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Disciplina: LetA09 - Oficina de produção e leitura de textos, 2017.

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Artigo de opinião: tema – racismo contra crespos. 
Veículo de publicação pretendido: blog Mundo Afro do jornal A Tarde
<http://mundoafro.atarde.uol.com.br>.

Não, não nos envergonhamos dos nossos cabelos!


Élisson Lopes, jovem negro, soteropolitano periférico, estudante de Letras
Vernáculas pela UFBA.

“Se você quiser te empresto dinheiro para cortar esse cabelo”. Todos os dias, nós,
pessoas de cabelos crespos, somos submetidxs a comentários racistas em quase todos os
lugares aonde vamos. No Brasil, existe a lenda de que o preconceito racial foi
erradicado do país. Estando em qualquer estado brasileiro percebemos que essa
afirmação ao invés de fatídica é uma utopia falaciosa. A ironia é essa lenda se espalhar
até mesmo em capitais como Salvador, sendo ela, como todxs sabemos, a cidade mais
negra fora da África e vítima de uma constante discriminação racial.
A nós, crespxs, causa grande intriga pensar sobre a razão de cotidianamente
sermos alvo de tantas ofensas mascaradas de piadas. E as tais “piadas” vêm de todos os
lados: dxs nossxs chefes e colegas, no dia a dia de trabalho, entre nossxs familiares, em
casa, e, principalmente, dxs desconhecixs aleatórixs, na rua. Os pútridos comentários
variam entre pedidos para que alisemos os nossos cabelos, questionamentos sobre o
porquê de não usarmos megahair e condenações à tesoura. Chegam até a perguntar se os
nossos blackpowers são perucas. NãoNão é preciso dizer que todxs nos sentimos feridxs
nesses momentos, isso é evidente.
Há, entre nós, xs que são pacientemente educadxs em suas respostas, xs que
emudecem perante as injúrias, e também, xs que não levam desaforo para casa e
rebatem as grosserias. Todxs, cada umx à sua maneira, resistimos às afrontas – o que
não é tarefa fácil. Xs racistas, logo após soltarem as piadas, tentam amenizar: dizem que
estavam brincando, que não deveríamos nos importar. Chegam a ter a audácia de tentar
nos convencer de que a intenção delxs era provocar o nosso riso.
Será que não sabem que nossos cabelos são crespos porque somos negrxs, e isso é
geneticamente natural e imutável? Ou será que nos atacam através de sátiras justamente
por compreenderem perfeitamente esse fato? O que acontece na realidade é que, entre
um riso e outro, elxs alimentam a um padrão estético que tenta nos fazer sentir vergonha
de nossa negritude. Querem nos obrigar a negar os nossos próprios cabelos – nossa
legítima herança.
Em uma sociedade tão desigual quanto a nossa é corriqueiro ver o racismo entre
as manchetes. Quando atiram bananas em nossxs jogadorxs de futebol. Quando usam de
classificações econômicas para, legalmente, nos escravizar. Quando se escondem atrás
do anonimato de uma tela de computador para agredir a moral de muitos de nós, negrxs.
Quando sofremos bulling em instituições de ensino. Quando atiram pedras em muitos
de nós que divergimos das religiões delxs.
Vivendo nessa realidade, é crucial que resistamos e nos imponhamos diante de
qualquer situação racista. É necessário que desatemos o nó em nossas gargantas e
deixemos sair o grito de resistência. É importante que nos empoderemos e não
permitamos que nos submetam a nenhum tipo de humilhação. É essencial que
enfrentemos e afrontemos qualquer umx que tente nos fazer negar a nossa própria
herança genética. Elxs pensam que nos adestrarão através da vergonha, então, em
resposta, gritemos: “não, não nos envergonhamos dos nossos cabelos!”

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