Você está na página 1de 6

Haze

Personagens
Lara/Haze - ela/dela;
Bianca - ela/dela;
Lanai - ela/dela;
Don – ele/dele;
Breno - ele/dele;
Guiomar – elu/delu;

Cena 1 - Introdução
(No palco Lanai e Lara, o mais distante possível uma da outra. Lanai em pé e Lara sentada
no chão com um livro.)
LANAI (para o público) – Aquela ali sentada no chão no fim do corredor, é Lara. É muito
fácil encontrar ela assim lendo. Lê o que gosta, pula o que a enfada. Sem exagero e sem
desprezo. Narro isso porque não se estende só aos livros. Assim é que Lara vive. Sem
exagero e sem desprezo. Branda, sentada ao fim de um corredor. Parecendo alheia, mas
ciente. Observa o que é bonito, com os atentos olhos claros e, se a perguntassem o porquê,
ela responderia com uma citação de livro: "não sou criança nem idiota. Vivo só e vejo de
longe, mas vejo". Mas isso é Lara e é só Lara. Porque, me utilizando dos mesmos livros
que ela tanto lê, "tudo cansa, até a solidão". É por esse motivo que existe Haze. O outro
lado.
(Nesse momento, Lara levanta parecendo começar a se arrumar pra algo, passa
maquiagem, ou penteia os cabelos, talvez adiciona um acessório.)
LANAI (para o público) – Haze é a válvula de escape, o efeito de meia garrafa de álcool, o
drama, a fala descarada que sai de vez em quando. Poucas pessoas têm o prazer de
conhecer Lara e Haze. Quem dirá reconhecer o limite entre uma e outra. Eu poderia até
dizer que a protagonista dessa história é Haze e que, se ela não existisse, nada disso teria
ao menos acontecido. Eu poderia e teria muita gente pra confirmar. Mas não seria justo.
Porque eu tava lá e eu sei que, por incrível que possa parecer, ela é uma só... E eu já enrolei
demais, né? A história de verdade, começa numa festa. Ótima, por sinal, não é só porque
eu que dei não, viu?
(Lara sai.)

Cena 2 – Cedo
(Uma mesa com alguns copos e garrafas no palco. Don, Breno, Guiomar e Bianca vão
conversando e entrando, em direção a Lanai)
BRENO – Tá é cedo, vocês não tão entendendo. Se Lanai falou oito horas é pra chegar nove
porque ela já conta o atraso da galera.
DON – Poxa, real. Nem Haze chegou ainda.
LANAI – Mas eu já tô aqui, não tô? Ou vai dizer que a alma da festa não sou eu?
(Se abraçam e tals. Lara entra, longe deles, meio tímida.)
BIANCA – Mas foi só falar na bonita, ó. Larinha! Vem cá.
DON – Mas a senhora é gata mesmo, viu?
BRENO – É gata, mas não é A HAZE, né? É Lara ainda.
LARA – Começou...
LANAI – Como assim?
DON – Ih, nem dá trela, é besteira deles.
BRENO – Quando Haze chegar, você entende.
LANAI – Ué, gente...
BIANCA – É complexo.
LANAI – Então quando ela chega?
LARA – Pelas minhas contas... Em meia garrafa daquilo ali.
(A partir daqui, as cenas mudam rapidamente, todas acontecem no mesmo cenário e todos
os personagens estão presentes no palco, embora possam ser separados em pequenos
grupos.)

Cena 3 – Início de festa


LARA (para o público) – É... Oi, a gente não foi apresentado direito. Meu nome é Lara e eu
nunca me achei muito divertida. Não... Na real, real mesmo, eu sempre me achei
engraçada. Eu sou a pessoa que começa a andar pela casa, envolta nos próprios
pensamentos e DO NADA solta um (risadinha tosca)
O que eu não achava é que outras pessoas poderiam me achar engraçada. Quando eu
falava alguma coisa e as pessoas realmente riam, não era só a minha própria risada
ecoando na minha cabeça, eu ficava meio "ué, como assim? foi engraçado?". E pra
completar, toda vez que eu causava riso, era com algo tão natural, tipo, era só eu falando,
que eu não sabia se era o meu jeito, se tavam rindo de mim, eu nunca soube o que era.
Por exemplo, depois de uma festa de réveillon, uma amiga chega pra mim e fala "cara, tu
é muito engraçada bêbada". EU NÃO SABIA O QUE ACHAR DESSA FRASE. Daí eu fui ver
os vídeos dessa festa e eu acho que entendi.
Lara e Breno
BRENO – Mas diga aí, qual o itinerário de hoje?
LARA – Hoje eu tô de boa. Se tiver com coragem ainda, depois daqui é praia. (bebe.)
BRENO – Eu DUVIDO que tu vá pra praia depois daqui. Tu vai é dormir como sempre, pra
dar tempo da ressaca moral tomar conta do teu corpo logo de manhã.
LARA – E o que te garante a existência dessa ressaca moral?
BRENO – O copo na tua mão. (riem.)
LARA (para o público) – Acontece que toda a tosquisse do meu ser normalmente fica presa
naqueles meus pensamentos que eu sei que são toscos, acho graça, mas não externalizo.
Só que quando eu bebo o suficiente pra perder esse autocontrole, ou ingiro muito açúcar,
ou, por qualquer outro motivo, me sinto confortável o suficiente pra perder esse filtro,
surge praticamente uma outra pessoa. Meio que aquele alter ego mais clichê de pessoa
bêbada possível. Que fala tudo o que pensa, se anima igual criança com umas coisas que
gosta, xinga as que não gosta igual uma velha, manda mensagem pra quem não devia...
(para, como se lembrando de algo, tira o telefone do bolso e coloca sobre a mesa)

Bianca, Don, Guiomar e Lanai


LANAI – Não, mas explique aí esse negócio de Lara e Haze.
GUIOMAR – Ih, vou até me sentar.
DON – Ó, presta atenção. Larinha tu conhece da sala de aula. Quietinha, só ouve e ri.
Ninguém sabe o que passa na cabeça daquela criatura.
LANAI – Aham.
DON – Pois pronto. Haze é ela bêbada.
BIANCA – Não necessariamente bêbada, diga-se de passagem.
DON – Provavelmente bêbada. Ou qualquer efeito semelhante.
LANAI – É a versão que fala, basicamente?
GUIOMAR – Ai, gente, nem bebemo nada ainda e vocês já tão nessas brisas, eu hein... Cadê
a música pelo menos, peraí. (aumenta a música)
BIANCA – Que fala e age.
Lara
LARA (para o público) – Não, não. A Haze é irritante, a Haze não sabe o limite da ação, ela
tem aquela sinceridade infantil, sabe? Quando a criança fala e a galera ao redor ri, você
olha pros responsáveis daquela criança e eles tão derretendo de vergonha? Mas eu acabei
percebendo que ela é tudo que eu queria ser socialmente, mas não consigo estando 100%
sóbria. É meu rolemodel de interação social e, mais que tudo, a Haze é a Lara depois de
meia garrafa de álcool, de café... E, olha só (mostra garrafa pela metade) é ela que vocês
vão conhecer agora.

Cena 4 – Interlúdio
(Várias coisas podem estar acontecendo no palco neste momento. Ao centro Lanai e Lara
começam a dançar cada vez mais próximas, como que provocando uma à outra. Não há
fala. Elas seguem se aproximando até um beijo acontecer. Don vem à frente logo em
seguida.)

DON – Eeeita. Deixa que eu narro


Mas também vou narrar do meu jeito
E Lanai só queria chegar nisso, viu?
Se preocupem não que eu conto direito

E a história não é bem ESSA (gesticula na direção das garotas)


Faz parte, mas não é

Eu não posso soltar tudo que eu sei


Mas tenho que terminar essa cena
De um jeito que todo mundo entenda
E não pareça que eu inventei

Escolhi rimar, mas nem precisava


Que de recurso eu tenho estoque
Mas não vou gastar saliva
Vou é puxar um flashback
(Don estala os dedos, ou bate palmas, ou algo semelhante. A música, que tocava até agora,
para. Todos saem de cena, exceto Lara e Bianca)

Cena 5 – Flashback
(Lara vai até o telefone que havia deixado na mesa, liga para alguém e deita no chão. Bianca
atende, distante da outra)
LARA – Desculpa eu te ligar assim. Não, não tô bêbada, eu juro. É só muito açúcar e tá
tarde. Tô com sono, tô sozinha no escuro... É que eu preciso de respostas. E você é minha
luz.
BIANCA – Nossa, que brega.
LARA – É (rindo), mas me diz: O que fazer com um amor a quem não se quer amar? Apelei
pra o tarô, mas as cartas se recusam a explicar.
BIANCA – Você deveria parar.
LARA – (falando mais rápido) Me diz o que fazer, se eu só penso em você... Se essa hora só
me vem que eu precisaria ficar na ponta dos pés se eu quisesse te beijar.
BIANCA – Haze...
LARA – Se eu quisesse não, eu quero (rindo)
BIANCA – Você precisa é dormir.
LARA – Só me deixa terminar. Me deixa ser sua. Não precisa ser namorada. Eu só quero
ser sua.

(Bianca desliga o telefone com um suspiro. Se havia algum foco em Haze, não há mais. Breno
entra)

BRENO – Cheguei, criatura. Tais bem?


BIANCA – (concordando) Hoje me dei um presente pra ficar bem. Lembra daquele livro
que eu gostei da capa? Abri a conta e vi que dava. Comprei. Chega semana que vem.
BRENO – Mas a Haze disse que ia te dar esse de aniversário.
BIANCA – Eu sei. (volta-se para o público) Eu gosto das coisas com intensidade. Tudo vira
poema muito rápido. Deve ser por isso que não suporto a Haze. Ela é tão intensa quanto
eu. A Lara não. Amo a Lara, mas não posso gostar da Haze. O mundo não suportaria nós
duas.

Cena 7 –
(A música e as outras personagens vão retornando gradativamente. Bianca observa, com
aparente raiva, Lanai e Lara retornando juntas)

Bianca começa a sentir ciúmes

Cena 8 –
Discussão tem de se desenrolar aqui

Cena 9 – After
BIANCA – Por que você nunca me disse nada disso? Por que você nunca fala direito o que
você sente sóbria?
LARA – Porque não adianta eu falar. Parece que toda vez que eu abro a boca, só te afasto
mais. Quer dizer, você se afasta, com esse muro que você mesma construiu e só você
enxerga.
BIANCA – E você não enxerga o muro?
LARA - Às vezes até acho que tô enxergando, aí esbarro nele. Igual gente broca dando de
cara com porta de vidro.

Cena 10 – Limpeza

Você também pode gostar