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Distorções não são novidade para a história Afro-Americana, mas seria difí-
cil encontrar uma figura Preta que tenha sofrido mais nas mãos de historiadores e
críticos. Este estudo pretende tratar Marcus Garvey e a Associação Universal para
o Progresso Negro com a seriedade e o respeito que merecem.
– Marcus Garvey¹
– Marcus Garvey²
Marcus Mosiah Garvey nasceu em St. Ann's Bay, Jamaica, no dia 17 de agos-
to, 1887. Sua infância foi profundamente enraizada no ambiente camponês que o
cercava. Certa vez descrevera sobre um tio, para quem às vezes trabalhava, como
meeiro rural. Seus próprios pais eram do ramo da agricultura camponesa em pe-
quena escala. No entanto, Garvey não teve uma típica experiência camponesa. Seu
pai, descendente dos quilombolas Marroons, ex-escravizados Africanos-
Jamaicanos que desafiaram com sucesso o regime escravista, também foi um co-
merciante habilidoso, além de pedreiro. O histórico de Garvey o distingue ainda
mais do típico camponês, pois seu pai possuía uma biblioteca, cujos volumes de-
ram a Garvey um gosto precoce pela leitura.
Ele continuou, por mais ou menos um ano, a vagar pela América Latina, indo
para lugares como Panamá e Equador, onde as Índias Ocidentais trabalham tinham
migrado em grande escala, a procura de trabalho. Ele observou a degradação uni-
versal da raça Preta, trabalhou intermitentemente para financiar suas viagens, e
iniciou outro pequeno jornal, em Colón, Panamá, assim agitando trabalhadores
negros. Um trabalhador negro de Colon na época lembra ter conhecido Garvey por
volta de 1912, quando se dirigiu à população predominantemente negra no Colon
Federal Labor Union.⁵ Existe a possibilidade de Garvey ter parado brevemente,
talvez em trânsito por algum um porto marítimo, em algum lugar do Estados Uni-
dos durante este período.⁶
Da América Central, Garvey retornou rapidamente à Jamaica, e pelo outono
de 1912, sem se intimidar pela falta de dinheiro, ele estava na Inglaterra, onde sua
única irmã sobrevivente, Indiana, trabalhava como governanta. Na Inglaterra, ele
se entregou à paixão de falar em público, no Hyde Park's Speakers' Corner, e era
um visitante regular na House of Commons e trabalhou para o Africa Times and
Orient Review, o então principal jornal Pan-Africano. Encontrou tempo para visitar
a Escócia, Irlanda, França, Itália, Espanha, Áustria, Hungria e Alemanha.⁸ Garvey
disse mais tarde que participou algumas aulas de direito no Birkbeck College da
Universidade de Londres.⁸
Nos últimos dez anos, dediquei meu tempo ao estudo das condições
do negro, aqui, ali e em todos os lugares, e eu vim a perceber que ele ainda é
objeto de degradação e ter se pena pelo mundo, no sentido de que ele não
tem status social, nacional ou comercialmente (com um mínimo de exceção
nos Estados Unidos da América)... ¹²
Como Garvey escrevera mais tarde: “Eu tive que decidir se deveria agradar
meus amigos e ser um dos 'negro-brancos' da Jamaica, e ser razoavelmente prós-
pero, ou sair abertamente defendendo e ajudando a melhorar e proteger a integri-
dade dos milhões de negros, e sofrer por isto.” ¹⁴
Garvey chegou à Nova York em 23 de março de 1916, para uma turnê de pa-
lestras que ele achava que duraria apenas cinco meses cuja audiência ficaria restri-
ta principalmente aos negros no Sul. Ele providenciou que seu correio fosse entre-
gue para um endereço na Jamaica durante a sua ausência e informando onde quer
que ele fosse na América, e que estava angariando fundos para um instituto indus-
trial para se estabelecer na Jamaica.
A primeira filial da UNIA de Garvey em Nova York, bem como sua se-
gunda tentativa no início de 1918, fora concebida como auxiliar do quartel-general
na Jamaica. O próprio Garvey, como presidente da divisão da Jamaica, não ocupava
cargo lá. Ambos os esforços para estabelecer filiais da UNIA foram interrompidos
por tentativas de socialistas e republicanos de transformá-las em clubes políticos.
Numa terceira tentativa baseada num plano de núcleo para treze membros, Garvey
consentiu em se tornar presidente da filial em Nova York, concretizando assim
uma decisão que com toda a probabilidade já havia contemplado - ou seja, jogar
seu balde nos Estados Unidos.²² Com esta jogada, a cidade de Nova York abasteceu
a Kingston, Jamaica, como sede da UNIA. Uma cisma desenvolveu-se nesta nova
tentativa, também, mas Garvey resistiu à tempestade. O local de encontro da asso-
ciação, no entanto, mudou-se do Lafayette Hall para o Palace Casino, onde perma-
neceu durante a maior parte de 1918.
Uma vez que Garvey decide permanecer nos Estados Unidos, ele se-
guiu adiante com vigor renovado. A UNIA foi oficializada sob as leis de Nova York
em 2 de julho de 1918. Em 31 de julho, a Liga das Comunidades Africanas foi cons-
tituída como uma corporação comercial. Um ou dois meses depois surge o Negro
World, destinado a se tornar o mais difundido dos jornais raciais e a ruína dos co-
lonialistas europeus. Garvey fora inicialmente seu editor. As primeiras edições fo-
ram distribuídas gratuitamente ao serem disponibilizadas por debaixo das portas
das pessoas em suas primeiras horas.
Tabela 1.
Distribuição das Filiais da UNIA nos Estados Unidos, ca. 1926
----------------------
Fonte: Adaptado de dados da Divisão Central da UNIA (Nova York) arquivos, Cole-
ção Schomburg, Biblioteca Pública de Nova York.
Tabela 2.
Distribuição das Filiais da UNIA Fora dos Estados Unidos, ca. 1926
---------------------
Fonte: Adaptado de dados da Divisão Central da UNIA (Nova York) arquivos, Cole-
ção Schomburg, Biblioteca Pública de Nova York.
Fora dos Estados Unidos, Cuba liderou com cinquenta-e-duas filiais, mais do
que qualquer estado dos Estados Unidos, exceto a Louisiana. A maior área do Cari-
be (incluindo a América Central e o norte da América do Sul) era, sem dúvidas, o
maior reduto Garveyísta fora dos Estados Unidos. A África do Sul era o melhor or-
ganizado dos países africanos. Nenhuma área de população negra significativa no
mundo estava sem uma filial UNIA. Incluindo Canadá, Europa e Austrália.
Uma conclusão importante a ser tirada dos números deste capítulo é que a
UNIA continuou a se expandir após o encarceramento de Garvey em 1925. Alguns
ramos estavam, sem dúvida, desmantelando-se, mesmo quando novos eram adici-
onados, mas a evidência de quantos é inconclusiva. Certamente, em 1926, alguns
ramos não estavam enviando informações atualizadas para a sede, mas isso sem-
pre foi um problema e não indicam falta de atividade.
Cinco mil seguidores leais estavam à disposição em Nova Orleãs para ouvi-
rem o discurso de despedida de Garvey direto do convés do navio que o levava pa-
ra o Caribe. Eles ficaram na chuva e cantaram o hino da UNIA, “Deus Abençoe Nos-
so Presidente”, enquanto o navio se afastava, levando seu líder da cena de seus
maiores triunfos, para nunca mais pisar nos Estados Unidos.
Quando o navio parou no Panamá, Garvey foi recebido por uma delegação
da UNIA local. E na Jamaica, onde chegou em 10 de dezembro de 1927, ele foi rece-
bido como herói junto a uma das maiores multidões da história da ilha reunidas
para cumprimentá-lo.
Em 1931, Garvey fez mais uma viagem à Inglaterra e à Liga dos Nações. De
volta à Jamaica, ele continuou a realizar reuniões políticas, formou uma empresa
no ramo de entretenimento e se aventurou em imóveis. Uma Seventh International
Convention foi realizada na Jamaica em 1934, seguida alguns meses depois por
uma mudança de sua base de operações para a Inglaterra.³⁴
NOTAS
– Marcus Garvey¹
O que acreditamos
– Marcus Garvey²
Minimamente percebido
Algumas pessoas estão com medo, algumas irritadas e outras enojadas por-
que nós, como eles dizem,
Ainda haverá um jogo justo neste país. “O Homem Preto” está a serviço e em
breve irá enegrecer algumas dessas lojas e escritórios de forma descomunal.²⁷
Assim, enquanto a UNIA nos Estados Unidos estava entre suas fileiras pes-
soas de todas as cores, excluindo brancos, empresários e profissionais do ramo,
somados à grande massa de trabalhadores e camponeses, na Jamaica foi em grande
parte confinada às “seções mais humildes” da humanidade. Isso levou Garvey a
provocar que “Deus parece salvar de baixo para cima”. ³³
A experiência de Garvey com o elemento pele clara, tanto nas Índias Ociden-
tais como na América, o levou a ser hostil com aqueles que pareciam diminuir for-
ma arrogante de tratar o que ele abominava. Isso o levou, também, a considerar
miscigenação como um mal que não deve ser perpetuado - “Nós somos conscientes
do fato de que a escravidão trouxe sobre nós a maldição de tantas cores dentro de
nossa Raça, mas não é por isso que nós mesmos devamos perpetuar este mal... .” ³⁴
A doutrina de Raça Primeiro tivera inúmeras implicações para a atitude de
Garvey para com os brancos. Significava antes de tudo a exclusão dos brancos co-
mo membros da UNIA e organizações afiliadas. Brancos também foram impedidos
de deter participações nas empresas econômicas de Garvey. Seu desejo de constru-
ir uma autoconfiança racial o levou logicamente à rejeição da filantropia financeira
branca. Em resposta a uma sugestão de um repórter branco, em 1921, sobre “cer-
tos negrófilos de Massachusetts” possam querer contribuir para UNIA; Garvey res-
pondeu: “Nós não queremos dinheiro deles; este é um movimento de homens ne-
gros”. ³⁵
Além disso, Garvey acreditava que o homem Negro tinha poucas opções na
questão. Se ele não seguisse em frente, estimulado por seus próprios esforços, en-
tão ele sucumbiria na escravidão e até o extermínio. “Os dias da escravidão não se
foram para sempre”, lembrava aos seguidores. “A escravidão é uma ameaça para
todas as raças e nações que permanecem fracas e se recusam a organizar suas for-
ças para sua própria proteção”.⁴⁸
A luta pela autoconfiança é bem ilustrada pelo status do Negro Factory Cor-
poration em meados de 1922. Haviam três mercearias. A compra cooperativa para
todas as lojas e restaurantes fora realizada por um só gerente, mantendo assim os
preços competitivos com os empreendimentos brancos, que proliferaram no Har-
lem. Na Universal Grocery Store nº 1 (47 West 135 Street), o gerente relatou uma
minoria de clientes brancos. Na Grocery Store nº 2 (646 Lenox Avenue, entre as
ruas 142 e 143) foi relatado que estava indo bem, apesar de cercada por concor-
rência branca. A Loja nº 3, na 552 Lenox Avenue e 138 Street, foi dito ser a mais
florescente das três. Incluía mercado de aves, peixe e carne, considerado o único
desse tipo no Harlem. Além de também ostentar o primeiro açougueiro Negro no
Harlem. As mercearias apresentavam tais alimentos, como inhame das Índias Oci-
dentais, ervilhas, inhambus, abóboras e bananas-da-terra, além de batata-doce do
sul e melaço de cana.
NOTAS
– Marcus Garvey¹
– Marcus Garvey²
E “tudo o que vem com isto” a UNIA tinha de fato. Durante o período ameri-
cano de Garvey ela tornara-se um microcosmo da nação africana que Garvey espe-
rava construir. Nas convenções internacionais iniciadas em 1920, a UNIA teve, nas
palavras de Garvey, “a maior Assembleia Legislativa de todos os tempos reunida
pelos povos negros do mundo”⁴. Tendo debatido, geralmente durante todos os
trinta-e-um dias agosto, além de contar com todos os funcionários, incluindo o
próprio Garvey, foram devidamente eleitos. Os delegados, eleitos por filiais da
UNIA e outras organizações raciais, marcaram presença de lugares tão distantes
quanto a Austrália, África e América do Norte. Presidindo a organização desde
1920 havia um potentado, uma espécie de monarquia constitucional. A legislação
da UNIA estipulava que o potentado deveria ser um Africano de pátria. O próprio
Garvey, como chefe executivo, recebera o título de presidente provisório da África.
O mundo negro foi subdividida em várias grandes regiões geográficas, cada uma
presidida por um líder. A organização tinha seu próprio “Hino Universal da Etió-
pia”, que em 1920 foi adotado como “o Hino da Raça Negra”⁵, também como sua
própria Magna Carta em sua Declaration of Rights of the Negro Peoples of the
World adotada na convenção de 1920. Garvey deteve o título de “Honorável” nesta
convenção. Um R.H. da UNIA administrava exames e preparava trabalhadores para
o servir a organização. A UNIA também concebia tratados de nacionalidade, conce-
dendo títulos a membros merecedores da raça. Brancos, assim como Negros, os
críticos ridicularizavam a prática, à qual Garvey retrucou: “Sou acusado de criar
Duques, Barões e Cavaleiros. Quem deu ao homem branco a monopolização de cri-
ar ordens sociais?”⁶ Com lógica semelhante, Garvey insistiu em vestir, em ocasiões
cerimoniais, uniformes e túnicas à moda daqueles usado pelos líderes dos estados
soberanos. Garvey vivera o suficiente para ver fascistas italianos instalarem um
duque de Adis Abeba depois sua invasão na Etiópia. Ele notou incisivamente a falta
de hostilidade para esta ocorrência, daqueles que o ridicularizaram em 1924 ao
nomear John E. Bruce como Duque do Nilo.⁷ Os atributos externos da nação foram
evidenciados também nos auxiliares uniformizados da UNIA, como nas Universal
African Legions, o Universal Motor Corps, a Universal African Black Cross Nurses e
seu setor de juvenis e assim por diante.
Mesmo antes, porém, da declaração e proposta sobre a Casa Negra (que não
fora implementada) a UNIA enviou comissários à França para atenderem à Confe-
rência de Paz em Paris, 1919. Seus esforços de lobby não tiveram sucesso ao bus-
carem qualquer abatimento no zelo das potências imperialistas europeias em to-
marem posse das ex-colônias alemãs Africanas. Talvez por isso, a declaração de
1920 comentou sobre a Liga das Nações como sendo “nula e sem efeito no que se
trata do Negro, na medida em que procura privar os Negros de sua liberdade”.¹⁷
No entanto, em 1922, a UNIA estava pronta para tentar a liga novamente. Contando
com uma delegação composta por George O. Marke, treinado em Oxford, da Sierra
Leone, Professor J. J. Adam do Haiti, que foi formado em Tuskegee, William LeVan
Sherrill da Afro-America, formado em Philander Smith College, Little Rock, Arkan-
sas, e o professor James O'Meally da Jamaica, ex-professor da Calabar College, foi
para Geneva apresentar uma petição perante a liga. A petição pedia que as ex-
colônias alemãs sejam entregues à liderança negra, uma vez que os soldados ne-
gros eram responsáveis por sua captura. A petição sugeria que, sob liderança ne-
gra, eles poderiam fazer valer dentro de vinte anos. Então quatrocentos milhões de
Negros ão seriam mais servos.¹⁸
... o trabalho pode ter juízo suficiente para saber que o melhor cami-
nho que poderia adotar para sua prosperidade é ser justo e amigável com
todos os grupos humanos. Nós não contemplaríamos o trabalho tendo sair
para lutar contra outros povos para a exploração aventureira de é nativos a
tais povos. Não podemos pensar em Ramsay MacDonald como Primeiro Mi-
nistro da Inglaterra declarando guerra contra os nativos africanos que pro-
curam proteger seus direitos nativos. Mas esperaríamos isto de David Lloyd
George ou um Arthur J. Balfour, que representam o elemento Tory e as mul-
tidões capitalistas de seu país… Logo, estamos felizes com a queda do Go-
verno Tory da Inglaterra. Também nos alegramos quando outras organiza-
ções políticas monopolistas desmoronam para serem sucedidas pelo con-
trole desse elemento das pessoas que sabem o que é amor humano, sabem
o que é justiça.⁵¹
Sua dupla inclinação entre apoio limitado e uma oposição hostil à Hilter e
Mussolini podem ser melhor explicadas por uma declaração de 1933 sobre Hitler:
NOTAS
– Marcus Garvey¹
... apesar de todas as evidências ... Negros ainda acreditam que Garvey
não está morto. O que está errado? Ele era imortal? Não era ele humano e
sujeito à doença e à morte como o resto de nós?
– S. V. Smith, tesoureiro,
Harmony Division, Jamaica²
Garvey tinha contato frequente com a religião durante seus primeiros anos.
Aos sete anos de idade ele supostamente gostava de fazer o papel de pregador en-
tre seus colegas. Menino, também, ele tocava órgão na Wesleyan Methodist Church
em St. Ann's Bay, Jamaica, a igreja de onde pertenciam seus pais.⁵ Garvey mais tar-
de se converteu ao catolicismo, o que não o impediu de seguir uma linha indepen-
dente em assuntos religiosos.
Eles regularmente o comparavam a Cristo. Como Cristo, ele foi traído por
dinheiro e condenado pelos governos. E seu evangelho, também, seria pregado a
todas as nações e precipitaria o fim da barbárie.⁹ Um pregador escreveu um livro
no qual dissertou que Garvey havia trazido à raça a UNIA através da instrumenta-
lidade de Deus.¹⁰ Garveyístas de Colón, Panamá, buscando a libertação de seu líder
da prisão no Estados Unidos, informou ao presidente Coolidge que “Nós, os Negros
do mundo vemos Garvey como um super-homem; um semideus; e como o reencar-
nado Anjo da Paz, que veio do Céu para dar a Salvação Política” a um povo oprimi-
do. “Sim,” esta mensagem continuou, “nós amamos Garvey semelhante a nosso
deus.”¹¹ Uma divisão de Nova York chegou a canonizar Garvey em vida, após sua
expulsão dos Estados Unidos.¹² Essa tendência de apoteose a Garvey encontrou
expressão nas palavras do Credo da UNIA: “Cremos em Deus, o Criador de todas as
coisas e pessoas, em Jesus Cristo, Seu Filho, o Salvador Espiritual de toda a huma-
nidade. Nós acreditamos em Marcus Garvey, o líder dos povos Negros do mundo, e
em no programa enunciado por ele através da UNIA... a redenção da África”.¹³ Um
credo semelhante encontrou seu caminho em uma Igreja nacionalista Sul- Africa-
na: “Cremos em um Deus, Criador de todas as coisas, Pai da Etiopia… a quem
Athlyi, Marcus Garvey e colegas vieram salvar? Os filhos oprimidos da Etiópia, para
que pudessem se tornar grande poder entre as nações”.¹⁴ Foi coerente, com essa
veneração que alguns dos seguidores de Garvey a princípio se recusaram a acredi-
tar nos relatos de sua morte (em parte devido ao fato de que os primeiros relatos
de seu falecimento foram na verdade, falsos) e teria de se ter certeza de que Garvey
realmente havia falecido, mas permanecera em espírito para compartilhar as ale-
grias e tristezas de seu povo.
Garvey não se entregou à religião por si só, no entanto, mas a usou como se
usa a arte, para promover seu programa de orgulho racial e autodeterminação. Seu
uso político da religião começou pelo simples argumento de que se, como prega-
vam as igrejas cristãs estabelecidas, o homem foi feito à imagem semelhança de
Deus, então os homens negros devem representar um Deus em sua própria ima-
gem e semelhança, que inevitavelmente seriam Negros. Garvey apontou que a prá-
tica dos Africanos do hemisfério ocidental em adorar um Deus de outra raça tinha
poucos paralelos em qualquer outro lugar. Era bastante normal para um povo vi-
sualizar e retratar seus deuses em sua própria cor. O tingimento de um deus bran-
co para pessoas negras era, portanto, uma distorção branca. Um colega próximo a
Garvey, o bispo George McGuire, reforçou seu argumento ao apontar que Cristo
era historicamente marrom-avermelhado, ao invés de branco. E, além disso, se
Cristo viesse a Nova York, ele não teria permissão para morar na Riverside Drive,
mas teria que residir em Harlem por causa de sua cor.¹⁵ Garvey reforçou essa visão
com o argumento que “Porque Ele veio como uma personificação de toda a huma-
nidade, e por isso foi colorido”, Cristo foi perseguido.¹⁶
Essa faceta do pensamento de Garvey, como a maioria das outras, foi levada
a sua conclusão lógica. Numa cerimônia religiosa que marca o encerramento da
International Convention of Negro Peoples of the World de 1924, Jesus Cristo foi
canonizado como “Homem Negro das Dores” e a Virgem Maria como uma “Madona
Negra”. A convenção também concordou em “A Idealização de Deus como Espírito
Santo, sem forma física, mas uma criatura do imaginário da raça negra, sendo de
igual imagem e semelhança”. Garvey alegou que isso não significava que a UNIA
estava embarcando em uma nova religião. Estava simplesmente corrigindo o erro
de séculos.¹⁷
Garvey levou a sério suas inovações religiosas, e ele e seus colegas ligas
eram intolerantes com excêntricos religiosos que se sentiam atraídos pela organi-
zação. “A U.N.I.A. é inundado com um monte de religionistas”, disse S. A. Haynes,
colunista do Negro World, sobre uma senhora que reclamou que a organização era
sem-deus.³⁷ O próprio Garvey expressou seu desacordo com o Father Divine, que
se proclamou Deus, e sua desaprovação da religião folclórica jamaicana “pocoma-
nia” era um caso surpreendente forte.³⁸ Ele também desaprovava dos “profetas e
profetisas jamaicanas que iam voar em direção ao céu pela solução do problema
dos negros,³⁹ uma aparente referência ao profeta jamaicano Bedward, com quem
Garvey é controversamente comparado.⁴⁰ Uma ocasião Garvey declarou: “Eles en-
viaram o pobre Bedward para o asilo, mas eles terão dificuldade em me enviar pa-
ra lá...”⁴¹
NOTAS
História, como tudo mais para Garvey, era algo a ser usado em prol da
emancipação racial. Ele usou a história primeiramente pra estabelecer uma recla-
mação – mostrar que o homem preto vinha sendo injustiçado. Muitos dos seus es-
critos possuíam esse sentido histórico. Em 1938, por exemplo, ele enviou um me-
morando à Comissão Real das Índias Ocidentais, uma instituição do governo britâ-
nico, que estava então investigando revoltas de trabalhadores e tumultos na busca
por igualdade efetiva para os Afro-Caribenhos, as migrações resultantes em busca
de trabalho onde quer que fosse, a usurpação da economia da ilha por raças es-
trangeiras, como forma de explicar os recentes levantes. (6)
A história, de todo jeito, podia também ser utilizada para instilar autoconfi-
ança. Ele frequentemente apontava que em tempos passados os africanos haviam
desfrutado de uma história louvável, e que isso havia sido confirmado por histori-
adores como Heródoto, que pertenceu a uma era que se sentia menos inclinada a
estabelecer mitos de inferioridade africana. (7) Os Africanos não teria, então, nada
para se envergonhar diante das alegações de inferioridade emanadas do mundo
branco. De fato, o povo preto deveria mudar da defesa para a reabilitação enérgica
do seu passado. “O Tempo é chegado”, ele declarou, “para o povo preto esquecer e
deixar pra trás sua admiração de heróis e adoração por outras raças, e começar
imediatamente a criar e demarcar seus próprios heróis. Precisamos canonizar nos-
sos próprios santos, criar nossos próprios mártires, e elevá-los a posições de fama
e honra, homens e mulheres pretas que tenham feito uma contribuição destacada
para nossa história racial”(8)
A insistência de Garvey na natureza progressista do passado preto, era uma
reação às distorções que observou a partir da caneta dos historiadores brancos
nessa era. Ele conduziu, além disso, uma campanha constante contra os escritos
brancos sobre o passado preto. Em 1929 ele declarou que “A história é escrita com
preconceitos, simpatias e antipatias; e nunca houve um historiador branco que
tenha escrito com amor ou sentimento verdadeiro pelo negro”(9). Ele continua: “
Historiadores brancos têm tentado roubar do homem preto seu passado glorioso
na história, e quando algo novo é descoberto que reforça nossa posição e atesta a
verdade da nossa grandiosidade em outras épocas, então isso é sutilmente rear-
ranjado e creditado a alguma outra raça ou povo desconhecido.”(10)
Mr. Garvey: Então como podemos fazer isso sem tentar? (13)
Essa conexão com o passado estava ligada a uma forte consciência da sua
própria importância histórica. Ele frequentemente em termos de como as futuras
gerações seriam inspiradas pelo seu exemplo, bem com pelas gerações passadas,
cujos sofrimentos, não teriam sido em vão.(17)
O esforço de propaganda feito por Garvey, foi mais franco nos anos de sua
maior glória nos Esatados Unidos. Ele considerava o tumulto da Guerra e seus le-
vantes políticos, a Revolução Russa e os rumores de autodeterminação para todos
os povos, como momento ideal para uma propaganda estridente. Por volta de
1924, ele acreditava que a cena mundial havia se estabilizado ao ponto em que os
esforços da UNIA deveriam mudar na direção de se tornar uma organização mais
silenciosa, sem ênfase em uma propaganda estridente. Ele informou aos seus se-
guidores: “ Lembrem-se, a política da Associação Universal para o progresso do
Negro em 1924 e 1925, são as mesmas que eram em 1917 e 1918, somente esta-
mos usando um julgamento mais cuidadoso. As coisas que podíamos dizer em
1914, até 1920, não podemos mais dizer agora, mas queremos dizer exatamente o
mesmo.”(5) . Essa atitude foi sem dúvida influenciada também, pela escalada de
ataques à sua organização, tanto internos quanto externos. Ainda que não tenha
havido nenhuma mudança essencial. A Convenção Internacional de 1924, por
exemplo, discutiu entre outras coisas, “o banimento de toda a propaganda aliení-
gena voltada para destruir os ideais e escravizar as mentes do Negro.”(6)
Além do próprio Garvey, o Negro World foi apoiado em seus esforços por
uma sucessão dos mais refinados editores da América Afro. Um dos primeiros foi
W.A. Domingo, que por um período foi o Escritor de editoriais do jornal. (16) Ele e
Garvey partilharam a companhia em 1919, apesar de suas idéias socialistas (de
acordo com Garvey), e seu desagrado com os esquemas de negócios de Garvey.
(17) Durante 1920-1921 o jornal teve como editor Hubert H. Harrison, um pales-
trante e ativista altamente respeitado membro da comunidade intelectual do Har-
lem. De 1917 a 1919, ele havia publicado The Voice, um órgão de sua Liberty Lea-
gue, fundada em 1917.(18) William H. Ferris, historiador e graduado em Harvard e
Yale, serviu três anos como editor e um como editor associado entre 1919 e 1923.
Ele alegava que a circulação fidelizada do jornal, aumentou de dezessete mil, para
sessenta mil, em seu primeiro ano. (19)
John E. Bruce foi por alguns anos um editor contribuinte até sua morte
em 1924, assim como Eric D. Walrond, uma figura literária de sucesso da Harlem
Renaissance. Mas possivelmente o mais ilustre entre os editores do Negro World,
foi T.Thomas Fortune, conhecido reitor dos jornalistas Afro-Americanos, que edi-
tou o jornal de 1923 até sua morte em 1928. Ele ditou seus últimos editoriais do
Negro World, de seu leito de morte, durante suas últimas três semanas de vida(20).
Duse Mohamed Ali, foi também associado do jornal por um tempo. No último ano
após Fortune, esse alto padrão editorial foi mantido por Hucheswar G. Mudgal, um
indiano que veio para o Harlem via Trinidad.
A Guiana Inglesa seguiu o mesmo exemplo. Ali, também o jornal foi bani-
do ainda em 1919, e somente depois veio a legislação para legitimar o fato. Em 20
de junho de 1919, o comitê executivo colonial concordou por unanimidade com a
proibição das publicações Afro-Americanas Crusader, Monitor, Recorder e Negro
World. O Negro World foi apontado como sendo “de caráter grosseiro e ofensivo”.
(35). Quando essas leis estavam prontas para serem introduzidas perante a Corte
de Polícia Colonial, houve tanto protesto da população preta que o governador
achou necessário telegrafar pra que um navio de guerra ficasse a postos. Ele então
adiou a decisão por apelo popular, para estender o alcance da lei para o banimento
de publicações estrangeiras “questionáveis”, o que foi cortado após segunda leitu-
ra. A idéia era que no caso de emergência, o decreto pudesse ser apressado e tor-
nado lei em um tempo muito curto.(36)
Na Costa Rica, o Departamento Postal se viu incitado à ação por uma coa-
lizão anti-Negro World, conduzida pela United Fruit Company, o cônsul britânico e
as autoridades portorriquenhas. Em setembro de 1919, o conselho da United Fruit
Company de Washington escreveu ao secretário de estado e enviou algumas cópias
do Negro World. A estrada inicial de Garvey na Costa Rica não foi tranquila, pois a
companhia lembrava disso claramente. A carta explicava que Garvey “ deixou Li-
món em 192 e que era um típico jamicano barulhento, e que se lhe fosse permitido
prosseguir como estava, havia a possibilidade que tentasse repetir a experiência
francesa no Haiti.” Ele apontou também que, o governador de Limón, com a per-
missão do cônsul britânico, estavam planejando deportar todos aqueles presentes
no próximo encontro da UNIA. O conselho da United Fruit Company sugeriu, final-
mente, que o Departamento de Justiça acionasse seu serviço secreto no caso, posto
que a UNIA estava incitando revolução e assim violando a neutralidade de países
em paz com os Estados Unidos.(60). Correspondência similar foi enviada por ofici-
ais da Costa Rica que, após banir o Negro World, requeriu ao escritório postal de
Nova York, que não permitisse o envio do Negro World para a Costa Rica. (61)
O curso dos eventos nos Estados Unidos sugerem que as autoridades apa-
rentemente preferiram se mover contra o próprio Garvey, ao invés da possibilida-
de de causar furor ao perseguir meramente o Jornal. De fato, um movimento contra
o Jornal poderia ser muito impopular contra os mesmos líderes negros oficiais, que
estavam ansiosos para ver o governo se mover contra o próprio Garvey, já que
muitos deles estavam envolvidos em suas próprias publicações e eram sensíveis a
qualquer precedente de estabelecimento de censura sobre a imprensa. Essa foi a
lição do relatório do Advogado Geral Palmer, de 1919 contra a Imprensa Afro-
Americana. Alguns daqueles que mais tarde se tornariam os piores inimigos de
garvey ( tais como A.Philip Randolph e chandler Owen do Messenger e Cyril Briggs
do Crusader) foram censurados junto com Garvey e o Negro World naquele relató-
rio e o Crisis, editado por W.E.B. Dubois, apesar de discordar de qualquer idéia do
negro World, ainda saiu em defesa de sua liberdade de expressão. ( 63) De forma
parecida, em 1920, o Decreto de Sedição de Graham, foi derrotado no Congresso
com o apoio dos negros conservadores do New York Age e da NAACP. Esse decreto
buscava amordaçar e entregar nominalmente as publicações pretas.(64) Um pro-
cesso contra Garvey não envolveria tanta confusão para o governo dos Estados
Unidos, posto que os mais importantes líderes fora da UNIA eram quase que total-
mente contra ele.
O mais perto que os Estados Unidos estiveram de banir o Negro World, foi
durante, e logo depois do julgamento de Garvy em 1923 por alegação de fraude
postal, quando eles puderam se mover sob as vistas da oposição da elite afro-
americana a Garvey, que havia alcançado o seu zênite. Garvey relatou que o pro-
motor ameaçou suprimir tanto o Negro World, quando o Daily Negro Times, du-
rante e após o julgamento. Ele também apreendeu ilegalmente as listas de assinan-
tes do Negro World, e os assinantes logo começaram a receber jornais de oposito-
res. O propórito dessas ameaças era amedrontar os editores pra que os mesmos
não relatassem a conduta do promotor durante o julgamento. (65) O número do
Negro World que tratava do julgamento foi, de fato, estranhamente vetado.
Quanto tempo você supõe que o povo de cor tem que sofrer
nessa terra? Eu rezo a Deus que envie um Moisés que nos guie pra
longe dessa terra...
Garvey foi herdeiro de uma rica tradição de interesse na unidade preta in-
ternacional que floresceu através do século XIX. De muitas formas , Garvey perten-
ceu a essa tradição panafricanista do século XIX e poderia mesmo ser tido como o
último dos grandes panafricanistas do século XIX, mesmo tendo estabelecido seu
movimento no século XX. Sua fraseologia era inconfundivelmente novecentista –
sua referência constante à Etiópia estendendo suas mãos para Deus, sua fala sobre
uma nacionalidade africana e sobre redenção, seu slogan “ África para os Africa-
nos”, tudo isso era recortes dos vocabulários de Martin Delanys, do Bispo Turners,
de Edward Blydens entre outros Panafricanistas Afro-Americanos e Afro-
Caribenhos que o precederam. Sua preocupação com a Libéria, seu interesse em
imigração e seu desejo de operar sua própria companhia de navegação também o
situa firmemente na tradição do século XIX.
Outra ligação foi ainda o Dr. J. Albert Thorne, um barbadense que viveu na
mesma vizinhança de Garvey durante a adolescência deste. Thorne, na década de
1890 tentou organizar o estabelecimento de caribenhos na África Ocidental. Ele é
tido como apoiador de Garvey ainda nas atividades iniciais da UNIA na Jamaica, e
um de seus assistentes foi um dos primeiros a se associar à UNIA.(8)
Dois dos mais importantes contatos diretos de Garvey foram sem dúvi-
da, com Booker T. Washington, talvez o internacionalmente mais famoso homem
negro do seu tempo, e Duse Mohamed Ali, do African Times and Orient Review.
Além disso, o nome da organização de Garvey guarda uma similaridade suspeita
com a Universal Association for the Moral Improvement of Mankind, estabelecida em
1905 pelo Panafricanista haitiano Benito Sylvain. (9)
Muitos dos que se juntaram à UNIA, ainda que não fossem necessaria-
mente famosos internacionalmente, pertenceram ou lideraram organizações raci-
ais, geralmente com abordagem Panafricanista. James B. Yearwood, por exemplo,
foi do alto escalão da UNIA e liderou a Universal Loyal Negroes, sediada na Zona do
Canal, no Panamá.(10) Maurice Rouselle, líder da divisão de Wilmington, organizou
muitos anos antes a Afro-American Improvemente Company, e visitou a África atra-
vés dessa conexão. (11) William Ferris, de 1901 a 1903 foi “palestrante e corres-
pondente jornalístico” do Boston Guardian de William Monroe Trotter , assim como
membro da Academia Negra Americana, do Niagara Movement e da Sociedade Ne-
gra para Pesquisa Histórica, de John Edward Bruce.(12). O próprio Bruce em 1913
formou os Filhos Leais da África, para unir o povo preto através do mundo e mais
tarde se destacou como figura importante na Liga Hamítica Mundial.(13)
Outra importante figura política da África Ocidental que desde o início teve
contato com a UNIA foi Ernst S. Ikoli, da Nigéria, que em 1930 foi fundador do im-
portante Movimento da Juventude de Lagos (mais tarde Movimento da Juventude
Nigeriana). Ikoli foi secretário da UNIA em Lagos desde seu início em 1920, e foi
responsável por receber duzentas cópias por semana do Negro World, que seu es-
critório solicitou em novembro de 1920. Havia também outros agentes do jornal
em Lagos. Em 1920, seu escritório solicitou quinhentos distintivos da UNIA e tre-
zentas cópias de sua Constituição, e em 1922 as fontes policiais estimavam a exis-
tência de cerca de trezentos membros, dos quais somente vinte e oito eram finan-
ciados.(49) Esses Garveytas nigerianos ( também havia um escritório em Kano
(50) eram estigmatizados pelo governo como “Africanos descontentes.”(51)
Os escritórios da UNIA na África do Sul parecem ter sidos mais ativos que
qualquer outro. Eles enviaram delegados para as convenções de Garvey nos Esta-
dos Unidos e relataram estar preparando para enviar delegados para a Convenção
Jamaicana em 1929.(56) O presidente da divisão da Cidade do Cabo editava uma
publicação chamada The Black Man, (57) e do enclave britânico da Basutoland, vi-
nham notícias de grandes convenções da UNIA em 1924.(58) Alguns escritórios Sul
Africanos enfrentaram problemas que eram comuns em toda parte. Um membro
da divisão de Evanton explanou em 1927 que os encontros estavam acontecendo
em lugar aberto, porque a divisão ainda não havia adquirido um salão. Além disso,
escreveu, “os pastores nativos estão contra nós, eles não nos permitem organizar
nenhum encontro nas igrejas ou escolas, porque eles possuem o espírito de ho-
mem branco, de manter os negrinhos tão baixos quanto seja possível...”(59) Alguns
desses escritórios tiveram uma vida longa. Bem tarde em 1935, a primeira contri-
buição não solicitada para um novo fundo pró-Garvey, veio da África do Sul,(60) e
pelo menos um dos escritórios se manteve ativo até 1958.(61)
A UNIA foi ativa na luta pelos direitos humanos na África do Sul. Esta-
va entre as trinta organizações que participaram em 1927 da Conferência Não-
Européia em Kimberlt, descrita por John Padmore como uma das primeiras tenta-
tivas de uma frente nacional unificada entre os povos sul-africanos.(62) O Black-
man, de Garvey, relatou em que em junho de 1930, dois mil africanos se reuniram
sob os auspícios da UNIA para protestar contra o Riotous Assemblies Act, que proi-
bia manifestações e protestos em lugares públicos.(63) A UNIA também teve in-
fluência na luta por direitos humanos ao se infiltrar no alto escalão das duas maio-
res organizações Africanas, a Industrial and Comercial Workers Union (ICU) e no
Congresso Nacional Africano (ANC).
Uma das expressões mais usadas pra descrever a UNIA, foi “Movimento
de Volta para a África,” um rótulo que desagradava muito a Garvey. Garvey costu-
meiramente preferia afirmar que a UNIA advogava o retorno de pioneiros capazes
de fazer uma contribuição ao desenvolvimento Africano.(92) Ainda que suas falas
freqüentemente fossem além disso, e parecessem sugerir uma migração em larga
escala, como alegavam seus críticos. Ele sugeriu algumas vezes que essa imigração
teria lugar após os pioneiros terem completado seu trabalho. (93) E ele certamente
apoiou a Lei Bilbo, de 1939, que visava a repatriação gradual da maioria dos Afro-
Americanos. Também foi dito que o segundo Encontro da UNIA na Jamaica, teve
como tema o “Retorno para a África.” (94)
Nesses apelos ambíguos por retorno à África, está a fonte de uma porção
significativa do apelo de massa da UNIA. O poder do impulso imigracionista na his-
tória Afro-Americana ainda está por ser devidamente apreciado. Durante os anos
de Garvey na América, cartas ainda eram enviadas aos escritórios da Sociedade
Americana de Colonização, por pessoas pretas que não conseguiam mais suportar
a opressão Americana e ansiavam por um escape para a África. “Agora alguns de
nós estamos te implorando para nos enviar de volta para a África”, escreveu um
remetente de Oklahoma em 1920. Ele estava tão ansioso que começou a vender
sua propriedade antes mesmo que os arranjos pra enviá-lo estivessem finalizados.
(92) Esse impulso ainda era tão grande em 1927 e 1928, que uma impostora, as-
sim-chamada Laura Coffey, conseguiu enganar alguns pretos sulistas, alegando ser
representante de Garvey enviada para coletar fundos para propósitos imigracio-
nistas. Algumas pessoas chegaram a abandonar suas propriedades para ir esperar
por navios que ela afirmara terem sido enviados por Reis Africanos para Miami e
Jacksonville para transportá-los para a África. (96)
Já em 1920, como foi visto, Elie Garcia havia avisado Garvey da hostilida-
de liberiana contra os imigrantes que “demonstrassem qualquer tendência a to-
mar parte da vida política da república.”Garcia aconselhou que os agentes da UNIA
deveriam “negar firmemente qualquer intenção de nossa parte de entrar na políti-
ca da Libéria.” Garcia provavelmente revelou as intenções da UNIA quando ele
acrescentou, “essa atitude irá remover qualquer idéia possível de oposição e não
irá nos impedir quando tivermos uma posição segura no país, de agir da melhor
forma que desejemos, pra seu próprio benefício e para benefício da Raça como um
todo.”(183) O conselho de Garcia foi reforçado pelos emissários da associação em
1921. Ciryl Crichlow advertiu que a distribuição dos imigrantes da UNIA deveria
ser “de acordo com os propósitos do sistema unipartidário, de manter sua existên-
cia intacta.” Em outras palavras, os Garveytas deveriam estar espalhados nos as-
sentamentos já existentes, em lugar de serem permitidos a se concentrarem em
algumas áreas. Isso iria “permitir aos liberianos que estivessem em ascendência
política e dominantes nas eleições.” Crichlow concluiu que Garvey deveria ter cui-
dado com isso, no sentido de “entender em que medida isso significava deixar de
lado o programa político da Associação.”(184) Um dos membros do corpo de técni-
cos também experessou uma visão parecida. (185) E um oficial americano monito-
rando a situação, chegou a conclusão de que “a partir da informação que tenho em
mãos, podemos sem dificuldade entender que a UNIA possui ambições políticas na
Libéria. Esse é o ponto que deve ser cuidadosamente acompanhado Algumas cen-
tenas de Negros Americanos radicais desembarcados na Libéria, podem derrubar o
governo como está constituído, e tentar substituí-lo por um regime dominado pe-
los sentimentos do movimento de Garvey, se não, sob o domínio mesmo da própria
organização.”(186)
Uma última volta nesse medo das intenções políticas era a sensação de
que Garvey poderia se juntar com Liberianos influentes como o ex-Presidente Ar-
thur Barclay e D.Howard, ou talvez o Chefe de Justiça J.J., todos associados à UNIA
da Libéria, em um esforço para destituir o partido no poder.(194)Garvey deu a pa-
lavra final. E, 1928, ele afirmou ter “influência suficiente pra ter destituído Charles
King como presidente nas próximas eleições.”(195)
Dubois alegou mais tarde, que não mencionou Garvey ao Presidente King
durante sua estadia na Libéria. (199) Um ano antes, ele se deu ao trabalho de es-
crever ao Secretário de Estado Charles Evans Hughes , por dois navios para tomar
o controle da Black Star Line de Garvey. Ele queria saber, disse a Hughes, se havia
“qualquer viabilidade ou modo legal através do qual o governo dos Estados Unidos
poderia ajudar ou conduzir um plano para fornecer pelo menos dois navios, na
tentativa de começar um intercurso comercial direto entre a Libéria e a América.”
Tal intercurso seria dirigido por uma companhia privada composta por pretos e
brancos. A companhia iria “tentar tomar, em um trust, os certificados da Black Star
Line.” (200)
A semente que Garvey plantou foi tal que seus seguidores nunca re-
nunciaram ao seu interesse na Libéria. Em 1925, com Garvey na cadeia, um dele-
gado buscou o apoio do Presidente Coolidge para um assentamento na Libé-
ria.(207) E em 1926, uma tentativa sem sucesso foi feita no sentido de atrair a aju-
da da Sociedade Colonizadora Americana.(208) Em 1936, a UNIA de Nova York se
ofereceu para satisfazer o requerimento do Presidente Edwin Barclay por imigra-
ção continuada, e o interesse nunca cessou.(209)
O impacto de Garvey na África pode então ser tido como amplo e variado.
Aqueles africanos que tiveram contato com sua mensagem eram favoravelmente
dispostos e frequentemente abertamente entusiastas. Onde ocorreu oposição, ela
se veio principalmente dos proprietários europeus, ou, no caso da Libéria, dos
“quase colonialistas” proprietários pretos. Isso não significa dizer que não houve
uma oposição Africana. Na África ocidental Inglesa, muitos dos elementos mais
conservadores se opuseram ao seu programa político enquanto abraçaram de todo
o coração suas iniciativas econômicas. (219)
Por esse tipo de razão, a Black Star Line foi grandemente celebrada pelo
povo preto. Mercadores africanos e caribenhos viram nela a possibilidade de inde-
pendência em relação às companhias brancas racistas, (7) missionários viram um
fim para as longas viagens para a África via Europa, (8) liberianos viram aí a possi-
bilidade de um serviço costeiro entre a Libéria e Serra Leoa (8), e a maioria viu isso
como um triunfo para a auto-estima preta. Garvey pensava que a Companhia devia
temer mpouco a concorrência das Companhias brancas, posto que operaria ideal-
mente com o mundo negro autossuficiente. (10) Não surpreende de que a Black
Star Line provou ser o maior mecanismo de recrutamento para a UNIA. (11)
Dois dias após seu retorno em no meio de janeiro de 1920, o Yarmouth re-
cebeu ordenamentos para transportar uma carga de Uísque para Cuba, diante da
iminente chegada da proibição. Garvey alegou que o contrato ( que ele já havia re-
cusado), foi dado entrada por um de seus subordinados enquanto ele estava em lua
de mel no Canadá.(29) Por transportar essa carga avaliada em cerca de 5 milhões
de dólares (30), a BSL deveria receber a quantia irrisória de 7 mil dólares ( 11 mil
de acordo com algumas fontes) (31), que não era suficiente sequer pra cobrir os
gastos de viagem do navio. Além disso, havia reparos a ser feitos. Como Garvey
expôs, “ Eu fui, portanto, convidado a gastar 11 mil dólaresem reparos necessários
pra ter o navio navegando com uma carga de 5 milhões, da qual a Companhia rece-
beria apenas 7 mil como frete, tudo devido à desobediência de dois oficiais da
Companhia.” (32)
Logo depois de ser posto no mar, o navio foi sabotado por um mecânico, e
Cockburn solicitou que fossem jogadas ao mar 500 garrafas de uisque e champag-
ne, que foram recolhidas por pequenos barcos, que de maneira suspeita, já esta-
vam por perto. (33) O navio teve que retornar para reparos. O navio também foi
parado por um tempo por oficiais americanos da Receita. ( 34) Garvey mesmo as-
sim foi capaz de evitar muita publicidade sobre esses acontecimentos. “Eu quero
lhes dizer que realmente fizemos história,” declarou, “porque aquele uísque veio
do Sul, e também pertence aos caipiras do Sul.” (35)
Mais tarde naquele verão o navio foi posto fora de funcionamento devido
a processos movidos por diversos credores. Foi vendido pelo U.S Marshal (depar-
tamento de justiça federal dos Estados Unidos) por 1,625 dólares em novembro de
1921. (45) Ainda assim, os litígios referentes ao Yarmouth se arrastaram por toda
a década seguinte. Isso aumentou após uma colisão envolvendo o navio em 21 de
setembro de 1920. A BSL alegou que o navio estava a cargo do Departamento de
Justiça nessa época. O governo alegou que o Capitão e a tripulação do navio eram
culpados. Uma apelação da BSL em relação a uma decisão desfavorável foi derru-
bada com os devidos custos pelo não prosseguimento da ação, que foram pagos
por uma companhia que o adquiriu, já que a Linha obviamente não podia pagar.
(46)
O quarto navio da Black Star Line nunca chegou a estar em posse da com-
panhia, mas sua história foi, no entanto tão depressiva quanto as dos três anterio-
res. Isso envolveu a perda de uma grande quantidade de dinheiro,envolveu a Com-
panhia em um litígio que durou mais de uma década, sendo finalmente vendido
como sucata. O Phyllis Weathley, como o navio iria se chamar deveria ser o navio
que faria a rota Nova York-Libéria, e sua compra foi prometida várias vezes já des-
de novembro de 1919. (64)
Nesse meio tempo, Garvey anunciou que Hugh Mulzac seria o Capitão do
Phyllis Weathley, “por motivos de propaganda”, pensou Mulzac, (68) e propagan-
das foram divulgadas anunciando que ele navegaria para Havana, Santo Domingo,
St Kitts, Dominica, Barbados, Trinidad, Demerara e Monróvia, “por volta de 27 de
março, ou no mais tardar, em 25 de abril.” (68) 8.900 dólares foi coletado das pes-
soas que anteciparam as passagens. O dinheiro não foi separado dos fundos gerais
da Black Star Line, e nunca foram devolvidos. (70)
Uma outra explicação possível para o atraso é o fato de que a essa altura,
o Governo dos Estados Unidos se intrometera nas negociações. Em 31 de agosto,
William J. Burns, Diretor do Bureau de Investigação do Departamento de Justiça,
informou à Companhia de Navegação que Garvey era um agitador comunista radi-
cal que “advoga e ensina a derrubada do Governo dos Estados Unidos através da
força e da violência.” Alguém da Companhia de Navegação rubricou uma pequena
nota manuscrita ao fim da carta de Burns, - “Recomendação de Venda para esse
grupo cancelada.” (75)
O governo britânico não ficou muito atrás. O Cônsul Geral Britânico em
Nova York informou à Companhia de Navegação em 17 de janeiro de 1922 que a
Black Star Line ainda devia dinheiro à Departamento Canadense de Marinha e Pes-
ca, relativo ao Yarmouth. (76) O Vice-Presidente da Companhia estava então reso-
luto em sua decisão de que a Linha não iria adquirir um navio. (77)
A tripulação era toda preta. Somente dois dos oficiais eram brancos. Gar-
vey explicou que oficiais pretos qualificados eram difíceis de encontrar. (94) Na
tentativa de evitar os problemas anteriores ele fez os dois, Capitão e Tesoureiro a
bordo, concordarem em não contratar quaisquer débitos sem a aprovação da
Companhia. (95) Garvey foi derrotado em sua apelação contra a acusação de frau-
de postal e foi preso logo depois do navio deixar Nova York para a tradicional via-
gem Cuba-Jamaica-Panamá. A tentativa usual, era a de financiar a viagem princi-
palmente com a venda de estoques ao longo do caminho. O resultado foi outra fa-
lência. Os passageiros e a tripulação tiveram conflitos com os oficiais brancos; Es-
ses então tentaram abandonar o navio na Jamaica; aconteceram muitos atrasos na
Jamaica e em Colón devido à falta de dinheiro; a tripulação quase se amotinou em
Colón devido à falta de pagamento; Em Charleston, no caminho de volta para casa o
não havia dinheiro para pagar pelos suprimentos e o Engenheiro Chefe pulou do
navio, causando um problema para a obtenção do liberação para prosseguir a via-
gem; e houve relatos da tripulação queimando a cabine da proa, como forma de se
manter aquecida. (96) O navio retornou a Nova York por volta do início de junho.
(97) Ele foi vendido mais tarde para saldar dívidas. (98) Em 1926 o auditor da
UNIA declarou que o valor bruto recebido pela Companhia foi de 287.432,95 mil
dólares , excluindo fundos recebidos por um agente de investimentos. (98) O lan-
çamento de uma companhia de navios tomou a proporção de obssessão entre os
membros da UNIA tanto quanto o desejo de migrar para a Libéria. O comitê de na-
vegação da convenção de 1929 na Jamaica sugeriu a formação de uma Companhia
Africana de Navegação Ltd. (100)
Não houve nada de inevitável na falência da Black Star Line e dos em-
preendimentos a ela relacionados. As poucas viagens do Yarmouth provaram que
as possibilidades de cargas lucrativas e do negócio de passageiros estavam ali. Sem
os problemas enumerados acima, não há razão para que os empreendimentos de
navegação da UNIA não pudessem ter sido, pelo menos, modestamente lucrativos.
Tal interesse oficial imediato por Garvey, não é difícil de explicar. Porque
Garvey estava, de fato, provocando o status quo, em um tempo em que o pensa-
mento oficial via no desejo do povo preto em ser livre e igual, um problema de lei e
ordem, e um pouco mais. Para esse tipo de mentalidade, até mesmo a Liga Nacio-
nal, a NAACP e os republicanos negros tentando emancipar membros da raça, po-
deria ser visto ocasionalmente como uma ameaça à paz. (4)
Garvey, por seu lado, fez muito pouco pra acalmar os medos do oficialato
americano. Não poderia ser diferente. Pra alcançar e mover as massas pretas, ele
precisava dizer o que precisava ser dito. Em sua denúncia dos conflitos de St, Louis
em 1917, por exemplo, sua linguagem não dava nenhuma mostra de que fosse um
estrangeiro chegado no país há apenas um ano, se dirigindo a um público que con-
tinha um bom número de oficiais de polícia , na era das deportações de radicais
não nascidos no país. Ele condenou o conluio entre as autoridades civis no massa-
cre como crime contra a humanidade. “ por trezentos anos,” disse , “ os negros da
América têm derramado seu sangue para fazer da República a maior entre os ne-
gros do mundo, e durante todo esse tempo, não houve sequer um ano de justiça.
Pelo contrário, uma sucessão contínua de opressão.” (8)
Muitos dos seus primeiros discursos, também, clamava aos homens pre-
tos que não participassem das guerras dos brancos, após seus sacrifício em vão na
Guerra Mundial. Em um discurso feito não muito após o fim dos conflitos, ele de-
clarou, “A primeira morte a ser buscada pelo homem preto no futuro , será para
fazer a si mesmo livre, e depois que isso tenha sido conquistado, se restar alguma
caridade para nós gastarmos, nós podemos morrer pelo homem branco. Mas pra
mim, acho que já basta de morrer por ele.” Esse discurso escandalizou o Comitê
Lusk. Seu comentário não foi inesperado: “ Esses discursos extravagantes e bom-
básticos podem parecer triviais na letra fria, mas a repetição contínua de tais sen-
timentos possuem um efeito inquietante e pernicioso sobre a população negra não
doutrinada.” (9)
Em muitos outros momentos Garvey parece ter saído de sua rota de irritar o
governo americano. A Conferência de Washington para Controle de Armas, por
exemplo, foi agraciada com um telegrama de Garvey apontando que para o fato de
que 400 milhões de pessoas pretas não estavam representadas e recomendando ao
Presidente Harding o compromisso de democracia para o povo preto.(11) Nova-
mente, em 1922, Garvey escreveu ao secretário de Estado Charles E. Hughes, por
uma representação no Departamento de Estado para participar de uma sessão so-
bre o colonialismo em sua convenção internacional. A solicitação foi negada. (12)
Há muito pouco da doutrina de Garvey que pode não ser entendido como
ataque direto ou indireto aos Estados Unidos. Suas doutrinas de luta racial militan-
te podiam se transformar algumas vezes em greves contra poderosas corporações
americanas, como a United Fruit Company, em diversos países da América Latina.
Também seu projeto para a África, com suas implicações nacionalistas e anti-
imperialistas, se tivesse sucesso, resultaria em prejuízo aos interesses financeiros
americanos. Garvey apontou que o capital americano iria buscar se expandir na
África. Em 1929 escreveu, “A Europa hoje está falida e não pode dispor de muito
capital para o desenvolvimento de suas indústrias na África, além do que estão ten-
tando despertar o interesse dos americanos em explorar as riquezas do grande
Continente.” (13)
Tendo determinado desde o início de sua jornada nos Estados Unidos, que
Garvey era um indivíduo perigoso, diversas agências governamentais, policiais,
suboficiais e corporativas, submeteram Garvey e a UNIA a uma constante vigilância
em proporções internacionais. Onde era possível, essa vigilância era complemen-
tada pela infiltração de agentes na UNIA. A afirmação de Garvey de que “agentes
do governo, de organizações , corporações e indivíduos interessados na exploração
do povo preto, operam entre os membros e oficiais da Associação em diversas ci-
dades”, dificilmente pode ser lida como exagero. (14) Garvey notou que um conse-
lheiro geral da UNIA, do qual dependia para serviços jurídicos, foi apontado como
advogado geral assistente, após ser denunciado. (15) Repórteres brancos que en-
trevistavam Garvey também eram suspeitos de serem homens da Inteligência. (16)
Em um discurso na Jamaica em 1927, Garvey declarou: “O grande governo dos Es-
tados Unidos tem homens par me investigar. Todo tipo de gente do serviço secreto
é colocado atrás de mim e 20% dos meus empregados nos Estados Unidos são
agentes secretos dos Estados Unidos. Eu acredito que eu deva ter custado ao go-
verno dos Estados Unidos cerca de cinco milhões de dólares em dez anos.” (17)
Após a deportação de Garvey dos Estados Unidos, ele visitou por diversas
vezes o Canadá. Obviamente, ele não escapou do olho onipresente dos represen-
tantes do Tio Sam nessas ocasiões. Em outubro de 1928, menos de um ano de sua
expulsão dos Estados Unidos, ele chegou ao Candá e falou em favor de Al smith,
candidato democrata à presidência nas iminentes eleições americanas. Ele foi
prontamente preso, trazido diante de uma banca de interrogatório das autoridades
da imigração local em Montreal, e sua deportação foi ordenada sob o Decreto de
proibição de agitadores políticos. Explicando que estava em trânsito, ele foi multa-
do em 100 dólares, recebeu o parzo de até 7 de novembro para deixar o país, e pro-
ibido de participar de qualquer atividade pública.(39) O Negro World presumiu
que tudo isso foi conduzido pelas mãos do Partido Republicano, e estava certo.
(40) O cônsul geral americano em Montreal, escondido, é claro, do público, reivin-
dicou o crédito pela ação das autoridades canadenses. Escrevendo para Washing-
ton no dia após ao prazo limite dado para Garvey deixar o país, ele informou aos
seus superiores que Garvey havia chegado no Canadá com duas semanas de ante-
cedência e tinha feito discursos em apoio ao Partido Democrata. Garvey foi então,
por alguma razão inexplicável, chamado ao gabinete do cônsul geral, mas deixou o
país antes que pudesse ser interrogado. A essa altura, o oficial já havia contatado o
serviço de imigração canadense, e informado que Garvey era um ex-condenado,
inadmissível no Canadá. Portanto, as autoridades do Canadá, em suas palavras ofi-
ciais, agiram “discreta e prontamente.” (41)
A linha que separava vigilância e repressão a Garvey e à UNIA era fina. A vi-
gilância oficial obviamente não era um fim em si mesma. Era meramente um ponto
sobre o qual uma guerra de atrito foi conduzida e que culminou, após um período
de onze anos nos quais Garvey e suas organizações foram inclementemente asse-
diados, na prisão, julgamento, condenação e deportação de Garvey. Esse processo
teve início não muito depois da chegada de Garvey aos Estados Unidos. O negro
World de 14 de junho de 1919, traz um relato de Garvey sobre a sua recente con-
vocação por um oficial descrito como promotor público . Garvey afirma que alguns
sabotadores e bandidos sem consciência, haviam informado às autoridades polici-
ais de Nova York que o Negro World era responsável por enviar bombas pelos cor-
reios, através dos endereços de algumas pessoas. Essas acusações não foram pro-
vadas e os sabotadores foram expulsos da UNIA.
Garvey deixou Nova York em fevereiro de 1921 e viajou de trem até a Flóri-
da, de onde continuou de navio até Havana, Cuba. Ele teve uma passagem triunfan-
te por Cuba, onde foi recebido pelo presidente da ilha. (55) De Cuba ele foi para a
Jamaica, e então a trama ficou densa. Em primeiro de março, o cônsul americano
em Kingston, Charles L. Latham, informou ao secretário de estado em Washington,
que o jornal Daily Gleaner havia anunciado a chegada iminente de Garvey. Ele soli-
citou instruções concernentes ao visto do passaporte de Garvey, se ele deveria re-
tornar aos Estados Unidos, tendo em vista o que ele considerava como o ‘histórico
subversivo de Garvey’. Em 25 de março o Departamento de Estado despachou sua
resposta: “ em vista das atividades de garvey na política e na agitação racial,você
está instruído a recusar a ele um visto, e informar ao mesmo tempo ao Cônsul de
Port Antonio (Jamaica)m de sua ação.” (57).
Em 11 de abril, Garvey se apresentou devidamente no escritporio de
Latham, e solicitou um visto pra viajar para a Zona do Canal Americana, e depois de
volta para os Estados Unidos. Ele estava acompanhado por Cleveland Augustus
jacques e Amy Euphemia Jacques ( que viria a ser sua segunda esposa), que então
era secretária da Negro Factories Corporation. Os três haviam agendado passagens
para aquela mesma tarde. Latham informou que não poderia expedir seu visto sem
tempo para a devida análises, e o aconselhou a retornar no dia seguinte. Ele expe-
diu Visto para os dois acompanhantes de Garvey. Os três então cancelaram suas
passagens e em lugar disso viajaram de navio para Port Limón, na Costa Rica.
Latham informou tudo isso a Washington, e de que toda a autoridade consular de
portos do Caribe haviam sido notificadas pelo correio, de que não se deveria expe-
dir Vistos para Garvey. (58)
A razão para a repentina cessão do Visto a Garvey, ainda não está clara. Tal-
vez a ocasional mudança simultânea do pessoal responsável por lidar com o caso,
tanto em Kingston quanto em Washington, tenha sido o golpe de sorte que o salvou
de uma permanência forçada fora dos Estados Unidos por tempo indefinido. Após
sua prisão em 1925, um oficial de imigração em Atlanta deu uma outra explicação,
de que o retorno de Garvey foi permitido, pra que ele pudesse ser processado. (73)
Garvey e os comunistas
- Daily Worker2
A maior parte dos seguidores de Garvey nos Estados Unidos, como em ou-
tros lugares, eram trabalhadores e camponeses. Esses eram os tipos de pessoas
sobre as quais os comunistas necessariamente esperavam construir um movimen-
to de massa. A necessidade de conquistar os trabalhadores e camponeses negros
assumiria uma importância ainda maior para os comunistas quando eles tardia-
mente acordassem para a compreensão de que as massas negras, como o segmento
mais explorado da sociedade americana, teriam que ocupar uma posição crítica em
seu pensamento se eles algum dia quisessem nutrir seriamente qualquer esperan-
ça de derrubar o capitalismo americano. Mas entre os comunistas e as massas ne-
gras americanas estava Garvey. Eles tentaram se infiltrar na UNIA "minar por den-
tro", eles tentaram cortejar e conquistar o próprio Garvey, eles tentaram lançar
ataques frontais contra ele na imprensa, eles discutiram sobre ele em suas reuni-
ões de Moscou a Chicago, eles até tentaram plagiar facetas de sua filosofia naciona-
lista, mas eles não puderam prevalecer. Garvey, exibindo grande tato e astúcia polí-
tica, não se comprometeria. Ele geralmente se abstinha de denunciar abertamente
os comunistas, mas não seria cooptado.
Portanto, esse era o ponto crucial de sua briga com Garvey. Um estado sepa-
rado controlado por Negros com uma minoria branca seria apoiado na Faixa Negra,
até o ponto de secessão completa dos Estados Unidos, e mesmo se esse estado op-
tasse por não seguir o programa comunista, mas um estado Garvey totalmente Pre-
to em qualquer lugar, mesmo na América, seria utópico e reacionário. O ponto foi
reforçado por outra explosão de ataques à Garvey: "Todas as correntes reformistas
nacionais como, por exemplo, o Garveyismo, que são um obstáculo à revolução das
massas Negras, devem ser combatidas sistematicamente e com a máxima ener-
gia."27
À luz de tudo isso, não é nenhuma surpresa que ele se opusesse aos títulos
conferidos pela UNIA como sendo uma aspiração pela aristocracia. Os títulos da
UNIA, observou ele, não eram baseados na riqueza, mas no serviço à raça. Eram
distinções conferidas a indivíduos dignos por uma raça apreciativa.38
Talvez no início de 1921, senão antes, Briggs foi abordado por comunistas
americanos que, com isso, conseguiram obter um punhado de recrutas da ABB.
Esses recrutas foram alguns dos primeiros comunistas negros nos Estados Unidos
e continuaram por muito tempo entre os mais proeminentes. Eles incluíam, além
do próprio Briggs, Richard B. Moore, Otto Hall, Lovett Fort-Whiteman e Harry
Haywood. Outro destacado socialista do Harlem dentro da ABB foi o ex-editor do
Negro World W. A.Domingo. Domingo não entrou para o partido comunista. Otto
Huiswoud saiu da festa para se juntar à ABB.60
Em qualquer caso, Garvey usou o bolchevismo da ABB para justificar seu ca-
so contra eles, embora tenha elogiado Lenin e Trotsky durante a mesma convenção
em um discurso que exortou seus ouvintes a fazerem pela África o que Lenin e
Trotsky fizeram pela Rússia ao derrubar o despotismo czarista.68 Essa distinção
entre Lenin e Trotsky, a quem ele geralmente endossava, e os comunistas america-
nos, que ele evitava, representava a posição normal de Garvey. Algum tempo de-
pois, ele disse: "Eu sou contra o tipo de comunismo que é ensinado na América... Na
América, ele constitui um grupo de mentirosos, conspiradores e enganadores astu-
tos que distorcem um terço da verdade em uma grande mentira, e entregam para o
consumo da clientela precipitada. O comunismo entre Negros em 1920-1921 foi
representado em Nova York por Negros como Cyril Briggs e WA Domingo, e meu
contato e experiência com eles, e seus métodos são suficientes para manter minhas
reservas sobre esse tipo de comunismo pelo equilíbrio da minha vida natural.” 69
Briggs, por sua vez, consolou-se com sua derrota argumentando que Garvey
planejou sua expulsão para impedir que o programa da ABB fosse oficialmente
representado pelos delegados, os quais, disse ele, estavam favoravelmente dispos-
tos a isso.70
Mais ou menos nessa época, três Garveyistas de alto escalão afastados jun-
taram forças com a ABB. Eles eram Cyril Crichlow, J. D. Gordon, um ex-presidente-
geral assistente, e o bispo McGuire.75 Os dois últimos voltaram para a UNIA. 76 A
presença deles não pareceu ajudar muito a ABB. Em uma reunião da ABB em 1922
em Baltimore, por exemplo, Garveyistas recorreu a uma de suas táticas favoritas
contra reuniões inimigas. Eles lotaram a reunião com membros da UNIA. Eles ouvi-
ram um pouco o palestrante, mas assim que ele atacou a UNIA, foi recebido com o
conselho: “Pare aí, irmão; você não diz mais nada." A polícia foi chamada, mas co-
mo o ambiente estava tranquilo, eles foram embora. Os Garveyistas então a trans-
formaram em uma reunião da UNIA.77
Mas:
Uma das tentativas mais interessantes de uma objetiva, e às vezes até mes-
mo uma favorável análise comunista do movimento de Garvey, veio na cobertura
de Robert Minor da convenção de Garvey de 1924 para o Daily Worker. A conven-
ção foi a ocasião para uma grande tentativa comunista de sufocar Garvey com ofer-
tas de amizade, e os artigos de Minor devem ser vistos sob esta luz. Antes de 1924,
o Daily Worker e seus predecessores (The Worker, The Toiler e The Ohio Socialist)
eram amplamente desprovidos de qualquer referência à questão racial. A partir do
início de 1924, entretanto, um programa de ampla cobertura de assuntos raciais foi
lançado. Essa cobertura foi orquestrada para fornecer um papel de apoio a um es-
forço igualmente intenso do Partido dos Trabalhadores daquele ano para “minar
por dentro” as principais organizações pretas.
O ano começou com uma série de artigos sobre a questão racial de Lovett
Fort-Whiteman, comunista e membro da ABB. Em fevereiro, o jornal anunciou que
a ABB e o partido dos Trabalhadores compareceriam ao iminente Sinédrio em Chi-
cago. O Sinédrio, organizado por Kelly Miller, era uma convenção preta da qual
participaram mais de cinquenta grupos raciais. A abertura da conferência foi sau-
dada em 11 de fevereiro por um artigo laudatório de Fort-Whiteman, que anunciou
que os dois delegados da ABB trabalhariam em estreita colaboração com os cinco
do Partido dos Trabalhadores (dos quais Fort-Whiteman era um), uma vez que
ambas as organizações eram "totalmente conscientes de classe . ” Ele enfaticamen-
te observou que a UNIA seria um ausente conspícuo da conferência, sem dúvida
porque o Sinédrio estava "preocupado principalmente em ganhar direitos para os
Negros onde eles vivem", enquanto a UNIA estava supostamente preocupada prin-
cipalmente com um retorno à África. 93 Uma semana mais tarde, após ter aparen-
temente saído um pouco menos do que vitorioso de vários confrontos com os or-
ganizadores do Sinédrio, o Daily Worker expressou total desencanto com Kelly
Miller e os “Negros capitalistas” que ajudaram a administrar o caso. Tão grande foi
o seu desencanto que agora concordaram a contragosto com a decisão de Garvey
de permanecer à margem da convenção. O jornal lamentou: “A esperança dos tra-
balhadores Negros oprimidos não reside no atual conjunto de líderes Negros. Mar-
cus Garvey diz que eles são muito velhos. Os trabalhadores dizem que são burgue-
ses demais.”94 No entanto, a real intenção dos comunistas, aqui, e mais tarde na
convenção da UNIA, foi revelada cerca de quatro meses depois no quinto congresso
do Comintern em Moscou, onde um delegado americano se gabou disso, apesar da
dominação desta assembléia por tipos eclesiásticos e pequeno-burgueses, os co-
munistas "tiveram sucesso nos últimos dois dias do congresso em provocar uma
divisão".95 O próximo ensaio geral para a convenção da UNIA veio em julho, quan-
do Minor, redator e cartunista para o artigo, cobriu a conferência da NAACP na Fi-
ladélfia. Então, em 28 de julho, o jornal notou a próxima reunião pré-convenção da
UNIA de Chicago em um item excepcionalmente livre de retórica anti-UNIA.
A esta altura, a atenção dada pelo Daily Worker (e, portanto, pelo Partido
dos Trabalhadores) à convenção de Garvey já havia excedido em muito a dada ao
Sinédrio de Kelly Miller e à conferência da NAACP na Filadélfia. O preâmbulo da
primeira página da saudação oficial dizia: “Percebendo que a única esperança de
emancipação dos trabalhadores de cor e brancos é a solidariedade universal do
trabalho, o Partido dos Trabalhadores envia suas saudações ardentes aos repre-
sentantes da oprimida Raça Negra que estão reunidos no Liberty Hall, Nova York,
sob a bandeira da Associação Universal Para o Progresso do Negro.”
Esta ofensiva de agosto, com toda a sua preparação óbvia e sua grande esca-
la, não foi isenta de erros estúpidos da magnitude da ofensiva de 1921 da ABB. O
teor favorável dos artigos de Minor de Nova York era, de tempos em tempos, con-
trabalançado por editoriais da sede de Chicago, que eram hostis o suficiente para
fazer qualquer leitor inteligente se espantar com a sinceridade da recém-
descoberta simpatia para com a UNIA. Em 8 de agosto, por exemplo, na mesma
edição com a efusiva história de uma mulher preta espiando por cima do ombro de
um leitor do Daily Worker em um bonde e sendo conquistada como leitora do jor-
nal, apareceu um artigo com a legenda "Daily Worker busca conquistar os seguido-
res de Marcus Garvey para o programa comunista.” O item consistia em uma carta
de um Israel Zimmerman expressando choque com a atitude amigável do jornal em
relação a Garvey, meros de dois anos após os camaradas Briggs, Owen e Randolph
terem feito campanha contra ele. À demanda de Zimmerman por uma explicação, o
jornal explicou: "não mudamos nossa atitude fundamental em relação a Marcus
Garvey. Hoje somos mais contra seus esquemas por uma terra prometida para o
Negro na África. Não apenas não endossamos, mas repudiamos totalmente todos
os esquemas como a "Black Star Line" de Garvey como meio de libertar as massas
Negras oprimidas e exploradas.” A única razão para seu novo espírito de coopera-
ção com a UNIA, explicou o jornal, era conquistar os seguidores de Garvey para
uma liderança "viril e consciente de classe" (isto é, Partido dos Trabalhadores).
Assim foram repetidos os erros da ofensiva da ABB de 1921. Mais uma vez, os co-
munistas tentaram conquistar a amizade de Garvey, roubar seus seguidores e in-
sultar sua inteligência, tudo ao mesmo tempo.
Foi em parte por sentimentos como esses que os governos europeus, norte-
americanos e latino-americanos muitas vezes consideraram Garvey comunista. O
fato de que este foi um período em que o radicalismo era frequentemente equipa-
rado ao bolchevismo nas mentes oficiais sem dúvida exagerava essa tendência. E
Garvey, é claro, não detestava se proclamar um radical - “Eles falam sobre Garvey
ser radical”, disse ele em uma ocasião. “Como pode um Negro ser conservador? O
que ele tem para conservar? O que você tem senão dor, sofrimento e privação? É
hora do negro ser radical e deixar o mundo saber o que ele quer.” 108 Assim, ele po-
deria ser descrito pelas autoridades britânicas como apoiado pelos Trabalhadores
Industriais do Mundo, por um governador provincial da Costa Rica como bolchevi-
que, por J. Edgar Hoover como pró-bolchevique, pelos imperialistas belgas como
tendo conexões bolcheviques, e por um funcionário dos Estados Unidos como pre-
sidente de um partido comunista.109 Em 1932, porém, o Ministério do Interior bri-
tânico finalmente descobriu que “as informações disponíveis mostram que a orga-
nização de Marcus Garvey é considerada por Moscou como 'burguesa'." 110
A atitude de Garvey em relação aos comunistas americanos pode ter sido in-
fluenciada pelo chauvinismo branco que existia em suas fileiras. Claude McKay
acusou os comunistas americanos brancos de racismo no quarto congresso do Co-
mintern.111 Acusações semelhantes foram feitas durante o sexto congresso em
1928 e foram reconhecidas pelos mais altos círculos do Comintern, na pessoa de
Nikolai Bukharin, que advertiu seus camaradas “a aderir na esfera dada a uma li-
nha correta, combatendo impiedosamente a mais leve manifestação de 'chauvi-
nismo racial'”.11S Garvey permaneceu convencido, entretanto, de que em um lugar
como a América, “o reinado do comunismo executivo não seria uma melhoria em
relação ao reinado da democracia executiva”.113
Uma tentativa mais séria de criar conflito por meio da amizade com os líde-
res ocorreu em 1935, quando um Comitê Provisório para a Defesa da Etiópia
(PCDE) foi formado no Harlem. A conferência de fundação foi realizada na sede da
UNIA em Nova York, e o capitão A. L. King, líder da Divisão Central da UNIA em No-
va York, foi eleito presidente por unanimidade. O secretário executivo seria A. W.
Berry, da Liga de Luta pelos Direitos do Negro, organizada pelos comunistas, en-
quanto o diretor de publicidade era William Fitzgerald, de outra organização co-
munista, a Defesa Internacional do Trabalho.121 Entre os membros do PCDE esta-
vam James W. Ford, na época secretário do ramo do Harlem do Partido Comunista
dos EUA. Ford aproveitou a oportunidade para cultivar a cooperação de King. Em
novembro, ele convidou King a se juntar a uma delegação ao prefeito LaGuardia
para protestar contra a invasão policial de um baile do Harlem patrocinado pelo
partido comunista, no qual setenta e quatro pessoas foram presas. No mês seguin-
te, ele convidou King para uma reunião dos principais líderes do Harlem com um
Comitê Antifascista.122
As relações entre os dois grupos nem sempre foram tão cordiais após a pri-
são de Garvey. A imprensa comunista, encabeçada pelo Liberator, publicou regu-
larmente apelos aos Garveyistas para se juntarem a órgãos comunistas como a Liga
de Luta pelos Direitos do Negro. Tais apelos foram acompanhados por artigos bai-
xos e hostis sobre Garvey e a UNIA e foram apoiados por proselitismo ativo nas
comunidades pretas. Aqui, no entanto, a presença de Garveyites provou ser um
obstáculo constante. Um relatório de um membro dos Jovens Libertadores (um
grupo comunista) em 1931 deu uma indicação disso. Durante o recrutamento no
lado sul de Chicago, o grupo encontrou jovens Garveyistas, que informaram aos
Libertadores que filhos brancos de escravagistas e estupradores nunca ajudariam
os pretos. Os Libertadores tentaram por três horas estabelecer uma distinção entre
capitalistas brancos e trabalhadores brancos. Os Garveyistas não estavam conven-
cidos, mas os Libertadores tinham esperanças de eventualmente conquistá-los, já
que eram "sinceros e militantes". 126 O recrutamento comunista no lado sul tinha
uma longa história de frustração por parte dos Garveyistas, desde pelo menos
1924.127
O Negro Worker e outros materiais da ITUC-NW eram lidos por pretos que,
embora admirassem a militância dessas publicações, nem sempre apreciavam as
denúncias de Garvey. Uma carta desse leitor na Guiana Inglesa foi publicada em
1932, junto com uma resposta do editor. Uma extensa troca de idéias ocorreu em
1936 e 1937 144 entre o editor, na época Charles Woodson (na verdade Otto
Huiswoud, de acordo com uma fonte de inteligência dos Estados Unidos) 145 e um
veterano líder da UNIA da Dominica, J. R. Ralph Casimir. Casimir nesta época era o
agente do Negro Worker na Dominica e ameaçou deixar de prestar este serviço
devido aos ataques enganosos a Garvey. Ele particularmente não gostou da ten-
dência do jornal de minimizar o papel dos imperialistas em frustrar os planos de
Garvey na Libéria. A revista dedicou várias páginas às cartas de Casimir e às res-
postas editoriais. Várias cartas anti-Casimir também foram publicadas, incluindo
uma do veterano inimigo de Garvey, W. A. Domingo.
Ainda assim, no mesmo ano em que Padmore repetia como papagaio essas
expressões comunistas de abuso, ele deu uma vaga idéia de uma persistente sim-
patia por Garvey em um panfleto intitulado Imperialismo Americano Escraviza a
Libéria. Aqui ele fugiu de suas distorções para admitir que o esquema de Garvey na
Libéria "foi derrotado pela intervenção do governo dos EUA". Ele também repetiu
o "boato" de que W. E. B. Du Bois foi usado pelo presidente Coolidge para ajudar a
derrotar o esquema.154
Padmore interrompeu suas várias filiações comunistas em 1933 e foi então
formalmente expulso do movimento em meio a muitos comentários estridentes de
seus sucessores no Negro Worker. Ele havia partido por causa de sua convicção de
que a eliminação parcial do programa anticolonial do Comintern na Ásia e na Áfri-
ca era uma "traição aos interesses fundamentais do meu povo". 155 Ao expulsá-lo,
seus ex-colegas o acusaram de muitas das coisas que ele acusou Garvey. A ITUC-
NW publicou uma longa declaração de "acusações muito graves" resumidas no se-
guinte extrato - "Em uma reunião em 23 de fevereiro de 1934, a Comissão de Con-
trole Internacional decidiu expulsar Padmore do Partido Comunista por contatos
com um provocador, por contatos com organizações burguesas sobre a questão da
Libéria, por uma atitude incorreta em relação à questão nacional (em vez da uni-
dade de classe lutando pela unidade racial)."156 Uma declaração posterior do Negro
Worker mostrou como a posição de raça-primeiro Garveyista afetou Padmore.
Acusou: “Em um esforço débil para justificar sua posição e uma profunda falta de
confiança nos trabalhadores brancos revolucionários, ele afirma, 'o que vocês ca-
maradas brancos nunca entenderam e nunca serão capazes de entender, é a psico-
logia do Negro.'”157 A mesma declaração, ao criticar suas atividades de arrecadação
de fundos em nome da Libéria, juntou-o a Garvey“ o pai de tal ideia, que introduziu
o 'movimento de volta à África' na mesma maneira.” 158 Ainda um artigo posterior
sobre“ A ascensão e queda de George Padmore como um lutador revolucionário ”,
novamente comparou-o com Garvey, declarando, no que era pretendido como abu-
so, que ele tinha“ duas almas, a dos anti- imperialista e o nacionalista Negro.”159
Padmore teria considerado isso um elogio, como a maioria dos revolucionários
pretos, Garvey incluído.
9. " Theses on the National and Colonial Question Adopted By the Second
Comintern Congress, 28 de julho de 1920," em Jane Degras, ed., The Communist
International, 1919-1943 (Nova York: Oxford University Press, 1956), I: 142 . O
“etc.” depois de “Negros” não aparece nesta versão, mas é incorporado a uma cita-
ção mais curta em Draper, American Communism, p. 337.
10. Claude McKay, "Soviet Russia and the Negro", Crisis 27 (dezembro de
1923): 64; Draper, American Communism, p. 321; Claude McKay, A l.ong Way From
Home (Nova York: Harcourt, Brace & World, 1970), p. 206.
24. Foster, The Negro People, p. 463. Uma formulação ligeiramente diferen-
te é sugerida em Draper, American Communism, p. 344.
30. Amy Jacques Garvey, ed., The Philosophy and Opinions of Marcus Garvey
(Londres: Frank Cass, 1967), II: 315.
33. Marcus Garvey, The Tragedy of White Injustice (Nova York: A. J. Garvey,
1927), p. 14
35. Garvey para Rt. Hon. Phillip Snowdon, Chancellor of the Exchequet 27 de
fevereiro de 1930, CO 318/399/76634, Colonial Office Records, Public Record Of-
fice, Londres.
46. Ibid., 26 de abril de 1930. Uma mensagem de Garvey em nome dos tra-
balhadores e trabalhadores da Jamaica recebeu pouca atenção do British Colonial
Office-E. B. Boyd para Rt. Exmo. Lord Stamfordham, 20 de setembro de 1930, CO
318/399/76634.
47. Black Man, 3 (julho de 1938): 6. Em 1941, o National Negro Voice (19 de
julho de 1941, p. 5) considerou Garvey juntamente com Bustamante, Ken Hill e S.
Kerr Coombs (editor do Jamaica Labor Weekly) como números de mão de obra
pendentes do período. Esse documento também dizia que Garvey havia criado um
Sindicato Trabalhista da Jamaica em 1935 (9 de agosto de 1941, p. 3).
57. Robert Bruce e J. P. Collins, "The Party and the Negro Struggle", The
Communist (novembro de 1921): 15.
60. Cyril Briggs, “The Decline of the Garvey Movement,” Communist, (junho
de 1931): 550; Draper, American Communism, p. 325, 326.
66. Negro World, 27 de agosto de 1921: Vincent, Black Power, p. 81; Garvey,
Garvey and Garveyism, p. 64; Crusader 5 (novembro de 1921): 5.
76. Philosophy and Opinions, II: xiv; Vincent, Black Power, p. 221.
77. Negro World, 25 de fevereiro de 1922.
90. John Bruce e J. P. Collins, "The Party and the Negro Struggle", The Com-
munist (outubro de 1921): 19.
95. Degras, Communist International, II: 97. Degras diz aqui que havia dez
comunistas na convenção. Ela não se refere ao Sinédrio pelo nome, mas o descreve
como tendo ocorrido em Chicago em fevereiro de 1924.
104. New York Age, 4 de setembro de 1920; New York Tribune, 20 de agos-
to de 1920.
117. M.I. l.c. New York, “Special” General Report, 6 de janeiro de 1920 "Ne-
gro Agitation," FO 371/4567.
119. Citado em Wilson Record, The Negro and the Communist Party (Chapel
Hill, University of North Carolina Press, 1951), p. 135
125. Ibid., Mary Dalton, Secretária Executiva, Distrito de Nova York, Ameri-
can Friends of The Soviet Union to King, 19 de fevereiro de 1936 Caixa 13, e.149.
142. George Padmore, Negro Workers and the Imperialist War (Hamburgo:
ITUC-NW, 1931), p. 16
153. George Padmore, The Life and Struggles of Negro Toilers (Londres:
ITUC-NW, 1931), p.125, 126, Negro Worker (dezembro de 1931): 7.
154. George Padmore, American Imperialism Enslaves Liberia (Moscou:
Centrizdat, 1931), pp. 6n, 33, 34.
158. Ibid., P. 9
160. James R. Hooker, "Africa for Afro-Americans: Padmore and the Black
Press", Radical America 2 (julho - agosto de 1968): 14-19.
11
Dois anos antes desta declaração amarga, Mary White Ovington, presidente
do conselho de diretores da NAACP, havia se expressado em particular (talvez em
tom de brincadeira) de uma forma que parecia estar de acordo com as acusações
de Garvey. Em uma carta a Arthur B. Spingarn, na época vice-presidente da NAACP,
ela disse: “De qualquer forma, apenas pretos deveriam viver nessas cidades de car-
vão! Meus pulmões estão diariamente ficando cinzentos como as cortinas sujas da
minha janela.”5
Os princípios da NAACP se desviaram dos de Garvey não apenas na questão
da hegemonia dos brancos sobre as organizações de ascensão racial, mas também
na questão das atitudes para com os pretos de pele clara. James Weldon Johnson,
durante o período americano de Garvey, um dos poucos oficiais pretos nacionais
importantes da NAACP, considerou que os principais erros de Garvey incluíram
suas supostas distinções "entre pessoas de cor e pretos" e seu Deus preto, que, na
opinião de Johnson, ajudava a impulsionar um racha entre pretos retintos e pretos
de pele clara.6 Isso não é surpreendente, já que em 1924 Garvey publicou parte da
autobiografia de Johnson sobre um ex-homem de cor em seu jornal diário para
mostrar que Johnson queria ser branco.7 A NAACP também não gostou do contato
de Garvey com segregacionistas brancos.8
O apoio da UNIA foi mantido até 1922, quando o projeto de lei foi aprovado
na Câmara, mas posteriormente derrubado no Senado. Assim, em janeiro, Garvey
enviou um telegrama ao Congresso pedindo a aprovação do projeto. Em fevereiro,
ele recebeu parte do crédito pela aprovação do projeto na Câmara. Em março, um
editorial do Negro World de William Ferris elogiou a NAACP por seu trabalho no
projeto de lei. Quase ao mesmo tempo, uma reunião de audiência mista em apoio
ao projeto de lei em Wilmington, Delaware, ficou surpresa ao ver um grande con-
tingente da UNIA presente, com setenta e cinco Enfermeiras da Cruz Preta unifor-
mizadas usando seus botões vermelhos, pretos e verdes. Elas estavam lá a convite
da NAACP, cujo William Pickens era o orador principal. A. Haynes, comissário da
UNIA para Delaware, também falou. Em maio, o Negro World viu com bons olhos a
visita a Washington D.C., de uma delegação liderada por William Monroe Trotter,
que esperava retirar o projeto do comitê, onde havia ficado travado. Em junho, a
UNIA juntou-se à NAACP, YMCA e várias outras organizações em um desfile do cen-
tro do Harlem à Manhattan branca em apoio ao projeto. E em novembro, William
H. Lewis, um ex-procurador-geral adjunto preto, falou no Liberty Hall sobre a
questão do antilinchamento. Poucos meses depois, Lewis planejaria uma visita de
W. E. B. Du Bois à Libéria. Nessa ocasião, porém, ele foi efusivo em seus elogios a
Garvey.12
Garvey viu a mão sinistra da NAACP por trás da maioria de seus problemas -
desde a tentativa de 1921 de excluí-lo do país até o embaraço de seu esquema na
Libéria, seu julgamento e prisão. Ele culpou os problemas da Black Star Line na
sabotagem de certas "organizações que se autodenominam associações para o
progresso Negro". James Weldon Johnson pediu a retratação dessa declaração e
divulgou um comunicado à imprensa sobre o assunto. Garvey respondeu, sem dú-
vida irônico, que não havia se referido especificamente à NAACP. “Aqueles que têm
a consciência limpa”, ele advertiu, “não se perturbam quando algo não relacionado
a eles é dito ou publicado.” 16
O que foi mais fascinante sobre a luta Garvey-Du Bois foi que ela foi, no sen-
tido mais real, uma continuação do debate Washington-Du Bois. As questões ideo-
lógicas levantadas eram basicamente as mesmas. Além disso, Garvey era um discí-
pulo de Washington muito autoconsciente. Junto com sua admiração por Washing-
ton, Garvey logo absorveu uma antipatia por Du Bois. Ele, portanto, se via como o
herdeiro da luta de Washington contra Du Bois e nunca perdeu a oportunidade de
comparar os dois, em detrimento de Du Bois.
É impossível apontar a data exata em que Garvey teve pela primeira vez co-
nhecimento das idéias de Washington. As Índias Ocidentais da infância de Garvey
há muito tempo foram expostas a debates sobre a questão da educação industrial,
o tipo popularizado por Washington. Esses debates nas Índias Ocidentais haviam
precedido Washington em muitos anos. No entanto, nas Índias Ocidentais, como na
América, a influência de Washington forneceu uma fonte de interesse crescente
nas escolas industriais e agrícolas. Quando menino, Garvey morou na paróquia de
St. Ann's na costa norte da Jamaica, onde em 1909 o pioneiro Pan-Africanista Bar-
badiano Dr. Albert Thome começou uma escola industrial.25 Nessa época, o inte-
resse pelos experimentos educacionais de Washington era generalizado nas Ilhas e
os alunos das Índias Ocidentais estavam freqüentando o Instituto Tuskegee de Wa-
shington. Vários delegados das Índias Ocidentais participaram da Conferência In-
ternacional de Washington sobre o Negro, realizada em Tuskegee em 1912. Entre
eles estava um grupo de educadores jamaicanos, incluindo o diretor de educação
da Ilha. Uma resolução apresentada na Conferência pelos delegados britânicos das
Índias Ocidentais, entre eles professores e alunos em Tuskegee, pedia a construção
de um Tuskegee nas Índias Ocidentais e uma visita às Ilhas por Booker T. Washing-
ton.26 Não demorou muito para nesta conferência (relatada no Africa Times e Ori-
ent Review com sede em Londres para a qual Garvey trabalhou) que Garvey leu a
autobiografia de Washington, Up From Slavery. Isso teve um efeito profundo sobre
ele e é a partir desse evento que, como ele disse, seu "destino" de ser um líder da
raça desceu sobre ele.27
Esse breve encontro com Moton foi em março de 1916, o mesmo mês em
que Garvey deixou a Jamaica e foi para os Estados Unidos. Durante sua primeira
viagem aos Estates, ele foi para Tuskegee e conheceu Emmett J. Scott, que o apre-
sentou a pessoas influentes.33 Garvey voltou a Tuskegee no final de 1923. Desta
vez, ele ficou alguns dias, falou aos alunos e deixou o que o jornal estudantil cha-
mou de uma “contribuição substancial” de cinquenta dólares para o fundo de bol-
sas. Ele fez uma promessa de um presente anual. “A língua me falha”, escreveu ele
no final de sua visita, “para expressar meu alto apreço pelo serviço que o Dr. Wa-
shington prestou a nós como um povo”.34
É claro que Washington foi, e continua sendo, uma figura histórica contro-
versa. Muitos o viram principalmente como um grande acomodador, disposto a se
comprometer com o racismo para ganhar tempo para o homem preto em sua luta
pela sobrevivência. Garvey não estava alheio a esse aspecto da carreira de Wa-
shington. Ele acreditava que a relutância de Washington em se entregar a uma agi-
tação aberta por direitos políticos e sua dependência da filantropia branca podem
ter sido inevitáveis durante a vida de Washington. Na nova realidade do mundo do
pós-guerra, no entanto, “O próprio Negro educado industrialmente desenvolveria
um novo ideal, após ter sido treinado pelo Sábio de Tuskegee”. Em vez de atacar
Washington nesses pontos, ele preferiu argumentar que o próprio Washington
teria feito esses tipos de ajustes se tivesse vivido.35
Garvey tornou-se cada vez mais intolerante com o sucessor de Washington,
R. R. Moton, quando ficou claro que ele não faria os ajustes necessários à nova era.
Garvey o denunciou abertamente no final da década de 1920 e em 1929 ele escre-
veu: “Dr. Moton é mantido por filantropos brancos, portanto, tal homem preto não
tem absolutamente nenhum direito de falar em nome da raça Negra.” 36
...Sr. Fortune foi por muitos anos guia, filósofo e amigo do maior edu-
cador industrial, que os brancos adoravam elogiar e os pretos idolatravam.
Então, uma felicidade do destino decretou que ele deveria ser ajudante do
único homem que, aqui ou no exterior, superou em tamanho a grandeza de
Washington - que, começando de onde Washington parou, carregou rápido
e alto a tocha da verdadeira emancipação para a raça Negra... 41
O órgão oficial da NAACP, o Crisis, do qual Du Bois foi editor durante todo o
período americano de Garvey, reconheceu a presença de Garvey logo após sua che-
gada aos Estados Unidos. Uma breve declaração na edição de maio de 1916 obser-
vou: “Sr. Marcus Garvey, fundador e presidente da Associação Universal para o
Progresso Negro da Jamaica, B.W.I., está agora em visita à América. Ele fará uma
série de palestras sobre a Jamaica em um esforço para arrecadar fundos para o
estabelecimento de uma instituição industrial e educacional para Negros na Jamai-
ca”.
Logo após o início da convenção, foi anunciado que Du Bois havia participa-
do de uma sessão antecipada. Isso gerou uma denúncia de Garvey de Du Bois, que
atraiu os aplausos mais entusiásticos do dia. Em uma referência a duas das publi-
cações mais conhecidas deste último, Garvey declarou que Du Bois não poderia
pregar "aliança" (com a América branca) um dia e "desagrado" no dia seguinte. 59
Para aumentar seu desconforto, Du Bois tinha sido erroneamente responsabilizado
pelo Chicago Tribune pelo slogan “de Volta à Africa” naquela cidade, no qual Gar-
vey estava supostamente implicado. “No meio da convenção, Garvey informou a
um entrevistador da National Civic Federation que Du Bois representava o “Negro
pré-guerra” em oposição ao Novo Negro militante do pós-guerra. Quatro dias de-
pois, Du Bois disse ao mesmo entrevistador que Garvey não era sincero. Ele tam-
bém disse aqui o que se tornaria uma espécie de obsessão para ele, ou seja, que os
seguidores de Garvey eram "o tipo mais baixo de Negros, a maioria das Índias" e
que a UNIA não poderia de forma alguma ser considerado um movimento Afro-
americano. Ele também denunciou Garvey como um aliado dos bolcheviques e de
Sinn Feiners.61
Apesar dessa denúncia direta de Garvey feita em particular, Du Bois conti-
nuou sua política de ataque público velado no Crisis, a edição de setembro do qual
publicou um editorial sobre os caribenhos dirigido, na própria admissão de Du
Bois, a Garvey e a UNIA.62 desta vez, os esforços de Du Bois para ignorar Garvey
chamaram a atenção de Chandler Owen e A. Philip Randolph, cujo Menssenger em
um editorial intitulado "Um Registro das Raças Mais Escuras" (uma tirada com o
subtítulo do Crisis) apontou que o Crisis não correspondeu ao seu subtítulo. O
Menssenger mostrou que, embora o Crisis tenha mencionado eventos raciais me-
nores, ele permitiu que os acontecimentos espetaculares de Garvey na cidade de
Nova York não fossem relatados.63 Talvez em resposta a essa crítica, o Crisis de
novembro finalmente tomou conhecimento da convenção de Garvey de agosto em
algumas breves linhas ocultas no meio de várias notícias breves e relativamente
sem importância.64 Essa mesma edição publicou outro editorial de Du Bois contra
ataques de fontes não identificadas em sua defesa da igualdade social. Desta vez,
Du Bois tentou usar Booker T. Washington contra o campo dos Garveyistas neo-
Washington, sugerindo que o próprio Washington, o grande oponente da igualdade
social, havia participado de eventos com os brancos.65 A resposta Garveyista usual
a esse tipo de argumento era, é claro, que Washington pegou o dinheiro dos bran-
cos, mas construiu para si uma base de poder preto independente com ele. Garvey
provavelmente não sabia, mas seu desprezo pelo histórico de dependência de
brancos de Du Bois era compartilhado por Mary White Ovington, que contrastava
privadamente a influência de Du Bois entre os brancos com sua influência menor
entre os pretos, mesmo dentro da NAACP. Ela então comentou, com um desprezo
não inferior ao de Garvey: “Sua carreira foi feita pelos brancos; primeiro o Dr.
Bumstead [o presidente da Universidade de Atlanta que contratou Du Bois), depois
vários membros da NAACP.”66 A própria Ovington manteve uma relação imprová-
vel com o Negro World, que em 1921 e 1922 publicou regularmente sua coluna“
Book Chat ”.
Sua tentativa de fingir publicamente que Garvey não estava lá, tendo falha-
do em garantir o desaparecimento de Garvey, Du Bois, em novembro de 1920, de-
cidiu que havia chegado a hora de cancelar o fingimento. Ele escreveu a W. A. Do-
mingo, agora um conhecido inimigo de Garvey: “Posso perguntar se você tem al-
guma informação sobre o Sr. Marcus Garvey e suas organizações que estaria dis-
posto a me dar?” Ele perguntou também sobre o endereço de Eliezer Cadet, o co-
missário Haitiano da UNIA que compareceu ao seu Congresso Pan-Africano em
Paris de 1919. A carta foi devolvida a ele e ele a enviou ao historiador Arthur A.
Schomburg na esperança de que Schomburg pudesse localizar Domingo e encami-
nhá-la.67 A carta parece não ter ido além de Schomburg, mas o Crisis de dezembro,
no entanto, apresentou um Artigo de Du Bois intitulado “Marcus Garvey.” A batalha
agora estava irrevogavelmente travada.
Du Bois publicou uma segunda parte dessa crítica em janeiro. Aqui, ele ata-
cou Garvey na questão dos retintos versus os de pele clara e o acusou de levantar
essa questão em um país onde, de acordo com Du Bois, era uma não-questão. Ele
também se opôs ao antagonismo de Garvey contra os imperialistas britânicos e
divulgou a informação de que em julho de 1920 ele havia enviado "uma carta de
pesquisa cortês" a Garvey pedindo dados financeiros sobre a UNIA e a Black Star
Line. Ele esperava que Garvey lhe fornecesse essa informação e ficou chateado
porque sua carta permaneceu sem reconhecimento e sem resposta. Ele novamente
se exagerou, desta vez descrevendo o Yarmouth da Black Star Line como um navio
de madeira em vez de aço.70 Du Bois publicou posteriormente uma retratação des-
sa declaração por sugestão de Arthur B. Spingarn, chefe do comitê jurídico da
NAACP.71 desta vez, a controvérsia entre os dois homens despertou interesse sufi-
ciente para um “debate” a ser organizado na Igreja Mãe Bethel AME na Filadélfia.
Du Bois apresentou suas opiniões em 4 de abril de 1921. Garvey, escalado para
falar na semana seguinte, não pôde fazê-lo, pois ainda estava nas Índias Ociden-
tais.72
Após esses dois artigos, Du Bois voltou à sua política atacando Garvey sem
nomeá-lo. Em um desses ataques em maio de 1921, ele introduziu a questão de
uma concentração na luta puramente Afro-americana versus um movimento para
ligações imediatas entre as comunidades Africanas em todo o mundo. Du Bois, de-
pois de explodir a "horda de canalhas e sopradores de bolhas, pronto para conquis-
tar a África, juntar-se à revolução russa e votar no Reino de Deus amanhã", mani-
festou-se a favor de "um programa que diz: a batalha dos direitos dos Negros deve
ser lutada aqui mesmo na América”. Ele expressou a expectativa otimista, que ele
próprio repudiaria na próxima década, de que mais vinte e cinco anos de "luta inte-
ligente", como a que a NAACP estava travando, libertariam a raça na América. 73
Tais sentimentos isolacionistas do fundador do Congresso Pan-Africano não eram
tão incomuns como pode parecer à primeira vista. Pois Du Bois, nesta época, pare-
ce ter concebido essa organização mais como um clube social internacional para os
dez talentosos, em vez de um corpo engajado na luta real com base mundial, como
era o propósito da UNIA. Ele mesmo disse isso em uma carta ao Secretário de Esta-
do Charles Hughes, um mês após o lançamento deste artigo. Ele disse a Hughes, “O
Congresso Pan-Africano é para conferências, conhecimento e organização geral.
Não tem nada a ver com o chamado movimento Garvey e não contempla força nem
revolução em seu programa.” Ele continuou: “Tivemos a cooperação cordial dos
governos francês, belga e português e esperamos chamar a atenção e a simpatia de
todas as potências coloniais.” 74 O que é interessante nesta carta, além da evidência
do conceito não militante do Pan-Africanismo de Du Bois é que ela foi escrito na
época em que Hughes e o Departamento de Estado tentavam manter Garvey fora
dos Estados Unidos. Possivelmente, pode ter reforçado a convicção de Hughes so-
bre a indesejabilidade de Garvey. Garvey, por sua vez, estava bastante convencido
de que Du Bois contribuiu para sua exclusão. Du Bois escreveu uma carta seme-
lhante ao embaixador britânico em Washington.75 O objetivo dessas cartas era ob-
ter apoio governamental para o Congresso Pan-Africano de 1921 em Londres.
Além disso, Ferris viu neste último esforço de Du Bois apenas o exemplo
mais recente da tendência de longa data de Du Bois ao plágio. Ele argumentou que
Du Bois havia incorporado o programa anti-linchamento de Ida Wells-Barnett sem
lhe dar crédito por isso. Oito anos depois que o Guardian de William Monroe Trot-
ter e a organização da raça apareceram, continuou Ferris, Du Bois começou uma
revista e organização em linhas semelhantes. O único crédito que deu a Trotter por
sua ideia foi chamá-lo de fanático. A curta história do Negro de Du Bois era apenas
uma versão mais curta de uma publicada nove anos antes por um homem preto a
quem Du Bois havia se referido como um arrivista. Dez anos antes, Duse Mohamed
Ali havia escrito a Booker T. Washington, Dr. W. S. Scarborough e Du Bois infor-
mando-os do surgimento iminente de sua revista destinada a aproximar as raças
mais escuras do mundo. Os dois primeiros enviaram respostas encorajadoras. A
resposta de Du Bois foi descrita por Mohamed como inútil e decepcionante. No
entanto, Du Bois mais tarde copiou a ideia de Mohamed. Agora, depois de ter en-
contrado falhas na convenção de Garvey de 1920, ele estava ocupado discutindo as
mesmas coisas em seu congresso e tentando estabelecer uma organização perma-
nente.85
O artigo da Black Star Line apareceu na revista Crisis de setembro. Foi cui-
dadosamente documentado para evitar a possibilidade de processos por difama-
ção, com a maioria das informações importantes na forma de citações diretas do
Negro World e do caso Orr (onde um acionista processou a Black Star Line, resul-
tando na exposição pública da maior perda financeira da empresa). Muitos dos
argumentos de Du Bois aqui foram repetidos posteriormente pela promotoria no
julgamento de 1923. Aqui, pela primeira vez em suas negociações com Garvey, Du
Bois foi capaz de controlar sua raiva por tempo suficiente para empregar com efi-
cácia seus consideráveis talentos acadêmicos. E vindo como aconteceu no meio da
campanha “Marcus Garvey Must Go” (Marcus Garvey Deve Sair) e em um momento
em que Garvey já havia sido preso e indiciado por suposta fraude em conexão com
a empresa de navegação, o resultado foi o mais devastador dos ataques de Du Bois.
Com efeito, Du Bois presumiu a culpa e julgou um assunto que estava sub judice.
Isso, junto com suas cartas a funcionários do governo e sua amizade com o juiz que
logo presidiria o julgamento de Garvey, certamente deve ter prejudicado as chan-
ces de Garvey de uma audiência imparcial. Garvey considerou este ataque particu-
larmente infeliz, uma vez que, explicou ele, a Black Star Line representava não um
empreendimento no interesse dos indivíduos, mas um esforço para levantar uma
raça em dificuldades. “Se”, lamentou ele, “Du Bois fosse um líder construtivo, já que
possuía todo o conhecimento do mundo, ele ajudaria Marcus Garvey, a Associação
Universal para o Progresso Negro e a Black Star Line a fazer melhor.” 100 Du Bois
tentou ajudar a linha a ficar bem. Ele escreveu ao secretário de Estado para que
dois navios, de fato, assumissem a linha. 101
O artigo da Black Star Line marcou o início de uma série de ataques abertos
a Garvey. Um desses artigos apareceu em novembro e dizia respeito à deserção do
Dr. Leroy Bundy da NAACP para a UNIA. Bundy havia sido preso durante o massa-
cre de pretos em 1917 em East St. Louis por encorajar a comunidade negra a se
armar em legítima defesa e ser acusado de assassinato e incitamento à rebelião. Ele
colaborou por um tempo com a NAACP, que organizou um fundo de defesa e se
preparou para defendê-lo. Em algum lugar ao longo da linha, Bundy desentendeu-
se com a NAACP e desertou para o campo da UNIA. Durante a convenção de 1922,
ele foi nomeado cavaleiro por Garvey, e a convenção o elegeu primeiro presidente
geral adjunto. Em resposta às incessantes acusações da NAACP de má gestão finan-
ceira, Garvey rebateu com uma acusação própria. O que, indagou o Negro World,
havia acontecido com os $50.000 arrecadados pela NAACP para a defesa de Bundy?
Apenas $150 foram gastos em Bundy, acusou o jornal. O diretor jurídico da NAACP,
Arthur Spingarn, sugeriu que Du Bois publicasse um "resumo muito breve dos de-
sembolsos e despesas no caso Bondy [sic]". 102 Du Bois publicou um artigo de seis
páginas sobre o caso, que foi devidamente repudiado por dois editoriais de Ferris
no Negro World.103
O ano de 1923 foi saudado por uma tentativa de Du Bois de provar que a
UNIA tinha menos de 18.000 membros.104 Para fazer isso, ele publicou um relató-
rio financeiro da UNIA que alegou ter sido suprimido até então. O número de assi-
naturas era relativamente pequeno e Du Bois presumiu que todas as agências ha-
viam enviado todas as suas assinaturas e que os membros pagantes e os membros
ativos eram necessariamente os mesmos. Quando ele descobriu que apenas cerca
de 200 delegados haviam votado na convenção de 1922, ele concluiu que isso era
uma indicação do pequeno número de delegados presentes, não percebendo que
os votos eram dados por delegação em vez de individualmente. As conclusões de
Du Bois sobre a adesão aqui foram obviamente um eufemismo grosseiro. Quando
estimativas do governo puderam estimar conservadoramente 20.000 a 25.000
pessoas presentes na primeira sessão da convenção de Garvey de 1920 ou 3.000
pessoas em uma reunião apenas da filial de Chicago, ou 100.000 pessoas desfilan-
do e congestionando as calçadas do Harlem em 1926 exigindo a libertação de Gar-
vey, então a enormidade da subestimação de Du Bois fica clara.105
Garvey, nesta fase, emitiu uma resposta a seus muitos críticos, alegando, en-
tre outras coisas, a acusação de que seus seguidores representavam "os ignorantes
e ingênuos". Esta declaração de Garvey apareceu quase ao mesmo tempo que um
comunicado de imprensa da NAACP de 25 de janeiro 106 dando publicidade prévia
ao ataque mais elaborado de Du Bois contra Garvey, um artigo de dez páginas que
apareceu na edição de fevereiro da revista branca Century. O artigo retratou Gar-
vey como uma figura semicômica. Começava assim: 'Havia um porão de igreja lon-
go, baixo, inacabado e coberto. Um negrinho gordo, feio, mas com olhos inteligen-
tes e cabeça grande, estava sentado em uma plataforma de tábuas ao lado de um
'trono', vestido com um uniforme militar do tipo mais alegre do meio-vitoriano ...
Entre os sortudos ganhadores de títulos estava o ex-secretário particular de Boo-
ker T. Washington! ” Neste artigo, Du Bois reafirmou a maioria de suas diferenças
ideológicas e outras diferenças com Garvey. Primeiro havia a questão da raça. Ele
insistiu contraditoriamente que as linhas de cor intra-raciais eram essencialmente
um fenômeno das Índias Ocidentais, "apesar das aristocracias quase brancas de
cidades como Charleston e Nova Orleans, e apesar do fato de que a proporção de
mulatos que eram livres e que ganharam alguma riqueza e educação era maior do
que os pretos por causa do favor de seus pais brancos.” Ele até admitiu que após a
emancipação na América “a casta de cor tendia a surgir novamente” e que em sua
própria época estava na moda os Afro-americanos de pele clara se passarem por
espanhóis ou portugueses. Diante de todas essas evidências voluntárias em contrá-
rio, ele teimosamente insistiu que o antagonismo intra-racial de cores era pratica-
mente desconhecido na Afro-América, porque o racismo branco que permeia tudo
forçava os de pele clara a se referir a eles mesmos como pretos. Que essa posição
se devia em grande parte ao seu próprio sentimento de vulnerabilidade como pes-
soa de cor muito clara, foi aparentemente admitido inconscientemente quando ele
declarou: “Pessoas de cor tão brancas quanto as mais brancas passaram a se des-
crever como pretas. Imagine, então, a surpresa e o nojo desses americanos quando
Garvey lançou seu esquema de cor jamaicano.” Para alguém tão sensível quanto Du
Bois em relação à sua cor, a questão intra-racial sobre cor era mais bem tratada
pelo silêncio. Ele disse isso neste artigo, embora tenha impingido sua ideia à maio-
ria dos Afro-americanos. Ele disse, "passou a ser geralmente considerado o gosto
mais pobre possível para um negro até mesmo para se referir a diferenças de cor.”
Junto com sua recusa em admitir uma questão doméstica de cor dentro da
raça, Du Bois chegou muito perto neste artigo de um tratamento com tom condes-
cendente e até ofensivo da pretitude de Garvey. Garvey, é claro, muitas vezes acu-
sou Du Bois de odiar o sangue preto dentro dele e de ansiar pela sociedade branca.
Esta faceta da experiência de Du Bois recebeu posteriormente um tratamento aca-
dêmico pelo eminente sociólogo Afro-americano E. Franklin Frazier. A análise de
Frazier aproximou-se da de Garvey. Ele definiu Du Bois como um "homem margi-
nal". Ele escreveu:
Garvey também usou suas diferenças raciais com Du Bois para responder às
referências depreciativas de seu rival ao Liberty Hall como sendo um "porão baixo
e irregular de tijolo e pedra bruta". Du Bois havia contrastado esta estrutura com
vários edifícios próximos que ele considerava bonitos. Garvey conseguiu demons-
trar que todos os edifícios elogiados por Du Bois eram total ou parcialmente de
propriedade de brancos. Liberty Hall, ele argumentou, pelo menos representava a
autossuficiência preta. Du Bois, por outro lado, era um "mulato preguiçoso depen-
dente", o escárnio de Du Bois sobre a cavalaria de Garvey também era vista como
uma falta de consciência racial, pois ele certamente teria exultado com uma honra
semelhante de um potentado branco. (de fato, deve-se lembrar, Du Bois recebeu
em 1920 uma medalha Spingarn, nomeada em homenagem a um líder branco da
NAACP, e certamente não menos tolo do que uma honra Garveyista. E ele certa-
mente exultou mais tarde com a pompa dourada e com sobrecasaca que cercou sua
breve passagem como representante dos Estados Unidos na Libéria.)108
Nas incessantes piadas de Du Bois sobre as deficiências educacionais de seu
rival, Garvey também deu sua opinião. “Se a educação de Du Bois não o qualifica
para nenhum serviço melhor do que ser lacaio de brancos do bem”, comentou, “en-
tão seria melhor que os Negros não fossem educados”. O motivo do alvoroço sobre
as realizações educacionais de Du Bois, ele viu como decorrente do fato de que "ele
foi um dos primeiros ‘experimentos’ feitos por brancos com homens de cor na li-
nha do ensino superior." Apesar da veemência de sua resposta, Garvey não se refe-
riu a algumas das acusações de Du Bois. Ele ignorou a acusação de ser um campo-
nês jamaicano preto que não se interessava pela luta Afro-americana. Ele também
ignorou os ataques de Du Bois ao seu programa Liberiano e à sua atitude anti-
imperialista.109
Garvey repetiu muitos desses argumentos nos meses que se seguiram. Du-
rante esses meses, foi realizado seu julgamento e ele ficou preso aguardando fian-
ça. Ele saiu da prisão a tempo do terceiro Congresso Pan-Africano de Du Bois, no
entanto. Du Bois culpou Garvey pelo fraco desempenho deste congresso. Ele escre-
veu mais tarde que “O infeliz desastre de seus esquemas super-anunciados natu-
ralmente prejudicou e dificultou o desenvolvimento efetivo da ideia do Congresso
Pan-Africano.”110 No entanto, ambos Kelly Miller na América e o líder da Costa do
Ouro de Casely Hayford saíram nesta época em favor do programa Africano de
Garvey em vez do Congresso Pan-Africano de Du Bois.111
Nesse ínterim, em Londres, o Congresso Pan-Africano teve problemas e não
conseguiu aumentar o quórum para a sua última sessão; O representante de Gar-
vey em Londres relatou a presença de onze. O relatório de Du Bois relatou uma
representação maior que Garvey atribuiu à contagem dupla e à inclusão de algu-
mas pessoas curiosas que olharam brevemente. De todos os Africanos do mundo,
lamentou Garvey, Du Bois não poderia conseguir vinte para se encontrar com ele.
Em vez disso, os oradores principais, além do próprio Du Bois, que foi o orador
principal na maioria das sessões, eram "pessoas brancas com ideias peculiares so-
bre o Negro, especialmente Sir Sydney Olivier e H. G. Wells". “Por que um Congres-
so Pan-Africano em tal companhia?” Garvey queria saber. “A coisa é profana e está
fadada a morrer a morte dos injustos.”112 Críticas semelhantes foram feitas por A.
Philip Randolph e Chandler Owen, do Messenger, que publicou um editorial: “Dr.
Du Bois representou os doze milhões de Negros americanos, sem seu consentimen-
to, e o Sr. H. G. Wells, junto com alguns outros liberais ingleses brancos, sem dúvi-
da, constituíram a voz da seção Africana da Grã-Bretanha. ”113 Garvey fez a mesma
observação de forma mais pitoresca: “Du Bois não tinha mais direito ou autoridade
de convocar um Congresso Pan-Africano do que um gato tinha de convocar um
parlamento de ratos”.114 E o Negro World citou o Manchester Guardian sobre a
despreocupação demonstrada no congresso pela maioria dos Africanos proemi-
nentes da Grã-Bretanha.115
O fracasso de Du Bois em Londres foi seguido por uma sessão de seu con-
gresso em Lisboa, Portugal, organizado pela Liga Africana. De lá, ele viajou para a
Libéria, onde seria ministro plenipotenciário e enviado extraordinário em repre-
sentação do presidente Coolidge na segunda posse do presidente rei da Libéria em
1 de janeiro de 1924. Garvey relatou que Du Bois em seu retorno para casa foi ho-
menageado em um banquete no qual o juiz Mack, que presidiu o caso de Garvey em
1923, foi o convidado especial.116 E em setembro, o secretário de Estado Charles E.
Hughes informou ao presidente Coolidge, depois de ler uma petição da UNIA pe-
dindo ajuda para ir para a Libéria, que os seguidores de Du Bois eram muito maio-
res e mais respeitáveis do que os de Garvey.117 O Messenger, a essa altura bem na
campanha “Marcus Garvey Deve Sair”, aprovou as ações de Du Bois, argumentando
que se ele não tivesse feito nada na Libéria além de frustrar os planos de Garvey,
então sua viagem teria valido a pena.118
A razão imediata para essa explosão foi um simpósio que Garvey enviou pa-
ra pessoas brancas influentes. O simpósio procurou garantir um sentimento favo-
rável entre os brancos para a separação racial e colonização Africana. Argumentou
com efeito que os pretos nunca seriam tolerados como iguais na América e, portan-
to, o programa de integração da NAACP poderia levar apenas a uma guerra racial.
Du Bois não foi o único integracionista levado à fúria por este simpósio. Os comu-
nistas o criticaram na primeira página do Daily Worker e os integracionistas socia-
listas pretos do grupo Messenger também o atacaram cruelmente.
Du Bois (nervoso)
Aclamações novamente.
Jonson
Du Bois
Estou esperando por algum líder Negro que organizou mais Negros do que
Marcus Garvey organizou, para criticar Garvey - e eu francamente confesso que se
tal líder recebeu um mandato mais longo em Leavenworth do que Garvey recebeu,
eu o ouvirei com mais atenção.
Um resultado dos eventos de 1923 e 1924 foi que Garvey e Du Bois toma-
ram a irreconciliabilidade de seus pontos de vista como significando que a união
total dos pretos não era apenas uma impossibilidade, mas um objetivo pelo qual
nem valia a pena lutar. No Sinédrio em fevereiro de 1924, Alain Locke de A Howard
University e outras pessoas pretas proeminentes pediram uma reaproximação en-
tre os dois rivais.125 Respondendo a essas opiniões antes do início do Sinédrio,
Garvey argumentou que ele e Du Bois não poderiam se unir em uma base constru-
tiva em tal convenção plural. Pois Du Bois era um “extremista moderno” que pre-
gava um ideal de integração que poderia se materializar em dois mil anos, quando
todas as raças tivessem alcançado igual força material e cultural. Para a ocasião,
Garvey explicou: “O Negro tem que se desenvolver separadamente e criar seu pró-
prio governo e fundação industrial” para alcançar um mundo que respeitava ape-
nas a força política e econômica.126 Du Bois em julho veio igualmente forte contra a
unidade, argumentando que a diversidade, e até mesmo algumas "brigas pessoais"
eram "absolutamente essenciais na situação atual da raça Negra". A NAACP, argu-
mentou ele, queria que o homem preto se tornasse “um cidadão americano de ple-
no direito” e discordava das visões contrárias. “Nessas circunstâncias”, declarou
ele, “falar de unidade e acordo é um absurdo. Se a Associação Nacional para o Pro-
gresso das Pessoas de Cor estiver certa, essas outras pessoas estão erradas. Se um
grupo está caminhando para o norte e o outro grupo caminhando para o sul, então
a unidade significaria a abdicação de sua posição por um grupo”. Somente as pes-
soas que estivessem dispostas a aceitar seu programa eram bem-vindas para se
unir à NAACP.127
Du Bois viveu noventa e cinco anos. Sua vida foi em muitos aspectos a histó-
ria triste e tortuosa de um homem atraído por treinamento e educação para a aris-
tocracia branca, mas muito sensível para ignorar o racismo que o atingiu e a sua
raça. Durante sua vida, ele mudou impacientemente de uma tática para a outra, de
uma filosofia para a outra, em uma busca frustrantemente vã pela fórmula elusiva
que superaria o monstro formidável do racismo branco, e mais especialmente ra-
cismo branco americano. E foi assim que Du Bois chegou ao Garveyismo.
Quando Garvey foi deportado dos Estados Unidos em 1927, Du Bois já era
um homem velho, a menos de três meses de seu sexagésimo aniversário. Ele já ha-
via tentado intelectualizar o problema racial para longe. Ele havia desistido há
muito tempo em favor de agitá-lo. Ele havia tentado o socialismo, a integração e
muito mais. Ainda assim, por volta de 1930, Du Bois começou a seguir o caminho
que George Padmore logo seguiria. A principal diferença entre os dois era que Pa-
dmore foi mais honesto sobre a influência de Garvey em fazer com que os comunis-
tas pretos reconsiderassem suas posições do que Du Bois foi no caso de sua pró-
pria mudança da integração para a separação.
Assim que Garvey saiu do caminho, Du Bois foi dominado por uma profunda
desilusão com a integração que ele defendeu tão obstinadamente. Ele percebeu
cada vez mais que, apesar de todo o seu esforço, de todo o esforço da NAACP, a in-
tegração estava avançando pouco. A segregação escolar de fato havia aumentado
no Norte e os linchamentos, embora menos frequentes, não eram menos chocan-
tes. Ele, portanto, agora começou a argumentar que, uma vez que a integração era
uma aparente impossibilidade, pelo menos por enquanto, os pretos deveriam
aproveitar ao máximo a separação. Ele falou de uma “economia racial” cooperativa
sem fins lucrativos que operaria dentro do capitalismo americano, mas não seria
dele. Com o tempo, essa economia racial incorporaria as Índias Ocidentais. Ele até
começou, com a terrível tragédia da depressão, a expressar o pessimismo de Gar-
vey sobre a sobrevivência da raça Africana na América. No passado, Du Bois havia
ameaçado a separação se a América negasse igualdade ao homem preto, mas esses
foram apenas vislumbres fugazes de sua incerteza. Agora, entretanto, era diferente.
Um dos primeiros a notar a mudança em Du Bois foi o próprio Garvey. De-
pois de ler um discurso de formatura de Du Bois na Howard University, Garvey, da
Jamaica, acusou Du Bois de agora pregar o Garveyismo. Isso foi em 1930, e Du Bois
havia se referido naquele discurso à necessidade de uma base econômica preta. 134
Em 1931, o Negro World fez a mesma observação. As manchetes das páginas de-
claravam: “Dr. Du Bois concorda com o Programa de Líderes da UNIA, mas não o
confessa abertamente. Enfatiza indústrias e negócios de propriedade de pretos.” 135
Essa nova linha de pensamento levou inevitavelmente a uma ruptura entre Du Bois
e seus empregadores integracionistas na NAACP. Du Bois, em suas próprias pala-
vras, estava agora “defendendo uma nova segregação, deliberada e proposital para
a defesa econômica”. 136 Em 1934, ele e a NAACP se separaram, deixando o Crisis
nas mãos integradoras de Roy Wilkins e George W. Streator. Garvey, aludindo à
chegada tardia de Du Bois à filosofia de autossuficiência econômica racial, comen-
tou: “Não é de se admirar que Du Bois tenha renunciado à Associação Nacional pa-
ra o Avanço de Pessoas de Cor. Ele não pode ir mais longe. Será que ele pode conti-
nuar abusando do homem branco quando o Negro americano está na cozinha do
homem branco?”137 Du Bois, enquanto se abstinha de dar crédito a Garvey por sua
nova posição, buscava fazer as pazes com o espírito de Booker T. Washington , ale-
gando agora que não se opôs a Washington no campo segregação.
O programa racial de Du Bois não precisa ser levado a sério... Ele tem
apenas um interesse romântico ocasional no Negro como uma raça distinta.
Nada seria mais insuportável para ele do que viver dentro de um gueto pre-
to ou dentro de uma nação preta - a menos que talvez ele fosse rei, e então
provavelmente tentaria unir os brancos e pretos por meio do casamento das
famílias reais. Quando Garvey tentou seu genuíno movimento racial, nin-
guém foi mais crítico e desdenhoso que Du Bois da fantástica glorificação da
raça preta e de todas as coisas pretas. O movimento de Garvey estava muito
próximo das massas pretas ignorantes para Du Bois. Por outro lado, ele se
sentia mais à vontade com os intelectuais de cor que se reuniam nos Con-
gressos Pan-africanos.140
Enquanto isso, na Inglaterra, Garvey resumiu seu conflito com Du Bois. Ele
resumiu as grandes deficiências de Du Bois em uma frase: "Ele não tem autorres-
peito racial, não tem ideias independentes, não tem autoconfiança e esse é o seu
grande problema." Além disso, em Du Bois, Garvey não viu nenhuma evidência de
qualquer pensamento independente de longo prazo sobre estratégias para eman-
cipar a raça, como havia caracterizado o programa de Booker T. Washington. Gar-
vey viu a notável contribuição de Du Bois como uma hostilidade negativa aos pro-
gramas de libertação mais importantes de sua época. Garvey escreveu em 1935:
Até então, Pickens não tinha feito nada pior do que enganar Garvey para ob-
ter um aumento de salário. De agora em diante, ele seria uma figura central na
campanha mais vituperativa já empreendida por líderes afro-americanos impor-
tantes contra um grande rival.
A verdade da questão era que Eason havia sido formalmente impedido e ex-
pulso da UNIA por noventa e nove anos em demorados procedimentos legais na
convenção de 1922. O seu impeachment resultou da acusação de um grande núme-
ro de irregularidades financeiras e outras, algumas das quais ele admitiu. Essas
questões chamaram a atenção de Garvey e foram comprovadas por seu auditor J.
Charles Zampty durante uma extensa turnê pelos Estados Unidos antes da conven-
ção.110 Uma vez expulso, ele reforçou a campanha integracionista realizando reu-
niões anti-Garvey por todo o país sob os auspícios nominais de sua apressadamen-
te organizada Universal Negro Alliance. Ele viajou por muitas das mesmas áreas
que havia visitado recentemente em nome da UNIA, desta vez repudiando suas
antigas opiniões Garveyistas. Em algum momento durante esse período, foi anun-
ciado que ele seria a principal testemunha contra Garvey no julgamento deste úl-
timo.
Esses ataques, por mais sérios que fossem, foram apenas um prelúdio para a
campanha real, que pode-se dizer começou com a publicação do Messenger de ju-
lho de 1922. O primeiro editorial gritava: "Marcus Garvey!" Mais uma vez, e não
pela última vez, as declarações separatistas de Garvey levaram os integracionistas
ao frenesi. Desta vez, o casus belli foi um discurso de Garvey em Nova Orleans. Ele
foi citado como tendo dito, em termos que lembram Booker T. Washington, que a
América era o país do homem branco e o homem preto não podia insistir em andar
no bonde Jim Crow do homem branco, uma vez que ele não havia construído ne-
nhum bonde próprio. Isso foi demais para o Messenger. Antes que o mês terminas-
se, Randolph começou seus discursos anti-Garvey no Harlem.181
Assim que a decisão pela guerra total foi tomada, Owen e Randolph aban-
donaram todas as pretensões de decoro em seus ataques. Como Du Bois, eles ex-
ploraram ao máximo a fenda mais vulnerável na armadura de Garvey, ou seja, sua
condição de estrangeiro, e isso apesar de já terem se desassociado dos ataques a
origem de Garvey.182 O encarceramento e deportação de Garvey passaram a ser os
principais objetivos da campanha. "Essa conversa tola também", declarou a salva
de abertura, "emana de um demagogo turbulento das Índias Ocidentais que ataca
os pobres trabalhadores e trabalhadoras das Índias Ocidentais que acreditam que
Garvey é uma espécie de Moisés." Todos os "ministros, editores e conferencistas
que têm os interesses da raça de coração" foram instados a "cingir sua coragem,
colocar nova força e prosseguir com poder e força para expulsar a ameaça do Gar-
veyismo deste país." E apenas no caso de a mensagem ainda não ter sido deixada
clara, a seguinte declaração de hostilidade intransigente apareceu: "Aqui está o
aviso de que o Messenger está dando o tiro de abertura em uma campanha para
expulsar Garvey e o Garveyismo em toda a sua crueldade sinistra do solo america-
no." 183
Por volta dessa época, Randolph recebeu pelo correio um pacote contendo
uma mão humana. A mão tinha cabelos ruivos e, portanto, era presumivelmente de
uma pessoa branca.191 Uma carta anexa repreendia Randolph por não ser capaz de
se unir com os seus e deu-lhe uma semana para se juntar à sua "associação de pro-
gresso de neguinhos". Estava assinado “KKK”. Se a mão veio da Klan ou Garvey ou
foi postada por Randolph para si mesmo, nunca foi estabelecido. Em qualquer caso,
Randolph concluiu que "a Klan veio em resgate de seu líder negro, Marcus Garvey".
Ele convenientemente omitiu do artigo que fez essas conclusões o fato de que a
mão era branca.192 Esse evento foi contrabalançado por rumores de que os ativis-
tas estavam considerando a possibilidade de assassinar Garvey. 195
Foi nessa fase que as cruzadas anti-Garvey decidiram encenar um dos epi-
sódios mais estranhos da história Afro-americana. Eles decidiram escrever e divul-
gar amplamente uma carta ao procurador-geral. Na verdade, eles estavam agindo
para conseguir abertamente o apoio do governo dos Estados Unidos para superar
seu principal rival. A respeito desse episódio, Garvey comentou: “Diz-se que existe
honra até mesmo entre os ladrões, mas é evidente que não há honra e respeito
próprio entre certos negros.”198
O caráter estrangeiro de Garvey foi mais uma vez explorado. Seus seguido-
res foram descritos como, em sua maioria, estrangeiros e não-eleitores, inferindo-
se que o governo não teria de se preocupar em perder seus votos. Para tornar a
proposta ainda mais atraente, Du Bois e Domingo foram citados como autoridades
na associação mundial da UNIA, que foi estimada em “muito menos de 20.000”. A
carta também revelou o mesmo tipo de elitismo integracionista e esnobismo que
caracterizou Du Bois. O fenômeno das massas de trabalhadores e camponeses pre-
tos organizados militantemente e sem medo da violência, se necessário, era um
espectro tão assustador para os integracionistas pretos quanto para os brancos. A
carta declarava: “A UNIA é composta principalmente do elemento mais primitivo e
ignorante dos índios ocidentais e negros americanos”, e mais da metade da carta
era dedicada a um catálogo de seus atos violentos. A constituição da UNIA foi cita-
da para mostrar que Garvey desaprovava os criminosos, exceto quando seus cri-
mes eram cometidos no interesse da organização. Esta disposição sem dúvida teria
abrangido casos como a condenação de membros da UNIA por resistirem a ataques
da polícia aos seus locais de reunião. Foi apresentado aqui, no entanto, como um
incentivo positivo ao crime.
Foi com esse conhecimento que o governo conseguiu que Garvey fos-
se indiciado em Nova York pelo uso indevido dos correios em um esquema
fraudulento. Como você sabe, este caso foi definido para julgamento em
uma data muito próxima e o Departamento tem confiança suficiente para
acreditar que os fins da justiça certamente serão satisfeitos antes que todo o
assunto seja concluído.
O governo está plenamente ciente do fato de que Garvey não repre-
senta e nunca representou o negro americano. Por muitos meses antes da
preparação desta carta conjunta, o Governo não tem estado ocioso ou es-
quecido desta fraude colossal e em todos os momentos está ansioso para
receber dos elementos substanciais de sua raça qualquer informação que o
ajude a fazer cumprir as leis da nação e a supressão de movimentos, como o
esquema de Garvey. Os detalhes de sua carta estão recebendo muita atenção
e se evidências suficientes puderem ser obtidas nas várias instâncias cita-
das, você pode ter certeza de que ações adicionais ainda serão tomadas. 205
Este rascunho foi substituído por uma nota breve e mais formal de duas fra-
ses. Mesmo esta nota, no entanto, terminava com “por favor, mantenha-nos infor-
mados, caso fatos adicionais cheguem ao seu conhecimento.”206
Não é de surpreender que o rascunho original não tenha sido enviado. Sem
dúvida, teria chegado ao Messenger e ao resto da imprensa anti-Garvey. E mesmo
no contexto do caso de Garvey, já irremediavelmente prejudicado pelos esforços de
Du Bois, os Amigos da Liberdade do Negro e outros, isso teria sido um pouco de-
mais. Em 26 de fevereiro, Owen, o suposto socialista radical, agradeceu a Crim por
sua resposta e lembrou-lhe que os oito representavam "os mais distintos e respon-
sáveis empresários, educadores e publicitários entre os negros dos Estados Uni-
dos".
A campanha “Marcus Garvey Deve Sair”, como foi observado, foi essencial-
mente uma aliança de conveniência entre integracionistas, muitos dos quais esta-
vam em desacordo entre si antes que os sucessos de Garvey os levassem a uma
unidade temporária. Depois que Garvey partiu, a base para sua unidade se foi com
ele. Assim, menos de um ano após a prisão de Garvey, o Messenger estava atacando
editorialmente a Abbott. Mesmo antes disso, eles haviam se voltado contra o ex-
procurador-geral Daugherty, que agora era, em sua opinião, "notório por suas ne-
gociações políticas desonestas e duvidosas". E em 1928 Owen e Randolph lança-
ram um ataque a outro dos oito, George Harris.226
4. Amy Jacques Garvey, ed., The Philosophy and Opinions of Marcus Garvey
(Londres: Frank Cass, 1967), II: 70.
7.Messenger (junho de 1924): 184. Garvey disse que recebia qualquer pes-
soa com um décimo sexto ou mais sangue preto, desde que trabalhasse pela unida-
de da raça - New York World, 24 de agosto de 1920.
20. Secretário adjunto do Sr. Allen Dawson, ed., New York Tribune, 17 de fe-
vereiro de 1922, e correspondência relacionada, NAACP Files, Box C-304; Walter
White para Spingarn, 18 de fevereiro de 1922, Spingarn Papers Box 2.
30. Garvey para Emmett J. Scott, em Daniel T. Williams, Eight Negro Biblio-
grafias (Nova York: Kraus Reprint Co., 1970).
32. R. N. Murray, ed., J. J. Mills, Sua Própria Conta de Sua Vida e Tempos
(Kingston: Collins and Sangster, 1969), p.110.
35. Garvey, Philosophy and Opinions, I: 41, New York World, 3 de agosto de
1921.
36. Blackman, 22 de abril de 1929; Southern Workman 57 (outubro de
1928): 425.
61. Documentos da National Civic Federation, Box 152, New York Public
Library.
81. W. E. B. Du Bois, The World and Africa (Nova York: International Pub-
lishers, 1965), p. 237; Du Bois, Dusk of Dawn, p. 278 •, Negro World, 8 de outubro
de 1921.
96. Du Bois para Presidente, U.S. Shipping Board, 27 de julho de 1922, A.D.
Lasker, Presidente, para Du Bois, 31 de julho de 1922, RG 32, 605-1-653.
116. Ibid., 27 de agosto de 1927; Garvey, Philosophy and Opinions, 11: 243.
121. Ibid.
122. Pittsburgh Courier, n.d., citado em Negro World, 17 de maio de 1924;
Hotel Tattler, n.d., reimpresso em Negro World, 24 de maio de 1924; Gary Sun, n.d.,
reimpresso em Negro World, 24 de maio de 1924.
156. Ibid.
162. Boletim, New York Urban League, Inc., Relatório Anual 1921, p.1.
163. National Urban League, Report 1920, 3 (January 1921): 14. O “Ideal da
Liga” afirma aqui: “Vamos trabalhar não como pessoas de cor nem como pessoas
brancas para o estreito benefício de qualquer grupo sozinho, mas JUNTOS como
Cidadãos americanos ... ”
168. Hubert Harrison, The Negro and the Nation (Nova York: Cosmo Advo-
cate Publishing Company, 1917), p. 3.
172. Guichard Parris e Lester Brooks, Blacks in the City-A Historyof the Na-
tional Urban League (Boston: Little, Brown and Co., 1971), p. 200; Owen e Ran-
dolph expressaram o mesmo medo - Documentos da NCF, Quadro 152.
178. Papéis NCF, Caixa 152; Messenger, setembro de 1920, pp. 83, 84.
184. Ibid (agosto de 1922) 472; The Public Journal, 29 de julho de 1922;
Garvey to Pickens, 10 de julho de 1922, Pickens to Garvey, 24 de julho de 1922,
Pickens Papers, Box 7; Pickens to Garvey, n.d., julho de 1922, NAACP fUes, Box C-
304.
210. Bruce Papers, Group D, P 3-10, Schomburg Collection, New York Public
Library.
217. Negro World, 6 de outubro de 1923. Era para ser um “Dia da Rosa”
(“Dia da Corrida” de acordo com pelo menos um relatório).
228. Negro World, 23 de maio de 1931; folheto, n.d., UNIA Central Division
(New York) Files, Box 14, F. 4.
229. Vincent, Black Power e o Movimento Garvey, p. 246. Vincent cita aqui
as seguintes cartas de A. J. Garvey Papers-Du Bois para A. J. Garvey, 8 de abril de
1944, e A. J. Garvey para Du Bois, 24 de abril de 1944.
Foi por causa de incidentes como esses que Garvey inicialmente não apenas
apoiou o projeto de lei antilinchamento de Dyer, mas também adotou uma posição
de hostilidade aberta em relação ao KKK. Ele foi citado em 1920 como ameaçando
chicotear a Klan se ela viesse para o norte,6 e vários editoriais do Negro World em
1920 e 1921 eram dirigidos contra esta organização. 7 Uma faixa no desfile da
convenção de 1921 proclamava: “O Novo Negro está pronto para o Ku Klux.” 8
A reunião durou duas horas. Durante esse tempo, cada lado traçou sua
filosofia. Clarke enfatizou que a América era um país do homem branco, que sua
organização defendia a pureza racial e negou que a Klan fosse responsável por
todos os incidentes de intolerância racial atribuídos a ela. Garvey descreveu a
filosofia da UNIA. Ele disse depois: "Eu estava falando com um homem que era
brutalmente um homem branco e estava falando com ele como um homem que era
brutalmente um Negro."9 Como resultado da discussão, Clarke expressou simpatia
pelos objetivos da UNIA , enquanto Garvey foi reforçado em sua suspeita de que a
Klan representava o governo invisível dos Estados Unidos. Ele se convenceu de que
esta organização representava o ponto de vista da maioria branca americana e
ficou impressionado com a afirmação de Clarke de que a Klan era mais forte no
Norte do que no Sul. Ambos os diretores concordaram em publicar um memorando
da reunião em seus respectivos órgãos e Garvey convidou Clarke para o Liberty
Hall para esclarecer melhor a posição da Klan. Nesse ínterim, Garvey parece ter
obtido uma garantia de Clarke de que a Klan se absteria de incomodar a UNIA,
especialmente porque a UNIA não representava uma ameaça à sua fobia em
relação a casamentos inter-raciais. Clarke até disse, de acordo com Garvey, que era
contra homens brancos estuprarem mulheres pretas. E Garvey citou com
aprovação o caso em Baton Rouge, Louisiana, onde membros da UNIA açoitaram
alguns homens brancos que encontraram dormindo com mulheres pretas. Por esta
ação os membros da UNIA foram cumprimentados por um juiz da KKK. O resultado
final de tudo isso foi que Garvey concluiu que, dali em diante, valeria mais a pena
avançar com o programa da UNIA para construir um governo forte na África que
redundaria em benefício dos pretos em toda parte, em vez de perder tempo
atacando o Klan, uma ideia que ele vinha contemplando desde 1921.10
Bilbo há muito é um dos racistas mais declarados do país. Ele uma vez
admitiu ter sido iniciado na Ku Klux Klan. Em 1926, ele declarou: “Tratemos o
negro com justiça; dê-lhe justiça; ensine-o que o homem branco é seu verdadeiro
amigo; que ele saiba e entenda de uma vez por todas que ele pertence a uma raça
inferior e que a igualdade social e política nunca será tolerada no sul.” Duas
décadas depois, ele escreveu: “Histórica e cientificamente, a inferioridade da raça
negra quando comparada à raça branca é um fato comprovado e óbvio”, embora
ele afirmasse aqui ter “sempre tratado de forma justa e simpática com o negro”.
Como senador dos Estados Unidos, ele atuou ativamente para impedir que os
negros participassem das primárias do Mississippi. Em 1947, o octogésimo
Congresso, agindo em resposta a um forte clamor dos direitos civis e grupos
religiosos, sindicatos e outras organizações, agiu para impedi-lo de ser empossado
para seu terceiro mandato. A moção foi arquivada porque ele já havia sido atingido
por uma doença fatal.18
Vários fatores o levaram a modificar sua opinião. Por uma coisa ele ficou
impressionado com Garvey, a quem considerava "o mais conspícuo [sic] de todos
os organizadores de sua raça" e "um líder negro notável e mundialmente
conhecido”.21 Garvey, disse ele, "definitivamente teve sucesso em estabelecer o fato
de que há um impulso dominante, uma afirmação divina entre as massas de negros
nos Estados Unidos por um país próprio e um governo administrado por eles.” 22
A história, tal como foi, era apenas uma desculpa na qual Dixon poderia
injetar suas idéias sobre relações raciais. Seu argumento básico era que o bom
trabalho iniciado por Booker T. Washington e continuado por Garvey corria o risco
de ser destruído por Du Bois e pelos integracionistas. Ele comparou o quase branco
Du Bois com Washington, que