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Prefácio

Este livro se baseia na simples premissa de que ninguém poderia organizar


e construir o maior movimento Afro-Americano em massa na história, diante dos
incessantes ataques por parte de comunistas da esquerda, pretos reacionários de
todos os lados, e um dos mais poderosos governos do mundo. Ainda assim ser uma
piada, ou um palhaço, e ao mesmo tempo, um irresistivelmente impraticável visio-
nário.

Distorções não são novidade para a história Afro-Americana, mas seria difí-
cil encontrar uma figura Preta que tenha sofrido mais nas mãos de historiadores e
críticos. Este estudo pretende tratar Marcus Garvey e a Associação Universal para
o Progresso Negro com a seriedade e o respeito que merecem.

Após uma breve introdução biográfica, o estudo examina as maiores carac-


terísticas do panorama ideológico de Garvey, e como se manifestava na teoria, e na
prática. A última e maior porção do livro contém uma análise das memoráveis ba-
talhas que a UNIA estava simultaneamente envolvida, no front dos mais variados
setores. Independente das rixas pessoais geradas por estas lutas, estas eram es-
sencialmente confrontos ideológicos; devido ao fato de que o nacionalismo revolu-
cionário de Garvey era concebido como uma ameaça por uma vasta gama de opo-
nentes, que tinham entre si afeições semelhantes, fora o fato de quererem derrubar
Garvey e extinguir seu movimento. Contra todas estas forças Garvey prevaleceu.
Fora tão somente devido a sua deportação dos Estados Unidos, que sua força orga-
nizacional dentre as massas da América do Norte e, em muitos graus, ao redor do
mundo, começara a afrouxar-se lentamente. Até então, seu legado ideológico con-
tinua a ser uma grande força nas comunidades Pretas.

Um grande número de pessoas me ajudou de várias formas. Grandes e pe-


quenos, durante os anos que este livro ia tomando forma. Agradeço por todos. Em
particular, gostaria de mencionar quatro professores que providenciaram grande
encorajamento durante minha trajetória enquanto aluno na Michigan State Univer-
sity, quando as fundações deste livro foram lançadas. São eles, Professores James
R. Hooker, Joseph McMillan, Harold G. Marcus, e Ruth Hamilton.

Eu gostaria de incluir uma palavra especial de agradecimento pela inspira-


ção fornecida por algumas pessoas com quem conversei, que eram membros ativos
da UNIA no tempo de Garvey. São eles, póstumos, Sra. Amy Jacques Garvey de
Kingston, Jamaica; Sr. J. Charles Zampty, outrora de Trinidad, mas por mais de cin-
qüenta anos de Detroit, Michigan, fundador da UNIA em Detroit e auditor ocasional
para Garvey; Sr. J. R. Ralph Casimir de Roseau, Dominica, líder dos anos pós Pri-
meira Guerra Mundial na UNIA de Dominica e um dos mais ativos e influentes Gar-
veyístas das Índias Ocidentais; mãe Rainha Moore, que viu Garvey em Nova Or-
leãns em 1922; Coronel Von Dinzey de Nova Iorque e alguns membros da New
York Vanguard Local e da UNIA de Detroit, com quem conversei. Agradeço também
ao Sr. Herbert Whiteman, amigo de Kwame Nkrumah, o Schomburg Center for Re-
search in Black Culture, a New York Public Library, as Fundacções Astor, Lenox and
Tilden, por materiais usados no apêndice, e a Association for Study ofAfro-
American Life and History, pelos materiais contidos no Capítulo 9, que original-
mente apareceram num artigo no Negro History Bulletin.
Para o idiota dos idiotas do Harlem, que arrombou meu carro, rasgou mi-
nhas primeiras anotações de seis meses e me forçou a recomeçar minha pesquisa,
eu digo, “Por que você não pegou o pneu reserva, mano?”

Junho 1975 Tony


Martin
1
Introdução:

Marcus Mosiah Garvey,


1887-1940

O que me importa a morte pela causa da redenção de África?... Eu pode-


ria morrer em qualquer lugar pela causa da liberdade: Um homem de verdade
morre apenas uma vez; enquanto um covarde morre mil vezes antes de sua
verdadeira morte. Então, queremos que você perceba que a vida não vale seu
sal, exceto para que você possa vivê-lo por algum propósito. E o mais nobre
propósito para se viver é a emancipação de uma raça e a emancipação da pos-
teridade.

– Marcus Garvey¹

A história registra que escravos - em virtude de suas experiências e o


conhecimento adquirido nos cativeiros em terras estranhas- têm eventualmen-
te tornado-se Mestres de si mesmos, e com o tempo, têm escravizado outros
(povos). Vamos, portanto, usar a adversidade como outros têm feito. Levar
vantagem de cada oportunidade; onde não há nenhuma, façamos, e deixe a
história registrar isto, de que enquanto trabalhávamos laboriosa e corajosa-
mente, trabalhamos para viver gloriosamente.

– Marcus Garvey²

Marcus Mosiah Garvey nasceu em St. Ann's Bay, Jamaica, no dia 17 de agos-
to, 1887. Sua infância foi profundamente enraizada no ambiente camponês que o
cercava. Certa vez descrevera sobre um tio, para quem às vezes trabalhava, como
meeiro rural. Seus próprios pais eram do ramo da agricultura camponesa em pe-
quena escala. No entanto, Garvey não teve uma típica experiência camponesa. Seu
pai, descendente dos quilombolas Marroons, ex-escravizados Africanos-
Jamaicanos que desafiaram com sucesso o regime escravista, também foi um co-
merciante habilidoso, além de pedreiro. O histórico de Garvey o distingue ainda
mais do típico camponês, pois seu pai possuía uma biblioteca, cujos volumes de-
ram a Garvey um gosto precoce pela leitura.

Sua infância caracterizou-se por uma capacitada educação no Primário, pre-


enchida por professores particulares e escola dominical. Sua capacidade de lide-
rança parece ter se manifestado desde o princípio, devido ao seu porte físico dar-
lhe uma posição de destaque entre seus colegas³. Aos quatorze anos, época em que
já havia se tornado aprendiz numa gráfica local, Garvey deixou a escola. Dois anos
depois, mudou-se para Kingston, capital da Jamaica, onde conseguiu trabalho. Até
seus dezoito, havia alcançado o que mais tarde descreveu como “uma excelente
posição como gerente de uma grande gráfica.” Esta foi uma excelente conquista,
tornando Garvey o impressor mais jovem em Kingston, numa época em que muitos
trabalhadores eram importados da Grã-Bretanha e Canadá. Participara de uma
greve, durante a qual ele consentiu em liderar os trabalhadores apesar das garan-
tias de favores pela administração. O que custou ele seu emprego. Ele então conse-
guiu uma vaga na nas impressoras do governo.

Em Kingston, Garvey penetrou rapidamente no mundo intelectual e na vida


política da cidade. Em 1909, seu envolvimento político o trouxe ao National Club,
organizado por um advogado e membro do conselho legislativo, Sandy Cox. Garvey
foi eleito um dos secretários adjuntos deste clube, que buscava combater o privilé-
gio e os males do colonialismo na ilha⁴.

Em 1910, Garvey embarcou na primeira de suas muitas andanças por terras


estrangeiras. Foi para a Costa Rica, onde trabalhou por um tempo como cronome-
trista em uma plantação de banana da United Fruit Company e como operário no
cais de Port Limón. Editara um jornal, La Nación, e assediou o diplomata britânico
sobre suas negligências perante muitos trabalhadores das Índias Ocidentais, foi
preso por incitar trabalhadores a lutarem por melhores condições, e acabou sendo
expulso do país (ou fugido para escapar das autoridades).

Ele continuou, por mais ou menos um ano, a vagar pela América Latina, indo
para lugares como Panamá e Equador, onde as Índias Ocidentais trabalham tinham
migrado em grande escala, a procura de trabalho. Ele observou a degradação uni-
versal da raça Preta, trabalhou intermitentemente para financiar suas viagens, e
iniciou outro pequeno jornal, em Colón, Panamá, assim agitando trabalhadores
negros. Um trabalhador negro de Colon na época lembra ter conhecido Garvey por
volta de 1912, quando se dirigiu à população predominantemente negra no Colon
Federal Labor Union.⁵ Existe a possibilidade de Garvey ter parado brevemente,
talvez em trânsito por algum um porto marítimo, em algum lugar do Estados Uni-
dos durante este período.⁶
Da América Central, Garvey retornou rapidamente à Jamaica, e pelo outono
de 1912, sem se intimidar pela falta de dinheiro, ele estava na Inglaterra, onde sua
única irmã sobrevivente, Indiana, trabalhava como governanta. Na Inglaterra, ele
se entregou à paixão de falar em público, no Hyde Park's Speakers' Corner, e era
um visitante regular na House of Commons e trabalhou para o Africa Times and
Orient Review, o então principal jornal Pan-Africano. Encontrou tempo para visitar
a Escócia, Irlanda, França, Itália, Espanha, Áustria, Hungria e Alemanha.⁸ Garvey
disse mais tarde que participou algumas aulas de direito no Birkbeck College da
Universidade de Londres.⁸

Em julho de 1913, Garvey estava, não surpreendentemente, quase indigen-


te, e então solicitou ajuda do governo. No entanto, possivelmente devido ao seu
trabalho na Africa Times e Orient Review, (seu artigo para a revista só foi publica-
do na edição de outubro), ele conseguiu sobreviver por quase mais um ano. Em
maio de 1914, enquanto estava provavelmente sem emprego, a Sociedade de Pro-
teção Anti-Escravidão e Aborígenes intervira em seu favor, despachando-o para o
Escritório Colonial com uma oferta de contribuição da sociedade se o Escritório
Colonial colocasse parte do dinheiro para repatriá-lo à Jamaica. No início de junho
a sociedade informou ao Escritório Colonial que Garvey estava “se esforçando para
levantar um fundo para cobrir o dinheiro da passagem” e se ofereceu para igualar
qualquer quantia que o Escritório Colonial oferecesse. No entanto, Garvey conse-
guiu fazê-lo sem a generosidade dessas duas agências. Ele conseguiu levantar sua
passagem para casa e deixou a Inglaterra em 17 de junho de 1914.⁹

A primeira estadia de Garvey na Inglaterra foi de grande importância para


sua carreira. O funcionamento da democracia britânica deixou uma impressão du-
radoura nele e, assim como gerações posteriores de visitantes do mundo coloniza-
do à metrópole, ele notou o contraste entre a autocracia que os mesmos coloniza-
dores mantinham em suas dependências tropicais. Ele estava muitas vezes a cla-
mar, nos anos seguintes, por uma extensão da "justiça britânica" às colônias. A In-
glaterra lhe dera, também, uma oportunidade de aprimorar seu já amplo conheci-
mento sobre o sofrimento mundial dos negros. Nas páginas do Africa Times e da
Orient Review apareciam regularmente artigos por e sobre figuras negras impor-
tantes, como Booker T. Washington, Edward Wilmot Blyden, John Edward Bruce,
W. E. B. Du Bois e William Ferris, por exemplo. Alguns destes logo seriam seus só-
cios nos os Estados Unidos. Garvey também entrou em contato com marinheiros e
estudantes negros, cujo sofrimento ele observou, e com as muitas pessoas de cor
que visitara os escritórios do jornal. E o fato do jornal combinar uma perspectiva
Pan-Africana com ampla cobertura sobre as lutas nacionalistas no Médio e Extre-
mo Oriente, e, de fato, todas as lutas anti-coloniais, contribuíram muito para o
crescimento de Garvey e influenciara suas futuras perspectivas.

Garvey volta à Jamaica em 15 de julho de 1914, com a cabeça fervendo de


ideias sobre como ganhar a vida e fundar um movimento racial. Para se assegurar
disto, ele tentou vender cartões de felicitações e condolências, bem como “lápides
monumentais”.¹⁰ Para garantir isto, ele formou, cinco dias depois de sua chegada, a
Universal Negro Improvement and Conservation Association e Liga das Comuni-
dades Africanas (Imperial)¹¹. O título deu testemunho de sua visão ampla provo-
cada por suas viagens e o medo, que ele nunca abandonou, de que raças fracas es-
tavam condenadas à escravidão e à possível extinção. A este respeito escreveu:

Nos últimos dez anos, dediquei meu tempo ao estudo das condições
do negro, aqui, ali e em todos os lugares, e eu vim a perceber que ele ainda é
objeto de degradação e ter se pena pelo mundo, no sentido de que ele não
tem status social, nacional ou comercialmente (com um mínimo de exceção
nos Estados Unidos da América)... ¹²

Garvey tornou-se presidente e comissário itinerante da nova organização,


entre cujos objetivos declarados estavam a promoção de uma "Confraria Universal
entre as raças", o estabelecimento de uma nação central para negros, a criação de
instituições de ensino e o compromisso "de trabalhar por melhores condições en-
tre os negros em todos os lugares."

Amy Ashwood, que ele conheceu na reunião semanal do East Queen


St.Baptist Literary and Debating Society, se tornara sua secretária. A associação
fora formada, relata, em sua segunda reunião¹³. Alguns dias depois, uma reunião
inaugural ocorreu no Collegiate Hall, Kingston, presidida pelo prefeito de Kingston.
O recrutamento foi lento, embora Garvey trabalhara incansavelmente, conseguiu
estabelecer-se na mentes de muitos como um agitador e um incômodo. Muitos
“negros respeitáveis” que ainda não tinham aprendido a amar sua negritude, se
opuseram ao seu movimento.

Como Garvey escrevera mais tarde: “Eu tive que decidir se deveria agradar
meus amigos e ser um dos 'negro-brancos' da Jamaica, e ser razoavelmente prós-
pero, ou sair abertamente defendendo e ajudando a melhorar e proteger a integri-
dade dos milhões de negros, e sofrer por isto.” ¹⁴

Após cerca de um ano, a organização só podia se gabar por cerca de cem


membros.¹⁵ Até este momento, suas atividades foram em grande parte confinadas
à Kingston. Em novembro de 1915, no entanto, sua primeira reunião pública fora
de Kingston foi realizada, na cidade natal de Garvey, St. Ann's Bay. O Jamaica Times
relatou: “Certamente regojizadas, as pessoas da cidade acabaram por escute seu
conterrâneo.”¹⁶ Garvey tinha planejado empreender uma turnê de palestras para
arrecadação de fundos nos Estados Unidos começando neste mesmo mês, tendo
recebido uma garantia de apoio de Booker T. Washington. Mas sua morte fizera
com que ele adiasse sua viagem até 1916.

Garvey chegou à Nova York em 23 de março de 1916, para uma turnê de pa-
lestras que ele achava que duraria apenas cinco meses cuja audiência ficaria restri-
ta principalmente aos negros no Sul. Ele providenciou que seu correio fosse entre-
gue para um endereço na Jamaica durante a sua ausência e informando onde quer
que ele fosse na América, e que estava angariando fundos para um instituto indus-
trial para se estabelecer na Jamaica.

O advento de Garvey aos Estados Unidos não o encontrara tanto como um


estranho às condições de lá, como alguns são levados a acreditar. Para uma coisa
servia sua ampla leitura sobre questões raciais, que obviamente incluía as condi-
ções da raça na América do Norte. Mais do que isso, porém, a visita de Garvey aos
Estados Unidos aconteceu no meio de uma migração em massa de caribenhos para
aquele país. O vai-e-vem de pessoas e idéias por essa migração significava que a
adaptação aos Estados Unidos não era, possivelmente, um grande problema para
os recém-chegados.

Em março de 1916, o senso de missão de Garvey, sua convicção de que fora


chamado para emancipar sua raça, havia atingido um grau assustador. Pouco antes
de deixar a Jamaica, ele havia escrito uma carta para Robert Russa Moton, sucessor
de Booker T. Washington em Tuskegee, “agora, falo com você como um homem que
recebera uma missão do Deus Supremo”. Embora ainda pensasse que a Jamaica
seria seu principal campo de esforços, ele, no entanto, já havia traçado o curso que
estava a seguir nos anos seguintes. Na mesma carta, escreveu:

Tenho muitos grandes projetos em mente para o avanço do


meu povo que eu não posso expor no momento ao público. De tal forma,
minha esperança de sucesso imediato seria derrotada, pois meus inimigos
são tantos e eles estão sempre ansiosos para me deturpar. Em primeiro
lugar, tenho que criar uma imprensa própria e realizar algum trabalho para
demonstrar minhas verdadeiras intenções.¹⁷

Nos Estados Unidos, Garvey encontrou um alojamento no Harlem


onde residia uma família jamaicana, contraiu pneumonia, conseguiu trabalho como
impressor, e economizou o suficiente para começar sua turnê para levantar fundos
entre os estados. Neste momento, deu seu endereço como sendo 53 West 140
Street, no Harlem. Em junho, estava dando palestras em Boston e até novembro,
demonstrava novamente a incrível articulação que caracterizou suas visitas à
Europa e América Central. Ele já havia visitado, entre outros lugares, Nova York,
Boston, Filadélfia, Pittsburgh, Baltimore, Washington D.C., e Chicago, além de
conhecer um bom número de personalidades nacionais e líderes Afro-Americanos
locais. Entre eles estavam John Edward Bruce, a quem ele chamava de “um verda-
deiro negro”, um homem para quem ele tinha “a mais forte consideração”, um Dr.
R. R. Wright, Jr., Dr. Parks, vice-presidente da Igreja Batista Union, Dr. Triley da
Igreja Metodista Episcopal de Filadélfia, Reverendo J. C. Anderson, a quem ele des-
creveu apenas como sendo “de Quinn Chapel”, Sra. Ida Wells-Barnett, famosa pelos
pronunciamentos antilinchamentos, editor de revista Fenton Johnson e William H.
Ferris. Bruce tinha sido um agente e um colaborador regular do Africa Times and
Orient Review. Ferris tinha certa vez escrito um artigo para a mesma revista em
que elogiou a atitude de Garvey no artigo de outubro de 1913, publicado alguns
meses antes do seu.¹⁸ Ferris editaria mais tarde o semanal Negro World de Garvey
entre os anos de 1920 a 1923 e passaria a ocupar uma variedade de cargos superi-
ores dentro da UNIA. Bruce, depois de um período inicial de ceticismo, tornou-se
um colaborador regular e membro dos conselhos editoriais do Negro World e do
Garvey’s Daily Negro Times. Até sua morte em 1924, ele permaneceu o mais firme
dos apoiadores de Garvey entre a intelectualidade afro-americana.

A turnê-furacão de Garvey o levou por trinta e oito estados e durou


cerca de um ano. Ao final, regressou para a cidade de Nova York, onde estabeleceu
uma base temporária. Harlem, recentemente convertido à seção negra de Nova
York, já era a potencial capital do mundo negro. Sua população, composta na gran-
de maioria de imigrantes sulistas ou nascidos nas Índias Ocidentais, possuía uma
rara vitalidade, contendo uma alta proporção de radicais de todos os tipos e um
grande número de artistas negros de destaque. Grupos raciais de todos os tipos
enchiam a avenida principal, a Lenox Avenue, o local favorito dos oradores popula-
res e seus palanques.

O Harlem, no entanto, era apenas um microcosmo do mundo negro


no Período da Primeira Guerra. A subjugação da África pelo imperialismo europeu
era, ainda, uma memória recente. Em resposta a isto, um número infinito de nacio-
nalistas e pan-africanistas surgiram na África, Europa, América do Norte, Índias
Ocidentais, América Central e do Sul — em todos os lugares que os negros viviam e
todos olhando para a restauração da independência. Além da questão africana, as
comunidades negras em todos os lugares tinham seus próprios problemas locais. O
negro estava em quase todos os lugares numa posição de subjugação. Garvey, em
seu envolvimento na greve dos impressores, em sua participação no Jamaica’s Na-
tional Club, em sua agitação entre os trabalhadores negros da América Central, em
suas viagens pela Europa, e em sua formação da UNIA (a palavra “Conservação”
havia sido abandonada do título eventualmente), há muito incorporava o espírito
de protesto negro que caracterizava o momento. Era inevitável, portanto, que ele
seria seduzido pelo Harlem, a comunidade negra mais politizada do mundo.

Garvey mudou-se para o centro das atenções do Harlem, com toda a


facilidade e autoconfiança de um homem com uma missão. Ele foi às ruas, juntan-
do-se aos palestrantes de palanque e escada, e formou alianças políticas com al-
guns dos mais radicais proeminentes do Harlem. Alguém que conhecia Garvey nes-
te momento lembrou que ele “poderia jogar sua voz em três cantos sem pestane-
jar.” ¹⁹

Em 12 de junho de 1917, um intelectual do Harlem, Hubert Harrison,


convidou Garvey para discursar em uma assembléia na presença de aproximada-
mente duas mil pessoas, realizada no Bethel AME Church com o propósito de orga-
nizar a Harrison’s Liberty League. O próprio Garvey, antes de sua turnê estadual,
havia realizado uma reunião que não fora tão bem sucedida, visto que caiu do pal-
co. A reunião da Liberty League porém foi um ganho inesperado, pois ele foi um
tremendo sucesso.²⁰ Pouco antes, ou talvez logo depois da assembléia com
Harrison, Garvey começou a realizar suas próprias reuniões semanais todos os
domingos às 15h no Harlem's Lafayette Hall, na 131 Street e na Lenox Avenue. As
reuniões estavam programadas para continuar até outubro de 1917 e Garvey ainda
estava sendo anunciado como chefe da UNIA e ACL da Jamaica. Em um destes do-
mingo de reuniões, no dia 8 de julho, menos de um mês após a reunião da Liberty
League, o discurso de Garvey recebera a denúncia de “conspiração pelos motins de
East St. Louis.”²¹ É possível que a primeira filial da UNIA em Nova York já existia
por esta época, pois o endereço da associação era dado como 235 West 131 Street.
O tema desta palestra mostra que Garvey tinha mais uma vez a propensão, como
na Costa Rica e Panamá, de se envolver rapidamente nas questões puramente lo-
cais de onde quer que ele estivesse.

A primeira filial da UNIA de Garvey em Nova York, bem como sua se-
gunda tentativa no início de 1918, fora concebida como auxiliar do quartel-general
na Jamaica. O próprio Garvey, como presidente da divisão da Jamaica, não ocupava
cargo lá. Ambos os esforços para estabelecer filiais da UNIA foram interrompidos
por tentativas de socialistas e republicanos de transformá-las em clubes políticos.
Numa terceira tentativa baseada num plano de núcleo para treze membros, Garvey
consentiu em se tornar presidente da filial em Nova York, concretizando assim
uma decisão que com toda a probabilidade já havia contemplado - ou seja, jogar
seu balde nos Estados Unidos.²² Com esta jogada, a cidade de Nova York abasteceu
a Kingston, Jamaica, como sede da UNIA. Uma cisma desenvolveu-se nesta nova
tentativa, também, mas Garvey resistiu à tempestade. O local de encontro da asso-
ciação, no entanto, mudou-se do Lafayette Hall para o Palace Casino, onde perma-
neceu durante a maior parte de 1918.

Uma vez que Garvey decide permanecer nos Estados Unidos, ele se-
guiu adiante com vigor renovado. A UNIA foi oficializada sob as leis de Nova York
em 2 de julho de 1918. Em 31 de julho, a Liga das Comunidades Africanas foi cons-
tituída como uma corporação comercial. Um ou dois meses depois surge o Negro
World, destinado a se tornar o mais difundido dos jornais raciais e a ruína dos co-
lonialistas europeus. Garvey fora inicialmente seu editor. As primeiras edições fo-
ram distribuídas gratuitamente ao serem disponibilizadas por debaixo das portas
das pessoas em suas primeiras horas.

Durante o ano, Garvey embarcou em sua primeira turnê de arrecada-


ção de fundos fora de Nova York depois de mudar a sede da UNIA. Sua primeira
parada foi Detroit, onde foi atingido na cabeça por uma pedra atirada por um de-
sordeiro. Ao seu retorno a Nova York, sua secretária, Amy Ashwood, que o acom-
panhava, foi convocada ao escritório do promotor público por um total de, ela es-
creveu mais tarde, dezessete vezes. As autoridades, ao que parece, suspeitaram
que Garvey angariava fundos para uma empresa “Back-to-Africa” inexistente .²³

Em 11 de novembro de 1918, o New York Times noticiou uma reuni-


ão de cinco mil pessoas presididas por Garvey no Palace Casino. A reunião celebra-
va o fim da Primeira Guerra Mundial convocando o Poder Aliado para entregar as
ex-colônias alemãs na África ao domínio negro. Diversas pessoas, entre elas os so-
cialistas A. Philip Randolph e Ida Wells-Barnett, foram nomeados na reunião para
fazer lobby em nome da UNIA na próxima conferência de paz em Paris. A UNIA
acabou por despachar um haitiano como alto comissário para fazer lobby durante
a conferência, já que a maioria Afro-americanos estavam sendo negados passapor-
tes para a França pelo governo dos Estados Unidos.

Logo após a reunião de novembro, a Sra. Wells-Barnett dirigiu-se a


uma Assembleia da UNIA em Nova York. Nesta ocasião, no entanto, ela irritou Gar-
vey ao desaconselhar a ideia de um retorno à África e o lançamento do que poste-
riormente se tornaria o Black Star Line Steamship Corporation. Como a maioria
das pessoas que viram Garvey em ação, ela mais tarde testemunhou a influência
notável que ele exerceu sobre seu público.²⁴

Em 1919, Garvey já estava firmemente estabelecido como um dos lí-


deres radicais mais influentes do Harlem. E foi nesse ano que sua fama espalhou-se
pelo globo. Antes que o ano terminasse, ele seria regularmente discutido na im-
prensa e nos círculos governamentais da Europa, África, Índias Ocidentais, e outros
lugares.
Em março de 1919, em outra grande assembleia no Palace Casino,
Garvey alegou que W. E. B. Du Bois havia sabotado as atividades de seu alto comis-
sário na França.²⁵ O desejo por um lobby afro-americano na Conferência de Paz de
Paris também foi motivo para reunir um grupo de radicais do Harlem e outros in-
divíduos proeminentes no lar da rica, porém com consciência de raça, Madame C. J.
Walker. Garvey estava entre os presentes neste encontro, da qual surgiu a curta
International League of Darker Peoples.²⁶

Em junho de 1919, Garvey incorporou sua Black Star Line Steamship


Corporation. A esta altura, Garvey afirmara mais tarde, que a UNIA tinha cerca de
trinta filiais e mais de dois milhões de membros.²⁷ Esse número aparentemente
incluía simpatizantes, bem como membros sem qualquer relação específica, mas o
a propagação de suas idéias neste volume não poderia ser contestada. Já em 1918,
o Negro World estava alcançando lugares tão distantes quanto o Panamá e durante
1919 Garveyístas eram acusados pelas autoridades coloniais por incitação anti-
branca na Jamaica, Trinidad e Honduras Britânicas, entre outros lugares.²⁸

Em outubro de 1919, Garvey, aproximando-se rapidamente do auge


de sua carreira, escapara de uma morte prematura. Vários tiros foram disparados
contra ele por George Tyler, dois dos quais tiraram-lhe sangue. As feridas foram
minoritárias, no entanto. Tyler morreu misteriosamente, supostamente se jogando
da cela onde aguardava audiência no tribunal. Era amplamente suspeito de que ele
planejava implicar outros de sua tentativa de assassinato. Pouco mais de dois me-
ses depois desse atentado contra sua vida, no Natal de 1919, Garvey se casou com
Amy Ashwood durante um espetáculo luxuoso no Liberty Hall, agora, próprio local
de encontro da UNIA. Em 1916 ela deixou a Jamaica para o Panamá, mas se reen-
controu com Garvey na primavera de 1918, quando se mudou para os Estados
Unidos. O casamento teve fim no início de 1920, se separando em meio a uma con-
fusão de acusações e contra-acusações relativas à infidelidade, erros financeiros e
estratégias políticas.

O ano de 1920 testemunhara a First International Convention of the


Negro Peoples of the World, organizada por Garvey. Na sessão de abertura no Ma-
dison Square Garden, Nova York, uma multidão transbordante de vinte e cinco mil
encheram a arena e se espalharam pelas ruas. As outras sessões foram realizadas
no Liberty Hall, Harlem. Delegados, vindos de todo o mundo negro, adotaram a
Declaration of Rights of the Negro Peoples of the World. Esta declaração listou as
principais queixas da raça e exigira sua resolução. A notificação foi entregue na
Europa colonialista de que o homem negro tinha um “direito inerente. . . de possuir
ele mesmo a África” independentemente das reivindicações de qualquer outra raça
ou nação. Reivindicações foram feitas para a capitalização da letra “N” em Negro,
para o ensino da história negra nas escolas, e pelo fim do linchamento e diversas
outras discriminações. O vermelho, preto e verde foram adotados como as cores da
raça; 31 de agosto, o último dia da convenção que durou um mês, foi proclamado
feriado internacional para os negros; o Hino Universal Etíope foi adotado. Durante
a convenção, Garvey foi eleito presidente geral da UNIA e presidente provisório da
África. O prefeito da Monróvia, Libéria, Gabriel Johnson, foi eleito potentado su-
premo, ou líder cerimonial. Diversos outros foram eleitos líderes de várias partes
do mundo negro.

Também em 1920, ocorreu o nascimento da UNlA’s Negro Factories


Corporation, que ao longo dos próximos dois ou três anos geriu uma série de negó-
cios UNIA, incluindo lavanderias, restaurantes, uma fábrica de bonecas, alfaiataria
e estabelecimentos de chapelaria, bem como uma prensa tipográfica. Alguns desses
empreendimentos estiveram em operação desde 1918, pois Ida Wells-Bamett rela-
tara ter sido apresentada por Garvey a um restaurante UNIA e algumas empresas
menores não especificadas, àquele ano.

Em 1921, Garvey era inquestionavelmente o líder da maior organiza-


ção de seu tipo na história da raça. Ele teve sucesso como ninguém mais teve, ao
reunir os sentimentos mundiais de consternação pela perda de independência e
desafio contra o colonialismo e a opressão, que caracterizava o espírito do “Novo
Negro” da época. A partir de 1º de agosto de 1921, a UNIA continha 418 divisões
(acima de 95 um ano antes) e mais 422 ainda não fretadas. Além disso, havia 19
seções (de nenhuma no ano anterior), totalizando um total de 859 agências. ²⁹

O sucesso inigualável de Garvey teve o efeito de se alinhar contra ele


um conglomerado mais poderoso de forças hostis. O governo dos Estados Unidos
estava contra ele pois considerava todos os radicais negros subversivos; os gover-
nos europeus estavam contra ele porque ele era uma ameaça à estabilidade de suas
colônias; os comunistas eram contra ele porque ele conseguiu manter os trabalha-
dores negros fora de seu alcance; a National Association for the Advancement of
Colored People e outras organizações integracionistas estavam contra ele porque
ele argumentou que segregacionistas brancos eram os verdadeiros porta-vozes da
América branca e porque ele, por sua vez, defendia o separatismo negro. Sua orga-
nização também teve de lidar com oportunistas inescrupulosos que mediram es-
forços para sabotar seu funcionamento em troca de ganhos pessoais.

Em 1921, a oposição de todas essas forças aumentou consideravel-


mente. Primeiro, o Departamento de Estado dos Estados Unidos quase impediu
Garvey de reentrar no país após uma curta viagem ao Caribe. Ele conseguiu voltar,
no entanto, mal a tempo de sua Second International Convention. Então, em sua
convenção anual, os comunistas, liderada por seu auxiliar negro, a African Blood
Brotherhood, fez uma tentativa malsucedida de capturar seus seguidores. Enquan-
to isso, a NAACP, através de seu principal porta-voz negro, W. E. B. Du Bois, foi
constantemente aumentando sua campanha de ataques em seu órgão The Crisis e
em outros lugares. Os socialistas negros também começaram a criticar Garvey, e as
autoridades britânicas estavam ocupadas com a medida que haviam começado em
1919 de banir o Negro World, proibindo os funcionários da UNIA de entrar em su-
as colônias, e geralmente fazendo tudo o que podiam para impedir a propagação da
influência de Garvey. Finalmente, em 12 de janeiro de 1922, Garvey foi preso por
suposta fraude postal. Este foi um sinal dos esforços redobrados por parte de seus
inimigos que presumiam sua culpa e pediam sua prisão e deportação. Apesar de
tudo isso, a UNIA conseguiu avançar. O The Daily Negro Times apareceu em 1922 e
uma revista Black Man foi projetada, mas de fato não apareceu até muito mais tar-
de. O segundo casamento de Garvey aconteceu logo durante este ano, com sua se-
cretária particular Amy Jacques.

Em 1923, ele foi condenado pelas acusações de fraude postal em co-


nexão com com a Black Star Line. No entanto, Garvey estava agora reivindicando
uma adesão de seis milhões e novecentas agências. Quinhentos dos ramos e um
pouco menos da metade dos membros estariam nos Estados Unidos.³⁰

O último ano completo de Garvey como homem livre nos Es-


tados Unidos foi 1924. Durante este ano, a notável fé que seus seguidores deposi-
taram nele foi novamente demonstrada quando se inscreveram o suficiente para
lançar a nova linha de navios a vapor, a Black Cross Navigation and Trading Com-
pany. O ano de 1924 também viu o bloqueio das intenções de Garvey em estabele-
cer uma base na Libéria. Também durante este ano, a UNIA lançou sua Negro Polí-
tical Union projetado para trazer sua força de voto para influenciar as eleições dos
Estados Unidos e outras nações, endossando candidatos com base em seu histórico
de negociações com a raça, independentemente de filiação partidária.
Em fevereiro de 1925, o apelo de Garvey foi negado e ele ingressara
na penitenciária federal de Atlanta. O que seus inimigos esperavam obter através
de sua prisão, aconteceu. As cismas surgiram no movimento americano resultando,
em 1926, num rompimento na filial de New York, a maior de todas (estimada em
trinta e cinco mil membros em certo momento). Essas tensões ocasionadas pela
partida de Garvey foram, no entanto, ainda relativamente menores, pois Garvey,
mesmo da prisão, conseguiu manter algum controle, nomeando e destituindo dire-
tores e tendo conferências com seus ajudantes. Em uma conferência extraordinária
em Detroit em 1926, o secretário geral, G. Emonei Carter, relatou 814 filiais “do-
mésticas”, 215 “estrangeiras” além de “novas” 91 (sejam estrangeiros ou nacionais
não especificados), somando um total de 1.120. Havia 25 pedidos pendentes de
alvará.³¹

A descoberta em 1970 de registros da UNIA, incluindo arquivos de


membros, oferece uma oportunidade única para verificar esses números. De acor-
do com dados nesses registros (principalmente compilados de cerca de 1925 a
1928) havia 725 filiais da UNIA nos Estados Unidos (possivelmente 723-ver apên-
dice) e 271 fora dos Estados Unidos (possivelmente 273), totalizando a grande
marca de 996. Os dados (excluindo onze agências não-registradas de acordo com a
localização) estão resumidos nas Tabelas 1 e 2.

Tabela 1.
Distribuição das Filiais da UNIA nos Estados Unidos, ca. 1926

Estado Nº de Filiais Estado Nº de Filiais

1. Louisiana 74 20. Alabama 11


2. Virgínia 48 21. Connecticut 10
3. Carolina do Norte 47 22. Maryland 10
4. Pensilvânia 45 23. Tennessee 9
5. West Virginia 44 24. Texas 9
6. Mississippi 44 25. Kentucky 8
7. Ohio 39 26. Kansas 7
8. Arkansas 38 27.Massachusetts 7
9. Flórida 32 28. Arizona 4
10. Nova Jersey 31 29. Colorado 3
11. Oklahoma 28 30. Delaware 3
12. Geórgia 26 31. Washington 3
13. Carolina do Sul 24 32. D.C. 2
14. Illinois 23 33. Iowa 2
15. Missouri 21 34. Rhode Island 2
16. Califórnia 16 35. Nebraska 1
17. Nova York 16 36. Oregon 1
18. Michigan 14 37. Utah 1
19. Indiana 13 38. Wisconsin 1

----------------------
Fonte: Adaptado de dados da Divisão Central da UNIA (Nova York) arquivos, Cole-
ção Schomburg, Biblioteca Pública de Nova York.

Nota: Os ramos "Diversos" (ver apêndice) são omitidos.

Alguns fatos interessantes e possivelmente surpreendentes emergem


dessa nova informação. Em primeiro lugar, se o número de filiais em uma determi-
nada área pode ser tomado para indicar a extensão da penetração da UNIA, então o
sul dos Estados Unidos era a área melhor organizada da UNIA no mundo. Louisiana
era de longe o estado mais completamente garveyísta, com um total de setenta e
quatro filiais.³⁰ Os três principais estados dos Estados Unidos estavam no Sul, e
apenas três dos treze primeiros estavam no Norte.

Tabela 2.
Distribuição das Filiais da UNIA Fora dos Estados Unidos, ca. 1926

País Nº de Filiais País Nº de Filiais

1. Cuba 52 22. Zona do Canal (Panamá) 2


2. Panamá 47 23. Sudoeste da África 2
3. Trinidad 30 24. País de Gales 2
4. Costa Rica 23 25. Antígua 1
5. Canadá 15 26. Austrália 1
6. Jamaica 11 27. Bermudas 1
7. Honduras Espanhola 8 28. Brasil 1
8. África do Sul 8 29. Dominica 1
9. Guiana Britânica 7 30. Guiana Holandesa 1
10. Colômbia 6 31. Equador 1
11. República Dominicana 5 32. Granada 1
12. Guatemala 5 33. Haiti 1
13. Nicarágua 5 34. Nevis 1
14. Barbados 4 35. Nigéria 1
15. Honduras Britânicas 4 36. Porto Rico 1
16. México 4 37. São Cristóvão 1
17. Serra Leoa 3 38. Santa Lúcia 1
18. Inglaterra 2 39. St. Thomas 1
19. Costa do Ouro 2 40. São Vicente 1
20. Libéria 2 41. Venezuela 1
21. Bahamas 2

---------------------

Fonte: Adaptado de dados da Divisão Central da UNIA (Nova York) arquivos, Cole-
ção Schomburg, Biblioteca Pública de Nova York.

Nota: Os ramos “Diversos” (ver apêndice) são omitidos.


Esses achados podem ser moderados um pouco, mas apenas um pouco, pelo
fato de que algumas das maiores filiais individuais estavam provavelmente em ci-
dades ao norte como Nova York e Chicago. Ao total, a UNIA estava representada em
trinta e oito dos Estados Unidos. Não foi apenas a organização de afro-americanos
recém-urbanizados. Foi também a organização da grande massa de camponeses
negros em todo o Sul, Sudoeste e outros lugares.

Fora dos Estados Unidos, Cuba liderou com cinquenta-e-duas filiais, mais do
que qualquer estado dos Estados Unidos, exceto a Louisiana. A maior área do Cari-
be (incluindo a América Central e o norte da América do Sul) era, sem dúvidas, o
maior reduto Garveyísta fora dos Estados Unidos. A África do Sul era o melhor or-
ganizado dos países africanos. Nenhuma área de população negra significativa no
mundo estava sem uma filial UNIA. Incluindo Canadá, Europa e Austrália.

Os dados sugerem que o relatório de Detroit de 1926 era exato. A ligeira


discrepância nos números provavelmente não se deva a uma causa maior do que a
perda de alguns cartões de filiação durante as décadas anteriores à sua redesco-
berta. Pois havia filiais em lugares como Daomé, Congo Belga e áreas de Trinidad
que não aparecem nos registros.

Uma conclusão importante a ser tirada dos números deste capítulo é que a
UNIA continuou a se expandir após o encarceramento de Garvey em 1925. Alguns
ramos estavam, sem dúvida, desmantelando-se, mesmo quando novos eram adici-
onados, mas a evidência de quantos é inconclusiva. Certamente, em 1926, alguns
ramos não estavam enviando informações atualizadas para a sede, mas isso sem-
pre foi um problema e não indicam falta de atividade.

Enquanto isso, o clamor pela libertação de Garvey aumentava. Numa de-


monstração no Harlem, cerca de 150.000 pessoas marcharam e engarrafaram as
calçadas.³³ O governo, perplexo com a profundidade do sentimento demonstrado
por alguém que eles caracterizavam como um golpista, e talvez vendo com apreen-
são o próximo ano eleitoral, decidiram comutar sua sentença, porém com deporta-
ção.

Cinco mil seguidores leais estavam à disposição em Nova Orleãs para ouvi-
rem o discurso de despedida de Garvey direto do convés do navio que o levava pa-
ra o Caribe. Eles ficaram na chuva e cantaram o hino da UNIA, “Deus Abençoe Nos-
so Presidente”, enquanto o navio se afastava, levando seu líder da cena de seus
maiores triunfos, para nunca mais pisar nos Estados Unidos.

Quando o navio parou no Panamá, Garvey foi recebido por uma delegação
da UNIA local. E na Jamaica, onde chegou em 10 de dezembro de 1927, ele foi rece-
bido como herói junto a uma das maiores multidões da história da ilha reunidas
para cumprimentá-lo.

Nada desanimado com sua deportação, Garvey começou a tirar o máximo


desta adversidade. Em 1928 ele visitou a Inglaterra, apresentou uma petição re-
formulada à Liga das Nações, e visitou brevemente o Canadá.
Em agosto de 1929, Garvey realizou a Sixth International Convention na
Jamaica. E fora tão espetacular quanto as anteriores no Harlem. Um racha tendo
surgido durante a convenção resultou na formação de uma franquia UNIA separa-
da, com sede nos Estados Unidos. Garvey permaneceu como chefe de sua facção,
agora autodenominando-se UNIA e ACL (agosto de 1929) do Mundo. Os america-
nos mas céticos, não levaram todo o campo americano com eles. Eles falharam, por
exemplo, em ganhar o controle do Negro World, que continuou a carregar os pro-
nunciamentos de Garvey. Unidades leais à Garvey por muitas vezes mudavam seus
nomes para Garvey Clubs, Ethiopian Clubs e afins, e a animosidade entre os dois
grupos nos Estados Unidos ocasionalmente levava à violência.

O ano de 1929 marcou, também, a incursão mais direta de Garvey na políti-


ca eleitoral jamaicana. Entre a convenção e o fim do ano em que formou o Partido
Político do Povo (PPP), começou a fazer campanha um assento no conselho legisla-
tivo, foi preso por três meses por desacato por juízes britânicos quando prometeu
reformar a bancada se eleito, e foi eleito para o conselho da Kingston and St. An-
drew Corporation (KSAC) enquanto na cadeia. Após sua libertação, a corporação
prontamente declarou sua sede vago, mas foi devolvido sem oposição no início de
1930. Enquanto isso, os Juízes britânicos o condenaram novamente, desta vez por
supostamente calúnia colonialismo britânico em um editorial em seu jornal
Blackman.
A candidatura de Garvey para o conselho legislativo foi derrotada em janei-
ro de 1930, em grande parte porque a maioria das massas negras ainda não tinha
direito de voto pelo colonialismo britânico. Seu PPP, no entanto, colocou com êxito
alguns candidatos tanto no KSAC quanto no conselho legislativo. O próprio Garvey
continuou a servir no conselho do KSAC pelos próximos anos, em uma ocasião
(1931) sendo reeleito fora do país. Durante este período, Garvey ocasionalmente
atuava como um líder sindical de fato, assumindo causas de trabalhadores não-
organizados.

Em 1931, Garvey fez mais uma viagem à Inglaterra e à Liga dos Nações. De
volta à Jamaica, ele continuou a realizar reuniões políticas, formou uma empresa
no ramo de entretenimento e se aventurou em imóveis. Uma Seventh International
Convention foi realizada na Jamaica em 1934, seguida alguns meses depois por
uma mudança de sua base de operações para a Inglaterra.³⁴

Na Inglaterra, Garvey entrou em contato com estudantes africanos, e discur-


sava para a multidão no Speakers' Corner do Hyde Park, e conseguiu manter juntas
aquelas divisões da UNIA que sobreviveram à depressão, os ismos que seguiram
sua deportação dos Estados Unidos, e as incursões de antigos seguidores (especi-
almente nos Estados Unidos) feitos pelo Pai Divino, Muçulmanos, o Peace Move-
ment of Ethiopia, os comunistas e diversos outros grupos.

Sua organização nos Estados Unidos permaneceu viável e, em 1936, 1937 e


1938 Garvey visitara o Canadá para se encontrar com seus seguidores norte-
americanos, que nestas ocasiões atravessavam a fronteira em grande número e
iam, entre outros afazeres, frequentar a Garvey’s School of African Philosophy, que
fornecia cursos intensivos para os organizadores da UNIA. Depois de sua visita ao
Canadá em 1937, ele viajou pelas Índias Ocidentais, falando com públicos entusi-
asmados de São Cristóvão, Nevis, Antígua, Montserrat, Dominica, Santa Lúcia, São
Vicente, Granada, Barbados, Trinidad e Guiana Britânica. Durante sua visita de
1938 ao Canadá, ele realizou sua Eighth International Convention in Toronto de 1 a
17 de Agosto.³⁵

Apesar de sua deportação e apesar da crescente fragmentação da sua ade-


são, suas ideias continuaram a dominar entre as massas negras na América com
notável tenacidade. Por um lado, a fragmentação nem sempre significou uma dife-
rença de ideologia entre as várias camadas de grupos. Muitos deles, como o Peace
Movement of Ethiopia e os Moorish Americans continuaram a considerar Garvey
como um santo patrono mesmo depois de terem rompido com a UN1A.

Garvey morreu em Londres em junho de 1940, ativo em seus esforços para


emancipar sua raça até o fim.

NOTAS

1. Negro World, April 28, 1923.


2. Amy Jacques Garvey, Garvey and Garveyism (Kingston: A. J. Garvey,
1963), p. 29.
3. Amy Ashwood Garvey, “ Marcus G arvey-Prophet of Black Nationalism,”
n.d., Amy Ashwood Garvey Papers, London.
4. Garvey identified some of the leading figures in the club as S. A. G. Cox,
Alexander Dixon, H. A. L. Simpson, a Mr. DeLeon, and himself: Blackman, Septem-
ber 11, 1929;see also Jamaica Times, April 30, 1910, quoted in Rupert Lewis, “ A
Political Study of Garveyism in Jamaica and London: 1914-1940” (Masters thesis,
University of the West Indies, 1971), p. S3. A contemporary remembered Garvey as
one o f the most frequent speakers at the club’s weekly meetings. His speeches
were usually antigovernment. See R. N. Murray, ed., J. J. Mills-His Own Account o f
His Life and Times (Kingston: Collins and Sangster, 1969).
5. Interview with Mr. J. Charles Zampty, Highland Park, Michigan, April 17,
1973.
6. The Jamaica Times o f November 13, 1915, quotes Garvey assaying that
he had traveled in “ America, North and Central, Europe and parts of the West In-
dies.” Another source claimed that Garvey first visited the United States in 1911. F.
A. McKenzie, “ Is There a Black Peril?” Overseas 6 (April 1921): 43. If the Jamaica
Times article is correct and the Overseas one wrong, a further possibility may be
an intransit stop on his way to or from England.
7. Negro World, September 10, 1921.
8. He claimed to have spent eighteen months here. Negro World, June 19,
1920.
9. Public Record Office, London, Colonial Office records, G/27424, Register
of Correspondence for Jamaica, destroyed file, letter from M. Garvey, July 8, 1913;
ibid., Misc/19729, May 28, 1914, “ Repatriation of M. Garvey,” destroyed file, June
9, 1914; ibid., destroyed file, June 19, 1914. In the case of all these destroyed files,
the actual correspondence has been destroyed but a synopsis of their contents re-
mains.
10. Amy Ashwood Garvey, “ Prophet,” p. 54.
11. Negro World, September 10, 1921.
12. Marcus Garvey, Jr., A Talk With Afro-West Indians-T he Negro Race and
Its Problems (Kingston (? ]: African Communities League, 1915 (? )), p. 1.
13. Amy Ashwood Garvey, “Prophet,” p. 41.
14. Amy Jacques Garvey, ed., The Philosophy and Opinions o f Marcus Gar-
vey (London: Frank Cass, 1967), II: 127.
15. Amy Ashwood Garvey, “ Prophet,” p. 60.
16. Jamaica Times, November 13, 1915.
17. Garvey to Moton, February 29, 1916, in Daniel T. Williams, Eight Negro
Bibliographies (New York: Kraus Reprint Co., 1970).
18. Africa Times and Orient Review 1 (April 1914): 77-78.
19. Negro World. April 8, 1922.
20. Emancipator, March 27, 1920. The meeting was held at St. Mark’s Hall,
West 138 Street, New York.
21. Marcus Garvey, Conspiracy o f the East St. Louis Riots (New York: UNIA,
1917).
22. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 129, and Garvey and Garveyism,
p.25
23. Amy Ashwood Garvey, “ Prophet,” pp. 111-113.
24. Ida B. Wells, Crusade fo r Justice-T he Autobiography of Ida B. Wells, ed.
Alfreda M. Duster (Chicago: University of Chicago Press, 1970), p. 381; Garvey, “
Prophet,” pp. 114-116.
25. Crisis 21 (December 1920): 60.
26. Messenger (August 1922): 470.
27. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 129.
28. Tony Martin, “ Revolutionary Upheaval in Trinidad, 1919,” Journal of
Negro History 58 (July 1973): 313-326.
29. Negro World, August 20, 1921.
30. Evening World, June 29, 1923.
31. Negro World, March 27, 1926.
32. Branches included divisions and chapters. A chapter designated a
branch in an area that already contained a division. Chapters were kept to a mini-
mum and could only be formed with the consent of the existing division.
33. Negro World, August 21, 1926. White New York papers (the Herald,
Tribune, and Journal) estimated 100,000 in their August 16 edition.
34. For the Jamaica period, see Garvey, Garvey and Garveyism, chaps. 33-35
35. The Black Man is the best source of information for this period.
2
Raça Primeiro
e Autoconfiança

Em um mundo de lobos, deve-se andar armado, e uma das mais poderosas


armas de defesa ao alcance dos negros é a prática da raça em primeiro lugar,
em todas as partes do mundo.

– Marcus Garvey¹

O que acreditamos

A Universal Negro Improvement Association defende a unidade e inte-


gração de todos os negros em uma raça forte e saudável.
É contra a miscigenação e o suicídio racial.
Acredita que a raça negra é tão boa quanto qualquer outra, e deve ser
tão orgulhoso de si mesmo quanto os outros.
Acredita na pureza da raça negra e na pureza da raça branca.
É contra negros ricos se casando com brancos pobres.
É contra brancos ricos ou pobres se aproveitando de mulheres negras.
Acredita na Paternidade Espiritual de Deus e na Fraternidade do Ho-
mem.

– Marcus Garvey²

Marcus Garvey, ao contrário de seus principais rivais nos Estados Unidos,


construiu uma organização em massa, que foi além da mera agitação e protesto dos
direitos civis, baseava-se num programa objetivo e articulado, que ele acreditava
poder levar à total emancipação do domínio da raça branca.
Central à base ideológica que sustentava o programa de Garvey, era a ques-
tão da raça. Para Garvey, o Negro era universalmente oprimido por motivos raciais,
e qualquer programa de emancipação teria que ser construído em torno da ques-
tão da raça primeiro. A raça torna-se então uma “entidade política” que teria que
ser resgatada.³ Os rivais contra-argumentavam dizendo que a humanidade, e não a
raça negra em especial, é que deve ser o objeto de seu atenção, ele argumentava
que não foi a “humanidade” que foi linchada, queimada, proibida e segregada, mas
sim o Povo Preto.⁴ A primazia do caráter racial caracterizara a UNIA desde seu
início na Jamaica⁵ e em 1919, funcionários do governo dos Estados Unidos esta-
vam alertando a sociedade sobre o que, consideravam, ser esta doutrina subversi-
va. ⁶
Garvey dedicou-se à tarefa de converter as deficiências da raça em ferra-
mentas positivas de libertação com uma agressividade assertiva. “Nenhum homem
pode convencer-me contrariamente à minha crença”, declarou ele, “porque minha
crença é fundada sobre uma experiência difícil e horrível, não uma experiência
pessoal, mas uma experiência racial. O mundo fez de ser negro um crime, e eu senti
isso em comum com homens que sofrem como eu, e ao invés de tornar isto um
crime, espero torná-lhe uma virtude.”⁷ Do mesmo modo, a consciência apurada dos
seguidores de Garvey estava saturada com a nova doutrina. Bonecas Pretas eram
fabricadas para crianças negras; o jornal de Garvey chamara-se o Negro World, ele
encorajava seus seguidores a apoiarem empresários e profissionais negros; o cate-
cismo racial usado por seus seguidores desiludiram as mentes dos negros sobre as
alegações do mito Camítico, explicando que, ao contrário desse mito, os Negros
“certamente que não” foram os destinatários de qualquer maldição bíblica; se fran-
zia à propagandas de natureza racialmente degradante,⁸ o Negro World patrocina-
va concursos de beleza e publicava fotos de belas negras mulheres, assunto sobre o
qual Garvey tornara-se poético – “Rainha negra da beleza, deste cor ao mundo.”⁹
De fato, praticamente todos os aspectos da organização foi projetado para reforçar
a autoestima do homem negro e promover o orgulho de si mesmo.

O conceito de raça no pensamento de Garvey estava associado a um profun-


do pessimismo em relação ao futuro do homem Negro na América. Ele acreditava
que o homem Negro, com oportunidades educacionais cada vez mais amplas, aspi-
raria à posições de influência, o que o colocaria em competição direta com a estru-
tura do poder branco. Dentro de cinquenta a cem anos, ele previa, tal disputa leva-
ria a um confronto racial que terminaria desastrosamente mal para a raça negra.

Esta análise levou Garvey inevitavelmente à direção da separação racial.


Seus empreendimentos econômicos nos Estados Unidos representaram uma inves-
tida em direção a um núcleo de sociedade negra auto-sustentável (e, portanto, au-
to-empregada) na América. Mas seu olhar apontava mais ansiosamente para a
África como a salvação do Africano no exterior. E mesmo na África, porém, ele en-
contrara os senhores europeus tentando semear sementes de futuras discórdias,
como em 1938, quando ele protestou contra a consideração britânica de uma pro-
posta para reassentar judeus europeus na Tanganyika, Quênia ou Guiana Britâni-
ca.¹⁰
A preocupação de Garvey com a salvação da raça o levou a duras críticas e
sobre quaisquer fraquezas que ele via entre os negros, não havia nada que o desa-
gradasse mais do que o negro que não pensava em termos raciais. Tal crítica trou-
xe à tona o melhor de suas provocações – “Sim, este é um ‘Tio Tom, Negro’. Sim, um
‘sim, patrão, Negro’ – ‘Supimpa! Negro – um ‘Sim tá supimpa, Charlie, Negro’” Um
Negro que ficará satisfeito em enegrecer os sapatos de um homem branco todos os
dias de sua vida e lamber o cuspe do homem branco se ele ordenar que o faça. ¹¹

A doutrina da raça em primeiro lugar de Garvey encontrou excelente ex-


pressão em sua consciência sobre o papel da cultura como instrumento de liberta-
ção. Ele mesmo foi um prolífico poeta da libertação.¹² De fato, seus poemas são
uma boa fonte de sua ideologia como qualquer outra. Eles estavam repletos de te-
mas como a beleza da mulher negra, a necessidade de autoconfiança, as glórias da
história, a necessidade de acabar com a participação negra nas guerras brancas, e
protestos contra a invasão italiana da Etiópia. Esta experimentação com as artes
para fins de politização dos membros da UNIA também fora favorecido por um dos
associados mais próximos de Garvey, John Edward Bruce. Uma peça de Bruce, Pre-
aching vs. Practice, expressou a hostilidade de Garvey em relação a pregadores
negros inescrupulosos. Outra, Which One, forneceu um excelente exemplo do uso
deste meio para a educação política. Os personagens principais eram um Senne-
bundo Ajai, um diplomata africano da UNIA, e três jovens, uma da Martinica, das
Índias Ocidentais Britânicas e outra da Afro-America, todas apaixonadas pelo he-
rói, que estava partindo para a Nigéria em negócios organizacionais da UNIA. Entre
as escapadas românticas, o público era presenteado com monólogos exaltando as
virtudes da UNIA. O cenário era livremente decorado com o vermelho, preto e ver-
de da UNIA, e o herói e a dama de sua escolha eventualmente anunciariam sua in-
tenção de se casar em um Liberty Hall na África.¹³

O próprio Garvey se entregou à escrita de peças políticas. Sua obra “The


Coronation ol the African King” fora realizada em sua sede, Edelweis Park na Ja-
maica, em 1930. A peça de três atos incluiu cenas em Nova York, Washington, Pa-
ris, Londres, Índias Ocidentais, Ashanti, Dahomey, Senegal e Sudão. Uma cena mos-
trava o primeiro-ministro francês e o primeiro-ministro britânico David Lloyd Ge-
orge conferenciando sobre a penetração da UNIA na África. Noutra, vozes negras
davam vida à oratória emocionante frente à cortina de fundo de libertadores afri-
canos envolvidos em uma luta sangrenta contra invasores franceses no Sudão. To-
da a peça fora concebida como uma dramatização dos resultados da propaganda
da UNIA desde 1918.¹⁴

Tal atividade cultural foi amplamente praticada em toda a UNIA.A divisão


dominicana tinha um clube literário. As Black Cross Nurses de Norfolk, Virgínia, em
1922 encenaram a “African Convention”, uma peça que "repleta de orgulho racial, e
encenada para entusiasmar o público sobre os objetivos da U.N.I.A. e A. C. L.” Em
Newport News, Virgínia, mais ou menos durante o mesmo período, as Juvenile
Black Cross Nurses e os Escoteiros fizeram uma pequena peça, “Coming Home to
Africa”. Em Nova York, o UNIA Dramatic Club apresentou "o grande drama da raça,
Tallaboo'", projetado para "Interpretar as ideias desta grande Associação.”¹⁵ A filial
da Filadélfia patrocinou The New Negro, descrito como “Um genuíno melodrama
negro”. O Negro World comentou sobre a peça: “O antigo arquétipo do Tio Sam é
mostrado como um servo do Honorárvel Marcus Garvey, enquanto o novo negro
enfrenta homem a homem à luz de Marcus Garvey, exigindo uma ruptura de igual-
dade com outras raças.” ¹⁶

O auge de Garvey na década de 20 coincidiu com a literatura Afro-


Americana em eferverscência, conhecida como o movimento Harlem Renaissance.
Devido, justamente, à consciência racial e Africana pela qual o próprio Garvey foi
em grande parte responsável. De fato, muito dos artistas mais importantes deste
Renascimento eram membros da UNIA. Claude McKay era um apoiador de Garvey
e um colaborador regular do Negro World em seu período inicial; Eric Walrond
fora editor do Negro World; e Zora Neale Hurston, colunista do jornal. Os leitores
do Negro World eram deleitados com excelentes resenhas de livros de editores
como William H. Ferris, Eric Walrond e Hubert H. Harrison.

No entanto, Garvey não podia aceitar acriticamente o exotismo e o exagero


de Negritude que por vezes caracterizava os escritores da época. Ele, portanto, jun-
tou-se ao coro de críticas contra Home to Harlem, de Claude McKay. Escrevendo da
França, ele desaprovava veementemente os escritores Negros que estavam “prosti-
tuindo sua inteligência, sob a direção de um cara branco, para trazer à tona e mos-
trar os piores traços do nosso povo... ” Ele considerou o livro de McKay como “uma
calúnia deplorável contra o Negro” e postulou sua concepção do tipo de artista que
a raça precisava: “Devemos incentivar nossos próprios autores Negros que têm
caráter, que são leais a sua raça, que se orgulham em serem Negros, e que de todas
as formas sintam que seus esforços são apreciados em avançarem nossa raça atra-
vés de uma literatura saudável e decente”. ¹⁷

O Negro World, na mesma linha, repreendeu Countee Cullen, outro ilumina-


do pelo Renascimento do Harlem. O jornal lamentou o fato de que um graduado de
Harvard poderia exagerar a ideia de Negritude ao ponto de escrever:

Ainda não têm, meu coração ou cabeça

Minimamente percebido

Que ele e eu somos civilizados.¹⁸

Durante as convenções internacionais da UNIA em Nova York e Jamaica, um


oficial foi recomendado como censor literário que protegeria os negros de material
desfavorável à raça.¹⁹
Durante a segunda metade da década de 1930, Garvey concentrou cada vez
mais sua atenção em Paul Robeson, o principal ator de cinema negro da época.
Garvey prestou devida homenagem à habilidade artística de Robeson, mas não co-
mo o espetáculo de personalidade dramática negra mais importante do tempo,
escalada para uma série de papéis calculados para rebaixar os Negros. Robeson foi
relacionado em 1929 para ser a estrela de uma sátira sobre a carreira de Garvey,
escrito por dois autores, Wallace Thurman e Willard Rapp, conhecidos pelo sensa-
cionalismo do lado mais sórdido do Harlem. Se isso teve algo a ver com a atitude de
Garvey não está claro. A peça seria intitulada Jeremiah, The Great.²⁰ De qualquer
forma, em 1935 Garvey encontrava-se denunciando as aparições de Robeson em
tão conhecidos palcos e filmes de produções como Emperor Jones, Sanders of the
River e Stevedore. Os leitores da revista Black Man, de Garvey, foram informados
de que “Paul Robeson, o ator Negro, trocou Londres por Hollywood. E lá se foi, para
fazer outra imagem caluniosa contra o negro”. O argumento foi feito, de que em
tempos passados, qualquer homem negro que conseguisse adentrar em círculos
brancos, era automaticamente idolatrado. Esse dia não deveria existir mais. A es-
perança foi expressa na ideia de que Robeson estava agora ganhando dinheiro su-
ficiente para que “quando ele se aposentasse do palco, ele possa ser capaz de har-
monizar sua consciência com a raça fazendo algo de bom por ela.”²¹ Em 1937, Gar-
vey protestou junto à British Broadcasting Corporation contra programas antine-
gros e ao British Moving Picture Board contra os filmes de Robeson, enquanto em
1939, um ano antes de sua morte, ele efetivamente publicara um panfleto crítico
direcionado aos filmes de Robeson.²² Robeson se retirou de Hollywood no mesmo
ano, pelas mesmas razões contidas nas críticas de Garvey.²³

A preocupação de Garvey com as implicações raciais da cultura abraçou


também vaudeville (o UNIA possuía duas empresas de teatro na Jamaica), vários
coros e bandas da UNIA (como o Universal Jazz Hounds of Jamaica UNIA), e espor-
tes, onde Garvey expressou grande interesse nos duelos entre Joe Louis e Max
Schmeling no final da década de 1930. Excelente talento negro em qualquer campo
sempre foi bem-vindo no Liberty Hall. O Dia da Mulher na Convenção de 1922 con-
tara com Marian Anderson da Filadélfia, anunciada como “a maior solista-contralto
da América”.

A doutrina da raça primeiro de Garvey foi duramente testada pela presença,


dentro da raça, de um grande número de pessoas de origem mista, Africana e Cau-
casiana. Ele assumiu a posição de que “há mais amargura entre nós negros devido
à casta da cor, do que existe entre quaisquer outros povos, não excluindo o povo da
Índia.”²⁴ Ele até afirmou que o preconceito dentro da raça provavelmente excede
àquele dirigido contra à raça, por raças alienígenas.²⁵ Essa posição levou Garvey a
sérios conflitos ideológicos com líderes da classe média dos Estados Unidos e das
Índias Ocidentais (Caribe), muitos dos quais eram, eles próprios, de tonalidade
mais clara. Tal oposição foi particularmente hostil nos Estados Unidos, onde líde-
res integracionistas, como W. E. B. Du Bois, argumentara que este problema ou não
existia ou era relativamente menor nos Estados Unidos. Ao que Garvey, por causa
de sua origem caribenha, estava projetando erroneamente esta característica da
ilha na sociedade, numa realidade Afro-Americana que ele não entendia.

Garvey realmente saíra de uma sociedade das Índias Ocidentais, embruteci-


da por um sistema hostil de três camadas de estratificação social, branco-pardo-
negro, e ele próprio discutia regularmente a questão desde 1913.²⁶ Seu diário ja-
maicano, o Blackman, publicou em 1929:

Algumas pessoas estão com medo, algumas irritadas e outras enojadas por-
que nós, como eles dizem,

LEVANTAMOS A QUESTÃO DE COR

A questão foi levantada há muito tempo e colocada como operação vingati-


va. A questão de cor é a única razão pela qual não podemos encontrar uma menina
ou menino negro numa loja ou escritório desta cidade quando temos a certeza de
que os mais inteligentes entre eles. . . foram recusados em lugares cheios de meni-
nas e meninos pardos e mulatos semi-analfabetos, inibindo suas atitudes como se
fossem superiores em comportamento...

Ainda haverá um jogo justo neste país. “O Homem Preto” está a serviço e em
breve irá enegrecer algumas dessas lojas e escritórios de forma descomunal.²⁷

Como sugere o editorial, mesmo na Jamaica, onde as distinções de cor e cas-


ta eram profundas, a tendência da classe parda era negar sua existência, assim co-
mo Du Bois e os integracionistas Afro-Americanos fizeram. Garvey porém, fora im-
placável em suas tentativas de trazer esta questão à tona. “Este grito hipócrita de
‘Paz, Paz’, quando não há Paz é danoso para a paz e harmonia da sociedade”, decla-
rava.
Negamos a existência de uma condição que é tecida na aberração e trama da
nossa vida social e pública. Nós nos recusamos a admitir a presença de uma carac-
terística em nossa vida nacional, os resultados impraticáveis, cujos esforços insidi-
osos causam atraso, irritação e aborrecimento. Nós deliramos, proibimos, amea-
çamos aqueles que se atrevem a se referir ao evidente, aos fatos patenteados e seus
resultados gritantes. Enquanto toda terra é fermentada e permeada pelos males da
distinção de cores e clamamos por harmonia e paz! Somos, para usar uma frase
vulgar, um monte de trapaças. Somos desonestos, imorais, mentirosos hipócritas.²⁸

Este tipo de ataque ao privilégio enraizado, trouxe a Garvey uma ameaça de


morte por uma autodenominada “Jamaican Secret Society of Colored Men”, que o
considerava um “suíno negro”. ²⁹

Também na Afro-América, Garvey observou uma preferência entre os em-


pregadores para pessoas de pele clara como balconistas, garçonetes, etc., e jornais
cheios de anúncios de clareadores de pele, muitas vezes redigidos na linguagem
mais grosseira possível. Somado a isso, descobriu em Nova York, Boston, Washing-
ton e Detroit, a Blue Vein Society e o Colonial Club. "Os 'luzes' das Índias Ocidentais
formavam o 'Clube Colonial' e as 'luzes' americanas, a Sociedade 'Blue Vein'.³⁰ Es-
sas ações se estendiam às igrejas. Parecia então que Garvey, como um de seus
apoiadores apontou, não “apelou” ao preconceito de cor intrarracial nos Estados
Unidos, mas sim, “o revelou”.³¹

Apesar das semelhanças, é claro, a situação na América, onde o maioria não


precisava do suporte do “elemento tapa-buraco mulato” na mesma medida que a
minoria branca nas ilhas, até que não fora tão grave como as Índias Ocidentais.
Garvey tinha plena consciência disso. A situação na América era grave o suficiente
para justificar a exposição e o ataque, mas nas Índias Ocidentais, havia uma estru-
tura de casta rígida. O próprio Garvey identificou essa diferença melhor do que
qualquer um de seus críticos:

No termo “Negro” incluímos todas aquelas pessoas que o homem branco


americano inclui nesta denominação de desprezo e ódio...
O conteúdo do termo se reduz muito na Jamaica e nas Índias Ocidentais,
mas não traz menos reprovação contra as pessoas...

A grande maldição da nossa vida comunitária na Jamaica é o fracasso da


população híbrida em realizar sua identificação natural e correta...³²

Assim, enquanto a UNIA nos Estados Unidos estava entre suas fileiras pes-
soas de todas as cores, excluindo brancos, empresários e profissionais do ramo,
somados à grande massa de trabalhadores e camponeses, na Jamaica foi em grande
parte confinada às “seções mais humildes” da humanidade. Isso levou Garvey a
provocar que “Deus parece salvar de baixo para cima”. ³³

A experiência de Garvey com o elemento pele clara, tanto nas Índias Ociden-
tais como na América, o levou a ser hostil com aqueles que pareciam diminuir for-
ma arrogante de tratar o que ele abominava. Isso o levou, também, a considerar
miscigenação como um mal que não deve ser perpetuado - “Nós somos conscientes
do fato de que a escravidão trouxe sobre nós a maldição de tantas cores dentro de
nossa Raça, mas não é por isso que nós mesmos devamos perpetuar este mal... .” ³⁴
A doutrina de Raça Primeiro tivera inúmeras implicações para a atitude de
Garvey para com os brancos. Significava antes de tudo a exclusão dos brancos co-
mo membros da UNIA e organizações afiliadas. Brancos também foram impedidos
de deter participações nas empresas econômicas de Garvey. Seu desejo de constru-
ir uma autoconfiança racial o levou logicamente à rejeição da filantropia financeira
branca. Em resposta a uma sugestão de um repórter branco, em 1921, sobre “cer-
tos negrófilos de Massachusetts” possam querer contribuir para UNIA; Garvey res-
pondeu: “Nós não queremos dinheiro deles; este é um movimento de homens ne-
gros”. ³⁵

Raça Primeiro significava, no entanto, não apenas raça em primeiro lugar


para os negros, mas para outras raças também. No que dizia respeito a Garvey, os
brancos vindos de qualquer persuasão política, colocava a raça acima de todas as
outras considerações. Assim, ele muitas vezes preferia uma expressão honesta de
racismo à sorrisos possivelmente transparentes do filantropo. Ele olhava para a
honesta expressão do racismo como uma bênção disfarçada, pois forçava o negro a
admitir uma consciência racial, enquanto a camuflagem poderia iludi-lo em uma
sensação de falsa segurança. Comentando em 1917 sobre os grandes avanços que
os Afro-Americanos deram na educação racial libertária, escreveu: “O preconceito
honesto do Sul foi bastante evidente para dar ao Negro da América o verdadeiro
começo – o início, com uma consciência de raça, que estou convencido que seja o
responsável pelo estado de desenvolvimento já alcançado pela raça”.³⁶ Assim ele
poderia dizer: “Nós temos que admirar o homem branco que alterou a Bíblia para
adequá-la a si próprio, e que até fixou a própria tradição, dizendo-nos que tudo que
vale a pena e é belo foi feito pelo homem branco; que Deus é um grande homem
branco, que Jesus era um homem branco, e que os anjos, etc., sejam eles quais fo-
rem, são tão bonitos quanto pêssegos na Geórgia”. ³⁷

Da mesma forma, no entanto, ele via o interesse próprio do branco como


amplamente prejudicial ao interesse próprio do negro. E dentro dos limites de um
país como os Estados Unidos, onde os brancos formaram uma grande maioria do-
minante, o interesse racial branco tenderia inexoravelmente para o extermínio de
a minoria negra. Essas considerações fortaleceram o compromisso de Garvey com
a separação racial.

Apesar do fato de que Garvey não aceitar a filantropia branca ou permitir


que brancos se juntassem à sua organização, isso não significava que ele não pu-
desse trabalhar até certo ponto com pessoas brancas. De fato, ao manter uma base
preta de poder sólida, ele tinha mais liberdade para apoiar diferentes pessoas e
organizações brancas em projetos específicos, do que alguns de seus contemporâ-
neos, que ficavam de mãos atadas em organizações inter-raciais.

A primeira categoria de brancos com quem Garvey poderia cooperar eram


certos tipos de radicais, geralmente aqueles engajados em atividades anticoloniais,
lutas anti-imperialistas ou antirracistas. Muitas vezes eles eram líderes de movi-
mentos de massa como o seu, e ele poderia identificá-los como almas gêmeas de si
próprio. Dentre pessoas nesta categoria, foram Eamon De Valera, o líder irlandês,
que em certa ocasião foi listado como palestrante de destaque no Harlem Liberty
Hall, de Garvey³⁸, bem como os revolucionários russos Lenin e Trotsky. Ele muitas
vezes dava boas referências para figuras históricas como John Brown, Elijah Love-
joy, e outros de inclinação abolicionista.³⁹ Ele também tinha grande admiração por
Capitão A. A. Cipriani, líder branco do Trinidad’s Workingmen Association (TWA),
cuja carreira pública em grande parte coincidiu com a de Garvey em momento e
visão política. Cipriani tornou-se chefe da TWA em 1919 a convite dos membros,
que eram negros. Por esta altura a associação já havia se tornado um reduto gar-
veyísta em Trinidad, e suas lutas estavam sendo relatadas no Negro World. Muitas
de suas reuniões foram realizadas no Liberty Hall de Port-of-Spain e seu segundo
em comando, W. Howard Bishop, assim como outros membros de sua autarquia
eram Garveyístas. Garvey correspondia com Cipriani, que emitiu pronunciamentos
ao governo britânico em 1937 para mudar sua intenção de barrar Garvey de entrar
na ilha.⁴⁰ Outro conhecido radical por quem Garvey parecia ter algum respeito era
Nancy Cunard, filha renegada de uma rica família naval que envolveu-se em uma
variedade de causas negras. Em 1932, Cunard visitou a Jamaica com objetivo de
reunir material para sua Negro Antology, e foi convidada para uma recepção orga-
nizada por Garvey.⁴¹

Se Garvey pudesse se associar a alguns brancos radicais da esquerda por


sua postura anti-imperialista ou reputação como líderes das massas, também po-
deria associar-se, por diferentes razões, à segregacionistas na extrema-direita. Esta
última razão, compartilhavam um princípio ideológico crucial com Garvey: eles
também acreditavam primeiro na raça e, portanto, na separação das raças.

Apesar dos acordos limitados de Garvey com alguns brancos, o insistente


impulso nacionalista negro da UNIA sempre assegurava, no entanto a hostilidade à
maioria dos brancos. Uma senhora branca que testemunhava um desfile da UNIA
na 125 Street, Manhattan, em 1920, exclamou em lágrimas: “E pensar que os ne-
gros terão sua liberdade antes dos irlandeses.”⁴²

A doutrina da raça em primeiro lugar de Garvey era essencialmente um es-


tratagema para garantir a autoconfiança e igualdade para a oprimida raça Africana.
Ao contrário dos brancos que pregavam esta doutrina, com quem colaborara, ele
não foi um deu um passo a frente para pregar sobre superioridade racial. Ele mais
de uma vez enfatizou que “toda beleza, virtude e bondade são atributos exclusivos
de nenhuma raça. Toda a humanidade tem seus defeitos; portanto, nenhuma decla-
ração minha, a qualquer momento, deve ser interpretada como um elogio indis-
criminado, ou ataque a qualquer raça, povo ou credo.”⁴³
A autoconfiança é essencial para a Raça em Primeiro lugar. Em seu primeiro
panfleto que Garvey explicou, mostrando os pormenores da provável influência de
Booker T. Washington, de que “o negro é ignorado hoje simplesmente porque ele
se manteve para trás; mas se ele tentasse se reciclar para um estado superior no
cosmos civilizado, todas as outras raças teriam prazer em conhecê-lo no plano da
igualdade e camaradagem.” Ele seguiu em expressar a ideia que mais tarde lhe
causaria muita inimizade entre Integracionistas Afro-Americanos: “É de fato injus-
to exigir igualdade, quando nada se faz para estabelecer o direito à igualdade”.⁴⁴
Garvey nunca abandonou essa tendência de tanto demarcar a raça branca sobre
sua injustiça, ao mesmo tempo que utiliza a linguagem condenatória para estimu-
lar a raça Negra à uma maior autoconfiança.
A crença de Garvey na necessidade de autoconfiança o levou ocasionalmen-
te a falar na linguagem do darwinismo social. Ele atacou o os peudo-cientistas ra-
cistas que tentaram justificar o genocídio contra os negros em termos da darwinis-
ta “sobrevivência do mais apto”, transformando seu argumento numa causa de au-
toconfiança racial. “Filósofos brancos”, argumentava, “Darwin, Locke, Newton e o
resto... esqueceram que o macaco ia se transformar em homem, que sua cauda cai-
ria e ele exigiria seu pedaço.”⁴⁵ E não apenas esses filósofos se enganaram, mas o
heroísmo negro na Primeira Guerra Mundial finalmente desmentiu essas falsas
suposições. Ele lembrou seu público negro de que “essa teoria foi bombardeada na
guerra mundial. Foi você, o super-homem, que trouxe a vitória pra casa no Mar-
ne.”⁴⁶

A urgência que Garvey sentia pela independência racial e autoconfiança o


levou a argumentar que no esforço autônomo, independente estava a única espe-
rança de uma eventual solução para o problema do preconceito racial. A raça bran-
ca cessa sua agressividade em relação ao preto quando é recebida pelo Preto inde-
pendente, em potência de magnitude igual à sua. O racismo branco se manifesta
“não porque haja diferença entre nós na religião ou na cor, mas porque há uma
diferença entre nós no poder.” ⁴⁷

Além disso, Garvey acreditava que o homem Negro tinha poucas opções na
questão. Se ele não seguisse em frente, estimulado por seus próprios esforços, en-
tão ele sucumbiria na escravidão e até o extermínio. “Os dias da escravidão não se
foram para sempre”, lembrava aos seguidores. “A escravidão é uma ameaça para
todas as raças e nações que permanecem fracas e se recusam a organizar suas for-
ças para sua própria proteção”.⁴⁸

A área mais importante para a prática do esforços independentes foi a eco-


nômica. Garvey acreditava, como Washington antes dele, que a economia era pri-
mária. Uma ação política bem-sucedida só poderia se basear numa base econômica
independente. “Depois que um povo estabelecera com sucesso uma base industrial
firme”, escreveu, “eles naturalmente se voltam para a política e sociedade, mas não
primeiro à sociedade e à política, porque as duas últimas não pode existir sem a
primeira.”⁴⁹ Com meses de sua chegada aos Estados Unidos em 1916, Garvey já
avaliava, com aprovação, os esforços dos Afro-Americanos no campo econômico.
Neste período inicial, antes de tomar sua decisão de permanecer nos Estados Uni-
dos, ele escreveu, numa veia de implicações proféticas para sua própria carreira,
"O apogeu do empreendimento Negro americano ainda não foi alcançado. Ainda
um longo caminho a percorrer. Vocês querem mais lojas, mais bancos e maiores
empreendimentos. Espero que a sua poderosa imprensa negra e o elemento cons-
ciente entre seus líderes continuem a inspirá-los a alcançarem” ⁵⁰

Esse desejo de autossuficiência econômica dominou o pensamento de Gar-


vey. O fato do negro ser um consumidor e não um produtor o preocupava. “Deixe
que Edison desligue sua luz elétrica e estaremos na escuridão do Liberty Hall em
dois minutos”, ele disse uma vez, “O Negro está vivendo de bens emprestados.” ⁵¹

Garvey realizara uma tentativa corajosa em mudar o estado destas coisas.


Entre 1918 e início da década de 1920, de dentro da sede de Garvey na cidade de
Nova York brotou uma grande variedade de negócios UNIA. A Black Star Line foi
incorporada em 1919. A Negro Factories Corporation seguiu não muito depois. Sob
sua égide surgiram as Universal Launderies (lavanderia), a Universal Millinery Sto-
re (chapelaria), Universal Restaurants (restaurante), Universal Grocery Stores (re-
de de supermercados), além de hoteis, alfaiataria, fábrica de bonecas e imprensa e
estamparia. Além disso, a UNIA em Nova York tinha, na primeira metade de 1920,
adquirido três prédios, um lote e dois caminhões, e seu órgão, o Negro World, já
estava bem estabelecido. Em 1920, também, Garvey estava até contemplando um
grande banco.⁵² Em 1920, mais de trezentas pessoas estavam empregadas pela
UNIA e suas corporações aliadas no Estados Unidos, e entre 1920 e 1924 a UNIA e
funcionários aliados ocasionalmente ultrapassavam a casa dos mil, apenas nos Es-
tados Unidos.⁵³

A luta pela autoconfiança é bem ilustrada pelo status do Negro Factory Cor-
poration em meados de 1922. Haviam três mercearias. A compra cooperativa para
todas as lojas e restaurantes fora realizada por um só gerente, mantendo assim os
preços competitivos com os empreendimentos brancos, que proliferaram no Har-
lem. Na Universal Grocery Store nº 1 (47 West 135 Street), o gerente relatou uma
minoria de clientes brancos. Na Grocery Store nº 2 (646 Lenox Avenue, entre as
ruas 142 e 143) foi relatado que estava indo bem, apesar de cercada por concor-
rência branca. A Loja nº 3, na 552 Lenox Avenue e 138 Street, foi dito ser a mais
florescente das três. Incluía mercado de aves, peixe e carne, considerado o único
desse tipo no Harlem. Além de também ostentar o primeiro açougueiro Negro no
Harlem. As mercearias apresentavam tais alimentos, como inhame das Índias Oci-
dentais, ervilhas, inhambus, abóboras e bananas-da-terra, além de batata-doce do
sul e melaço de cana.

O Universal Restaurant nº 1 estava situado no Liberty Hall, na 138 Street.


Sua capacidade para cinquenta pessoas estava sendo aumentada para cem. Sra.
Maria J Lawrence, quimicista de alimentos e ex-nutricionista de hospital, presidiu o
preparo dos alimentos. O Restaurante nº 2, na 75 West 135 Street, era menor e
ainda novo, enfrentando a concorrência de outros oito restaurantes no mesmo
quarteirão.

A fábrica de impressão Bee Hive da corporação na 2305 Seventh Avenue foi


descrita como realizadora da maior parte do trabalho no Harlem em impressão de
revistas.

Na 62 West 142 Street estava situada o Universal Mart of Industry, que


abrigava uma variedade de empresas. Estas incluíam o Universal Steam and Elec-
tric Laundry, que empregava ao todo dois caminhões de entregas; o Men’s Manu-
facturing Department, que fabricava os uniformes da UNIA, suas insígnias e simila-
res; bem como a Women’s Manufacturing Department and Bazaar, que fabricava os
uniformes das Black Cross Nurses, chapéus Panamá e eu outros artigos de chapela-
ria como camisas e gravatas. Planos estavam em andamento para um catálogo Uni-
versal e negócios por correspondência e, inclusive, os uniformes de enfermeiras já
estavam disponíveis por correspondência.
Presidindo a Negro Factories Corporation, àquela época empregando cerca
de setenta e cinco pessoas, estava Ulysses S. Poston, ministro UNIA das indústrias
e ex-editor do negro Contender de Detroit.⁵⁴ Devido a sua posição, Poston viu-se
chamado a agir como um consultor não-oficial de negócios do Harlem em geral.
Somente durante maio de 1922, ele portara, que o Departamento de Trabalho e
Indústrias da UNIA recebeu ao menos quarenta visitas de empresários do Harlem
com propostas de financiamento.⁵⁵

Além da matriz no Harlem, filiais locais da UNIA possuíam quantidades con-


sideráveis de propriedade e às vezes lançavam-se em empreendimentos comerci-
ais locais. O incentivo ao comércio local foi de fato um fator primordial para as em-
presas estabelecidas por Garvey no Harlem. Esses investimentos foram muitas ve-
zes bem sucedidos. Em 1927, por exemplo, após vários anos de ataques financeiros
à organização e dois anos após a prisão de Garvey, seus advogados afirmaram que
a organização ainda possuía ativos, geralmente imóveis, avaliados em USD$20.000
na Filadélfia, USD$30.000 em Pittsburgh, USD$ 50.000 em Detroit e USD$ 30.000
em Chicago, entre outros lugares.⁵⁶ Unidades locais fora dos Estados Unidos parti-
ciparam de tais atividade também. A UNIA do Colón, Panamá, por exemplo, dirigia
uma padaria de cooperativa, enquanto a filial de Kingston, Jamaica, administrava
uma lavanderia e o African Communities League Peoples Co-operative Bank, cujas
ações estavam abertas apenas para membros da UNIA.⁵⁷

Todas empresas comerciais individuais estabelecidas pelas filiais da UNIA


em todo o mundo estavam interligadas, de acordo com o grande projeto de Garvey,
em um sistema mundial de cooperação econômica Pan-Africana. Tal comunidade
comercial, quando plenamente envolvida, seria tão grande que as macro-
economias em escala geradas permitiriam que prosperassem mesmo diante de
hostilidade do resto do mundo. Garvey resumira esta ideia assim: "Produtores ne-
gros, distribuidores negros, consumidores negros! O mundo dos Negros podem ser
autônomo. Desejamos sinceramente lidar com o resto do mundo, mas se o resto do
mundo assim não deseja, nós não buscamos”. ⁵⁸ O Black Star Line (e mais tarde
Black Cross Navigation and Trading Company) seria a transportadora para este
comércio pan-africano.

As tentativas de Garvey em estabelecer a autossuficiência econômica foram


além de empresas cooperativas de negócios, colocando filiais da UNIA para atua-
rem em auxílio mútuo com sociedades amigas através de seguro e outros benefí-
cios menores aos membros. Nas áreas rurais entre as comunidades pobres, este
aspecto das operações da organização assumiram maior importância. Divisões lo-
cais também foram obrigadas a manter um fundo de caridade “para fins de ajudar
membros aflitos ou necessitados da raça”, um fundo para “empréstimos de honra”
dedicados a membros ativos e um escritório de emprego para ajudar membros que
procuram trabalho.⁵⁹

A autossuficiência econômica, especialmente no cenário americano, adqui-


riu um urgência especial para Garvey, pois ele antevia a Depressão que, pensava,
acabaria de vez com o negro na América: “O reajuste o mundo, como já disse mui-
tas vezes, trará estagnação econômica e industrial na América, que vai irá reduzir o
negro à sua última posição nesta nação.”⁶⁴
A busca da UNIA por autossuficiência levou à tentativas esporádicas em
facilidades educacionais oferecidas pela organização. A correspondência de Garvey
com Booker T. Washington e sua visita aos Estados Unidos foram ambas motivadas
pelo desejo de estabelecer na Jamaica escolas agro-industriais nos moldes do Wa-
shington’s Tuskegee Institute, no Alabama. Esse desejo de uma educação voltada
para a independência continuamente surgia. A Declaration of Rights de 1920 exigia
educação sem limites e preconceitos para Negros; membros locais da UNIA em
Port Limón (Costa Rica), Colón (Panamá), Guiana Britânica e outros lugares geri-
am escolas primárias e, às vezes, de gramática.⁶¹ Sobre uma dessas escolas em Co-
lón fora descrito, dois meses após a sua criação em 1925, como estando no nível
das linhas cooperativas (com mensalidades gratuitas para filhos de associados),
com mais de trezentas matrículas e composta por cinco caribenhos das, Índias Oci-
dentais e um professor panamenho, este último designado para satisfazer um exi-
gência do governo para um professor de língua espanhola.⁶²

Na cidade de Nova York, a associação possuía uma “Booker T. Washington


University” nos primeiros anos, e em 1926 a associação nos Estados Unidos obteve
o Smallwood-Corey Industrial Institute em Claremont, posteriormente renomeada
para Liberty University. A escola fora informada estar localizada na propriedade
adjacente ao rio James, contendo o cais onde o segundo lote de escravizados de-
sembacara na Virgínia, em 1622. Fora transferido então como posse da UNIA em
contraprestação das dívidas pendentes. No momento da transferência, o vice-
presidente da escola, J. G. Saint Clair Drake, era o organizador internacional da
UNIA, enquanto seu diretor, Caleb B. Robinson, foi membro da divisão na Filadél-
fia⁶³. Liberty University foi adquirida em meio a grandes esperanças de que se tor-
naria um veículo de sucesso para transmitir autoconfiança e orgulho racial, além
de reabilitar a história Negra.⁶⁴ A universidade, como muitas outras faculdades
Afro-Americanas da época, mantinha de fato um padrão de ensino médio, e lutava
por três anos antes de ser fechada, em 1929, devido a dificuldades financeiras. Os
alunos eram frequentemente patrocinados pelas unidades UNIA locais e eram Gar-
veyites dedicados.

Além de suas escolas formalmente organizadas, a UNIA, em toda sua sua


história organizara cursos de formação para o serviço vários setores. Durante o
período americano de Garvey, por exemplo, a organização realizou
tais programas para seus funcionários públicos, e o Mestre Educacional Ja-
mes O'Meally escreveu um guia especial para futuros oficiais da UNIA. Durante os
últimos anos de Garvey em Londres, ele organizou uma Escola de Filosofia Africana
que, por meio de cursos por correspondência e cursos intensivos ministrados pelo
próprio Garvey no Canadá, preparava trabalhadores da UNIA para desempenhar
funções na organização.
O insistente pulso da UNIA rumo a autossuficiência pode ser melhor resu-
mido nas palavras do próprio Garvey:

A Universal Negro Improvement Association ensina à nossa raça sobre au-


to-ajuda e autoconfiança, não apenas em essência, mas em todas aquelas
coisas que contribuem para a felicidade e o bem-estar humano. A disposição
de muitos em depender das outras raças para uma bondosa consideração
solidária de suas necessidades, sem fazer oesforço de fazer por si mesmos,
tem sido a desgraça permanente da raça. Pela qual fomos julgados e através
da qual criamos os mais fortes preconceitos contra nós mesmos...

A raça precisa de trabalhadores neste momento, não plagiadores, copiado-


res e meros imitadores; mas de homens e mulheres que são capazes de cri-
ar, originar e melhorar, e assim fazer uma contribuição racial autônoma pa-
ra o mundo e a civilização.⁶⁵

NOTAS

1. Negro World, July 26, 1919.


2. Ibid., January 5, 1924.
3. Black Man 2 (September-October 1936): 5.
4. Negro World, July 28, 1923.
5. A UNIA application form of 1915 required the applicant to state his color.
Enclosed in Marcus Garvey to Booker T. Washington, April 12, 1915, Box 939,
Booker T. Washington Papers, Library of Congress.
6. U.S. Post Office, Translation Bureau, to Solicitor, Post Office Department,
July 24, 1919, RG 28, Box 56, Unarranged #500, National Archives of the United
States, Records of the Post Office Department.
7. Speech at the Ward Theatre, Kingston, Jamaica, Negro World, January 7,
1928.
8. After Garvey’s imprisonment some such advertisements (e.g., for bleach-
ing creams) did appear in the Negro World, no doubt a reflection, of financial ne-
cessity; for a letter protesting this development, see Negro World, September,
1929.
9. Marcus Garvey, Selections from the Poetic Meditations o f Marcus Garvey
(New York: A. J. Garvey, 1927), p. 22.
10. Garvey to Viscount Halifax, Secretary o f State, Foreign Office November
22, 1938, FO 371/21637, Foreign Office Records, Public Record Office, London.
11. Blackman, September 3,1 9 2 9 . “Black Man " refers here to Garvey’s
monthly magazine published for the most part in England. "Blackman" refers to his
daily (subsequently weekly) paper published in Jamaica.
12. Garvey, Selections; Marcus Garvey, The Tragedy o f White Injustice (New
York: A. J. Garvey, 1927). The Black Man magazine also contains j a large num ber
of his poems.
13. Preaching vs. Practice, n.d., John E. Bruce Papers, F I 0, 8, Schomburg
Collection, New York Public Library; Which One, Bruce Papers, BD 10, D. 1. Anoth-
er Bruce creation, The Odious Comparison, was ’serialized in the Negro World; see
the July 1, 1922, edition, for example.
14. Blackman, June 21, 1930.
15. Negro World, May 13, 1922; January 28, 1922; December 17, 1921; Jan-
uary 21, 1922.
16. Negro World, July 16, 1921.
17. Ibid., September 29, 1928.
18. Ibid., January 9, 1932.
19. Ralph Bunche, “ The Programs, Ideologies, Tactics and Achievements of
Negro Betterment and Interracial Organizations,” unpublished manuscript pre-
pared for the Cargegie-Myrdal study on The Negro in America, June 7, 1940
(Schomburg Collection), p. 419;Negro World. June 7, 1924, in FO 371/9633.
20. Negro World, November 9, 1929.
21. BlackM an (late October 1935): 10-11.
22. Panama Tribune, February 14, 1937; Marcus Garvey, Grand Speech of
Hon. Marcus Garvey at Kingsway Hall, London, Denouncing the Moving Picture
Propaganda to Discredit the Negro (London: Black Man Pub. Co., 1939).
23. Paul Robeson, Jr., “Paul Robeson: Black Warrior,” Freedomways 11
(1971): 26.
24. Negro World, December 8, 1923; Amy Jacques Garvey, ed., The Philoso-
phy and Opinions o f Marcus Garvey (London: Frank Cass, 1967), II: 128.
25. Marcus Garvey, A n Answer to His Many Critics (UNIA press release “To
the White Press of the Warld,” January 1923).
26. Marcus Garvey, Jr., “ The British West Indies in the Mirror of Civiliza-
tion,” Africa Times and Orient Review (October 1913): p. 159; Marcus Garvey, Jr., A
Talk With Afro-West Indians (Kingston?, African Communities League, 1915), p. 6;
Garvey to Moton, February 29, 1916, reprinted in Eight Negro Bibliographies.
27. Blackman, April 16, 1929.
28. Ibid., January 22, 1930.
29. Ibid., May 20, 1929.
30. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 58.
31. Negro World, October 27, 1923.
32. Blackman, September 17, 1929.
33. Ibid.
34. Garvey, An Answer to His Many Critics.
35. Rollin Lynde Hartt, “ The Negro Moses,” The Independent 105 (February
26, 1921): 205.
36. Marcus Garvey, Jr., “ The West Indies in the Mirror of Truth,” Champion
Magazine 1 (January 1917): 267.
37. Negro World, April 28, 1923.
38. Handbill in the John E. Bruce papers announcing a Liberty Hall meeting
on Saturday, January 1 (year not given).
39. Negro World, March 7 ,1925;Garvey, Philosophy and Opinions, II; 10.
40. Negro World, June 14, 1919, memorial o f the T.W.A. to the British Gov-
ernment. New Jamaican, September 1, 1932, p. 2; minute of 21 July 1937, CO
323/1518;and see Tony Martin, “ Marcus Garvey and Trinidad, 1912-1947,” paper
read at the International Seminar on Marcus Garvey, University of the West Indies,
January 1973.
41. New Jamaican, July 12, July 18, July 29, July 30, 1932.
42. Truman Hughes Talley, “Garvey’s ‘Empire of Ethiopia,’ ” World's Work,
41 (January 1921): 265.
43. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 134; Blackman, June 21, 1929.
44. Marcus Garvey, A Talk with Afro-West Indians, (Kingston (?): African
Communities League, 1915 (? )),p . 2.
45. St. Louis, Mo., Star, October 6, 1923.
46. British Guiana Tribune, May IS, 1921.
47. Negro World, February 24, 1923.
48. Ibid., May 22, 1926.
49. Ibid., May 17, 1924.
50. Marcus Garvey, “ The West Indies in the Mirror of Truth,” Champion
Magazine 1, (January 1917): 267.
51. Negro World, January 26, 1924.
52. William H. Ferris, “Garvey and the Black Star Line,” Favorite Magazine 4
(July 1920): 396; Amy Ashwood Garvey, “ Prophet,” pp. 153, 154; Michael Gold, “
When Africa Awakes,” New York World, August 22, 1920, p. 7; Wells, Crusade fo r
Justice, p. 380; M.I. l.c., New York to Foreign Office, January 7,1920, FO 371/4567;N
ew York Amsterdam News, January 31, 1923; undated anonymous letter, “ To the
Editor,” Bruce Papers, BL 11.
53. Ferris, “Garvey and the BSL"; Negro World, May 6, 1933.
54. Negro World, July 8, 1922, March 22, 1922.
55. Ibid., August 12, 1922.
56. RG 204, 42-793, Records of the Office o f the Pardon Attorney, National
Archives.
57. Negro World, June 30, 1923; Blackman, July 30, 1929; Blackman August
23, 1930.
58. Blackman, April 10, 1929.
59. Universal Black Men Catechism (n.p., n.d.), p. 28.
60. Negro World, January 26, 1924.
61. Negro World, December 24, 1927; Blackman, August 5 1929- ibid., June
21, 1930.
62. Odin G. Loren, American Vice Consul, Colon, to Secretary of State, Wash-
ington, D.C., April 22, 1925, Records of the Department of State, RG 59, 819.5032;
The Star and Herald (Panama), April 19, 1925.
63. Negro World. July 24, 1926.
64. Ibid., August 7, 28, 1926.
65. Ibid., August 18, 1923.
3
Nacionalidade

Quando nós, enquanto membros do Universal Negro Improvement


Association, falarmos sobre um governo próprio na África, uma ban-
deira nossa, um hino nacional nosso, alguns Negros riem de nós, mas só
temos pena deles, pois eles não sabem o que fazem. Enquanto o Tio Sam lin-
cha seus meninos pretos vestindo uniformes, e John Bull chama seus ex-
soldados forasteiros que os ajudaram nas guerras Ashanti e Zulu, para
pegar grandes fatias da África, então é a hora de alguns Negros mórbidos e
apáticos de pensarem em termos de nacionalidade.

– Marcus Garvey¹

...estamos determinados a resolver nosso próprio problema, resgatan-


do nossa Pátria África das mãos de exploradores estrangeiros e lá fundar
um governo, uma nação própria, forte o suficiente para dar proteção aos
membros de nossa raça espalhados por toda parte o mundo, e obrigar res-
peito às nações e raças da Terra.

– Marcus Garvey²

Convencido de que os negros deveriam buscar a salvação primeiro enquan-


to raça, Garvey colocou-se à tarefa de fazê-lo através do princípio da nacionalidade.
Ele acreditava que os negros deveriam ser trazidos para uma comunidade ativa
que abrangesse todo o universo negro. Por pertencer a esta comunidade Pan-
Africana de quatrocentos milhões de Negros (seus críticos muitas vezes discorda-
vam de sua aritmética), podia contar com a força de uma esmagadora maioria,
mesmo em áreas como os Estados Unidos, onde eram minoria.

A ideia de nacionalidade, como provavelmente todas as suas principais idei-


as, fora gerada por Garvey antes da formação da UN1A, como mostra sua atividade
no National Club na Jamaica. Até a UNIA entrar em operação nos Estados Unidos,
Garvey proclamaria seu desacordo com as estratégias limitadas de seus rivais – a
UNIA, declarava, não falava “na linguagem da teologia e da religião, não na lingua-
gem da reforma social, mas a Universal Negro Improvement Association fala na
linguagem da construção de um governo: da construir o poder político e tudo o que
o vem com isto”.³

E “tudo o que vem com isto” a UNIA tinha de fato. Durante o período ameri-
cano de Garvey ela tornara-se um microcosmo da nação africana que Garvey espe-
rava construir. Nas convenções internacionais iniciadas em 1920, a UNIA teve, nas
palavras de Garvey, “a maior Assembleia Legislativa de todos os tempos reunida
pelos povos negros do mundo”⁴. Tendo debatido, geralmente durante todos os
trinta-e-um dias agosto, além de contar com todos os funcionários, incluindo o
próprio Garvey, foram devidamente eleitos. Os delegados, eleitos por filiais da
UNIA e outras organizações raciais, marcaram presença de lugares tão distantes
quanto a Austrália, África e América do Norte. Presidindo a organização desde
1920 havia um potentado, uma espécie de monarquia constitucional. A legislação
da UNIA estipulava que o potentado deveria ser um Africano de pátria. O próprio
Garvey, como chefe executivo, recebera o título de presidente provisório da África.
O mundo negro foi subdividida em várias grandes regiões geográficas, cada uma
presidida por um líder. A organização tinha seu próprio “Hino Universal da Etió-
pia”, que em 1920 foi adotado como “o Hino da Raça Negra”⁵, também como sua
própria Magna Carta em sua Declaration of Rights of the Negro Peoples of the
World adotada na convenção de 1920. Garvey deteve o título de “Honorável” nesta
convenção. Um R.H. da UNIA administrava exames e preparava trabalhadores para
o servir a organização. A UNIA também concebia tratados de nacionalidade, conce-
dendo títulos a membros merecedores da raça. Brancos, assim como Negros, os
críticos ridicularizavam a prática, à qual Garvey retrucou: “Sou acusado de criar
Duques, Barões e Cavaleiros. Quem deu ao homem branco a monopolização de cri-
ar ordens sociais?”⁶ Com lógica semelhante, Garvey insistiu em vestir, em ocasiões
cerimoniais, uniformes e túnicas à moda daqueles usado pelos líderes dos estados
soberanos. Garvey vivera o suficiente para ver fascistas italianos instalarem um
duque de Adis Abeba depois sua invasão na Etiópia. Ele notou incisivamente a falta
de hostilidade para esta ocorrência, daqueles que o ridicularizaram em 1924 ao
nomear John E. Bruce como Duque do Nilo.⁷ Os atributos externos da nação foram
evidenciados também nos auxiliares uniformizados da UNIA, como nas Universal
African Legions, o Universal Motor Corps, a Universal African Black Cross Nurses e
seu setor de juvenis e assim por diante.

O item de pompa mais extravagantemente impressionante do nacionalismo


de Garvey era inspirada em torno das recepções de corte que marcaram suas con-
venções. Tais recepções eram concebidas como “o maior evento na vida social dos
Povos Negros do Mundo”. A recepção de 1929 foi adornado com uma estátua da
Rainha Negra da Beleza segurando no alto sua tocha da verdade. Entre o requinte
de tais recepções da corte estavam "Sua Majestades Candace e as Damas Provisó-
rias da Corte Real Etíope da UNIA.”

A mais duradoura das propagandas externas à nacionalidade da UNlA fora


sua bandeira vermelha, preta e verde, adotada na Declaration of Rights de 1920
como cores oficiais da raça Africana. A questão por uma bandeira para raça não era
tão trivial quanto poderia parecer na superfície, pois nos Estados Unidos, especi-
almente, a falta de um símbolo Africano de coesão nacional, parece ter sido a causa
de escárnio grosseiro por parte dos brancos e uma fonte de solidariedade por par-
te dos Afro-Americanos. O escárnio dos brancos sobre essa deficiência foi resumi-
da em uma canção popular americana, “Toda a raça tem bandeira, menos o animal
[guaxinim].” Um relatório de 1912 que aparece na África Times and Orient Review
(para o qual Garvey trabalhava) documentara as consequências de longo prazo
sobre esta canção.⁸ Um Bispo J. Lennox da African Methodist Episcopal Church of
Zion, de Cleveland, Ohio, levantou-se de um teatro onde a música estava sendo can-
tada, para ser recebido por uma briga entre um irlandês e um Afro-Americano que
se opôs ao homem branco por estar repetindo a canção. O bispo separou devida-
mente os envolvidos, mas foi movido pelo incidente a levantar uma bandeira para
a raça com objetivo de remover esta fonte de ridicularização. Sua bandeira foi pos-
teriormente endossada por oitenta e cinco mil Negros (de acordo com o artigo)
numa convenção em Ontário, Canadá. O conclave geral da igreja deste bispo tam-
bém endossara a bandeira. A bandeira em questão era um design esquisito com
estrelas e barras, vermelho, branco, azul e roxo, e foi baseada em grande parte no
simbolismo bíblico (roxo para o manto de Jesus, branco pela pureza dos santos,
azul pela fidelidade dos Negros aos Estados Unidos). A bandeira em si aparente-
mente não era uma grande sucesso. A ideia, no entanto, continuou com Garvey, que
foi capaz de traduzi-la para algo mais significativo (e hoje universalmente adotado)
vermelho, preto, e verde.

Garvey provavelmente estava familiarizado com o artigo do bispo. Em 1921


ele declarou,

Mostre-me uma raça ou a nação sem bandeira, e eu lhe mostrarei


uma raça de pessoas sem qualquer orgulho. Sim! No canto e no escárnio eles
têm dito: “Toda raça tem uma bandeira, menos o animal [guaxinim]”. Quão
verdadeiro! Sim! Mas isso foi dito de nós quatro anos atrás. Eles não podem
dizer isso agora...⁹

O catequismo racial usado pelos garveyístas explicava o significado do ver-


melho, preto e verde como sendo vermelho para a “cor do sangue que os homens
devem derramar por sua redenção e liberdade”, preto para “a cor da nobre e dis-
tinta raça a qual pertencemos” e verde para “a luxuriante vegetação da nossa Pá-
tria.”¹⁰ Em pelo menos uma ocasião Garvey deu uma explicação diferente para as
cores. Aqui seu propósito parece ter sido deliberadamente alarmar seu entrevista-
dor, Charles Mowbray White, um membro da coalisão conservadora de empresá-
rios, entre comércio sindicalista moderado e profissionais conhecidos como a Na-
tional Civic Federation. Ele disse a White que o vermelho expressava a simpatia da
UNlA com os “Vermelhos do Mundo”, o verde expressava uma simpatia semelhante
aos irlandeses em sua luta contra os britânicos, e o preto representava pessoas da
raça Africana.¹¹

As implicações nacionalistas da bandeira de Garvey, assim como outros as-


pectos do pensamento de Garvey, não se limitavam à Afro-América, mas às lutas
nacionalistas no continente Africano também. Assim, na cerimônia de inauguração
da divisão UNIA Woodstock, na Cidade do Cabo, África do Sul, em 1924, o orador
principal, J. G. Gumbs, expressou particular gratidão para a bandeira vermelha,
preta e verde, uma bandeira, como ele expressou, “é nossa”.¹² No ano seguinte, o
Congresso Nacional Africano, também da África do Sul, adotou uma bandeira dou-
rada, preta e verde – ouro para a riqueza do país, preto para as pessoas e verde
para a terra. A bandeira foi sugerida por um admirador de Garvey e membro influ-
ente do ANC, T. D. Mweli Skota.¹³ Nos anos 1950, o vermelho, preto e verde podiam
ser vistos no Quênia, desta vez com escudo, flecha e lança sobrepostos, como a
bandeira do Kenya African Union do nacionalista Jomo Kenyatta. ¹⁴

Uma das consequências mais importantes da doutrina de nacionalidade pa-


ra Garvey, foi a instalação de representantes da raça em áreas estratégicas. Para
isso, a Declaration of Rights of the Negro Peoples of the World apelaram “aos vá-
rios governos do mundo para aceitarem e reconhecerem representantes Negros
que serão enviado aos referidos governos, para representar o bem-estar geral do
Negro dentre os povos do mundo”.¹⁵ Poucos dias após a adoção desta declaração
foi feito o anúncio de que o líder da UNIA do Negros Americanos, passaria a residir
em uma Casa Negra em Washington já que os negros não podiam eleger um dos
seus para a Casa Branca.¹⁶

Mesmo antes, porém, da declaração e proposta sobre a Casa Negra (que não
fora implementada) a UNIA enviou comissários à França para atenderem à Confe-
rência de Paz em Paris, 1919. Seus esforços de lobby não tiveram sucesso ao bus-
carem qualquer abatimento no zelo das potências imperialistas europeias em to-
marem posse das ex-colônias alemãs Africanas. Talvez por isso, a declaração de
1920 comentou sobre a Liga das Nações como sendo “nula e sem efeito no que se
trata do Negro, na medida em que procura privar os Negros de sua liberdade”.¹⁷
No entanto, em 1922, a UNIA estava pronta para tentar a liga novamente. Contando
com uma delegação composta por George O. Marke, treinado em Oxford, da Sierra
Leone, Professor J. J. Adam do Haiti, que foi formado em Tuskegee, William LeVan
Sherrill da Afro-America, formado em Philander Smith College, Little Rock, Arkan-
sas, e o professor James O'Meally da Jamaica, ex-professor da Calabar College, foi
para Geneva apresentar uma petição perante a liga. A petição pedia que as ex-
colônias alemãs sejam entregues à liderança negra, uma vez que os soldados ne-
gros eram responsáveis por sua captura. A petição sugeria que, sob liderança ne-
gra, eles poderiam fazer valer dentro de vinte anos. Então quatrocentos milhões de
Negros ão seriam mais servos.¹⁸

A delegação chegou em Genebra no início de setembro de 1922, assegurada


de assentos na sala da Assembleia, fora admitida em todas as salas das comissões,
e tiveram um encontro com o diretor da seção de mandatos da liga, a quem insta-
ram nomear um negro para a comissão permanente de mandatos. Depois de faze-
rem lobby por três semanas e meia, eles conseguiram interessar a delegação persa,
na apresentação da petição em nome da UNIA. Os persas fizeram isto, mas a esta
altura a sessão da liga estava dentro de três dias do término, e a petição foi, portan-
to, arquivada para considerações da sessão de 1923. A delegação da UNIA conse-
guiu sentar-se entre os delegados oficiais e não na galeria onde ficam os delegados
não-oficiais. Segundo um membro da delegação, cerca de trezentos delegados não-
oficiais semelhantes tentavam apresentar petições, e apenas os representantes da
UNIA tiveram sucesso.¹⁹

Para a sessão da liga de 1923, a UNIA novamente despachou um represen-


tante, na esperança de que a petição de 1922 fosse debatida. Desta vez o único de-
legado foi o professor Jean Joseph Adam, ex-presidente da Divisão UNIA de São
Francisco e secretário e tradutor na delegação de 1922. Agora ele fora promovido
ao posto de primeiro embaixador provisório dos Povos Negros do mundo na Fran-
ça. Ele residiria em Paris e faria lobby em Genebra. Partira de Nova York em 23 de
agosto, e em 24 de agosto, o cônsul geral britânico em Nova York, que o vigiava de
perto a UNIA, assim informou o embaixador britânico em Washington ,que assim
informou o Foreign Office em Londres.²⁰ Uma vez que Adam chegou à Europa, a
liga, provavelmente por intermédio da Grã-Bretanha e França, cujos territórios
Africanos ex-alemães eram o centro de interesses sobre consciência racial na UNIA,
havia silenciosamente frustrado os planos de Garvey. Eles contornaram de nacio-
nalidade da UNIA ao resolverem que todos os representantes nacionais com quei-
xas deveriam apresentá-los através de seus respectivos governos. No que dizia
respeito a Garvey, é claro, o Africano, onde quer que vivesse, não tinha governo
para falar de seus interesses e assim ele deve ser ouvido como uma raça. E a UNIA,
com suas aspirações à nacionalidade, representavam esses interesses raciais.²¹

A petição dificilmente agradaria os governos europeus clamando pela “li-


berdade política racial” e lembrando os esforços heróicos de soldados Pretos, su-
postamente pela causa da democracia. Mostrou que todos povos sujeitos, haviam
recebido algo em troca da guerra, exceto a maioria dos Africanos:

Apreciamos prontamente o fato de que a Liga das Nações levou em conside-


ração a restauração da Palestina aos judeus… A Irlanda foi levada a consideração
por um Governo de Estado Livre, ao Egito foi concedida uma forma de indepen-
dência, e ainda há uma grande consideração pela Índia, e esteve representada na
Conferência de Paz em Versalhes através e por causa do do esplêndido serviço
prestado por soldados indianos.²²

Garvey emitiu uma petição renovada em 1928 e continuou a tentar atrair a


atenção da liga, mas nunca chegou mais perto de sucesso do que em 1922.²³

A pauta da UNIA rumo à nacionalidade não parou com os comissários à Li-


ga das Nações e um embaixador provisório na França. Comissários estavam cons-
tantemente em movimento, em viagens, estabelecendo contato pessoal com filiais
da UNIA. Também foram nomeados embaixadores provisórios e legiões instaladas
em outros lugares além da França. Um desses lugares era a Libéria, onde uma dele-
gação foi criada em 1921. O secretário residente resumiu suas funções em uma
carta a Garvey, nos seguintes termos:

As instruções orais de Vossa Excelência, concebidas a partir do ponto de


vista de que o cargo era diplomático, o Comissariat a Legation, e meu cargo de Se-
cretário da Legação, indicaram que eu deveria fazer tudo o que se espera que
um Secretário da Legação faça – estudar a situação da Libéria, seu povo e governo,
farejar todas as notícias importantes sobre o quê e quem quer que s eja, fazer re-
latórios confidenciais diretamente a Vossa Excelência, além de outros relatórios
que eu possa enviar ao Conselho através de Vossa Excelência.²⁴

No caso da Libéria, Garvey tentou estabelecer uma legação, sem anunciá-la


abertamente como tal. Em janeiro de 1924, no entanto, ele enviou um embaixador
para a Grã-Bretanha em meio a muita cerimônia. Ele estava angustiado durante
suas viagens pela Europa, para descobrir que todos os povos e raças tinham al-
guém para poder cuidar de seus interesses – exceto o homem negro. O primeiro
embaixador da UNIA na Grã-Bretanha era Sir Richard Hilton Tobitt. Tobitt era ex-
ministro Episcopal Metodista Africano e Mestre educacional nas Bermudas. Parti-
cipara da convenção da UNIA em 1920 e foi um dos signatários da Declaration of
Rights. Ele foi eleito líder das províncias orientais das Índias Ocidentais e, como
resultado de sua recusa em deixar a UNIA, ele perdeu sua posição na igreja e sofreu
uma retirada do apoio do governo para sua escola.²⁵ Em seu apontamento, ele fora
admitido por Garvey na “ordem exclusiva de Knight Commander da Sublime Order
of the Nile”, que lhe deu o direito de usar o prefixo “Sir”.²⁶ Também encarregado da
tarefa de representar os interesses dos povos Negros do mundo na corte de St.
James. Ele deveria estudar a situação política na Inglaterra e como afetava o raça
Africana. Garvey considerou o momento propício (Tobitt navegou em janeiro de
1924) porque 1924 foi um ano de governo do Partido Trabalhista. Um governo
trabalhista, Garvey supunha, seria menos difícil de lidar do que conservadores
aristocráticos, uma vez que deveriam ter alguma simpatia por aspirações da massa.
Por isso, também, Tobitt foi encarregado de gerar um sentimento favorável entre
os trabalhadores ingleses que, como Garvey explicou, “Se você for capaz de con-
vencer o trabalhador inglês de que ele não tem motivos para reclamar do negro,
seria impossível para qualquer governo britânico de fazer qualquer coisa que afe-
tasse os interesses dos Negros...” Se os trabalhadores ingleses se recusassem a lu-
tar, então não havia como a Grã-Bretanha entrar em guerra com o UNIA na África.
Tobitt, como Adam na França, seria um provisório embaixador e cederia lugar
quando uma África verdadeiramente independente começasse a enviar seus pró-
prios embaixadores.²⁷

Garvey, com toda sua desenvoltura de mestre propagandista, informou ofi-


cialmente o governo britânico sobre a nomeação do Honorável Richard Hilton To-
bitt como “Alto Comissário e Ministro Plenipotenciário de Governo da Sua Majes-
tade Britânica” em nota que dizia: “Excelente Richard Hilton Tobitt é credenciado
pela Universal Negro Improvement Association em todos os assuntos que afetem o
interesse da raça negra dentro da Grã-Bretanha.” E continuava: “Suas credenciais
foram submetidas ao primeiro-ministro e secretário de Relações Exteriores de Sua
Majestade e espera-se que o Governo de Sua Majestade lhe conceda tal cortesias
estendidas a outros representantes de raças independentes e povos soberanos”.²⁸

Ao chegar na Inglaterra, Tobitt solicitou entrevistas com o primeiro minis-


tro e secretário de estado do Escritório Colonial para que ele pudesse apresentar
as credenciais da UNIA e ACL. Seu pedido gerou um debate sobre se a resposta de-
veria vir apropriadamente do Ministério do Reino Unido das Relações Exteriores
ou o Escritório Colonial. Um oficial do Escritório Colonial sugeriu que era negócio
de seu departamento “manter Garvey e seus associados fora da África Ocidental –
não fora do nº 10.” Mantendo a UNIA fora do nº 10 (a residência oficial do primei-
ro-ministro britânico) deve ser de responsabilidade do Ministério das Relações
Exteriores. Outro oficial do Escritório Colonial considerou os efeitos adversos do
colonialismo britânico nas Índias Ocidentais, e que resultariam em tal reconheci-
mento oficial da UNIA: “A confiança das Índias Ocidentais no HMG [governo de
vossa majestade] Sofreria um choque desfavorável se algum tipo de reconhecimen-
to oficial fosse dado a esta Associação, que tem antecedentes de fraude, sedição e
incitamento à violência”. ²⁹

Não surpreendentemente, o pedido de Tobitt para uma entrevista para


apresentar sua credenciais, foi finalmente recusado.³⁰ O alto comissário, no entan-
to, permaneceu na Inglaterra por algum tempo, discursando em reuniões de filiais
da UNIA em Manchester e Londres.³¹ Em 1925, como alto comissário do leste das
províncias das Índias Ocidentais, ele se saiu muito melhor com a colônia holandesa
do Suriname, onde foi recebido pelo governador e lhe foi dada a liberdade da colô-
nia.³²

Um ano antes de se recusar a aceitar o alto comissário de Garvey na corte de


St. James, o governo britânico considerou seriamente estender um reconhecimento
quase-diplomático à divisão cubana da UNIA. A situação em Cuba era singular.
Aqui, milhares de trabalhadores negros, principalmente haitianos e jamaicanos
(estes últimos sujeitos aos britânicos), eram recrutados para trabalhar nas planta-
ções de açúcar cubanas. Em Cuba, estes trabalhadores negros eram impiedosamen-
te oprimidos e recebiam praticamente nenhuma proteção legal, seja pelo governo
cubano ou pelo pessoal diplomático britânico. Nesta situação, a UNIA tornou-se
firmemente cercada entre os trabalhadores negros em Cuba e com tempo tornou-
se uma sociedade de ajuda mútua, organização de elevação racial e quase-governo
para a população negra. Foi praticamente a única tentativa eficaz de zelar pelos
seus interesses.³³ Não surpreendentemente, em meados da década de 1920, Cuba
tinha o maior número de divisões UNIA e filiais de qualquer país, exceto os Estados
Unidos (ver apêndice).

Nesta situação, o ministro britânico em Cuba comprou a ideia da UNIA em


estender o reconhecimento semioficial dado a ela como a organização, protegendo
os interesses dos trabalhadores britânicos das Índias Ocidentais em Cuba. O Minis-
tério das Relações Exteriores em Londres, cuja a sugestão foi encaminhada, decidiu
sondar três governadores de suas colônias das Índias Ocidentais antes de tomar
uma decisão. Esses governadores, todos eles bem familiarizados com o bom traba-
lho da UNIA em suas próprias colônias, eram principalmente hostis à ideia. O go-
vernador de Barbados explicou que havia apenas duas filiais da UNIA na ilha, uma
delas era composta por “homens mais sólidos” e carecia de “qualquer tendências
anti-brancas de destaque”, enquanto a outro era supostamente desleais. O reco-
nhecimento semioficial da UNIA cubana daria um impulso às filiais locais, o que
poderia resultar em dores de cabeça para os colonos britânicos. “Se, no entanto”,
ele respondeu à pergunta do Ministério das Relações Exteriores,

A filial cubana fora reconhecida como o centro de proteção dos interesses


das Índias Ocidentais Britânicas naquele País, prevejo que a sociedade obteria um
status nesta Colônia que poderia ser muito inconveniente. Certamente resultaria
em um aumento muito grande no número de membros e as cabeças quentes da
Associação provavelmente seriam despertadas para provocar problemas entre
as duas raças. Os Barbadenses geralmente são um povo calmo e bem comportado
de homens, mas são muito excitáveis facilmente alterados.³⁴

Ele ainda acusou que membros da UNIA enviaram recentemente cartas


ameaçando os fazendeiros e encorajando trabalhadores à greve, e com a aproxima-
ção da época de colheita nos canaviais, esses cabeças-quentes podem tornar-se
resistentes. Além disso, seria inconsistente reconhecer a UNIA em Cuba e reprimi-
la em Barbados (onde foi submetida à vigilância da polícia e o Negro World bani-
do).

O governador britânico da Jamaica foi um pouco menos hostil à ideia, possi-


velmente porque a UNIA cubana era em grande parte jamaicana em composição.
Ele estava inclinado a ser contra o reconhecimento, mas nas circunstâncias peculi-
ares, “era como um meio de obter ação assertiva de proteção às Índias Ocidentais
britânicas daquele país”, ele não podia “prever como esse Governo ficaria cons-
trangido com o reconhecimento semi-oficial das pessoas mencionadas, desde que
se tome o cuidado de evitar toda a ideia de que este Governo é de alguma forma
parte favorável no reconhecimento.”³⁵

O governador de Trinidad, onde a UNIA era geralmente mais reprimida en-


tre as ilhas britânicas das Índias Ocidentais, respondeu brevemente, e com veneno:
“Sou fortemente aversivo a qualquer ação que possa, de alguma forma, levar a Uni-
versal Negro Improvement Association acreditando que o Governo de Sua Majes-
tade considerou a Associação como algo que poderia de qualquer forma Melhorar a
posição da população negra de Sua Majestade no Índias Ocidentais." Ele acrescen-
tara que recentemente recusou uma petição de Tribunal da UNIA Trinidad para
abolir a proibição do Negro World, “pois o caráter das matérias que esta editora
contém é censurável”. ³⁶

Com base nestas opiniões, o ministro britânico em Cuba foi aconselhado a


reter o reconhecimento.³⁷ A partir de então, o governo cubano, com a fusão de em-
pregadores americanos de trabalho negro como a United Fruit Company, intensifi-
cara sua campanha contra a UNIA que, entre outras coisas, fora responsável por
greves contra esses empregadores. Funcionários da UNIA eram detidos e as filiais
fechadas pelo governo.³⁸ Em 1930, o próprio Garvey teve sua permissão negada
para visitar Cuba. General Manuel Delgado, secretário do interior, explicou que não
havia problema de raça em Cuba, mas a UNIA estava, no entanto, incitando-o. Ele
também emitiu uma declaração ordenando que os governos provinciais fechassem
todas as filiais da UNIA.³⁹

Se o governo provisório de Garvey estivesse bem abastecido de embaixado-


res e comissários de bordo, ele próprio em suas viagens agia como um chefe de
estado, solicitando e às vezes recebendo entrevistas com tais dignitários, como o
governador das Honduras Britânicas e o presidente da Costa Rica.⁴⁰

A posse de nacionalidade da UNlA não existiria sem seus incidentes humo-


rísticos. Em 1923 a organização despachou uma delegação oficial para o funeral do
presidente Warren Harding. A delegação viajou de carro repleto de membros das
Universal African Legions em cada etapa. Após o funeral, a delegação divertiu-se
dirigindo pelas ruas de Washington e vendo os policiais saudarem e atrapalharem
o trânsito para deixá-los passar. Eles obviamente estavam sendo enganados por
representantes de um estado soberano. William Sherrill, lembrando o ocorrido
uma década depois, explicou que “nunca antes tínhamos desfrutado de tal conside-
ração a pela polícia do sul, e aproveitamos ao máximo nossa falsa identidade.”⁴¹

A base da predileção de Garvey pela nacionalidade eram suas próprias es-


peculações sobre teoria política. Ele concebera que o grande problema da prática
democrática como a concepção de um mecanismo de governo que asseguraria a
representação permanente da vontade popular. Vontade esta que seria sinônimo
de expressão da maioria da população, mas que de alguma forma garantiria “que
todos os cidadãos desse governo ficassem satisfeitos e simpatizassem uns com os
outros.”⁴³ Ele criticou a democracia americana nesse quesito, explicando que mui-
tas vezes apenas uma minoria da população vota realmente no presidente dos Es-
tados Unidos, então ele não representa necessariamente a vontade da maioria.
Além disso, uma vez que o executivo muitas vezes controla o judiciário, apelariam
entre si e às vezes seria como apelar de César para César. Garvey certa vez escre-
veu um pequeno ensaio, “Governando o Estado Ideal”, sobre esses problemas de
governo não majoritário e falta de sensibilidade à vontade popular. Ele partiu da
premissa de que, como todos os sistemas e regimes de governo dependem, em úl-
tima análise, da implementação humana, ele conceberia um sistema pelo qual os
representantes do povo cumpririam com sua confiança ou sofreriam de imediato,
desgraça e execução:

O governo deve ser absoluto, e a cabeça deve ser completamente


responsável por si mesmo e pelos atos de seus subordinados. Ele deve ser a
alma de honra, e quando for legalmente ou devidamente provado do contrá-
rio, ele deveria ser publicamente desonrado e condenado à morte como um
representante indigno da vontade justa do povo.

A ameaça de punição instantânea e morte também devem pairar sobre as


cabeças de funcionários subordinados do governante.

Para garantir ainda mais a incorruptibilidade do governante, Garvey sugeriu que


ele “seja removido de todas as obrigações pecuniárias e serviços de ordem
social” através do dispositivo de um salário e subsídios elevados, ambos durante e
após sua administração. Em troca, o governante deveria devotar-se inteiramente
ao governo do Estado e, durante o período de sua administração, deve evitar a pos-
sibilidade de interesses sectários, pressões de grupo, rejeitando a companhia de
todos os amigos fora de sua família imediata. Governantes que abusarem de seu
compromisso seriam executados, e “imagens deles devem ser produzidas e coloca-
das em um hall da criminologia e da má fama, e seus crimes devem ser recitados e
uma maldição pronunciada sobre eles e suas gerações.”⁴³

Além disso, Garvey pronunciou a falta de vontade de uma geração posterior


de ativistas Negros a se restringirem por ideologias políticas pré-estabelecidas (às
vezes até ao ponto de ecletismo aleatório) insistindo que sentia-se livre para “es-
colher o melhor em cada governo, seja esse governo monárquico, democrático ou
soviético.”⁴⁴

Os pensamentos de Garvey sobre a democracia o levaram inevitavelmente à


consideração do capitalismo e do comunismo, uma vez que o conceito de democra-
cia não tem sentido sem relação com o sistema econômico que a sustenta. Ele con-
siderava o capitalismo como um estágio necessário para o progresso humano, ao
mesmo tempo que expressando inquietação com os resultados de suas utilizações
desenfreadas.⁴⁵

A desaprovação de Garvey pelo capitalismo desenfreado estendeu-se desde


a nascente de sua própria raça. Como Frantz Fanon, três décadas depois, ele acre-
ditava que esta classe entre a raça negra era mais destrutiva do que pessoas em
circunstâncias semelhantes dentre as raças brancas e outras. Afinal milionários
brancos doam para fundações de caridade e quer queira quer não exibem algumas
características progressistas, os Negros ricos tendem a ser mais parasitários e des-
trutivos para sua própria raça. Garvey em 1924 expressou essa ideia assim: “Não
temos apenas que lutar contra o capitalista branco, mas também temos que lutar
contra o Negro capitalista. Ele vai vender seu próprio povo para o inferno da mes-
ma forma que qualquer outra pessoa.” Em 1929 ele repetiu sentimentos semelhan-
tes: “A raça negra ou ‘de cor’ está desenvolvendo uma classe de milionários em
acumuladores de dinheiro, muito mais nocivos para a vida e existência da raça do
que qualquer grupo semelhante de homens dentre qualquer outra raça.”⁴⁶

Para solucionar estes problemas, Garvey inclinou-se para reformas de na-


tureza social-democrata, e não para a completa erradicação do sistema capitalista.
Ele era a favor de tetos de USD$ 1 milhão e USD$ 5 milhões para fundos de inves-
timentos controlados por pessoas físicas e jurídicas, respectivamente. Os montan-
tes acumulados acima destes valores eram apropriados pelo Estado, que também
deveriam expropriar sem indenização os bens de capitalistas e corporações que
fomentaram guerras e conflitos no avanço por seus interesses financeiros.⁴⁷

Em suas próprias organizações, Garvey tentou implementar essas ideias


organizando seus empreendimentos em linhas cooperativas e colocando um teto
para o número de ações que qualquer pessoa podia possuir. Via esforços como es-
tes como tentativas de pessoas pobres estabelecerem “um sistema capitalista pró-
prio” para “combater os sistema capitalista da classe dominante.”⁴⁸ Numa ocasião,
enquanto representando os trabalhadores na Jamaica em disputa com a United
Fruit Company, ele até se descreveu como um capitalista na tentativa de mostrar
que também era um empregador de mão de obra, mas mesmo assim encontrou
maneiras de evitar excessos sobre os quais os grevistas que ele representava re-
clamavam.⁴⁹

As ideias de Garvey sobre capitalismo e comunismo podem ser ilustradas


também pela companhia que ele mantinha, por assim dizer. Para os líderes do Ter-
ceiro Mundo que ele admirava, eram geralmente aqueles com uma perspectiva
política semelhante – pessoas, como ele mesmo, envolvidas em lutas nacionalistas
e tentando andar numa corda-bamba entre capitalismo e comunismo. O mais im-
portante destes foram Mahatma Gandhi na Índia, Clements Kadalie no sul África, e
o Capitão A. A. Cipriani, líder do Trinidad Workingmen’s Association. Esses líderes
eram geralmente agrupados junto com Garvey em jornais comunistas como “re-
formistas pequeno-burgueses” “enganosos” e “falsários”. Os governos imperialis-
tas geralmente os consideravam perigosos agitadores.

As tendências de Garvey para a social-democracia também podem ser vistas


em seu otimismo em relação à eleição de Franklin D. Roosevelt nos Estados Unidos
Unidos, na década de 1930⁵⁰ e, principalmente, em sua antiga afeição pelo bem-
estar social representado pelo Partido Trabalhista britânico. Já em 1923, Garvey foi
relatado pelo New York Age como sendo um membro deste partido. Sua crença de
que o Partido Trabalhista mostraria maior sensibilidade às aspirações dos negros
era um sonho perene dos povos colonizados pelo Império Britânico, mas que ge-
ralmente era desenganado. Em 1923, por exemplo, Garvey, regozijando-se com o
fato de que o Partido Trabalhista Britânico era agora a oposição oficial no Parla-
mento, publicou o significado deste evento para os subalternos britânicos negros:

Ganhemos nova coragem e firme confiança em nossos esforços, dei-


xemo-nos inspirar pela conquista do Partido Trabalhista na Inglaterra, e
das forças trabalhistas em todo o mundo.

A ascendência do Trabalho na política trará uma nova ordem que não


pode ser tão sem sentido quanto àquela a que lhes sucedem.

... o trabalho pode ter juízo suficiente para saber que o melhor cami-
nho que poderia adotar para sua prosperidade é ser justo e amigável com
todos os grupos humanos. Nós não contemplaríamos o trabalho tendo sair
para lutar contra outros povos para a exploração aventureira de é nativos a
tais povos. Não podemos pensar em Ramsay MacDonald como Primeiro Mi-
nistro da Inglaterra declarando guerra contra os nativos africanos que pro-
curam proteger seus direitos nativos. Mas esperaríamos isto de David Lloyd
George ou um Arthur J. Balfour, que representam o elemento Tory e as mul-
tidões capitalistas de seu país… Logo, estamos felizes com a queda do Go-
verno Tory da Inglaterra. Também nos alegramos quando outras organiza-
ções políticas monopolistas desmoronam para serem sucedidas pelo con-
trole desse elemento das pessoas que sabem o que é amor humano, sabem
o que é justiça.⁵¹

Em janeiro de 1924, Garvey celebrou a vitória pela curta-vida do governo de


MacDonald. tendo um telegrama informando o novo primeiro-ministro que a UNIA
olhava para os Trabalhistas como aliados da raça negra na luta pela independência
nacional na África.⁵² Quase simultaneamente ele despachou o embaixador da UNIA
pra Inglaterra. A propícia época e a atitude geralmente favorável de Garvey em
relação ao Partido Trabalhista pode ter algo a ver com o fato de que nessa mesma
época a UNIA de Londres estava expressando agradecimento ao Partido Trabalhis-
ta por ajudar a trabalhadores negros em Londres para encontrar emprego.⁵³

Este apoio incomum do Partido Trabalhista na Grã-Bretanha foi em parte


devido à falta de distinção substancial de Garvey entre o socialismo de bem-estar
do partido, por um lado, e o socialismo russo praticado sob Lênin, no outro. Pois,
como será visto mais adiante, apesar de suas rixas com comunistas brancos nos
Estados Unidos, Garvey admirava Lênin por seu movimento de massa e suas tenta-
tivas de reduzir o controle capitalista. Ele considerou que o Partido Trabalhista
britânico era do mesmo tipo. Em elogio a Lênin no Liberty Hall em 1924, após a
morte do líder russo, ele diria, “eu acredito que, com o tempo, o mundo inteiro as-
sumirá o papel social do sistema democrático de governo agora existente na Rús-
sia. É apenas um questão de tempo, digo. A Inglaterra é a primeira a ter chegado a
este estado perfeito de controle social-democrata entre seus povos”.⁵⁴ Em 1932
estava disposto a admitir que o Partido Trabalhista não havia chegado ao comu-
nismo, mas que estava trabalhando diligentemente para esse objetivo, e logo seri-
am "comunistas vermelhos", uma proposição que não parecia assustá-lo. Entretan-
to, reiterou o seu apoio ao partido durante a eleições de 1929.⁵⁶
Em 1927, o Partido Trabalhista recebera uma oportunidade de retribuir de
forma menor. O líder sindical sul-africano Clements Kadalie, durante uma visita à
Grã-Bretanha, conseguiu obter assistência do partido em O caso de uma niassalan-
desa, Isa Macdonald Lawrence, que havia sido enviada pelas autoridades britânicas
há três anos de trabalho duro por importar seis exemplares do Negro World de
Garvey e dois sulafricanos, Worker’s Herald, para a África Central. Um deputado
trabalhista, Richard Wallhead, levantou a questão na Câmara dos Comuns, e
Lawrence foi libertado pouco depois.⁵⁷

As reflexões de Garvey sobre a teoria política e, especialmente, sobre a de-


mocracia encontrou vasão em sua concepção de sua liderança própria. Embora em
vezes mostrando uma tendência para o autocrático, ele foi, no entanto, EU imbuído
de uma noção consumidora de serviço, o que levou a uma fatalista aceitação do
sacrifício como consequência inevitável da liderança, apesar de reclamações ocasi-
onais sobre as dificuldades na liderança da raça e indignidade dos colegas errantes.

No conceito de liderança de Garvey, como dedicação, sacrifício e martírio foi


correspondido com lealdade entre um grande número de seus seguidores que es-
pantava observadores. Kelly Miller da Howard University, uma das intelectuais
Afro-Americanas não garveyístas que tentaram analisá-lo com alguma semelhança
à objetividade, escreveu que “deve-se admitir que ele gerou para si mesmo uma
intensidade de discipulado que eu que não tem paralelo entre os Negros neste pa-
ís.”⁵⁸ Miller observou que na morte de Frederick Douglass, a Howard University,
dos quais Douglass tinha sido um administrador, pôde levantar apenas alguns mi-
lhares de dólares para uma doação uma escola em sua homenagem. A cidade natal
de Douglass também falhou em tornar-se uma meca para a raça. Assim como no
caso de Booker T. Washington, seus seguidores, muitos dos quais estavam em dívi-
da com ele por suas posições elevadas, foram indiferentes à tentativa de angariar
uma dotação de meio-milhão de dólares em sua homenagem. Isso contrastava for-
temente com a fiel devoção dos seguidores de Garvey, e mais ainda, depois de seu
encarceramento. T. Thomas Fortune, veterano militante dos direitos civis, reitor da
Afro-American Jornalists, ex-sócio de Booker T. Washington, e, pelo últimos anos
de sua vida, editor do Negro World, fez uma observação semelhante:

O editor do Negro World está em posição de julgar este assunto pois


está ativamente engajado no jornalismo racial há quarenta e cinco a e co-
nheceu todos os líderes da raça na América e em outras terra durante esse
tempo, pessoalmente ou por reputação. De Frederick Douglass para Marcus
Garvey. Nenhum deles tinha a personalidade magnética de Sr. Garvey; ne-
nhum deles poderia atrair homens para ele segurá-los, como ele. Nenhum
deles tinha um slogan de abrangência mundial que agradasse o povo negro
em todos os lugares .⁵⁹

Uma petição da divisão UNIA de Jacksonville, Flórida, ao presidente Coolid-


ge para a libertação de Garvey da prisão expressou a mesma ideia de forma mais
pungente – “O mundo nunca teve um personagem, enquanto protagonista, como
Marcus Garvey, um dos mais inspiradores e corajosos idealistas da história. E esse
Marcus Garvey é tudo que o Negro já teve.”⁶⁰ Para a mentalidade oficial de um pro-
curador-geral dos Estados Unidos, tal lealdade era irracional e perturbadora. Ele
explicou sua perplexidade em um memorando ao presidente Coolidge:

A situação apresentada no caso Garvey é bastante incomum. Apesar do fato


de acusação fora projetada para proteger pessoas de cor, a quem Garvey fo-
ra acusado de fraudes por meio de declarações exageradas e incorretas di-
vulgadas pelo correio, nenhuma dessas pessoas aparentemente acredita
que foram defraudadas, manifestamente mantendo toda a sua confiança em
Garvey, e em vez de acusação e prisão do requerente ser um exemplo e
advertência contra uma violação da lei, isto realmente se mantém e consi-
deram-se uma classe, num ato anti-opressão da raça em seus esforços na di-
reção do progresso da raça e de discriminação contra Garvey enquanto ne-
gro. Isso não é de forma alguma uma condição saudável de negócios. ⁶¹

Tal lealdade se manifestava em milhares de cartas, telegramas, petições e


afins, que inundaram os departamentos dos Estados Unido e outros governos sem-
pre que Garvey era tratado injustamente.⁴² Isto manifestava-se também em cenas
como durante o discurso de Garvey no julgamento em 1923 por suposta fraude
postal. Centenas de seus apoiadores se ajoelharam, oraram, lamentaram e ameaça-
ram ou testemunhas. O camburão de polícia que levava Garvey para a prisão foi
obstruído por cerca de trezentas pessoas e, na linguagem pitoresca do New York
Times, “vários negrescos mostraram emoção marcante.”⁴³ Este artigo ficara tão
perplexo diante destas manifestações de devoção quanto havia ficado o procura-
dor-geral dos Estados Unidos, e, em editorial intitulado “A Hero More Sorry Uni-
maginable”, repreendeu os apoiadores de Garvey: “Certamente deveria existir inte-
ligência suficiente entre as pessoas de cor para ver que Garvey tratou suas piores e
mais fracas qualidades, não suas melhores e mais fortes.” ⁶⁴ Essa lealdade também
se manifestou no fato de que apenas cerca de dezoito pessoas dos trinta e cinco mil
acionistas da Black Star Line escrito por funcionários do governo dos Estados Uni-
dos que apreenderam livros da empresa estavam dispostos a concordar que esta-
vam insatisfeitos com as operações da empresa. Todos os dezoito eram, pensava
Garvey, empregados do governo.⁶⁵ Muitos desses mesmos acionistas estavam en-
tre aqueles que subscreviam USD$ 4.400 para um fundo de defesa na mesma noite
de sua prisão.⁶⁶ Tais feitos de angariação de fundos eram bastante comuns. Em
1921 Garvey arrecadou cerca de US$ 25.000 na Costa Rica, a maior parte em qua-
renta e oito horas.⁶⁷ A United Fruit Company em Puerto Barrios, Guatemala, infor-
mou a venda de saques destinados à UNIA e Black Star Line de $ 2.941,08 entre
novembro de 1921 e fevereiro de 1922. Este valor foi considerado um eufemismo.
À população de Puerto Barrios foi dada apenas USD$2.400.⁶⁸ Dentro de um ano de
sua libertação sob fiança em 1923, Garvey é dito ter coletado 150.000 balboas de
seguidores no Panamá.⁶⁹

Sobre tais manifestações de lealdade, o colunista do Negro World S. A.


Haynes, concluiu que Garvey havia demonstrado duas coisas, evidentemente, que
Negros podiam ser organizados, e que eles estavam de fato “ansiosos para deposi-
tar confiança e apoiar uma liderança Negra sincera.”⁷⁰ Isto é ilustrado graficamen-
te por um visitante aos escritórios de Garvey no Harlem em janeiro de 1920, que
relatou uma fila de pessoas que se estendia por mais de cem metros ao longo da
135 Street, esperando para ver Garvey, alguns por nenhuma outra razão a não ser
para expressar sua gratidão a ele.⁷¹

Não surpreendentemente, uma lealdade tão feroz e inabalável era muitas


vezes taxada como “fanatismo”, e críticos e inimigos de Garvey não hesitaram em
descrever o estilo de liderança existente na Nação Africana provisória de Garvey
como fascista. Essas acusações foram ajudadas por uma tensão de violência que
parecia correr entre Garveyístas. além das lutas anticoloniais em que estiveram
envolvidos, como os levantes de 1919 em Trinidad e nas Honduras Britânicas. Gar-
veyístas, particularmente nos Estados Unidos, estavam frequentemente envolvidos
em confrontos violentos com civis e grupos rivais. Provavelmente o mais divulgado
de tais casos envolvia o assassinato de um ex-líder da UNIA dos Negros america-
nos, J. W. H. Eason, em Nova Orleans no ano de 1923 depois de ter rompido com
Garvey. W. A. Domingo, ex-Jamaicano editor do Negro World relatou que “na cida-
de de Nova York, já no outono de 1919, levantei a voz em protesto contra o execrá-
vel exagero, a estupidez impressionante, bombástica e abomináveis homicidas do
nosso Barnum Negro, culminando em Thomas Potter sendo agredido, chutado e
preso por Garveístas na primavera de 1920.”⁷² Em agosto de 1920, várias centenas
de Garveístas executaram uma reunião de reavivamento, realizada sob uma grande
tenda na West 138 Street, Harlem, pelo Reverendo Adam Clayton Powell, Sr. A cau-
sa deste distúrbio, era o reverendo Charles S. Morris, missionário veterano de Nor-
folk, Virgínia, cujo sermão continha uma rejeição ao programa de políticas Africa-
nas de Garvey, pois, em sua opinião, as potências colonialistas eram muito coesos
para serem desarticulados. Policiais uniformizados e à paisana tiveram que escol-
tar o Reverendo para casa, e por um outro trajeto, uma vez que a rota mais próxi-
ma passava pelo Liberty Hall.⁷³

W. E. B. Du Bois anexou seu nome à lista de vítimas de violência e ameaças


da UNIA. Ele “não só foi ameaçado com morte por homens que se declaram seus
seguidores [de Garvey], mas recebera cartas de uma imundície tão inacreditável
que eram absolutamente não-publicáveis”. Seus amigos ficaram em choque, ele
declarou, e articularam fornecer-lhe uma polícia secreta de proteção ao desembar-
car nos Estados Unidos de sua viagem à África.⁷⁴ Debates sobre o julgamento de
Garvey às vezes transformavam reuniões pacíficas bem como festas em casa, em
brigas resultando em cortes e outros ferimentos.⁷⁵ Um caso semelhante ao assas-
sinato de Eason ocorreu em Miami, 1928. Aqui uma Laura Champion, ou Laura Kof-
fey, uma auto-intitulada princesa Africana cujos esforços não autorizados de coleta
de dinheiro para filiais da UNIA foram denunciados pela organização, foi assassi-
nada em uma reunião anti-Garvey que estava ministrando. Seus seguidores assas-
sinaram um Garveyísta em retaliação. O presidente e o líder das legiões de divisão
Miami UNIA foram acusados, mas absolvidos, de assassinato em primeiro grau.⁷⁶

O traço violento não foi o único ponto de semelhança entre o Garveyismo e


as doutrinas do fascismo e nazismo, que mais tarde floresceram na Europa. Em seu
nacionalismo feroz, em suas doutrinas de pureza racial, em seus grupos de jovens
doutrinados uniformizados, em sua conversão de multidões em unidades unifor-
mizadas disciplinadas, bem como algumas qualificações de anticomunismo, na ora-
tória apaixonada de seus líderes, na pompa, na atmosfera de excitação em torno de
seus movimentos, o fascismo e o nazismo europeus tinham certas semelhanças
com o Garveyismo. Estas semelhanças não passaram despercebidas aos contempo-
râneos. J. A. Rogers notou estas semelhanças durante uma viagem à Itália de Mus-
solini em 1927. Escrevendo da Itália para o Negro World, ele disse: “A outra coisa
que me fez sentir em casa, como eu disse, era o fascismo, ou devo dizer Mussolini.
Eu vivi a agitação que se assolou em volta de Garvey no Harlem, em 1922. E apenas
fecho meus olhos e ouvidos para a cor, as questões, e assisto a conduta humana
dançando à mesma velha melodia cantada, em palavras diferentes.” ⁷⁷

Dez anos depois, o próprio Garvey contra-argumentou Rogers perante o fa-


to de que a UNIA antecedeu Mussolini com o estilo de governo associado a ele. Dis-
se: “Nós fomos os primeiros fascistas. Tivemos homens, mulheres e crianças disci-
plinados em treinamento para a libertação da África! As massas Negras viram que
neste nacionalismo extremo estava a única esperança e prontamente nos apoia-
ram. Mussolini copiou o fascismo de mim, mas os Negros reacionários sabotaram-
no”.⁷⁸ Em discurso no mesmo ano (1937) proferido no Canadá, Garvey enfatizou o
mesmo ponto – “A UNIA existia antes de Mussolini ou Hitler serem conhecidos.
Mussolini e Hitler copiaram o programa da UNIA – nacionalismo agressivo para o
homem Negro na África.”⁷⁹ Em outras ocasiões, ele apontou que havia pregado a
pureza da raça antes de Hitler, e em 1935 ele disse a um entrevistador em Londres:
“Eles riram de mim porque eu vesti meus seguidores com uniformes e os desfilei
pelas ruas. Mas veja o que Mussolini e Hitler fizeram com camisas e uniformes. Se
eu fosse abandonado, o Negro, também, teria uma camisa.”⁸⁰

Não surpreendentemente, uma lealdade tão feroz e inabalável era muitas


vezes taxada como “fanatismo”, e críticos e inimigos de Garvey não hesitaram em
descrever o estilo de liderança existente na Nação Africana provisória de Garvey
como fascista. Essas acusações foram ajudadas por uma tensão de violência que
parecia correr entre Garveyístas. além das lutas anticoloniais em que estiveram
envolvidos, como os levantes de 1919 em Trinidad e nas Honduras Britânicas. Gar-
veyístas, particularmente nos Estados Unidos, estavam frequentemente envolvidos
em confrontos violentos com civis e grupos rivais. Provavelmente o mais divulgado
de tais casos envolvia o assassinato de um ex-líder da UNIA dos Negros america-
nos, J. W. H. Eason, em Nova Orleans no ano de 1923 depois de ter rompido com
Garvey. W. A. Domingo, ex-Jamaicano editor do Negro World relatou que “na cida-
de de Nova York, já no outono de 1919, levantei a voz em protesto contra o execrá-
vel exagero, a estupidez impressionante, bombástica e abomináveis homicidas do
nosso Barnum Negro, culminando em Thomas Potter sendo agredido, chutado e
preso por Garveístas na primavera de 1920.”⁷² Em agosto de 1920, várias centenas
de Garveístas executaram uma reunião de reavivamento, realizada sob uma grande
tenda na West 138 Street, Harlem, pelo Reverendo Adam Clayton Powell, Sr. A cau-
sa deste distúrbio, era o reverendo Charles S. Morris, missionário veterano de Nor-
folk, Virgínia, cujo sermão continha uma rejeição ao programa de políticas Africa-
nas de Garvey, pois, em sua opinião, as potências colonialistas eram muito coesos
para serem desarticulados. Policiais uniformizados e à paisana tiveram que escol-
tar o Reverendo para casa, e por um outro trajeto, uma vez que a rota mais próxi-
ma passava pelo Liberty Hall.⁷³

W. E. B. Du Bois anexou seu nome à lista de vítimas de violência e ameaças


da UNIA. Ele “não só foi ameaçado com morte por homens que se declaram seus
seguidores [de Garvey], mas recebera cartas de uma imundície tão inacreditável
que eram absolutamente não-publicáveis”. Seus amigos ficaram em choque, ele
declarou, e articularam fornecer-lhe uma polícia secreta de proteção ao desembar-
car nos Estados Unidos de sua viagem à África.⁷⁴ Debates sobre o julgamento de
Garvey às vezes transformavam reuniões pacíficas bem como festas em casa, em
brigas resultando em cortes e outros ferimentos.⁷⁵ Um caso semelhante ao assas-
sinato de Eason ocorreu em Miami, 1928. Aqui uma Laura Champion, ou Laura Kof-
fey, uma auto-intitulada princesa Africana cujos esforços não autorizados de coleta
de dinheiro para filiais da UNIA foram denunciados pela organização, foi assassi-
nada em uma reunião anti-Garvey que estava ministrando. Seus seguidores assas-
sinaram um Garveyísta em retaliação. O presidente e o líder das legiões de divisão
Miami UNIA foram acusados, mas absolvidos, de assassinato em primeiro grau.⁷⁶

O traço violento não foi o único ponto de semelhança entre o Garveyismo e


as doutrinas do fascismo e nazismo, que mais tarde floresceram na Europa. Em seu
nacionalismo feroz, em suas doutrinas de pureza racial, em seus grupos de jovens
doutrinados uniformizados, em sua conversão de multidões em unidades unifor-
mizadas disciplinadas, bem como algumas qualificações de anticomunismo, na ora-
tória apaixonada de seus líderes, na pompa, na atmosfera de excitação em torno de
seus movimentos, o fascismo e o nazismo europeus tinham certas semelhanças
com o Garveyismo. Estas semelhanças não passaram despercebidas aos contempo-
râneos. J. A. Rogers notou estas semelhanças durante uma viagem à Itália de Mus-
solini em 1927. Escrevendo da Itália para o Negro World, ele disse: “A outra coisa
que me fez sentir em casa, como eu disse, era o fascismo, ou devo dizer Mussolini.
Eu vivi a agitação que se assolou em volta de Garvey no Harlem, em 1922. E apenas
fecho meus olhos e ouvidos para a cor, as questões, e assisto a conduta humana
dançando à mesma velha melodia cantada, em palavras diferentes.” ⁷⁷

Dez anos depois, o próprio Garvey contra-argumentou Rogers perante o


fato de que a UNIA antecedeu Mussolini com o estilo de governo associado a ele.
Disse: “Nós fomos os primeiros fascistas. Tivemos homens, mulheres e crianças
disciplinados em treinamento para a libertação da África! As massas Negras viram
que neste nacionalismo extremo estava a única esperança e prontamente nos apoi-
aram. Mussolini copiou o fascismo de mim, mas os Negros reacionários sabotaram-
no”.⁷⁸ Em discurso no mesmo ano (1937) proferido no Canadá, Garvey enfatizou o
mesmo ponto – “A UNIA existia antes de Mussolini ou Hitler serem conhecidos.
Mussolini e Hitler copiaram o programa da UNIA – nacionalismo agressivo para o
homem Negro na África.”⁷⁹ Em outras ocasiões, ele apontou que havia pregado a
pureza da raça antes de Hitler, e em 1935 ele disse a um entrevistador em Londres:
“Eles riram de mim porque eu vesti meus seguidores com uniformes e os desfilei
pelas ruas. Mas veja o que Mussolini e Hitler fizeram com camisas e uniformes. Se
eu fosse abandonado, o Negro, também, teria uma camisa.”⁸⁰

A questão do fascismo foi recorrente nas várias publicações de Garvey. Em


1923, por exemplo, o New York Amsterdam News citou um editorial do Negro
World que afirmava que a UNIA havia realizado uma revolução sem sangue mais
ampla que o fascismo.⁸¹ Em 1929 o Blackman editorializado, enquanto Garvey es-
tava na prisão, que “Marcus Garvey é o Mussolini da Raça Negra e nenhum outro
Negro pôde ou conseguiu igualar-se a ele como lutador pelas liberdades e direitos
de um povo.”⁸² O próprio Garvey identificou um característica que admirava em
Mussolini, como governar com punhos de ferro, que Garvey considerou necessário
em alguns estágios da história.⁸³

O interesse de Garvey por Hitler coincidiu com sua ascensão à influência na


Alemanha. De fato, mesmo antes da jornada de Hitler ao poder, Garvey, em uma
visita a Alemanha em 1928, ele ficou impressionado com a meticulosidade e disci-
plina alemã. Ele sugeriu que os negros poderiam absorver essas qualidades de
forma lucrativa.⁸⁴ Em 1932, o editor de seu New Jamaican elogiou o papel de Hitler
como patriota, uma visão que Garvey compartilhava.⁸⁵ Garvey esperava que a Raça
Negra produzisse um Hitler, e que os Negros se familiarizassem com as ideias de
Hitler. Em 1934, porém, consciente de sua própria experiência nos Estados Unidos
e Jamaica, ele concluiu que um Hitler negro poderia ser permanentemente bem
sucedido apenas na África, pois a África proporciona uma melhor oportunidade
para um apelo nacionalista, do que áreas Africanas em diáspora.⁸⁶

A admiração de Garvey por Hitler e Mussolini não era, no entanto, desquali-


ficada. Sua admiração baseava-se na consideração objetiva de estilo político e filo-
sofia. Ele era sábio demais para não perceber, no entanto, que suas teorias poderi-
am significar apenas ruína para a África, e se opunha a eles totalmente. Já em 1924
ele enviou um telegrama para Mussolini da Fourth International Convention of
Negro Peoples of the World, solicitando uma mudança nas políticas de Mussolini
sobre África e autodeterminação para colônias italianas.⁸⁷

Sua dupla inclinação entre apoio limitado e uma oposição hostil à Hilter e
Mussolini podem ser melhor explicadas por uma declaração de 1933 sobre Hitler:

Adolph Hitler, o chanceler alemão, não pode ser confundido como


qualquer patriota...

...Estamos interessados em Hitler apenas do ponto de vista em que a


Alemanha ocupa em relação a nossa raça. É evidente que se Hitler odeia o
judeu, ele também odeia o negro...

Embora o admiremos como nacionalista alemão, ou melhor, patriota, não


devemos fazê-lo em detrimento do nosso nacionalismo ou patriotismo, por-
tanto, seria muito imprudente para nós encorajar alguém a a ter visões tão
extremas quanto Hitler. Agora, Hitler defende uma Alemanha Superior, que
é seu direito e o negro deve defender uma África Superior, que também é
seu direito.⁸⁸

Sua oposição à Mussolini foi cunhada em termos semelhantes.⁸⁹ E um edito-


rial do Negro World de 1928 argumentava que Mussolini não estava apenas ciente
de Garvey, mas o considerou uma ameaça aos planos de imperialismo italiano na
África. O editorial citava um discurso em que Mussolini referiu-se a um motim no
Harlem: “Há um grande bairro em Nova York chamado Harlem onde a população é
exclusivamente negra. Um grande motim quebrou lá em julho passado que, depois
de uma noite inteira de conflito sangrento, foi finalmente controlado pela polícia,
contra aquela massas de Negros”. O editorial comentava que o relato de Mussolini
foi exagerado e representava uma advertência indireta ao Estados Unidos, que a
consciência racial Afro-Americana era uma ameaça à seus esquemas na África, es-
pecialmente porque ele sabia que o programa de Garvey saiu do Harlem. O editori-
al continua: “Ele pode não se referir a Marcus Garvey pelo nome, mas os Negros do
mundo todo sabem que ele respeita Garvey como a força de impedimento mais
potencial nos planos de colocar suas mãos-de-ladrão na riqueza da África.” Termi-
nava em tom profético: “Estamos um pouco confusos, em comum com outros es-
pectadores, em relação as atitudes de Ras Tafari para com o antigo inimigo da
Etiópia, mas vamos julgar precipitadamente."⁹⁰

Quando Mussolini invadiu a Etiópia em 1935, a oposição de Garvey tornou-


se mais estridente, e praticamente todas as edições de seu Black Man eram ador-
nadas de artigos e poemas hostis. O seguinte, chamado “O Cheiro de Mussolini, é o
mais comum:

Que todos os italianos vivam e morram de vergonha,


Pelo que o Cachorro Louco deles fez ao nosso querido lar:
O nome sangrento e selvagem de seu Mussolini
Fede de Addis até a pecaminosa Roma...

Marcharemos para esmagar o cão italiano,


E nas pontas de espadas reluzentes e brilhantes,
Vamos deitar bem baixo o violento porco romano.⁹¹

O conceito de nacionalidade de Garvey foi, portanto, extremamente articu-


lado. Era uma nação provisória, aguardando o momento da libertação da África.
Dentro de talvez cinquenta anos, conjecturou Garvey, enquanto W. E. B. Du Bois e a
NAACP estavam para “enviar petições ao Congresso pedindo-lhes para introduzir
outro Dyer Anti-Lynching Bill, Marcus Garvey e o A UNIA estará subindo a Baía de
Hudson com uma flotilha de navios e cruzeiros de guerra, para aterrissar nosso
primeiro embaixador, e enquanto eles apresentaram projetos de lei no Congresso,
seremos entretidos na Casa Branca como sendo os primeiros embaixadores da
grande república Africana. E deixe-me lhes dizer, eles vão nos ouvir muito mais.”⁹²

Não pode haver dúvida de que a suposição de nacionalidade de Garvey pre-


enchia um grande vazio na vida dos negros, principalmente durante seus períodos
mais anos prósperos. Quase em nenhum lugar do mundo os negros nessa época
tiveram um governo de sua própria raça. A UNIA, alcançando como fez todas as
áreas onde os Negros viviam, semeou as sementes do nacionalismo e por vezes até
atuou como um governo provisório.

NOTAS

1. Negro World , January 30, 1926.


2. Blackman, December 30, 1929.
3. Negro World, February 24, 1923.
4. Blackman, September 7, 1929; Negro World, August 3, 1929.
5. Amy Jacques Garvey, ed., The Philosophy and Opinions of Marcus Garvey
(London: Frank Cass, 1967), II: 140; Negro World, August 25, 1923. The anthem
was composed by Arnold J. Ford, UNIA musical director, in 1919.
6. N e g r o W o rld , February 4, 1928.
7. Black Man 2 (July-August 1936): 18.
8. “ New Flag for Afro-Americans,” Africa Times and Orient Review 1
(October 1912): 134.
9. Negro World, March 19, 1927 (reprint of a 1921 speech).
10. Universal Black Men Catechism (n.p., n.d.), p. 37.
11. National Civic Federation Papers, New York Public Library,
Box 152.
12. N e g r o W o rld , June 14, 1924.
13. Mary Benson, South Africa: The Struggle for a Birthright (Middlesex:
Penguin, 1966), p. 46.
14. Donald Barnett and Karari Njama, Mau Mau from Within, (New York:
Monthly Review Press, 1966), p. 75.
15. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 141.
16. New York World, August 18, 1920; New York Times, August 18, 1920.
17. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 141; Catechism, p. 39.
18. Negro World, June 11, 18, 1932.
19. Ibid., December 9, 1922, August 25, 1923.
20. H. G. Armstrong, H. M. Consul General, New York, to H. M.
Charge d’Affaires, Washington, D.C., August 24, 1923, FO 371/8513,
Foreign Office Records, Public Record Office, London.
21. Negro World, October 27, 1928.
22. Petition of the Universal Negro Improvement Association and African
Communities’ League to the League of Nations, Geneva, Switzerland. n .p.-copy in
RG 59, 800.4016/19, National Archives, Washington, D.C.
23. Sce.e.g., Negro World. October 27, 1928; August 3, 1929; November 14,
1931; J. V. Wilson, League of Nations to William Strang, Foreign Office, and related
correspondence, May 1934, FO 371/18505.64
24. Cyril Crichlow to Garvey, “ Special Personal Report,” June 24, I
1921, RG 59, 882.00/705.
25. Governor of Bermuda to Secretary of State, Colonial Office,
November 2, 1920, C 0318/356, Colonial Office Records, Public Record
Office, London.
26. Negro World, January 26, 1924.
27. Ibid.
28. Marcus Garvey and P. L. Burrows, Secretary-General of the UNIA to Rt.
Hon. J. H. Thomas, H. M. Colonial Secretary, January 2S, 1924, CO 554/64.
29. Minutes, February 13, March 6 , 1924, CO 554/64.
30. Ibid., private secretary of the Secretary o f State, Colonial Office to T
obitt, March 8 , 1924.
31. Negro World, April 5, April 19, May 10, 1924.
32. Ibid., May 19, 1925.
33. Ibid., February 2 , 1924. A correspondent from Santiago de Cuba says
that Jamaican UNIA members control the dispensing jobs in many hospitals and
use their positions to provide medical care for Haitians and Jamaicans.
34. Charles Bain, Governor of Barbados, to Secretary of State, Colonial Of-
fice, January 16, 1923, FO 371/8450.
35. Governor L. Probyn Jo Duke of Devonshire, Secretary of State, April
25,1923, FO 371/8450.
36. Governor Wilson of Trinidad to Secretary of State, 20 January 1923, FO
371/8450.
37. Under Secretary of State, Colonial Office to Under Secretary of State,
Foreign Office, 29 May 1923, FO 371/8450.
38. Negro World, August 4, 1928\ Blackman, June 28, 1930.
39. RG 59, 837.00-G eneral Conditions/27; New York Times, January 30,
1930, January 31, 1930. Some branches were reopened six months U let-Bfockman,
June 28, 1930.
40. F. Gordon, H.M. Consul, Port Limon, Costa Rica to A. P. Bennett, H.B.M.
Minister, San Jose, Costa Rica, May 9, 1921, FO 371/5684; ibid., Governor Eyre
Hutson of British Honduras to Secretary of State, 1 Colonial Office, 14 July 1921.
41. Negro World, July 9, 1932.
42. Ibid., October 3, 1925.
43. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 74-76.
44. Negro World, October 3, 1925.
45. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 72.
46. D a ily W o r k e r , August 12, 1924 ; B la c k m a n , September 5, 1929.
47. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 72.
48. Blackman, January 8, 1930; see also New Jamaican, September 6, 1932.
49. Blackman , May 29, 1929.
50. Blackman , 1, (January 1934): 14.
51. N e g r o W o rld , December 15, 1923.
52. Ibid., February 2, 1924.
53. Ibid., January 12, 1924.
54. Ibid., February 2, 1924.
55. N e w J a m a ic a n , October 12, 1932.
56. B la c k m a n , April 3, June 4, June 7, 1929.
57. Clements Kadalie, My Life and the ICU (New York: Humanities press,
1970), p. 125 \ Negro World , August 20, 1927;George Shepperson, III Sylvia
Thrupp, ed., Millennial Dreams in Action (The Hague; Mouton Klid Co., 1962), p.
153. Kadalie and the Negro World give the country of importation as Rhodesia;
Shepperson says they were im ported into Nyusaland.
58. N e g r o W o rld , September 3, 1927.
59. Ibid., May 9, 1925.
60. Ibid., June 25, 1927.
61. John Sargent, Attorney General to the President, “In the Matter of the
Application for Commutation of Sentence of Marcus Garvey,” November 12, 1927,
RG 204, 42-793, National Archives.
62. See, e.g., the many thousands of these still retained in RG 60; 198940; RG
204,42-793; National Archives Sen. 69A-J25, Senate Judiciary Committee, 69th
Congress-Petitions; also Negro World, December 19, 1925, and B la c k m a n , Oc-
tober 10, 1929.
63. New York Times, June 22, 1923; New York Herald, June 23, 1923; Ne-
groWorld, June 30, 1923; Lenford Sylvester Nembhard, Trials and Triumphs of
Marcus Garvey (Kingston: The Gleaner Co., Ltd., 1940), p 88.
64. New York Times, July 3, 1923.
65. Marcus Garvey, Speech Delivered by Marcus Garvey at Royal (London:
Poets and Painters Press, 1968), p. 13.
66. Bruce to Editor, T h e W o rld , January 17, 1922, Bruce Papers, HI. 27,
Schomburg Collection, New York Public Library.
67. F. Gordon, H. M. Consul, Po-t Limon, Costa Rica, to A. P. Ilennelt, H. B. M.
Minister, San Jose, Costa Rica, May 9, 1921, FO 171/5684.
68 . American Consul, Guatemala City, to Secretary of State March 9
1922, RG S9, 811.108 G 191/27, Records of the Department of State, Na-
tional Archives.
69. “ Panama and Canal Zone,” annual report, 1924, FO 371/10632.1
70. Negro World, May 6 , 1933.
71. Hugh Mulzac, A Star to Steer By (New York: International Publishers,
1972), p. 81.
72. “The Policy of the Messenger on West Indians and American Negroes-W.
A. Domingo vs. Chandler Owen,” Messenger (March 1923):
73. New York Age, August 28, 1920.
74. W. E. B. Du Bois, “ A Lunatic or a Traitor,” Crisis 28 (May 1924): 75.
New York Amsterdam News, June 27, 1923; February 18, 1925 lb . New York
Times, March 21, \92B\Negro World July 14 1928-July 21, 1928; July 28, 1928.
77. Negro World, May 21, 1927.
78. J. A. Rogers, World’s Great Men o f Color (New York: J. A. Rogers/1947),
p. 602. Garvey said this during a conversation with Rogers in London in 1937.
79. Black Man 2 (December 1937): 12.
80. Ibid., (September-October 1936): 2; New York Amsterdam News} Au-
gust 31, 1935.
81. New York Amsterdam News, September 19, 1923.
82. Blackman, December 14, 1929.
83. Ibid., April 4, 1929.
84. Negro World, August 25, 1928.
85. N ew Jamaican, July 28, 1932. Black Man, 1 (January 1934): 13.
86 . Black Man, 1 (March-April, 1934): 3.
87. Negro World, August 9, 1924.
88 . Black Man 1 (December 1933): 2.
89. Blackman, April 16, 1929;Negro World, May 7, 1932.
90. Negro World, October 6 , 1928.
91. Black Man 2 (July-August 1936): 9.
92. Negro World, February 24, 1923.
4
Religião

Deus, nos assuntos de homens, está do lado do batalhão mais forte.

– Marcus Garvey¹

... apesar de todas as evidências ... Negros ainda acreditam que Garvey
não está morto. O que está errado? Ele era imortal? Não era ele humano e
sujeito à doença e à morte como o resto de nós?

– S. V. Smith, tesoureiro,
Harmony Division, Jamaica²

Em março de 1917, a Champion Magazine, com sede em Chicago, publicou-


sobre a necessidade de uma religião que inspirasse o homem Negro a fazer mais
por si próprio. Observava que, “Do ponto de vista secular, tanto Booker T. Wa-
shington como Dr. Du Bois, com suas diferentes escolas de pensamento, supriram
esta necessidade”. No entanto, continuou o artigo, “tais crenças não penetram tão
profundamente na natureza de um homem como aqueles inspirados por seu eu
espiritual”. O editorial continuou com um apelo apaixonado: “O negro está claman-
do por um Maomé, que um Profeta venha e lhe entregue o Alcorão do bem-estar
econômico e intelectual. Onde ele está?" ³ Um artigo de Garvey havia aparecido
nesta revista dois meses antes,⁴ e nos próximos dois anos ele estaria a caminho de
responder por esse apelo.

Garvey tinha contato frequente com a religião durante seus primeiros anos.
Aos sete anos de idade ele supostamente gostava de fazer o papel de pregador en-
tre seus colegas. Menino, também, ele tocava órgão na Wesleyan Methodist Church
em St. Ann's Bay, Jamaica, a igreja de onde pertenciam seus pais.⁵ Garvey mais tar-
de se converteu ao catolicismo, o que não o impediu de seguir uma linha indepen-
dente em assuntos religiosos.

Como muitos dos grandes revolucionários e transformadores do mundo,


Garvey sonhou sonhos, teve visões, e muito antes de seus sonhos assumirem o
mundo ele estava imbuído de uma premonição autoconsciente de grandeza imi-
nente. Esse fenômeno, aliado ao seu fascínio por religião e ritual religioso, deu à
sua carreira uma qualidade messiânica que ele próprio não estava relutante em
expressar. Ele não se detinha em comparar seus feitos à própria carreira de Jesus
Cristo. Ao fazê-lo, no entanto, ele tentava recapturar o que ele considerava ser o
progresso e essência revolucionária da igreja cristã primitiva. No que lhe dizia res-
peito, Cristo foi o líder de um movimento de massa para a elevação dos pessoas
oprimidas, e ele também. Isso explica por que ele poderia ser pró-religioso e eu
muitas vezes anticlero ao mesmo tempo. A doutrina de Cristo, explicava, “era sim-
ples, mas revolucionária. Ele lançou as bases de um democracia pura e estabeleceu
o fato, não uma teoria, sobre Fraternidade Universal do Homem."⁶ E assim como
ele se viu no papel de messias, ele viu que sua doutrina de nacionalismo Negro co-
mo algo que sobreviveria e prosperaria eu mesmo em face da perseguição. Uma
citação poética favorita na UNIA entre oradores era o bordão: “A verdade esmaga-
da à terra, ressuscitará novamente”.⁷

Esse aspecto espiritual do movimento de Garvey o distinguiu dos movimen-


tos contemporâneos mais importantes de objetivos semelhantes. O sentimento
universal de opressão e ressentimento vivenciado pelos Negros em sua sujeição
mundial ao colonialismo e à opressão não pode ser supracitado. A incrível capaci-
dade de Garvey de abranger todo este sentimento racial mundial amplo e obter
sucesso espetacular com que teve em canalizá-lo de forma organizacional, liberou
emoções de esperança e apreciação entre os negros de forma imensurável. Segui-
dores e admiradores de Garvey, regularmente o saudavam como “o profeta mais
poderoso que apareceu entre nós em cinquenta anos”, um grande mestre religioso,
um João Batista.⁸

Eles regularmente o comparavam a Cristo. Como Cristo, ele foi traído por
dinheiro e condenado pelos governos. E seu evangelho, também, seria pregado a
todas as nações e precipitaria o fim da barbárie.⁹ Um pregador escreveu um livro
no qual dissertou que Garvey havia trazido à raça a UNIA através da instrumenta-
lidade de Deus.¹⁰ Garveyístas de Colón, Panamá, buscando a libertação de seu líder
da prisão no Estados Unidos, informou ao presidente Coolidge que “Nós, os Negros
do mundo vemos Garvey como um super-homem; um semideus; e como o reencar-
nado Anjo da Paz, que veio do Céu para dar a Salvação Política” a um povo oprimi-
do. “Sim,” esta mensagem continuou, “nós amamos Garvey semelhante a nosso
deus.”¹¹ Uma divisão de Nova York chegou a canonizar Garvey em vida, após sua
expulsão dos Estados Unidos.¹² Essa tendência de apoteose a Garvey encontrou
expressão nas palavras do Credo da UNIA: “Cremos em Deus, o Criador de todas as
coisas e pessoas, em Jesus Cristo, Seu Filho, o Salvador Espiritual de toda a huma-
nidade. Nós acreditamos em Marcus Garvey, o líder dos povos Negros do mundo, e
em no programa enunciado por ele através da UNIA... a redenção da África”.¹³ Um
credo semelhante encontrou seu caminho em uma Igreja nacionalista Sul- Africa-
na: “Cremos em um Deus, Criador de todas as coisas, Pai da Etiopia… a quem
Athlyi, Marcus Garvey e colegas vieram salvar? Os filhos oprimidos da Etiópia, para
que pudessem se tornar grande poder entre as nações”.¹⁴ Foi coerente, com essa
veneração que alguns dos seguidores de Garvey a princípio se recusaram a acredi-
tar nos relatos de sua morte (em parte devido ao fato de que os primeiros relatos
de seu falecimento foram na verdade, falsos) e teria de se ter certeza de que Garvey
realmente havia falecido, mas permanecera em espírito para compartilhar as ale-
grias e tristezas de seu povo.

Garvey não se entregou à religião por si só, no entanto, mas a usou como se
usa a arte, para promover seu programa de orgulho racial e autodeterminação. Seu
uso político da religião começou pelo simples argumento de que se, como prega-
vam as igrejas cristãs estabelecidas, o homem foi feito à imagem semelhança de
Deus, então os homens negros devem representar um Deus em sua própria ima-
gem e semelhança, que inevitavelmente seriam Negros. Garvey apontou que a prá-
tica dos Africanos do hemisfério ocidental em adorar um Deus de outra raça tinha
poucos paralelos em qualquer outro lugar. Era bastante normal para um povo vi-
sualizar e retratar seus deuses em sua própria cor. O tingimento de um deus bran-
co para pessoas negras era, portanto, uma distorção branca. Um colega próximo a
Garvey, o bispo George McGuire, reforçou seu argumento ao apontar que Cristo
era historicamente marrom-avermelhado, ao invés de branco. E, além disso, se
Cristo viesse a Nova York, ele não teria permissão para morar na Riverside Drive,
mas teria que residir em Harlem por causa de sua cor.¹⁵ Garvey reforçou essa visão
com o argumento que “Porque Ele veio como uma personificação de toda a huma-
nidade, e por isso foi colorido”, Cristo foi perseguido.¹⁶

Essa faceta do pensamento de Garvey, como a maioria das outras, foi levada
a sua conclusão lógica. Numa cerimônia religiosa que marca o encerramento da
International Convention of Negro Peoples of the World de 1924, Jesus Cristo foi
canonizado como “Homem Negro das Dores” e a Virgem Maria como uma “Madona
Negra”. A convenção também concordou em “A Idealização de Deus como Espírito
Santo, sem forma física, mas uma criatura do imaginário da raça negra, sendo de
igual imagem e semelhança”. Garvey alegou que isso não significava que a UNIA
estava embarcando em uma nova religião. Estava simplesmente corrigindo o erro
de séculos.¹⁷

O Deus negro de Garvey suscitou repreensões de uma seção transversal do


tipos de pessoas que se opuseram a seus outros programas. O pastor da St. Philips
Colored Episcopal Church no Harlem considerou a ideia absurda. Garvey estava,
em sua opinião, levando a raça ao ridículo. Um escritório estrangeiro britânico ofi-
cial considerou que este programa religioso “bate a banda”. Outro constatou que “o
bispo McGuire parece ter tirado algumas de suas ideias de Chartres.” A professora
Kelly Miller, da Howard University, concordou que Deus era tão preto quanto
branco, mas achava que o meio-termo não coincidia com a “alternativa vingativa
de Marcus Garvey”. Um correspondente ao New York Times apontou que índios e
Africanos no Brasil há muito tempo retratavam Cristo como Negro, mas sem o que
ele considerava da animosidade racial de Garvey.¹⁸

Como a religião para Garvey era eminentemente política, o Deus negro da


UNIA diferia de muitos outros deuses cristãos na medida em que ele era um Deus
de autossuficiência. O Deus da UNIA se preocupava com o espírito de assuntos es-
pirituais. Ele tratava todas as raças igualmente e as deixou à sua própria disposição
para resolver o problema da sobrevivência. Parecia que Garvey, tendo em conta a
sua própria formação religiosa e atento a posição intrínseca da religião na vida das
pessoas Pretas, optou por canalizar este fervor religioso ao caminho da salvação
racial, ao invés de lutar contra. Logo ele incessantemente repetia esta mensagem:
“Acusamos Deus de muitas coisas que ele nem sabe que existe.”¹⁹ Ele estava con-
vencido de que num mundo extremamente materialista, meros preceitos religiosos
não divagariam os corações daqueles no poder. Ele até ironizou sugerindo que se
ele pensasse que a religião sozinha daria conta de realizar justiça para o homem
Preto, ele seria bispo.²⁰
Essa diferença entre a religião de Garvey e o cristianismo convencional não
foi por acidente. Ele considerava o cristianismo branco como sinônimo de hipocri-
sia, e agrediu negros até entregarem o mundo ao homem branco, pelo duvidoso
privilégio de receber Jesus: “O homem branco pega o mundo e descarta de Jesus!
Você não sabe que o homem branco tem o direito de um Jesus também? Jesus per-
tence a todos, então você é tolo para em desistir do mundo e ficar com Jesus so-
mente.”²¹ Assim, quando, durante a International Convention anual de 1922, em
Nova York, uma sociedade bíblica branca pretensiosamente ofereceu Bíblias gra-
tuitas aos delegados, a oferta foi recusada e sugerida de que que eles fossem envi-
ados para o sul pelos racistas que moravam naqueles bandas, pois todos os delega-
dos já tinham suas bíblias.²² A amargura que Garvey sentia em relação ao cristia-
nismo branco é eloquentemente resumida no editorial da Negro World que ele es-
creveu em 1923:

O Negro está agora aceitando a religião do Cristo real, não o Cristo


que rouba propriedades, rouba ouro e explora diamantes, mas o Cristo de
Amor, Justiça e Misericórdia. O Negro não quer mais a religião do homem
branco e como se aplica à sua raça, pois é uma mentira e uma farsa; é pro-
paganda pura e simplesmente para enganar uma raça e roubar o mundo
precioso, dom de Deus ao homem, que é torná-la exclusivo lar de prazer,
prosperidade e felicidade para quem tem suficiente Inteligência para perce-
ber que Deus os fez senhores de seu destino e arquitetos de seus próprios
destinos.²³.

Em 1937, na mesma linha, Garvey descreveu a si mesmo como um cristão


desvirtuado da igreja por ações como a bênção do papa aos fascistas italianos para
a invasão da Etiópia.²⁴ E aos pastores negros que discriminadamente apoiavam
suas contrapartes brancas, Garvey era igualmente hostil. Ele os considerava de
pouca ajuda para a UNIA, uma vez que resumiam suas atividades principalmente a
pregar e arrecadar dinheiro.²⁵

Durante seu período americano, o programa religioso de Garvey foi refor-


çado e frequentemente implementado pela Igreja Ortodoxa Africana. Enquanto a
UNIA nunca adotou qualquer denominação religiosa específica, cristã ou não, além
de outras instituições, a Igreja Ortodoxa Africana (AOC) foi aproximação mais con-
creta deste estado de coisas. A figura dominante na AOC foi George Alexander
McGuire (também conhecido como George Alexander). Naturalizado americano, e
uma vez ministro da Igreja da Inglaterra em sua terra natal, Antígua e em outros
lugares nas Índias Ocidentais, e mais tarde um episcopal e chapelão geral da UNIA.
McGuire foi ordenado primeiro bispo da AOC em 29 de setembro, 1921, por um
funcionário da Igreja Ortodoxa Russa, depois de devidamente reordenado e eleva-
do ao episcopado no Igreja Católica Americana, a fim de garantir a sucessão apos-
tólica. O Negro World estendeu suas felicitações ao Bispo McGuire por esta ocasião
e lembrou a seus leitores que isso estava de acordo com a decisão de sua recente
convenção para endossar todas as igrejas sob liderança racial, sem se aliar a ne-
nhuma outra. Bispo McGuire renunciou ao cargo de capelão general da UN1A após
a sua elevação ao episcopado.²⁶
Apesar de uma richa com Garvey, que fez com que o Bispo McGuire fosse
afastado da UNIA, a AOC desempenhou um importante papel na disseminação do
Garveyismo na América do Norte, Índias Ocidentais, África e em outros lugares. Foi
o Bispo McGuire quem escreveu o uso do catecismo racial por Garveyístas, repro-
duzido fielmente nas ideias de Garvey (e McGuire, pois parecem ter sido basica-
mente as mesmas) sobre religião e história da religião, bem como os princípios
fundamentais da UNIA. Garveyites, alguns de alto escalão, desempenharam papéis
importantes dentro do AOC. Em 1924, por exemplo, um ex-secretário geral da
UNIA tornou-se vigário geral do a Igreja Ortodoxa Africana.²⁷ Durante o “serviço
sinodal unido” dei o quarto sínodo geral da AOC, realizado no Liberty Hall do Har-
lem em 1924, o Bispo McGuire conferiu o grau honorário de Doutor em Ciências
Leis sobre Garvey.²⁸ Em 1923, com Garvey encarcerado na prisão Tombs em Nova
York, McGuire foi mencionado como um possível sucessor no evento, e que Garvey
deveria ser permanentemente negado fiança.²⁹

O AOC serviu muitas vezes como uma agência de propaganda suplementar


para os UNIA. O Negro Churchman, seu órgão oficial, promoveu regularmente
idéias garveyístas como orgulho racial, colonização na Libéria e coisas semelhan-
tes. Os editoriais de McGuire, “Ex Oriente Lux”, geralmente começavam, “Igrejas de
Descendência Africana, Saudação em Cristo”, que tinha óbvia semelhança com a de
Garvey, “Companheiros da Raça Negra, Saudações”.

As atividades da AOC em territórios colonizados não foram tão menos em-


baraçosas para as autoridades coloniais do que as da própria UNIA, e de fato as
duas eram às vezes representadas pelo mesmo indivíduo. Um sacerdote AOC que
dobrava como chefe da UNIA em Santo Domingo foi deportado daquele país por
insultar a bandeira britânica, enquanto outro, Ven Edward Seiler Salmon, foi de-
portado, segundo a mesma fonte, de Trinidad à Jamaica por incitar tumultos e gre-
ves, além de por articular com trabalhadores das Honduras Britânicas contra a
United Fruit Company. Nesta oportunidade, era também secretário adjunto da
Trinidad Workingmen Association³⁰. A fonte desta informação foi um sacerdote
renegado do AOC, que decidiu informar as autoridades britânicas sobre as ativida-
des de sua igreja. Entre as informações gratuitas assim oferecidas estava o fato de
que o AOC havia ordenado um bispo, muito possivelmente do Canadá, mas que iria
presidir da Nova Escócia sobre as seções das Índias Ocidentais da igreja. Temia-se
que o título de “bispo das Índias Ocidentais” faria colonialistas britânicos impedi-lo
de entrar nas ilhas. McGuire disse a ramificações da AOC nas Índias Ocidentais para
mudarem seus nomes se importunados por autoridades, caso isto lhes permitisse
continuar seu trabalho.

A AOC estava igualmente engajada em várias partes da África. Em 1924 um


pedido de adesão foi aceito por um “Arquidiácono de Pretoria, África do Sul” junto
com sua congregação de quinhentos. Ao aderir, o bispo McGuire teria sugerido que
o arquidiácono ajudou a entrada de Garvey na África do Sul, depois, Bispo McGuire
iria consagrá-lo bispo do Sul África.³¹ Pouco depois, de Griqualand West, África do
Sul, veio a notícia de que um sacerdote AOC pretendia ir a Nova York para partici-
par do próxima convenção internacional e ser elevado ao episcopado por Bispo
McGuire.³² Em 1929, uma filial da AOC foi iniciada na Uganda por Reuben Spartas
Mukasa, um político nacionalista que por algum tempo manteve correspondência
com o Bispo McGuire, além de ser admirador de Garvey.³³

Em 1925, McGuire resumiu sua crença religiosa em poucas palavras:“Eu


acredito em Deus; Eu acredito na raça negra.” E mesmo que aUNIA não fosse uma
religião, ele tinha certeza de que “chegou a hora em que a entendam como um
grande movimento missionário racial abrangente, uma causa sagrada à qual todo
negro deve prestar lealdade indivisa”.³⁴

Como era de se esperar, as reuniões da UNIA eram caracterizadas por ex-


cessos religiosos. Sejam hinos, orações e, às vezes, procissões, e cada unidade tinha
um capelão. Festivais cristãos como Páscoa e Natal eram celebrados, mas, de acor-
do com a reinterpretação de Garvey de Cristandade, eles se voltavam para a causa
do programa de Garvey. Em concurso de Natal no Liberty Hall no Harlem, por
exemplo, Cristo era retratado como uma criança Negra. Para o período anterior à
Páscoa, o projeto UNIA produziu seu próprio filme para substituir as peças da Pai-
xão onde os atores brancos são retratados como Deus. Na Páscoa, Garvey fez seu
discurso anual sobre “The Ressurreição do Negro.”³⁵ Até a prática cristã do batis-
mo teve sua contrapartida, pois o catecismo da associação estipulava que as crian-
ças sejam trazidas por seus pais para serem indicadas pelo capelão de seu divisão o
mais tardar três meses após o nascimento, “quando eles entram como membros
gerais da Organização”. Garvey, o irreprimível, não contente em ser poeta e
dramaturgo da libertação, dedicou-se também à escrita de hinos políticos. Entre
seus versículos religiosos surgiram, inevitavelmente, títulos como “A Nobre Cause
da Liberdade—1834-1934” e linhas como “Nunca mais como esterco o preto Afri-
cano será vendido”³⁶

Garvey levou a sério suas inovações religiosas, e ele e seus colegas ligas
eram intolerantes com excêntricos religiosos que se sentiam atraídos pela organi-
zação. “A U.N.I.A. é inundado com um monte de religionistas”, disse S. A. Haynes,
colunista do Negro World, sobre uma senhora que reclamou que a organização era
sem-deus.³⁷ O próprio Garvey expressou seu desacordo com o Father Divine, que
se proclamou Deus, e sua desaprovação da religião folclórica jamaicana “pocoma-
nia” era um caso surpreendente forte.³⁸ Ele também desaprovava dos “profetas e
profetisas jamaicanas que iam voar em direção ao céu pela solução do problema
dos negros,³⁹ uma aparente referência ao profeta jamaicano Bedward, com quem
Garvey é controversamente comparado.⁴⁰ Uma ocasião Garvey declarou: “Eles en-
viaram o pobre Bedward para o asilo, mas eles terão dificuldade em me enviar pa-
ra lá...”⁴¹

Como dito anteriormente, a UNIA recusou-se a adotar exclusivamente qual-


quer denominação cristã. Essa relutância em dividir a raça ao longo de denomina-
ções internacionais se estendiam às distinções entre religiões. Embora tenha ado-
tado formas cristãs para a UNIA, Garvey considerava diferenças entre religiões
como o cristianismo e o islamismo irrelevantes, uma vez que eram apenas manei-
ras diferentes de adorar a Deus.⁴² Uma cópia antiga do preâmbulo da constituição
da UNIA anexada à correspondência de Garvey para Booker T. Washington se re-
feria à promoção de adoração "cristã". Isso deu lugar, em versões revisadas, para
adoração "espiritual".
Essa tolerância religiosa é interessante à luz da rápida disseminação pós-
Gavey do islamismo entre os Afro-Americanos. Pois a UNIA tratava o movimento
islâmico iniciante com um fórum solidário. Esta tolerância perante o Islã interior
pode ter sido indiretamente devido ao renomado sucessor de Garvey na causa da
redenção africana, Edward Wilmot Blyden. Em seu antigo panfleto, Garvey carre-
gava uma citação do livro de Blyden Christianity, Islam, and the Negro Race, que
ocupava cerca de metade do de suas páginas. A própria citação se referia superfici-
almente ao Islã, mas o livro do qual foi tirada é uma clara expressão da admiração
de Blyden, apesar de Blyden ser um cristão devoto.⁴³

A atitude favorável de Blyden em relação ao Islã também influenciou John E.


Bruce conheceu Blyden (que morreu em 1912) e planejava sua biografia. Em um
discurso para a UNIA Boston, em 1923, Bruce comparou as atitudes cristãs e islâ-
micas à Raça Africana em detrimento aos cristãos. Outra possível fonte para a tole-
rância de Garvey ao Islã pode ter sido Duse Mohamed Ali, que era um proeminente
membro da comunidade Islâmica de Londres.

Na convenção da UNIA de 1922, vários delegados sugeriram que a associa-


ção deveria adotar o Islã como sua religião oficial, já que três quartos do mundo
negro eram os muçulmanos e os muçulmanos eram melhores cristãos do que cris-
tãos. Garvey, é claro, recusou-se a legislar sobre este assunto.⁴⁴ Alguns os escrito-
res do Negro World chegaram ao ponto de ocasionalmente comparar Garvey com
Maomé. Um deles, em 1925, comparou “o profeta de Allah, enviando sua energia
incandescente inesgotável sobre o material espiritual de libertação de seu povo e
'Arauto do Novo Amanhecer', Garvey, enfatiza com igual zelo à redenção material-
espiritual de sua raça”.⁴⁵ Outro, em um hino de louvor intitulado “Sing of Garvey,
Glorify Him, Ye Myriad Men of Sable Hue”, referiu-se a ele como “um filho de Al-
lah”.⁴⁶ Inclusive o Hinário Etíope Universal da organização, compilado pelo rabino
Arnold J. Ford (um líder dos chamados judeus negros do Harlem, nada menos),
continha um hino “Allah-Hu-Ak Bar” baseado em letras africanas.

Entre os muçulmanos que estabeleceram contato aparentemente próximo


com a UNIA durante o período americano de Garvey, muitos eram adeptos do mo-
vimento Ahmadiyya, uma denominação muçulmana fundada no norte da Índia cer-
ca de uma década antes do final do século XIX. Em 1920 o dr. Mufti Muhammad
Sadiq, missionário deste grupo, chegou ao Estados Unidos. Ele comprou uma pro-
priedade em 4448 South Wabash Avenue, em Chicago, parte da qual foi convertida
em mesquita, e começou com o proselitismo.⁴⁷ Em 1923 encontramos Sadiq entre
os convidados na tribuna durante uma reunião no Liberty Hall. Ele havia converti-
do recentemente quarenta Garveyístas em Detroit, uma área de intenso apoio Ah-
madiyya.⁴⁸ Sadiq voltou a Índia em 1923 e foi sucedido por Mohammed Yusuf
Khan, também da Índia. Maulvi Muhammed Din, sucessor de Sadiq como editor do
Moslem Sunrise, do movimento Ahmadiyya, reimprimiu assuntos pró-muçulmanos
no Negro World, que por sua vez carregava seu discurso, “Tem o cristianismo fa-
lhado e o Islã sucesso?”⁴⁹ Din apareceu no Mundo Negro novamente em 1925, des-
ta vez respondendo a alguns editoriais de T. Thomas Fortune que discordava de
Blyden que o Islã era preferível do que o Cristianismo. O argumento de Fortune
baseava-se na suposta superioridade moral de monogamia sobre a poligamia e a
facilidade do divórcio no Islã.⁵⁰ Din se descrevera como pertencente à Missão Mu-
çulmana Ahmadiyya, e apontou que a traição e divórcio entre os monogâmicos
cristãos minam o argumento da Fortune. Fortune permaneceu inflexível, no entan-
to. Um associado editor do Negro World favoreceu a posição muçulmana, e mesmo
Fortune estava em 1926 denunciando “a maneira arrogante em que o cristãos
americanos e europeus estão e têm lidado com os Muçulmanos Africanos e Asiáti-
cos”. ⁵¹

Possivelmente por causa de uma exposição tão favorável no mundo negro, o


Islã continuou a ser um assunto de interesse entre os membros da UNIA nos Esta-
dos Unidos após a deportação de Garvey. Em 1931 a divisão de Cleveland, Ohio,
celebraram um encontro do “Dia de Maomé”, durante o qual eles foram abordados
pelo Dr. Abad M. D. Sty, listado como sendo do Nordeste da África.⁵²

Os muçulmanos Ahmadiyya aparentemente não conseguiram construir um


movimento de massa, mas aqueles muçulmanos que o fizeram também estavam
associados de alguma forma com a UNIA. Tem sido especulado que Elijah Muham-
mad, p líder da mais bem-sucedida dessas organizações muçulmanas, a Nation of
Islã, era um cabo nas fileiras uniformizadas da UNIA Chicago. Outros se lembram
dele como um membro ativo do UNIA Detroit⁵⁴. Muhammad fez alguns de seus
primeiros proselitismos em Chicago, 1933 num Liberty Hall da UNIA.⁵⁵ Ele tam-
bém aparentemente encorajou, ou em pelo menos não se opôs, a ter seu movimen-
to colocado no papel de sucessor do movimento Garvey.⁵⁶ Às vezes também é es-
peculado que Timothy Drew (mais tarde conhecido como Noble Drew Ali), funda-
dor em 1913 dos Moorish-American Science Temples, reconheceu a influência de
Garvey em seu movimento. O movimento de Drew teve como principais documen-
tos teológicos, o Sagrado Alcorão, um composto de ensinamentos da Bíblia, Marcus
Garvey e o Alcorão. Garvey era aparentemente “mencionado em todas as reuniões
como o João Batista do movimento”.⁵⁷ De fato, tão bem-sucedidos foram os Mou-
ros-Americanos em atrair seguidores de Garvey após sua deportação, que Gar-
veyístas da Philadelphia chegaram a escrever para as autoridades do Estados Uni-
dos em 1935 pedindo o retorno de Garvey para combater a usurpação de Gar-
veypor seu grupo. A carta indicava que os Mouros-Americanos estavam induzindo
membros da UNIA “sob o pretexto de que estão fazendo o trabalho de Garvey, já
que não pode mais retornar.” Os líderes Mouros-Americanos constantemente lem-
bravam a seus convertidos das injustiças que acompanhavam o ataque de deporta-
ção a Garvey, e chegou ao ponto de reivindicar autoridade de Garvey, enquanto
denunciando Garveyístas ortodoxos como bandidos que perderam contato com
Garvey.⁵⁸

A essência da religião para Garvey era transmitir orgulho racial. Naciona-


lismo Preto e autoconfiança. A esta luz, a sua vontade de toleraro Islã e a atração
que ele tinha de muçulmanos não são difíceis de entender. De fato, até os judeus
Negros do Harlem poderiam encontrar um lar na UNIA pois o impulso básico de
suas doutrinas se resumia no essencial. Religiões cristãs e não cristãs aprovados
por Garvey todas simultaneamente previram e trabalharam duro para efetuar um
retorno às antigas glórias da Raça Africana. O catequismo UNIA expressou assim:
P. Que previsão feita no Salmo 68 e no versículo 31 e agora está
sendo cumprida?

R. “Príncipes sairão do Egito, a Etiópia logo se estenderá estende


as mãos a Deus”.

P. O que este versículo prova?

R. Que os homens Negros estabelecerão seu próprio governo na


África, com governantes de sua própria raça.

NOTAS

1. Negro World, January 30, 1932.


2. National Negro Voice, July 29, 1941.
3. Champion Magazine 1 (March 1917): 334
4. Ibid., l(January 1917): 267, 268
5. Amy Ashwood Garvey, “Marcus Garvey: Prophet of Black Nationalism,”
n.d., Amy Ashwood Garvey Papers, London, England; J.A. Rogers, World’s Great
Men of Color (New York: J.A. Rogers, 1947), II: 599; James L. Houghteling, Commis-
sioner of Immigration, to Senator Theodore G. Bilbo, n.d. [ca. February 1938], RG
60, 198940, Records of the Department of Justice, National Archives.
6 . Blackman, November 30, 1929.
7. Amy Jacques Garvey quotes it and the stanza from which it is taken in her
The Philosophy and Opinions of Marcus Garvey (London Frank Cass, 1967), II:iii.
8. Arkansas Survey, December 18, 1927; Negro World, December 24, Febru-
ary 19, 1927; March 10, 1923; May 15, 1926; National Negro Voice, July 26, 1941.
9. Negro World, April 4, 1925; speech by Mrs. Bruce, n.d., Bruce
Papers, 69-6, Schomburg Collection, New York Public Library.
10. Rev. Zebedee Green, Why I Am Dissatisfied – Part Two (Pittsburgh,
1924) p.6.
11. UNIA Colón para Presidente Calvin Coolidge, 20 de Junho, 1927, RG 204,
42-793.
12. Negro World, January 10, 1931.
13. Sixth Anniversary Drive, Cincinnati Division, No 146 (1927) pp. 14, 15.
14. Quoted in Tony Martin, “ Some Reflections on Evangelical Pan-
Africanism, or, Black Missionaries, White Missionaries, and the Struggle for African
Souls,” Ufahamu 1 (Winter 1971): 84. The church was Afro-Athlican Conservative
Church.
15. New York Times, August 6 , 1924.
16. Blackman, August 3, 1929.
17. Negro World, June 7, September 6 , 1924.
19. Negro World, January 26, 1924.
20. Ibid., February 24, 1923.
21. The Tribune (British Guiana), May 22, 1921, reprinted from the Gleaner
(Jamaica), March 26, 1921. Enclosure in Governor o f British (hiianu to Secretary of
State, Colonial Office, June 7, 1921, CO 318/364, Colonial Office Records, Public
Record Office, London.
22. Amy Jacques Garvey, Garvey and Garveyism (Kingston: A. J. Harvey,
1962), p. 99.
23. Negro World, November 3, 1923, May 21, 1932.
24. Black Man 2 (January 1937): S.
25. Negro World, February 2, 1924; March 19, 1927-.Black Man, 1 (1934):
10.
26. Negro World, October 8, 1921.
27. Negro World, March 29, 1924.
28. Invitation card to the ceremony in FO 371/9633.
29. New York Amsterdam News, June 27, 1923.
30. Rev. E. Urban Lewis to H. M. Consul, New York, September 24, 1924, H fO
371/9633.
31. Lewis to H. M. Consul, November 1, 1924, FO 371 /9633.
32. Negro World, February 7, 1925.
33. Robert I. Rotberg, A Political History o f Tropical Africa (New ink: Har-
court, Brace and World, 1965), pp. 340, 341.
34. Negro World, December 5, 1925.
35. Ibid., January 3, September 5, 1925; April 7, 1923;Garvey
Philosophy and Opinions, I: 66; Blackman, April 6, 1929.
36. Marcus Garvey, Jr., Universal Negro Im provem ent Association V Con-
vention Hymns ((K ingston), 1934);some of the hymns in here were by Arnold J.
Ford, who compiled the better-known Universal Ethiopian Hymnal (New York:
Beth B'nai Abraham Pub. Co., 1920, 1921, 1923).
37. Negro World. March 19, 1927.
38. Black Man, 1 (late March 1936): 16.
39. Ibid., 2 (January 1937): 12.
40. F..g., Sylvia Wynter, “ Garvey and Bedward,” Sunday Gleaner, F Maich 12,
1972, and related correspondence.
41. Lenford S. Nembhard, Trials and Triumphs o f Marcus Garvey; (King-
ston: The Gleaner Co. Ltd., 1940), p. 117.
42. Blackman, August 31, 1929.
43. Marcus Garvey, A Talk w ith Afro-West Indians-T he Negro Race end Its
Problems (Kingston (? ): African Communities League, 1915 (? )); I liu Blyden's
biography, see Hollis Lynch, Edward Wilmot Blyden (New I Volk: Oxford University
Press, 1967).
44. Negro World, September 2, 1922.
45. Ibid., August 15, 1925. The writer was Randolph P. Mercurius. 1
46. Ibid., June 4, 1927.
47. A. T. Hoffert, “ Moslem Propaganda—The Hand of Islam StretchM Out to
Aframerica,” The Messenger (May 1927): 141, 160.
48. Negro World, September 1, 1923; The Moslem Sunrise 2 (January 1923):
167. I am indebted to Professor Khalil Mahmud of Ibadan University for copies of
this journal.
49. Negro World, January 5, 1924; The Moslem Sunrise 2 (October 1 1923):
263.
50. Negro World, July 18, September 5, 1925.
51. Ibid., October 3, 17, 1925, July 3, 1926.
52. Ibid., August 8 , 1931.
53. Leonard E. Barrett, The Rastafarians (Rio Piedras: Institute of Caribbean
Studies, University of Puerto Rico, 1968), p. 62. The statement was told to Barrett
by Mrs. Amy J. Garvey during an interview.
54. Interview with J. Charles Zampty.
55. Muhammad Speaks, Special Issue (n.d., ca. June 1972], p. 5.
56. See foreword by Daniel Burley, in Elijah Muhammad, Message to the
Blackman in America (Chicago: Muhammad Mosque of Islam No. 2, 1965).
57. Arna Bontemps and Jack Conroy, They Seek a City (Garden City, N.Y.:
Doubleday, 1945), p. 175.
58. Benjamin W. Jones, Secretary of Philadelphia UNIA to Joseph B. Keenan,
Asst. Attorney General, May 21, 1935, RG 60, 39-51-821; for a similar complaint,
see Negro World, April 15, 1933.
Capítulo 5 – História

“Você se arvora o direito de escrever a história restrita aos úl-


timos 500 anos, e simplesmente porque você foi capaz de despejar
tantas toneladas de sua própria história sobre o mundo e os outros
povos não reclamaram nunca, então você acredita que a sua história
reside nisso. Mas muitas das coisas que você , Mr Wells, nós Negros
tratamos como insanidade. Mr H.G.Wells pode restringir o conceito
de civilização em benefício de seu grupo anglo-saxão, mas isso não
significa que os demais povos que reivindicam aquela civilização que
ele atribui aos outros, vão abrir mão facilmente. O homem preto co-
nhece seu passado. É uma passado do qual ele pode ser nobremente
orgulhoso. É por isso que estou em sua frente esta tarde, um homem
preto orgulhoso, que não desejaria ser nada em meio à criação divi-
na, além de um homem preto.”

Marcus Garvey (1)

“Pra fora da Europa fria esses homens brancos vieram

De cavernas, covis e buracos, sem nenhuma fama

Comendo a carne dos próprios mortos e sugando seu sangue

Ruínas das enchentes mediterrâneas

Literatura, ciência e arte eles roubaram

Depois da África já ter medido cada Pólo

A Ásia os ensinou o quanto o aprendizado era importante

Agora eles olham feio , para o trabalho dos chineses...”

Marcus Garvey (2)

Os estudos de Garvey sobre história, parece, ter assumido proporções signi-


ficativas durante sua adolescência, durante seu aprendizado como gráfico. Durante
esse período ele se interessou profundamente pelos heróis pretos do Caribe, entre
os quais Thoussaint L´Overture, líder da Revolução Haitiana, era o seu favorito(3).
Seus primeiros artigos no Tempo Africano e na Revista Oriente, e no Magazine
Campeão mostram esse apreço ela história das Índias Ocidentais(Caribe). Possi-
velmente após a sua primeira viagem pra fora da Jamaica, ele começou a explorar a
história Africana, bem como da Afro-América. Esse interesse na história africana é
claramente demonstrado em um dos seus primeiros escritos, Uma conversa com os
Negros das Índias Ocidentais. Aqui ele recomenda ao público, o estudo sobre
Edward Wilmot Blyden:

“Você que não conhece nada sobre sua ancestralidade, faria


bem em ler os trabalhos de Blinden, um dos nossos historiadores e
cronistas, que tem feito muito para restaurar o prestígio da raça, e
pra desfazer o egoísmo dos historiadores alheios a nós e sua história,
que tem dito tão pouco sobre nós e nos pintado de forma muito in-
justa.(4)”

O conhecimento e o apreço de Garvey pela história de sua raça, foi refor-


çado por muitos dos seus primeiros contatos. Duse Mohamed Ali, foi autor do co-
nhecido trabalho sobre a história do Egito, Na Terra dos Faraós. William H. Ferris,
um dos primeiros editores do Negro World, havia publicado anteriormente The
African Abroad . John Edward Bruce em 1911 estava entre os fundadores da Soci-
edade Negra para Pesquisa Histórica em Yonkers, Nova York, e foi seu presidente.
Essa sociedade disseminava conhecimento histórico e coletava livros raros e ma-
nuscritos relacionados à história do Povo Preto. O crescimento da Sociedade Pan
Africana, é simbolizado pela escolha do Rei Lewanika de Barotesaland como presi-
dente honorário. Duse Mohamed Ali estava entre os memebros correspondentes,
assim como Marie Du Chatellier, de Bocas Del Toro, Panama, que mais tarde foi
uma importante organizadora da UNIA. Essa Sociedade antecedeu em quatro anos
a bem conhecida Associação para o Estudo da História e Vida do Negro, fundada
por Carter G. Woodson. O secretário-tesoureiro da Sociedade Nacional para pes-
quisa Histórica, foi o famoso historiador e bibliófilo Arthr A. Schomburg. Envolvido
no surgimento do Jornal de História Negra, de Woodson, em 1916, Schomburg su-
geriu que esse jornal estaria “roubando o trovão no qual somos pioneiros”(5). O
próprio Woodson, muitos anos depois, se tornaria colunista do Negro World. E en-
tre todas as referências de vida de Garvey, de sua infância na Jamaica, até seus úl-
timos anos na Inglaterra, estava outro dos principais historiadores pretos de sua
época, J.A.Rogers.

História, como tudo mais para Garvey, era algo a ser usado em prol da
emancipação racial. Ele usou a história primeiramente pra estabelecer uma recla-
mação – mostrar que o homem preto vinha sendo injustiçado. Muitos dos seus es-
critos possuíam esse sentido histórico. Em 1938, por exemplo, ele enviou um me-
morando à Comissão Real das Índias Ocidentais, uma instituição do governo britâ-
nico, que estava então investigando revoltas de trabalhadores e tumultos na busca
por igualdade efetiva para os Afro-Caribenhos, as migrações resultantes em busca
de trabalho onde quer que fosse, a usurpação da economia da ilha por raças es-
trangeiras, como forma de explicar os recentes levantes. (6)

A história, de todo jeito, podia também ser utilizada para instilar autoconfi-
ança. Ele frequentemente apontava que em tempos passados os africanos haviam
desfrutado de uma história louvável, e que isso havia sido confirmado por histori-
adores como Heródoto, que pertenceu a uma era que se sentia menos inclinada a
estabelecer mitos de inferioridade africana. (7) Os Africanos não teria, então, nada
para se envergonhar diante das alegações de inferioridade emanadas do mundo
branco. De fato, o povo preto deveria mudar da defesa para a reabilitação enérgica
do seu passado. “O Tempo é chegado”, ele declarou, “para o povo preto esquecer e
deixar pra trás sua admiração de heróis e adoração por outras raças, e começar
imediatamente a criar e demarcar seus próprios heróis. Precisamos canonizar nos-
sos próprios santos, criar nossos próprios mártires, e elevá-los a posições de fama
e honra, homens e mulheres pretas que tenham feito uma contribuição destacada
para nossa história racial”(8)
A insistência de Garvey na natureza progressista do passado preto, era uma
reação às distorções que observou a partir da caneta dos historiadores brancos
nessa era. Ele conduziu, além disso, uma campanha constante contra os escritos
brancos sobre o passado preto. Em 1929 ele declarou que “A história é escrita com
preconceitos, simpatias e antipatias; e nunca houve um historiador branco que
tenha escrito com amor ou sentimento verdadeiro pelo negro”(9). Ele continua: “
Historiadores brancos têm tentado roubar do homem preto seu passado glorioso
na história, e quando algo novo é descoberto que reforça nossa posição e atesta a
verdade da nossa grandiosidade em outras épocas, então isso é sutilmente rear-
ranjado e creditado a alguma outra raça ou povo desconhecido.”(10)

O resgate do passado negro, especialmente do passado mais antigo, e seu


reconhecimento da grandiosidade dos heróis pretos do passado e do presente, não
diminuía a sua admissão de que o homem preto havia falhado nos últimos séculos,
na marcha em direção do progresso material. Ele incorporou isso em uma teoria
cíclica da história, com o intuito de fornecer ao homem preto uma esperança. Como
no caso de todas as grandes teorias revolucionárias, do Cristianismo ao Comunis-
mo, o Garveísmo decreta a invitabilidade de alcançar os seus objetivos finais, obje-
tivos finais, no caso, a ressurgência da raça preta. “ Neste ciclo de coisas, ele perdeu
a sua posição, mas o mesmo ciclo irá conduzi-lo de volta ao seu lugar”(11)

Na tradição dessas grandes correntes filosóficas, entretanto, o sucesso ine-


vitável que espera o homem preto, precisa ser mobilizado por seu próprio esforço.
Em outras palavras, o sucesso seria inevitável, caso o homem preto não se tornasse
complacente, e não cessasse de se envolver constantemente na luta, do modo pro-
posto pelo programa de Garvey. Como o próprio Garvey expressou, “ Estamos per-
to de vencer. O Homem e a mulher preta estão perto de avançar; nada pode Pará-
los, além da morte e deles mesmos.”(12)

A mesma idéia foi expressa sucintamente por Garvey durante um debate


com um representante da 6ª Convenção Internacional dos Povos Negros do Mun-
do, que aconteceu na Jamaica em 1929. O diálogo foi como:

Mr. Garvey: Você não acredita na interpretação literal para “Etiópia


estendendo suas mãos para Deus?

Mr. Bailey: Sim, acredito.

Mr. Garvey: Então como podemos fazer isso sem tentar? (13)

Essa idéia também é central na grande saga poética de Garvey, A tragédia da


Injustiça Branca, que reconta as glória africanas no tempo em que a Europa estava
mergulhada no barbarismo , e cataloga a história européia de genocídio e rapina-
gem. Ela postula a ressurreição inevitável da glória do homem preto, e tremula
uma esperança de paz, no caso de o homem branco mudar logo seus maus modos.
De outra forma, viria o Armageddon.
O interesse de Garvey na história preta difere em um aspecto importante do
de alguns nacionalistas culturais cujas escolas de pensamento ele é constantemen-
te relacionado. Ele evita as armadilhas de viver no passado. Utiliza a história para
estabelecer um apontamento, instilar orgulho preto e apontar um caminho para a
eventual emancipação da raça, e isso é tudo. Ele se recusa uma glória no passado,
às custas de deixar esse exotismo se tornar um obstáculo para a luta em seu pró-
prio tempo. Em 1936 ele diria, “ É uma fato inegável, que o Negro teve um passado
glorioso. Não precisamos nos preocupar com isso agora, porque para além de nos
inspirar com confiança e esperança, não teríamos nenhuma vantagem material em
ficar nisso, porque é o presente que nos confronta na direção do futuro.” (14) Tre-
ze anos antes, ele havia expressado sentimentos similares: “ Podemos voltar três
mil anos e apontar a nossa civilização àquela época. MAS NÓS NÃO PODEMOS VI-
VER NO PASSADO.”(15)

Seu interesse em história era reforçado por um sentimento de profunda


empatia com o sofrimento histórico da raça preta. A expressão a seguir se tornou
típica:

Meu firme propósito, meu único propósito na


vida, é trabalhar pela salvação de minha raça. Por causa dos gri-
tos dos túmulos – eu ouço o choro de 300 anos. O choro de
meus bisavós nos campos de cana e algodão; eu vejo a dureza
do capataz estalando seu chicote em suas costas; Eu os escuto
gritar em agonia mortal: “isso dói, isso dói, isso dói!” Eu os vejo
cair pela chicotada; Eu os vejo cair no chão; Eu os vejo enterra-
dos, e Eu escuto as almas chorosas do céu e das regiões inferio-
res. Eu escuto o choro de minha mãe e pai e de milhões de Ne-
gros que foram brutalizados: “ Vá em frente Garvey! Vá em
frente! Vá em frente”, E então, meu irmão, por conta desse cho-
ro que vem do túmulo, Eu abri mão de todos os desejos materi-
ais; Eu abri mão de todos os prazeres temporais e tenho me de-
dicado aos princípios sagrados da UNIA, a emancipação da Raça
Negra e uma África livre e redimida.(16)

Essa conexão com o passado estava ligada a uma forte consciência da sua
própria importância histórica. Ele frequentemente em termos de como as futuras
gerações seriam inspiradas pelo seu exemplo, bem com pelas gerações passadas,
cujos sofrimentos, não teriam sido em vão.(17)

Não é então, surpreendente, que a história tenha tido um papel importante


nas questões cotidianas da UNIA. O catecismo racial utilizado pela organização era,
de forma geral, um encapsulamento do conhecimento histórico sobre raça. A pri-
meira de suas quatro seções, Conhecimento Religioso, descrevia sucintamente a
África na Antiguidade, com ênfase particular nas referências bíblicas à África e
Africanos.

A segunda seção, Conhecimento Histórico, apresentava um olhar panorâmi-


co da Etiópia, Meroe, Egito, tráfico escravista, escravidão no Novo Mundo e Africa-
nos na América antes de Colombo. Incluía ainda breves apresentações biográficas
de algumas figuras históricas como Edward Wilmot Blyden, James Africanus Hor-
ton e Samuel Lewis de Serra Leoa, o Reverendo Samuel D, Ferguson da Libéria,
Conrad Reeves de Barbados, Toussaint L´Ouverture, Frederick Douglass, Prince
Hall, Alexander Crumell e outros. (18)

J.A. Rogers e Arthur A. Schomburg, palestravam algumas vezes em sedes da


UNIA sobre história Preta(19), e o Do SuperHomem ao Homem, de Rogers, era ofe-
recido com bônus com as assinaturas do jornal Negro World (20) . A Associação
para o Estudo da Vida e História do Negro de Carter G.Woodson era citada favora-
velmente pelos redatores do jornal, e o próprio Woodson tomou a iniciativa de
escrever a Garvey solicitando a permissão para publicar em seu jornal. (22) Wood-
son tinha uma relação igualmente amigável com o jornal diário de Garvey no Har-
lem, o Tempo Negro Diário. John E. Bruce, que trabalhou nesse jornal, era amigo de
Woodson e muitas vezes trazia os esforços historiográficos de Woodson em sua
coluna.(23) Já em 1920 a Declaração de Direitos havia estabelecido que a História
Preta fosse ensinada nas escolas. E quando a organização obteve a Universidade
Liberty, em Virgínia, foi noticiado que esse conteúdo seria devidamente ensinado.
(24) Para os leitores juvenis do Mundo Negro, a vida de figuras pretas famosas co-
mo o artista Bert Williams e o ex-campeão peso pesado de boxe Jack Johnson eram
apresentados em forma de tirinhas de quadrinhos. Os navios da Black Star Line
eram nomeados com nomes de heróis negros, assim como o Hotel Phyllis Wheatley
e a Universidade Booker T. Washington, ambos no Harlem. Esse interesse em his-
tória racial não estava resumido aos Garveítas afro-americanos(25). O próprio
Garvey foi um colecionador de obras de arte africana e em uma ocasião o encon-
tramos passando uma noite com o professor William Leo Hansberry do escritório
da Universidade Howard, revendo imagens da antiga cultura Etíope.(26)

Uma importante caraterística das apresentações de Garvey, que eram ilu-


minadas pelo uso da história, era seu profundo sentimento de humanidade. Ele
trazia a idéia de que as grandes civilizações do passado foram destruídas pelo ma-
terialismo e pela submersão dos valores humanos, ele via para o futuro uma socie-
dade que deveria aprender com esses erros do passado. Nesse ponto, via uma
chance para o homem preto ser o salvador da humanidade. Por conta do homem
preto teria a experiência dupla de sua própria civilização ao longo do Nilo, bem
como da civilização do homem branco, na qual ele atualmente vive. A primeira ha-
via sido destruída pelo materialismo e sentimentos de superioridade racial. A se-
gunda estava em processo de desintegração pelo mesmo motivo. Nessa situação o
homem preto poderia não somente emancipar a si mesmo, mas poderia talvez sal-
var a humanidade nesse ínterin e “salvar a falida civilização da Europa branca”. Ele
poderia fazê-lo pois “O coração do Negro é profundo e sagrado. Mal direcionado,
ele tem sido emocional e sentimental até aqui, mas o resgate da raça em seu subli-
me pensar, possibilitará o impulso direto na direção de um objetivo que irá derra-
mar muitas bênçãos sobre a humanidade.”(27)
Capítulo 6 – Propaganda

O grande homem branco teve sucesso em sub-


meter o mundo, forçando a todos a pensar da sua ma-
neira, do seu Deus ao seu lar. Ele deu ao mundo, da Bí-
blia às páginas amareladas de seus jornais, uma litera-
tura que estabelece seu direito e soberania, para a des-
vantagem do resto da raça humana.

A propagando do homem branco o tornou mes-


tre do mundo e todos aqueles que entraram em contato
com isso e aceitaram , se tornaram seus escravos.

A Associação Universal para o Progresso do


Negro, está agora convocando os 400.000.000 de
membros de nossa raça, para descartar a psicologia e
propagando de todos os outros povos , para avançar a
nossa própria. O homem branco ensinou que o melhor
do mundo foi projetado por ele, e agora nós ensinamos
que todas as belezas da criação são dos homens pretos,
e que ele deve possuir tudo aquilo que Deus deu para o
homem.

Marcus Garvey (1)

Garvey vendeu o Negro para o próprio Negro.

S.A. Haynes (2)

Entre as maiores façanhas de Garvey, estava a profundidade e o sucesso de


seus esforços propagandísticos. Ele a conduziu com sincera auto-consciência , para
opor a propaganda de orgulho racial e nacionalismo, às idéias contrárias de su-
premacismo branco, inferioridade africana, o fardo do homem branco e do destino
manifesto do caucasiano. Garvey quase sozinho desafiou a máquina oficial de pro-
paganda de toda a Europa e dos poderes coloniais da América do Norte, bem como
as miríades de publicações, agências, universidades e afins, que ajudavam na dis-
seminação de informação inimiga do homem preto. “Não temos medo da palavra
propaganda”, ele declarou, “ posto que usamos o termo no sentido de disseminar
nossas idéias entre os Negros de todo o mundo. Não há nada dissimulado nesse
significado.”(3)

Para Garvey, tudo – educação, religião, história, a mídia de notícias- estavam


alinhadas pela raça dominante no intuito de propaganda para perpetuar sua conti-
nuidade no poder. Desse modo, o tempo havia chegado, para o homem preto não
somente tornar sua própria propaganda acessível , mas para também recusar ser
guiado por aqueles que não sofreram e não poderiam simpatizar consigo. Ele disse,
“ cabe ao escravo interpretar os sentimentos do escravo; cabe ao homem desafor-
tunado, compreender o espírito do seu irmão desafortunado; e cabe ao negro so-
fredor, interpretar o espírito do seu camarada.”(4)

O esforço de propaganda feito por Garvey, foi mais franco nos anos de sua
maior glória nos Esatados Unidos. Ele considerava o tumulto da Guerra e seus le-
vantes políticos, a Revolução Russa e os rumores de autodeterminação para todos
os povos, como momento ideal para uma propaganda estridente. Por volta de
1924, ele acreditava que a cena mundial havia se estabilizado ao ponto em que os
esforços da UNIA deveriam mudar na direção de se tornar uma organização mais
silenciosa, sem ênfase em uma propaganda estridente. Ele informou aos seus se-
guidores: “ Lembrem-se, a política da Associação Universal para o progresso do
Negro em 1924 e 1925, são as mesmas que eram em 1917 e 1918, somente esta-
mos usando um julgamento mais cuidadoso. As coisas que podíamos dizer em
1914, até 1920, não podemos mais dizer agora, mas queremos dizer exatamente o
mesmo.”(5) . Essa atitude foi sem dúvida influenciada também, pela escalada de
ataques à sua organização, tanto internos quanto externos. Ainda que não tenha
havido nenhuma mudança essencial. A Convenção Internacional de 1924, por
exemplo, discutiu entre outras coisas, “o banimento de toda a propaganda aliení-
gena voltada para destruir os ideais e escravizar as mentes do Negro.”(6)

A propaganda da UNIA era disseminada em uma variedade de formas. De fa-


to, praticamente todos os aspectos da organização tinham valor enquanto propa-
ganda. Suas produções artísticas eram grandemente utilizadas para doutrinação
política. O mesmo pode ser dito da religião como era praticada na organização. Es-
ses negócios eram conduzidos para instilar auto-confiança racial e estabelecer um
exemplo. Como Garvey disse, você não pode dizer ao povo preto, você tem que
mostrar ao povo preto (7)

O material impresso da UNIA, como o catecismo preto, servia a propósitos


similares. A UNIA estava até mesmo no negócio de filmes, algumas das paradas
eram filmadas para serem exibidas no Salão da Liberdade. Muitos dos discursos de
Garvey, bem como as seleções executadas pela Banda Black Star Line, eram dispo-
nibilizadas em gravações fonográficas.(8) Na Convenção Internacional de 1929, os
delegados consideraram a viabilidade de uma estação de rádio, para futuramente
disseminar a mensagem. (9) Os Embaixadores de Garvey, também, como todos
Embaixadores, eram encarregados com funções de propaganda. Seus comissários
viajantes, rodaram boa parte do mundo espalhando a mensagem e disseminando
sua literatura.

Mas o mecanismo mais efetivo da propaganda Garveísta, era o seu jornal.


Tendo sido treinado como gráfico e jornalista, Garvey estava também qualificado
para seu papel enquanto propagandista de jornal. Ele fundou uma série de infor-
mativos e jornais durante sua vida, em diferentes países. Entre 1910 e 1911 ele
começou o Garvey´s Watchman, na Jamaica, La Nacíon, em Porto Limão, Costa Rica,
e La Prensa, em Colón, Panamá, além disso era aparentemente co-editor do Bluefi-
elds Messenger, na Costa Rica. Todos esses tiveram vida curta.(10). O Semanário
Negro World (Mundo Negro) foi publicado no Harlem de 1918 até 1933. Entre
1922 e 1924, o Daily Negro Times apareceu no Harlem. De volta à Jamaica após sua
expulsão dos Estados Unidos ele publicou o BlackMan, de 1929 a 1931. Ele come-
çou, como proclamado em letras garrafais, como “ Um jornal diário devotado para
erguer a Raça Negra e o benefício da humanidade.” Mas tarde, foi convertido a um
semanário. O encerramento deste, foi seguido pelo aparecimento em 1932 do New
Jamaican , “ Um informativo diário devotado para o desenvolvimento da Jamaica.”
Esse durou até 1933 e foi seguido quase que imediatamente pela revista Black Man
publicada inicialmente na Jamaica em dezembro de 1033, e mais tarde na Inglater-
ra, pelo menos até 1939. A essa lista precisamos acrescentar seu trabalho no Afri-
can Times and Orient Review, em Londres. O Clube Nacional que ele ajudou a fundar
em sua juventude na Jamaica, possuía o seu Our Own e o seu mentor nesse período,
o Dr John Robert Love , publicou o Jamaica Advocate. Ele também alegou “estar
conectado”, com o Catholic Opinion, de Kingston. (11)

O mais importante dos jornais de Garvey, e possivelmente seu maior meca-


nismo de propaganda foi o Negro World. O jornal considerava a si mesmo “ Um
meio de propaganda publicado no interesse do Negro desperto,” (12), e em seu
período inicial trazia como bandeira de frente “ Negros Preparem-Se”, que aparecia
na parte superior da página frontal, e até mesmo diminuía o título do jornal. O títu-
lo era seguido pela explanação , “ Um jornal devotado aos interesses da Raça Negra,
e sem fins de lucro ou Investimento.” Por quase toda a vida do jornal, a página
frontal era dedicada a uma polêmica de Garvey. A Philip Randolph em sua campa-
nha contra Garvey ridicularizava essa prática: “ Que tipo de jornal é o Negro World,
afinal, que devota sua página frontal, a página de notícias de todo jornal moderno
reconhecido como jornal no reino do jornalismo, aos vapores e puerilidades imbe-
cis e conhecida falta de senso , de um ignorante consumado?”(13). O que Randolph
não sabia, era que os apontamentos ideológicos de Garvey em sua página frontal,
serviam como catecismo para o povo preto através do mundo. A leitura do Negro
World de Garvey era uma parte fundamental dos encontros da UNIA onde quer que
a organização existisse. Um colunista do Negro World em 1927, por exemplo, ex-
planou que “ ele é traduzido em partes em dialetos vinte e quatro horas após che-
gar na África e entregue por comboios interior adentro, pelos Grandes Lagos e no
Sudeste da África...”(14) Em Trinidad, o governador notou em 1920, que os encon-
tros da Associação de Trabalhadores de Trinidad e outros lugares,eram utilizadas
citações do Negro World e de outros escritos de Garvey.(15)

Além do próprio Garvey, o Negro World foi apoiado em seus esforços por
uma sucessão dos mais refinados editores da América Afro. Um dos primeiros foi
W.A. Domingo, que por um período foi o Escritor de editoriais do jornal. (16) Ele e
Garvey partilharam a companhia em 1919, apesar de suas idéias socialistas (de
acordo com Garvey), e seu desagrado com os esquemas de negócios de Garvey.
(17) Durante 1920-1921 o jornal teve como editor Hubert H. Harrison, um pales-
trante e ativista altamente respeitado membro da comunidade intelectual do Har-
lem. De 1917 a 1919, ele havia publicado The Voice, um órgão de sua Liberty Lea-
gue, fundada em 1917.(18) William H. Ferris, historiador e graduado em Harvard e
Yale, serviu três anos como editor e um como editor associado entre 1919 e 1923.
Ele alegava que a circulação fidelizada do jornal, aumentou de dezessete mil, para
sessenta mil, em seu primeiro ano. (19)

John E. Bruce foi por alguns anos um editor contribuinte até sua morte
em 1924, assim como Eric D. Walrond, uma figura literária de sucesso da Harlem
Renaissance. Mas possivelmente o mais ilustre entre os editores do Negro World,
foi T.Thomas Fortune, conhecido reitor dos jornalistas Afro-Americanos, que edi-
tou o jornal de 1923 até sua morte em 1928. Ele ditou seus últimos editoriais do
Negro World, de seu leito de morte, durante suas últimas três semanas de vida(20).
Duse Mohamed Ali, foi também associado do jornal por um tempo. No último ano
após Fortune, esse alto padrão editorial foi mantido por Hucheswar G. Mudgal, um
indiano que veio para o Harlem via Trinidad.

O Negro World penetrou em todas as áreas onde viviam pessoas pretas e


teve leitores regulares em lugares tão distantes como a Austrália.(21). Isso foi cita-
do pelos poderes coloniais como fatores para levantes e revoltas em lugares diver-
sos como o Daomé, Honduras, Quênia, Trinidad e Cuba. Esses poderes não tinham
então nenhuma dúvida a respeito do apelo dessa mensagem de auto-determinação
racial e anticolonialismo, e seus efeitos sobre o povo preto oprimido. Por conta
disso, por toda sua existência o Jornal esteve envolvido em batalhas contra os go-
vernos inglês, francês e dos Estados Unidos, entre outros, todos os que tentaram
com afinco planejar sua destruição, ou, não conseguindo, restringir ou evitar sua
circulação, especialmente na África, América Central e Caribe. A atitude dos pode-
res coloniais podem ser resumidas nas palavras de um oficial britânico no Panamá:
“ Todo o jornal assusta com antagonismo racial.”(22). Garvey e seus seguidores,
por sua vez, protestaram por diversas vezes contra essas tentativas, fizeram piada
a esse respeito, sempre tentando envolvê-los, e , no caso de Garvey, ridicularizando
poeticamente:

Vamos tirar deles o NEGRO WORLD

E eles não terão notícias da bandeira defraudada

Se eles contrabandearem exemplares e nós falharmos

Vamos mandar todos eles pra cadeia.

Esse é o plano do homem branco pelos sete mares

Poderiam ser mais astutos e viciosos? (23)

No campo mais prático, a Declaração de Direitos de 1920 protesta contra


a supressão de jornais pretos por todo o mundo, enquanto uma petição de Garvey
à Liga das Nações em 1928 protesta contra o banimento do Negro World em algu-
mas áreas, e a imposição de penalidades, incluindo prisão perpétua e mesmo pena
de morte, por ter o jornal em mãos. O Garveyta S.A. Haynes observou lacônica e
corretamente, “ É lido semanalmente pelos escritórios de assuntos exteriores fran-
ceses e ingleses.”(24)

As autoridades britânicas se mantiveram especialmente ocupadas em


sua guerra contra o jornal. Em 1923 o governador britânico de Nassau, explanou
que, “ Nos solos em que esse jornal envenena e confunde a um nível que somente
quem tem negócios com os rudes nativos africanos, podem entender propriamen-
te, estabeleci em março do último ano, na lista dos jornais proibidos em Nassau.
”(25) Em 1923 exemplares também foram confiscados no nordeste da Rodésia
(Zimbábwe) .(26) Ao mesmo tempo o governador de Serra Leoa relatava que o
jornal “ainda que não totalmente proibido, estava sendo rigidamente controlado, e
apenas algumas poucas cópias eram liberadas pra circular.” (27). Nas outras colô-
nias britânicas na África Ocidental – Costa do Ouro ( Gana), Nigéria e Gâmbia, o
jornal foi completamente banido nessa época.(28). Em 1930, ainda era proibido
nessas áreas.(29). Os chefes coloniais britânicos não tiveram muito sucesso em
evitar que a imprensa local apoiasse o programa de Garvey.

O Gold Coast Leader, em um artigo de 1928 intitulado “ Censura ao Ne-


gro World, um sinal de fraqueza”, celebrava o jornal, apoiando os princípios de co-
operação Panafricanista e até mesmo fazendo citações da publicação proibida.(30)
Como o seu editor J.E.Casely Hayford tinha condições de adquirir o jornal, é expli-
cado em uma carta sua a John E. Bruce, na qual diz “ eu não consigo o Negro World
regularmente. Quando eu consigo já está muito atrasado, e eu quero me manter a
par do que está acontecendo. Você poderia por gentileza estar certo de me enviar
um exemplar toda semana, bem envelopado, pra meu segundo endereço?” (31)

Na África do Sul, ainda que o jornal não fosse completamente proibido,


um agente local em Kimberly relatou que quando ele levou seus jornais ao escritó-
rio, levou uma seqüência de “chutes, murros, zombarias, insultos e perguntas im-
pertinentes.” (32)

No Caribe, também, a mão pesada da Inglaterra caiu sobre o jornal. De fa-


to, ali o jornal foi atacado praticamente desde seu início. Já em fevereiro de 1919,
quando agentes da UNIA foram descobertos solicitando afiliações e vendendo o
jornal em Trinidad, ele foi banido. Em junho de 1919, o então governador de Trini-
dad confidenciou ao seu colega da Guiana Inglesa, que estava fazendo isso “sem
estar legalmente coberto”. Somente em 1920 as solicitações para sua proibição
foram atendidas. As tentativas de suspensão dessa proibição, nos anos seguintes,
não tiveram sucesso. (33)

Nas Honduras Britânicas, o jornal foi retido antes da circulação já em


1919, por uma regulamentação emergencial. Quando o governo recebeu, em 1920
a permissão pra uma proibição permanente, decidiu que ao fim, não queria seguir
esse curso de ação, já que estava receoso do ressentimento racial que ainda existia
após as revoltas da população preta ocorrida em 1919. (34) O Garveísmo era con-
siderado como um fator importante nesses distúrbios.

A Guiana Inglesa seguiu o mesmo exemplo. Ali, também o jornal foi bani-
do ainda em 1919, e somente depois veio a legislação para legitimar o fato. Em 20
de junho de 1919, o comitê executivo colonial concordou por unanimidade com a
proibição das publicações Afro-Americanas Crusader, Monitor, Recorder e Negro
World. O Negro World foi apontado como sendo “de caráter grosseiro e ofensivo”.
(35). Quando essas leis estavam prontas para serem introduzidas perante a Corte
de Polícia Colonial, houve tanto protesto da população preta que o governador
achou necessário telegrafar pra que um navio de guerra ficasse a postos. Ele então
adiou a decisão por apelo popular, para estender o alcance da lei para o banimento
de publicações estrangeiras “questionáveis”, o que foi cortado após segunda leitu-
ra. A idéia era que no caso de emergência, o decreto pudesse ser apressado e tor-
nado lei em um tempo muito curto.(36)

Os trabalhadores celebraram a derrota nas intenções do governo, mas o


jornal parece ter sido banido mais tarde, o que demonstra uma petição requerindo
a suspensão do embargo, apresentada não muito depois, a uma comissão inglesa
liderada por Wood, que investigava as condições da área.(37) De acordo com o
governador, em 1922,ele considerou seriamente atender a essas solicitações, mas
explica em um despacho para Winston Churchill, então secretário de estado do
Escritório Colonial, que o comitê executivo estava completamente contra a idéia e
que não seria sábio enquanto a proibição continuasse em Trinidad. (38) O Gover-
nador de Trinidad, em resposta à inquirição de Churchill, reiterou sua completa
recusa a suspender o embargo,(39) apesar do fato do governador da Guiana Ingle-
sa achar o jornal não menos questionável que jornais radicais brancos, que foram
permitidos, sendo também convencido que o tom do jornal se tornou menos estri-
dente em 1922 do que era em 1919. (40), O jornal foi também “prontamente su-
primido” em 1920 em Bermuda, e em Granada no mesmo ano, o que é claro, pode
estimar sua crescente circulação. (41)

Mesmo em territórios não-britânicos do Caribe, as autoridades britâ-


nicas fizeram o possível pra evitar a circulação do Jornal. O cônsul britânico em
Port Limón, Costa Rica, teve participação ativa em fazer as autoridades locais con-
fiscarem o jornal em 1919. Eles também confiscaram a escritura e a constituição
enviada pela UNIA de Nova York para a divisão local.(43) Mesmo em 1926, o côn-
sul britânico em Colón, Panamá, lamentava os efeitos possíveis da propaganda an-
ti-britânica sem do disseminada entre as ìndias Ocidentais Britânicas através do
Negro World. (44)
Onde os britânicos conseguiram banir o jornal, isso se deu geralmente
através de uma Ordenanaça de Publicações Sediciosas. O West Indian, de Granada,
jornal testa de ferro do político nacionalista T.A. Marryshow, atacou uma dessas
propostas em 1920 como, “um ultraje...um incitamento à sedição, à anarquia, à re-
volta”, e “ o fator determinante em nossa luta por um governo representativo.”. O
protesto em Grenada incluiu um encontro de seicentas pessoas em St. Davis.(45)

Tardiamente em 1920, o jornal foi banido por um tempo em Cuba(46)


e na Libéria.(47) Não foi melhor nas colônias francesas, sendo banido em todas
elas pelo menos até o começo de 1922, apesar de aparentemente ter sido liberado
na Costa do Marfim em 1932.(48) Por boa parte da vida do Jornla, é claro, algumas
seções eram impressas em francês e espanhol, além do inglês.

Contra o ataque ao seu principal órgão de propaganda, Garvey


respondia com uma bem organizada rede de contrabando que, pelo menos no seu
início se provou efetivo em contornar as autoridades, apesar de ter um garnde cus-
to para a organização. O link mais importante na distribuição clandestina do Negro
World, eram os marinheiros negros, mas um operário caribenho do Canal do Pa-
namá, relembra ter sido apresentado ao jornal primeiramenteem 1928, por mari-
nheiros japoneses que costumavam depositar cópias no seu caminho através do
Canal. (49) O sucesso desse esforço de contrabando, foi atestado pelas próprias
autoridades coloniais. O governador das Honduras Inglesas, por exemplo, confes-
sou que apesar do seu embargo desde 1919, “ Eu tenho todos os motivos para
acreditar que o jornal tem sido contrabandeado através do México e Guatemala em
números maiores do que antes do banimento ser decretado.” (50). O governador
de Trinidade em 1920 reportou uma grande apreensão do jornal, junto com paln-
fletos da UNIA, incluindo um panfletoescrito por Garvey especialmente para o povo
de Trinidad, escondidos entre a carga de um navio vindo de Nova York.(51) C.R.L.
James afirma que apesar do banimento, ele conseguia compara um exemplar toda
manhã de sábado e, Port-of-Spain.(52) A polícia em Trinidad, e sem dúvida em to-
dos os lugares, estava ocupada procurando o jornal, e casas eram revistadas por
detetives. (53)

O governo dos Estados Unidos, apesar de nunca ter oficialmente banido


o Negro World, o mantinha sob estrita vigilância desde o início. Além disso, o Ad-
vogado Geral A. Mitchel Palmer, em 1919 deu ao Negro World papel de destaque
em seu relatório ao Departamento de Justiça sobre o “ Radicalismo e Sedição entre
os Negros, como refletido em suas publicações.” O Negro World era a primeira en-
tre várias publicações afro-americanas apontadas no relatório.

Em julho de 1919, oficiais do Departamento de Correspondências confe-


riam entre si e buscavam o conselho dos seus superiores, a respeito do jornal ser
censurável o suficiente pra ser processado. Eles estavam particularmente alarma-
dos com os artigos pró-bolchevique e sobre raça primeiro, que eram considerados
igualmente perigosos.(54) Além das prórpias observações do departamento, o oca-
sional espírito público dos cidadãos americanos, também direcionou sua atenção
aos efeitos radicais do jornal. Um deles, aparentemente um branco residente em
Tower Hill, Virgínia, enviou ao departamento cópias do Negro World e do Chicago
Defender, para mostrar que tipo de conteúdo estava fazendo usos dos correios dos
Esatados Unidos. Ele chamava a atenção dos oficiais, de que os negros agora não
queriam trabalahar para brancos, presumivelmente, devido à influência desses
jornais.(55)

Muitas comunicações dessa natureza emanaram dos agentes consulares


americanos mundo afora, que geralmente dividiam o sentimento dos seus países
de trabalho, de que os correios dos Estados Unidos não deveriam ser utilizados
para o que eles consideravam subversão contra governos amigos. Em maio de
1919, o cônsul americano de Georgetown, na Guiana Inglesa, explicou que seu go-
verno gostaria de pervenis a recepção e distribuição de quatro publicações – o ne-
gro World, Crusader, Monitor ( publicado em Omaha,Nebraska), e o Christian Re-
corder ( órgão oficial da Igreja Metodista Episcopal Africana – aparentemente a
junção de afro e americano era suficiente pra causar fricção no oficialato colonial
britânico). O oficial britânico explicou, nas palavras do cônsul, que “ devido ao fato
da população negra ser várias vezes maior que a população branca e incluir pesso-
as proeminentes como oficiais, advogados, doutores e ministros, eles não estavam
certos da viabilidade de tomar os passos necessários ali, para prevenir a sua circu-
lação.” Eles preferiam que os Estados Unidos evitassem isso na fonte, se não ba-
nindo o jornal, então proibindo o uso dos Correios. O cônsul reportou que dos qua-
tro, apenas o negro World e o Crusader, eram perigosos.(56). Dois anos mais tarde,
o procurador dos correios declarou que uma publicação não podia ser submetida à
negação de seus direitos postais. Cada número então teria que ser examinado se-
paradamente. (57) As autoridades britânicas em Londres, em um documento de
1919, “Levante Entre os Negros”, informava ao Tio Sam que onde havia organiza-
ções negras radicais nos Estados Unidos, a UNIA e o Negro World eram menciona-
dos e seus analistas foram cuidadosos em apontar que “ É certo que as várias orga-
nizações negras dos Estados Unidos, não irão deixar as Colônias Britânicas sozi-
nhas.(58)
No caso de Trinidad, o cônsul americano, Henry D. Baker, tomou a inicia-
tiva de sugerir que o jornal fosse eliminado na fonte. Ele explicou que “ainda que as
autoridades postais queime cada uma cópia, eles poderão encontrar o jornal, o que
é obviamente esperado como propaganda pra causar problemas raciais e anarquia
geral, sendo ainda esperado que diversas cópias escapem da destruição e sejam
distribuídas subrepticiamente através dessa Colônia.” Ele anexou diversos envelo-
pes nos quais o Jornal era enviado por Garvey a pessoas em Trinidad para “ mos-
trar como os Correios dos Estados Unidos estavam sendo utilizados com o propósi-
to de levar a um país amigo, jornais que incitavam diretamente a população negra
a atoas de assassinato e anarquia.” (59)

Na Costa Rica, o Departamento Postal se viu incitado à ação por uma coa-
lizão anti-Negro World, conduzida pela United Fruit Company, o cônsul britânico e
as autoridades portorriquenhas. Em setembro de 1919, o conselho da United Fruit
Company de Washington escreveu ao secretário de estado e enviou algumas cópias
do Negro World. A estrada inicial de Garvey na Costa Rica não foi tranquila, pois a
companhia lembrava disso claramente. A carta explicava que Garvey “ deixou Li-
món em 192 e que era um típico jamicano barulhento, e que se lhe fosse permitido
prosseguir como estava, havia a possibilidade que tentasse repetir a experiência
francesa no Haiti.” Ele apontou também que, o governador de Limón, com a per-
missão do cônsul britânico, estavam planejando deportar todos aqueles presentes
no próximo encontro da UNIA. O conselho da United Fruit Company sugeriu, final-
mente, que o Departamento de Justiça acionasse seu serviço secreto no caso, posto
que a UNIA estava incitando revolução e assim violando a neutralidade de países
em paz com os Estados Unidos.(60). Correspondência similar foi enviada por ofici-
ais da Costa Rica que, após banir o Negro World, requeriu ao escritório postal de
Nova York, que não permitisse o envio do Negro World para a Costa Rica. (61)

A propaganda do Negro World espalhada por todo o Caribe, não passou


batida nas colônias dos Estados Unidos. Casper Holstein, uma proeminente figura
no movimento nacionalista das Ilhas Virgens Americanas, era um colaborador re-
gular do Negro World, onde atuava como autor cooperativo. Seu cunhado D. Hamil-
ton Jackson, foi presidente da União Trabalhista de Sta Croix. Após uma curta esta-
dia nos Estados Unidos, Jackson estava de volta a Sta Croix em 1923, agitando, en-
tre outras coisas, por voto universal. Os oficiais ficaram alarmados com a propa-
ganda nos artigos do Negro World parabenizando os esforços de Jackson. Um juiz
aventou a opinião de que “ todos os venenosos artigos escritos no Negro World por
Holstein, foram inspirados por Jackson.” (62)

O curso dos eventos nos Estados Unidos sugerem que as autoridades apa-
rentemente preferiram se mover contra o próprio Garvey, ao invés da possibilida-
de de causar furor ao perseguir meramente o Jornal. De fato, um movimento contra
o Jornal poderia ser muito impopular contra os mesmos líderes negros oficiais, que
estavam ansiosos para ver o governo se mover contra o próprio Garvey, já que
muitos deles estavam envolvidos em suas próprias publicações e eram sensíveis a
qualquer precedente de estabelecimento de censura sobre a imprensa. Essa foi a
lição do relatório do Advogado Geral Palmer, de 1919 contra a Imprensa Afro-
Americana. Alguns daqueles que mais tarde se tornariam os piores inimigos de
garvey ( tais como A.Philip Randolph e chandler Owen do Messenger e Cyril Briggs
do Crusader) foram censurados junto com Garvey e o Negro World naquele relató-
rio e o Crisis, editado por W.E.B. Dubois, apesar de discordar de qualquer idéia do
negro World, ainda saiu em defesa de sua liberdade de expressão. ( 63) De forma
parecida, em 1920, o Decreto de Sedição de Graham, foi derrotado no Congresso
com o apoio dos negros conservadores do New York Age e da NAACP. Esse decreto
buscava amordaçar e entregar nominalmente as publicações pretas.(64) Um pro-
cesso contra Garvey não envolveria tanta confusão para o governo dos Estados
Unidos, posto que os mais importantes líderes fora da UNIA eram quase que total-
mente contra ele.

O mais perto que os Estados Unidos estiveram de banir o Negro World, foi
durante, e logo depois do julgamento de Garvy em 1923 por alegação de fraude
postal, quando eles puderam se mover sob as vistas da oposição da elite afro-
americana a Garvey, que havia alcançado o seu zênite. Garvey relatou que o pro-
motor ameaçou suprimir tanto o Negro World, quando o Daily Negro Times, du-
rante e após o julgamento. Ele também apreendeu ilegalmente as listas de assinan-
tes do Negro World, e os assinantes logo começaram a receber jornais de oposito-
res. O propórito dessas ameaças era amedrontar os editores pra que os mesmos
não relatassem a conduta do promotor durante o julgamento. (65) O número do
Negro World que tratava do julgamento foi, de fato, estranhamente vetado.

Se o Negro World era o maior instrumento de propaganda que a UNIA


possúia, encontrava um rival à sua altura, no próprio Garvey. Um panfleto anuci-
ando uma palestra de garvey em Atlanta, georgia, em 1917, se refereia a ele como
“um orador de excepcional força”. Logo mais, os panfletos o proclamavam o “mai-
or orador do mundo”. Uma circular da UNIA avisando sobre uma fala sua no Albert
Hall em Londres em 1928, proclamava que o maior orador do mundo estaria “ para
oferecer um dos maiores discursos de qualquer período da história”. Leitores des-
sa circular eram assegurados de que “ Uma chance como essa aparece somente
uma vez na vida”. (66) O mais surpreendente sobre essas colocações, é que muitas
pessoas acreditavam nelas. A excelência e o poder da oratória de Garvey era pro-
vavelmente o mais indiscutível de seus atributos. De fato, é difícil pensar em qual-
quer outra coisa a respeito de Garvey, com que pessoas diversas como líderes co-
munistas, J. Edgar Hoover do Departamento de Justiça, Anti-Garveystas da NAACP,
oficiais da polícia colonial britânica e os seguidores de Garvey todos concordavam.

Em seus esforços por capturar o tom da oratória de Garvey, aqueles que


testemunhavam a experiência singular descrita acima, frequentemente utilizavam
deuma linguagem exótica pra descrever o que presenciaram. A organizadora da
UNIA Marie Duchatellier, em uma carta a John E. Bruce, disse a respeito da oratória
de Garvey:

Eu notei o que você me disse em sua carta para que


solicitasse ao Sr Garvey que freasse a sua linguagem, mas eu acho
que já te disse antes que você está me pedindo algo impossível. Te
disse que seria o mesmo que parar o fluxo das cataratas do Niága-
ra. Você me disse que escreveu ao Sr. Garvey sobre o assunto, en-
tão isso terá que bastar. Tudo o que você fala é real, e se o Sr. Gar-
vey fosse menos radical, seria melhor, mas você tem somente que
esperar que um “etíope mude sua pele, ou um leopardo mude suas
pintas”, assim como deve acreditar que um dia Garvey mudará seu
método ou sua forma de proceder. Eu estou convencida que isso é
o jorro de uma fúria de gerações de seus ancestrais que nasceram
na opressão e injustiça do homem branco por séculos. Esse grito
vem se formando através dos tempos e ele está dando voz à ago-
nia acumulada que nosso povo sofreu durante a escravidão e des-
de a emancipação. Nós somos os herdeiros desses tempos.” (67)

Um repórter do Panama-American, se expressou dessa forma:

“ Ele passaria depercebido por uma multidão, até que come-


çasse a falar. Ele tem o mais precioso de todos talentos, o dom da
eloquência; equando ele fala, seus pequenos olhos marrons-escuro,
parecem crescer, seus dentes muito brancos brilham através de seus
lábios negros. Seu discurso é suave e untuoso, sem nenhum toque de
sotaque americano, apesar de sua longa permanência nos Estados
Unidos. Seu inglês é aquele de um acadêmico de Oxford, e quando ele
fala- seus ouvintes escuram.”(68)

Mesmo um oficial da polícia colonial britânica, destacado para observar


uma encontro de Garvey em Honduras, não pode esconder completamente sua
apreciação pela fina oratória de Garvey, por trás do seu óbvio desprezo:

“ Marcus Garvey foi apresentado pelo capelão, e começou


sua fala de 45 minutos . Quando ele pegou fogo, eu me lembrei do per-
sonagem “Winstonpogoas” de Rider Haggard, em seus momentos de fe-
orcidade animal, mas ele entretanto sabe como agarrar os seus ouvintes
e foi aplaudido com emoção repetidamente. Garvey em seus momentos
mais sérios, não deixou faltar humor, no que foi apreciado....houve mo-
mentos de loucura entusiástica em que ele forçava a si mesmo enquanto
falava, e eu pensei que a juda de um médico seria indispensável, mas
não era.”(69)

Uma matéria de jornal sobre um discurso de garvey na Jamaica diz “próxi-


mo ao fim de seu discurso, o Sr. Garvey utilizou o bem conhecido truque dos ora-
dores, “ Eu creio que já me alonguei bastante por essa noite”, disse, e a multidão
gritou para que ele continuasse.”(70). Um jornal aparentemente branco dos Esta-
dos Unidos afirmou sobre sua igualmente aparentemente negra platéia em uma
ocasião, “ eles aplaudiam quase cada palavra. Os homens gritavam e alguns até
mesmo soltavam um emocionla Amén.” Esse artigo notou que “ Ele pronuciava pa-
lavras como “Mestre”, com o uso de um longo R, mas geralmente o fuxo de sua lin-
guagem era o de um negro educado do Sul.”(71) Herbert J. Selingman, diretor de
publicidade do NAACP, também comentou sobre isso “leve entonação inglesa, que
soa estranha aos ouvidos americanos, não acostumados aos nativos do Caribe Bri-
tânico.”(72) Robert Minor, cobrindo a convenção internacional de Garvey em 1924
para o Partido Trabalhista (comunista) dos Estados Unidos, disse, “Eu escutei Gar-
vey falar na noite passada. Ele é uma das mais poderosas personalidades que eu já
vi em um palanque.” (73)

Após um discurso na Universidade Howard, em 1924, o chefe do departa-


mento de oratória e arte dramática, o considerou um dos grandes discursos que
ouviu na vida. O Reitor Kelly Miller o considerou um dos melhores já realizados no
auditório da Universidade. (74) John Edgar Hoover, que logo se tornaria por quase
meio século o chefe do FBI, foi menos efusivo. Ele escreveu em 1919, “Ele é um
orador excepcionalmente refinado...” (75)

A excelência do treinamento de Garvey como gráfico e jornalista na juven-


tude, combinou com seu longo e sistemático estudo e prática da oratória. Nos foi
dito que o jovem Garvey visitou diversas igrejas para estudar e aprender o estilo
de fala dos ministros.(76) Durante esse período também é dito que ele recebeu
lições de oratória do seu mentor Dr. J. Robert Love.(77) Por volta de 1910, Garvey
estava envolvido em competições de debates e chegou a treinar jovens oradores e
promover tais competições em West Kingston. Um presidente da União de Profes-
sores da Jamaica, relembrou ter visto a performance de Garvey nessa época, duran-
te as finais de um torneio jamaicano de eloquência no qual ele ficou em terceiro
lugar.(78) Durante sua primeira estadia em Londres ( 1912-1914), ele frequente-
mente falava no Canto do Discurso, em Hyde Park ( fez o mesmo durante suas ou-
tras estadias em Londres). De volta à Jamaica em 1914 ele frequentou e participou
dos debates literários semanais no Salão da Igreja Batista em Kingston.(79) De fa-
to, ainda em 1932, ele ainda organizava torneios de debate na Jamaica. (80)

No período em que ele explodiu no cenário americano, então, a preparação


de garvey no campo da oratória foi longa, variada e minuciosa. E seus conhecimen-
tos de oratória foram alçados como importante vantagem como meio de propa-
ganda para a organização. Mais do que um escritor, Garvey foi primeiramente um
orador. Um corpo de habilidosos secretários copiaram seus discursos e encheram
com eles diversas páginas do Negro World e seus outros jornais. Ele estava cons-
tantemente em turnê então numa época anterior à televisão seus seguidores, es-
pecialmente nos Estados Unidos, mas também no Canadá, no Caribe, na América
Central e na Europa tinham amplas oportunidades de vê-lo e ouví-lo pessoalmen-
te. Entre os subordinados de Garvey, haviam também diversos excepcionais orado-
res de presença constante nas turnês, alguns dos quais viajavam com Garvey.

A propaganda de Garvey causou ou esteve implicada em manifestações na-


cionalistas e anticoloniais por todo o mundo. Muitas das concessões a povos colo-
nizados que se seguiram, foram traçados por Garvey em sua propaganda.(81) Ele
também creditava à sua propaganda e ao exemplo do Negro World , uma melhora
no tom do jornalismo afor-americano. Ele disse, “ Quando eu cheguei nesse país
em 1916, eu descobri que a imprensa negra não possuía nenhuma política constru-
tiva, As notícias publicadas eram do tipo que reflete o pior do caráter da raça, como
assassinato, adultério, roubo, etc...outro papel desempenhado pelos jornais eram
somente bailes e eventos sociais de intenções duvidosas...” Após alguns anos de
Negro World, ele acreditava que esse foco havia mudado, e que muitos jornais es-
tavam agora “ publicando notícias internacionais e escrevendo editoriais inteligen-
tes sobre assuntos pertinentes.”(82)

Uma consequência da propaganda de Garvey, foi o chamado para um ex-


tensivo esforço de contrapropaganda pelos poderes coloniais. Eles evidentemente
sentiram que seus esforços para banir o Negro World e aprisionar e deportar os
agentes de Garvey não eram suficientes, então eles partiram para a publicação de
mensagem anti-Garvey. Em Nova York em 1923, o consul geral britânico promoveu
ativamente uma revista pró-Inglaterra, a Revista do Caribe Britânico, para, em suas
palavras “superar, em alguma dimensão, a propaganda viciosa conduzida por Gar-
vey e a Associação Universal para o Desenvolvimento Negro.”(83) No Panamá em
1925 , o chefe da delegação britânica anunciou que havia montado sua própria
campanha entre a população caribenha contra Garvey. Ele listou o apoio dos Minis-
tros com grandes congregações, e estava organizando os escoteiros como meio
para disseminar sentimentos pró-Inglaterra e Anti-Garvey.(84) Um escritor no jor-
nal branco sul-africano Cape Argus, em 1923 chegou à mesma conclusão no que diz
respeito a organizar uma ativa propaganda anti-Garvey: “Sem dúvida o governo irá
olhar cuidadosamente a disseminação de propaganda anti-branco na União, mas
será facilmente percebido que a mera supressão desses movimentos assim que
surgem, não será suficiente. O povo nativo está crescendo e alguns métodos con-
tundentes para desabilitá-los a expressar esse crescimento serão necessários.(85)

Para Garvey , ter colocado a grande máquina da propaganda inglesa na de-


fensiva, foi um dos seus feitos mais notáveis. Enquanto os negros W.E.B. Dubois e
A.Philip Randolphs, da América, o chamavam de palhaço e bufão, enquantoajuda-
vam a construir sua queda, os juízes dos destinos do povo preto em Washington e
Londres estavam dispostos a ser mais realistas. Já em 1919 o governo inglês havia
informado Washington que o programa da UNIA estava “sendo espalhado através
de propaganda inteligente principalmente por Marcus Garvey, um negro caribe-
nho...”(86)
Garvey estava ciente da existência de um esforço de contrapropagan-
da. Por volta do mesmo período em que o consul geram inglês em Nova Yorke es-
tava supervisionando a primeira ediçãi de sua Revista do Caribe Britânico, garvey
estava no Liberty Hall discursando contra a “contra propaganda para distorcer e
perturbar as mentes e intenções daqueles que são responsáveis pelo progra-
ma.”(87) Em 1929, ele fez uma colocação a respeito disso:

Justamente naquele período havia uma bem organi-


zada propaganda e conspiração engendrada por uma combina-
ção de forças conhecidas e desconhecidas, visíveis e invis´veis,
nos Estados Unidos da América e em diferentes parte do mun-
do, para minar a poderosa influência da UNIA em unificar os
negros em todo canto.
Essa conspiração e propaganda está sendo conduzida
em uma mão , por alguns dos nossos senhores de escravos de
outrora, que nunca conseguiram lidar com a idéia de que o Ne-
gro pudesse ser nada além de escravo, e na outra mão por um
barato, descerebrado, incosnciente, traiçoeiro e desleal grupo
de negros rejeitados que, como traidores de todas as causas,
nacional, secular e religiosa, estão sempre procurando vender a
si mesmos pelas trinta sujas moedas de prata.

É difícil de explicar perfeitamente como eu gostaria pra


demonstrar claramente a construção dessa combinação que
agora se organiza para lutar contra a Associação Universal para
o Progresso do Negro...”(88)
A propaganda de Garvey não morreu com ele. Um surpreendentemente
amplo número de líderes pretos nos anos 1960, a era das Independências e do Po-
der Negro, reconheceram sua influência.(89)
Capítulo 7 – Áfrika

O mundo branco pode nos desprezar; o mundo branco po-


de zombar e rejeitar a idéia de uma África livre porque eles dizem:
“ como vocês ousam falar sobre África, quando África é uma pos-
sessão da Inglaterra, quando África é uma possessão da França,
quando África é uma possessão da Espanha?” Qual é a sua lógica,
Sr. Homem Branco? Você não tem diante de si as páginas da histó-
ria registrando a ascensão e queda de povos, de raças e de nações?
Homem Branco, você não consegue aprender com a experiência?
Porque falar sobre a permanência da França na África?” Marcus
Garvey (1)

Quanto tempo você supõe que o povo de cor tem que sofrer
nessa terra? Eu rezo a Deus que envie um Moisés que nos guie pra
longe dessa terra...

Will Right de Damasco, Georgia, Para a Sociedade America-


na de Colonização, 5 de abril de 1920 (2)

Garvey foi herdeiro de uma rica tradição de interesse na unidade preta in-
ternacional que floresceu através do século XIX. De muitas formas , Garvey perten-
ceu a essa tradição panafricanista do século XIX e poderia mesmo ser tido como o
último dos grandes panafricanistas do século XIX, mesmo tendo estabelecido seu
movimento no século XX. Sua fraseologia era inconfundivelmente novecentista –
sua referência constante à Etiópia estendendo suas mãos para Deus, sua fala sobre
uma nacionalidade africana e sobre redenção, seu slogan “ África para os Africa-
nos”, tudo isso era recortes dos vocabulários de Martin Delanys, do Bispo Turners,
de Edward Blydens entre outros Panafricanistas Afro-Americanos e Afro-
Caribenhos que o precederam. Sua preocupação com a Libéria, seu interesse em
imigração e seu desejo de operar sua própria companhia de navegação também o
situa firmemente na tradição do século XIX.

Muitos dos discursos e escritos de Garvey revelam familiaridade com as


preocupações de seus predecessores. Mas o mais interessante é o fato de que exis-
tem diversas ligações diretas e indiretas entre Garvey e alguns dos grandes nomes
do século XIX e início do século XX. Talvez a ligação mais importante seja fornecida
por John Edward Bruce, que por muitas décadas manteve contato, tanto por encon-
tro pessoais como por correspondência, com uma lista impressionante de figuras
importantes de todo o mundo negro. Entre os muitos amigos e correspondentes de
Bruce através dos anos, estavam Edward Blynden, Alexander Crumell, Frederick
Douglass, Dr. Mojola Agbebi da Nigéria e J.E.Casely Havford, da Costa do Ouro, to-
dos figuras importantes.(3) O mentor de Garvey, Dr. J.Robert Love, fornece outra
ligação. Love não somente manteve uma correspondência prolífica com Bruce mui-
to antes da ascensão de Garvey, como durante seus muitos anos nos Estados Uni-
dos, foi amigo próximo do Bispo Henry Macneal Turner, um dos mais importantes
Panafricanistas do século XIX e aquele cuja retórica talvez seja a mais próxima a
Garvey. Love, enquanto clérigo, também trabalhou no Haiti com o bem conhecido
imigracionista afro-americano Bispo J. Theodore Holly(4). A citação de Love em
1901 poderia facilmente ter sido escrita por Garvey duas décadas mais tarde. Ele
escreveu, “ ‘África para os Africanos’ é uma forma nova pra um antigo grito...esse
grito vai acordar o assim-chamado mundo civilizado, para o fato de que outros que
não são contados como civilizados, pensam a respeito dos direitos naturais, do
mesmo modo que os povos civilizados pensam...”(5)

Love também colaborou em 1901 com Henry Sylvester-Williams, organiza-


dor da Conferência Pan-Africana de 1900 em Londres, quando este visitou a Jamai-
ca e estabelecei sedes de sua Associação Pan-Africana.(6) Garvey teve outra ligação
com essa Conferência de 1900, na pessoa da viúva do homem que presidiu o en-
contro, Bispo Alexander Walters. Sra. Walters foi uma ardente Garveysta e uma
palestrante constante nos encontros do Liberty Hall. (7)

Outra ligação foi ainda o Dr. J. Albert Thorne, um barbadense que viveu na
mesma vizinhança de Garvey durante a adolescência deste. Thorne, na década de
1890 tentou organizar o estabelecimento de caribenhos na África Ocidental. Ele é
tido como apoiador de Garvey ainda nas atividades iniciais da UNIA na Jamaica, e
um de seus assistentes foi um dos primeiros a se associar à UNIA.(8)

Dois dos mais importantes contatos diretos de Garvey foram sem dúvi-
da, com Booker T. Washington, talvez o internacionalmente mais famoso homem
negro do seu tempo, e Duse Mohamed Ali, do African Times and Orient Review.
Além disso, o nome da organização de Garvey guarda uma similaridade suspeita
com a Universal Association for the Moral Improvement of Mankind, estabelecida em
1905 pelo Panafricanista haitiano Benito Sylvain. (9)

Muitos dos que se juntaram à UNIA, ainda que não fossem necessaria-
mente famosos internacionalmente, pertenceram ou lideraram organizações raci-
ais, geralmente com abordagem Panafricanista. James B. Yearwood, por exemplo,
foi do alto escalão da UNIA e liderou a Universal Loyal Negroes, sediada na Zona do
Canal, no Panamá.(10) Maurice Rouselle, líder da divisão de Wilmington, organizou
muitos anos antes a Afro-American Improvemente Company, e visitou a África atra-
vés dessa conexão. (11) William Ferris, de 1901 a 1903 foi “palestrante e corres-
pondente jornalístico” do Boston Guardian de William Monroe Trotter , assim como
membro da Academia Negra Americana, do Niagara Movement e da Sociedade Ne-
gra para Pesquisa Histórica, de John Edward Bruce.(12). O próprio Bruce em 1913
formou os Filhos Leais da África, para unir o povo preto através do mundo e mais
tarde se destacou como figura importante na Liga Hamítica Mundial.(13)

Um precursor importante com quem Garvey não gostava particularmente


de ser comparado, foi o Chefe Alfred Sam, da Costa do Ouro, que em 1914 teve
frustrada sua tentativa de estabelecer em sua terra nativa uma colônia de afro-
americanos. Os inimigos negros de Garvey adotaram a mesma atitude grosseira
contra Sam, que adotaram contra Garvey, e os comparavam constantemente. Tal
comparação grosseira estava presente em um artigo do Chicago Defender que teve
como assunto o comportamento de Garvey.(14)
Garvey via a África essencialmente como o único lugar onde o povo preto
poderia tentar estabelecer igualdade com outras raças e nações. África é a casa an-
cestral do homem preto; ele ainda era maioria lá; o continente era rico em recursos
naturais; e com algum apoio tecnológico do povo preto em outras áreas, um plano
determinado em direção à igualdade, poderia ter as melhores chances de sucesso
lá. E se o povo preto se tornasse poderoso na África, isso necessariamente levanta-
ria a sua posição por todo o mundo. Porque como foi dito por Garvey, “ Um homem
forte é forte em qualquer lugar.”(15) Como forma de consolidar a proteção dos
membros espalhados da raça Garvey visualizava que um governo Africano forte,
poderia expandir cidadania pro povo preto em qualquer lugar.(16)

A questão da exploração branca na África naturalmente infligia em garvey


um senso de urgência. “ Se o petróleo da África é bom para os interesses de John D.
Rockefeller”, escreveu, “ se a borracha é benéfica para os interesses da Firestone;
se o ferro é bom o suficiente para o Carnegie Trust, então certamente, são de nosso
interesse também.”(17) Em uma ocasião, Garvey ficou particularmente indignado
quando o historiador inglês H.G.Wells sugeriu que a África era economicamente
necessária para a Europa . Garvey o enviou um telegrama irado, sugerindo que
Wells deve ter tirado sua “ ultrapassada informação ‘Pai João’, de W.E.B. Dubois.”
(18)

Enquanto gente como Wells tentava justificar a expropriação da riqueza


africana,outros seguimentos do pensamento branco com parâmetros peseud-
etnológicos. O New York Times, tomou pra si essa briga, admoestando Garvey por
não saber que a África nunca pertenceu completamente ao “negro”. Se Garvey fosse
para a África, segundo esse curioso editorial, teria que escolher entre os hotento-
tes, zulus e pigmeus, entre outros, porque supostamente, esses eram “não-negros.”
(19)

Garvey dirigiu muito do seu esforço de propaganda para o continente Afri-


cano, e existe evidência suficiente pra sugerir que essa influência foi largamente
sentida, mesmo em áreas em que a UNIA nunca teve um escritório. Parte desse
trabalho na África era clandestino, por necessidade, e os nomes de seus agentes às
vezes eram desconhecidos até mesmo pelos membros executivos da UNIA. Em al-
gumas ocasiões Garvey financiou esses agentes do seu próprio bolso em lugar de
usar o dinheiro da Organização, como forma de manter o sigilo. (20) Da mesma
forma, na convenção de 1920, alguns delegados africanos registraram-se com no-
mes falsos e foram ouvidos em privado. (21)

O desejo de Garvey de manter em segredo alguns dos seus movimentos na


África, pode ser apreciado à luz da constante vigilância colonial sobre as atividades
dos seus agentes. Em janeiro de 1920, a inteligência militar britânica reportou que
um comerciante da Costa do Ouro, S.G. Kpakpa-Quartey, falou em um encontro da
UNIA em 1919. (22) Em agosto de 1920 membros do povo Nyasa nos Estados Uni-
dos pregando o slogan de Garvey chamou a atenção das autoridades britânicas.
(23) Em 1921, um Wilson, da Costa do Ouro foi deportado do Congo Belga por ati-
vidades ligadas à UNIA. (24) Novamente, em 1922, as autoridades coloniais vigia-
vam os movimentos de um John Kamara, um comissário viajante da UNIAque or-
ganizou encontros em Dakar, no Senegal, antes de partir para a Gâmbia e o resto da
África Ocidental.(25) Após a partida de Kamara do Senegal, as autoridades france-
sas atacaram as casas de alguns membros locais da UNIA, como quem ele esteve
em contato. Documentos foram apreendidos revelando a existência de escritórios
da UNIA em Dakar, Rufisque e Thies. Quatro Garveytas de Serra Leoa foram depor-
tados. (26)

Tais atividades foram apenas uma pequena porção do esforço colonialista


contra Garvey. Eles negavam vistos a pessoas pretas que eles considerassem radi-
cais, como o historiador J.A.Rogers descobriu quando solicitou para uma visita a
Serra Leoa. (27) Onde eles possivelmente tentaram conter a propaganda Gar-
veysta. Sir Gordon Guggisberg, então governador britânico da Costa do Ouro, dei-
xou claro em uma visita aos Estados Unidos que “ era desconfiado do Negro Ameri-
cano.” O Golden Coast Leader, que sempre se recusou a ser intimidado pelos senho-
res britânicos, sugeriu que “ antes de o africano nativo estar desconfiado dos afri-
canos mundo afora, é nosso constante desejo que entremos em contato, como os
olhos no desenvolvimento de nossa nacionalidade em comum. Até aqui, os gover-
nos locais tem adotado tosos os meios possíveis para tornar esse contato mais difí-
cil, senão impossível.”(28)

Honduras anulou a doação de Isaiah Morter de uma propriedade no


valor de U$ 100.000 à UNIA para a redenção Africana. O juiz sentenciou que a re-
denção Africana era “ um propósito ilegal e contrário à política pública...”(30)

Foi no mesmo espírito que as autoridades britânicas reagiram quan-


do em 1923 Garvey os reduziu a um estado de consternação ao anunciar sua inten-
ção de realizar uma turnê mundial para defender sua reputação. Governos de colô-
nias da África Ocidental, Oriental e Central todos concordaram em proibir sua en-
trada se ele tentasse aterrissar em suas áreas, e estavam preparados para criar
uma legislação especial pra essa contingência. (31) Essa legislação anti-Garvey,
‘Ordenância de Prevenção à Imigração de Pessoas Indesejáveis’ de 1924 se tornou
real em Serra Leoa. Trazia o ingênuo subtítulo, “Uma Ordenança para prevenir cer-
tos tipos de pessoas de entrar em Serra leoa.”(32). Companhias de navegação tam-
bém foram alertadas a recusar passagem a Garvey e sua organização caso eles ten-
tassem navegar para a África.(33)

As autoridades coloniais francesas reagiram com uma histeria ainda mai-


or que a dos britânicos à presença da UNIA, e suas informações tendiam a ser fre-
quentemente adulteradas.(34) O governador geral da África Ocidental Francesa
estava convencido, em 1921, que a UNIA planejava massacrar todos os brancos da
Costa do Ouro, como preliminar de um levante geral que seria financiado da Amé-
rica.(35)

Talvez a histeria francesa possa ser entendida como referência às


provocações de Garvey. Em 1922, por exemplo, ele declarou que o banimento do
Negro World pela França havia chegado muito tarde, pois ele já tinha organizado a
África Francesa, assim como as tropas senegalesas no Reno.(36). E para suplemen-
tar o trabalho de seus agentes na África, Garvey mantinha contato próximo com
africanos das colônias francesas que viviam na Europa. Talvez seu contato mais
próximo fosse Koju Tovalou Houénou, um advogado residente em Paris, sobrinho
do Rei Benhazin do Daomé, que havia sido exilado pela França para o Caribe. Kojo
foi a grande atração da Convenção de Garvey em 1914, onde ele sugeriu uma alian-
ça entre a UNIA e sua própria Liga Universal Para a Defesa da Raça Negra. Essa ali-
ança se articularia em uma federação internacional de organizações raciais, na qual
a UNIA iria prover a “artilharia pesada”. (37) Kojo é tido como líder de uma rebe-
lião fracassada no Daomé em 1925, inspirada na UNIA.(38) Durante sua viagem à
França em 1928, Garvey clamava ter “cimentado um plano de trabalho com
o Negro Francês” e ter estabelecido um “quartel sub-europeu” na França.(39) Ele
também se juntou ao Comitè de Defense de La Race Nègre, uma organização Pana-
fricanista sediada em Paris, associada ao Partido Comunista e ao Comintern.(40)

Os belgas também viram em Garvey causa para alarme. Um escritor em


1922, temeroso dos efeitos das denúncias do Congo Belga sobre as Convenções da
UNIA, acreditou que o Levante de Kimbangu pode ter sido inspirados pela propa-
ganda Garveísta.(41) Indo pra 1930, os belgas rotineiramente suspeitava que Gar-
veytas estavam envolvidos em levantes anticoloniais, incluindo alguns liderados
ostensivamente liderados por convertidos da Associação Internacional dos Estu-
dantes Bíblicos do Brooklyn, Nova York. Muitos africanos eram suspeitos de per-
tencer tanto a essa seita quanto à UNIA.(42)

Outra evidência da influência Garveísta na África é fácil de encontrar. Mui-


tos dos primeiros políticos nacionalistas mantinha contatos Garveístas. Um dos
fundadores do “primeiro corpo político Africano permanente” na África Central
Britânica, foi um homem do povo Nyasa , Malawi, que esteve em comunicação com
Garvey.(43) E no Quênia, a importante figura nacionalista de Harry Thuku, escre-
veu a Garvey em 1921 em busca de “conselho e ajuda.” (44) Thuku foi preso logo
depois e leu o “Filosofia e Opiniões de Marcus Garvey” enquanto encarcerado. (45),
A prisão de Thuku pelos britânicos foi seguida por uma manifestação pacífica por
sua libertação, na qual um grande número de africanos foi morto a tiros pelas for-
ças coloniais. Garvey organizou um encontro de protesto, imprimiu um comunica-
do à imprensa sobre o fato, e despachou um telegrama ao Primeiro Ministro Britâ-
nico. “ Você matou a tiros pessoas indefesas em sua p´ropria terra nativa, por exer-
citar seus direitos como homens,” ele escreveu, “tal política tende a somente agra-
var as muitas injustiças históricas contra uma raça que um dia estará em posição
de verdadeiramente se defender...novamente, pedimos a você e ao seu governo
para ser justos com nossa raça, pois certamente, não nos esqueceremos de vo-
cês.(46)

Na Costa do Ouro, Garvey tinha um aliado poderoso em J.E.Casely Hayford e


seu Gold Coast Leader. Hayford, que foi tornado Cavaleiro por Garvey em
1922(47), deu as boas vindas ao surgimento da UNIA durante sua fala inaugural na
fundação do Congresso Nacional da África Ocidental Britânica em 1920.(48)

Outra importante figura política da África Ocidental que desde o início teve
contato com a UNIA foi Ernst S. Ikoli, da Nigéria, que em 1930 foi fundador do im-
portante Movimento da Juventude de Lagos (mais tarde Movimento da Juventude
Nigeriana). Ikoli foi secretário da UNIA em Lagos desde seu início em 1920, e foi
responsável por receber duzentas cópias por semana do Negro World, que seu es-
critório solicitou em novembro de 1920. Havia também outros agentes do jornal
em Lagos. Em 1920, seu escritório solicitou quinhentos distintivos da UNIA e tre-
zentas cópias de sua Constituição, e em 1922 as fontes policiais estimavam a exis-
tência de cerca de trezentos membros, dos quais somente vinte e oito eram finan-
ciados.(49) Esses Garveytas nigerianos ( também havia um escritório em Kano
(50) eram estigmatizados pelo governo como “Africanos descontentes.”(51)

Talvez o mais conhecido caso de contato garveísta com proeminentes fi-


guras políticas africanas tenha sido Jomo Kenyatta do Quênia, que supõe-se ter tido
contato com as idéias de Gravey já em 1921, tendo se encontrado com Garvey em
1930, e Kwame Nkrumah, de Gana, que reconheceu sua dívida com as idéias de
Garvey em diversas ocasiões.(52)

Na Inglaterra também, Garvey manteve contato com jovens ativistas,


muitos dos quais se tornaram futuros líderes políticos em organizações sediadas
em Londres com a União de Estudantes da África Ocidental, e o Escritório Interna-
cional de Serviço Africano, liderado por Wallace Johnson de Serra Leoa, George
Padmore de Trinidad e Outros. (53) Mas a região do Continente em que a UNIA
parece ter florescido mais foi na África do Sul. Talvez isso possa ser um indicador
da severidade do racismo sul-africano, pois os escritórios da UNIA sempre tende-
ram a se proliferar nas áreas mais opressivas, como o sul dos Estados Unidos e Cu-
ba. Talvez, por outro lado, isso tenha sido um indicativo do avanço de um proleta-
riado preto mais organizado na África do Sul, comparado ao resto da África.

A África do Sul já havia também estabelecido o hábito de contato próximo


com Afro-Americanos através da Igreja Metodista Episcopal (Bispo Turner havia
visitado a África do Sul por várias vezes antes da virada do século) e através de
diversas figuras proeminentes que receberam educação Afro-Americana. Além dis-
so, na África do Sul, como em outras regiões, a presença de um grupo numerica-
mente insignificante, mas altamente motivado e ativo de Caribenhos, muitos dos
quais missionários do Garveísmo, pode ter influenciado a situação.

Uma indicação óbvia do interesse Sul-Africano em relação à UNIA é ofe-


recida pelas cartas de leitores ao Negro World. Aparecem mais cartas da África do
Sul, bem como do sudoeste Africano, do que de qualquer outro país Africano. Uma
carta de 1929 demonstra amplamente o espírito que permeava essas correspon-
dências. Nela se lê, “É mera estupidez e puerilidade dizer que os nativos Sul-
Africanos estão apáticos em relação à UNIA. Mesmo as Leis draconianas de Hertzog
e Ross não puderam, a esse tempo, desencorajá-los em sua determinação para ade-
rir aos nobres ideais do Garveísmo.” (54). A evidência provida por essas cartas, são
corroboradas por indicações de grande interesse sobre Garvey, não somente nas
cidades maiores como Cidade do Cabo e Johannesburgo, mas também em vizi-
nhanças como a terra dos Bechua, entre garotos da missão escolar no leste da Ci-
dade do Cabo e mesmo “nos rincões remotos de Ciskei e Transkei.” (55)

Os escritórios da UNIA na África do Sul parecem ter sidos mais ativos que
qualquer outro. Eles enviaram delegados para as convenções de Garvey nos Esta-
dos Unidos e relataram estar preparando para enviar delegados para a Convenção
Jamaicana em 1929.(56) O presidente da divisão da Cidade do Cabo editava uma
publicação chamada The Black Man, (57) e do enclave britânico da Basutoland, vi-
nham notícias de grandes convenções da UNIA em 1924.(58) Alguns escritórios Sul
Africanos enfrentaram problemas que eram comuns em toda parte. Um membro
da divisão de Evanton explanou em 1927 que os encontros estavam acontecendo
em lugar aberto, porque a divisão ainda não havia adquirido um salão. Além disso,
escreveu, “os pastores nativos estão contra nós, eles não nos permitem organizar
nenhum encontro nas igrejas ou escolas, porque eles possuem o espírito de ho-
mem branco, de manter os negrinhos tão baixos quanto seja possível...”(59) Alguns
desses escritórios tiveram uma vida longa. Bem tarde em 1935, a primeira contri-
buição não solicitada para um novo fundo pró-Garvey, veio da África do Sul,(60) e
pelo menos um dos escritórios se manteve ativo até 1958.(61)

A UNIA foi ativa na luta pelos direitos humanos na África do Sul. Esta-
va entre as trinta organizações que participaram em 1927 da Conferência Não-
Européia em Kimberlt, descrita por John Padmore como uma das primeiras tenta-
tivas de uma frente nacional unificada entre os povos sul-africanos.(62) O Black-
man, de Garvey, relatou em que em junho de 1930, dois mil africanos se reuniram
sob os auspícios da UNIA para protestar contra o Riotous Assemblies Act, que proi-
bia manifestações e protestos em lugares públicos.(63) A UNIA também teve in-
fluência na luta por direitos humanos ao se infiltrar no alto escalão das duas maio-
res organizações Africanas, a Industrial and Comercial Workers Union (ICU) e no
Congresso Nacional Africano (ANC).

A representação da UNIA na hierarquia da ICU parece ter sido facili-


tada pela presença da Comunidade Caribenha da África do Sul. Clements Kadalie,
líder da ICU, relata que em sua formação em 1919, havia um Número considerável
de caribenhos na Cidade do Cabo. Muitos dos quais trabalhadores portuários – es-
tivadores, carpinteiros, contramestres.(64) Os arquivos da UNIA fornecem evidên-
cias ocasionais de Garveytas caribenhos tais como um homem não identificado em
Durban ainda em 1920, que esteve na África por vinte anos e falava diversas lín-
guas africanas fluentemente. Essa pessoa viajou pela África do Sul e regularmente
recebia cópias do Negro World “de um jeito particular.” (65) Novamente em 1925
o presidente da divisão de Luderitz, sudoeste da África anuncia a morte de um Ar-
thur Cecil Grainger, de quarenta e quatro anos, vindo de São Vicente. Grainger foi
para a África do Sul durante a Guerra Bôer e ali permaneceu. (66) E em 1939, ou-
vimos falar da morte de um jamaicano Arthur Mackinley, um agente do Black Man
de Garvey, na Cidade do Cabo.(67)

Um jornal branco da África do Sul em 1923 também estimava que havia


cerca de duzentos afro-americanos na Cidade do Cabo.(68) Não é improvável que
possivelmente alguns desses fossem nascidos no Caribe. Garveytas caribenhos
eram freqüentemente descritos, especialmente por autoridades européias, como
americanos pretos, e muitos tinha realmente vivido na América por períodos vari-
ados. Arthur Mackinley estava entre esse da Cidade do Cabo, descrito em uma oca-
sião como americano.(69) Em 1922, escutamos sobre uma divisão em Claremont,
Cidade do Cabo, sendo organizada por T.L. Robertson, de Nova York.(70)

Talvez por conta de sua posição portuária estratégica, os caribenhos esti-


vessem pesadamente representados na hierarquia da ICU. Kadalie conta que em
sua formação em 1919, o segundo presidente da ICU James King e o terceiro presi-
dente, J.G.Gumbs, eram caribenhos. O Comitê Executivo, ele registra, frequente-
mente continha três ou quatro caribenhos. E J.G.Gumbs, um químico e armador do
porto de Cidade do Cabo, foi o presidente da ICU de 1924 até sua morte em
1929.(71) Enquanto o jornal branco Cape Argus acreditava que o problema da lin-
guagem restringiria a mobilidade da população afro-americana de Cidade do Ca-
bo,(72) Kadalie considerava que ser forasteiros, dava vantagem para os caribenhos
na ICU. Ele conta que Gumbs, “era bem respeitado por todos assim como eu, ele era
livre de afiliações tribais.”(73) (Kadalie era do povo Nyasa.) Um residente de Cida-
de do Cabo arrisca a opinião de que “os caribenhos são duros, negros osso duro, do
tipo que se destaca, agressivos e ousados.” (74)Os caribenhos da ICU eram gar-
veytas convictos, até demais, para Kadalie, que teve que se precaver contra o que
ele considerava uma tentativa de transformar a organização em uma auxiliar da
UNIA. Ele conta ter feito isso, porque discordava de seguir a dois mestres ao mes-
mo tempo e porque discordava do slogan “Africa para os Africanos”, preferindo o
chamado para a luta Panafricanista local.(75) Kadalie preferia de todo jeito, não
participar na luta que se desenrolou dentro da ICU, entre os Garveytas liderados
por Gumbs, e os comunistas, que acabaram por ser expulsos.(76) Apesar de seus
medos concernentes à tomada da ICU pela UNIA, a inscrição nos dois grupos conti-
nuou. O próprio Gumbs foi por muitos anos membro do quadro consultivo da UNIA
em Cidade do Cabo. (77)

Muitos admiradores de Garvey também se encontravam em posições de li-


derança da ANC. Um era o Professor James Thaele, presidente da ANC em Cabo
Oeste. Thaele era graduado na Universidade de Wilberforce e havia estudado por
quinze anos nos Estados Unidos.(78) Ele começou a promover as doutrinas de
Garvey assim que retornou,(79) e junto com J.G.Gumbs, parece ter sido um dos
mais prestigiados oradores em importantes funções na UNIA. (Eles falaram no
mesmo palanque em uma ocasião.)(80) Nós podemos mesmo encontrar Thaele
parabenizando o trabalho Africano da UNIA em um encontro da ICU.(81)

Em 1929 Thaele começou a editar o The African World, que instantanea-


mente se tornou uma grande vitrine da propaganda Garveísta. O primeiro número
trazia no editorial, “ Eu acredito que isso é essencial para o sucesso inicial de nossa
causa, que os africanos do continente busquem cooperação com os africanos mun-
do afora. A UNIA é a maior coisa atualmente, em organização Negra moderna. Seu
programa deve ser escrutinado, embebido e assimilado por nós...” Ele chega a su-
gerir que o “ Negro World deve ser uma Bíblia pra nós...(82) A celebração do Dia de
Garvey na Cidade do Cabo em 1925 foi pelo menos em parte, devida à insistência
do The African World.(83) O trabalho do The African World era paralelo a outra
publicação da ANC, o Abantu Batho, reedições dos artigos pró-UNIA também en-
contrados no Negro World.(84) As convenções da ANC entre 1925 e 1927 acatou
resoluções exigindo a libertação de Garvey da prisão. (85)

Havia outros pontos de contato entre o Garveísmo e os sul-africanos. So-


lomon T.Plaatje, que viajou pelos Estados Unidos em 1921, levantou fundos para
seu trabalho entre os mineiros de Kimberly, foi acolhido por Garveytas e falou nos
Liberty Hall de vários estados.(86) Em seu retorno à sua terra, Plaatje parece ter
alarmado os oficiais britânicos por sua posição pró-Garvey.(87) A Igreja Africana
Ortodoxa também encontrou seu caminho na África do Sul. (88)

A reação do oficialato sul-africano às atividades Garveístas parece ter si-


do, de alguma forma, menos histérico do que em suas contrapartes européias. O
primeiro Ministro J.C. Smuts explica sua atitude em 1923. Ele sabia que a UNIA ti-
nha “tentado trabalho de propaganda na União, principalmente em Cidade do Cabo
e Johannesburgo, mas...sem muito sucesso.” Ele continua, “ Nenhuma ação repres-
siva foi tomada contra os agentes dessa organização, ainda que suas atividades
estejam sendo cuidadosamente acompanhadas.” Ele considerava que a UNIA esta-
ria “ sem estabilidade moral ou financeira.” Ele conclui em tom familiar, “Que al-
guma quantidade de equívocos vem sido cometida por pessoas ignorantres e mal
guiadas, está fora de dúvida, e sobre esse ponto os Ministros têm essa organização
com disfavor.”(89) A UNIA parece ter sido sujeitada a algumas perseguições, de
todo modo, como adulteração de correspondências e em alguns lugares, confisca-
ção do Negro World.(90) E parece que se tornou quase impossível para Afro-
Americanos ou caribenhos conseguir entrar na África do Sul.(91)

Uma das expressões mais usadas pra descrever a UNIA, foi “Movimento
de Volta para a África,” um rótulo que desagradava muito a Garvey. Garvey costu-
meiramente preferia afirmar que a UNIA advogava o retorno de pioneiros capazes
de fazer uma contribuição ao desenvolvimento Africano.(92) Ainda que suas falas
freqüentemente fossem além disso, e parecessem sugerir uma migração em larga
escala, como alegavam seus críticos. Ele sugeriu algumas vezes que essa imigração
teria lugar após os pioneiros terem completado seu trabalho. (93) E ele certamente
apoiou a Lei Bilbo, de 1939, que visava a repatriação gradual da maioria dos Afro-
Americanos. Também foi dito que o segundo Encontro da UNIA na Jamaica, teve
como tema o “Retorno para a África.” (94)

Nesses apelos ambíguos por retorno à África, está a fonte de uma porção
significativa do apelo de massa da UNIA. O poder do impulso imigracionista na his-
tória Afro-Americana ainda está por ser devidamente apreciado. Durante os anos
de Garvey na América, cartas ainda eram enviadas aos escritórios da Sociedade
Americana de Colonização, por pessoas pretas que não conseguiam mais suportar
a opressão Americana e ansiavam por um escape para a África. “Agora alguns de
nós estamos te implorando para nos enviar de volta para a África”, escreveu um
remetente de Oklahoma em 1920. Ele estava tão ansioso que começou a vender
sua propriedade antes mesmo que os arranjos pra enviá-lo estivessem finalizados.
(92) Esse impulso ainda era tão grande em 1927 e 1928, que uma impostora, as-
sim-chamada Laura Coffey, conseguiu enganar alguns pretos sulistas, alegando ser
representante de Garvey enviada para coletar fundos para propósitos imigracio-
nistas. Algumas pessoas chegaram a abandonar suas propriedades para ir esperar
por navios que ela afirmara terem sido enviados por Reis Africanos para Miami e
Jacksonville para transportá-los para a África. (96)

As atividades da UNIA na Liga das Nações foi principalmente engrena-


da pela obtenção de uma base na África Oriental da Ex-Alemanha Oriental, ou Áfri-
ca Sudoeste, mas foi na Libéria , a casa tradicional dos Africanos do Novo Mundo
retornados, que o grosso dos esforços imigracionistas foi concentrado. A UNIA es-
teve desde o início, bem conectada na Libéria. John E. Bruce, era um velho amigo
do Chefe de Justiça J.J.Dossen. O Primeiro Assistente do Presidente, General Dr.
LeRoy Bundy era irmão de Richard Bundy, secretário da delegação Americana em
Monróvia.(97) O Reverendo Frances Wilcome Ellegor, um dos primeiros Oficiais da
UNIA, havia sido professor no Liberia College. O Conselheiro Legal da UNIA, foi o ex
presidente Arthur Barclay,(99).

Tentativas de cortejar o governo da Libéria, já tinha tido início em 1919,


quando o Alto Comissário da UNIA na França, Eliezer Cadet, deixou diversas cópias
do Negro World com os delegados Liberianos no Congresso Panafricano em Paris.
Ele também entrevistou C.D.B. King, que logo se tornaria o presidente da Libéria.
King é tido como quem sugeriu a Cadet que se as condições na Ámérica eram tão
ruins, então so Afro-Americanos deveriam ir para a Libéria.(100). Um ano mais
tarde nos Estados Unidos, King conclamou novamente os Afro-Americanos a mi-
grar para a Libéria.(101). Além disso, se esses chamados parecem estar favoráveis
às aspirações da UNIA, existem outras indicações ao contrário. As fontes da Inteli-
gência inglesa relatam que o presidente liberiano afirmava não ter afinidade com
as lutas do povo preto que estavam assolando a América. (102) e King aparente-
mente havia demonstrado as mesmas inclinações em seu encontro com Ca-
det.(103) A tendência de parte das autoridades liberianas de expressar sentimen-
tos conflitantes a respeito das atividades da UNIA se tornou mais marcante com o
passar dos anos. Antes do fim de 1919, de todo jeito, Garvey anunciou sua intenção
de mudar o seu quartel general para Monróvia, após a convenção de 1920.(104)

Tendo em vista esses relatos conflitantes das atitudes da Libéria, Garvey


tomou a decisão sensível de despachar um comissário, Elie Garcia, para a Libéria
no início de 1920, para dar conhecimento ao governo das intenções da UNIA e para
obter a aprovação oficial. Garcia informou aos governantes a respeito do formato e
do programa da UNIA, do desejo de mudar seu quartel general para a Libéria, e da
intenção de ajudar financeiramente a Libéria, em contrapartida ao plano de enco-
rajar a imigração para a Libéria. Garcia explicou que “ devido aos rumores que pre-
valecem aqui nos Estados Unidos a respeito da atitude não amigável do povo da
Libéria em relação a pessoas de outras comunidades negras, rumores que nossa
organização tem grandes razões para duvidar, pensamos que é melhor nos apro-
ximarmos do governo da Libéria a respeito da nossa intenção de comprar terras ,
antes de colocar em prática o nosso futuro programa.”(105). O Secretário de Esta-
do Edwin Barclay, respondendo pelo Presidente King, assegurou à UNIA “toda a
facilidade legal possível para efetivar os seus projetos industriais, agrícolas e de
empreendimentos.”(106) A atitude do governo foi corroborada por um Dr. Jordan,
da Convenção Batista Nacional, que informou a um Liberty Hall lotado, que en-
quanto jantava com o Presidente King, este havia expressado aprovação aos planos
da UNIA de se mudar para a Libéria.(107)

Enquanto na Libéria um observador astuto fez uma avaliação confiden-


cial das condições na República, e incorporou suas impressões em um relatório
secreto para Garvey. Ele anotou que apesar de bem provida de recursos naturais, a
Libéria era extremamente pobre devido à falta de iniciativa da minoria governante
Liberiana-Americana. Ele catalogou uma longa lista de problemas sociais, inclusive
rígidas distinções de classe, escravidão, poligamia, corrupção e má-gestão financei-
ra. Ele alertava que a UNIA deveria inicialmente diminuir qualquer intenção de
interferir na vida política do país, porque “ os políticos liberianos entendem clara-
mente que são degenerados e moralmente fracos, e eles sabem que se um número
de negros honestos com cérebros, energia e experiência forem pra a Libéria e ti-
vessem a permissão de tomar parte no governo nacional, eles seriam absorvidos
ou depostos rapidamente”. A UNIA deveria da mesma forma, suspender suas in-
tenções de “esclarecer as tribos nativas.” Garcia também apontou a precária corda-
bamba que a Libéria teria que atravessar entre os Estados Unidos, Inglaterra e
França.(108) Esse documento continha todos os principais elementos da relação
que deveria se desenvolver nos próximos anos entre a UNIA e a Libéria, e sua des-
coberta pelo governo liberiano pouco tempo depois, ajudou a assegurar o fracasso
do programa Liberiano de Garvey. Na convenção de 1920, enquanto isso, Gabriel
Johnson, padrasto do Presidente King e do Ministro de Monróvia, foi eleito Mestre
de Cerimônia da UNIA, e o próprio King repetia seu chamado para uma imigração
organizada, sem fazer nenhuma referência à UNIA. (109)

Sem nenhuma indicação de mudança de perspectiva da Libéria, a UNIA


deu seguimento a seus planos e, em março de 1921, enquanto Garvey estava no
Caribe, e King nos Estados Unidos, um pequeno grupo avançado de Oficiais e técni-
cos da UNIA desembarcou na Libéria. Os técnicos deveriam começar a trabalhar
em fazendas, construções e uma farmácia, entre outras coisas, e se esperava que a
Black Star Line logo iria trazer mais suprimentos e um grande número de imigran-
tes. Os trabalhadores estariam sob o controle duplo do Potentado Johnson e Cyril
Crichlow, secretário residente da recém-fundada Missão da UNIA.

Logo após da chegada desse grupo, uma delegação da UNIA, consistin-


do de Johnson, Crichlow e G.O.Marke, deputado supremo nascido em Serra Leoa, se
encontraram com o gabinete liberiano. O Gabinete ofereceu à associação “ alguns
lotes já disponíveis” e se preocupou a respeito de Companhias inglesas e francesas
iriam recusar carvão para os navios da Black Star Line. A questão de um potencial
problema da UNIA com os vizinhos da Libéria causava alguma preocupação, e a
delegação sentiu a necessidade de acalmar os medos do Gabinete e sua equipe. O
presidente Edwing Barclay então fez a seguinte declaração:

Eu devo admitir que a Inglaterra e a França


tem perguntado aos nossos representantes na América a esse res-
peito e nos fizeram perguntas objetivas a respeito da atitude do
Governo Liberiano em relação à UNIA. Devo dizer isso a vocês.
Não há um Negro no mundo que, se dado a oportunidade e o po-
der de fazer certas coisas, não as faria. Mas não é sempre aconse-
lhável e nem político, expor abertamente nossas intenções secre-
tas – nossos pensamentos secretos. Essa é a forma que fazemos –
ou melhor, que não fazemos – na Libéria. Nós não contamos a eles
o que de fato pensamos; nós só dizemos a eles o que queremos
que eles ecutem- que é, de fato, o que eles querem ouvir.(110)

Esse maquiavelismo da Libéria atordoou um oficial americano que temia


que Barclay poderia adotar a mesma atitude em relação aos americanos.(111) Mas
parece ter sido a UNIA a real vítima dessa duplicidade. Em junho, Crichlow já havia
concluído que os liberianos não queria nenhuma parte da UNIA, além do seu di-
nheiro.(112) Um oficial americano chegou à mesma conclusão, (113) como fez
Cyril Henry, um membro do grpo de técnicos da UNIA (114) E em 18 de julho, em
resposta a uma carta do Cônsul Geral inglês em Monróvia detalhando as atividades
pró-Libéria de Garvey na Costa Rica, Barclay escreveu: “Os movimentos e ativida-
des do Sr. Marcus Garvey não são de nenhum interesse prático para esse Governo,
assim como não foi dado e não será dado endosso aos seus esquemas fantásticos.
Passos já foram dados pelo Presidente King para pôr um fim à não autorizada e
injustificada exploração da Libéria.”(115) Essa declaração impressionante aconte-
ceu um ano após a carta de Barclay aprovando Elie Garcia, e quatro meses depois
do Gabinete intervir a favor dos comissários da UNIA. Talvez estivesse somente
dizendo aos ingleses aquilo que eles queriam ouvir, mas, mais provavelmente ele
estava dizendo a verdade, possivelmente pelo crescimento da impaciência e da
agressividade das declarações de Garvey, um fato sobre o qual havia aludido em
sua declaração à delegação da UNIA.

Enquanto a comissão avançada da UNIA estava fazendo seu trabalho na


Libéria, o próprio Garvey estava encalhado forçadamente no Caribe, proibido pelo
Departamento de Estado de reentrar nos Estados Unidos. Por conta disso, Crichlow
estava travado em seus esforços para manter contato regular, e Garvey bom pode-
ria estar desavisado por algum tempo do conteúdo das colocações do Gabinete. De
toda forma, há relatos de que Garvey teria falado em julho, nas Honduras Britâni-
cas, que o povo preto deveria se espalhar desde sua base na Libéria, até dominar
todo o Continente. (116) Enquanto isso, em junho, três meses após ter recebido
calorosamente uma delegação da UNIA em Nova York, (117) o Presidente King pu-
blicou uma carta aberta no jornal Crisis, de Du Bois, alertando que “sob nenhuma
circunstância” a Libéria iria “permitir que seu território fosse o centro de agressão
ou conspiração contra outros estados soberanos.”(118) Isso foi objetivo o suficien-
te, e após seu retorno aos Estados Unidos, Garvey anunciou que “ não estamos ten-
tando utilizar a Libéria como uma base para conquistar toda a África. Mas nós
acreditamos que a África pertence legitimamente à raça Negra.”(119) Isso foi se-
guido de mensagens a King e à Comissão Plenária da Libéria, negando objetivos
políticos. O Secretário da Comissão, respondendo a essa afirmação “mais oportu-
na”, reiterou que a Libéria não poderia “ser usada como centro de ataques hostis
contra outros estados soberanos.”(120)Enquanto esses eventos transcorriam, a
Unia na Libéria começava a vivenciar diversos problemas internos. Em 13 de janei-
ro de 1921, a associação foi incorporada por um Ato da legistratura Liberiana.
(121) Mesmo esse passo necessário e positivo, foi visto como potencial conflito por
Crichlow, já que estrangeiros não poderiam adquirir propriedades sob a lei liberi-
ana, e na ocasião de uma disputa, as terras compradas pela direção, poderiam ser
facilmente tomadas pela parte local. (122) . Além disso, as relações se deteriora-
ram entre o Potentado Johnson e Crichlow. Johnson, interpretando literalmente a
Constituição da UNIA, tomou a posição de que ele era a mais alta autoridade na
associação e tentou usurpar alguns dos poderes de Crichlow, especialmente sobre
os fundos da UNIA. Crichlow, por seu lado, não poderia lidar com “a postura arro-
gante, aristocrática, dogmática, dominadora e conservadora do potentado.” (123)
Havia também algum ressentimento sentido pelo presidente da Libéria e alguns
osficiais de alto-escalão, sobre o fato de, como Potentado, Johnson era supostamen-
te, o Cabeça de todo o Povo Preto do mundo, e ganhava um salário maior que o do
presidente.(124) A questão dos fundos insuficientes para o trabalho do Secretário
Residente e para o grupo de técnicos, foi posteriormente exacerbada. Crichlow re-
nunciou em junho de 1921, mas não sem antes dar um passo extraordinário em
apresentar sua disputa com o Potentado, ao Ministro dos Estados Unidos na Libé-
ria, Joseph L. Johnson.

O Ministro Johnson solicitou toda a correspondência relevante e


Crichlow o entregou um rico quinhão, incluindo seus relatórios confidenciais a
Garvey, outras correspondências confidenciais, instruções de Garvey a ele, e a
transcrição da reunião entre o Gabinete da Libéria com a UNIA. Todo esse material
foi prontamente enviado para o Departamento de Estado dos Estados Unidos.(125)
O ministro dos Estados Unidos prometeu então a Crichlow que “toda a força e po-
der do governo dos Estados Unidos seria utilizada para prevenir que qualquer
injustiça fosse feita a um cidadão Americano,” e Crichlow realmente depositou o
dinheiro da UNIA aos cuidados do Governo Americano, sob a alegação de que o
Potentado não poderia pôr suas mãos nele.” (126) Crichlow justificou seu recurso
aos Estados Unidos, comparando com a tentativa de Garvey de assegurar justiça,
nas cortes federais americanas.(127)

Enquanto isso no Harlem, os envios de dinheiro pareciam sugerir que


nada desagradável estava acontecendo na Libéria. Um empréstimo de 2 milhões da
UNIA continuava de pé.(128) E na convenção de agosto, o auditor relatou mais de 8
mil dólares gastos com madeiras e outros materiais de construção na Libéria.(129)
Garvey também anunciou, baseado, ele disse, na palavra do Potentado, que os pio-
neiros estavam indo bem e haviam comprado uma fazenda de duzentos
acres.(130) O próximo grande acontecimento foi em março de 1922, quando o in-
fluente jornal imperialista sediado em Londres, O Mundo Africano, publicou o rela-
tório secreto de Garcia para Garvey, e sua carta ao Presidente King.

O vazamento do relatório, com seus comentários desfavoráveis sobre a


sociedade Liberiana, e sua discussão franca sobre os objetivos na Libéria, em toda
a sua crueza, pôs um fim às chances de sucesso de Garvey, mesmo que ele tenha
mantido seus esforços por mais dois anos. O Liberian News, relatou que esses do-
cumentos “dão uma imagem clara dos propósitos revolucionários da UNIA na Libé-
ria, e determina a irrevogável atitude de oposição por parte do governo.”(131) O
African World não revelou o que tiveram que fazer pra ter acesso a esses docu-
mentos, mas declararam apenas que essa correspondência havia sido “enviada de
Nova York para Monròvia,” sugerindo que o relatório de Garcia poderia já estar nas
mãos do governo da Libéria, no tempo em que seu jornal o recebeu. Entre aqueles
que demonstraram grande interesse nesses documentos, foram os oficiais ameri-
canos na Libéria. (132) Garvey parece ter ignorado publicamente esse grande con-
tratempo.

Após um período de relativa inatividade ocasionada parcialmente por


seu julgamento e aprisionamento, em dezembro de 1923, Garvey despachou uma
nova delegação para a Libperia, formada por Robert L. Poston, secretário geral e
líder da delegação, Henrietta Vinton Davis, quarta assistente do presidente geral, e
Milton Van Lowe, um advogado de Detroit. Eles viajaram via Lisboa, onde se encon-
traram com a Liga Africana, um grupo composto por africanos portugueses, e che-
garam na Libéria em fevereiro. (133)
Na Libéria a delegação foi recebida com calorosas boas vindas.(134) No
entanto, a missão de 1924 foi grandemente uma repetição da experiência de 1921.
O governo da Libéria disse a eles o que eles queriam escutar, enquanto aparente-
mente contando as horas antes de destruir os esforços da UNIA Liberiana. O Pre-
sidente King assegurou aos membros da delegação que eles deveriam ignorar a
propaganda anti-UNIA. Ele sugeriu que os artesãos e o material deveriam preceder
o corpo geral dos colonos da UNIA. (Garvey já havia lhe prometido entre vinte e
trinta mil famílias em dois anos começando por volta de setembro de 1924.)(135)
King também sugeriu o apontamento de uma comissão local de coalizão. Isso foi
imediatamente acordado na mesma noite. Ela incluía o Vice-Presidente H.T.Wesley,
o Chefe de Justiça James J. Dossen, os ex-presidentes Arthur Barclay e D.E.Howard,
o Controlador de Costumes, além de dois outros. (136) Entre outras coisas o comi-
tê se articulou a concessão de um edifício pertencente ao enteado de King, como
um comissário da UNIA. (137)Uma entusiástica e calorosa despedida foi oferecida
à delegação, que retornou a Nova York com a esperança de que os primeiros colo-
nos iriam navegar em um navio da UNIA imediatamente após a convenção de
1924.(138) Essa euforia foi arrefecida, de todo jeito, pela morte do chefe da dele-
gação, Robert Lincoln Poston, durante a travessia marítima. (139) E simultanea-
mente, com o retorno da delegação em março, veio a sinistra reportagem jornalís-
tica, afirmando que a Libéria não queria imigrantes e que o Presidente King havia
se recusado a receber a delegação. (140) Claro que King havia se encontrado com a
delegação, mas, de acordo com o Cônsul inglês em Monròvia, recusou encontrá-los
formalmente, optando por uma reunião privada. (141)Garvey tentou ignorar essas
reportagens, enquanto tentava alguma confirmação de King. (142) Começando em
junho, o Reverendo R.Van Richards, capelão do senado da Libéria e enteado do
Chefe de Justiça Dossen, assumiu o papel de defender a UNIA em uma série de dis-
cursos no Liberty Hall. (143), Mas mesmo que Richards estivesse tentando jogar ao
descrédito as reposrtagens sobre a hostilidade liberiana, seu governo estava se
articulando para esmagar os esforços da UNIA de uma vez por todas. Em 30 de ju-
nho de 1924, o Secretário de Estado Edwin Barclay, informou às companhias de
navegação, que nenhum dos membros do “assim chamado movimento Garveyta”
deveriam ter permissão para aportar na Libéria. (144) Por essa época, os oficiais e
técnicos da UNIA já estavam em a caminho, como sugerido pelo comitê de conces-
são inspirado por King. Em 25 de julho, três deles aportaram em um navio alemão.
Eles foram imediatamente presos e deportados no próximo navio alemão de volta
a Hamburgo. Em resposta a um inquérito, o cônsul inglês não acreditou que de-
vesse intervir em favor de um deles que era inglês, “tendo em vista as conhecidas
mal-práticas da UNIA.”(145) A embaixada americana reportou que outros três,
todos ingleses, chegaram em 30 de julho e foram deportados.(146) Dois mais che-
garam em 4 de agosto e não tiveram permissão para aportar.(147) Enquanto isso,
em 10 de julho, o cônsul geral da Libéria nos Estados Unidos, Ernst Lyon, anunciou
que os garveytas não teriam permissão de aportar na Libéria e que os cônsules
liberianos nos Estados Unidos não deveriam expedir vistos para tais pessoas. Aos
solicitantes de vistos passou a ser requerido que fornecessem um depoimento
mostrando que eles não eram conectados à UNIA. (148) Em agosto, Lyons buscou
a assistência do Departamento de Estado dos Estados Unidos, para tornar a posi-
ção da Libéria mais conhecida. Por sugestão do Secretário de Estado Charles E.
Hughes, representantes da Associated and Uninted Press foram chamados. O resul-
tado foi a disseminação da posição liberiana, que também recebeu reforço por uma
declaração preparada pelo Departamento de Estado. (149)No meio de toda essa
névoa, a imprensa anti-Garvey recebeu uma desculpa posterior, para deslegitimar
os esforços da UNIA da Libéria, quando foi amplamente divulgado que um repre-
sentante da UNIA na Libéria havia sido assassinado. Ocorre que o homem, Milton J.
Marshall, era um impostor que coletou dinheiro nos Estados Unidos fingindo ser
um representante da UNIA, e que havia sido preso por uma tempo na Nigéria antes
de se mudar para a Libéria. (15)

A resposta de Garvey a esses contratempos, foi raivosa e com um pouco


de descrença, já que o governo da Libéria em nenhum momento tenha tido a mí-
nima cortesia de uma comunicação direta repudiando os acordos. Em uma declara-
ção de 26 de julho, Garvey diz que está mais determinado do que nunca para seguir
em frente com seus planos na Libéria. (151) No dia anterior, 25 de julho, o mesmo
dia em que o primeiro representante da UNIA foi deportado da Libéria, um navio
com material da UNIA deixou Nova York em direção à Libéria no S.S. West Irmo, da
United States Shipping Board, operado por A.H.Bull and Co. Isso também, estava
em concordância com as susgestões do Presidentes King ao comitê de concessão. A
carga consistia em dois motores de trator, uma serraria e outros equipamentos
avaliados em 6, 169.82 dólares, ainda que Garvey tenha dito que somada essa à
carga anterior de 25 de julho, estariam avaliadas em mais de 50 mil dólares. (152)
Os bens foram embarcados pela H.D. Taylor Company, de Buffalo , nova York, e
deveriam ser retiradas na Libéria pelo cosignatário, o Chefe de Justiça Dossen. Em
30 de julho, a UNIA entregou um cheque a H.D.Taylor Co. pelos bens. Não havia
fundos suficientes na conta para honrar o cheque, então por volta de 21 de agosto
a companhia solicitou ao United Shipping Board, que parasse a carga em trânsito.
Isso somente um dia após a carga ser agendada para chegar à Libéria , e nesse
momento em que chegou o telegrama solicitando a suspensão da entrega, a carga
já tinha sido descarregada. Foi decidido então que a carga seria armazenada em
um depósito até que o dinheiro fosse pago. A conta foi paga efetivamente em de-
zembro, e a UNIA estava agora livre para retirar a carga, mediante somente ao pa-
gamento dos custos de armazenamento. Pra piorar a situação, o Chefe de Justiça
Dossen morreu em 17 de agosto, poucos dias antes da carga alcançar a Libé-
ria.(153) e ela nunca foi retirada. (154) as autoridades alfandegárias inicialmente
tentaram vender a carga para cobrir os custos de armazenamento, e aparentemen-
te teria entrado em contato com a UNIA da Libéria para tratar do assunto. (155)
Ainda em março de 1925, a carga continuava armazenada, e o governo tentou ne-
gociar com os representantes da UNIA (presumivelmente do escritório da Libéria),
para comprá-los. (156)

Os bens foram eventualmente vendidos pelo governo da Libéria pra pagar


os salários atrasados dos oficiais, de acordo com algumas fontes. (157) De acordo
com outra fonte, elas foram vendidas somente para pagar os custos com a estoca-
gem das cargas. (158)

No Harlem, enquanto isso, a Convenção Anual começou em 1 de agosto e


rapidamente despachou um telegrama ao Presidente King expressando “alarme e
surpresa” aos relatos sobre a hostilidade Liberiana.(159) Semanas depois, seguiu-
se uma resolução protestando unanimemente contra as ações do governo da Libé-
ria. (160) Durante a Convenção, o Reverendo Van Richards apoiou a posição da
UNIA, chamando mesmo o banimento da associação pelo seu governo de “vergo-
nha fedorenta.”(161)Um dos últimos atos da Convenção foi despachar uma petição
para o senado da Libéria e para a Casa dos Representantes. A petição reforçava a
base ideológica dos interesses da UNIA na Libéria. Nele se lia:

Por seis anos essa associação conduziu um contínuo siste-


ma de educação entre esse povo no intuito de que eles estivessem
organizados em um grande movimento no sentido de seu retorno
para a África, de onde os seus antepassados foram retirados sécu-
los atrás, para que se reabilitassem e voltassem a possuir a terra
da qual são os donos originais. Com esse objetivo em mente, foi
decidido que o modo mais conveniente de estar aptos para ajudar
sua terra nativa – África- seria apoiando a República da Libéria
para se estabeler como uma nação de sucesso através de seu mais
avançado desenvolvimento industrial, comercial e agrícola, pro-
vando completamente a habilidade indiscutível do Negro para se
auto-governar.

A petição também recontava a história das relações entre a UNIA e a Libé-


ria, citando da constituição liberiana, que o efeito do “grande Objetivo” de iniciar a
nação Liberiana foi “prover um lar para os dispersos e oprimidos filhos da África e
regenerar e iluminar esse continente ignorado.” (162) A Convenção deu seguimen-
to a tudo isso, com o apontamento de uma delegação de seis membros que entre-
garam ao Presidente Coolidge uma “Petição de Quatro Milhões de Negros dos Esta-
dos Unidos da América à Sua Excelência o Presidente dos Estados Unidos Pedindo
Por Consideração Amigável e Simpática Ao Plano de Fundar Uma Nação na África
Para o Povo Negro e Encorajá-los Em Apoiar O Desenvolvimento Das Nações Ne-
gras Já Existentes Como Forma de Ajudar a Resolver Os Conflitantes Problemas
Raciais.”(163)

Esses esforços não resultaram em nenhum benefício relevante. A im-


prensa inimiga, por outro lado, continuou em sua luta diária. O New York Times
expressou estar impressionado com os poderes de persuasão de Garvey. “ Um ho-
mem que consegue persuadir alguns milhares de negros americanos de que eles
estariam melhor lá na Libéria ou em qualquer outra parte da África, do que eles
estariam nesse país,” o editorial finalizava, “ pode lidar com quase qualquer pro-
blema com alguma esperança de sucesso.”(164) O Liberian News, que geralmente
refletia as atitudes oficiais em relação à UNIA, publicou um longo , e parcialmente
falso, apontamento das relações UNIA-Libéria, afirmando, entre outras coisas, que
o Secretário de Estado Edwin Barclay em 1921, “disse com franqueza ( à delegação
da UNIA) que o Governo não daria nenhum apoio aos seus esquemas.” (165)

O Chicago Defender se tornou objeto de um processo da UNIA, por suge-


rir em julho que “os oradores ensaboados e os barcos a vela do movimento de Gar-
vey”, haviam sido repelidos da Libéria , e por afirmar que um agente da UNIA na
Libéria havia assassinado um colega Garveyta devido à pobreza causada pelo não
recebimento de seus salários. Processos por causas similares foram trazidos contra
o Pittsburgh Courier e o AfroAmerican, de Baltimore. Os casos foram negados sem
custos pela corte de Nova York por estarem fora de sua jurisdição, ou por falta de
produção de provas suficientes pelos queixosos. (166)

O mais estranho episódio referente à imprensa hostil, foi a publicação pe-


lo New York Amsterdam News, do relatório secreto de Elie Garcia, de 1920. De
acordo com esse jornal, correspondência secreta da UNIA referente à Libéria, foi
roubada dos arquivos da UNIA e trazidos para o escritório do jornal, bem como
para o inimigo comunista de Garvey, Cyril Briggs, que estava prestes a publicar
esse material, quando este foi roubado por Cyril Crichlow, que se tornara um anti-
Garveyta. Crichlow o enviou então ao Capitão James Jones. Daí a correspondência
seguiu até “alguns quartéis diplomáticos”, de onde por sua vez, foi roubada por
uma agência de detetives que a trouxe de volta para Baltimore (onde vivia o cônsul
geral da Libéria), para Garvey. O jornal aparentemente tinha visto os documentos
por tempo suficiente para transcrever o relatório de Garcia. (167) Garvey também
os publicou. (168) E como forma de se assegurarem duplamente, os presidentes
dos Estados Unidos e da Libéria, recomeçaram suas hostilidades contra os planos
liberianos de Garvey. Em uma conferência em setembro de 1924, o presidente de-
clarou que iria cooperar com a Libéria nesse sentido e em dezembro, expressou
seu alívio por “o espectro de Marcus Garvey estar agora completamente exorciza-
do.”(169)

A questão que permanece é de por que o governo da Libéria, após prover


Garvey com o encorajamento inicial, repudiou os acordos de forma tão insultante.
Um grande motivo foi o medo da Libéria de seus vizinhos franceses e ingleses. O
então presidente Edwin Barclay, é bom lembrar, informou em 1921 à delegação da
UNIA, o interesse de ingleses e franceses sobre as atividades garveytas. E em seu
discurso inaugural de janeiro de 1924, o Presidente King incluiu muita bajulação
sobre a cooperação com a França e a Inglaterra para o progresso da África. (170)
Logo após o banimento da UNIA, Edwin Barclay declarou que a associação tinha
“uma tendência avessa às relações amigáveis” com os países adjacentes. (171) Em
setembro, o cônsul geral da Libéria nos Estados Unidos disse a oficiais do Depar-
tamento de Estado bem francamente que a UNIA advogar um Império Preto na
África sempre provocou protestos da Inglaterra e da França em Serra Leoa e na
Costa do Marfim, respectivamente. Segundo ele, os liberianos temiam ser realmen-
te absorvidos por esses poderosos colonialistas, caso esse tipo de propaganda ti-
vesse permissão para continuar. (172)

Garvey certamente contribuiu para esse tipo de reação. Durante os jul-


gamentos de 1921, o Capitão Cockburn, da Black Star Line, testemunhou que em
seu primeiro encontro com Garvey havia perguntado se seria possível posicionar
uma frota de navios de guerra na baía de Monróvia.”(173) E apesar de saber que os
vizinhos ingleses e franceses da Libéria estavam entre seus mais poderosos inimi-
gos, (174) ele ainda sugeriu em um panfleto de 1924, que eles poderiam tomar
Serra Leoa e a Costa do Marfim, para que pudessem formar junto com a Libéria um
grande Estado.(175) Além disso, a delegação de 1924, havia requerido seis assen-
tamentos para quinhentas famílias cada, quatro na fronteira francesa, dois na fron-
teira britânica. O cônsul britânico relatou que os quinhentos acres concedidos nes-
sa época, não estava em nenhuma fronteira, mas o Liberian News relatou que o Rio
Cavala, era o local onde os franceses eram mais fortes. (176)

O timing dessas sugestões sobre os assentamentos se revelou especial-


mente desafortunado, tendo em vista que a Libéria vivenciou um problema real
com suas fronteiras em 1924. O Presidente King relatou mais tarde que seu país
temia uma invasão francesa. (177) Os ingleses, por sua parte, estavam tão sensí-
veis sobre suas fronteiras coma Libéria, que em 1925 eles se opuseram ao estabe-
lecimento de ferrovias, estradas ou via fluvial entre a Libéria e a Guiné Cronacry,
nas vizinhanças das fronteiras sudoeste de Serra Leoa. (178)

O tamanho da paranóia britânica sobre a presença tão próxima da UNIA,


pode ser medida pelo alívio coma derrota de Garvey. O governador de Serra Leoa
enviou um navio de guerra para King e sua esposa visitarem seu país. Em um ban-
quete em honra de King, o governador assegurou que “por ter batido a porta na
cara do...homem que tentou tornar a Libéria um foco de animosidade racial nesse
Continente,” ele teria “merecidamente ganhado a gratidão...de todos aqueles que
tem a verdadeira preocupação com o bem estar da África em seus corações.”(179)
Os franceses fizeram de King, um Cavaleiro da Legião de Honra.(180)
Garvey não ficou impressionado. Ele escreveu, “Foi-se o tempo em que os
nativos africanos eram induzidos a partilhar suas riquezas, seu ouro e seu diaman-
te e marfim, em troca de lenços e miçangas. No ano de 1925, quando a África está
acordando de seu sono, e se torna progressivamente difícil enganar até mesmo as
pessoas de mente mais simples, um “intelectual” preto poderia perder sua alma, se
tudo o que ele arrecada é um título e um passeio em um navio de guerra. Certa-
mente, Charles Dunbar King vai cair desonrado e esquecido pelos homens pre-
tos.”(181) Em um discurso em sua Convenção, Garvey foio mais explícito. “A maldi-
ta audácia disso,” disse, “que um bando de estupradores anglo-saxões, vilões e ca-
nalhas e bandidos, fiquem da Europa dizendo que nós não devemos ir para a Áfri-
ca.”(182)

Outra grande preocupação que influenciou a atitude da Libéria, foi o


medo de que Garvey pudesse engendrar um golpe de estado na Libéria. As evidên-
cias parecem sugerir que Garvey realmente teve desejos de poder político ligados à
república Africana. Aqui, mais uma vez, de todo jeito, Garvey pode ter pesado a
maõ muito cedo, na dureza de suas afirmações.

Já em 1920, como foi visto, Elie Garcia havia avisado Garvey da hostilida-
de liberiana contra os imigrantes que “demonstrassem qualquer tendência a to-
mar parte da vida política da república.”Garcia aconselhou que os agentes da UNIA
deveriam “negar firmemente qualquer intenção de nossa parte de entrar na políti-
ca da Libéria.” Garcia provavelmente revelou as intenções da UNIA quando ele
acrescentou, “essa atitude irá remover qualquer idéia possível de oposição e não
irá nos impedir quando tivermos uma posição segura no país, de agir da melhor
forma que desejemos, pra seu próprio benefício e para benefício da Raça como um
todo.”(183) O conselho de Garcia foi reforçado pelos emissários da associação em
1921. Ciryl Crichlow advertiu que a distribuição dos imigrantes da UNIA deveria
ser “de acordo com os propósitos do sistema unipartidário, de manter sua existên-
cia intacta.” Em outras palavras, os Garveytas deveriam estar espalhados nos as-
sentamentos já existentes, em lugar de serem permitidos a se concentrarem em
algumas áreas. Isso iria “permitir aos liberianos que estivessem em ascendência
política e dominantes nas eleições.” Crichlow concluiu que Garvey deveria ter cui-
dado com isso, no sentido de “entender em que medida isso significava deixar de
lado o programa político da Associação.”(184) Um dos membros do corpo de técni-
cos também experessou uma visão parecida. (185) E um oficial americano monito-
rando a situação, chegou a conclusão de que “a partir da informação que tenho em
mãos, podemos sem dificuldade entender que a UNIA possui ambições políticas na
Libéria. Esse é o ponto que deve ser cuidadosamente acompanhado Algumas cen-
tenas de Negros Americanos radicais desembarcados na Libéria, podem derrubar o
governo como está constituído, e tentar substituí-lo por um regime dominado pe-
los sentimentos do movimento de Garvey, se não, sob o domínio mesmo da própria
organização.”(186)

O impacto político que mesmo algumas centenas de assentados da


UNIA poderiam causar, pode ser apreciado quando é percebido que todo o eleito-
rado liberiano em 1920 consistia de aproximadamente 5.000 Americanos-
Liberianos,. Somados a um punhado de Africanos nativos.(187) O problema foi tra-
zido para o Liberty Hall em dezembro de 1921, quando o Reverendo Dr. R. Harten,
um missionário na Libéria, informou aos Garveytas do medo dos liberianos de um
governo da UNIA paralelo ao Governo.(188)

Ainda em maio de 1922 (provavelmente devido à recente exposição do re-


latório secreto de Garcia em Londres) Garvey atacou abertamente o “grande nú-
mero de homens de mente estreita” que estavam monopolizando o poder na Libé-
ria para o benefício de poucos , e os desfiou abertamente. “ A Libéria foi fundada a
mais de cem anos atrás,” escreveu, “com o propósito de ajudar os refugiados, os
escravos e os africanos exilados a estabelecer uma base em sua terra nativa; além
disso, nenhum Liberiano, nem em sua pátria e nem fora dela, possui nenhuma mo-
ral ou outro tipo de direito em evitar que Negros retornem para sua casa para fazer
o que possam de melhor para desenvolvê-la.” (189)

Havia outro componente para o medo liberiano das ambições políti-


cas de Garvey, nomeadamente, o efeito que ela poderia ter sobre os Africanos nati-
vos oprimidos. Garcia havia avisado a Garvey sobre isso em 1920. Em 1923 um
Reverendo H.H. Jones, recentemente retornado após catorze anos de trabalho com
a população Africana nativa, testemunhou a popularidade de Garvey entre eles.
Africanos em áreas remotas que sabiam mais sobre Garvey do que ele, afirmou, e
seus Reis conversaram com ele por horas sobre Garvey.(190)

A última delegação da UNIA a ser bem recebida na Libéria (em 1924),


sentiu os efeitos desses medos liberianos. O Comitê de Concessão liberiano, em
suas estipulações escritas, deixaram claro que haveria autoridade superior sobre
os assentamentos da UNIA. Garvey sugeriu emendas substituindo a direção da
UNIA.(191)

Em sua última tentativa de petição ao governo da Libéria, a Convenção da


UNIA de 1924 afirmou não ter “absolutamente nenhuma ambição política.”(192)
Mas uma vez que o assunto parecia irrevogavelmente perdido, Garvey se sentiu
novamente à vontade para criticar os “negros do tipo de Barclay e King”, que man-
tinham “os nativos pobres, famintos, desprotegidos e nus.” “Tais negros”, declarou,
“estão com medo de mim, porque eles percebem que eles não encontram em mim
um aliado para explorar o trabalho dos desafortunados pretos e consolidar distin-
ções de classe.(193)

Uma última volta nesse medo das intenções políticas era a sensação de
que Garvey poderia se juntar com Liberianos influentes como o ex-Presidente Ar-
thur Barclay e D.Howard, ou talvez o Chefe de Justiça J.J., todos associados à UNIA
da Libéria, em um esforço para destituir o partido no poder.(194)Garvey deu a pa-
lavra final. E, 1928, ele afirmou ter “influência suficiente pra ter destituído Charles
King como presidente nas próximas eleições.”(195)

Ainda outro fator na falência da Libéria Garveysta, é o possível envolvi-


mento de seu rival W.E.B.Dubois. Após saber em 1923 que Dubois estava interes-
sado na Libéria, William H.lewis, um advogado preto de Boston e advogado geral
assistente, sugeriu ao Presidente Coolidge que seria “uma coisa muito graciosa” e
uma ajuda as relações Estados Unidos-Libéria, se Dubois pudesse ser apontado
como representante especial para a segunda posse de King que logo acontece-
ria.(196) O que Dubois , que aceitou, não sabia, era que a oferta representou um
ardil político do partido Republicano para, como Lewis assim afirmou, “assegurar o
suporte do Crisis, a publicação mais amplamente lida entre as pessoas de cor, ou
deslegitimá-la, caso ela se volte contra nós” nas eleições vindouras.(197).

Dubois equivocadamente exultou por esse “gesto de cortesia” oficial,


tão raro quanto épico...o mais alto grau já oferecido por qualquer país a um agente
diplomático da América Negra.” Ele glorificou em sua escolta militar liberiana, do
fato que ele foi Reitor do serviço diplomático na Libéria, com o engalanado presi-
dente Liberiano “com a estrela e as listras da Ordem Espanhola em seu peito” e os
cônsuls Europeus “de branco e dourado com medalhas e espadas.” (198)

Dubois alegou mais tarde, que não mencionou Garvey ao Presidente King
durante sua estadia na Libéria. (199) Um ano antes, ele se deu ao trabalho de es-
crever ao Secretário de Estado Charles Evans Hughes , por dois navios para tomar
o controle da Black Star Line de Garvey. Ele queria saber, disse a Hughes, se havia
“qualquer viabilidade ou modo legal através do qual o governo dos Estados Unidos
poderia ajudar ou conduzir um plano para fornecer pelo menos dois navios, na
tentativa de começar um intercurso comercial direto entre a Libéria e a América.”
Tal intercurso seria dirigido por uma companhia privada composta por pretos e
brancos. A companhia iria “tentar tomar, em um trust, os certificados da Black Star
Line.” (200)

Os Garveytas estavam tão apreensivos da possível influência maligna de


Dubois na Libéria e em territórios vizinhos, que John E. Bruce, enviou um telegra-
ma a J.E.Casely Hayford, com os dizeres: “Dubois – Crisis – em viagem para a África,
cruvado de vergonha devido ao fracasso de seu esquema do Congresso Pan-
Africano. Financiado por Joel Spingarn, um judeu, e outros interesses (brancos)
inimigos da Independência Africana. Vigie ele. Seguem-se cartas. Não faça com-
promissos.”(201)

Ao retornar aos Estados Unidos, Dubois, no relatório de sua missão para


o secretário de estado, sugeriu, entre outras coisas, que um pequeno time de ex-
perts agrícolas e industriais dos Estados Unidos fossem enviados para a Libéria, e
que eles deveriam ser , se possível, pretos. Isso era exatamente o que Garvey vinha
sugerindo e estava em processo de fato. Dubois também publicou posteriormente,
ataques aos planos liberianos de Garvey.(202)

Os noventa e nove anos de concessão pela Libéria de um milhão de acres


para a Firestone Tire Company, de Akron, Ohio, acrescentou outra possibilidade de
explicação para o repúdio do esquema de Garvey. O Presidente King, com o encora-
jamento de Dubois, estava fazendo sua cabeça para conceder terra para a Firesto-
ne, ao mesmo tempo em que estava frustrando rudemente as aspirações de Garvey.
(203) O papel de Dubois nos negócios da borracha, parece ter sido muito íntimo.
Em janeiro de 1924, ele acompanhou o minsitro dos Estados Unidos, Solomon Por-
ter Hood, e um expert em borracha da Firestone em uma viagem à lavoura de bor-
racha da Libéria, para verificar se a Firestone deveria investir na área. E em 1925
ele buscou capitalizar sobre tudo isso, ao pedir a Harvey Firestone para incluir pre-
tos entre o pessoal de supervisão da Companhia na Libéria. Tudo o que ele conse-
guiu foi uma resposta insignificante da companhia prometendo nada. (204)

Enquanto isso, a Convenção de 1924 da UNIA advertiu que uma con-


cessão da Firestone significaria em última instância “usurpação do governo, assim
como foi feito com a República Preta do Haiti, após compnhias similares entrarem
lá com o pretexto de desenvolver o país.”(205) Essa advertência pode ter contribu-
ído com a hostilidade Liberiana, quando a Firestone ofereceu um pagamento de 5
milhões de dólares, em troca do direito de apontar vinte e dois oficiais para condu-
zir questões financeiras, militares e a respeito dos nativos africanos na Libéria.
(206)

A semente que Garvey plantou foi tal que seus seguidores nunca re-
nunciaram ao seu interesse na Libéria. Em 1925, com Garvey na cadeia, um dele-
gado buscou o apoio do Presidente Coolidge para um assentamento na Libé-
ria.(207) E em 1926, uma tentativa sem sucesso foi feita no sentido de atrair a aju-
da da Sociedade Colonizadora Americana.(208) Em 1936, a UNIA de Nova York se
ofereceu para satisfazer o requerimento do Presidente Edwin Barclay por imigra-
ção continuada, e o interesse nunca cessou.(209)

Apesar desses muitos fracassos, diversos Garveytas migraram para a Li-


béria, de fato, através dos anos. Alguns foram mesmo após o banimento.(210) En-
tre esses estavam os técnicos da UNIA , que lá permaneceram.(211) Um desses
técnicos, Reginald.C.Hurley, de Barbados, se tornou personagem de uma pequena
ópera bufa em 1924, quando o governo da Libéria determinou a sua deportação,
mas ficou relutante em efetuar o pagamento de U$ 1.70 necessário para conduzi-lo
até a Colônia Britânica mais próxima, Serra Leoa.

Hurley não podia pagar, as autoridades britânicas se recusaram a pagar


e como Hurley havia entrado antes da lei obrigar as companhias de navegação a
pagar, elas também não poderiam ser obrigadas a pagar. Para finalizar o impasse,
foi dada a Hurley a opção de permanecer, desde que ele desfizesse seus votos feitos
à UNIA. Ele se recusou a fazer, porque, disse, os princípios da UNIA estavam muito
firmemente gravados em seus coração. (212) Finalmente em 1925 o Governo da
Libéria decidiu deixá-lo ficar, evitando os gastos em deportá-lo. A comédia entre-
tanto ainda não estava superada, de todo jeito, para o cônsul britânico que restrin-
giu o passaporte de Hurleys, tornando-o renovável anualmente e evitando que o
mesmo viajasse para fora da Libéria sem a sua permissão. “Dessa forma,” reflete o
funcionário britânico, “eu posso mantê-lo sob vigilância e notar qualquer mal feito
em que ele esteja envolvido, se ele ainda estiver engajado ou em conexão com a
UNIA.”(213)

Outros Garveytas ficaram na Libéria, por estarem de acordo com o re-


querimento de denunciar o seu líder. Nisso, tiveram a aprovação de Garvey. (214)
Por volta de 1930, o banimento parece já ter sido esquecido. (215)

A determinação dos Garveytas para retornar à África, também encon-


trou um canal na Etiópia. O Negro World em 1932 instiga os seus leitores a ir,
mesmo individualmente, a lugares com a Libéria e a Etiópia, para “estabelecer as
bases para disseminar propaganda futura no sentido de criar uma África unida e
liberada.”(216)

Uma década antes, a Convenção de 1922 recebeu uma mensagem do


Monarca da Etiópia convidando pretos ocidentais capacitados, para voltarem para
casa. (217) O líder não-oficial dos migrantes da UNIA para a Etiópia, foi o Rabbi
Arnold J. Ford, um líder dos Judeus Pretos do Harlem, que foi por muitos anos dire-
tor musical da UNIA, que chegou na Etiópia em dezembro de 1930. Alguns dos imi-
grantes se saíram bem, trabalhando como professores de música, mordomos, dire-
tores escolares e coisas do tipo. (218)

O impacto de Garvey na África pode então ser tido como amplo e variado.
Aqueles africanos que tiveram contato com sua mensagem eram favoravelmente
dispostos e frequentemente abertamente entusiastas. Onde ocorreu oposição, ela
se veio principalmente dos proprietários europeus, ou, no caso da Libéria, dos
“quase colonialistas” proprietários pretos. Isso não significa dizer que não houve
uma oposição Africana. Na África ocidental Inglesa, muitos dos elementos mais
conservadores se opuseram ao seu programa político enquanto abraçaram de todo
o coração suas iniciativas econômicas. (219)

A oposição mais ativa veio de Blaise Diagne, o deputado senegalês para a


assembléia francesa e por algum tempo membro do gabinete francês. Por conta da
sua posição, sua oposição pode talvez ser classificada mais como européia do que
Africana. Em 1922, ele escreveu uma carta aberta a Garvey: “ Nós nativos franceses
desejamos permanecer franceses, posto que a França nos deu a todos liberdade e
posto que nos aceitou sem reservas, sobre as mesmas bases em que aceita os seus
próprios filhos europeus. Nenhum de nós aspiramos a ver a África Francesa dedi-
cada somente aos Africanos, como é demandado, ainda que sem nenhuma autori-
dade, por negros americanos, que você mesmo se colocou como líder.”(220)

De forma similar foram os ataques de J.E.Kwegyr Aggrey. Originário da


Costa do Ouro, Aggrey passou muitos anos sendo educado e trabalhando nos Esta-
dos Unidos. Sua razoabilidade lhe garantiu uma posição na Comissão Educacional
Phelps Stokes para a África. Como o único membro negro dessa comissão, era es-
perado que ele demonstrasse o potencial que os Africanos poderiam desenvolver,
caso lhes fossem dadas as condições apropriadas. Sua presença também parece ter
tido outro motivo, nomeadamente, combater a popularidade de Garvey entre as
massas Africanas. Em um encontro na África do Sul, no qual ele foi vaiado, disse
para os seus irmãos Africanos: “Esses que pregam ‘África para os Africanos’, estão
loucos; se você se mantém sozinho, logo estará novamente em trevas profundas. O
que temos, e o que somos, nós devemos aos missionários. Eu nasci pagão, e não
estou envergonhado disso. Mas se os Missionários não houvessem me buscado e
me encontrado, eu poderia hoje ter talvez, uma dúzia de esposas.”(221)

Mais tarde, em um discurso em 1921 em Johannesburgo, no qual ele


denunciou a Black Star Line, o jornal Africano Abantu-Batho quis saber o porque
de uma comissão ostensivamente educacional gastar tanto tempo atacando Gar-
vey. De fato, os principais discursos de Aggrey praticamente negligenciavam com-
pletamente o assunto educação. O jornal acreditava que os esforços de Aggrey es-
tavam sendo contraproducentes. “ Marcus Garvey deve ter feito algo para enervar
o ‘Sr HomemBranco’,”diz o editorial. “A ampla divulgação da imprensa branca , do
discurso do Dr Aggrey sobre esse assunto em particular, é o resultado de nenhuma
outra razão além de puro nervosismo. Sabiamente ou não, mas por razões melho-
res conhecidas por ele mesmo, o Dr. Aggrey ficou um pouco mais aliviado em rea-
lação a isso.”(222). Apesar de, quando provocado por um repórter, ter criticado
Aggrey por seguir a linha de menor resistência,(223) ele preferiu não perder tem-
po o atacando e as publicações da UNIA foram gentis com o educador.(224)
O tipo de oposição cáustica e sem escrúpulos a Garvey que se desenvol-
veu na Afro-América, teve pouco ou nenhum paralelo entre os Africanos. Uma rara
exceção foi M.Mokete Manoedi do Lesotho, e mesmo sua oposição teve lugar nos
Estados Unidos e sob os auspícios dos arqui-inimigos de Garvey da Irmandade do
Sangue Africano ( African Blood Brotherhood), uma organização comunista preta.
(225) Além de de realizar encontros de rua e publicar um livro hostil, Manoedi, sob
os auspícios do cônsul britânico em Nova York (226) e provavelmente com a apro-
vação da ISA (ABB), se queixou ao Escritório Colonial Britânico sobre Garvey. ( O
recurso de ir aos governos brancos contra Garvey, não era uma tática poudo usada.
Dubois estava entre os que o fez e muitas outras grandes figuras Afro-Americanas.)

Manoedi endereçou sua carta para Winston Churchill, então secretário


de estado para as colônias. A propaganda Garveyista, ele escreveu, “tem causado
algum efeito nas massas dos Negros na América, no Caribe, na América do Sul e
Central, e também, na África.” Ele preveniu Churchill que “não podemos permitir”
deixar Garvey continuar criando a impressão “que os Africanos Britânicos estão
insatisfeitos com o governo Britânico.” Ele solicitava então o apoio financeiro para
continuar na luta. (227) Churchill colocou o representante britânico para checar as
credenciais de Manoedi e acharam as mesmas impecáveis. O governo da África do
Sul foi então perguntado sobre a possibilidade de financiar Manoedi com fundos do
Lesotho. O governo Smuts, sugeriu aos britânicos que o dinheiro seria melhor gas-
to na África do Sul, e se negou a contribuir. Esse conselho foi aceito e Manoedi não
recebeu seu dinheiro. (228) Sua informação não foi, entretanto, sem efeito. Ela foi
enviada às autoridades do Malawi, e um oficial do Escritório de Assuntos Exterio-
res as utilizou mais tarde para justificar ações inglesas contra Garvey na Libéria.
(229) As idéias próprias de Manoedi sobre o desenvolvimento Africano, consistiam
em assistência de Afro-Americanos e Caribenhos, reformas feitas pelos colonialis-
tas e investimentos de capitalistas brancos. (230)

Capítulo 8 – A Black Star Line (83-219)Pág 151

“Lembrem, a Black Star Line Corporação de Navios a


Vapor , não é uma companhia privada. Os navios que são
propriedades dessa Corporação, são de propriedade da raça
Negra.” Marcus Garvey (1)

“O homem branco controla o cabo e o sem


fio/conexões de navios com força e coação/mantém as raças
pretas do mundo separadas/então para os seus esquemas,
não podemos ser espertos/ ‘não pode haver nenhuma Black
Star Line’, ele diz/pois isso iria interferir em nossos cami-
nhos tortos/ ‘vou destruir essa empresa de qualquer forma’/
‘assim eles não terão conexões com nenhum estrangeiro’”
Marcus Garvey (2)
A história da Black Star Line Corporação de Navios a Vapor e as demais
inciativas no campo da navegação, ilustram os mais fortes e mais fracos aspectos
do movimento de Garvey. Por um lado, o mero lançamento de quatro navios por
um homem negro, constitui por si só um feito admirável, com pouco ou nenhum
paralelo na história do Novo Mundo Preto. Na história da Black Star Line também
vemos, mais claro do que em qualquer outro aspecto do movimento, os fantásticos
sacrifícios que o povo preto estava disposto a fazer por um movimento racial que
eles percebiam como sério no que diz respeito à efetivação de sua emancipação. E
a perspectiva de ser proprietário de um empreendimento de navegação de propri-
edade de negros, estimulava em muitos jovens negros o interesse por um campo
com o qual até então não lhes era próximo.(3) Por outro lado, a história dessa cor-
poração revela os extremos de ladroagem e corrupção a que pessoas pretas podem
recorrer, mesmo em se tratando de um movimento para o progresso racial. De-
monstra também a implacável pressão dos inimigos externos de Garvey, brancos e
negros, e a falta de cuidado com que as finanças da organização eram geridas.

Na Black Star Line se tentou atender a uma necessidade de longa data. Os


passageiros pretos eram rotineiramente submetidos a práticas racistas nas com-
panhias de navegação existentes. Passagens de primeira classe, muitas vezes não
eram suficientes para evitar que pessoas pretas só pudessem comer após os passa-
geiros brancos terem terminado. (4) Os marinheiros pretos, último a ser contrata-
do e primeiro a ser despedido, também tinha razões para celebrar uma companhia
negra. (5) E para os poucos marinheiros pretos com maior qualificação náutica, a
vida era particularmente dura.(6)

Por esse tipo de razão, a Black Star Line foi grandemente celebrada pelo
povo preto. Mercadores africanos e caribenhos viram nela a possibilidade de inde-
pendência em relação às companhias brancas racistas, (7) missionários viram um
fim para as longas viagens para a África via Europa, (8) liberianos viram aí a possi-
bilidade de um serviço costeiro entre a Libéria e Serra Leoa (8), e a maioria viu isso
como um triunfo para a auto-estima preta. Garvey pensava que a Companhia devia
temer mpouco a concorrência das Companhias brancas, posto que operaria ideal-
mente com o mundo negro autossuficiente. (10) Não surpreende de que a Black
Star Line provou ser o maior mecanismo de recrutamento para a UNIA. (11)

Garvey começou a trabalhar na Companhia em 1919, e foi prontamente ci-


tada perante o Advogado Distrital Assistente Edwin P. Kilroe, de Nova York. Esti-
mulado por ex-associados de Garvey, Kilroe o informou que era ilegal solicitar fun-
dos para um investimento comercial não incorporado. (12) Ele também acusou
Garvey de estar usando ilegalmente os fundos da Black Star Line para um Restau-
rante da UNIA e para o Negro World. (13) A Companhia foi então devidamente in-
corporada em 27 de Junho de 1919, em Delaware com um capital de 500.000 dóla-
res.(14) As ações tinha valor pareado de 5 dólares cada, e as pessoas podiam com-
prar no máximo duzentas. (15) Garvey descreveu a si mesmo como principal acio-
nista. (16)

Com menos de três meses de fundação, a Companhia havia angariado di-


nheiro suficiente (principalmente por venda de ações) para dar entrada no primei-
ro navio. Isso se deu em 17 de setembro de 1919, e o navio Yarmouth custou 165
mil dólares. ( 17) O Negro World anunciou que o Yarmouth já havia navegado de
Boston e era o mesmo navio no qual o ativista dos direitos civis negroWilliam
Monroe Trotter navegou como garçom e cozinheiro, como forma de burlar a recusa
do governo por um passaporte para que ele pudesse ir para a Conferência de Paz
em Paris. ( 18) O navio estava em más condições, de todo jeito. De acordo com um
dos seus oficiais negros, ele tinha sido usado durante a guerra como um bote para
carvão, e não valeria um centavo além de 25 mil dólares.(19) A acusação do caso
contra Garvey por fraude postal apontava que ele tinha sido usado para transporte
de gado, estava em péssimas condições e não estava equipado para o serviço de
passageiros quando foi comprado. ( 20) Para capitão do navio, Garvey foi capaz de
encontrar um dos homens pretos qualificados nesse campo, Joshua Cockburn, que
havia navegado extensivamente por portos africanos. ( 21)

O Yarmouth ( renomeado extra-oficialmente como Frederik Douglass pela


BSL), navegou em 24 de novembro com alguns passageiros ( Muitos acionistas en-
tre eles) e uma carga de cimento para Sagua La Grande, em Cuba. (24) De Cuba
Cockburn informou a Garvey que os mecânicos brancos haviam tentado encalhar o
navio.(25) Alguns dias mais tarde, em 5 de dezembro, Cockburn reclamou nova-
mente que os mecânicos brancos estavam causando problemas. Ele relatou tam-
bém que o povo em Sagua La Grande estava muito entusiasmado com o navio. As
pessoas a bordo não tiveram permissão para desembarcar, por razões não especi-
ficadas, mas os estivadores locais rapidamente compraram cerca de 250 dólares
em ações. (26) O navio permaneceu no Caribe por um tempo, navegando para a
Jamaica e o panamá, sem nenhuma carga além da de Cuba.(27) Em sua viagem de
volta, ele veio com lotação máxima, tanto de passageiros, quanto de carga. (Madei-
ra) (28)

Dois dias após seu retorno em no meio de janeiro de 1920, o Yarmouth re-
cebeu ordenamentos para transportar uma carga de Uísque para Cuba, diante da
iminente chegada da proibição. Garvey alegou que o contrato ( que ele já havia re-
cusado), foi dado entrada por um de seus subordinados enquanto ele estava em lua
de mel no Canadá.(29) Por transportar essa carga avaliada em cerca de 5 milhões
de dólares (30), a BSL deveria receber a quantia irrisória de 7 mil dólares ( 11 mil
de acordo com algumas fontes) (31), que não era suficiente sequer pra cobrir os
gastos de viagem do navio. Além disso, havia reparos a ser feitos. Como Garvey
expôs, “ Eu fui, portanto, convidado a gastar 11 mil dólaresem reparos necessários
pra ter o navio navegando com uma carga de 5 milhões, da qual a Companhia rece-
beria apenas 7 mil como frete, tudo devido à desobediência de dois oficiais da
Companhia.” (32)

Logo depois de ser posto no mar, o navio foi sabotado por um mecânico, e
Cockburn solicitou que fossem jogadas ao mar 500 garrafas de uisque e champag-
ne, que foram recolhidas por pequenos barcos, que de maneira suspeita, já esta-
vam por perto. (33) O navio teve que retornar para reparos. O navio também foi
parado por um tempo por oficiais americanos da Receita. ( 34) Garvey mesmo as-
sim foi capaz de evitar muita publicidade sobre esses acontecimentos. “Eu quero
lhes dizer que realmente fizemos história,” declarou, “porque aquele uísque veio
do Sul, e também pertence aos caipiras do Sul.” (35)

A viagem foi finalmente reiniciada em 27 de fevereiro de 1920 e o Yar-


mouth , com seu uísque , assim como todos os passageiros chegou em Havana em 3
de março, para uma fantástica recepção. Não foi possível atracar, mas o povo vinha
em barcos festejando o navio jogando flores e frutas. Quando o navio atracou de-
pois de cinco dias, foi “ abarrotado de visitantes desde o nascer do sol até ele se
pôr”. O Boas Vindas cubano incluiu um banquete no palácio presidencial oferecido
pelo presidente Menocal em honra desse evento marcante na história do povo pre-
to, com promessas de apoio comercial de oficiais do governo, incluindo o presiden-
te e empresários. (36)

A entusiasmada recepção cubana foi diminuída, entretanto, pelos pesa-


dos e desnecessários custos ocorridos como resultado da incompetência financeira
( e possivelmente desonestidade deliberada) dos oficiais da Linha que deram en-
trada no contrato do uísque. Na pressa de se livrar do uísque antes da proibição, os
proprietários falharam em conseguir um receptor cubano, o que causou um atraso
para descarregar. Outro atraso foi causado pelos cinco dias de ancoragem e uma
greve de duas semanas dos marinheiros. Normalmente, o remetente da carga de-
veria ter se protegido contra o atraso no montante de vários milhares de dólares
por dia, por uma cláusula contratual de atraso. Não havia essa cláusula no contrato,
mas de todo jeito, o custo, que incluía a manutenção de trinta e cinco passageiros
da Jamaica e de outros portos, teve de ser coberto pela Black Star Line. O uísque foi
finalmente descarregado, e o Yarmouth retornou, após trinta e dois dias em Hava-
na. (37)
A próxima parada foi a Jamaica, onde centenas de apoiadores entusias-
mados novamente parabenizaram o navio. Os fornos foram consertados e os su-
plimentos renovados durante a estadia ali. (38) Da Jamaica o Yarmouth foi para
Colón, no Panamá, onde a recepção eclipsou até mesmo a ocorrida em Havana.
Hugh Mulzac, um oficial negro do navio, descreveu mais tarde a cena, “Literalmen-
te, milhares de panamenhos encheram as docas com cestas de frutas , verduras e
presentes. Eu estava maravilhado que o Yarmouth tivesse se tornado um símbolo
assim pra pessoas de cor de todas essas terras.”(39) Em Colón o navio pegou qui-
nhentos passageiros, todos imigrantes caribenhos que estavam cansados do racis-
mo estadunidense na Zona do Canal, e iam tentar a sorte nas plantações de cana
em Cuba. Arranjos improvisados foram necessários para acomodar a todos. (40)

Outras cenas de entusiasmo comovente esperavam o navio em Bocas Del


Toro e Almirante, no Panamá e Port Limón, na Costa Rica, com o povo preto opri-
mido celebrando o sinal de que talvez a raça ainda conseguiria se igualar às outras
raças. Mulzac descreveu as cenas em Boca Del Toro onde,

“Milhares de camponeses desceram as montanhas em


cavalos, burros e charretes improvisadas e em um trem especi-
al fornecido pela United Fruit Company, que, já que iria mesmo
perder o dia de trabalho de seus empregados, declarou um feri-
ado legal. A multidão nas docas era tão grande que quando nós
recolhemos nossas correntes pesadas da âncora, foram os cam-
poneses que prenderam os ganchos assim que foram retirados
da água e literalmente encostaram em nós através das docas.
No tumulto que se seguiu, a dança tomou conta do deck, gran-
des pilhas de flores e frutas foram amontoadas na escotilha, e
os agentes da UNIA conseguiu centenas de assinaturas de no-
vos membros. (41)

Da América Central o Yarmouth seguiu até Santiago de Cuba, onde


os quinhentos passageiros desembarcaram e então voltou para a Jamaica para re-
ceber uma carga de 700 toneladas de coco, além de reparos. Restrições limitando
as exportações de alimentos de Cuba em período de guerra impossibilitou a via-
gem de volta pra casa. Então Cockburn parou em Norfolk e Nassau, na Virgínia,
para comprar mantimentos e gasolina. Em Norfolk Garvey ordenou que o navio
voltasse para a Filadélfia e Boston, para celebrações da UNIA. Após alguns atrasos,
(42) o navio alcançou esses portos. Nesse tempo, a permissão para a condução da
carga e dos passageiros foi dada, mas de todo jeito, os cocos haviam apodrecido. A
perda financeira por essas perdas foi aumentada devido ao fato de que “o contrato
não continha nenhum limite relativo à responsabilidade da Companhia”. “Além
disso,” como explicou Mulzac, “ ninguém no escritório sabia como checar as recla-
mações de dano submetidas pelo proprietário da carga, deixando a Companhia
completamente a mercê do remetente e de suas estimativas de valor sobre a carga,
ao invés de sua própria estimativa.” (43)

A terceira e última viagem do Yarmouth se deu após Cockburn ser demitido


por desonestidade. Seu substituto foi um branco canadense , Capitão Dixon.Uma
carga de fertilizante foi levada a Cuba, de onde o navio seguiu para Porto Príncipe,
Haiti, para ser encontrado por mais multidões entusiasmadas. Jamaica foi a próxi-
ma parada. Aqui a inépcia comercial dos dirigentes da Linha novamente se mos-
trou. O agente da Linha na Jamaica, Sr. Wilson, aceitou um contrato para rebocar
uma embarcação japonesa que havia encalhado quinhentas milhas ao sul da Jamai-
ca, em Serrana Banks. Dixon e Mulzac sugeriram cobrar ao proprietário da carga, o
Lyods de Londres, 45 mil dólares, o que, de acordo com Mulzac, parecia razoável
de acordo com o valor da carga e outras considerações. Wilson, que Mulzac definiu
como “um empreiteiro de construção que entendia do negócio de navegação me-
nos até que o Sr, Garvey,” aceitou 12 mil dólares, o que quase não cobria nem os
custos do reboque. O Yarmouth, com seus 33 passageiros a bordo teve pouca difi-
culdade em rebocar a embarcação avariada. Então retornou a Nova York. (44)

Mais tarde naquele verão o navio foi posto fora de funcionamento devido
a processos movidos por diversos credores. Foi vendido pelo U.S Marshal (depar-
tamento de justiça federal dos Estados Unidos) por 1,625 dólares em novembro de
1921. (45) Ainda assim, os litígios referentes ao Yarmouth se arrastaram por toda
a década seguinte. Isso aumentou após uma colisão envolvendo o navio em 21 de
setembro de 1920. A BSL alegou que o navio estava a cargo do Departamento de
Justiça nessa época. O governo alegou que o Capitão e a tripulação do navio eram
culpados. Uma apelação da BSL em relação a uma decisão desfavorável foi derru-
bada com os devidos custos pelo não prosseguimento da ação, que foram pagos
por uma companhia que o adquiriu, já que a Linha obviamente não podia pagar.
(46)

O segundo navio da Linha, o Shadyside, foi comprado em em abril de 1920


por 35 mil dólares e carregou passageiros em excursões através do Rio Hudson
duas ou três vezes por semana. ( 46) Assim como os demais navios da Linha, ele
foi considerado pelas autoridades marítimas como em condições de navegar ,
quando comprado. (48) Após a temporada de excursões, ele foi levado a Port Lee,
pelo rio, mas abriu um buraco durante uma tempestade de gelo e naufragou. (49)

O terceiro navio da Linha, o Kanawha ( novo nome não oficial do Antônio


Maceo), estava sendo negociado na mesma época em que o Shadyside foi compra-
do. Em 9 de maio de 1920 já estava disponível na rua 129 com o Pier Rio Norte do
Harlem, (50) com Garvey se comprometendo a pagar 65 mil dólares por ele. (51)
Nesse ponto, com dois navios navegando e um terceiro a caminho, a Black Star Line
estava em seu auge. O Kanawha, entretanto, logo iria se mostrar como o navio de
pior destino da Linha. Em junho, na viagem inaugural pelo rio Hudson, uma caldei-
ra explodiu, causando a morte de uma pessoa. (52) Desde julho de 1920, foram
feitas várias tentativas de embarcar para Cuba, todas frustradas por problemas
mecânicos. (53)

Somente em 25 de marcço de 1921, o Kanawha finalmente deixou Nova


York em um esforço efetivo pra chegar no Caribe. Os problemas que acompanha-
ram o navio nos próximos dois meses e meio foram detalhadamente descritos por
Garvey (que foi passageiro durante um período), em uma reclamação apresentada
ao Cônsul americano em Kingston, Jamaica em 7 de junho de 1921. Apesar da certi-
ficação de pronto para navegar, uma válvula dos motores explodiu na mesma noite
em que o navio deixou Nova York. Eles estava sob a responsabilidade do engenhei-
ro chefe, mas ele não pode ser encontrado em lugar nenhum. O navio retornou pa-
ra reparos e voltou a navegar em 28 de março. Entre Norfolk e Jacksonville ( 31 de
maio a 3 de abril), o motor do ventilador quebrou, apesar dos muitos sinais que
foram ignorados, o que forçou uma parada em Jacksonville em 3 de abril para re-
paros. O navio partiu uma vez mais em cinco de abril às duas da tarde, somente
para o motor do ventilador quebrar novamente às 4 da manhã. 24 horas após par-
tir de Jacksonville, o engenheiro cehefe danificou as caldeiras ao colocar nelas água
salgada, apesar da presença de um evaporador capaz de propiciar um estoque
inesgotável de água fresca. O navio chegou em Havana em 9 de abril. Outros repa-
ros foram necessários, mas assim que o navio partiu o motor do ventilador que-
brou novamente. Aparentemente o primeiro assistente de engenheiro o havia sa-
botado antes de partir de Havana. Cerca de quatro horas após partir de Havana,
pistões, rodas e outras partes da maquinaria estragaram, devido ao uso prévio da
água salgada. Em 28 de abril um dinamômetro parou de funcionar.

Em 29 de abril o navio atracou em Sagua La Grande para mais reparos e


partiu para Santiago de Cuba no dia seguinte. Três horas e mias depois, mais pro-
blemas mecânicos, mas não havia nenhum engenheiro mecânico na sala de máqui-
nas. Em 1º de maio as caldeiras foram encontradas sem água quente suficiente pa-
ra manter o navio funcionando. Novamente nenhum engenheiro pode ser encon-
trado, então logo as caldeiras foram postas fora de funcionamento. Em 2 de maio o
maquinista parou em Gibaro para conseguir água. O navio partiu em 2 de maio e
chegou em Santiago no dia 6, período em que água salgada foi colocada nas caldei-
ras que precisaram de novos reparos. De Santiago a próxima parada foi em Kings-
ton, onde foi estabelecido que as máquinas tinha avarias múltiplas e onde extensi-
vos reparos foram feitos.

O Kanawha partiu de Kingston em 28 de maio para Colón. Após trinta ho-


ras o engenheiro os obrigou a retornar a Kingston por falta de água, sendo que o
mesmo havia declarado previamente haver água suficiente. Mais água salgada foi
colocada nas caldeiras e o engenheiro chefe fechou um motor por causa de um ba-
rulho que ele não conseguiu descobrir a causa. Em 29 de maio um engenheiro as-
sistente deixou o ventilador rodar com velocidade excessiva, aumentando de tal
forma a pressão na caldeira, que explodiu um dos seus tubos. O motor de estibordo
parou de funcionar, e então o motor com barulho foi religado. Pelo resto da viagem
de volta os engenheiros freqüentemente se ausentaram da sala de máquinas. O
engenheiro chefe por vezes estava bêbado e continuamente utilizava linguagem
obscena, mesmo quando na presença de “damas de refinamento e cultura”, e em
uma ocasião estapeou o imediato.

Contra o Capitão negro, Adrian Richardson, Garvey tinha também sérias


reclamações. Ele levava uma tripulação de quarenta, inclusive clandestinos, ao in-
vés dos 25 estipulados pela regulamentação americana. Eles estavam recebendo
salários muito altos, sem o consentimento da Companhia. Manteve o navio parado
no meio do oceano durante todo o dia 26 de março. Ele conduziu o navio para Nor-
folk com falsas alegações e então se ausentou para ver sua esposa. Ele embarcou
um amigo de Norfolk e lhe concedeu uma carona pra um destino que estava fora da
rota do navio. No desembarque do amigo ele colidiu com o píer, causando estragos
tanto no píer quanto na popa do navio. Em Jacksonville ele encomendou o tipo er-
rado de carvão, causando a desaceleração do navio.
Além disso, apontou Garvey, Richardson mantinha a tripulação em uma
péssima disciplina. Ele mesmo promovia jogatinas no convés com a tripulação, e
eles confraternizavam no convés usando linguagem obscena quando deveriam es-
tar trabalhando. Em uma das vezes, Richardson permitiu uma briga de quinze mi-
nutos, sob as vistas dos passageiros. Havia também uma acusação de nepotismo,
pelo Capitão ter colocado o seu irmão como Comissário de Bordo Chefe, apesar de
sua falta de capacitação. Ao fim e ao cabo, acusa Garvey, o navio havia consumido
três meses, em uma viagem de trinta dias que não tinha alcançado nem a metade
do caminho. Ele acusou formalmente todos os oficiais eles por negligência e sabo-
tagem. (54)

Richardson negou que aquelas acusações dissessem respeito a ele, e as


explicou. Houve disciplina, ele alegou, até que o Sr Garvey chegou a bordo. “Sr Gar-
vey”, ele explicou , “ queria ser o condutor, o engenheiro, o comissário, o mestre, o
presidente e o proprietário.” (55) o Engenheiro Chefe, Charles Harris, também ne-
gou as acusações de Garvey. (56) Os Inspetores do Serviço de Inspeção de Navios
dos Estados Unidos, mais tarde, ouviram o caso e decidiram contra Garvey. (57)

Apesar desses contratempos, o navio recebeu as habituais boas vindas ca-


lorosas em Cuba, inclusive as amigáveis recepções do Governador Alfredo Lora, da
província Oriental. (58) Foi em Santiago (Oriente), que Garvey teve que se juntar à
tripulação, se apressando desde Kingston, pra resolver um confronto sério entre os
acionistas locais e o capitão e a tripulação. ( 59)

Detalhadas como eram, as acusações de Garvey não contaram a história


toda. Um engenheiro de Kingston concluiu que os problemas do navio se deviam
apenas a “pura negligência.” (60) E mais tarde foi revelado que Richardson se en-
volveu em duas lutas corporais com Garvey, tendo mesmo apontado uma arma
para ele. (61) O Engenheiro Chefe supostamente sofreu um ataque nervoso, o que
não o impediu de tentar afundar o navio abrindo as comportas. (62)

Após mais de um mês de atraso, o Kanawha finalmente partiu de volta para


Nova York, mas o mais longe que conseguiu chegar foi Antilla, em Cuba, onde que-
brou e foi abandonado. Ali permaneceu por anos, um naufrágio que punha em risco
a navegação na área. Um vigilante foi posto a bordo, mas seus salários nunca che-
garam, e em 1924uma penhora foi obtida contra o navio para que o pagamento
fosse feito. O cônsul americano em Antilla conseguiu que um negociante local esto-
casse álcool no navio, para que os salários do vigilante fosse mantido. Através dos
anos pessoas locais ofereceram somas entre 350 e 4 mil dólares pelo navio, mas
ladrões o depenaram de tudo o que ele tinha de valor, até mesmo suas porcas e
parafusos. Em 1925 uma tempestade arrancou o navio de suas amarras e ele co-
meçou a naufragar. A essa altura, o cônsul declarou perda total. Em fevereiro de
1927 o navio estava ainda meio submerso em águas rasas a uma milha e meia da
Praia de Antilla e o Cônsul considerou oferecer para resgatá-lo em troca de 15 por
cento de tudo de valor que fosse recuperado. (63)

O quarto navio da Black Star Line nunca chegou a estar em posse da com-
panhia, mas sua história foi, no entanto tão depressiva quanto as dos três anterio-
res. Isso envolveu a perda de uma grande quantidade de dinheiro,envolveu a Com-
panhia em um litígio que durou mais de uma década, sendo finalmente vendido
como sucata. O Phyllis Weathley, como o navio iria se chamar deveria ser o navio
que faria a rota Nova York-Libéria, e sua compra foi prometida várias vezes já des-
de novembro de 1919. (64)

As tentativas de encontrar o navio começaram seriamente após a partida de


Garvey pra o Caribe em 1921. Após as negociações por um navio britânico dar er-
rado, a Companhia contratou um agente branco, A. Rudolph Silverston, que rece-
beu 20 mil dólares para pagar pelo S.S. Hong Kheng, que nunca se materializou.
(65) Silverston se voltou então para a Companhia de Navegação dos Estados Uni-
dos. Em 28 de abril ele ofereceu 190 mil pelo Orion, um navio alemão capturado,
oferta que ele aumentou um mês depois para 225 mil. Em 26 de maio, acreditando
que o Orion já havia sido comprado por alguém, ele ofereceu 175 mil pelo Porto
Rico, outro navio alemão capturado. A oferta foi recusada por ser muito baixa, e ele
a aumentou para aceitáveis 225 mil dólares. A Companhia de Navegação estava de
fato negociando com com outras partes para a venda dos dois navios, por seis par-
celas de 65 mil, mais a promessa de compra por 200 mil durante esse período. (66)

Após requerer uma análise detalhada das condições financeiras da Black


Star Line, a Companhia de Navegação decidiu vender o Orion para a New York Ship
Exchange, de Silverston, em nome da Black Star Line. Dez por cento seria pago em
dinheiro na entrega do navio e e dez por cento cada mês dali pra frente, até que o
preço total fosse pago. Com juros de 5 por cento ao ano sobre os pagamentos. Os
compradores deveriam “manter um vínculo satisfatório à Companhia de Navega-
ção, para garantir o cumprimento do contrato.” (67)

Nesse meio tempo, Garvey anunciou que Hugh Mulzac seria o Capitão do
Phyllis Weathley, “por motivos de propaganda”, pensou Mulzac, (68) e propagan-
das foram divulgadas anunciando que ele navegaria para Havana, Santo Domingo,
St Kitts, Dominica, Barbados, Trinidad, Demerara e Monróvia, “por volta de 27 de
março, ou no mais tardar, em 25 de abril.” (68) 8.900 dólares foi coletado das pes-
soas que anteciparam as passagens. O dinheiro não foi separado dos fundos gerais
da Black Star Line, e nunca foram devolvidos. (70)

Em lugar dos 22.500 dólares requeridos no contrato, Silverston pagou


12.500 à Companhia de Navegação, (71), embora ele tivesse em mãos, pelo menos,
os 20 mil da Linha, referentes ao négócio abortado do Hong Kheng. Elie Garcia, Se-
cretário da BSL, em 1928, em depoimento juramentado, que 22.500 dólares da Li-
nha havia sido dado a Silverston. Silverston e Orlando M. Thompson, o Vice-
Presidente da BSL, se apropriaram de 10 mil dólares. Para encobrir a fraude, Tho-
mpson pegou um empréstimo de 1º mil dólares junto à International Financial
Corporation, proferindo como testemunho uma falsa determinação do quadro de
diretores da Black Star Line, que não foi vista por nenhum outro diretor. Quando
esses fatos vieram à luz, um mandato de prisão foi emitido contra Thompson, mas
com a prisão de Garvey já em 1922, todos os registros e documentos da Linha ha-
viam sido apreendidos pelo governo federal, o que tornou impossível a continui-
dade do processo. (72)

Em todo caso, a Linha revogou o poder de representação de Silverston


por volta de 28 de agosto de 1921. (73) Com o passar das semanas e nenhum sinal
dos 10 mil restantes ou do vínculo de performance, a Companhia de Navegação
começou a pesar os prós e contras de cancelar a venda e confiscar os 12.500 em
sua posse. Foi decidido que dariam à Linha uma outra chance, mas a Companhia de
Navegação dessa vez atrasou o envio da documentação necessária, indicando a
forma de contrato e vínculos porque, disseram, estavam no processo de introdução
de um novo modelo de contrato.(74)

Uma outra explicação possível para o atraso é o fato de que a essa altura,
o Governo dos Estados Unidos se intrometera nas negociações. Em 31 de agosto,
William J. Burns, Diretor do Bureau de Investigação do Departamento de Justiça,
informou à Companhia de Navegação que Garvey era um agitador comunista radi-
cal que “advoga e ensina a derrubada do Governo dos Estados Unidos através da
força e da violência.” Alguém da Companhia de Navegação rubricou uma pequena
nota manuscrita ao fim da carta de Burns, - “Recomendação de Venda para esse
grupo cancelada.” (75)
O governo britânico não ficou muito atrás. O Cônsul Geral Britânico em
Nova York informou à Companhia de Navegação em 17 de janeiro de 1922 que a
Black Star Line ainda devia dinheiro à Departamento Canadense de Marinha e Pes-
ca, relativo ao Yarmouth. (76) O Vice-Presidente da Companhia estava então reso-
luto em sua decisão de que a Linha não iria adquirir um navio. (77)

Um cheque assinado por Joseph P. Nolan, advogado da Linha, foi deposi-


tado pela Companhia de Navegação em 30 de agosto de 1921. (78) Nolan reclamou
que o cheque havia de fato sido entregue em agosto e relacionou esse atraso àquele
referente à forma de contrato e vínculo. E quando, após algum atraso, esse último
foi finalmente entregue, a Companhia se viu então instada a fornecer uma garantia
de 450 mil, duas vezes o que ficara acordado. (79) O gerente da divisão de vendas
da Companhia explicou posteriormente que, ainda que o cheque tenha sido ofere-
cido a ele muitas vezes, ele se recusou a aceitá-lo por um tempo, já que as condi-
ções referentes ao seguro ainda não haviam sido estabelecidas. Ele o aceitou even-
tualmente por “questão de cortesia.” (80) A prisão de Garvey em janeiro de 1922 e
a suspensão das atividades da Linha, meio que extinguiu qualquer esperança res-
tante de que a Linha seria capaz de cumprir o contrato. Por sorte, o Departamento
de Guerra expressou interesse pelo Orion, para serviços internos nas Filipinas, e a
Companhia de Navegação começou a pensar nos termos de uma devolução total ou
quase total, do depósito feito pela Black Star Line. (81) O problema agora era para
quem a devolução seria feita.

Em 5 de abril, Orlando Thompson aconselhou a Companhia a fazer o pa-


gamento ao advogado Nolan. Em 12 de abril Garvey revogou o poder de represen-
tação de Nolan, em favor de William C. Mathews. (Elie Garcia em seu depoimento
juramentado afirmou que nem Nolan e nem Thompson tinham nenhum interesse
no dinheiro.) A Companhia estava tendendo a conversar com Matthews ainda que
não estivesse satisfeita com suas credenciais, para pagar-lhe o dinheiro. Em 25 de
abril, Silverston reapareceu em cena, reivindicando 12.500 dólares. A Companhia
então decidiu que não pagaria nenhum dinheiro sem as alegações completas de
cada reclamante. E as reivindicações continuaram. O advogado Matthews e Nolan
surpreendentemente fizeram uma oferta conjunta para receber o dinheiro. Quando
essa tentativa falhou, Nolan continuou por conta própria, alegando que os 10 mil
eram dinheiro seu, que ele havia emprestado à Black Star Line. Então alguns credo-
res da Linha tentaram implicar o dinheiro para cobrir processos mal-sucedidos.
Em 17 de agosto de 1923, Garvey solicitou à Companhia que segurasse o dinheiro ,
já que os acionistas desejavam utilizá-lo na compra de um navio, e ele não queria
que aqueles “tubarões financeiros”, privassem “negros pobres”, daquilo pelo qual
haviam se sacrificado. Mais tarde em 1926, Casper Holstein, uma proeminente fi-
gura do Harlem e por muito tempo um apoiador da UNIA, tentou recuperar 1000
dólares que segundo ele, havia emprestado à Linha para a compra de um navio.
(82)

Em 1926 e 1927, cerca de trinta credores, em sua maioria ex-oficiais e


marinheiros da Black Star Line que haviam ganhado processos contra a Linha, ten-
taram forçar um mandato de penhora contra a Companhia de Navegação, para ten-
tar recuperar os seus pagamentos atrasados. A tentativa fracassou após ir para a
Corte de Apelações de Washington D.C. (83) Os credores então se voltaram ao
Congresso e buscaram passar um Ato Privado, aprovado pelo Senado em 1º de
março de 1929, que conferiu jurisdição à Corte de Apelações para julgar “como
assunto de equidade e justiça”, reclamações dos credores referentes ao dinheiro da
Linha. (84) Muitas pessoas recuperaram seu dinheiro junto àquela Corte. (85) Em
julho de 1936, por exemplo, U$ 17.722,79, de 21.624,76 da Black Star Line, foi pago
(algumas centenas de dólares tendo sido deduzido por despesas.) (86) Inquéritos
de credores ainda eram pagos em 1939. (87) Enquanto isso, em 1930, o Orion foi
vendido como sucata por 27.665 dólares. (88)

Em 1º de abril de 1922, o Negro World anunciou a suspensão das ativi-


dades da Black Star Line. Em agosto, a convenção da UNIA concordou, em princí-
pio, a lançar uma nova empresa de navegação e em estabelecer uma Black Star Li-
ne Redemption Corporation, para repor os gastos dos acionistas. (89) A nova Black
Cross Navigation and Trading Company foi anunciada oficialmente no Liberty Hall
em 20 de março de 1924, e foi noticiado que essa nova empreitada atraiu a maior e
mais entusiasmada multidão ao Liberty Hall, desde os tempos da velha Black Star
Line. (90) Em junho, Garvey se ofereceu pra comprar o Susquehanna, de instala-
ções da Companhia de Navegação dos Estados Unidos, apesar da confusão com o
Orion. Pesquisas no departamento de crédito da Companhia revelou que os fundos
da UNIA eram de cerca de 20 mil dólares, o suficiente para assegurar o pagamento
inicial, mas não suficiente para evitar problemas no levantamento dos 140 mil res-
tantes. A Companhia então decidiu vender somente em dinheiro. Eles parecem não
terem considerado a solicitação de Garvey para investir o depósito do Orion em um
novo navio, e nem o próprio Garvey repetiu a solicitação. (91)

Garvey comprou em seu lugar o General Goethals (batizado nos círculos


da UNIA como o Booker T. Washington.) por 100 mil dólares Junto à Companhia
Ferroviária do Panamá, e gastou mais 25 mil para recondicioná-lo. O navio foi bati-
zado em janeiro de 1925 e tanta gente foi para o passeio inaugural que cerca de mil
pessoas tiveram que retornar. (92) Essa impressionante mostra de devoção, por
parte dos seus seguidores, reforça a declaração de Garvey de que 90% do dinheiro
era originado nos acionistas da BSL. (93)

A tripulação era toda preta. Somente dois dos oficiais eram brancos. Gar-
vey explicou que oficiais pretos qualificados eram difíceis de encontrar. (94) Na
tentativa de evitar os problemas anteriores ele fez os dois, Capitão e Tesoureiro a
bordo, concordarem em não contratar quaisquer débitos sem a aprovação da
Companhia. (95) Garvey foi derrotado em sua apelação contra a acusação de frau-
de postal e foi preso logo depois do navio deixar Nova York para a tradicional via-
gem Cuba-Jamaica-Panamá. A tentativa usual, era a de financiar a viagem princi-
palmente com a venda de estoques ao longo do caminho. O resultado foi outra fa-
lência. Os passageiros e a tripulação tiveram conflitos com os oficiais brancos; Es-
ses então tentaram abandonar o navio na Jamaica; aconteceram muitos atrasos na
Jamaica e em Colón devido à falta de dinheiro; a tripulação quase se amotinou em
Colón devido à falta de pagamento; Em Charleston, no caminho de volta para casa o
não havia dinheiro para pagar pelos suprimentos e o Engenheiro Chefe pulou do
navio, causando um problema para a obtenção do liberação para prosseguir a via-
gem; e houve relatos da tripulação queimando a cabine da proa, como forma de se
manter aquecida. (96) O navio retornou a Nova York por volta do início de junho.
(97) Ele foi vendido mais tarde para saldar dívidas. (98) Em 1926 o auditor da
UNIA declarou que o valor bruto recebido pela Companhia foi de 287.432,95 mil
dólares , excluindo fundos recebidos por um agente de investimentos. (98) O lan-
çamento de uma companhia de navios tomou a proporção de obssessão entre os
membros da UNIA tanto quanto o desejo de migrar para a Libéria. O comitê de na-
vegação da convenção de 1929 na Jamaica sugeriu a formação de uma Companhia
Africana de Navegação Ltd. (100)

A Black Star Line coletou aproximadamente 750 mil dólares em seus


primeiros dez meses, incitando Garvey a aumentar a venda de ações da companhia
de 500 mil dólares para 10 milhões em dezembro de 1919 (101) Em agosto de
1922 Garvey afirmou que 900 mil dólares das ações já havia sido pago (102) Se
somamos a isso os investimentos coletados pela Black Cross Navigation and Tra-
ding Company, chegamos em um prejuízo de cerca de 1 milhão e 250 mil dólares
para o povo preto. A questão que se levanta é o porque de tamanha perda ser tole-
rada. Os motivos são de dois tipos: aqueles os quais Garvey pode ser diretamente
responsabilizado, e aqueles sobre os quais ele tinha pouco controle.
Entre as primeiras podemos citar sua falta de bom senso em apontar su-
bordinados. Um caso que podemos apontar diz respeito ao representante nigeria-
no da Black Star Line, Akinbami Agbebi, cuja escolha foi criticada pelo próprio pri-
mo , nos seguintes termos: “um agente ideal da Black Star Line deveria ser alguém
que possui algum suporte no país, alguém que possa diversificar e assumir sua
carga no negócio de importação. Existem diversas pessoas assim em Lagos, mas
Akinbami certamente não é um deles.” (103)

O exagero de Garvey também teve um papel importante nas mãos de seus


inimigos. O processo sobre fraude fiscal, muito se deveu ao fato de que ele estava
prometendo altos dividendos enquanto a BSL estava atravessando dificuldades
financeiras , prometendo levar milhares de imigrantes para a África em seus navios
e por aí vai. Ele também foi muito precipitado em comprar novos navios antes que
os que já existiam, estivessem cobrindo os seus custos.

Garvey também é parcialmente culpado pelas perdas resultantes da falta


de conhecimento sobre finanças marítmas e a condução antiprofissional de suas
companhias de navegação. O apodrecimento da carga de cocos é um exemplo gri-
tante disso. Muitos dos casos similares de incompetência foi certamente devido aos
subordinados de Garvey. E ele tentou se desassociar de suas ações, explicando que
contratou as duas melhores firmas de contabilidade de Nova York para iniciar e
auditar os Livros da BSL.

Tal incompetência geral e desleixo incluiu a perda de certificados de


ações. (105) Isso pode ser ilustrado também pelo caso do representante da BSL na
Nigéria, que segundo as leis locais não poderia iniciar um comércio se não possuís-
se um escritório registrado. Repetidas petições à Nova York pelos documentos ne-
cessários para a obtenção do registro, esbarraram em atrasos inexplicáveis , mes-
mo com milhares de dólares chegando diariamente em ações. O dinheiro acabava
sendo devolvido. (106) Um outro agente nigeriano acabou por se retirar, devido às
dificuldades de comunicação com a Companhia. (107) Um razão possível pra uma
parte dessa incompetência, é o fato de que o crescimento da BSL foi fenomenal,
pegando até mesmo seus diretores de surpresa. Em maio de 1920, havia escritó-
rios em Nova York, Cuba, Guiana Inglesa, Haiti, Jamaica, Bocas Del Toro, Port Li-
món, Lagos, Monróvia, Serra Leoa e quinze estados americanos. (108) E o dinheiro
também vinha de outras áreas.

Junto à incompetência geral, estava o usos dos recursos como tapa-


buraco financeiro. “Eu recordo vividamente minha própria experiência nas viagens
do Yarmouth e do Sojourn no Panamá,” relatou um representante da BSL. “Mas pra
mim sem a venda de ações para liquidar débitos...encontraríamos o desastre em
mais de uma ocasião.” (109) No verão de 1920, a Linha já tinha problemas finan-
ceiros o suficiente pra provocar a fundação de uma nova corporação , conhecida
como Black Star Steamship Company em um esforço pra deixar de lado os proble-
mas da Black Star Line. (110)

Ainda mais sérios foram os fatores fora do controle de Garvey. Entre


eles estavam os persistentes e maliciosos ataques dos seus inimigos. O Chicago
Defender, jornal negro de grande circulação, fez um editorial contra a Black Star
Line. Garvey venceu um processo contra o jornal, mas o júri o indenizou com seis
centavos, por danos morais. (111) O comunista Cyril Briggs, ao tempo em que de-
nuciava Garvey como ferramenta dos Britânicos e outros imperialistas, não tinha
nenhum escrúpulo em importunar esses mesmos imperialistas com inquirições
destinadas a aumentar suas oposições contra a Black Star Line. Ele publicou as
respostas desses imperialistas em seu jornal anti-imperialista, o Crusader. (112)
Seu amigo socialista W.A. Domingo fez o mesmo, em seus anti-imperialista Eman-
cipator. (113) As duas publicações continham principalmente material contra Gar-
vey e a Black Star Line.

Governos brancos foram a principal fonte de oposição. A administração


inglesa da Dominica, aprovou uma lei criada especificamente para os acionistas da
BSL, contra o envio ao exterior de mais de dez dólares por quinzena. (114) Cartas
da Companhia para o Congo Belga foram interceptadas e destruídas. (115) E o pa-
pel dos governos inglês e americano no caso Orion, já foi tratado.

O maior de todos os golpes contra os empreendimentos marítimos de


Garvey, veio da corrupção, ladroagem e sabotagem de muitos dos seus emprega-
dos. Pouca dúvida resta de que os engenheiros brancos do Yarmouth e do Kana-
wha praticamente destruíram esses navios. As multas inflacionadas, geradas pelas
propinas dos oficiais aumentaram cerca de 30 por cento. Propinas similares tam-
bém foram recebidas por outros carregamentos. (116) Um caso da BSL contra uma
companhi de New Jersey por cobrar 11.791,74 mil dólares por um conserto de 2.
500 dólares, muito mal executado, foi arquivado por falta de jurisdição. (117) O
Capitão Cockburn admitiu ter sido um dos cinco que dividiu uma propina de 8 mil
dólares por fora de um pagamento de 16.500 mil ao Yarmouth. Ele e Edward Smith
Green um oficial da Linha, racharam um suborno de 2 mil dólares para acelerar a
partida pra Cuba com a carga de uísque. (118) “ Aquele homem, Cockburn!”, Gar-
vey afirmou posteriormente, “que Deus o amaldiçoe ao esquecimento eterno.
Aquele homem teve em suas mãos o destino comercial dos mares para o povo pre-
to. E ele o vendeu, pedaço por pedaço, por vantagens vazias.”(119) Nem Cockburn,
nem Silverston, nem Orlando Thompson, nem nenhuma das principais figuras en-
volvidas foi condenada. Falsos vendedores se passando por representantes da BSL
também atingiram a Companhia. O Negro World trazia grandes avisos contra esses
e alguns foram processados com sucesso. (120)

Não houve nada de inevitável na falência da Black Star Line e dos em-
preendimentos a ela relacionados. As poucas viagens do Yarmouth provaram que
as possibilidades de cargas lucrativas e do negócio de passageiros estavam ali. Sem
os problemas enumerados acima, não há razão para que os empreendimentos de
navegação da UNIA não pudessem ter sido, pelo menos, modestamente lucrativos.

Capítulo 9 – Os Estados Unidos contra a UNIA

“Garvey é um negro caribenho e além dos seus esfor-


ços em estabelecer a Black Star Line Steamship Corporation
ele também tem estado particularmente ativo entre os ele-
mentos radicais da cidade de Nova York na agitação do mo-
vimento negro. Contudo, ele infelizmente ainda não violou
nenhuma lei federal pela qual possa ser processado como es-
trangeiro indesejável , do ponto de vista de deportação. Me
ocorre entretanto, a partir do material anexo, que possa ha-
ver alguma coisa contra ele por fraude, em conexão com a
propaganda da sua Black Star Line”

John Edgar Hoover (1)

“Apenas ladrões e bandidos temem ir para a prisão.


Homens de princípios não se preocupam com a cadeia.”

Marcus Garvey (2)

Os Estados Unidos forneceram a Garvey a maior população preta como


base, os recursos financeiros e tecnológicos, e o local estratégico no centro do
mundo do Panafricanismo, que foram as condições objetivas com as quais ele al-
cançou proeminência mundial. Sua aparição nos Estados Unidos, entretanto, coin-
cidiu com uma repressão selvagem contra as organizações radicais. E não demorou
muito pra que o próprio Garvey se tornasse alvo do interesse oficial. Em seu pan-
fleto de 1917 denunciando as revoltas do East de Saint Louis, aparece, sem comen-
tários, a informação de que seu discurso fora realizado diante de “uma grande e
entusiástica multidão de Afro-Americanos e Afro-Caribenhos, no qual o Capitão de
Polícia da Delegacia de Borough, acompanhado por mais de dez detetives, tenentes
e homens do serviço secreto estavam presentes.” (3)

Tal interesse oficial imediato por Garvey, não é difícil de explicar. Porque
Garvey estava, de fato, provocando o status quo, em um tempo em que o pensa-
mento oficial via no desejo do povo preto em ser livre e igual, um problema de lei e
ordem, e um pouco mais. Para esse tipo de mentalidade, até mesmo a Liga Nacio-
nal, a NAACP e os republicanos negros tentando emancipar membros da raça, po-
deria ser visto ocasionalmente como uma ameaça à paz. (4)

Essas atitudes estavam expressas pelo Procurador Geral A. Mitchell Pal-


mer em seu relatório de 1919 “Radicalismo e Sedição entre os negros, como refle-
tido em suas publicações.” Que encontrou problema em um discurso de Garvey
“que pregava uma doutrina de negro pelo negro.” (5) Atitudes similares também
foram expressos no relatório de 1920 do Comitê Lusk do Estado de Nova York,
“Radicalismo Revolucionário.” Seus reconhecimento da opressão dos Afro-
Americanos esra mais explícita: “O mais interessante, bem como a principal faceta
da propaganda radical e revolucionária”, eles apontam, “é o apelo feito àqueles
elementos da nossa população que possuem uma causa justa para reclamarem do
tratamento que recebem nesse país.” A despeito dessa admissão, a erradicação do
racismo era previsivelmente posta de lado em favor de uma solução de Lei e Or-
dem: “O próprio fato de que o negro tem muitas causas justas para reclamar, au-
menta a seriedade dessa propaganda e devemos encorajar os negros leais e refle-
xivos desse Estado a organizar atividades em oposição a esses radicais, que não
pode senão conduzir a sérios problemas, caso a continuidade dessa propaganda
seja permitida, o que agora vem sendo feito em grande quantidade.”(6) As mesmas
idéias aparecem nas opiniões do Cônsul estadunidense na Jamaica , que via em
Garvey um “canalha esperto”, cujas atividades por direitos civis faziam dele uma
ameaça. Nas palavras do Oficial: “Ao tempo em que ele é esperto o suficiente pra
aliviar seus discursos com afirmações de que ele é pelo negro e não contra os bran-
cos ou os governos, não faltam em seus discursos referências para que os negros
lutem por seus direitos e eu acredito que a tendência dessa propaganda é transfe-
rir a lealdade dos negros americanos e caribenhos à sua Associação.” (7) Portanto
transformaram a luta por direitos dos negros em um crime.

Garvey, por seu lado, fez muito pouco pra acalmar os medos do oficialato
americano. Não poderia ser diferente. Pra alcançar e mover as massas pretas, ele
precisava dizer o que precisava ser dito. Em sua denúncia dos conflitos de St, Louis
em 1917, por exemplo, sua linguagem não dava nenhuma mostra de que fosse um
estrangeiro chegado no país há apenas um ano, se dirigindo a um público que con-
tinha um bom número de oficiais de polícia , na era das deportações de radicais
não nascidos no país. Ele condenou o conluio entre as autoridades civis no massa-
cre como crime contra a humanidade. “ por trezentos anos,” disse , “ os negros da
América têm derramado seu sangue para fazer da República a maior entre os ne-
gros do mundo, e durante todo esse tempo, não houve sequer um ano de justiça.
Pelo contrário, uma sucessão contínua de opressão.” (8)

Muitos dos seus primeiros discursos, também, clamava aos homens pre-
tos que não participassem das guerras dos brancos, após seus sacrifício em vão na
Guerra Mundial. Em um discurso feito não muito após o fim dos conflitos, ele de-
clarou, “A primeira morte a ser buscada pelo homem preto no futuro , será para
fazer a si mesmo livre, e depois que isso tenha sido conquistado, se restar alguma
caridade para nós gastarmos, nós podemos morrer pelo homem branco. Mas pra
mim, acho que já basta de morrer por ele.” Esse discurso escandalizou o Comitê
Lusk. Seu comentário não foi inesperado: “ Esses discursos extravagantes e bom-
básticos podem parecer triviais na letra fria, mas a repetição contínua de tais sen-
timentos possuem um efeito inquietante e pernicioso sobre a população negra não
doutrinada.” (9)

Não era menor entre as provocações de Garvey ao oficialato americano, seu


flerte ambíguo com o comunismo. Como muitos outros líderes negros ele resolu-
tamente cuidou para que os comunistas não cooptassem sua organização, enquan-
to ao mesmo tempo, hesitava em condená-los e , em alguns momentos, elogiar
abertamente o sistema de governo russo. (10)

Em muitos outros momentos Garvey parece ter saído de sua rota de irritar o
governo americano. A Conferência de Washington para Controle de Armas, por
exemplo, foi agraciada com um telegrama de Garvey apontando que para o fato de
que 400 milhões de pessoas pretas não estavam representadas e recomendando ao
Presidente Harding o compromisso de democracia para o povo preto.(11) Nova-
mente, em 1922, Garvey escreveu ao secretário de Estado Charles E. Hughes, por
uma representação no Departamento de Estado para participar de uma sessão so-
bre o colonialismo em sua convenção internacional. A solicitação foi negada. (12)

Há muito pouco da doutrina de Garvey que pode não ser entendido como
ataque direto ou indireto aos Estados Unidos. Suas doutrinas de luta racial militan-
te podiam se transformar algumas vezes em greves contra poderosas corporações
americanas, como a United Fruit Company, em diversos países da América Latina.
Também seu projeto para a África, com suas implicações nacionalistas e anti-
imperialistas, se tivesse sucesso, resultaria em prejuízo aos interesses financeiros
americanos. Garvey apontou que o capital americano iria buscar se expandir na
África. Em 1929 escreveu, “A Europa hoje está falida e não pode dispor de muito
capital para o desenvolvimento de suas indústrias na África, além do que estão ten-
tando despertar o interesse dos americanos em explorar as riquezas do grande
Continente.” (13)

Tendo determinado desde o início de sua jornada nos Estados Unidos, que
Garvey era um indivíduo perigoso, diversas agências governamentais, policiais,
suboficiais e corporativas, submeteram Garvey e a UNIA a uma constante vigilância
em proporções internacionais. Onde era possível, essa vigilância era complemen-
tada pela infiltração de agentes na UNIA. A afirmação de Garvey de que “agentes
do governo, de organizações , corporações e indivíduos interessados na exploração
do povo preto, operam entre os membros e oficiais da Associação em diversas ci-
dades”, dificilmente pode ser lida como exagero. (14) Garvey notou que um conse-
lheiro geral da UNIA, do qual dependia para serviços jurídicos, foi apontado como
advogado geral assistente, após ser denunciado. (15) Repórteres brancos que en-
trevistavam Garvey também eram suspeitos de serem homens da Inteligência. (16)
Em um discurso na Jamaica em 1927, Garvey declarou: “O grande governo dos Es-
tados Unidos tem homens par me investigar. Todo tipo de gente do serviço secreto
é colocado atrás de mim e 20% dos meus empregados nos Estados Unidos são
agentes secretos dos Estados Unidos. Eu acredito que eu deva ter custado ao go-
verno dos Estados Unidos cerca de cinco milhões de dólares em dez anos.” (17)

Evidências de vigilância oficial sobre Garvey pipocavam dos lugares mais


inesperados. Em audiência perante o subcomitê de verbas em 1921, por exemplo, o
assunto veio à tona por causa dos altos pagamentos feitos a um empregado negro
do Departamento do Tesouro, que havia sido contratado para transcrever proce-
dimentos em “alguns encontros de negros radicais”. Um estenógrafo de primeira
classe foi solicitado , e um branco não poderia ser usado , já que estaria exposto a
ser posto pra fora do encontro ou assassinado. Um estenógrafo negro qualificado
foi buscado fora dos serviços governamentais, mas em vão. O Departamento de
Justiça , que havia solicitado o proffissional, teve que se contentar em utilizar um
funcionário do governo. Esses encontros tiveram lugar em Washington D.C., em
julho e setembro de 1920. A tarefa do estenógrafo foi descrita por um chefe do De-
partamento do Tesouro como “um trabalho estenográfico muito importante e con-
fidencial”, consistindo em “discretamente transcrever relatórios dos procedimen-
tos desses radicais negros.” (18) Aí transparece que esse funcionário já havia sido
anteriormente empregado para cobrir o encontro da UNIA em 1918, ocorrido em
Baltimore, Maryland. (19)
O papel do Departamento de Justiça nesse caso, não foi um evento
isolado. Muito da vigilância oficial sobre Garvey era originada desse Departamento.
Em 1919, por exemplo, oficiais do Canal do Panamá contataram o Escritório de
Investigação do Departamento , a respeito dos riscos que Garvey significava para
as duas áreas. (20) Essa correspondência logo chegou às mãos do agente J. Edgar
Hoover, que demonstrou um interesse mais que passageiro em Garvey. Ele expres-
sou o remorso genuíno por Garvey não haver ainda violado nenhuma Lei Federal
que o pusesse em condição de ser deportado. Ele sugeriu, entretanto, que o proces-
so contra ele fosse mantido por fraude, ligada à Black Star Line. Hoover não pecou
por não reconhecer os méritos do seu adversário, descrito por ele como “um dos
mais proeminentes agitadores negros de Nova York”, e “um orador excepcional-
mente fino, causando excitação entre os negros, por conta do seu projeto de nave-
gação.” Hoover concluía sua observação de modo previsível: “Em seu jornal Negro
World, as ordens da Rússia Soviéticas são apoiadas e há uma ampla defesa do bol-
chevismo.”(21) Em 1920, Oficiais Britânicos, que sempre trocavam informações
com as suas contrapartes americanas, estavam atentos ao fato de que os agentes
do Departamento de Justiça estavam vigiando Garvey de muito perto. (22) A vigi-
lância do Departamento se estendeu também aos empreendimentos de Garvey.
(23) O diretor do Escritório de Investigação, tentou até mesmo influenciar o modo
com que o promotor conduziu o caso contra Garvey quando ele foi preso em 1922.
(24)

Garvey dolorosamente ficou ciente da vigilância do Departamento ,


pelo zelo de um agente negro do Escritório de Investigação de Nova York, o Agente
Especial James E. Amos, um ex guarda-costa do ex-presidente Theodore Roosevelt.
As reclamações de Garvey contra Amos incluem conluio com outros anti-garveístas
, membros do NAACP, autorização de reportagens preconceituosas durante os jul-
gamentos de 1923, encorajamento de litígios civis contra Garvey , o ataque injusti-
ficado contra o Liberty Hall do Harlem e muito mais. (25) Os ataques de Amos con-
tinuaram em 1926, quando John Edgar Hoover, agora diretor do Escritório de In-
vestigações do Departamento, enviou um relatório secreto no qual Amos dessa vez,
erroneamente alegava que Garvey estaria da cadeia instruindo sua esposa a arre-
cadar fundos em circunstâncias e montantes que qualificavam fraude postal. (26)
Hoover manteve o interesse por Garvey mesmo após sua posterior de-
portação. Em 1928 ele recebeu um relatório a respeito dos feitos de Garvey na In-
glaterra de uma “fonte confidencial.”(27) Em 1929, presumivelmente devido à con-
tinuidade do seu interesse por Garvey, o auxílio de Hoover foi solicitado no caso
John O. Garret v. United States, onde houve uma tentativa de se recuperar partes
dos 22.500 dólares da Black Star Line, ainda bloqueados pela Companhia de Nave-
gação dos Estados Unidos. (28) Ainda mesmo em 1930, Hoover estava ainda lidan-
do com a UNIA, dessa vez prestando informações ao Departamento de Estado, que
estava investigando as atividades de um homem de Trinidad em Chicago, que era
suspeito de estar conectado ao moviento de Garvey.(29)

A vigilância americana sobre Garvey era diligentemente realizada, assim


como a vigilância interna. Agentes consulares americanos e “fontes confidenciais”
da Suécia à Libéria, do Canadá a Trinidad, mantinham uma vigilância minuciosa
sobre Garvey. Sua organização e suas ramificações em suas respectivas áreas.
Em 1919, um embaixador americano em Estocolmo , Suécia, informou a
Washington que um jornal sueco havia publicado um material sensacional vindo
de Londres, sobre a Black Star Line e o alarde de Garvey sobre um eminente guerra
racial. (30) Relatórios vinham de outras partes da Europa também, como um rela-
tório de 1930 do embaixador francês sobre o movimento negro radical na França ,
e sua ligação com Garvey. (31) E em 1919 quando o embaixador de Londres passou
para Washington o relatório secreto da inteligência inglesa , “Rebelião Entre os
Negros” (32), (incluindo

informações sobre Garvey e seus associados), o Departamento de Estado


apreciou muito a atenção inglesa a respeito da “rebelião negra através do mundo”,
e expressou o desejo de ter acesso toda informação possível de Londres. (33) Isso é
interessante, posto que muito entre as informações inglesas era obtida através da
sua própria vigilância conduzida dentro dos Estados Unidos. Em 1920, a presença
da ex-esposa de Garvey em Londres, Amy Ashwood Garvey, que estava a caminho
da Libéria, ocasionou um telegrama da embaixada dos Estados Unidos, para que o
Departamento de Estado certificasse se ela estava envolvida em “atividades anti-
branco de Garvey.” O departamento achava que não. (34) Em 1921, oficiais dos
Estados Unidos em londres, atuando por solicitação do Departamento de Estado,
recusou temporariamente permitir que o empregador de Garvey, Duse Mohamed
Ali, obtivesse um visto para entrar no Esatdos Unidos, apesar da boa vontade de
Mohamed para prestar informações não relevantes sobre Garvey quando interro-
gado pelo consul geral dos Estados Unidos.(35) O inglês branco Dr. Charles Garnett
passou a ser investigado por ter eventualmente sentado com Garvey em um encon-
tro no Royal Albert Hall.(36)

O interesse do Departamento de Estado a respeito do Garveísmo na Libéria


não poderia ser mais explícito. Em maio de 1921 o ministro residente e cônsul ge-
ral foi instruído a “observar de perto e relatar detalhadamente todas as atividades”
da UNIA. Suas instruções prosseguem, “o Departamento deseja saber os nomes das
pessoas na Libéria conectadas com esse movimento aparentemente subversivo, e
deseja ser informado principalmente a respeito de Gabriel Johnson, prefeito de
Monróvia, que é apontado como alguém que teria papel importante nos objetivos
futuros desse movimento.” Esse representante dos Estados Unidos estava da feliz
posição de poder dizer a Washington que já estava seguindo os rastros de Garvey
mesmo antes de assim ser ordenado. (37) Relatórios sobre o Garveísmo também
chegaram ao Departamento de Estado vindo dos oficiais americanos em Serra Le-
oa. (38)

Após a deportação de Garvey dos Estados Unidos, ele visitou por diversas
vezes o Canadá. Obviamente, ele não escapou do olho onipresente dos represen-
tantes do Tio Sam nessas ocasiões. Em outubro de 1928, menos de um ano de sua
expulsão dos Estados Unidos, ele chegou ao Candá e falou em favor de Al smith,
candidato democrata à presidência nas iminentes eleições americanas. Ele foi
prontamente preso, trazido diante de uma banca de interrogatório das autoridades
da imigração local em Montreal, e sua deportação foi ordenada sob o Decreto de
proibição de agitadores políticos. Explicando que estava em trânsito, ele foi multa-
do em 100 dólares, recebeu o parzo de até 7 de novembro para deixar o país, e pro-
ibido de participar de qualquer atividade pública.(39) O Negro World presumiu
que tudo isso foi conduzido pelas mãos do Partido Republicano, e estava certo.
(40) O cônsul geral americano em Montreal, escondido, é claro, do público, reivin-
dicou o crédito pela ação das autoridades canadenses. Escrevendo para Washing-
ton no dia após ao prazo limite dado para Garvey deixar o país, ele informou aos
seus superiores que Garvey havia chegado no Canadá com duas semanas de ante-
cedência e tinha feito discursos em apoio ao Partido Democrata. Garvey foi então,
por alguma razão inexplicável, chamado ao gabinete do cônsul geral, mas deixou o
país antes que pudesse ser interrogado. A essa altura, o oficial já havia contatado o
serviço de imigração canadense, e informado que Garvey era um ex-condenado,
inadmissível no Canadá. Portanto, as autoridades do Canadá, em suas palavras ofi-
ciais, agiram “discreta e prontamente.” (41)

Do Caribe Inglês, cehgavam observações periódicas sobre Garvey e os


Garveytas, de lugares como a Jamaica (42) e Ilhas Virgens Americanas, onde nin-
guém menos que o presidente dos Estados Unidos solicitou em 1923, um relatório
a respeito de uma figura política local suspeita de ser garveista. (43)

A vigilância nessa área era particularmente aguda em Trinidad, especial-


mente nos dois nos após a I Guerra Mundial. Isso se devia principalmente aos sé-
rios levantes e insurreições ocorridos ali em 1919. O cônsul americano em Porto
de Espanha recebia e enviava regularmente informações sobre a influência gar-
veysta com o governo inglês e as autoridades policiais. Quase nada escapava da sua
atenção. Um exemplo do seu zelo, foi a sua solicitação ás autoridades policiais lo-
cais em 1920, por informações confidenciais de dois jovens de Trinidad menciona-
dos em um jornal local por estarem procurando emprego na Black Star Line. (44) O
cônsul em Trinidad estava entre os mais fortes críticos do que ele considerava co-
mo tolerância de Washington em permitir que a propaganda garveysta saísse de
Nova York para as ilhas. Em 1920 ele admoestou o departamento de Estado: “ Eu
ultimamente tenho mencionado por várias vezes em despachos ao departamento,
os perniciosos efeitos que já são sentidos aqui, causados por essa propaganda de
Nova York, que provavelmente teve muita responsabilidade pelos recentes levan-
tes em Trinidad e Tobago. Não tenho como expressar de forma mais contundente a
minha opinião, de que essa propaganda de Nova york não deveria ser tolerada por
nosso governo.” (45)

Essa vigilância internacional se estendia inevitavelmente à América Latina,


onde existiam alguns dos mais fortes escritórios da UNIA. Relatórios fluíam regu-
larmente de lugares com a Costa Rica (46), Panamá (47) e Cuba, onde em 1921 o
encarregado americano solicitou uma investigação informal sobre a UNIA e a naci-
onalidade dos seus oficiais. (48) Em São Domingo, então um páis ocupado, os fuzi-
leiros americanos iniciaram em 1920 a repressão à UNIA e a prisão de seus líderes.
(49)

Na América Latina, a vigilância do Departamento de Estado era comple-


mentada pela United Fruit Company. Em janeiro de 1920, por exemplo, Marie Du-
chtelier, escrevendo da cidade do Panamá onde ela estava envolvida em uma turnê
promocional para a UNIA e a Black Star Line, explicou que a United Fruit Company
havia usado sua influência com o governo do panamá e a zona do canal para impe-
dir que a delegação da UNIA desembarcasse. Ela relatou que os pretos locais juntos
com os caribenhos e liderados por um panamenho hispânico, Morales, forçaram as
autoridades ameaçando fazer greve no Canal, e queimar abaixo a cidade. (50) Nes-
sa ocasião, a Companhia também segurou um cheque com o dinheiro remetido pe-
los trabalhadores para as organizações de Garvey. Tal informação foi transmitida
para o cônsul americano local. (51)

A United Fruit Company não era a única instituição não-governamental, ou


quase-governamental a suplementar a vigilância oficial. Outra era a Federação Cí-
vica Nacional. Em agosto de 1920, em meio à primeira Convenção Internacional
dos povos negros do Mundo, organizada por Garvey, a Federação embarcou em
uma trama para investigar a posição de Garvey. Um representante simplesmente
vistou e entrevistou vários entre as mais importantes figuras políticas afro-
americanas , em um período de poucos dias. (52) A primeira pessoa vistitada pelo
entrevistador, Charles Mowbray White, foi ninguém menos que o próprio Garvey.
Garvey o presenteou com uma cópia da Declaração dos Direitos dos Povos Negros
do Mundo, e o regalou com histórias da simpatia da UNIA com comunistas e inde-
pendentistas irlandeses. Garvey também explicou que não advogava o retorno de
todos os pretos para a África e relegou W.E.B. Dubois ao status de Negro antiqua-
do.” Sobre a fala de Garvey a respeito de sua intenção de visitar a África brevemen-
te, White respondeu anexando ao seu relatório, um avis de que o governo inglês
devia ser alertado para mantê-lo fora daquele continente.

Dois dias mais tarde, os visitados foram os redatores do The Messenger,


onde se encontrou com A.Philip Randolph e Chandler Owen. Owen falou quase so-
zinho , mas Whire relatou que Randolph concordava com as opiniões do seu par-
ceiro. Aqui White aprendeu que Garvey não poderia ser um bolshevique, porque
“ele não tinha se esforçado em nenhum estudo, era um ignorante sem educação
que não sabia nada a respeito dos afro-americanos sendo unicamente líder de um
movimento de caribenhos”. Owen e Randolph ainda avançaram na hipótese de que
Garvey poderia estar trabalhando com o Departamento de Justiça para destruir a
solidariedade preta ao minar a arrecadação de organizações rivais . Eles também
reforçaram a convicção de que o slogan de Garvey de “África para os Africanos”,
era não-científico , enquanto eles eram internacionalistas científicos. Eles previram
que os esquemas de Garvey entrariam em colapso dentre de três meses. Dois dias
depois White visitou W.E.B. Dubois, que assim como Randolph e owen, considerava
a UNIA mais um movimento caribenho do que afro-americano. De acordo com a
trabscrição de White, Dubois atribuiu o grande número de seguidores de Garvey,
não somente aos Caribenhos, mas também aos Centro-americanos. Dubois acredi-
tava que garvey estava aliado com os bolcheviques, e Sinn Feiners, e previa o fim
próximo da UNIA. A missão de white o levou em seguida a Frederick Moore, do
bem estabelecido semanário negro o new york age. Ele também considerava a
UNIA um assunto caribenho. Ele se orgulhava sobre o quanto seu jornal era agra-
dável e conservador e expressou confusão a respeito da relutância das autoridades
em atacar o “charlatão” Garvey, a quem ele acusava de pregações utópicas e socia-
listas.

A linha que separava vigilância e repressão a Garvey e à UNIA era fina. A vi-
gilância oficial obviamente não era um fim em si mesma. Era meramente um ponto
sobre o qual uma guerra de atrito foi conduzida e que culminou, após um período
de onze anos nos quais Garvey e suas organizações foram inclementemente asse-
diados, na prisão, julgamento, condenação e deportação de Garvey. Esse processo
teve início não muito depois da chegada de Garvey aos Estados Unidos. O negro
World de 14 de junho de 1919, traz um relato de Garvey sobre a sua recente con-
vocação por um oficial descrito como promotor público . Garvey afirma que alguns
sabotadores e bandidos sem consciência, haviam informado às autoridades polici-
ais de Nova York que o Negro World era responsável por enviar bombas pelos cor-
reios, através dos endereços de algumas pessoas. Essas acusações não foram pro-
vadas e os sabotadores foram expulsos da UNIA.

Durante esse mesmo mês, as tribulações de Garvey envolvendo o Assistente


Distrital , Promotor Edwin P. Kilroe, começaram. Como fruto do conflito entre os
dois, veio um processo de Kilroe contra Garvey, seguida de uma retratação no Ne-
gro World. Posteriormente, Kilroe admitiu que a única pessoa que ele poderia en-
contrar pra testemunhar contra Garvey durante as investigações sobre a Black Star
Line, era Tyler, que havia atentado contra a vida de Garvey. (53). De acordo com
Garvey, Tyler, anunciou que fora enviado por Kilroe para pegá-lo, antes de atirar
duas vezes. (54) Uma das mais interessantes ofensivas na campanha contínua con-
tra Garvey, foi a tentativa do Departamento de Estado para impedi-lo de retornar
aos Estados Unidos após uma visita ao caribe e América Central em 1921. Com to-
da a seriedade do caso, isso foi grandemente superado pelo melodrama desempe-
nhado por Garvey, o Departamento de Justiça e seus representantes consulares,
brincando de esconde-esconde por todo o Caribe durante cinco meses.

Garvey deixou Nova York em fevereiro de 1921 e viajou de trem até a Flóri-
da, de onde continuou de navio até Havana, Cuba. Ele teve uma passagem triunfan-
te por Cuba, onde foi recebido pelo presidente da ilha. (55) De Cuba ele foi para a
Jamaica, e então a trama ficou densa. Em primeiro de março, o cônsul americano
em Kingston, Charles L. Latham, informou ao secretário de estado em Washington,
que o jornal Daily Gleaner havia anunciado a chegada iminente de Garvey. Ele soli-
citou instruções concernentes ao visto do passaporte de Garvey, se ele deveria re-
tornar aos Estados Unidos, tendo em vista o que ele considerava como o ‘histórico
subversivo de Garvey’. Em 25 de março o Departamento de Estado despachou sua
resposta: “ em vista das atividades de garvey na política e na agitação racial,você
está instruído a recusar a ele um visto, e informar ao mesmo tempo ao Cônsul de
Port Antonio (Jamaica)m de sua ação.” (57).
Em 11 de abril, Garvey se apresentou devidamente no escritporio de
Latham, e solicitou um visto pra viajar para a Zona do Canal Americana, e depois de
volta para os Estados Unidos. Ele estava acompanhado por Cleveland Augustus
jacques e Amy Euphemia Jacques ( que viria a ser sua segunda esposa), que então
era secretária da Negro Factories Corporation. Os três haviam agendado passagens
para aquela mesma tarde. Latham informou que não poderia expedir seu visto sem
tempo para a devida análises, e o aconselhou a retornar no dia seguinte. Ele expe-
diu Visto para os dois acompanhantes de Garvey. Os três então cancelaram suas
passagens e em lugar disso viajaram de navio para Port Limón, na Costa Rica.
Latham informou tudo isso a Washington, e de que toda a autoridade consular de
portos do Caribe haviam sido notificadas pelo correio, de que não se deveria expe-
dir Vistos para Garvey. (58)

Mais detalhes dessa notificação foram despachados da Jamaica para o De-


partamento de Estado em 13 de abril. Washington foi notificado que o cônsul geral
do Panamá havia sido contatado, porque Garvey poderia tentar desembarcar lá. O
aviso expressava que em tal caso “ ele poderia provocar um considerável antago-
nismo racial entre os negros” na Zona do Canal e na República do Panamá, caso ele
tenha sucesso. (59) Um avez na Costa Rica, Garvey tentou, como haviam previsto
os oficiais americanos, obter um Visto para o panamá. O secretário de Estado Char-
les E. Hughes, informou em 26 de abril aos seus funcionários em San José, Costa
Rica, por telegrama, que não deveria ser dado Visto a Garvey. (60) Em 2 de maio, o
escritório de San josé respondeu, avisando Hughes que Garvey já havia partido
para Bocas del Toro, Panamá, antes da chegada do comunicado de Hughes. Ele ha-
via entrado no Panamá com um Visto do cônsul panamenho em Boston. (61) No
Panamá, ele teve novamente negada sua entrada na Zona do Canal Americana. Ele
então embarcou em uma lancha e saiu do território panamenho para Colón, onde
ele chegou sem se esconder das autoridades americanas. (62) Do Panamá Garvey
retronou à Jamaica , e em 7 de maio o cônsul americano Latham informou a Wa-
shington que Garvey poderia tentar entrar nos Estados Unidos como membro da
tripulação do navio kanawa, da Black Star Line, quando este estivesse em Cuba.
(63) Em 10 de maio uma nota secreta urgente foi despachada pelo Secretário de
Estado hughes, em Washington: “ Recuse o Visto da tripulação do SS Kannawha, se
o nome de Garvey estiver lá. A não ser que o nome dele já tenha sido removido.”
(64)

A perturbação de Latham aumentou rapidamente após isso, quando ele foi


informado de que Garvey havia zarpado de Santiago de Cuba, como Comissário de
Bordo, sem o conhecimento do Cônsul americano de lá. Ele suspeitou que Garvey
tentaria navegar por Port Limón com seu navio por volta de 20 de maio, e mandou
instruções por telegrama para que impedissem Garvey de navegar como membro
da tripulação ou como passageiro. (65) O Secretário de Estado, em 20 de maio ad-
mitiu que o Departamento de Estado não poderia impedir Garvey de viajar para a
Costa Rica, mas lembrou ao Cônsul Americano em Port Limón, que caso Garvey
aparecesse por lá, lhe fosse recusado um Visto americano. (66) Nos Estados Uni-
dos, enquanto isso, um advogado da UNIA conseguira uma audiência com o Depar-
tamento de Estado, requisitando o retorno de Garvey ao território americano, pos-
to que sua presença era importante para os negócios da Black Star Line. (67) De
todo jeito, uma semana e meia depois dessa audiência, um memorando do escritó-
rio do Departamento, ainda se referia a Garvey como um criador de problemas , e
sugeria que “ele deveria ser mantido fora dos Estados Unidos, se possível,” apesar
de expressar dúvida sobre a legalidade de negar o visto sanitário ao Antonio Maceo
(Kanawha), como sugerido por Latham, se Garvey tentasse navegar pra os Estados
Unidos como tripulante. Em todo caso, seria suficiente recusar o Visto da lista de
tripulantes para garantir que todos os estrangeiros seriam mantidos embarcados,
se chegassem sem estar na lista de tripulantes com visto. (68)

A essa altura, entretanto, essa encenação elaborada estava quase chegando


ao fim. Em 22 de junho, Garvey, ainda na Jamaica, despachou um telegrama para o
Secretário de Estado Hughes, solicitando que ele instruísse seu cônsul a carimbar o
seu passaporte. (69) Nesse momento, afortunadamente para Garvey, uma outra
pessoa havia assumido o lugar de Latham em Kingston. Garvey apresentou a esse
novo cônsul uma solicitação dos diretores da Black Star Line em Nova York, para
que seu Visto fosse expedido. (70) Por alguma coincidência, o Departamento de
Estado se encontrava momentaneamente com um secretário provisório substi-
tuindo Hughes, ao mesmo tempo em que um novo rosto ocupava o consulado em
Kingston. A nova combinação de atores, primeiro autorizou a expedição do Visto
de Garvey, em 25 de junho, e finalmente o enviou a Kingston em 28 de junho. (71)

Os problemas de Garvey não tinham acabado. Na chegada em Nova Orle-


ans, em um barco bananeiro a caminho da Guatemala, ele foi detido pelas autori-
dades da Imigração, que se surpreenderam com seu passaporte válido, e eviden-
temente jogaram com o tempo para que pudessem planejar algum novo esquema
pra criar dificuldades mais tarde. Ele finalmente obteve a permissão para entrar no
país, após despachar telegramas para o presidente e o secretário de estado em 13
de julho de 1921. (72)

A razão para a repentina cessão do Visto a Garvey, ainda não está clara. Tal-
vez a ocasional mudança simultânea do pessoal responsável por lidar com o caso,
tanto em Kingston quanto em Washington, tenha sido o golpe de sorte que o salvou
de uma permanência forçada fora dos Estados Unidos por tempo indefinido. Após
sua prisão em 1925, um oficial de imigração em Atlanta deu uma outra explicação,
de que o retorno de Garvey foi permitido, pra que ele pudesse ser processado. (73)

O próprio Garvey, que obviamente não estava completamente ciente da cor-


respondência que emanava de Washington durante sua permanência fora do país,
concluiu que, e não estava necessariamente equivocado, que seus inimigos pretos
haviam guiado washington para essa ação, e que o real culpado foi o consul em
Kingston, Charles Latham.
10

Garvey e os comunistas

Temos simpatia pelo Partido dos Trabalhadores. Mas nós pertencemos


primeiro, último e sempre ao partido Negro. Apoiaremos todas as partes que
nos apoiam, e agradecemos a atenção que o Partido dos Trabalhadores nos
dispensou ao enviar esta amigável comunicação. Mas os comunistas têm mui-
to tempo pela frente antes de poderem fazer qualquer coisa por si próprios
neste país. Quando eles chegarem lá, estaremos lá para eles. Mas enquanto is-
so nós somos por nós mesmos.

-Marcus Garvey '

Estamos trabalhando com a Associação Universal para o Progresso


Negro não porque seu presidente, Marcus Garvey, tenha melhorado ou mesmo
mudado nos últimos dois anos para se adequar à nossa visão do que os negros
americanos devem fazer para ganhar sua liberdade. A razão de trabalharmos
com a Associação Universal para o Progresso Negro é porque desejamos con-
quistar as massas, organizacional e ideologicamente, seguindo esta associa-
ção para o programa comunista.

- Daily Worker2

A revolução russa ocorreu em 1917, um ano e meio após a chegada de Gar-


vey aos Estados Unidos. A Internacional Comunista (ou Terceira Internacional) foi
formada em março de 1919 e foi seguida seis meses depois pelo nascimento do
movimento comunista nos Estados Unidos. O ano de 1919 foi o primeiro ano de
Garvey como uma grande dor de cabeça internacional para governos brancos. Após
dois anos de perseguição e partidarismo, grande parte do movimento comunista
americano surgiu como o Partido dos Trabalhadores em 1921. Nessa época, Gar-
vey era um líder estabelecido de um movimento de massa sem precedentes entre
os povos africanos em todo o mundo.

A maior parte dos seguidores de Garvey nos Estados Unidos, como em ou-
tros lugares, eram trabalhadores e camponeses. Esses eram os tipos de pessoas
sobre as quais os comunistas necessariamente esperavam construir um movimen-
to de massa. A necessidade de conquistar os trabalhadores e camponeses negros
assumiria uma importância ainda maior para os comunistas quando eles tardia-
mente acordassem para a compreensão de que as massas negras, como o segmento
mais explorado da sociedade americana, teriam que ocupar uma posição crítica em
seu pensamento se eles algum dia quisessem nutrir seriamente qualquer esperan-
ça de derrubar o capitalismo americano. Mas entre os comunistas e as massas ne-
gras americanas estava Garvey. Eles tentaram se infiltrar na UNIA "minar por den-
tro", eles tentaram cortejar e conquistar o próprio Garvey, eles tentaram lançar
ataques frontais contra ele na imprensa, eles discutiram sobre ele em suas reuni-
ões de Moscou a Chicago, eles até tentaram plagiar facetas de sua filosofia naciona-
lista, mas eles não puderam prevalecer. Garvey, exibindo grande tato e astúcia polí-
tica, não se comprometeria. Ele geralmente se abstinha de denunciar abertamente
os comunistas, mas não seria cooptado.

Parece não haver nenhuma evidência da participação negra na fundação do


movimento comunista americano em 1919.3 O programa adotado pelo Partido
Comunista da América, uma das duas facções fundadoras, incluía, no entanto, o
seguinte parágrafo: “O problema do Negro é um problema político e econômico. A
opressão racial do Negro é simplesmente a expressão de sua escravidão econômica
e opressão, cada uma intensificando a outra. Isso complica o problema do negro,
mas não altera seu caráter proletário. ”4 Essa afirmação, com sua tentativa de su-
bordinar a raça à classe, mas com sua percepção desconfortável de que o fator ra-
cial complicou a questão do Negro, continha os elementos básicos do dilema cen-
tral que intrigou os comunistas em sua abordagem às organizações não-
comunistas negras em geral e a Garvey e à UNIA em particular. A questão não era
fácil, e a dificuldade enfrentada pelos comunistas em resolvê-la era compreensível,
especialmente porque a análise desses primeiros comunistas norte-americanos era
restrita por uma interpretação estreita da doutrina marxista ortodoxa da primazia
da luta de classes. Essa rigidez na análise comunista americana dificultou uma aná-
lise objetiva dos componentes nacionalista e racial em uma ideologia de sucesso
como o Garveyismo. A solução para o problema racial era vista como um subpro-
duto automático de uma revolução socialista, e isso era tudo. Em 1920, o Partido
Comunista Unido (representando uma fusão entre uma das facções de 1919, o Par-
tido Trabalhista Comunista, e uma divisão da outra facção, o Partido Comunista da
América) mostrou essa tendência em seu programa. Reconheceu que a população
afro-americana era superexplorada e declarou:

O Partido Comunista Unido apoiará ativamente os negros em sua luta


desesperada contra essas condições infernais. Aponta para a única solução
possível para o problema do negro, a saber: a abolição da escravidão assala-
riada por meio da derrubada do Estado capitalista e da construção de uma
sociedade comunista. A tarefa do Partido Comunista Unido é quebrar a bar-
reira do preconceito racial que separa e mantém separados os trabalhado-
res brancos e negros, e os une em uma união de forças revolucionárias para
a derrubada de seu inimigo comum.5

O Partido dos Trabalhadores, a manifestação “legal” do comunismo ameri-


cano que surgiu no final de 1921, resolveu de forma semelhante em sua formação
mostrar aos negros que “os interesses dos trabalhadores negros são idênticos aos
dos brancos”.6

Não obstante, nessa época o primeiro débil reconhecimento nos círculos


comunistas de que a questão racial que afetava os negros possuía um caráter dife-
rente do puramente de classe se manifestou - não na América, mas na Rússia. No
segundo congresso da Internacional Comunista (Comintern) realizado em 1920,
um delegado americano branco, o jornalista John Reed, fez algumas observações
sobre o caráter nacional da luta afro-americana. Suas observações foram estimula-
das por uma discussão das idéias de Lenin sobre "Os Negros na América", que fazi-
am parte de seu projeto de "Teses sobre a Questão Nacional e Colonial". 7 A consi-
deração de Reed sobre a questão nacional, no entanto, foi meramente para repu-
diá-la. Ele disse: “Os negros não têm exigências de independência nacional. Todos
os movimentos que visam uma existência nacional separada para os negros fa-
lham, assim como o ‘Movimento de Volta à África’ de alguns anos atrás. Eles se
consideram, antes de tudo, americanos em casa nos Estados Unidos. Isso torna tu-
do muito mais simples para os comunistas ”.8

O que é interessante sobre a opinião de Reed é que Lenin a ignorou e incor-


porou em suas teses finais uma declaração muito antes da posição então defendida
pelos comunistas americanos. Por causa da controvérsia que rodeou esta breve
referência, ela será citada juntamente com todo o parágrafo de onde veio, bem co-
mo o parágrafo que veio depois:

As ofensas contra a igualdade das nações e as violações dos direitos


garantidos das minorias nacionais, repetidamente cometidas por todos os
Estados capitalistas apesar da sua constituição “democrática”, devem ser in-
flexivelmente expostas em toda a propaganda e agitação levada a cabo pelos
partidos comunistas, tanto dentro como fora do parlamento. Mas isso não é
suficiente. É também necessário: primeiro, deixar sempre claro que só o sis-
tema soviético é capaz de garantir uma igualdade real para as nações, por-
que une primeiro os proletários e depois todas as massas trabalhadoras na
luta contra a burguesia; em segundo lugar, os partidos comunistas devem
dar apoio direto aos movimentos revolucionários entre as nações depen-
dentes e sem direitos iguais (por exemplo, na Irlanda e entre os negros
americanos, etc.), e nas colônias, j Sem esta última condição particularmente
importante, a luta contra a opressão das nações e colônias dependentes e o
reconhecimento de seu direito de se separarem como Estados separados
continua sendo uma pretensão enganosa, como o é nas partes da Segunda
Internacional.9 [Grifo meu].

Parece bastante claro que Lenin estava se referindo à população afro-


americana aqui, se não como uma nação, pelo menos como uma minoria nacional
negada direitos iguais e possivelmente tendo o direito de se separar. O fato de ele
ter assumido tal posição em relação aos afro-americanos não é surpreendente, já
que por algum tempo ele se inclinou nesta direção em relação às minorias nacio-
nais na União Soviética. Isso pode muito bem explicar por que Garvey conseguia
manter uma admiração por Lenin ao mesmo tempo em que lutava contra os comu-
nistas americanos. Lenin acompanhou esses temas com conselhos a seus camara-
das americanos sobre a urgência da necessidade de propaganda e trabalho organi-
zacional entre os afro-americanos.
A natureza fugaz da referência de Lenin ao caráter nacional da situação
afro-americana e sua indisponibilidade de tradução por algum tempo garantiram
que não haveria um seguimento imediato desta ideia. Durante a sessão final do
terceiro congresso em 1921, entretanto, a delegação sul-africana propôs que o co-
mitê executivo deveria estudar “a questão negra ou o movimento proletário entre
os negros como um aspecto importante do problema oriental”.

A Questão do Negro foi, portanto, considerada pelo quarto congresso em


1922. As teses foram apresentadas por Otto Huiswoud, um negro membro do par-
tido nos Estados Unidos, que operava sob o pseudônimo de "Billings". Eles foram
adotados por unanimidade e não revelaram nenhuma mudança na abordagem
americana normal. A Questão do Negro foi vista como principalmente econômica,
embora a questão racial ainda desempenhasse um papel importante. Huiswoud
considerou o “problema do Negro” como “uma questão vital da revolução mundial”
E a cooperação dos povos negros é essencial para o sucesso proletário. Ele sugeriu
uma organização mundial da raça negra que soava suspeitosamente como um sem
Garveyless UNIA.12 Huiswoud considerava a população afro-americana uma pro-
vável fonte de mão de obra para a contra-revolução, no caso de um levante, opinião
nada incomum nos primeiros círculos comunistas americanos, onde a frase "reser-
va da reação capitalista" já foi usada para descrever a população afro-americana.13
Artigo publicado no jornal soviético Izvestia duas semanas antes de Huiswoud
apresentou suas teses e expressou visão semelhante. A raça negra era aqui vista
como “uma arma obediente” nas mãos do capitalismo internacional e, portanto,
uma ameaça ao proletariado branco.

As discussões do Congresso do Comintern sobre a Questão do Negro conti-


nuaram no quinto congresso em 1924. Desta vez, as características nacionais da
luta afro-americana se intrometeram nas discussões. Um delegado americano ar-
gumentou que o problema enfrentado pelos afro-americanos era tanto psicológico
quanto econômico e transcendia as linhas de classe. Portanto, era fútil, ele argu-
mentou, direcionar a mesma literatura aos trabalhadores negros e brancos.15 A
comissão de programa do congresso também lutou com esse problema e concluiu
que era impossível definir o conceito de nação de tal maneira que para cobrir ade-
quadamente todas as situações nacionais. Nada disso impediu o delegado america-
no John Pepper de denunciar o movimento de Garvey de uma forma tipicamente
irrealista como "um movimento negro-sionista na América que deseja ir para a
África", apesar do desejo dos afro-americanos por igualdade social.16
A tentativa mais concentrada de esclarecer a posição comunista sobre a
questão racial veio no sexto congresso do Comintern, realizado em Moscou em
1928. Nessa época, Garvey tinha sido recentemente deportado dos Estados Unidos,
e os comunistas, com pouco a mostrar para seus esforços anteriores, estavam ansi-
osos para se juntar à corrida geral pelos seguidores de Garvey. Muito da confusão
anterior se manifestou, mas desta vez os debates culminaram no estabelecimento
de uma política definida. Stalin, como um especialista soviético de longa data na
questão das minorias nacionais, foi em grande parte responsável pela importância
atribuída à questão. Seu interesse aparentemente se manifestou já em 1925, quan-
do ele explicou a um grupo de estudantes negros dos Estados Unidos que a atitude
americana em relação à questão estava totalmente errada. Afro-americanos, disse
ele, eram uma minoria nacional com algumas das características de uma nação. 11
O trabalho preparatório para o exame de 1928 da questão racial havia co-
meçado com bastante antecedência, e referências a ele apareciam regularmente
desde as primeiras sessões. John Pepper admitiu desde o início que os comunistas
americanos cometeram alguns erros,18 enquanto outro americano retratou a ideia
de que os negros do sul eram uma reserva da reação capitalista.19 Não obstante, as
opiniões expressas nos debates variaram amplamente. Weinstone, um delegado
dos Estados Unidos, pensou que a questão poderia ser resolvida avançando slo-
gans de plenos direitos sociais e políticos para os afro-americanos.20 O Pravda de
24 de agosto de 1928 citou Jones, um delegado negro dos Estados Unidos, dizendo
que duas tendências foi expressa na comissão negra do congresso. Um argumentou
que os afro-americanos nos Estados Unidos eram uma minoria racial, enquanto
outro negou a unidade nacional dos afro-americanos e apontou para o aumento da
estratificação de classe dentro da raça, especialmente desde a Guerra Mundial. Este
delegado também se dirigiu à sugestão de uma República Socialista Soviética inde-
pendente para os afro-americanos. Ele não se opôs a essa ideia, mas considerou o
slogan de direitos iguais mais fundamental naquele momento específico. 21 O afro-
americano James W. Ford referiu-se aos negros dos Estados Unidos como "uma
minoria nacional economicamente atrasada, sem território próprio.” Isso não o
impediu de argumentar que os interesses dos trabalhadores negros e brancos
coincidiam, assim como os da burguesia negra e branca. Ele, portanto, se opôs
"atualmente a qualquer movimento nacional entre os negros", pois seria "apenas
um trunfo nas mãos da burguesia" e "atrapalharia a guerra revolucionária de clas-
ses das massas negras, e aprofundaria ainda mais o abismo entre os brancos e os
grupos oprimidos.”22

Desse debate surgiu a nova linha de autodeterminação do Comintern para a


população Preta na “Faixa Preta” do sul dos Estados Unidos. A nova linha foi expos-
ta extensamente em uma resolução do comitê executivo do Comintern logo após o
final do congresso. Ele destacou que 86% da população Afro-americana vivia no
Sul e que aproximadamente metade deles vivia na Faixa Preta, onde representava
mais de 50% de toda a população. A partir disso, argumentou que "As várias for-
mas de opressão das massas Negras, que estão concentradas principalmente na
chamada 'Faixa Preta', fornecem as condições necessárias para um movimento
revolucionário nacional entre os Negros... A grande maioria dos Negros nos distri-
tos rurais do Sul não são ‘reservas da reação capitalista’, mas potenciais aliados do
proletariado revolucionário.” Esse reconhecimento tardio do caráter nacional da
luta Afro-americana foi, portanto, limitado a uma questão de autonomia territorial
nessa área. Além disso, o slogan de “plena igualdade social e política” permaneceria
o “slogan central”. As implicações do nacionalismo Preto para aqueles fora do
Black Belt, conforme demonstrado por Garvey, foram ignoradas. A resolução ob-
servou, como Garvey havia feito há muito tempo, que devido à opressão imperialis-
ta mundial, “um laço comum de interesse é estabelecido para a luta revolucionária
de raça e libertação nacional da dominação imperialista dos Negros em várias par-
tes do mundo”.23

A adoção desta linha nacional de 1928 pela Internacional Comunista é ge-


ralmente apresentada como tendo procedido da famosa definição de Stalin de uma
nação - “Uma nação é uma comunidade estável e historicamente desenvolvida de
idioma, território, vida econômica e constituição psicológica manifestada em uma
comunidade de cultura.24 É digno de nota que, durante os debates do congresso, a
maioria dos comunistas americanos, Pretos e brancos, parecem não ter defendido
uma abordagem nacional para a questão racial. George Padmore, na época um
membro ativo do partido americano, argumentou mais tarde que a mudança de
1928 foi motivada pela tentativa de longa data de atingir os seguidores de Garvey.
Ele escreveu: “Foi, portanto, decidido que, uma vez que Marcus Garvey reuniu o
apoio popular ao prometer 'Eu estabeleço um 'Lar Nacional' para os pretos na Áfri-
ca, os comunistas americanos deveriam fazer um pouco melhor e oferecer aos Ne-
gros americanos um estado próprio na Faixa Preta... Esperava-se com essa mano-
bra que eu satisfizesse as aspirações nacionalistas daqueles Negros que ainda ansi-
avam pelo ‘sionismo negro’ e os afastasse do Garveyismo para o comunismo ”. Ele
continuou: "Com a bênção de Stalin, este incrível absurdo foi imposto ao partido
americano." 25

O partido americano certamente não demorou a aceitar a nova linha. De fa-


to, o Partido dos Trabalhadores emitiu uma declaração sobre autodeterminação
simultaneamente com as últimas etapas do congresso, sem dúvida suscitada pelo
fato de que 1928 foi um ano eleitoral nos Estados Unidos e o Partido dos Trabalha-
dores teve vários candidatos pretos em campo. A declaração lida em parte:

O Partido dos Trabalhadores (Comunista) Americano apresenta cor-


retamente como seu slogan central: Abolição de todo o sistema de discrimi-
nação racial. Plena igualdade racial, social e política do povo Negro. Mas é
necessário complementar a luta pela plena igualdade racial, social e política
do Negro com uma luta por seu direito à autodeterminação nacional. Auto-
determinação significa o direito de estabelecer seu próprio estado, de erigir
seu próprio governo, se assim escolherem. Nas condições econômicas e so-
ciais e nas relações de classe do povo Negro, há forças crescentes que ser-
vem de base para o desenvolvimento de uma nação Negra (uma massa
compacta de agricultores em um território contíguo, condições semifeudais,
segregação completa, tradições comuns da escravidão, o desenvolvimento
de classes e laços econômicos distintos etc. etc.).

Esta declaração do Partido dos Trabalhadores, muito mais explicitamente


do que a declaração do Comintern, reconheceu (embora de forma relutante) o pa-
pel que Garvey desempenhou na indução desta nova linha. Continuou:

Existem muitos movimentos nacionais da pequena burguesia e da intelectu-


alidade da cidade preta. O fato de que o movimento de massa mais importante foi
uma espécie de Sionismo Negro e teve slogans tão reacionários e extremamente
prejudiciais como deixar os Estados Unidos e voltar para a África, não deve nos
cegar para as possibilidades revolucionárias dos movimentos Negros de libertação
nacional do futuro.

A resolução conferiu a Garvey uma medida de legitimidade involuntária


quando buscou autoridade para a nova linha nacional em uma citação de Lenin no
sentido de que todos os movimentos de libertação nacional são democráticos bur-
gueses. À medida que o movimento se desenvolveu, porém, eles presumiram que
seria assumido por elementos proletários.26

Em 1930, em um esforço para esclarecer de uma vez por todas a “falta de


clareza sobre a Nuestão do Negro” que eles ainda reconheciam dentro do partido
americano, o secretariado político do comitê executivo da Internacional Comunista
redigiu uma nova resolução “Sobre a Questão do Negro nos Estados Unidos." Esta
resolução reconheceu mais claramente do que antes as características peculiares
da nação Afro-americana. Afirmou:

No interesse da máxima clareza de idéias sobre esta questão, a ques-


tão do Negro nos Estados Unidos deve ser vista do ponto de vista de sua pe-
culiaridade, ou seja, como a questão de uma nação oprimida, que está em
uma situação peculiar e extraordinariamente angustiante de opressão naci-
onal não apenas em vista das distinções raciais proeminentes (diferenças
materiais na cor da pele, etc.), mas acima de tudo por causa do antagonismo
social considerável (resquícios da escravidão). Isso introduz na questão do
Negro americano um importante e peculiar traço que está ausente da ques-
tão nacional de outros povos oprimidos.

A resolução, no entanto, continuou a distinguir entre os Afro-americanos do


Sul e os do Norte. Viu tendências e perspectivas de separação como mais prováveis
no sul. Mais do que autodeterminação, via a reivindicação de direitos iguais como o
slogan mais importante do Norte, onde “em hipótese alguma era tarefa dos comu-
nistas apoiar o nacionalismo burguês em sua luta contra as tendências progressi-
vas de assimilação das massas trabalhadoras Negras.”

No entanto, contraditoriamente, advertiu o partido a "resistir a todas as


tendências dentro de suas próprias fileiras de ignorar a questão do Negro como
uma questão nacional nos Estados Unidos, não apenas no Sul, mas também no Nor-
te". Esta resolução, então, não era ela mesma um modelo de clareza. A distinção
entre Sul e Norte significava, é claro, que alguma maneira tinha que ser encontrada
em torno da realidade desconfortável do Garveyismo, que floresceu tanto no Norte
quanto no Sul e que, em 1930, três anos após a deportação de Garvey, ainda apre-
sentava um obstáculo formidável ao trabalho comunista no norte Negro. Garvey
foi, portanto, sufocado por uma torrente de retórica que substituiu a análise. Ape-
sar da defesa da autodeterminação na Faixa Negra, até o ponto de separação, os
comunistas foram advertidos de que não podiam “se associar no present, ou de
modo geral, durante o capitalismo, indiscriminadamente e sem crítica a todas as
correntes separatistas dos vários grupos Negros burgueses ou pequeno-burgueses
”, pois havia “não apenas uma revolução nacional, mas também um separatismo
Negro reacionário, por exemplo, representado por Garvey ”. Isso levou a uma de-
claração da principal objeção ao nacionalismo de Garvey, ou seja, sua exclusividade
racial. Tendo já declarado a natureza progressiva da assimilação no Norte, agora
levou para casa seu ataque à "utopia de um Estado Negro isolado de Garvey (inde-
pendentemente se na África ou na América, se é suposto consistir apenas de ne-
gros)." Tal estado serviria apenas ao "objetivo político de desviar as massas Negras
da verdadeira luta de libertação contra o imperialismo americano".

Portanto, esse era o ponto crucial de sua briga com Garvey. Um estado sepa-
rado controlado por Negros com uma minoria branca seria apoiado na Faixa Negra,
até o ponto de secessão completa dos Estados Unidos, e mesmo se esse estado op-
tasse por não seguir o programa comunista, mas um estado Garvey totalmente Pre-
to em qualquer lugar, mesmo na América, seria utópico e reacionário. O ponto foi
reforçado por outra explosão de ataques à Garvey: "Todas as correntes reformistas
nacionais como, por exemplo, o Garveyismo, que são um obstáculo à revolução das
massas Negras, devem ser combatidas sistematicamente e com a máxima ener-
gia."27

Os trotskistas americanos também lutaram com a questão nacional. O pró-


prio Trotsky havia, em 1922, impressionado o poeta renascentista do Harlem,
Claude McKay, ao ver a questão racial de uma forma mais inteligente do que qual-
quer outro líder russo. Ele concedeu a McKay uma entrevista em Moscou e, entre
outras coisas, propôs treinar alguns homens pretos como oficiais do Exército Ver-
melho.28 Discutindo a questão nacional no México com camaradas americanos em
1939, Trotsky adotou uma posição um pouco mais suscetível à autodeterminação
do que a maioria dos comunistas estavam acostumados. Ele argumentou que o su-
cesso do movimento de Garvey era explicável em suas propensões à autodetermi-
nação. E ao invés de atacar a direção pequeno-burguesa das organizações raciais,
ele preferiu ver este fenômeno como uma etapa necessária na emancipação da ra-
ça, necessária pelo racismo manifestado pelos trabalhadores brancos. Ele até ima-
ginou a possibilidade muito incomum para um comunista dessa época de que Pre-
tos, pelo caminho da autodeterminação, pudessem até pular sobre o proletariado
branco e assumir um papel de vanguarda. Ele expressou esta opinião da seguinte
forma:

É bem possível que os Negros também pela autodeterminação pro-


cedam à ditadura do proletariado em dois passos gigantescos, à frente do
grande bloco dos trabalhadores brancos. Eles então fornecerão a vanguar-
da. Estou absolutamente certo de que, em qualquer caso, lutarão melhor do
que os trabalhadores brancos. Isso, no entanto, só pode acontecer desde que
o Partido Comunista conduza uma luta implacável e intransigente, não con-
tra as supostas pretensões nacionais dos negros, mas contra os preconcei-
tos colossais dos trabalhadores brancos e não lhe dê qualquer concessão. 29

Os comunistas geralmente tendiam a ver Garvey em termos simplistas como


uma figura pequeno-burguesa pregando o nacionalismo reacionário e desviando as
massas negras para canais utópicos. Obviamente, como já vimos, havia muito mais
em Garvey do que sugeria essa imagem imprecisa. Muito do controle de Garvey
sobre as massas foi devido a ideias não muito diferentes de algumas defendidas
pelos comunistas. Apesar de sua firme adoção do princípio de raça primeiro, por
exemplo, havia um componente de classe persistente no pensamento de Garvey.
Diferente da raça branca, ele viu a necessidade de solidariedade intraracial, mas
dentro da raça ele demonstrou muito claramente que se identificava com as mas-
sas oprimidas contra aqueles com pretensões a um status mais exaltado. Contra a
acusação de WEB Du Bois de que ele nasceu em circunstâncias humildes, ele decla-
rou: “Admitindo que Marcus Garvey nasceu pobre, ele nunca encorajou um ódio
pelas pessoas de sua espécie ou classe, mas ao contrário devotou sua vida à melho-
ria e um maior desenvolvimento dessa classe dentro da raça que tem lutado com a
desvantagem que o próprio DuBois retrata em seu artigo”.30 [Grifo meu.] Membros
da UNIA em Nova Orleans em uma ocasião expressaram eloquentemente essa
mesma atitude. “Não somos membros do Negro 400 de Nova Orleans”, escreveram
eles, “composto pela classe que passa seu tempo imitando os brancos ricos ...”31.
Em uma ocasião, Garvey poderia até mesmo considerar as revoltas dos trabalhado-
res em países brancos como um exemplo a ser seguido pela raça preta. Em um edi-
torial de 1926, ele comentou: “As classes da realeza e privilegiadas de preguiçosos
que costumavam tiranizar e oprimir as massas humildes da humanidade agora
estão tendo dificuldade em manter o controle sobre o sentimento do povo.” Ele
achava que o homem preto deveria também atacar a realeza e o privilégio. 33 Certa
vez, ele chegou a versar:

Os oprimidos pretos e brancos pobres deveriam se juntar

E impedir que os brancos ricos nossos direitos roubar.33

O apelo de classe da propaganda de Garvey foi reconhecido por um funcio-


nário do Departamento de Estado que a considerou mais perigosa do que o comu-
nismo. Esse funcionário escreveu em 1921: “Embora ele certamente não seja um
intelectual, sua propaganda e agitação particulares são consideradas perigosas,
pois encontrará um campo mais fértil de divergência de classes do que o bolche-
vismo provavelmente encontraria nos Estados Unidos.” 34

Nem era o aspecto da filosofia raça primeiro de Garvey difícil de explicar em


termos de classe, pois era baseada no reconhecimento de que a esmagadora maio-
ria da raça preta correspondia aos trabalhadores e camponeses em todos os luga-
res. Garvey analisou essa situação em relação à sua Jamaica natal.

A Jamaica é uma colônia britânica com uma população de quase um


milhão de pessoas deste número, mais de 850.000 são pretos. Existem
15.000 brancos e o resto são de pessoas de ascendência preta e branca.
Nessa população, há um arranjo social pelo qual todas as posições de in-
fluência são ocupadas por uma classe minoritária. A maior parte dos pretos
são mantidos em condições que beiram a servidão, são geralmente constitu-
ídos pela classe trabalhadora que recebe apenas uma mixaria de salário, que
varia de seis a 9 pence para mulheres, e para homens de 1 [shilling] por dia
a 2 [shillings]. Por causa desta baixa escala de salários entre as pessoas, o
crime é abundante, nossas casas pobres estão cheias ...

Em meio a essa miséria da maioria preta, temos uma próspera mino-


ria de brancos, mestiços e alguns negros que foram levados sob o patrocínio
da minoria privilegiada.35

Complementando seu sentimento pelas massas, havia uma intolerância ao


privilégio não muito diferente da dos comunistas. E o ataque de Garvey ao privilé-
gio estendeu-se às pessoas assimiladas dentro da raça, apesar de sua doutrina de
raça primeiro. Em 1924, por exemplo, falando contra a candidatura do republicano
preto do Harlem Charles H. Roberts, acusou-o de ser apoiado por capitalistas pre-
tos e marajás. Ele foi longe a ponto de afirmar que “como os brancos nos sindica-
tos, o grupo Socialista e o grupo Progressista estão mantendo seus olhos naquele
grupo egoísta de pessoas brancas que estão tentando roubar e explorar, você tam-
bém deve manter seu olhos naqueles negros egoístas que têm esmagado você nos
últimos 20 anos.” Ele encerrou seu argumento explicando ao público que "você, o
trabalhador, não tem nada em comum com o Dr. Charles Roberts neste momen-
to."36 Nesta ocasião, a União Política Negra de Garvey na verdade apoiou um candi-
dato branco contra Roberts.

Essa hostilidade em relação aos privilégios estendia-se naturalmente aos


proprietários de terras. Sua plataforma eleitoral durante sua campanha de 1929
para o conselho legislativo da Jamaica incluiu sugestões para a reforma agrária.
Relembrando as experiências de seu próprio tio, que fora arrendatário e sujeito ao
capricho de um senhorio desonesto, ele propôs métodos para obrigar os grandes
proprietários a disponibilizarem terras excedentes aos pequenos proprietários. 37

À luz de tudo isso, não é nenhuma surpresa que ele se opusesse aos títulos
conferidos pela UNIA como sendo uma aspiração pela aristocracia. Os títulos da
UNIA, observou ele, não eram baseados na riqueza, mas no serviço à raça. Eram
distinções conferidas a indivíduos dignos por uma raça apreciativa.38

Esses sentimentos de classe da parte de Garvey foram reforçados por uma


longa história de luta em nome das organizações de trabalhadores. Os comunistas
e outros que o conheciam apenas no contexto americano acreditavam que sua hos-
tilidade para com os sindicatos americanos brancos era indicativo de uma hostili-
dade geral para com as organizações de trabalhadores. Ainda assim, em sua hosti-
lidade às práticas racistas da Federação Americana do Trabalho, Garvey não estava
agindo de maneira diferente de praticamente todos os líderes afro-americanos e,
na verdade, dos próprios comunistas. Onde ele diferiu deles e expressou o que
consideravam heresia foi em seu conselho ao trabalhador preto na América de que
ele não deveria ter nenhum escrúpulo em jogar com a ganância do capitalista ven-
dendo abaixo do trabalhador branco e, assim, obtendo emprego. “Parece estranho
e um paradoxo”, escreveu ele, “mas eu, o único amigo conveniente que o trabalha-
dor negro tem na América, atualmente, é o capitalista branco.” 39 Esta posição, no
entanto, era estritamente relacionada à situação peculiar induzida na América por
sindicatos racistas de trabalhadores brancos. Em outras situações, Garvey teve um
histórico de luta em organizações trabalhistas que foi, sem dúvida, mais notável do
que o de muitos críticos comunistas. Seu envolvimento inicial nas lutas dos traba-
lhadores na Jamaica, Costa Rica e Panamá já foi observado. Durante os primeiros
anos da UNIA na Jamaica (1914-1916), ele tentou, sem sucesso, implementar um
esquema estabelecendo trabalhadores desempregados como agricultores campo-
neses nas terras da coroa. Ele também tentou, neste período, obter a ajuda da Fe-
deração do Trabalho da Jamaica.40 Ele manteve seu interesse pelo cenário traba-
lhista jamaicano depois de se mudar para os Estados Unidos. Em 1920, durante
uma greve policial em Kingston, ele incomodou as autoridades ao enviar um tele-
grama expressando simpatia a seu amigo A. Bain Alves, presidente da Federação
do Trabalho da Jamaica, que havia sido muito ativo nas lutas dos trabalhadores
durante aqueles anos. De volta ao Caribe em 1921, Garvey defendeu a sindicaliza-
ção do trabalho na Jamaica e o patrocínio trabalhista de representantes no conse-
lho legislativo.43

A atividade mais sustentada de Garvey no movimento trabalhista ocorreu


durante o período jamaicano de 1927-1935. Seu jornal Blackman tornou-se um
órgão para a exposição de queixas trabalhistas. Em maio de 1929, pouco mais de
um mês após seu surgimento, ele abordou o caso de um jovem carregador de ba-
nana que havia sido chutado e algemado no cais por um assistente do cais. Garvey
reclamou com os outros trabalhadores no cais por não terem jogado o culpado no
mar. Quando os homens tentaram fazer greve alguns dias depois, ele os apoiou.
Eles, portanto, marcharam até sua sede em Edelweis Park e pediram que ele os
representasse na disputa com seus empregadores, a United Fruit Company. Seu
salário era de um xelim e nove pence por cem cachos de bananas carregados. Tam-
bém não recebiam horas extras no trabalho noturno, domingos ou feriados. Garvey
falou com eles sobre a necessidade de sindicalização e condenou a estrutura social
na Jamaica, cujo resultado, ele declarou, “um grande número de seu povo, meu po-
vo, nossa raça estão desempregados”. Em vista da falta de uma organização forte o
suficiente para sustentar uma greve e da fácil disponibilidade de fura-greves, Gar-
vey sugeriu que os trabalhadores retomassem o trabalho enquanto ele negociava
em seu nome.
Durante suas negociações com J. G. Keifer, chefe da United Fruit Company
na Jamaica, Garvey estendeu suas queixas para incluir a condição esfarrapada e
seminua das trabalhadoras no cais, que ele disse ser um tema favorito dos fotógra-
fos turísticos. Keifer ameaçou máquinas que economizavam trabalho e se gabou de
sua habilidade de interromper a greve. O The Daily Gleaner, descrito por Garvey
como "o porta-voz de privilégios especiais e capital de sangue frio na Ilha da Jamai-
ca", encorajou a adoção dos dispositivos sugeridos, fazendo Garvey alertar seu edi-
tor para "manter suas monstruosas 'patas' longe da situação,” para que o homem
preto “não lhe diga pra onde ele deve ir ”, pois estava “sempre pronto para lhe di-
zer sem qualquer hesitação”. 43

A demanda por um salário mínimo foi apresentada no manifesto de 1929 do


Partido Político do Povo de Garvey, e durante sua permanência no Kingston and St.
Andrew Corporation Council, ele regularmente fazia campanha por um dia de tra-
balho de oito horas.44 Desta e de atividades aliadas, incluindo uma delegação ao
governador e uma petição a uma visitante comissão imperial do açúcar,45 surgiu
sua Jamaica Workers and Labourers Association (Associação de Trabalhadores da
Jamaica), conceituada como um órgão que abriria caminho para os sindicatos, em
vez de ser o próprio sindicato.44 O interesse de Garvey no trabalho da Jamaica con-
tinuou após sua saída da Jamaica, e em 1938, ele aprovou a entrada na política do
líder sindical Alexander Bustamante, que durante as três décadas seguintes de-
sempenharia um papel central na vida política da Jamaica.47

A presença onipresente de Garvey, como foi visto, foi sentida em organiza-


ções de trabalhadores em outras partes do mundo, como Trinidad e África do Sul.
Esse envolvimento estendeu-se a outras áreas. Na Guiana Britânica, a UNIA mante-
ve contato próximo com o líder sindical pioneiro Hubert Crichlow e seu Sindicato
da Guiana Britânica.48 Ligações semelhantes entre a UNIA e as lutas dos trabalha-
dores foram relatadas em Barbados49 e nas Ilhas Virgens dos Estados Unidos.50 De
fato, já foi dito por um ativos no movimento que a maioria dos líderes importantes
da classe trabalhadora que emergiram na cena política na década de 1930 nas Ín-
dias Ocidentais foram influenciados pelo envolvimento em maior ou menor grau
no movimento de Garvey.51

Em Garvey, portanto, os comunistas se depararam com um adversário cujo


conhecimento da classe trabalhadora preta, tanto do ponto de vista da UNIA quan-
to do ponto de vista sindical, era muito amplo. E o campo de operações de Garvey
era verdadeiramente tão universal quanto o dos comunistas era internacional. Os
corpos de pensamento representados por Garvey e os comunistas eram engano-
samente semelhantes. Ambos eram, em maior ou menor grau, anti-capitalistas e
anti-imperialistas. Ambos eram anticlericais (Garvey, é claro, sendo ao mesmo
tempo um tanto anticlerical, mas muito pró-religioso). Ambos procuraram se or-
ganizar em torno da grande massa de trabalhadores e camponeses, e ambos (ape-
sar de todas as alegações dos comunistas em contrário) tiveram seu quinhão de
liderança pequeno-burguesa. Na verdade, Garvey tinha melhores alegações de uma
origem humilde do que muitos dos intelectuais comunistas que levianamente o
classificaram como pequeno-burguês. Ambos haviam, pelo menos em 1928, reco-
nhecido, embora em graus variáveis, o caráter nacional das chamadas Questões
Negras. Entre eles, no entanto, estava o vasto abismo da raça. Assim como os co-
munistas, em sua formulação da questão nacional, sentiram a necessidade de cer-
cear sua atitude em torno das exigências assimilacionistas e, assim, se afastar de
um reconhecimento da primazia do fator raça, Garvey, embora reconhecendo o
caráter de classe da sociedade, sempre via-o dentro das restrições do fator raça,
que em sua opinião anulava e transcendia as diferenças de classe. Assim, por mais
próximos que os dois corpos de pensamento possam às vezes parecer estar, a
questão raça / classe apresentava um ponto fundamental de discordância. Essas
semelhanças e diferenças se manifestaram na prática em uma relação intrincada
de hostilidade intercalada com tolerância entre a UNIA e os comunistas, enquanto
os comunistas tentavam conquistar os seguidores de Garvey e a UNIA habilmente
evitava cair nas mãos dos comunistas.

Alguns dos primeiros contatos entre o comunismo e a UNIA ocorreram nas


pessoas dos primeiros membros da UNIA. O primeiro redator editorial (além do
próprio Garvey) do Negro World (Mundo Negro) foi W. A. Domingo, um socialista.
Domingo foi responsável por pelo menos parte da propaganda bolchevique que
apareceu no jornal que alarmou as autoridades em 1919. Ele foi, nas palavras de
Garvey seis anos depois, “demitido de seu emprego como editor de um de meus
jornais por causa de seu perigoso comunismo princípios. " 52 Outro parasita da
UNIA foi Cyril Briggs, que, por meio de sua African Blood Brotherhood -ABB (Ir-
mandade de Sangue Africana), forneceu aos comunistas americanos alguns de seus
primeiros quadros negros. Outro ainda foi Otto Hall. Veterano da Primeira Guerra
Mundial, ele simpatizou com os militantes Industrial Workers of the World (Traba-
lhadores Industriais do Mundo), ingressou na UNIA em Chicago pouco depois do
fim da guerra e tornou-se membro das Universal African Legions (Legiões Univer-
sais Africanas). De lá, ele foi para a ABB e depois seguiu Briggs para o Partido Co-
munista.53
As tentativas comunistas de capturar a UNIA começaram praticamente des-
de o início do movimento comunista nos Estados Unidos. O programa do Partido
Comunista Unido em 1920 exortava os comunistas pretos a entrar em sindicatos,
lojas, clubes e igrejas pretas "para expor os líderes reacionários que, com o propó-
sito de trair sua raça, infestam essas instituições". Os comunistas foram intimados,
por outro lado, a apoiar todas as organizações pretas radicais. 54 A UNIA não foi
especificamente mencionada, mas não poderia deixar de ser considerada em uma
dessas duas categorias. Nos anos subsequentes, pronunciamentos semelhantes
encorajaram a infiltração em organizações pretas. O quarto congresso da Interna-
cional Comunista em Moscou em 1922 pediu apoio a "todas as formas de Movi-
mento Negro que tendem a minar o capitalismo e o imperialismo ou impedir seu
progresso futuro." 55 Na mesma linha, o comitê executivo da Internacional Comu-
nista em 1928 estabeleceu a linha de "táticas de frente única para demandas espe-
cíficas" ao lidar com "organizações pequeno-burguesas negras existentes". O pro-
pósito de tais táticas, foi claramente declarado, deveria ser mobilizar as massas
pretas sob a liderança comunista e expor e minar sua “liderança pequeno-burguesa
traiçoeira”.56

Nem os comunistas relutaram em considerar a utilização de pedaços do


programa e táticas de Garvey. Em 1921, um jornal comunista explicou que “O Ne-
gro tem um grande amor pela exibição, show, pompa, ostentação, bandas de músi-
ca, misticismo, enfeites, botões, frivolidades sociais e exibições militares. (A esse
respeito, é justo dizer que ele não está sozinho.) Essas engenhocas captam sua
imaginação e agem como um incentivo para a organização como nada mais pode
no momento.”57 Este artigo sugeriu que aspirações Afro-americanas como uma
África livre, igualdade racial e similares não devem ser combatidos, mas direciona-
dos para "canais eficazes". No quinto congresso do Comintern em 1924, Israel Am-
ter, um delegado americano, chegou a sugerir ligar a África e a Afro-América envi-
ando panfletos para distribuição por marinheiros com destino à África.58

Uma das primeiras tentativas de se infiltrar na UNIA veio através do uso da


Irmandade de Sangue Africana de Cyril Briggs. Embora essa tentativa tenha falha-
do, Briggs e a Irmandade continuariam a ser uma fonte de assédio para a UNIA até
a morte de Garvey. Briggs organizou a ABB em Nova York em 1919 e se tornou seu
"chefe supremo". Um imigrante de Nevis, nas Índias Ocidentais, ele havia sido edi-
tor do New York Amsterdam News antes de ser demitido pelo nacionalismo mili-
tante expresso em seus editoriais. Durante sua estada no Amsterdam Newshe, ele
brincou com várias soluções nacionalistas para o problema racial, como um estado
separado para os Afro-americanos no Ocidente, ou na África, América do Sul ou nas
Índias Ocidentais. Sua revista Crusader, criada em 1918 após sua expulsão do Ams-
terdam News, proclamou-se originalmente o órgão de publicidade da Liga Hamíti-
ca do Mundo. A ABB se organizou em torno dessa revista e, embora nunca fosse
uma grande organização (três mil membros no auge), estabeleceu filiais em luga-
res como Trinidad, Guiana Inglesa e Santo Domingo, além de várias localidades nos
Estados Unidos. Em 1921, Briggs também reivindicou a afiliação de 153 organiza-
ções, como igrejas, nos Estados Unidos, nas Índias Ocidentais, na África e em ou-
tros lugares. A organização se viu no início como radical, embora não comunista. 59

Talvez no início de 1921, senão antes, Briggs foi abordado por comunistas
americanos que, com isso, conseguiram obter um punhado de recrutas da ABB.
Esses recrutas foram alguns dos primeiros comunistas negros nos Estados Unidos
e continuaram por muito tempo entre os mais proeminentes. Eles incluíam, além
do próprio Briggs, Richard B. Moore, Otto Hall, Lovett Fort-Whiteman e Harry
Haywood. Outro destacado socialista do Harlem dentro da ABB foi o ex-editor do
Negro World W. A.Domingo. Domingo não entrou para o partido comunista. Otto
Huiswoud saiu da festa para se juntar à ABB.60

O quadro da ABB provou ser uma dádiva para os comunistas americanos


numa época em que as potências que estão em Moscou estavam se perguntando
sobre a ausência de representação negra no movimento americano. Em 1922, o
Harlem West Side Branch do partido Workers era dirigido por membros da ABB:
Huiswoud, organizador; Briggs, secretário de registro e financeiro; e pessoas des-
critas como camaradas Moore, Campbell e McKay, membros do comitê de propa-
ganda e educação.61 Em 28 de novembro de 1922, Huiswoud, disfarçado de cama-
rada Billings, estava elogiando a ABB em uma sessão da comissão sobre a Questão
do Negro na quarta Congresso do Comintern. Ele distinguiu a ABB do garveyismo,
em detrimento do último.62 De volta aos Estados Unidos, o Trabalhador Comunista
viu na ABB uma grande ajuda na construção de uma frente unida de trabalhadores
negros e brancos. 63

A primeira tarefa importante para a ABB na construção dessa desejada fren-


te única foi se infiltrar na UNIA. Eles tentaram fazer isso durante a Convenção In-
ternacional de Garvey de 1921. Antes da convenção, possivelmente por razões táti-
cas, Briggs assumira uma posição moderadamente favorável a Garvey. 64 Com a
convenção em andamento, Briggs, em 1S de agosto, enviou uma carta a Garvey.
Assumindo para a ocasião uma atitude de deferência devida, ele se dirigiu a Garvey
como “Sua Excelência, o Presidente Provisório da África”. Ele ofereceu a Garvey
uma proposta que Garvey (com seu movimento de massa internacional, talvez mi-
lhões) deveria entrar em um programa de ação conjunta com a ABB (uma organi-
zação obscura de mil ou dois) para a libertação africana. “Mas pense no que pode-
ríamos ser capazes de fazer pela corrida”, ele bajulou, “por meio da cooperação
consciente se adotássemos um programa que nos representasse em conjunto, sem
qualquer compromisso sério de qualquer um dos lados de pontos ou princípios
táticos importantes”.65 Briggs então aproveitou a oportunidade oferecida pela mul-
tidão reunida de Garvey para fazer um pequeno recrutamento para si mesmo e
distribuir cópias do programa da ABB.

O próximo estratagema na tentativa de Briggs de impor uma frente única


comunista a Garvey foi fazer com que sua amiga comunista branca, Rose Pastor
Stokes, falasse na convenção. Ela discorreu sobre o desejo da Rússia de libertar a
África e sobre a necessidade de unidade da classe trabalhadora preta e branca. Ela
então pediu a Garvey que se posicionasse em relação às suas aberturas comunistas.
Garvey foi educado, mas evasivo. O golpe final na estratégia de Briggs foi fazer com
que os delegados da ABB à convenção apresentassem uma moção para endosso do
programa comunista. A moção foi debatida e apresentada.66 A ABB, irritada com
este revés, então publicou imediatamente um Boletim do Congress Negro em 24 de
agosto, quase inteiramente dedicado a uma deturpação grosseira da convenção da
UNIA. Isso foi levado ao conhecimento da convenção e uma explicação foi solicita-
da aos quatro delegados da ABB. Seus nomes foram chamados, mas não houve res-
posta. Um exame das cartas dos delegados estava para ser feito quando, nas pala-
vras do Mundo Negro, “um homem foi visto se levantando apressadamente e cor-
rendo pelo corredor, mergulhando pela porta, abrindo caminho em um vôo preci-
pitado em direção à Sétima Avenida. A Casa outrora indignada estremeceu de tanto
rir.” Em seguida, foi votado por unanimidade que os cartões dos delegados da ABB
deveriam ser retirados.67 Um jogo de poder tão rude e insultante só poderia ter
sido devido à inépcia política de Briggs ou ao desdém pelo grande conhecimento
de Garvey sobre lutas políticas internas.

Em qualquer caso, Garvey usou o bolchevismo da ABB para justificar seu ca-
so contra eles, embora tenha elogiado Lenin e Trotsky durante a mesma convenção
em um discurso que exortou seus ouvintes a fazerem pela África o que Lenin e
Trotsky fizeram pela Rússia ao derrubar o despotismo czarista.68 Essa distinção
entre Lenin e Trotsky, a quem ele geralmente endossava, e os comunistas america-
nos, que ele evitava, representava a posição normal de Garvey. Algum tempo de-
pois, ele disse: "Eu sou contra o tipo de comunismo que é ensinado na América... Na
América, ele constitui um grupo de mentirosos, conspiradores e enganadores astu-
tos que distorcem um terço da verdade em uma grande mentira, e entregam para o
consumo da clientela precipitada. O comunismo entre Negros em 1920-1921 foi
representado em Nova York por Negros como Cyril Briggs e WA Domingo, e meu
contato e experiência com eles, e seus métodos são suficientes para manter minhas
reservas sobre esse tipo de comunismo pelo equilíbrio da minha vida natural.” 69
Briggs, por sua vez, consolou-se com sua derrota argumentando que Garvey
planejou sua expulsão para impedir que o programa da ABB fosse oficialmente
representado pelos delegados, os quais, disse ele, estavam favoravelmente dispos-
tos a isso.70

Essa reviravolta significava que, se até mesmo o desejo comunista de uma


frente única com a UNIA tivesse falhado, os comunistas teriam a garantia da se-
gunda melhor coisa, a cooperação do que agora eram alguns dos inimigos mais
violentos de Garvey. A rivalidade Briggs-Garvey atingiu o seu estado mais amargo
menos de dois meses após o golpe abortivo da ABB, quando o Negro World publi-
cou um anúncio intitulado “HOMEM BRANCO NEGRO POR CONVENIÊNCIA”. Dizia:
“Um Homem Branco em Nova York com o nome de CYRIL BRIGGS começou a
‘AFRICAN BLOOD BROTHERHOOD’ para capturar negros, sem dúvida. Para ter su-
cesso, ele afirma ser um Negro e continuamente ataca a Universal Negro Improve-
ment Association e seu fundador, Marcus Garvey. Negros, observem e governem-se
de acordo.”71 Por essa indiscrição, Briggs (que era de fato de pele clara) fez com
que Garvey fosse preso e julgado por difamação criminal, e Garvey reagiu mos-
trando a carta de cooperação de Briggs ao juiz.72 Briggs permaneceu impassível
por uma decisão favorável, e o Crusader do mês seguinte foi um verdadeiro especi-
al Garvey. Pelo menos dez dos dezesseis editoriais tratavam de Garvey, assim como
vários outros artigos. Os leitores foram informados de que Garvey havia deixado
sua esposa, que seu pai morrera em uma casa pobre (um ponto que também foi
utilizado por Du Bois e o governo britânico em campanhas anti-Garvey), que uma
carta de Briggs ao Bureau de Navegação recebeu uma resposta sugerindo que não
havia registro de dois navios reivindicados pela Black Star Line e muito mais. Ele
também citou uma declaração de Garvey reconhecendo comentários favoráveis
sobre a UNIA de algumas publicações socialistas europeias para mostrar que Gar-
vey pode ter mudado de ideia desde que repudiava a posição da ABB em se conec-
tar com trabalhadores brancos para a libertação da África. Um editorial chegou a
afirmar que Garvey havia estuprado uma "garotinha branca no escritório de um
amigo" na Inglaterra.73 Por essa última indiscrição, Briggs foi, por sua vez, preso
sob uma acusação de difamação criminal apresentada por Garvey.74

Mais ou menos nessa época, três Garveyistas de alto escalão afastados jun-
taram forças com a ABB. Eles eram Cyril Crichlow, J. D. Gordon, um ex-presidente-
geral assistente, e o bispo McGuire.75 Os dois últimos voltaram para a UNIA. 76 A
presença deles não pareceu ajudar muito a ABB. Em uma reunião da ABB em 1922
em Baltimore, por exemplo, Garveyistas recorreu a uma de suas táticas favoritas
contra reuniões inimigas. Eles lotaram a reunião com membros da UNIA. Eles ouvi-
ram um pouco o palestrante, mas assim que ele atacou a UNIA, foi recebido com o
conselho: “Pare aí, irmão; você não diz mais nada." A polícia foi chamada, mas co-
mo o ambiente estava tranquilo, eles foram embora. Os Garveyistas então a trans-
formaram em uma reunião da UNIA.77

Em 1923, Garvey acusou a ABB de estar implicada na operação policial con-


tra a UNIA em Nova Orleans.78 No entanto, em 1924 Briggs agiu como agente da
Cruz Negra de Navegação e Comércio de Garvey, ajudando-a a obter um navio.
Garvey mais tarde atacou um de seus próprios subordinados, William L. Sherrill,
por ter sido o responsável por isso.79

O relacionamento de Briggs com Garvey deu outra reviravolta estranha


quando, em 1926, Briggs escreveu uma carta para o Negro World. Esta carta afir-
mava que Briggs não era amigo de Garvey e o atacava com frequência. Mesmo as-
sim, ele ainda tinha uma carta de Garvey agradecendo por apoiar a Primeira Con-
venção Internacional. Ele também indicou que ele e os membros da ABB W. A.
Domingo e Richard B. Moore haviam atacado a campanha “Marcus Garvey Must
Go” de Chandler Owen e seus associados. Briggs até expressou simpatia por Gar-
vey, agora que vira, disse ele, a ajuda incompetente que Garvey tinha no gerencia-
mento de sua mais recente linha de navios a vapor. O ponto principal da carta pa-
recia estar contido na afirmação de Briggs de que "para mim, é evidente que a
UNIA logo estará em ruínas, a menos que alguma mudança drástica de controle e
política possa ser efetuada rapidamente. E eu acredito que seria um grande desas-
tre para a raça se a UNIA se desintegrasse.” 80 [Grifo meu.] Esta carta foi publicada
apenas duas semanas após o ataque de Garvey a Sherrill por empregar Briggs e foi
provavelmente mais uma tentativa comunista na cooptação da UNIA. O interesse
de Briggs na UNIA seguiu Garvey à Jamaica e incluiu ligações para Garveyistas para
se juntarem à comunista Liga de Luta pelos Direitos dos Negros.81

Em 1931, Briggs publicou uma longa análise do movimento Garvey. Garvey


foi retratado como o bicho-papão pequeno-burguês de sempre que desviava o sen-
timento nacionalista negro revolucionário para canais "utópicos, reacionários de
‘De Volta à África’”. A liderança da UNIA, escreveu ele, "consistia no estrato mais
pobre de Negros, elementos intelectualmente desclassificados, pregadores, empre-
sários em dificuldades, advogados sem currículo, etc. que ficavam mais ou menos
próximos das massas Negras e sentiam nitidamente o efeitos da crise.” A inegável
massa de seguidores construída por Garvey foi contrastada com “o pequeno prole-
tariado industrial avançado, que tinha experiência na luta de classes” (presumi-
velmente a ABB), para quem a UNIA tinha pouco apelo. Briggs também apresentou
aqui o que se tornou uma espécie de argumento comunista padrão, ou seja, que
Garvey havia sido progressista e disposto a lutar nos Estados Unidos no início, mas
que após sua exclusão dos Estados Unidos em 1921 ele se assustou e se tornou
parte em uma abjeta capitulação aos imperialistas. Ao concluir, ele reconheceu
“certas conquistas progressistas” da UNIA, sendo uma delas o fato de que “sem dú-
vida ajudou a cristalizar as aspirações nacionais das massas Negras”.82

Pouco depois, o Negro World zombou da posição recém-descoberta dos co-


munistas sobre a questão nacional, sugerindo que, ao adotar essa posição, Briggs
estava de fato pregando o Garveyismo. Briggs negou veementemente, alegando,
entre outras coisas, que a "igualdade incondicional do povo Negro" era estranha ao
Garveyismo.83

Briggs repetiu muitas de suas antigas acusações contra Garvey em 1932. 84


Garvey respondeu imediatamente a partir das páginas de seu New Jamaican, que
editorializou: “Como de costume, fomos ridicularizados pelo órgão oficial The Ne-
gro Worker do Comitê Sindical Internacional de Trabalhadores Negros. Em sua
edição de agosto, eles publicaram um artigo, sob o nome de Cyril Briggs, com a le-
genda, 'Como Garvey traiu os Negros'. ”O editorial continuou:“ Briggs tem sido um
oponente obstinado de nosso método racional de solução do problema do Negro
na América. Ele e outros sempre tentaram nos amarrar ao comunismo.”85 O anta-
gonismo de Briggs permaneceu desenfreado em face da morte de Garvey. Um obi-
tuário prematuro com a legenda "Marcus Garvey morre em Londres", publicado
pela Crusader News Agency de Briggs, anunciou, de forma tipicamente distorcida,
que "durante sua estada na Jamaica, ele fez as pazes com os imperialistas britâni-
cos e se juntou a empregadores brancos em seus ataques a sindicatos jamaica-
nos.”86 Este obituário foi baseado em informações erradas sobre a morte de Gar-
vey. Garvey morreu de fato no mês seguinte.

O padrão de hostilidade intercalado com gestos aparentemente amigáveis


exibidos pela ABB em seu relacionamento com Garvey era típico dos comunistas
em geral, e particularmente daqueles nos Estados Unidos. Ele era frequentemente
descrito como um "charlatão". Mas talvez o termo de abuso mais frequente usado
para descrever Garvey tenha sido o termo “sionista”. Claude McKay havia descrito
Garvey como “sionista” em uma entrevista publicada no Izvestia russo em 1922. 87
O trotskista C. L. R. James na década de 1930 considerou o programa de Garvey
"essencialmente de volta à África" e, portanto, "uma porcaria lamentável".88 Vários
outros disseram basicamente a mesma coisa. O argumento mais convincente con-
tra essa acusação de “sionismo Negro” veio - é estranho dizer - da caneta de outro
comunista, Robert Minor. Minor, cobrindo a Convenção Internacional de Garvey de
1924 para o comunista Daily Worker, relatou um discurso no qual o presidente
assistente geral William Sherrill defendeu a autonomia do homem Negro na África.
Neste ponto, disse Minor, um repórter de "um jornal sionista hebreu" sussurrou do
outro lado da mesa da imprensa, 'este é o sionismo Negro”. Minor considerou isso,
"apesar de toda a semelhança superficial, a mais louca tolice." Ele considerou os
dois diferentes por vários motivos:
1. As Grandes Potências e a Liga das Nações podem com muita ale-
gria dar a alguns milhares de judeus a chance de se estabelecerem na Pales-
tina.

2. Os grandes governos imperialistas do mundo podem sorrir ale-


gremente sobre a propaganda nacionalista judaica que tira a mente dos tra-
balhadores judeus da revolução proletária.

Mas:

1. As grandes potências, Grã-Bretanha, França, Bélgica e agora os Es-


tados Unidos - não podem sorrir diante de qualquer sugestão de render a
Rodésia e o Rand, Camarões, o Congo e o Nilo e o Marrocos e Tunisia e Algé-
ria - a qualquer movimento de nacionalismo Negro independente, não im-
porta o quão fantásticas as túnicas vermelhas e verdes de Garvey possam
ser, nem quão impróprios para navegar seus navios.

2. As Grandes Potências não podem tolerar nem por um instante a


propaganda do nacionalismo Negro independente em qualquer parte da
África - nem mesmo nos estados Negros da Abissínia e Libéria, especialmen-
te não na forma “fanática” em que sozinho este movimento se encontra.

3. Não, o movimento nacionalista Negro pode ser mais facilmente


comparado ao nacionalismo turco dos últimos anos do que ao sionismo ju-
deu.89

Os comunistas atacaram Garvey em muitos outros pontos. Esses ataques


eram tipicamente caracterizados por mentiras e distorções e muitas vezes reduzi-
ram Garvey a algum tipo de ferramenta do imperialismo. Um artigo de 1921 no
The Communist foi típico. Afirmava que "os reis das finanças têm grande estima
pelo Sr. Garvey pelo trabalho que ele fez para manter a mente do Negro longe dos
problemas reais diante dele e ocupá-lo com tolices como títulos de cavaleiro e
pompas".90 Ataques comunistas também foram muitas vezes oportunistas ao ponto
de chegarem a acusar Garvey de falta de solidariedade racial por não apoiar candi-
datos comunistas Pretos na época das eleições.91

No entanto, o elogio dos círculos comunistas, embora muitas vezes parte de


uma manobra barata para amaciar Garvey à complacência, às vezes era baseado
em uma avaliação das implicações anti-imperialistas das ideias e carreira de Gar-
vey. Este foi possivelmente o motivo de uma declaração emitida em 1925 pelo Pra-
esidium do Conselho Internacional de Camponeses (Krestintem) em Moscou ex-
pressando solidariedade a Garvey após sua prisão nos Estados Unidos. A declara-
ção dizia em parte, 'Os capitalistas perceberam que o movimento liderado por Gar-
vey, o movimento pela independência do Negro, mesmo sob o modesto slogan de
'De volta à África' continha o embrião do futuro movimento revolucionário que, em
aliança com os trabalhadores e camponeses, vai ameaçar o reinado do capital. ” Ele
descreveu o julgamento de Garvey como "uma orgia de capitalismo vingativo". 92

Uma das tentativas mais interessantes de uma objetiva, e às vezes até mes-
mo uma favorável análise comunista do movimento de Garvey, veio na cobertura
de Robert Minor da convenção de Garvey de 1924 para o Daily Worker. A conven-
ção foi a ocasião para uma grande tentativa comunista de sufocar Garvey com ofer-
tas de amizade, e os artigos de Minor devem ser vistos sob esta luz. Antes de 1924,
o Daily Worker e seus predecessores (The Worker, The Toiler e The Ohio Socialist)
eram amplamente desprovidos de qualquer referência à questão racial. A partir do
início de 1924, entretanto, um programa de ampla cobertura de assuntos raciais foi
lançado. Essa cobertura foi orquestrada para fornecer um papel de apoio a um es-
forço igualmente intenso do Partido dos Trabalhadores daquele ano para “minar
por dentro” as principais organizações pretas.

O ano começou com uma série de artigos sobre a questão racial de Lovett
Fort-Whiteman, comunista e membro da ABB. Em fevereiro, o jornal anunciou que
a ABB e o partido dos Trabalhadores compareceriam ao iminente Sinédrio em Chi-
cago. O Sinédrio, organizado por Kelly Miller, era uma convenção preta da qual
participaram mais de cinquenta grupos raciais. A abertura da conferência foi sau-
dada em 11 de fevereiro por um artigo laudatório de Fort-Whiteman, que anunciou
que os dois delegados da ABB trabalhariam em estreita colaboração com os cinco
do Partido dos Trabalhadores (dos quais Fort-Whiteman era um), uma vez que
ambas as organizações eram "totalmente conscientes de classe . ” Ele enfaticamen-
te observou que a UNIA seria um ausente conspícuo da conferência, sem dúvida
porque o Sinédrio estava "preocupado principalmente em ganhar direitos para os
Negros onde eles vivem", enquanto a UNIA estava supostamente preocupada prin-
cipalmente com um retorno à África. 93 Uma semana mais tarde, após ter aparen-
temente saído um pouco menos do que vitorioso de vários confrontos com os or-
ganizadores do Sinédrio, o Daily Worker expressou total desencanto com Kelly
Miller e os “Negros capitalistas” que ajudaram a administrar o caso. Tão grande foi
o seu desencanto que agora concordaram a contragosto com a decisão de Garvey
de permanecer à margem da convenção. O jornal lamentou: “A esperança dos tra-
balhadores Negros oprimidos não reside no atual conjunto de líderes Negros. Mar-
cus Garvey diz que eles são muito velhos. Os trabalhadores dizem que são burgue-
ses demais.”94 No entanto, a real intenção dos comunistas, aqui, e mais tarde na
convenção da UNIA, foi revelada cerca de quatro meses depois no quinto congresso
do Comintern em Moscou, onde um delegado americano se gabou disso, apesar da
dominação desta assembléia por tipos eclesiásticos e pequeno-burgueses, os co-
munistas "tiveram sucesso nos últimos dois dias do congresso em provocar uma
divisão".95 O próximo ensaio geral para a convenção da UNIA veio em julho, quan-
do Minor, redator e cartunista para o artigo, cobriu a conferência da NAACP na Fi-
ladélfia. Então, em 28 de julho, o jornal notou a próxima reunião pré-convenção da
UNIA de Chicago em um item excepcionalmente livre de retórica anti-UNIA.

As ofertas pré-convenção para Garvey continuaram em 29 de julho com


uma reversão notável da distorção comunista tradicional do programa de Garvey.
Um artigo de primeira página observou que, “Embora o programa final da organi-
zação de Garvey exija o estabelecimento de uma Nação Negra na África, com a mi-
gração gradual dos Negros para aquele país, a convenção percebe a necessidade de
lidar com a condição americana até que seus ideais finais sejam realizados.” A
mesma questão afirmava, em linguagem muito explícita, o respeito que a poderosa
posição de Garvey impelia, até mesmo em seus oponentes. “Garvey”, declarou,
“embora sua organização declare por uma Nação Negra independente, conseguiu
reunir quase meio milhão de Negros no maior movimento de massa que os Negros
americanos já tiveram. A Associação Universal Para o Progresso do Negro deve,
portanto, ser reconhecida como uma força nos problemas que confrontam o Negro
como parte da sociedade americana.”96 Um editorial de 29 de julho, embora rever-
tendo à fraseologia normal do “utopismo que caracteriza os projetos fantásticos de
reivindicar a África como o lar da raça Negra”, no entanto, relegou isso ao status de
um “fenômeno superficial” do Garveyismo. "O verdadeiro conteúdo social do mo-
vimento", afirmou, "é o despertar de milhões de trabalhadores explorados para o
fato de sua exploração, de sua sujeição, social e econômica, por forças sinistras que
governam a sociedade." O editorial, ao mesmo tempo que defendia a primazia e o
triunfo final da luta de classes para os trabalhadores Negros, ainda assim chegou a
reconhecer como “inevitável” a “tendência racial, e não de classe” induzida pela
opressão peculiar dos Afro-americanos.

A construção da pré-convenção continuou com a aprovação cautelosa em 30


de julho de um discurso de Garvey denunciando o imperialismo dos Estados Uni-
dos no Brasil e no Haiti. Ainda outro editorial nesta edição considerou o programa
Africano de Garvey "uma curiosa mistura de erro e intuição", uma reviravolta par-
cial do editorial de apenas um dia antes. Em 31 de julho, no último artigo da massi-
va construção pré-convenção, foi relatada uma reunião em massa da UNIA em Chi-
cago. Duas mil pessoas haviam se reunido em uma reunião de despedida dos dele-
gados de Chicago à Convenção Internacional dos Povos Negros do Mundo de 1924.
J. J. Peters, presidente da divisão de Chicago no. 23, foi citado como dizendo: "Meus
amigos brancos comunistas que estão sentados à minha esquerda discordam do
Nacionalismo de nossa associação". Ele continuou, “Eu argumentei esse ponto com
eles por vários anos, freqüentemente chegando a pontos de vista teóricos com eles;
mas ainda somos os melhores amigos.”

Os primeiros relatórios da convenção de Garvey de agosto foram de um cor-


respondente especial, mas em 5 de agosto o Daily Worker anunciou que Minor ha-
via partido para Nova York para cobrir o resto dos procedimentos. Seus artigos
foram claramente projetados para liderar o esforço do partido dos trabalhadores
para influenciar a convenção de Garvey, pois os leitores foram convidados a circu-
lar os artigos da próxima convenção do Minor entre os trabalhadores negros, bem
como a edição de 5 de agosto, que continha a saudação do partido dos trabalhado-
res “À Quarta Convenção Internacional da Reunião da Associação Universal Para o
Progresso do Negro no Liberty Hall, Nova York, agosto de 1924.” “Seu valor depen-
de de uma ampla distribuição”, os leitores foram instados, “Cumpra seu dever co-
munista”.

A esta altura, a atenção dada pelo Daily Worker (e, portanto, pelo Partido
dos Trabalhadores) à convenção de Garvey já havia excedido em muito a dada ao
Sinédrio de Kelly Miller e à conferência da NAACP na Filadélfia. O preâmbulo da
primeira página da saudação oficial dizia: “Percebendo que a única esperança de
emancipação dos trabalhadores de cor e brancos é a solidariedade universal do
trabalho, o Partido dos Trabalhadores envia suas saudações ardentes aos repre-
sentantes da oprimida Raça Negra que estão reunidos no Liberty Hall, Nova York,
sob a bandeira da Associação Universal Para o Progresso do Negro.”

A declaração foi assinada em nome do Partido dos Trabalhadores da Améri-


ca por William Z. Foster, presidente nacional, e C. E. Ruthenberg, secretário execu-
tivo nacional. Foi bem longa. Começou expressando a esperança de que “esta con-
venção histórica” seja “fecunda para a libertação de sua raça”. A UNIA foi lembrada
de que o lucro capitalista é a base de toda opressão colonial e doméstica. Os tem-
pos foram caracterizados como difíceis para o imperialismo. A queda do antigo
regime na Rússia foi vista como um sintoma disso. Garveyistas foram informados
de que essas lutas se espalhariam para as colônias e que a oportunidade da África
estava se aproximando. Até agora, a declaração revelou uma característica comum
dos inimigos e rivais de Garvey, ou seja, uma relutância teimosa em reconhecer (ou
uma falta de conhecimento) da realidade das realizações de Garvey. Enquanto em
1919, dois anos antes da fundação do Partido dos Trabalhadores, Garveyistas esti-
veram na vanguarda das principais lutas anticoloniais em lugares como Honduras
britânicas, Trinidade e África do Sul, aqui estava o partido em 1924 informando
Garvey que tal fermentação era iminente. Da mesma forma, Garvey dificilmente
precisava que o Partido dos Trabalhadores lhe dissesse que a oportunidade da
África estava se aproximando em um momento em que ele já havia gasto muitos
anos e muito dinheiro e energia tentando aproveitar essa oportunidade.

A declaração então aconselhou Garvey a lutar contra os imperialistas na


África sem sacrificar direitos nos Estados Unidos e concordou com uma proposta
de convenção para material educacional independente para os pretos. O Negro
Political Union de Garvey, a agência que coordenaria a excursão da UNIA à política
interna, foi entusiasticamente apoiado, assim como sua solidariedade com o Ter-
ceiro Mundo, que também antecedeu a formação do Partido dos Trabalhadores.
“Sua solidariedade militante com os povos coloniais oprimidos internacionalmente
é uma honra para sua organização”, diz o comunicado. O Partido dos Trabalhado-
res também elogiou a composição de classe da UNIA e sua defesa junto aos pretos
de não lutar em futuras guerras imperialistas. A intenção da convenção de fazer
petições a presidentes, reis e semelhantes de países imperialistas foi considerada
uma perda de tempo, assim como a intenção de fazer uma petição à Liga das Na-
ções. Garvey foi informado de que a Internacional Comunista era um órgão muito
mais valioso para apelar do que a liga. Na Internacional Comunista, a UNIA seria
"convidado de honra". Além disso, os comunistas eram inimigos dos inimigos de
Garvey e, portanto, deveriam ser seus amigos. Partidos comunistas, assim como a
UNIA, estavam em todos os países organizados contra as classes dominantes e con-
tra o colonialismo. E havia o exemplo da Rússia, que havia libertado suas naciona-
lidades subordinadas.

A declaração continuou sua avaliação sistemática do desempenho anterior


de Garvey e do programa da convenção. Desaprovou a intenção da convenção de
discutir uma solução para o problema de raça no sul “para a satisfação de todos os
interessados”, alegando que todos os interessados não poderiam ser satisfeitos.
(Garvey, é claro, veria a separação das raças como uma solução mutuamente acei-
tável). Sobre a denúncia de Garvey de discriminação nos sindicatos trabalhistas
americanos, a declaração foi especialmente entusiástica e lançou-lhe um convite à
luta conjunta - “Nós gostaríamos especialmente de coordenar nossos esforços com
os seus em uma ação para abrir as portas de todos os sindicatos (ou daqueles que
agora discriminam) para a admissão plena e igual de trabalhadores negros.” Ele
reconheceu que isso exigiria reeducar os trabalhadores brancos. Finalmente, as
denúncias de Garvey de pregadores e missionários como agentes capitalistas fo-
ram usadas para expressar desejos de que a convenção saísse da religião para "um
tema mais científico, moderno [sic].97

Na própria convenção, Minor entrevistou Garvey, deu descrições vívidas da


pompa e cerimônia e da "música de qualidade excepcionalmente boa", culpou o
Partido Republicano pela prisão de Garvey durante a convenção e ficou intrigado
com o que lhe pareceu paradoxos na inerente postura anticlerical de Garvey vs sua
religiosidade, seu anti-imperialismo vs sua relutância em denunciar incondicio-
nalmente a Ku Klux Klan.98

Esta ofensiva de agosto, com toda a sua preparação óbvia e sua grande esca-
la, não foi isenta de erros estúpidos da magnitude da ofensiva de 1921 da ABB. O
teor favorável dos artigos de Minor de Nova York era, de tempos em tempos, con-
trabalançado por editoriais da sede de Chicago, que eram hostis o suficiente para
fazer qualquer leitor inteligente se espantar com a sinceridade da recém-
descoberta simpatia para com a UNIA. Em 8 de agosto, por exemplo, na mesma
edição com a efusiva história de uma mulher preta espiando por cima do ombro de
um leitor do Daily Worker em um bonde e sendo conquistada como leitora do jor-
nal, apareceu um artigo com a legenda "Daily Worker busca conquistar os seguido-
res de Marcus Garvey para o programa comunista.” O item consistia em uma carta
de um Israel Zimmerman expressando choque com a atitude amigável do jornal em
relação a Garvey, meros de dois anos após os camaradas Briggs, Owen e Randolph
terem feito campanha contra ele. À demanda de Zimmerman por uma explicação, o
jornal explicou: "não mudamos nossa atitude fundamental em relação a Marcus
Garvey. Hoje somos mais contra seus esquemas por uma terra prometida para o
Negro na África. Não apenas não endossamos, mas repudiamos totalmente todos
os esquemas como a "Black Star Line" de Garvey como meio de libertar as massas
Negras oprimidas e exploradas.” A única razão para seu novo espírito de coopera-
ção com a UNIA, explicou o jornal, era conquistar os seguidores de Garvey para
uma liderança "viril e consciente de classe" (isto é, Partido dos Trabalhadores).
Assim foram repetidos os erros da ofensiva da ABB de 1921. Mais uma vez, os co-
munistas tentaram conquistar a amizade de Garvey, roubar seus seguidores e in-
sultar sua inteligência, tudo ao mesmo tempo.

É difícil conceber como o Partido dos Trabalhadores esperava atingir seus


objetivos após este artigo, mas a tentativa continuou. Minor, obviamente impressi-
onado com o espetáculo e a indicação de poder que era uma convenção da UNIA,
foi levado a grandes feitos de expressão lírica. Ele escreveu, ouvi Garvey falar on-
tem à noite. Ele é uma das pessoas mais poderosas, alíticas, que já vi na plataforma.
Ele é um dos raros erros de digitação que a história encontra surgindo em cada
período instável para expressar novas correntes entre as massas dos homens. Para
a felicidade ou a desgraça, Garvey é feito de que os líderes (ou enganadores muito
poderosos) são feitos. Não o tipo de líder que se levanta em tempos de silêncio e se
ajusta ao seu ambiente 1 como uma modelo se encaixa nos vestidos do dia, mas o
tipo de líder] que se levanta em tempos de tempestade e estresse, que não se ajusta
ao seu ambiente que parece e sentir e agir fora do lugar na ordem do dia - aqueles
que são chamados de rudes, que são zombados como desajustados e, ainda assim,
que podem formar as cabeças dos aríetes que destroem as paredes de seu ambien-
te.
Não posso garantir a integridade de Marcus Garvey. Mas eu sei que o
pior grupo de canalhas que eu conheço na terra odeia Garvey.99

O partido dos Trabalhadores, talvez desejando criar uma divisão na conven-


ção da UNIA, como se gabava de fazer no Sinédrio, mudou após duas semanas para
a tática de intervenção direta nas deliberações do Liberty Hall. O Daily Worker em
14 de agosto publicou uma nova declaração oficial do Partido dos Trabalhadores
para a convenção. Para este ataque, os comunistas utilizaram a resolução da con-
venção sobre a Ku Klux Klan, que considerava a atitude da Klan para com os pretos
"bastante representativa" dos sentimentos brancos em geral, e que apontava que
as supostas atrocidades da Klan não eram muito significativas quando comparadas
com os ultrajes perpetrados por trabalhadores brancos no Norte. A declaração
buscava estabelecer as credenciais dos comunistas, por assim dizer, citando uma
resolução do quarto congresso do Comintern de 1922, elogiando as lutas dos tra-
balhadores pretos. Garvey também foi assegurado de que os comunistas "estão
engajados não menos do que você na luta contra o imperialismo que está escravi-
zando a África". Eles, portanto, lamentaram a resolução da convenção da Klan, que
interpretaram como uma recusa em lutar pela igualdade nos Estados Unidos.

Esta comunicação do Partido dos Trabalhadores foi devidamente debatida


pela convenção e forneceu um bom exemplo da forma como Garvey lidou com o
desafio comunista americano. Garvey abriu a discussão lembrando aos delegados
que a UNIA era uma organização muito liberal. Em uma convenção anterior, ele
disse, eles haviam permitido que Rose Pastor Stokes tentasse doutrinar a organi-
zação e agora eles iriam dar uma audiência ao Partido dos Trabalhadores. A uma
moção pedindo que a declaração do Partido dos Trabalhadores fosse apresentada,
Garvey se opôs, dizendo que era uma questão importante e deveria ser respondida
com o mesmo espírito de amizade que foi proferida. Se os comunistas estavam tão
desejosos de lutar contra a Klan, Garvey argumentou, que levem sua proposta para
o judeu e o católico, os quais estavam em uma posição econômica muito mais forte
do que o homem preto e não dependiam dos tipos da Klan para emprego. “Acho
que está tudo bem deixar os grupos brancos lutarem entre si”, disse ele. “Quanto
mais bandidos caem, mais as outras pessoas podem receber suas dívidas. E, por-
tanto, eu aconselharia o partido dos trabalhadores a enviar seu comunicado aos
judeus e católicos, e os aconselharia a lutar, e lutar, e lutar ”. 100 Delegados do par-
tido dos trabalhadores que compareceram à convenção e participaram de suas
deliberações não estiveram presentes, por alguma razão inexplicada, nesta sessão.
À medida que a convenção avançava, Minor considerava que Garvey poderia
se destruir na questão da Klan, mas que a organização continuaria com outros líde-
res.102 E no final do mês um editorial criticou a imprensa branca por dar muita co-
bertura à pequena reunião da National Negro Business League, enquanto ignorava
a convenção massiva de Garvey. No mesmo editorial, o esforço comunista em
grande escala durante a convenção de Garvey foi reconhecido e explicado assim:
“Nas sessões da Associação Universal Para o Progresso do Negro há ainda mais
elementos da classe trabalhadora representados do que no Sinédrio e uma tentati-
va ainda mais forte foi feita pelos comunistas para unificar as lutas dos trabalhado-
res explorados, independentemente de sua cor.”103
A atitude de Garvey em relação ao comunismo era complexa. Embora resis-
tindo aos avanços grosseiros da ABB e do Partido dos Trabalhadores, seus escritos
e discursos são frequentemente intercalados com referências não hostis e até favo-
ráveis ao comunismo. Suas publicações frequentemente traziam notícias de natu-
reza anti-imperialista de fontes comunistas. Mesmo fontes ativamente hostis a
Garvey, como Cyril Briggs ’Crusader News Service e o Negro Worker, foram utili-
zadas para itens de notícias. Os colunistas do Negro World também escreveram
ocasionalmente sobre o comunismo.

As ambigüidades de Garvey em relação ao comunismo podem ser parcial-


mente explicadas, como já observado, pelo fato de que ele normalmente distinguia
entre o comunismo na Rússia, especialmente sob Lenin, e o comunismo na Améri-
ca. Ele foi citado uma vez como sugerindo um pacto com Lenin e Trotsky para to-
mar a África durante um discurso no Liberty Hall em agosto de 1920. 104 Em 1922,
ele se referiu ao experimento em "social-democracia" na Rússia como aquele que
provavelmente provaria "uma dádiva e uma bênção para humanidade." 105 Mas a
apreciação mais extensa de Garvey da experiência revolucionária na Rússia veio
em 1924, apenas sete meses antes da ofensiva do Partido dos Trabalhadores. A
proximidade desses dois eventos destaca as diferentes atitudes de Garvey em rela-
ção aos dois comunismos. A ocasião foi a morte de Lenin em Janeiro de 1924. A
primeira resposta de Garvey foi um telegrama para o Congresso Soviético que dizia
em parte: "para nós, Lenin foi um dos maiores benfeitores do mundo. Vida longa ao
governo soviético da Rússia".106 Isso foi seguido por um longo discurso no Liberty
Hall intitulado "A passagem do Grande Homem da Rússia", no qual ele chamou Lê-
nin de "provavelmente o maior homem do mundo entre 1917 e 1924, quando deu
seu último suspiro." Ele expressou também a opinião de que o mundo inteiro esta-
va destinado, em última instância, a assumir a forma de governo da Rússia. Ele
presumiu que a mensagem de condolências da UNIA seria tratada com respeito,
embora "infelizmente, ainda não tenhamos enviado um embaixador à Rússia". Ele
explicou que Lenin representava a classe que compreendia a maioria da humani-
dade. Ele continuou,

Portanto, Lenin se destaca mais do que todos porque foi o represen-


tante de um número maior de pessoas. Não apenas o campesinato da Rússia
lamenta por Lenin nesta hora, mas o campesinato de toda a Europa, o cam-
pesinato de todo o mundo lamenta por Lenin, porque ele era seu líder. E nós
também, como Negros, lamentamos por Lenin. Não um, mas os quatrocen-
tos milhões de nós devemos lamentar a morte deste grande homem, porque
a Rússia prometeu grande esperança não apenas aos Negros, mas aos povos
mais fracos do mundo. A Rússia, por meio de seu sistema social-democrata,
prometeu uma revolução ao mundo que realmente emanciparia as almas
dos homens em todos os lugares. Os Negros ainda não perceberam o efeito
de certas mudanças mundiais. Nós, da Associação Universal Para o Progres-
so do Negro, que lideramos, estudamos cuidadosa e intensamente as ativi-
dades de Lenin e Trotsky. Nunca antes nos comprometemos com qualquer
opinião pública no que toca o sistema de governo agora existente na Rússia,
porque não o considerávamos sábio. O governo soviético social-democrata
da Rússia ainda não é reconhecido por todos os outros governos do mundo.
Apenas alguns governos reconhecidos reconheceram a Rússia. Os governos
da classe capitalista, os governos da classe privilegiada recusaram-se a re-
conhecer a Rússia como governo. Eles ainda estão buscando e esperando
que outra revolução seja decretada na Rússia que tire o poder e o controle
do governo das mãos do campesinato e os devolva às mãos da classe privi-
legiada. Naquela hora, todos os outros governos que ainda não reconhecem
a Rússia reconhecerão seu governo. Mas nós, da Associação Universal Para o
Progresso do Negro, como eu disse, tínhamos nossa própria opinião e nossa
própria ideia a respeito do novo governo da Rússia. E é sem qualquer hesi-
tação, sem qualquer reserva, não poderíamos deixar de favorecer a existên-
cia de um governo social-democrata na Rússia ou em qualquer outra parte
do mundo, porque somos da classe que governa na Rússia e, naturalmente,
nossa simpatia deveria ser com as pessoas que sentem conosco, que sofrem
conosco.107

Foi em parte por sentimentos como esses que os governos europeus, norte-
americanos e latino-americanos muitas vezes consideraram Garvey comunista. O
fato de que este foi um período em que o radicalismo era frequentemente equipa-
rado ao bolchevismo nas mentes oficiais sem dúvida exagerava essa tendência. E
Garvey, é claro, não detestava se proclamar um radical - “Eles falam sobre Garvey
ser radical”, disse ele em uma ocasião. “Como pode um Negro ser conservador? O
que ele tem para conservar? O que você tem senão dor, sofrimento e privação? É
hora do negro ser radical e deixar o mundo saber o que ele quer.” 108 Assim, ele po-
deria ser descrito pelas autoridades britânicas como apoiado pelos Trabalhadores
Industriais do Mundo, por um governador provincial da Costa Rica como bolchevi-
que, por J. Edgar Hoover como pró-bolchevique, pelos imperialistas belgas como
tendo conexões bolcheviques, e por um funcionário dos Estados Unidos como pre-
sidente de um partido comunista.109 Em 1932, porém, o Ministério do Interior bri-
tânico finalmente descobriu que “as informações disponíveis mostram que a orga-
nização de Marcus Garvey é considerada por Moscou como 'burguesa'." 110

A atitude de Garvey em relação aos comunistas americanos pode ter sido in-
fluenciada pelo chauvinismo branco que existia em suas fileiras. Claude McKay
acusou os comunistas americanos brancos de racismo no quarto congresso do Co-
mintern.111 Acusações semelhantes foram feitas durante o sexto congresso em
1928 e foram reconhecidas pelos mais altos círculos do Comintern, na pessoa de
Nikolai Bukharin, que advertiu seus camaradas “a aderir na esfera dada a uma li-
nha correta, combatendo impiedosamente a mais leve manifestação de 'chauvi-
nismo racial'”.11S Garvey permaneceu convencido, entretanto, de que em um lugar
como a América, “o reinado do comunismo executivo não seria uma melhoria em
relação ao reinado da democracia executiva”.113

A hostilidade de Garvey ao comunismo americano também foi condicionada


por sua recusa obstinada em ter sua organização cooptada por qualquer pessoa,
seja da direita ou da esquerda. Escrevendo em 1932, Garvey relembrou as repeti-
das tentativas dos comunistas de tomar sua organização. Ele disse,

Os comunistas têm sido nossos maiores adversários nos últimos dez


anos. Eles nos prejudicaram muito nos Estados Unidos. Fizeram várias ten-
tativas de operar uma organização de quatro milhões de Negros, da qual
éramos cabeças, e quando os detivemos e resistimos obstinadamente a to-
dos eles, eles iniciaram uma propaganda vil e perversa contra nós nos cha-
mando de capitalistas, burgueses, oportunistas e Tio Toms.114

Garvey tinha certeza de que nos Estados Unidos os comunistas simplesmen-


te "usariam o voto e os números físicos do Negro" para elevar a posição de sua
própria espécie. O homem preto então descobriria que a raça ainda estaria no po-
der, "não apenas como comunistas, mas como homens brancos".115 Esse tipo de
pensamento levou o editor do Negro World, HG Mudgal, em 1932, a zombar da es-
colha do preto James W. Ford como candidato comunista a vice-presidente dos
Estados Unidos. Ele argumentou que Ford foi escolhido porque os comunistas sa-
biam que não tinham chance de vencer.116 As suspeitas de Garvey sobre a duplici-
dade comunista tiveram uma corroboração possível incomum em um relatório da
inteligência militar britânica de 1920. A comunicação, originada em Nova York,
lidava com propaganda radical entre pretos e concluíam que os pretos estavam
“sendo usados para servir aos fins ulteriores dos vermelhos” e deveriam ser des-
cartados. A evidência para esta afirmação foi fornecida por circulares supostamen-
te "enviadas para ‘Distribuidores de literatura I. W. W.’" e obtidas de uma "fonte
confiável" não identificada. As circulares continham as seguintes informações:

É desejada atividade extra para alcançar os negros. Não o queremos


na organização exatamente, mas queremos que ele ajude a começar uma
agitação e desordem geral. O negro está ascendendo rapidamente a uma po-
sição elevada em termos de cidadania e posição social útil. Precisamos que-
brar isso. Se pudermos dissociá-lo de sua tendência atual para o que eles
chamam de boa cidadania e obter capital para ele, podemos retirá-lo da as-
sociação mais tarde.117

O atrito entre Garveyites e comunistas continuou após a prisão e deporta-


ção de Garvey. Apesar de sua ausência, ele deixou para trás uma firme influência
ideológica sobre as massas de pretos na América. Cyril Briggs admitiu esse fato em
1931 quando escreveu que “o movimento Garvey, embora em declínio e à beira do
colapso, ainda representa uma força reacionária muito perigosa, exercendo consi-
derável influência ideológica sobre grandes massas de Negros”.118
Mesmo neste período, as táticas comunistas eram caracterizadas pela mes-
ma combinação de hostilidade aberta e tentativas simultâneas de impor alianças
de “frente unida” à UNIA. A abordagem amigável foi articulada por James W. Ford
da seguinte forma: “Como abordamos os Garveyistas e os outros elementos Nacio-
nalistas ... Nós os abordamos de maneira amigável, e os comunistas Negros dizem:
'Nós, comunistas, somos os defensores de nosso povo, defensores do povo Etíope
...'” 119

Essas táticas eram freqüentemente dirigidas aos líderes da UNIA. Em 1926


encontramos um comitê incluindo o representante do Partido dos Trabalhadores,
C. E. Ruthenberg, Manuel Gomez, secretário da Liga Antiimperialista e outros, or-
ganizando o envio de George Weston, líder da UNIA em Nova York, em uma viagem
a uma conferência anti-imperialista em Bruxelas. Eles também estavam conside-
rando a possibilidade de fazer uma viagem aos EUA após a conferência. 170 Weston
estava na época liderando uma facção própria da UNIA em uma disputa com o res-
to da organização.

Uma tentativa mais séria de criar conflito por meio da amizade com os líde-
res ocorreu em 1935, quando um Comitê Provisório para a Defesa da Etiópia
(PCDE) foi formado no Harlem. A conferência de fundação foi realizada na sede da
UNIA em Nova York, e o capitão A. L. King, líder da Divisão Central da UNIA em No-
va York, foi eleito presidente por unanimidade. O secretário executivo seria A. W.
Berry, da Liga de Luta pelos Direitos do Negro, organizada pelos comunistas, en-
quanto o diretor de publicidade era William Fitzgerald, de outra organização co-
munista, a Defesa Internacional do Trabalho.121 Entre os membros do PCDE esta-
vam James W. Ford, na época secretário do ramo do Harlem do Partido Comunista
dos EUA. Ford aproveitou a oportunidade para cultivar a cooperação de King. Em
novembro, ele convidou King a se juntar a uma delegação ao prefeito LaGuardia
para protestar contra a invasão policial de um baile do Harlem patrocinado pelo
partido comunista, no qual setenta e quatro pessoas foram presas. No mês seguin-
te, ele convidou King para uma reunião dos principais líderes do Harlem com um
Comitê Antifascista.122

Essa cooperação entre King e os comunistas causou dissensão nas fileiras da


UNIA. Um movimento foi desenvolvido para esmagar King por causa disso. Os dis-
sidentes reafirmaram sua lealdade à Etiópia, mas recusaram-se a servir no mesmo
comitê que os comunistas. Eles acusaram King de ditadura e de tentar tornar co-
munista a UNIA de Nova York.123 Eles aparentemente contataram Garvey, e King
foi forçado a escrever a Garvey uma explicação. Ele garantiu a Garvey que o único
motivo de sua participação no PCDE era comprar publicidade que a organização
não podia pagar. Ele explicou que várias organizações pertenciam ao PCDE e que a
UNIA detinha a balança de poder. Em sua opinião, isso não significava consórcio
com os comunistas.124 Se a explicação de King fosse honesta, o que isso significava
é que a UNIA estava tentando usar os comunistas exatamente da mesma maneira
que os comunistas tentavam simultaneamente usar a UNIA. O contato de King com
os comunistas continuou por mais algum tempo, pois em fevereiro de 1936 ele foi
convidado pelos Amigos Americanos da União Soviética a enviar um representante
da UNIA com uma delegação americana à U.S.S.R. 125

As relações entre os dois grupos nem sempre foram tão cordiais após a pri-
são de Garvey. A imprensa comunista, encabeçada pelo Liberator, publicou regu-
larmente apelos aos Garveyistas para se juntarem a órgãos comunistas como a Liga
de Luta pelos Direitos do Negro. Tais apelos foram acompanhados por artigos bai-
xos e hostis sobre Garvey e a UNIA e foram apoiados por proselitismo ativo nas
comunidades pretas. Aqui, no entanto, a presença de Garveyites provou ser um
obstáculo constante. Um relatório de um membro dos Jovens Libertadores (um
grupo comunista) em 1931 deu uma indicação disso. Durante o recrutamento no
lado sul de Chicago, o grupo encontrou jovens Garveyistas, que informaram aos
Libertadores que filhos brancos de escravagistas e estupradores nunca ajudariam
os pretos. Os Libertadores tentaram por três horas estabelecer uma distinção entre
capitalistas brancos e trabalhadores brancos. Os Garveyistas não estavam conven-
cidos, mas os Libertadores tinham esperanças de eventualmente conquistá-los, já
que eram "sinceros e militantes". 126 O recrutamento comunista no lado sul tinha
uma longa história de frustração por parte dos Garveyistas, desde pelo menos
1924.127

Esses tipos de encontros foram acompanhados por outros mais sérios. Em


1927, o Negro World atacou editorialmente o comunista americano Negro Labour
Congress.128 E em 1930 ocorreu o confronto mais sério de todos, resultando em
uma briga de rua que tirou a vida do comunista Alfred Levy. Essa briga em particu-
lar foi o culminar de uma rivalidade amarga entre os dois grupos na área de Nova
York em 1930. William Grant, líder da Divisão Tigre da UNIA, havia sido agredido
algum tempo antes por pessoas que identificou como comunistas. Ele fez a polícia
prender os comunistas pretos que ele acusou de serem seus agressores. A comu-
nista Defesa Internacional do Trabalho providenciou a defesa dos acusados. 129 A
Divisão Tigre posteriormente proclamou sua hostilidade aos “comunistas e vigaris-
tas”.130 A cena da morte de Levy foi uma reunião da UNIA na esquina de uma rua na
Avenida Lenox do Harlem. Os comunistas atacaram a reunião, de acordo com a
versão Garveyista, e um tentou invadir a plataforma do palestrante. A polícia, que
estava presente, tentou conter os comunistas, mas sem sucesso. A luta estourou e a
polícia “rogou” aos Garveyistas para prestar assistência. Seguiu-se um vale-tudo e
Levy foi morto. No dia seguinte, Garveyistas se reuniram novamente na mesma
esquina e declararam sua intenção de interromper qualquer reunião na Avenida
Lenox que falasse contra o Movimento Garvey. O Blackman de Garvey anunciou da
Jamaica: "Sua ação pode ser facilmente compreendida, pois o Garveyismo é um dos
principais alvos do ódio comunista e de vingança, os semeadores de propaganda
vermelha rotulando seus irmãos pacíficos de 'agentes imperialistas', 'traidores de
sua raça' e 'burguêses.'”131 Os comunistas, entretanto, retiraram-se para a 144
Street com a Lenox Avenue, onde o corpo de Alfred Levy jazia sob a guarda comu-
nista constante. Depois de dois dias, uma manifestação em massa foi dirigida no
local por Otto Huiswoud, que aproveitou a oportunidade para atacar Garvey. Levy
foi finalmente enterrado sob as tensões da "Internacional". 132

As relações ficaram particularmente tensas nos dois anos ou mais depois


disso. O Negro World publicou uma carta ocasional alegando a prática comunista
de Jim Crow, ou como uma de Farrell, Pensilvânia, relatando que os comunistas
diziam às pessoas que estavam trabalhando junto com a UNIA e que Garveyites
deveriam, portanto, se juntar aos comunistas.133 Em 1931, uma Liberty Hall de Chi-
cago recusou permissão a August E. Poansjoe, um candidato do Partido Comunista
a tesoureiro da cidade que desejava falar lá.134
E os comunistas em 1931 trouxeram suas maiores armas de propaganda,
representadas pelo caso Scottsboro, para pesar sobre a UNIA. No caso de Scottsbo-
ro, nove jovens pretos inocentes foram acusados de estuprar duas senhoras bran-
cas de má reputação e foram condenados à morte no Alabama. O ILD havia captu-
rado a defesa da NAACP e havia colhido uma sorte inesperada da indignação inter-
nacional sentida por esta paródia de justiça. A sorte inesperada de Scottsboro tor-
nou-se uma arma de propaganda poderosa. O editorial do A Negro World de 1931
expressou uma visão frequentemente expressa de que os comunistas nunca teriam
apoiado os acusados se não fosse pela publicidade. Duvidava de sua sinceridade
em vista de sua hostilidade às divisões da UNIA e outros grupos raciais que tenta-
vam ajudar.135 A Sra. Ada Wright, mãe de dois dos acusados, foi utilizada para ata-
car o líder da Divisão Tigre William Grant em um discurso para Garveyistas em
Nova York.136 O Liberator publicou uma carta aberta atacando Grant e convidando
os membros da UNIA a se juntarem à luta de Scottsboro. 137 A atitude da UNIA foi
resumida da seguinte forma: "Deixe os comunistas agitarem, se reunirem e se pro-
pagarem, se necessário; mas vamos permanecer “de canto” até que algo seja inicia-
do que nos forneça a oportunidade de que precisamos para fazer nossa grande 'sa-
ída'.”138

O Liberator manteve sua intensa campanha contra Garvey neste período.


Um sucessor do Negro Champion, seus editores colaboradores continham nomes
conhecidos da ABB e comunistas pretos como Otto Hall, Otto Huiswoud e J. W.
Ford. A estridência de seus ataques sem dúvida devia algo ao fato de Cyril Briggs
ser o editor. Seus ataques eram frequentemente compostos de exageros e distor-
ções desenfreadas. Sobre Garvey ser barrado de Cuba, o Liberator comentou em
1930 que ele ainda era uma ferramenta imperialista, mas estava sendo tratado
dessa maneira pelos imperialistas porque eles agora eram "servidos por outros
interesses" e não precisavam mais de Garvey "como um mascate de suas ilusões
particulares."139 Em 1931, o jornal publicou um editorial que a Liga de Luta pelos
Direitos dos Negros (sucessor do American Negro Labour Congress como uma al-
ternativa comunista preta a outras organizações raciais)" deve expor essa tentativa
ultrajante de enganar as massas pretas." Ele continuou, “reuniões devem ser reali-
zadas, panfletos distribuídos, contatos feitos com as massas de Garvey e um ataque
esmagador realizado contra esses vendedores de ilusões e apologistas do imperia-
lismo, e ganhar os trabalhadores nas organizações de Garvey para uma luta re-
al”.140

O Libertador foi habilmente apoiado em nível internacional por uma cons-


tante barragem anti-Garvey que emanava do Negro Worker. Este jornal, publicado
inicialmente em Hamburgo, Alemanha, e posteriormente em outras localidades,
era o órgão do Comitê Sindical Internacional de Trabalhadores Negros (ITUC-NW),
uma criação da Rede Internacional de Sindicatos (Profintern). O Profintern deu o
tom para os ataques do Negro Worker a Garvey, declarando em sua “Resolução
Especial sobre o Trabalho entre Negros nos Estados Unidos e nas Colônias” de
1931 que “De todas as formas de engano ideológico, a mais perigosa é o 'Garveyis-
mo', negando a luta de classes, e a possibilidade da luta revolucionária das massas
Negras pela autodeterminação.”141 Mesmo antes disso, uma declaração da ITUC-
NW feita em sua conferência de fundação em Hamburgo em 1930 havia declarado
guerra aos “Negros capitalistas enganadores” como Garvey, Du Bois e uma série de
outros, bem como sobre “o falsificador sindical branco, Capitão Cipriant, nas Índias
Ocidentais.”142 Em 1933, Garvey foi levado a comentar sobre a campanha do Negro
Worker. Ele escreveu: “Os comunistas, através de sua seção Negra, estão publican-
do uma revista mensal da Alemanha, chamada 'Negro Worker'. Reconhecemos os
membros da equipe editorial como Negros que conhecemos em diferentes lugares.
Achamos que esses Negros estão causando um grande dano à sua raça no momen-
to, tentando influenciá-los a assumir a responsabilidade de propagar o comunis-
mo.”143 Garvey argumentou aqui que o comunismo tinha “uma grande chance de
influenciar uma mudança nos sistemas políticos do mundo”, mas os Negros ainda
não deveriam ser “sacrificados nos estágios iniciais da batalha” pelos comunistas.

O Negro Worker e outros materiais da ITUC-NW eram lidos por pretos que,
embora admirassem a militância dessas publicações, nem sempre apreciavam as
denúncias de Garvey. Uma carta desse leitor na Guiana Inglesa foi publicada em
1932, junto com uma resposta do editor. Uma extensa troca de idéias ocorreu em
1936 e 1937 144 entre o editor, na época Charles Woodson (na verdade Otto
Huiswoud, de acordo com uma fonte de inteligência dos Estados Unidos) 145 e um
veterano líder da UNIA da Dominica, J. R. Ralph Casimir. Casimir nesta época era o
agente do Negro Worker na Dominica e ameaçou deixar de prestar este serviço
devido aos ataques enganosos a Garvey. Ele particularmente não gostou da ten-
dência do jornal de minimizar o papel dos imperialistas em frustrar os planos de
Garvey na Libéria. A revista dedicou várias páginas às cartas de Casimir e às res-
postas editoriais. Várias cartas anti-Casimir também foram publicadas, incluindo
uma do veterano inimigo de Garvey, W. A. Domingo.

A ala trotskista do movimento comunista também contemplou maneiras de


contornar a influência de Garvey na década de 1930. No final da década, seu porta-
voz preto, C. L. R. James (escondido sob o pseudônimo de J. R. Johnson), sugeriu
uma organização preta de frente unida para a luta de massas que mostraria que
estar "lutando como uma organização Negra, mas sem nada a ver com o Garveyis-
mo.”144

Em nenhum lugar a mistura incomum de tolerância e hostilidade raivosa


que caracterizou a relação garveyismo-comunismo é melhor vista do que na série
de debates formais que ocorreram entre os dois grupos neste período. Essas trocas
têm uma longa história. O Negro World de 20 de setembro de 1919 continha uma
troca de cartas entre a figura literária do Harlem, Claude McKay e William H. Fer-
ris, editor literário do jornal de Garvey. McKay tinha argumentado a favor do bol-
chevismo, sugerindo que os trabalhadores pretos seriam automaticamente liberta-
dos na esteira de uma revolução proletária branca. Debates informais entre mem-
bros do partido dos trabalhadores e membros da UNIA em Chicago já foram men-
cionados. Na Convenção Internacional de Garvey, realizada na Jamaica em 1929,
um debate formal ocorreu entre o próprio Garvey e Otto Huiswoud em mais uma
tentativa comunista de influenciar uma convenção da UNIA. O tópico resolveu que
‘O problema do Negro só pode ser resolvido pela cooperação internacional do tra-
balho entre trabalhadores brancos e negros”. Garvey obviamente argumentou con-
tra e obviamente ganhou. O público era juiz.147 Em fevereiro de 1931, o editor do
Negro World, H. G. Mudgal, engajou um senhor Welch, descrito como editor associ-
ado do Revolutionary Age, para um debate formal. Uma grande multidão de comu-
nistas e Garveyistas compareceu ao Frederick Douglass International Forum, no
Brooklyn, para ouvi-los debater o tema, “Garveyismo vs. Comunismo: Qual vai re-
solver melhor o problema do Negro?” Mudgal venceu, provavelmente porque devia
haver mais Garveyistas na platéia do que comunistas. Welch argumentou que o
problema do Negro era essencialmente um problema de classe, enquanto Mudgal
argumentou que "Nenhum não-Negro poderia fingir dar uma filosofia que apenas
atendesse às necessidades e humores das massas pretas." 148 Mudgal venceu um
debate semelhante no final daquele ano contra Albert Weisbord, editor do comu-
nista de esquerda Class Struggle. Em dezembro daquele ano, a divisão de Cleveland
relatou um debate semelhante, com ambos os lados discutidos por Garveyistas. Em
1932, o Liberator relatou que a organizadora da UNIA, a Sra. De Mena recusou um
desafio comunista para um debate durante a turnê devido à falta de tempo.
A atitude de Garvey em relação aos comunistas foi justificada em certa me-
dida nas décadas de 1930 e 1940, quando vários comunistas pretos proeminentes
ficaram desencantados e abandonaram o movimento por questões como a degra-
dação do trabalho de Stalin entre os pretos, a venda de petróleo da URSS aos fascis-
tas italianos, que foram usadosdurante a invasão da Etiópia, e a hostilidade dos
comunistas americanos à atividade preta pelos direitos civis durante a Segunda
Guerra Mundial. O problema comum em tais casos era a questão do que fazer
quando o Nacionalismo Preto fosse contra os interesses do partido. Muitas dessas
pessoas foram atraídas pelo comunismo em primeiro lugar por causa do potencial
que percebiam nele para os povos pretos oprimidos, conforme enfatizado na pro-
paganda comunista sobre o tratamento favorável da Rússia às minorias, autode-
terminação na Faixa Preta e assim por diante. Um excelente exemplo de tudo isso,
e que mostra o apelo que Garvey continuou a exercer sobre os pretos preocupados
com a raça, mesmo na hierarquia comunista, foi o caso de George Padmore.

Quando jovem em Trinidad, Padmore provavelmente tinha sido um leitor


do Negro World e ficou impressionado com a revolta de 1919 liderada por Gar-
veyistas. C. L. R. James acha que Padmore foi “profundamente influenciado por
Garvey” nessa época.150 Certamente, na época em que Padmore migrou para os
Estados Unidos em 1924, Trinidad era a segunda ilha mais organizada pela UNlA
no Caribe, depois de Cuba. Nos Estados Unidos, Padmore tornou-se comunista por
volta de 1927.151 No entanto, em 1928, ele liderou um protesto na Howard Univer-
sity contra a presença do embaixador britânico Sir Esme Howard no campus, por-
que este último desempenhou um papel importante na deportação de Garvey dos
Estados Unidos e Canadá. Longas folhas mimeografadas foram distribuídas para
esse efeito, levando o nome de Padmore como secretário da Liga Internacional An-
tiimperialista da Juventude.152 Padmore logo depois viajou para Moscou, onde se
tornou chefe do Bureau Negro do Profintern. Durante o início dos anos 1930, ele
editou o Negro Worker e produziu vários panfletos e outros materiais apresentan-
do visões comunistas sobre vários assuntos relevantes para os trabalhadores pre-
tos. Quaisquer que sejam as afinidades remanescentes que ele possa ter com Gar-
vey em 1928, não eram visíveis na maioria desses escritos (principalmente publi-
cados em 1931). Na verdade, ele denunciou Garvey com regularidade monótona na
retórica comunista padrão - "A luta contra o Garveyismo", escreveu ele, a título de
exemplo, "representa uma das principais tarefas dos trabalhadores Negros na
América e nas colônias Africanas e das Índias Ocidentais." Ou ainda, "Como o sio-
nismo e o gandismo, ele (o Garveyismo) visa apenas utilizar a consciência racial e
nacional com o propósito de promover os interesses de classe da burguesia preta e
dos latifundiários". Outro abuso típico explicou que Garvey foi “o maior fraudador
e chantagista que já se impôs a um povo oprimido”.153

Ainda assim, no mesmo ano em que Padmore repetia como papagaio essas
expressões comunistas de abuso, ele deu uma vaga idéia de uma persistente sim-
patia por Garvey em um panfleto intitulado Imperialismo Americano Escraviza a
Libéria. Aqui ele fugiu de suas distorções para admitir que o esquema de Garvey na
Libéria "foi derrotado pela intervenção do governo dos EUA". Ele também repetiu
o "boato" de que W. E. B. Du Bois foi usado pelo presidente Coolidge para ajudar a
derrotar o esquema.154
Padmore interrompeu suas várias filiações comunistas em 1933 e foi então
formalmente expulso do movimento em meio a muitos comentários estridentes de
seus sucessores no Negro Worker. Ele havia partido por causa de sua convicção de
que a eliminação parcial do programa anticolonial do Comintern na Ásia e na Áfri-
ca era uma "traição aos interesses fundamentais do meu povo". 155 Ao expulsá-lo,
seus ex-colegas o acusaram de muitas das coisas que ele acusou Garvey. A ITUC-
NW publicou uma longa declaração de "acusações muito graves" resumidas no se-
guinte extrato - "Em uma reunião em 23 de fevereiro de 1934, a Comissão de Con-
trole Internacional decidiu expulsar Padmore do Partido Comunista por contatos
com um provocador, por contatos com organizações burguesas sobre a questão da
Libéria, por uma atitude incorreta em relação à questão nacional (em vez da uni-
dade de classe lutando pela unidade racial)."156 Uma declaração posterior do Negro
Worker mostrou como a posição de raça-primeiro Garveyista afetou Padmore.
Acusou: “Em um esforço débil para justificar sua posição e uma profunda falta de
confiança nos trabalhadores brancos revolucionários, ele afirma, 'o que vocês ca-
maradas brancos nunca entenderam e nunca serão capazes de entender, é a psico-
logia do Negro.'”157 A mesma declaração, ao criticar suas atividades de arrecadação
de fundos em nome da Libéria, juntou-o a Garvey“ o pai de tal ideia, que introduziu
o 'movimento de volta à África' na mesma maneira.” 158 Ainda um artigo posterior
sobre“ A ascensão e queda de George Padmore como um lutador revolucionário ”,
novamente comparou-o com Garvey, declarando, no que era pretendido como abu-
so, que ele tinha“ duas almas, a dos anti- imperialista e o nacionalista Negro.”159
Padmore teria considerado isso um elogio, como a maioria dos revolucionários
pretos, Garvey incluído.

Depois que o movimento comunista se tornou uma coisa do passado de Pa-


dmore, sua atitude para com Garvey mais uma vez sofreu uma modificação. Como
colaborador de jornais Afro-americanos de 1938 em diante, seus artigos às vezes
assumiam um tom Garveyista.160 Em 1947, ele foi listado como "nosso correspon-
dente europeu em questões coloniais" pelo jornal Garveyista The African'. No ano
de 1952, ele foi visto homenageando Garvey como o inspirador de "África para os
Africanos", de Jomo Kenyatta.162 Pouco depois, em sua obra principal, “Pan-
Africanismo ou comunismo?” ele chamou Garvey de “o maior profeta e visionário
preto desde a Emancipação do Negro”.163 Nesse mesmo trabalho, ele aparentemen-
te admitiu a influência de Garvey em sua saída do comunismo no que pode ter sido
uma referência velada a si mesmo quando disse: “As tiradas anticomunistas de
Garvey teve um efeito desmoralizante sobre os membros neófitos do partido Ne-
gro, alguns dos quais foram expulsos por 'desvios nacionalistas pretos'”. 164 Ele
também repetiu aqui a visão frequentemente expressa de Garvey de que os comu-
nistas consideravam os trabalhadores e camponeses pretos como “revolucionários
dispensáveis”.165

Embora as maiores batalhas entre Garveyismo e comunismo tenham sido


travadas nos Estados Unidos, a luta entre essas duas ideologias era, é claro, mundi-
al. E o lugar que mais se aproximava dos Estados Unidos em sua situação racial
objetiva era a África do Sul. Aqui também havia Jim Crow (apartheid), um pequeno
partido comunista liderado por radicais brancos, e movimentos pretos massivos
no Congresso Nacional Africano (ANC) e no Sindicato dos Trabalhadores Industri-
ais e Comerciais (ICU), ambos os quais tinham ligações estreitas com o UNIA (Ver
Capítulo 7).
A África do Sul também foi afetada pela decisão do Comintern de 1928 de
adotar uma linha nacionalista na questão racial. Junto com a imposição do slogan
da autodeterminação na Faixa Preta dos Estados Unidos, o congresso de 1928 bus-
cou impor aos camaradas Sul-Africanos o slogan de uma “República Nativa Sul-
Africana Independente baseada na organização dos trabalhadores e camponeses
garantindo (ao mesmo tempo) os direitos das minorias nacionais.” S. P. Bunting, o
porta-voz branco do partido Sul-Africano (erroneamente considerado preto pelos
funcionários dos Estados Unidos que monitoram o congresso), resistiu a esse slo-
gan. Ele se agarrou obstinadamente a uma preferência pela luta de classes em rela-
ção à luta racial e afirmou que a África do Sul não tinha um movimento Nacional
eficaz. Ele alegou que dos 1.750 membros do partido, 1.600 eram pretos (contra
apenas 200 no ano anterior).166 A maioria do Comitê Central da África do Sul com-
partilhava dessa visão e foram atacados pelo comitê executivo do Comintern por
sua "oposição obstinada ao slogan correto proposto pelo Comintern.” 167 Bunting e
seus colegas parecem, no entanto, ter feito alguma tentativa de implementar os
desejos do Comintern, pois em 1930 eles foram atacados dentro do partido por
pregar o “Republicanismo Nativo”, que era visto como “Marcus Garveyismo”com
um nome diferente. O editor preto do semanário comunista da Cidade do Cabo
Umsebenzi, respondendo a este ataque, argumentou que qualquer socialista bran-
co que não pudesse "reconhecer o direito dos explorados e chicoteados Nativos de
completar a autonomia nacional" deve ser considerado um chauvinista branco,
"não importa quantas palestras ele possa ter feito para audiências nativas.” 168 O
editor do Negro World expressou o desejo de que os comunistas pretos dos Esta-
dos Unidos pudessem ser igualmente independentes de espírito e acrescentou:“
Estamos contentes de ver o triunfo do Garveyismo não apenas sobre o imperialis-
mo dos capitalistas, mas também sobre o imperialismo dos comunistas.” 169

Ocasionalmente, o aspecto puramente americano da luta entre as duas ideo-


logias se espalhou para a África do Sul, como em 1931, quando o Negro World
zombou do artigo de Cyril Briggs publicado em um jornal comunista Sul-Africano.
Briggs naquele artigo atacou um editorial do Negro World. O Negro World insultou
Briggs com a pregação de “Garveyismo puro” ao defender os “direitos dos Negros”
em todo o mundo. “Mas a única diferença”, sugeria o editorial, “é que Briggs está
disposto a receber ordens de Moscou e Garvey não está disposto a receber ordens
de ninguém”. O editorial continuou com uma provocação semelhante a fazer com
que pessoas como George Padmore deixassem as fileiras comunistas. Dizia: "Espe-
ramos que esta exposição de Cyril Briggs não lhe custe a posição como um traidor
da filosofia comunista ortodoxa, que denuncia a ideia de Briggs como nacionalismo
jim crow. Desejo-lhe sorte, Cyril, e espero que seus chefes comunistas não notem
este item.”170

George Padmore resumiu as lutas de Garvey contra os comunistas quando


escreveu: “O maior erro que os comunistas brancos cometeram foi atacar Garvey
abertamente e tentar interromper seu movimento antes de ganhar a confiança dos
Negros... Ao lutar contra os comunistas com as próprias armas de meias-verdades,
vilania e violência deles, Marcus Garvey foi o primeiro líder negro a forçá-los a
manter as mãos longe de organizações Negras”.171
NOTAS

1. Daily Worker, 23 de agosto de 1924.

2. Ibid., 9 de agosto de 1924.

3. Theodore Draper, American Communism and Soviet Russia (Nova York:


The Viking Press, 1960), p. 320

4. Ibid.; William Z. Foster, The Negro People in American History (Nova


York: International Publishers, 1954), p. 455.

5. The Communist, 13 [1920): 4.

6. Foster, The Negro People, p. 455.

7. Draper, American Communism, p. 320

8. Ibid., P. 320. 321.

9. " Theses on the National and Colonial Question Adopted By the Second
Comintern Congress, 28 de julho de 1920," em Jane Degras, ed., The Communist
International, 1919-1943 (Nova York: Oxford University Press, 1956), I: 142 . O
“etc.” depois de “Negros” não aparece nesta versão, mas é incorporado a uma cita-
ção mais curta em Draper, American Communism, p. 337.

10. Claude McKay, "Soviet Russia and the Negro", Crisis 27 (dezembro de
1923): 64; Draper, American Communism, p. 321; Claude McKay, A l.ong Way From
Home (Nova York: Harcourt, Brace & World, 1970), p. 206.

11. Draper, American Communism, p. 326; Degras, Communist Internation-


al, pp. 398, 399.

12. Degras, Communist International, I: 398-401.

13. Foster, The Negro People, p. 457.

14. U. Steklov, “The Awakening Race,” Izvestia, 16 de novembro de 1922, RG


59, 861.00-Congress, Communist International, IV / 2, National Archives.

15. Degras, Communist International, II: 97.

16. Draper, American Communism, pp. 328, 329.

17. Ibidem, p. 334.

18. Resumo de Moscow Pravda, 17 de julho de 1928, RG 59, 861.00 - Con-


gress, Communist International VI / 13.

19. Pravda, 26 de julho de 1928, discurso de Dunne, RG 59, 861.00- Con-


gress, Communist International VI / 19.
20. Resumo baseado no Pravda, 18 de agosto de 1928, RG 59, 861,00-1 Con-
gress, Communist International VI / 13.

21. Ibid., Resumo de Pravda, 24 de agosto de 1928.

22. Ibid., Pravda, 25 de agosto de 1928.

23. Degras, Communist International, II: 552-557.

24. Foster, The Negro People, p. 463. Uma formulação ligeiramente diferen-
te é sugerida em Draper, American Communism, p. 344.

25. George Padmore, Pan-Africanism or Communism? (Nova York: Roy Pub-


lishers, 1956 [?]), P. 305, 306.

26. Negro Champion 1 (27 de agosto de 1928): 8.

27. Esta e as citações anteriores de Degras, Communist International, III:


124-135.

28. McKay, A Long Way From Home, p. 208


29. George Breitman, ed., Leon Trotsky on Black Nationalism and Self-
Determination (New York: Merit Publishers, 1967), pp. 14, 18, 25, M.

30. Amy Jacques Garvey, ed., The Philosophy and Opinions of Marcus Garvey
(Londres: Frank Cass, 1967), II: 315.

31. Negro World, 24 de março de 1923.

32. Ibid., 4 de setembro de 1926.

33. Marcus Garvey, The Tragedy of White Injustice (Nova York: A. J. Garvey,
1927), p. 14

34. Charles Latham para Secretário de Estado, 24 de agosto de 1921, RG 59,


811.108 G 191/24.

35. Garvey para Rt. Hon. Phillip Snowdon, Chancellor of the Exchequet 27 de
fevereiro de 1930, CO 318/399/76634, Colonial Office Records, Public Record Of-
fice, Londres.

36. Negro World, 1º de novembro de 1924.

37. Blackman, 12 de setembro de 1929.

38. Negro World, 1º de dezembro de 1923.

39. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 69.

40. Amy Ashwood Garvey, “Prophet of Black Nationalism,” p. 73. Theodore


G. Vincent, Black Power and the Garvey Movement (Berkeley: Ramparts Press,
1971 [?]), P. 98
41. Charles L. Latham para Secretário de Estado, 12 de setembro de 1920,
RG 59, 811.108 G 191/1; Alves apresentou Garvey em uma reunião no Ward Thea-
tre, Kingston em 1921 - Negro World, 16 de abril de 1921.

42. Daily Gleaner, 2 de junho de 1921, citado em Adolph Edwards, Marcus-


Garvey (Londres: New Beacon Publications, 1967), p. É.

43. Blackman, 14, 27, 28, 29, 30, 1929 de maio.

44. Ibid., 31 de dezembro de 1929, 10 de março, 17 de março de 1930.

45. Ibid., 11 de janeiro, 12 de abril de 1930.

46. Ibid., 26 de abril de 1930. Uma mensagem de Garvey em nome dos tra-
balhadores e trabalhadores da Jamaica recebeu pouca atenção do British Colonial
Office-E. B. Boyd para Rt. Exmo. Lord Stamfordham, 20 de setembro de 1930, CO
318/399/76634.

47. Black Man, 3 (julho de 1938): 6. Em 1941, o National Negro Voice (19 de
julho de 1941, p. 5) considerou Garvey juntamente com Bustamante, Ken Hill e S.
Kerr Coombs (editor do Jamaica Labor Weekly) como números de mão de obra
pendentes do período. Esse documento também dizia que Garvey havia criado um
Sindicato Trabalhista da Jamaica em 1935 (9 de agosto de 1941, p. 3).

48. Governador Wilfred Collet da Guiana Britânica para o Visconde Milner, 8


de outubro de 1920, Collet para Rt. Exmo. Winston Churchill, 7 de junho de 1921,
CO 318/356. O próprio Critchlow menciona que os trabalhadores se voltaram para
o garveyismo durante os tempos difíceis da década de 1920. Ver Hubert Critchlow,
“História do Movimento Sindical na Guiana Britânica,” em George Padmore, ed.,
Voice of Coloured Labour (Manchester: PANAF Service Ltd.119451), p. 51. Em uma
reunião da UNIA em 1921 realizada pelo comissário viajante R. H. Tobitt, Critchlow
e um Sr. Andrews do B.G. O sindicato trabalhista estava na plataforma, junto com
GS Primo, chefe local da UNIA, J. Johnson, vice-presidente, EM Seaton, secretário e
outros - Afegro World, 2 de julho de 1921, reimpresso do The Tribune (BG), 22 de
maio 1921. Em 1922, Tobitt foi o convidado de honra na reunião do terceiro ani-
versário do B. G. Labor Union — Negro World, 11 de março de 1922.

49. Governador Charles Bain de Barbados ao Secretário de Estado, Colonial


Office, 16 de janeiro de 1923, FO 371/8450.

50. C. E. Rappolee, Governador, Ilhas Virgens dos EUA, "Relatório sobre as


atividades de um D. Hamilton Jackson," 10 de fevereiro de 1923, RG 59.811 G
00/37.

51. Basil Brentnol Blackman, Secretário-Tesoureiro, Caribbean Congress of


Labor, palestra no St. Ann’s Community Workshop, Trinidad, 7 de julho de 1969.

52. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 244.

53. Draper, American Communism, p. 333.

54. The Communist, 13 (1920]: 4.


55. Rose Pastor Stokes, "The Communist International and the Negro," The
Worker, 10 de março de 1923.

56. Degras, Communist International, II: 557.

57. Robert Bruce e J. P. Collins, "The Party and the Negro Struggle", The
Communist (novembro de 1921): 15.

58. Draper, American Communism, p. 329.

59. Ibid., P. 323-325; Crusader, 3 (janeiro de 1921): 31; 5 (novembro de


1921): 22; New York Amsterdam News, 16 de novembro de 1921; The Worker, 11
de agosto de 1923.

60. Cyril Briggs, “The Decline of the Garvey Movement,” Communist, (junho
de 1931): 550; Draper, American Communism, p. 325, 326.

61. The Worker, 5 de agosto de 1922.

62. Congresso, Comunista Internacional IV / 5, ata da "Sessão da Comissão


sobre a Questão do Negro", 28 de novembro de 1922, incluída em FWB Coleman,
Legação dos EUA, Riga, Letônia, ao Secretário de Estado, 22 de dezembro de 1922,
RG 59.861,00 — Congresso, Internacional Comunista.
63. The Worker, 18 de agosto de 1923.

64. Crusader 4 (fevereiro de 1921): 9.

65. Ibid. 5 (novembro de 1921): 5.

66. Negro World, 27 de agosto de 1921: Vincent, Black Power, p. 81; Garvey,
Garvey and Garveyism, p. 64; Crusader 5 (novembro de 1921): 5.

67. Negro World, 3 de setembro de 1921.

68. Garvey, Philosophy and Opinions, 1: 73.

69. Ibid., II: 333, 334.

70. Crusader 5 (novembro de 1921): 8.

71. Negro World, 8 de outubro de 1921.

72. New York Herald, 21 de outubro de 1921; Crusader 5 (novembro de


1921): 5.

73. Crusader 5 (novembro de 1921): passim.

74. New York Times, 3 de dezembro de 1921.

75. Negro World, 31 de dezembro de 1921. McGuire entregou as listas de


assinaturas do Negro World a Briggs, que enviou circulares anti-Garvey aos assi-
nantes - ibid., 14 de janeiro de 1922.

76. Philosophy and Opinions, II: xiv; Vincent, Black Power, p. 221.
77. Negro World, 25 de fevereiro de 1922.

78. Garvey para Harry M. Daugherty, Procurador-Geral dos Estados Unidos,


22 de janeiro de 1923; Garvey para Daugherty, 24 de janeiro de 1923, RG 60,
198940.

79. Negro World, 20 de março de 1926.

80. Ibid., 3 de abril de 1926.

81. Blackman, 2 de agosto de 1930; Liberator, 25 de abril de 1931.

82. Comunista (junho de 1931): 547-552.

83. Negro World, 29 de agosto de 1931. Ver também ibid., 27 de fevereiro


de 1932.

84. Negro Worker 2 (agosto de 1932): 14.

85. New Jamaican, 20 de setembro de 1932.

86. Crusader News Agency, semana de 20 de maio de 1940.

87. Resumo de lzvestia, 18 de novembro de 1922, RG 59, 861.00-Congresso,


Comunista Internacional IV / 4.

88. C. L. R. James, A History of Pan-African Revolt (Washington, D.C .: Drum


and Spear Press, 1969), p. 79

89. Daily Worker, 18 de agosto de 1924.

90. John Bruce e J. P. Collins, "The Party and the Negro Struggle", The Com-
munist (outubro de 1921): 19.

91. Negro Champion, (27 de outubro de 1928): 5.

92. Negro World, 7 de novembro de 1925, de uma cópia datilografada nos


papéis de Amy Jacques Garvey.

93. Daily Worker, 11 de fevereiro de 1924.

94. Ibid., 18 de fevereiro de 1924.

95. Degras, Communist International, II: 97. Degras diz aqui que havia dez
comunistas na convenção. Ela não se refere ao Sinédrio pelo nome, mas o descreve
como tendo ocorrido em Chicago em fevereiro de 1924.

96. Daily Worker, 29 de julho de 1924.

97. Ibid., 5 de agosto de 1924.

98. Ibid., 6 de agosto, 13 de agosto, 18 de agosto de 1924.

99. Ibid., 13 de agosto de 1924.


100. Ibid., 23 de agosto de 1924, Negro World, 30 de agosto de 1924.
101. Daily Worker. 23 de agosto de 1924; referências a uma delegada negra
do partido dos Trabalhadores, Sra. Olivia Whiteman, estão em relatórios de 15 de
agosto de 1924 e 19 de agosto de 1924.

102. Ibid., 29 de agosto de 1924.

103. Ibid., 25 de agosto de 1924.

104. New York Age, 4 de setembro de 1920; New York Tribune, 20 de agos-
to de 1920.

105. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 94.

106. Negro World, 2 de fevereiro de 1924.

107. Ibid., 2 de fevereiro de 1924. O editor T. Thomas Fortune não compar-


tilhou as opiniões de Garvey. Ibid.

108. Ibid., 23 de agosto de 1924.

109. Ata de 15 de setembro de 1920, FO 371/4567; “Unrest Between the


Negroes”, 7 de outubro de 1919, RG 28, Box 53 unarranged, arquivo 398; Cônsul
Americano, Port Limon, Costa Rica ao Secretário de Estado, 24 de agosto de 1919,
RG 59, 818.4016 / orig.; J. Edgar Hoover, "Memorandum for Mr. Ridgely", 11 de
outubro de 1919, RG 60, 198940; Home Office to Secretary of State Foreign Office,
20 de julho de 1932, FO 371/16355; Frank Burke para A. J. Frey, 1 de setembro de
1921, RG 32.605-1-653.

110. Home Office to Secretary of State, Foreign Office, 20 de julho de 1932,


FO 371/16355, Foreign Office Records, Public Record Office, Londres.

111. Draper, American Communism, p. 327.

112. Pravda, 25 de julho de 27, 4 de agosto de 1928, RG 59, 861,00, Con-


gresso, Internacional Comunista VI / 9.

113. Black Man 2 (julho-agosto de 1936): 8.

114. New Jamaican, 5 de setembro de 1932.

115. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 69.

116. Negro World, 11 de junho de 1932.

117. M.I. l.c. New York, “Special” General Report, 6 de janeiro de 1920 "Ne-
gro Agitation," FO 371/4567.

118. Comunista (junho de 1931): 551.

119. Citado em Wilson Record, The Negro and the Communist Party (Chapel
Hill, University of North Carolina Press, 1951), p. 135

120. Lovett Fort-Whiteman para Pickens, 11 de setembro de 1926, Pickens


Papers, Caixa 1.
121. Arquivos da Divisão Central da UNIA (Nova York), Caixa 15, G.

122. James W. Ford para o Capitão A. L. King, 28 de novembro, 8 de dezem-


bro de 1935, Arquivos da Divisão Central da UNIA (Nova York), Caixa 13, e.149.

123. Folheto, n.d., Arquivos da Divisão Central da UNIA, Caixa 9, d. 41

124. Ibid., King to Garvey, 19 de dezembro de 1935, Caixa 8, d. 23

125. Ibid., Mary Dalton, Secretária Executiva, Distrito de Nova York, Ameri-
can Friends of The Soviet Union to King, 19 de fevereiro de 1936 Caixa 13, e.149.

126. Liberator, 25 de abril de 1931.

127. Daily Worker, 12 de setembro de 1924.

128. Negro World, 16 de julho de 1927.

129. Liberator, 25 de abril de 1931.

130. Negro World, 9 de agosto de 1930.

131. Blackman, 12 de julho de 1930.

132. Ibid., 19 de julho de 1930.

133. Negro World, 22 de novembro de 1930, 23 de maio de 1931.

134. Liberator, 25 de abril de 1931.

135. Negro World, 23 de maio de 1931.

136. Liberator, 4 de julho de 1931.

137. Ibid., 13 de junho de 1931.

138. Negro World, 30 de janeiro de 1932.

139. Liberator, 8 de fevereiro de 1930.

140. Ibid., 28 de março de 1931.

141. Negro Worker (fevereiro de 1931): 19.

142. George Padmore, Negro Workers and the Imperialist War (Hamburgo:
ITUC-NW, 1931), p. 16

143. Black Man (dezembro de 1933): 4, 5.

144. Negro Worker 6 (dezembro de 1936); 7 (abril de 1937).

145. Livro do significado, RG 59, 844 g. 00/27.

146. Breitman, Leon Trotsky on Black Nationalism, p. 40


147. Daily Gleaner, 15 de agosto de 1929; Negro World, 14 de setembro de
1929; Nembhard, Trials and Triumphs of Marcus Garvey, p. 140. Huiswoud repre-
sentou o Congresso Americano do Trabalho Negro.

148. Negro World, 14, 21, 28 de fevereiro de 1931.

149. Ibid., 17, 24 de outubro, 12 de dezembro de 1931; Liberator, 15 de ju-


lho de 1932.

150. C. L. R. James, “Documento: C. L. R. On the Origins,” Radical America 2


(julho-agosto de 1968): 24.

151. James R. Hooker, Black Revolutionary (Londres: Pall Mall, 1967), p. 6

152. Negro World, 22 de dezembro de 1928; Hooker, Black Revolutionary,


pág. 7

153. George Padmore, The Life and Struggles of Negro Toilers (Londres:
ITUC-NW, 1931), p.125, 126, Negro Worker (dezembro de 1931): 7.
154. George Padmore, American Imperialism Enslaves Liberia (Moscou:
Centrizdat, 1931), pp. 6n, 33, 34.

155. Hooker, Black Revolutionary, p. 31

156. Negro Worker 4 (junho de 1934): 14.

157. Ibid. 4 (julho de 1934): 6.

158. Ibid., P. 9

159. Ibid. 4 (agosto de 1934): 17.

160. James R. Hooker, "Africa for Afro-Americans: Padmore and the Black
Press", Radical America 2 (julho - agosto de 1968): 14-19.

161. The African 5 (junho-julho de 1947).

162. Daily Gleaner, 23 de outubro de 1952, citado em A. J. Garvey, BlackPo-


wer in America, p. 33

163. Padmore, Pan-Africanism or Communism ?, p. 87. No entanto, ainda


havia muita hostilidade para com Garvey expressa neste livro.

164. Ibidem, p. 304.

165. Ibidem, p. 289.

166. Resumo do Pravda, 24 de agosto de 1928, RG 59, 861.00-Congresso, In-


ternacional Comunista VI / 13.

167. Degras, Communist International, II: 553; discurso de Kuusinen, Prav-


da, 1 de setembro de 1928, RG 59, 861.00-Congresso, Internacional Comunista VI /
13.
168. Umsebenzi, 26 de setembro de 1930, citado em Negro World, 8 de no-
vembro de 1930.

169. Negro World, 8 de novembro de 1930.

170. Ibid., 1 de agosto de 1931.171. Padmore, Pan-Africanism or Commu-


nism? 304, 305.

11

Da NAACP e Integracionistas, e de Garvey e Separatistas, ou do Ataque Integracionista

Marcus Garvey é, sem dúvida, o inimigo mais perigoso da raça Negra


na América e no mundo. Ele é um lunático ou um traidor.
- W. E. B. Du Bois1

Eu tinha prometido não desperdiçar muito espaço do Negro World


com o editor mestiço holandês-francês-negro da Crise, o órgão oficial da Asso-
ciação Nacional para o Avanço de "Certas" Pessoas, porque é como enxugar
gelo, mas este um terço holandês, que assume o direito de ditar ao povo Negro
o que eles devem ou não devem fazer, tornou-se tão descarado e impertinente
que não me deixa outro caminho a não ser lidar com ele como ele merece. Em
certa sociedade, quando encontramos indivíduos desse tipo, não perdemos
tempo discutindo com eles, mas lhes damos uma boa surra de cavalo... Du Bois
está especulando se Garvey é um lunático ou um atraidor. Garvey não tem tal
especulação sobre DuBois. Ele tem certeza de que ele é um traidor.
- Marcus Garvey2
A Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor, fundada em 1909,
era, na época da chegada de Garvey aos Estados Unidos, talvez a mais poderosa do
grande número de organizações de direitos civis e de ascensão racial em campo.
Essa razão por si só teria dado motivos suficientes para se sentir ameaçado pela
rápida ascensão da UNIA. Mas a rivalidade e a hostilidade que se desenvolveram
entre essas duas organizações foram alimentados por outras considerações tam-
bém. Grande parte dessa discordância foi incorporada à contenda amarga travada
durante o período americano de Garvey e posteriormente entre Garvey e W. E. B.
Du Bois, importante porta-voz preto da NAACP.

O principal ponto de discordância entre as duas organizações foi, sem dúvi-


da, a questão racial. A NAACP foi formada em grande parte por meio dos esforços
de socialistas e liberais brancos, e Du Bois fora o único membro preto de seu comi-
tê executivo nacional inicial. Sua hierarquia nacional na época de Garvey continuou
a ser dominada pelos brancos. Naturalmente, portanto, a NAACP acreditava na co-
operação inter-racial, e não na organização exclusivamente preta. Nesse aspecto, o
integracionismo da NAACP não era muito diferente das “tendências assimilacionis-
tas progressistas” dos comunistas, e Garvey se opôs a ambas. Ele se opôs particu-
larmente à posição de controle exercida pelos brancos na NAACP. Ele descreveu
esse estado de coisas como um insulto e pensou que os líderes brancos da NAACP
“desejam que os Negros vão apenas até certo ponto e não mais longe”. Ele os con-
siderava "espiões para o resto da raça branca" 3 e os via como um freio à autossufi-
ciência do homem preto e um obstáculo na busca pelo nacionalismo preto. Em um
discurso intitulado "Cuidado com os gregos que trazem presentes", ele disse:

Os maiores inimigos do Negro estão entre aqueles que professam hi-


pocritamente amor e camaradagem por ele, quando, na verdade, e no fundo
de seus corações, eles o desprezam e odeiam. Pseudo-filantropos e suas or-
ganizações estão matando o Negro. Homens e mulheres brancos do Moorfi-
eld Storey, Joel Spingarn, Julius Rosenwald, Oswald Garrison Villard, o con-
gressista Dyer e Mary White Ovington são do tipo, em conjunto com as
agências acima mencionadas, estão desarmando, matando a visão e a ambi-
ção e enganando o Negro até a morte. Eles ensinam o Negro a buscar os
brancos em uma falsa direção... ao mesmo tempo, distraindo o Negro da so-
lução real e do objetivo de assegurar o nacionalismo.4

Dois anos antes desta declaração amarga, Mary White Ovington, presidente
do conselho de diretores da NAACP, havia se expressado em particular (talvez em
tom de brincadeira) de uma forma que parecia estar de acordo com as acusações
de Garvey. Em uma carta a Arthur B. Spingarn, na época vice-presidente da NAACP,
ela disse: “De qualquer forma, apenas pretos deveriam viver nessas cidades de car-
vão! Meus pulmões estão diariamente ficando cinzentos como as cortinas sujas da
minha janela.”5
Os princípios da NAACP se desviaram dos de Garvey não apenas na questão
da hegemonia dos brancos sobre as organizações de ascensão racial, mas também
na questão das atitudes para com os pretos de pele clara. James Weldon Johnson,
durante o período americano de Garvey, um dos poucos oficiais pretos nacionais
importantes da NAACP, considerou que os principais erros de Garvey incluíram
suas supostas distinções "entre pessoas de cor e pretos" e seu Deus preto, que, na
opinião de Johnson, ajudava a impulsionar um racha entre pretos retintos e pretos
de pele clara.6 Isso não é surpreendente, já que em 1924 Garvey publicou parte da
autobiografia de Johnson sobre um ex-homem de cor em seu jornal diário para
mostrar que Johnson queria ser branco.7 A NAACP também não gostou do contato
de Garvey com segregacionistas brancos.8

O impulso Pan-Africano de Garvey forneceu outra área de divergência entre


as duas organizações. Apesar do conhecido interesse de Du Bois no mundo preto
mais amplo, a NAACP mais tipicamente se via como uma especialista no campo
Afro-americano. James Weldon Johnson, escrevendo durante a convenção de Gar-
vey de 1920, discordou da ideia do envolvimento Afro-americano na libertação
Africana. Ele argumentou que os Africanos deveriam ter permissão para travar
suas próprias lutas. A melhor maneira de os Afro-americanos ajudarem, ele pen-
sou, seria cuidar de seus próprios negócios em casa.9 Dez anos depois, ele argu-
mentou que "O principal motivo do fracasso de Garvey com Negros americanos
questionadores foi seu esquema Africano". Ele achou "difícil dar ao homem crédito
por honestidade ou sanidade nesses moldes imperialistas", a menos que sua inten-
ção fosse encenar um golpe na Libéria. 10 Essa preocupação da NAACP com a Afro-
América levou a alguma absorção das atitudes gerais do nativismo que caracteri-
zou a América em geral nos anos do pós-guerra. Du Bois, o Pan-Africanista, foi, es-
tranhamente, um dos maiores criminosos nesse aspecto, pelo menos em seus ata-
ques a Garvey, mas outros líderes pretos da NAACP compartilhavam seu ressenti-
mento com o fato de Garvey ser estrangeiro. Eles nunca perdoaram Garvey por ser
primeiro um estrangeiro, e segundo ousado o suficiente para presumir liderar um
movimento Afro-americano e, terceiro, com ousadia de atacar os "pensadores pre-
tos americanos" de James Weldon Johnson. Johnson expressou muito desse senti-
mento em um comunicado de imprensa de 1924. Ele disse: “Sr. Garvey, que não é
cidadão americano, assumiu a responsabilidade de ir perante os brancos deste pa-
ís, defendendo que o Negro americano abdique de seus direitos constitucionais,
saia deste país e vá para a África. O Sr. Garvey aparentemente não sabe que o Ne-
gro americano se considera, e é, tão americano quanto qualquer um ... ” 11

As diferenças ideológicas de Garvey com a NAACP foram traduzidas em uma


sucessão contínua de batalhas entre os dois. Havia pouco que qualquer um dos
lados fizesse que não resultasse na condenação do outro lado. Uma dessas ques-
tões controversas era a lei de antilinchamento de Dyer. A mutilação pública gene-
ralizada e a execução de pretos por hordas brancas sem lei, com a conivência de
policiais, era um assunto que preocupava todos os líderes pretos na América. No
entanto, havia diferentes abordagens para resolver o problema. Em junho de 1919,
um editorial do Negro World atacou uma resolução da NAACP para combater o
linchamento, contribuindo para um fundo anti-linchamento e prometeu que a
UNIA responderia ao linchamento por meios físicos, em vez de depender da filan-
tropia branca. Com o surgimento do projeto de lei Dyer, no entanto, a UNIA decidiu
inicialmente por uma política de cooperação, apesar do fato de que a NAACP estava
liderando a campanha para a aprovação do projeto, e mesmo que tenha ocorrido
em um momento de conflito crescente entre as duas organizações. A questão foi
obviamente considerada muito importante para permitir considerações de rivali-
dade organizacional.

O apoio da UNIA foi mantido até 1922, quando o projeto de lei foi aprovado
na Câmara, mas posteriormente derrubado no Senado. Assim, em janeiro, Garvey
enviou um telegrama ao Congresso pedindo a aprovação do projeto. Em fevereiro,
ele recebeu parte do crédito pela aprovação do projeto na Câmara. Em março, um
editorial do Negro World de William Ferris elogiou a NAACP por seu trabalho no
projeto de lei. Quase ao mesmo tempo, uma reunião de audiência mista em apoio
ao projeto de lei em Wilmington, Delaware, ficou surpresa ao ver um grande con-
tingente da UNIA presente, com setenta e cinco Enfermeiras da Cruz Preta unifor-
mizadas usando seus botões vermelhos, pretos e verdes. Elas estavam lá a convite
da NAACP, cujo William Pickens era o orador principal. A. Haynes, comissário da
UNIA para Delaware, também falou. Em maio, o Negro World viu com bons olhos a
visita a Washington D.C., de uma delegação liderada por William Monroe Trotter,
que esperava retirar o projeto do comitê, onde havia ficado travado. Em junho, a
UNIA juntou-se à NAACP, YMCA e várias outras organizações em um desfile do cen-
tro do Harlem à Manhattan branca em apoio ao projeto. E em novembro, William
H. Lewis, um ex-procurador-geral adjunto preto, falou no Liberty Hall sobre a
questão do antilinchamento. Poucos meses depois, Lewis planejaria uma visita de
W. E. B. Du Bois à Libéria. Nessa ocasião, porém, ele foi efusivo em seus elogios a
Garvey.12

Mesmo no meio dessa cooperação, no entanto, dúvidas ocasionais podiam


ser ouvidas nas fileiras da UNIA. Garvey, sempre desconfiado de paliativos tempo-
rários onde medidas mais duradouras deveriam ser aplicadas, declarou em abril
que somente no momento em que o homem preto obtivesse um governo poderoso
na África o linchamento seria erradicado. Em maio, John Edward Bruce, conside-
rando o linchamento de um jovem preto de quinze anos no Texas por uma multi-
dão de dois mil brancos enlouquecidos, explodiu em desgosto: “As Leis Anti-
linchamento Mil Dyer não podem mudar o instinto assassino desse gado.” Logo
depois, Garvey começou a criticar a forma como a NAACP lidou com a campanha,
especialmente seus ataques à administração republicana, ao mesmo tempo que
tentava fazer com que os republicanos apoiassem o projeto de lei e sua tendência
de reivindicar muito crédito por quaisquer sucessos que o projeto de lei teve. 13
Só em 1923, entretanto, Garvey se tornou totalmente hostil à campanha an-
ti-linchamento. À esta altura, a NAACP e a campanha aliada para efetuar a prisão e
deportação de Garvey estavam no seu auge. Ele também recebeu mais evidências
de hipocrisia dos brancos. Ele escreveu: “Se Dyer não sabe, deixe-me dizer a ele
que eu estava em seu distrito congressional em St. Louis há duas semanas e não
consegui um refrigerante servido nem mesmo por um grego sujo, que mantinha
sua chamada fonte de refrigerante branco em uma seção Negra, a seção represen-
tada pelo "famoso" advogado do antilinchamento. Oh! A hipocrisia deste mundo!”
O ressentimento de Garvey foi aumentado pelo fato de Dyer, em discursos para a
NAACP, ter expressado satisfação com a condenação de Garvey.14
Garvey agora argumentou que o projeto de lei de Dyer duplicou as leis já
existentes que poderiam ser aplicadas se as autoridades assim desejassem. Além
disso, quaisquer leis que Dyer propusesse ainda teriam que ser aplicadas pelos
amigos brancos dos linchadores. (Alguns dos argumentos de Garvey aqui recebe-
ram uma justificativa incomum de Mary White Ovington da NAACP. Os brancos, ela
escreveu em uma carta privada, não aprovariam um projeto de lei para punir bran-
cos por lincharem pretos.)15

Garvey viu a mão sinistra da NAACP por trás da maioria de seus problemas -
desde a tentativa de 1921 de excluí-lo do país até o embaraço de seu esquema na
Libéria, seu julgamento e prisão. Ele culpou os problemas da Black Star Line na
sabotagem de certas "organizações que se autodenominam associações para o
progresso Negro". James Weldon Johnson pediu a retratação dessa declaração e
divulgou um comunicado à imprensa sobre o assunto. Garvey respondeu, sem dú-
vida irônico, que não havia se referido especificamente à NAACP. “Aqueles que têm
a consciência limpa”, ele advertiu, “não se perturbam quando algo não relacionado
a eles é dito ou publicado.” 16

Algumas das acusações mais amargas de Garvey diziam respeito às cone-


xões da NAACP com o juiz Mack e o agente especial Amos em seu julgamento de
1923. Ele também acusou “um poderoso consórcio de banana e frutas cítricas en-
gajado no comércio tropical” (aparentemente uma referência à United Fruit Com-
pany) contribuiu para seu julgamento e condenação. Este fundo empregou um
grande número de acionistas da Black Star Line, e ele identificou o presidente da
NAACP, Moorfield Storey, como um "advogado ou acionista" da empresa de fru-
tas.17 A NAACP em um estágio emitiu um comunicado à imprensa negando uma
acusação do Negro World de que Storey tinha visitado o escritório do promotor
distrital para garantir uma condenação no mesmo dia em que o caso de Garvey foi
convocado.18

Uma das disputas mais incomuns da NAACP-UNIA se desenvolveu a partir


da visita aos Estados Unidos em 1924 e 1925 do príncipe Kojo Tovalou-Houenou
do Dahomey. Kojo era um associado de longa data da UNIA e foi homenageado no
Liberty Hall. Isso fez com que, segundo alguns relatórios, corresse o risco de per-
der uma viagem ao país que a NAACP organizou para ele. Ele, portanto, disse coisas
pouco elogiosas sobre a UNIA, o que teve o efeito de reintegrá-lo nas graças da
NAACP. Em 1925, o príncipe perdeu dois dentes ao ser expulso à força de um res-
taurante branco em Chicago, para onde havia sido levado por membros brancos da
NAACP, em cuja companhia ele estava na época. O Negro World comentou seca-
mente que esperava que ele agora apreciasse o slogan “África para os Africanos”. 19

No meio de sua rivalidade com Garvey, a NAACP ocasionalmente ficava de-


cepcionada com casos em que pessoas sem conhecimento confundiam as duas or-
ganizações. Já em 1919, Du Bois havia encontrado esse problema na Europa.
Quando, no início de 1922, o New York Times e vários outros jornais foram induzi-
dos por uma agência de notícias a chamar Garvey de "Presidente da Associação
para o Avanço da Raça de Cor", alguns funcionários da NAACP os processaram e
muita energia foi gasta extraindo retratações de errata dos jornais. A associação
explicou a esses editores que compreendia “brancos e pessoas de cor da melhor
espécie” e não estava ligada a Garvey.20
Para aumentar o desconforto da NAACP, ela recebeu um fluxo constante de
cartas a favor e contra Garvey. Muitos eram de pessoas que queriam saber se Gar-
vey era honesto. Uma pessoa queria saber se a NAACP endossava a UNIA. Os alu-
nos da Howard University queriam material para um debate sobre o assunto, “Que
o Movimento Marcus Garvey é a melhor solução para o Problema do Negro”. O cor-
po discente foi citado como dividido entre as duas organizações. O editor do Nation
queria informações confidenciais sobre Garvey. Alguns, por outro lado, escreveram
cartas abusivas, como um homem que devolveu sua carteira de membro da NAACP,
declarando “Eu sou a favor de Marcus Garvey”. Outro informou à associação que
era uma pena que seu bando de homens brancos não tivesse nada melhor a fazer
do que perseguir Garvey, o maior homem preto da época.21 A maioria dos corres-
pondentes foi encaminhada por funcionários da NAACP à artigos anti-Garvey no
Crise, Cruzado e Mensageiro.

No entanto, alguns outros membros comuns das organizações ficaram mui-


to felizes em tolerar ambos. Em 1924, por exemplo, Garvey falou na Howard Uni-
versity sob os auspícios da NAACP e Caribbean Clubs da universidade, os quais, por
acaso, eram liderados pelo mesmo indivíduo.22 Mais uma vez, em 1921, Herbert J.
Seligman, da NAACP, recebeu uma repreensão severa de uma senhora preta em
Boston por um artigo que ele escrevera sobre Garvey. A senhora professou a filia-
ção à NAACP de Boston, à National Equal Rights League e à UNIA, uma vez que to-
das estavam trabalhando para a elevação da raça. Ela presumiu que Seligman era
branco e expressou acordo com as opiniões de Garvey sobre a falta de sinceridade
dos motivos brancos. “Se Garvey fracassar e todos nós perdermos nosso dinheiro, é
problema nosso”, ela se irritou, “e temos bom senso o bastante para saber e perce-
ber que existe a possibilidade de fracasso em tudo na vida, exceto na morte”. Seli-
gman conseguiu apenas uma resposta fraca sobre seu direito de criticar tanto pre-
tos quanto brancos e os "fatos" nos quais seu artigo foi baseado. 22 A dupla filiação
nas organizações rivais pode ter se tornado mais difícil após 1924, pois a conven-
ção da UNIA daquele ano por unanimidade aprovou uma resolução no sentido de
que qualquer pessoa que ingressasse à UNIA considerada membro da NAACP teria
que se retirar de um dos dois.24

A luta entre o NAACP e o UNIA atingiu sua maior personificação na rivalida-


de pessoal entre Du Bois e Garvey. Antes da chegada de Garvey aos Estados Unidos,
Du Bois havia se envolvido por muitos anos em uma celebrada altercação ideológi-
ca com Booker T. Washington, indiscutivelmente o homem preto mais poderoso da
América nas duas décadas anteriores à sua morte em 1915. Além de as diferenças
ideológicas muito reais entre os dois homens, as iniciativas de Du Bois contra Wa-
shington poderiam ser interpretadas como uma tentativa de arrancar dele o manto
de líder supremo não oficial da raça. Com a morte de Washington, pode ter pareci-
do por uma temporada que Du Bois agora estava livre de competições sérias. No
entanto, quatro meses após o enterro de Washington, Garvey havia chegado obscu-
ramente aos Estados Unidos e, em 1920, havia estabelecido, além de qualquer dú-
vida razoável, o fato de que o país mais uma vez tinha um líder de raça de estatura
suficiente para ofuscar sériamente seus contemporâneos. Ele apareceu do nada e
ultrapassou a liderança atual com passos rápidos. A batalha que se desenvolveu
entre ele e Du Bois superou de longe em acrimônia o debate anterior Washington-
Du Bois. Este último foi, pelo menos externamente, um caso bastante refinado. A
batalha de Du Bois- Garvey logo degenerou em uma competição sem barreiras, em
que todas as pretensões ao decoro foram dispensadas.

O que foi mais fascinante sobre a luta Garvey-Du Bois foi que ela foi, no sen-
tido mais real, uma continuação do debate Washington-Du Bois. As questões ideo-
lógicas levantadas eram basicamente as mesmas. Além disso, Garvey era um discí-
pulo de Washington muito autoconsciente. Junto com sua admiração por Washing-
ton, Garvey logo absorveu uma antipatia por Du Bois. Ele, portanto, se via como o
herdeiro da luta de Washington contra Du Bois e nunca perdeu a oportunidade de
comparar os dois, em detrimento de Du Bois.

É impossível apontar a data exata em que Garvey teve pela primeira vez co-
nhecimento das idéias de Washington. As Índias Ocidentais da infância de Garvey
há muito tempo foram expostas a debates sobre a questão da educação industrial,
o tipo popularizado por Washington. Esses debates nas Índias Ocidentais haviam
precedido Washington em muitos anos. No entanto, nas Índias Ocidentais, como na
América, a influência de Washington forneceu uma fonte de interesse crescente
nas escolas industriais e agrícolas. Quando menino, Garvey morou na paróquia de
St. Ann's na costa norte da Jamaica, onde em 1909 o pioneiro Pan-Africanista Bar-
badiano Dr. Albert Thome começou uma escola industrial.25 Nessa época, o inte-
resse pelos experimentos educacionais de Washington era generalizado nas Ilhas e
os alunos das Índias Ocidentais estavam freqüentando o Instituto Tuskegee de Wa-
shington. Vários delegados das Índias Ocidentais participaram da Conferência In-
ternacional de Washington sobre o Negro, realizada em Tuskegee em 1912. Entre
eles estava um grupo de educadores jamaicanos, incluindo o diretor de educação
da Ilha. Uma resolução apresentada na Conferência pelos delegados britânicos das
Índias Ocidentais, entre eles professores e alunos em Tuskegee, pedia a construção
de um Tuskegee nas Índias Ocidentais e uma visita às Ilhas por Booker T. Washing-
ton.26 Não demorou muito para nesta conferência (relatada no Africa Times e Ori-
ent Review com sede em Londres para a qual Garvey trabalhou) que Garvey leu a
autobiografia de Washington, Up From Slavery. Isso teve um efeito profundo sobre
ele e é a partir desse evento que, como ele disse, seu "destino" de ser um líder da
raça desceu sobre ele.27

Uma carta de Garvey a Washington em 1915 referia-se a uma carta anterior


de 1914 e à resposta de Washington convidando Garvey para Tuskegee. Garvey
expressou sua intenção de deixar a Jamaica em maio ou junho de 1915 para uma
turnê de palestras que seria confinada principalmente ao público da raça no sul.
Esta seria uma viagem para arrecadar fundos para fornecer os recursos para alivi-
ar o sofrimento na Jamaica. Ele escreveu: “Não preciso relembrá-lo da condição
horrível que prevalece entre o nosso povo nas Índias Ocidentais, visto que você
está tão bem informado sobre os acontecimentos em Negrodom”. Ele incluiu um
manifesto da UNIA que afirmava entre seus "objetivos locais" (em oposição aos
objetivos internacionais) o estabelecimento de faculdades industriais.28 Washing-
ton respondeu duas semanas depois prometendo fazer tudo o que pudesse para
tornar a estada de Garvey nos Estados Unidos o mais lucrativa possível . 29 Menos
de sete meses depois, porém, Washington estava morto.

Garvey, portanto, adiou sua visita e realizou uma reunião em memória de


Washington no Kingston’s Collegiate Hall. Ele também se ocupou em dar palestras
por toda a Ilha, levando a vida e o trabalho de Washington à atenção, em suas pala-
vras, "do adormecido público Negro na Jamaica". Ele informou ao associado de Wa-
shington, Emmett J. Scott, que em breve estaria realizando sua viagem para arreca-
dar fundos para seu "Projeto de Fazenda Industrial e Instituto". 30 A essa altura,
Garvey estava imerso nas ideias de Washington. Em fevereiro de 1916, o timbre de
seu papel timbrado trazia uma citação de Washington no sentido de que o homem
no topo não poderia segurar o homem embaixo sem ele próprio descer também.
Ele reiterou, em uma carta ao sucessor de Washington, R. R. Moton, seu desejo de
estabelecer uma Fazenda e Instituto Industrial na Jamaica nas mesmas linhas da
Tuskegee para ensinar “orgulho racial, desenvolvimento racial e outros assuntos
úteis”. Ele até se referiu em termos de Washingtonianos, à assistência menor de
"pessoas brancas cultas". 31 Quando Moton fez uma breve visita à Jamaica logo
após esta carta, Garvey conseguiu trocar algumas palavras com ele, apesar dos es-
forços para impedir qualquer contato por parte de pessoas que agora considera-
vam Garvey um incômodo.32

Esse breve encontro com Moton foi em março de 1916, o mesmo mês em
que Garvey deixou a Jamaica e foi para os Estados Unidos. Durante sua primeira
viagem aos Estates, ele foi para Tuskegee e conheceu Emmett J. Scott, que o apre-
sentou a pessoas influentes.33 Garvey voltou a Tuskegee no final de 1923. Desta
vez, ele ficou alguns dias, falou aos alunos e deixou o que o jornal estudantil cha-
mou de uma “contribuição substancial” de cinquenta dólares para o fundo de bol-
sas. Ele fez uma promessa de um presente anual. “A língua me falha”, escreveu ele
no final de sua visita, “para expressar meu alto apreço pelo serviço que o Dr. Wa-
shington prestou a nós como um povo”.34

É claro que Washington foi, e continua sendo, uma figura histórica contro-
versa. Muitos o viram principalmente como um grande acomodador, disposto a se
comprometer com o racismo para ganhar tempo para o homem preto em sua luta
pela sobrevivência. Garvey não estava alheio a esse aspecto da carreira de Wa-
shington. Ele acreditava que a relutância de Washington em se entregar a uma agi-
tação aberta por direitos políticos e sua dependência da filantropia branca podem
ter sido inevitáveis durante a vida de Washington. Na nova realidade do mundo do
pós-guerra, no entanto, “O próprio Negro educado industrialmente desenvolveria
um novo ideal, após ter sido treinado pelo Sábio de Tuskegee”. Em vez de atacar
Washington nesses pontos, ele preferiu argumentar que o próprio Washington
teria feito esses tipos de ajustes se tivesse vivido.35
Garvey tornou-se cada vez mais intolerante com o sucessor de Washington,
R. R. Moton, quando ficou claro que ele não faria os ajustes necessários à nova era.
Garvey o denunciou abertamente no final da década de 1920 e em 1929 ele escre-
veu: “Dr. Moton é mantido por filantropos brancos, portanto, tal homem preto não
tem absolutamente nenhum direito de falar em nome da raça Negra.” 36

Garvey, portanto, estava ciente e não necessariamente aprovava os elemen-


tos do programa de Washington que o levaram a ser rotulado como um acomoda-
dor. O que ele mais tipicamente viu na carreira de Washington foi autossuficiência
e orgulho racial, qualidades que ele professou não ver em Du Bois. Pois, enquanto
Washington foi “um criador e construtor que, do nada, construiu a maior institui-
ção educacional e industrial da raça nos tempos modernos”, Du Bois foi “um fan-
farrão e iconoclasta” cheio de “críticas cruéis e maliciosas sobre outros homens.”
Washington, disse ele, valia, portanto, mais que dois milhões de Du Boises. 37 Da
mesma forma, Garvey viu na UNIA uma continuação da hostilidade de Washington
à "igualdade social"38, como a mistura social generalizada entre as raças era fre-
quentemente chamada. Outro aspecto da carreira de Washington que Garvey tam-
bém admirou foi o alcance mundial de sua influência.39

Se Garvey ficou desencantado com R. R. Moton, em T. Thomas Fortune, edi-


tor do Negro World, ele tinha um associado próximo que fora por muitos anos um
assessor próximo de Washington. Na verdade, Fortune pensava que devia ter co-
nhecido Washington mais intimamente do que qualquer outra pessoa durante os
dezoito anos do relacionamento deles. Quase não se passou um dia durante esse
período, disse ele, sem os dois estarem em contato direto, seja pessoalmente, por
carta ou por telegrama.40 Com a morte de Fortune em 1928, o Negro World esbo-
çou as ligações entre Washington, Fortune e Garvey. O jornal dizia:

...Sr. Fortune foi por muitos anos guia, filósofo e amigo do maior edu-
cador industrial, que os brancos adoravam elogiar e os pretos idolatravam.
Então, uma felicidade do destino decretou que ele deveria ser ajudante do
único homem que, aqui ou no exterior, superou em tamanho a grandeza de
Washington - que, começando de onde Washington parou, carregou rápido
e alto a tocha da verdadeira emancipação para a raça Negra... 41

O contato entre Du Bois e Garvey começou inocentemente. Du Bois relem-


brou: "Ouvi falar dele pela primeira vez quando estava na Jamaica, em 1915, quan-
do ele enviou uma carta 'apresentando seus cumprimentos' e dando-me 'boas-
vindas calorosas à Jamaica, na parte da United Improvement and Conservation As-
sociation [sic].'”42 Em um panfleto publicado na mesma época, Garvey incluiu Du
Bois em uma longa lista de heróis da raça.43 A estima de Garvey por Du Bois dura-
ria pouco, no entanto. Du Bois disse muitos anos depois que nesta viagem à Jamai-
ca foi “surpreendentemente bem recebido por pessoas de cor e brancos”. 44 Possi-
velmente por causa disso, e possivelmente por causa da aparente ausência na Ja-
maica dos aspectos mais flagrantes do racismo americano, ele pode ter sido tem-
porariamente enganado, como muitos visitantes norte-americanos desavisados,
pensando que o problema da raça na Jamaica havia sido resolvido. Pois em feverei-
ro de 1916 Garvey, agora aparentemente desencantado com Du Bois, escreveu em
uma carta a Moton em Tuskegee: “Não acredite como o homem de cor Dr. Du Bois
que o 'problema racial acabou aqui', exceto se você deseja admitir a total insignifi-
cância do homem preto. "Garvey continuou, significativamente: “Eu pessoalmente
gostaria de resolver a situação nas mais amplas linhas humanitárias . Eu gostaria
de resolvê-lo na plataforma do Dr. Booker T. Washington.” 45 Garvey mais tarde
atribuiu a interpretação equivocada de Du Bois da situação racial na Jamaica nesta
ocasião ao fato de que ele havia se associado nesta visita principalmente a casta de
pele clara local.46

O órgão oficial da NAACP, o Crisis, do qual Du Bois foi editor durante todo o
período americano de Garvey, reconheceu a presença de Garvey logo após sua che-
gada aos Estados Unidos. Uma breve declaração na edição de maio de 1916 obser-
vou: “Sr. Marcus Garvey, fundador e presidente da Associação Universal para o
Progresso Negro da Jamaica, B.W.I., está agora em visita à América. Ele fará uma
série de palestras sobre a Jamaica em um esforço para arrecadar fundos para o
estabelecimento de uma instituição industrial e educacional para Negros na Jamai-
ca”.

Quando isso apareceu, Garvey já havia visitado o escritório de Du Bois (em


25 de abril de 1916) com um pedido para que Du Bois presidisse sua primeira reu-
nião UNIA nos Estados Unidos. Esta reunião foi agendada para 9 de maio de 1916,
no St. Marks Hall, 57 West 138 Street, no Harlem. O assunto era “Jamaica”. Garvey,
neste estágio, presumivelmente estava disposto a ignorar seu desacordo com Du
Bois em vista do prestígio que o editor do Crisis iria emprestar a sua reunião. Em
qualquer caso, Du Bois, que não estava quando Garvey ligou, recusou, alegando um
compromisso fora da cidade.47 Garvey mais tarde afirmou ter ficado “pasmo” com
o que viu no escritório. Ele não foi capaz de dizer, disse ele, "se era um show de
brancos ou um vaudeville mestiço que ele conduzia na Quinta Avenida".48

Em 19J9, Garvey já havia emergido como um dos mais importantes Novos


Negros militantes do Harlem e, embora, como o próprio Du Bois admitiu, ele ten-
tasse o máximo que pudesse "explicar o movimento Garvey e ignorá-lo"49, ele não
poderia fingir totalmente que Garvey não existia. Por um lado, a referência ocasio-
nal a Garvey, às vezes explícita, às vezes velada, invadiu o Crisis. Durante a ausên-
cia de Du Bois na França em 1919, por exemplo, um longo editorial considerou fa-
voravelmente a nova demanda de África para os Africanos e até defendeu a migra-
ção limitada de Afro-americanos para a África, embora não à custa da luta em ca-
sa.50 Um breve relatório do Crisis no final daquele ano trouxe notícias do conflito
de Garvey com o promotor distrital em Nova York.51 No mesmo ano, um comissário
da UNIA na França cruzou o caminho de Du Bois e realmente compareceu ao Con-
gresso Pan-Africano organizado às pressas por este último.52 E em Dezembro, o
Crisis sentiu-se obrigado a afirmar o direito do Negro World e outros jornais pre-
tos radicais de publicar, em face de um ataque contra a imprensa preta por sulistas
no Congresso, apoiados pelo procurador-geral.53

Em 1920, Garvey estava muito próximo, senão no auge de sua carreira, de


modo que, embora Du Bois continuasse tentando, agora estava se tornando muito
difícil ignorá-lo. Por um lado, dois dos ex-associados de Du Bois estavam agora en-
tre os colegas mais próximos de Garvey. Eram John Edward Bruce e William H.
Ferris, ambos entre os cinquenta e nove que convocaram a reunião de fundação do
conhecido Movimento Niágara de Du Bois em 1905. Ambos foram condecorados
por Garvey. Bruce também havia sido presidente da Negro Society for Historical
Research, fundada em Yonkers, Nova York, em 1911. Du Bois era um membro cor-
respondente dessa sociedade. Assim como a Sra. Marie DuChatellier de Bocas del
Toro, Panamá, em 1920, uma organizadora da UNIA, e Duse Mohamed Ali, ex-
empregador de Garvey na Inglaterra e ele próprio ligado por um tempo à UNIA. O
mais convicto defensor Liberiano de Garvey, o Chefe de Justiça James J. Dossen, um
ex-vice-presidente da Libéria, era um membro honorário.54 Du Bois não poderia
ignorar as conexões Garveyistas de pelo menos parte dessa lista impressionante de
elementos altamente educados a quem chamou de "dez talentosos".

A partir do início de 1920, então, Du Bois começou a dirigir alguns editoriais


do Crisis para Garvey. Mesmo neste ponto, no entanto, ele ainda queria ignorar seu
novo rival e se limitou a referências veladas a Garvey, sem realmente nomeá-lo. Em
janeiro de 1920, ele publicou um editorial favorável sobre o novo clima de separa-
tismo e consciência racial expresso em slogans como "Ásia para os asiáticos" e
"África para os Africanos". Ele sugeriu que o homem branco deveria sair das co-
munidades pretas em todo o mundo ou fornecer "justiça absoluta para todos". .
“Aqui está a escolha”, escreveu ele. "O que vocês terão, meus mestres?" 55 Em mar-
ço, porém, em resposta às críticas ao caráter inter-racial da NAACP de uma fonte
não identificada, um editorial do Crisis argumentou que os pretos não podiam lutar
por igualdade na sociedade branca e separação ao mesmo tempo e defendeu vigo-
rosamente a participação branca na NAACP .56 Pouco depois, Garvey zombou do
recebimento da Medalha Spingarn por Du Bois pela fundação do Congresso Pan-
Africano. Ele considerou William Monroe Trotter (que havia rompido com Du Bois)
como tendo realizado uma tarefa mais digna ao apresentar uma petição de sua Liga
Nacional de Igualdade de Direitos à conferência de paz de Paris. Trotter, ele apon-
tou, tinha sido radical demais para o ponto de vista branco da NAACP.57

Duas semanas antes do início de sua convenção de 1920, Garvey escreveu a


Du Bois:

Caro Dr. DuBois:

Na Convenção Internacional dos Negros a ser realizada em Nova


York durante o mês de agosto, o Povo Negro da América elegerá um líder
por voto popular dos delegados dos quarenta e oito Estados da União. Este
líder eleito será o porta-voz credenciado do Povo Negro americano. Solicita-
se que você seja bom o suficiente para nos permitir colocar seu nome na in-
dicação para o cargo.

Du Bois permaneceu aparentemente calmo em face desse ataque ao seu ego.


"Agradeço a sugestão", respondeu ele, "mas em nenhuma circunstância posso
permitir que meu nome seja apresentado." Ele então retaliou com uma série de
pedidos de Garvey por informações detalhadas sobre finanças UNIA, membros,
propriedades, “atividades e realizações” e muito mais, para uma “estimativa críti-
ca” a ser publicada no Crisis.58

Logo após o início da convenção, foi anunciado que Du Bois havia participa-
do de uma sessão antecipada. Isso gerou uma denúncia de Garvey de Du Bois, que
atraiu os aplausos mais entusiásticos do dia. Em uma referência a duas das publi-
cações mais conhecidas deste último, Garvey declarou que Du Bois não poderia
pregar "aliança" (com a América branca) um dia e "desagrado" no dia seguinte. 59
Para aumentar seu desconforto, Du Bois tinha sido erroneamente responsabilizado
pelo Chicago Tribune pelo slogan “de Volta à Africa” naquela cidade, no qual Gar-
vey estava supostamente implicado. “No meio da convenção, Garvey informou a
um entrevistador da National Civic Federation que Du Bois representava o “Negro
pré-guerra” em oposição ao Novo Negro militante do pós-guerra. Quatro dias de-
pois, Du Bois disse ao mesmo entrevistador que Garvey não era sincero. Ele tam-
bém disse aqui o que se tornaria uma espécie de obsessão para ele, ou seja, que os
seguidores de Garvey eram "o tipo mais baixo de Negros, a maioria das Índias" e
que a UNIA não poderia de forma alguma ser considerado um movimento Afro-
americano. Ele também denunciou Garvey como um aliado dos bolcheviques e de
Sinn Feiners.61
Apesar dessa denúncia direta de Garvey feita em particular, Du Bois conti-
nuou sua política de ataque público velado no Crisis, a edição de setembro do qual
publicou um editorial sobre os caribenhos dirigido, na própria admissão de Du
Bois, a Garvey e a UNIA.62 desta vez, os esforços de Du Bois para ignorar Garvey
chamaram a atenção de Chandler Owen e A. Philip Randolph, cujo Menssenger em
um editorial intitulado "Um Registro das Raças Mais Escuras" (uma tirada com o
subtítulo do Crisis) apontou que o Crisis não correspondeu ao seu subtítulo. O
Menssenger mostrou que, embora o Crisis tenha mencionado eventos raciais me-
nores, ele permitiu que os acontecimentos espetaculares de Garvey na cidade de
Nova York não fossem relatados.63 Talvez em resposta a essa crítica, o Crisis de
novembro finalmente tomou conhecimento da convenção de Garvey de agosto em
algumas breves linhas ocultas no meio de várias notícias breves e relativamente
sem importância.64 Essa mesma edição publicou outro editorial de Du Bois contra
ataques de fontes não identificadas em sua defesa da igualdade social. Desta vez,
Du Bois tentou usar Booker T. Washington contra o campo dos Garveyistas neo-
Washington, sugerindo que o próprio Washington, o grande oponente da igualdade
social, havia participado de eventos com os brancos.65 A resposta Garveyista usual
a esse tipo de argumento era, é claro, que Washington pegou o dinheiro dos bran-
cos, mas construiu para si uma base de poder preto independente com ele. Garvey
provavelmente não sabia, mas seu desprezo pelo histórico de dependência de
brancos de Du Bois era compartilhado por Mary White Ovington, que contrastava
privadamente a influência de Du Bois entre os brancos com sua influência menor
entre os pretos, mesmo dentro da NAACP. Ela então comentou, com um desprezo
não inferior ao de Garvey: “Sua carreira foi feita pelos brancos; primeiro o Dr.
Bumstead [o presidente da Universidade de Atlanta que contratou Du Bois), depois
vários membros da NAACP.”66 A própria Ovington manteve uma relação imprová-
vel com o Negro World, que em 1921 e 1922 publicou regularmente sua coluna“
Book Chat ”.

Sua tentativa de fingir publicamente que Garvey não estava lá, tendo falha-
do em garantir o desaparecimento de Garvey, Du Bois, em novembro de 1920, de-
cidiu que havia chegado a hora de cancelar o fingimento. Ele escreveu a W. A. Do-
mingo, agora um conhecido inimigo de Garvey: “Posso perguntar se você tem al-
guma informação sobre o Sr. Marcus Garvey e suas organizações que estaria dis-
posto a me dar?” Ele perguntou também sobre o endereço de Eliezer Cadet, o co-
missário Haitiano da UNIA que compareceu ao seu Congresso Pan-Africano em
Paris de 1919. A carta foi devolvida a ele e ele a enviou ao historiador Arthur A.
Schomburg na esperança de que Schomburg pudesse localizar Domingo e encami-
nhá-la.67 A carta parece não ter ido além de Schomburg, mas o Crisis de dezembro,
no entanto, apresentou um Artigo de Du Bois intitulado “Marcus Garvey.” A batalha
agora estava irrevogavelmente travada.

Nesse artigo, como na maioria, mas não todos, os comentários publicados


sobre Garvey, Du Bois afetou a postura do observador acadêmico imparcial - uma
postura que nunca impediu que suas análises de Garvey fossem em vários graus
distorcidas e imprecisas. No entanto, enganou muitos comentaristas sobre o confli-
to Du Bois-Garvey durante o meio século seguinte, fazendo-os pensar que Du Bois
sempre foi, na verdade, justo e imparcial. Enquanto em agosto Du Bois denunciara
em particular Garvey como um simpatizante bolchevique insincero liderando um
bando de índios ocidentais ignorantes, agora sua pose pública era um pouco mais
suave. Ele caracterizou Garvey como “essencialmente um homem honesto e since-
ro”, mas possuidor de uma longa lista de defeitos de caráter. Várias de suas princi-
pais objeções a Garvey foram declaradas. Esnobe inveterado que era, ele zombava
do que considerava defeitos de treinamento de Garvey, da mesma forma que há
muito esfolava todos aqueles, incluindo Washington, que não reconheciam o direi-
to quase divino do "décimo talentoso" de liderar a raça. Novamente, como sempre,
Garvey foi descrito como um líder dos camponeses pretos da Jamaica, mas não co-
mo um líder dos Afro-americanos. O conflito contínuo entre o Congresso Pan-
Africano e a UNIA também teve uma prévia. Ao tentar estabelecer que Garvey não
podia se dar bem com seus colegas de trabalho, ele se exagerou, alegando como
prova o fato de que nenhum dos quinze nomes dos oficiais de Garvey em 1914
aparecia em uma lista semelhante para 1918.68 A verdade da questão era, é claro,
que a lista de 1914 compreendia o primeiro executivo Jamaicano de Garvey, en-
quanto a lista de 1918 representava sua organização americana. John Edward Bru-
ce atacou Du Bois neste ponto.69

Du Bois publicou uma segunda parte dessa crítica em janeiro. Aqui, ele ata-
cou Garvey na questão dos retintos versus os de pele clara e o acusou de levantar
essa questão em um país onde, de acordo com Du Bois, era uma não-questão. Ele
também se opôs ao antagonismo de Garvey contra os imperialistas britânicos e
divulgou a informação de que em julho de 1920 ele havia enviado "uma carta de
pesquisa cortês" a Garvey pedindo dados financeiros sobre a UNIA e a Black Star
Line. Ele esperava que Garvey lhe fornecesse essa informação e ficou chateado
porque sua carta permaneceu sem reconhecimento e sem resposta. Ele novamente
se exagerou, desta vez descrevendo o Yarmouth da Black Star Line como um navio
de madeira em vez de aço.70 Du Bois publicou posteriormente uma retratação des-
sa declaração por sugestão de Arthur B. Spingarn, chefe do comitê jurídico da
NAACP.71 desta vez, a controvérsia entre os dois homens despertou interesse sufi-
ciente para um “debate” a ser organizado na Igreja Mãe Bethel AME na Filadélfia.
Du Bois apresentou suas opiniões em 4 de abril de 1921. Garvey, escalado para
falar na semana seguinte, não pôde fazê-lo, pois ainda estava nas Índias Ociden-
tais.72

Após esses dois artigos, Du Bois voltou à sua política atacando Garvey sem
nomeá-lo. Em um desses ataques em maio de 1921, ele introduziu a questão de
uma concentração na luta puramente Afro-americana versus um movimento para
ligações imediatas entre as comunidades Africanas em todo o mundo. Du Bois, de-
pois de explodir a "horda de canalhas e sopradores de bolhas, pronto para conquis-
tar a África, juntar-se à revolução russa e votar no Reino de Deus amanhã", mani-
festou-se a favor de "um programa que diz: a batalha dos direitos dos Negros deve
ser lutada aqui mesmo na América”. Ele expressou a expectativa otimista, que ele
próprio repudiaria na próxima década, de que mais vinte e cinco anos de "luta inte-
ligente", como a que a NAACP estava travando, libertariam a raça na América. 73
Tais sentimentos isolacionistas do fundador do Congresso Pan-Africano não eram
tão incomuns como pode parecer à primeira vista. Pois Du Bois, nesta época, pare-
ce ter concebido essa organização mais como um clube social internacional para os
dez talentosos, em vez de um corpo engajado na luta real com base mundial, como
era o propósito da UNIA. Ele mesmo disse isso em uma carta ao Secretário de Esta-
do Charles Hughes, um mês após o lançamento deste artigo. Ele disse a Hughes, “O
Congresso Pan-Africano é para conferências, conhecimento e organização geral.
Não tem nada a ver com o chamado movimento Garvey e não contempla força nem
revolução em seu programa.” Ele continuou: “Tivemos a cooperação cordial dos
governos francês, belga e português e esperamos chamar a atenção e a simpatia de
todas as potências coloniais.” 74 O que é interessante nesta carta, além da evidência
do conceito não militante do Pan-Africanismo de Du Bois é que ela foi escrito na
época em que Hughes e o Departamento de Estado tentavam manter Garvey fora
dos Estados Unidos. Possivelmente, pode ter reforçado a convicção de Hughes so-
bre a indesejabilidade de Garvey. Garvey, por sua vez, estava bastante convencido
de que Du Bois contribuiu para sua exclusão. Du Bois escreveu uma carta seme-
lhante ao embaixador britânico em Washington.75 O objetivo dessas cartas era ob-
ter apoio governamental para o Congresso Pan-Africano de 1921 em Londres.

O Congresso Pan-Africano foi agendado para agosto e 1º de setembro e po-


de ter representado uma tentativa de desviar alguma atenção da convenção anual
de Garvey de agosto. Na véspera da convenção da UNIA, Garvey, recentemente de
volta de sua provação no Caribe, fez um apelo à unidade e convidou Du Bois, RR
Moton, Kelly Miller e Emmet J. Scott a comparecer. 76 Ele não poderia ter sido muito
sério, no entanto, porque ele quase simultaneamente descreveu Du Bois como "lí-
der da oposição" à UNIA e um "expoente da classe reacionária" que "manteve os
Negros na servidão e na peonagem".77 Além disso, a convenção praticamente co-
meçou com uma resolução denunciando o Congresso Pan-Africano. Isso foi apro-
vado em meio a aplausos.78 Durante a convenção, o Negro World publicou um rela-
tório das finanças da UNIA. Esta informação, há muito buscada por Du Bois, foi di-
ligentemente transcrita do jornal na sede da NAACP.79 E a convenção de Garvey
mais uma vez ganhou uma vaga menção entre os resumos de notícias do Crisis.80

Enquanto isso, na Europa, o Congresso Pan-Africano foi amplamente con-


fundido, apesar dos esforços de Du Bois, como algo Garveyista, para grande des-
gosto de seu fundador e alegria de Garvey, que exultou com a publicidade gratuita
à UNIA resultante da situação infeliz de Du Bois. Cada segunda palavra dita no con-
gresso de Du Bois tinha sido "Marcus Garvey", ele se gabou, e citou com grande
coleção de recortes de jornais europeus para apoiar sua controvérsia.81 Du Bois
não considerou necessário convidar qualquer participação da UNIA porque consi-
derava que o programa Garvey era muito "perigoso" e "impraticável". 82 As ideias e
a influência de Garvey, no entanto, continuaram a assombrar os procedimentos. Na
sessão de Londres, um estudante Nigeriano leu um artigo propondo "Um Programa
Africano", que era nada além de Garveyismo requentado, completo com a migração
Africana do Novo Mundo para o Continente-Mãe, um empréstimo da Libéria e o
estabelecimento de uma base na Libéria para conduzir eventualmente aos Estados
Unidos da África Ocidental.83 Mas o "corte mais cruel de todos" veio quando a pes-
soa deixada no comando do secretariado permanente estabelecido em Paris após a
conferência ser infectada com ideias Garveyistas. O próprio Du Bois explicou assim
este episódio: “Assim como o movimento Garvey fez sua tese de cooperação indus-
trial, o novo jovem secretário do movimento Pan-Africano, um professor de cor de
uma escola pública de Paris, queria combinar Investimento e lucro com a ideia da
Pan-África. Ele queria capital Negro americano para este fim. Tínhamos outras
ideias."84 Du Bois acrescentou que essa influência Garveyista quase destruiu sua
organização.
Os problemas do Congresso Pan-Africano de Du Bois de 1921 não foram
tornados menos preocupantes por uma torrente de comentários hostis que ema-
navam dos editoriais do Negro World de William H. Ferris. Du Bois, Ferris argu-
mentou, certamente deve estar cedendo à licença poética quando ousou chamar
sua reunião de Congresso Pan-Africano, embora pessoas como o oficial colonial
britânico e o estudioso africanista Sir Harry Johnston estivessem entre os patroci-
nadores. Foi Johnston, Ferris lembrou a seus leitores, que em sua arrogância havia
dito que nenhum afro-americano sabia nada sobre a África. A denominação incor-
reta de Du Bois também foi enfatizada por apresentar uma longa lista de territó-
rios Africanos (a grande maioria no Continente) não representado no congresso.
“Não houve nenhum Congresso ‘Pan-africano’ na Europa este ano”, concluiu este
editorial, “porque nem todos os Africanos responderam ao apelo de Du Bois”. Fer-
ris descreveu a reunião de Du Bois como uma piada, uma "adulteração racial", uma
"função exclusiva de faculdade", compreendendo trinta delegados e dois mil bran-
cos no dito "público".

Além disso, Ferris viu neste último esforço de Du Bois apenas o exemplo
mais recente da tendência de longa data de Du Bois ao plágio. Ele argumentou que
Du Bois havia incorporado o programa anti-linchamento de Ida Wells-Barnett sem
lhe dar crédito por isso. Oito anos depois que o Guardian de William Monroe Trot-
ter e a organização da raça apareceram, continuou Ferris, Du Bois começou uma
revista e organização em linhas semelhantes. O único crédito que deu a Trotter por
sua ideia foi chamá-lo de fanático. A curta história do Negro de Du Bois era apenas
uma versão mais curta de uma publicada nove anos antes por um homem preto a
quem Du Bois havia se referido como um arrivista. Dez anos antes, Duse Mohamed
Ali havia escrito a Booker T. Washington, Dr. W. S. Scarborough e Du Bois infor-
mando-os do surgimento iminente de sua revista destinada a aproximar as raças
mais escuras do mundo. Os dois primeiros enviaram respostas encorajadoras. A
resposta de Du Bois foi descrita por Mohamed como inútil e decepcionante. No
entanto, Du Bois mais tarde copiou a ideia de Mohamed. Agora, depois de ter en-
contrado falhas na convenção de Garvey de 1920, ele estava ocupado discutindo as
mesmas coisas em seu congresso e tentando estabelecer uma organização perma-
nente.85

De volta à América após o congresso, Du Bois recebeu uma tempestade de


críticas de Garvey e outros, incluindo o adversário de Garvey, Cyril Briggs, sobre
um relatório da Associated Press amplamente divulgado. Este relatório citou Du
Bois como tendo dito durante o congresso que não apenas os afro-americanos não
tinham nenhum desejo de expulsar os colonialistas da África, mas eles dificilmente
poderiam migrar para lá, já que não suportavam o clima. Garvey comentou: “Um
editor e líder chegou ao ponto de dizer em seu chamado Congresso Pan-Africano
que os Negros americanos não podiam viver na África, porque o clima era muito
quente.”86 Du Bois mais tarde tentou se livrar desso declaração. Ele negou, mas
diluiu sua negação um pouco, acrescentando que, só porque o bisavô de alguém
pode ter sido Africano, não significava que o clima Africano não o causaria terror.87

Em seu retorno, Du Bois também teve que enfrentar contínuas divulgações


embaraçosas nas páginas do Negro World sobre seu Congresso Pan-Africano. Um
relatório, traduzido de um jornal português, lembra o convite de Du Bois aos colo-
nialistas portugueses para participarem de sua conferência. O artigo afirmava que
apenas Africanos escolhidos a dedo, membros da African League (Liga Africana),
foram autorizados a participar. Estes delegados regressaram então à África contro-
lada por portugueses, onde dois deles, Nicolan Santos Pinto e José de Magalhanes
[s/c], foram interrogados e obrigados a parar de falar quando tentavam exaltar as
virtudes do Congresso Pan-Africano. Eles foram confrontados por gritos de "Vida
longa à Marcus Garvey e ao Partido Nacional Africano (UNIA)". O público denunci-
ou Blaise Diagne (presidente senegalês conservador do congresso) em particular e
o congresso em geral.

Outro artigo, traduzido de uma revista francesa, era de um advogado de Pa-


ris, o Sr. Alcandre, que comparecera à sessão parisiense do congresso. O artigo re-
produzia uma resolução apresentada no congresso conclamando o órgão a convi-
dar Garvey para sua próxima reunião, em vez de atacá-lo injustamente em sua au-
sência. Diagne, presidindo a reunião, a princípio recusou-se a lê-lo. Quando ele leu,
foi de uma forma semi-compreensível no final da sessão. Alcandre, o patrocinador
da resolução, não tinha certeza se ela tinha sido aprovada ou não.88

No final de 1921, Du Bois tentava em vão persuadir a hierarquia da NAACP


a mudar sua sede para o Harlem.89 A disputa com Garvey pode muito bem ter au-
mentado as desvantagens de uma localização no centro, no lado branco da cidade
de Nova York.

Assim terminou o primeiro ano inteiro de aumento da hostilidade entre os


dois líderes. Durante o ano, seus seguidores e apoiadores se juntaram cada vez
mais à briga. Um Garveyista, Wheeler Sheppard, havia publicado um livro atacando
Du Bois porque pensava que Garvey não fora firme o suficiente com ele. O livro
trazia o título autoexplicativo, Erros de W. E. B. Du Bois, sendo uma resposta ao
ataque do Dr. W. E. B. Du Bois' ao Honorável Marcus Garvey. O autor se descreveu
como um "Orador de campo voluntário da UNIA" e enfatizou que Du Bois era "dú-
bio" e um adepto da "mentira científica", uma aparente referência à tática de Du
Bois de fazer distorções com linguagem aparentemente erudita e desapaixonada.

Du Bois acelerou sua campanha contra a filosofia e personalidade de Garvey


em 1922. No início do ano, Garvey figurou em sua lista anual de "débitos" "com o
Negro americano". Garvey apareceu na lista de débitos de Du Bois, juntamente com
o discurso do presidente Harding em Birmingham e o linchamento de 59 negros
durante o ano. Entre os "créditos" estavam o Projeto de Lei Anti-linchamento de
Dyer e, naturalmente, o segundo Congresso Pan-Africano.90 A resposta de Garvey
foi chamar seu adversário de "doido lunático ou um empregado sem alma" pago
por uma raça alienígena para sugerir que seus navios eram lucro em vez de prejuí-
zo.91 Algumas páginas depois da lista de débitos e créditos, Du Bois escorregou em
outro ataque a Garvey em meio a um elogio ao coronel Afro-americano Charles
Young, que morrera na África Ocidental. Ele escreveu sobre Young: “Mas a África
precisava dele. Ele não gritou e arrecadou dinheiro e não anunciou grandes es-
quemas e desfilou em vermelho - ele apenas foi em silêncio, ignorando o apelo e o
protesto.” Como se isso não bastasse, Du Bois incluiu mais um editorial anti-Garvey
camuflado na mesma página. Este, intitulado “África para os Africanos”, sugeria
que “a África deveria ser administrada para os Africanos e, o mais rapidamente
possível, pelos Africanos”. Ele enfatizou que "não queria dizer com isso que a África
deveria ser administrada por índios ocidentais ou Negros americanos." 92 Assim,
enquanto Garvey clamava por um governo Africano imediato, com índios ociden-
tais e Afro-americanos fornecendo pessoal extra qualificado, Du Bois, em 1922,
parecia contente em seguir a mentira colonialista de que eles estariam gradual-
mente treinando Africanos atualmente incompetentes para um eventual autogo-
verno. Vários Africanos protestaram contra esta e outras declarações semelhantes
provenientes de Du Bois e Blaise Diagno.

No cenário doméstico, as críticas de Garvey parecem ter aguçado a análise


de Du Bois da realidade afro-americana. Pois, enquanto em 1921 ele argumentou
que Garvey praticamente introduziu o antagonismo de cor intra-racial no cenário
americano onde ele praticamente não existia,94 agora o sucesso de Garvey o fez
pensar novamente. Em mais um longo ataque a Garvey sem nomeá-lo expressa-
mente, ele se referiu a seu adversário como "o Demagogo". “De agora em diante em
nosso novo despertar”, declarou ele, “com nossa autocrítica, nossa impaciência e
paixão, devemos esperar o Demagogo entre os Negros cada vez mais. Ele virá para
liderar, inflamar, mentir e roubar. Ele reunirá muitos seguidores e então explodirá
e desaparecerá. Prejuízo e desespero seguirão sua queda até que surjam novos
falsos profetas.” No entanto, ele reconheceu que seu suposto demagogo encontra-
ria em 1922 um campo fértil de divisão crescente “entre nossas classes sociais in-
cipientes”. A opressão branca, argumentou ele, restringiu artificialmente as dife-
renças de classe entre os Negros. Mas essas diferenças, embora não tão grandes
como seriam na ausência de tal discriminação, existiam de qualquer forma. “No
entanto”, argumentou ele, “os laços entre nossos privilegiados e explorados, nossos
educados e ignorantes, nossos ricos e pobres, nossos claros e escuros, não são co-
mo deveria e como o que podemos e devemos torná-los”.95 A admissão de Du Bois
de que existiam antagonismos na sociedade Afro-americana entre “claro e escuro”
é importante porque antes disso, e na verdade também depois, ele preferia tratá-lo
como um assunto tabu a não ser discutido, exceto para culpar Garvey por introdu-
zi-lo.

Depois dessa enxurrada de ataques furtivos durante a primeira metade de


1922, Du Bois decidiu que havia chegado a hora de outro artigo abertamente diri-
gido a Garvey. Ele, portanto, começou a coletar informações a partir de julho para
um artigo sobre a Black Star Line. Em 27 de julho, ele escreveu ao presidente do
Conselho de Navegação dos Estados Unidos para obter informações sobre as tenta-
tivas de Garvey de comprar navios do conselho. Ele explicou ao presidente que
Garvey havia coletado talvez meio milhão de dólares em conexão com sua empresa
de navegação e insinuou a possibilidade de fraude. O presidente recusou-se a di-
vulgar qualquer informação, mas sugeriu que julgasse Joseph P. Nolan, que havia
atuado como advogado da Black Star Line em algumas dessas transações.96 Des-
temido, Du Bois escreveu ao Departamento de Estado. Ele foi solicitado a fornecer
uma declaração explicando seu interesse no assunto antes que uma decisão pudes-
se ser tomada sobre se atenderia a seu pedido. Ele acatou a sugestão, explicando
que “o Black Star Une foi promovido por um agitador das Índias Ocidentais chama-
do Marcus Garvey. Ele arrecadou dos negros da América e das Índias Ocidentais
quase $ 800.000. ” Muitas pessoas, ele sugeriu, perderam dinheiro no processo.
Entre eles estavam os leitores do Crisis. Ele, portanto, agora queria publicar a ver-
dade e alertar os leitores contra tais esquemas. Mais uma vez, porém, a informação
foi recusada. Ele foi informado de que os arquivos eram confidenciais.91 Enquanto
aguardava essas respostas, Du Bois foi em frente e escreveu o artigo mesmo assim
e obteve aconselhamento jurídico antes de enviá-lo à imprensa para garantir que
não fosse difamatório.98

Grande parte dessa atividade estava acontecendo durante agosto, o mês da


convenção de Garvey. Um convite anterior de Garvey a Du Bois para comparecer e
deixar “a verdadeira liderança” liderar a raça aparentemente não foi aceito. Nem o
convite de Garvey para a NAACP participar do desfile da convenção junto com um
banner com o nome da associação.99

O artigo da Black Star Line apareceu na revista Crisis de setembro. Foi cui-
dadosamente documentado para evitar a possibilidade de processos por difama-
ção, com a maioria das informações importantes na forma de citações diretas do
Negro World e do caso Orr (onde um acionista processou a Black Star Line, resul-
tando na exposição pública da maior perda financeira da empresa). Muitos dos
argumentos de Du Bois aqui foram repetidos posteriormente pela promotoria no
julgamento de 1923. Aqui, pela primeira vez em suas negociações com Garvey, Du
Bois foi capaz de controlar sua raiva por tempo suficiente para empregar com efi-
cácia seus consideráveis talentos acadêmicos. E vindo como aconteceu no meio da
campanha “Marcus Garvey Must Go” (Marcus Garvey Deve Sair) e em um momento
em que Garvey já havia sido preso e indiciado por suposta fraude em conexão com
a empresa de navegação, o resultado foi o mais devastador dos ataques de Du Bois.
Com efeito, Du Bois presumiu a culpa e julgou um assunto que estava sub judice.
Isso, junto com suas cartas a funcionários do governo e sua amizade com o juiz que
logo presidiria o julgamento de Garvey, certamente deve ter prejudicado as chan-
ces de Garvey de uma audiência imparcial. Garvey considerou este ataque particu-
larmente infeliz, uma vez que, explicou ele, a Black Star Line representava não um
empreendimento no interesse dos indivíduos, mas um esforço para levantar uma
raça em dificuldades. “Se”, lamentou ele, “Du Bois fosse um líder construtivo, já que
possuía todo o conhecimento do mundo, ele ajudaria Marcus Garvey, a Associação
Universal para o Progresso Negro e a Black Star Line a fazer melhor.” 100 Du Bois
tentou ajudar a linha a ficar bem. Ele escreveu ao secretário de Estado para que
dois navios, de fato, assumissem a linha. 101

O artigo da Black Star Line marcou o início de uma série de ataques abertos
a Garvey. Um desses artigos apareceu em novembro e dizia respeito à deserção do
Dr. Leroy Bundy da NAACP para a UNIA. Bundy havia sido preso durante o massa-
cre de pretos em 1917 em East St. Louis por encorajar a comunidade negra a se
armar em legítima defesa e ser acusado de assassinato e incitamento à rebelião. Ele
colaborou por um tempo com a NAACP, que organizou um fundo de defesa e se
preparou para defendê-lo. Em algum lugar ao longo da linha, Bundy desentendeu-
se com a NAACP e desertou para o campo da UNIA. Durante a convenção de 1922,
ele foi nomeado cavaleiro por Garvey, e a convenção o elegeu primeiro presidente
geral adjunto. Em resposta às incessantes acusações da NAACP de má gestão finan-
ceira, Garvey rebateu com uma acusação própria. O que, indagou o Negro World,
havia acontecido com os $50.000 arrecadados pela NAACP para a defesa de Bundy?
Apenas $150 foram gastos em Bundy, acusou o jornal. O diretor jurídico da NAACP,
Arthur Spingarn, sugeriu que Du Bois publicasse um "resumo muito breve dos de-
sembolsos e despesas no caso Bondy [sic]". 102 Du Bois publicou um artigo de seis
páginas sobre o caso, que foi devidamente repudiado por dois editoriais de Ferris
no Negro World.103
O ano de 1923 foi saudado por uma tentativa de Du Bois de provar que a
UNIA tinha menos de 18.000 membros.104 Para fazer isso, ele publicou um relató-
rio financeiro da UNIA que alegou ter sido suprimido até então. O número de assi-
naturas era relativamente pequeno e Du Bois presumiu que todas as agências ha-
viam enviado todas as suas assinaturas e que os membros pagantes e os membros
ativos eram necessariamente os mesmos. Quando ele descobriu que apenas cerca
de 200 delegados haviam votado na convenção de 1922, ele concluiu que isso era
uma indicação do pequeno número de delegados presentes, não percebendo que
os votos eram dados por delegação em vez de individualmente. As conclusões de
Du Bois sobre a adesão aqui foram obviamente um eufemismo grosseiro. Quando
estimativas do governo puderam estimar conservadoramente 20.000 a 25.000
pessoas presentes na primeira sessão da convenção de Garvey de 1920 ou 3.000
pessoas em uma reunião apenas da filial de Chicago, ou 100.000 pessoas desfilan-
do e congestionando as calçadas do Harlem em 1926 exigindo a libertação de Gar-
vey, então a enormidade da subestimação de Du Bois fica clara.105

Garvey, nesta fase, emitiu uma resposta a seus muitos críticos, alegando, en-
tre outras coisas, a acusação de que seus seguidores representavam "os ignorantes
e ingênuos". Esta declaração de Garvey apareceu quase ao mesmo tempo que um
comunicado de imprensa da NAACP de 25 de janeiro 106 dando publicidade prévia
ao ataque mais elaborado de Du Bois contra Garvey, um artigo de dez páginas que
apareceu na edição de fevereiro da revista branca Century. O artigo retratou Gar-
vey como uma figura semicômica. Começava assim: 'Havia um porão de igreja lon-
go, baixo, inacabado e coberto. Um negrinho gordo, feio, mas com olhos inteligen-
tes e cabeça grande, estava sentado em uma plataforma de tábuas ao lado de um
'trono', vestido com um uniforme militar do tipo mais alegre do meio-vitoriano ...
Entre os sortudos ganhadores de títulos estava o ex-secretário particular de Boo-
ker T. Washington! ” Neste artigo, Du Bois reafirmou a maioria de suas diferenças
ideológicas e outras diferenças com Garvey. Primeiro havia a questão da raça. Ele
insistiu contraditoriamente que as linhas de cor intra-raciais eram essencialmente
um fenômeno das Índias Ocidentais, "apesar das aristocracias quase brancas de
cidades como Charleston e Nova Orleans, e apesar do fato de que a proporção de
mulatos que eram livres e que ganharam alguma riqueza e educação era maior do
que os pretos por causa do favor de seus pais brancos.” Ele até admitiu que após a
emancipação na América “a casta de cor tendia a surgir novamente” e que em sua
própria época estava na moda os Afro-americanos de pele clara se passarem por
espanhóis ou portugueses. Diante de todas essas evidências voluntárias em contrá-
rio, ele teimosamente insistiu que o antagonismo intra-racial de cores era pratica-
mente desconhecido na Afro-América, porque o racismo branco que permeia tudo
forçava os de pele clara a se referir a eles mesmos como pretos. Que essa posição
se devia em grande parte ao seu próprio sentimento de vulnerabilidade como pes-
soa de cor muito clara, foi aparentemente admitido inconscientemente quando ele
declarou: “Pessoas de cor tão brancas quanto as mais brancas passaram a se des-
crever como pretas. Imagine, então, a surpresa e o nojo desses americanos quando
Garvey lançou seu esquema de cor jamaicano.” Para alguém tão sensível quanto Du
Bois em relação à sua cor, a questão intra-racial sobre cor era mais bem tratada
pelo silêncio. Ele disse isso neste artigo, embora tenha impingido sua ideia à maio-
ria dos Afro-americanos. Ele disse, "passou a ser geralmente considerado o gosto
mais pobre possível para um negro até mesmo para se referir a diferenças de cor.”
Junto com sua recusa em admitir uma questão doméstica de cor dentro da
raça, Du Bois chegou muito perto neste artigo de um tratamento com tom condes-
cendente e até ofensivo da pretitude de Garvey. Garvey, é claro, muitas vezes acu-
sou Du Bois de odiar o sangue preto dentro dele e de ansiar pela sociedade branca.
Esta faceta da experiência de Du Bois recebeu posteriormente um tratamento aca-
dêmico pelo eminente sociólogo Afro-americano E. Franklin Frazier. A análise de
Frazier aproximou-se da de Garvey. Ele definiu Du Bois como um "homem margi-
nal". Ele escreveu:

Ele nasceu na Nova Inglaterra, onde suas características de mulato


lhe permitiram um alto grau de participação na vida do mundo branco. Du-
rante sua curta estada no Sul como estudante de graduação na Fisk Univer-
sity, onde foi orientado por professores brancos da Nova Inglaterra, ele
nunca foi totalmente assimilado pela vida de Negro. Seu retorno à Nova In-
glaterra proporcionou-lhe um ambiente mais agradável, onde ele absorveu
completamente a refinada tradição intelectual de Harvard...

Mas Du Bois, aristocrata em porte e simpatia, era na verdade um hí-


brido cultural ou o que os sociólogos chamam de "homem marginal". De vol-
ta aos Estados Unidos e Atlanta, ele era apenas um “neguinho”. Fina flor da
cultura ocidental, ele tinha aqui o mesmo status que o Negro semibárbaro
mais cruel do sul. Em The Souls of Black Folk, temos uma afirmação clássica
do “homem marginal” com sua dupla consciência: por um lado, sensível a
todo desprezo em relação ao Negro, e sentindo, por outro lado, pouca afini-
dade ou simpatia real pela grande massa de camponeses rudes com os quais
ele foi identificado. Pois, apesar da maneira como Du Bois escreveu sobre as
massas, ele não tem uma compreensão simpática real delas. The Souls of
Black Folk é um retrato magistral da alma de Du Bois e não uma imagem re-
al das massas pretas. Quando ele pega sua caneta para escrever sobre as
massas pretas, temos a certeza de obter um quadro romântico deslumbran-
te. Alguém observou com propriedade que os Negros em “The Quest of the
Silver Fleece” são ciganos. A voz de Du Bois é genuína apenas quando ele fa-
la como representante dos “Dez Talentosos”... 107

No artigo da Century, Du Bois reafirmou sua afirmação de que Garvey era


essencialmente um líder dos camponeses das Índias Ocidentais que não tinha inte-
resse e não tinha muito conhecimento sobre as lutas Afro-americanas. Também era
recorrente aqui seu desdém típico por Garvey e por todos os outros que não havi-
am sido educados em Harvard e Berlim. “Garvey”, disse ele, “não tinha uma educa-
ção completa e uma ideia muito nebulosa da técnica da civilização”. Ele novamente
expressou sua desaprovação da atitude anti-imperialista de Garvey e acusou Gar-
vey de tentar assumir o controle da Libéria. A gangorra em sua mente entre sepa-
ração e integração agora estava firmemente do lado da integração. “Não na segre-
gação”, pontificou, “mas na união mais estreita e maior está a paz inter-racial”. E
com sua insistência contra a segregação, ele reconheceu a afinidade entre Booker
T. Washington e Garvey, descartou-os juntamente com a alegação de que

A atual geração de negros sobreviveu a duas graves tentações, a mai-


or, gerada por Booker T. Washington, que dizia: "Deixe a política pra lá, fi-
que na sua, trabalhe duro e não reclame", e que significava eterna casta de
cor para as pessoas de cor por sua própria cooperação e consentimento, e a
consequente inevitável deboche do mundo branco; e o menor, gerado por
Marcus Garvey, que disse: “Desista! Se entregue! A luta é inútil; voltar para a
África e lutar contra o mundo branco.”

O ataque da Century, o mais abrangente de Du Bois, não ficou sem resposta.


A resposta de Garvey foi rápida e amarga. Ele se dirigiu primeiro às calúnias raci-
ais. A manchete do Negro World proclamava: “W. E. BURGHARDT DU BOIS COMO
UM HATER DE PESSOAS ESCURAS." Seguiu-se um subtítulo: "Chama sua própria
raça de 'Preta e Feia', Julgando pelo Padrão de Beleza do Homem Branco". Garvey
declarou: “Este“ mulato infeliz, 'que lamenta todos os dias a gota de sangue Negro
em suas veias, lamentando não ser holandês ou francês, assumiu a responsabilida-
de de criticar e condenar outras pessoas enquanto se mantém como o socialmente
'inacessível' e o grande 'EU SOU' da raça negra.” Garvey, que sabe muito bem es-
crever de forma ácida, continuou a despejar desprezo e insultos nas observações
raciais de Du Bois. "Como ele chega, a sua conclusão de que Marcus Garvey é feio,
sendo Negro, é impossível determinar", ele se enfureceu , cedendo ao seu gosto por
se referir a si mesmo na terceira pessoa, "em que se houver alguma feiura na raça
Negra, isso se refletirá mais através de Du Bois do que de Marcus Garvey, no senti-
do de que ele mesmo nos diz que é um pouco holandês, um pouco francês e um
pouco Negro. Ora, o homem é uma aberração.” Garvey não conseguia ver por que
“esse professor, que vê feiura em ser preto, tenta ser um líder do povo Negro”. Ele
supôs que a comparação de Du Bois de pretitude com feiura e brancura com beleza
explicava "por que ele gosta de dançar com pessoas brancas, jantar com elas e às
vezes dormir com elas". Na atitude racial de Du Bois, ele preferiu encontrar uma
explicação “para os processos de clareamento e os escapes de alisamento de cabelo
de algumas pessoas que se identificam com a NAACP em seu desejo louco de se
aproximar da raça branca.” Foi também por essas razões, sem dúvida, que “o erudi-
to doutor” manteve uma “barba francesa”. Garvey também assumiu o crédito por
ter constrangido a NAACP após sua visita aos escritórios em 1916 ao contratar os
pretos James Weldon Johnson e William Pickens. Pickens, afirmou ele, deve ter
sido desagradável para Du Bois porque mais tarde veio a Garvey em busca de em-
prego.

Garvey também usou suas diferenças raciais com Du Bois para responder às
referências depreciativas de seu rival ao Liberty Hall como sendo um "porão baixo
e irregular de tijolo e pedra bruta". Du Bois havia contrastado esta estrutura com
vários edifícios próximos que ele considerava bonitos. Garvey conseguiu demons-
trar que todos os edifícios elogiados por Du Bois eram total ou parcialmente de
propriedade de brancos. Liberty Hall, ele argumentou, pelo menos representava a
autossuficiência preta. Du Bois, por outro lado, era um "mulato preguiçoso depen-
dente", o escárnio de Du Bois sobre a cavalaria de Garvey também era vista como
uma falta de consciência racial, pois ele certamente teria exultado com uma honra
semelhante de um potentado branco. (de fato, deve-se lembrar, Du Bois recebeu
em 1920 uma medalha Spingarn, nomeada em homenagem a um líder branco da
NAACP, e certamente não menos tolo do que uma honra Garveyista. E ele certa-
mente exultou mais tarde com a pompa dourada e com sobrecasaca que cercou sua
breve passagem como representante dos Estados Unidos na Libéria.)108
Nas incessantes piadas de Du Bois sobre as deficiências educacionais de seu
rival, Garvey também deu sua opinião. “Se a educação de Du Bois não o qualifica
para nenhum serviço melhor do que ser lacaio de brancos do bem”, comentou, “en-
tão seria melhor que os Negros não fossem educados”. O motivo do alvoroço sobre
as realizações educacionais de Du Bois, ele viu como decorrente do fato de que "ele
foi um dos primeiros ‘experimentos’ feitos por brancos com homens de cor na li-
nha do ensino superior." Apesar da veemência de sua resposta, Garvey não se refe-
riu a algumas das acusações de Du Bois. Ele ignorou a acusação de ser um campo-
nês jamaicano preto que não se interessava pela luta Afro-americana. Ele também
ignorou os ataques de Du Bois ao seu programa Liberiano e à sua atitude anti-
imperialista.109

Garvey repetiu muitos desses argumentos nos meses que se seguiram. Du-
rante esses meses, foi realizado seu julgamento e ele ficou preso aguardando fian-
ça. Ele saiu da prisão a tempo do terceiro Congresso Pan-Africano de Du Bois, no
entanto. Du Bois culpou Garvey pelo fraco desempenho deste congresso. Ele escre-
veu mais tarde que “O infeliz desastre de seus esquemas super-anunciados natu-
ralmente prejudicou e dificultou o desenvolvimento efetivo da ideia do Congresso
Pan-Africano.”110 No entanto, ambos Kelly Miller na América e o líder da Costa do
Ouro de Casely Hayford saíram nesta época em favor do programa Africano de
Garvey em vez do Congresso Pan-Africano de Du Bois.111
Nesse ínterim, em Londres, o Congresso Pan-Africano teve problemas e não
conseguiu aumentar o quórum para a sua última sessão; O representante de Gar-
vey em Londres relatou a presença de onze. O relatório de Du Bois relatou uma
representação maior que Garvey atribuiu à contagem dupla e à inclusão de algu-
mas pessoas curiosas que olharam brevemente. De todos os Africanos do mundo,
lamentou Garvey, Du Bois não poderia conseguir vinte para se encontrar com ele.
Em vez disso, os oradores principais, além do próprio Du Bois, que foi o orador
principal na maioria das sessões, eram "pessoas brancas com ideias peculiares so-
bre o Negro, especialmente Sir Sydney Olivier e H. G. Wells". “Por que um Congres-
so Pan-Africano em tal companhia?” Garvey queria saber. “A coisa é profana e está
fadada a morrer a morte dos injustos.”112 Críticas semelhantes foram feitas por A.
Philip Randolph e Chandler Owen, do Messenger, que publicou um editorial: “Dr.
Du Bois representou os doze milhões de Negros americanos, sem seu consentimen-
to, e o Sr. H. G. Wells, junto com alguns outros liberais ingleses brancos, sem dúvi-
da, constituíram a voz da seção Africana da Grã-Bretanha. ”113 Garvey fez a mesma
observação de forma mais pitoresca: “Du Bois não tinha mais direito ou autoridade
de convocar um Congresso Pan-Africano do que um gato tinha de convocar um
parlamento de ratos”.114 E o Negro World citou o Manchester Guardian sobre a
despreocupação demonstrada no congresso pela maioria dos Africanos proemi-
nentes da Grã-Bretanha.115

O fracasso de Du Bois em Londres foi seguido por uma sessão de seu con-
gresso em Lisboa, Portugal, organizado pela Liga Africana. De lá, ele viajou para a
Libéria, onde seria ministro plenipotenciário e enviado extraordinário em repre-
sentação do presidente Coolidge na segunda posse do presidente rei da Libéria em
1 de janeiro de 1924. Garvey relatou que Du Bois em seu retorno para casa foi ho-
menageado em um banquete no qual o juiz Mack, que presidiu o caso de Garvey em
1923, foi o convidado especial.116 E em setembro, o secretário de Estado Charles E.
Hughes informou ao presidente Coolidge, depois de ler uma petição da UNIA pe-
dindo ajuda para ir para a Libéria, que os seguidores de Du Bois eram muito maio-
res e mais respeitáveis do que os de Garvey.117 O Messenger, a essa altura bem na
campanha “Marcus Garvey Deve Sair”, aprovou as ações de Du Bois, argumentando
que se ele não tivesse feito nada na Libéria além de frustrar os planos de Garvey,
então sua viagem teria valido a pena.118

Em maio, Du Bois publicou o mais venenoso de todos os seus ataques a Gar-


vey. Este notório editorial, “Um Lunático ou um Traidor”, mostrou mais uma vez
que as diferenças entre os dois homens foram ofuscadas por suas diferenças de
raça, particularmente a questão dos antagonismos intra-raciais de cor e separação
em oposição à integração. O editorial condenou Garvey como um lunático ou trai-
dor que havia ultrapassado suas boas-vindas na América e agora devia ser “tranca-
do ou mandado para casa”. Ele alegou que “Nenhum Negro na América jamais teve
um julgamento mais justo e paciente do que Marcus Garvey”. Garvey, afirmou ele,
condenou-se por suas próprias “macaquices arrogantes” e ameaças de violência, e
pelas últimas razões lhe foi negada a fiança. Ele admitiu que J. W. H. Eason (a quem
ele na verdade não nomeou) fora responsável, depois que rompeu com Garvey, por
fornecer ao Crisis o demonstrativo financeiro da UNIA que Du Bois havia publica-
do.

A razão imediata para essa explosão foi um simpósio que Garvey enviou pa-
ra pessoas brancas influentes. O simpósio procurou garantir um sentimento favo-
rável entre os brancos para a separação racial e colonização Africana. Argumentou
com efeito que os pretos nunca seriam tolerados como iguais na América e, portan-
to, o programa de integração da NAACP poderia levar apenas a uma guerra racial.
Du Bois não foi o único integracionista levado à fúria por este simpósio. Os comu-
nistas o criticaram na primeira página do Daily Worker e os integracionistas socia-
listas pretos do grupo Messenger também o atacaram cruelmente.

É interessante notar que Du Bois estava em meio a graves dificuldades in-


ternas dentro da NAACP, neste momento, um fato que Garvey estava ciente. Ele
havia sido forçado a deixar a conferência anual da NAACP de 1923 e agora estava
acusando James Weldon Johnson, Walter White e Mary White Ovington de tentar
mantê-lo fora da conferência de 1924 iniciada em junho.119
Este último ataque Du Bois continha várias imprecisões factuais, e o Negro
World dedicou muito espaço para contra-ataques e refutações. T. Thomas Fortune
descreveu editorialmente o último esforço de Du Bois como uma “orgia de depre-
ciação imprecisa e abuso injurioso”.120 Mas a resposta mais imaginativa veio em
um editorial especial de Norton Thomas, editor associado do artigo de Garvey, inti-
tulado “Com desculpas a Shakespeare.” Esta foi na verdade uma adaptação de Júlio
Cesar de Shakespeare. Tudo começou no “Ato XCIX. Cena IX. Harlem. Sétima
Avenida. ” Continuou:

Entram William Pickens, William Du Bois e Weldon Johnson.

Du Bois (nervoso)
Aclamações novamente.

Eu acredito que esses aplausos são

por novas honras que se acumulam sobre Garvey

Jonson

Ora, homem, ele cavalga o mundo Negro

Como um Colosso; e nós, homens pequenos

Andamos sob suas pernas gigantescas e espreitamos por toda parte,

A fim de ver se achamos túmulos desonrados.

Há momentos em que os homens são donos de seus destinos;


A culpa, caro Du Bois, não está nas estrelas,

Mas em nós mesmos, por sermos subordinados.

Du Bois e Garvey: O que deve haver no nome Garvey?

Para soar melhor do que o seu nome?

Escrevei-os juntos, tão belo é o vosso como o dele;

Pronunciai-os, tanto um como outro assenta bem na boca;

Pesai-os, ambos tem o mesmo peso; valei-vos deles para esconjuros,

Du Bois evocará qualquer espírito assim como Garvey.

Agora, em nome de todos os Deuses de uma vez,

De que carne este nosso Garvey se alimentou,

Para ele crescer tão Grandioso?

Du Bois

Chega, fiel (suspira). O que você disse

Eu vou considerar; o que você tem a dizer

Irei com paciência ouvir: e encontrar um tempo

Tanto para ouvir, quanto responder coisas tão elevadas

Até lá, meu nobre amigo, mastigue isso


Du Bois preferia ser nórdico
Do que se autodenominar filho de Cam

Sob essas condições difíceis, que este tempo

Está prestes a descer sobre nós.

(Saem Du Bois e Johnson)

O editorial continuou com um solilóquio de Pickens.

Com o editorial “Lunático ou Traidor”, a polêmica entre os dois líderes des-


ceu a um novo patamar. Garvey, com certeza, nunca foi poupado em abusos, mas
em mentiras descaradas, Du Bois parece ter mantido um monopólio. Este editorial
representou o pior exemplo da propensão de Du Bois em deixar a verdade escapar
dele. Por "isso, ele foi atacado por várias publicações negras. 122 O comunista Ro-
bert Minor também o atacou severamente neste editorial, embora tivesse relações
cordiais com alguns membros da NAACP. Ele escreveu:

Eu pensaria muito antes de contestar o julgamento do acadêmico Negro, Dr.


W. E. B. Du Bois. Mas quando o Dr. Du Bois escreve que o governo dos Estados Uni-
dos deu a Garvey "um julgamento justo e paciente" e que a Garvey foi recusada
fiança "por causa das repetidas ameaças e ataques a sangue frio contra sua organi-
zação", e que "ele próprio abertamente ameaçou pegar o promotor público ”, etc.,
recebo uma reação diferente daquela pretendida pelo Dr. Du Bois. Sou obrigado a
olhar além dos detalhes para o aparente fato de que um governo que odeia a classe
trabalhadora, e que nunca foi implacável com esquemas de inserção, tal governo
não encontra um amigo em Garvey.

E acima de tudo, destaca-se o fato de que a Associação Universal para o Pro-


gresso Negro, a maior organização de Negros do mundo, é composta quase intei-
ramente pela classe trabalhadora.

Estou esperando por algum líder Negro que organizou mais Negros do que
Marcus Garvey organizou, para criticar Garvey - e eu francamente confesso que se
tal líder recebeu um mandato mais longo em Leavenworth do que Garvey recebeu,
eu o ouvirei com mais atenção.

Os parasitas do capitalismo em Washington não amam Marcus Garvey. Só


isso já deveria fazer alguém da classe trabalhadora pensar duas vezes antes de
condenar o homem. Seus inimigos dizem que o governo condena Garvey por usar
métodos financeiros questionáveis com o propósito de espoliar as massas de tra-
balhadores Negros sem instrução. Mas eu não acho que os Teapot Domers em Wa-
shington tenham qualquer objeção ao roubo das massas Negras.

Acho que sua solicitude se baseia em outra coisa.

O fato de Garvey estar organizando muitos milhares de Negros da classe


que está destinada a dominar a terra, e fazer uma reivindicação militante por uma
ampla libertação internacional dos povos coloniais, parece-me ser a razão mais
provável para Mesrs. Coolidge, Daugherty e, sim, o Sr. Hughes do Departamento de
Estado se interessarem por Garvey.123

Pouco depois do editorial “Lunático ou Traidor”, Du Bois e Garvey ficaram


cara a cara por um breve e assustador momento. Du Bois, na companhia de um
certo W. P. Dabney, estava esperando para entrar no elevador do hotel quando saiu
um bando de senhoras esplendidamente vestidas acompanhadas por "um cava-
lheiro robusto e escuro, maravilhosamente vestido" em traje militar. "Ó deuses!"
Dabney escreveu depois: “Twas Garvey. Ele me viu, um sorriso de reconhecimento,
depois um olhar para Du Bois. Seus olhos se arregalaram. Afastando-se, ele olhou;
virando-se, ele olhou, enquanto Du Bois, olhando para a frente, cabeça erguida,
narinas tremendo, marchou para o elevador... ”Em resposta a uma pergunta de
Dabney, Du Bois afirmou que não viu Garvey. Suas narinas tremiam, explicou ele,
porque sentiu o cheiro de comida.124

Um resultado dos eventos de 1923 e 1924 foi que Garvey e Du Bois toma-
ram a irreconciliabilidade de seus pontos de vista como significando que a união
total dos pretos não era apenas uma impossibilidade, mas um objetivo pelo qual
nem valia a pena lutar. No Sinédrio em fevereiro de 1924, Alain Locke de A Howard
University e outras pessoas pretas proeminentes pediram uma reaproximação en-
tre os dois rivais.125 Respondendo a essas opiniões antes do início do Sinédrio,
Garvey argumentou que ele e Du Bois não poderiam se unir em uma base constru-
tiva em tal convenção plural. Pois Du Bois era um “extremista moderno” que pre-
gava um ideal de integração que poderia se materializar em dois mil anos, quando
todas as raças tivessem alcançado igual força material e cultural. Para a ocasião,
Garvey explicou: “O Negro tem que se desenvolver separadamente e criar seu pró-
prio governo e fundação industrial” para alcançar um mundo que respeitava ape-
nas a força política e econômica.126 Du Bois em julho veio igualmente forte contra a
unidade, argumentando que a diversidade, e até mesmo algumas "brigas pessoais"
eram "absolutamente essenciais na situação atual da raça Negra". A NAACP, argu-
mentou ele, queria que o homem preto se tornasse “um cidadão americano de ple-
no direito” e discordava das visões contrárias. “Nessas circunstâncias”, declarou
ele, “falar de unidade e acordo é um absurdo. Se a Associação Nacional para o Pro-
gresso das Pessoas de Cor estiver certa, essas outras pessoas estão erradas. Se um
grupo está caminhando para o norte e o outro grupo caminhando para o sul, então
a unidade significaria a abdicação de sua posição por um grupo”. Somente as pes-
soas que estivessem dispostas a aceitar seu programa eram bem-vindas para se
unir à NAACP.127

O editorial “Lunático ou Traidor” foi seguido por alguns ataques do Crisis


relativamente sutis no final de 1924, mas a UNIA passou a banir oficialmente Du
Bois da raça. Isso foi feito por uma resolução aprovada por unanimidade, no final
da convenção de 1924 da UNIA. As notícias da frustração final da Libéria com a
colonização da UNIA foram recebidas durante a convenção e os delegados viram
nisso a consumação dos esforços de Du Bois. A resolução declarou:

Em face o fato de que W.E.B. Du Bois tem continuamente tentado


obstruir o progresso da Associação Universal para o Progresso Negro em
prejuízo e detrimento da raça Negra e que ele tem várias vezes se esforçado
para tentar derrotar a causa da redenção da África, que ele seja proclamado
com o banimento da raça Negra no que diz respeito à Associação Universal
para o Progresso do Negro, e doravante ser considerado um inimigo dos
pretos do mundo.128

Com Garvey na prisão desde o início de 1925, a batalha diminuiu um pouco.


Garvey continuou a acusar Du Bois e a NAACP de ajudarem a prendê-lo e Du Bois
sem dúvida sentiu que havia cumprido seu propósito, já que emprestou sua voz
aos que pediam o encarceramento e deportação de Garvey. Ele planejou um quarto
Congresso Pan-Africano a ser realizado nas Índias Ocidentais em 1925, o que pode
ou não ter sido um movimento para aumentar sua influência na única área em que
ele reconheceu a existência de seguidores poderosos de Garvey. No entanto, seus
planos foram frustrados. É estranho dizer que ele pensava que os colonialistas es-
tavam por trás desse fracasso.129 Em anos anteriores, ele culpou Garvey por seus
reveses no congresso.

Em 1927, entretanto, Du Bois teve sucesso em realizar um congresso na


maior de todas as fortalezas Garveyistas, o Harlem. A iniciativa veio em grande
parte de organizações de mulheres pretas. Garvey, é claro, ainda estava na prisão e
decretou que não deveria haver convenção da UNIA naquele ano. Então, no mês de
agosto da convenção da UNIA, Du Bois correu para preencher a brecha. Seu con-
gresso chegou a tomar emprestado o famoso slogan de Garvey e aprovar uma reso-
lução que defende "A África para os Africanos".130

Teria sido estranho se Du Bois pudesse ter realizado um congresso, mesmo


que de quatro dias, no Harlem sem algum interesse Garveyista. Nas páginas do Ne-
gro World, Kelly Miller claramente chamou Garvey de prisioneiro político, um líder
racial maior do que todos os seus predecessores e o maior defensor da redenção
Africana. Ele apelou ao Congresso Pan-Africano para exigir clemência para Garvey.
T. Thomas Fortune apareceu na sessão de encerramento para ver por si mesmo o
que estava acontecendo e voltou ao escritório para escrever um editorial sobre o
assunto. Ele discordou de muito do que ouviu, incluindo “A opinião do Professor
Logan de que não era possível nem seria bom esperar que os europeus pudessem
ou fossem expulsos da África”, e que os Africanos deveriam cooperar com os bran-
cos. “A velha teoria do leão e do cordeiro deitados juntos sem brigar”, Fortune me-
ditou, “porque o cordeiro estava dentro do leão. É o índio vermelho em contato
com os brancos europeus no continente ocidental novamente.”

Um dos últimos assuntos do congresso foi a adoção de resoluções. Du Bois


manteve um controle rígido sobre essa fase do negócio. Ele mesmo redigiu as reso-
luções, que foram aprovadas 11 por uma comissão. Enquanto os lia para o público,
o reverendo Walker, pastor de uma igreja da AME em Cleveland, Ohio, interrom-
peu para sugerir que o congresso deveria lançar um pedido de clemência para Gar-
vey. A ideia foi calorosamente aplaudida e apresentada na forma de uma moção
formal, acompanhada por um elogio efusivo e bem recebido a Garvey. Du Bois su-
geriu que a resolução voltasse ao comitê, onde ele poderia eliminá-la, em vez de
ser votada por toda a assembleia. Depois de um caloroso debate que, Fortune rela-
tou, indicou que a maioria do público apoiava a resolução, ela foi transferida para
um comitê do qual não voltou. Mas isso não impediu “o doutor descarado”, como
disse um relatório, de proclamar “África para os Africanos”.131
No entanto, Garvey foi libertado da prisão e deportado três meses após o
congresso. Du Bois comemorou com uma revisão de sua controvérsia com Garvey
"não para reviver rancor esquecido, mas por uma questão de precisão histórica". O
artigo era, na verdade, mais uma distorção e tudo menos historicamente preciso.
Ao afirmar que o Crisis publicou apenas cinco artigos sobre Garvey, ele convenien-
temente esqueceu aqueles que eram obviamente dedicados a Garvey, mas não o
citaram, assim como vários artigos menores do Crisis. Du Bois até esqueceu a data
de um de seus próprios artigos, alegando que trechos de um artigo de 1924 haviam
aparecido em 1922. Sua afirmação de que "a impressão de que a NAACP foi o ini-
migo persistente de Marcus Garvey" foi "sem a menor base factual” era no mínimo
um exagero grosseiro. Ele comparou essa doce inocência da parte da NAACP com
"os ataques de Garvey à NAACP [que] têm sido contínuos, absurdos e falsos". 133
Mais ou menos nessa época, parece que Du Bois transformou sua campanha contra
Garvey em ficção, pois Alain Locke, revisando seu Dark Princess, localizou "talvez
um Garvey mal acabado" entre os personagens.133

Du Bois viveu noventa e cinco anos. Sua vida foi em muitos aspectos a histó-
ria triste e tortuosa de um homem atraído por treinamento e educação para a aris-
tocracia branca, mas muito sensível para ignorar o racismo que o atingiu e a sua
raça. Durante sua vida, ele mudou impacientemente de uma tática para a outra, de
uma filosofia para a outra, em uma busca frustrantemente vã pela fórmula elusiva
que superaria o monstro formidável do racismo branco, e mais especialmente ra-
cismo branco americano. E foi assim que Du Bois chegou ao Garveyismo.

Quando Garvey foi deportado dos Estados Unidos em 1927, Du Bois já era
um homem velho, a menos de três meses de seu sexagésimo aniversário. Ele já ha-
via tentado intelectualizar o problema racial para longe. Ele havia desistido há
muito tempo em favor de agitá-lo. Ele havia tentado o socialismo, a integração e
muito mais. Ainda assim, por volta de 1930, Du Bois começou a seguir o caminho
que George Padmore logo seguiria. A principal diferença entre os dois era que Pa-
dmore foi mais honesto sobre a influência de Garvey em fazer com que os comunis-
tas pretos reconsiderassem suas posições do que Du Bois foi no caso de sua pró-
pria mudança da integração para a separação.

Assim que Garvey saiu do caminho, Du Bois foi dominado por uma profunda
desilusão com a integração que ele defendeu tão obstinadamente. Ele percebeu
cada vez mais que, apesar de todo o seu esforço, de todo o esforço da NAACP, a in-
tegração estava avançando pouco. A segregação escolar de fato havia aumentado
no Norte e os linchamentos, embora menos frequentes, não eram menos chocan-
tes. Ele, portanto, agora começou a argumentar que, uma vez que a integração era
uma aparente impossibilidade, pelo menos por enquanto, os pretos deveriam
aproveitar ao máximo a separação. Ele falou de uma “economia racial” cooperativa
sem fins lucrativos que operaria dentro do capitalismo americano, mas não seria
dele. Com o tempo, essa economia racial incorporaria as Índias Ocidentais. Ele até
começou, com a terrível tragédia da depressão, a expressar o pessimismo de Gar-
vey sobre a sobrevivência da raça Africana na América. No passado, Du Bois havia
ameaçado a separação se a América negasse igualdade ao homem preto, mas esses
foram apenas vislumbres fugazes de sua incerteza. Agora, entretanto, era diferente.
Um dos primeiros a notar a mudança em Du Bois foi o próprio Garvey. De-
pois de ler um discurso de formatura de Du Bois na Howard University, Garvey, da
Jamaica, acusou Du Bois de agora pregar o Garveyismo. Isso foi em 1930, e Du Bois
havia se referido naquele discurso à necessidade de uma base econômica preta. 134
Em 1931, o Negro World fez a mesma observação. As manchetes das páginas de-
claravam: “Dr. Du Bois concorda com o Programa de Líderes da UNIA, mas não o
confessa abertamente. Enfatiza indústrias e negócios de propriedade de pretos.” 135
Essa nova linha de pensamento levou inevitavelmente a uma ruptura entre Du Bois
e seus empregadores integracionistas na NAACP. Du Bois, em suas próprias pala-
vras, estava agora “defendendo uma nova segregação, deliberada e proposital para
a defesa econômica”. 136 Em 1934, ele e a NAACP se separaram, deixando o Crisis
nas mãos integradoras de Roy Wilkins e George W. Streator. Garvey, aludindo à
chegada tardia de Du Bois à filosofia de autossuficiência econômica racial, comen-
tou: “Não é de se admirar que Du Bois tenha renunciado à Associação Nacional pa-
ra o Avanço de Pessoas de Cor. Ele não pode ir mais longe. Será que ele pode conti-
nuar abusando do homem branco quando o Negro americano está na cozinha do
homem branco?”137 Du Bois, enquanto se abstinha de dar crédito a Garvey por sua
nova posição, buscava fazer as pazes com o espírito de Booker T. Washington , ale-
gando agora que não se opôs a Washington no campo segregação.

Outros observadores, no entanto, notaram o tom Garveyista dos novos pro-


nunciamentos de Du Bois. George Streator escreveu logo depois: “É significativo
que a ideia de Garvey, por mais que tenha sido ridicularizada pelos intelectuais
Negros durante o apogeu do movimento, não tenha caído. Pelo contrário, ela rea-
parece da forma mais inesperada, por exemplo, na doutrina Du Bois atualmente
exposta de uma economia preta...”139 E o sociólogo E. Franklin Frazier, ele mesmo
não tão amante de Garvey, observou: “Quando Garvey propôs um esquema grandi-
oso para construir um império comercial preto Du Bois ridicularizou sua ingenui-
dade. Mas o que poderia ser mais fantástico do que seu próprio programa para
uma economia sem fins lucrativos separada dentro do capitalismo americano?”
Frazier, tendo descartado Du Bois como o homem marginal que não conseguia
descobrir sua identidade, profetizou, corretamente como se viu, que Du Bois não
permaneceria um separatista por muito tempo. Ele escreveu em tons fulminantes:

O programa racial de Du Bois não precisa ser levado a sério... Ele tem
apenas um interesse romântico ocasional no Negro como uma raça distinta.
Nada seria mais insuportável para ele do que viver dentro de um gueto pre-
to ou dentro de uma nação preta - a menos que talvez ele fosse rei, e então
provavelmente tentaria unir os brancos e pretos por meio do casamento das
famílias reais. Quando Garvey tentou seu genuíno movimento racial, nin-
guém foi mais crítico e desdenhoso que Du Bois da fantástica glorificação da
raça preta e de todas as coisas pretas. O movimento de Garvey estava muito
próximo das massas pretas ignorantes para Du Bois. Por outro lado, ele se
sentia mais à vontade com os intelectuais de cor que se reuniam nos Con-
gressos Pan-africanos.140

Enquanto isso, na Inglaterra, Garvey resumiu seu conflito com Du Bois. Ele
resumiu as grandes deficiências de Du Bois em uma frase: "Ele não tem autorres-
peito racial, não tem ideias independentes, não tem autoconfiança e esse é o seu
grande problema." Além disso, em Du Bois, Garvey não viu nenhuma evidência de
qualquer pensamento independente de longo prazo sobre estratégias para eman-
cipar a raça, como havia caracterizado o programa de Booker T. Washington. Gar-
vey viu a notável contribuição de Du Bois como uma hostilidade negativa aos pro-
gramas de libertação mais importantes de sua época. Garvey escreveu em 1935:

Quando Du Bois morrer, descerá ao túmulo para ser lembrado como


o homem que sabotou o esquema de colonização do Negro na Libéria, o ho-
mem que se opôs ao Negro americano que lançava navios a vapor nos ma-
res, o homem que fez de tudo para prejudicar o setor industrial e proposi-
ções comerciais do Negro americano, o homem que tentou destruir o siste-
ma educacional industrial de Tuskegee, o homem que nunca teve uma pala-
vra boa a dizer em nome de qualquer outro líder negro, mas que tentou der-
rubar todos eles.141

A natureza mais espontânea e de curto alcance da concepção Du Bois-


NAACP de um programa de libertação foi bem expressa pelo próprio Du Bois em
1921, quando explicou que “a NAACP é organizada para agitar, investigar, expor,
defender, raciocinar, apelar. Este é o nosso programa e este é todo o nosso pro-
grama.”142 Isso é exatamente o que Garvey quis dizer quando disse que Du Bois
não tinha programa. Sobre a acusação de hostilidade constante aos programas de
Garvey e outros, Du Bois escreveu mais tarde: “No caso dele, como no caso de ou-
tros, foram repetidamente acusados de inimizade e inveja, o que está tão longe do
meu pensamento que as acusações tem sido uma experiência bastante amarga.”143

O conflito Du Bois-Garvey dominou o conflito entre a NAACP e Garvey. Mas


Garvey teve suas trocas ocasionais com outros líderes da NAACP. No caso de um
deles, William Pickens, uma extensa controvérsia se desenvolveu, perdendo ape-
nas para a intensidade da luta de Garvey com Du Bois. O caso de Pickens é impor-
tante porque não apenas a animosidade pessoal gerada foi tão grande, mas as di-
vergências ideológicas que surgiram foram as mesmas do conflito de Du Bois- Gar-
vey. A coincidência das posições de Du Bois e Pickens em seus conflitos separados
com Garvey sublinha o verdadeiro caráter ideológico das diferenças entre a NAACP
e a UNIA.

Pickens ingressou na NAACP em 1920 como secretário de campo associado.


Ele era formado em Yale, turma de 1904 e, como alguns dos associados de Garvey,
havia sido membro do Movimento Niágara de Du Bois. Quando ingressou na
NAACP, ele era vice-presidente do Morgan State College.144

Mesmo antes de ingressar na NAACP, se o testemunho posterior muito pou-


co confiável de Pickens puder ser acreditado, ele recebeu uma oferta ou ofertas da
UNIA.145 Depois de cerca de um ano com a NAACP, Pickens começou a expressar
insatisfação com a organização. Ele foi aconselhado por Du Bois em março de 1921
a ser leal, apesar de tudo.146 Ele decidiu, no entanto, explorar a possibilidade de um
emprego alternativo na UNIA. Amy Jacques Garvey lembra que ele ligou para Gar-
vey e posteriormente visitou seu apartamento duas vezes. Ele disse a Garvey que
seu salário era insuficiente, embora trabalhasse mais do que seus colegas, e que
estava sendo discriminado por causa de sua cor. Garvey ofereceu-lhe um emprego
até a convenção de agosto, quando ele poderia se candidatar a um cargo. 147 Pic-
kens, no entanto, não tinha nenhuma intenção real de se juntar a Garvey neste
momento, mas foi apenas habilidosamente e com extrema insensibilidade usando
Garvey na tentativa de exigir mais dinheiro e uma posição de maior autoridade da
NAACP. Ele foi, portanto, capaz de contemporizar com Garvey até com segurança
após a convenção de agosto, embora ele tenha se dirigido a uma audiência no Li-
berty Hall em 30 de agosto. quando seu conflito com a NAACP estava atingindo o
ápice, ele escreveu a Garvey uma carta efusivamente lisonjeira, que, à luz dos even-
tos posteriores, foi um engano calculado da maior magnitude. A carta afirmava que
Pickens estava indo bem e realmente não precisava de uma mudança de emprego,
exceto “pela grande sensação da grande oportunidade de ajudar o empreendimen-
to supremo que você está empreendendo e que você tem me instado a considerar
há algum tempo.” Destemido por sua pretensa traição, ele assegurou a Garvey: “Eu
sei que você lidou com muitos traidores e ainda tem traidores para enfrentar. Eles
infestam o mundo. Mas confie em mim. Se eu nunca trabalhei na mesma organiza-
ção com você, ainda deveria ser seu irmão.”149

Apenas cinco dias depois, em 17 de setembro, Pickens apresentou sua re-


núncia ao conselho de diretores da NAACP com efeito o mais tardar em novembro,
mas de preferência em 1º de outubro. Ele alegou que continuaria a defender os
objetivos da associação, estranho discurso para um Garveyista em potencial. 150
Descobriu-se que a preferência de 1º de outubro se devia à sua promessa de falar
aos "negros de Nova York" em 2 de outubro.151 Em 25 de setembro, sem dúvida em
resposta às tentativas da NAACP de resolver seus problemas, ele informou ao te-
soureiro da associação que enquanto ele teria recebido substancialmente mais se
tivesse sucumbido a ofertas anteriores, sua maior oferta atual era apenas aproxi-
madamente o mesmo que seu salário atual mais seus ganhos de palestras ocasio-
nais.152 Em 29 de setembro ele recusou um convite para participar de uma reunião
da NAACP. executivos para discutir sua renúncia. “O próximo movimento”, ele ra-
biscou na parte inferior do convite, “pertencia a eles e deixava que o fizessem”. 153
No entanto, os executivos recusaram-se a aceitar a renúncia e nomearam uma co-
missão para investigar. O comitê recomendou um aumento no pagamento e uma
reorganização do trabalho de campo para dar a Pickens "uma parte direcional
maior", superando assim suas duas queixas principais. 134 A manobra de Pickens
teve sucesso. Que ele tinha apenas usado o UNIA, ele mesmo confirmou. Com rela-
ção à oferta de Garvey de emprego temporário até a convenção de 1921, ele expli-
cou: "Decidi tentar tudo o que valia a pena, se tivesse que deixar a NAACP, o que
nunca quis fazer, se pudesse ser razoavelmente evitado." 155

Em algum momento durante o curso dessas intrigas, Pickens escreveu um


artigo para a Nation a pedido dessa revista. Foi escrito antes da resolução de seu
conflito com a NAACP. O resultado foi tão efusivamente pró-Garvey que os editores
da revista suspeitaram de uma fraude. Em 11 de outubro, um dia depois que o con-
selho de diretores da NAACP aceitou a recomendação de aumentar o pagamento e
a autoridade de Pickens, ele teve que garantir aos editores da Nation que, de fato,
não os havia levado para um passeio. Ele alegou que o artigo havia sido escrito an-
tes que ele começasse a cogitar a possibilidade de se juntar a Garvey e que escreve-
ria exatamente o mesmo artigo agora que seu conflito com a NAACP estava resol-
vido.156 A Nation publicou uma versão enxugada em dezembro. O Negro World
publicou o artigo completo uma semana e meia antes. Também apareceu no preto
California Voice em 31 de dezembro de 1921, junto com uma saudação de Natal de
Pickens para a UNIA. O jornal California apresentou o artigo com o título, “Secretá-
rio de campo da N.A.A.C.P. analisa e endossa o movimento de Garvey.” 151
O próprio artigo elogiava a ênfase de Garvey em raça, defendia seus emble-
mas sem concordar que era necessário, apoiava seus métodos de negócios, sua fro-
ta de navios a vapor e sua honestidade e não via nenhuma contradição necessária
entre as operações internacionais da UNIA e a ênfase doméstica da NAACP. Pickens
até argumentou que não havia razão para que a mesma pessoa não pudesse per-
tencer à Liga Urbana, à UNIA e à NAACP“ e ainda falar consistentemente em um
‘congresso interracial’ em Atlanta, Geórgia.” A versão não enxugada até sugeria que
um líder das índias Ocidentais e um movimento preto nos Estados Unidos eram a
combinação perfeita para a emancipação racial naquela época específica. Onde
houve crítica, como na questão da pele clara, foi moderada. Em fevereiro de 1922,
Garvey proclamou sua "alta consideração" por Pickens, a quem considerava "acima
de qualquer tipo de mesquinhez". Em março, um editorial do Negro World veio em
defesa de Pickens quando o Cleveland Call indagou: "De Que Lado da Cerca Pickens
Está?"158

Pickens parece não ter informado a Garvey de sua intenção de permanecer


com a NAACP, mesmo depois de receber seu aumento de salário e resolver sua dis-
puta, pois em maio de 1922 Garvey novamente estendeu uma oferta a ele. 159 Em
junho, Pickens fez uma oferta particular bastante favorável a avaliação de Garvey.
Ele elogiou a organização internacional de Garvey, mas desta vez optou pela luta
doméstica da NAACP como um remédio mais rápido para a emancipação da raça
na América. Ele se opôs à emigração para a África, mas admitiu que o programa de
Garvey foi a maior ameaça da época para o mundo branco. Seus comentários são
importantes porque vieram logo antes da campanha “Marcus Garvey Must Go”
(“Marcus Garvey Deve Sair”), da qual Pickens logo se tornaria um dos líderes. Tal-
vez como um prenúncio do que está por vir, ele parecia antecipar a persistência da
"ideia de Garvey" após a partida do próprio Garvey. Ele escreveu:

Quanto ao Movimento Garvey, não é perfeito. Nenhum movimento é -


mas Garvey tem a ideia certa de que todos os habitantes de todos os países
e especialmente do mundo ocidental devem estar em contato e organização
uns com os outros. Conheço Garvey pessoalmente e não o considero um vi-
garista. Ele é uma espécie de visionário; todos os homens assim são. Ele não
falhará, embora ele mesmo não veja o grande sucesso de seus planos. A
ideia que ele injetou nas massas Negras vai permanecer, mesmo que Garvey
seja preso ou enforcado. O mundo inteiro hoje, o grande mundo branco, fora
de lugares como Shreveport e Mississippi, está mais preocupado com a
“ideia de Garvey” do que com qualquer outro movimento que o Negro já fez
pelo poder no mundo moderno. Eles sabem que realizar uma organização
internacional é buscar o poder REAL, especialmente através de MASSAS de
homens.

Mas estou com o N.A.A.C.P., embora me tenham sido oferecidos até


dez mil dólares por ano para unir à outras forças, e a oferta ainda permane-
ce. Eu acredito na fruição antecipada das semeaduras da N.A.A.C.P., para o
bem dos Negros nos EUA.

Os americanos de cor cometerão erros lamentáveis se ajudarem os


americanos brancos a lutar contra a “ideia de Garvey”. A ideia é boa, se Gar-
vey puder se livrar de alguns dos vigaristas que infestaram sua organização
e falar abertamente sobre a organização do grupo racial, e não tentar enga-
nar ninguém sobre o mito da "volta à África".160

Em 10 de julho, Garvey convidou Pickens a aceitar uma homenagem na pró-


xima convenção da UNIA em agosto por seus esforços exemplares a serviço da ra-
ça. A esta altura, no entanto, a campanha “Marcus Must Go” (“Marcus Deve Sair”)
estava disparando seus primeiros ataques contra Garvey e Pickens havia se aliado
a ela. Em 24 de julho, ele respondeu com raiva. Sua resposta mostrou claramente
que, como Du Bois, ele poderia ser tomado de grande ira pelas manifestações sepa-
ratistas mais radicais de Garvey, neste caso a conferência de cúpula com a Ku Klux
Klan.161 Pickens considerou absurdo qualquer acordo com a Klan pelo qual, como
ele disse, a América foi aceita como um país do homem branco em troca de ajuda
para tornar a África um verdadeiro continente do homem preto. Ele acreditava,
disse ele, na África para os africanos, negros e brancos, e na América para todas as
cores.

Até então, Pickens não tinha feito nada pior do que enganar Garvey para ob-
ter um aumento de salário. De agora em diante, ele seria uma figura central na
campanha mais vituperativa já empreendida por líderes afro-americanos impor-
tantes contra um grande rival.

MARCUS GARVEY DEVE SAIR !!!

A campanha “Marcus Garvey Deve Sair” representou essencialmente uma


aliança temporária de conveniência entre socialistas pretos, representados princi-
palmente por A. Philip Randolph e Chandler Owen, alguns oficiais pretos da Liga
Urbana, a NAACP e diversos outros integracionistas pretos. Representou uma coa-
lizão formidável dos líderes integracionistas pretos mais influentes do país. Muitos
deles haviam cruzado espadas anteriormente em sua competição pela liderança
das massas afro-americanas, e muitos deveriam cruzar espadas após a remoção de
Garvey, mas no momento eles estavam dispostos a cooperar em face do rolo com-
pressor de Garvey que ameaçou esmagar todos eles.

Entre as personalidades mais importantes que lideraram esta campanha es-


tavam, em primeiro lugar, Randolph e Owen. Eles representavam a ala radical dos
integracionistas não comunistas, sendo mais propensos a discursos destempera-
dos e tagarelices sobre a luta de classes e a natureza “científica” de seu programa.
Em muitos aspectos, entretanto, eles diferiam pouco dos integracionistas da cor-
rente principal na NAACP. Os principais representantes da NAACP nesta campanha
foram Pickens e Robert W. Bagnall, seu diretor de filiais, com Du Bois, é claro, de-
sempenhando um papel fundamental de apoio. A diretoria executiva da National
Urban League em Nova York forneceu dois dos líderes da campanha, John E. Nail e
Harry H. Pace.162 A Urban League, também, era integracionista convencional.163

Muitos dos líderes da campanha já haviam se envolvido em disputas acirra-


das com Garvey. Bagnall, um pregador, quase tentou expulsar Garvey de sua igreja
em Detroit quando Garvey tentou "se integrar" sentando-se na frente do povo de
pele clara durante seus primeiros anos nos Estados Unidos.164 Robert S. Abbott,
editor do Chicago Defender e outro líder da campanha, foi processado por difama-
ção por Garvey em 1919 por ataques ao que chamou de “Jim Crow” Black Star Line.
Abbott, como editor de um dos principais jornais afro-americanos, presumivel-
mente não apreciou a competição do Negro World em rápido crescimento e os ata-
ques de Garvey a seus anúncios degradantes da raça. Em 1920, Abbott planejou a
prisão de Garvey por um tecnicismo enquanto ele estava em turnê em Chicago. 165
Os contatos anteriores de Garvey com Randolph e Owen eram muito mais antigos.

Randolph reivindica a distinção de ter dado a Garvey sua primeira oportu-


nidade de se dirigir a um público do Harlem. O ano era 1916 e Randolph estava se
dirigindo a uma grande multidão em seu palanque na esquina da 135 Street com a
Lenox Avenue. Alguém vestiu seu casaco e disse que um jovem da Jamaica gostaria
de falar. Garvey falou e, de acordo com Randolph, "você podia ouvi-lo da 135th à
125th Street".

Depois de seu discurso, Garvey sentou-se perto da plataforma com papel,


selos e envelopes, ocupado em enviar sua propaganda.166 O discurso de Garvey de
1917 denunciando as revoltas de East St. Louis foi presidido por Chandler Owen.
Essa relação cordial continuou em 1919. A partir de julho de 1919, W. A. Domingo,
ele próprio um socialista, foi listado como um editor colaborador do Messenger
enquanto simultaneamente editava o Negro World. Muitos de seus artigos apare-
ceram no Messenger até e depois de sua renúncia do jornal. Em 1919, Randolph foi
realmente escolhido por Garvey como um de seus representantes na conferência
de paz de Paris. A viagem nunca se concretizou. Randolph afirmou mais tarde, no
auge da campanha contra Garvey, que a primeira grande reunião de massa já reali-
zada pela UNIA foi sob o pretexto de enviá-lo para esta conferência.167

A colaboração de Garvey com esses socialistas foi condenada desde o início


por causa da incompatibilidade da defesa da luta de classes inter-racial integracio-
nista com suas próprias ideias de raça primeiro. Sua demissão de Domingo, portan-
to, coincidiu com uma ruptura com Owen e Randolph sobre esses princípios. O
próprio Messenger em dezembro de 1920 reconheceu a natureza ideológica da
divisão. Ele editorializou: “Ao mesmo tempo, os editores do Messenger falavam da
mesma plataforma movidos com o espírito da organização em questão. Então, a
ideia da Black Star Line não fez parte de seus efeitos. Nem os slogans ‘Negro Pri-
meiro’ e ‘Império Africano’, ‘De volta à África’ e iscas raciais extremas proeminen-
tes em seu programa.” Ao lado de Garvey neste cisma estava Hubert H. Harrison,
que deixou o Partido Socialista, como explicou em 1917, porque é um crente firme
na "doutrina americana de 'Raça Primeiro', ele desejava se colocar em uma posição
para trabalhar entre seu povo ao longo de linhas de sua própria escolha.” 168 (Har-
rison estava se referindo a si mesmo aqui na terceira pessoa.)

Aumentando as fileiras desses dedicados integracionistas de longa data es-


tava o inevitável oportunista ocasional que aproveitou o tempo para levantar algo
pessoal contra Garvey. O representante mais destacado desta categoria foi J. W. H.
Eason. Eleito líder da UNIA para os Negros americanos em 1920, Eason manteve
esta posição até sua expulsão durante a convenção de 1922. Foi Eason quem, em
1920, foi escalado para ocupar a Black House da UNIA em Washington, D.C., um
gesto muito não-integracionista. Poucos meses antes de sua partida da UNIA, ele
expressou o desejo fervoroso de ir para a África. “Mas se eu nunca for”, ele implo-
rou à audiência da UNIA, “quero que vocês, Negros americanos, quando fizerem
seu futuro êxodo deste país, levem meus ossos com vocês e os enterrem na Terra
Mãe”. Quatro meses depois, ele disse que deixou a UNIA porque havia problemas
suficientes na América para ter que se envolver na África ou em qualquer outro
lugar. Em junho, ele afirmou ter ficado impressionado com o senador segregacio-
nista branco do Mississippi McCallum, que ele entrevistou. McCallum sugeriu que
os pretos deveriam cuidar de seus próprios assuntos. Em agosto, na véspera de sua
expulsão, ele acusou Garvey de ingressar na KKK.169

A verdade da questão era que Eason havia sido formalmente impedido e ex-
pulso da UNIA por noventa e nove anos em demorados procedimentos legais na
convenção de 1922. O seu impeachment resultou da acusação de um grande núme-
ro de irregularidades financeiras e outras, algumas das quais ele admitiu. Essas
questões chamaram a atenção de Garvey e foram comprovadas por seu auditor J.
Charles Zampty durante uma extensa turnê pelos Estados Unidos antes da conven-
ção.110 Uma vez expulso, ele reforçou a campanha integracionista realizando reu-
niões anti-Garvey por todo o país sob os auspícios nominais de sua apressadamen-
te organizada Universal Negro Alliance. Ele viajou por muitas das mesmas áreas
que havia visitado recentemente em nome da UNIA, desta vez repudiando suas
antigas opiniões Garveyistas. Em algum momento durante esse período, foi anun-
ciado que ele seria a principal testemunha contra Garvey no julgamento deste úl-
timo.

A rapidez e a abrangência de sua virada de casaca não agradaram os apoia-


dores de Garvey. Em uma reunião em Chicago, trinta e um dos trinta e cinco que
compareceram para ouvi-lo eram Garveyistas leais, que o observavam com cautela.
Após esta reunião, tiros foram disparados levando muitos a acreditar, nas palavras
do Negro World, que Eason havia “pago o preço do traidor”. Os tiros foram, na ver-
dade, o resultado de alguma discussão desconexa. Na noite seguinte, ele teve uma
audiência de seis pessoas. Em Nova Orleans, em outubro, ele falou para trinta e
duas pessoas onde, alguns meses antes, como representante de Garvey, ele havia se
dirigido a casa lotada em quatro ocasiões. O pior ainda estava por vir. Em janeiro
de 1923, ele foi morto a tiros após discursar em uma reunião do Dia da Emancipa-
ção, novamente em Nova Orleans. O Negro World chamou seu assassinato de “ato
covarde” e sugeriu um envolvimento amoroso ilícito como a causa provável. Dois
Garveyistas foram presos e acusados do assassinato. A UNIA iniciou um fundo de
defesa para eles e eles foram eventualmente absolvidos. Um terceiro suspeito qua-
se foi encurralado em uma reunião da UNIA em Detroit, mas os detetives que per-
guntaram por ele foram detidos na porta por membros das Legiões Universais
Africanas tempo suficiente para permitir que o suspeito escapasse por uma saída
dos fundos. A UNIA, entretanto, negou qualquer cumplicidade no assassinato.171

Como no caso de Du Bois, a coalizão integracionista fez do separatismo de


Garvey e das doutrinas aliadas seus principais objetos de ataque. Havia também a
questão muito não-ideológica do que um estudo chamou de "crise de confiança" na
Urban League (e certamente em outras organizações) quando, apesar da ajuda fi-
lantrópica branca, eles não conseguiram arrecadar nada perto das somas que Gar-
vey conseguia de seus seguidores pretos.172 (Na verdade, tanto John B. Nail quanto
Harry H. Pace, as duas principais figuras da Urban League na campanha anti-
Garvey, eram na época membros do comitê de finanças da Urban League.) 173

O efeito da doutrina de separação racial de Garvey em forçar esses integra-


cionistas a se unirem é destacado pelas disputas que ocorreram entre eles antes e
por um curto período após sua ascensão à proeminência. Em 1917, por exemplo, o
Messenger atacou Du Bois, Pickens e outros. Em 1918, chamou Du Bois, Pickens,
James Weldon Johnson e outros de "um descrédito para os Negros e motivo de
chacota entre os brancos". Ataques semelhantes ocorreram em 1919, quando Ran-
dolph se referiu a esses três como típicos reacionários Negros. Em dezembro de
1919, Pickens, respondendo aos ataques de Owen e Randolph, disse que respeitava
o socialismo, mas não o fajuto praticado por esses dois. Ele aconselhou os socialis-
tas brancos a encontrarem material mais adequado para trabalhar entre os pretos
ou enfrentariam fracassos contínuos. E ainda em dezembro de 1920, o primeiro
comentário aberto de Du Bois sobre Garvey acusou que no início de 1919 Chandler
Owen havia presidido uma grande reunião no Palace Casino do Harlem. Naquela
reunião, Du Bois cobrou, Garvey e Randolph se dirigiram ao público e $204 foram
coletados sob alegação de que Du Bois havia obstruído o alto comissário de Garvey
na França ao repudiar as declarações de Garvey sobre linchamentos e injustiças
americanas. (O Messenger havia atacado Du Bois em setembro.) 174 Na época do
artigo de Du Bois, no entanto, Pickens havia começado a fazer as pazes com Owen e
Randolph.175 Ele também, se é que podemos acreditar, já tinha sido abordado por
Garvey.

Um dos primeiros tiros pela culatra na campanha da coalizão veio em maio


de 1920, quando a reunião de fundação dos Amigos da Liberdade do Negro aconte-
ceu em Washington, D.C. Esse grupo iria desempenhar um papel importante, pelo
menos nominalmente, na campanha. A reunião foi convocada por iniciativa de
Owen e Randolph, que se tornariam seus secretários executivos conjuntos. A lista
dos convidados mostrou que já havia ocorrido algum fechamento das fileiras inte-
gracionistas, pois vários funcionários locais da NAACP estavam entre eles. Entre
eles estavam Archibald Grimke, presidente do capítulo de Washington, D.C., que
anteriormente havia sido considerado reacionário por Owen e Randolph. Entre os
outros convidados estavam Robert W. Bagnall, Carl Murphy, editor do Baltimore
Afro-American, e o historiador Carter G. Woodson que, ao contrário da maioria dos
outros, geralmente evitava discretamente se envolver em ataques a Garvey. Mais
tarde, esta coalizão integracionista inspirada por Owen-Randolph estendeu a mão
para abraçar os assimilacionistas comunistas, pois o nome de Cyril Briggs apareceu
no cabeçalho dos Amigos da Liberdade do Negro.176 A hostilidade pré-campanha
de Owen e Randolph aos comunistas (que foi retribuída em igual medida) foi tão
grande quanto para outros elementos desta coalizão.

A primeira reunião dos Amigos da Liberdade do Negro foi agendada para


menos de duas semanas após a convenção nacional de 1920 do Partido Socialista.
Aqui Owen e Randolph, junto com W. A. Domingo e Thomas E. A. Potter, foram vis-
tos como desempenhando o mesmo tipo de papel que a Fraternidade de Sangue
Africano deveria desempenhar para os comunistas. Eles deveriam liderar o impul-
so socialista entre as massas pretas. 177 Os Amigos da Liberdade do Negro foram,
sem dúvida, entre outras coisas, uma manifestação desse papel. A nova organiza-
ção também era totalmente integracionista, sendo especificado que deveria ser
inter-racial, embora liderada por pretos.

Nos meses que se seguiram, Owen e Randolph continuaram seus ataques ao


programa separatista de Garvey. Owen declarou em agosto de 1920: “Nós, negros
educados e de mentalidade superior, não queremos uma nação negra. Isso mataria
para sempre nosso sonho de igualdade mundial.” O Messenger também se opôs ao
slogan “África para os Africanos” porque, argumentou, a opressão não conhece
cor.178 Em outubro de 1920, a revista havia chegado à conclusão de que a UNIA era
“não uma promessa, mas uma ameaça definitiva para os Negros”. Entre os atribu-
tos ameaçadores de Garvey estava sua defesa de um partido político preto nos Es-
tados Unidos.179 O programa Africano de Garvey especialmente recebeu repetidos
ataques. Randolph argumentou que a África foi quase totalmente colonizada e, por-
tanto, não poderia ser tomada. Garvey, ele pensava, era uma ferramenta dos racis-
tas brancos ao desviar as aspirações dos pretos para objetivos inatingíveis. Nesse
ponto, Randolph comparou Garvey desfavoravelmente com os sionistas, que, se-
gundo ele, não defendiam a conquista. “A aguçada mentalidade do judeu”, pontifi-
cou, “reconhece a loucura suicida de tal política”. Ele reconheceu, no entanto, que
Garvey deu uma contribuição útil em sua "crítica necessária e eficaz sobre a lide-
rança Negra", em sua popularização da história preta, em sua introdução de uma
atitude de resistência em relação aos brancos e em motivar os pretos a seguir lide-
ranças pretas. 180

Esses ataques, por mais sérios que fossem, foram apenas um prelúdio para a
campanha real, que pode-se dizer começou com a publicação do Messenger de ju-
lho de 1922. O primeiro editorial gritava: "Marcus Garvey!" Mais uma vez, e não
pela última vez, as declarações separatistas de Garvey levaram os integracionistas
ao frenesi. Desta vez, o casus belli foi um discurso de Garvey em Nova Orleans. Ele
foi citado como tendo dito, em termos que lembram Booker T. Washington, que a
América era o país do homem branco e o homem preto não podia insistir em andar
no bonde Jim Crow do homem branco, uma vez que ele não havia construído ne-
nhum bonde próprio. Isso foi demais para o Messenger. Antes que o mês terminas-
se, Randolph começou seus discursos anti-Garvey no Harlem.181

Assim que a decisão pela guerra total foi tomada, Owen e Randolph aban-
donaram todas as pretensões de decoro em seus ataques. Como Du Bois, eles ex-
ploraram ao máximo a fenda mais vulnerável na armadura de Garvey, ou seja, sua
condição de estrangeiro, e isso apesar de já terem se desassociado dos ataques a
origem de Garvey.182 O encarceramento e deportação de Garvey passaram a ser os
principais objetivos da campanha. "Essa conversa tola também", declarou a salva
de abertura, "emana de um demagogo turbulento das Índias Ocidentais que ataca
os pobres trabalhadores e trabalhadoras das Índias Ocidentais que acreditam que
Garvey é uma espécie de Moisés." Todos os "ministros, editores e conferencistas
que têm os interesses da raça de coração" foram instados a "cingir sua coragem,
colocar nova força e prosseguir com poder e força para expulsar a ameaça do Gar-
veyismo deste país." E apenas no caso de a mensagem ainda não ter sido deixada
clara, a seguinte declaração de hostilidade intransigente apareceu: "Aqui está o
aviso de que o Messenger está dando o tiro de abertura em uma campanha para
expulsar Garvey e o Garveyismo em toda a sua crueldade sinistra do solo america-
no." 183

Nesse ponto, Pickens entrou na campanha. O jornal preto Philadelphia Pu-


blic Journal, do qual era editor colaborador, e o Messenger de agosto publicaram
reimpressões da troca de cartas de julho de 1922 entre ele e Garvey. Em resposta à
oferta de Garvey de um prêmio na convenção de agosto da UNIA, ele respondeu
que não queria nenhum prêmio da organização KKK.184 Ao suprimir sua corres-
pondência anterior com Garvey, ele criou a impressão de que os avanços de Garvey
eram um assunto unilateral, embora mais tarde, ele admitiu ter “discutido” uma
possibilidade de emprego.185 Ele apoiou sua entrada na campanha com um fluxo
constante de comunicados à imprensa e editoriais, muitos deles grosseiros, contra
Garvey.186 Garvey, por sua vez, lamentou a virada de casaca de Pickens. “Acredita-
mos que ele era realmente um patriota racial”, escreveu ele, “e poderia ter sido
aproveitado para servir à sua raça, mas o encontramos, preto como é, agonizando
sob o açoite de uma multidão preconceituosa que tem mais veneno do que bom
senso, mais malícia do que lealdade racial.” Garvey também lamentou sua desones-
tidade por não publicar mais um acréscimo à correspondência em que Garvey "re-
jeitou acusações de uma ligação com o KKK e desafiou Pickens para um debate pú-
blico.187

Agosto, o mês da estréia anti-Garvey de Pickens no Messenger, também foi o


mês da convenção de Garvey. A última página do Messenger proclamava, como
milhares de folhetos logo fariam, "Marcus Garvey Deve Sair!!!" Seguiram-se avisos
de reuniões anti-Garvey no Harlem para cada um dos quatro domingos de agosto.
Os palestrantes seriam Pickens, Bagnall, Randolph e Owen. Handbills descreveu
este quarteto como "quatro dos mais ilustres estudiosos, oradores nacionalmente
famosos, debatedores famosos, profundos pensadores, fiéis, altruístas, destemidos,
devotados e servidores públicos incorruptíveis pela causa da liberdade do Negro".
O envolvimento da NAACP foi sublinhado pela adição de Du Bois e James Weldon
Johnson aos nomes dos quatro palestrantes como pessoas que seguiram a linha
correta enquanto estavam no Sul, o que Garvey supostamente não fez. Ficou claro
que os ataques girariam em torno da Black Star Line (e, portanto, do programa
Africano) e da questão Ku Klux Klan.188 As reuniões foram realizadas sob os auspí-
cios dos Amigos da Liberdade do Negro.

A convenção da UNIA foi aberta de forma natural em meio a muita tensão.


Um grande contingente policial estava disponível para o desfile de abertura, du-
rante o qual algumas pequenas discussões ocorreram entre manifestantes e tran-
seuntes que foram corajosos o suficiente para ecoar as acusações do campo ri-
val.189

Durante o mês, Garvey desafiou os ativistas para um debate público; Rando-


lph teria dito que o Afro-americano estaria tão deslocado na África quanto o ho-
mem branco; três Africanos escreveram para o New York Times protestando con-
tra a difamação de Pickens sobre a Terra Mãe durante uma reunião anti-Garvey; e
Walter White, secretário assistente da NAACP, enviou um cavalheiro anônimo das
Índias Ocidentais a Randolph com informações anti-Garvey interessantes que Ran-
dolph ficou feliz em receber.190

Por volta dessa época, Randolph recebeu pelo correio um pacote contendo
uma mão humana. A mão tinha cabelos ruivos e, portanto, era presumivelmente de
uma pessoa branca.191 Uma carta anexa repreendia Randolph por não ser capaz de
se unir com os seus e deu-lhe uma semana para se juntar à sua "associação de pro-
gresso de neguinhos". Estava assinado “KKK”. Se a mão veio da Klan ou Garvey ou
foi postada por Randolph para si mesmo, nunca foi estabelecido. Em qualquer caso,
Randolph concluiu que "a Klan veio em resgate de seu líder negro, Marcus Garvey".
Ele convenientemente omitiu do artigo que fez essas conclusões o fato de que a
mão era branca.192 Esse evento foi contrabalançado por rumores de que os ativis-
tas estavam considerando a possibilidade de assassinar Garvey. 195

Entre os abusos, as objeções ideológicas muito reais ao Garveyismo conti-


nuaram a surgir, entre elas seu programa Africano. “A África para os africanos”,
disse Randolph, era “devotamente a ser desejada”, o que “não implicava que reco-
nhecêssemos a capacidade dos Africanos de assumir as responsabilidades e deve-
res de uma nação soberana, no presente”. 194

Em novembro, o Crisis ajudou a campanha atacando um folheto da UNIA


distribuído pelo Harlem contra as acusações de Randolph e companhia e o Mes-
senger publicou uma lista das “Doze Menores Pessoas na América”. Garvey encabe-
çava naturalmente a lista, seguido por pessoas como um líder da Ku Klux Klan, Jack
Johnson, e um certo John S. Williams da Geórgia, que enterrou treze pretos vi-
vos.195

Ao longo da campanha, o impacto do ataque foi suportado por Owen e Ran-


dolph e, em menor medida, por Pickens e Bagnall. Uma indicação útil de quão pou-
co eles haviam sido capazes de levar consigo opiniões Afro-americanas proeminen-
tes não Garveyistas e até anti-Garveyistas foi fornecida pelos próprios Owen e
Randolph. Eles enviaram um questionário a 25 dos Afro-americanos mais proemi-
nentes, incluindo alguns membros nominais dos Amigos da Liberdade do Negro e
alguns dos membros mais ativos da campanha. Os destinatários do questionário
incluíram Du Bois, Carter G. Woodson, Bagnall, Kelly Miller, Emmett J, Scott, Robert
S. Abbott, Carl Murphy, Archibald Grimke e outros. O questionário foi acompanha-
do por uma carta com os chamados "fatos" alegando o envolvimento de Garvey
com a Klan e a responsabilidade pelo caso da mão humana. Quatorze pessoas res-
ponderam. Desse número, Du Bois os encaminhou para o Crisis e se recusou a res-
ponder mais, e Woodson discretamente alegou falta de conhecimento suficiente do
movimento Garvey para responder de forma significativa. Dos doze restantes, não
menos do que cinco logo seriam signatários da notória carta anti-Garvey ao procu-
rador-geral e, portanto, estavam entre os mais fortemente comprometidos dos ati-
vistas anti-Garvey. Ainda assim, de um total de vinte e cinco questionários e qua-
torze respostas, resultando em doze respostas efetivas, fortemente influenciadas
pela inclusão de membros da campanha anti-Garvey, apenas quatro concordaram
com Owen e Randolph que Garvey deveria ser deportado. Entre aqueles contra a
deportação estavam Emmett J. Scott, Carl Murphy, Kelly Miller, Archibald Grimke e
o membro da campanha John E. Nail, que logo seria persuadido a mudar de ideia e
assinar a carta de pró-relatório ao procurador-geral. Abbott, do Chicago Defender,
outro signatário, recusou-se a responder a essa pergunta. Aqueles que favorece-
ram a deportação foram Harry H. Pace da Urban League, Bagnall da NAACP (ambos
signatários da carta ao procurador-geral), Thomas W. Talley da Fisk University e J.
B. Bass, editor do California Eagle.196

No início de 1923, Pickens e Bagnall foram listados como editores contribu-


intes do Messenger. O ano começou desastrosamente para a campanha anti-
Garvey. J. W. H. Eason foi morto a tiros em janeiro. Nesta fase, a campanha estava
em uma posição muito precária. Por cerca de seis meses, os ativistas derramaram
uma torrente de retórica anti-Garvey apoiada por reuniões em todos os Estados
Unidos e Canadá. A grande influência de Garvey sobre a massa do povo era eviden-
te em todos os lugares. Em Nova Orleans, Chicago, Toronto, Harlem e em outros
lugares, eles foram submetidos a ameaças, assédios e intimidações de Garveyistas.
Suas reuniões regularmente tiveram que ser realizadas sob proteção policial. A
lista de reclamações dos ativistas foi impressionante. Uma reunião de Eason na
Filadélfia interrompida pela polícia para evitar derramamento de sangue depois
que pessoas que tentaram comparecer foram agredidas e insultadas por Garveyis-
tas reunidos do lado de fora; um "verdadeiro motim" em Cleveland, Ohio, liderado
pelo vice de Garvey, Dr. Leroy Bundy, contra elementos anti-Garvey; Chandler
Owen foi salvo por pouco pela polícia de Garveyistas que corriam atrás do bonde
em que viajava em Pittsburgh; Pickens intimidado por Garveyistas em Toronto; um
policial de Chicago baleado por um Garveyista durante uma briga após uma reuni-
ão anti-Garvey; reuniões de campanha em Nova York invadidas por “dezenas” de
Garveyistas; um orador de campanha foi morto após uma reunião anti-Garvey em
Cincinnati; e agora Eason estava morto.197

Foi nessa fase que as cruzadas anti-Garvey decidiram encenar um dos epi-
sódios mais estranhos da história Afro-americana. Eles decidiram escrever e divul-
gar amplamente uma carta ao procurador-geral. Na verdade, eles estavam agindo
para conseguir abertamente o apoio do governo dos Estados Unidos para superar
seu principal rival. A respeito desse episódio, Garvey comentou: “Diz-se que existe
honra até mesmo entre os ladrões, mas é evidente que não há honra e respeito
próprio entre certos negros.”198

A notória carta ao procurador-geral Harry M. Daugherty, assinada por oito


líderes da campanha “Marcus Garvey Deve Sair”, datava de 15 de janeiro de 1923.
Esta parece ser a data em que o esboço foi redigido. Na verdade, foi postada ou
entregue mais tarde, embora a data original não tenha sido alterada. Embora assi-
nados por oito, os redatores principais eram quatro - os mesmos quatro que deram
a iniciativa e a maior parte da energia para a campanha até agora. Eles eram Ran-
dolph, Owen, Pickens e Bagnall. O papel preeminente desses quatro foi declarado
por Bagnall em uma carta a Arthur B. Spingarn, um vice-presidente nacional e pre-
sidente do comitê jurídico da NAACP. Esta carta a Spingarn prova, como se fosse
necessária alguma prova à luz do papel de Pickens e Bagnall, que a NAACP estava
profundamente envolvida em todo o caso. Na verdade, Bagnall anexou o projeto ao
procurador-geral e solicitou aconselhamento jurídico. Isso foi antes de os outros
signatários eventuais o endossarem. A carta de Bagnall dizia:

O anexo é uma carta aberta ao procurador-geral Daugherty, que pla-


nejamos assinar por pessoas de cor influentes em várias partes do país. Foi
elaborado por um grupo de nós, entre os quais Owen, Randolph, Pickens e
eu fomos os principais. Desejamos nos proteger contra qualquer declaração
ilegal e agradeceremos seus conselhos sobre esse ponto e sobre todo o as-
sunto.199

Spingarn (ou outra pessoa do escritório da NAACP) examinou o rascunho


com muito cuidado. Várias porções mais espalhafatosas foram excluídas. Parece
bastante seguro dizer que a versão que finalmente foi para o procurador-geral foi
finalizada no escritório da NAACP, com toda a probabilidade por Arthur B. Spin-
garn. Aparentemente, foi visto por outros funcionários da NAACP também, prova-
velmente Johnson e White, secretário e secretário assistente, respectivamente,
embora eles alegassem que a NAACP "como uma organização" não tinha nada a ver
com isso.200

A carta atacou a posição anti-integração de Garvey. Dizia: “há em nosso


meio certos criminosos Negros e assassinos em potencial, tanto estrangeiros como
nascidos americanos, que são movidos por um ódio intenso contra a raça branca.
Esses indesejáveis proclamam continuamente que todos os brancos são inimigos
do Negro.” A UNIA foi descrita como “tão questionável e ainda mais perigosa” do
que o KKK, “na medida em que atrai naturalmente um tipo ainda inferior de lunáti-
cos, vigaristas e fanáticos raciais, entre os quais a sugestionabilidade de crimes
violentos é muito maior”.

O caráter estrangeiro de Garvey foi mais uma vez explorado. Seus seguido-
res foram descritos como, em sua maioria, estrangeiros e não-eleitores, inferindo-
se que o governo não teria de se preocupar em perder seus votos. Para tornar a
proposta ainda mais atraente, Du Bois e Domingo foram citados como autoridades
na associação mundial da UNIA, que foi estimada em “muito menos de 20.000”. A
carta também revelou o mesmo tipo de elitismo integracionista e esnobismo que
caracterizou Du Bois. O fenômeno das massas de trabalhadores e camponeses pre-
tos organizados militantemente e sem medo da violência, se necessário, era um
espectro tão assustador para os integracionistas pretos quanto para os brancos. A
carta declarava: “A UNIA é composta principalmente do elemento mais primitivo e
ignorante dos índios ocidentais e negros americanos”, e mais da metade da carta
era dedicada a um catálogo de seus atos violentos. A constituição da UNIA foi cita-
da para mostrar que Garvey desaprovava os criminosos, exceto quando seus cri-
mes eram cometidos no interesse da organização. Esta disposição sem dúvida teria
abrangido casos como a condenação de membros da UNIA por resistirem a ataques
da polícia aos seus locais de reunião. Foi apresentado aqui, no entanto, como um
incentivo positivo ao crime.

Em dois casos em que as questões estavam pendentes nos tribunais, a carta


tentou impressionar o chefe da lei do país sobre a probabilidade de culpa Garveyis-
ta. Este foi o caso Eason, em que o oficial da UNIA preso havia professado sua ino-
cência, embora regozijando-se com sua morte, e o próprio caso de fraude postal
pendente de Garvey. Eles imploraram ao procurador-geral para "movimentar vigo-
rosa e rapidamente o caso do governo contra Marcus Garvey por usar os correios
para fraudar", já que "massas de cidadãos eleitores" de ambas as cores desejavam
"seriamente". A carta pedia, finalmente, a vigilância do Departamento de Justiça da
UNIA e solicitava "que o Procurador-Geral usasse toda a sua influência para dissol-
ver e extirpar este movimento perverso." Os oito signatários foram Harry H. Pace
da Urban League e presidente de uma corporação fonográfica; Robert S. Abbott,
editor e editor do Chicago Defender; John E. Nail da Urban League e presidente de
uma imobiliária; Dra. Julia P. Coleman, presidente de uma fábrica de cosméticos;
William Pickens, secretário de campo da NAACP; Chandler Owen, co-editor do
Messenger e co-secretário executivo dos Amigos da Liberdade do Negro; Robert W.
Bagnall, diretor de filiais da NAACP; e George W. Harris, editor do New York News
e membro do conselho de vereadores da cidade de Nova York.201 Conspicuamente
ausente da lista de signatários estava o nome de A. Philip Randolph, apesar de seu
papel principal no caso.
O procurador-geral foi solicitado a dirigir sua resposta a Owen, secretário
do comitê de signatários. Para Owen especialmente, essa foi uma triste reviravolta.
Seu Messenger, em seus primeiros dias, descaradamente se proclamou o único jor-
nal preto radical. E em 1919 o então procurador-geral A. Mitchell Palmer o rotulou
como a publicação afro-americana mais radical. Agora o socialista radical implora-
va ao procurador-geral que se livrasse de seu rival Garvey.

Em 26 de janeiro, Owen escreveu outra carta ao procurador-geral. Ele suge-


riu que a carta dos oito não fosse entregue à imprensa, já que seria lançada em to-
do o país em 1 de fevereiro de 2002. Em 30 de janeiro Carl Murphy, editor do Bal-
timore Afro-American, indagou ao procurador-geral quais medidas haviam sido
tomadas para dissolver a UNIA de acordo com os desejos dos 8. 203 Em 4 de feverei-
ro, Garvey, agora ciente da carta, informou ao diretor de direito que não havia "ab-
solutamente nenhuma verdade" nas alegações nela contidas. A UNIA, escreveu ele,
representava a elevação de uma raça oprimida. Não havia nada de desleal nisso. Os
bolcheviques e socialistas entre seus detratores ele considerava os verdadeiros
elementos desleais.204 Então, em 20 de fevereiro, uma coisa notável. O gabinete do
procurador-geral redigiu uma resposta detalhada a Owen, endossando sua análise
hostil do movimento Garvey e prometendo possíveis ações legais contra Garvey. A
carta era aparentemente rascunhada pelo Procurador-Geral Adjunto John W. H.
Crim. É interessante notar que Crim foi posteriormente acusado por Garvey de
comentários prejudiciais ao seu caso de fraude postal enquanto ainda estava sub
judice. Alguém, talvez o procurador-geral Daugherty, teve dúvidas sobre a resposta
e ela não foi enviada. O rascunho não enviado dizia:

O Departamento está recebendo a sua comunicação do 15º ultimo di-


rigida ao Procurador Geral por você e vários outros, com referência particu-
lar a Marcus Garvey e à organização conhecida como Universal Negro Im-
provement Association.

O Departamento aprecia cuidadosamente os fatos relatados em sua


carta a respeito das atividades desse estrangeiro. O Departamento de Justiça
está muito bem informado dos detalhes de suas operações e está plenamen-
te satisfeito de que seus esquemas foram formulados e executados em
grande detrimento de milhares de cidadãos americanos de cor que caíram
como tolos e entregaram a ele inocentemente suas poucas economias na es-
perança de realizar o impossível. Garvey sabia dessa impossibilidade desde
o início, mas, como tantas outras organizações que surgiram em todo o país,
a propaganda tem sido um meio de vida mais satisfatório do que uma ocu-
pação honesta. É uma pena que tantos dos joguetes de Garvey tenham sido
cidadãos americanos, muitos deles os negros mais pobres que não podiam
perder suas parcas economias.

Foi com esse conhecimento que o governo conseguiu que Garvey fos-
se indiciado em Nova York pelo uso indevido dos correios em um esquema
fraudulento. Como você sabe, este caso foi definido para julgamento em
uma data muito próxima e o Departamento tem confiança suficiente para
acreditar que os fins da justiça certamente serão satisfeitos antes que todo o
assunto seja concluído.
O governo está plenamente ciente do fato de que Garvey não repre-
senta e nunca representou o negro americano. Por muitos meses antes da
preparação desta carta conjunta, o Governo não tem estado ocioso ou es-
quecido desta fraude colossal e em todos os momentos está ansioso para
receber dos elementos substanciais de sua raça qualquer informação que o
ajude a fazer cumprir as leis da nação e a supressão de movimentos, como o
esquema de Garvey. Os detalhes de sua carta estão recebendo muita atenção
e se evidências suficientes puderem ser obtidas nas várias instâncias cita-
das, você pode ter certeza de que ações adicionais ainda serão tomadas. 205

Este rascunho foi substituído por uma nota breve e mais formal de duas fra-
ses. Mesmo esta nota, no entanto, terminava com “por favor, mantenha-nos infor-
mados, caso fatos adicionais cheguem ao seu conhecimento.”206

Não é de surpreender que o rascunho original não tenha sido enviado. Sem
dúvida, teria chegado ao Messenger e ao resto da imprensa anti-Garvey. E mesmo
no contexto do caso de Garvey, já irremediavelmente prejudicado pelos esforços de
Du Bois, os Amigos da Liberdade do Negro e outros, isso teria sido um pouco de-
mais. Em 26 de fevereiro, Owen, o suposto socialista radical, agradeceu a Crim por
sua resposta e lembrou-lhe que os oito representavam "os mais distintos e respon-
sáveis empresários, educadores e publicitários entre os negros dos Estados Uni-
dos".

A carta dos oito ao procurador-geral foi acompanhada por outra de Du Bois


ao secretário de Estado, rotulando Garvey de "um visionário totalmente impraticá-
vel, se não um criminoso, com esquemas grandiosos de conquista".

Garvey respondeu longamente à acusação dos oito. "Meus inimigos", disse


ele, "e aqueles que se opõem à libertação do Negro à nacionalidade são tão incom-
petentes e incapazes de enfrentar argumentos com argumentos e tolerância com
tolerância que covardemente buscaram o poder do governo para me combater e
destruir." Ele concluiu que esta era a prova de "sua fraqueza e incapacidade de re-
sistir à marcha da redenção Africana e da verdadeira liberdade Negra". Como os
“bons e velhos escurinhos” que eram, “eles acreditam que têm algumas novidades
para contar e estão contando tudo que vale a pena”.

Ele os denunciou como um bando de assimilacionistas que queriam cruzar a


barreira para entrar na raça branca. Em sua opinião, a UNIA não odiava os brancos,
pois acreditava nos direitos de todas as raças. E ele não conseguia ver como seus
malignos podiam simultaneamente acusá-lo de despertar mal-estar entre as raças
e buscar uma aliança com a Ku Klux Klan. O principal problema deles, ele pensava,
era sua incapacidade de tolerar qualquer organização que não tivesse membros
brancos. Quanto aos alegados seguidores “primitivos” e “ignorantes” da UNIA não
ficou menos indignado. “Se não fosse pelo elemento ignorante dos Negros”, ele re-
trucou, “esses mesmos companheiros teriam morrido de fome há muito tempo,
porque todos eles ganham a vida vendendo a raça sob o pretexto de liderança ou
explorando a raça nos negócios.” Ele reafirmou a capacidade da UNIA de reunir
mais votos do que todas as outras organizações pretas nos Estados Unidos juntas e
afirmou que "cada 1 entre 2 negros que você encontra, se não é um membro real, é
um em espírito". E ele profeticamente os advertiu que por suas ações “um prece-
dente será estabelecido para a destruição de todas as organizações pretas que bus-
cam de alguma forma melhorar a condição da raça Negra”.

A resposta de Garvey incluiu um retrato a caneta dos oito. Um era um “ex-


plorador de negócios” que apelava ao patriotismo racial enquanto cobrava caro
por seus produtos. Outro era “um difamador da raça de Chicago” cujo jornal adora-
va destacar o crime e o vício da raça. “Foi ele que publicou em seu jornal por mais
de um ano um anúncio de página inteira mostrando as fotos de duas mulheres,
uma negra e uma muito clara, com o conselho sob a foto da negra de 'clareie sua
pele negra’”. O próximo era um “tubarão imobiliário” que cobrava aluguéis mais
altos do que os proprietários brancos. Então vinha “um alisador de cabelo e um
descolorante de rosto, cuja lealdade à raça é fazer com que a raça fique insatisfeita
consigo mesma”. Sobre o “vira-casaca e lacaio” que o usou para conseguir um au-
mento em uma organização rival, ele foi particularmente severo. Depois veio o
“trapaceiro socialista” que havia iniciado diversos empreendimentos entre os Ne-
gros sem lhes prestar contas dos fundos. O sétimo signatário foi o antigo adversá-
rio de Garvey, o ex-pastor de uma "Blue Vein Society Church em Detroit, Michigan",
que foi absolvido de sua acusação por suposta imoralidade. Finalmente, havia o
"político inescrupuloso" que havia perdido o respeito das massas. A resposta ter-
minou com um apelo aos membros da UNIA para que cerrassem as fileiras contra
este ataque. A título de pós-escrito, Garvey notou que todos os signatários eram
brancos mestiços ou casados com brancas mestiças. A única exceção, “um mulato e
socialista” (Owen), tentou se casar com uma mulher branca, mas foi dissuadido
pelas críticas da UNIA.209 John Edward Bruce, sempre fiel a Garvey, compôs um
poema para a ocasião intitulado “Seven Little Colored Men" (“Sete Homenzinhos de
Cor”). Duas linhas típicas diziam "Três homenzinhos de cor sentados em uma filei-
ra, comentando um com o outro, o homem Garvey deve sair".210

A campanha continuou inabalável após a carta. Bagnall, mostrando que a


antipatia integracionista pelas características físicas de Garvey compartilhadas por
Du Bois, o descreveu como “Um negro jamaicano de linhagem não misturada, ca-
bisbaixo, parrudo, gordo e baixo, com mandíbulas salientes e bochechas pesadas,
olhos pequenos e brilhantes como os de um porco e feições de bulldog. Arrogante,
egoísta, tirânico, ardiloso, desonesto, avarento...” 211

No entanto, sem dúvida devido ao estresse da campanha, divisões começa-


ram a aparecer entre os inimigos de Garvey. Por um lado, o ataque estridente da
campanha contra as Índias Ocidentais agora começou a embaraçar seu principal
membro das Índias Ocidentais, W. A. Domingo. Enquanto mantinha sua posição
anti-Garvey, Domingo agora atacava abertamente o Messenger por causa disso.
Owen defendeu a posição do Messenger em meio a um nativismo integracionista
mais rancoroso.212 Outra garantia resultou na demissão de Floyd J. Calvin de seu
posto como editor associado do Messenger. O erro de Calvin foi sugerir que Rando-
lph e Owen não deveriam tentar causar a destruição de toda a organização de Gar-
vey apenas porque Garvey pode ter errado. Por mais branda que fosse essa crítica,
custou-lhe o emprego.213 Como se para enfatizar sua discordância com Calvin, os
editores do Messenger declararam em abril de 1923: “Nosso trabalho está dando
frutos. A Black Star Line sumiu completamente. Cada uma de suas lojas está fecha-
da. Seu Negro Times foi suspenso, e quase todos os seus ex-funcionários estão pro-
cessando-o em troca de dinheiro.”214 A campanha já havia degenerado a tal ponto
que uma caricatura do Messenger poderia retratar Garvey como um burro e des-
crevê-lo como “Um idiota bem conhecido.”215 A campanha não diminuiu durante o
julgamento de Garvey, e durante a prisão pós-julgamento sem fiança, o Messenger
pediu a destruição total da UNIA agora que Garvey estava na prisão, uma vez que
representava uma continuação do espírito de Garvey.216

Garvey saiu da prisão a tempo de parabenizar seus apoiadores por terem


contribuído para a derrota de George Harris nas primárias do Harlem. Harris, um
dos oito, já havia algum tempo sido o único objetor a uma celebração patrocinada
pela UNIA, embora seus colegas brancos no conselho de vereadores tivessem dado
sua aprovação.217 E Pickens, após publicar um artigo em que reverteu o bem que
ele tinha a dizer sobre Garvey em 1921, escreveu ao promotor expressando sua
impaciência com a demora em se desfazer do caso de Garvey, agora que ele estava
em liberdade sob fiança.218

O ataque “Lunático ou Traidor” de Du Bois em 1924 foi calorosamente


aplaudido pelo Messenger, que veio em sua defesa em face do desacordo generali-
zado que gerou. Os editores ficaram tão satisfeitos que disseram que gostariam de
rescindir todas as críticas anteriores a Du Bois. Du Bois, diziam eles, era um gigante
intelectual. Garvey era apenas um "idiota de baixo grau". 219

Garvey perdeu seu recurso em fevereiro de 1925 e Pickens se alegrou. 220


Um aparte interessante sobre a tragédia e a comédia do papel de Pickens nesta
campanha é o fato de que no final de 1924 ele novamente extraiu um aumento de
salário da NAACP usando a mesma abordagem que em 1921. Ele alegou que havia
perdido a chance de obter um aumento substancial de uma organização semelhan-
te.221 Em seu primeiro pedido de perdão em junho de 1925, Garvey apontou que
Pickens agiu de maneira provocadora e imprópria no tribunal durante o julgamen-
to e que Abbott, outro dos oito, trouxera a primeira Sra. Garvey de volta ao país e
apresentava seus pronunciamentos em seu Chicago Defender a fim de prejudicar
seu julgamento.222 Em 1926, George Harris não estava acima de aumentar a circu-
lação de seu New York News organizando uma "petição" supostamente em nome
de Garvey e publicando as "memórias" de Garvey, este último escrito por uma tes-
temunha de acusação no julgamento de Garvey.223

Como no caso dos comunistas, que adotaram uma forma de nacionalismo


preto depois que Garvey deixou os Estados Unidos, e como no caso de Du Bois, que
começou a pregar o separatismo na década de 1930, o mesmo aconteceu com al-
guns dos oito. Amy Jacques Garvey observou em 1927 que George Harris advertiu
o mundo branco que teria que contar com as ideias radicais de Garvey e parar de
explorar pessoas pretas. E o Negro World observou um editorial da Abbott sobre a
redenção Africana, completo com a fraseologia de Garvey. 224 Dos oito, no entanto,
foi Pickens, sempre o mais errático e imprevisível, que saiu abertamente para a
libertação de Garvey em 1927. Ele disse, no entanto, que ele teria preferido a de-
portação à prisão de Garvey desde o início.225

A campanha “Marcus Garvey Deve Sair”, como foi observado, foi essencial-
mente uma aliança de conveniência entre integracionistas, muitos dos quais esta-
vam em desacordo entre si antes que os sucessos de Garvey os levassem a uma
unidade temporária. Depois que Garvey partiu, a base para sua unidade se foi com
ele. Assim, menos de um ano após a prisão de Garvey, o Messenger estava atacando
editorialmente a Abbott. Mesmo antes disso, eles haviam se voltado contra o ex-
procurador-geral Daugherty, que agora era, em sua opinião, "notório por suas ne-
gociações políticas desonestas e duvidosas". E em 1928 Owen e Randolph lança-
ram um ataque a outro dos oito, George Harris.226

A relação entre a UNIA e os integracionistas era de hostilidade avassaladora,


mas não implacável. Ocasionalmente, como no caso do projeto de lei de Dyer, eles
estavam dispostos a cooperar onde os interesses dos pretos poderiam ser grave-
mente afetados. Assim, em 1922, no auge dos ataques de Du Bois, John Edward
Bruce estava disposto a se juntar a ele em uma "Liga de Fair Play", que visitaria
delegacias de polícia no Harlem para tentar garantir o tratamento adequado dos
prisioneiros pretos.227 Como no caso das relações com os comunistas, entretanto,
esse tipo de cooperação era mais provável após a deportação de Garvey dos Esta-
dos Unidos, quando a UNIA foi gradualmente diminuindo como uma ameaça ao
establishment integracionista. Em 1931, o Negro World aliou-se à NAACP contra a
exploração comunista do caso Scottsboro e, no meio da década, uma reunião pa-
trocinada pela UNIA e o Comitê Provisório para a Defesa da Etiópia apresentou
Walter White e Du Bois (agora em sua fase separatista) como oradores. 228 Em
1944, o mesmo ano em que voltou a integrar a NAACP, Du Bois solicitou a ajuda de
Amy Jacques Garvey para atrair delegados para o quinto Congresso Pan-
Africano.229 Quando o congresso se reuniu em Manchester, Inglaterra, em 1945, a
UNIA da Jamaica estava entre as delegações representadas.230

Esses exemplos de cooperação foram, no entanto, relativamente menores e


em última instância. Eles de forma alguma diminuem o fato de que uma grande
parte da responsabilidade pela prisão e deportação de Garvey deve ser atribuída
ao ataque integracionista, especialmente como manifesto nas campanhas de Du
Bois e da NAACP, e dos socialistas pretos Owen e Randolph.
NOTAS

1. Crisis 28 (maio de 1924): 8.

2. Negro World, 10 de maio de 1924.

3. Ibid., 6 de outubro de 1928.

4. Amy Jacques Garvey, ed., The Philosophy and Opinions of Marcus Garvey
(Londres: Frank Cass, 1967), II: 70.

5. Ovington para Spingam, 8 de fevereiro de 1921, Arthur Barnett Spingaril


Papers, Caixa 2, Biblioteca do Congresso.

6. James Weldon Johnson, Black Manhattan (Nova York: Atheneum, 1968),


primeiro pub. 1930, pág. 257.

7.Messenger (junho de 1924): 184. Garvey disse que recebia qualquer pes-
soa com um décimo sexto ou mais sangue preto, desde que trabalhasse pela unida-
de da raça - New York World, 24 de agosto de 1920.

8. Em agosto de 1924, Walter White, Secretário Assistente da NAACP, escre-


veu uma carta de apresentação da Sra. Robert Minor comunista a um certo Louis R.
Glavis em Nova York. Glavis supostamente tinha "dados oficiais" sobre as negocia-
ções de Garvey com a Ku Klux Klan - secretário assistente de Louis R. Glavis, 28 de
agosto de 1924, Arquivos administrativos da NAACP, Biblioteca do Congresso, Cai-
xa C-304.

9. New York Age, 21 de agosto de 1920.

10. Johnson, Black Manhattan, p. 258.

11. Comunicado de imprensa da NAACP, 21 de março de 1924, Arquivos


NAACP, Box C-304, Manuscript Division, Library of Congress.

12. Negro World, 7 de junho de 1919, 7,14 de janeiro, 4 de fevereiro, 4 de


março, 27 de maio, 10 de junho, 4 de novembro de 1922.

13. Ibid., 8 de abril, 27 de maio, 15 de julho, 16 de dezembro de 1922.

14. Ibid., 27 de outubro de 1923.

15. Ovington para Spingam, 8 de fevereiro de 1921, Spingarn Papers, Caixa


2.

16. Johnson para Garvey, 20 de janeiro de 1922, Garvey para Johnson, 21 de


janeiro de 1922, NAACP Files, Box C-304.
17. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 261.
18. Comunicado à imprensa de 22 de junho de 1923, arquivos NAACP, Caixa
C-304.

19. Negro World, 3 de janeiro, 6 de junho de 1925.

20. Secretário adjunto do Sr. Allen Dawson, ed., New York Tribune, 17 de fe-
vereiro de 1922, e correspondência relacionada, NAACP Files, Box C-304; Walter
White para Spingarn, 18 de fevereiro de 1922, Spingarn Papers Box 2.

21. A. A. Maney para James W. Johnson, 2 de dezembro de 1921; Norman


Thomas, editor associado do Nation para Johnson, 31 de agosto de 1921; Edgar
Collier para Johnson, 12 de março de 1921; J. K. Marshall para NAACP, 24 de agosto
de 1924, e muitos outros, NAACP Files, Box C-304.

22. Negro World, 2 de fevereiro de 1924.

23. Alice Woodby McKane, M.D., para Seligman, 21 de dezembro de 1921,


Ncligman para McKane, 27 de dezembro de 1921, NAACP Files, Box C-304.

24. Negro World, 6 de setembro de 1924.

25. Graham Knox, “Mudança Política na Jamaica (1866-1906) e a Reação


Local às Políticas do Governo da Colônia da Coroa” p.161; Lewis, "A Political Study
of Garveyism", p.14.

26. Africa Times and Orient Review 1 (julho de 1912): 10-12.

27. Negro World, 8 de dezembro de 1923.

28. Garvey para Booker T. Washington, 12 de abril de 1915, Booker T.


Washington Papers, Container 939, Biblioteca do Congresso.

29. Washington para Garvey, 27 de abril de 1915, Washington Papers,


Container 939.

30. Garvey para Emmett J. Scott, em Daniel T. Williams, Eight Negro Biblio-
grafias (Nova York: Kraus Reprint Co., 1970).

31. Garvey para R. R. Moton, 29 de fevereiro de 1916, em Williams, Eight


Negro Bibliographies.

32. R. N. Murray, ed., J. J. Mills, Sua Própria Conta de Sua Vida e Tempos
(Kingston: Collins and Sangster, 1969), p.110.

33. Amy Ashwood Garvey, “Prophet of Black Nationalism,” p. 80

34. Garvey to Moton, 23 de outubro de 1923, Garvey to Secretary, Tuskegee


Institute, 2 de novembro de 1923, Diretor, Tuskegee Institute to Garvey, 6 de
novembro de 1923, in Williams, Eight Negro Bibliografias; Negro World, 17 de
novembro de 1923; The Tuskegee Student 33 (dezembro de 1923): 2.

35. Garvey, Philosophy and Opinions, I: 41, New York World, 3 de agosto de
1921.
36. Blackman, 22 de abril de 1929; Southern Workman 57 (outubro de
1928): 425.

37. Negro World, 10 de novembro de 1923.

38. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 38.

39. Negro World, 17 de novembro de 1923.

40. Ibid., 19 de abril de 1924.

41. Negro World, 9 de junho de 1928.

42. W. E. B. Du Bois, The Autobiography of W. E. B. Du Bois (Nova York: In-


ternational Publishers, 1968), p.273.

43. Garvey, A Talk With Afro-West Indians, p.3.

44. W. E. B. Du Bois, Dusk of Dawn (Nova York: Schocken, 1968), p.277.

45. Garvey para Moton, 29 de fevereiro de 1916, em Williams, Eight Negro


Bibliographies.

46. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 60.


47. Herbert Aptheker, ed., The Correspondence of W. E. B. Du Bois (Am-
herst: University of Massachusetts Press, 1973), I: 214, 215.

48. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 57.311.

49. Du Bois, Dusk of Dawn, p. 278

50. Crisis 17 (fevereiro de 1919): 165, 166.

51. Crisis 18 (agosto de 1919): 207.

52. C. G. Contee, “The Worley Report on the Pan-African Congress of 1919,”


Journal of Negro History 55 (abril de 1970): 141.

53. Crisis 19 (dezembro de 1919): 46.

54. A lista de membros foi reimpressa em Martin Kilson e Adelaide Hill,


Apropos of Africa (Garden City, N.Y .: Doubleday, 1971), pp. 203-205.

55. Crisis 19 (janeiro de 1920): 107.

56. Crisis 20 (março de 1920): 6-8.

57. Negro World, 12 de junho de 1920, citado em Elliott M. Rudwick, “Du


Bois versus Garvey: Race Propagandists at War,” Journal of Negro Education 28
(1959): 424.

58. Aptheker, Correspondence, pp. 245, 246.

59. New York World, 4 de agosto de 1920; Aegro World, 14 de agosto de


1920, Garvey diz que Ferris o informou da presença de Du Bois.
60. Crisis 20 (agosto de 1920): 189.

61. Documentos da National Civic Federation, Box 152, New York Public
Library.

62. Crisis 20 (setembro de 1920): 214-215; Documentos da National Civic


Federation, Box 152.

63. Messenger (setembro de 1920): 84, 85.

64. Crisis 21 (novembro de 1920): 35.

65. Ibid., P.16.

66. Ovington para Spingarn, 24 de julho de 1921, Spingarn Papers, Caixa 2.

67. Du Bois a Schomburg, 9 de novembro de 1920, incluindo Du Bois a


Domingo, 6 de novembro de 1920, Schomburg Papers, Box 2.

68. Crisis 21 (dezembro de 1920): 58-60.

69. Bruce Papers, Group D-9E, 14-9.

70. Crisis 21 (janeiro de 1921): 112-115.


71. Crisis 21 (março de 1921): 213; Spingarn para Du Bois, 9 de fevereiro de
1921, Spingarn Papers.

72. Negro World, 9 de abril de 1921.

73. Crisis 22 (maio de 1921): 8.

74. Du Bois para Hughes, 23 de junho de 1921, RG 59, 540 C2 / original,


Arquivos Nacionais. Du Bois publicou a resposta cordial de Hughes na Crise22
(agosto de 1921): 150.

75. Garvey para Sir A. Geddes, Embaixador Britânico, Washington, 16 de


junho de 1921, citado em Robert G. Weisbord, “Marcus Garvey, Pan-Negroist: The
View from Whitehall,” Race 11 (1970): 426.

76. New York Call, 1º de agosto de 1921.

77. Negro World. 30 de julho de 1921.

78. New York World, 2 de agosto de 1921.

79. Cópia datilografada, Arquivos NAACP, Caixa C-304.

80. Crisis 22 (setembro de 1921): 225.

81. W. E. B. Du Bois, The World and Africa (Nova York: International Pub-
lishers, 1965), p. 237; Du Bois, Dusk of Dawn, p. 278 •, Negro World, 8 de outubro
de 1921.

82. Negro World, 2 de julho de 1921.


83. Crisis 24 (maio de 1922): 33.

84. W. E. B. Du Bois, “The Pan-African Movement,” em George Padmore, ed.,


History of the Pan-African Congress (Londres: Hammersmith Bookshop, [1945]),
pp. 21,22.

85. Negro World, 2 de julho, 1 de outubro de 1921.

86. Garvey, Philosophy and Opinions, 1:50; New York Tribune, 15 de


setembro de 1921, reimpresso em Crusader, 5 (novembro de 1921): 24, 25.

87. Crisis 23 (fevereiro de 1922): 154.

88. Negro World, 29 de outubro, 17 de dezembro de 1921.

89. Ata de uma reunião de 21 de dezembro de 1921, Spingarn Papers, Caixa


37.

90. Crisis 23 (fevereiro de 1922): 151.

91. Negro World, fevereiro de 1922.


92. Crisis 23 (fevereiro de 1922): 155.

93. Negro World, 1º de outubro de 1921, 11 de fevereiro de 1922.

94. Crisis 21 (janeiro de 1921): 114.

95. Crisis 23 (abril de 1922): 252.

96. Du Bois para Presidente, U.S. Shipping Board, 27 de julho de 1922, A.D.
Lasker, Presidente, para Du Bois, 31 de julho de 1922, RG 32, 605-1-653.

97. Du Bois para o Departamento de Estado, 3 de agosto de 1922, Wilbur J.


Carr, Diretor de Serviços Consulares, para Du Bois, 18 de agosto de 1922, Du Bois
para Carr, 6 de setembro de 1922, Carr para Du Bois, 5 de outubro , 1922, RG 59,
195,7 Kanawha.

98. Du Bois para Charles Studin, 8 de agosto de 1922, Spingarn Papers,


Caixa 52.

99. Negro World, 4 de fevereiro de 1922, citado em Rudwick, “Du Bois


versus Garvey,” p. 427; Garvey to Secretary, NAACP, 14 de julho de 1922, NAACP
Files, Box C-304.

100. Negro World, 4 de novembro de 1922.

101. Du Bois para Exmo. Charles Hughes, 5 de janeiro de 1923, em


Aptheker, Correspondence, p. 261.

102. Walter White para Spingarn, 16 de agosto de 1922, Spingarn para


White, 17 de agosto de 1922, White para Spingarn, 18 de agosto de 1922, Spingarn
Papers, Box Negro World, 19 de agosto de 1922.
103. Crisis 25 (novembro de 1922): 16-21, Negro World. 28 de outubro, 4
de novembro de 1922.

104. Crisis 25 (janeiro de 1923): 120-122.

105. O autor entrevistou velhos no Harlem que se consideravam Garvey


ites, mas nunca foram membros assalariados da UNIA. Um desses informantes
disse que regularmente tirava férias do trabalho para assistir a desfiles e eventos
da UNIA; Ferris refutou esta alegação de Du Bois no Negro World, em 6 de janeiro
de 1923.

106. Arquivos NAACP, Caixa C-304.

107. Race 1 (Winter 1935-1936): 11, 12.

108. Du Bois, Dusk of Dawn, p. 124

109. Garvey, Philosophy and Opinions 11: 310-320, reimpresso de Negro


World, 13 de fevereiro de 1920.
110. Du Bois, Dusk of Dawn, p. 278

111. Negro World, 15 de dezembro, 6 de outubro de 1923, reimpresso do


Gold Coast Leader, n.d .; Negro World, 26 de janeiro de 1924, reimprimindo o
editorial do Gold Coast Leader de 1º de dezembro de 1923.

112. Negro World, 24 de novembro, 1º de dezembro de 1923.

113. Messenger (janeiro de 1924): 5.

114. Negro World, 29 de dezembro de 1923.

115. Ibid., 15 de dezembro de 1923.

116. Ibid., 27 de agosto de 1927; Garvey, Philosophy and Opinions, 11: 243.

117. Memorando, 6 de setembro de 1924, em Hughes ao presidente, 6 de


setembro de 1924, RG 59, 882.5511 / 10.

118. Messenger (outubro de 1924): 313.

119. Du Bois para Johnson, 15 de abril de 1924, Spingarn Papers, Quadro 3.


Para tentativas de resolver esta disputa ver Harry E. Davis para Spingarn, 16 de
junho de 1924; Du Bois para Spingarn, 23 de junho de 1924, incluindo Johnson
para Du Bois, 23 de junho de 1924 e Du Bois para Johnson, 23 de junho de 1924;
Garvey se referiu aos problemas NAACP de Du Bois no Mundo Negro, 9 de
setembro de 1922 e 4 de novembro de 1922-ver Rudwick, "Du Bois versus
Garvey," p 427.

120. Negro World, 10 de maio de 1924.

121. Ibid.
122. Pittsburgh Courier, n.d., citado em Negro World, 17 de maio de 1924;
Hotel Tattler, n.d., reimpresso em Negro World, 24 de maio de 1924; Gary Sun, n.d.,
reimpresso em Negro World, 24 de maio de 1924.

123. Daily Worker, 13 de agosto de 1924.

124. Cleveland Gazette, n.d., reimpresso em Negro World, 7 de junho de


1924.

125. Daily Worker, 14 de fevereiro de 1924.

126. Boston Chronicle, n.d., reimpresso em Negro World, 2 de fevereiro de


1924.

127. Crisis 28 (julho de 1924): 103, 104.

128. Negro World, 6 de setembro de 1924; New York Times, 29 de agosto de


1924.

129. Du Bois, World and Africa, p. 242.


130. Ibid., P.243.

131. Negro World, 3 de setembro de 1927, 14 de janeiro de 1928.

132. Crisis 35 (fevereiro de 1928): 51.

133. New York Herald Tribune Books, 20 de maio de 1928.

134. Negro World, 19 de julho de 1930.

135. Ibid., 7 de novembro de 1931.

136. Du Bois, Autobiografia, p. 298.

137. Blackman 1 (novembro de 1934): 9.

138. Recorte de jornal, n.d., Du Bois Scrapbook, Schomburg Collection, New


York Public Library.

139. Race 1 (Winter 1935-1936): 14.

140. Ibid., Pp. 12-14.

141. Black Man 1 (final de julho de 1935): 6-8.

142. Crisis 22 (agosto de 1921): 151.

143. Du Bois, Autobiografia, p. 273.

144. New York Age, fevereiro de 1920.

145. Pickens para J. E. Spingarn, 25 de setembro de 1921, Pickens Papers,


Schomburg Collection, Box 1.
146. Du Bois para Pickens, 28 de março de 1921, Pickens Papers, Caixa 1.
147. Amy J. Garvey para E. David Cronon, 28 de março de 1955, Amy
Jacques Garvey Papers. A. J. Garvey, Garvey and Garveyism, p. 249; Garvey, Philos-
ophy and Opinions, II: 307; Negro World, 27 de agosto de 1927. Aqui a Sra. Garvey
sugere que Pickens pode ter visitado Garvey várias vezes.

148. Negro World, 10 de setembro de 1921.

149. Pickens to Garvey, 12 de setembro de 1921, citado em Sheldon Avery,


"Up from Washington: William Pickens and the Negro Struggle for Equality, 1900-
1954" (Ph.D. diss., University of Oregon, 1970), p. 0,82.

150. Pickens para a Diretoria, NAACP, 17 de setembro de 1921, Pickens


Papers, Caixa 1.

151. Ibid., “Memorandum to Mr. Bagnall,” n.d.

152. Ibid., Pickens para J. E. Spingarn, 25 de setembro de 1921.

153. Ibid., Robert W. Bagnall, secretário pro tem, para Pickens, 29 de


setembro de 1921.

154. Ata da reunião do Conselho de Administração, 10 de outubro de 1921,


Spingarn Papers, Box 37.
155. Pickens para o Sr. Gruening e o Sr. Thomas, editores da Nation, 11 de
outubro de 1921, Pickens Papers, Caixa 1.

156. Ibid.

157. Nation 113 (28 de dezembro de 1921): 750-751; Negro World, 17 de


dezembro de 1921; California Voice, 31 de dezembro de 1921.

158. Negro World, 25 de fevereiro, 11 de março de 1922.

159. Garvey para Pickens, 5 de maio de 1922, Pickens Papers, Box 7.

160. Pickens para o Dr. H. Claude Hudson, 4 de junho de 1922, Pickens


Papers, Caixa 1.

161. Garvey to Pickens, 10 de julho de 1922, Pickens to Garvey, 24 de julho


de 1922, Pickens Papers, Box 7.

162. Boletim, New York Urban League, Inc., Relatório Anual 1921, p.1.

163. National Urban League, Report 1920, 3 (January 1921): 14. O “Ideal da
Liga” afirma aqui: “Vamos trabalhar não como pessoas de cor nem como pessoas
brancas para o estreito benefício de qualquer grupo sozinho, mas JUNTOS como
Cidadãos americanos ... ”

164. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 58.

165. Marcus Garvey v. Robert S. Abbott Publishing Company, Federal Court


Records, New York, FRC 536137; Garvey, Philosophyand Opinions, II: 78, 321.
166. Jervis Anderson, A. Philip Randolph (Nova York: Harcourt Brace Jo-
vanovich, 1973), p. 122; William H. Ferris, “Garvey and the Black Star Line,” Favor-
ite Magazine, 4 (julho de 1920): 397.

167. Messenger (agosto de 1922): 467-471.

168. Hubert Harrison, The Negro and the Nation (Nova York: Cosmo Advo-
cate Publishing Company, 1917), p. 3.

169. Negro World, 6 de maio, 10 de junho, 20 de setembro de 1922; New


York Times, 11 de setembro de 1922.

170. Entrevista com J. Charles Zampty, Highland Park, Michigan, 17 de abril


de 1973; Negro World, 2 de setembro de 1922.

171. Entrevista com J. Charles Zampty, Highland Park, Michigan, 17 de abril


de 1913; Negro World, 14 de outubro de 1922, 13 de janeiro de 1923.

172. Guichard Parris e Lester Brooks, Blacks in the City-A Historyof the Na-
tional Urban League (Boston: Little, Brown and Co., 1971), p. 200; Owen e Ran-
dolph expressaram o mesmo medo - Documentos da NCF, Quadro 152.

173. Negro World, 28 de janeiro de 1922.


174. Messenger (novembro de 1917): 31, (janeiro de 1918): 23, (maio-
junho de 1919): 9, 10, 26, 27, (dezembro de 1919): 21, (setembro de 1920); New
YorkAge, 13 de dezembro de 1919, Crisis 21 (dezembro de 1920): 60.

175. Messenger (dezembro de 1920): 178.

176. Messenger (abril-maio de 1920): 3, 4, Chandler Owen para Exmo. Har-


ry M. Daugherty, 26 de janeiro de 1923, RG 60, 198940.

177. Revolutionary Radicalism (Albany, Nova York: J. B. Lyon, 1920), p.


2007

178. Papéis NCF, Caixa 152; Messenger, setembro de 1920, pp. 83, 84.

179. Messenger, outubro de 1920, dezembro de 1920.

180. Ibid., Setembro de 1921, janeiro de 1922.

181. Negro World, 29 de julho de 1922.

182. Ibid., 13 de maio de 1922, citando do Messenger, n.d.

183. Messenger (julho de 1922): 437.

184. Ibid (agosto de 1922) 472; The Public Journal, 29 de julho de 1922;
Garvey to Pickens, 10 de julho de 1922, Pickens to Garvey, 24 de julho de 1922,
Pickens Papers, Box 7; Pickens to Garvey, n.d., julho de 1922, NAACP fUes, Box C-
304.

185. The Public Journal, clipping, n.d.


186. Recortes não datados de The Public Journal, Pickens Papers, Caixa 7.

187. Negro World, 12 de agosto de 1922.

188. “Marcus Garvey deve ir !!!” folheto; Messenger, agosto de 1922. O


anúncio do Messenger tinha um ponto de exclamação.

189. New York World, 2 de agosto de 1922.

190. Ibid., 6 de agosto de 1922; Afew York Times, 7 de agosto de 1922; A. J.


Garvey, Garvey and Garveyism, pp. 96, 97; Secretário adjunto de Randolph, 7 de
agosto de 1922, Randolph para White, 25 de agosto de 1922, Arquivos NAACP,
Caixa C-304.

191. New York Times, 6 de setembro de 1922.

192. Messenger, outubro de 1922.

193. Negro World, 19 de agosto de 1922.

194. Messenger (novembro de 1922): 523.


195. Messenger, novembro de 1922.

196. Ibid. (Dezembro de 1922): 550-552.

197. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 296-298.

198. Ibid., P. 294.

199. Bagnall para Spingarn, 16 de janeiro de 1923, Spingam Papers.

200. O rascunho agora está arquivado em um arquivo com material


amplamente escrito 'Iby Johnson and White. Arquivos NAACP, Caixa C-304. Ver
também ibid., Whiteto Johnson, 17 de maio de 1923, comunicado à imprensa da
NAACP, 18 de maio de 1923, Johnson para Exmo. Julian W. Mack, 19 de maio de
1923.

201. Chandler Owen et al. para Exmo. Harry M. Daugherty, 15 de janeiro de


1923, RG 60, 198940; Garvey, Philosophy and Opinions, II: 293-300.

202. Owen para Daugherty, 26 de janeiro de 1923, RG 60, 198940.

203. Ibid., Murphy para Daugherty, 30 de janeiro de 1923.

204. Ibid., Garvey para Daugherty, 4 de fevereiro de 1923; John W. H. Crim,


procurador-geral adjunto de Garvey, 7 de fevereiro de 1923.

205. Ibid., Procurador-Geral Adjunto de Owen, 20 de fevereiro de 1923.

206. Ibid., Crim to Owen, 23 de fevereiro de 1923.

207. Ibid., Owen to Crim, 26 de fevereiro de 1923.

208. Du Bois para Exmo. Charles Hughes, 5 de janeiro de 1923, em


Aptheker, Correspondence, p. 261.
209. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 300-309.

210. Bruce Papers, Group D, P 3-10, Schomburg Collection, New York Public
Library.

211. Messenger (março de 1923): 638.

212. Ibid., Pp. 639-645.

213. New York Amsterdam News, 7 de março de 1923; Messenger, março de


1923.

214. Messenger (abril de 1923): 748.

215. Ibid. (Março de 1923): 647.

216. Ibid. (Agosto de 1923): 782.

217. Negro World, 6 de outubro de 1923. Era para ser um “Dia da Rosa”
(“Dia da Corrida” de acordo com pelo menos um relatório).

218. Ibid., 20, 27 de outubro de 1923; Pickens (simplesmente “W.P.” nesta


cópia carbono não assinada) para Mattuck, 19 de dezembro de 1923, NAACP Files,
Box C-304.

219. Messenger (julho de 1924): 210, 212.

220. New York Amsterdam News, 11 de fevereiro de 1925.

221. Pickens para Spingarn, 16 de setembro de 1924, Spingarn Papers.

222. Garvey, Philosophy and Opinions, II: 243, 253.

223. Negro World, 6 de fevereiro de 1926.

224. Ibid., 27 de agosto de 1927.

225. New Republic, 52 (31 de agosto de 1927): 46,47.

226. Messenger (janeiro de 1926): 16; Negro World, 27 de agosto de 1927.


Messenger (fevereiro de 1928): 41,45.

227. R. E. Enright, Comissário de Polícia de Bruce, 2 de junho de 1922, Bruce


Papers; Negro World, 10 de junho de 1922.

228. Negro World, 23 de maio de 1931; folheto, n.d., UNIA Central Division
(New York) Files, Box 14, F. 4.

229. Vincent, Black Power e o Movimento Garvey, p. 246. Vincent cita aqui
as seguintes cartas de A. J. Garvey Papers-Du Bois para A. J. Garvey, 8 de abril de
1944, e A. J. Garvey para Du Bois, 24 de abril de 1944.

230. Padmore, History of the Pan-African Congress, p. 62


12

Ku Klux Klan, Supremacia Branca e Garvey - Uma Relação Simbiótica

Entre a Ku Klux Klan e o grupo Associação Nacional para o Progresso


das Pessoas “de Cor” de Moorfield Storey, dê-me a Klan por sua honestidade de
propósito para com o Negro. Eles são melhores amigos da minha raça, por nos
dizerem o que são e o que querem dizer, dando-nos assim uma chance de lutar
por nós mesmos, do que todos os hipócritas reunidos com seus falsos deuses e
religiões, não obstante. Religiões que pregam e não praticam; um Deus de
quem falam, de quem abusam todos os dias - com farsa, hipocrisia e mentira.
Cheira, cheira mal. - Marcus Garvey1

Um homem preto que defende a integridade racial não pode ser


contestado por um homem branco que defende a integridade racial. Eles são
atraídos um pelo outro, pois lutam por uma causa comum. - Earnest Sevier
Cox, da White America Society2

A mais amplamente divulgada das negociações de Garvey com


segregacionistas e supremacistas brancos envolveu sua conferência de cúpula com
a Ku Klux Klan em 1922. Como chefe de uma organização preta com filiais em
todos os Estados Unidos, Garvey enfrentou continuamente a realidade racista da
KKK e grupos semelhantes. Em 1920, a formação de uma divisão da UNIA em Key
West, Flórida, fez com que os brancos da área organizassem uma filial da KKK
como contramedida. O líder local da UNIA, reverendo T. C. Glashen, recebeu vinte e
quatro horas para deixar a cidade do presidente da câmara de comércio. Quando
ele se recusou, foi preso e encarcerado. Após a intervenção do órgão de origem da
UNIA no Harlem, um juiz o visitou na prisão e implorou que ele fosse embora para
evitar um conflito racial entre a UNIA e turbas brancas. Glashen finalmente partiu
para Nova York via Havana, Cuba, já que foi avisado pelo juiz de que seria retirado
do trem se tentasse viajar por terra.3

Novamente, em 1922, R. B. Mosely, alto comissário da UNIA para o Texas, foi


preso e multado por “vadiagem” durante uma excursão de organização. Ao ser
libertado da prisão, ele foi açoitado por uma gangue de oito homens brancos.4 Na
convenção da UNIA daquele ano, vários delegados relataram experiências de
primeira mão da fúria racista branca, incluindo algumas fugas de quase
linchamentos. Um Sr. Davis de Homestead, Alabama, contou sobre as tentativas de
turbas brancas de intimidar e desmantelar a UNIA em sua cidade, esforços que
culminaram no linchamento de um jovem que vendia ações de empresas da UNIA.5

Foi por causa de incidentes como esses que Garvey inicialmente não apenas
apoiou o projeto de lei antilinchamento de Dyer, mas também adotou uma posição
de hostilidade aberta em relação ao KKK. Ele foi citado em 1920 como ameaçando
chicotear a Klan se ela viesse para o norte,6 e vários editoriais do Negro World em
1920 e 1921 eram dirigidos contra esta organização. 7 Uma faixa no desfile da
convenção de 1921 proclamava: “O Novo Negro está pronto para o Ku Klux.” 8

Em junho de 1922, no entanto, durante uma extensa turnê pelos Estados


Unidos, Garvey parou em Atlanta para uma conferência com Edward Young Clarke,
mago imperial da Klan. A iniciativa partiu de Clarke, que encaminhou um pedido à
UNIA local para se encontrar com o líder da UNIA. Garvey aceitou o convite porque
o considerou no melhor interesse de sua organização, dado o histórico de conflito
entre a UNIA e os segregacionistas brancos.

A reunião durou duas horas. Durante esse tempo, cada lado traçou sua
filosofia. Clarke enfatizou que a América era um país do homem branco, que sua
organização defendia a pureza racial e negou que a Klan fosse responsável por
todos os incidentes de intolerância racial atribuídos a ela. Garvey descreveu a
filosofia da UNIA. Ele disse depois: "Eu estava falando com um homem que era
brutalmente um homem branco e estava falando com ele como um homem que era
brutalmente um Negro."9 Como resultado da discussão, Clarke expressou simpatia
pelos objetivos da UNIA , enquanto Garvey foi reforçado em sua suspeita de que a
Klan representava o governo invisível dos Estados Unidos. Ele se convenceu de que
esta organização representava o ponto de vista da maioria branca americana e
ficou impressionado com a afirmação de Clarke de que a Klan era mais forte no
Norte do que no Sul. Ambos os diretores concordaram em publicar um memorando
da reunião em seus respectivos órgãos e Garvey convidou Clarke para o Liberty
Hall para esclarecer melhor a posição da Klan. Nesse ínterim, Garvey parece ter
obtido uma garantia de Clarke de que a Klan se absteria de incomodar a UNIA,
especialmente porque a UNIA não representava uma ameaça à sua fobia em
relação a casamentos inter-raciais. Clarke até disse, de acordo com Garvey, que era
contra homens brancos estuprarem mulheres pretas. E Garvey citou com
aprovação o caso em Baton Rouge, Louisiana, onde membros da UNIA açoitaram
alguns homens brancos que encontraram dormindo com mulheres pretas. Por esta
ação os membros da UNIA foram cumprimentados por um juiz da KKK. O resultado
final de tudo isso foi que Garvey concluiu que, dali em diante, valeria mais a pena
avançar com o programa da UNIA para construir um governo forte na África que
redundaria em benefício dos pretos em toda parte, em vez de perder tempo
atacando o Klan, uma ideia que ele vinha contemplando desde 1921.10

O resultado imediato desta conferência de cúpula UNIA-KKK foi uma


avalanche de protestos de líderes integracionistas pretos, e brancos também. A.
Philip Randolph chegou ao ponto de chamar Garvey de "Líder Negro da Klan”, um
sentimento ecoado pelo comunista Robert Minor, que declarou Garvey "principal
defensor do Klan". 11

O governo federal também entrou em ação quando, durante o julgamento


do caso de fraude postal contra Garvey, forçou Clarke a comparecer sob intimação
perante um grande júri federal em Nova York. Garvey protestou que essa era uma
tentativa de prejudicar ainda mais seu caso, uma vez que suas negociações com a
Klan eram irrelevantes para as acusações contra ele.12
Diante desse clamor, Garvey tentou, em grande parte em vão, contrariar as
visões simplistas apresentadas a respeito de seu encontro com a Klan. Menos de
um mês após a reunião, ele o defendeu desta forma:

Repito, conhecendo o poder, a influência e a intenção da Klan,


entrevistei-os com o propósito de fazer com que, se possível, adotassem
uma atitude diferente em relação à raça e, assim, evitar uma repetição de
várias maneiras do que aconteceu durante os dias da Reconstrução. Por
causa disso, meu esforço para afastar um perigo iminente por meio de uma
melhor compreensão das atitudes desta organização, este sensacionalista
{George Harris] se apresenta com total autoridade de sua ignorância para
me acusar de me render ao Mago e formar um aliança com a Klan. Esta tem
sido a atitude de um grande número de editores Negros em todo o país,
especialmente daqueles que vivem no Norte, que não têm contato diário
com a Ku Klux Klan, como milhões de nosso povo no sul. Esses pedantes e os
chamados patriotas raciais permanecem a 1.500 e 2.000 milhas de distância
e escrevem todo tipo de coisa contra o Sul, contra a Ku Klux Klan e contra as
pessoas com quem eles não entram em contato, deixando as pessoas que
realmente entram contato com eles para sofrer o resultado de sua
propaganda sem sentido e hipócrita. Alguns Negros que falam e escrevem
sobre o Norte farão barulho até Washington, mas sempre que pedem que
troquem de lugar, eles ficam tão calados quanto uma ostra.13

Vários segregacionistas individuais tiveram o apoio de Garvey quando suas


opiniões pareciam coincidir com as dele. Poucos meses antes de sua reunião com a
Klan em 1922, por exemplo, Garvey pediu apoio a uma resolução apresentada no
Senado Estadual do Mississippi pelo senador McCallum. Essa resolução
conclamava a legislatura do Mississippi a homenagear o presidente e o congresso
para garantir por tratado, compra ou outra negociação um pedaço da África onde o
afro-americano pudesse se mover em direção à independência sob a tutela do
governo dos Estados Unidos. Ele sugeriu que uma nação europeia poderia ser
induzida a se separar de tal área em troca de parte da dívida de guerra dos Aliados
com os Estados Unidos.14 Garvey concordou com uma ideia semelhante
apresentada mais ou menos na mesma época pelo senador Joseph I. France de
Maryland. Este plano previa a entrega aos Estados Unidos da ex-África Oriental
Alemã, novamente em troca da dívida de guerra.15

Garvey cooperou também com John Powell do Anglo-Saxon Clubs of


America (clubes anglo-saxões). Powell visitou Garvey na prisão logo após seu
encarceramento em Atlanta em 1925 e, a partir de então, informou que Garvey lhe
havia assegurado “o total apoio de sua organização”. O editor da Negro World, T.
Thomas Fortune, considerou isso um pouco demais e procurou limitar o apoio de
Garvey às doutrinas da pureza racial e da África para os Africanos. Garvey então
telegrafou uma repreensão de Atlanta. “Não sei nada sobre o espírito do editorial”,
ele se irritou, “que considero pernicioso”. Fortune insistiu que seu editorial foi
escrito de boa fé e que não havia “nada nele para modificar ou retratar”. A resposta
de Garvey foi providenciar, da prisão, para Powell falar no Liberty Hall. Lá Powell
explicou, entre outras coisas, que ele havia apresentado uma resolução no ramo
dos clubes anglo-saxões em Richmond, Virgínia, expressando indignação com a
prisão de Garvey.16

Um dos contatos mais extensos de Garvey com segregacionistas brancos era


seu relacionamento com Theodore G. Bilbo. Quando seus caminhos se cruzaram no
final da década de 1930, Bilbo já tinha uma longa e notória carreira pública no
Mississippi. Ele havia sido senador estadual, vice-governador e governador. Na
época de seus contatos com Garveyism, ele estava servindo como senador
democrata no Senado dos Estados Unidos pelo Mississippi.17

Bilbo há muito é um dos racistas mais declarados do país. Ele uma vez
admitiu ter sido iniciado na Ku Klux Klan. Em 1926, ele declarou: “Tratemos o
negro com justiça; dê-lhe justiça; ensine-o que o homem branco é seu verdadeiro
amigo; que ele saiba e entenda de uma vez por todas que ele pertence a uma raça
inferior e que a igualdade social e política nunca será tolerada no sul.” Duas
décadas depois, ele escreveu: “Histórica e cientificamente, a inferioridade da raça
negra quando comparada à raça branca é um fato comprovado e óbvio”, embora
ele afirmasse aqui ter “sempre tratado de forma justa e simpática com o negro”.
Como senador dos Estados Unidos, ele atuou ativamente para impedir que os
negros participassem das primárias do Mississippi. Em 1947, o octogésimo
Congresso, agindo em resposta a um forte clamor dos direitos civis e grupos
religiosos, sindicatos e outras organizações, agiu para impedi-lo de ser empossado
para seu terceiro mandato. A moção foi arquivada porque ele já havia sido atingido
por uma doença fatal.18

Como Garvey, um dos ódios de estimação de Bilbo era a miscigenação, ou


mestiçagem, como ele preferia chamar. Para demonstrar a iniqüidade da mistura
de raças, ele estava disposto a falsificar a história, argumentando que o antigo
Egito era originalmente caucasiano, mas posteriormente declinou devido à mistura
de raças. “O desejo de misturar, mestiçar, cruzar ou casar com a raça branca”, ele
atribuiu principalmente aos “mulatos ou vira-latas” que estavam “agora em um
grau alarmante encontrado na raça negra neste país”. Não surpreendentemente,
ele deplorou o casamento de uma garota branca" com o negro corpulento,
fraudulento, barrigudo, negro como o carvão, de setenta anos que se
autodenomina Pai Divino". A certa altura, ele apresentou um projeto de lei para
proibir casamentos interraciais em Washington, D.C.19
As ligações de Bilbo com Garvey e Garveyistas giravam em torno da
proposta de Lei da Grande Libéria, que ele introduziu no Senado dos Estados
Unidos em 1939. A lei exigia o repatriamento voluntário de afro-americanos para a
África Ocidental com a assistência do governo dos Estados Unidos. Bilbo nem
sempre considerou a repatriação viável. Em 1923, ele zombou do "esquema do
senador T. G. McCallum para mover negros dos Estados Unidos para a África mais
escura" como "maravilhoso de contemplar, um fato a ser desejado com devoção,
mas. . . um sonho inviável.”24

Vários fatores o levaram a modificar sua opinião. Por uma coisa ele ficou
impressionado com Garvey, a quem considerava "o mais conspícuo [sic] de todos
os organizadores de sua raça" e "um líder negro notável e mundialmente
conhecido”.21 Garvey, disse ele, "definitivamente teve sucesso em estabelecer o fato
de que há um impulso dominante, uma afirmação divina entre as massas de negros
nos Estados Unidos por um país próprio e um governo administrado por eles.” 22

Ele também ficou impressionado com as atividades do Movimento pela Paz


da Etiópia. Esta organização, que liderou o impulso para a repatriação afro-
americana durante os anos 1930, foi liderada pela Sra. Mittie Maude Lena Gordon
de Chicago, uma ex-membro da UNIA e uma eterna admiradora de Marcus Garvey.
A Sra. Gordon viu a emigração como a única saída para o sofrimento que caiu sobre
os negros durante a depressão. Em uma carta comovente para Bilbo, ela prometeu
seu apoio ao projeto dele porque, disse ela, estava cansada de ver crianças
morrerem.23 Em 1933, o Movimento pela Paz da Etiópia havia pedido ao
presidente Roosevelt ajuda para chegar à África. A petição apontava que o custo de
ajudar os negros a estabelecer as bases para uma vida modesta na África seria
menor do que a caridade com qual eles foram forçados a subsistir na América sem
culpa própria.24 Bilbo afirmou que os comissários do movimento haviam viajado
para a Libéria e foi garantido pelo presidente do país que “milhões de acres”
aguardavam os afro-americanos.25 A Sra. Gordon mais tarde foi desfavorecida em
relação a Bilbo e seus patriotas segregacionistas quando foi presa por
supostamente colaborar com os japoneses durante a Segunda Guerra Mundial. 26

Bilbo também passou a defender a repatriação porque a África era, ou assim


ele fingiu acreditar, o continente mais rico do mundo. Ele relatou em termos
maravilhosos a história de um emigrante do Mississippi que colheu doze safras de
batata-doce por ano no clima ameno da Libéria.27 Ele acrescentou a esses motivos
seu medo de uma "raça mestiça" se desenvolver na América e o fato de que os afro-
descendentes adquiriram habilidades durante sua estada forçada nas terras do
homem branco, o que aumentaria sua habilidade de se realizar na África.
Finalmente, durante a Segunda Guerra Mundial, ele previu "tantos problemas com
a raça negra em todas as partes do país" no final da guerra que certamente haveria
"uma demanda gritante pela aprovação de minha legislação".28

Bilbo previa a remoção de cinco a oito milhões de pretos em um período de


quinze a vinte e cinco anos. Concentrando-se em pessoas em idade produtiva e
jovens, esperava-se que aqueles que permaneceram morressem no curso normal
das coisas.29 Para evitar uma possível brecha, ele fez provisões especificamente
para estrangeiros pretos nos Estados Unidos participarem de seu esquema de
repatriação.30 E quando os emigrantes se instalassem na África Ocidental, declarou
ele, faria de Eleanor Roosevelt, esposa do presidente dos Estados Unidos, “Rainha
da Grande Libéria”, provavelmente uma indicação de sua antipatia pelas
tendências liberais da primeira-dama.31

O apoio de Garvey ao projeto de lei de Bilbo foi extenso. Em agosto de 1938,


a Oitava Convenção Internacional da UNIA, reunida em Toronto, Canadá, aprovou
uma resolução unânime de apoio. Garvey enviou cópias ao presidente Roosevelt e
a Bilbo.32 Pouco depois, a UNIA de Virginia enviou um telegrama de apoio ao
presidente.33 Os líderes da UNIA em Nova York, Filadélfia e outros locais trocaram
correspondência com Bilbo, enviaram delegações a Washington, distribuíram
cópias do projeto de lei, e reuniões de massa organizadas para apoiá-lo. Em abril
de 1939, a UNIA contribuiu com 50.000 assinaturas nos dois milhões que Bilbo
disse ter coletado. Bilbo, a certa altura, tentou obter fundos para enviar alguns de
seus apoiadores do Harlem em uma turnê de palestras.34 A UNIA até mesmo
realizou um debate público sobre o projeto no Brooklyn.35 E Garvey, da Inglaterra,
nomeou um comitê especial para fazer lobby em Washington durante a execução
da introdução do projeto.34 Líderes da UNIA de Nova York, Filadélfia e Cleveland
mais tarde uniram-se em um "Comitê de Lobby sobre a Lei da Grande Libéria".37

Garvey, como de costume em suas relações com os segregacionistas,


assumiu a posição de que, uma vez que o que o senador estivesse propondo era o
que ele queria, os motivos de Bilbo eram irrelevantes. “O desejo do senador de
cumprir o propósito de seu projeto de lei pode não ser tão idealista quanto os
Negros desejam”, argumentou Garvey, “mas esse não é o ponto a ser considerado.
O que se quer agora é a oportunidade do Negro de se estabelecer e não há dúvida
de que esse projeto de lei oferece essa oportunidade.” 38

O projeto de Bilbo, após duas leituras no Senado, foi encaminhado à


Comissão de Relações Exteriores por envolver negociações com uma potência
estrangeira. Isso, para todos os efeitos práticos, foi o fim de tudo. Em 1946, ele
expressou a intenção de ressuscitá-lo no congresso seguinte, mas a morte
interveio.39

Intimamente relacionado ao apoio de Garvey ao projeto de lei de Bilbo


estava sua associação de longa data com Earnest Sevier Cox, um trabalhador
incansável na causa da White America Society (Sociedade da Amérca Branca) e um
amigo próximo e associado de Bilbo. Cox, um residente da Virgínia, afirmou ter se
interessado por questões raciais pela primeira vez quando entrou em contato com
pessoas pretas enquanto era estudante de graduação na Universidade de Chicago.
Esse interesse, disse ele em 1931, o levou a gastar US$ 60.000 de seu próprio
dinheiro. Ele alegou também ter viajado muito pela África. 40 Talvez por essa razão,
ele apoiou o programa Africano de Garvey, mesmo considerando a colonização
branca naquele continente "impraticável e... injusto com o Negro.” 41 Ele tinha os
contatos mais próximos com as bases da UNIA do que qualquer segregacionista.
Não apenas ele se dirigiu a uma reunião ocasional da UNIA, mas afirmou estar em
correspondência com Garveyistas em vinte e seis estados, bem como Jamaica,
Panamá, Honduras, Cuba, Haiti, Santo Domingo e outros lugares. 42 Garveyistas em
Detroit venderam 17.000 cópias de seu livro White America, principalmente para
pessoas brancas.43 Sua associação com a UNIA, iniciada no início dos anos 1920,
ainda era muito viva em 1961.44
Cox dedicou seu livro “Let My People Go” (Deixe Meu Povo Ir ) a Garvey e o
discutiu com sua aprovação em outro, “The South’s Part in Mongrelizing the
Nation” (“A Parte do Sul na Mestiçagem da Nação ”). Como Garvey, no entanto, ele
se ressentia da visão simplista que via na relação entre os defensores pretos da
pureza racial e os defensores brancos da pureza racial algum tipo de aliança
abrangente. Assim, quando o Norfolk Journal and Guide sugeriu que havia uma
aliança entre os dois homens e que Cox era discípulo de Garvey, sua refutação foi
tão enfática quanto o aborrecimento de Garvey por ser chamado de membro do
Klan. Ele ressaltou que havia um entendimento entre os dois homens sobre a
questão da integridade racial, e isso era tudo.45

A maior parte da colaboração de Cox com a UNIA girou em torno de sua


adoção da emigração afro-americana para a África. Ele se via como um sucessor de
estadistas americanos brancos racistas como Thomas Jefferson e Ben Tillman, bem
como o "grande emancipador" Abraham Lincoln, todos os quais eram a favor da
repatriação dos afro-americanos.46 Como residente da Virgínia, ele estava
especialmente ciente do histórico de antecedentes do estado ao seu trabalho.
Virginia era o lar de Thomas Jefferson. A assembleia da Virgínia também apoiou a
American Colonization Society, que era responsável por estabelecer os afro-
americanos na Libéria desde o início do século XIX.

Em 1932, Cox arquitetou a introdução na legislatura do estado da Virgínia


de uma resolução sugerindo que o governo federal fosse homenageado para ajudar
na emigração para a Libéria. A resolução foi redigida em linguagem quase idêntica
à segunda mensagem de Abraham Lincoln ao Congresso. Ela gerou muita oposição
e morreu no comitê.41 Em 1936, seus esforços foram mais bem-sucedidos. O estado
da Virgínia, nesta ocasião, fez uma homenagem ao congresso pela assistência
federal à ideia da Grande Libéria. Cox posteriormente agradeceu ao governador da
Virgínia em nome da UNIA, do Movimento pela Paz da Etiópia, da União Nacional
para Afrodescendentes e de um grupo de pretos da Virgínia.48

Cox trabalhou em estreita colaboração com Bilbo para a popularização do


projeto de lei de Bilbo e os dois homens tentaram arduamente levar Garvey de
volta aos Estados Unidos. No caso de Cox, esses esforços datavam de pelo menos
1931.49 Em 1938, o esforço era intenso devido à convicção de Bilbo de que a
presença de Garvey, mesmo com uma licença temporária, aumentaria muito as
chances de sucesso de seu projeto.50 Cox tinha outro motivo para querer Garvey de
volta, ou seja, para compensar a influência da NAACP.51

O episódio mais bizarro na história da atração que o Garveyismo exerceu


sobre os segregacionistas brancos veio do romancista Thomas Dixon, cujos
esforços literários glorificando a Ku Klux Klan e a supremacia branca há muito
tempo lhe rendiam uma notoriedade que rivalizava, se não excedesse, aquela
atribuída a Bilbo. Foi Dixon cujo romance difamatório “The Clansman”(O Membro
da Clan) suscitou oposição maciça da NAACP e de outros grupos de direitos civis
quando apareceu em 1915 como o filme “Birth of a Nation” (O Nascimento de uma
Nação). O filme, assim como o livro, procurou apresentar a emancipação e a
concessão dos direitos civis aos afro-americanos durante a reconstrução como um
grande equívoco.

Em 1939, o ano do projeto de lei de Bilbo, Dixon publicou um romance


intitulado “The Flaming Sword” (A Espada Flamejante”). O romance era quente, de
movimento rápido, emocionante de certa forma e muito longo. Dixon,
considerando o romance "a forma mais vívida e precisa em que a história pode ser
escrita", presumiu "dar um registro oficial do Conflito de Cor na América de 1900 a
1938."52 O romance era essencialmente um ataque épico contra o que a sobrecapa
chamou de “o único problema não resolvido da América que ameaça nossa
existência como povo civilizado”. Esse problema, é claro, era a mistura de raças.
Dixon advertiu em seu prefácio que ele havia “sido compelido a usar homens e
mulheres vivos como personagens importantes”. Ele advertiu ainda, com notável
autoconfiança: “Se fui injusto no tratamento, eles têm seu remédio sob a lei da
difamação. Eu me considero responsável. ” Tendo assim limpado o ar, ele passou a
encher seu livro com todos os tipos de insultos vis contra "a junta lutando pelo
casamento interracial", a saber, Du Bois, James Weldon Johnson, A. Philip
Randolph, os comunistas James W. Ford e Earl Browder, a Fraternidade de Sangue
Africana, Claude McKay, Carl VanVechten, JE Spingarn, Moorfield Storey e outros. O
frontispício do livro trazia uma citação de Du Bois da qual Dixon extraiu o título:
“Do outro lado deste caminho está o sul com uma espada flamejante.”

Dixon não deixou de destacar os estereótipos racistas normais de escravos


felizes e satisfeitos e lascivas “feras” negras cobiçando mulheres brancas. Um deles
matou um homem branco e seus dois cães, amordaçou seu filho, estuprou uma
mulher branca até a morte na casa do homem morto e acabou sendo linchado.
Depois de acabar com a mulher, o estuprador foi obrigado a dizer: “Um neguinho
do Harlem me mandou um livrinho que diz que eu tenho o direito de me casar com
uma garota branca e eu vim buscá-la. Não posso casar com ela aqui, mas por Deus,
eu a peguei." Descobriu-se que sua inspiração havia sido um poema de James
Weldon Johnson intitulado "The White Witch" (“A Bruxa Branca”) contendo as
seguintes linhas:

E eu beijei seus lábios vermelhos,


E o rosto cruel tão branco e belo;

Em torno de mim ela enroscou os braços,

E me prendeu com seu cabelo amarelo.53

A história, tal como foi, era apenas uma desculpa na qual Dixon poderia
injetar suas idéias sobre relações raciais. Seu argumento básico era que o bom
trabalho iniciado por Booker T. Washington e continuado por Garvey corria o risco
de ser destruído por Du Bois e pelos integracionistas. Ele comparou o quase branco
Du Bois com Washington, que

apesar da tonalidade amarela em sua pele mais escura, era


inconfundivelmente africano em cada linha de seu rosto e corpo. E
não do tipo mais bonito. Seu cabelo, que tendia a enrolar apesar das
loções modernas, era áspero e totalmente negróide. Suas orelhas
grandes estavam propensas a cair. Seu nariz era grande e achatado.
Sua mandíbula era pesada. Cada característica o carimbava como um
negro entre negros. Somente de seus olhos graves e fortes brilhava a
luz da liderança. Ele era corpulento e esparramado à moda negra
quando sentado.54

Ele considerava Garvey o "sucessor lógico" de Abraham Lincoln e Thomas


Jefferson por causa de seus esforços emigracionistas e também "o maior negro do
mundo moderno". Sua heroína, em uma viagem ao Harlem, ouviu um discurso de
Garvey e foi conquistada pela ideia da repatriação. Ela foi reforçada nessa opinião
quando leu Earnest Sevier Cox sobre a superioridade branca e a necessidade da
repatriação preta. Perto do final do livro, o herói morreu e deixou um fundo de US$
10 milhões para o estabelecimento de uma Sociedade de Colonização Marcus
Garvey para a “colonização pacífica e voluntária da raça Negra”. O livro terminou
com a América pega desprevenida no meio de uma revolução comunista. Assim
terminou, sem dúvida, a homenagem mais estranha já prestada a Marcus Garvey.
Earnest Sevier Cox considerou-o "o primeiro romance colonizacionista desde
“Uncle Tom’s Cabin” (A Cabana do Pai Tomás)". 55

Houve outros casos de afinidade de Garvey com segregacionistas. A Liga de


Emergência Alemã contra o Terror Negro supostamente buscou sua ajuda em 1921
para a remoção das tropas Africanas francesas da Renânia.56 Garvey já havia se
oposto à presença dessas tropas, mas por razões diferentes ele achava que os
franceses tinham medo de mandá-los para casa, pois seu treinamento militar podia
ser um mau negócio para o colonialismo francês.57

Em 1921, Garvey também endossou de forma polêmica o discurso do


presidente Harding em Birmingham, Alabama, que evitava a "fusão racial", sugeriu
que os negros não deveriam mais votar solidamente nos republicanos e apelou aos
brancos do sul para que não votassem solidamente nos democratas. Garvey ficou
sem dúvida impressionado com a sugestão de Harding de que o homem preto
deveria ser "o melhor homem preto possível e não a melhor imitação possível de
um homem branco". 58

A história de Garvey e a supremacia branca é muito incomum e suscetível


de fácil interpretação errônea. O que a história prova é que Garvey deve
certamente ser o separatista preto mais obstinado de todos os tempos. Seu amor
feroz por sua própria raça o colocou na posição improvável de compartilhar com
os racistas brancos mais notórios da América, uma hostilidade aos integracionistas
e uma defesa da emigração. Pessoas como Bilbo e Cox continuaram a pregar a
superioridade branca para o benefício de seus iguais, mas em suas negociações
diretas com Garvey e seus representantes não havia nenhum indício de arrogância
racial. Cada lado estava ciente da posição do outro e preferia se concentrar o
máximo possível nas áreas de interesse comum. Como Garvey disse sobre sua
entrevista com o representante de Rian: “Eu estava falando com um homem que
era brutalmente um homem branco, e estava falando com ele como um homem que
era brutalmente um Negro”.

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