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MARJORY LINCOLN

DEIXO VOCÊ ESCOLHER


SÉRIE OS COVERICKS

LIVRO DOIS

Todos os direitos reservados.


Obra devidamente registrada na Biblioteca Nacional.

NACIONAIS-ACHERON
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AUTORAMARJORYLINCOLN@GMAIL.COM
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“Para mim e para todos os amigos e familiares pelo apoio, com amor e
intensa satisfação. Até para os amigos de outra vida.”

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PRÓLOGO

São Paulo.
Quatorze anos antes.

— O que faz aí? Subiu do escritório parecendo bravo, o que seu avô te
disse? — Ellen entra no quarto e me pega sentado de cabeça baixa.
—Ele me disse algumas verdades… só isso. — eu falo com meu coração
doendo e quase não suporto a dor, mas eu não posso chorar aqui, não sou um
fraco! Pelo menos não na frente das pessoas, não na frente dela!
—Que verdades, Tay? — ela se senta ao meu lado e tira uma mecha de
cabelo do meu olho.
— Ellen, somos muito novos para namorar, preciso me concentrar na
escola e, com você aqui, não vou fazer isso… — eu começo falando e ela se
afasta sem acreditar no que ouviu.
— Estou te atrapalhando??? Eu te ajudo com as matérias, eu te ajudo!
Não quero atrapalhar você, vim para ficar com você, para te ajudar! — ela diz
com a voz entristecida e minha garganta ganha um nó de presente.
— Não preciso de ajuda, preciso ficar sozinho. Não entende? Não
podemos mais ficar juntos! — eu digo e me levanto para fugir de seu toque
carinhoso e acolhedor. Minha dor estava saindo do coração e seguindo para
todas as partes do meu corpo, me deixando fraco.
— Uai, por que tá fazendo isso comigo? Eu vim de longe para te ver,
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você disse que gostava de mim, quer que eu vá embora? O que seu avô te
disse? — ela chega perto de mim, me tocando e me puxando para perto. Faz
com que eu olhe nos olhos dela… Ellen já chorava e meus olhos, ao ver
aquela cena, ficaram quentes demais.
— Ele não me disse nada, eu… eu não gosto de você, não gosto de
você!!! Eu menti! Você é uma roceira, não é garota para me namorar! Eu não
gosto, nunca gostei de você, só queria passar o tempo, só queria me divertir,
sou novo, garotos novos fazem essas coisas… — eu digo sem olhar em seus
olhos e me viro para que ela não veja a lágrima que fugiu denunciando a
mentira.
— Garotos novos, não. Guri sem vergonha faz isso! E no hotel? E o que a
gente fez? E as coisas que você me falou… tudo aquilo foi mentira? As
mensagens pelo celular? A florzinha, nosso nome na areia que você mesmo
escreveu, as fotos, as coisas que me disse? Era tudo mentira??? — Ellen
começa soluçar de tanto chorar e eu não aguento mais aquilo!
— ERA!!! ERA TUDO MENTIRA!!! Falei tudo aquilo só pra você… só
para poder pegar você!!! — eu grito em sua direção ainda sem olhar em seus
olhos e ela olha ao redor procurando o que dizer.
Naquele momento meu coração se parte ao meio. Eu tinha certeza que
nunca mais esqueceria aquilo, nem quando virasse um adulto. Porque tudo o
que eu queria era que ela fosse embora e, em contrapartida, pedia a Deus que
ela entendesse que era tudo mentira, que era por causa de meu avô que eu
estava fazendo tudo aquilo, mas Ellen não notou isso. Ela começou a colocar
as coisas na mala e eu me desesperei.
— Está tarde, estou terminando com você, não te expulsando da minha
casa! Você não precisa ir embora agora. — eu digo andando de um lado para
o outro, procurando uma maneira de amenizar aquilo.
Não queria que ela fosse embora àquela hora, queria acabar com o que a
gente tinha! Ela me forçou a magoá-la… se não fosse assim, ela nunca
aceitaria aquilo e eu nunca conseguiria fazer o que meu avô mandou.
— Não fala comigo, nunca mais fala comigo, nunca mais quero ver você
na minha frente! — Ellen diz chorando, termina de arrumar as coisas e desce
correndo com a mala pesada. Meu pai entra no quarto em seguida e eu
desabo.
Momentos depois, assim que viro as costas para ela na sala, sinto que
meu mundo acabava de ruir. Tudo que restou foram as fotos no telefone, as
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mensagens de texto no celular, o anel que trocamos na viagem e o perfume de


lavanda que ficou em minha camiseta preta que usei na noite que dormimos
juntos e nos beijamos pela primeira vez.

Pub do Raul, Parintins, Amazonas.


Dias atuais. Sábado a noite.

— Oi, gato! Você vem sempre aqui? — Rosa pergunta isso toda vez que
venho aqui.
— Venho, Rosa! Venho sempre aqui! — eu respondo rindo e ela enche
meu copo de whisky.
Era minha folga e, em “todas” as minhas folgas, eu vinha para o centro da
cidade esquecer um pouco da FAB. Era isso ou enlouquecer.
— Faz tempo que não aparece, o que está rolando, tenente? — ela
pergunta sorrindo e mexendo nos cabelos escuros.
Eu me lembro de quantas vezes Rosa já deu em cima de mim até que
desistiu. Ela tem um estilo muito “gótica sexy” e eu não curto, mas por baixo
daquela tonelada de maquiagem forte, sei que existe uma mulher linda.
— Nada. Ando muito ocupado… mas agora decidi que vou tirar um
tempo a mais para mim, eu sei que mereço, trabalho demais… só sei lidar
com aeronaves, quase não sei o que é curtir uma mulher! — eu digo e ela
sorri.
— Se quiser ajuda, me chama! — ela diz e pisca, eu sorrio por educação e
me viro para olhar o pub que, naquela noite de sábado, estava movimentado
demais.
Eu vinha só para beber e relaxar, esquecer algumas coisas, pensar um
pouco, enfim, realmente distrair minha cabeça.
— Sabia que você estava aqui, brother! — Pedro chega de repente e me
abraça apertado.
Porra, que mania chata de abraçar!
— O que está fazendo aqui? — eu pergunto e ele pede uma bebida
chamando a Rosa de “delícia”.
— Fala, boi caprichoso!!! — ele de repente grita como os locutores da
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famosa festa folclórica, já demonstrando ter bebido em outro lugar. — Vim


curtir essa cidade linda assim como você, muita amazonense gostosa, beber
uma, ou duas, já que você está aqui, no caso três… e não vim sozinho.
Trouxe sua co-polioto gostosa! — ele diz e eu reviro os olhos.
— Trouxe a Laura com você!? — eu questiono e ele sorri tomando um
gole — que posso dizer grande demais — de uma bebida cheia de decoração
feminina.
— Trouxe, nunca tinha visto ela sem farda, man… muito gata, eu achei
que ela era um homem! — ele diz e não me canso de fingir que não achei
graça.
— Eu vim porque queria paz, você sabe disso, não é!?
— Eu sei, Coverick. Já, já me mando com uma gata e tu não vai nem
notar que estive aqui…
— Tá, sei! — eu digo e ele faz ‘não’ com a cabeça.
É realmente impossível Pedro sair daqui com uma mulher!
— O que pediram para mim? — Laura chega com seus cabelos soltos e
um vestido curto. É uma morena linda, estressada e chata às vezes, mas linda.
— Nossa, temos aqui um homem com vestido! — eu resmungo e a puxo
para um abraço.
Ela permanece séria como sempre e finge que não ouviu minha
provocação. Laura tinha medo de mim e eu sabia o porquê.
— Está muito gostosa, tenente! Parabéns. — eu digo, beijo e mordo de
leve seu pescoço perfumado. Ela se afasta, me mostrando o dedo do meio e
quebrando qualquer protocolo militar que existe entre a gente, mas assim que
senta na bancada sorri e pisca para mim.
— Eu SOU gostosa e não ESTOU gostosa! E não sou para o seu bico,
Coverick, seu imbecil! — Laura quase grita para mim.
Pedro ri e ela pede alguma coisa para Rosa. Volto a olhar ao redor e vejo
algumas garotas dançando na pista de dança. Parecem universitárias, são
jovens, lindas e ‘pequenos pedaços de mau caminho’. Se tiverem uns 19 anos
é muito… para mim, quanto mais nova melhor, meu limite é 18.
— Vem, tenente, vamos dançar… — Laura levanta e me convida.
— Não, obrigado, linda! — eu digo, mas Pedro se adianta.
— Vamos, gata, que eu sei dançar melhor que nosso boi aqui, vou dar
uma canseira em você! — Laura olha desconfiada para ele, mas logo aceita
sorrindo.
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Ela sai na frente e ele cochicha no meu ouvido antes de ir até a pista.
— Hoje eu pego tua tenente, Coverick! — ele pisca e sorri.
— Vai na fé, toda sua! — ele ri e vai atrás dela.
Fico olhando para os dois e me divirto. Pedro não se garante tanto, mas
fazia muito tempo que eu sabia que Laura gostava dele, só mesmo ele se
recusava a notar e nunca realmente chegava nela. Dois idiotas.
Ao mesmo tempo em que eu me via fazendo algo que não fazia há muito
tempo, como relaxar e me divertir, eu ficava me perguntando ‘que diabos eu
estava fazendo aqui’? Eu devia estar dormindo ou sossegado no alojamento
da base, mas não… estava na farra com os amigos ao invés de ser o tenente
responsável.
Eu, Tay, era uma farsa.
Antes de me virar e sumir dali vejo uma das universitárias morenas me
olhando. Só começo a ter certeza de que a pirralha me paquerava quando, na
terceira vez em que eu a olhei, ela também correspondeu. Saco.
— Quer dançar? — de repente ela estava bem na minha frente, assim que
eu cortei a troca de olhares e me distraí.
— Depende. Quantos anos tem? — eu pergunto ela sorri.
— Dezoito. — eu gosto do que escuto.
— Não sei dançar.
— Vem que eu te ensino. — ela diz e me oferece a mão.
— Não, eu… realmente tenho dois pés esquerdos, não vai rolar. — eu
digo e ela já se preparava para dar meia volta sorrindo, mas ainda sim
entristecida. — Mas… — eu digo alto e ela se vira achando graça. — Eu sei
fazer algo melhor do que dançar, se quiser que eu te mostre! — eu falo e era a
minha vez de estender a mão para ela.
Na mesma hora ela pega e eu saio dali sob risos e zombarias dos meus
dois companheiros de trabalho. Laura ria e Pedro fazia gestos obscenos,
imitando uma transa muito louca, que era algo parecido com o que eu teria
daqui a alguns minutos com a garota que me paquerava. Sim, eu iria comer a
ninfeta até o domingo chegar, porque eu podia, queria e não tinha nada
melhor programado para o final de semana.

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BAMN. Base Aérea de Manaus, Floresta Amazônica. Base 5° dos Oficiais


Aviadores das Araras. Fiscalização da Mata Fechada no Norte.

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01 de maio de 2016
Dormi como um anjo, como há dias não acontecia. Eu, provavelmente
muito em breve, teria o curso do novo turboélice C—105, também tinha
outros caças gringos para cursar, mas estava muito inseguro e estressado por
estar próximo do dia em que eu voltaria para ver minha família.
Eu precisava estar de pé às 07:00hrs para cobrir minha área pilotando e
acordei sem dificuldade nenhuma graças ao toque alto do celular, era meu
pai. Olhei no visor e optei por não atender, agora não era uma boa hora para
ele me cobrar uma visita. Primeiro eu iria me levantar porque já estava
atrasado, iria tomar café, me vestir e depois eu retornava. Faço tudo isso com
pressa, mas chego na hora como sempre.
— Fala, brother, também foi chamado? Saiu a lista lá na ADM. Fala
logo… diz que sim! Vamos arrebentar Minas Gerais!
Pedro é cabo e meu amigo, — pelo menos era o militar que não era meu
inimigo ali. — eu tinha várias inimizades só por causa de meu sobrenome.
Era mais uma espécie de implicância, mas já fui muito prejudicado
simplesmente por ser o filho de quem eu era.
Resumidamente, Pedro era o cara que tocava o foda-se para mim, para
minha patente, para o que eu tinha, vestia, etc… e se ele estivesse com a
razão, me mandava tomar no cu sem perder a amizade e era por isso que eu o
estimava muito. Laura também o estimava muito, acho que no caso dela,
muito mesmo.
— Como assim ‘também’? Vai me dizer que você foi? — eu pergunto
zombando dele e ele me oferece os instrumentos que eu precisava para me
vestir e pilotar.
— Não para pilotar, não é, ‘parça’!? Mas vou oferecer cafés na sala do
simulador, já é uma grande coisa! — ele diz e acho engraçado, mas
obviamente não é o suficiente para me fazer sorrir.
— Sim, eu fui, confirmei depois do café. Mas pelo jeito você vai uma
semana depois de mim! De qualquer forma, minha casa é tua! — apenas
digo.
— ‘Demorô’, boi! É ‘nóis’! — ele resmunga meio para baixo e eu reviro
os olhos com sua falta de disciplina.
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— Mas e aí? Pegou aquele dia ou não? — eu questiono jogando a cabeça


em direção à Laura, que também organizava tudo para pilotar, e ele me
entrega uma das correspondências que frequentemente chegavam.
— Peguei porra nenhuma, porra de mulher complicada! — ele diz e eu,
enfim, consigo rir disso.
Subo no jato com Laura e inicio o processo de voo. Sobrevoo toda minha
rota, como todos os dias e não encontro focos de incêndio ou madeireiras
ilegais. Não há nenhuma denúncia de desaparecimento no dia, nada suspeito,
enfim, tudo em ordem, graças a Deus.
Mais tarde, no fim do meu expediente, sigo para minha base no norte da
floresta e, quando pouso a aeronave e piso na terra amarronzada, meu pai liga
novamente.
— Oi, seu Max! — atendo.
— Estamos regredindo como pai e filho.
— Desculpa, pai, o que deseja?
— Desejo falar com meu filho, uma tarefa quase impossível!
— Ok, o que foi? Tudo bem aí?
— Jon me disse que viria para casa logo, vai cursar o C—105 comigo.
— Vou, sim. — eu digo.
— Vai gostar, ele é um monstro, maior que o Hércules, até!
— Já pilotou ele?
— Já.
— Como é?
— É turboélice, filho, tem sessenta por cento do sistema do Hércules,
sustenta setenta e um combatentes, também cuida da logística… é um bicho
de carga que você já consegue dar conta!
— Tudo bem. Só soube agora que você foi transferido de Pirassununga
para Barbacena, Lulu disse que vocês passarão um tempo aí… sabe qual o
dia exato do início dos exames, pai?
— Bom, creio eu, que semana que vem! É verdade, chegou a hora da
gente cuidar um pouco dos seus avós… como você está?
— Estressado, não quero voltar para Barbacena.
— Eu entendo você, mas sua mãe está triste, cada dia mais triste e seu
avô está muito doente, Tay, você precisa vê-lo! — ele diz.
— Não suporto, pai, não aguento ele! Sabe como ele fica, como ele me
tratava todas as vezes que eu ia para casa!
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— Ele está morrendo, filho! Seu avô está deixando a gente!!!


Fico em silêncio.
— Eu não sabia, pai, o que ele tem?
— Se me atendesse de vez em quando e tivesse mais noção de tempo,
saberia que ele está velho, ele e a vovó estão cansados, filho!
— Desculpa, pai, eu entendo. É só que é muito difícil voltar para casa,
depois ter que partir novamente… é uma tortura!
— Eu entendo, ok? Eu e seu avô entendemos isso melhor do que
ninguém, mas já te falei: é passageiro, esse sentimento ruim passa com o
tempo, de verdade. E a gente aqui está morrendo de saudades de você,
principalmente sua mãe, seus avós…
— Está bem. Preciso ir, pai, mais tarde ligo para eles, ligo para mamãe!
— Ela está te ouvindo pelo viva-voz! — ele fala.
— Mãe, não fica brava comigo, eu amo vocês!
— Eu também te amo, bebê da mãe! Estou morrendo de saudades, vem
logo para casa! — ouço minha mãe praticamente gritar.
— Vai lá, te vejo em breve. Sua família não vê a hora de você chegar! Eu
te amo, filho! — meu pai se despede.
— Também te amo, pai! Até já! — eu digo, desligo e suspiro.
Só Deus sabia o quanto era difícil ficar longe deles enquanto, ao mesmo
tempo, era difícil ficar tão próximo.
Sigo meu caminho na trilha aberta e bem padronizada, indo para meu
alojamento. Tudo o que eu queria era dormir mais um pouco, pois ainda não
tinha me recuperado do último final de semana.
Laura caminha comigo, mas permanece silenciosa e também demonstra
sonolência. Finjo que não notei sua cara péssima e não falo nada. Laura é
extremamente estressada e parecia um homem quando estava na TPM,
ninguém mexia com ela. Ela chegou e já aprendeu a se defender, assim como
eu, na base de muita pancada, e, no caso dela, muito abuso simplesmente por
ser mulher, bonita e piloto. Por isso, ganhou o respeito de todos, inclusive o
meu, mas éramos colegas. Então às vezes, só às vezes, eu ‘abusava’ de sua
paciência.
Próximo a nós sinto alguém nos observando, mas, apesar de atento, eu
ignoro. Eu estava com sono, então meus instintos podiam me enganar. Um
galho se quebra de repente e então Laura e eu entramos em estado de alerta.
Amazonenses revoltados, onças e cobras peçonhentas eram ameaças
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constantes na base.
— Ah, é sua comida… — Laura resmunga, guarda sua arma de volta no cós
da calça e continua andando.
Ao lado dela, na beira da mata fechada, Dena, uma garota que eu usava
como distração na base, me olhava escondida por trás de uma árvore grande e
velha. Ali era sua casa, ela era uma aldeã amazonense que morava por perto
em uma aldeia dentro da mata fechada, uma das muitas para qual a minha
base prestava toda a assistência de logística ligando a mata à cidade grande.
Eu me aproximo, ela me mede com sede e segue para dentro da mata. Eu
penso em seguí-la, mas reflito melhor e volto para a estrada, seguindo direto
para meu alojamento… algumas horas de sexo com aquela garota — e eu sei
que era isso o que ela queria ali — e eu logo morreria de fraqueza. Antes de
sexo eu necessitava, urgentemente, dormir e descansar.

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1
A ORDEM NATURAL DAS COISAS

Escritório de ADM, Base 05.


04h05. Manaus.

—Posso ver o relatório? Onde você vai fazer o curso? — Laura me


questiona na administração.
— Está aqui. Farei em Barbacena, minha família toda está lá! — digo e
ela afirma me devolvendo o papel.
—Quem vai levar o Hércules, Mounsher? — ela pergunta alto para o
sargento Vitor, que trabalhava em seu computador totalmente imerso,
enquanto colocava café expresso no pequeno copo de isopor.
—Sei lá, tenente, os senhores que decidam…
— O que está no documento dela? — Laura pergunta referindo-se à ‘ave’
e me oferece um café.
— “… Para transporte de curso O Lockheed C-130, vulgo Hércules: Tem
a autorização de comando às mãos com total responsabilidade militar de
segurança e capacitação comprovada por meio de patente: Segundo tenente
Coverick Segundo tenente Nogueira”. Resumindo: Sei lá, tenente, os
senhores que decidam. — Mounsher recita como um robô parte do
documento em que nós dois estávamos autorizados a pilotar e Laura ri com
sua ironia.
— Você pode levá-la, Laura. — eu digo e ela concorda.
— Bom, está vendo como foi fácil? Podem assinar o documento de
identificação dela e bom... o resto vocês já sabem. — ele se levanta da mesa,
nos entrega uma pilha de documentos já bastante comum, e volta para seu
computador. Fizemos tudo o que precisava, assinamos tudo e saímos da
administração.
— Está segura para pilotar? — pergunto no corredor e ela me olha de
cara feia.
Como se Laura pudesse ficar feia…
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— Temos as mesmas horas de voo!


— Isso não significa nada! — digo e ela bufa.
— Estou segura, tenente, me sinto segura. Você e meus oitenta fuzileiros
chegarão em Minas com vida. — ela diz, mas ainda assim parece insegura.
— Matar todas as araras talvez não, mas a mim com essa TPM absurda,
pelo amor de Deus! Está quase. Tomou seu remedinho, não é!? Não vou ficar
preso sete horas contigo, se você estiver com esse humor… — eu falo e ela
me olha com nojo.
— Cale a boca, Coverick, seu imbecil!
— Aonde fará o curso? — eu rio e questiono.
— Pirassununga.
— Se quiser passar a semana livre em Minas, me dá um toque no
telefone. Vamos conhecer os bares de Minas Gerais, eu mesmo não
conheço...
— Não, obrigada. — ela diz sem demora.
— Que droga, vou ter que suportar o empata do Pedro sozinho… — falo
e ergo uma sobrancelha ainda sem olhar para ela. Mesmo assim pude sentir
seu olhar em mim.
Eu me sentia a vontade com os dois e então convidei. Pelo menos teria
para aonde correr quando minha família surtasse ao descobrir que não havia
sobrado nada de mim mesmo, nada do que fui nos últimos anos.
— Preciso ir ali na administração… seu ridículo!
E lá vai ela mudar o local do curso na última hora. Mulheres são todas
iguais!
Laura volta minutos depois com um meio sorriso. Ao encará-la
descaradamente, seu sorriso desaparece e, ao entrar no Hércules, ela diz: —
Calado!
Como se eu fosse falar alguma coisa… não. Não pretendia falar nada.
Viajamos até o hangar da Escola de Cadetes em Barbacena. Aterrissamos
às 12:00hrs em ponto. Laura parecia nervosa, mas não cometeu um só deslize
durante todo o percurso. Foram sete horas de voo, apenas duas em modo
piloto automático. Ela estava de parabéns, mas eu nunca diria isso.
— Caraca! — ela exclama ao pousar, abaixa a cabeça e parece fazer uma
prece silenciosa.
Laura fica assim por um momento e eu respeito. Olho para ela e a vejo
respirar fundo. Ela toca o painel da Ave — é assim que chamamos o Hércules
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na base de Manaus — e parece fazer carinho nela. Todos os pilotos têm uma
maneira diferente de lidar com os aviões que pilotam. Eu, por exemplo,
tratava o meu Carcará com respeito, primeiro ela, no tempo dela e depois eu.
Já Laura falava com a ave.
— Muito bem, Havii, muito bem! Chegamos. — ela diz e tira suas mãos
do painel. Começa a desligar os sensores no teto da aeronave e depois me
olha sem jeito.
— Você tem medo de voar! — eu exclamo baixo e ela não me olha nos
olhos. — Como burlou o teste de aptidão que durou quase um ano, Laura? —
eu questiono e ela retira seu próprio cinto.
— Faço de meus medos, meus desafios. Tenho um dom, Coverick. Passei
pelo teste mais punk de aptidão do Brasil, passo pelo teste do polígrafo da
polícia federal brincando e sempre consigo tudo o que eu quero. — ela diz e
fico com medo.
Laura espera todos desembarcarem e, quando enfim chega minha vez, ela
espera que eu desça do Hércules como o protocolo manda.
— Ai, que saudade!!! — meu pai me abraça ainda na recepção da pista.
— Como vai, capitão? — me sinto feliz em vê-lo.
— Vou bem, tenente, e você? Será que meu filho veio junto? — Max me
olha e sorri para mim.
— Para. Não vou te chamar de pai aqui dentro. Já tem alguns meses que
‘esqueceram’ que sou seu filho e só por causa disso tenho paz. — eu digo e
ele me olha com aquela cara que eu sabia que significava ‘vamos conversar
depois’. Vejo Laura descer do Hércules e ela se junta a nós.
— Por que não o trouxe dessa vez? — ele questiona.
— Por nada... eu vi que ela queria trazer, queria se provar e deixei.
Capitão, essa é segundo tenente Nogueira, minha parceira, co-piloto na base.
— mudo de assunto quando Laura nos alcança.
— Capitão. — Laura presta continência ao meu pai e ele olha para ela.
— À vontade, tenente. — os dois se cumprimentam informalmente e
Laura enfim sorri.
— Capitão Coverick, é uma honra conhecê-lo! Acompanhei sua atuação e
seus grandes feitos na pacificação da Síria e Haiti há alguns anos. É
realmente um prazer conhecê-lo! — Laura diz com admiração e eu olho para
a cara dela.
— Por que nunca me disse que era do fã-clube? — falo, mas Laura nem
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ao menos me olha, continua encarando meu pai com os olhos marejados.


— Você não suporta que se aproximem de você por causa do
sobrenome... nem para saber mais sobre ele, nem que fale dele. Como eu te
diria isso!?
— Você me odeia, filho? — meu pai questiona rindo.
— Não, pai... é que eu nunca sei quando as pessoas querem se aproximar
de mim por minha causa ou por causa do senhor. Ou me matar porque fiz
algo errado ou porque o senhor fez… — eu digo olhando para ela e ela sorri
zombando.
— Você é chato, Coverick. Ninguém quer você. — ela diz e os dois riem.
— Eu mereço… — eu falo e meu pai me abraça.
— Há quanto tempo estão juntos? — meu pai pergunta enquanto
caminhamos para o saguão.
— Com todo respeito, senhor, mas o senhor pirou? — Laura pira e meu
pai ri.
— Laura será nossa hóspede, na casa do vilarejo, se não tiver problemas.
— eu aviso.
— Sem problemas. — ele bate no meu ombro enquanto anda.
— Só porque eu disse que não queria festa, aproveitaram para ir até o
limite e ninguém veio? — questiono assim que não vejo ninguém da minha
família no saguão do hangar.
— Como eu disse... — Laura resmunga e eu ignoro.
— Tenente Nogueira, a senhorita vai assinar os documentos da ave, te
esperamos lá fora. — meu pai diz.
— Vou sim, senhor, está bem. — ela diz e se encaminha para a
administração.
— Sabe o nome do meu Hércules!? — pergunto curioso já sabendo a
resposta.
— Sei o nome, codinome e termos carinhosos de todas as aeronaves da
FAB. — ele diz sério e parece preocupado.
— O que foi? O senhor está bem? — eu pergunto e ele sorri fraco.
— É seu avô... cada vez piora mais. Tenho esperança de que sua volta
melhore tudo. E também tem a Olhos Brilhantes, está parindo. Então eu vim
correndo. — ele diz e me sinto mal.
— Nunca devia ter ficado tanto tempo fora, não é!? — eu falo mais para
mim mesmo do que para ele.
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— Se lamentar agora, não adianta. Você está aqui neste momento e é isso
o que importa. Ele ficará muito feliz.
Esperamos no carro até Laura voltar, dez minutos depois ela sai do
hangar e entra no carro. Fizemos o percurso que eu já conhecia até a chácara
e consigo matar minha saudade.
— Lulu está aqui? — eu questiono no carro.
— Não, está viajando em intercâmbio com o colégio. — ele diz e me
sinto mais triste ainda.
Paramos em frente ao lago logo em seguida. O lugar todo continuava o
mesmo, a mesma beleza, o mesmo charme... eu havia me esquecido do tanto
que eu amava aquele lugar.
— Que lugar lindo! — Laura diz sorrindo.
Seus cabelos escuros começavam a se soltar do co que devido ao vento.
Ela ajeitava a sua boina e olhava tudo. O dia, que começava a raiar, ajudava a
deixar tudo ainda mais lindo e Laura notava isso.
— Comprei para o meu bebê quando ele tinha uns treze anos, não me
lembro ao certo. Tinha acabado de voltar da Síria e queria agradá-lo! — meu
pai comenta com ela.
— Belo presente, senhor!
— Bom, na época ele amou... — ele diz sorrindo.
— Ainda amo, pai! — eu digo chateado e começo a andar com os dois na
minha cola.
Subo as escadas e abro a grande porta na minha frente e, para o meu
espanto, minha família grita alto: 'SURPRESA!!!'. Minha avó, meu vô na
cadeira de rodas, minha mãe, Lulu, Nina, Rafa e os gêmeos. Todos estavam
lá no meio das bexigas e bandeirinhas.
— Meu amor... — minha mãe corre para me abraçar, Lulu e tia Nina vêm
logo em seguida.
Depois do abraço triplo, eu me adianto para me ajoelhar na frente do meu
avô. Ele parecia abatido e fraco demais, velho demais, mas tinha em seu
semblante um sorriso que devia ser grande.
— Oi, vô! — eu digo, beijo minha vó e volto para dar atenção a ele. —
Como o senhor está? — ele me olha e chora, eu o abraço e não consigo
segurar o choro com aquilo. Há muito tempo eu não chorava por qualquer
motivo, posso dizer que não chorava há anos.
— Está tudo bem, vovô, eu estou aqui! Desculpe pela demora! Eu estava
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trabalhando demais...
— Me... perdoa! Me perdoa... — ele resmungava fraco com sua voz que
quase não era mais audível e eu faço 'shhh', como quando tentamos silenciar
uma criança.
— Eu te amo, vô!!! Eu te amo muito! Não tem que me pedir perdão por
nada! Eu só queria te orgulhar, vivi minha vida para te orgulhar, era o
mínimo que eu podia fazer, porque eu te amo! Entendeu? Não se desculpe!
— eu me negava a voltar para casa para não ser cobrado por ele, mas não vi
como o tempo passou, não vi que ele envelheceu, que todos aqueles discursos
que eu dizia serem um 'pé no saco' eram só a forma dele de me amar e me
proteger. Um jeito meio torto, mas era o jeito dele. E eu me recusei a olhar
com olhos de ternura para seus cuidados, por pura bobagem e egoísmo.
Engraçado como o tempo passa e só assim vemos as bobagens que
fazemos por nada. Agora meu avô estava indo embora e eu me sentia um
lixo. Esperei até que ele se acalmasse e me levantei do chão, meu pai estava
me esperando para um abraço e não pude evitar chorar igual uma criança
enquanto todos nos assistiam.
— Pai, o que eu fiz? — eu pergunto baixo e acredito que ninguém tenha
ouvido.
— Está tudo bem, Tay, tudo bem... — ele diz baixo também e aperta seu
abraço ainda mais.
— Eu tentei ser o melhor e fui o pior neto do mundo, eu fui o pior neto
que ele podia ter. — eu resmungo chorando e sinto meu pai fazer 'não' com a
cabeça.
Lulu, que também chorava, se aproxima fazendo com que nos separemos.
Ao sair do abraço de meu pai e eu o encaro com vergonha.
— Chega de choro, pelo amor de Deus. Vem cá me abraçar direito, meu
maninho, eu senti tanta saudade! — ela diz sorrindo ao me abraçar e eu me
lembro de algo importante que, no calor do momento, acabei esquecendo.
— Ah, gente... desculpa, Laura! Essa é Laura, minha parceira e co-piloto.
Não somos namorados, nem 'ficantes', nem nada... antes que alguém solte
uma piadinha sem graça. Na verdade, ela só veio por causa do curso e ofereci
uma das casas do vilarejo para ela se hospedar. Laura, essa é minha irmã
Luiza, minha mãe Hella, meus avós, dona Jô e seu Luiz, ele é major
aposentado, minha tia Marina que mais parece irmã de tão gata e jovem, o
marido dela, Rafa e os gêmeos. — chego perto e me ajoelho porque ainda
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não havia falado com eles — Gustavo e Gabi, e bom... acho que acabou. —
eu digo ainda chorando um pouco e me levanto depois de dar um beijo em
meus primos, Laura acenou para todos, mas só se aproximou de meu avô.
— Major. — ela o cumprimenta formalmente.
— À vontade, tenente. — meu avô resmunga com dificuldade e estende o
braço para ela, que o segura e sorri.
— É um enorme prazer, me sinto honrada em estar aqui. Seu neto não vai
gostar de ouvir o que vou dizer, mas tenho uma foto sua junto ao nosso
antigo marechal do ar, Rubens, em meu armário. O senhor é uma inspiração
para a minha carreira. — Laura diz sorrindo e meu avô olha para mim.
— Eu gostei dela, não vou te obrigar a nada... mas é uma ótima opção! —
ele resmunga baixo e todos riem alto. — Você não me é estranha... me
lembra alguém. — ele diz e Laura sorri.
— Sou filha da sargento Nogueira. Ela foi com o senhor para Cuba na
década de setenta, morreu em combate servindo o apoio de tropas brasileiras
assim que nasci. Naquela época eu ainda usava fraldas, mas cresci ouvindo
seu nome... nas suas histórias, nos seus grandes feitos como militar, como
pessoa. O senhor foi uma lenda, major, e também era uma inspiração para
minha mãe. — ela diz e meu avô fica sério demais, mas ainda zomba.
— Retiro o que eu disse, por favor, case-se com ela hoje. — meu avô faz
todo mundo rir e Laura entra no embalo.
— E aí, vovó... o que cozinhou para mim? — eu pergunto me sentando ao
seu lado.
— Ah, meu filho, eu não ando cozinhando mais... agora sua mãe assumiu
meu lugar! — ela diz sorrindo e finjo lamentar.
— Se reclamar passará fome, menino abusado! — minha mãe diz
fingindo revolta e meu pai vai abraçá-la.
Fico olhando para os dois por um momento e consigo notar dali o amor
que os dois sentem um pelo outro, e é algo imensurável! Qual seria o segredo
de tantos anos juntos? Era tão lindo vê-los assim... os dois se olham
apaixonados o tempo todo, trocavam beijos carinhosos discretamente e não
conseguiam se desgrudar. Parecia que meu pai tinha uma aura que a
iluminava e que minha mãe dependia de sua presença para brilhar, parecia
que, com ele ali perto, minha mãe era mais feliz. Já meu pai, com minha mãe
ao seu lado, ficava ainda maior, ainda mais simpático, uma versão melhorada
dele.
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— Sim, eles ainda são um grude até hoje. Não podem ficar no mesmo
ambiente que parecem um ímã, se agarram e não se soltam nunca mais! —
Luiza senta ao meu lado no sofá e olha para nossos pais.
— Como você está? — eu pergunto.
— Melhor agora, com você aqui, obrigada! — ela sorri para mim e meu
coração se desmancha. — E você?
— Eu me sinto feliz e péssimo ao mesmo tempo, me sinto incompleto faz
muito tempo, me sinto pela metade e, mesmo aqui, ainda não encontrei o
pedaço que perdi de mim. Talvez eu nunca consiga encontrar. — falo sobre
meus sentimentos com facilidade e depois paro para pensar no que falei.
Quando estava prestes a me desculpar, Lulu me abraça com os olhos cheios
de lágrimas. Eu ainda não entendia como havia falado tudo aquilo para ela,
uma garota de 13 anos.
— Tudo bem, seu segredo está guardado comigo, maninho, eu não ouvi
nada.
— O que anda fazendo? — pergunto mudando de assunto e ela me solta.
— Eu treino luta com o Rafa na academia, mas só nas horas vagas. Poupo
a mesada que você e o papai me dão aplicando na bolsa e passeio com a
escola de vez em quando. — ela diz rindo e secando os olhos.
— Como aprendeu a fazer isso? — pergunto impressionado e ela sorri.
— Videoaulas na internet! Não é difícil, não, é só curtir o assunto! — ela
ri e eu a abraço de novo.
Era tão bom, mas ao mesmo tempo tão ruim estar em casa. A parte ruim
era ter que me despedir de minha irmã querida, saber que a qualquer
momento eu teria que me despedir de todos eles.
— Papai, vamos ou não? — ela fala de repente com meu pai e se levanta.
— Aonde? — ele se solta de minha mãe e questiona.
— Ver a Olhos Brilhantes, não é!? Já tinha te falado, ela vai ter bebê! —
Luiza diz abraçando minha mãe e as duas sorriem, juntas dava para ver que
tinham o mesmo sorriso, os mesmos traços, os mesmos olhos, só o que
mudava era a cor do cabelo, pareciam irmãs.
— Vamos, minha princesa mais linda do mundo, vamos ver como ela
está! Já tinha até me esquecido dela. — ele resmunga e ela ri.
— E então, vai me levar até a casa que tinha me dito? — Laura se senta
do meu lado e pergunta.
— Por que não fica com a gente, Laura? Vamos fazer um churrasco na
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clareira. Não precisa ficar sozinha! — minha mãe se senta no outro sofá e eu
olho para Laura esperando que ela decida.
— O que acha, tenente? — ela pergunta parecendo querer uma resposta
sincera.
— Fica, 'ué', você vai gostar. Acho que terá moda de viola, sei que você
adora! — eu digo sério e faço todos rirem. Não entendo o porquê, não era
para ser engraçado, era para “envergonhá-la”.
— Quem disse isso? — Laura se desespera.
— Vai falar mal de moda de viola dentro de uma chácara cheia de
caipiras assumidos? — eu questiono sério de novo e Laura fica vermelha.
— Para, Coverick, ridículo! — ela sussurra mega-sem graça e a casa toda
ri mais ainda.
Gustavo começa andar pela sala e se aproxima de mim aos poucos.
Coloca um aviãozinho de brinquedo no meu joelho e fica uns quinze
segundos olhando para minha cara, mas eu não sei o que fazer.
— Oi, Gustavo, agora você quer falar comigo? — pergunto e ele balança
a cabeça, tem quase cinco aninhos, uns quatro e meio. — Entendi. — eu digo
e sorrio para ele.
— Gosta de aviões? — ele pergunta com sua vozinha fina.
— Deixa seu primo descansar, Gustavo! — meu avô resmunga e eu
consigo sorrir só pela surpresa.
— Está tudo bem, vô! Olha, Gustavo, eu meio que preciso gostar já que
piloto um deles todos os dias... — eu digo e ele arregala os olhos, seus
cabelos loirinhos e olhos azuis são um charme, ele era a cara de Nina.
— Qual você pilota? — ele pergunta ainda surpreso.
— Eu piloto um R-35A Learjet, é um jato que uso para tirar fotos da mata
fechada e cuidar da floresta amazônica. Ele se chama Carcará, como uma ave
de rapina que tem uma visão incrível. Já ouviu falar nele? — eu pergunto e
ele diz: — Claro que já, não é, vovô!? Eu sei tudo sobre aeronaves! Mas o
que você faz lá? — ele questiona e eu sorrio.
— Eu cuido da floresta para ver se não tem ninguém fazendo mal para
ela, levo medicamentos para as aldeias, transporto pacientes doentes para os
hospitais da cidade, levo as provas do Enem para os índios estudarem... vixi!
Um milhão de coisas, Gu! — eu bagunço seu cabelo liso e ele sai correndo
imitando um avião.
— Dessa vez seu avô não tem culpa, é Gabi quem não fala em outra
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coisa! — Rafa diz rindo e Gabi esconde o rosto no colo de Nina.


— Ela gosta de aviões? — pergunto curioso.
— Não, ela é fissurada em aviões! Acho que vai fazer engenharia... seu
pai comprou um boing pra ela, que se desmonta em um milhão de peças e ela
monta e desmonta de olhos fechados, ela é brilhante! — Nina diz cheia de
orgulho e Gabi olha para ela sorrindo.
— Bom, vamos ver onde você vai ficar, Laura. Estamos tão felizes por
Tay estar de volta que fomos mal educados, nem acomodamos você. — Nina
se levanta e Laura acompanha minha tia.
Eu dou um beijo nos meus avós e vou até o lago deixando Rafa cuidando
das ‘quatro crianças’.
— Como você está? Está bem? — minha mãe pergunta ao meu lado. Não
envelheceu um ano, continua linda e charmosa.
— Eu estou bem. E você e meu pai? — eu pergunto e ela sorri olhando o
lago.
— Estamos bem. Ele continua recebendo convites informais para partir e
me deixar, continua recusando todos... mas, tenho medo de chegar o dia em
que ele precisará aceitar um deles. — ela diz e me encara triste.
— Ele nunca fará isso. — eu digo com certeza absoluta.
— Eu também acho, mas suspeito de que terei medo disso acontecer para
sempre. — ela diz e eu a abraço, trazendo-a para perto de mim.
— Mas não devia, devia ficar tranquila. Ele te adora... continua olhando
pra você com a mesma devoção que olhava quando eu era criança, sem
contar que ama Luiza de paixão. Impossível abandonar vocês aqui. — eu
digo e ela ri.
— Ele está nervoso... — ela diz de repente.
— É? Por quê? Pelo vovô? — eu pergunto já sentindo o estresse.
— Não. Com você. Diz que você deu indícios de ter sofrido em Manaus.
Acha que você teve sérios problemas, está preocupado. É natural, não é!?
Depois de tudo o que ele passou, ele se preocupa com você. — ela diz e eu
encaro o lago.
— Bobagem.
— Quer me contar alguma coisa? — minha mãe me olha com seus olhos
de um azul profundo e parece ver minha alma.
— Não tem nada, mãe, não se preocupe! — eu falo e decido sair dali.
— Implicaram com você por ser de família de militares? Por ter esse
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sobrenome? Por ser o melhor, essas coisas?


— Entendeu a parte que não quero falar disso? Ninguém implicou
comigo, não houve nada, mãe! — eu digo e ela sorri.
— Judiaram do meu bebê? Diz que vou até Manaus colocar aqueles
nojentos para correr! — ela zomba apertando minha bochecha e me abraça.
— A gente só se preocupa, filho. Olha para mim... eu te amo tanto, mas tanto,
mais que minha própria vida! Eu queria tanto que você tivesse ficado em
casa, estudado outra coisa, mas, mesmo assim, me sinto tão orgulhosa de
você! Tay, você vai ser sempre meu bebê amado, aquela criaturinha pequena
que só me fazia sorrir! Meu bebê para sempre! Minha vida! E se eu souber
que você sofre ou que sofreu naquele lugar por qualquer motivo que seja, eu
tiro você de lá nem que seja a última coisa que eu faça na minha vida! Você é
minha vida, meu príncipe querido, meu primeiro filho. Te dei a minha vida
há anos atrás e estou disposta a fazer o mesmo quantas vezes forem
necessárias. Você é meu, nasceu daqui, faz parte de mim e não importa que
agora seja um homem, seja velho demais para ser o 'bebezinho da mamãe'...
aos meus olhos, será sempre meu bebê Tay, meu pequenino e vou te
proteger! — minha mãe diz e eu me seguro para não chorar como um bebê.
— Minha rainha! Eu te amo!!! — eu digo e ela sorri.
— Mas agora me diga... o que tem com essa Laura? — ela questiona e eu
sorrio.
— Nada, exatamente nada. Ela meio que está destinada ao meu amigo.
— Mas você gosta dela?
— Gosto, sim, é uma amiga legal. Mas é só. Não consigo amar ninguém,
mãe, me relaciono com garotas, mas é só coisa de pele, atração física. Não sei
o que é gostar de alguém... — eu digo e ela me faz um carinho.
— Quando vir a Ellen isso talvez mude.
— Ellen? Ellen ainda está aqui? — eu questiono e ela afirma.
— Sempre esteve, continua morando no vilarejo. Foi estudar em BH, mas
agora trabalha aqui para seu pai, no caso para você. Em breve vai vê-la,
espero que seja especial, bebê! Vai falar com tua amiga... eu vou atrás de meu
marido, ainda não consigo ficar mais de vinte minutos longe dele. — minha
mãe diz, me abraça e, depois de me recuperar do cho que sobre o que ela
disse a respeito de Ellen ainda estar aqui, eu olho para o casarão e vejo Laura
na janela.
— Gostou da suíte, madame? — entro no quarto de hóspedes e lá está ela
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olhando pela janela.


Laura vestia uma calça jeans, tênis, tem seus cabelos soltos em cachos
rebeldes e bonitos, e parecia uma menina. Seu corpo parecia ser uma delícia...
só de olhar eu já queria provar. Era loucura, eu sei, ela era uma colega de
base, mas que eu queria muito... ah, eu queria.
— Gostei da vista! — ela diz sorrindo e eu olho para a linda vista de seu
bumbum na calça jeans.
— Eu também gostei. — eu digo olhando para ela. Ela sorri, mas não me
olha, continua olhando para o lago e mexe em sua medalha de identificação
no pescoço.
— Não vamos ter nenhum tipo de relacionamento físico aqui, você sabe
disso, então por que está me elogiando, tenente? — ela diz e pela primeira
vez na vida me faz sorrir, Laura nunca teve graça. Ela me olha parecendo
gostar de me ver rir e continuamos sorrindo juntos.
— Eu sei que não vamos, mas você é muito gostosa. Mais gostosa do que
eu imaginava... eu sempre tive muita vontade de te ver nua e saber como você
é na cama. Na verdade, ainda tenho, preciso dizer… trabalhamos juntos, te
vejo todos os dias, te conheço melhor do que ninguém… precisamos dar um
passo a mais nesse nosso relacionamento, se é que você me entende… — eu
falo, mas ela me interrompe.
— Cala a sua boca, que nojo! — ela diz rindo e eu a olho curioso.
— Tem nojo de mim? — eu questiono realmente impressionado e ela fica
sem graça quando toco sua cintura e me aproximo.
— Não de você em si, mas dessa possibilidade. Te vejo como um irmão,
estamos juntos desde quando você ainda tinha espinha. Nunca vai me ver
nua, muito menos transar comigo. — ela diz e eu confirmo.
— Mas que eu queria, eu queria... precisava dizer isso, espero que me
entenda. Pedro é um cara de muita sorte! — eu resmungo baixo e ela sorri.
— Já teve uma época em que eu senti curiosidade a seu respeito, mas isso
foi há muito tempo! — ela diz e me olha vermelha.
— Cale a boca, mulher!!! — eu falo, sorrio para ela e a abraço por trás.
Laura é cheirosa e me deixa excitado, mas antes de pensar em jogá-la na
cama, eu a solto e reflito antes de fazer uma besteira das grandes. Se eu
trepasse com aquela mulher ali, como seria conviver com ela depois? Será
que ela deixaria aquilo enterrado e lidaria normalmente comigo? Ou se
apegaria e me daria trabalho? Bom, era melhor não arriscar. Dou um beijo
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demorado em seu pescoço e desço, deixando-a sozinha. Na sala, encontro


apenas meus avós.
— Cadê todo mundo? — pergunto e minha vó levanta os olhos para mim.
— Eu não sei, filho, mas acho que uma égua está dando cria. Eu não
gosto de ver... acho que foram todos para lá. — ela diz e fico curioso.
— Está bem, vou até lá.
— Espera. — meu avô, que eu pensei estar cochilando, de repente chama
a minha atenção assim que viro as costas.
— Que foi, vovô? — eu me aproximo dele e me ajoelho.
— Quero te dizer que já chegou a hora, em breve não estarei mais aqui,
então é hora de você viver tudo o que você quis e eu te impedi. Eu te privei
de ser feliz. Agora não consigo mais gritar e te colocar de castigo, então se
aproveite disso… esqueça um pouco de FAB e carreira militar. Você já foi
longe, você já me deu orgulho, você é o melhor da sua base, já orgulhou sua
família, seus ancestrais. Agora viva para você e por você! Você merece! —
ele diz e não consigo entender.
— Por que o senhor está me dizendo tudo isso? — eu questiono e ele dá
de ombros.
— Porque agora temos silêncio por aqui... vá ver a égua! Vai... — ele diz
e não me convenço.
Fico preocupado, olho para minha vó e ela assente afirmando que posso
sair. Dou um beijo nele, respiro fundo, mas permaneço agoniado.
Sigo para o estábulo e vejo todos do lado de fora, olhando para dentro da
cocheira. Eu me aproximei, vi a égua deitada e também uma moça perto de
sua cabeça fazendo carinho e conversando com ela. Ela vestia uma calça
jeans que deixavam suas coxas em evidência, suas botas de salto quadrado
marrom vinham até o joelho, seus cabelos escuros eram brilhantes e longos e
sua blusa larga de manga comprida tinha o cordão frouxo e deixava seu
decote em evidência de um modo discreto, mas que muito me atiçava. Parei e
prestei atenção na égua que agonizava antes de parir e notei que ela parecia
chorar... era o esperado, devia mesmo estar sentindo uma dor tremenda.
— O que está havendo? Ela vai parir mesmo? — pergunto para Rafa e ele
mal consegue falar.
— Vai... é bizarro não é!? — ele diz e eu volto a olhar para a égua.
— Bizarro, não! É a coisa mais linda que existe na natureza, uma mãe
dando a luz. A ordem natural das coisas, a mágica da vida. — a moça se
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levanta, olha para nós de relance e começa a colocar água em uma bacia. De
repente a égua começa a relinchar, levantar o rabo e soltar um líquido pela
genitália. Eu começo a entender a situação espiritual de Rafael que acabava
de sair dali quase correndo.
— Esse Rafa é um frouxo mesmo. — meu pai diz e todo mundo dá
risada. Apenas Nina bate forte no braço dele e finge estar emburrada com seu
comentário.
— Não fala nada, pai, porque estou quase fazendo a mesma coisa. — eu
digo e ele ri, mas finge ficar bravo.
Nesse momento vejo a garota que cuidava da égua parar de mexer nos
instrumentos cirúrgicos e olhar para parede. Foi numa fração de segundos,
mas eu notei. Rapidamente ela volta a si como se nada tivesse acontecido e
continua examinando a égua.
— Temos quanto tempo, doutora? — meu pai questiona parecendo
impaciente e a mulher se levanta para olhar para ele. Ela é simplesmente a
mulher mais linda que já vi na minha vida.
— Max, da última vez que perguntou faltavam uns vinte minutos, agora
faltam dezenove. — ela diz fazendo minha família toda zombar do meu pai.
Eu olho para ele curioso e noto algo raro: uma garota (uma garota que não era
minha mãe) havia feito meu pai sorrir descontraído.
— Estou pensando seriamente em contratar outra veterinária... — ele diz
e ela volta seu olhar para meu pai.
— Melhor do que eu não encontrará.
— Olha, papai!!! — Luiza aponta para a égua e a cabeça do potrinho já
aparecia.
— Nossa, que demais! — tia Nina resmunga e todos concordam.
O potrinho escorrega ainda mais e seu pescoço já aparecia, assim como as
patas dianteiras. Depois de pouco tempo, vemos o restante do corpo e logo as
patas traseiras. Ele tentava levantar e se aproximar de sua mãe, mas suas
patas não ajudavam, ficava cambaleando e cambaleando o tempo todo.
A veterinária retirou a placenta que estava pendurada, guardou em um
saco de lixo devidamente lacrado e continuou seu trabalho.
— E o cordão umbilical? É você quem corta? — eu pergunto e ela não
me olha nos olhos para responder.
— Não, o intuito é a Olhos Brilhantes se levantar e ele romper na hora,
mas se ela não fizer isso, é meu trabalho resolver. — ela dizia com
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cordialidade, mas não tanto quanto como falava com meus familiares.
E assim que eu paro de pensar nisso, a égua se levanta e rompe o cordão.
Penso que ela vai olhar para mim e dizer 'eu falei' como qualquer um faria,
mas a veterinária gata me ignora completamente. Meu pai me olha de um
jeito que não entendo e eu o ignoro.
— Como vamos chamá-lo, Lulu? — ela chama minha irmã do jeito que
só eu chamo e Luiza sorri para ela.
— Que tal Sereno? Ele pareceu bem sereno... nem chorou ao nascer! —
ela diz fazendo todos sorrirem.
— Então, Max, ela vai ficar em repouso de três a quatro dias. Vou ficar
na cabana esses dias e com o rádio ligado caso você note algo diferente e eu
esteja na clínica. Também vou mudar a sua dieta só para feno e cenoura e me
certificar de que o potrinho mame o colostro. Alguns bebês se recusam assim
que nascem, mas é de extrema importância que ele já mame desde agora,
então vou cuidar disso. De resto, agora é aguardar. Olhos Brilhantes e Sereno
ficarão bem... — ela diz e sorri para meu pai e minha mãe.
— Você é veterinária? — eu pergunto e ela me olha rapidamente.
É simpática e educada na medida certa, mas não me dá muita bola. E eu
não gostei nada, nada disso... não estava acostumado a ser tratado sem
assédio por mulher nenhuma. Desde que me conhecia por homem, toda
mulher que eu me aproximava — tirando as da minha família — ficavam de
pernas bambas.
— Sou, cursei na UFMG e trabalho aqui há alguns anos. Na verdade,
desde criança eu meio que moro por aqui... é provável que você não se
lembre. — ela fala de um jeito que faz meu coração sangrar e na mesma hora
a vontade de chorar me invade de uma maneira quase incontrolável.
Como eu poderia não reparar no cheiro de lavanda que invadia aquele
lugar? Como ignorei os sinais que estavam ali? Eu me recomponho mais
lentamente que ela, obviamente ignoro a dor em meu coração, mantenho o
foco e respondo.
— Se nós nos vimos quando crianças, com certeza me lembrarei... chega
aqui mais perto de mim, deixa eu olhar para você! — ela, que estava
abaixada, pareceu meio que travar na hora, mas logo se recompôs. Pois é,
Ellen era rápida.
Minha família de repente 'desapareceu' e eu só enxergava nós dois ali.
— Claro... — ela diz, se levanta, limpa as mãos na calça jeans e se
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oferece para me cumprimentar.


Aperto sua mão macia e meus olhos vão da sua mão estendida até seu
decote decorado com um colar que continha uma medalha de Nossa Senhora
Aparecida que pertenceu a mim, e o anel que dei para ela, cujo par estava até
hoje pendurado junto à minha placa de identificação da FAB em meu
pescoço, naquele instante, mais precisamente, dentro de minha blusa.
Eu travo, me sinto estranho e a pequena história que tive com aquela
mulher passa pela minha cabeça naquele mesmo momento: nossa noite
juntos, nossa viagem, nossas mensagens e declarações gostosas e tão juvenis
e, por último, a noite em que eu parti seu coração de uma forma cruel. Agora
ali na minha frente não havia mais uma roceira inocente, apaixonadinha pelo
filho dos patrões de seus pais. Ali na minha frente havia uma mulher linda,
forte, educada, inteligente, feminina, sexy e com o olhar mais misterioso que
já vi na vida. Ellen só me olhava e eu já queria tomá-la para mim, queria
levá-la embora dali para que ninguém olhasse para ela, para que ninguém a
tocasse, para que ninguém pudesse machucá-la de maneira nenhuma. Queria
que ela fosse propriedade minha, para sempre.
Eu estava completamente perturbado...

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2
RAIVOSO

Quatorze anos antes.

— Eu não acredito que seus pais deixaram que ficássemos sozinhos! —


eu digo e Tay entra, depositando a minha mala e a sua no canto do quarto do
hotel.
— Eles não fizeram isso por nós, mas por eles. — ele olha para mim e ri.
Começa a abrir as janelas do quarto e todas elas são espécies de portas que
dão direto na areia da praia, a coisa mais linda que já vi na vida.
E eu nunca tinha visto o mar de perto. Pego minha câmera e praticamente
corro parando somente onde a água já tocava meus pés. Fotografo tudo e Tay
chega sorrindo para mim.
— Nunca esteve em uma praia? — ele pergunta e eu fico sem graça.
— Não. Só vi na televisão. — eu digo e ele não zomba como pensei que
faria. Ele apenas volta a olhar para o mar e depois para mim. Fico tímida e
continuo tirando fotos de tudo.
— Ellen, me dê aqui, deixa eu tirar uma sua, vai lá para frente! — ele
pega a câmera das minhas mãos e fico mais tímida ainda com seu toque, mas
obedeço.
Tay tira algumas fotos e, quando penso que vai me devolver, ele me
agarra.
— Agora uma nossa! — ele me beija no rosto e levanta a câmera, me
deixando sair na foto sorrindo de olhos fechados, sem graça e pega de
surpresa. — Ficou legal. Espontânea! — ele diz e ri.
Passeamos um pouco pela areia, conversamos sobre tudo, sobre o futuro
dele, o meu, sobre possibilidades, sobre nossos gostos e nos conhecemos
melhor. No fim da tarde, vamos até a feira no centro da cidade, comemos
algumas besteiras... até que ele para na frente de uma barraca de bijuterias
feitas com moedas e outros materiais como madeira, plástico e produtos
recicláveis.
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Eu vejo um anel lindo e o pego nas mãos para olhar mais de perto.
— Quanto custa esse, tio? — ele questiona o vendedor sorrindo e me
pergunta se eu gostei.
A aliança tinha uma pedra rosa encrustada em formato de coração, como
se tivesse nascido dentro do metal e transbordasse para fora. Eu respondo que
sim para ele e ele devolve o anel ao lugar.
— Vamos beber um suco? — ele pergunta e eu digo que sim.
Nós nos sentamos na mesa de uma barraca de petiscos de peixes e
fizemos os pedidos. Conversamos mais e ficamos comendo e bebendo ali até
ver a tarde começar a cair.
— Paga para mim? Eu já volto! — Tay diz e coloca o dinheiro na mesa.
Eu entro na fila para pagar e revejo todas as fotos do telefone e da
câmera. Não via a hora de revelar todas elas! Tirei foto de tudo, tudo mesmo!
Nunca tinha saído de Barbacena então estar ali era surreal, eu estava vivendo
um sonho e queria registrar tudo. Assim que termino de pagar, Tay volta.
— Vamos? Já está tarde!
Caminhamos de volta ao hotel e, enquanto andávamos na areia, Tay pega
em minha mão. Eu sorrio nervosa e tímida, mas não tiro a minha mão da
dele. Entramos no quarto, fui rever as fotos da câmera sentada na cama e, de
repente, ele tira a máquina de minha mão.
— Tenho uma coisa para você! — ele diz, se senta na minha frente e
coloca uma caixinha de madeira na palma de minha mão.
Ao abrir vejo o anel que eu tinha gostado e fico super feliz e surpresa.
Nunca pensei que ele faria algo assim. Eu me inclino para frente para abraçá-
lo e beijar sua bochecha, mas ele é mais esperto e me dá um selinho rápido.
Fico confusa e envergonhada e começo a falar, mas ele faz 'shh' para mim,
me silenciando completamente.
Eu fico quieta, olho para ele e ele olha para minha boca antes de tentar de
novo. O beijo não tem muito sentido no começo, é fora de ritmo e meio
confuso, mas depois tudo melhora. Os nossos dentes não se encontram mais,
eu não mordo mais sua língua e assim que eu começo a sentir algo diferente,
Tay se senta mais para frente e chega mais perto de mim. Suas mãos tocam
meus ombros e ele me faz deitar na cama.
— Eu comprei uma para mim também, aliás… — ele interrompe o beijo
e tira do bolso um anel semelhante, só que sem a pedra.
Eu sorrio com sua falta de jeito e coloco a aliança no seu dedo anelar
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direito, como coloquei a minha.


— Isso significa que estamos namorando? — pergunto e ele fica sem
graça.
— Só se você quiser. — ele diz e eu sorrio.
— Eu quero. — digo e ele volta a me beijar, estendendo os beijos para
além de nossas bocas.
— Eu gosto de você! Vamos ficar juntos para sempre. — ele diz e eu
sinto vontade de chorar.
— Você promete?
— Prometo! Vamos namorar até ficar adultos e vou te pedir em
casamento lá na chácara, para todo mundo ver. Vamos ser eu e você até
ficarmos velhinhos. — ele diz e eu dou risada da parte de ‘ficar velhos’.
Ficamos juntos por mais um tempo, nem mesmo reparamos na hora
quando a fome chegou. Decidimos ir até o quarto de seus pais para saber se
jantaríamos juntos e, no caminho, Tay tira uma florzinha do canteiro do hotel
e coloca atrás de minha orelha me chamando de princesa.
Eu me sinto a garota mais boba do mundo e a mais apaixonada. Eu,
mesmo jovem, tinha certeza que amaria Tay para sempre e além disso, tinha
certeza que não esqueceria aquela viagem nunca mais, nem depois de adulta.

(...)
Eu fui educada, fiz minha parte como uma mulher adulta, minha
consciência estava no seu devido estado: tranquila.
Na minha frente estava o cara/garoto que me fez mal um dia, mas no
passado. Foi há muito tempo atrás e eu tinha a obrigação — citando aqui as
leis do bom senso — de manter aquilo no passado e seguir em frente,
principalmente levando em consideração o fato de que ele estava de volta. Eu
não era mais a roceira que não sabia o que era uma rua asfaltada ou uma boba
que só viu o mar pela televisão. Eu era uma mulher feita, inteligente, formada
e deveria deixar que isso se refletisse nos meus atos.
— Estou perto o suficiente agora? Conseguiu se lembrar?
Tay não tirava os olhos de minha medalhinha. Ele parecia suar frio,
percebi pelo fato de que tentava, mas de que sua boca não saia uma só
palavra. Imaginava que seus pensamentos estivessem voando para nossa

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viagem e nossa noite de um término cruel.


Confesso que vê-lo travar diante de mim era um bálsamo e, quando eu
começava a duvidar se ele voltaria a si, ele se recompôs e sorriu com os
olhos.
— Está. Como vai, Ellen? Está diferente… só o que me deu certeza foi
esse aroma de lavanda que está impregnado em uma camiseta minha até hoje
e esse pingente, que já foi meu… — ele diz e sorri fraco como se não tivesse
nem um pouco a fim de sorrir.
— Você também está diferente, não tem mais aquela franjinha bem aqui.
— eu respondo sorrindo e colocando a mão em minha testa para falar do
cabelo, então viro as costas para arrumar minhas coisas.
A mãe dele de repente tosse e, um a um vão se retirando do estábulo com
o intuito de nos deixar sozinhos ali.
— Ellen, vamos andar de cavalo comigo e com Tay mais tarde? — Luiza
começa.
Eu respiro fundo e, quando me viro, vejo Max me encarar sorrindo,
esperando a resposta que daria para sua filha. Olho para ele de cara fechada e
sorrio quando me dirijo à Luiza.
— Se eu não estiver trabalhando, eu vou, sim, Lulu. — toco em seu
cabelo liso e ela sai feliz do estábulo antes de seu pai.
Fico olhando para Max, visivelmente irritada, até que ele vire as costas,
mas Max não desiste e não se intimida. Toca no ombro do filho como se
estivesse falando “vai que é tua, filhão, me orgulhe…”.
— Como você está? — Tay questiona assim que ficamos sozinhos.
— Estou bem e você? — eu tento ser educada, mas acelero o passo para
sair dali. Sinto que aquele papo será constrangedor.
— Estou bem também. Nunca tive oportunidade de me desculpar… —
ele começa, mas logo mostro a palma da mão para ele.
— Vou falar o mesmo que falei para o seu pai desde o dia que se
mudaram para cá: não trate aquele “namorinho kids” como se tivesse sido
algo importante, marcante, como se tivesse significado algo realmente forte,
porque não foi isso. Nada aconteceu, nada rolou, você mesmo disse que era
uma mentira… não durou um verão. Não faça isso. — eu começo a falar
sorrindo e me viro para realmente sair dali, mas ele me segura e me impede.
Olho para sua mão no meu braço e não me sinto muito bem. Seu toque
firme me passa uma corrente de eletricidade que me desestabiliza.
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— Vou aproveitar que você está aqui, que eu estou aqui, que não tem
ninguém, e vou falar uma única vez. Então para, escuta o que eu tenho para
falar e depois pode me dar as costas e me deixar aqui, saindo com a cabeça
erguida! — ele diz de uma forma agressiva e aquilo me deixa curiosa, então
mostro com o corpo que concordei.
Puxo meu braço de sua mão, coloco a maleta no chão e espero com cara
de paisagem. Olho para aqueles olhos de oceano de águas cristalinas e projeto
em minha mente o rio Tietê de São Paulo, que está poluído há anos, só para
não me concentrar em sua beleza fora do comum. O filho da mãe estava
ainda mais lindo.
— Nada daquilo foi mentira. Tudo o que eu disse, todas as nossas
mensagens, este anel que também levo comigo até hoje, nada foi mentira. Eu
não vou dizer que amava você porque na nossa idade a gente nem sabia o que
significava isso, mas eu fiz o que fiz porque achei que era o certo, caí no
papo antiquado do meu avô. Ele viu que eu estava disposto a jogar todo o
meu futuro fora por você e quase me matou e não, não o culpo… abri mão de
nosso “namorinho kids” porque achei que era o correto, achei que deveria ser
como ele foi, como meu pai foi, como eles agiram, largando a mulher que
amavam para se dedicar a algo muito maior. — ele não para de falar. — Eu
não queria envergonhar meu avô, parecer um homem fraco, mudar o rumo da
história de nossa família, ser o diferente e decepcionar. Eu não queria… mas
fiz errado e, naquela época, parti seu coração. E é só por isso, é somente por
não ter me aberto com você e falado de uma forma mais delicada, que eu me
desculpo agora. Ellen, me perdoa por aquela noite, eu sofri… sofri demais e
nunca esqueci. Agora, se para você aquilo foi uma bobagem, não significou
nada e não doeu, se você não sofreu como eu, eu de certa forma, fico feliz e
tranquilo. — ele termina.
Eu travo e quase perco a pose quando ele mostra o anel em sua corrente,
mas logo estampo um sorriso no rosto e mantenho a postura de quando
converso com minha melhor amiga Lari sobre reprodução assistida ou clone
de ovelhas, a descoberta científica que bombou em uma novela nos anos
2000.
— Eu aceito suas desculpas, Tay. Fica tranquilo e esquece isso! — falo
sorrindo enquanto toco no seu braço esquerdo.
Pego a maleta do chão e saio dali com meu coração pesado e dolorido
demais. No momento em que falava seu discurso pobre em concordância
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factual, eu descobri que, dentro de mim, tinha tanta coisa para sair… eu tinha
tanta coisa para falar, tanta coisa para gritar para ele, que eu desisti de fazer
isso e me recusei a dar uma importância que aquilo não merecia ter, uma
importância que ele mesmo não dava.
Eu saí de Minas Gerais praticamente escondida quando soube do
acidente. Eu saí da minha casa, perdi aula, deixei tudo para trás e fui com
roupa demais porque pensei que ele me pediria para ficar. Levei documentos
pessoais escondidos de minha mãe porque não estava nos meus planos voltar
para cá, ou voltar para cá sem ele. Bobagens que uma criança faz por amor
ou, segundo ele, “o que a gente acha que é o significado de amor”.
Eu me recusava a colocar gravidade naquele acontecimento que para ele
era apenas “o atraso, a pedra no caminho, o impedimento para a futura
carreira militar dele”, eu me recusava a sofrer por isso. Por causa disso, fiz
como ele sugeriu e, depois de escutar, saí de cabeça erguida dali, nem olhei
para trás. Mas ele ficou, ele se lamentou sozinho e era assim que tinha que
ser.
O restante do dia foi “tranquilo”, voltei para o estábulo para dar uma
olhada em Sereno e, por via das dúvidas, o ajudei a mamar. Arrumei e
escovei todos os outros cavalos e, quando eu notava que estava terminando as
tarefas, arrumava outra coisa para fazer imediatamente. Ocupar minha cabeça
com trabalho era o que eu precisava para seguir em frente.
Quando todas as atividades enfim acabaram, decidi colocar a sela no
Farol, o Mangalarga Marchador que eu amava montar. Quando eu já estava
pronta para cavalgar meu tio aparece.
— Oi, princesa.
— Oi, tio! — respondo e desço do Farol.
— Tudo bem se eu for com você? Faz tempo que não fazemos isso
juntos. — ele diz e sei que quer conversar, faço cara de paisagem e concordo
como uma boa sobrinha deve fazer.
Ele ajeita Docinho, uma égua dócil e marrom, e sai do estábulo já
montado nela. Trotamos até o pasto vazio onde ele mesmo tinha montado
alguns obstáculos improvisados para eu treinar há muito tempo atrás e
diminuímos a velocidade no momento certo.
— Conversou com seu namorado de infância? — Seu Renan sempre
direto.
— Sim, tio, ele foi até o estábulo ver a Olhos brilhantes com toda a
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família. — eu digo e me faço de indiferente.


Aquele assunto não me incomodava. Tay não me incomodava. Nada me
tiraria do foco naquela altura do campeonato.
— Escuta, você não é mais uma menina. Sempre apoiei você, sempre
estive do seu lado, então vou ser direto como sempre: não crie expectativas. E
não adianta dizer que não gosta, que é passado, porque é mentira e ponto
final. Você não me engana, eu e sua mãe sabemos que você nunca deixou de
gostar e nunca esqueceu aquele menino. Não crie expectativas, tire esse rapaz
do seu coração porque não ele não é para você. Uma vez ele te disse que você
era uma roceira, não era garota para ele e, apesar de você, culturalmente
falando, ainda ser uma roceira com muito orgulho, agora é ele que não é
homem para você. Você é linda, é uma joia, inteligente, forte, mulher de
família e merece um homem de verdade. Ele é pouco para você! Agora tem
que ver o que perdeu quando partiu seu coração…
— Tio. — eu interrompo e ele suspira. — Menos! Realmente não
pretendo ter nada com ele, mal olhei para ele, falei com ele por educação,
relaxa. Nada vai acontecer, meu foco agora é minha clínica, meu trabalho, e
não homens. Eu não gosto mais dele, não sinto nada, relaxa! Aquilo passou,
mesmo! — falo pausadamente para que ele possa entender.
Antes mesmo do papo chato continuar, algo me chama atenção. Vejo
alguém cavalgando em alta velocidade enquanto gritava apavorado. Raivoso,
um alazão que ainda não domei, era um cavalo arredio, estressado, bravo, e
eu já tinha deixado claro que ele não estava pronto para ser montado.
— Mas que… — meu tio resmunga quando nota o que eu notei e eu não
perco tempo.
— Deixa que eu sou mais rápida!!! — atiço Farol para que ele corra e
acelero ainda mais.
Travo quando vejo que é Luiza quem está montada no animal. Logo atrás,
vinham Max em um cavalo e Tay a pé tentando chegar até a irmã. Raivoso
corria pela estradinha que ladeava o pasto vazio, então corri na direção oposta
para pegá-los lá na frente, antes dele seguir com Luiza para dentro da mata
fechada.
— Papai, me ajuda!!! Para ele!!! Papai!!! Socorro!!! — Luiza gritava
apavorada.
Quando enfim me aproximei dela com Farol e corremos lado a lado por
alguns segundos, vi que ela já estava quase caindo. Luiza pendia para o lado
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e gritava. Eu a puxei de volta à sela à medida que cavalgávamos a uma


velocidade que não me agradava — pelo menos não enquanto Lulu estava
sofrendo — e me ajeitei no Farol para conseguir parar Raivoso.
— Calma, Lulu, me dá a corda! — estendi a minha mão, peguei a corda
amarrada nele e, devagar para ele não empinar, puxei o freio de sua boca
enquanto controlava Farol, que me conduzia fielmente.
Luiza chorava de um jeito que cortava o coração e, só de pensar nela
caindo, o meu coração se despedaçava. Seria um tombo feio demais, fatal.
Parei Raivoso, desci do Farol e peguei Lulu no colo colocando-a chão. Ela
me abraçou apertado demais e só me largou quando Max chegou perto,
rapidamente correu para o colo do pai. Continuei segurando Raivoso pela
corda porque ele poderia fugir e me debrucei na pequena cerca para respirar e
me acalmar.
— Quem deixou ela montar nesse cavalo??? — pergunto baixo,
tremendo, e com muita raiva.
Se tivesse acontecido algo pior eu me puniria eternamente.
— Fui eu! Eu mesmo! — Max diz e Tay se aproxima.
— Mas eu não falei que ele não estava pronto para ser cavalgado??? —
quase gritei e, quando achei que Max pularia em meu pescoço, ele fechou os
olhos e abraçou mais um pouco sua filha.
— O que há de errado com esse bicho??? — Tay grita nervoso e meu tio
se aproxima.
— Com ele, nada, ele precisa ser domado! Eu já disse isso, já disse que
ele não estava pronto!!! — eu grito nervosa, mas me acalmo na mesma hora.
— Não adianta brigar agora, já passou, ninguém tem culpa! Vão deixar a
criança mais assustada ainda! — meu tio diz em defesa da pequena Luiza.
— Quem deveria domar ele? Por que não levou esse cavalo para resolver
isso? Por que ainda está no estábulo, se não deveria estar??? Falta de
responsabilidade em um lugar que tem criança!!! — Tay também se acalma,
mas ainda questiona mais raivoso que o próprio cavalo.
— Sou eu quem domo. É o meu trabalho!!! Mas há dias certos, pausas,
tempos. Há regras aqui, tenente! Para domar e cavalgá-lo!!! — eu falo e faço
carinho em Raivoso, que estava agitado com tanta gritaria.
— Ellen, eu sinto muito! Eu me esqueci, me desculpa. Muito obrigado
por ajudar minha filha. Vou ser grato a você eternamente. Eu… me
desculpa… é tudo culpa minha. — Max diz me olhando nos olhos.
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Seus olhos estavam vermelhos, mas não saíam lágrimas. Olhar para ele
me dava pena. De longe, toda a família corria para ver se Luiza estava bem.
— Não precisa se desculpar. Eu devia ter tirado ele daqui quando vocês
se mudaram, devia ter trancado sua baia para prevenir situações desse tipo…
— resmungo com um nó na garganta e meu tio toma as minhas dores.
— Devia, nada! Raivoso estava onde devia estar, longe dos outros
cavalos adoeceria e você sabe disso melhor do que qualquer um aqui! Já disse
que ninguém tem culpa, muito menos você, Ellen! Te proíbo de se culpar,
menina!!! — meu tio diz se alterando e eu o ignoro.
Eu me aproximo de Luiza e me ajoelho.
— Lulu, você vai ficar bem! Raivoso não fez por mal, está bem!? Ele não
pensa como a gente! Ele não controla! Em breve você vai esquecer isso e sei
que o que falo, parece ser loucura, mas é muito importante que você não
deixe que o que aconteceu hoje te deixe amedrontada. É só Raivoso que não
está bem, os outros cavalos são mansinhos e seguros para passear… — eu
digo e ela me olha enquanto ainda se mantinha agarrada ao pai.
— Obrigada por me salvar, Ellen, mas eu nunca mais vou chegar perto
deles! — ela diz, volta a agarrar seu pai.
Ao invés de escutar o que Lulu diz, meu cérebro e meu coração registram
um “por sua culpa nunca mais vou chegar perto desse maldito animal!”. Eu
me levanto sem ter o que dizer, tiro a corda de Raivoso, monto nele e puxo
Farol para caminhar do lado. Saio dali com culpa demais e era tão visível que
até Raivoso estava mais encurvado do que o normal. Meu tio também sai dali
numa atitude de "apoio", mas eu queria fugir para bem longe.
Chego no estábulo com meu tio na minha cola e amarro Raivoso na base
que coloquei ali para isso.
— Não foi sua culpa! — meu tio desce da Docinho e começa a me
encher.
— FOI SIM! FOI SIM!!! — eu já grito antes de me lembrar de que estava
no lugar errado para fazer isso e também com a pessoa errada, meu tio odiava
que qualquer pessoa levantasse a voz para ele.
Não seguro mais e choro por estar nervosa com o recente acontecimento.
— Não foi, não tinha como prever, princesa! Essas coisas acontecem…
— Tio!!! Imagina se essa menina tivesse caído naquela velocidade, o
senhor imagina o que teria acontecido com aquela criança??? — eu pergunto
em prantos andando de um lado para o outro sem saber o que dizer, sentir ou
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falar.
— Sim, mas não aconteceu… não aconteceu!!!
— Porque a gente estava por perto, estávamos ali. Pensa bem se não
tivesse ninguém, Max estava longe de chegar perto dela, ele nem ia conseguir
pegá-la e, pior, se conseguisse chegar ele ia empinar naquela velocidade, ia
ser fatal, tio! Ia ser fatal. Luiza poderia…
— Está bem, já chega!!! Não me faça voltar a te ameaçar de cinto que
nem quando era criança, menina! Vem aqui! — ele diz bravo e me abraça.
— Vou levar Raivoso para a chácara do Juliano, ele me deve um favor,
vou levá-lo para lá. — eu digo desamarrando a corda da base e meu tio
desaprova.
— Para quê??? No que isso vai ajudar???
— Acha que essa família vai gostar de ter que ficar olhando para o cavalo
que quase matou a filha deles??? Tio??? Pensa bem, uai! Parece que não
pensa… — eu digo e ele demonstra, mesmo contrariado, que concorda com
aquilo. — Acomoda o Farol, por favor… — digo quando desato o nó forte da
corda. Ele concorda e vejo Tay se aproximar.
— Ellen, me desculpa por… — ele começa.
A verdade era que eu já estava cheia de suas desculpas por aquele dia.
Tay tinha acabado com o estoque de desculpas dele e eu não estava com a
menor paciência para ouvir nada e nem ninguém, ele muito menos. Portanto
subi no Raivoso e saí cavalgando rápido demais com ele dali.
E depositava minhas esperanças nisso: que a corrida e o vento que batia
em mim levassem para longe toda a culpa que eu carregava.

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ATÉ FICARMOS VELHINHOS

— Calma, pai! Não é para tanto também, Luiza está bem! — eu digo para
seu Max que, naquele momento, andava pela sala agitado e infeliz.
— Ela está bem, mas por pouco quase não acontece uma fatalidade! Por
irresponsabilidade minha. Por culpa minha, quase perco minha filha! Eu sou
um idiota! Um tremendo idiota! — ele diz e tia Nina, que havia levado Luiza
para tomar banho e descansar, volta para a sala naquele momento.
— Ela adormeceu, está muito assustada… — ela diz e se senta ao lado de
minha vó.
— Eu devia ter me lembrado, devia ter me lembrado de algo desse tipo.
Como eu pude…!?
— Max, já chega! — minha mãe se levanta e diz extremamente
estressada. — Olha pra mim! Você não teve culpa, você não é um robô, pare
de se cobrar tanto!!! Todo mundo erra, esquecer faz parte, amor! — ela diz e
tenta abraçá-lo, mas meu pai se afasta fazendo dona Hella ficar vermelha de
raiva.
— Não com minha filha, não posso errar com minha filha. Não posso
cometer um erro desses…
— Max, olha pra mim! Já passou, Luiza é forte, ela vai ficar bem!!! Você
comete erros, é humano! — ela se aproxima e ele se afasta ainda mais.
— Minha vontade é de levar aquele bicho para longe. Bem longe! Que
raiva!!! — meu pai rosna baixo.
— Ellen parece que previu isso, levou o animal para outro local. Seu
Renan disse que para um lugar seguro. E, pelo jeito que ela me deixou
falando sozinho, nem sei se ela volta. Ela se culpa… — eu digo, me sento no
sofá e vejo Laura descer.
— Também, não é… você não ajudou, você mesmo responsabilizou a
garota! — meu pai quase grita comigo e eu me controlo ao responder.
— Eu só disse o que eu faria, não quis magoá-la, eu estava bravo. Luiza
naquela velocidade teria morrido! Não faz essa cara, não, mãe! Não faz essa
cara, não, porque é a verdade, seria fatal! Papai estava longe, não chegaria a
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tempo, o bicho estava indo direto para a mata fechada, cheia de árvores e
pedras enormes! Um lugar com crianças precisa ter um cuidado redobrado,
eu só cobrei o que eu faria. Mas de qualquer forma fui até lá, fui me
desculpar porque, no calor do momento, peguei pesado com ela, mas nem ela
e nem você têm culpa, pai, então pega leve! Essas coisas acontecem. — eu
digo e ele faz 'não' com a cabeça.
— Preciso dar uma volta! — meu pai diz e aquilo me corta o coração,
mas dona Hella dá um jeito nele.
— NÃO!!! Você não vai a lugar nenhum, Max. Não vai surtar agora!
— Hella… — ele começa a falar se virando para ela e ela toma a chave
do carro que ele tinha pego no sofá.
— O quê? Vai me fazer te ameaçar? Te chantagear??? Não deixe chegar a
isso, capitão, porque eu chego, você me conhece, conhece bem o suficiente
para saber que, se for necessário, alcanço o extremo… então pensa bem e
senta aí, nem pense em sair daqui! É algo difícil de aceitar, foi sério, então
vamos encarar, vamos resolver. Já estava velho antes, agora nem se fala, não
tem mais idade para fugir como um adolescente. Se contenha!!! — minha
mãe diz e meu pai parece querer sorrir e matá-la ao mesmo tempo.
Minha mãe precisava levantar o pescoço para falar com ele, mas
enfrentava meu pai sem medo, e meu pai, pelo jeito, colocava o rabo entre as
pernas para seu próprio bem, mesmo que ainda falasse com medo.
— Não pode me obrigar a ficar aqui, preciso de um tempo, preciso clarear
as ideias, Hella… — ele falava baixo agora. Minha mãe ouviu e aquilo
pareceu doer mais do que deveria.
— Conseguiu sobreviver no meio de duas guerras civis. Não entendo
como foge de problemas familiares que na verdade nem são problemas. Max,
foi um acidente, ninguém teve culpa…
— Eu tive culpa, Ellen tinha me avisado… ela… — de repente meu pai
para de falar quando vê minha mãe estender as chaves para ele. — Hella…
— ele lamenta vê-la daquela forma. Minha mãe tinha se cansado e desistido.
— Desaparece. Some daqui! — minha mãe diz baixo olhando nos olhos
dele, fazendo o clima pesar de uma maneira surreal.
— Não precisa ser assim… — ele diz, joga as chaves no sofá e se
aproxima dela, mas era a hora da minha mãe se afastar mostrando as palmas
das mãos para deixar claro que agora ele não deveria tocá-la.
— Eu vivo dizendo que tenho medo de você partir, mas sou uma idiota.
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Nunca havia notado que você nunca voltou!!! É só seu corpo que voltou
daquela guerra, mais nada, tudo seu ficou lá. — minha mãe diz e se retira.
Meu pai fica furioso e vai atrás dela.
Tudo fica ruim, toda a situação piora. Tudo por causa de um acidente que
ninguém podia prever.
— Como funciona isso? Eles vão se acertar, não é? — pergunto para
minha tia que, naquele momento, roía as unhas.
— Não tenho a menor ideia! Pode ser que sim… — ela diz e me sinto
péssimo.
Vinte minutos depois de total silêncio lá em cima, meu pai desce
correndo. Eu e Laura fingimos que não o vemos corado devido ao sexo e
tratamos aquilo com naturalidade, mas não minha tia Nina, claro, que
segurava um riso fora do comum.
— Sua mãe quer que a gente traga Ellen aqui! — ele diz e minha tia
responde.
— Talvez deixar isso para lá seja a melhor maneira de lidar com isso,
talvez Ellen queira um pouco de paz, esquecer tudo isso, Max. — ela diz e,
no fundo, eu concordo, mas não falo nada pois vê-la seria maravilhoso.
— Nina, Hella quer que eu a traga aqui. Ela manda, eu obedeço! — meu
pai diz aquilo com uma timidez absurda e de um jeito estranho demais e
então, de repente, grita. — OUVIU??? ESPERO QUE TENHA ESCUTADO,
MULHER, PORQUE JAMAIS REPETIREI ISSO, SUA CRETINA!!!
Laura olha para mim apavorada e eu olho para minha tia apavorado, mas
ela ri.
— OUVI, CAPITÃO, MAS DA PRÓXIMA VEZ QUERO MAIS
CONVINCENTE! BOM TRABALHO! — minha mãe grita de cima da
escada e meu pai ri.
— Posso ir junto? — Laura questiona.
— Não, fica aí. — eu digo e ela concorda.
— Já está entediada, é!? Tia pede para Laura levar os gêmeos G. para
passear! — eu digo e Laura sorri.
Minha tia fala alguma coisa, mas não presto atenção. Sigo meu pai até a
porta e caminhamos até o carro. Dirigimos até a casa de seu Renan, dentro do
terreno da propriedade, e fiquei no carro enquanto meu pai foi falar com ele.
Logo depois ele volta com a cara amarrada.
— Esse homem não vai muito com tua cara! — ele diz bufando e eu
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sorrio.
— Eu sei. — digo e meu pai fica surpreso.
— Como sabe?
— A hora que fui me desculpar e Ellen foi embora, ele me disse um
monte, mandou eu ficar longe dela. — eu falo e ele sorri.
— Isso é bom, torna tudo mais emocionante! — ele diz e ri.
Meu pai estava voltando a ser um adolescente, meu Deus.
— Ela nunca deixou de ser minha, não é!? — eu digo e ele me olha
sorrindo.
— Não. — ele diz e eu balanço a cabeça afirmando, ela realmente nunca
deixou.
Seu Renan deu o endereço de um sítio vizinho, mas, mesmo sendo perto,
era um pouco complicado para ir de carro. Pegamos a estradinha seguindo
para o centro de Barbacena e, de lá, outra estrada de terra para o sítio do tal
Juliano. Cinco minutos dirigindo em uma estrada reta e logo chegamos em
uma porteira com os dizeres: Sítio Canto dos Pássaros. Meu pai e eu
descemos do carro e fomos atendidos por um típico funcionário intitulado
‘capataz’. Trajava toda a roupa típica e carregava consigo uma arma no cinto.
— Gostaríamos de falar com a Ellen, soubemos que ela está aí. Somos
da… — meu pai começa, mas o bruto interrompe.
— Pôr do Sol. Eu sei. Só um minuto, vou ver se ela pode atender, pelo o
que vi, estava trabalhando. — ele diz e vira as costas para falar no rádio
enquanto eu e meu pai nos entreolhamos.
— Trabalhando? Ela trabalha em outras chácaras? — eu pergunto já
incomodado e meu pai faz que 'não' com a cabeça.
— Vocês podem entrar! — ele diz abrindo a porteira e entramos no carro
de novo.
O bruto explica mais ou menos onde ela estava e seguimos nosso
caminho. O sítio é bonito, mas é menor em extensão comparado ao meu. É
acolhedor também. Paramos em frente a um espaço que deveria ter sido um
pasto antigamente, todo cercado, e logo a avistamos. Ellen estava em cima do
cavalo bravo e, no meio do pasto, estava um rapaz vestido como o cara que
nos recepcionou, fazendo alguma coisa em uma bacia, sentado em um banco.
Eu e meu pai nos apoiamos na cerca e ficamos olhando por um momento.
Ellen cavalgava a toda velocidade dando voltas padronizadas pelo espaço
disponível. Estava linda, confiante, corajosa… maravilhosa! Em certo
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momento ela parou, desceu do cavalo e, com uma espécie de vara, bateu de
leve duas vezes no traseiro do animal que, de repente, passou a acompanhá-la
sem que Ellen precisasse segurar em sua corda. Em pouco tempo a
veterinária e tratadora parecia ter tido bons avanços com ele.
— Oi! — ela se aproxima da cerca e nos cumprimenta, mas sem seu
sorriso simpático.
— Como você está? — eu questiono.
— Eu estou bem! Como está Luiza?
— Ela está ótima, foi descansar! — meu pai faz parecer tudo tranquilo e
eu agradeço por isso.
— O que querem aqui? Precisam de alguma coisa?
— Precisamos de você na chácara, o que faz aqui? Que lugar é este??? —
questiono sem pensar e meu pai olha para mim.
— Precisam de mim para quê? Estou usando um espaço emprestado para
domar Raivoso, é de um amigo meu… estou fazendo meu trabalho, para
fazer isso não precisa ser lá. Achei que vocês não fossem querer vê-lo tão
cedo, então decidi por trazê-lo, me responsabilizei por um espaço onde tem
criança! — ela diz e meu pai olha para mim de novo.
— Já pedi desculpas…
— Não importa! Agora estou ocupada. — ela diz chateada e vejo seu
amigo se aproximar.
— Como vai? Família Coverick, não!? Chácara Pôr do Sol? Bela
propriedade, por vezes tentei comprá-la! — o mané diz e meu pai o
cumprimenta.
Ele toca as costas de Ellen ao falar e eu olho para sua mão enquanto Ellen
me encara sem graça.
— Esse é Juliano, dono do lugar e me cede espaço quando preciso. —
Ellen diz e sorri para ele, eu olho para a cena e respiro fundo.
— Esse sítio é seu! Já falei isso. Vou pedir um café fresquinho para nós.
— o mané diz.
— Não se incomode… já estamos de saída! — meu pai responde
enquanto encaro o abusado e Ellen me encara.
— Quem sai de meu sítio sem tomar um café da dona Maria vira meu
inimigo! Brincadeira, mas ficarei chateado se não aceitarem! — ele responde
meu pai olhando para mim com uma ameaça disfarçada e se retira.
Olho para Ellen que tinha agora um semblante sem graça e quase de
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culpa, semblante esse que desapareceu na mesma hora em que notei.


— Ellen, a Hella quer te ver, quer conversar com você. — meu pai diz e
ela afirma.
— Tudo bem, não pode ser amanhã? Vou ficar aqui até mais tarde,
preciso…
— Mas não vai mesmo!!! — eu falo e ela e meu pai me encaram como se
eu tivesse falado um palavrão na frente de uma criança. — Minha mãe quer
te ver agora, pega esse bicho Raivoso aí e vamos para casa! — eu falo e ela
me encara enquanto eu sustento seu olhar sem hesitar.
— Ellen, não precisa cuidar disso hoje, não agora, você não precisa se
sentir culpada, vai por mim já faço isso por nós dois. Ninguém te culpou,
nem mesmo Tay, ele se desculpou, ou pelo menos tentou se desculpar com
você. Está tudo bem, você salvou minha filha hoje, serei grato a você e te
devo a minha vida por isso. Por favor, esquece isso! E você pode fazer isso
lá. Não vou negar que quis matar o cavalo, mas eu estava nervoso, o bicho
não tem culpa, já passou… estávamos todos assustados com a possibilidade
de Luiza se machucar! — meu pai diz e ela sorri fraco.
— Tudo bem, Max, mas realmente quero terminar aqui, está bem!? Não
posso começar e parar agora… não faz bem para o animal. — ela diz bate
com a vara no traseiro dele, imediatamente o cavalo corre para longe.
— Hoje à noite faremos uma fogueira, um churrasco, se quiser
aparecer… é bom que vocês podem conversar, você e Hella. Se eu não
conseguir que você apareça perco uma aposta que, para mim, é muito
importante, então… vai, me ajuda!!! — meu pai diz sorrindo e Ellen sorri de
volta, com vontade.
— Bom, podemos conversar sobre isso. Já tem um tempo que preciso de
um aumento de salário… essa é a minha hora! — ela diz e os dois riem.
— Bom, eu estou de acordo, mas quem paga seu salário é o dono da
chácara, seu dinheiro todo mês sai da conta dele. — meu pai diz e olha para
mim.
Eu permaneço olhando para ela como fiz desde o início. Ellen deixa o
sorriso morrer na mesma hora.
— Bom, pelo jeito tudo mudou, não é!? — eu digo sem sorrir, me
sentindo mal com sua antipatia por mim.
— É, mudou, sim. Posso pedir um emprego extra aqui. Juliano tem
cavalos, vacas, bois… — ela diz sorrindo falsamente.
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— Vamos-embora. — eu digo pausadamente, olhando para ela e para o


manezão que chega.
— Olha os cafés! — uma senhora entrega uma xícara para cada e eu pego
por consideração a ela. — Espero que gostem. — ela diz e se retira. Cinco
minutos depois, terminamos de beber em silêncio.
— Pai, vou esperar vocês no carro. Espero você colocar o Raivoso na
baia dele! — eu digo olhando para ela e já ia virando as costas quando ela
respondeu: — Eu não vou, estou ocupada agora… mas, obrigada!
Eu me viro para olhar para ela e vejo Juliano entrar em seu espaço
pessoal. Ela se afasta dele, assobia para o cavalo e Raivoso volta trotando.
— Tudo bem! — eu digo e entro no carro calmamente.
Um ódio toma posse de mim subitamente, me fazendo tremer. Deitei
minha cabeça no painel em minha frente e tentei controlar minha respiração
para eu me acalmar. Meu coração doía e eu continuava sem entender o
porquê. Estava chateado e ainda assim não sabia o motivo. Os dois estavam
juntos, talvez fosse por isso que eu estivesse chateado, porque Ellen estava
com aquele caipira… meu Deus, que dor. Algumas lágrimas ameaçavam cair,
mas eu as ignoro e impeço que aquilo venha à tona logo ali.
— Relaxa. Eles não estão juntos. — meu pai diz ao entrar no carro.
— Como você sabe? — eu questiono e ele ri.
— Eu perguntei. — ele fala e eu reviro os olhos. Que ótimo!
Chegamos em casa e a fogueira já estava acesa. Minha mãe, tia Nina,
Isabelle e uma parente de Ellen cozinhavam lá na cozinha e conversavam
sobre alguma coisa. Dei um beijo na minha mãe e subi para meu quarto.
Tomei um banho rápido e senti a fome chegar na mesma hora. Entro no
quarto de Laura e a encontro de toalha.
— Deus, cheguei no momento certo! — eu falo e ela ri.
— Pedro te ligou? — ela diz e eu pego meu telefone para olhar. Havia
uma mensagem dele e um milhão de ligações perdidas.
"Ow Boi, ‘tô chegando mais cedo. Mousher é zica! Não conheço nada aí,
então vem me buscar, mané!!! Amanhã ‘tô aí na parte da tarde. Como eu sou
o cara do cafezinho, vou de avião comercial mesmo, eu sou muito
discriminado nesse lugar!"
— Bom, ligou, mandou mensagem e tudo o mais! — eu digo e me deito
em sua cama.
Ela deixa a toalha na cama, se veste e eu só consigo pensar na selvagem
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domando o cavalo. Pronto, virei uma menininha apaixonada! Eu não podia


deixar a criatura me amarrar, me deixar maluco, quem fazia isso era eu, e não
o contrário!!! Ellen não ia me prender, não ia me fazer de gato e sapato, eu
me recusava!!!
Deixei Laura seminua no quarto e desci. Sim, eu fui um idiota. Caminhei
até a clareira e sentei no banco, a cantoria estava alta e alguns dos casais
dançavam uma música lenta que dizia algo sobre 'a longa estrada da vida'.
Maravilhoso!
Uma jovem gata se aproxima com um prato de comida e eu agradeço,
minha fome estava fazendo minha barriga doer. Comi tudo e continuei por
ali. Meus pais, Lulu, minha tia e meus avós chegaram e logo foram se
acomodando. Passamos um tempo conversando sobre temas específicos,
minha infância, o quanto eu era alegre e feliz, e então me cansei. Pelo jeito
ela não viria mesmo, devia estar ocupada com o caipira que faz inimigos com
quem não toma seu café, o patético!
Eu me retirei meio que furtivamente, peguei o carro de meu pai e fui
dirigindo sem destino. Eu não sabia o que estava acontecendo comigo, não
queria ficar 24 horas por dia pensando naquela mulher, eu não podia, esse
não era eu! Dirijo devagar e com minha cabeça encostada no apoio do banco
e penso em tudo, penso em tudo que me remete à ela.
De repente vejo onde fui parar e sorrio.
Entro primeiro na casa que minha mãe morava, passo pelo quarto, olho
tudo. Vejo fotos suas de quando era mais jovem e fotos minhas de recém
nascido, que mostravam que ela saiu daqui praticamente correndo, deixando
muita coisa para trás. Vou até a cozinha, abro a geladeira e vejo que foi
abastecida. Acho que era a avó de Ellen que cuidava de tudo e, pelo jeito,
cuidava muito bem.
Encontro uma garrafa de vinho fechado, abro, me sirvo em um copo de
molho de tomate e rio disso. Sigo até a área e entendo o porquê vim
inconscientemente para cá.
A bananeira que ela cuidava estava ali, magnífica, provavelmente como
tudo o que ela tocava. Sentei na escada com os pés no gramado aparado e
minha mente viajou para aquele dia em que a vi por aqui, a primeira vez que
nos vimos.
E aqueles olhos inocentes?
A roceira mal educada que só me dava coices no inicio, se entregou para
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mim tempos depois em um quarto de hotel. E o que aconteceu lá eu nunca


contei para ninguém… e aposto que ela também não. Só o que meu pai sabia
era que eu usei somente a boca, chupei aquela garota em tudo quanto era
lugar e amei seu gosto, amei como sua voz soava ao chamar por meu nome.
Dois pré-adolescentes ‘brincando de médico’… e que brincadeira gostosa, só
de lembrar fico duro.
Não consigo acreditar que foi com aquela mulher, a que hoje ficou frente
a frente comigo, que tive meu primeiro beijo, que foi tão especial… só agora
consigo entender a besteira que falei. Eu estava errado, nós não sabíamos o
que era o amor, ainda não sabíamos, mas eu a amava. Amei aquela selvagem
desde quando pisei aqui e achei que ela era surda, mas não… era só grossa e
mal educada mesmo.
Dou risada e bebo um gole grande do vinho. Por que diabos eu estava
pensando nela? Eu, Tay Coverick, o galinha que só queria comer e se
despedir desde o dia em que precisou partir o coração da garota que amava. O
cara com o lema "pega, mas não se apega", "come e dispensa no mesmo
minuto", não, isso estava errado!
Decido pensar em outra coisa, mas a filha da puta pula o muro bem na
minha frente com uma bacia na mão. Seus cabelos estavam molhados,
indicando que acabara de tomar banho e o cheiro de lavanda era forte e
sensual. Ellen vestia uma saia rústica até o pé, uma blusa branca de alça bem
simples, tinha jóias de madeira presas no braço acima do cotovelo e, não sei
como, ainda continuava usando minha corrente.
Engraçado que eu acreditava que, depois de hoje, ela a jogaria fora. Ela
pula o muro tal qual uma selvagem, igual antigamente, erguendo a saia até as
coxas para facilitar. Joga a bacia de alumínio no gramado fofo e vai até a
bananeira fazer seu trabalho voluntário. Como ela não me notou aqui???
— Ainda cuida dessa bananeira? — eu pergunto.
Penso que ela vai se assustar, ter uma crise e me xingar pela falta de bom
senso, mas a diaba responde normalmente como se já tivesse me visto ali. A
criatura nem hesita.
— Sim, tenho um compromisso com ela, até que ela fique velhinha. —
ela repete a frase que disse anos atrás e aquilo me deixa sem rumo e
parecendo um idiota.
— Ainda temos nossa aliança e estamos jovens… ainda posso cumprir o
que eu te prometi! — eu digo e não entendo o porquê disse aquilo.
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— Ela não significa que ainda temos algo. Guardei isso para me lembrar!
Para nunca esquecer que a vida nos dá algo e, ao mesmo tempo, tira. Que o
amor de verdade não existe, ou pelo menos não é aquele conto de fadas que a
gente cria na cabeça enquanto criança! — ela diz e me olha por um momento.
— Eu… te amava. — eu digo com dor no coração e torço para ela não
fugir.
— Você sentia muitas coisas, tenente, mas nenhuma delas era amor… —
ela diz despreocupada e eu não sei como, mas meu sangue ferve.
Eu me levanto, vou até Ellen e esmurro a enorme árvore que ela cuidava.
Faço isso ao invés de sacudí-la, tentando fazer com que ela entenda de uma
maneira ‘mais sutil’, antes que eu a machuque ou até mesmo seja grosseiro
com ela.
— EU AMEI VOCÊ, ELLEN! EU AMAVA VOCÊ!!!
— Repetir isso não ajuda, gritar muito menos. — ela se mantém calma e
centrada, não demonstra ter medo de mim, mesmo levando em consideração
o fato de que não mais me conhecia.
— O que quer que eu faça? O que preciso fazer para você me perdoar? —
eu digo com a voz alta, mas não grito mais.
O copo de molho de tomate não era grande, mas eu já me sentia tonto e
não sabia o porquê, acho que pelo fato de não ter comido quase nada, sei lá…
— Já te perdoei, você não significa nada para mim. — ela diz.
Eu abaixo meus olhos involuntariamente em sinal de tristeza e sinto meu
nariz começar a escorrer e transbordar em sangue fresco.
— Tay… — ela diz preocupada.
Eu fecho os olhos ao ouvir Ellen dizer meu nome baixinho. Aquilo doía,
doía demais. Eu me viro, tiro a camiseta para colocar no nariz e saio de perto
dela, mas ela me segue. Na mesma hora descubro a besteira que acabei de
fazer por ficar sem camisa na sua frente.
— Relaxa, isso sempre acontece. Seu nariz nunca sangrou? — eu
questiono e ela me ignora. Pega um pano de prato da gaveta da cozinha e me
faz sentar na cadeira. — Eu estou bem. Vou voltar para chácara. — digo
triste, mas ela continua me puxando para sentar.
— Vai para onde quiser, mas só depois que esse sangue parar de jorrar!
— ela diz e eu não contesto.
Ela olha para meus cortes e finge que não viu nada de uma maneira
impressionante. Ellen era discreta e educada. Seu toque em mim e seus
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cuidados, que naquele momento não tinham sentido nenhum, me faziam bem
demais.
— Levanta essa cabeça! — eu queria ficar olhando para ela, mas ela não
deixava. — Não está sol aqui, por que isso aconteceu? — ela questiona me
olhando desconfiada e eu olho para o outro lado.
— Fiquei no sol hoje o dia inteiro!
— Não é válido, já anoiteceu! Suas opções são rinite, tumores intranasais,
problemas cardíacos, doenças infecciosas, má nutrição, doenças vasculares,
intoxicação alcoólica, traumas… nada tem a ver com sol. Isso acontece desde
aquela época?
Ela cita cada doença, para por alguns segundos para pensar, eliminando
uma por uma e pesando cada uma delas. Nesse momento eu já estava
começando a me sentir doente.
— Se eu disser que é uma doença terminal, você faz amor comigo agora?
— eu questiono olhando paro teto e ela parece travar na parte de ‘doença
terminal’ e na parte de ‘fazer amor’. Quando volto a olhar para ela, vejo uma
Ellen corada e envergonhada.
— Além do cabelo diferente, você também perdeu totalmente a graça.
Não brinque com essas coisas! E não. Não existe a menor possibilidade,
nunca! — ela se recompõe e volta a me examinar.
— Mas está preocupada comigo, com certeza sofreria…
— Sou veterinária, me preocupo com todos os tipos de animais que
precisam de cuidados médicos. — ela diz e eu fecho os olhos pedindo que
aquela frase não ficasse colada em minha cabeça pelos próximos dias.
O que havia de errado comigo? Eu parecia uma menina carente e
sensível. Ela tentou fazer graça para descontrair o momento e eu fiquei
magoadinho? Meu Deus, o que eu tenho???
— Vai para casa, a hemorragia já cessou. — ela diz.
Eu tiro o pano do nariz e me levanto para ir em direção à porta, mas ela
me impede fazendo uma pergunta.
— Como está Luiza? — Ellen tem um semblante triste demais, como meu
pai tinha.
— Ela está bem. Tudo vai ficar bem, ninguém lá culpa você! Já pedimos
para você esquecer isso! — eu digo.
— Engraçado que o que eu ouvi de você foi outra coisa… e, mesmo
assim, não importa, eu mesma me culpo.
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— Ah, para! Por favor! Eu estava nervoso e tentei me desculpar. Esquece,


foi um acidente!
— Você pede desculpas demais. — ela diz, começa a caminhar até a
porta e eu respondo.
— Oras, me desculpa!!! — eu falo e ela ri.
Ao invés de prosseguir seu caminho ela para no batente da porta. Eu olho
para ela e penso em falar alguma coisa, mas tenho medo. Decido continuar
caminhando e me sento no sofá. Eu me sentia fraco demais, triste demais e só
queria que aquilo passasse. Eu cheguei e encontrei uma Ellen já mulher feita,
decidida, e que queria distância de mim. O mínimo que eu poderia fazer era
ficar distante dela, mas como ficar longe se, desde que cheguei, eu só
pensava nela? Impossível. Eu nunca devia ter voltado… me deito no sofá,
fecho os olhos e sinto que ela se aproxima de mim.
— Você está bem? Quer que eu dirija? Eu te levo lá! — ela questiona
baixo e eu sorrio triste.
— Está tentando me expulsar daqui? Eu estou bem, linda. Você pode ir
para sua casa! Eu estou bem, só me sinto cansado. — digo, mas não sinto ela
se distanciar.
Abro os olhos para entender o que ela ainda fazia ali e então a vejo a
chorando. Eu me levanto, olho para ela e lhe dou um abraço apertado. Penso
na mesma hora que ela poderia se afastar, mas isso não acontece. Ellen
corresponde e me abraça forte, talvez para matar a saudade ou para afastar o
medo que sentia ou, sei lá… poderia ser qualquer coisa.
Ficamos colados ali por alguns minutos, sem dizer nada. Eu só queria que
aqueles minutos fossem longos e demorassem para passar, pois, com seu
corpo tão próximo ao meu, eu sentia que aquele pedaço que estava faltando
em mim começava a ser preenchido por ela. Só agora eu entendi… fiz uma
nota mental de que precisava dizer para Lulu que eu tinha encontrado o que
me faltava.
— Eu te amava muito, fiquei muito machucado. Eu queria que…
— Por favor, Tay, não faça isso! — ela me interrompe e eu fico perdido.
— Por favor, me deixe falar… eu queria tanto que você soubesse como
eu me senti, como foi difícil, como sua partida me desestabilizou
completamente… — eu digo e a puxo para mim ainda mais.
Encosto meu rosto em sua bochecha e, se quiséssemos nos beijar, aquela
seria a hora. Estávamos muito perto, estava muito fácil… mas assim que
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meus carinhos começaram a tirar a selvagem do rumo, ela se afastou de mim.


— Eu sinto muito. Preciso ir embora… tenho coisas a fazer! — ela diz
como se já tivesse tomado uma decisão.
— Você está com aquele caipira? — eu pergunto.
Ela me olha confusa, parece pensar se responde ou não e toma a pior
decisão que poderia ter tomado.
— Não é da sua conta! — ela responde, começa a andar e sai pela porta,
me deixando completamente sozinho.
Respiro fundo e, definitivamente, decido esquecer aquela garota. Eu não
podia mais ficar daquele jeito, pensando nela. Ellen estava decidida a não me
perdoar e eu tinha que aceitar aquilo.
Eu me levanto, saio da casa, entro no carro e me distancio dali cantando
pneu de pura raiva. Chego na clareira e recebo uma enxurrada de perguntas:
"onde você estava?", "com quem você estava?", "por que você saiu?”. Nossa,
voltei a ser um bebê!
Respondi as perguntas e estampei um sorriso na cara porque nada mais
me abalaria dali para frente. Falava com minha mãe sobre os cursos que eu
teria que fazer nos próximos dias, sobre meus planos e diversos outros
assuntos, enquanto a moda de viola continuava com força total.
De repente dona Hella se ilumina e sorri olhando para fora da roda. Eu
acompanho seu olhar e vejo Ellen se aproximando, sem graça. Nem o fogo ali
deixava aquele lugar mais brilhante do que ela, nada a superava…
Ellen vestia um vestido curto marrom e botas baixas. Seus cabelos caiam
em cachos, dando charme a sua face já em saldo negativo de defeitos ou
imperfeições. Ela estava linda, a mais linda de todas e, ao se aproximar de
mim, meu coração vibrou de pura emoção e eu esqueci tudo o que havia
planejado sobre não deixar que ela me machucasse ou me magoasse.
— Oi! — ela diz sorrindo.
Ela havia passado um batom vermelho e, só de olhar, aquilo já me
acendeu. Logo imaginei meu corpo todo borrado de batom.
Se controla Coverick, se controla…
— Oi, Ellen! — eu digo, ela sorri e repete o cumprimento no meu ouvido.
— Oi, Tay. — ela diz baixinho, me abraça educadamente, me deixando
mais excitado do que eu já estava, e se aproxima de minha família.
Minha mãe a recebe com um abraço apertado e vejo as duas a
choramingar e cochichar pedidos mútuos de desculpas. Meu pai olha para
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mim curioso e eu volto a olhar para a fogueira.


A moça bonita me oferece um vinho quente e eu bebo de uma vez
pedindo mais. Ellen permanece um tempo conversando e curtindo a festa sem
olhar para mim e eu permaneço bebendo e desejando que ela se aproximasse.
— Quer dançar uma música caipira com uma caipira? — quando eu já
perdia as esperanças, ela se aproxima e questiona.
— Não, não sei dançar… — eu digo quase me desculpando e ela sorri, se
dirigindo até a mesa de doces.
De repente um caipira metido a gostoso segura na mão dela, fala alguma
coisa que dali não posso ouvir e eu me incomodo demais com aquilo. Ela
sorri para ele e parece aceitar sua aproximação. Ele então a puxa para o meio
da roda onde outros casais dançavam uma música lenta demais e começa a
dançar com a minha mulher.
— Ela é minha! — eu resmungo só para o universo ter certeza e meu pai
se aproxima de mim.
— Segura a onda! Ouviu??? — ele diz, mas eu ignoro. Continuo olhando
para aquela cena absurda.
Ellen dançava com ele há uma distância razoável, mas ele a puxava com
calma, fazendo com que o corpo dos dois se colassem de um jeito que, para
mim, estava obsceno demais. Quando eu começava a querer mandar aquela
música toda parar, só para não ver os dois continuarem com aquilo, o palhaço
aperta a mão em sua cintura e deposita um beijo demorado em seu pescoço.
Ali foi o limite, foi o suficiente para mim! Ando praticamente correndo,
meu pai tenta me parar, mas jogo ele longe. Chego perto dos dois, afasto os
dois com grosseria e dou um soco bem no olho do mané fazendo ele cair
surpreso no chão. E eu não paro, continuo batendo e batendo até que eu veja
seu sangue em minhas mãos. Sinto Ellen me puxando para eu parar com
aquilo, depois minha mãe e depois meu pai, mas ninguém consegue me fazer
parar.
— Vem me beijar agora, por que você não me beija, seu babaca!? — eu
digo.
O cabra se recupera depois de uns dez socos meus e me atinge também no
olho e no maxilar. Eu devolvo outro bem no estômago do filho da puta só
como vingança por ter conseguido me acertar e só o montanha do Rafa
consegue me fazer parar de me divertir.
— Ela é minha, seu filho da puta! — eu grito em direção a ele e o boi,
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como diz Pedro, começa a resmungar alguma coisa e tentar se aproximar de


mim.
Sinto Ellen me puxar para ficar ainda mais longe dele, mas ela não
consegue muito. Eu me afasto porque eu quero e porque era ela quem pedia,
e bem, eu já tinha feito o que eu queria, então não custava obedecer.
— Seu playboy desgraçado! Você é um maluco!!! — ele fala de repente e
eu me aproximo dele com Ellen quase empoleirada em mim colocando toda a
sua força para tentar me impedir.
— Sou maluco mesmo, beija ela de novo para você ver se eu não mato
você! — eu digo e ele começa a xingar todos os meus ancestrais.
— Cala a boca, Tay!!! Vem, vamos sair daqui!!! — ela grita para mim
quando eu começo a sentir o sangue que escorria escurecer a minha vista.
O boi tinha conseguido tirar meu couro. Ellen me levava para o lado
oposto do casarão, mas não eu disse nada. Se ela quisesse me levar para a
baia do Raivoso ou o que fosse… com ela eu iria. Andamos pela mata
fechada que rodeava a clareira e em pouco tempo chegamos em uma cabana
aconchegante. Eu não via nada direito, mas só pelo cheiro da lavanda eu
sabia que era onde ela ficava quando precisava dormir por aqui. Entramos e
eu me sentei em um sofá que parecia de bonecas. O lugar era a cara dela.
— Por que me trouxe aqui? — logo pergunto.
— Porque aqui guardo minha maleta de primeiros socorros e já vi que
precisará de pontos. Felipe fez um estrago em você. — ela diz e se segura
para não rir.
— Eu fiz mais nele, está bem!? — eu digo com o orgulho ferido e ela
balança a cabeça.
— Não fez, não, mas isso não importa. Eu sei me defender sozinha,
espero que essa palhaçada não volte a acontecer, você não é meu dono!!! —
ela entra no meio de minhas pernas e começa a mexer no corte.
Seguro a parte de trás de seu joelho e sinto que a dor no ferimento era
menor que a vontade que eu sentia de fazer com que ela sentasse no meu colo
e levantasse seu vestido.
— Sou, sim, você é minha, para sempre! Até ficarmos velhinhos! — eu
digo e ela faz uma cara de paisagem. — Minha!!! — eu repito e ela me olha
nos olhos, parecendo estar brava.
— Você está bêbado! Isso é vergonhoso!
— Estou bêbado, mas você é minha! Faria tudo de novo, mesmo sem
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beber. Não vou deixar que ninguém encoste em você. Entendeu? Da próxima
vez, eu mato aquele verme! — eu digo e Ellen revira os olhos.
— Cale a boca, Tay.
— Não consigo, eu te amo! — eu digo e ela me olha com os olhos
marejados sem conseguir fazer a pose que sempre faz para disfarçar seus
reais sentimentos.
Eu tinha conseguido um feito, deixei a roceira sem palavras.

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4
ELE ME AMA TANTO!

Como lidar?
Como agir após ouvir aquilo e tentar parecer indiferente?
Desde a hora que esse homem chegou, nunca mais consegui agir da
mesma forma, agir como se tivesse superado aquilo. Tay tira meu foco, me
atrapalha e eu estava completamente perturbada com sua presença. O que eu
poderia fazer? O que eu deveria responder para aquele ser?
Ele quase matou meu amigo só porque ele me beijou no pescoço, como
achar aquilo totalmente ruim? Eu deveria agir como uma mulher, achar
aquilo indevido, feio, uma atitude vergonhosa, mas como a gente mente para
si mesma? Eu nunca fui capaz de fazer isso, me sinto ridícula ao afirmar que
vê-lo morrendo de ciúmes de mim me deixou boba, me deixou feliz. Fico
envergonhada em dizer que só aceitei dançar com Felipe porque Tay recusou
e não, não foi para provocá-lo… eu só queria dançar, mas ele não só não
entendeu que aquilo era só uma dança, como também passou dos limites.
E agora eu estava aqui, sem saber como reagir diante daquela nova
informação, sem saber o que responder, o que fazer… uma frase errada e eu
mando esse deus grego para longe de mim, o que minha razão queria, mas
meu coração discordava. Uma resposta sincera vinda do coração e minha
razão me condenaria, então eu perderia noites de sono e seria meu coração o
castigado depois de tudo. Eu não sabia o que aconteceria, mas a única certeza
era que eu, no fim de tudo, sofreria tudo de novo!
— Vou dar uns três pontinhos, não mexa a cabeça. — eu digo e me sinto
uma bruxa.
— Não quero saber de pontos!!! Só me diga que não estou ficando
maluco, que não estou sentindo tudo isso sozinho. Diga que não estou
delirando, que tem algo acontecendo aqui. — Tay segura minha mão com a
agulha e se altera.
— Eu vou falar uma vez só, e quero que você me entenda bem, porque
não quero mais repetir… — eu começo a falar e ele olha nos meus olhos
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afirmando com a cabeça e concordando com sinceridade.


Só aquilo me deixa insegura, mas opto por prosseguir.
— Tudo o que houve entre a gente foi especial, foi lindo, sincero, pelo
menos da minha parte. Eu me apaixonei por você naquele quintal e nunca
vou me esquecer daquela nossa viagem, como nunca me esquecerei que você
me expulsou da sua vida à força. Mas acabou, éramos crianças e agora somos
outras pessoas. Eu não sinto mais nada por você, aquele sentimento que eu
tinha morreu quando você terminou comigo daquele jeito e eu sinto muito
por isso, sinto mais ainda em dizer tudo isso, Tay, mas foi culpa inteiramente
sua, você escolheu sua profissão, seu avô, escolheu partir e me deixar,
escolheu as palavras duras que eu me recordo até hoje e escolheu acabar com
tudo de uma maneira extremamente cruel. — tento não parecer abalada ao
falar tudo isso. — Não é porque você voltou que tudo aquilo será anulado,
que tudo mudou. Não! Continuo sendo a garota que você dispensou… e não
se arrependa, porque é tarde demais. Agora tenho minha própria vida, meu
trabalho, meus amigos que não serão mais machucados por você e, me
baseando nisso, faço minha própria escolha agora. Eu escolho continuar
vivendo a minha vida, escolho enterrar aquela noite para sempre, e não quero
reviver aquele dia, aquelas lembranças, nunca mais. Nossas mensagens estão
guardadas, as fotos, os presentes, lembranças do Rio Grande do Norte, a noite
que tivemos e que foi mágica… está tudo guardado e me recuso a esquecer,
nada e nem ninguém me fará esquecer, mas o que eu sentia acabou e quero
que você aceite isso. Eu não escolho você e você não pode me cobrar outra
atitude. — digo uma montanha de mentiras verdadeiras faladas pela minha
razão e meu coração sangra ao ouví-las.
Tay escuta tudo e seus dois oceanos secam completamente ao invés de
transbordar. Ele parece tentar entender e digerir tudo o que eu acabei de dizer
e, ao conseguir chegar a uma conclusão, ele abaixa a cabeça e carrega um
peso que eu não ousaria ajudá-lo a carregar.
— Agora eu preciso dar uns pontos aqui para seu bem ou vai ficar com
uma cicatriz horrorosa no seu rosto. — digo isso e me lembro da cena em que
o vi no quintal sem camisa.
Sou só uma “médica de bichos", não sou expert no assunto, mas afirmo
com certeza absoluta que meu bebê dos olhos azuis foi torturado naquele
lugar. Tirando os indícios que eu via de que também sofreu tortura
psicológica, me baseando em suas atitudes e numa conversa que ouvi entre e
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Hella e Max, dias antes dele chegar.


Tay era um homem bonito, inteligente e atraente. Em contrapartida era
inseguro, agressivo e instável. Deve ter sofrido por anos e não foi pouco, mas
se ele mesmo não conversasse comigo sobre isso um dia, eu não falaria. Se
até mesmo seus pais não tinham certeza do que o filho passou, não seria eu
que iria me intrometer, não nesse assunto. Sem falar no fato de que seu nariz
sangrou do nada, não uma pequena perda de sangue causada por um
rompimento de um vasinho, o que é super comum, mas uma hemorragia das
grandes.
Tay estava doente e precisava de cuidados, nisso eu pretendia falar com
sua mãe, mas com relação aos seus problemas psicológicos eu não iria me
meter e um dos motivos para tal era que talvez eu fosse um deles.
— Eu terminei. Você precisa de repouso, tem problemas com má
cicatrização e… forçar pode… — eu começo falando as recomendações, mas
ele se levanta me ignorando, resmunga um "obrigado" e sai. —...pode voltar
a abrir, os pontos. — eu continuo falando baixo depois que ele fecha a porta
atrás de si e me sinto um lixo.
Paro para pensar se não acabei de fazer com ele o que ele fez comigo
anos atrás e então penso, penso de novo, e concluo que não. Fui "carinhosa",
cordial, falei baixo, tentei falar de um jeito que não doesse tanto porque, até
então, magoá-lo não era o intuito ali, como ele fez comigo há anos atrás. Eu
só queria que ele me compreendesse e aceitasse, então me controlo e fico
com a consciência tranquila.
Não… algo estava estranho ali, algo me incomodava naquela conversa
onde só eu falei, algo me machucou e eu não conseguia encontrar a parte que
deu errado.
Eu me sento no sofá, limpo algumas lágrimas teimosas e depois me
levanto para arrumar tudo. Faço um chá para mim e escuto alguém bater na
porta. É Felipe.
— Oi, como você está? — eu questiono e o deixo entrar.
— Eu me sinto dolorido. Pensei que pudesse me ajudar com isso… —
Felipe fala rindo e aponta para a face também machucada. Nada em
comparação ao rosto de Tay, mas ainda assim deformada.
— Claro que sim, senta aqui. Te devo desculpas, eu não sabia que ele
reagiria dessa forma… e não me beije mais daquele jeito, já te disse que não
gosto daquilo! — eu digo e ele faz cara de coitadinho.
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— Perdão, você já falou mesmo… aquilo não vai mais se repetir. Agora
vem cá… aquele playboy é teu namorado, é? — ele fica curioso e eu fico
irritada.
— Para começar ele trabalha demais para ser chamado de playboy e não,
não é meu namorado. Foi quase um 'ex' quando éramos crianças, mas nem
isso. O nosso namoro só durou um dia! — eu digo sem vontade nenhuma de
me explicar e ele diz que entendeu.
Limpo seus ferimentos e coloco curativos nos piores. Levo-o até a porta e
ele me abraça antes de sair. Sinto algo estranho, como se eu estivesse sendo
observada e entro.
Antes de dormir penso em Tay. Não que eu quisesse que aquilo
acontecesse, mas não tive escolha. A vontade de me sentar em seu colo e
beijá-lo eram quase insuportáveis, meu Deus… afasto aqueles pensamentos
de mim e me deito de vestido e tudo. Adormeço por puro cansaço mental.
Acordo às cinco da manhã, tomo um banho rápido e vou até o casarão. Eu
sabia que minha mãe passaria uns dias fazendo o café lá e então segui. Entro
na cozinha e lá estava ela. O cheirinho de café impregnava o cômodo e
chegava até mesmo no quintal. Maravilhoso, era tudo o que eu precisava!
— Bom dia, mãe! — eu digo e ela me responde de cara fechada, de certo
já sabia o que tinha acontecido, mesmo que naquela hora ela não estava
presente.
— Não posso mais surrar você porque já é mulher feita, mas já sabe o que
penso sobre esse rapaz. E minha ordem é a mesma de seu tio: fique longe
dele! — ela diz baixo e eu reviro os olhos.
— Farei isso. Não porque pensa que manda em mim, mas porque essa é a
minha decisão, dona Isabelle! — eu digo e já me sirvo de café, ela para seus
afazeres e olha para mim.
— Não tenho nada contra ele, o que houve entre vocês foi quando vocês
eram crianças, nenhum dos dois sabia direito o que faziam, o que queriam da
vida, o que sentiam. Mas já foi, logo ele vai embora, não é homem para se ter
um compromisso. Não negue, eu sei que você ainda o ama e pelo o que
soube, ele sente o mesmo, mas escuta sua mãe, não é porque aquilo
aconteceu que você precisa "dar o troco", "se vingar", nada disso… não faça
esse menino sofrer porque você continua magoada. Aja como a mulher que
você se tornou. Não precisam virar inimigos, vocês se amam, ofereça a ele
sua amizade, seja a adulta aqui, porque já vi que ele não será. Não é porque
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acabou, não é porque não vai dar certo, que vocês precisam começar uma
guerra. Imagina como vai ser para você trabalhar aqui, ter que ir para clínica,
focar em carreira, se não conseguir nem olhar para esse menino, conviver
com ele!? E eu soube que ele vai ficar aqui por um bom tempo, viu! Então
faça a coisa certa! — ela diz e eu a abraço.
Saio de lá decidida a pegar mais leve com ele, realmente não precisamos
formar uma guerra por bobagem e sei que a minha amizade eu posso oferecer
para qualquer pessoa de caráter. E mesmo que ele tenha me magoado há anos
atrás, Tay continuava sendo um bom rapaz.
Vou até a sala de jantar, passo pela grande sala charmosa, subo as escadas
com uma xícara de café e penso em uma desculpa para dar. Talvez tenha
vindo aqui só para ver se os pontos abriram — o que eu realmente temia —,
ou para me desculpar por algo que eu ainda não sabia ou oferecer um café
como bandeira branca ou só vê-lo dormir mesmo… já que eu apostava que
naquela hora ele estava dormindo.
Entro no quarto que eu sabia que era o dele e a cama permanecia
arrumada, ele não estava ali. Entro no primeiro quarto de hóspedes e nada,
então só faltava um, o último quarto da direita que eu ignorei por achar que
ele estava no dele.
Abro a porta devagar, entro de fininho e o que vejo a seguir faz um
buraco se abrir embaixo dos meus pés, fazendo o assoalho de madeira antiga
ficar deformado. Tay estava deitado de barriga para cima, nu, com a hóspede
deles, também nua, e praticamente em cima dele, apoiando a cabeça em seu
peito.
Tay me amava tanto que, quando eu disse que não o queria, veio correndo
comer sua hóspede e amiga de trabalho.

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5
ENXAQUECA

Abro os olhos e concluo que não deveria ter feito isso. A enxaqueca é
tremenda, não consigo pôr em palavras o tamanho da dor que sinto.
— Deus… — resmungo como se uma prece fosse resolver. Sinto, de
repente, um peso em cima de mim e pulo com o susto.
— Mas que porra…!? — eu não grito, mas é o suficiente para Laura
acordar assustada.
— Que foi???
— Que foi!? Eu que pergunto! O que eu estou fazendo aqui? E nu? E
você? Está nua??? — levanto o lençol e fico aterrorizado. — O que eu fiz???
— pergunto mais para mim mesmo, mas Laura responde.
— Quer os detalhes ou só o básico? — ela diz enquanto se levanta
enrolada na toalha e vai direto para o banheiro.
Minhas roupas estão todas jogadas pelo chão, os produtos de higiene e
perfumes da cômoda do quarto estão todos esparramados no chão e eu não
entendo nada.
— Nós… nós transamos??? — eu questiono na porta do banheiro e Laura
sai de cara lavada e dentes escovados.
— Sim, e foi ‘uau’… — ela diz sorrindo e eu coloco as mãos na cabeça.
— Se foi ‘uau’, então por que não me lembro de nada, maluca!?
Geralmente eu me lembro das fodas ‘uau’!!! — eu digo colocando minha
roupa e ela ri.
Deus, eu mereço…
— Você bebeu, Tay, normal não se lembrar de nada. — ela diz se
aproximando de mim e eu me afasto.
— Eu tinha decidido que não era boa coisa trepar com você. Se tem algo
hoje em dia que eu faço bem é tomar meus porres e comer mulheres e, às
vezes, até as duas coisas ao mesmo tempo… agora… isso!? — eu resmungo
e quase choro.
— Tay, esquece, já rolou! Já foi… — ela diz sorrindo e eu saio do quarto.
— Meu Deus, o que eu fiz!?
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Vou para o meu quarto, sento na cama, deito, levanto, ando pelo quarto e
tento tirar de mim, o máximo de memória que eu conseguia…
Nada me vem na cabeça. Nada. Não me lembro de nada.
Quer dizer, me lembro que eu bati no maluco, Ellen me levou para ajeitar
a minha cara estragada, me deu um fora colossal, cheguei na clareira, vi o
abusado indo em direção à cabana, segui o filho da puta, ele entrou lá, ficou
um tempo e depois que saiu, agarrou Ellen na pequena varanda. Depois disso,
subi para a clareira para não matá-lo no meio do mato sem ninguém ver, bebi
mais um ou dois copos de vinho quente e depois… e depois… nada.
— Droga!!! — resmungo me lamentando profundamente.
Ando mais um pouco e me jogo na cama pensando nela. Nos seus
cuidados comigo, no seu rosto, seu perfume, seu fora…
— Eu te amo… — digo baixo como se ela pudesse ouvir e choro.
Como uma menininha carente.
Choro demais.
Tomo um banho, coloco uma roupa limpa e desço para tomar água, a sede
era inexplicável. Ressaca…
Eu me apoio na pia e uma das parentas de Ellen entra na cozinha, a
mulher que ajudou na festa ontem. Engraçado que eu me lembro do que não
devia, já do que eu devia, passo longe. Ela olha para mim com admiração e
nem consigo flertar. Se fosse em outra situação, pegava a ninfeta ali
mesmo… mas a dor moral, ressaca e culpa me impediam de paquerar àquela
hora da manhã.
— O senhor precisa de alguma coisa? — ela questiona e sua voz entra no
meu cérebro me fazendo ter vontade de me matar só para aquela dor parar.
Faço que ‘não’ com o dedo, coloco as mãos nas têmporas e depois bebo mais
um gole enorme de água.
— Ressaca moral, bebê? — minha mãe entra na cozinha, me abraça, me
beija e senta-se à mesa para o café.
— Cadê meu pai? — eu pergunto baixo porque até minha própria voz era
difícil de engolir, me sento e coloco café em uma xícara limpa.
— Está no banho, já vai descer… Ana Luiza também, já, já desce. Como
se sente, filho? — ela questiona fazendo alguma coisa, eu mantinha meus
olhos fechados para a dor amenizar.
— Eu me sinto péssimo! Posso ser guia turístico dos bares de Manaus
porque vivo frequentando todos eles, mas nunca passei por isso antes, nunca
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bebi ao ponto de ficar assim… — eu digo me lamentando profundamente.


— Você devia estar chateado, é normal, não se culpe por isso! — ela diz
e meu pai entra na cozinha.
— Bom dia, Anderson Silva! — ele zomba rindo e se senta ao lado de
minha mãe. — O que você tem? — questiona ao olhar melhor para mim.
— Ressaca. — eu digo baixo.
— Ressaca de vinho quente, mané? Tá doido? Não sabia que tu era fraco
para beber!
— Pois é, pelo jeito vinho quente não me faz muito bem! Vou me deitar
um pouco. Depois que tomar café vai até lá, pai, por favor… — eu digo e
subo devagar, cada passo era uma pontada na cabeça.
Deito na cama e apago. Pelo o que vi no relógio, uma hora depois meu
pai me chama com um copo de água nas mãos.
— Oi, vim aqui depois do café, mas você estava dormindo… te chamei
algumas vezes, mas você não respondeu. — ele diz e se senta ao meu lado.
— Eu bebi demais ontem, não é!?
— Te vi bebendo uns três copos de vinho… e depois que voltou da
cabana mais meio copo… não sei ao certo.
— Pai, me diz o que eu fiz depois que voltei de lá… não me lembro de
nada!
— Bom, você voltou de lá, aquele rapaz voltou logo atrás de você, você
se sentou ao nosso lado, começou a resmungar, brindou com a sua amiga, deu
mais alguns grandes goles e saiu me deixando falando sozinho. Pedi para
Laura ir atrás de você, te impedir de fazer mais alguma merda. — ele diz e eu
rio.
— Engraçado que ela me ajudou a fazer uma “merda”, pai, nós
transamos! — eu digo e me ajeito no travesseiro.
— Pensei que queria a Ellen de volta… — ele diz chateado.
— Era o que eu queria, mas ela já deixou bem claro que não quer saber de
nada, pai, ela não sente mais nada! — digo olhando para a parede.
— Certo, e agora? Vai ficar com essa garota? — meu pai pergunta se
levantando e passa a fazer o que eu fazia horas antes, ele anda pelo quarto
procurando uma solução para me ajudar.
— Mas é claro que não! Tirando o fato dela ser gostosa, não sinto nada
por ela. Já tinha decidido que não ia pegar a Laura, pai… trabalhamos juntos,
como seria depois!? Não dá! Quer dizer, não dava…
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— Ok, então por que mudou de idéia, ontem?


— Não sei. Não tenho a menor ideia. Vai ver fiquei bravo em ver a Ellen
abraçar aquele verme na cabana! — eu digo e ele volta a se sentar.
—Você viu ele lá?
— Vi! Vi ele passar por mim e voltei. Ela cuidou dele e se despediu com
um abraço carinhoso até demais. — eu digo e volto a sentir a raiva tremenda.
— Por causa de um abraço você comeu a outra? — ele me olha torto.
— Não faça perguntas difíceis, pai! — eu digo e alguém bate na porta.
Minha mãe entra com feições preocupadas e abre mais ainda a porta para
alguém passar. Ellen entra com sua maleta de primeiros socorros, minha mãe
olha firme para mim e eu não entendo nada.
— Ellen veio para me fazer um favor! — ela diz decidida como se eu não
pudesse contestar.
— Que favor??? Estou de ressaca, não morrendo! — eu já falo indignado
e meu pai abaixa a cabeça demonstrando que já sabia de toda aquela
conspiração.
— Só preciso de um pouco de sangue. — Ellen diz sem me olhar nos
olhos, como se estivesse chateada comigo.
Ela me dá um fora e ela fica chateada???
— Pra quê? — pergunto.
— Ellen me contou sobre a hemorragia! — minha mãe diz como se
tivesse sido traída.
— Mas eu fiquei no sol… eu…
— Não discuta comigo, Tay. Só fique quieto!
— Por que quieto??? O corpo é meu! Além do mais, poderíamos fazer os
exames no hospital. Por que ela? E por que aqui?
— Demoraríamos muito até te convencer a ir, não é mesmo!? E outra que
ela conseguirá os resultados mais rapidamente!
— Isso não faz nenhum sentido! — eu digo enquanto Ellen invade meu
espaço pessoal sem permissão e amarra um elástico maldito que puxam todos
os meus pelos.
— Você tem alguma coisa. Ou não sabe, ou nos esconde! — minha mãe
praticamente grita e meu pai chega perto dela para fazer ela se acalmar.
— Eu não tenho o porquê esconder nada! — falo e olho para a selvagem
que passava um algodão ardido em mim.
Ellen ergue uma sobrancelha como se a afirmação fosse para ela.
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— Então deixa ela fazer isso e fique quieto! — minha mãe diz mais baixo
e parece começar a chorar, mas não entendo.
Ellen tira uns quatro potinhos de sangue em silêncio e não demonstra
nenhum tipo de reação. Ela tem seu semblante sério e frio.
Não consigo entender…
— Pronto, já tenho o que eu preciso, tia! Vou mandar Ritinha trazer um
suco de laranja e um lanche. Ele vai precisar, estava fraco demais por causa
da bebida e agora ainda mais! — ela diz, dá um beijo na minha mãe e se
retira depois de ouvir minha mãe agradecer como se a bruta fosse a Madre
Teresa de Calcutá.
— Eu perdi alguma coisa aqui? — eu pergunto e minha mãe, por um
momento, parece querer voar no meu pescoço. Mas, ao contrário do que
pensei, ela só grita muito alto, muito alto!!!
— EU QUE PERDI!!! EU QUE PERDI ANOS DA MINHA VIDA
CRIANDO UM RAPAZ MAL AGRADECIDO!!! O QUE EU SOU PARA
VOCÊ, TAY??? O QUE EU SOU??? NÃO SIGNIFICO NADA PARA
VOCÊ??? SABE O QUE EU FIZ COM A MINHA VIDA PRA PODER
CRIAR VOCÊ DIREITO? JÁ NOTOU COMO ME RETRIBUIU??? —
minha mãe grita ainda mais alto e eu me levanto.
— Hella, você surtou? Fica calma!!! O que está havendo? — meu pai diz
baixo e a segura para que ela não voe em cima de mim.
— FICAR CALMA??? FICAR CALMA??? COMO EU VOU FICAR
CALMA COM ESSE MENINO??? ME SOLTA, MAX!!! ME SOLTA!!!
MOSTRA PARA O SEU PAI, MOSTRA PARA ELE AS MARCAS QUE
VOCÊ ESCONDE!!! ESSE MENINO FOI TORTURADO NAQUELE
INFERNO!!! MOSTRA PARA ELE!!! MOSTRA!!! — minha mãe grita e eu
fecho os olhos enquanto volto a me sentar.
— Torturado? — meu pai me encara e solta minha mãe que, àquela
altura, era mais uma onça furiosa do que minha própria mãe.
Ao ouvir aquilo, meu pai se aproxima de mim e levanta minha camiseta.
Eu olho para ele vejo o seu semblante assustado virar puro horror e agonia.
Ele arregala os olhos e então não era mais uma só pessoa gritando. Eram
duas. Minha cabeça latejava dolorosamente.
— Como você explica isso??? Quando você ia me contar??? O que é isso,
Tay???
— ISSO É A FORMA DELE PAGAR TUDO O QUE EU PASSEI
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PARA CRIÁ-LO!!! ISSO AÍ É A GRATIDÃO DELE, SOFRENDO EM


SILÊNCIO NAQUELE INFERNO DE LUGAR, POR ANOS!!! ANOS!!!
ABANDONA A PRÓPRIA MÃE PARA QUERER SER O HOMEM
FORTE, CORAJOSO, ORGULHAR O AVÔ E QUASE É MORTO EM
OUTRO ESTADO!!!
— Tay… — meu pai lamenta sem saber o que falar, talvez comparando o
que passou com o que eu passei. O que ele não sabia era que não tinha como
comparar.
— EU FALEI, QUANTAS VEZES EU FALEI QUE NÃO PRECISAVA
IR EMBORA??? QUANTAS VEZES EU FALEI QUE NÃO PRECISAVA
COPIAR AS DECISÕES DESGRAÇADAS DO SEU PAI E DO SEU
AVÔ??? ISSO SÓ TROUXE TRISTEZA PARA A FAMÍLIA TODA!!!
AGORA JÁ NÃO BASTAVA EU E SUA VÓ VIVER UMA VIDA ONDE
A GENTE NÃO SABIA SE NOSSO MARIDO VOLTARIA PARA CASA,
TEMOS UM FILHO E UM NETO QUE VOLTA PARA CASA COM
MARCAS DE TORTURA!!! QUANTAS VEZES EU PEDI??? QUANTAS
VEZES EU PEDI PARA VOCÊ E SEU PAI NÃO FAZEREM ISSO??? —
minha mãe não parava de gritar e minha cabeça...
— Isso não foi nada, foi há muito tempo. Essas coisas não acontecem
mais lá! Está tudo bem, mãe! — eu digo baixo para ver se ela começa a falar
baixo, mas não funciona.
— TUDO BEM??? "ESTÁ TUDO BEM, MÃE"???? O QUE EU FAÇO
COM ESSE MENINO, MAX??? O QUE EU FAÇO COM ELE??? VOCÊ
ERA UMA CRIANÇA! NÃO TINHA PORQUÊ BANCAR O HOMEM
FORTE, VOCÊ ERA SÓ UM GAROTO!!! — ela gritava e chorava de um
jeito que a dor de minha cabeça duplicou, passando também para meu
coração.
Se eu pudesse, faria qualquer coisa para não vê-la sofrer daquela forma.
Por que aquela selvagem abriu a boca???
— Quem fez isso, Tay? Por quê??? — meu pai questiona se sentando ao
meu lado.
— Era no começo, era o castigo para a postura. Os mais velhos
comandavam os mais novos… você sabe…
— Por que nunca nos contou? Eu tirava você de lá, eu resolveria tudo
isso, acabaria com aquilo. Por que nunca contou para mim? Por um momento
achou que eu te forçaria a aguentar esse tipo de coisa? Que eu diria que isso
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não era nada, ou algo assim? Tay, por que escondeu isso de nós? — meu pai
chora enquanto fala.
— Eu sabia que podia aguentar, eu sabia que você me tiraria de lá e eu
não queria parecer fraco, não queria voltar para casa e encarar o meu avô.
Não dava para ser desse jeito. Está tudo bem, pai, eu estou bem. Não
precisam se preocupar com isso! Já passou! Eu só me lembro quando alguém
fala sobre isso, convivo bem com o que aconteceu, não ficou trauma, não
ficou nada. — eu digo isso porque, simplesmente, não tinha nada melhor para
falar.
Eu não tinha treinado uma desculpa para dar sobre o que passei em
Manaus porque, na verdade, não queria que descobrissem isso nunca. Era
uma base afastada que tinha suas próprias leis. Eu ouvia que me matariam se
eu contasse e que a tortura só pioraria. Eram os grandalhões que mandavam.
Quem chorava, apanhava. Quem contava para alguém, morria. Era assim que
funcionava ou pelo menos eles diziam que era assim que funcionava.
— Você vai tirar esse menino de lá, você me ouviu? Ele não volta para lá
nem por cima do meu cadáver!!! — minha mãe dizia e caminhava de um lado
para o outro e eu, naquele momento, olho para ela.
— Eu trabalho lá, você não pode me impedir de trabalhar, ficou
maluca??? — eu pergunto e ela mal olha para mim.
— Eu posso te impedir de qualquer coisa, eu sou sua mãe, seu mal
agradecido!!! Se você voltar a pisar naquele lugar pode esquecer que um dia
teve uma mãe. Corto contato, relações, tudo. Ouse pegar aquele avião o ano
que vem! Ouse!!! — ela diz revoltada, esquecendo que sou maior de idade e
sai do quarto batendo a porta.
— Ela não pode fazer isso! — eu digo olhando para a porta fechada.
— Sua mãe pode fazer tudo. Vou falar com o Jon, vou perguntar como
podemos processar a instituição, farei tudo o que eu puder! — ele diz se
levantando e minha dor aumenta.
— Pai… não pode…
— Eu também posso fazer tudo o que eu quiser! — ele diz e sai do quarto
também, mas sem bater a porta, sem revolta. O que, no caso dele, era um
péssimo sinal.
Minutos depois, a mulher que agora eu sabia que se chamava Rita, bate
na porta e entra com um lanche que eu nem toquei. Eu me troco, colocando
um agasalho, pois estava frio lá fora, e vou atrás da ‘boca aberta’. Encontro a
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criatura no estábulo com os melhores amigos dela. Ellen vestia roupa de


montaria e estava linda como sempre. Eu me forcei a lembrar de que estava
bravo com ela, e então falei: — Qual é a tua? Por que contou tudo?
Ela para de escovar uma égua e se retira da baia para se aproximar.
— Sobre sua saúde, como médica, não fiz mais que minha obrigação!
Sobre seus sinais de tortura… eu não sei. Sua mãe arrancou tudo de mim. Eu
não pretendia contar, mas, de qualquer forma, era a coisa certa, só por isso
falei.
— Tudo bem, mas não era assunto que te diz respeito, não era uma
decisão sua! — eu falo e ela ri.
— E por acaso você pretendia contar? Se eu falasse pra você contar para
todos, você seguiria meu conselho?
— Ellen, isso envolve muito mais do que assumir que sofri quando era
pequeno. Envolve o emprego do meu pai, o casamento dele, envolve o pouco
de saúde que meu avô ainda tem… como acha que ele vai reagir quando
souber disso??? Meu avô morre se souber que sofri "por causa dele"! — eu
digo e suas feições irônicas desaparecem.
— Não pensei nisso, ninguém vai contar para ele, vai!? — ela questiona
com culpa e olha para o meu peito se aproximando mais.
— Não tem como… meu avô, uma hora ou outra, vai saber. Qual é o
problema? Isso tudo faz parte de sua vingança? — eu pergunto e ela me
encara com raiva.
— Eu nunca quis me vingar de você, isso nunca me passou pela cabeça,
só fiquei preocupada!
— Se preocupa com um cara que te fez tão mal e por isso joga toda a
merda no ventilador!? É vingança, sim! Sente ódio de mim!?
— E você? Hum? Que se vingou de mim indo pra cama com aquela
bonitona!!! Eu te falo um 'não' e, mesmo dizendo que me ama, corre para a
cama quente dela! Sem hipocrisia, Tay, mas a minha “vingança” foi para seu
próprio bem! Você está doente e precisa conversar sobre o que passou lá com
alguém, nada melhor se for com sua família!!! — ela diz e se vira para ir
embora.
— Quem te disse isso? Quem contou que fui para cama com ela??? — eu
questiono com dor, esquecendo totalmente de minhas cicatrizes.
— Eu vi. — ela fala ainda de costas para mim e depois dá meia volta para
me encarar. — Fui “fazer as pazes”, me desculpar caso tivesse te magoado ao
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dizer que não te queria mais. Eu não sabia se eu tinha sido dura demais, se eu
tinha pegado pesado sem precisar… afinal, você saiu de casa parecendo
muito chateado. Fui levar um café pra você. Minha mãe me apoiou em te
oferecer minha amizade, já que, para ela, você gosta de mim e ela acha que
eu sinto algo por você. Foi uma péssima ideia, a dela. Cheguei lá e você
estava muito ocupado, nu com a sua hóspede em cima de você. — ela diz e
volta a caminhar.
— Ellen…
— Não podemos falar sobre vingança, Tay! Nem sobre magoar, partir
coração, machucar, fazer chorar… você ganha! — ela resmunga enquanto
anda e me deixa sozinho no estábulo.
Eu fico ali parado, sem saber mais o que fazer, onde eu estava e porque
estava ali. Perco o rumo.
De repente meu telefone toca. É Pedro.
— Alô.
— Fala, brother… atende essa porra aí, mané, o que ‘tá rolando?
— Não estou em um bom dia, então é melhor você ir falando, cabo!
— Estou chegando, mané. Desci em BH, peguei um ônibus e tô chegando
em menos de duas horas. Você não atende, achei que estaria aqui… agora tô
indo sozinho!
— Você já é grandinho, não faz mais que obrigação.
— Nossa, que mau humor. Tanto faz, não importa se seu mundo acabou!
Vai me pegar na porra do terminal em uma hora, não sei onde fica essa
chácara!
— É só ligar!!!
— Ah, claro, você super atende o telefone, filho da puta! — ele diz e eu
desligo. Mais um para me encher, que péssima ideia eu tive.
Saio do estábulo e dou de cara com Laura na porta.
— Estava te procurando! — ela diz e se aproxima.
— Qual o problema? — eu questiono e continuo andando com ela na
minha cola. Isso era tudo o que eu queria evitar.
— Nenhum, queria falar com você! Oras, por que está me tratando assim?
— ela diz e eu paro.
— Olha, era por isso que eu não queria comer você, não quero você no
meu pé, não quero cobrança, não quero pé no meu saco! — digo e volto a
andar.
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— Estou me sentindo um objeto. Não entendo o que eu te fiz! — ela diz


soando triste, eu a deixo falando sozinha e aperto o passo.
Não aguentaria ficar aqui por muito tempo! Acho que já estava na hora de
pular fora…
Entro na cozinha e vejo que minha mãe estava conversando com dona
Isabelle e Rita. Assim que eu entro, a conversa cessa e as duas se dispersam
deixando minha mãe lá. Ela me olha nos olhos, eu dou um passo para chegar
perto e ela sai da cozinha, fazendo meu coração passar naquelas máquinas de
moer carne. Minha mãe não queria mais olhar na minha cara… me sento na
cadeira, encosto a testa na mesa e meu pai diz: — Relaxa, ela vai voltar ao
normal, logo.
— Eu não entendo, eu estou sendo punido porque um dia, fui punido. —
digo com a cabeça ainda na mesa. Dou uma risada nervosa.
— Sua mãe está magoada porque o filho que ela tanto ama a deixou para
trás para seguir uma profissão que ele não queria e sofreu de graça por anos,
sem dividir isso com ninguém. Agora eu estou pensando se conto para ela ou
não que esse sofrimento todo é mais recente do que a gente imagina, não
aconteceu só quando você era criança. — ele diz e eu levanto minha cabeça
olhando para onde ele se encontrava, no batente da porta vermelha da
cozinha.
— É… Jon tem contatos! Vou fazer agora o papel de pai que nunca fui,
que nunca fiz, e vou te falar: todas as escolhas que a gente faz na vida têm
uma consequência, seja perder o crescimento do filho, a convivência com a
família, a mulher que ama, e por aí vai! Toda escolha tem uma consequência.
Eu colhi o que plantei, paguei por tudo isso quando voltei da Síria e foi o pior
momento de toda a minha vida. Eu estava sem minha mulher, sem meu filho,
minha família não me reconhecia mais e pastei na mão de sua mãe que já
pretendia casar com outro. Quase enlouqueci por causa de tudo o que vivi lá,
por causa de tudo o que passei. Matei mulheres, crianças, idosos, famílias
inocentes inteiras e isso quase me custaram a sanidade. Se não fosse você,
meu filho, eu não estaria aqui! Se não fosse o amor da sua mãe, eu já teria me
matado há muito tempo…
— Pai… — eu resmungo tentando o fazer parar de me falar aquelas
coisas, mas não funciona.
— … o que eu quero te dizer é: agora já foi, você fez sua escolha, Tay!
Se escolheu o certo ou o errado só você pode dizer, agora o que precisa fazer
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é aceitar tudo isso, aceitar que Ellen não é sua, que sua mãe vai ficar
magoada pelo tempo que ela precisar, e que você perdeu tudo o que achava
importante. E incluo nisso sua alegria de viver… e perdeu mais, muito mais.
Agora quem define como seguir é você! Você pode voltar e perder sua mãe,
pode ficar e reconquistar Ellen ou pode desistir de tudo isso, subir para o
quarto chorando e ser um fracasso ambulante. Você escolhe. Mas eu repito,
toda escolha tem uma consequência e eu não aceito que, tendo parte do meu
DNA, você seja um covardão fracassado! Você sempre foi corajoso, nunca
desistiu de nada. Você já fez sua mãe sair de São Paulo, quase de madrugada,
para vir até Barbacena só para juntar nós dois… e conseguiu. Sempre foi uma
criança que sabia o que queria, algo daquele moleque irritante e inteligente
ainda tem que estar aí dentro! — meu pai diz, bate nas minhas costas e sai.
Subo para meu quarto ainda com aquele sentimento enorme de falta…
sim, me faltava alguma coisa, mas eu não sabia dizer o que era. Tomo um
banho demorado, procuro manter minha cabeça vazia e tomo uma decisão:
decido trabalhar e seguir com minha vida. Nada, além disso. Eu me arrumo,
pego o carro e vou até a rodoviária no centro, esperar pelo mané.
— Caramba, achei que não estaria aqui! — ele diz me abraçando.
Saco.
— Minha vontade era não vir. Tinha me esquecido do quão chato você
é!!!
— Fala aí, brother! Qual o problema? — ele questiona quando entra no
carro.
— Podemos parar em um lugar ou quer descansar? — eu questiono e ele
sorri.
— Cara, tudo o que eu não quero é descansar.
Dirijo e paro num bar próximo: Mineiro's. Nome sugestivo. Somos
atendidos por uma loira gostosa e Pedro coloca a mão na minha testa depois
que ela se retira.
— Tá com febre, brow? Tu nem olhou para bunda da gata naquele
uniforme minúsculo!? A gente sempre olha quando elas saem, é nosso ritual,
sem isso somos o quê? — ele diz e eu reviro os olhos.
— Já disse que estou com problemas!
— Tá, fala aí. Aposto que não são maiores que os meus… — ele diz e eu
começo. Meia hora depois ele abre a boca.
— PUTAQUEOPARIL. Você tá fodido, cara! E isso é bom porque, bom,
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isso me inspira. Quando eu penso que tô fodido, vem você e me mostra que
sempre pode piorar e que meu problema perto do seu não é nada! — Pedro
diz rindo da minha cara e para quando vê que eu não achei graça. — Certo,
desculpa. Sei falar sério quando precisa… — ele volta a falar e revira os
olhos colocando em dúvida a afirmação que acabou de dizer.
Sempre faz isso quando quer me zoar.
— Ok, tem duas coisas que eu não entendi. Se essa gostosa… ops,
desculpa, selvagem e irritante, te odeia, por que a bicha quis te ajudar no
lance dos exames??? Por que saiu correndo para te ajudar quando o cara
acabou com sua raça??? E outra, desde quando você dá PT com vinho quente,
brother? Virou mocinha? — ele questiona segurando o riso.
— Primeiro, ela é a mulher mais maluca e bipolar que eu conheço;
segundo, eu bebi demais, mais bebi do que comi. E eu não sei, estava muito
mal, tive hemorragia e tudo mais cedo… eu também acredito que não ando
bem, acordei de ressaca e depois dormi por quase duas horas! — eu falo e ele
levanta uma sobrancelha.
— É a velhice, man! — não entendo como Pedro consegue ser tão
palhaço. A alegria do novato deveria me colocar para cima, me dar um up,
por que não estava sendo assim? Por que não funcionava comigo?
— Vamos, quero ir para casa! — eu digo assim que meu suco de laranja
acaba, só porque foi o que ela disse para eu beber.
E a roceira selvagem não saía da minha cabeça… nem a garçonete loira,
que provavelmente malhava me fez esquecer. Olhei para ela e pensei em
dizer que ela deveria pintar o cabelo de preto, emagrecer bastante, tirar o
silicone e por aí vai. Inferno.
Dirijo até a chácara com Pedro falando sem parar sobre seus problemas
que eram menores, mas que ainda assim o deixavam magoado: sexo e
mulheres. Minha dor de cabeça já havia voltado quando chegamos.
Ele saiu do carro e fez a mesma cara de bobo que Laura fez olhando para
o lugar. Sim, a chácara é linda, mas não é para tanto, é!? Não sei. Acho que
tudo ali perdeu a graça para mim…
Entro pela sala, vou até a cozinha para ver se encontrava alguém para
apresentá-lo e encontro dona Isabelle fazendo café, Ellen sentada na bancada
comendo e minha mãe folheando uma revista na mesa.
— Gente, esse é o Pedro, cabo na base, e vai passar o tempo do curso
com a gente. Pedro, essa minha mãe, Hella, aquela é Ellen, a veterinária e
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tratadora dos cavalos aqui, e aquela é Isabelle, mãe dela, ajuda a gente com o
que precisar. — eu digo e ele cumprimenta todas com simpatia e um beijo no
rosto.
As três o tratam com simpatia e são bastante receptivas, mas o meu bem
estar acaba quando ele chega perto da selvagem e a cumprimenta dizendo a
merda: — Oi, gata, você é veterinária? Dizem por aí que eu sou um gato! —
ele diz fazendo as três rirem.
— Desculpe, meu lance é cavalo. — Ellen responde com simpatia e eu
reviro os olhos.
— Não tem problema… lá no Rio eu sou um cachorro, em Manaus as
amazonenses me chamam de gato, aqui posso ser um cavalo sem problema
nenhum… — ele diz fazendo as três rirem de novo e eu não aguento mais.
— Está bem, pangaré, vamos indo! — falo do jeito que Pedro sabe que
não se deve contestar e logo ele se despede com um ‘tchau’ e me acompanha.
— Cavalo, né… cavalo aguenta um soco na boca, filho da puta! — digo
baixo e soco “de leve” a costela dele enquanto caminhamos na sala em
direção às escadas.
Depois de subir toda a escada, ele arregala os olhos e, enfim, entende toda
a situação. Pelo visto eu já deveria começar a me preparar para bater nele
constantemente.

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6
TOLA

— São as regionais! Não cansa de só ficar limpando a baia? — Seu


Renan começava a me encher logo cedo.
— Você sabe que não é isso o que eu quero. Cavalgo por hobby, tio! —
eu digo e ele revira os olhos.
— Eu devo um favor a ele, ajuda seu tio, princesa! E outra, será atleta
substituta… provavelmente você nem competirá, a não ser que tenha um
forfait ou alguém adoecer misteriosamente! — ele brinca deixando nossa
conversa mais irônica e me olha triste esperando uma resposta.
— Eu vou pensar. Pensar! Ok? Nada garantido! — digo enquanto ele
sorria esperançoso e saio da cabana. Eu precisava ir para clínica e só o que o
chato fez foi me atrasar ainda mais.
Meu tio estava pedindo que eu participasse da competição de hipismo de
Barbacena. Não tinha como competir sem me comprometer, perder horas
treinando, perder o foco no trabalho entre clínica e a Pôr do Sol e, se eu
ganhasse, teria que participar de outras competições e não era nada do que eu
queria para mim naquele momento da minha vida. Eu precisava terminar de
pagar as prestações da imobiliária, focar em Raivoso — que passou a dividir
comigo a culpa no episódio de Luiza —, me atualizar e os rendimentos da
clínica não estavam lá essas coisas… então provavelmente a minha resposta
para meu tio seria não. Não tinha como ser diferente.
— Oi, mãe! — entro pela cozinha do casarão e encontro dona Isabelle
cozinhando.
— Oi, lindinha, já vai para clínica? — ela pergunta mexendo nas panelas,
o cheiro era incrível. Só de sentir eu já sabia que era carne com legumes, a
melhor comida do mundo era minha mãe que fazia.
— Vou, já tem algo pronto, aí? Preciso comer mais aqui ou levar
marmita, estou gastando muito no Mineiro's, só enriqueço a família da Lari…
— E como ela está?
— Está bem… como sempre! — eu digo, ela ajeita as panelas, abaixa o
fogo e senta na cadeira.
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— E você? Como você está? — ela questiona e eu paro de tirar umas


casquinhas de sua carne deliciosa.
— Estou bem, só estou preocupada com a clínica. Mês que vem tem outra
prestação estrondosa para pagar, todo o dinheiro que recebo aqui vai para a
imobiliária! Mas tudo bem, não é!? Vai valer à pena… — digo sorrindo e
sinto meu estômago roncar.
Nesse mesmo momento Tay entra na cozinha, deseja uma boa tarde
friamente a nós duas, pega um copo d'água e se retira. Fico me perguntando
se ele ouviu alguma coisa, mas logo tiro isso da cabeça. Minha mãe olha para
mim e parece ouvir que meu coração acelerou. Aquele cara chegava em
qualquer lugar, em qualquer situação e eu sentia a energia que ele irradiava.
O ar ao meu redor pesava e então surgia a dificuldade para respirar.
— Bom, já que você não vai me dar comida, vou embora… — digo me
levantando e fugindo dali.
Ela faz cara feia e rapidinho coloca meu prato. Como rapidamente antes
que eu precise voltar a vê-lo por ali e saio. Chego ao consultório e Lari me
recebe com um abraço caloroso.
— Oi, linda! Como você está? — ela pergunta e sorri para mim.
Lari é uma loira dos olhos azuis bem malandra e ficava na recepção de
propósito. Claro que a entrada do consultório não era agraciada só pela sua
beleza, mas pela sua simpatia com os clientes, inteligência, sagacidade e
paciência com todos. Lari é filha dos donos do Mineiro's, um bar de dia e que
a noite virava uma baladinha bem legal. Ficava aqui mesmo, no centro de
Barbacena. Trabalhei lá quando era mais nova e foi assim que a conheci, no
fim fomos estudar em BH na mesma época e, quando nos esbarramos no
campus, tamanha era nossa felicidade.
— Eu estou ótima e você? — sorrio e entro em minha sala com ela em
meu encalço.
— Estou bem, graças a Deus! Mudei sua agenda essa semana toda para as
consultas na parte da tarde, como você mandou… por causa do adestramento
do Raivoso, então, temos a primeira consulta somente às duas! — ela diz
sorrindo e se senta na cadeira a minha frente.
— Ótimo, quem é? A Lolinha está para hoje, não!? — eu falo da cachorra
da dona Martha.
A criatura traz a cadelinha toda semana, sempre procurando, ou melhor,
remediando possíveis problemas da cachorrinha que já é idosa. Lolinha era a
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cachorra mais saudável que já me consultou, mas dona Martha nunca


acreditava em mim.
— Sim, mas ela trocou o horário ontem para mais tarde, não é ela, não…
— ela diz e me olha de um jeito estranho.
— Tudo bem, garota, então quem é!? — pergunto achando graça.
— Não tenho a menor ideia, Leninha… — Lari diz com culpa e eu sorrio
puxando a agenda da mão dela.
— Certo, mas que nome anotou? O que você agendou? — olho na agenda
e vejo a frase “cliente não quis se identificar”. — Uai… — resmungo
olhando para a agenda. Paro para pensar, mas não vem nada em minha
cabeça, ninguém que possa querer me ver. — Olhou o… — começo a falar,
mas Lari me interrompe fazendo que ‘não’ com a cabeça.
— Nada. Número restrito e tudo! Só sei que é um homem.
— Que estranho. Bom, só nos resta esperar para saber, não é!? — digo e
me sento, ligando o computador. Eu tinha coisas mais importantes para me
preocupar naquele momento. — Como estão nossas contas? — pergunto
sobre minha preocupação número um.
— Bom, segundo a contabilidade, estamos ‘ok’. Sem faltas no momento.
Medicamentos, produtos, vacina… tudo em ordem. Só a próxima
mensalidade que virá bem gorda como sempre foi, mas vamos lidar com isso.
Amanhã temos visita da fiscalização, semana que vem da farmacologia,
enfim, chega a ser engraçado, somos duas solteironas rodeadas de gatos
profissionais! — Lari diz rindo e eu bufo.
— Então é isso o que pensa de mim, sua chata!? — questiono com humor
e ela continua rindo.
— Eu tudo bem, mas não entendo como uma veterinária gata não arruma
um peguete tão gato quanto! Minha seca está me matando e nem sei o porquê
comecei a falar disso! — ela diz rindo, mas dessa vez eu não.
— Ele voltou, Lari… — digo isso com dor no coração, enquanto digito o
login do sistema de atendimento da clínica. Lari me olha com os olhos
arregalados e abre a boca levemente.
— Deuses. Sério? Não acredito… como foi???
— Ele chegou ontem bem cedo. Está na chácara, veio para se atualizar
com os cursos que eles fazem, você sabe… ele nem me reconheceu de cara,
acredita!? Só teve certeza quando viu minha correntinha e o anel que me deu
quando éramos crianças… ele até travou! — digo e ela sorri para mim.
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— Que romântico! Já rolou uns amassos? Ele deve estar gato… diz que
tirou uma foto pra a titia aqui, vai!? — Lari parecia estar chocada com a
novidade.
— Esquece, querida, não teve amasso, não teve beijo, não teve nada e
nem vai ter. Acabou. O que aconteceu entre eu e ele foi há muitos anos atrás!
E não, não tem foto para titia! Quer dizer… — paro para pensar e tenho uma
ideia. — Ele trabalha na base aérea do Amazonas, deve ter alguma foto dele
no site da FAB ou sei lá. Deixa eu procurar aqui para te mostrar! — volto a
ser uma adolescente e procuro fotos de Tay pela internet. Quando, enfim,
encontro, Lari encena um desmaio ridículo. — Vem aqui, tua tonta, você não
viu a melhor parte! Vem ver o amigo que está com ele na chácara também!
Achei uma foto que Pedro e Tay tiraram juntos em um evento com índios
que a FUNAI havia criado para arrecadar alguma verba para alguma coisa…
não entendi direito e li muito por cima, só queria saber da foto. Lari levantou
do chão fingindo estar desestabilizada e encarou a próxima foto do slide que
eu mostrava.
— Nossa, que gostoso, mas por que melhor parte? Tay é mil vezes mais
gato!!! — ela diz e me olha confusa.
— Porque esse aqui está disponível para suas investidas, o deus grego,
não!!! — eu digo rindo e jogo nela as borrachas e post-its que estavam por
perto pois me segurei para não jogar o peso de papel e mandá-la para UTI.
— Está bem, ciumenta! Só o achei um deus grego, ele é todo seu. Agora,
esse gostoso aí já está de bom tamanho para mim. Como é o nome dele?
— Pedro!
— Legal, hoje vou dormir contigo na cabana. Vamos fazer uma festa do
pijama! — Lari diz sorrindo e dançando.
— Há meses que te chamo para fazer uma festa dessas! — eu digo
olhando séria para ela.
— Amiga, releva! Estou na seca e aquela sua casa de bonecas que parece
um ovo tem dois quartos! E melhor, você tem um hóspede que parece ser o
rei do sexo, tenha dó de mim! Agora me deixa voltar para o meu trabalho,
nunca vi uma chefe que deixa seus funcionários desfocados assim, tenho
certeza que depois dessa foto, nunca mais vou trabalhar direito. — ela diz
rindo e se levanta. Olho para o peso de papel e ela sai correndo. Bicha safada!
Respiro fundo, volto os slides e paro na foto dele. Por que ele tinha que
ser tão bonito? Tão gostoso? Aquilo só dificultava as coisas.
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As palavras ‘gostoso’ e ‘dificuldade’ passeiam pelo pequeno vácuo que


minha cabeça guarda para o tema “Tay”. Era um lugar vazio, muito antigo e
onde não ficava cena nenhuma. Elas apenas passeavam ali e eu podia ver,
mas depois desapareciam e não me incomodavam mais. E, por causa
daquelas palavras, a cena do deus grego com a vaca na cama apareceu para
mim naquele buraco medonho, mas dessa vez desapareceu mais lentamente,
infelizmente. Eu me perguntava o porquê dele ter feito aquilo. Obviamente
era um direito dele, obviamente não posso cobrar nada, mas eu pensei que…
— Aff… Calada, garota! Não pensou nada! — resmungo e aperto o ‘x’
da janela.
Prendo meu cabelo em um co que, respiro fundo e volto a me manter
focada enquanto pego os relatórios de saúde dos meus filhotinhos. Era o
mínimo que eu poderia fazer: trabalhar e esquecer. Mas, como nada nessa
vida é como a gente quer, como a gente programa e deseja, largo os relatórios
na mesa e pego o telefone. Digito o número que eu já sabia de cor e salteado
e espero na linha.
— Oi, doutora!
— Oi, Vicente! Como vai?
— Eu vou bem, e você?
— Bom, preocupada, não é!? Você sabe…
— Eu sei, mas você sabe que os resultados de um hemograma completo
demoram a sair! Fica calma! Já adiantei tudo o que podia para você não
esperar tanto, então se acalme!
— Não consigo…
— Essa pessoa deve ser muito importante pra você…
— Bom, eu vivo dizendo que não, mas acho que para você não preciso
mentir…
— Não precisa mesmo, eu sou a última pessoa na face da Terra que vai
querer te julgar! Somos amigos! Mas é serio, relaxa, daqui a três dias, assim
que esses resultados chegarem até mim, eu vou te ligar na mesma hora!
— Assim como eu sei que demora, você sabe que eu sei que quem faz o
exame é você, não é!? Também sei que os testes que demoram são só
confirmações… vai, me fala de uma vez o que ele tem!
— Linda, isso é totalmente antiético, vai contra tudo o que nós dois
acreditamos, tudo o que juramos na universidade, todos os anos que nos
dedicamos. Três dias, Ellen, aguenta firme!
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— Tudo bem, tem razão… mas vou colocar esses três dias e transformá-
los em anos, para o nosso próximo café!
— Que maldade! Isso também não é certo, mocinha!
— Preciso trabalhar, está bem!? Nos falamos depois!
— Está bem. Agora fica em paz. Tudo bem!? Você pode ficar sossegada!
— Está bem, doutor! Ficarei calma. Beijos, obrigada por tudo, parceiro!
— Bobagem, quando eu tiver um pet, sei que poderei contar contigo!
— Você é alérgico, garoto!!!
— Não importa! — Vicente diz rindo e eu desligo. Amigo de ouro!
Então eu tinha mais três dias de tortura. Três dias inteiros até saber o que
Tay tinha, três dias para os exames chegarem do laboratório. Eu não sabia se
aguentaria esperar ou se suportaria uma notícia ruim, não tinha como saber.
Só o que eu sabia é que estava preocupada com ele…

O dia passou lento e a clínica permaneceu vazia como já esperávamos.


Ao meio-dia, Lari saiu para almoçar e me chamou para ir junto, recusei e
continuei trabalhando com os relatórios que eu precisava e fiquei focada,
como eu queria. Uma hora depois Lari volta e entra na sala após bater quase
violentamente.
— VOCÊ NÃO SABE QUEM ESTAVA LÁ NA MINHA
CASA/RESTAURANTE! — ela diz pasma e eu finjo prestar atenção no que
lia: os índices de estresse nos resultados dos exames do Beethoven.
— Quem? — eu pergunto e pego a agenda para ligar para Cristiano, dono
do São Bernardo lindo que eu amava.
— O deus grego e o gostoso!!! — ela diz e meus olhos fogem da agenda
na página ‘C’ para olhar para ela.
— Sério? No Mineiro's? — eu finjo indiferença.
— Sério. E mãezoca disse que não era a primeira vez deles lá… e essa
não é a pior parte, eu me sentei na mesa com eles, me apresentei e tudo! Só a
morena não curtiu muito minha fuça, mas… — ela diz e eu sorrio.
— Deve ser a garota que o deus grego come, peguei os dois na cama
ontem! — eu digo e seu queixo cai.
— Como assim???
— Isso é papo para a festa do pijama. Vai, conta tudo, o que

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conversaram? — eu pergunto e largo a agenda. Desisto.


— Bom, eu achei eles parecidos demais com a foto, entrei no site pelo
celular e confirmei. Aí eu me sentei, me apresentei… o gostosão arrastou a
cadeira para o meu lado, mas seu deus grego mal me cumprimentou, parecia
estressado, bravo com alguma coisa! Ele fica sempre de cara amarrada, é!? —
ela questiona e eu afirmo me lamentando, Tay era realmente um pé no saco
no quesito simpatia. — Então, conversamos um pouco, falei que era sua
recepcionista e o deus grego me perguntou onde ficava sua clínica, respondi,
ele voltou a beber e eu continuei conversando com o gostoso. A morena
nojenta mal olhou na minha cara, mas fui simpática mesmo assim e até falei
da nossa festinha do pijama. Disse que os três estavam convidados! — Lari
diz e eu olho para ela com sangue nos olhos.
— Você é maluca? Quando concordei com essa maluquice, eu imaginava
que era uma festa para nós duas! NÓS DUAS, sua maluca! Tay e eu não
estamos nos falando bem… na verdade, não nos damos bem. Você é
doida??? — eu quase grito de nervoso e a maluca ri.
— Relaxa, ele não vai até lá. Mas o gostoso vai… — ela diz sorrindo e eu
me sinto mal.
— Ele disse que não ia??? Aliás, o que ele estava bebendo? — questiono
sem graça e ela não zomba de mim.
—Sim, ele disse: "obrigado, senhorita Larissa, pelo convite, mas
dispenso!". Aí o gostoso riu e disse: "Não, mas eu irei com certeza… Topa,
gatinha?". Ele perguntou olhando para a morena e ela repetiu a frase do deus
grego. E… — ela faz uma pausa para pensar — …era suco de laranja, eu
acho, enfim. Você não precisa ficar brava comigo, ele não vai aparecer! —
ela disse tudo imitando a voz dos dois, mas eu não ri. Apenas fiquei tranquila
com o fato de que ele não estava bebendo, não estava sendo descuidado.
— Não estou brava, só decepcionada! Você é muito bocão!!! — eu digo e
ela faz cara de quem ficou sentida.
— Quer que eu ligue e desmarque?
— Pegou o telefone dele, Larissa? Não acredito, mulher!
— Peguei oras, ele é tão lindo! E foi ele que me ofereceu, como recusar?
— Lari diz e finge querer levantar da cadeira por puro medo.
— Ai, você não existe, não sei o que faço com você! Sai da minha frente,
garota atrevida! — eu falo rindo e ela se levanta.
Imagino um do lado do outro e vejo que formam um bonito casal, pena
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que, pelo jeito, ele não presta. Se bem que Tay também não presta…
— Já, já tem a visita misteriosa… existe alguém que eu deva impedir de
entrar? — ela me pergunta batendo no braço como um macho-alfa e eu
respiro fundo.
— Ele. Se for ele, arrume uma desculpa. Não quero vê-lo! — eu digo
enquanto ela concorda e sai.
Mentira, tudo o que meu coração queria era ficar perto daquele homem.
Mas eu estava de parabéns, estava deixando toda essa situação sob controle.
Guardei para mim tudo o que sentia e assim eu iria permanecer. Era o melhor
que podia fazer. Era o melhor para os dois.
Ligo para Cristiano e aviso da alta do Beethoven. Digo que ele já pode ir
para casa, mas o alerto a respeito do estresse e passo os exercícios
recomendados para o caso dele. Fiquei extremamente preocupada com o
grande cão e anotei mentalmente que ia tentar visitá-lo para ver como ele
estava, o espaço que ele tinha, como ele estava sendo tratado, enfim… nada
que faça parte de minha obrigação como veterinária, mas eu não conseguia
ficar indiferente ao seu relatório. Cristiano viria dentro de uma hora, então
voltei às analises dos relatórios dos outros pets, lendo e relendo por um bom
tempo. Estresse era o mais relax dos problemas que os anjinhos
apresentavam.
— Psiu! Ele está aí… nossa visita misteriosa é o deus grego!!! — Lari
entra de repente.
Ela fecha a porta encosta nela como se Tay fosse querer arrombá-la e ela
não permitiria. Eu lamento, respiro fundo e me encosto no apoio da cadeira.
— Disse que eu não estava como combinamos, Larissa??? — perguntei
desanimada e nervosa, já sabendo a resposta.
— Não, amiga, ele chegou na minha frente e disse: “gostaria de falar com
a Ellen, por gentileza”. Aí eu ia dizer que você não estava e ele disse: "Agora,
senhorita Larissa!". Então eu fiquei travada, não consegui falar mais nada, me
levantei e vim aqui. Ele parece ter tanto pra falar, atende ele, amiga! — ela
diz manhosa e eu perco a paciência.
— Tá, tá, vai, deixe ele entrar!!! — eu falo arrumando minha própria
postura na cadeira e ela volta ao normal, sorrindo feito uma tonta.
— Está bem, agora arruma esse cabelo! — ela rosna baixo ao sair e eu
reviro os olhos.
Meu cabelo estava um caos e um caos permaneceria. Era bom que ele
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refletisse o que eu sentia por dentro, principalmente com Tay ali.


— Boa tarde, doutora! — ele entra e olha ao redor.
Tay era grande, aquele dito popular “homão da porra”, e sua presença
abalava até mesmo um recinto vazio. Controlo minha respiração e permaneço
em silêncio. Ele se senta em minha frente, fica uns vinte segundos me
olhando nos olhos e, quando nota que eu não falaria nada, começa a fuçar nas
coisas em cima da mesa descontraidamente. Por um momento chego a ver
nele o velho Tay que tanto amei, um garoto ingênuo. Sensível, bem
humorado…
— O que faz aqui? Como posso te ajudar, Tay? — pergunto tentando soar
a profissional quando minha paciência acaba, e ela não durou um minuto.
— Não tenho a menor ideia. Acho que só vim para conhecer seu trabalho
e, aliás, você fica bem de branco! Está linda demais! — ele diz olhando para
mim, pega um retrato meu com minha mãe e sinto o suor frio na testa.
Em cima de minha mesa havia um dos retratos que tiramos juntos, ele me
beijando e eu de olhos fechados, com a luz do sol dando um charme. Estavam
todos virados para mim, ele não podia ver sem que pegasse e os virasse e eu,
naquele momento, orei para ele parar de mexer na minha mesa. Eu sabia que
ele estava procurando por ele, ele procurava por aquele retrato e não ia parar
até encontrá-lo. E também sabia que eu estava nervosa, porque me olhava nos
olhos tentando me ler e sorria orgulhoso. Parecia querer saber se estava
chegando perto de encontrá-lo se baseando em minha reação.
— Tem como parar? Diga o que quer dizer e vá embora porque preciso
trabalhar! — eu digo e ele devolve ao lugar um retrato meu e do Farol juntos.
— Ah, não se preocupe, pagarei pela consulta. Acho que quero três horas
para colocar o papo em dia com você… vamos começar? Ok, eu estou
pensando em comprar um cãozinho para Lulu, vi que sua clínica tem uma
loja aqui do lado… — ele diz e volta a pegar um retrato meu, só que agora,
sozinha.
— Não é uma loja, não venderia seres tão inocentes! São todos para
adoção, pode escolher qualquer um e usar suas duas horas e cinquenta e oito
minutos para decidir qual Luiza vai gostar mais! — eu digo e me levanto.
Quando chego até a porta, a criatura pega o retrato certo e fica em
silêncio olhando para a foto mais bizarra que eu já tirei com alguém, aquela
bendita foto surpresa que você sai toda 'torta'. Torço para que ele não
pergunte o porquê eu ainda guardo aquilo e espero, segurando com força a
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vontade que eu tinha de chorar. Tay pega o retrato nas mãos e apóia seus dois
cotovelos na mesa, volto a fechar a porta e permaneço parada no mesmo
lugar, tentando ter um pouco de paciência. Afinal, não era preciso destratá-lo.
— Você me trata com frieza, mas me ama… parece me odiar, mas guarda
todas as nossas lembranças com você. Como consegue atuar tanto? Deveria
ser atriz, não veterinária! — ele diz com a voz que provavelmente assustou
Lari, mas não fico intimidada.
Em um rompante, este sim que muito me assustou, ele se levanta e chega
perto de mim, segurando o retrato nas mãos. Tay tinha raiva nos olhos.
— Pelo menos uma vez na vida me diga o que realmente sente por
mim… seja sincera comigo! — ele diz bravo.
Tay coloca o retrato no armário ao meu lado e me imprensa na parede.
Coloca suas mãos ao meu redor, me impedindo de sair dali, e se aproxima
como se fosse me beijar. Seu perfume é diferente agora, mas seu cheiro
próprio, juntamente com o cheiro de roupa limpa, eram os mesmos que eu me
lembrava.
— Quer saber o sinto agora??? — questiono enquanto ele olhava para
minha boca, aposto que sentia o cheiro do meu hálito como eu sentia o dele.
— Por favor! — ele sussurra e sinto medo em seu pedido.
— Sinto enjoo. Com você assim tão perto, posso sentir o cheiro daquela
vadia em você! O cheiro dela está em você até agora, não importa quantas
vezes tome banho, não importa quantas vezes me peça perdão, todas as vezes
que eu olhar em seus olhos, a cena de vocês dois na cama surgirá em minha
cabeça! E não importa o que sinto, não importa quantas lembranças ainda
guardo de nós dois, nada será como antes, nunca te darei outra chance, nunca
ficaremos juntos! Não porque você foi embora, porque se deitou com outras
ou porque não é o mesmo Tay que conheci, não ficaremos juntos porque eu
não quero! — digo surpresa comigo mesma. Ele confirma com a cabeça
enquanto encosta seu corpo no meu e me abraça devagar, tudo isso sem
retirar seus olhos dos meus.
E eu, que nunca senti aquilo antes, totalmente inexperiente, não tenho
força nenhuma para afastá-lo dali, tirá-lo de perto mim… ele tira suas mãos
da parede e coloca em volta de minha cintura, seu músculo que tocava minha
virilha de repente cresce e minha respiração acelera. Naquele momento me
desarmo, toco suas costas com minhas mãos e encosto meu nariz em seu
pescoço… e eu sabia que nunca mais esqueceria aquele cheiro. Nunca mais
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esqueceria aquele momento.


Minhas mãos foram das suas costas para seu pescoço involuntariamente e
ele se aproveitou disso para me apertar ainda mais contra a parede. Agora eu
estava vulnerável, meus seios doíam de uma maneira incrivelmente deliciosa,
minha intimidade pulsava de um jeito que nunca pulsou antes, e por ninguém
na face da terra. A respiração dele começou a ficar ofegante no mesmo
momento que a minha e, depois de minutos assim, só agarrados um ao outro,
ele diz com sua voz alterada pela excitação: — Seu cheiro ainda é o mesmo,
me pergunto se seu gosto permanece o mesmo… deve estar ainda melhor! Eu
me lembro, sabia!? Eu me lembro do seu gosto na minha boca até hoje, eu
sonho com aquela noite, a nossa noite. — ele sorri de um jeito sexy,
aproxima sua boca da minha e sussurra. — Você se lembra por quanto tempo
chupei você? Por quanto tempo mamei em você? Lembra-se do que me dizia
enquanto minha boca ficava ocupada? Se lembra em como minha boca ficou
depois que você chegou ao limite!? Ficou encharcada, encharcada demais. Te
chupei por quase uma hora e você gemia baixinho para mim, mal conseguia
explicar o que estava sentindo, mas era real, era de verdade, e quando eu
ameaçava me afastar, você prendia minha cabeça com as pernas. Minha
pequena insaciável. Aposto que não contou nada daquilo para ninguém, mas
nunca conseguiu esquecer, assim como eu!!! — ele diz com a sua testa
colada na minha e eu fico molhada, minhas partes íntimas latejam e chegam a
doer.
Eu sabia que essa dor só passaria se ele me tocasse. Tento me livrar de
seu abraço, mas ele me aperta ainda mais, olha mais profundamente nos meus
olhos e continua falando baixo só para eu escutar.
— Pare de fugir de mim, me perdoa, volta para mim! Não paro de pensar
em você um só minuto! Eu tentei, juro que tentei me afastar, mas é
impossível, pequena! Eu estou completamente maluco por você! Para um
pouco de pensar na merda que fiz na noite de ontem, no nosso passado. Em
nenhuma dessas situações agi como eu quis, nas duas situações eu estava fora
de mim. Pare um pouco e escute o que eu estou falando, se parar para prestar
atenção, notará que estou implorando para você voltar para mim, estou
implorando para você ser minha de novo. Eu não aguento olhar para você e
não poder te tocar, Ellen! Não aguento ficar perto de você sem poder te
abraçar e te beijar! Eu me apaixonei por você de novo! Estou maluco por ti
pela segunda vez. — ele diz e começa a beijar de leve meu pescoço. Minhas
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pernas ficam bambas e, ao sentir isso, ele me segura mais firme pensando em
minha segurança. Eu acho.
— Você já tem alguém, deveria respeitar sua namoradinha. — eu digo
com a voz fraca e quase gaguejo.
— Ela não é minha namorada, eu não tenho ninguém e aquela noite foi
um erro, eu nem me lembro de nada, Ellen, não me lembro nem de como
cheguei até lá. Por favor, me perdoa! Não sinto nada por ela, eu quero você!!!
— Tay ainda falava baixo e parecia sincero, e isso foi difícil de engolir.
Saber, ou melhor, sentir que tudo aquilo era sincero e ainda assim ‘não poder
retribuir’, era desolador.
— Se afasta de mim, Tay, já disse que não quero você, não sinto nada por
você! — eu digo e ele aperta a minha cintura contra a cintura dele, eu sinto
seus dedos apertarem conscientemente minha cintura, me desejando.
Era como se Tay não quisesse só por ele mesmo, só porque gostava de
mim, ou só porque eu era “alvo fácil” ali… era como se todas as versões dele
me quisessem de um jeito que nem ele poderia explicar. Eu senti isso e tive
certeza — assim com tinha certeza de que eu precisava de ar para sobreviver
— que, mesmo com ele ali, não me restava quase nada do que deveria existir
para me manter de pé. Era como se ele se segurasse para não me despir e
sofria com a dúvida de fazer o certo, em vez de agir por impulso.
— Esse colar, aquele retrato, seus olhos, sua voz, sua respiração e seu
corpo dizem o contrário. Posso apostar que você está extremamente molhada
assim como eu estou duro aqui. A gente se ama, Ellen, você não pode negar!
— ele diz e fico ainda mais excitada.
— Eu não amo você e você está completamente errado, não estou
sentindo nada! — eu digo, me forçando a parecer convicta.
— Então prova, me deixa ver, amor… — ele diz abrindo o botão da
minha calça jeans branca devagar, para me dar tempo de protestar.
Vou confessar que foi a situação mais difícil pela qual já passei, fugir de
seus encantos, suas palavras doces, seu feitiço… mas naquele momento a
maldita cena dele na cama com a garota reaparece para mim, dessa vez me
fazendo um favor, porque eu sabia onde chegaríamos. Eu sabia que Tay
avançaria o sinal e aquilo seria perigoso demais, simplesmente porque eu
também queria… no fundo eu queria demais. E assumir isso era ruim demais
para mim. Só que aquela cena não serviu só para interromper o clima, serviu
para me deixar péssima.
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— Para! — digo com dificuldade e ele me olha imediatamente.


— Não posso. Não posso parar! — ele diz parecendo sofrer e fico ainda
mais triste.
— Você pode, e vai! — eu digo chorando e ele me olha sem entender.
Não pude evitar, Tay me deixava completamente desestabilizada ali,
dizendo tudo aquilo, me fazendo relembrar coisas dolorosas, mexendo com
meu emocional. Eu não consegui evitar.
— Ellen… — ele lamenta tocando minha face molhada e parecia querer
me pegar no colo e me ninar.
E eu o odiava por isso.
— Vai embora! Isso não podia ter acontecido! Não posso te oferecer nada
além de uma amizade, nada além disso. Isso está errado, você não deveria
estar aqui e eu não deveria te dar ouvidos! Isso aqui não vai se repetir nunca
mais, não vai voltar a tocar em mim de forma nenhuma. — eu me afasto e
dou-lhe as costas, enquanto fecho novamente o botão da minha calça jeans.
— Aconteceu porque a gente se ama! Sei que você me ama… por que me
evita tanto? Do que tem medo? Não vou magoar você de novo, nunca mais
farei isso! — ele diz se aproximando e me toca, mas eu me afasto.
— Quem ama não faz o que você fez, não se deita com uma enquanto diz
amar a outra. Quem ama não abandona, não maltrata, não engana… E eu te
evito porque você não me merece! Sou melhor agora, sou outra pessoa agora.
E o que fez comigo, nunca vou conseguir esquecer!
— Para começar, você disse que me perdoou, disse que havia esquecido
nosso passado, deixado ele para trás, que não tinha mágoas de mim. E está
tratando o lance com a Laura como se tivesse sido uma traição, mas você
disse que não me queria!
— E ainda não quero… — eu digo e faço seus olhos se encherem de
lágrimas. Sento-me no sofá no canto da sala e escondo o rosto nas mãos.
— Você mente enquanto sua calcinha fala a verdade. Eu tenho certeza
que sentiu algo ali, junto comigo… foi surreal! Assim como nunca senti com
mulher nenhuma! — ele diz se aproximando.
— Você é um cara bonito, gosto de caras bonitos. E você é gostoso, que
mulher em sã consciência não tiraria uma casquinha!? Você tem charme e é
só isso, Tay, só o charme e beleza que todo mulherengo tem! — eu digo e
meu coração que, há poucos minutos vibrava de felicidade, agora me
castigava, me causando dor.
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— Sei que nunca se baseou em beleza, duvido que isso mudou. Duvido
que outro “cara bonito” faria isso com você, faria você sentir o que você está
sentindo! — ele diz chateado e me encara de pé.
— O que estou sentindo é só culpa por ter abraçado você!!! Não sinto
nada por você, tenho opções melhores por aí! Agora, por favor, não torne
tudo isso mais difícil, não quero magoar você, não fique insistindo nisso. —
pauso a fala e faço pose para parecer arrogante assim como ele era. — Eu
mudei, agora só pego homens bonitos! Para ser mais precisa, um a cada
semana e, mesmo assim, você nunca será uma das minhas opções. — digo e
ele ri alto, levanto meu olhar e não consigo acreditar naquela cena.
— Você é patética! Sei que não pega ninguém há muito tempo! Se deu
alguns beijinhos na faculdade foi muito. Você é virgem, Ellen!!! Não queira
fazer a malvada pegadora comigo, porque não vai colar! Seu forte é trabalhar
e não sair por aí pegando geral!
— Quem disse que sou virgem, de onde você tirou isso??? — pergunto e
gargalho nervosa, mas tento não demonstrar a raiva e a insegurança que eu
sentia.
— Eu comi mulheres o suficiente para saber diferenciar. E você é virgem!
Passou todos esses anos presa a mim, ninguém te interessava, pelo menos não
sexualmente, não falando em amor, não depois de passar algumas noites no
Rio Grande do Norte comigo! Se guardou para mim, Ellen,
inconscientemente me esperou porque é minha e sabe disso. Você sempre me
amou e estava me esperando! Consigo ver isso só de olhar para você. — ele
diz quase gritando, mas termina seu discurso se controlando.
Aposto que fico vermelha.
— Agora é você quem está sendo patético… — eu digo sorrindo, me
recomponho e me dirijo a minha mesa, mas, ao passar por ele, ele me pega
pelo braço me fazendo parar e me puxa para si.
— Assuma! Assuma para mim que nunca deixou homem nenhum te tocar
porque não era eu, porque você me ama e nenhum dos caras que tentaram
conseguiram fazer você me esquecer! — ele diz e aperta meu braço, mas não
me machuca, dessa vez me intimida.
— Eu sou virgem, mas não me envergonho disso por causa de minha
idade, sinto é muito orgulho, se você quer saber, permaneço assim porque
quero, por opção minha, não por tua causa, não porque te esperei. Acho
melhor você parar de se achar tão importante, ou vai cair do cavalo!
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— Realmente não é motivo para se envergonhar, muito pelo contrário!


Mas esse fato só piora a nossa situação, porque agora não vou deixar você
sozinha nunca mais, você é minha e ninguém toca! E não ando de cavalo,
quem anda e pode cair aqui, é você!
— E você precisa de ajuda psicológica! Eu não sou de ninguém. E, para
deixar claro, as chances de você cair de um cavalo, mesmo não montando em
um, são enormes se comparadas às chances de que EU caia de um! Então me
deixa em paz! — falo parecendo confusa e ele ri.
— Que historia é essa de festa do pijama? — ele questiona quando me
larga e eu volto para minha mesa.
— Não é da sua conta!
— É da minha conta, é na minha casa! — ele diz e senta novamente,
agora olhava em meus olhos.
— A cabana não é sua casa! É MINHA! Assim como o estábulo! São
propriedades minhas! — eu digo uma mentira deslavada. Nada ali era meu,
era tudo dele.
— Dois lugares que estão dentro dos limites de minha chácara, portanto
são meus! E não é porque só você cuida que eles passam a ser seus, pago
você para isso!
— Não são seus, são meus!!! Eu não só cuido, eu mantenho, eu limpo, eu
vigio e sem mim não existiriam! E nem você sabia que me pagava, eu sei que
é Luiza, sua irmã de treze anos, que cuida das suas contas. Portanto são
meus!
— Podemos ficar aqui até amanhã ou você pode me dizer que história é
essa… — ele diz sorrindo enquanto olha para meu decote quando tiro o
jaleco para me livrar do calor surreal que eu sentia.
Tay umedece os lábios e sinto minhas partes íntimas latejarem com
aquilo, não entendia que descontrole era aquele, nunca fui assim.
— Lari que inventou, ela não sabia que vocês estariam lá, acabou abrindo
a boca porque gostou do Pedro e quer conhecê-lo.
— Não quero homens na cabana! — ele diz e eu reviro os olhos.
— Você não tem que querer, convido quem eu quiser para a MINHA
casa!
— Pode dizer isso e cuidar de feridos à bala, o que vai estragar sua noite,
ou pode seguir o conselho que eu estou te dando e ficar quieta em casa, só
com sua amiga. Sem machos, sem Felipe’s, sem Juliano’s, sem Pedro’s, sem
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ninguém… — ele diz e sei que falava a verdade. Fico com medo de seu lado
psicopata ciumento, mas disfarço.
— Você não manda em mim! O que faço com minha vida e as decisões
que tomo não lhe dizem respeito. Ouse atacar outro amigo meu! Processo
você, registro um boletim!
— Você é minha e eu te amo, isso significa que posso mais do que
“mandar em você”. — ele diz me olhando nos olhos e eu, como sempre, fico
sem reação.
— Tay, vai embora, eu preciso trabalhar, é sério! Não tenho mais nada
para falar com você! Tenho muitos relatórios para revisar e preciso me
concentrar, você está me atrapalhando e atrasando o meu trabalho! — digo
sem paciência e ele me ignora.
— Tsc, tsc… depois de ficarmos por quase meia-hora abraçados, como
ficamos agora pouco, você vai fazer qualquer coisa hoje, menos trabalhar
realmente… aliás, sua amiga perguntou se era eu “o cara que ligou aqui
marcando horário e não quis se identificar”! Eu disse que sim pra ela não
atrapalhar minha entrada, mas não fui eu quem fez isso. Isso é perigoso,
vocês tem seguranças aqui? — ele pergunta ao se levantar, vai até a estante e
traz para a mesa nosso retrato juntos.
— Não. Não temos segurança! — digo fingindo mexer no computador,
mas fico preocupada. Se não foi ele, quem seria!?
— Se importaria se eu colocasse aqui alguns militares para fazer esse
trabalho, já que você ainda não fez isso? Já que não leva a sério sua própria
segurança e a de sua recepcionista!? — ele questiona olhando para a foto e
finjo estar entediada.
— Eu me importaria, não é necessário tudo isso! De qualquer forma, acho
que seus amigos militares têm mais o que fazer!
— Muitos deles procuram esse tipo de trabalho para ganhar um extra e
todos têm porte de armas, então vocês estarão seguras!
— Estou aqui há anos, nada me aconteceu. Não acho que agora algo
mude. Então a minha resposta para sua ideia ridícula é NÃO! — eu digo e ele
levanta seus olhos para mim, suas feições mudam de repente e ficam sérias
demais, por mais um pouco eu me sentiria ‘amedrontada’.
— Vou mandar de qualquer jeito. Se você me apoiar, eles terão um
conforto maior para poder vir beber uma água, tomar um café aqui dentro,
usar o banheiro… não é um pedido de casamento, é só uma ajuda com sua
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própria segurança. Você me ofereceu sua amizade. Como amigos, poderia


aceitar e não dificultar as coisas!
— É você quem não tem que dificultar! Ainda não entendi o que faz aqui.
Está me tirando o tempo, preciso trabalhar e você está me atrapalhando, vá
para casa! — eu digo com ‘calma’ e ele se levanta.
— Vou ficar aqui até o cliente desconhecido chegar, vou bater um papo
com a “Lari” lá fora, para não te atrapalhar. Você se importa!? — ele
questiona levantando a nossa fotografia.
Era um teste ridículo para constatar o quão possessiva eu era sobre nossa
foto, eu sabia. Automaticamente ele mudou suas feições para o modo ironia.
Tay conseguia ser mais bipolar do que eu.
— Não, pode levar se quiser! — eu digo dando de ombros com o coração
apertado.
Ele segue até a porta com o nosso retrato nas mãos. Ele levaria minha
fotografia embora.
— Não. Me dá. É minha…!!! — digo baixo, vou até lá pisando firme,
estendo a mão e ele me devolve a fotografia sorrindo.
Ordinário.
Abro a porta para ele, ele caminha pela recepção olhando tudo e depois se
senta em frente à Lari na mesa da recepção. Ela me olha assustada, eu reviro
os olhos e fecho a porta. Encosto na porta por dentro e solto a respiração que
eu havia guardado todo aquele tempo.
Meu Deus, o que eu fiz??? Depois de tanto tempo, como podia deixar
aquele homem mexer comigo daquele jeito? Eu sento-me à mesa e me seguro
para não apertar o viva-voz do telefone. Eu queria trabalhar, não ficar de olho
naquele crápula. Penso um pouco e aperto o viva-voz mesmo assim.
Eu sou uma idiota.
— E então, senhorita Larissa… como andam as coisas por aqui?
— Andam bem, tenente!
— Ellen precisa de alguma coisa?
— Bom, já que perguntou até que precisa… uma cafeteira nova, sabe!?
Daquelas importadas que fazem cappuccino!? Então… um filtro de água,
uma cadeira para recepção que seja mais confortável que essa, alguns
materiais de escritório que ela não compra há anos, um quadro ali menos
brega… ela está precisando aumentar meu salário também… — Tay ri
descontraído e eu fico com ciúmes.
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— Certo, e a Ellen? Está precisando de alguma coisa? — ele questiona de


novo e os dois riem, até eu.
— Não, ela está bem… o quadro é do Farol, ela super-curte cavalos! —
Lari responde e os dois riem de novo. — Você gosta dela? — ela questiona
com a voz melosa e eu reviro os olhos.
— Eu a amo. Muito. Desde criança, acredita!? — escuto isso e meu
coração se aperta. Aliás, todas as vezes que ele diz que me ama, eu fico
tocada e me condeno por isso.
— É por isso que está aqui?
— É. Eu estou aqui porque a quero de volta. E ela, me ama? — há um
silêncio antes que Lari responda.
— Não, ela já superou.
— Entendo.
— Vocês se entenderam?
— Não, acho que nunca vamos nos entender. Fiz muita merda!
— É mesmo! Fez sim. — sinto seu tom de voz acusador.
— Ela tem alguém, Larissa?
— Ela tem umas paqueras aí… mas alguém mesmo, alguém assim, não,
ainda não!
— Sei.
— Sabe como é, não é!? Ellen é uma médica veterinária gata, os caras da
cidade caem matando.
— E um terço ou dois fogem de medo! — eu resmungo me lamentando.
— Mas eu voltei. Todos eles cairão mortos se chegarem perto dela.
Nossa, falou o Thor.
— Deus de misericórdia!
— Deus não tem misericórdia quando fico enciumado, por isso acho
melhor vocês cancelarem a tal festinha na cabana hoje à noite.
Está bem, Thor…
— Certo… Está bem!
Fraca.
— Ótimo! Vou me sentar ali e esperar o tal cliente misterioso. Está bem?
— Claro, fi… fique à vontade! — Lari gagueja e eu desligo.
Bicha medrosa!
Essa atitude possessiva e antiquada só me deixava louca para fazer uma
festa do pijama com os homens da cidade inteira. Babaca. Acabou de chegar
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e pensa que tem algum controle sobre minha vida? Volto a trabalhar brava e
frustrada, mas ainda assim me sentindo segura com o Thor na recepção,
afinal esse lance de cliente misterioso estava me deixando grilada.
Vinte minutos depois, uma Lari sofrida entra na minha sala anunciando o
cliente misterioso. Era Juliano, mas não o comum, não meu amigo da
fazenda, mas sim um Juliano super cheiroso e segurando um buquê de rosas
vermelhas.
Eu odeio rosas vermelhas.
Fico sem saber o que dizer e me levanto. Lari e Tay esquecem os bons
modos e entram na sala junto com ele.
— Surpresa… — Juliano diz sorrindo e sem graça.
— Ahn… por que isso? Não precisava... — digo pegando as flores que
ele me oferecia e forço um sorriso.
— Bom, vim te fazer um convite que há muito tempo queria fazer… tem
algo para fazer hoje à noite!? — ele questiona ainda sem graça. Eu poderia
apostar que não esperava tanto espectadores assim.
— Sim! — Lari e Tay quase gritam ao mesmo tempo. Eu e Juliano
olhamos para os dois.
— Combinamos um encontro particular entre amigas, desculpe… — Lari
diz e eu não entendia o que ela estava fazendo.
— Podemos conversar a sós, Ellen? — Juliano questiona e Tay se coloca
ao meu lado.
— Não. Na verdade não, eu sinto muito! Ela realmente está cheia de
trabalho, cheia de relatórios para revisar… não é mesmo!? — Tay diz me
olhando nos olhos com as mãos para trás e soa ameaçador.
Eu olho para ele tentando entender duas coisas: o porquê ele agia daquela
maneira se eu estava cansada de dar foras nele, e o que ele ainda fazia aqui.
— Está bem, você: coloca isso em um vaso, por favor, e você vai embora!
— entrego as flores e praticamente expulso Lari da sala. Já Tay parecia
querer matar Juliano, os dois não tiravam os olhos um do outro. — Tay, vai
embora! — eu repito e ele só parece me notar quando eu toco em seu braço.
Parecia que eu tinha feito Tay acordar de um transe. Ele me olha confuso
e parecia estar perdido, obviamente eu fico mal com aquilo.
— Está me mandando embora para dar moral para esse caipira? — ele diz
magoado e minha compaixão desaparece.
— Eu também sou uma caipira e essa palavra não é um termo ofensivo
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aqui, Tay, temos muito orgulho disso! E já vai fazer uma hora que te mandei
embora, não quero fazer curativos em você de novo, muito menos ter que
limpar meu chão ou jogar algo pessoal no lixo porque vocês irão quebrar…
tenho muito apego pelas minhas coisas! E eu estudei veterinária, não
pediatria. Então vai embora, por favor! — eu digo e ele soa apenas triste e
não bravo.
— Sabe que eu não vou voltar, não é!? Sabe que tenho a impressão de
que está fazendo uma escolha e isso não é muito legal para mim…!?
— Não é isso e, mesmo que fosse, no meu caso, fui trocada de uma forma
baixa e muito pior que essa. Só estou pedindo privacidade. Este espaço aqui é
meu e eu decido quem entra e quem sai. E você sai! — eu digo e de repente
não me sinto tão mal.
Todas as vezes que me lembro de tudo o que ele me fez me sinto com a
razão e, com a razão, eu tomo controle de tudo. Minha raiva volta e eu pego
novamente as rédeas de minha vida. Esse era o segredo para colocar Tay em
seu devido lugar: ficar com raiva dele.
— Você nunca foi trocada! — Tay diz se segurando e eu fico nervosa
com aquilo.
— Agora não é a hora para isso. Depois a gente conversa. Vai embora,
por favor! — eu digo demonstrando impaciência, ele afirma com a cabeça e
se encaminha para a porta.
Eu me sentia como se tivesse que lidar com uma criança e sua partida era
um alívio. Mas como minha vida havia se transformado em uma grande
aventura desde que ele chegou, Juliano estraga tudo… não perde o momento
e diz: — Perdeu, playboy!
E nessa hora o Thor vira o Hulk. O deus grego vira um demônio.
Tay se vira rapidamente e anda na direção de Juliano, mas eu e Lari —
que ouvia a conversa toda sem autorização e eu nem tinha notado —,
corremos e nos colocamos em sua frente.
— Vai embora, Tay, depois vocês conversam! — Lari diz com medo e
ele olha para ela. Ele pisca algumas vezes e parece novamente acordar de um
transe. Suas feições mudam de furioso para sereno.
— O que eu estou fazendo? Nada disso vale a pena, não é!? — Tay
resmunga baixo parecendo profundamente magoado enquanto se dirigia à
Lari e a situação muda de figura.
Minha garganta fecha, meu coração dói, a bile que eu não consigo engolir
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me machuca como se fosse um punhado de espinhos na garganta e minha


visão fica levemente embaçada e quente. Nesse momento, Tay ajeita a
postura e se retira da sala indo embora. Lari, que olhava ele partir assim como
eu, de repente olha para mim com o semblante entristecido e questiona: —
Você não vai atrás dele?
— Não. A vez dele já passou. — eu digo aceitando aquela dor que já
fazia parte de mim durante anos.
Ela faz um ‘não’ com a cabeça e se retira. Lari me achava tola e eu, de
certo modo, concordava com isso.

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7
O TEMPORAL

Saio da clínica disposto a esquecer aquela selvagem, esquecer tudo o que


ela significava. Eu não era homem de implorar por afeto, aquilo nunca mais
se repetiria. Eu não precisava de Ellen na minha vida se ela se recusava a
fazer parte dela. Eu não precisava disso. Penso em ir direto para o carro, mas
me lembro do cachorrinho. Escolho um maltês macho com sinais claros de
que fora misturado com vira-lata, branquinho e bonito, e acho que Luiza vai
amar. Aproveito e faço o pagamento da consulta maldita e que nunca deveria
ter acontecido para a atendente da loja que não era uma loja.
O dia tinha sido literalmente um ‘dia de cão’, mas pelo menos alguém
sairia feliz nessa: Ana Luiza.
— Quase peguei seu carro e deixei você aqui! Que cara é essa? O que
houve? — entro no carro, coloco o filhotinho no colo de Laura e as perguntas
de Pedro começam.
Ignoro todas. Cinco minutos depois meu pai me liga.
— Alô, filho.
— Fala, pai.
— Onde você está? Luiza está te procurando, acho que você prometeu
algum presente… quando isso acontece, ela não deixa ninguém em paz!
— Sim, prometi. Diz para ela que já estou chegando, estamos na
estradinha.
— Tudo bem! Até já.
— Até. — desligo e segundos depois paramos em frente ao lago.
— E então… como foi com a roceira? — Laura caminha ao meu lado e
questiona curiosa.
— É Ellen, Laura. O nome dela é Ellen.
— Você mesmo a chama assim, mané! — ela exclama zombando
indignada.
— Eu posso, você não. E foi ótimo. Não poderia ter sido melhor! —
respondo com rispidez e ela para de caminhar.
Pedro nota o clima estranho e se adianta na frente para nos dar
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privacidade, eu olho para ela sem entender e espero seu desabafo.


— Escuta, seja bem sincero, quer que eu vá embora?
— Por que eu ia querer isso!? Está maluca?
— Desde que dormimos juntos, você vem me tratando super mal. E eu
não consigo entender o que fiz de errado. Você dizia o tempo todo que não
transaria comigo para eu não ficar apaixonadinha e pegar no seu pé. Mas eu
estou normal! É você quem está agindo diferente comigo, me tratando mal,
agindo de forma estranha, só por causa de uma foda que não significou nada
para ambos. Então me explica qual é a minha culpa nisso tudo, diz e eu vou
embora! Você está agindo como um adolescente arrependido e me culpa,
sendo que o ato foi feito pelos dois. Mesmo que nós dois estivéssemos
bêbados de vinho, não acho que mereço ser tratada assim! — ela diz e me
sinto um lixo. Respiro fundo.
— Eu sinto muito, você tem razão, é só que aquilo foi um erro e me
prejudiquei com a Ellen, eu não…
— Desde quando os sentimentos das mulheres que pega ou já pegou por
aí, importam para você? — ela me interrompe.
— Os sentimentos dela me importam! — digo e fico surpreso com aquilo.
— Quer dizer, importavam. Ela não quer nada comigo, então, esquece… me
desculpa por ter agido assim. Agora até podemos repetir a dose já que, da
primeira vez, eu nem me lembro de nada. — eu digo e seu sorriso vai de
orelha a orelha. — Brincadeira, aquilo nunca mais vai se repetir, continuo
tendo a impressão de que você pode se apaixonar por mim a qualquer
momento. — digo e seu sorriso some enquanto o meu aparece.
— Você se acha demais!
— Eu não me acho, eu sei que sou… — respondo e continuo
caminhando.
— Ah é!? Então quer saber a nota que te dei!? — ela questiona em tom
de zombaria.
— Eu estava bêbado, provavelmente foi um nove! — eu gargalho porque
realmente me divertia e ela faz o mesmo.
— Foi -4, seu imbecil!!!
— Duvido! — eu digo e pego o cachorrinho de seu colo.
Entramos pela sala em que todos conversavam e comiam, menos meus
avós.
— MEU DEUS, que bebê mais lindo! — Ana Luiza exclama ao ver o
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filhotinho.
— Você gostou? — me ajoelho junto a ela e toda sua atenção vai para o
cãozinho após me abraçar.
— Eu amei!!! Ele vai crescer até que tamanho? É machinho? Posso
dormir com ele? — ela perguntava sem fazer pausas e ver sua felicidade
mandou embora toda a tristeza que eu tinha no meu coração.
— Bom, tem uma mistura de vira-lata, então talvez cresça mais do que
deveria. É um machinho e você deve consultar a mamãe se você pode dormir
com ele. — eu digo, levanto e olho para minha mãe que, naquele momento,
me olhava e então ela desvia seu olhar para Luiza, que corria até ela,
demonstrando ainda estar brava. Ao sentir novamente sua rejeição, sinto um
nó na garganta fora do comum.
— Cadê meus avós? — pergunto e é tia Nina quem responde.
— Já se recolheram, estavam aqui até agora pouco! Estão cansados. —
ela diz sorrindo para mim e logo subo para o quarto com os dois “pés no
saco" na minha cola.
— Sua mãe vai te desculpar… — entro no meu quarto e Laura pula na
minha cama. Pedro começa a mexer nos meus DVDs e, de certa forma, me
sinto grato por estarem ali.
— Pode ser, mas talvez demore. De qualquer forma, vou retribuir o gelo
que ela está me dando pra ver se ela vai gostar! Acha que é bom fazer isso,
vamos ver se em um dia ela não vem correndo pedir perdão com aquele
sermão meloso dela de que “sou o primeiro filho”, “o seu favorito”, “seu
bebê mais amado”… deixa ela, comigo! — desabafo como um bebê chorão e
os dois riem. Eu me deito na cama e Laura se aproxima e me abraça.
— Credo, Tay, que maldade, ela é sua mãe! — ela exclama e pressiona o
seu quadril no meu ao olhar para mim.
Antes de ficar de pau duro devido à seca em que eu me encontrava, eu me
afasto enquanto olho para sua virilha.
— Pensasse nisso antes de me tratar assim. Dá para parar de mexer nas
minhas coisas? — grito com Pedro que fuçava em minhas gavetas.
— Quero passar o tempo até a hora da festinha do pijama chegar. Será
que elas vão estar vestidas de pijamas bem curtinhos?
— O quê? — ele se vira, me encara sorrindo e responde.
— Nada, brother. Estou brincando. Mas eu vou… não sei vocês, mas eu
vou!
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— Não terá festinha para você, hoje. — eu digo com raiva.


— Relaxa, só vou pela loira gostosa. — ele diz e sorri, piscando para
Laura que tinha uma cara de paisagem naquele momento.
— Toda siliconada, não sei o que viu nela. Aliás, não sei o que os dois
viram nas duas. Uma loira de farmácia e a outra caipira favelada cheia de
sotaque. Vai entender… — ela diz e sai do quarto batendo a porta.
— O que foi isso!? — Pedro cai na risada.
— Pior que eu nem sei te dizer se é ciumes de mim, de você, ou dos dois.
— respondo indignado.
— Acha que ela gosta de nós dois? Achei que era medo de perder o posto
de primeira dama do grupinho… — ele diz tirando uma das caixas velhas do
guarda-roupa. Parecia que procurava algo.
— Se fosse só isso estava bom… — resmungo e Pedro me olha com os
olhos arregalados.
— Já pensou nós dois pegando a Laura ao mesmo tempo??? Dupla
penetração, de ladinho, eu atrás, você na frente... Eu topo! — ele solta e eu
sinto vontade de não ter escutado aquilo.
— Como você consegue só falar merda, filho da puta!? — pergunto e ele
ri.
— Vai me dizer que nunca pensou nisso?
— Não depois que cheguei aqui! Desde que cheguei aqui eu só penso
naquela bruta. — resmungo em voz alta sem querer.
— Aliás… conta aí, como foi lá? Falou com ela? — ele pergunta e se
senta na cama, mexendo nas minhas caixas.
— Falei, abracei, peguei de jeito, mas a criatura não quer saber de mim…
ficou molinha nos meus braços, mas fugiu depois. Se eu não tivesse feito a
merda que fiz, teríamos feito amor em cima da mesa dela, tenho certeza. —
eu falo e ele ri.
— “Amor”, tenente? Desde quando??? — Pedro pergunta indignado.
— Eu amo aquela mulher, com ela seria amor… Ellen é diferente! —
digo já me sentindo mal, mas Pedro age ao notar isso.
— Vixi, que bad!!! Vamos esquecer isso, parceiro, você mesmo disse que
a guria não te quer, então vamos voltar ao normal e sair pegando por aí! Não
vai ficar na sofrência mineira aqui não. Nós vamos ficar quase um ano aqui,
vai ficar todo esse tempo sofrendo e correndo atrás dela!? Aí não pode… não
tem como, parceiro!
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— Não vou ficar correndo atrás de ninguém e nem posso sair por aí,
pegando Minas Gerais inteira. Se for assim ela nunca vai me aceitar de volta.
Nunca vai querer ser minha mulher!
— Ela já disse que não quer…
— Mas pode mudar de ideia.
— Ou não. E você vai ficar aí, perdendo tempo e se comportando e no
fim ela vai te dar mais alguns 'pés na bunda'. Quer uma dica!?
— Não. — respondo e ele ri de novo.
— É sério. Não quer arriscar? Gosta mesmo dela!? Então dá uma
esnobada, fica tranquilão e finge que desistiu. Ela vai sentir tua falta e talvez
mude de ideia. — ele diz e é a minha vez de rir.
— Dica maravilhosa a sua, palhaço! — ele ri. Depois de alguns minutos
em silêncio, continuo. — E isso não é tudo, tem uma coisa que me deixou
encucado hoje cedo…
— O que, brother?
— Antes de entrar na cozinha, quando ouvi a voz dela fiquei escutando
da sala de jantar. Ouvi que ela está preocupada com o pagamento da
imobiliária. Disse que todo dinheiro que ganha aqui não fica com ela, ela
paga a prestação e não sobra nada… — digo e ele olha para mim — Não está
pensando em fazer o que eu acho que está pensando, não é!?
— Tu nem sabe o que estou pensando!
— Sei sim, está pensando em pagar a dívida da garota! Esquece isso,
man, ela nem quer ficar com você! — Pedro se altera, fala alto e eu faço
'sshhh' pra ele baixar o tom.
— Só estou preocupado… e se fizesse isso não seria por estar com ela,
seria para ajudá-la. Faria por qualquer um de minha família. Eu tenho
dinheiro e ela está precisando!
— Para, cara, eu estou cheio de dívidas e tu nunca me pagou nada! A não
ser algumas biritas no Raul… — ele diz e ri.
— Vou ficar pagando conta de marmanjo agora? — eu falo rindo e ele
cruza os braços.
— E vai pagar da mina que nem é tua!? Deixa isso quieto! Sem contar
que, pelo gênio dela, pelo o que tu fala, é capaz da mina te odiar ainda mais.
Ficar brava por se intrometer nos lances dela… você pode querer ajudar e
piorar ainda mais sua situação! — ele diz e faz sentido.
— Tem razão, mas ela não precisa saber que fui eu quem pagou.
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— Certo, nem vai passar pela cabeça dela que foi você, não é!? Acorda,
Coverick, seu Don Juan!
— Bom, sei lá, quero ajudar, não me custa nada… — resmungo e escuto
alguém bater na porta.
— Maninho, é Lulu! Posso entrar? — minha pirralha favorita entra no
quarto segurando o filhote nos braços e senta na cama.
— E aí!? Já escolheu um nome para ele? — pergunto e ela sorri ao
responder.
— Sim. Dobby, o que acha? — ela diz e Pedro gargalha.
— Dobby, o elfo doméstico de Harry Potter? — ele questiona e ela olha
feio para ele.
— Sim! Por quê? Algum problema?
— EU AMO HARRY POTTER!!! — Pedro de repente grita de alegria —
fingindo gostar para que ela não brigue com ele — e Lulu me olha com
medo, mas depois ri.
— Tudo bem, é bom saber! — Luiza resmunga rindo e sobe na cama ao
meu lado.
— Vamos dar uma volta com ele? Podemos chamar a Ellen… — ela diz e
eu volto a ficar triste.
— Eu não sou mais amigo da Ellen, Luiza.
— Amigo você nunca foi. Mamãe disse que vocês namoraram quando
eram crianças e agora vivem brigando. Mas gosto dela, queria que vocês
namorassem de novo.
— Não é tão simples. — eu digo sem querer me aprofundar nesse assunto
com uma pirralha, mas Luiza bufa ao ouvir aquilo.
— Mas para mim, é! Não entende que ela não sabe falar ‘não’ para mim?
Aliás, ninguém sabe. Minha carinha de anjo abre muitas portas. Eu posso te
ajudar com ela se quiser, é só fazer biquinho e eu consigo qualquer coisa. —
ela diz e beija o próprio ombro.
— Mesmo assim não vai ser fácil, pelo menos não para mim. Eu dei
muita mancada com ela. Na verdade, ela é especial demais para mim, não
mereço namorá-la, Lulu! — eu digo e vejo Pedro segurar o riso.
— Bom, posso fazer ela te perdoar, aí é só você mudar! — Luiza diz
como se fosse simples.
Eu me ajeito na cama e faço com que ela pare de encher o saco do
filhotinho para prestar atenção em mim.
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— Você não conseguiria entender mesmo se eu te explicasse. Não posso


me aproximar dela porque ela mesma disse que quer distância de mim. Ellen
continua magoada comigo e preciso respeitar o espaço dela, Lulu, por isso
quero te pedir para esquecer isso, está bem? Não fique tentando juntar nós
dois, não faça nada e não fale nada nem para ela e nem para ninguém.
Esquece essa história! — digo e ela parece entender.
— Tudo bem. Mas quando mudar de ideia — e preciso dizer que sua
decisão é um tanto estúpida — você poderia comprar um presente bem legal
para amolecer o coração dela. Mulheres adoram ganhar presentes! — ela diz,
volta a fazer carinho em Dobby e Pedro segura outro riso.
— As mulheres ou VOCÊ adora ganhar presentes? — questiono rindo.
— Bom, eu sou mulher, não é mesmo!? Vai passear comigo e com Dobby
ou não!? — ela pergunta e se levanta da cama.
— Bora? — pergunto para Pedro que recusa na hora.
— Podemos chamar a Laura!? — Luiza diz e eu lamento por dentro.
— Não está de bom tamanho só eu, não? — ela ri alto.
— Para de reclamar, vai ser legal. Vamos à praça do centro, eu até te
deixo me pagar um sorvete. Precisamos de uma coleira para o Dobby!
Mamãe disse que era você que tinha que me levar na casa de ração,
precisamos de rações, caminha, bandejas higiênicas… — Luiza começa a
tagarelar e se adianta em direção ao quarto de Laura.
Ela bate na porta, entra, faz o convite e Laura olha para mim antes de
responder. Concordo com a cabeça e ela diz sim para Luiza. Pedi para Luiza
avisar dona Hella e fui com ela até a cozinha. Lá estava meu pai, minha mãe,
tia Nina fazendo bolinhos e Rafa cuidando dos gêmeos.
— Mommy, Tay vai me levar para brincar com o Dobby e comprar as
coisas dele! — Luiza diz para minha mãe, dá um beijo no rosto dela e abraça
meu pai.
— Tudo bem, cuidado na rua! — ela diz sorrindo para ela, mas Luiza
estranha, parecendo sentir o clima no ar.
— Não vai se despedir do meu irmão? Você sempre dá um beijo nele…
— ela pergunta e meu pai me encara triste.
— Não é necessário. Nenhum dos dois faz questão. Vamos porque já está
ficando tarde, Ana Luiza! — digo e viro as costas, mas a ela começa.
— Espera aí, o que está acontecendo? Vocês brigaram??? — ela fica
indignada.
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— Está tudo bem, princesa, vai com seu irmão antes que ele mude de
ideia. Quando você chegar a gente conversa. — meu pai diz e beija Luiza,
mas ela se solta do meu pai como se ele tivesse culpa e olha feio para minha
mãe.
— Acho melhor ele ter feito algo muito ruim para ser tratado desse jeito
pela própria mãe. Sempre foi seu xodó, o primogênito, mimava mais ele do
que eu. Quando ele for embora vai ficar aí choramingando pelos cantos, não
é!? Essa família viu… quanto mais eu cresço, menos entendo das coisas! —
ela resmunga olhando para minha mãe.
— Se não parar de resmungar comigo assim, vou blo quear os seus
cartões, tirar seu celular e colocar você de castigo até me respeitar! — minha
mãe diz e eu puxo Luiza pela mão.
— Blo queia, faça tudo isso! Aí vou para Manaus com meu irmão e você
perde não só um, mas dois filhos!
— Vamos, mini-Hella. Vamos embora!!! — resmungo irônico e tiro Lulu
de lá antes da maluquinha ficar de castigo eterno.
Andamos até o carro rindo de sua performance defensora e teatral
enquanto ela sorria orgulhosa.
— Somos irmãos, ela não pode te tratar assim! — ela reclama, abraça
Dobby e na hora ele solta um latido fino. — Viu, Dobby concorda! — ela diz
e sorri.

Mais tarde estaciono no espaço público do centro, em frente a praça em


que beijei Ellen pela primeira vez. Há anos eu não pisava ali, então foi só
chegar que logo bateu a sofrência mineira, como disse Pedro, o
engraçadinho. Eu me sento no mesmo local que ficamos juntos naquele dia e
respiro fundo. Penso em todo aquele lance mais cedo e fico com raiva
daquele paspalho. Foi muito difícil me segurar para não socá-lo ali mesmo.
Por que tinha que ser tão difícil?
— TAY! — Luiza grita e me faz voltar para a Terra.
— Oi, linda, desculpa…
— Está dormindo, é? Vem, vamos brincar... você joga a bolinha
primeiro!
Fomos para o gramado do parque e deixei Dobby e Luiza me entreterem.

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Era isso ou enlouquecer pensando nela. Brincamos na tarde fresca até


começar a escurecer e Dobby nunca cansava, Luiza nunca queria ir para casa
e toda hora pedia mais cinco minutos. Laura parecia se divertir também.
— Você está bem? Parece que está no mundo da lua desde que saiu da
clínica! — Laura diz enquanto caminhávamos.
— Eu estou legal, não se preocupe.
— Vai naquela festinha?
— Já disse que ela não vai fazer festinha nenhuma!
— Mas você disse que o lance de vocês acabou, por que a proibiria de dar
uma festa? — ela questiona sorrindo.
Laura parecia gostar de me ver na merda.
— Acabou, mas mesmo assim ela não fará festinha nenhuma. — digo
com rispidez e ela fecha a cara.
Passamos na loja para comprar as frescuras do filhote, paramos também
para as duas comerem um lanche, pois eu não estava com fome no momento,
elas tomaram um sorvete de sobremesa e fomos para a casa. Eu não sei
quanto as duas, mas eu estava exausto.
Entro no quarto, tiro toda a roupa e vou direto para o banho. A água
estava quente e deliciosa, consegui relaxar e afastar um pouco da tristeza que
eu sentia. O dia foi exaustivo e eu só queria poder comer algo, pois, ao pisar
em casa, a fome de comida de verdade se apossou de mim e, por fim, dormir
um pouco.
Saio só com uma toalha amarrada na cintura e encontro dona Hella
sentada em minha cama com um retrato meu nas mãos. Ela olha para mim,
coloca o retrato no lugar e, quando sua atenção se volta para meus cortes, seu
olhar não para nem dois segundos neles. Coloco um roupão para aquele clima
desagradável amenizar e diminuir a nudez na frente de minha mãe. De
qualquer jeito aquilo era constrangedor.
— O que faz aqui? — pergunto enquanto seco o cabelo.
— Seu pai está me chantageando. Preciso me resolver com você.
— Pode ir embora, eu digo que a gente conversou, nos abraçamos,
choramos e estamos bem. Não precisa fazer isso! — eu falo e abro a porta do
quarto para ela sair.
— Senta aqui. — ela diz batendo a mão na cama e eu reviro os olhos.
— Estou bem de pé, espero que essa conversa seja rápida. Estou com
fome e quero dormir. — eu digo e ela me olha sorrindo.
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— Senta, garoto!!! — obedeço e, ao sentar, ela se aproxima.


— Bom, como pode notar, sua irmã é boa em sermões — como você
também era nessa idade — apesar de que, por ter falado daquele jeito
comigo, ela está de castigo por um mês. Luiza disse que, para justificar
minha atitude, esperava que você tivesse feito algo bem ruim, mas não fez,
não é mesmo!? Nada do que aconteceu com você foi culpa sua, muito pelo
contrário, foi minha e de seu pai. Nós apoiamos a sua partida e carregarei
para sempre essa culpa, só Deus sabe do que estou falando. Tay, me perdoa
por ter sido tão cruel!!! Eu te amo e talvez repita essa atitude a qualquer
momento, mas sou sua mãe, você é meu bebê e isso nunca vai mudar. Você
me perdoa? — ela fala com os olhos cheios de lágrimas.
— Sabia que uma hora ou outra você faria isso. Não vai dificultar as
coisas quando chegar o dia que eu for voltar para Manaus? Porque não
adianta pedir perdão agora e depois fazer tudo de novo, dona Hella! — eu
falo e ela sorri.
— No que depender de mim você nunca mais pisa naquele lugar. —
Deus, como ela consegue? — Seu pai já deu entrada ao processo militar e vai
acabar com a base de Manaus, nada disso mudou!
— Olha aí, está vendo!? Você precisa parar de me tratar como um
moleque! Sempre soube me defender e agora sou maior, aliás, já estou velho,
mãe… eu tomarei as minhas próprias decisões e você não pode atrapalhar a
minha vida, a minha carreira! — digo e me levanto, respiro fundo tentando
me acalmar e ela se mantém sorrindo.
— Não posso parar de te tratar como uma criança, você é meu filho! Vou
te proteger. Não quero você lá, quero você aqui. Não faço isso para te
prejudicar, só quero meu filho perto de mim! — ela diz e meu coração se
aperta. Eu me sento novamente, seguro em sua mão e vejo uma lágrima cair
de seus olhos.
— Mãe, eu não devia nem ter voltado. Meu lugar é lá, eu tenho minha
função lá. Meu trabalho é de extrema importância e não posso dar as costas a
ele.
— E vai ficar longe da sua família de novo? Abandonar Ellen mais uma
vez?
— Mãe, ela não quer nada comigo, já deixou bem claro que o que a gente
tinha já passou…
— E você vai desistir???
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— Continuar no pé dela é dar murro em ponta de faca. Ela é mais


cabeçuda que você, não me quer por perto! Se quer saber, fui até ela hoje,
pedi para voltar, praticamente implorei pra ela ficar comigo, mas ela me
expulsou de lá várias vezes durante a conversa e, pior, recebeu a visita
daquele caipira da outra fazenda onde ela deixou aquele cavalo maluco. O
cara trouxe flores para ela, chamou a bruta pra jantar e ela nem me deixou
ouvir a resposta. Mandou que eu fosse embora dali como se eu fosse um
cachorro sarnento. — dou risada. — Na verdade não, não é!? Até cachorros
sarnentos tem seu afeto, ela gosta e cuida. Ela me tratou como se eu
realmente não significasse nada. Não ficou sem graça, não ficou mexida, ela
escolheu o outro e me mandou embora! Preciso sair fora dessa, preciso deixar
que ela viva a vida dela, afinal acabei de chegar! — digo e ela toca meu rosto
me fazendo carinho.
— Ellen ama você, Tay! Sempre amou! — ela diz sorrindo.
— Como pode pensar isso!? Não ouviu nada do que eu disse?
— Ela me disse. Quando conversamos no dia que seu nariz parecia um
chafariz, disse que o amor que sentia por você quando era criança ainda
estava lá, dentro dela. E os sinais!? Não vê? Viu a fotografia na mesa dela?
Eu vi quando fui até lá, uma vez. Aquele cordão que ela não tira para nada, o
jeito como te olha… é só você chegar e ela fica sem saber o que fazer. E eu
sei como ela se sente, já te contei as histórias sobre seu pai e eu, de quando
ele voltou e eu estava noiva do João. Ela não pode dar o braço a torcer agora,
sofreu demais, esperou demais por você e você a magoou muito naquela
noite. Foi traumático. Se quer mesmo essa garota, vai ter que lutar por ela e,
em minha opinião, você só será inteiramente feliz com ela. Falo por
experiência própria… dá um tempo para ela, dê um espaço, reconquiste-a.
Não será fácil, mas você vai ver, vai valer a pena, o amor de vocês é tão
lindo!
— Então você acha que ela vai me perdoar por ter dormindo com a
Laura? — questiono irônico e ela muda um pouco o seu semblante.
— Você já contou pra ela?
— Ela viu, mãe, ela entrou no meu quarto de manhã, trouxe uma xícara
de café, disse que queria conversar… mas foi me procurar nos quartos dos
hóspedes e viu nós dois na cama, no quarto em que Laura está. — digo e ela
coloca a mão na boca. — Achei que já sabia disso.
— Não dessa parte, necessariamente. Mas ela te ama de verdade, vai te
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perdoar com certeza. Pode demorar, mas vai sim!


— Sua esperança me comove. Ela disse que toda vez que me olhar nos
olhos, vai se lembrar da cena… — falo e ela respira antes de responder.
— Ela está magoada, mais um sinal de que te ama. Mas vocês não têm
um compromisso ainda, pelo menos isso não foi uma traição! Aliás, não
entendi o porquê você fez isso, sempre achei que a escolhida seria Ellen…
— Mãe, eu não sei o que houve comigo, se eu pudesse voltar no tempo…
Se ela soubesse o quanto eu gosto dela, ela ficaria impressionada, certeza que
ficaria!!! — eu digo e deito no colo dela como um bebê.
Como eu faria minha mãe parar de me tratar como um bebê se eu mesmo
não me controlava!? Mas era tão bom o colo dela…
— Eu acho que se você soubesse o quanto ela ama você, você também
ficaria impressionado, filho! — ela diz afagando minha cabeça e eu sorrio. Já
estava ficando sonolento, mas ainda estava faminto.
— Mãe!? — eu digo alguns minutos depois.
— Tudo bem, eu já volto! Vou buscar algo para você comer!
— Como sabia que era isso??? — pergunto rindo e ela se levanta.
— Motivo um: você havia dito que só queria comer e dormir. Motivo
dois: sua barriga está roncando alto demais! — ela ri, se retira e na mesma
hora ouço barulho de trovões, engraçado que eu não havia visto sinal algum
de que choveria naquela noite.
O temporal começou a cair e, em pouco tempo, foi ficando cada vez mais
forte. Poucos minutos depois minha mãe volta com uma bandeja quentinha
de comida e, só pelo cheiro, minha barriga dá sinal de vida novamente.
— Nossa, viu que chuva!? Do nada, não é… — ela resmunga colocando a
bandeja na cama. Eu me ajeito para comer e ela vai até a janela.
— Quer falar sobre o tempo!? — eu zombo e ela faz careta para mim.
Começo a comer e quase não mastigo, estava deliciosa. Termino a
refeição, ela se despede de mim com um beijo, eu escovo os dentes e me
deito. Não consigo descrever o quanto gosto de dormir com o barulho de
chuva no telhado e em Manaus eu não tinha isso. Assim que relaxo e fecho os
olhos o meu telefone toca. Decido não atender, mas um pensamento bizarro
de que poderia ser Ellen ao voltar do trabalho me invade sem motivo algum.
Eu me estico, pego o aparelho e vejo na tela, um número que não estava
gravado em minha agenda.
— Alô. — atendo.
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— Oi, sou eu.


— Imaginei, isso foi bizarro… está tudo bem?
— Então, na verdade, não muito… meu tio não atende, tentei ligar para
minha mãe, mas só dá caixa…
— Fala logo, Ellen, o que foi??? — que saco! Para que enrolar? Que
nervoso! Precisava deixar claro que eu era sua última opção? — Você está
bem?
— Eu estou presa com o carro aqui no início da estrada. Falta muito, não
posso ir a pé. Uma árvore caiu aqui…
— Tudo bem, não preciso dizer para não sair do carro e nem abrir as
janelas, não é!? Tem muito raio, trovoada, é perigoso!
— Eu sei, ficarei aqui.
— Já estou indo! — digo e desligo.
Coloco um agasalho correndo e desço até a cozinha. Pego um guarda-
chuva para ela e saio para a noite chuvosa. Como a vida era engraçada... eram
nove horas da noite, provavelmente estava chegando do encontro com o
caipira brega, mas eu fingiria que estava tudo bem. E estava, não é!? Eu
prometi para mim mesmo que daria a ela espaço, fazendo o que ela queria:
esquecer e manter distância. E assim seria, sem crise, sem ataques de ciúmes,
sem nada.
Chego até o carro e sigo para o local que ela havia indicado. A árvore
havia caído bem no final da estradinha de terra, estava um estrago. Paro o
carro e olho para ela por um momento, os dois faróis estavam ligados e a
gente podia se ver mutuamente. Suas feições eram de tristeza e pesar por ter
me chamado até ali, mas antes que ela notasse quais eram as minhas —
fracasso, tristeza e coração partido, devo mencionar —, saio do carro, pulo o
enorme tronco e abro a porta do motorista.
Ela estava com a mesma roupa de trabalho, então respirei aliviado com a
possibilidade dela ter apenas ficado no trabalho até mais tarde. Doce ilusão.
Abro o guarda-chuva e ela desce do carro se apoiando em mim, eu a
ajudo a pular o tronco e a coloco sentada em segurança, no banco do carona.
Volto ao carro dela, pego a chave, tranco seu carro e volto para o meu. Em
todo meu percurso senti seu olhar pesado sobre mim, mas me recusei a
retribuir o olhar. Já havia feito isso no carro e meu coração doeu demais… eu
não queria sentir aquela agonia nunca mais. Tudo o que eu queria era poder
olhar para ela e não sentir dor nenhuma.
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— Você está bem? — olho para ela de relance e ligo o carro.


— Estou, obrigada por vir. Juro que não quis te incomodar, é que não
consegui falar com ninguém! — ela diz com a voz triste e eu finjo estar tudo
bem, chego até a sorrir enquanto respondo e fico grato por conseguir aquela
proeza.
— Tudo bem, sem problemas, tenho certeza que se eu precisasse, você
também me ajudaria, ajudaria qualquer pessoa. — eu digo com simpatia e ela
confirma balançando a cabeça.
— O que estava fazendo quando liguei?
— Estava na cama, já. Tinha acabado de jantar. — eu digo e não olho
para ver sua reação.
— Sinto muito…
— Relaxa.
— Quando chegar tome um banho para esquentar o corpo, beba algo
quente para dormir melhor… — ela indica.
— Está bem, farei isso!
— Preciso me desculpar por hoje mais cedo, sei que fui dura…
— Não quero falar disso. Já entendi o que você disse. Aliás, o que você
tem dito para mim desde que eu cheguei e te entendo. Vou te respeitar, mas
em troca quero que este tipo de assunto morra por aqui. — eu a interrompo e
sinto seu olhar quase indignado.
— Não entendo. — ela sussurra manhosa demais e aquilo me deixa um
pouco irritado, mas também me deixa culpado, triste e com vontade de
agarrá-la naquele exato momento.
— Vou te explicar melhor, então… eu aceito suas desculpas. Você foi
dura, mas estava certa. Você não me deve nada e ponto final. Farei o que
você me pediu esse tempo todo, vou esquecer nosso passado e enterrá-lo
como você fez. Podemos ser amigos se quiser e, mesmo se não quiser, você
terá meu respeito. Só não toque mais nesses assuntos, não tem como esquecer
você assim, isso é muito doloroso para mim. E me perdoe se te magoei de
alguma forma, fui sincero em tudo o que te disse, mas me desculpa por ter te
procurado lá, forçado a barra, enfim… no que depender de mim, vou
esquecer. E espero de coração que você também consiga. — digo e nem paro
para me ouvir.
A impressão que eu tinha era de que havia me tornado uma mariquinha
chorona, mas gostei de notar que eu consegui falar tudo o que eu sentia
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naquele momento, de coração aberto. Pelo menos parte do que eu sentia, pois
também havia decidido que não soltaria um "eu te amo" nem tão cedo para
ela.
— Obrigada por entender. E quero sim ser sua amiga, por que não!?
Vamos esquecer… — ela diz meio chorosa e eu olho para ela. Ellen olhava
para a estrada e seus olhos brilhavam.
— Vai para a cabana? Acho um pouco arriscado andar no meio da
mata… claro que, se você quiser, vou até a porta contigo, mas acho melhor
você ficar em casa. — digo e olho para ela. Ellen mantinha seu olhar
entristecido na estrada a nossa frente.
— Nem tem espaço lá… — ela resmunga chateada.
— Posso ficar no quarto com o Pedro sem problemas. E até o sofá na
frente da lareira é muito desejado por mim… — digo sorrindo para aliviar o
clima, mas meu falso bom humor não estava sendo transmitido para ela.
— Não sei, não quero incomodar.
— Não vai, vou me sentir melhor se ficar. Pode tomar um banho, colocar
uma roupa minha e a gente treina esse lance de amizade enquanto eu te
mostro meus dotes culinários para um chá quente e reconfortante. — digo
sorrindo novamente, mas ela não.
— Tudo bem, pode ser. — ela responde e eu decido ficar calado agora.
Ela não parecia bem e eu não entendia o porquê, mas não me arriscaria
em perguntar, já que a lista de queixas a meu respeito era enorme. Eu a deixo
na porta de casa e sigo com o carro até o lago. A chuva em nada diminuía, só
parecia aumentar.
— Sobe lá enquanto eu faço o chá! — digo ao entrarmos na cozinha, mas
ela parece travar. — Vai tomar um banho, tire essa roupa molhada. Vai
acabar se resfriando! Coloque qualquer roupa minha e se deite. Já vou subir,
fique à vontade, a casa é sua! — eu digo e percebo o lance estranho que falei,
mas não me corrijo.
Meu coração dói de novo e eu volto a mexer nas panelas. Eu já sabia o
porquê doía tanto, eu estava me reprimindo demais. A vontade de tomá-la
nos meus braços era tão forte, mas tão forte, que me segurar daquela forma
me machucava e essa dor era indescritível.
Ellen continuava parada no mesmo lugar. Coloco o bule com a água no
fogo baixo, me apoio na pia e respiro fundo. Quando consigo juntar forças
para me mover, vou até ela e a puxo com delicadeza pela mão. Seguimos de
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mãos entrelaçadas até subirmos as escadas para garantir que ela não sairia
correndo com medo de mim. Ao chegar, solto sua mão e entro com ela no
quarto. Abro a porta do banheiro e espero ela se aproximar enquanto anda
devagar e olha tudo. Quando ela se aproxima, me lembro de um detalhe
importante, pego uma muda de roupa — uma camiseta, calça, blusa e meia
— e entrego para ela.
— Bom, ficará grande em você, mas é melhor que suas peças úmidas.
Tem toalha de banho limpa no armário da pia, escova de dente nova, enfim,
tudo… fica à vontade! — digo sem sorrir enquanto ela me olhava nos olhos.
— Obrigada. — ela resmunga e entra no banheiro.
Eu me retiro e só no corredor volto a respirar. Encosto na parede e tento
me acalmar fechando os olhos — como se, fazendo isso, eu fosse ser capaz
de manter a pose equilibrada. Desço, faço seu chá, um lanche caprichado,
porque se eu estava com fome ela também podia estar e, quando volto, ela já
está sentada na cama com as minhas roupas largas.
Sorrio para ela e, por milagre, ela sorri de volta. Ellen parecia uma
garotinha indefesa que precisava de minha proteção. Mas ela não era assim…
— Ficou engraçada com as minhas roupas! — eu brinco.
— Não zombe! Ou volto colocar as minhas peças úmidas só de raiva…
— ela diz sem graça e sorridente.
— Tudo bem, não faça isso ou molhará minha cama e eu não vou gostar
disso. Aqui está, fiz um lanche também… espero que ache maravilhoso! —
eu digo e ela ri sem querer.
— Ai, Deus. Será que está comestível? — faço careta e sinto que era hora
de sair e deixá-la em paz.
Vou para o banho que faço durar menos do que gostaria, e logo saio já
vestido, extremamente comportado. Quem diria…
Eu sentia algo indescritível ao sair do banho e vê-la em minha cama.
Minha vontade de subir em cima dela e arrancar sua roupa era fora do
comum. Se ela soubesse o tanto que eu tinha que me segurar, ela não estaria
aqui, não arriscaria…
— Bom, já vou indo! — digo e ela parece preocupada, mas logo disfarça.
— Onde vai dormir?
— No sofá, lá embaixo. Se precisar de alguma coisa pode me chamar. —
eu digo, entendendo onde ela queria chegar, e ela sorri de uma forma
estranha, de um jeito misterioso.
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Engraçado que não me queria, mas eu não eu podia fugir para o quarto da
Laura, não é!? Mulheres…
— Desculpe por isso, novamente. — quantas vezes mais ela iria se
desculpar!?
— Boa noite, Ellen. — falo sorrindo.
— Boa noite, Tay! — ela responde e volta sua atenção para a bandeja.
Eu pego um dos meus travesseiros, um cobertor e me retiro. Desço,
acendo a lareira para amenizar aquele frio e penso nela. O que eu não daria
para estar lá, com aquela selvagem filha da mãe!? Eu daria qualquer coisa,
com certeza absoluta. Uma noite chuvosa embaixo das cobertas… eu faria
um amor calminho até de manhã.
Calminho uma ova! Com a raiva que eu estou e com o ódio que ela
provavelmente sente de mim, quebraríamos aquele quarto todo. Eu podia
apostar um rim que eu arrancava aqueles cabelos da nuca dela. Não, com ela,
não… ela é diferente. Com ela eu não faria isso, eu não judiaria da minha
princesa assim…
— Meu Deus, o que está acontecendo comigo??? Eu estou pirando! —
resmungo baixo.
Eu penso em Ellen na minha cama, fico duro, choro, lamento e depois
apago de puro cansaço. Acordo ao que parecia ser três minutos depois com o
barulho de passos por perto. Pulo assustado e dou de cara com meu pai.
— Bom dia! O que faz aqui? — olho ao redor e já era dia. Eu estava
exausto e cheio de dores pelo corpo todo.
— Bom dia, pai. É uma longa história… — eu me sento no sofá e esfrego
os olhos. — A chuva passou? Preciso tirar o carro da Ellen da estrada de
terra. Uma árvore caiu e…
Deus, nem pela manhã ela desaparecia da minha vida. Por que eu estava
pensando em seu maldito carro???
— Cadê a chave? — ele questiona e eu me levanto.
— Está na cozinha junto com as outras.
— Deixa que eu resolvo isso para você! Vai lavar esse rosto. — ele diz e
continua me olhando curioso.
— Que horas são? — eu pergunto.
— São seis da manhã.
— Mamãe já levantou?
— Já está de pé, sim.
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— Vou usar seu banheiro, então.


— Por que???
— Porque a Ellen está no meu quarto. — eu digo e subo as escadas
deixando meu pai pasmo.
Entro no quarto de minha mãe e encontro a terrível penteando o cabelo.
Explico tudo de novo sobre o porquê eu estava ali e faço minha higiene.
Desço para tomar café e já encontro a mesa posta com dona Isabelle super
ativa, não sei como ela conseguia.
— Bom dia! — ela diz e quase que o sono me impede de responder.
— Bom dia, Isabelle. — resmungo com simpatia e me sirvo de café.
Pedro e Laura descem juntos e sentam-se à mesa da cozinha também.
— Gente, eu coloquei a mesa na sala de jantar, já que tem muita gente,
viu!? — Isabella diz e eu fico curioso.
— Estamos atrapalhando você? — eu brinco e ela fica assustada.
— Imagina, uai! Mas que bobajada! É que são visitas, só quero que se
sintam à vontade… a cozinha não é tão requintada como a sala, não é!?
Nunca que eu ia destratar a visita na casa dos outros, sô! — engraçado como
o sotaque dela ficava ainda mais pesado quando ela ficava nervosa, igual o da
filha.
— Tudo bem, eu iria expulsá-los para o quintal se eles estivessem
atrapalhando seu trabalho. — eu digo rindo e os dois fazem cara feia
enquanto se servem.
— Mas, mudando de assunto… é engraçado vocês descerem ao mesmo
tempo. Preciso saber de alguma coisa? — questiono irônico e vejo Laura
ficar vermelha.
— Você está com uma cara péssima… está com dores, tenente?
Precisamos saber de alguma coisa? — Laura devolve sorrindo e eu imagino
que ela já saiba sobre Ellen.
— Bom, deixa eu me levantar e me pronunciar em voz alta, espere aí…
— Pedro se levanta e Laura o puxa de volta.
Não era necessário dizer nada. Os dois dormiram juntos, estava escrito na
testa de ambos. No mesmo instante que comecei a rir sozinho, minha mãe se
junta a nós na cozinha e eu começo a me comportar. Conversávamos sobre o
temporal daquela noite quando Ellen entrou na cozinha vestida de mim
mesmo. Isabelle, ao vê-la, se assusta e quase deixa uma xícara cair no chão.
Pedro fica boquiaberto e minha mãe sorri feliz.
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— Bom dia! — ela diz simplesmente, beija a minha mãe e abraça dona
Isabelle, que ainda estava em pânico. — Fica calma, dona Isabelle. Eu
consigo explicar e é muito simples. — Ellen diz sorrindo e age como se só
estivessem as duas na cozinha.
— Mais tarde vai me explicar mesmo, tintin por tintin! — a mãe dela
responde nervosa e ela sorri se servindo de suco natural.
— Não precisa ser mais tarde, não há nada que eu não possa falar aqui e
agora! Trabalhei até mais tarde e, quando saí do trabalho, estava começando a
garoar. Cheguei no início da estrada de terra e a garoa já havia virado um
temporal violento. Vi uma árvore caindo bem na minha frente, por pouco não
pega meu carro. Fique barrada lá, tentei te ligar e você não atendeu, tio Renan
não atendeu, Rita também não… e então decidi interromper a soneca do meu
mais novo amigo, Tay… — ela diz e olha para mim sorrindo.
Sorrio de volta e continuo mastigando, me recusando a olhar para Pedro
que naquela hora, eu tinha certeza, segurava um riso zombeteiro descomunal.
—… e ele atendeu o celular, por incrível que pareça. Foi me socorrer e
sugeriu, gentilmente, que eu ficasse em seu quarto para não ter que andarmos
pela mata, correndo risco devido aos raios. Em resumo, ele dormiu no sofá
aqui embaixo e eu em sua cama confortável. Por isso o meu bom humor, por
isso a cara de dor nas costas dele! — ela diz apontando para minha cara e eu
tenho vontade de agarrá-la e mordê-la até ela se desculpar.
— Só achei legal a parte do ‘por incrível que pareça’. — Pedro diz rindo
e eu olho para a cara dele sem achar graça nenhuma.
Não achei ruim, mas era só para não dar corda. Mais um pouco e ele
começaria um talk-show sobre minha vida com as mulheres em Manaus.
— Foi só isso mesmo, senhor Coverick??? — dona Isabelle me pega de
surpresa.
— Claro que foi! Minha amiga Ellen nunca mentiria para a própria mãe!
— digo e pisco para ela e, pela primeira vez na vida, vejo a selvagem ficar
sem graça.
— Entendo. — dona Isabelle resmunga.
Laura fuzila Ellen com os olhos, Ellen finge não notar e sorri feliz. Minha
mãe muda de assunto, meu pai entra na cozinha e coloca a chave de Ellen de
volta ao porta-chaves.
— Chamei ajuda para retirar o tronco. Coloquei seu carro para o lado e
vou aguardar o retorno deles. Vai demorar um pouco para chegar, a cidade
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está um caos… — meu pai diz diretamente com Ellen e ela sorri.
— Sem problemas, muito obrigada! — Ellen responde, eu me levanto,
saio da mesa pedindo licença e subo para tomar um banho.
Como estava frio, visto uma calça jeans, blusa de moletom fina, casaco
grosso e sapatos tipo botas masculinas para suportar o lamaçal que aquela
chácara provavelmente estava. Desço e encontro todos papeando na mesa do
mesmo jeito que deixei quando subi e, ao me escorar na pia para esperar os
‘malas’ terminarem de tomar café, meu telefone toca. É da Administração da
EPCAR.
— Ih, pai… é a ADM! As aeronaves já chegaram? Achei que iam
demorar mais um pouco… — resmungo. Ele me olha preocupado e pede para
que eu coloque a chamada no viva-voz.
— Tenente Coverick!?
— Pois não!?
— Aqui é a Capitã Silmara…
— Sim, senhora.
— Recebemos um chamado urgente da CIAAR, Centro de Instrução e
Adaptação da Aeronáutica sediada em Belo Horizonte, no qual o senhor dará
apoio aéreo em um desastre natural na capital, pois não há efetivo o suficiente
lá. A cidade está um caos, o helicóptero já está pronto para planar. O código é
vermelho! Os chamados são para o Capitão Coverick, o qual não obtive
resposta por telefone, e sua co-piloto e subordinada, segundo tenente
Nogueira, que também não respondeu ao meu chamado! Pode contatá-los?
— Sim, senhora, estamos todos a caminho! — digo e desligo.
Laura, ao ouvir seu nome, já havia pulado da mesa para ir correndo se
vestir e eu sigo meu pai até o carro.
— Se cuide, está bem!? Cuide do nosso bebê! Espero você para o jantar!
— minha mãe sussurra para meu pai e ele responde da mesma forma.
— Vou cuidar. Logo volto para você, minha sereia! Diz para minha
princesa que o papai já volta! — ele diz e os dois se abraçam e se beijam
como se fosse a última vez que estariam juntos.
— Vai lá, parceiro! Vai com Deus!!! — Pedro diz sério e eu sorrio
agradecendo.
Ele me abraça e bate forte em minhas costas. Laura corre com uma muda
de roupa nas mãos, abraça a peste que sorria para ela e se aproxima correndo.
Enfim meus pais se soltam e eu abro a porta do carro para Laura entrar. Meu
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pai também entra no carro, minha mãe me agarra dizendo que me ama e,
assim que eu entro, meu pai arranca com o carro.
Pelo retrovisor da minha porta posso ver Ellen olhando preocupada em
minha direção enquanto sua mãe a abraçava em apoio. Tudo o que eu queria
era um abraço e um beijo dela, uma palavra carinhosa, um “eu te amo, volta
para mim…”.
Mas qual seria a possibilidade disso acontecer com dois ‘amigos’???

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8
BOA NOITE, CINDERELA
Eu dormi como um anjo. Dormi sentindo o cheiro maravilhoso dele. Tay
tem um perfume que me deixa acesa, arrepiada. É difícil de explicar, parece
uma espécie de droga, pois me dá um prazer fora do comum.
Assim que vi aquela árvore cair e quase pegar meu carro, a ‘roceira’ forte
e corajosa sumiu, desapareceu. Eu só queria vê-lo, só queria sua proteção, seu
carinho e por isso respirei fundo e liguei. Não, eu não tentei falar com outra
pessoa, foi nele que pensei assim que vi que precisava de ajuda.
Sua atitude fria e distante mexeu muito comigo. Preciso confessar que
não foi fácil ver que ele não insistiria mais, que não diria mais que me amava,
não escutar suas declarações quentes. No entanto eu entendo que é melhor
assim. Eu continuava amando aquele ‘moleque’, que agora era um homem,
mas eu também continuava magoada, infelizmente. E, devido às
circunstâncias, aquele amor era praticamente impossível. Eu, com sua
distância durante todos aqueles anos, aprendi a aceitar aquilo.
— Vai ficar tudo bem, filha. — minha mãe me abraçava enquanto eu o
encarava, me perguntando se eu deveria ou não ir até lá, me despedir.
Eu só sabia que ele iria até Belo Horizonte ajudar em um resgate devido a
um desastre natural, provavelmente aquela chuva tinha feito um estrago em
algum lugar da capital.
Tay era como o seu pai, um herói. Ouviu a notícia e seguiu para o carro
sem pensar, sem nem me olhar, correu para onde precisavam dele sem hesitar
e aquilo era fantástico, tanto quanto era doloroso. Quais as chances de um
acidente acontecer com ele?
Aqui ainda garoava fino, provavelmente em BH ainda chovia. E se
alguma coisa desse errado? E se o amor da minha vida voltasse para casa
machucado ou, pior, não voltasse? Se tinha algo que me agoniava era vê-lo
sangrar, vê-lo machucado, eu não suportava… não podia passar por aquilo.
Eu precisava ter aquele canalha por perto, mesmo brigados, mesmo nos
“odiando” e nos alfinetando.
Tia Hella abraçou Max com tanta, mas tanta paixão… ela sabe que a
profissão do marido é perigosa, arriscada. Eu a ouvi dizer que o esperava para
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jantar, mas foi uma ordem clara e romantizada de que ela o queria de volta
inteiro e logo, ela ordenava que ele se cuidasse… Max entendeu e respondeu
que voltaria para ela. Ele entendia. Ele sentia. E eu daria tudo para ter
coragem de descer aquela pequena ladeira, ir até seu carro e dizer para o meu
Thor voltar para mim, que eu ficaria esperando por ele, nem que fosse
somente para continuar nosso teatro ridículo de 'novos amigos'.
— Vem, vamos ver se tem alguma notícia na televisão! Eles vão ficar
bem! — tia Hella toca meu braço e me abraça enquanto caminha comigo até
a sala.
Pedro e minha mãe nos acompanham. Minha mãe liga a televisão e nos
sentamos no sofá, já havia notícias sobre o caos em BH, o conjunto de
aglomerados de Vila Califórnia e principalmente de Vila Maria. Duas
comunidades atingidas e praticamente destruídas pela chuva da noite passada.
— A quarta-feira começou com tragédias na região nordeste de Belo
Horizonte. Quinze pessoas morreram após duas barreiras deslizarem devido
às fortes chuvas que acontecem em vários pontos desde a madrugada. Até às
8 horas da manhã de hoje, a capital mineira já acumulava mais de 230
milímetros. Para evitar mais transtornos, a Companhia de Saneamento de
Minas Gerais, suspendeu o abastecimento de água nessas áreas. A Força
Aérea Brasileira já atua nos resgates e buscas das vítimas desse desastre, a
escola… — a repórter falava. Ela vestia capa de chuva, guarda-chuva e
gesticulava demonstrando a seriedade e a gravidade da situação. Ela seguiu
com sua reportagem até uma das escolas que servia de abrigo aos moradores
e continuou falando.
Eu me levantei e subi para o quarto onde fiquei hospedada naquela noite.
Eu precisava do cheiro dele, das coisas dele e me sentia triste por algum
motivo que eu não sabia dizer. Entro no quarto e pego a camiseta que ele
havia usado para dormir, obviamente estava em cima da cama, jogada com
desleixo, e me deito agarrada nela.
— Oi! Como você está? — tia Hella entra no quarto e senta na cama.
Olho para ela e nem sei bem o que dizer.
— Estou bem. — minto e ela se deita ao meu lado na cama.
— No dia em que Max voltou da Síria, eu estava noiva do João, acho que
você não chegou á conhecê-lo. Eu fiquei tão nervosa com sua volta, tão
mexida, que eu não sabia o que fazer. Max, quando chegou, foi me procurar
em casa e aquela noite foi tão especial… a volta dele em si, sabe!? Era tão
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difícil para mim, ficar perto dele, a gente brigava tanto por tantas bobagens,
fui tão dura com ele sem precisar, ele sempre foi tão paciente. Nem sei o
porquê estou te falando isso! — ela diz, ri e eu sorrio. — Hoje, quando você
entrou na cozinha, eu olhei para meu filho e vi o jeito como ele te olhou.
Ficou radiante, o mesmo olhar que trocávamos, eu e o pai dele…
— ‘Trocamos’ seria a palavra correta, não é!? Até hoje vocês são puro
amor. — digo e ela sorri olhando para o teto.
— Trocamos, é isso! Amo aquele homem mais que qualquer coisa no
mundo, quanto mais o tempo passa, mais esse amor aumenta. E com vocês
não são diferente, vocês ainda se amam…
— Isso não é o suficiente, você sabe! — também olho para o teto.
— Eu pensava dessa forma, Ellen. Colocava um monte de problema, um
monte de impedimento que só eu criava… sua mãe te contou de uma vez que
eu joguei um sutiã na cara dela? Achando que ela e Max tinham ficado
juntos!? No fim, o sutiã era da minha cunhada.
— Eu os vi. Juntos. Na cama. — eu interrompo e, ao me lembrar, me
afasto da camiseta dele e me levanto revoltada.
— Essa parte é mais difícil. Mas se vocês se amam, por que não o
perdoa? Essa menina quer meu filho… às vezes até acho que ela quer os dois,
Tay e Pedro. Eu já tive muita experiência com esse tipo de mulher. Tente não
ver como uma traição, afinal vocês não estão namorando, não estão juntos…
— Tia, para, por favor! Pare de defendê-lo…
— Ele é meu bebê, preciso defendê-lo. E também preciso confessar que
espero que me ajude a mantê-lo aqui. Quero meu filho perto de mim, quero o
Tay aqui, feliz, como ele era antigamente. Sei que você pode trazer meu
antigo menininho de volta… — ela diz e eu não acredito naquilo.
— Está colocando uma responsabilidade muito grande em cima de mim.
Eu não posso te ajudar nisso, tia. Tay me abandonou, escolheu um caminho
totalmente diferente do meu e provavelmente vai embora de novo. A última
coisa que quer é me ver todos os dias… — eu falo e caminho até a janela, a
garoa fina já diminuía lá fora.
— É aí que você se engana. Ele, ao contrário de Max, nunca priorizou a
carreira militar, nunca foi sua primeira ou principal opção. Ele nunca quis
deixar você, nunca! Só partiu por causa do avô. Por você, ele jogaria a FAB
para os ares, provavelmente trabalharia aqui com o pai ou arrumaria outra
coisa para fazer. Tenho certeza!!! — tia Hella diz e eu olho para ela sem ter
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coragem de dizer que ela estava ficando maluca.


Meu celular bipa na calça de moletom que eu vestia e era ele.
“Oi, amiga, os caras da companhia ainda não chegaram, então pegamos
o seu carro. Ele ficará na FAB, tudo bem?”
Eu sorrio para mensagem.
“Oi. Sem problemas. Espero que dê tudo certo... Se cuida!”
Escrevo e aperto enviar. Meio minuto depois ele responde.
“Vai dar tudo certo, vou voltar pra você.”
Ele responde e meu coração se aperta.
“Não tenha pressa, gostei da sua cama. Ficarei aqui enquanto estiver
fora…”
Envio sorrindo e, ao olhar para Dona Hella, ela também sorria me
encarando.
— Pelo seu sorriso aposto que é ele. — ela diz e sinto meu rosto queimar.
— É, meu mais novo amigo… — digo e me deito de novo ao ler sua
resposta.
“Ela é sua, você sabe disso!”
— Minha e da torcida do Cruzeiro… — resmungo desabafando e
continuo lá, deitada, olhando para o alto, com tia Hella sorrindo e fazendo o
mesmo.
Fiquei o dia todo lá, almocei, voltei para cama, nem trabalhar eu queria…
aquela chuvinha e o cafézinho da minha mãe me deixavam sem vontade de
fazer nada da vida.
Mais tarde, Rafa e Nina me levam até o colégio militar para que eu possa
pegar meu carro. Chego na clínica e meu coração se aperta ao ver que Lari
acompanhava as notícias na televisão da recepção.
— Boa tarde! — Lari diz séria e volta a olhar para a televisão.
— Boa tarde, tudo bem? — questiono e me sento no sofá para ver as
notícias.
— Tudo. — ela responde de um jeito frio e sua atitude me faz olhar pra
ela.
— Que foi? Está chateada? — ela faz ‘não’ com a cabeça. Eu me levanto,
sento em sua frente na mesa e ela abaixa os olhos para mim como se tivesse
entediada.
— Se insistir nisso eu vou falar, se eu falar, vamos discutir… — ela diz
ainda entediada.
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— Eu arrisco. — respondo para acabar logo com o assunto e minha


atenção logo se volta para a repórter que noticiava o drama que Vila Maria
estava vivendo.
— Vi pelas câmeras a hora que você saiu, vi que você saiu com ele. Quer
me contar alguma coisa?
— Estamos em um relacionamento e eu não sei, por acaso? Você está a
fim de mim? — pergunto séria e Lari volta seu olhar para a televisão
indicando que o assunto acabou para ela. — Escuta… ficamos aqui até tarde,
conversamos, ele me fez companhia enquanto terminava a pilha de atestados
clínicos, me ajudou a organizar algumas coisas. Desabafei, sorri, nem vi o
tempo passar! Juliano é um bom amigo e é só isso… não entendo o que te
preocupa e não entendi sua atitude ontem! — digo e ela volta seu olhar para
mim, se ajeitando na cadeira para começar o sermão.
— Sabe o que é!? É que não consigo dizer quantas vezes desabafou
comigo por causa do deus grego… lembra na faculdade? Seu assunto era ele!
Você ficou tantos anos com esse amor preso sem poder fazer nada e, quando
pode, quer fazer vingancinha!? Se você já tivesse esquecido o Tay, até tudo
bem… posso aceitar isso! Mas você ainda ama o cara! Ele vem aqui para se
declarar e ficar com você, sim eu ouvi tudo, tudo mesmo, até a parte que ele
queria… enfim, você sabe!!! Como consegue pensar em ficar com um cara de
caráter duvidoso e esnobar o cara que te ama... que você ama??? Vamos
combinar, você sabe do que eu estou falando, sabe que os boatos correm,
sabe que esse Juliano só é um bom amigo para você porque ele te quer. Sabe
muito bem das coisas que ele faz por essa cidade, então é serio, sai dessa…
— Lari começa e é a minha vez de responder.
— Primeiro, vou te demitir por ser tão curiosa…
— Não me importo!!! — ela me interrompe e reviro os olhos.
— E segundo que esses boatos são pura inveja, pura fofoca maldosa!
Juliano é meu amigo desde moleque, nunca me faria mal. E também nem
somos tão próximos assim! Presto meus serviços quando ele precisa e,
quando eu preciso, ele me ajuda. Como te contei do Raivoso, e ponto final!
Nada mais! E já te falei o que se passa comigo e com o "deus grego", nossa
história não é tão simples, ele não é a mesma pessoa, te falei isso! Ele me
magoou demais, chegou e já vi quem ele se tornou, ouvi rumores… Tay é um
galinha cafajeste que já pegou a Amazônia inteira! Não é mais meu amor de
infância, então esquece ele! — eu digo e quase imploro.
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— Sabe qual foi a última vez que você chegou e sentou aqui para assistir
televisão? — eu lamento.
— Não.
— Você nunca fez isso! Sempre foi direto para sua sala sem nem parar
para me olhar nos olhos. Sou eu que te acompanho até lá dentro. E sei que
não é por maldade, é porque tua cabeça é trabalho, trabalho e trabalho.
Sempre foi assim, até na faculdade. Nada de barzinhos, nada de garotos, nada
de pegação, nada de paquera, rolê, balada, nada de nada, eram só os
estudos!!! E nunca, Ellen… você nunca parou aqui para ver as notícias! Não
perguntou da agenda, não quis saber dos nossos clientes que, aliás, vão
aparecer para a primeira consulta em dez minutos. Mas nós duas sabemos o
porquê fez isso… soube que ele está lá. Pouco antes de você chegar a repórter
anunciou o reforço mandado pela Escola de Cadetes de Barbacena e o
helicóptero já chegou lá. Esse cara mexe com você e mexe demais, verdade
seja dita! Então não se envolva com aquele cara, corra atrás de sua felicidade,
já chega disso…
— Está bem. — eu a corto no meio da fala e volto a prestar atenção na
televisão.
Lari estava inspirada e, assim como com tia Hella, eu evitaria aquele
assunto até onde desse. Eu não aguentava mais aquilo e eu não queria falar
sobre ele. Eu poderia ficar remoendo, pensando, sonhando, qualquer coisa,
mas confessar em voz alta que ainda doía, era uma tarefa difícil e eu me
recusava a passar por isso.
— E já são mais duas mortes comprovadas até o meio-dia desta tarde,
Lorena! A situação aqui no bairro da Vila Maria é triste, a encosta não para
de descer. O reforço da Força Aérea já chegou e mais militares
especializados em resgates já retiram alguns sobreviventes de dentro do
aglomerado praticamente destruído…
Nesse momento só se ouvia a voz da mulher. As imagens destacavam
cenas horrorosas da situação do bairro, o helicóptero, que provavelmente Tay
pilotava, os militares no solo ajudando no resgate… tudo! Era muito triste de
ver. Quase me assusto com o telefone alto e Lari atende sem demora, eu só
ficava prestando atenção naquele helicóptero que fazia manobras instáveis
nos lugares mais precários do vilarejo, onde os militares não podiam ir a pé.
— Pet Care, boa tarde? — ouço Lari atender, mas minha atenção fica só
na televisão. — Claro, só um minuto… — olho para ela e a vejo fazer uma
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cara feia. — É o Juliano! — ela diz com indiferença e eu bufo.


Olho uma última vez para a televisão e peço que ela passe a chamada para
a minha sala. Pego minha bolsa na cadeira e entro para atender.
— Oi?
— Como você está, princesa?
— Estou bem, e você?
— Também estou, graças a Deus! Queria saber se você quer almoçar
comigo. Vou até o Mineiro's já, já. E então, quer me encontrar lá?
— Claro! Tudo bem…
— Ah! Tem mais uma coisa... preciso de ajuda com Safira. Ela está
estranha demais, esteve com febre essa noite… pode vir mais tarde dar uma
olhada nela para mim?
— Claro que vou, pode deixar! Te vejo aqui! Vê se me liga quando
chegar para eu não te deixar esperando, estou cheia de trabalho e você me
conhece. Mesmo anotando, capaz de esquecer que combinei de almoçar
contigo!
— Pode deixar, eu ligo sim, princesa!
— Ok, Ju, até mais!
— Até! — ele se despede e eu desligo, suspirando.
Eu me jogo no trabalho, mas mantenho a porta da sala aberta para olhar
para a televisão de vez em quando. Só fechava quando chegava algum
cliente.
Almocei com Juliano, conversamos sobre coisas banais, voltei para o
trabalho, atendi os clientes que estavam agendados e logo fui para casa. Lari
não falou comigo o dia todo, estava chateada e eu achava que ela estava
exagerando um pouco, mas não falei nada, evitei piorar a situação. Cheguei
ao casarão e os avós de Tay, minha mãe e tia Hella estavam na cozinha.
Cumprimentei todos, comi e logo fui embora para o sítio de Juliano ver como
Safira estava. Eu amava um dia cheio como aquele, ocupar a cabeça era tudo
de bom.

— Eu não sei, ela fica deitando e levantando demais, parece muito triste,
notei que ela ficou tentando urinar o tempo todo, mas não conseguia… —
Juliano entra comigo na baia da égua branca e me conta tudo o que sabia.

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— E esse pelo arrepiado aqui, hein, princesa? Como a gente faz? Conta
para mim o que está sentindo… — falo com Safira e ela responde bufando e
relinchando.
— Como consegue??? — Juliano questiona e eu sorrio.
— Não sei, eles me entendem! São seres extraordinários, não é!? — digo
sorrindo e a examino.
— São sim! — ele diz se sentando em um banquinho.
Tive muita dificuldade em examinar Safira, ela estava muito agitada e
continuava deitando e levantando, demonstrando sentir dor.
— Bom, nem preciso examiná-la para te dizer que ela sente dor. Muito
provavelmente é um desconforto abdominal comum, uma espécie de cólica.
Vou medicá-la, mas vou tirar umas amostras do seu sangue para termos mais
certeza, ta!? Em dez minutos ela já estará se sentindo melhor e essa febre dela
também vai baixar! — eu digo e Juliano se levanta, se aproximando de mim.
— Você é um anjo! — ele toca seu polegar na maçã do meu rosto e eu me
afasto.
— Tudo bem, para com isso, é meu trabalho!
— Por que foge de mim?
— Porque eu não gosto de você como você gostaria. — eu falo na lata e
ele se assusta. Todo mundo se assusta com essa minha mania “peculiar”.
— Gosta do mauricinho?
— Eu não sei porque todo mundo chama ele assim. E gosto.
— Ele não merece você!
— E eu sei muito bem disso! — respondo olhando em seus olhos e me
sinto orgulhosa em ser rápida nessa também. Realmente aquela era a maior
verdade de todas!
— Então por que não me dá uma chance? Eu não falo muito, mas você
está ciente de que sempre gostei de você!
— Por que não falou sobre isso comigo no almoço? Agora não é hora! —
se tinha algo que me irritava era baderna, bate papo sem sentido, gritaria ou
qualquer outra atitude como essas perto dos meus cavalos.
— Ellen, me desculpe, você já tinha me falado isso… me desculpe! — ele
diz, eu termino de fazer todo o procedimento na grande Safira e saio da baia.
— Vou voltar amanhã para dar uma olhada nela, está bem? Ficarei
preocupada… já os resultados dos exames demoram alguns dias, no máximo
uma semana, mas tenho certeza de que não é nada grave, não. Pode ficar
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despreocupado! — falo e ele sorri para mim.


— Tudo bem, a casa é tua, pode vir quando quiser! Agora dando
continuidade ao que eu estava falando…
— Juliano, não! Não quero saber de nada disso, minha prioridade é meu
trabalho. Já te disse isso, então esquece, somos amigos e é assim que vamos
ficar!
— Engraçado como você é grosseira comigo. Ninguém nessa cidade fala
desse jeito comigo…
— Engraçado que eu estava falando sobre isso hoje, com a Lari, sobre sua
fama na cidade. Mas eu não tenho medo de você! Vou falar com você como
sempre falei.
— Você, aqui, pode tudo, meu amor! Mas então… o que ela disse sobre
mim? Sou um anjo de candura.
— Anjo? Você amedronta todo mundo com essa sua cara amarrada, essa
arma na cintura. Ela só falou o que todos falam, que você é perigoso e é
necessário tomar cuidado. — digo e dou risada.
Juliano era grosseiro, rico, tinha mais fazendas por Minas Gerais do que
eu sabia e tinha uma empresa de finanças, relacionada ao comércio agrícola.
Não entendia como funcionava, mas, em resumo, ele investia grana nessa
área e recebia parte do faturamento como pagamento e com isso enriquecia
cada vez mais. Mas esse assunto nunca foi do meu interesse, eu via nele um
amigo e nada mais. Nunca tive medo de sua cara feia, apesar de sua fama ser
"fique devendo para o banco, deva para um bandido, um traficante, menos
para Juliano Mendonça". Ele nunca me tratou com menos do que carinho
então, a meu ver, o “meu” Juliano e o “Juliano deles” eram duas pessoas
totalmente diferentes.
— É mesmo? Mas e você? Tem medo de mim? Acredita nesses boatos de
que sou um cara perigoso? — ele questiona se aproximando e me olha com
uma curiosidade notável.
— Não. Você continua com a mesma alegria do meu amigo valentão que
me protegia na escola. Você não faria mal a nenhuma mosca! — eu olho para
ele e ele sorri.
— É legal ouvir isso de você, não quero que você mude sua opinião a
meu respeito nunca. Quero que conte comigo sempre e nunca acredite nessa
bobajada que dizem por aí! Lari não vai com minha cara…
— Bobagem, ela nem conhece você!
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— Tudo bem, de qualquer forma ainda tenho esperança de te conquistar!


Você sabe que não vou ficar no teu pé, não vou te encher, mas não vou
desistir! — ele diz e sorri olhando para minha boca.
— Desista!
— Juliano nunca desiste! — além da cara de paisagem, faço ‘não’ com a
cabeça e me retiro dali antes que aquela situação constrangedora me deixasse
pior. Nunca me imaginei ficando com ele e eu tinha certeza que nunca faria
isso. Juliano simplesmente não fazia meu tipo.
— Onde esteve? Comeu correndo e saiu… — minha mãe, como sempre,
estava cuidando daquela cozinha. Pelo jeito, todos haviam se retirado após o
jantar e ela já estava limpando tudo e ajeitando o almoço do dia seguinte.
— Fui dar uma olhada na Safira, a égua do Juliano. Guardou algo para eu
comer? Estou faminta… — digo e ela sorri me estendendo um prato que
havia guardado no microondas.
— Quer me explicar direito o que houve hoje? — ela pergunta e eu
lamento de novo. Eita! Dia difícil.
— Quer mandar meu apetite para os ares? — pergunto e ela sorri me
olhando.
— Não fica brincando com teus sentimentos, Ellen. Se gosta daquele
rapaz, vai em frente. Vou ficar do teu lado, filha, você sabe disso…
— Em falar nisso, tem notícias? Como está Vila Maria? — mudo de
assunto e ela demora em responder enquanto revira os olhos para meu corte
nada discreto.
— A chuva não cessou, mas as buscas continuam. Eles ainda estão lá.
— Legal. — digo de boca cheia e termino praticamente correndo. — Vou
me deitar… — digo me levantando.
— Vai dormir aqui de novo??? — ela me olha indignada, mas ainda fala
baixo.
— Que mal tem?
— Não é a sua casa.
— Mas eu me sinto em casa…
— Ellen, sei que gosta de todos aqui e que todos aqui gostam de você,
mas você continua sendo a filha da empregada. Não pode ficar enfiada aqui,
dormir no quarto de um homem solteiro. Já te falei tanto isso… você não está
em casa! — minha mãe diz mais baixo ainda e tia Hella entra na cozinha.
— Como assim, ela não está em casa?
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— Olha... Hella, me desculpe, mas é o que eu penso. Minha filha tem


casa, tem família, não pode ficar dormindo aqui, ainda mais no quarto dele. É
uma moça de família…
— Quanta bobagem, Isabelle!!! Nunca ouvi tanta bobagem! Você tem a
bondade de nos ajudar aqui em casa! Só nos ajuda, auxilia, não é menos do
que ninguém aqui. E Ellen se sente em casa porque está em casa. Deixa-a
ficar, tem total liberdade aqui dentro desde pequena! Deixa a menina… —
Hella diz e minha mãe suspira. — Não quero mais ouvir esse papo de
empregada e de filha de empregada e nem nada parecido!!! Isso é um
absurdo!!! — tia Hella continua e põe a mão na cintura.
— E eu não quero mais ninguém ouvindo atrás da porta as minhas
conversas com minha filha. Esse aqui é meu território!!! — minha mãe diz e
põe a mão na cintura também.
— Eu só parei para ficar ouvindo quando escutei sem querer esse seu
comentário bobo! Não fale mais bobagens que eu não me intrometo mais! —
tia Hella diz e sorri, minha mãe ri também.
— Nossa! Vocês são muito malucas, parem de brigar. O que importa é
que é só hoje, logo ele está de volta e eu vou voltar para minha cabana
distante e solitária! — eu falo fazendo drama e as duas me olham torto.
— Vai só se quiser! Aposto que meu filho te deixaria ficar, sem problema
nenhum! A cama é enorme. — dona Hella resmunga e minha mãe tapa os
ouvido como se isso a fizesse momentaneamente surda para o comentário
anterior.
— Bobagem. Eu tenho a minha casa. — imito a voz com sotaque forte da
minha mãe e faço ambas sorrirem.
— Beijos, boa noite, amo vocês, amo mesmo, mas quero muito tomar um
banho e dormir, então, tchau! — dou um beijo em cada uma delas durante as
pausas entre as palavras e subo correndo para tomar um banho e dormir
sentindo o cheiro dele em mim.
Sim, minha situação amorosa era precária e patética. Tomo um banho em
sua banheira maravilhosa, visto um samba-canção e uma camiseta limpa, e
caio na cama torcendo para que o edredom grosso me esquente.

Abro os olhos e a luz do sol quase me cega, pelo jeito o tempo havia

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melhorado naquela manhã. Viro de barriga para cima e uma sombra de


relance me assusta.
Tay estava sentado na poltrona próxima à cama e me olhava dormir. Uma
bandeja estava depositada bem longe do meu corpo e me sentei na cama com
cuidado para não me mexer muito e derrubá-la.
— Bom dia! — ele diz com sua voz grossa e minhas pernas tremem.
Tay se aproxima, me abraça, me beija o rosto e eu deixo tudo isso
acontecer. Era aquele abraço que eu não tinha dado antes…
— O que faz aí? Achei que ia demorar a voltar, se eu soubesse teria ido
pra casa… — pergunto arrumando meu cabelo e conferindo os olhos sujos.
— Chegamos há muito tempo. Vi que estava aqui, então trouxe um café e
não consegui sair. Fiquei te olhando dormir. — ele diz e me larga, se
afastando para se sentar mais distante de mim e sair do meu espaço pessoal.
Seu abraço me fez deitar na cama e o peso do seu corpo — mesmo que
apenas uma ínfima parte — sobre o meu me dava calafrios.
— Droga, viu que eu ronco? — zombei e peguei a bandeja para prestar
atenção em outra coisa e esconder a timidez. Tay apenas sorriu negando com
a cabeça.
— Boba! Você dorme como uma princesa! — ele diz e eu sorrio.
— Como foi lá??? Pensei mesmo que ia demorar…
— Foi triste, muito triste. Estava no apoio, então hoje de manhã, quando
o tempo melhorou, fomos dispensados e só ficou a força local. Ficamos a
madrugada toda trabalhando, estávamos exaustos… não teve como, nos
mandaram voltar para casa! — ele diz parecendo triste.
— Você está bem?
— Não. — Tay diz. Meus olhos se enchem de lágrimas e eu me odeio por
isso.
— O que houve? — pergunto e ele força o maxilar ao olhar para a janela.
— Nada demais, foi só um dia cheio para mim, não vou perturbar você.
Tome seu café, o lanche fui eu que fiz, aposto que já é seu favorito! — ele
sorri fraco mudando de assunto, mas não me convenço. Seu olhar era de pura
dor.
— Tay, me conta o que houve… — finjo não notar sua cara de pau em
tentar mudar de assunto e tento mais uma vez.
— Vi uma criança ser engolida pela lama. Uma menininha. Minha
vontade era pular do helicóptero, fazer alguma coisa, mas não pude fazer
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nada… o oficial paramédico estava amarrado na corda de segurança e


precisei levantá-lo, ou era capaz dele derrubar o helicóptero… a corda
poderia ficar presa, ele poderia ter sido soterrado também… eu precisei
planar muito baixo para pegá-la e, logo que vi a montanha de barro, precisei
levantar um pouco e… sei lá… é muito complicado ver o que eu vi, esse
sentimento de culpa não vai me deixar nunca mais… — ele diz, eu largo a
bandeja e me arrasto na cama para me aproximar dele.
— Você não tem culpa! Não pode se sentir assim! Essas coisas
acontecem, não dava para salvar todo mundo! — digo enquanto o abraço e
sinto vontade de tirar toda a dor do seu coração e colocar no meu, só para não
ver aqueles olhos azuis avermelhados e tristonhos.
— Tudo bem, eu sei!
— Pensei que já estivesse acostumado!
— Estou acostumado a ver o fogo acabar com uma parte grande da
floresta, bichos morrendo e correndo para fugir desses focos, caçadores
ilegais fazendo seus trabalhos sujos, madeireira desmatando tudo, pessoas
perdidas, crianças perdidas, índios caçando ou em guerra… mas morte?
Morte não! Ver sem poder fazer nada, sem poder ajudar, de jeito nenhum…
— ele diz e parece profundamente triste, mas logo sorri.
— Sinto muito, Tay… — digo com o coração partido porque não consigo
pensar em nada melhor e ele continua sorrindo fraco.
— Eu vou ficar bem… — ele diz e eu começo a comer o café que ele
trouxe, mas só beslico na verdade.
Alguém bate na porta e ele olha para meu corpo, como se parasse para
refletir se eu estava ou não decente para receber visitas de quem quer que
fosse ali. Eu acho sua atitude fofa e, de novo, me odeio por isso.
— Quem é? — ele se levanta e se aproxima da porta.
— Sou eu, Pedro, posso entrar?
— Não!
— Preciso falar com você!
— Sem problemas eu já vou, me espera na cozinha!
— Tá legal! — Pedro grita e Tay volta para perto da cama.
— Por que não deixou ele entrar? — pergunto e ele sorri.
— Nada, gosto de fazer ele de bobo! Vou lá. Até mais! — ele sorri para
mim e se vira.
— Já, já te devolvo tua cama para você poder descansar! — eu falo e ele
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ri.
— Relaxa. Eu já disse que ela é tua. Já tenho meu cantinho naquele sofá
ruim. Hoje mesmo pretendo trocar, vou comprar outro sofá… porque foi um
pouco complicada a noite que passei naquele! — ele diz zombando e meu
telefone toca interrompendo.
Tay, que ia embora, espera até que eu atenda por pura curiosidade e eu
não tenho tempo de expulsá-lo ou de chamar sua atenção ao ver quem era:
Vicente. Fico nervosa e atendo correndo, me levantando.
— Oi, Vicente!
— Oi, lindinha, tudo bem?
— Tudo e você? Tem novidades?
— Hum… tenho sim. Na verdade, estou a caminho da clínica, resolvi
juntar o útil ao agradável e conversar contigo sobre o resultado dos exames
pessoalmente, tudo bem!? Faz tanto tempo que a gente não se vê...
— Claro. Eu amei sua idéia! Estou indo pra lá! Beijo!
— Beijo, até já!
Desligo e me apresso para o banho. Pretendia fazer Ritinha passar em
casa e me trazer uma roupa social em dez minutos.
— Quem era? — Tay pergunta com aquela voz que eu já reconhecia.
— É do laboratório. Preciso ir trabalhar!
— Ok, mas aconteceu alguma coisa? Parece aflita… — ele pergunta
preocupado e eu sorrio achando graça.
— Não aconteceu nada, só me ligaram para falar da visita da
farmacologia e eu preciso estar lá, estou atrasada! — eu digo e já estava para
digitar o número de Rita quando ele se aproxima me tirando do eixo.
— Achei, por um momento, que era sobre o resultado do meu exame…
— ele diz me olhando nos olhos.
— Não, ainda não… — fico sem graça. Nem sei ao certo o porquê estava
escondendo aquilo.
— Tenho uma experiência muita curta contigo, mas mesmo assim sei
quando mente para mim, Ellen! — Tay diz e chega ainda mais perto.
— Ah, é!? Como sabe?
— Quando você mente pra mim, na hora em que conta a mentira, você
desvia o olhar, fica tensa… fez isso o tempo todo na sua clínica enquanto a
gente conversava… e algumas vezes não, me dando a certeza do que era
mentira e do que não era. E, na última vez que fez isso, ainda na nossa
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viagem, foi dizendo que aquilo era errado e que queria que eu parasse. Eu me
aproximei de você, perguntei se realmente queria que eu tirasse a boca e você
disse que sim, mas desviou o olhar, como agora. Então quando teimei e
continuei te chupando, você não me impediu… — ele diz baixo como se não
quisesse que ninguém escutasse aquilo e, de repente, parece voltar ao normal
ao continuar com sua linha de raciocínio. Eu umedeço meus lábios de puro
nervoso e respiro fundo, sentindo o cheiro de seu hálito puro, o cheiro que eu
imaginava que correspondia ao gosto do seu beijo. —… então se é isso, se
for o resultado, não faça alarde, não fale na frente dos meus avós e, se puder,
conte primeiro pra mim! — ele diz demonstrando medo e insegurança.
— Nem precisava me dizer isso. Eu não sou assim… — fico triste,
sentida e ele afirma com a cabeça.
— Só estou falando para que aquele último episódio com minha mãe não
se repita.
— O lance da amizade é serio, da tua parte? — eu questiono e ele
confirma na hora.
— É sim.
— Ótimo, porque para mim também é. Não farei aquilo de novo, se é
para sermos amigos, vamos ser amigos… de verdade! — eu digo e ele
confirma de novo.
Eu sorrio, pego o telefone e ligo para Ritinha trazer uma muda de roupa
específica. Rapidamente entro no banho, me troco e corro para a cozinha. Os
sapatos de salto que Rita trouxe era um dos mais altos, então fui com eles nas
mãos até lá embaixo. Desci toda a escada e só então os recoloquei para ser
mais rápida. O barulho que eles faziam no assoalho de madeira era
estrondoso.
Quase toda a família estava na sala de jantar, cumprimentei todos e fui
para a cozinha, se eu não comesse algo logo, desmaiaria de fome mais tarde e
sabe-se lá Deus, quando eu teria tempo para comer meu almoço, afinal não
consegui me concentrar nem ao menos no café especial que Tay havia me
levado. Entro na cozinha e a turma do barulho tomava café, também
cumprimento todos, dou um beijo na minha mãe e me sento para tomar um
café preto e beslicar um pão doce e uma fruta.
— Está morando aqui, agora? — a tal da Laura solta e coitada… soltou
na hora errada!
Eu estava extremamente nervosa com a possibilidade de saber o resultado
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do exame que descontei toda a minha frustração e nervosismo nela.


— Estou! Algum problema? — eu questiono e ela engole o choro, sua
face fica vermelha de raiva enquanto Tay e Pedro davam risadas quase
histéricas.
— Ellen… — minha mãe chama minha atenção e eu a ignoro, pois a
minha atenção estava direcionada na co-piloto que me fuzilava com olhos
enquanto eu mantinha minha cabeça erguida e também a encarava.
— Perguntei numa boa, agora te vejo sempre aqui… — ela resmunga
enquanto se serve de mais café após se recompor.
— Vai me ver cada vez mais. Aposto que consegue se acostumar! —
resmungo.
Minha mãe olha torto para mim e a cascavel sorri toda cínica. Aposto que
também queria voar no meu pescoço. Pedro parecia querer urinar nas calças e
Tay, sentado ao meu lado, olhava para mim achando aquilo engraçado. Eu
olho pra ele por um momento e volto a comer.
Eu não fiz de implicância. Na verdade, foi sem pensar, foi na lata, rápido
demais, mas eu gostei daquilo. Era bom deixar claro qual era seu devido
lugar. Não poderia tentar fazer uma amizade com ela depois do que vi, depois
de saber de sua intenção para com Tay, não tinha como… então era melhor
deixar tudo muito claro mesmo.
Termino de comer apressada, me despeço de minha mãe e corro para o
carro com o olhar pesado de Tay sobre mim. Obviamente não o correspondi,
mas eu sabia, sempre sabia… minha nuca esquentava e meu coração ficava
acelerado quando ele me olhava sem eu notar.
Chego à clínica e encontro Vicente papeando sorridente com Lari.
— Bom dia! — eu digo e os dois respondem. — Você me fez pular da
cama! — falo olhando para ele e ganho um abraço.
— Isso é bom! — ele sorri para mim e eu devolvo o sorriso.
— Vamos lá? — faço ele me acompanhar até minha sala e nem mesmo
me sento. Jogo minha bolsa na mesa e o vejo caminhando até o sofá.
— Vamos nos sentar aqui, doutora. — ele diz sorrindo e eu fico nervosa.
Se eu precisava me sentar, algo tinha! — Relaxa, mulher… — ele diz ao
olhar para minha face e se apressa em abrir sua maleta.
Eu me sento ao seu lado, ele me entrega o envelope branco lacrado e eu
abro sem demora. Fico lendo, lendo, lendo… e quando termino sinto certo
alívio.
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— Anemia megaloblástica… eu suspeitava… graças a Deus. É só a


injeção de B12 por um tempo, a vitamina em comprimidos, dieta rica em
ferro, e está tudo certo… — murmuro sorrindo, mas Vicente não. — Que foi?
— questiono e ele entorta a boca.
— Isso não é tudo, linda! Olha aqui… — ele me ajuda a chegar às
últimas páginas do amontoado de papéis em meu colo e eu não tinha notado
que era um segundo teste, outro exame.
— Fiz diversos testes, um deles deu positivo para uma droga da pesada!
— ele diz e eu não consigo acreditar.
— Não, ele não se droga! Ele é militar, tem disciplina… não… —
resmungo sem acreditar e começo a ler… — Flunitrazepan, ácido gama
hidroxibutírico e ketamina…
Leio e olho para Vicente sem acreditar naquilo, não era possível, não…
não podia ser!!!
— Sim. Deu positivo e você mesma pode ver, pelos índices no sangue
dele… foi uma dose bem potente, literalmente cavalar. Seu amigo foi dopado
com… falando no popular… boa noite, Cinderela!

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9
UM DIA E TANTO

— Vai falar com ela, não é? Eu perguntei se você queria que eu fosse
embora, você disse que não. Vai permitir que eu fique aqui para ser
destratada desse jeito? — Laura rosnava para mim em seu quarto.
Ela permaneceu com sua pose e nariz empinado até minha princesa ir
para o trabalho. Depois que ela partiu, Laura levantou da mesa e, num
rompante, subiu correndo. Fazendo com que eu e Pedro a seguíssemos sem
entender nada.
— Você mereceu o que ouviu! — eu digo e ela fica pior.
— Mereci? Ela nem mora aqui… — ela quase grita e Pedro responde
rindo.
— Nem você! — eu olho torto para ele e seguro o riso para evitar que ele
piore a situação.
— Bom… amigos como vocês, eu dispenso! — ela diz e começa a retirar
seus pertences do guarda roupa do quarto de hóspedes.
— Não exagera… não precisa ir embora! — eu falo e vejo Pedro ficar
sério e preocupado.
— Não vou ficar aqui vendo vocês dois babarem pela roceira cretina e
ainda ajudando a me humilhar na frente de todos. Não preciso disso. Ela não
é ninguém, você acabou de conhecê-la! Só ficou um dia com a caipira
quando eram pirralhos! Eu te conheço e convivo com você há anos! Não sou
obrigada a passar por isso. Ela não é ninguém perto de mim! — ela diz e eu
seguro a vontade de rir da cara dela.
— Ela mora aqui, claro que é na cabana, mas a casa é minha e ela está
aqui desde criança. Ou seja, a casa é dela! Mais dela do que minha. Não vou
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conversar com ela sobre o que disse, não vou fazê-la se desculpar, pois é
você quem deveria fazer isso por ter sido tão arrogante. Mas realmente não
precisa ir embora, te convidei para ficar aqui, na minha casa. Apenas deixe
Ellen em paz e ela não vai mexer com você, não vai te provocar como você
fez!
— A presença dela já é uma provocação para mim!!! — ela diz.
— Não entendo o porquê!
— Éramos só nós três. Eu tinha a atenção dos dois só para mim. Quer
falar sobre o que passamos na época do Frazão naquele inferno? Eu quero…
a gente se defendia. Se fosse para sofrer, sofríamos juntos, unidos. Se fosse
balada, rolê, era todo mundo junto. E agora, desde que chegamos, o que a
gente já fez juntos? Qual foi a última vez que me perguntou se eu estava
bem? Se eu queria sair? Fazer algo? Quando pediu minha opinião sobre algo
em sua vida? Nunca mais, Tay! E Pedro, que passa mais tempo de babá da
Luiza do que comigo! Desde que chegou aqui é só nessa pobretona que você
pensa! Não preciso ficar aqui, não farei falta aqui, vou embora! — ela diz e
eu fico surpreso. Não sabia que seu ciúme era relacionado a isso.
— Então é esse seu problema? Está carente de mim? — pergunto rindo e
ela vira a cara abrindo a mala e colocando-a em cima da cama.
— Não só de você, mané, dos dois! Até porque, preciso confessar, ando
mesmo no pé da Luiza… a menina é tão interessante quanto Laura é
ciumenta… — Pedro diz e ri sozinho.
— Primeiro, deixa minha irmã em paz. Segundo, cala essa boca! — eu
falo e ele se senta na cama para assistir a cena que Laura fazia.
— Vem cá, gatona, vamos fazer as pazes! Se vai se sentir melhor...
desculpe pela patada maravilhosa que a Ellen te deu e desculpe pela minha
falta de sensibilidade. Vamos sair só você e eu, o que acha? Somos parceiros,
amigos, amigos de trabalho e não podemos ficar brigados! Vamos fazer as
pazes e sair para beber um pouco, conversar… aí aproveito para te fazer todas
as perguntas que não fiz desde que chegamos. Vou tirar sua carência… tudo
bem!? — digo enquanto agarro a morena de cara fechada e ela sorri parando
com a birra, abraço apertado sua cintura e ela se desmancha nos meus braços.
— É bom mesmo… pelo menos isso! — ela diz, eu beijo sua bochecha e
dou-lhe outro abraço. Pedro se manifesta.
— É isso mesmo? Estou fora do rolê!? — ele questiona olhando torto
para a cena e eu e Laura damos risada de sua cara. — Tudo bem, chamarei a
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roceira para um sertanejo! — ele diz e começa a andar para se retirar do


quarto.
Aham. Chama, filho da puta, chama que vai acordar com a boca cheia de
formiga. Penso.
— Bom, coloca essas tralhas de volta no lugar, preciso fazer algumas
ligações. Depois te procuro e a gente sai! — digo, ela sorri e eu saio do seu
quarto em direção ao meu.
Talvez sair um pouco me faça bem, pois a imagem daquela menina sendo
engolida pela montanha de barro não saía da minha cabeça. Eu tinha certeza
que jamais esqueceria aquilo, então, além de deixar uma amiga feliz, eu podia
me distrair um pouco.
Entro no meu quarto, ligo meu notebook e inicio a operação “reconquistar
a minha mulher”. Dar um presente para Ellen não seria tão difícil, sei do que
ela mais ama e posso pagar por isso. Acesso o site de uma grande hípica de
Minas Gerais e pesquiso os cavalos que estão disponíveis para compras.
Clico na aba escrita ‘Garanhão’ e uma galeria se abre para mim. Logo quando
vejo um animal da raça frísio, que se chama Lodov, me apaixono… o animal
é negro como a noite e sua crina é tão extensa que chega ao meio de suas
patas frontais. Era tão lindo, será que ela ia gostar? Não tinha a menor ideia…
De qualquer forma vou comprar e não vou dizer que fui eu até notar sua
reação… se ela ficar feliz, eu digo que fui eu. Se ela ficar irada ou não gostar
do animal, conto depois de alguns anos, quando ela se acalmar. Sorrio
pensando nisso.
Pego o aparelho de telefone e disco o número da hípica. Eles atendem no
primeiro toque.
— Hípica Horse, boa tarde.
— Boa tarde. Estou no site de vocês. Gostaria de saber o preço de um
garanhão Frísio para a compra…
— Claro! Qual o nome dele, senhor? Vou consultar para você!
— Hum… Lodov.
— O Lodov, claro, é um garanhão lindo! Tem sido muito procurado
desde que chegou ao Brasil, viu!? O preço dele é cinquenta e cinco mil,
vacinado, pedigree maravilhoso, 1,70 cm de altura, manso, tem um trote
poderoso, saúde impecável… ele é simplesmente perfeito!
— Tudo bem. Eu tenho uma chácara, mas não sei direito como funciona o
transporte. Além disso, é um presente-surpresa… como e quando vocês
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entregariam?
— Onde fica sua propriedade?
— Barbacena, aqui em Minas mesmo.
— Ah, o senhor está pertinho… só dependemos do período do pagamento
mesmo! Podemos entregá-lo ainda hoje sem problemas nenhum, está bem? O
cavalo vai pelo transporte da hípica, ele também vai acompanhado por nosso
especialista encarregado, ele vai conhecer o espaço de vocês e as condições
em que o animal ficará…
— Entendo... nós já temos outros cavalos aqui…
— Isso é ótimo! Então acredito que já possuem um veterinário!?
— Ele é um presente para uma veterinária e tratadora profissional.
— Nossa! Perfeito. Sendo assim ela estará ciente de que tem um mês para
acompanhar a saúde de Lodov, contando que estamos disponíveis para
esclarecer qualquer dúvida relacionada à saúde do animal e arcar com
possíveis problemas que ela possa encontrar e comprovar, mas isso realmente
não vai acontecer… Lodov goza de perfeita saúde. A documentação dele será
entregue no mesmo dia, junto com sua árvore genealógica, sua documentação
registrada na Holanda, seu certificado de adestramento, histórico clínico,
enfim, tudo! O especialista estará disponível para atendê-la, e mesmo
mediante ao pagamento, a doutora poderá conhecer o animal e, se não gostar
— o que também não tem chances de acontecer —, ela pode devolver o
animal para hípica com toda a segurança…
— Isso é bom. E o pagamento? Como posso fazer?
— Como o senhor puder! Dividido, em depósito, crédito, cheque… da
melhor maneira para o senhor.
— Tudo bem, me manda isso por sms neste número, com o número da
conta. Farei essa transferência hoje, mas não quero que meu nome apareça
em nenhum documento.
— Claro, sem problemas. Te passo tudo por mensagem. Passo a
documentação para o nome de alguém aqui da própria hípica provisoriamente
e, quando ela assinar os papéis, estará tudo no nome dela… resolvemos tudo
em breve. Aliás, qual seu nome, desculpe!?
— É Tay.
— Está certo, senhor Tay! Nos falamos em poucos minutos!
— Tudo bem, até já! — desligo e abro o site do banco. — Meu Deus,
cinquenta e cinco mil reais em um cavalo… essa roceira terá que ser minha
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para sempre pra compensar o rombo nas minhas contas… — resmungo


sorrindo e nego com a cabeça.
Esses foram os cinquenta e cinco mil reais mais bem gastos da minha
vida! Faço tudo que é necessário primeiro por sms e depois por e-mail e parto
para o próximo passo dessa operação. Pesquiso pela internet qual é a
imobiliária da clínica dela e não encontro nada, nenhuma referência,
nenhuma informação.
— Droga. — resmungo e procuro o único que podia me ajudar.
O especialista em encontrar coisas, pessoas, resolver problemas, se livrar
de problemas e investigar a vida de qualquer pessoa no mundo: meu pai e seu
amigo sabe-tudo. Mando um SMS e, depois de vinte minutos, ele vem até
meu quarto, corado e com a roupa um pouco torta.
— E aí, me chamou? — ele questiona e senta na cama.
— Por que demorou?
— Estava com sua mãe. — ele diz sério como sempre e eu fico sem
graça. Interrompi os dois, que ótimo…
— Entendo, me desculpe! Preciso de ajuda com uma coisa! — eu falo
ainda sem graça e ele responde.
— Claro, o que foi!?
— Qual a possibilidade de Jon encontrar uma imobiliária por aqui? A
imobiliária da clínica da Ellen? — digo e ele franze um pouco os olhos.
— As chances dele descobrir qual é são de 100%. — simples.
— Pode fazer esse favor? — eu questiono, ele tira o telefone do bolso da
bermuda imediatamente e aperta dois botões, sim, Jon continuava nos
números favoritos de meu pai.
— Jon? Tudo bem? Legal, estou ótimo, graças a Deus! Preciso de uma
ajuda com uma informação… sim… preciso que me diga qual o nome da
imobiliária que está vinculada a uma clínica e pet shop daqui de Barbacena
chamada Pet Care… sim, vou ficar na linha… — meu pai se levanta e
começa a andar, depois de quinze segundos cravados, sim eu contei, meu pai
volta a falar com Jon. — Isso, Ellen Maia… tudo bem, Jon, muito obrigado!
— meu pai desliga o telefone e o coloca de novo no bolso.
— Collina Imóveis. Com dois ‘L’. — ele diz e me olha confuso.
— Obrigado, pai!
— Tudo bem, sem problemas. Só avise a Luiza, porque quando ela notar
a falta dessa grana vai fazer um escândalo. E cuidado, um ato como esse pode
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sair errado… Ellen é independente e ama essa condição, pagar as contas dela
pode ofendê-la, deixá-la chateada! — ele diz e sai do quarto.
Eu penso nisso e sinto que ele está certo… Ellen realmente parece nunca
aceitar esse tipo de coisa. Ligo para a imobiliária mesmo assim, digo que sou
um amigo, pergunto a respeito do assunto, coloco charme na atendente e ela
me passa o valor. É menos do que eu imaginava, logo, logo Ellen pagaria
tudo o que faltava. E nenhuma parcela estava atrasada, então eu adio essa
parte do plano. Não podia arriscar perdê-la de novo sem nem ainda tê-la
reconquistado… mas se eu souber de qualquer dificuldade dela, eu vou pagar
e quero se foda!!!
Mando um SMS para Lulu, peço para ela vir me ver e corro tomar um
banho. Quando saio, já encontro a pirralha na minha cama, brincando com
Dobby.
— Oi… — eu falo e ela sorri para mim.
— O que foi?
— Fiz o que me sugeriu… comprei um presente para Ellen! — eu digo e
ela arregala os olhos de felicidade.
— Legal!!! O quê???
— Um cavalo. — eu digo e ela se assusta ao ponto de travar.
— Nossa, eu sugeri uma lembrancinha!!! Quanto custou???
— Não custou nada perto do que quero dar a ela! Nada, perto do que ela
significa! — resmungo mais para mim mesmo e ela se levanta da cama.
— Tudo bem, mas vai acabar me deixando pobre! Vai falir nossa família!
Que raça é? — ela questiona e eu sorrio me sentando na cama, enquanto seco
o cabelo.
— Um frísio. — eu falo e ela se joga na cama.
— Deus, eu vou morrer!!!
— Não exagera, garota! — eu falo e Dobby se aproxima lambendo minha
mão.
— Ellen, depois dessa, vai ter que casar contigo e te amar para sempre ou
nunca mais falo com ela!!! E não te apoio… desde o dia que Raivoso quase
me matou, não gosto mais de cavalos.
— Bobagem… os outros cavalos não têm culpa, não precisa odiá-los. Ele
não sabe o que fez…
— Eu sei, eu sei… mas é difícil esquecer!
— Eu entendo, espero que isso um dia isso passe. Agora, com relação ao
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presente, não quero que conte para ela. Talvez ela fique brava por isso, então
não quero que conte! — eu digo e ela sorri.
— Tudo bem, se for para reconquistar a Ellen, eu topo tudo… até um
desfalque de mais de quarenta mil nas minhas contas… — ela resmunga a
última parte da frase em voz baixa e pega Dobby da cama.
— Como sabe o preço de um cavalo? — questiono surpreso e ela me olha
torto.
— Nós temos cavalos, sei quanto custam, quanto custa mantê-los, ração,
equipamentos… Ellen e suas compras de mimos para esses bichos traiçoeiros
é a parte do meu trabalho que mais me dá dor de cabeça. Se um dia pretender
casar com ela, saiba: Ellen é totalmente consumista. Trabalhe bastante, pilote
muitos aviões ou não dará conta de agradá-la. É só ração mais cara, cela
importada, rédeas de última geração, botas de hipismo… meu Deus… um dia
eu ainda me demito e volto a minha profissão de fazer apostas com papai em
dólares. Pelo menos naquela época eu ganhava mais-! — ela diz fingindo
estar chateada e sai do quarto resmungando.
Eu apenas sorrio. Se essa mulher me deixasse falido enquanto
estivéssemos casados, eu ia falir feliz. Faço tudo para vê-la sorrir. Ela me
pagaria por cada prejuízo na cama e eu seria o homem mais feliz do mundo.
De repente me lembro do passo três, que não é necessariamente para
reconquistá-la, e resolvo tudo por telefone. Foi o mais fácil, agora era só
esperar. Desço para a sala e estão todos vendo televisão.
— Oi, sumido… vive dormindo agora, não é!? — chego perto do velho
resmungão e ele ganha um beijo meu.
— Só estou morrendo devagar naquela cama… — ele resmunga fraco e
meu coração se aperta.
— Não fala bobagem, velho! — eu digo e minha avó bufa nervosa ao seu
lado.
— Está cada vez mais resmungão, só fala asneiras! — ela diz.
— Aí não pode, não é, vovô!? — eu falo e ele faz cara feia, me sento no
meio dos dois e me sinto feliz. — Cadê as crianças, Nina? — pergunto para
minha tia gata que estava jogada no sofá e ela sorri ao responder.
— Notou que a casa está silenciosa, é!? Rafa foi conhecer um espaço para
abrir a academia dele aqui e eu pedi para ele levar os dois, me dar uma folga!
Ontem eles foram também… — ela diz e eu fico rindo enquanto encaro seu
semblante de felicidade.
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Levanto e me sento ao seu lado para agarrá-la e receber carinho. Minha


mãe, que sentava mais afastada dela, bufa por ciúmes. Vou até ela e a encho
de beijos por todo o rosto. Seus olhos chegam a brilhar por causa do meus
carinhos, então fico ali até depois do meu pai chegar e se sentar do outro lado
dela. Éramos nós, os dois homens de sua vida.
Eu me perco em pensamentos e viajo para uma época em que éramos só
nós dois, depois só nós três e paro na época em que a roceira aparece em
minha vida se fazendo de muda naquele quintal. O meu amor bandido, minha
princesa…
Pensar nela faz meu coração doer e, quando me recuso a continuar
sentindo aquilo, ela aparece na sala, batendo aquele salto agulha no assoalho
de madeira. Não tem nada mais sexy no mundo do que aquela mulher, que
normalmente está de botas de montaria ou descalça pela chácara, de salto em
sua roupa clássica branca.
Ellen tem um semblante furioso e extremamente mau humorado. Ela
caminha até a entrada da enorme sala e, ao olhar para meus avós, trava,
inspira e solta o ar pela boca, me olha profundamente nos olhos e sobe as
escadas, deixando a ordem para seguí-la bem clara. Não penso duas vezes,
porque não sou idiota, e vou atrás dela imediatamente.
Eu me levanto já tremendo de medo e a sigo até meu quarto. Seu andar é
rápido e amedrontador, parecia marchar para a guerra. Eu entro no quarto
atrás dela e a vejo jogar a bolsa e um envelope branco na minha cama.
— Diz de uma vez… — já peço para que aquela agonia passe logo e ela,
que tinha suas costas viradas para mim, dá meia volta e me encara. — O que
eu tenho? — questiono e me aproximo.
Ellen parecia a ponto de enfartar, seu peito subia e descia muito
rapidamente como se ela tivesse vindo do centro da cidade até aqui correndo.
— Cadê aquela… — ela para de falar e parece se concentrar para se
acalmar. —… aquela mulher!? — ela se referia à Laura com ódio e sangue
nos olhos e eu não entendia o porquê.
— Primeiro, fica calma. Depois me explica o que está havendo! Por que
tanta implicância com minha amiga? — eu digo e ela sorri nervosa e irônica.
— Sua AMIGA te dopou, Tay! Sua AMIGA te deu um ‘boa noite,
cinderela’ naquela festa que sua família fez para você!!! — ela diz e eu dou
risada.
— Você está pirando… está doida, Ellen!? — eu continuo rindo alto e
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enquanto isso ela surta, abrindo o envelope branco com grosseria. Que
loucura era essa?
— Leia a penúltima página! Aí você vai ver o que foi encontrado no seu
sangue naquela manhã! Flunitrazepan, ácido gama hidroxibutírico, ketamina,
lorax e outras milhares! Um co quetel de drogas que poderia ter te matado!
Pelas drogas em si, pela quantidade gigantesca que você ingeriu e pela sua
doença! Você tem anemia megaloblástica! Ela poderia ter matado você!
Aliás, está vivo por milagre… pelo tanto que tomou, não sei como está
vivo!!! Poderia até listar o que houve com seu corpo naquele dia, por causa
da droga… aquilo quase te destruiu! — ela diz me entregando os papéis e não
entendo nada do que está escrito.
Aquilo não podia ser verdade, Laura não faria isso comigo.
— Ela não faria isso comigo… não pode ser, por que ela faria isso!? —
eu estava ficando tonto.
Sento na cama antes de minhas pernas falharem e coloco os papéis ao
meu lado. Eu estava começando a suar frio e não me sentia bem.
— Está passando mal, não é? Muito mal, não!? Daqui a alguns segundos
seu nariz vai sangrar… é raro, mas em alguns casos isso acontece com quem
tem essa doença. Foi por isso que sangrou no vilarejo, ficou estressado
demais, nervoso demais, comigo lá… mas não se preocupe, vai tomar
vitamina B12 praticamente pelo resto da vida e ficará bem. Fique feliz, você
é um sobrevivente! — ela diz com agressividade e me sinto mal pela forma
como falava comigo, pelo que supostamente Laura havia feito e pela minha
doença.
Pelo jeito não era grave, mas só de receber a notícia de que você tem uma
doença… é barra! Penso nisso e já sinto meu nariz formigar e o sangue
escorrer. Estanco o nariz com a mão e vejo Ellen ir até o armário calmamente
para pegar uma fronha de travesseiro. Ela me entrega com um semblante
triste, vai até sua bolsa e me estende um comprimido na cor vinho. Eu engulo
a seco e ela me ajuda com o nariz, que logo para de sangrar.
— Vou esperar seus avós saírem e vou contar tudo para seus pais. Vou
processá-la, vou acabar com a vida dela! — ela diz segurando a própria raiva
e eu não sei o que dizer.
— Não precisa de tudo isso, Ellen. Vou deixar ela se explicar, tem algo
que não se encaixa, não tem porquê ela fazer algo assim… ela não tinha
motivos, nunca me machucaria! — eu digo e ela se afasta de mim parecendo
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estar enojada.
— Ela te dopou!!! Tirou a sua roupa, dormiu pelada em cima de você!!!
Você está de brincadeira comigo? Isso é abuso!!! Como não tinha motivos?
Só de olhar para ela já dá para ver que ela quer te engolir… — ela diz quase
gritando.
— Ellen, fala baixo! Ela não precisaria me dopar para que eu a levasse
para cama! Antigamente era só ela dizer que queria! Principalmente na noite
em que você partiu meu coração. Eu continuei lá, olhando aquele cara sair de
sua cabana agarrado a você!!! — eu digo e ela parece impaciente, como se
estivesse lidando com uma criança. Ellen continuava andando para lá e para
cá, ela não estava se aguentando.
— Tay, você já me magoou muito, foi egoísta comigo naquela noite, era
mimado, até irritante às vezes, mas se tem algo que você nunca foi é burro!!!
Então não seja agora! Sabe muito bem que, desde que pisou aqui, não deu
moral para ela! Tudo se encaixa. Diz! Você não deu foras nela, por minha
causa!? Aposto que deu! E foi por isso que ela dopou você, porque nunca
mais demonstrou querer levá-la para cama… estou mentindo? Nem precisa
ser tão inteligente para juntar um mais dois…
— Certo, Ellen, tudo bem. Pode ser isso, muito provavelmente você está
certa! Mas escuta, nada mais me importa agora, a única coisa que quero no
momento é que ela assuma que me dopou e que nada aconteceu, só para eu
ter uma única chance contigo, pelo menos uma fina abertura. E nada mais me
importa… Laura, doença, drogas, só o que quero no momento é ter você de
volta para mim! — digo com calma ainda me recuperando e olho em seus
olhos.
Sinto que consegui tocá-la e comemoro por dentro. Ela se aproxima ainda
irritada, mas não se incomoda quando envolvo sua cintura e enterro a face em
sua barriga. Naquele mesmo momento a porta do quarto se abre e Laura entra
junto com Pedro, sorrindo e conversando alto, descontraidamente. Nesse
instante, Ellen se vira como um raio em direção à porta e, em um ápice de
loucura, corre para cima de Laura e voa direto em seu pescoço.
Eu e Pedro travamos enquanto vemos Laura sendo arrasta pelos cabelos,
da porta até o meio do quarto. Eu sabia que a roceira era durona, mas nunca
acreditaria naquela cena se eu mesmo não a tivesse presenciado. A força de
Ellen era descomunal, a veterinária ‘magricela’ estava prestes a nocautear
uma tenente das forças armadas, uma mulher com rotina militar pesada, uma
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mulher que, se quisesse, me derrubaria em três segundos.


Tudo isso com salto agulha.
Ellen puxou Laura pelos cabelos até onde queria. Laura se debatia no
chão e agarrava as mãos de Ellen, implorando para que ela parasse com
aquilo, mas Ellen nem ao menos ouviu, não deu clemência. Ela arrastava a
militar e, ao parar, sentou em sua barriga e começou a esbofetear Laura com
uma violência fora do comum. Ellen, que havia feito todo seu percurso em
silêncio, de repente começou a gritar, assim como Laura gritava. Ela gritava e
deformava o rosto de minha colega de trabalho, enquanto pequenas mechas
de seus cabelos caíam em sua face.
Ali estava a selvagem que eu tanto amava.
— E ENTÃO, SUA VADIA, POR QUE NÃO ME ENCHE DE
DROGAS TAMBÉM??? HEIN!!?? VEM ME DOPAR!!! SUA CACHORRA
SARNENTA!!! — Ellen socava a cara de Laura, mas Laura só tentava se
defender. Como militar sabia que só podia segurar Ellen, talvez apagá-la, mas
ela sabia que eu nunca ia permitir.
Enquanto gritava, Ellen voltava às raízes antigas e tinha um sotaque
forçado demais, que só me fazia achar engraçado. Cômico se não fosse
trágico. Enquanto ela estava por cima eu estava despreocupado…
— DO QUE VOCÊ ESTÁ FALANDO, SUA MALUCA??? VOCÊ É
DOIDA??? ME SOLTA SUA CAIPIRA DOENTE!!!
— SÓ VOU SOLTAR DEPOIS QUE EU VER A POÇA DE SANGUE
AO SEU REDOR, SUA PSICOPATA!!!
O caos estava instaurado.
As duas gritavam, Laura se debatia e tentava proteger seu rosto e Ellen
não era mais a Ellen. Ou não, ou aquela era verdadeira roceira que eu não
conhecia, seu verdadeiro ‘eu’, não tinha como saber… Pedro me olhava
embasbacado e, quando voltei a realidade e percebi no que aquilo ia dar,
puxei Ellen de cima de Laura e a segurei pela cintura. Ela gritava comigo, me
olhando nos olhos e implorando para soltá-la, mas eu só dizia não. Pedro,
depois de um tempo, foi ajudar Laura, que estava preste a desmaiar de tantos
socos na cabeça.
— ME SOLTA, TAY! VOU MATAR ESSA VAGABUNDA!!! — ela
grita para mim, se debatendo para se livrar de meus braços.
— Não vai matar ninguém, fica calma mulher, se controla! — eu a
segurava e ela se debatia.
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— TAY, ME SOLTA!!! ME SOLTA QUE VOCÊ VAI VER!!! VOU


ACABAR COM A RAÇA DESSA NOJENTA, ASQUEROSA!!! — ela grita
ainda mais e, nesse momento, meus pais e tia Nina entram no quarto.
— O que está havendo aqui? Estão assustando seus avós! Ellen, o que
está fazendo??? — minha mãe pergunta possessa por causa da gritaria.
— ESSA VADIA!!! DOPOU ELE, TIA!!! ENCHEU O TAY DE
DROGA NAQUELA NOITE, QUASE O MATOU!!! — Ellen apontava para
Laura, que limpava o próprio rosto em uma camiseta minha, se segurava em
Pedro para se manter de pé, e permanecia em silêncio como se fosse uma
coitadinha.
— Menina, o que você está dizendo??? — tia Nina questiona.
Minha mãe trava olhando para Laura e meu pai entra na roda em estado
de alerta por ouvir o que Ellen havia acabado de dizer em alto e bom som.
— O que ela está dizendo é verdade??? — minha mãe questiona olhando
para Laura, sem acreditar naquilo.
— Essa roceira é maluca!!! Óbvio que não é verdade, isso é um absurdo,
não fiz nada disso! — Laura diz chorosa e Ellen se agita nos meus braços.
— MALUCA??? EU SOU MALUCA??? — ela grita e depois se volta
para mim, a morena tinha sua face avermelhada de pura fúria. — ME SOLTA
AGORA OU VOCÊ VAI SE ARREPENDER!!! — ela diz e eu obedeço.
Ela corre pegar o envelope na cama e se aproxima da tenente batendo a
papelada em sua face ensanguentada, dizendo que tinha provas do que falava,
dizendo que Laura não tinha escrúpulos nenhum ao dizer que era ela quem
mentia.
Antes da briga toda recomeçar, meu pai se adianta e segura Ellen para
afastar uma da outra. Eu não gosto da cena e tiro Ellen das mãos de meu pai,
faço ela se afastar, fazendo ficar longe de todos, mas Ellen não para. Ela vai
até minha mãe e entrega a papelada.
— Aqui está tudo o que eu estou dizendo! Se não acreditam, leve em
qualquer médico, farmacêutico, enfermeiro, tanto faz! Qualquer um com o
mínimo de estudo vai identificar! Nas últimas folhas eu grifei o co quetel de
drogas que encontramos no sangue dele! Tay tem um tipo de anemia grave
que, com tudo aquilo de droga, poderia ter morrido! E mesmo se não tivesse
riscos, ela o dopou, o drogou, o fez apagar ao ponto de não se lembrar de
nada e nem conseguir se proteger, tirou a roupa dele e eu os encontrei nus,
com essa doente mental em cima dele!!! — Ellen diz alto para todos ouvirem
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e Laura me olha de olhos arregalados e cheios de culpa.


— Ácido gama hidroxibutírico… isso aqui é "boa noite, Cinderela"? —
meu pai pergunta diretamente para Ellen depois de tirar a papelada da mão de
minha mãe.
— Sim. Por isso ele não se lembra de nada, por isso dormiu demais até o
dia seguinte. E nas primeiras folhas está o resultado da doença, anemia
megaloblástica. Agora a pouco, enquanto conversava comigo, seu nariz
sangrou de novo. Sem medicamentos, isso voltará a se repetir! Pela dose que
tomou, é um milagre ele ainda estar entre nós! Essa desgraçada quase o
matou! — ela diz e todos olham para Laura, até mesmo Pedro, mas Laura só
olhava para mim, me olhava e chorava em silêncio.
— Você fez isso??? — minha mãe andava com calma na direção dela só
querendo a confissão.
Meu pai, que não era bobo nem nada, a seguiu para pará-la quando fosse
a hora. Laura começava a soluçar de tanto chorar e, ao responder, gaguejou
como uma criança quando confessa algo com medo de apanhar.
— Eu fiz, mas…
E só bastou isso.
Só o começo de uma frase, só o ‘sim’ que Ellen queria. Laura nem
conseguiu responder. Minha mãe acertou um tapa forte em sua face e meu pai
a puxou para longe.
— Você pode me soltar, homem! Não se atreva a me segurar, não ouse
colocar a mão em mim… — minha mãe começa e meu pai obedece. Livre
dele, ela continuava falando. — Acolhemos você aqui, como se fosse da
família, e você droga meu filho? Por que fez isso, menina? Para que tudo
isso???
— Eu não sabia… eu não queria… — Laura gagueja.
— O que você tem na cabeça? Quis dopar meu filho para quê? Para
quê??? — minha mãe questiona indignada e volta a ficar em sua frente.
Eu já previa outros tapas de dona Hella e sabia que meu pai permitiria,
então resolvi parar com aquilo. Antes que eu me mexesse, meu pai fala
primeiro.
— Deixe-nos a sós, quero ter uma conversa com ela… — ele diz e toca a
minha mãe, que continuava encarando Laura com sangue nos olhos.
Eu não podia deixar meu pai conversar com ela, pois não sabia mais
como ele lidaria com aquilo. Laura poderia sair do quarto em um saco preto.
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Sim, acredite em mim! Ou sairia de lá direto para a administração da força


aérea. E eu não queria nada daquilo.
— Isso é um problema meu, pai! Deixa que eu me resolvo com ela! — eu
digo isso e acontece o que eu temia, Ellen me olha indignada.
— Não vai ter conversa nenhuma. Ela já confessou! Não tem o que
esclarecer, Tay! Já chega…
— Não! — eu corto seu julgamento e ela me olha horrorizada.
Eu olho em seus olhos e faço uma prece para que minha decisão não a
afastasse ainda mais de mim.
— Vou deixar que ela se explique! Vou ouvir a versão dela, não pode ser
que tenha me drogado a custa de nada… — eu digo e, não só Ellen, mas
todos no quarto me olhavam curiosos.
Todos olhavam para mim tentando entender o que eu queria com aquilo,
já que ela já havia confessado. Ellen, que estava do meu lado, se coloca na
minha frente e me olha com raiva.
— Eu vou te dar trinta minutos e, depois disso, quero essa mulher fora
dessa casa! — ela diz com uma raiva extrema e eu concordo com a cabeça.
Ela me olha por mais um segundo e, com calma, pega o exame e sua bolsa, e
se retira do quarto. Em poucos segundos todos fazem o mesmo, deixando nós
dois a sós.
— Por que você fez isso comigo? — logo pergunto e ela se aproxima de
mim.
— Tay, me perdoa, eu não sabia que você estava doente, diz que me
perdoa… Tay, por favor! — ela diz enquanto chora e não me comove.
— Por que? — pergunto de novo e ela se senta na cama.
— Eu segui você até aqui e começamos a conversar… você só falava
nela, só falava nela. Ameaçou ir atrás dela de novo, porque parecia que você
tinha o visto com alguém. Queria ir brigar com ela, tirar satisfações, estava
fora de si, um pouco alterado e exagerado por conta do vinho. Ainda bebeu
mais um pouco antes de subir aqui… eu não podia deixar você se humilhar
daquele jeito por ela, não podia deixar!!! Então me lembrei que eu tinha um
pouco da droga… te fiz tomar no copo que eu estava bebendo, coloquei
enquanto você desabafava nervoso. Eu tremia muito ao fazer aquilo, estava
muito nervosa, tão nervosa que acabei derrubando demais! Mas você estava
tão agitado que virou o copo, virou tudo, Tay!!! Tomou uma dose muito alta,
me perdoa por isso! — ela confessava chorando e eu não podia acreditar.
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Só Deus sabe o quanto eu tinha esperanças de que ela dissesse que não
tinha sido ela, ela não… minha amiga, não.
— Por que acordamos nus? Por que sem roupa? O que fez comigo Laura?
O que você fez comigo? — perguntei enojado e já sentia a ânsia de vômito
chegar.
— Eu não fiz nada, juro que não fiz nada!!! Juro por Deus que não toquei
em você… só fiz aquilo para você achar que a gente tinha feito algo e assim
parar de me dar foras. Primeiro você demonstrava querer, demonstrava querer
ficar comigo, mas depois que chegou aqui só dizia que isso nunca ia
acontecer! Então fiz aquilo achando que, se você pensasse que já tinha
acontecido, pensaria nessa possibilidade, afinal já tinha rolado mesmo… eu
queria muito ficar com você, queria muito!!! Mas juro que não te toquei, só te
despi e te abracei para dormir do seu lado. Você me conhece, sabe que nunca
faria isso! — ela diz me olhando nos olhos e eu dou risada por conta do
nervosismo.
— Não, você está errada, eu não conheço você!!! Pensei que éramos
amigos antes de qualquer coisa, antes de qualquer atração física, antes de
tudo! Não consigo entender como teve coragem de fazer isso comigo! Eu
nunca faria isso com ninguém, muito menos com você. Isso é doentio. É um
crime…
— Tay, me perdoa, por favor!!! Por favor… — ela diz enquanto tenta
chegar perto de mim e me tocar, mas me afasto e a empurro de leve.
— Não consigo, não ainda. Não agora! — eu digo e me sinto triste. Muito
triste. Aquela situação era no mínimo bizarra demais, maluca demais. — Vai
arrumar suas malas… — digo sem olhar em seus olhos e sigo em direção à
porta, mas Laura corre e me agarra antes de sair, se ajoelhando e segurando
em minhas pernas.
— Tay, por favor, me perdoa!!! Nunca quis machucar você! Não toquei
em você… não fiz nada, não queria te prejudicar, só queria ter você… não
consegui aceitar ver você se humilhando por ela!!! — ela diz enquanto chora
e eu a forço a se levantar e parar com aquilo.
— Queria ficar comigo me dopando? Você é maluca, precisa de
tratamento…
— Eu errei, eu sei que errei, mas estou te pedindo perdão! Me perdoa, por
favor!!!
— Vai fazer suas malas…
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— Para onde eu vou? Não tenho para onde ir, não conheço nada desse
lugar!
— Não sei, vai para um hotel, aqui você não pode ficar. Vai colher o que
você plantou! E nunca mais se aproxime de mim ou eu mesmo denuncio
você! Entendeu bem? — eu digo e saio do quarto, deixando Laura sozinha.
Vê-la assim me doía, me deixava mal. Mas o que ela fez me deixou
péssimo, me prejudicou e eu não podia perdoá-la. Nunca pensei que Laura
seria capaz de algo tão maligno e nojento. Ela era minha amiga, por que fez
isso comigo??? Paro de me fazer perguntas, desencosto da porta onde me
escorei para secar o rosto e me recompor, e desço para a sala. Só encontro
meus avós.
— O que foi que aconteceu, meu amor? Ouvi os gritos e ninguém quer
nos contar! — minha avó se levanta do sofá e eu sorrio para ela.
— Eu e minha amiga brigamos, vovó, só foi isso. — eu digo e meu avô
me olha.
— A menina Laura? O que ela fez? — ele questiona e fico nervoso, mas
não demonstro.
— Nada demais, vovô!
— Então é só desculpar a menina…! — ele diz e já fico tenso.
— Já desculpei, vô, já está tudo bem! Não se preocupem com nada. Cadê
todo mundo? — pergunto e minha avó volta a se sentar.
— Estão na cozinha!
— Está bem. Eu vou lá conversar com eles… desculpe pelos gritos! — eu
digo e sigo para a cozinha, encontro todos reunidos.
— E então??? — minha mãe já pergunta, consigo notar que sua ira ainda
não tinha passado.
— Conversamos. Foi um grande engano, está tudo certo! — eu digo e
vejo Ellen fechar os olhos com impaciência e respirar fundo.
— Engano??? Está de brincadeira??? — minha tia questiona e eu olho
para ela pedindo para ela não começar com aquilo.
— Vou voltar para o meu trabalho… — Ellen diz muito baixo falando
com sua mãe que estava ao seu lado, e dona Isabelle entrega uma bolsa
térmica para a filha. Ela diz ‘tchau’ para todos e eu vou atrás dela até seu
carro.
— Acabou a amizade? — questiono e ela para no meio do caminho.
— Depende. Quando ela vai desaparecer daqui? — ela fala sério.
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— Já está fazendo as malas. — eu falo e ela parece relaxar.


— Ótimo. Quanto mais longe ela estiver, mais amigos seremos! — ela
diz e volta a caminhar, seguindo até seu carro.
Acho o comentário sugestivo, mas ainda assim a forma como falava
comigo me incomodava demais. Ellen, que agora não tinha motivos para me
odiar, parecia querer me tratar mal só para não dar o braço a torcer e se
entregar. Volto para a cozinha e os questionamentos continuam, até que
Laura aparece de malas feitas.
— Acho que devo um pedido de desculpas a todos! Como já expliquei
para o Tay, não foi minha intenção prejudicá-lo… Eu sinto muito! — Laura
diz e todos a encaram em silêncio, mas depois meu pai fala.
— O que você fez foi muito grave, tenente! Pode se prejudicar muito por
causa disso!
— Eu sei, eu entendo.
— E vai! Porque EU vou te denunciar para FAB!!! — minha mãe diz
ainda alterada e eu tento acalmar os ânimos.
— Ninguém vai denunciar nada, mãe! Ela já se explicou, já se desculpou
e vai pagar por isso com a co5nsciência. Está tudo certo! — eu digo e Pedro
me olha.
— Vem, eu te levo! — Pedro diz, eu entrego as chaves do meu carro para
ele e os dois saem como se estivessem de luto.
Eu realmente estava. Minha amizade com Laura havia padecido hoje.
— É isso? Vai ficar por isso mesmo? Ela não vai pagar pelo o que fez? —
minha mãe encara cada um ali e meu pai a abraça em uma tentativa fraca de
acalmá-la.
— Olhou para ela? Ela já está pagando! Todo mundo erra, cunhada… —
tia Nina diz e minha mãe sai revoltada.
Conversamos sobre o fato a tarde toda e, quando Pedro retornou, se
trancou dentro do quarto e não saiu mais. Eu não fui atrás porque tudo o que
eu queria era esquecer aquilo, pelo menos por algumas horas.
Eram 19:00hrs quando recebi a ligação da hípica dizendo que a
transferência já havia sido aprovada e que Lodov já estava a caminho. Como
se o destino quisesse que aquilo desse certo, Ellen chegou alguns minutos
antes da ligação. Eu estava na rede quando ela chegou, ela se aproximou e
seu perfume chegou primeiro em minhas narinas.
— Seguranças, não é!? Pensei que estava curtindo com a minha cara… —
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ela diz.
— Não vai adiantar discutir comigo. Eles ficarão lá, Ellen. Apenas aceite!
— digo e olho para ela, em pé, ao meu lado na rede.
— Não vou discutir. Vim agradecer pelo cuidado. Obrigada por isso… —
ela responde e eu fico surpreso, surpreso ao ponto de conseguir sorrir, mesmo
sendo um dia de cão como aquele.
— Meu Deus, vai chover aqui!!! — eu me levanto para zombar dela e ver
mais de perto sua carinha de brava.
— Continue… posso mudar de ideia e expulsá-los de lá a qualquer
momento!
— Expulsa nada. Vai deixar que eles trabalhem porque te pedi isso! É só
para sua segurança, só porque me preocupo!
— Eu sei! — ela diz e me olha de uma forma diferente, mas depois
parece se recompor e volta ao estado normal. — Te trouxe isso, é um por dia
e mais as injeções. Se não quiser que eu dê, pode procurar alguém para fazer
isso! Aqui está a receita e essas são a injeções que duram por um mês, depois
tem que comprar mais. — ela me entrega um monte de remédios e me sinto
feliz.
— Eu quero que seja você! Obrigado! Por isso e todo o resto! — eu digo
me aproximando e, quando consigo sentir o cheiro de seu hálito, fico em
transe.
— De nada, amigo! — ela diz sorrindo e eu volto para Terra.
Ela usa a palavra ‘amigo’ para me tirar o foco e fico irritado.
— Você já pode parar com isso, Ellen. Vai ser minha mulher!!! Pode não
ser agora, hoje, ou amanhã… mas vai ser minha, vamos ficar juntos! Eu vou
reconquistar você, então economiza nesse teatro ridículo que a gente
inventou!!! Eu estou parando por aqui. Ele acabou para mim, as cortinas se
fecharam! Eu não entendia o porquê acordei nu com Laura em cima de mim,
porque até então, era só em você que eu pensava. E agora que descobri que
realmente não traí o que sinto por você, vou lutar por você enquanto eu
puder, com todas as armas que eu tiver e você vai ser minha, só minha, para
sempre, até ficarmos velhinhos! — eu digo e não a deixo assustada.
A caipira selvagem nunca se abala por nada.
— Espero esse dia chegar a muito tempo… essas palavras são tão velhas,
Tay! — ela diz se aproximando mais ainda de mim. Uma leve inclinada para
frente e eu poderia beijá-la.
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— Eu vou cumprir!
— É bom que cumpra. Já demorou demais, é bom que você cumpra!
— Eu te amo! — eu digo no mesmo tom de voz que disse tudo o que eu
queria e, por um momento, ela fecha os olhos ao ouvir aquilo.
Acho que fiquei certo tempo sem dizer e ela estava com saudades.
— Eu sei disso. — ela diz e se retira.
Meu coração chega a vibrar de felicidade e excitação. O amor que eu
sentia por aquela mulher me deixava mais zonzo que minha “anemia auto-
imune”.
Quando o caminhão da hípica chegou, Ellen jantava com a mãe na
cozinha. Eu ainda estava na rede da varanda e meu pai e Lulu brincavam com
Dobby na frente do casarão, por isso foram os primeiros a receber o presente.
Logo me aproximei.
— Oi, Chácara Pôr do Sol, certo!? — o homem que estava sentado no
banco do passageiro desce e cumprimenta meu pai.
— Sim, é isso!!! — ele responde e Lulu olha para mim, sorrindo. Faço
cara feia para ela parar e ela entende.
— Temos uma entrega de um garanhão friesian, para Ellen Maia. Ela se
encontra? — o homem questiona.
— Luiza, vá chamar a Ellen para o papai, por favor! — ele diz e Luiza sai
correndo em direção à entrada da cozinha.
Segundos depois Ellen aparece de mãos dadas com Luiza enquanto o
homem e o motorista tiram o animal da cabine.
— Pois não!? — Ellen diz e fica paralisada ao ver o animal.
Antes mesmo dele se explicar, ela já chega perto dele, faz carinho em sua
cabeça e toca sua crina parecendo estar enfeitiçada. Bom, pelo menos ela
gostou…
— Um Frísio puro! Nunca vi na minha vida!!!
— É Ellen Maia?
— Sou eu, sim… — ela diz ainda encantada com o animal.
— Esse garanhão é um presente. Pode assinar aqui, por favor!? Preciso
conhecer o espaço onde ele ficará, e…
— Presente de quem??? — Ellen interrompe o homem e ele olha sem
graça para os papéis.
— Não deixou o nome, não, senhorita! — ele diz e Ellen olha para mim.
Eu me forço a permanecer sério e ela se aproxima. Penso em fingir
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ciúmes por vê-la sendo cortejada, mas não sei se funcionaria.


— Foi você??? — ela questiona sorrindo e com os olhos brilhando.
Ellen se aproxima de mim como se aproximou na varanda e posso voltar
a sentir seu cheiro delicioso.
— Claro que não. — digo sem sorrir e ela sorri ainda mais.
— Foi você, sim!!! — ela quase grita e me abraça apertado. Sorrio com
aquilo e toco sua cintura, correspondendo ao abraço. — Obrigada!!! — ela
diz baixo só para eu ouvir e me larga, correndo de volta para o cavalo.
Meu pai e Luiza me olham sorrindo e eu sinto meu rosto esquentar. Ellen
assina os papéis e volta a acarinhar o lindo cavalo.
— Você é tão lindo, mas tão lindo!!! Como ele se chama??? Trouxe todos
os documentos dele? Como está sua saúde??? — Ellen enche o
acompanhante de perguntas e ele sorri ao responder.
— Ele se chama Lodov, doutora! E ele está ótimo! Trouxe tudo. Quando
estiver pronta, posso conhecer a propriedade!? — ele diz e Ellen sorri
lindamente, tanto que o homem olha para ela se desmanchando.
— Claro, desculpe… vamos lá! — ela diz e eles seguem em direção ao
estábulo.
— Você não vai junto!? — meu pai pergunta.
— Não. Deixa-a. Ela sabe se virar sem mim! — digo sorrindo e meu pai
bate no meu ombro.
— É isso aí, temos por hoje dois pontos para você! — ele diz, ri do que
falou e volta a dar atenção para a princesinha dele.
Subo para esperar que um milagre aconteça e Ellen suba para “dormir” e
não consigo deixar de pensar no dia de hoje. Foi tenso demais… quando me
jogo na cama, Pedro bate na porta.
— E aí, tudo bem? — ele questiona.
— Estou tentando ficar… como ela está? — pergunto.
— Arrasada, claro. Não podia ter perdoado? — Pedro diz e eu dou risada.
— Está de brincadeira, não é!
— Não, não estou não. Somos amigos, brother…
— É por isso que estou decepcionado! Ela não podia ter feito isso
comigo!
— Eu sei, mas e agora!? Como ela fica agora? Vamos abandonar a
mulher em uma cidade que ela não conhece? Sozinha???
— Você pode ficar com ela se quiser, se está com tanta pena… mas eu
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nunca faria algo desse tipo com ninguém, muito menos com meus amigos,
com você, com ela… Laura pegou pesado, agora que pague por isso!!! — eu
digo e ele se aproxima.
— Está fazendo isso por estar chateado com ela ou por causa da Ellen? —
ele pergunta mais cedo do que eu imaginava, já sabia que diria isso.
— Brother, eu amor aquela mulher. Descobri que nunca deixei de amar
quando pisei aqui. Então se ela mandar eu pular de um precipício sem
paraquedas, eu vou pular!!! Mas Laura cometeu um crime aqui, você não
entende a gravidade da situação porque gosta dela, porque não foi com
você… eu entendo…
— Escuta, você está errado! Eu transei com a Laura e foi uma delícia,
aliás, mas foi só isso! Eu não gosto dela! Só que somos um trio, cara, somos
um trio! Estou defendendo nossa amizade! Esquece a babaquice que ela fez,
quero nós três no rolê de novo, man! — ele diz e fico impaciente.
— Não dá, agora não dá! Quando eu pensar no que ela fez comigo e isso
não me deixar magoado, eu a perdoo. Até lá não dá, cara! Eu sinto muito! —
eu digo e ele me olha entristecido.
— Vou ficar com ela… — ele diz e eu entendo.
— Faça isso. — ele estava certo, seria bom para ela. Laura não precisava
ficar abandonada e sozinha. Isso até faria mal para ela mesma.
— Vou lá arrumar minhas coisas. Até mais! — ele diz e eu afirmo com a
cabeça.
No fim aconteceu algo ainda mais chato do que poderia ter sido: não
perdi uma amiga por ter feito besteira, perdi dois. Eu me sinto extremamente
péssimo por isso. Trouxe meus melhores amigos para me fazer companhia e
me ajudar a me distrair, me apoiar, me ajudar a passar pela barra que era estar
de novo convivendo com minha família, com as cobranças, com o lado
negativo de tudo… e agora era eu quem ficaria sozinho para lidar com tudo
aquilo e não podia fazer nada a respeito.
Volto para a rede só para conferir se os caras da hípica se foram e fico por
lá... Minutos depois, Pedro aparece com a cara grande dele em cima de mim,
me assustando. Eu me sento na rede e o vejo com as malas.
— Já dei tchau pra todo mundo… — ele diz e me sinto péssimo, me
levanto e abraço forte meu amigo.
— Sinto muito por isso, não queria que nada disso tivesse acontecido,
nem queria que você fosse com ela! — eu digo e ele sorri.
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— Ela não pode ficar sozinha. Somos parceiros, faria o mesmo por você,
você sabe disso!
— Eu sei, vamos lá, vou te levar! — eu digo, ele sorri fraco e paramos na
mesma hora quando vemos um carro entrando na propriedade em velocidade
reduzida.
— Quem é? — ele pergunta e eu nego com a cabeça, não fazia ideia de
quem poderia ser.
O carro para perto da área da frente e eu me aproximo com Pedro em
minha cola. O motorista abaixa o vidro do carona e podemos ver quem é.
Lari dirigia quase desacordada. Seu rosto estava praticamente em carne viva.
Havia levado uma surra das boas e eu não entendia como ela havia
conseguido chegar até ali.
— Preciso conversar com você, preciso de ajuda, Tay!!! — ela diz de
olhos fechados, com dificuldade para falar, e Pedro e eu nos olhamos
assustados com a cena.
O dia sombrio parecia não acabar nunca.

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10
ONDE TUDO COMEÇOU

Eu estava encantada. Lodov era incrível, um animal maravilhoso e, desde


que pisou aqui, fiquei apaixonada, completamente fascinada por ele. Eu não
via a hora de montá-lo! Era difícil para eu aceitar as investidas de Tay e,
agora que o lance ‘amigos’ acabou definitivamente, ficaria ainda mais difícil.
Eu precisava ser forte, ser dura com ele.
Óbvio que tudo o que eu queria era correr para os seus braços desde que
ele mandou a vadia pastar, mas eu não conseguia ser tão fácil, agir
imediatamente como meu coração queria. Não dava!
Fiquei com o encarregado da hípica até tarde, mostrei toda a propriedade
e, assim que ele viu que Lodov ficaria bem, partiu. Corri para arrumar sua
baia, verificar se estava confortável e calmo e fui para o quarto que não me
pertencia.
Estava exausta, cansada demais e sabia que no dia seguinte eu tinha muito
trabalho para fazer. Pretendia visitar Bethoveen, Safira, continuar os
trabalhos com Raivoso e atender na clínica… seria um dia e tanto!
Tomei um banho, me tro quei — ainda usando as roupas dele para
dormir, como nos últimos dias —, e me senti uma folgada, mas não tinha
como evitar. Eu amava estar ali, amava ficar no quarto dele e sentir o cheiro
maravilhoso que irradiava dali! Era um bálsamo, o bálsamo que eu precisava
depois de passar por um dia como aquele.
Vejo as notificações do telefone enquanto apóio minhas costas em seus
travesseiros e, quando já me preparava para desligar o abajur, ele entra com
tudo no quarto. Tay já estava tirando a camiseta automaticamente, como
sempre faz. Ao passar a camiseta pela cabeça, ele me vê e trava por um
pequeno momento.
— Desculpe, não sabia que estava aqui! — ele diz sério e eu fico sem
graça.
— Vi que você não estava, imaginei que ficaria com Pedro então resolvi
ficar… quer que eu vá para a cabana?
— Não, de qualquer forma já ia procurar você! Vamos fazer uma viagem

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curta… vai arrumar suas coisas, só vou me trocar! — ele diz e fico assustada.
— O quê? Viagem? Para onde? Por quê? — eu me sento na cama e minha
cabeça fica virando de um lado para o outro, acompanhando seus passos
rápidos.
Ele troca de camisa, coloca um terno esporte como sempre, sapatos… e ia
de lá para cá, resolvendo tudo e guardando algumas coisas em uma mala.
— Primeiro levanta e veste sua roupa! Vamos passar na sua casa para
pegar tudo e talvez no caminho eu te diga algo… — ele diz e começo a
protestar, mas ele não deixa. — AGORA, Ellen!
Ele não grita, mas me deixa assustada. Por isso me levanto e me troco.
Desço com ele até a cozinha, ele pega diversos molhos de chaves da porta e
me encaminha até o carro com sua mão o tempo todo na minha cintura,
possessivamente.
— Dá para me dizer o que está havendo? Não posso sair da cidade, tenho
meu trabalho… agora tenho Lodov para cuidar também… — falo de Lodov
sorrindo, mas Tay não me olha e muito menos sorri para mim.
— Lodov e todos os outros bichos que você cuida ficarão bem! Agora
preciso tirar você daqui até decidir o que vou fazer, até ter um plano…
— Plano para que, Tay? Você está me assustando!!!
— Se eu disser, não acreditará, então vou ter que te mostrar. Só confie em
mim. De qualquer forma, só quero dar um tempo disso tudo aqui. O dia foi
extremamente cansativo, triste… mas não posso partir e deixar você aqui! —
ele fala e aperta as mãos no volante demonstrando estar nervoso.
— Trouxe os remédios? — questiono quando o vejo forçar o próprio
maxilar.
— Não, esqueci. Vai precisar lembrar disso por mim, provavelmente
sempre vou me esquecer de tomar. Nunca precisei ter uma rotina com
medicação, sou péssimo com isso… — ele diz e meu coração se infla.
— Vamos passar em uma farmácia! — eu falo e não consigo deixar de
tocá-lo.
Faço um carinho rápido em sua nuca e paro quando vejo os pelinhos de
seu pulso, livres do terno, se eriçarem. Ele para o carro na frente de minha
casa, eu desço sem esperar que ele abra a porta e, me puxando pela mão, anda
na minha frente e entra em casa sem bater.
— Oi, dona Isabelle, com licença! — minha mãe, que estava deitada no
sofá da sala, se levanta com o susto e olha brava para nós.
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Tay não espera o sermão e corre comigo para o meu quarto. Eu nem
imaginava que ele sabia onde ficava.
— O que estão fazendo??? — ela entra no quarto e nos encara.
— Vamos fazer um passeio! — Tay responde, abre todos os meus
armários e pega minha mochila que estava pendurada no cabide de chão lilás,
o móvel que eu tinha desde criança.
— Pra onde??? Parecem mais que estão fugindo… — ela questiona de
braços cruzados e começo a colocar a roupa na mochila para me ocupar,
porque as respostas que ela queria eu não podia dar.
— Para bem longe, dona Isabelle. E não estamos fugindo!
— Estão juntos, é!?
— Já faz alguns anos, não é, sogra!? — ele responde jogando algumas
roupas na cama para facilitar o meu trabalho.
— Não sei, nos últimos anos meu genro estava lá no extremo norte do
país, fazendo minha filha sofrer até alguns dias atrás! — ela diz com rancor e
meu coração dói por pouco tempo. Só até ouvir sua declaração: — Ellen
ainda não sabe, mas já me perdoou! Um dia a senhora também vai conseguir.
Eu voltei e não vou mais embora, então vai se acostumando comigo!!! Sua
filha sofreu até hoje, mas agora será feliz e nem precisa me agradecer, será
um prazer envelhecer ao lado dela! — Tay diz e deixa minha mãe e eu de
boca aberta e sem palavras.
Só que eu, ao contrário de minha mãe, escondi o rosto. Já a minha mãe
ficou com cara de tonta para ele ver mesmo. Ela nos olhava e, aos poucos, foi
descruzando os braços. Já me olhava com tristeza quando terminei de
arrumar tudo.
— Só me liga… — ela diz e me abraça na porta de casa.
— Eu já volto, mãe! — eu falo e sorrio para ela.
Tay abre a porta do carro para mim e eu entro jogando a minha mochila
enorme e uma bolsa de mão com meus documentos e tudo o mais, no banco
de trás. Cinco minutos depois, paramos em frente a um hotel no centro, perto
do parque onde ficamos pela primeira vez.
— Pensei que…
— É só por cinco minutos, Pedro está aqui… — ele diz me
interrompendo e passo a entender.
Entramos direto, ele chama o elevador do hotel luxuoso, a morena
gostosa da recepção sorri para ele, ele finge que não vê e eu suspiro
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escondido. Tay parecia nervoso, nervoso demais… a todo o momento só


olhava para porta do elevador e se mantinha fora do meu espaço pessoal, não
afastado demais, mas não tão perto quanto eu gostaria.
— Respira fundo e se acalma! — ele diz segurando em minha mão ao
descer no sexto andar e logo bate no quarto 170.
Por que eu precisaria me acalmar???
— Que demora, cacete!!! — Pedro atende a porta e eu entro na frente por
gentileza do Thor. O espaço é de contos de fadas, lindo e charmoso.
— Ela está lá dentro, Laura a colocou para descansar! — eu escuto aquele
nome e beiro o surto.
— Essa doente está aqui??? — olho para ele e ele aperta sua mão em
minha cintura como um pedido desesperado para eu ter calma.
— Estou.
A vagabunda sai de dentro de um cômodo, toda “costurada e remendada”,
tinha por todo o rosto aqueles curativos de pequenas fitas que deixavam os
ferimentos respirarem. Eu olhei para ela e tudo o que eu queria era fazer
machucados novos, esfregar a cara dela no asfalto do hotel.
— É sério que me trouxe aqui? — pergunto e Tay olha para baixo por um
momento, força o maxilar novamente e aperta de novo minha cintura.
— Ele pretendia te deixar no carro, eu que implorei para ele te fazer subir.
— ela diz e se aproxima, minha mão coça para bater naquela cara dela “até
ela subir”.
— Ele fez muito mal! — eu digo como um aviso.
Se ele tinha ganhado pontos ao mandá-la embora, ao me presentear com o
cavalo, com os seguranças e o cuidado comigo… havia acabado de perder
todos eles.
— Ele só te trouxe aqui porque sabe que meu pedido é de desculpas, me
perdoa, por favor! Sei que cometi um crime, devo pagar por isso, mas estou
muito arrependida, extremamente arrependida! Fiz besteira, uma besteira das
grandes e reconheço o quanto fui idiota, sem escrúpulos e tudo o mais aí que
você me chama! Sou tudo isso. Mas me perdoa Ellen, não dei a droga para
prejudicá-lo. Eu só queria que ele dormisse para não se humilhar por você,
porque era isso o que ele ia fazer depois que te viu com aquele cara… Tay
estava descontrolado… — ela recita um pedido ensaiado e eu fico entediada.
— Quero ir para minha casa! — falo virando as costas e deixando Laura
falar “sozinha”, mas Tay me segura.
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— Tem outra pessoa que você precisa ver, foi por isso que eu te trouxe
aqui, ou principalmente por isso! — ele diz e me olha triste.
— Mais uma psicopata louca por você? — pergunto baixo e ele lamenta
em silêncio.
— É a Larissa. — ele diz quando eu tentava sair de perto dele de novo e
me deixa travada.
— Lari está aqui? Fazendo o quê? — pergunto e ele me leva até o quarto.
Por um momento consigo esquecer da vadia e da raiva que eu estava dele
por me fazer vê-la novamente. Lari estava deitada na enorme cama e parecia
muito fraca e fragilizada. Seus cabelos loiros estavam um pouco
desgrenhados, seu rosto tinha ferimentos piores do que os da vadia e ela
parecia cochilar. Eu me sentei ao seu lado, subindo um pouco na cama, e isso
a fez despertar.
— Oi. — ela diz fraca e eu choro.
— O que fizeram com você??? — digo baixo como se o som da minha
voz pudesse machucá-la.
— Uns caras me pegaram assim que saí da clinica…
— Assalto??? O Vicente…
— O Vicente está bem, já tinha partido e não viu nada, não pôde me
ajudar. E não era nada com ele… eu era o alvo… — ela diz e se ajeita nos
travesseiros para me olhar melhor.
— Sinto muito, Lari… Tay colocou os seguranças lá, não te ajudaram? —
questiono chorando ainda mais, não conseguia parar, Lari estava
‘arrebentada’, para não dizer palavra pior, palavra que melhor a descreveria!
— Eu os liberei para fechar tudo, me pegaram na esquina quase chegando
no bar. Eles também já tinham entrado no carro e partido quando tudo
aconteceu!
— O que eles fizeram com você? — pergunto com medo de ouvir a
resposta.
— Nada de mais, se é que posso dizer assim. — ela diz apontando para a
própria face. — Apenas me bateram muito e disseram para eu parar de soltar
a língua por aí, que se eu continuasse falando que o chefe deles é perigoso, eu
ia acabar morrendo! Que se eu o descrevia como um bandido sem coração,
ele seria um bandido sem coração comigo. — Lari diz e não podia acreditar.
— Juliano…??? Não!!! — resmungo indignada e Lari ri.
— Então estou mentindo? — ela questiona e eu me levanto.
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Obviamente não estava, mas o fato de que Juliano tinha feito algo daquele
tipo era indescritível. Aquele não era o Juliano que eu conhecia. Não mesmo.
— Só procurei Tay para me oferecer como exemplo humano. Se você
permanecer dando confiança para aquele nojento, bandido, é assim que você
vai acabar. Ou, por causa de sua possessividade, pode acabar pior do que eu!
Escuta o que te falo, ele não é quem você pensa, nunca foi. Só é um anjo com
você porque te deseja há anos, já falei isso para você! Ele gosta de você e não
vai desistir, principalmente agora que vejo que vocês se acertaram, ou quase
isso… — ela olha para mim e para Tay com carinho. — Quando ele
descobrir vai mostrar para você o monstro que é, então você precisa dar uma
sumida daqui, dar um tempo daqui… — ela diz e eu me desespero.
— Isso é um absurdo! Não vou parar a minha vida por causa dele, não
tenho medo dele! — eu falo e ando para lá e para cá. Vejo a vadia e Pedro
entrarem no quarto, mas os ignoro.
— É, eu sei, mas eu tenho! Agora ele quase me matou… o que vai fazer
quando Tay aparecer assim? Ou sua mãe? Seu tio? Seus animais que você
tanto ama…!? — ela diz e eu olho para Tay.
Eu faria com ele como fiz com a vadia, mataria aquele falso ou, se me
impedissem de novo, o deixaria bem machucado!
— Pois é isso. Vai dar um tempo, se afaste dele, não diga o que sabe, faz
a sonsa e vai com Tay para bem longe daqui! Ele me machucou porque tentei
te mostrar quem ele realmente é! — ela continua.
— E a minha família? A sua? Lodov…!? Se ele é quem Lari diz, se foi
capaz de machucá-la, o que não fará com qualquer outra pessoa próxima a
nós!? Precisamos ficar aqui, denunciar ele! — eu digo para Tay e Lari bufa
de raiva, parecendo sentir dor ao mesmo tempo.
Ela olha para Tay como se dissesse: “eu não te falei que ela falaria isso!?”
— Laura vai ficar. — Tay diz e eu dou risada.
— Ah! Que ótimo! Claro que me sinto super segura, agora! Vai deixar a
psicopata cuidar de nossa família! Como você é esperto! — eu falo e ele
respira fundo.
— Eu não acredito que ele vá fazer alguma coisa. Só fez com ela porque
ela abriu a boca. Até eu pensar no que vou fazer… até eu pensar em como
matar aquele cara para te manter em segurança sem ir preso por isso, vamos
dar um tempo daqui. Levarei Lari porque ela continua recebendo ameaças por
mensagem e você vai ficar comigo. Se eu decidir voltar, vamos voltar, se eu
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decidir permanecer longe por quinze anos, ficará comigo, longe, por quinze
anos! O tempo que eu achar que é necessário, será, eu decido! E não estou
aberto a discussões. Laura vai ficar de olho no casarão, Pedro vai com a gente
para me ajudar e assim vai ser, Ellen! — Tay toma sua decisão, pega uma
mala que eu acreditava ser de Lari e sai do quarto, encerrando o assunto.
Pedro corre para ajudar Lari a se levantar e eu vejo tudo acontecer sem ter
a voz ativa que eu sempre tive. Com Tay de volta, eu era outra pessoa e não
estava gostando daquilo.
— Se algo acontecer com alguém de minha família, mato você! Arrumou
um jeito de ter o perdão dele, mas o meu nunca terá! Se diz que vai proteger
o casarão, proteja-o, mas fica longe do meu homem ou acabo com tua raça!!!
— eu digo olhando para a vadia que tinha ficado o tempo todo perto da porta
e ela concorda sem um pingo de raiva no olhar.
Como conseguia? Vadia cínica!
Saio do quarto e desço direto para o carro. Pedro ajuda Lari a entrar no
banco de trás e se senta ao seu lado, depositando a cabeça dela em seu
próprio ombro. Tay se senta no banco do motorista, liga o carro, e dirige o
tempo todo em um silêncio fúnebre e com um semblante de tristeza.
— Posso saber para onde a gente vai? — pergunto baixo e brava, mas ele
não me olha ao responder, continua fitando a estrada em sua frente.
— Vamos voltar para onde tudo começou. Para o lugar de onde você
nunca deveria ter partido! — ele diz alto para todos escutarem e meu coração
para por alguns segundos.

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11
AMOR VERSUS AMEAÇA

Lá estava eu levando minha princesa para bem longe daquele maluco. Eu


tinha dois problemas para resolver: me livrar dele e fazer Ellen ficar comigo
para sempre. Eu só não sabia dizer qual era o mais difícil. Mandei um SMS
para o meu pai contando tudo e ele respondeu que eu podia ficar tranquilo e
aproveitar as “férias”, por isso nem estranharia se eu chegasse lá e já
encontrasse o problema resolvido.
Ellen viajou o tempo todo olhando para a janela, parecendo pensar em
tudo, refletindo sobre os últimos acontecimentos e eu tinha certeza que todos
faziam o mesmo. Menos eu, eu só olhava para ela. Não conseguia esquecer o
que seu toque em minha nuca fez e havia sido só um toque, fraco demais…
fiquei, por horas, imaginando o que ela seria capaz de fazer comigo, nua, na
cama… muito provavelmente eu não sobreviveria para contar história, Ellen
acabaria comigo em alguns minutos.
Já eram quase duas da manhã quando estacionei o carro na casa de meus
avós. Passamos na farmácia porque ela me lembrou dos remédios, passamos
também em uma padaria porque ela sugeriu, e chegamos rapidamente. Pedro
instalou Lari no quarto de Nina e eu levei minhas coisas e as coisas de Ellen
para o quarto de meus pais, já que o meu era um pequeno casulo e tinha
somente uma cama de solteiro. Ellen foi colocar as compras e ver como
estava a cozinha. Parecia estar tudo limpo e tudo organizado.
Meu Deus há quanto tempo eu não colocava meus pés neste lugar?
Muitos anos! Eu não tinha noção da saudade que eu sentia daqui. Da minha
infância, de tudo o que vivi aqui com meus avós, meu pai recém-chegado,
depois com Ana Luiza ainda bebê… pensando nisso, antes de voltar para
Barbacena, eu pretendia passar em Pirassununga e visitar a minha outra casa,
e mais a casa do outro lado da rua…
Nossa! Já vivi tanta coisa nessa cidade, que daria um grande livro.
Eu me perco andando pelo pequeno cômodo, vendo as fotografias que
ficaram, o cheiro de meus pais nas roupas que não levaram para Minas, os
móveis, os objetos, tudo… por isso nem noto que Ellen me olhava da porta.

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—Entrou no quarto da Nina? — ela questiona e eu sorrio.


— Não quero entrar lá, foi lá que magoei você e estraguei tudo! — digo
sem graça e ela sorri.
— Lari quis descer para a sala, disse que ainda não está invalida… Pedro
está em cima dela abanando-a com um leque, como se ela fosse uma princesa
egípcia! Temos alguns minutos. Já estamos aqui, então… vamos até lá. — ela
diz e me estende a mão.
— Sabe que vai doer, não é!? — digo e ela inclina sua cabeça em
compreensão.
— É por isso que quero ir. Essa dor que eu sinto tem que ir embora,
preciso superar. Os problemas que virão daqui para frente serão outros
assuntos. Mas esse, quero esquecer. — ela diz saindo e eu sigo ao seu lado.
O quarto de Nina, assim como o resto da casa, estava exatamente do
mesmo jeito, sem tirar nem por. Tudo idêntico. Entro e já me sinto tonto de
tanta tristeza.
— Sentiu minha falta? Durante todos esses anos? Pensava em mim? —
Ellen questiona enquanto eu via uma foto de Nina e Rafa na estante da
televisão. Não consigo virar para encará-la e respondo de costas mesmo.
— Senti demais. Até demais!
— Por que não voltou?
— Porque meu avô me fez pensar que eu seria um fraco se não
conseguisse seguir a profissão da família!
— Por que evita olhar para mim quando fala comigo? — ela parece
angustiada e eu decido me virar. Logo que ela vê meus olhos molhados, ela
trava.
— Porque me envergonho! Sou diferente do meu pai, eu me arrependo de
ter partido e deixado você, ele não, mas eu sim! Eu me envergonho de ter
sido tão fraco, de ter feito essa loucura de ter ido embora, terminado com
você e me arrependo amargamente, me arrependo demais! Eu acho que sou
fraco, sim, e sinto muito por isso… eu não sabia, mas ficar aqui e enfrentá-lo
era algo que um homem forte faria, mas falhei nisso, falhei feio! — eu digo e
ela se aproxima de mim para secar as minhas lágrimas.
— Éramos novos, você era só uma criança. De tudo o que me disse aqui,
naquela noite, o que foi sincero?
— Nada. — ela se senta ao meu lado e continua.
— Quando foi que você se arrependeu do que fez?
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— Assim que te vi fazer as malas. Naquela noite perdi toda minha


essência. Minha mãe costuma dizer que a FAB matou o menino engraçado e
feliz que eu era, mas não foi! Foi você, ao ir embora, e por culpa minha!!!
Desde aquele dia não vejo mais graça em nada… tirando meu trabalho, que
sempre foi mais obrigação do que paixão, e agora é a única coisa que sei
fazer e me faz bem, não via mais graça em nada. Até voltar… — eu digo e
ela olha para a minha boca. Suas coxas tocavam as minhas e sua respiração
foi ficando cada vez mais pesada.
— Aquilo que falou para minha mãe… é verdade? — ela pergunta e
umedece os lábios.
Eu nunca tinha reparado no quanto sua boca parecia ser deliciosa. Era
carnuda e rosada naturalmente.
— É verdade! — eu respondo rapidamente e ela segura um sorriso
triunfal.
— Deixaria seu emprego por mim? Abandonaria a FAB? Manaus? —eu
sorrio.
— Não porque Luiza me disse que você é extremamente consumista! —
eu sorrio ao me lembrar de suas palavras — Disse que eu precisaria pilotar
muitos aviões para poder te agradar. Citou os presentinhos que você dá para
os cavalos, os acessórios de hipismo, e disse que, por isso, tinha vontade de
abandonar o emprego de administradora da grana da família. Então,
abandonar não… mas não volto mais para lá! Preciso continuar tendo um
emprego!!! — eu digo rindo e ela ri lindamente também. Quase me esqueço
do porquê estávamos rindo, enquanto eu olhava para ela.
— O que mais que ela falou??? Aquela danada…
— Disse que, pelo preço do Lodov e pelo rombo nas contas dela, você vai
ter que me amar para sempre… — eu digo e ela fica sem graça ao ponto de
parar de sorrir.
— Ana Luiza disse isso? Ou você?
— Foi ela, juro! Ela resmungou isso quando meu pai pediu para eu avisar
da retirada do dinheiro da minha conta. O que eu disse é que era pouco perto
do que eu gostaria de te dar. Que se você se casasse comigo poderia me falir
e eu seria um falido feliz. — não digo a parte de pagar na cama para não
assustá-la.
Era engraçado como Ellen me deixava calmo, cuidadoso… se fosse só
mais “uma qualquer” que eu queria comer, eu já teria pegado desde o
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primeiro dia que estive aqui! Mas ela não… sabendo que ela nunca tinha sido
tocada, eu pensava diferente.
— Sou consumista mesmo. Gosto de ter tudo, gosto de dinheiro e gosto
de gastar! — ela diz se recompondo depois de ouvir sobre o tema casamento
e sorri para mim.
— Pois é. Por isso não vou abandonar o meu emprego. Só vou me
transferir!
Eu me seguro demais para não beijá-la, mas não me aguento, eu precisava
tentar, precisava chegar perto dela. Eu queria muito e queria há tempos.
Então quando tentei e vi que ela deixaria, Pedro entra no quarto sem bater e
interrompe. Eu rosno com raiva e Ellen encosta sua testa na minha sorrindo e
controlando a respiração.
— Fiz um café, vem! Depois vocês namoram… — ele resmunga alto e
espera na porta.
— Por que eu o trouxe mesmo? — pergunto para Ellen e ela balança a
cabeça negando.
— Deve ser para ele ficar de babá da Lari, enquanto você tenta me
seduzir… — ela diz e fico sério.
— Agora pouco, eu quase consegui?
— Bom, quase… mas sua carta na manga entrou sem bater e te atrasou!
Arruinou o clima… — ela diz e eu olho para Pedro com raiva.
— Vai embora daqui! — eu ordeno e ele sai rindo.
— Pronto, gata, somos só nós dois de novo. — eu falo sorrindo e ela se
levanta.
— Vamos comer. Depois conversamos mais… — a roceira me dá as
costa e caminha para a porta. Fico puto e a pego do jeito que ela já estava, de
costas para mim.
— Já disse que odeio quando você me dá as costas? — eu questiono
segurando sua barriga com a mão esquerda e tiro seus cabelos do ombro,
falando baixo. Ela se mexe um pouco, eu aperto o cabelo de sua nuca e sinto
seu bumbum mexer sobre o meu músculo já extremamente duro.
— Não, não disse. Tudo isso é a seca desde que chegou aqui? — ela
pergunta e se vira agarrando meu pescoço.
— Tudo isso o que? Isso??? — Coloco sua mão no volume de minha
calça e ela parece querer morrer de vergonha, mas obviamente disfarça. —
Não, isso aqui é só você. É tudo culpa sua!
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— Melhor assim! — ela diz acariciando toda a extensão dura como rocha,
em movimentos sugestivos, e chega a minha vez de ficar tímido com sua
ousadia.
Graças a isso ela sai dando risada de mim. Droga.
Tomamos café na mesa e conversamos sobre coisas banais do nosso dia-
a-dia. Ellen só se preocupava com seus bichos e nossa família. Por um
momento, achei que era só o corpo dela que tinha viajado até aqui, que toda a
sua alma e seu coração haviam ficado em Barbacena.
— E então, já pensou no que vai fazer? Sabe que Laura não é páreo para
ele lá sozinha, não é? — Lari veio para sala com dificuldade enquanto Ellen e
Pedro organizavam a cozinha.
— Ela dá conta! É a melhor que conheço no que faz. Ao contrário de
mim, tem força tática como o meu pai, é uma fuzileira e não só piloto. É
preparada para situações de perigo! — eu digo ainda olhando pela janela da
sala. Eu estava preocupado demais com o futuro.
— Ellen quase a matou, como ela pode ser tão preparada se não dá conta
de uma briga de calcinhas? — ela questiona e me sento no sofá ao seu lado.
— Laura não encostaria um dedo em Ellen, nunca a machucaria porque
sabe que eu nunca permitiria. E, se fizesse, começaria uma guerra comigo.
Aquilo não foi uma briga, foi uma bobagem. Laura se deixou apanhar, pode
acreditar! E, no mais, contei tudo para meu pai, todos lá, inclusive sua
família… estão seguros! Nada vai acontecer! — eu digo e ela me olha mais
compreensiva, parecendo ficar mais calma. — Posso te fazer uma pergunta?
— eu me dirijo à Lari, falando mais baixo.
— Claro.
— Já se envolveu com aquele maluco? — questiono e ela olha para as
próprias mãos. — Entendi. Não precisa dizer mais nada, reparei que você
parece conhecê-lo, mais do que a Ellen, mas não vou julgar você! Nem posso
fazer isso… mas só me diga uma coisa, com quem estamos lidando? —
pergunto baixo e só depois disso ela me olha nos olhos.
— Com um bandido da pior espécie. Um bandido que só perdoa crianças
e nada, além disso! — ela diz com a voz ainda mais baixa e eu começo a suar
frio.
— Entendi.
— Tay, fique com Ellen aqui ou vá para mais longe! Ele é possessivo.
Tem mania de achar que o mundo é dele! Faz a ‘onda’ bom moço, é gentil,
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receptivo, mas só até não pisarem em seu calo. E o calo dele é a Ellen. Ele a
deixou em paz porque, em todos esses anos, Ellen nunca foi de paqueras,
nunca namorou, nunca passou de alguns beijos com coleguinhas de bairro.
Para controlá-la, foi ele quem nos cedeu o apartamento em Belo Horizonte na
época da faculdade. Está sempre dizendo que seus animais têm problemas,
para receber a visita dela. Até na época em que eu dormia com ele, que era
apaixonadinha, ele falava de Ellen para mim de uma maneira doentia…
assim, na minha cara, na cama, sem pudor! Então não volte com ela para lá,
não deixe ele saber que vocês têm algo sério e de verdade. Ele tem uma lista
negra de pessoas que devem para ele, que fizeram alguma coisa… pouco a
pouco a cidade vai ouvindo as notícias de que tal pessoa morreu, outra
faleceu por causa de acidente… freio cortado, gás aberto, execuções e muito
mais. Você já entrou para lista negra dele quando tentou atrapalhar suas
investidas naquele dia, no consultório dela. Ele amou te ver levando um fora,
amou quando ela te mandou embora! Eu vi nas câmeras que ele saiu de lá
com ela, tarde da noite. Ele tem mania de controle, quando se trata dela ele
vira um animal… — ela diz e sinto uma raiva descomunal.
— Deixa ele me procurar, estarei esperando por ele! Vou esperar você
ficar melhor e vou voltar com ela. Você vai ficar até eu dizer para voltar, até
tudo isso passar. Ela ficará bem! Vou conseguir alguns seguranças daqui de
Pirassununga para cuidar da casa enquanto estiver aqui e sua família
continuará em segurança, não se preocupe com nada. Vou me livrar dele!
— Aquele cara é um demônio, para se livrar dele, só matando!
— Posso fazer isso. — eu digo e ela já ia protestar, mas sorrio fraco para
Ellen, que entra de repente, e Lari disfarça sorrindo também.
— Sobre o que conspiram? — Ellen se senta ao meu lado, me abraçando.
— Estava falando para a Lari que vamos esperar até que ela melhore e
voltamos logo para Barbacena, mas que ela vai ficar até eu decidir o que
fazer! — eu conto meia verdade e fico satisfeito.
— Mas ficará sozinha? — Ellen pergunta e Pedro entra no assunto e na
sala.
— Eu posso ficar! — ele diz e os dois trocam sorrisos.
— Mas e seu curso? — Ellen pergunta.
— Temos aqui nossa primeira missão fora da FAB. Eu me sinto parte do
FBI. E eu sou cabo, meu papel no curso é oferecer cafézinho para os tenentes
super stars… Posso fazer isso em Pirassununga ou não fazer! — ele diz e
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todos riem. Só eu não tinha um pingo de humor.


— Bom, cabo, você pode ir comigo até a cama porque já, já serão seis da
manhã e eu estou quebrada, literalmente… — Lari ameaça se levantar e
Pedro corre para ajudá-la. Ellen e eu ficamos sozinhos e eu tinha tudo
naquela altura do campeonato, menos sono.
— Onde eu vou dormir? — ela pergunta e eu beijo sua testa.
— Na cama de meus pais, onde coloquei nossas coisas.
— E você, não vem…!? — ela me olha nos olhos e eu sorrio me
desmanchando com sua vozinha de neném.
— Estou sem sono, pode ir descansar! Aqui também tenho meu cantinho
no sofá! — eu digo e ela sorri.
— Você pode pegar um pedacinho do meu lado na cama, se quiser… é só
não fazer o safado… — ela diz e eu afirmo com a cabeça.
— Só vou tocar em você quando você pedir. — eu digo sério e ela parece
refletir sobre o que acabei de falar. E era realmente sério.
— Tudo bem, eu já vou! — ela diz, me beija no rosto e eu seguro o
impulso de levá-la até a porta do quarto. Como se algo pudesse acontecer
com ela no caminho dali para o andar de cima.
O tempo em Sampa estava nublado demais. Já eram 6:30 da manhã e tudo
continuava escuro. Logo começou a garoar e eu fui para a janela lateral da
sala, dali podia ver um pequeno pedaço da rua, já que na janela da frente só
se podia ver a garagem toda fechada. Cada carro que passava eu torcia para
continuar andando, para continuar seguindo. Comecei a notar que estava
ficando neurótico demais quando já estava com uma das armas que meu pai
esconde pela casa nas mãos. O pente estava cheio, meu pai sempre foi
precavido. Já me imaginava descarregando a arma na fuça daquele babaca.
Como pode mandar os capangas dele bater em uma garota indefesa? Ele era
maluco? Bom, pelo visto era… mas eu não ia deixar ele fazer isso ou nada
parecido com Ellen, com ela não! Um dedo que ele encostasse nela eu o
arrancava nos dentes. Era uma promessa minha para ele e eu tinha mania de
cumprir o que prometia.
— Tay, o que faz com isso nas mãos? — Ellen entra na sala escura,
depois de algumas horas. Eu continuava na janela como se a qualquer
momento Juliano fosse aparecer.
— Nada. Eu achei pela casa. Só estava olhando. — eu digo e ela se
aproxima.
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Ellen estava enrolada em uma das mantas curtas da minha mãe para
espantar o frio que fazia e, pelo visto, estava com aqueles pijamas curtos.
Somente nessa hora eu me toquei de que, provavelmente, ela me esperava na
cama e eu estava ali, surtando sem motivos. O problema era que, desde que
Lari me contou quem era aquele maníaco, eu não conseguia parar de sentir
um mau-presságio no ar.
— Está olhando isso para quê? Não vai precisar usar isso! Quando
chegarmos, vou falar com ele… — ela diz e entro em pânico.
— Não vai chegar perto dele nunca mais!!! Está ouvindo??? Esquece essa
história. Quero você longe daquele cara!!! — eu falo baixo, mas aposto que
podia sentir a seriedade no que eu falava, pois ela logo concordou.
— Tudo bem. Não vou fazer nada!
Ao responder ela se aproxima ainda mais e me olha nos olhos tirando a
calibre 38 com calma de minhas mãos, como se eu estivesse descontrolado.
Mas eu não estava descontrolado, sabia que não. Ou estava!? Ellen a tirou de
mim, devagar e com cuidado, e depositou a arma no sofá ao meu lado, ainda
me olhando nos olhos. Logo que conseguiu, me senti muito mais leve e voltei
a olhar para a janela, mas não por muito tempo. Ellen, para chamar minha
atenção, tirou a manta que cobria seu corpo quase nu e segurou minha mão,
me fazendo se aproximar dela. Obviamente fiquei em transe.
— Eu estava te esperando e você não subiu… na verdade estou te
esperando há mais de treze anos, então não me faça esperar mais, Tay! — ela
diz com os olhos iluminados pelo brilho da janela e eu não me aguento.
Pego Ellen no colo e a beijo apaixonadamente. Deposito ali tudo o que eu
sentia, todos os meus medos, todos os meus arrependimentos, frustrações,
preocupações, amor, a paixão que sentia, a saudade que era maior que tudo, o
tesão que estava guardado desde que cheguei, tudo! E por isso foi o melhor
beijo da minha vida. Ellen abre ainda mais a boca, me dando passagem,
quando a faço cruzar suas pernas na minha cintura. Ambos chupavam um a
língua do outro e eu só imaginava como era magnífico estar ali e como
deveria ser maravilhoso chupar outras partes de seu corpo. Eu me esqueci de
tudo naquele momento, tudo, só existia ela na minha vida e sempre foi assim.
Sempre me senti incompleto, sempre senti que faltava algo na minha vida e
agora, só agora me sentia completo, inteiro de novo… nem mesmo voar me
fazia sentir algo parecido com aquilo, nada nunca me deu prazer maior!
Subi com ela até o quarto e a deitei na cama, sem parar de beijá-la. Ela
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agarrou meu pescoço de um jeito que parecia temer que eu fosse embora a
qualquer momento. Suas pernas continuavam em minha cintura, mesmo
deitada, e logo me livrei delas, Ellen me prendia e eu queria ficar solto.
Deixei as pernas dela abertas para ter livre acesso e, sem pensar claramente,
pressionava meu músculo em seu sexo. Foi nessa hora que a doce menina
virgem e apaixonada virou a selvagem que eu conhecia. Seus beijos ficaram
mais eufóricos e, ainda sem tocá-la, já podia ouví-la gemer alto. Nessa manhã
silenciosa, se Pedro e Lari estivessem dormindo, podia apostar que Ellen os
acordaria. Eu ri disso, nem liguei!
Meus beijos foram para seu pescoço e, em seguida, com uma violência
nada proposital e pensada, destruí seu pequeno pijama floral. Seus seios já
estavam em minha boca quando ela gemia chamando meu nome.
— Você se lembra disso? — passo a língua de leve por todo o bico do seu
seio, como fiz quando éramos duas crianças e ela geme ao responder.
— Nunca… nunca me esqueci… — e eu continuo agora com força.
Eu não podia controlar. Seu cheiro, o gosto de sua pele, eram como
drogas, me deixavam maluco! Por isso, depois de dar atenção por igual aos
dois pequenos botões que cabiam certinhos em minhas mãos como se
tivessem sido criados especialmente para mim, eu desço em direção à minha
parte preferida e ignoro sua barriga naturalmente chapada. Quase peço perdão
por isso.
Abro ainda mais suas pernas e dou pequenas mordiscadas em sua
intimidade ainda por cima do shorts, que mais parecia uma calcinha de tão
pequena. Não fico ali por trinta segundos inteiros, não podia controlar…
abaixo o pijama e sua calcinha ao mesmo tempo e me sinto o homem mais
feliz do mundo.
— E disso, princesa, você se lembra? — questiono, começando a chupar
suas dobras delicadas e faço a doce menina gemer alto.
Chupo, dou lambidas mágicas como se fosse um sorvete de chocolate e
meu nome surge em sua boca novamente. Era um deleite. Naquela hora eu
sentia vontade de gritar de felicidade como há muito tempo não fazia. Era ela.
A minha maior felicidade era ela! E, de pernas abertas como estava, era a
minha perdição.
Meu pau já latejava forte quando Ellen gozou pela primeira vez em minha
boca. Ela se desmanchou embaixo de mim e me olhava com os olhos
arregalados por causa da novidade, do que fiz com seu corpo. Voltei minha
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atenção para o meio de suas pernas antes mesmo dela se recuperar


totalmente… mudava as táticas para ouvir o meu nome sair de sua boca, entre
chupadas grosseiras e tapas que faziam barulho demais — sim, eu amava
bater. O som que fazia pelo excesso de umidade era música para meus
ouvidos e, todas as vezes que eu batia em sua intimidade de cima para baixo,
Ellen se contorcia e gritava embaixo de mim. Meus dedos entrando sem pedir
licença e apertos usando a mão toda. É, deu certo, meu nome mais uma vez
saiu de sua boca e, de mais embaixo, o líquido quente que eu tanto queria
para espantar o frio. Tudo ao mesmo tempo.
Sem nem notar, assim que ela gozou novamente, eu já estava nu. Tinha
praticamente feito tudo ao mesmo tempo e comemorei isso.
— Abre para eu entrar, vida! — digo em seu ouvido e ela geme em
resposta. Escandalosa.
— Tay… — ela diz e soa preocupada.
— Abre, amor, não vou machucar você! — eu digo e ela obedece.
Entro nela devagar e viajo para outro mundo ao ver o quão extremamente
apertada ela era.
— Ahh… Tay! Por favor… — ela diz gemendo em voz alta, e nem
precisava traduzir. Eu já sabia o que ela queria.
Termino de entrar completamente e a faço abrir ainda mais as pernas.
Começo a meter devagar, depois mais ou menos e, com o tempo mais rápido.
E nada daquela entrada ficar mais larga, nada. Aquilo só me deixava mais
maluco, mais insano! Eu já metia com força enquanto ela gritava e eu a
deixei fazer o barulho que queria. Normalmente eu tamparia a boca da filha
da puta, mas ela era diferente. Eu queria ver Ellen gritar, chamar meu nome e
gemer alto. Quanto mais alto, melhor.
— Você não tem ideia do quanto eu desejei isso, mulher! — eu rosnava e
já podia ouvir a cama bater na parede.
— Por que me abandonou? Você me abandonou… — ela dizia enquanto
gemia . Fiz com que ela se levantasse e cavalgasse para olhar melhor em seus
olhos, enquanto eu transformava aquela menina em uma mulher.
— Porque eu sou um idiota!!! Eu fui um idiota. Me perdoa, Ellen! — eu
peço e ela beija a minha boca.
Controlo sua cintura para ela não parar enquanto me beijava porque, se
ela parasse, eu teria um troço. Eu queria mais, e mais rápido, e com mais
força.
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— Não para, por favor… — ela resmungava durante o beijo e faço


questão de obedecer.
Assim que ela começou a pegar o jeito da coisa, a rebolar com meu
músculo inteiro dentro dela e gemer baixo no meu ouvido, eu gozei. E, pelo
jeito, gozei demais. Nem avisei, nem pedi para ela parar, ainda era a vez dela.
Abri mais as minhas pernas e a conduzi, mostrando como se esfregava em
mim para 'chegar lá' e logo notei que ela entendeu.
Eu tirei as mãos de sua cintura e as coloquei para trás como apoio, só o
que fiz foi empurrar meu quadril na direção dela e olhar minha princesa "me
usar para se masturbar". Ela rebolava, esfregando seu ponto mágico na minha
virilha com meu músculo já adormecido dentro dela, e revirava os olhos
gemendo loucamente. Toquei seus pés e pude sentir quando a mágica
acontecia e ela chegava até o céu. Ela forçou os dedos dos pés, enterrou as
unhas nas minhas coxas e depois rosnou como um animal, foi lindo. Sorri
vendo a cena.
Antes de cair de costas na cama, eu a agarrei e a mantive colada em mim
até a lei da gravidade se fazer presente e o meu liquido misturado ao seu
começar a escorrer pela minha cintura. Eu estava no céu e sorria como um
garotinho. Ela respirava descontroladamente, mas nem isso a impediu de
olhar para mim.
— Eu te amo!!! — ela diz e o mundo para naquele momento.
Meu mundo parou, literalmente. Meu coração vibrou e eu me enchi de
seu amor, ficando ainda mais feliz. Mas não perdi a piada. Aquele novo/velho
Tay, nunca perdia.
— Meu Deus… agora vai cair um temporal… — eu digo e ela faz cara
feia.
Tamanha era minha felicidade, tanto que não conseguia descrever!
— Eu te amo mais, minha princesa selvagem! Escandalosa!!! — eu digo
quando a agarro e ela sorri.
— Não sou, não… — ela resmunga escondendo o rosto no meu pescoço e
eu dou risada. Nessa hora ela olha para mim espantada.
— O que foi?
— Você está gargalhando! Sabe qual foi a última vez que te vi fazer isso?
— Aposto que estávamos juntos. — digo tendo certeza e ela confirma.
— Você era um moleque! É maravilhoso te ver sorrir e dar risadas. Seu
sorriso é lindo…
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— Continue cavalgando assim em mim, que você vai presenciar mais


cenas como essa, cada vez mais!
— Você é muito safado!!!
— Eu sou é louco por você! — eu digo e ela fica tímida.
— Promete que nunca mais vai me deixar! — ela diz chorosa e eu toco
seu rosto com as duas mãos.
— Mulher, eu vou seguir você para onde você for, para o resto de minha
vida! Agora eu sei o que me faltava e vou te dizer que nunca mais deixarei
você escapar, nunca mais vou te abandonar e sempre, mas sempre, minha
prioridade será ficar com você!!! Do resto posso me livrar! — eu digo, ela
sorri e me beija. Um beijo quente, sensual e mágico.
Em pouco tempo a amazona já estava cavalgando em mim de novo e
posso dizer que, mesmo inexperiente, ela parecia ter nascido para fazer
aquilo… era boa com cavalos e maravilhosa comigo. Fizemos amor até meio-
dia! E foi pouco.
— Eu sosseguei, hoje foi a despedida da balada, dessa vida de solteiro…
eu sosseguei… — Pedro cantarola uma música sertaneja assim que eu e Ellen
entramos na cozinha para tomar café. Lari ri com a boca cheia e dá corda para
ele.
— Cala a boca, Pedro! — digo rindo e sento-me à mesa com Ellen ao
meu lado. Ela parecia radiante… acho que eu também estava.
— E então como foi a noite? — Lari solta e vejo Ellen ficar rosada.
— Foi melhor que a de vocês! Aposto… — eu digo e Pedro ri.
— A gente se divertiu muito… estávamos achando que a casa ia cair! —
ele diz e eu jogo um pão na cara dele. Que pecado!
— Ele está zoando — Lari ri. —, dormiu a noite inteira e roncou no meu
ouvido. Por isso, infelizmente, eu fiquei acordada, porque é impossível
dormir ao lado dele! Mas meus comentários são: felicidades ao casal! Vocês
se amam desde crianças e fazem um par muito amorzinho! Nasceram um para
o outro! Fico muito feliz por vocês! — Lari diz e toca a mão de Ellen na
mesa.
— Obrigada por isso, Larissa! — eu digo e ela sorri para mim.
— Está bem, o que vamos fazer hoje? Já estou me sentindo preso aqui…
— Pedro resmunga e eu sorrio.
— Eu não sei vocês, mas eu e minha mulher já temos um destino certo!
— eu digo e Ellen me olha torto.
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— “Sua mulher”, é!?


— É. Alguma dúvida com relação a isso? — questiono de cara séria e
Ellen sorri com timidez.
— Não. Nenhuma! — ela diz parecendo sem graça e tímida, volta a
comer e eu rio da cara dela.
— Meu Deus! O que temos aqui!? — Pedro zomba ao me ver rir e eu
continuo. Ellen olha para mim, me admirando, e eu dou um selinho nela,
fazendo com que ela pare com aquela cara de boba apaixonada para mim.
— Temos o cara mais feliz do mundo e completamente apaixonado…
deveria experimentar essa sensação, é indescritível, parça! — eu digo e
Pedro lamenta.
— Deus, definitivamente acabou o rolê! — ele resmunga e eu sorrio com
orgulho para ele.
— Acabou, graças a Deus, cara! Eu não via a hora! — eu digo e me sinto
feliz.
Pego minha xícara de café e quase derrubo quando ouço o telefone de
Ellen tocar. Ela tira o aparelho do bolso do meu moletom que ela vestia e
trava ao olhar para a tela.
— É ele! — ela diz e uma fúria toma conta de mim.
— Põe no viva-voz!!! — Lari e eu dizemos ao mesmo tempo.
— Aja naturalmente! Lembre-se que você não sabe de nada!!! — Ellen
concorda, respira e atende.
— Alô!
— Oi, linda, tudo bem? Onde você está?
— Tudo, Ju, e você? Estou na minha casa…
— Tudo ótimo! Ah, na sua casa… legal! Gostaria de saber se vai vir aqui
ver a Safira para mim?
— O que foi, ela piorou??? — Ellen parecia sinceramente preocupada.
— Não, mas você disse que viria, então queria confirmar! — ela olha
para mim perguntando o que falar e eu digo ‘sim’ com a cabeça.
— Vou sim, pode deixar! Terei um dia cheio hoje, não vou abrir a clínica
porque parece que a Lari está doente, mas assim que eu tiver um tempinho,
dou um pulo aí!
— Tudo bem, então, minha princesa! Até mais tarde!
— Até já! Beijo. — Ellen se despede, desliga e eu e Lari nos levantamos
e falamos ao mesmo tempo de novo.
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— Ele sabe! — as nossas palavras saem em uníssono e eu corro para o


quarto.
— Tay!!! — ouço Ellen gritar e ignoro, não havia tempo. Ligo para o
meu pai e me desespero.
— Oi, Tay!
— Pai, quem está no casarão?
— Só nossa família, o pessoal de sempre, filho…
— Ninguém de fora???
— Bom, o verme passou aqui querendo devolver o cavalo. Disse que sua
outra tratadora já havia cuidado dele, porque a Ellen não teve muito tempo, e
que ele já estava manso para ser montado…
— Ele perguntou dela? Perguntou por ela???
— Perguntou! Eu disse que ela estava resolvendo uns problemas para
mim, fora da cidade e que logo voltava!
— Ele ligou aqui, se fez de louco!!! Ele sabe que estamos longe, que eu
estou com ela. Eu senti! Larissa o conhece, sentiu o mesmo que eu! Ele ligou
para saber e Ellen disse que estava no casarão. Quero esse cara morto, pai!
MORTO!!!
— Fica calmo! Assim que ele saiu daqui, já resolvi isso. Está tudo bem
aqui, pare de se preocupar! Estou de olho nele, fica em paz! Se for para subir
com ele, vamos subir. Nossa família é prioridade. Já estou cuidando disso, se
ele bancar o engraçadinho, eu mesmo cuidarei disso! Fica em paz! — meu
pai diz e eu desligo.
Eu me viro e vejo Ellen me encarando apavorada, com medo de mim e
impressionada com o que eu tinha acabado de falar.
— Morto? — ela pergunta e eu jogo nossas roupas na cama. — O que
está fazendo??? Tay…???
— Vamos embora! Não devíamos ter saído de lá! Vamos voltar! — eu
digo e ela me faz parar.
— Por que?
— Porque meu pai só vai fazer alguma coisa quando ele der motivo e eu
não vou esperar por isso. Não vou esperar até que ele fique mais obcecado
por você ou te machucar… vou fazer do meu jeito! E do meu jeito ele não
terá tempo e nem vai continuar por muito tempo nas nossas vidas! Vou me
livrar desse cara! Vá arrumar suas coisas!

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12
O VERDADEIRO INIMIGO

— Sshhh… ei amor, está tudo bem! Tudo bem!!!


Abraço meu homem e ele para de jogar nossas roupas na mala por um
momento.
— Não está tudo bem, não está!
Ele diz e me abraça também.
— Tá sim! Vamos ficar aqui, Tay! Vamos ficar… Achei que teríamos
uma “lua de mel” maravilhosa!!! — sorrio. — Um tempo sem ninguém pra
atrapalhar. Ficamos tanto tempo longe. Por favor, não deixe ele estragar
tudo!!!
Eu imploro olhando em seus olhos e ele balança a cabeça.
— Não. Quero acabar logo com isso. Vamos voltar e depois que eu me
livrar dele, a gente viaja. Podemos voltar pro Rio grande do norte, fazer tudo
o que não fizemos… mas agora não dá. Esse cara mexeu com a pessoa
errada!
Ele diz com uma fúria e eu não o reconheço.
— Tay, ele nunca me fez mal, não é agora que vai fazer! Não se
preocupe!!!
Eu digo e vejo Tay ficar indignado ao ponto de se afastar de mim.
— Qual parte de “sua amiga quase morreu de tanto apanhar”, você não
entendeu??? Não olhou pra ela???
— Olhei, mas sei que você nunca vai permitir que ele chegue perto de
mim de novo. Nunca vai permitir que ele me machuque de nenhuma forma!
Vai me proteger e além do mais, sei me cuidar, sei me virar, você sabe disso!
Então relaxa, larga isso aí! Não vou deixar ninguém tomar as rédeas de
nossas vidas de novo, muito menos ele! Agora vem aqui…
Peço e o puxo até a cama.
—… Vamos passar o resto da tarde e o começo da noite aqui nessa cama!
Não quero nunca mais sair daqui, vem…
Eu o faço caminhar comigo até a cama e ele vem, mas faz um bico
enorme.
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— Desmancha esse bico…


Resmungo sentando em seu colo e ele não obedece, mas passa a dar
atenção a minha cintura que não parava de se mexer para fazer a rocha
acordar.
— Para uma mulher inexperiente, você está é muito ousada! Agora acha
que pode me calar e me parar com sexo é!? Tem poucas horas que fez amor
pela primeira vez, e já quer usar os dons recentes á seu favor!?
Ele pergunta segurando e olhando para a minha cintura, eu beijo seu
pescoço e mordo de leve. Eu sabia que ele estava amando.
— Se for eficiente como muita mulher diz por aí, vou usar, que mal tem!?
Você não gostou…?
Zombo e ele me toca.
— Eu amei vida! Você é muito gostosa…
Ele diz e logo abaixa meu moletom, com pressa, típico dele.
— Então vamos brincar de fazer meu homem ficar calmo e quietinho!!!
Assim que ele tira a minha roupa apressadamente, eu me sento em sua
boca e curto o momento. Às vezes Tay era melhor calado, literalmente.
— Vou ficar sentada aqui, até você mudar de ideia, e ver o quão podemos
ser felizes, longe daquela confusão. Quero a minha lua de mel…!!!
Eu resmungo enquanto gemo, devido às chupadas que eu levava, e o vejo
sorrir ao me olhar. Eu estava sendo sugada deliciosamente, mas era Tay,
quem parecia estar mais feliz.
— Já chega!
Ele diz depois de alguns minutos me chupando e me joga na cama com
força! Ele me beija com vontade e em sua boca eu podia sentir meu próprio
gosto. Aquilo era novidade demais pra mim. Paro de beijá-lo e o vejo sorrir.
— Tá com nojinho do seu próprio gozo, selvagem???
Tay ri deliciosamente.
— Só preciso me acostumar…
Falo sem graça e ele ri ainda mais.
— Gata, seu gosto é uma delícia, vai se acostumar! Quero ver o dia que
eu quiser gozar na sua boca…
Ele diz baixo demais como se ninguém no mundo pudesse saber daquilo.
— Porque você faria isso???
Pergunto assustada com a novidade.
— Porque eu quero muito… eu olho para essa sua boca e já consigo
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imaginar ela mim… mamando tudo!


Ele diz segurando o riso e eu escondo o rosto, me deitando ao seu lado.
— Ah, roceira tímida!!! Tô brincando contigo! Vamos no seu tempo,
amor… vai fazer essas coisas com o tempo, e não precisa fazer se não quiser!
Cada mulher é diferente! Eu te amo e curto um “papai e mamãe clássico” sem
problema nenhum!!!
Ele diz e eu sorrio.
— Tão compreensível…
Eu zombo e ele beija minha testa.
— Eu sou um ótimo namorado, princesa!!!
Sorrio ao ouvir isso e ele ri ainda mais.
Tay sobe em cima de mim me beijando e já se preparava para me dar
mais amor quando seu telefone solta um ‘bip’ anunciando a chegada de uma
mensagem.
— Ah… não!!! Não…
Resmungo chateada quando ele interrompe o grande o momento para se
levantar. Tento agarrá-lo pelo pescoço, mas não consigo.
— Pode ser importante…
Ele diz e pega o telefone no criado mudo, lê a mensagem e sai da cama se
vestindo calmamente.
— Vem me ajudar com isso, vamos embora!!!
Ele volta a ficar tenso e eu fico brava.
— O que aconteceu???
— Nada, só voltamos ao plano original…
— Não quero ir embora… quero ficar! Vamos ficar…
Digo tentando desabotoar sua calça jeans novamente e ele se irrita.
— Para, Ellen! Vamos logo, não discuta!!!
Ele diz e me sinto frustrada.
— Quem era, Tay?
— Laura.
Claro.
— O que essa nojenta queria? Ela tem que estragar tudo sempre, né!!!
Tem como parar de ter contato com ela? É pedir muito? Depois de tudo o que
ela fez você ainda fica perto dela! Deixa ela atrapalhar a gente… qual é a
tua???
Eu questiono e ele nem se comove. Que raiva!
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— Não quero ir, Tay!!! ESTÁ ME OUVINDO???


Eu grito e ele me ignora. Pensei que falar mais alto o faria ter alguma
reação, mas ele estava longe demais. Tay estava em Barbacena.
— Depois você surta! Vai arrumar a sua mala e no caminho para
Barbacena você surta!!!
— AHAM!, VOU SURTAR LÁ E AQUI, ENTÃO!!!
Grito e ele ri. Eu estava muito brava, não queria ir embora. Amei nossa
noite juntos, amei ter me acertado com ele, e não queria que nada estragasse.
Principalmente pelo fato de que estávamos ali, longe de Juliano e Laura.
— Isso maluca, grita mais! Mas tenta gritar e fazer as malas ao mesmo
tempo, por favor!!!
Pronto, Tay tinha seu grande amor de volta e automaticamente seu “bom”
humor de infância tinha voltado. Até seu humor insuportável, que na verdade
eram os mesmos.
— A gente nem dormiu, como vai dirigir até Barbacena? É perigoso!!!
Resmungo extremamente chateada enquanto começava a guardar tudo e
ele para e se aproxima.
— Amor, confia em mim!!! Vamos ter um tempo pra gente, vamos curtir
um ao outro logo… prometo isso! Mas tenha um pouco de paciência, me
deixa resolver isso primeiro!
Ele me abraça por trás, mas nada daquilo ameniza a tristeza e frustração
que eu sentia.
— Sai… esquece!
Me afasto dele e não falo mais nada. Não adiantava discutir com uma
porta. Eu sabia que o que Juliano fez com Lari era grave e ele precisava pagar
por aquilo. Mas Tay estava levando tudo aquilo muito ao extremo, e eu
estava exausta. Tudo o que eu queria era ficar naquela cama com ele até
cansar, — como se fosse possível, me cansar dele. — mas tudo o que ele
queria era correr atrás de confusão. Estávamos longe de Barbacena, longe
daquela corja, por que não ficar aqui e deixar tudo aquilo pra lá? Apenas ir
fazer uma denúncia contra ele e esperar ele ser preso??? Mas não, tinha que
fazer o Thor, o justiceiro. Que raiva!!!
Deixamos Lari e Pedro em casa e partimos rumo a Minas Gerais. Fui uma
boa parte do caminho em silêncio, só falei com ele uma vez para lembrá-lo de
tomar o remédio, e o resto do tempo da viagem, dormi pra caramba. Acordei
com dores por dormir de mau jeito e com uma manta sobre meu corpo. Se em
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São Paulo estava friozinho, imagine em Barbacena, a cidade que tem mais
hospícios do mundo por ser a cidade mais fria depois das do sul,
simplesmente por que acreditavam que os malucos ficavam mais calmos em
um lugar onde o tempo é uma friaca o tempo todo!
Quando despertei já estávamos na estradinha de entrada da chácara. O
carro tinha os faróis altos e ao olhar em volta ainda despertando, podíamos
ver um carro parado no meio da estrada, barrando a passagem. Era a vadia.
— Não saia do carro!
Tay resmunga ao tirar o cinto e franzir os olhos para a estrada, mas ignoro
e saio junto com ele. Do lado de fora ele faz uma cara feia pra mim, e eu o
ignoro de novo.
— O que houve aqui?
Ele pergunta e Laura que estava encostada no próprio carro dá de ombros.
— Só avisei que ele foi até lá! O que VOCÊS fazem aqui?
Ela pergunta e ele passa a mão na cabeça, demonstrando nervosismo. Eu
já começava á sentir que meus dedos das mãos iam cair por causa do tempo
frio e falta de agasalho, enquanto eles falavam um com o outro, fumaças
espessas saíam de suas bocas.
— Achei melhor voltar, quero cuidar disso pessoalmente!
Tay diz e já acho que estamos respirando o mesmo ar por tempo demais.
— Foi até lá, aonde? Do que você tá falando?
Questiono e Laura responde sem me olhar nos olhos, aliás, desde que
chegamos notei que ela estava diferente. Parecia brava e irritada. Ela apenas
encara Tay como se questionasse o porquê não me contou.
— Foi até sua clínica! Entrou lá! Tá te procurando!
Ela diz entediada e eu olho pra Tay. Tenho tempo de ver seu maxilar
protestar.
— Faz o que, aqui?
Ele muda o assunto e ela desencosta do carro, ajeitando a arma que
carregava na cintura. Usava um casaco verde elegante até o meio da coxa,
calça preta super colada, botas como as que tenho, de salto baixo quadrado e
cano até o joelho, cachecol, e cabelos livres ao vento. Era linda, uma pena
que não prestava.
— Tô com um mau-presságio horroroso! Tô por aqui desde que vocês
partiram. Pretendia ficar na propriedade, mas sua mãe praticamente ameaçou
me matar a paneladas se eu não saísse de lá. Foi só sair e logo passei por ele
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na estrada, veio trazendo um cavalo, e desde então, tô aqui, aqui ele não entra
de novo, sei que ele vai aprontar! Minha mãe era uma fuzileira maravilhosa,
me ensinou muito, e uma das coisas que ela mais me falava era que: uma
pessoa que fica mais de dez segundos te olhando nos olhos, sem parar, ou
quer te levar pra cama, ou quer te matar!!! E posso te dizer que aquele cara
não se interessa por mim! Ele vai aprontar uma das boas…
Ela diz de cara fechada e Tay vira as costas logo depois de refletir sobre
aquilo. Tay parecia querer falar algo, mas evitava por causa de minha
presença, e essa sensação era forte. Eu tinha certeza que eu “o acalmava” ou
segurava suas atitudes movidas por impulso, não sei o porquê, mas sentia
isso.
— Tira esse carro daí. Vamos até lá, beber algo quente!!!
Ele resmunga indo em direção ao carro e eu dou uma boa olhada nela
antes de seguí-lo. Entro no carro e não falo nada. Eu não ia dar o gostinho pra
ela, e nem pra ele! Abstraí, fingi demência, e fiz cara de paisagem porque
assim, sabia que ia ganhar muito mais.
Paramos o carro no lago, peguei minha mochila e entrei na frente. Meu
corpo todo doía! Dormir em um banco de carro era pior coisa. Eu tinha
passado a manhã inteira na cama com ele, e não dormi… então eu só pensava
em um banho quentinho, pôr alguns de seus moletons e sonhar um sonho
bem bonito até amanhã meio-dia!
Subo direto, e de relance vejo Tay ir para a cozinha paparicar sua best
friend com chazinho quente, assim como fez pra mim. Pois é, talvez também
faça aquele lanche especial do ‘chef’ pra ela também. Não quis esperar pra
ver! Tomei meu banho, vesti suas roupas e fui dormir. Vi Max de relance na
janela, quando descemos do carro lá fora… todos tinham se recolhido, mas
ele estava na ativa, o que aumentava minha segurança em ir dormir tranquila,
sem medo de uma visita inesperada.
Acho que cochilei e acordei com Tay me abraçando na cama. Evitei com
todas as minhas forças, me afastar, e “fingi” estar dormindo, mas acho que
não funcionou.
— Sei que está acordada. Eu te amo. Te amo muito! Não vou ficar
pedindo desculpas por proteger você e fazer de tudo para te manter longe
daquele maluco, então se quiser ficar brava, pode ficar! Mas não vou me
afastar de você nunca mais, se pensa que eu vou, perca as esperanças… eu te
quero muito, te amo muito e não vou te deixar, nem vou deixar você me
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abandonar ou se afastar de mim!


Ele diz baixo no meu ouvido, beija minha cabeça, e eu durmo fingindo
que não ouvi nada, abraçada com ele.

Acordo 13:30 e sozinha na cama. Tay tinha deixado uma bandeja com
café da manhã ao lado da cama e uma rosa vermelha que tia Hella cultivava
na chácara. O bule de porcelana soltava uma fumaça quentinha com café
provavelmente fresco, e feito para mim, e eu me sentia uma princesa, mas
ainda esta ‘puta’. Nem toco em nada, e me levanto. Tomo banho e coloco
uma muda de roupa da mochila, uma calça ótima pra montar, uma blusa
simples, casaco, e desço pra cozinha. Na sala de estar a família toda almoçava
e logo encontro minha mãe fazendo o seu trabalho de todo dia na cozinha.
Dou um beijo e um abraço nela, e ela resmunga: — Essa aventura durou
pouco, né!?
Ela diz e não me sinto na obrigação de responder a sua provocação. Ela
estava certa. Minha aventura durou pouco e por causa disso estava muito,
mas muito estressada. Corri fazer o que mais funcionava para me acalmar,
como nesses casos! Cavalgar.

Vi Raivoso, conversei com ele e me senti feliz. Escovei Lodov por alguns
minutos, conversei com ele também, e me senti segura para montá-lo. Animal
forte, rápido, e dócil. Eu estava mais do que apaixonada!!! Já calçada de
minhas botas próprias para montaria, saí dali trotando com Lodov. Ele
respondia muito bem aos comandos, era lindo e obediente. Fui com ele até o
pasto vazio e me diverti demais, cavalgar e ver sua crina voar com o vento,
fazia eu me sentir como em um conto de fadas, era um animal totalmente
charmoso e elegante. Mas a minha fantasia durou muito pouco. Ao treinar
com ele, vejo Tay se aproximar da cerca com Laura na sua cola. Nesse
momento Lodov se assusta com alguma coisa e corre em alta velocidade me
pegando desprevenida e me fazendo voar longe. Se tinha algo que eu estava
acostumada, era andar de cavalo e mais ainda cair dele, então já preparada,
não me machuquei… caí corretamente protegendo a cabeça e minhas
articulações e vejo quando Tay corre desesperado e se aproxima de mim. Ele
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me examina e pergunta constantemente se eu estava bem. Aposto que se meu


tio ou minha mãe estivessem aqui, não se preocuparia tanto, mas Tay achava
que eu era de porcelana e aquilo me irritava.
— Tô bem, eu tô bem!
Digo e me afasto dele. Eu olhava pro chão procurando o que tinha
assustado Lodov e Tay só me tocava procurando sangue e ferimentos que não
existiam.
— Você caiu feio… Como assim está bem??? Vem aqui, Ellen…
Ele diz preocupado e eu perco minha paciência.
Acho a cobra peçonhenta e a pego pelo “pescoço” e a cauda. Era uma
coral-falsa, tinha mais veneno do que deveria e era linda demais.
— Perca seu tempo ligando para a defesa civil e diz pro seu pai ficar de
olho na Lulu e nas crianças por aqui!
Digo e me retiro dali segurando firme a serpente nas mãos.
— Já sabe que quase me matou não é bonitinha!?
Resmungo com a cobra e ela se agita em minhas mãos.
— Que cobra é essa???
Laura questiona quando pulo a cerca sem as mãos, e se afasta um pouco
morrendo de medo. Cagona.
— Qual é!? Não reconhece seus parentes?
Pergunto e não paro de andar. Deixo ela parada na cerca com cara de
‘tacho’.
— Ela é mais peçonhenta que você, lindinha!
Digo pra bichinha na minha mão e não consigo segurar o riso.
— Será que eu te chamo de Laura??? — pergunto.
— Não, ninguém merece isso, nem você!
Gargalho e vou até a cozinha pegar uma tigela pra trancá-la.
— Mãe, olha aqui quem quase me matou!!!
Digo rindo e minha mãe se espanta, mas também se aproxima
maravilhada.
— Uma coral-falsa… que perigo, filha!!! Aonde estava?
Ela pergunta passando a mão em sua calda.
— No pasto vazio… Lodov me derrubou e saiu correndo, morrendo de
medo, tadinho…
— Ele tá bem???
Ela questiona e ri zombando. Óbvio que sua maior preocupação também
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era o cavalo, porque sabe que eu sabia me virar, mas só falou pra zombar de
mim!
— Vai chatona, me dá uma tigela gigante aí, para eu prender ela!
Eu digo, Max entra na cozinha e Tay entra pela porta de fora.
— Eita, onde estava isso?
Ele se espanta e eu fico séria.
— No pasto, e é ELA, não “isso”! Cuidado com a Lulu por aqui, são
perigosas!
Eu falo e ele se aproxima.
— Tudo bem defensora número um!!! Preciso jogar veneno no meio do
mato, para me livrar DELA?
Ele diz e não tenho ideia de como responder. Poderia dizer: “Não sei, se
eu puder jogar veneno na sua cara, eu deixo você fazer isso!”, mas só que
não.
— Ela estava no seu habitat. Apenas saiu do mato e se arrastou pro
pasto… somos nós que estamos na casa dela, não o contrário!
— Tá, e como faço com as crianças?
Ele diz com aquela cara e voz de quando fica bravo, mas em nada me
assusta.
— Mandei seu filho ligar pra defesa civil. Vão procurar focos e ninhos…
Vão resolver isso, são especialistas!
Eu digo fingindo estar brava e ele sorri pra mim.
— Toma filha, seja rápida. Não quero morrer hoje!
Minha mãe me estende a grande bacia e eu sorrio.
— Mãe, qualquer coisa tenho o antídoto na bolsa, mas vai ficar me
devendo essa! Põe no chão sua medrosa, nem parece minha mãe!!!
Eu digo e ela me obedece. Coloco a serpente na bacia, Max coloca a
tampa rapidamente, fechando a bacia por completo. Faço pequenos furos na
tampa e nas laterais e respiro aliviada e satisfeita.
— O que eles vão fazer com ela???
Tay se aproxima de mim questionando e meu humor muda.
— Vão colocar ela em uma mata isolada, provavelmente, ou levarão para
o laboratório… eles que decidem!
Falo estressada e ele não gosta do meu tom. Tem um semblante magoado
e finjo não notar. Eu estava tratando ele mal, confesso… Mas eu não
suportava o fato de que havia perdoado facilmente aquela naja. Parecia que o
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perfume da vadia estava impregnado nele, não conseguia ficar um minuto


sequer perto dele.
— Fique de olho nela pra mim, mãe! Vou buscar Lodov!!!
Eu digo e me retiro da cozinha. Logo sinto Tay me seguindo.
— Ellen…
Ele resmunga atrás de mim e eu paro de caminhar. Viro para olhar pra ele
e ele me olha nos olhos.
— Eu te amo!
Ele diz e se aproxima com calma.
— Vem cá… — fala e toca sua mão na minha. — Não me trata assim…
Ele sussurra perto demais de mim e quando eu estava pronta para pular
em seu colo por causa do seu choro, meus olhos escapam de seu olhar
“pidão” e choroso, e caem em uma cena bizarra: Laura lutava corpo á corpo
com um homem, no lado mais extremo do casarão. Tay segue meu olhar
apavorado e quando nota o que estava acontecendo, corre para ajudá-la.
Corro atrás porque não sabia direito o que fazer, e vejo uma luta digna de
cinema. Laura voa e acerta um chute na cara do homem de preto, fazendo um
ferimento fraco em seu rosto por causa do salto da bota, nisso, o homem
acerta um soco no seu estômago, Laura na mesma hora devolve o favor em
sua têmpora, o fazendo cair longe e Tay corre aproveitando a oportunidade, e
imobiliza o cara pelas costas. Laura se aproveita disso e depois de lançar um
olhar alegre para Tay, começa um show de pancadarias, ela acerta diversos
socos na cara dele enquanto o pobre se debatia nas mãos de Tay, e antes do
homem desmaiar, ela acerta os dois pés no peito dele enquanto Tay o solta no
chão ao mesmo tempo. Pareciam movimentos ensaiados, pareciam que os
dois dançavam, que fizeram isso muitas vezes, eram uma dupla imbatível!
Ele a força, e ela a graça, lutava com equilíbrio nos saltos baixos da bota e
não tinha nada fora do lugar, continuava tão linda quanto perigosa. Ela parou
quando o cara caiu desacordado e só saiu de “guarda” quando teve certeza
que o cara tinha apagado. Parecia aquelas super—heroínas dos filmes da
Marvel.
— Quem é ele? Por que atacou você?
Ele questiona nervoso, mas quase não tem resposta.
— Estava vigiando a cabana, estava armado! Eu joguei a arma perto da
rede. Não tive tempo de fazer um interrogatório, ele me viu e já fiquei sob a
mira!
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Ela diz enquanto saía pisando duro, retirando seu cachecol intacto do
pescoço.
— Aonde você vai???
Ele pergunta e ela responde sem olhar pra trás.
— Preciso de uma bebida forte e da minha cama. Estou cheia!
Ela diz gritando porque já estava longe e Max se aproxima andando
calmamente.
— Faz tanto tempo que eu não via uma cena dessas que não resisti, me
sentei na rede e curti o “filme”… desculpe não ter ajudado, aliás vocês nem
precisaram de ajuda!!!
Ele diz e começa amarrar o homem com tiras de plástico, tipo aqueles
lacres.
— Que bom que gostou.
Tay diz irritado e encara o homem desacordado.
— Aonde ela o encontrou???
— Na cabana.
Tay responde e Max me olha sem graça e com pena.
— Conhece esse cara???
Ele me pergunta e eu nego. Não me era estranho, mas realmente não sabia
ao certo. Já o tinha visto, mas...
— Mas nós sim! Não está lembrado???
Tay fala com seu pai e eu só fico prestando atenção na conversa.
Max olha pro maluco com ferimentos profundos e balança a cabeça.
— Passamos por ele com o carro no sítio do verme… é isso! Eu me
lembro, é ele sim…
Max parece falar sozinho.
— Vamos até lá!
Ele diz e começa á puxar o cabra com violência.
— Eu já fui, o sítio está vazio!
Tay diz e fico surpresa. Max mais ainda! Era por isso que levantou cedo,
ou nem dormiu.
— Foi até lá sozinho???
Max se altera, teme pela segurança do filho.
— Fui. O que queria que eu fizesse?
Tay grita nervoso com o pai e Max se aproxima dele.
— No mínimo, me chamado!
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— Estava com Luiza…


Tay diz deixando o restante da frase nas entrelinhas.
— Nunca deixei de te atender por causa dela!!!
— Se isso fosse verdade, era pra eu chegar aqui direto pro funeral
daquele filho da puta!!! O que ficou fazendo enquanto Larissa recebia
ameaças pelo telefone, e Ellen recebia ligações daquele maldito???
— EU ESTAVA DE OLHO NELE!
Max grita e Tay empurra o próprio pai. Isso bastou para eu começar á me
desesperar.
— É, TÔ VENDO! ESTAVA TÃO DE OLHO QUE DEIXOU ESSE
VERME ENTRAR AQUI!!!
Tay apontava para o homem moribundo e gritava ainda mais alto.
— Vocês parecem duas mulheres escandalosas! A briga de vocês não vai
ajudar em nada! Vamos para a delegacia! Parem de gritar um com outro!
Eu entro no meio dos dois, mas fico mais perto de Tay. Max quando
surtava me dava medo.
— Delegacia… não seja tola.
Tay resmunga e começa a puxar o homem para o canto mais afastado.
— Tay, vamos dar um jeito nisso, filho! Juntos! Mas precisamos ter
calma!
Max diz me ignorando e eu me afasto!
— Não quero calma, com calma nada funciona! A última vez que você
teve calma, quase que minha mãe morre grávida!!! Quero esse cara agora!!!
Chame Jon aqui! Quero ele aqui ainda hoje!
Tay dá ordens ao próprio pai e Max faz algo que nunca o vi fazer: ele
abaixa a cabeça. Era o tenente mandando no capitão velho de guerra e aquilo
era bizarro. Tay não era mais o mesmo. Estava apavorado ao ver que o cara
conseguiu chegar até minha cabana e não dizia, mas sentia medo. Tinha em
seu olhar, um medo profundo.
— Ele não pode ficar aqui, vou por ele dentro do galpão antes que Lulu
ou as outras crianças o vejam por aqui. Vou arrancar dele o que ele sabe, vou
ligar para Jon e pedir que ele venha até aqui!
Max diz de repente, põe o cara nos ombros como se ele pesasse somente
um kilo, e sai em direção ao galpão.
Tay fica olhando o pai sair e eu me aproximo.
— Você está bem?
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Pergunto tocando seu peito e ele beija minha testa.


— Não, mas vou ficar.
— Não pode ficar brigando com seu pai desse jeito! Vocês precisam ficar
juntos e se ajudar!
— Eu sei, eu sei!!! É só que aquele nojento está atrás de você, não sei o
que eu faria se ele tivesse feito alguma coisa contra você… Minha raiva é tão
grande, se você soubesse… não entendo o que ele ganha fazendo isso, não sei
o que ele quer! Por que não nos deixa em paz???
— Fica calmo, ele não vai vir atrás de mim! Nada vai acontecer comigo!
— Nada vai acontecer porque eu não vou deixar, né!? Não vai vir mesmo,
talvez ele não se arriscasse, mas pelo jeito está mandando os capangas dele.
Vou encontrar aquele merda! Ele não perde por esperar!
Ele diz e olho atentamente para ele.
— Tay, não sou nenhuma donzela perdida ou amedrontada que precisa
ser salva! Posso cuidar de mim mesma!
Eu digo baixo para não parecer que eu estava querendo brigar, mas aquilo
parecia ter sido pior do que um tapa.
Tay me olha profundamente nos olhos e vai embora em direção á cabana.
Penso em seguí-lo, mas me recuso, não queria brigar e aquele não era o
melhor momento para conversar com ele.
Encaminho-me até a cozinha me esquecendo completamente de Lodov e
só encontro Max. Ele parecia sereno enquanto separava facas da cozinha. Ele
conferia com o dedo o quanto eram afiadas e separavam todas em uma
bandeja. Parecia em transe.
— O que vai fazer???
Pergunto assustada e ele me olha nos olhos. Outro que tinha mais beleza
do que coração. Aquela família era de outro mundo.
— Conseguir algumas informações.
Ele fala, abre uma maleta que parecia ter instrumentos cirúrgicos,
horrorosos, e eu entro em pânico.
— Vai torturar o cara??? Você vai torturar ele???
Eu pergunto e ele me olha de um jeito estranho. Não espero resposta, nem
era preciso, pego as chaves do carro de Tay porque o meu eu não tinha ideia
de onde estava, e saio dali antes dele me impedir. Eu precisava parar com
aquela loucura, imediatamente, aquilo tudo já tinha ido longe demais. Do
caminho, ligo para Juliano e ele atende no primeiro toque.
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— Apareceu a margarida…
— O que você quer de mim? Por que está fazendo isso? Por que
machucou a Lari? Por que está tentando me machucar???
— Minha princesa, primeiro respira, depois fala com calma… não estou
entendendo nada!!!
— Aonde você está? AONDE VOCÊ ESTÁ? ENTENDEU AGORA???
— Tudo bem, mas gritar não ajuda… — ele ri. — eu estou indo viajar á
trabalho, vou pra Belo horizonte já, já…
— Aonde posso te encontrar, antes de você ir???
— Bom... preciso pegar uma muda de roupas no sítio e estou dirigindo, tô
indo pra lá agora mesmo… estou perto, se quiser te espero lá!
— Tô a caminho!
— Ok.
Ele diz e eu desligo.
Juliano estava com uma calma que não era dele. Sempre foi carinhoso
demais comigo, mas calmo? Calmo nunca foi com ninguém. Não parecia um
cara cheio de culpa…
Estaciono na porteira do sítio e um de seus capangas logo me deixa
entrar.
— Pode me explicar o que é tudo isso???
Entro na sala de seu casarão, aonde me disseram que ele estava e não me
sinto entrando em um covil. Era só Juliano arrumando algumas roupas e
parecendo calmo demais. Normal demais.
— Tudo isso o que, amor?
— Lari apareceu em casa toda ensanguentada, depois ficou recebendo
ameaças pelo telefone. Hoje um de seus capangas foi visto xeretando minha
cabana dentro do terreno do meu patrão, estava armado e quase matou um
dos amigos de Tay, e agora vivo um inferno… ele está lá, prestes á ser
torturado pelo meu chefe para dizer o que sabe! Por que você está fazendo
tudo isso? Não tô te reconhecendo!
Pergunto e ele para de mexer nas roupas e se senta me encarando.
— Acredita mesmo que eu seria capaz de fazer essas coisas? Mesmo???
Ele pergunta e nesse momento parece sereno demais.
— Não. Não me conformo! Não acredito que você seja capaz, mas há
evidências, ela acusa você!
Eu falo parecendo estar confusa e ele estende os braços pro alto como
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quem faz um pergunta óbvia.


— Se sou um bandido perigoso, o que você faz aqui sozinha, Ellen???
Ele pergunta e não sei o que responder.
— Não sei. Talvez seja porque não temo você! Não temo ninguém!!!
Eu falo, ele ri e se levanta.
— Linda, você está aqui porque me conhece! Larissa é maluca! Nunca
encostei um dedo nela. Não foram homens meus que á machucaram… te
garanto isso!!! E tem mais, não confio naquela família de malucos, vai por
mim, se eu realmente matei todas as pessoas que Larissa insiste em dizer que
matei por aí, perto dessa família que você tanto ama, sou um santo!
Investiguei a vida deles, desde que se mudaram pra cá. Aquele cara matou a
muita gente, matou até a melhor amiga quando era mais novo…
— Eu sei tudo sobre isso, Juliano, nada disso é novidade pra mim!
— Você não sabe nada sobre eles! Não sabe da missa, um terço, princesa!
Quer saber o que seu amor de infância aprontou em Manaus todos esses
anos??? Sim, também sei disso, sei de muitas coisas, ninguém entra e sai
dessa cidade sem minha vistoria e os Covericks estão mais sujos do que
supostamente eu estou!!!
Ele diz com um sorriso no rosto e me trata como se eu fosse uma garota
tolinha.
— Do que você está falando???
— Seu namoradinho… é, também sei que estão de namorico, é pior do
que o pai!!! A parte que eu fiquei sabendo e que você já sabe, é que ele
sofreu tortura, sofreu dentro daquela base no meio da floresta, foi muito
torturado mesmo e ninguém da família soube, ninguém o ajudou! Só que o
que eu sei e você não sabe é que isso aconteceu até completar uns dezenove
anos, gatinha!!! Depois disso, todas as marcas que ele tem no corpo é pelo
mal que causou á outros! Ferimentos de brigas feias! Tem a lista mais extensa
que a do próprio pai, matou mais que ele!!! Era um trio, o tal de Pedro sem-
sobrenome, Laura Nogueira, e ele, eram os três na noite sombria de Manaus.
Recebiam um pagamento e iam caçar o alvo. Ninguém ali presta, e se eu
fosse você pesquisava á respeito do Pedro sem-sobrenome, vou te ajudar:
Pesquisa á fundo, como quem não quer nada, á respeito de um tal de sargento
Carlos com seu sogro assassino! Pesquisa o que os dois têm em comum…
Ele diz e a cena de Laura e Tay, trabalhando em grupo para massacrar
aquele homem me veem á cabeça. Não podia ser. Isso é uma mentira.
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— Não quero saber de nada disso, é uma mentira deslavada para meu
foco sair de você e me voltar contra eles. Não vai funcionar. Eu sei que Max
matou muita gente, afinal serviu na pacificação do Haiti e da Síria, mas Tay
nunca machucaria ninguém, nunca mataria ninguém…
— Eu só estou mostrando de que lado você está, lindinha! Entrou na
minha casa para me acusar, mas mora com o verdadeiro inimigo. Vou
confessar: coloquei um capanga meu para ficar de olho em você lá dentro,
desde que eu fui te procurar e ele me disse que você estava fora da cidade á
mando dele, sendo que depois, você mesma me disse que estava no casarão.
Achei que estaria sendo coagida á mentir, forçada á dizer que estava tudo
bem, então, mandei Nonato ir até a cabana para ver se te encontrava, não para
te MATAR, sequestrar, machucar ou algo bizarro que você tenha pensado
com essa sua cabecinha manipulável, mas só para ver se você estava segura!
Mas não, não matei ninguém, não bati na maluca da Larissa, nem fiz nada de
errado! Larissa sempre me amou, morre de ciúmes do amor que sinto por
você desde guri, e não digo nada se ela mesma não se arrebentou só para sair
me difamando como sempre fez, desde que terminei o caso que a gente tinha.
Ele diz como quem fala do tempo, volta á organizar sua mala e eu tento
processar toda aquela informação. Larissa apaixonada, Max maluco, Tay
fazendo parte de um trio de assassinos, Pedro sem-sobrenome… não, tinha
algo que não se encaixava! Aquilo era bizarro e ridículo demais pra ser
verdade. Meu Deus, eu não sabia no que pensar!!!
— Não sei o que pensar… tô muito confusa!
Eu digo me sentando no sofá e limpando o suor de nervoso da testa.
— Eu imagino…
Ele resmunga, termina de arrumar a mala e se senta ao meu lado.
— Larissa nunca se auto—machucaria para me provar nada, muito menos
por ciúmes, isso é muito maluco até pra ela!!! Sabe que não sinto nada por
você, sabe que apoiaria um relacionamento de vocês, não tinha porque fazer
isso… ela sabe que eu amo Tay, nunca ficaria no caminho dela, não sou um
empecilho, nunca fui!!!
Eu digo enquanto fitava os próprios pés.
— Ama aquele cara???
— Amo! — eu o encaro sem entender.
Digo e não entendo o porquê daquele espanto!
— Eu sabia do namorico, mas não dos seus sentimentos. É outro
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assassino, por que o ama???


Ele diz e eu fico irritada.
— Ele não é um assassino! Tay é gentil, é um doce, não é assim. Isso é
mentira!!!
Eu digo e ele ri alto.
— Ellen, vou fingir que não ouvi isso, vou fingir que você não disse amar
um maluco que nem conhece!!! Nunca conseguiu retribuir o meu amor e diz
na minha cara, depois que eu conto quem ele realmente é, que o ama, que é
gentil, um doce??? Vou perdoar sua insanidade movida pela paixão e te dar
um tempo para acabar com esse relacionamento que nunca deveria ter
existido e sair daquele hospício!!! Só algumas horas…
Juliano diz furioso e eu me levanto para sair de lá.
— Você está maluco!!!
— Não estou não. Estou é protegendo você! Termine isso, termine essa
loucura, volte á trabalhar, esqueça Larissa, aquela nota de três reais, e volte
para a sua casa! Se afaste daquela família, daquela chácara ou acabará
morta!!!
Eu que havia virado de costas para me retirar, ao ouvir aquilo, me viro de
novo para ele e me aproximo para ficar cara á cara. Estava para nascer
homem que vai me fazer tremer de medo! Que ele vá pastar, esse condenado!
— Está me ameaçando???
Pergunto e ele nega com a cabeça.
— Estou te avisando, te ajudando!!! Todo mundo que se aproxima
daquela família morre, ou passa por situações cruéis demais. Te dou um dia!
Pretendia ir viajar agora, mas ficarei aqui até amanhã, vou esperar você! Te
dou até amanhã nesse mesmo horário. Se não me procurar, estará sozinha, e
vai ter que lidar com o caos sozinha!!! E se for pra perder você, já não tenho
mais nada á perder… se não pode me amar, eu que sempre fui eu mesmo com
você, vai ter que sentir alguma coisa, nem que seja ódio, Ellen!
Juliano diz e seguro o impulso de cometer uma agressão física.
— Ah, se é isso o que quer já está conseguindo!!! Fica longe de mim e da
minha família! É só um aviso! E não vou esperar meu namorado ou meu
sogro, “os dois assassinos” virem aqui para apagar mais um, se tocar na
minha família para me intimidar eu mesma venho!!!
Eu digo e me retiro dali sem olhar pra trás.
— UM DIA, ELLEN!!!
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Ele grita e eu seguro o impulso de mostrar o dedo do meio pra ele.

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13
LODOV NA CAIXA

— Tay…
Meu pai me chama e eu o ignoro, continuo procurando e encontro a arma
do condenado no gramado ao lado da área da cabana. Provavelmente Laura
jogou a arma no confronto, ela deslizou pela área da cabana e caiu no solo.
Foi isso.
— Tay! — ele me chama de novo e eu olho pra ele.
— Agora não, pai!
Eu digo porque já sabia que ia vir todo aquele lenga-lenga e não estava a
fim. Tiro o casaco e pego a arma por ele, para não deixar minhas digitais.
Provavelmente eu poderia matá-lo e fazer parecer que era suicídio, não sei,
precisava pensar, afinal não podia ficar agindo assim por aqui, não com Ellen
na minha vida novamente.
— TAY!!! — ele grita. — Ellen me viu com as facas… saiu desesperada,
acho que foi atrás dele no seu carro!!!
Ele diz e o meu coração se rasga. Tudo dói.
— Não vai ir atrás dela??? Não posso ir. Não posso deixar o verme
sozinho…
Ele diz, eu respiro fundo, e tomo a decisão mais difícil da minha vida.
— Ellen é forte! Sabe se virar, ele não vai machucá-la. Ele a quer, pra ele,
não a mataria.
— Tay ele não presta…
— Ellen diz que não é uma donzela em apuros. Sabe se virar, confio nela!
— Se algo acontecer com ela, você vai se sentir culpado pelo resto da
vida, filho!
Ele diz e eu volto á olhar no seus olhos.
— Sem problemas, pai! Você a viu sair e não fez nada, vou dividir a
minha culpa com você.
Eu digo e começo a ir embora, mas ele se coloca na minha frente.
— Não posso, Tay!
Ele sussurra e sei do que se trata.
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— Amarelou?
— Não posso voltar á ser quem eu era! Por Ana Luiza, quero continuar
no caminho certo! Quero ser melhor, quero ser um pai exemplo!
— Mudou de lado? Quer ir para o time dos super-heróis, agora? Sem
essa, Max, você nunca foi o herói!!!
— Eu sei, mas por minha filha quero ser. Não quero decepcioná-la.
Ele diz e eu sorrio.
— Então sai do meu caminho e deixa-me fazer o trabalho sujo, por você!
Eu digo e tento partir novamente, mas ele não sai da minha frente.
— Não vou fazer isso, não vou deixar você fazer isso e destruir a sua
vida, destruir a vida dela! Posso conseguir de outra maneira, vou fingir que
vou machucá-lo, ele abrirá a boca, te garanto isso!
— É melhor sair da minha frente!!!
Eu digo me segurando e ele franze o cenho.
— Ou o quê? Vai matar o seu próprio pai!? Teria coragem??? Ou vai
mandar Pedro? Não, Laura talvez…!?
Ele diz e eu sorrio com ironia.
— É assim, um ajuda o outro, não é!?
Ele continua e pensa que me surpreende ao insinuar sobre minha vida em
Manaus. Sempre soube que Jon estava na minha cola.
— Sou seu filho, mas há uma diferença entre mim e você: eu consigo
dormir á noite.
Digo e passo por ele.
— Se vai fazer isso, tem que fazer direito…
Ele resmunga, mas eu continuo andando.
— Não esquenta!
Falo e toco o ‘foda-se’. Enquanto ele estava brincando de casinha, eu
estava me fodendo em Manaus. Não, eu não o culpo, não culpo ninguém pelo
o que me tornei. Ninguém tem culpa nisso á não ser eu mesmo.
Enrolo a arma na blusa e caminho em direção ao casarão. Na área perto
da rede estavam os gêmeos e meus avós brincando e conversando. Dou um
beijo em cada um e sigo meu caminho até o galpão. O que eu ia fazer não era
muito difícil… ia tirar tudo o que aquele verme quer, todos os seus planos da
boca do capanga imundo e então enviar pelo correio a cabeça do verme-
empregado para o sítio. Seria fácil.
Entro e o vejo largado no chão bem no canto do galpão, já acordado.
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Estava um pouco escuro, a lâmpada iluminava pouco, era uma lâmpada


comum para um galpão enorme, “ambiente pesadelo”, literalmente. Arrasto
uma cadeira próxima fazendo um barulho horroroso e me sento em sua
frente. Meu pai tinha colocado uma fita em sua boca, e o mantinha preso
pelos lacres.
De repente ele começa á resmungar, impedido de proferir seus — acredito
eu — xingamentos, por causa da fita adesiva, e me olhava com os olhos
arregalados. Coloco minha blusa no chão, e abro com delicadeza e cuidado
para não tocar na arma. Ao vê-la, meu mais novo amigo entra em pânico e
começa á resmungar mais alto. Olho para ele entediado e fico com preguiça
de falar, mas começo.
— Sabe, eu não queria precisar fazer isso, juro! Não queria… isso é tão
difícil... estar no meu lugar, sabe??? Muito difícil… mas ás vezes temos que
fazer coisas para nos proteger, proteger quem a gente ama, nossa família,
nossos filhos… você sabe disso! Não sei se tem filhos, mas, bom, você deve
imaginar o quão difícil é!!!
Começo falando e quanto mais falo, mais nervoso o homem fica.
— Aí a gente pensa em dar um tempo disso, ficar numa boa na casa de
campo da família, com os amigos, os familiares, nossa mulher, e do nada
aparece alguém tentando tirar essa paz que você não tem faz muito tempo…
Eu falo e escuto um ‘por favor’ escapar da sua boca, ou algo parecido
com isso.
— Veja você… entrou na minha casa, foi atrás da minha mulher, quase
matou uma colega de trabalho, e apontou uma arma pra ela em uma
propriedade que moram crianças, cara! Como você se sentiria??? É muito
triste! Isso é muito decepcionante! Não é!? Escuta bem o que vou dizer,
porque odeio coisas repetitivas, odeio repetir o que falo… eu vou tirar a fita
da sua boca, você vai me contar tudo o que o Juliano quer com a minha
mulher, todos os seus planos e então, se você se comportar, mais tarde,
quando todos se recolherem, vou liberar você para ir embora e você nunca
mais pisará aqui! Afinal não quero enterrar nenhum corpo aonde minha irmã
mais nova brinca, ela ama esse galpão… agora um aviso: se você gritar, você
morre, se você se mover, você morre, se você olhar pro lado, você morre, se
tentar fazer qualquer gracinha, você morre!!! Ou seja, você não tem muitas
opções! Seja esperto, me fale de uma vez tudo o que sabe e responda com
verdade todas as minhas perguntas para sair daqui vivo. Uma pisada na bola e
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eu meto uma bala na tua cabeça, faço parecer suicídio ou faço uma cena de
crime aqui, perfeita, aonde você me atacou, lutamos, e te matei por legítima
defesa!
Me levanto e tiro a fita de sua boca com todo o cuidado de um homem
gentil que eu era. Só que não.
— Por favor, por favor!!! Eu não queria fazer nada, vi que tem crianças,
eu não ia deixar que elas me vissem, tenho filhos!!! Dois filhos!!! É só me
perguntar e eu te respondo!!!
Ele diz e lágrimas de desespero escorrem pelo seu rosto oleoso. O cara
parecia ter idade para ser meu pai.
— Ótimo. Pode começar me falando o teu nome e tudo o que sabe…
Eu digo e pego em um canto uma garrafa de vinho vazia da adega do meu
avô. A cada gracinha ele perderia um dente.
— Meu nome é Nonato…
Ele começa e eu arrasto a cadeira para mais perto ainda. Minha presença
em seu espaço pessoal o faz tremer de medo, literalmente. Ele olha para a
garrafa em minhas mãos e gagueja um pouco. Olho em seus olhos e fico
esperto para pescar qualquer mentira, me baseando em sua expressão
corporal.
—… Meu chefe, o doutor Juliano, me mandou aqui para saber se a
menina Maia estava bem…
Ele diz e dou uma garrafada no queixo dele, pegando “leve” para
começar.
— Sem mentiras, te dei uma chance e não darei outra, senhor Nonato!!!
Eu falo e espero ele se recompor.
— Senhor, me desculpe, isso foi o que ele nos instruiu a dizer caso
fôssemos pegos, senhor… não mentirei, não mentirei…
Ele resmunga enquanto o sangue jorrava de sua boca.
— Nos instruiu!? Sem mentiras…
— Tem mais funcionários, senhor… tem mais pela mata. A mata é aberta,
não tem fronteira nenhuma. Chegamos á pé. Me esperam retornar ao ponto de
encontro até o pôr do sol.
— Estão aqui? São quantos?
Temo pela minha família e ele nota.
— Não foram instruídos á se aproximar senhor… só eu estou aqui, estão
longe, não entrarão até o momento do meu retorno. Estamos em dez!
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— Dez, certo, continua…


— Ele me mandou aqui para encontrar a menina Maia e dar um recado á
ela. Só um recado. Ele sabe de coisas á respeito dos senhores, o senhor e seu
pai, e vai contar pra ela, vai contar tudo, para colocá-la contra os senhores.
Ele a ama.
Então era isso. Ele quer destruir o que Ellen sente por mim contando os
meus podres e os podres de meu pai.
— Ellen foi atrás dele para tirar satisfações ao ver você aqui. Ele contará
tudo pra ela…
— Vai contar sim, senhor!!!
— Acha que ele seria capaz de machucá-la?
— Não diretamente senhor! Ela não. Mas o senhor, a mãe dela, e o tio,
que são as pessoas que ela mais ama, ele seria capaz. Qualquer um que ele
quiser, menos as crianças, ele é contra machucar crianças.
— O que ele quer?
— Ele quer ela pra ele. Tem possessividade quando se fala na menina!
Sempre quis ela, desde menino e vai fazer de tudo para ter!
— Qual o plano dele? Quais os planos?
— Primeiramente tentar manipulá-la. Se não der certo, vai machucar
alguém que ela ama.
— Primeira opção… seria eu!?
— Sim, senhor!
— Ele tem crimes como as pessoas dizem?
—Tem sim, senhor! Muitos! Assassinatos, coação, queima de arquivo,
lavagem, processos, sequestros… tem a ficha muito extensa e muito suja!
Qualquer um que tente atrapalhar seus negócios, some do mapa!
Ele diz e eu paro para refletir em tudo aquilo. Eu já tinha um plano, mas
precisaria da ajuda de Jon. Se ele demorasse mais eu ia surtar.
— Qual seu ponto mais fraco? Aonde dói nele?
— A menina Maia é seu ponto mais fraco, senhor!
Como pode ser??? Nunca poderia usar Ellen para poder feri-lo. Não tinha
como!!!
— Tem que ter mais alguém, tem que ter outra pessoa, alguém que ele
ame, alguém que ele queira proteger…
Eu digo e Nonato olha para baixo.
— Já sabe como funciona, ou diz ou morre!
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— Vou acabar morrendo senhor, eu e toda minha família! Assim que eu


sair daqui e ele descobrir que contei tudo, vai matar minha família, minha
esposa! Então que seja! Se vou acabar morrendo de qualquer jeito, que não
seja usando uma pessoa inocente!
Ele rosna e lágrimas caem de seus olhos.
— Avó? Mãe? Filha?
Pressiono e ele começa chorar alto. Marica. Me canso, sinto meu tempo
se esgotando e perco a paciência. Pego a arma, engatilho e encosto o cano em
sua têmpora.
— Fala ou morre!!!
Eu falo alto e ele chora ainda mais.
— Quero uma garantia.
— Eu não trouxe você aqui para fazer um acordo!
— TEM FAMÍLIA, NÃO!? Não é por eles que está me torturando desse
jeito??? Não está tentando proteger a mulher que ama??? Tô fazendo o
mesmo!!! Ou me promete que minha família sairá disso ilesa, ou me mata
agora!!! ME MATA AGORA!!!
Ele grita e rosna beirando um ataque nervoso e não tenho como não olhar
sua atitude com outros olhos. Estávamos falando de crianças e esposa. Eu
faria o mesmo.
— Me conta e eu dou a minha palavra de que sua família ficará bem,
mesmo que ele te mate. Não me importo com você, mas se algo te acontecer,
cuidarei de sua esposa e de seus filhos como se fossem meus!
Eu falo e ele respira aliviado olhando nos meus olhos.
— Obrigado.
Ele diz e se recompõe para voltar á falar.
— Ele tem uma menina, Sofia, tem seis anos. É inocente, um doce, mora
com a mãe, moça solteira, Elisabeth. Moram em um condomínio de classe
média alta em Belo Horizonte, o endereço é…
Ele diz de olhos fechados, me passa todas as informações e responde
todas as minhas perguntas. No momento em que terminava de contar tudo o
que Juliano sabia á meu respeito, escuto Ellen entrar no recinto. Não me virei
para ver, conheço a forma como anda, e o barulho que suas botas fazem.
Ela não me olha nos olhos, caminha em direção ao capanga refém
segurando uma faca e por um breve momento o assusta. Ela corta todos os
lacres e o ajuda á se levantar.
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— Você está livre, mas leve um recado meu para seu chefe e seus
‘amigos de preto’: se pisarem aqui de novo, juro por Deus que eu acabo com
vocês! Sei que estão na mata, diz que eu mandei todos irem embora AGORA,
e eu não vou voltar á repetir. Você me entendeu, Nonato?
Ela fala beirando uma síncope, e eu sorrio para a cena. Eu não sabia se o
capanga tremia de frio ou de medo dela, ou era apenas respeito mesmo. Acho
que de tudo isso, um pouco.
— Eu entendi, sim, senhorita Maia!
Ele responde de cabeça baixa e tenho a impressão de que todos os vermes
eram treinados para servi-la. Foi Juliano que entrou em contradição ao
mandar um deles vir até aqui.
— Então vá pelos fundos, se alguém te ver saindo, você vai se ver
comigo!
— Sim, senhorita!!! Muito obrigado!
Nonato resmunga e sai apressado me olhando de relance. Ele cobrava a
promessa que eu havia feito e eu pretendia cumprir, pois tinha palavra.
E lá estava ela na minha frente, com pose e postura impecável. Sentado
eu estava, sentado eu fiquei. Só queria continuar olhando para ela. Se eu
morresse qualquer hora dessas, gostaria que minha última imagem fosse sua
face.
— O que você ia fazer?
Ela questiona e eu confirmo o que já suspeitava.
— O que acha??? Hum?
Meço seu corpo e fico excitado. Ela queria a verdade nua e crua. Ela teria
a mais cruel das verdades.
— Quero pensar que só ia assustá-lo para ter respostas… juro por Deus…
não quero pensar na possibilidade de ver você tirando a vida de alguém, ou
saber que já tirou…
Ela diz, eu deixo a garrafa com sangue no chão, e levanto.
Faço ‘não’ com a cabeça e entro em seu espaço pessoal. Ela fedia á Juliano.
Me recordo do modo como ele a chamou — de princesa — e fico mais do
que irado, o que sinto não tem nome.
— Eu ia realmente matá-lo! Disse que ia soltar o idiota pra ele me contar
tudo, mas se você não tivesse chegado e me atrapalhado com essa sua pose de
“dona do mundo”, ele já estaria sendo enterrado, aqui mesmo!!!
Eu falo olhando para sua boca e seu semblante é de raiva.
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— Tá com medo de mim? - pergunto.


— Eu não tenho medo de ninguém. Sou a “dona do mundo”!
Ela diz com sangue nos olhos e eu começo á arrancar aquela roupa
nojenta que tinha o cheiro dele. Maldito nojento. Maldito!
— Você está cheirando àquele verme!
Começo á tirar sua roupa, mas ela não protesta.
— Vou passar frio!
— Ah, mas não vai mesmo!!!
Afirmo e começo o meu alívio. Eu precisava tê-la em meus braços, sentir
seu corpo no meu. Eu estava preocupado, na verdade apavorado, com a
possibilidade dela não voltar para mim, então tirei a sua roupa, deixei
somente de lingerie, e a beijei com força. Sem cuidado, sem paciência, sem
medo de assustá-la. Foda-se, naquele momento só pensava com a cabeça de
baixo.
Pego minha selvagem no colo enquanto á beijo e a encosto na parede, no
canto extremo do galpão. Toco sua intimidade e noto que já estava pronta
para mim, ela era rápida.
Sugava sua língua com força e podia ouvir seus gemidos baixos. Passei á
dar atenção á seu pescoço e me esqueci do mundo, tanto que eu tinha certeza
que ali ficariam marcas e não lamentava, eu estava insano. Minhas mãos
apalpavam seu corpo com grosseria, e ela não reclamou dos meus puxões
exagerados nos cabelos de sua nuca. Ellen era minha mulher e precisava
saber quem eu era, inclusive quem eu era na hora ‘H’. Antes de sentir a
famosa dor nas bolas já me adiantei, eu precisava devorá-la e ouvir os seus
gemidos chamando por meu nome ou eu ia enlouquecer.
No canto direito do balcão havia muita tralha sendo em sua maioria,
móveis antigos do casarão. Então, tinha um amontoado de tudo inclusive uma
mesa. Caminhei rapidamente até lá com ela no meu colo e a fiz descer.
— Vira!
Ordeno enquanto a vejo me olhar transtornada e na hora ela obedece.
Coloco suas mãos na mesa e puxo seu bumbum na direção que era preciso.
Entro dentro dela sem pressa e não demoro muito até ela se acostumar com
meu volume, molhada como estava, com certeza aguentaria. Começo a meter
forte e ouço meu nome pela primeira vez. Alcanço sua nuca e seus gemidos
tímidos viram gritos histéricos. Meto com força e sem demora a vejo vacilar e
suas pernas ficarem bambas. Se ela continuasse gritando como uma cadela,
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logo eu gozaria dentro dela e não foi diferente.


— Gosta disso não é!? Toda vez que procurar aquele filho da puta vou te
tratar como uma cadela!
Eu resmungo em meios gemidos guturais e ela decide encostar suas
costas no meu peito.
— Se for isso o que eu ganho por procurá-lo, farei isso todos os dias!!!
Ela diz em alto e bom som e meu pau lateja dentro dela, implorando para
se aliviar e encher aquela boceta apertada do meu líquido.
— Filha da puta!
Empurro-a para frente e volto á socá-la com força, muita força, do jeito
que eu queria da primeira vez. Ellen é linda, mas aquela cena com ela de
bunda empinada pra mim era a visão do paraíso.
— Oh, por favor, Tay, por favor!!!
Ela geme e acelero as estocadas ainda mais. Estávamos em um canto nada
isolado, quem entrasse veria aquela cena, e lamento dizer que não ia ligar, e
que nada no mundo ia me fazer parar nem se houvesse um terremoto. Aquela
era a mulher da minha vida, meu grande amor, minha mulher selvagem que
não dependia de mim para nada, mas que naquele momento se satisfazia com
algo que só eu podia dar. Ellen não era uma donzela em apuros, mas
enquanto estivesse em seu interior ela seria o que eu quisesse. Passo a mão
em sua intimidade e chupo para sentir seu gosto, passo de novo e enfio em
sua boca, se ela fechasse a boca ia levar um tapa naquela bunda e eu torcia
para isso acontecer, mas não aconteceu. Ellen chupou meu dedo como se eu
tivesse o mergulhado em um pote de Nutella. Eu não aguentei, fui pego de
surpresa e sua ousadia me fez gozar na hora.
Gozei metendo fundo e quando ela sentiu que já tinha acabado, se
ajoelhou e começou á me chupar.
— O que…?
Eu ia começar á perguntar o que ela ia fazer, mas não deu tempo. Sua
boca era deliciosa e me fez ficar duro quase que imediatamente. Me pergunto
o que me deu na cabeça de ir embora para pilotar aviões, eu fiquei maluco???
— E como é a “boquinha mamando tudo”? Pode me dar uma nota?
Ela diz e volta á me chupar me olhando nos olhos. A criatura me chupava
olhando nos meus olhos… minha nossa…
Perto de gozar tentei fazer ela parar e me dar o outro buraco, mas ela se
recusou e isso á fez chupar com mais vontade. Chupava como uma “puta
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profissional”, não como uma “recém-ex-virgem”.


— Não quero desperdiçar…
Resmungo me segurando.
— Pode tentar me engravidar outra hora, por agora quero mamar, e saber
se seu gosto é tão bom quanto o meu!
Ela diz e entre as pausas passava a língua na cabeça demonstrando que ter
parado para me responder, era uma tortura. Filha da puta. Voltou á chupar, eu
gozei, ela não deixou escapar uma gota, continuou chupando mais um pouco,
e se levantou para me olhar nos olhos enquanto limpava os cantos da boca.
Mas que porra era aquela???
— Não é tão ruim quanto eu pensava… é até saboroso! Vou querer mais
ao me deitar!
Ela diz, me dá um beijo quente, e pega as peças de roupas pelo chão para
começar á se vestir.
— Nota mil!
Resmungo depois de um tempo e ela sorri como uma safada.

— O que aconteceu?
Meu pai entra na cozinha sussurrando assim que cheguei do galpão e fui
beber água.
— Ele me contou tudo! Mas Ellen chegou de repente e o soltou! Não
pude enviar a cabeça dele pro chefe!
Eu falo e ele cruza os braços.
— Brigou com você?
Ele questiona e a cena d'eu metendo com força naquela bunda pequena e
redondinha dela, aparece para me perturbar. Mulher deliciosa.
— Não, só transamos! — eu digo e ele franze o cenho.
— Estão juntos mesmo?
— Sim!
— Que bom, fico feliz! Que ela lhe traga juízo!
Ele diz e eu evito gargalhar.
— Bom, me baseando nos últimos acontecimentos, sou eu quem preciso
colocar um pouco de juízo na cabeça dela!
Largo o copo na pia e já ia me retirar.

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— Jon está á caminho! Não vai me contar tudo o que ele disse!?
— Não, pai! Vou deixar você fora disso! Vá brincar de bonecas com
Lulu, deixa os assuntos de gente grande comigo!
— Não seja babaca, Tay!
— Esquece…
Me viro para ele e me aproximo.
—… Você tem razão, precisa parar, precisa cuidar da família! Deixa que
eu resolvo isso!
Falo sinceramente e me retiro.
Entro no quarto e encontro Ellen vendo TV. Toda coberta. Me deito ao
seu lado, e começo á beijá-la, mas ela parece estar em outro mundo. Me enfio
debaixo das cobertas com ela e começo á acarinhar sua intimidade enquanto
beijo seu pescoço.
— O que está fazendo?
Ela pergunta curiosa.
— Tentando fazer amor com minha mulher.
— Acabamos de fazer!
— Aquilo está longe de ser amor, foi uma foda! Quero mais, e quero
agora!
Eu digo e ela volta á olhar pra TV. Subo em cima dela e a faço olhar pra
mim.
— Qual é o problema? — pergunto.
— Só estou cansada.
Ela diz fechando os olhos enormes e eu fico cansado.
— Se quer me perguntar alguma coisa, pergunte agora e serei sincero e
direto!
Falo e ela fica com o medo estampado na face.
Ela me olha nos olhos, e depois de um tempo tem aquele famoso olhar de
amor pra mim.
— Não é nada!!! — ela diz e eu lhe dou um selinho fraco.
— Vou deixar você descansar, então!
Eu digo e me afasto para me levantar. Ellen ouviu todo o veneno que
Juliano tinha como carta nas mangas e agora começava a “cair a ficha” para
ela. Eu não ia dizer nada, mas propus á responder todas as suas dúvidas. Se
ela não queria falar, não era eu quem ia insistir.
— Não, fica…
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Ela segura meu braço e sorri fraco. Volto á me deitar ao seu lado e depois
de uns dez segundos ela volta á colocar minha mão por dentro de sua
calcinha.
— Minha princesa! Eu te amo tanto…
Eu digo enquanto usava dois dedos para fazê-la pirar, logo ela gemia me
olhando nos olhos e mordendo o lábio inferior.
— Tay…
Ela me chama enquanto geme e eu não paro de desenhar círculos rápidos
para que ela pudesse ver estrelas brilhantes.
— Diz meu amor!!!
— Prometa que nunca mais vai embora, nunca mais vai me deixar!
— Eu prometo! Nunca mais vou te deixar! Nunca mais!
Eu digo e fazemos amor até ela adormecer nos meus braços.
Beijo o alto de sua cabeça e me afasto. Olho meu telefone e já davam
nove da noite. Desço procurar meu pai e o encontro na cozinha com minha
mãe sentada ao seu colo e conversando. Eu chego e os dois param.
— Cadê ele?
— Me ligou dizendo que ia parar em um hotel. Amanhã cedo chegará na
serra!
— Droga! — resmungo e me sento na cadeira.
— Fica calmo! — meu pai diz e eu respiro fundo.
— Por que esse desespero em ver Jon? — minha mãe questiona e eu
encaro meu pai.
— Nada. Só quero resolver algo logo… vou me deitar!
Digo e subo pro quarto. Não prego o olho até ás seis, desço para a
cozinha e já encontro Isabelle.
— Bom dia, sogra!
Eu digo e ela finge ter achado ruim, fazendo cara feia. Dou um beijo em
seu rosto pela primeira vez e ela sorri pra mim.
— Tá bem, o que quer???
— Oras, foi só um beijo de ‘bom dia’. — resmungo e ela põe as mãos na
cintura.
— Quero sua filha pra mim, pra sempre! Quero a mão dela em
casamento!
Eu digo depois de um tempo e ela quase derruba um copo no chão.
— O quê???
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— Isso mesmo!
Eu digo e ela responde depois de se recompor: — Vai ter que falar com o
tio dela também… com minha mãe, com todo mundo!!!
— Farei uma reunião pra formalizar! Mas o que a senhora me diz?
— Bom, fazendo ela feliz… eu apoio!!!
— Ótimo!
Digo e ouço um carro chegar. É Jon.
— Bom dia, Jon!!!
Eu digo ao vê-lo sair do carro e ele sorri.
— Nossa, como estou velho!!!
Ele resmunga, me abraça socando minhas costas, e eu o acompanho até a
cozinha.
— Vamos tomar um café! Como foi de viagem? Isabelle, poderia bater na
porta do quarto do meu pai, por favor???
— Claro!!! Vou lá!
— Diz que Jon chegou!!!
Ela sai e nos servimos de café!
— Bom... viagem cansativa, mas tudo ok! Adoraria um café, nunca
recuso!
— Fique á vontade. Conseguiu uns dias de folga??? — pergunto.
— Não. Infelizmente, não! Mas uma autorização assinada por mim
mesmo de uns três dias, para curtir essa chácara maravilhosa, eu consegui! —
ele ri e ergue a xícara.
— Seu pai disse que dessa vez quem precisava de mim era você!? Em
quê posso ser útil?
— Falamos disso no escritório, tome um café e descanse!!!

— Bom dia, meu amigo!!!


Meu pai entra na cozinha minutos depois e Jon se levanta. Ele estende a
mão para meu pai, mas meu pai o abraça.
— Senhor, Bom dia!
— Sem essa, Jon! “Á vontade” enquanto estiver aqui! Nada de ‘senhor’,
nada de postura ereta! Vai, fica encurvado, amigo! — meu pai ri e os dois se
abraçam de novo.

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— Que isso, amigo... impossível encurvar essa postura magnífica aqui!


Como vão todos!?
— Vamos muito bem! E a família?
— Bem, também! Graças á Deus!
— Maravilha!!!
Ficamos conversando a manhã inteira. Jon era completamente fiel ao meu
pai. Discreto, falava baixo, era educado e muito gentil. E o melhor, não olhou
meio desnorteado para Ellen, como todos os homens que se aproxima fazem,
e já caiu na minha graça por causa disso!
— Como consegue todas as informações que meu pai precisa, Jon?
Sempre achei isso incrível… — eu falo e ele ri.
— Saber é meu trabalho! Estou na administração da FAB há muitos anos,
e tenho também muitos contatos… trabalho com computador então tenho o
mundo nas mãos! — ele diz.
— E é um hacker. — meu pai resmunga e Jon faz uma cara de paisagem.
— Ual, você é um legítimo nerd!? Só não usa óculos. — brinco e todos
riem!
— Uso lentes, Tay!
— Putz, quase… — resmungo e meu pai me encara rindo.
— Podemos conversar!?
Falo mais tarde na sala e ele logo se levanta. Ele me acompanha até o
escritório e eu fecho a porta ao entrar.
— Bom, Jon… primeiramente gostaria de pedir que essa conversa fique
somente entre a gente! — eu falo e seu ar simpático desaparece.
— Impossível! Se seu pai me perguntar, vou ter que falar!
— Quero deixar meu pai fora disso! E na verdade, muito provavelmente
ele não irá fazer pergunta nenhuma! — eu falo e ele concorda.
— Sente-se, por favor, fique á vontade.
Eu falo e me sento na cadeira estilo ‘trono’ que é de meu avô.
— Bom o que vou te pedir, é simples…
Começo á falar, mas um grito desolador chama nossa atenção. Era Ellen,
era ela gritando! Me desesperei e Jon que também havia ficado assustado,
correu comigo. Chegando do lado de fora já estavam todos os nossos
familiares formando uma roda ao redor dela. Ellen estava de joelhos no chão,
gritando com toda a sua força, com toda a sua alma e corri para tirar todos da
frente e me aproximar. Ela havia recebido uma enorme caixa e dentro
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continha a cabeça de Lodov. Alguém tinha tirado ele da baia, e devolvido só


a cabeça. Me ajoelhei ao seu lado sentindo toda a sua dor e a abraçei. Ellen
gritava á plenos pulmões, se balançava escorada na grande caixa e suas
lágrimas caíam na cabeça ensanguentada de Lodov. Eu não podia pedir para
ela se acalmar, nem para ela parar de chorar, ou dizer que tudo ia ficar bem,
porque eu sabia que nada daquilo era verdade, nada daquilo seria possível.
— Lodov… Mataram ele! Arrancaram a cabeça dele!!!
Ela resmunga enquanto chora, um choro de cortar o coração, e eu sabia,
pelo estado em que ela estava, que nunca mais Ellen superaria aquilo!

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14
MATE-O

Eu não ouvia mais nada, não sentia o abraço apertado que Tay me dava,
eu não era mais a mesma pessoa. Eu havia me transformado em caos e uma
dor indescritível, parece que não haviam somente matado meu presente, meu
novo amigo, mas também arrancaram meu coração de dentro do meu corpo
com extrema violência e crueldade. Era melhor que tivessem me matado,
seria mais leve, mais aceitável, mais fácil. Chorar e gritar não estavam
aliviando. Eu olhava para o céu e questionava Deus, do porquê aquilo havia
acontecido comigo, o que eu tinha feito para merecer, por que comigo???
Por que um animal que nada tinha a ver com isso? Um animal tão puro
que nunca fez ou faria mal algum nem para a própria espécie… eu estava
desolada.
Meus joelhos tocavam o gramado úmido por causa do frio, eu estava com
pouco agasalho porque saí despreparada para receber uma caixa direcionada á
mim, achando que era mais uma surpresa de Tay, mas nem o frio e nem a
irritação no joelho me incomodavam. Eu queria me unhar, me cortar, queria
que alguém que me espancasse, para ver se aquela dor ultrapassaria a dor que
sentia na alma, mas muito provavelmente isso não ia acontecer.
— Vamos entrar, amor… vem!
Tay sussurra no meu ouvido e na mesma hora meu choro cessa. Eu não
queria entrar, não queria viver o luto, não queria ouvir que aquilo ia passar…
não. Eu queria Juliano morto. Sim, eu sei que foi ele, ontem ele disse que
nesse mesmo horário estaria me esperando na casa dele e que se eu não
aparecesse, eu ia me arrepender. A proposta era tão absurda que me esqueci,
que nem levei á sério, e aqui estava Lodov, que havia pagado por minha
negligência, morreu por culpa minha.
Seco minhas lágrimas, me recomponho, e ignoro os pedidos frequentes de
Tay, para sair dali. Juliano não tinha conseguido me desestabilizar ou
machucar, Juliano apenas tirou o melhor de mim, tirou o meu coração e
cometeu um grande erro, o maior deles: ele me deixou viva para contar a
história.
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Me levanto, passo por todo mundo, vou até a cozinha, pego uma toalha de
mesa que devia estar na família Coverick há mais ou menos uns cem anos, e
volto. Tiro a cabeça de Lodov da caixa, e vou até a cabana. Sinto Tay me
seguir, mas não falo nada. Entro, pego uma das enxadas de meu tio e volto
para fora. Começo a cavar um buraco do tamanho que era preciso e Tay não
faz e não fala nada, ele só me olha, mas não devolvo seu olhar preocupado,
eu não tinha tempo para aquilo. Cada vez que o buraco aumentava, a cada
força que eu fazia, podia sentir o suor começando á se fazer presente em
minha testa e aquilo sim, era um bálsamo. O trabalho para mim, sempre foi
um bálsamo. Eu forçava a coluna, os ombros, e parecia que o peso de Lodov,
que era o peso que eu carregava nas costas, ia diminuindo. Por isso sua cova
ficou grande demais, passei do ponto e não me importei, coloquei com
cuidado a cabeça de meu amigo dentro do buraco enorme, envolto na toalha
de linho, e lágrimas invadiram meus olhos me deixando ver toda aquela cena
lamentável de forma borrada. Ao parar para respirar e tomar fôlego, chorei
ainda mais porque a dor havia voltado, era a perda. E eu não sabia, mas a
perda não era algo fácil de se livrar, deveria ter aprendido e prestado atenção
nesse fato, quando Tay voltou de Manaus.
Eu ia conseguir o resto de seu corpo para enterrar com dignidade ou não
me chamava Ellen Maia. Eu não sabia como, mas ia conseguir.
Terminei meu trabalho, limpei tudo, guardei a enxada, e quando subi, alguém
já tinha se livrado da caixa ensanguentada de Lodov e agradeci por isso.
Tay sai do meu pé ao se juntar ao pequeno grupo do lado de fora do
casarão que consistia em Hella, Max, Jon, Marina e Rafael. Eu sabia que ele
chamaria Jon para conversar, sabia que Jon viera até aqui, só para ajudar Tay
á se livrar de Juliano, então não perdi tempo, corri na frente, entrei no
escritório, engatinhei para baixo da enorme mesa de carvalho antiga e fiquei
lá. Eu precisava fazer alguma coisa, não podia ficar parada, não depois do
que Juliano fez, então o primeiro passo era saber o que Tay sabia, o que ele
escondia e o que pretendia. Me baseando nisso, eu ia agir por mim mesma ou
ajudá-lo á encontrar uma solução melhor. Me encolhi embaixo da mesa e
esperei.
— Viu o porquê te chamei aqui… desde que estive com ele soube de cara
que ele era diferente, era dos piores… em Manaus eu matava quem merecia e
ele merece!!!
Tay entra no escritório e eu me encolho ainda mais. Era clara sua
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decepção, sua tristeza, sua revolta, e sua sede de sangue, só de ouvir a sua
voz.
— Não entendo como alguém tem coragem de fazer isso com um bicho
inocente… um cavalo que não tinha nada a ver com a história. Ele é
maluco??? — Jon resmunga.
— Jon, é isso, ele é maluco. Tudo o que quero é apagá-lo, sem deixar
rastros, mas não quero fazer isso com Ellen em minha vida, não sabendo que
sua reação ao descobrir, seria me abandonar e sei que ela vai! Juliano contou
pra ela sobre minha vida em Manaus e ela está naquela fase entre suspeita e
negação, não acredita que eu seria capaz de machucar alguém e tudo o que eu
queria era machucar esse filho da puta com minhas próprias mãos!!!
— Tay, vivo esse cara só vai atrapalhar a sua vida. Sei do que estou
falando, passei por situações como essa, com seu pai, durante anos! Mas,
pelo o que seu pai me disse, pelo o que você acabou de me falar á respeito do
que Maia pensa… é melhor não arriscar! Mas de qualquer forma, em
contrapartida, não vejo nada que possamos fazer que vá ajudar de alguma
forma, não mantendo ele vivo!!! — Jon diz baixo.
— Eu tenho uma ideia e acho que vai funcionar… — Tay começa e
alguém bate na porta. — Entra!
Ele fala e o vejo caminhar até a mesa e se sentar na cadeira. Se eu não
encolho os pés á tempo, ele me descobre ali!
— Tay… me mandou ficar de olho nela, mas não á encontro em nenhum
lugar da casa, filho!!!
É tia Hella quem fala da porta e Tay demora para responder.
— Ela deve estar na baia de Lodov…
Ele diz depois de um tempo, e o ouço respirar fundo. Tia Hella diz que
vai verificar e sai.
— Bom, o que eu ia dizer… acho que uma boa forma de anular essa força
que ele tem é ameaçá-lo! Recolher as provas de todos os seus crimes e ficar
pronto para enviar para a polícia federal…
— Mas um cara como ele faz todo o trabalho direito, não deixa sujeira á
vista, é muito difícil rastrear seus podres.
Jon diz desanimado.
— Mas eu sei que você consegue e é por isso que está aqui, vai trabalhar
nisso e vai encontrar. Além do mais ele esconde uma filha pequena, vou até
Belo Horizonte, entrarei na casa dele, ganharei a confiança de sua ex-mulher,
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e farei fotos, vou destruir esse cara e o farei desaparecer.


— Vai usar uma criança para amedrontá-lo? Nem seu pai faria isso… —
Jon parece estar assustado com a atitude de Tay.
— É isso, ou matá-lo, Jon. Ele não vai desistir de machucar Ellen até
conseguir tê-la para si, então farei tudo o que eu puder. Eu nunca machucaria
uma criança, mas não tenho outra ideia melhor do que essa! Os dois pontos
fracos dele é Ellen, e Sofia, sua filha… e entre as duas, nunca usaria Ellen
para atingí-lo, e é por isso que ele está revoltado, porque ela me escolheu, de
qualquer forma, sua presença aqui já está deixando ele pirado… só me resta
sua filha!!!
— Bom, tudo bem, pode dar certo! Vou começar á caçar seus crimes,
meu notebook está no carro.
— Eu vou ligar para uma pessoa que pode te ajudar muito nisso!!! Depois
nos falamos.
Tay enfim diz, se levanta acredito eu, para sair com Jon, mas chegando na
porta ele se despede dele e diz que logo, logo os dois conversariam, que ele
iria fazer a tal ligação naquele momento, que o quanto antes seria melhor…
Dessa maneira ele fecha a porta e diz: — Pode sair agora, Ellen!
Ele fala alto e eu lamento. Saio de baixo da mesa e olho em seus olhos
esperando a bronca.
— Quando for fazer esse tipo de coisa, lembre-se de retirar o perfume!
Assim que entrei na sala já pude sentir, dessa forma será pega!
Ele diz me olhando nos olhos e caminho devagar até que minhas mãos
possam tocar seu peito, e suas mãos carinhosas possam afagar minha face
úmida.
— Sobre o que você ouviu…
Tay começa á falar, mas coloco à palma de minha mão em sua boca. Tay
era um assassino, eu já tinha confirmado aquilo assim que entrei no estábulo,
mas eu não tinha tempo para ficar revoltada.
— Eu sei, e não me importo. Não me importo quem foi ou o que fez no
passado… poderia te dizer agora que o que importa pra mim, é quem você é
agora, mas novamente digo que não me importo, Tay! Tia Hella e Ana Luiza
conseguiram fazer seu pai mudar, melhorar e você não vai mais embora, você
vai ficar aqui comigo pra sempre, então terei tempo de fazer você melhorar
também, eu sei que terei. Mas de qualquer forma, por hoje, preciso do Tay
que apaga quem merece! Quero Juliano morto pelo que fez com Lodov,
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porque eu sei que Lodov não será o último! Juliano não vai parar enquanto eu
não ir embora e deixar você e eu nunca farei isso, então não quero ver minha
mãe, meu tio, ou você, em uma caixa. Mantenha seu plano com Jonatas,
conte o necessário e faça parecer que só o mandou para bem longe da cidade
pelas ameaças com as provas de todo o crime que ele cometeu. Mas mate-o.
Tire aquele monstro da minha vida, da nossa vida, pra sempre! Faça ele pagar
por ter matado o melhor presente que você me deu e impeça-o de destruir as
nossas vidas, ou eu mesma farei isso!
Eu digo com minhas mãos ainda em seu peito e me retiro do escritório
com a certeza de que Tay faria o que eu ordenei, porque eu sei que ele fará
qualquer coisa para me ver feliz.

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15
DESCUIDADA

.
— Não estamos mais em Manaus.
Pedro resmunga nervoso, e Laura ri como uma bruxa.
— Tá com medinho, mané!?
Ela zomba e Pedro cruza os braços.
— Não tenho medo de nada! Mas não estamos mais na nossa área.
Larissa me contou cada fita escabrosa do cara que vocês não têm ideia…
duvido que a gente consiga chegar perto dele, aquele sítio é uma fortaleza!
— Já pensei em tudo.
Digo e os dois param de discutir imediatamente.
— O quê??? Vai por um decote generoso na garota-veneno, e furar o
pneu dela para seduzir o “MIB, Homens de preto”???
Ele questiona e os dois me olham com curiosidade.
— Não. Farei melhor do que isso. Vou ligar e marcar uma visita!
Eu falo e os dois riem nervosos.
— Aí sim nossas chances serão menores que zero. Você vai acabar nos
matando! Ele vai reforçar a segurança, vamos ficar encurralados! O cara vai
fazer picadinho da gente e colocar nós três em uma caixa de sapatos!
Pedro resmunga e começo perder a paciência. Tantos anos fazendo a
mesma coisa e não se sente seguro, só porque não está mais em Manaus? Mas
que porra era aquela???
— Vai, Laura, fala que não concorda!? Ir até lá sem um bom plano é
suicídio ou não é, porra!!! — Ele fala olhando para ela e ela revira os olhos.
— A loira-falsa contaminou você hein, brother!!! Acabou com essa sua
cabecinha fraca! Relaxa, Pedro, vai dar tudo certo! — Laura exclama
impaciente. — Não vamos ser pegos, nunca fomos!!! Por que seríamos
agora? Não confia em você? Não confia no trio?
Laura questiona e Pedro ri irônico.
— Sabe o que é mais engraçado, não entendo o porquê quer fazer isso…
sabe que vamos nos arriscar por causa da “mãe natureza”, não por ele, não
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por nós dois, não pelo trio, — Pedro fala gesticulando indignado. — mas pela
mulher que tomou ele de você!!!
— Ele nunca foi meu, Pedro, ela não poderia tomar algo que nunca me
pertenceu. Prometemos cuidar um do outro para sempre, desde pirralhos
fizemos esse juramento. Eu entendo que para vocês dois, o trio não significa
mais nada desde que chegamos aqui, mas pra mim é tudo o que tenho! E
outra, não é só Ellen que esta na reta, é toda a família…
Pedro fica mexido com sua resposta assim como eu, mas ainda sim
responde rabugento.
— A família que te expulsou daqui…
— PORQUE EU MERECI, PEDRO!!! — Laura se exalta.
— Então quer se redimir…
— Talvez. Talvez eu queira mostrar para os dois que não fiz aquilo por
maldade, nunca quis prejudicar os dois, nunca quis matar meu melhor amigo,
e não sou um monstro que todos pensam que eu sou, muito menos ladra de
namorados… ou, pode ser que eu apenas queira me livrar dessa mesmice que
está minha vida, enquanto esse maldito curso não começa logo!
Ela diz e me olha nos olhos. Pela primeira vez sustento seu olhar depois
do que ela fez.
— Está disposta á morrer pelos dois???
Pedro questiona e Laura responde ainda olhando nos meus olhos.
— Estou.
Ela fala e Pedro me olha indignado fazendo ‘não creio que ouvi isso’ com
a cabeça.
— Tá dentro ou não?
Pergunto para acabar com o circo e ele começa á andar com as mãos na
cintura.
— Tenho escolha!?
— Tem, você pode dizer não!
— Aham. Tá!!!
Ele diz irônico e continua andando, tentando furar o chão do galpão.
— Mas quero fazer a carta… vou fazer a carta. Quero uma com cada um
de vocês, e uma com sua mãe... sua mãe não, Ana Luiza, ela é mais esperta
que a ‘senhora sua mãe’!!!
— Não vai precisar, Pedro! Ficaremos bem!
Laura tenta acalmá-lo, mas não funciona. Nuca vi Pedro tão tenso.
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— Por que você está tão nervoso? Acabamos com dois terços do
narcotráfico de Manaus, com caras barra-pesada, e sem plano nenhum… e
isso não o fez surtar! Já disse que pretendo não usar uma única bala, vamos
levar a grana, os seguranças já são nossos, faremos ele transferir o pagamento
que gastei com Lodov, e o colocamos no primeiro avião para qualquer lugar,
apenas isso! O que tem de diferente agora? — eu questiono curioso e ele
respira fundo.
— Eu e Larissa estamos juntos, tá legal!? Pronto, falei, me julguem! Se
ela souber disso, souber do que fiz, do que faço, não vai mais me querer, não
vai mais ficar comigo.
— Sabia… — Laura resmunga.
— Ah, não vem com crise agora não!!! Comigo você já teve sua vez, já
tirou uma casquinha desse corpinho maravilhoso, não me venha com crise!!!
— É por isso que eu não estou te reconhecendo! Era sempre o mais
empolgado com a matança, agora parece um franguinho!
Laura diz o apelido “proibido” de Pedro e ele surta, se adianta desejando
loucamente apertar o pescoço da amiga e quando eu acho que vou precisar
separar uma briga, Pedro dá pequenos passos para trás e posso ver o porquê.
Laura tinha uma semi-automática cromada no peito do amigo.
— Se afasta de mim, franguinho!
Ela resmunga com raiva e ele demonstra querer matá-la. Pedro podia
muito bem desarmá-la, mas opta por não fazer nada.
— Acho melhor você ficar! Não está bem para nos acompanhar. Pelo
menos fico mais tranquilo com você aqui.
Eu digo e me adianto com Laura para levantar a caixa que meu pai
escondia com armas e artefatos militares.
— Agora sou dispensado. Essa é boa!!! Eu vou, já disse que vou!
— Fique aqui! Fique disponível para ajudar em qualquer coisa que der
errado e proteja Ellen e minha família!
Eu falo e ele sabe que é minha decisão final. Ele sai e bate a enorme porta
de ferro enferrujado do galpão, resmungando alguma coisa.
— Sobre ser leal á mim para me provar que se importa, que nunca quis
me machucar… é verdade???
Pergunto colocando silenciadores nas armas que usaríamos e ela responde
na mesma hora.
— Sim.
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— Então quero te pedir que faça uma coisa por mim. Muito
provavelmente eu só consiga com sua ajuda!
Falo o que preciso e ela concorda sem pestanejar.
— Certeza?
— Certeza. Posso fazer isso!
Ela diz e me sinto tranquilo. No momento então, faltava 50% do plano:
apenas executar.
Ia dar 18:00hrs. Entro no quarto e encontro Ellen conversando com
Larissa. Eu falo um ‘oi’, me sento ao lado dela na cama, e logo Larissa sai,
deixando nós dois á sós.
— Está tudo pronto?
Ela pergunta e eu á abraço. Ellen estava “louca para que Juliano perdesse,
essa noite”, mas eu tinha uma faca de dois gumes ali. Eu podia fazer o que
ela queria, e depois que sua tristeza e seu luto passassem, ela se sentiria
culpada e ia ter que conviver com aquilo para o resto da vida. Mas em
contrapartida, se eu não fizesse e ela descobrisse, seria um grande problema
para mim, pior, se eu o deixar fugir e ele voltar e aprontar algo, eu me
culparia pelo resto da vida. Ellen estava fora de si, triste pela perda de Lodov,
chateada, então não estava pensando direito. Eu estava em uma sinuca de
bico das grandes.
— Tudo em ordem. — eu digo apenas.
Ela se vira pra mim, e senta no meu colo, tocando sua intimidade na
minha. Sua face estava séria demais e seus olhos fundos, de tanto chorar.
— Eu te amo. Preciso que faça o que eu pedi. Por nós dois, por nossa
família!
— Sabe que só quer isso, porque está triste… não está pensando direito!
Eu digo e ela que tinha acabado de enfiar a mão dentro de minha cueca,
agora me olhava com sangue nos olhos.
— Eu estou pensando direito, não vou me arrepender, não vou pensar
melhor, não estou agindo pela tristeza, tô pensando em nossa felicidade!!!
Quero ficar com você sem ter medo, sem me preocupar, sem achar que a
qualquer momento alguém vai tirar você de mim. Eu te amo, sou sua vida, e
no momento sou sua prioridade. Aquele maluco matou meu cavalo! Meu
cavalo!!! Arrancou a cabeça do animal mais puro que existe... primeiro eu,
Tay, tem que me proteger, tem que me manter longe daquele psicopata, e eu
o quero morto! Prometa-me!!!
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Ela resmunga baixo, chorando de novo, e eu afirmo com a cabeça.


— Prometo, vou fazer isso!
Eu digo e ela respira aliviada. Me beija um beijo quente e erótico demais
e tira meu músculo duro para fora da calça. Como ela conseguia pensar nisso
agora???
— Quando você vai?
Ela questiona empurrando sua calcinha pro lado e senta em mim. Mal
consigo responder…
— Daqui á pouco. Só vim me... me despedir!
Eu falo com dificuldade e ela me olha nos olhos enquanto rebola.
— Então temos pouco tempo! Preciso de amor, agora…
Ela pede e eu dou.
Ellen rebola enquanto geme e eu deito seu corpo na cama para estocá-la
como queria. Eu tinha sede, uma vontade indescritível de amá-la, mas de
repente tudo aquilo pareceu uma despedida real e fiquei incomodado com
aquilo.
— O que foi, vida!? Por que parou? Não para não, vem aqui…
Ela se mexe incomodada embaixo de mim e puxa meu pescoço me
mandando continuar.
— Vou te encontrar aqui quando eu voltar, não é!? Ficará em casa. Vai
me esperar aqui…— eu falo e saio de dentro dela.
— Claro que ficarei aqui, vou esperar por você!
— Não esta preocupada com a chance d'eu não voltar?
— Claro que não, sei que vai voltar pra mim…
Ela diz chorosa e seus olhos brilham.
— Então por que quer fazer amor agora?
— Porque tô com vontade, porque amo você, estou aflita, nervosa, e você
me faz bem!!!
Ela diz me olhando nos olhos e alguma coisa diz que aquilo não é tudo.
— Ficaremos juntos quando eu voltar!
Começo á recolocar minha roupa e ela pula no meu colo novamente.
— Quero agora… por favor, Tay, por favor!!!
Ela me abraça forte e me agarra de um jeito que não consigo afastá-la. Ela
sempre fazia isso.
— Menina…
Resmungo “irritado” e dou o que ela pede. Fodo com força porque é
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assim que eu gosto. Ela não reclama em nenhum momento, quanto mais
rápido eu a estocava, mais empurrava o quadril contra o meu. Ellen me
deixava maluco, sua depilação era total, não arranhava meu abdômen, só
deixava as estocadas e o esfrega-esfrega que gosto de fazer, ainda mais
delicioso. Era eu, e sua entrada molhada, macia, e apertada demais, sem nada
para atrapalhar. Divido meu tempo em estocadas e chupões e perco o rumo
de tudo, consegui esquecer tudo. Enquanto á chupava e sentia seu gosto
misturado ao meu, eu me perguntava de que jeito eu ia conseguir sair de casa
hoje… depois que gozou na minha boca sem me avisar — como
normalmente fazia —, a fiz ficar de quatro e olhei para a paisagem, desejei ir
além, mas fui no modo clássico, tudo o que mais queria é que ela me desse
um filho, e acho que ela já notou isso! Entro dentro dela com força e a filha
da puta começa á gritar, quem passasse no corredor poderia ouvir a putaria,
então dessa vez dou-lhe um castigo, bato em sua bunda até ficar um rosa
clarinho e tapo sua boca com mão!
— Não ouse gritar, eu nem tranquei a porta!
Rosno e tiro a mão de sua boca. Ela fica em silêncio só por um momento,
mas depois volta á gritar e gemer como uma cadela! Sorrio ouvindo aquilo e
meto mais forte. Eu era o cara mais sortudo do mundo por ter aquela mulher
deliciosa na minha vida.
Uma hora depois Laura joga uma pedra na janela. Vou até lá com Ellen
do meu lado por causa da curiosidade e do susto, e Laura aponta para o
relógio em seu pulso.
— Preciso ir…
Digo ainda olhando pra janela e Ellen me abraça ali mesmo.
— Vai lá!
Ela diz, me abraça, me beija demorado e anda em direção ao banheiro.
— Por que não dorme um pouco? Descansa.
Eu digo e ela me olha com um semblante misterioso.
— Farei isso, só vou tomar um banho.
— Sou seu homem! Deixa tudo aí que é para os machos passarem longe!
Vão sentir o cheiro e não chegarão perto!
Digo dando risada e ele se enrosca em mim de novo.
— Você colocou tudo dentro de mim e agora está escorrendo pelas
minhas pernas…
Ela sorri pela primeira vez desde a morte de Lodov, e eu me sinto feliz
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em vê-la daquele jeito.


— Tem que ficar aí dentro pelo máximo de tempo… se eu não estivesse
em cima da hora, faria você plantar bananeira!!!
Eu falo e a faço gargalhar.
— Você não sabe nada sobre espermatozóides. Vai logo e volta pra mim!
Ela diz rindo e me beija, apertando seu quadril no meu.
— Eu te amo!
— Eu também te amo!!!
Ela fala olhando nos meus olhos e corre para o banheiro.
Me arrumo, desço, e passo por todos na sala, indo direto pra cozinha para
usar a saída de lá. Do lado de fora, vejo Jon conversando com Laura perto do
carro e me aproximo.
— Bom, está tudo aqui. Fiz cópias em quase dez provedores, e enviei
para pessoas de minha confiança, nada do que ele possa fazer vai impedir
esses documentos de chegar até a PF!
Jon diz e me entrega um envelope.
— Obrigado, Jon.
— Não me agradeça ainda! Tem mais, pelo o que vi dos relatórios, ele é
ótimo em cometer crimes sem explicações, use isso e poderei ouvir tudo o
que se passa lá dentro, só eu vou ouvir, serei discreto. É só para eu saber, se
algo der errado, poderei ajudar vocês de alguma forma!
Jon diz, me entrega dois pontos, um para mim e outro para Laura e vejo
Larissa e Pedro se aproximando de mãos dadas.
— Veio desejar boa sorte, cagão!?
Laura pergunta rindo e Pedro se solta de Larissa para dar um abraço nela.
— Vim, sim. Tome cuidado lá, sua metida á besta! Se você morrer apenas
saiba: vou superar com facilidade!!!
Eles se abraçam apertado e Larissa diz olhando nos meus olhos: — Boa
sorte ao falar com ele, não sei Laura, mas você vai precisar…
Ela diz, eu sorrio pra ela e confirmo com a cabeça. Tolinha. Quem vai
precisar de sorte é ele.
Todos se despedem. Pedro bate em meu ombro, pede perdão com o olhar
e eu digo que ‘está tudo bem’. Antes de entrar no carro vejo Ellen já vestida
na janela olhando para mim, logo sinto aquele mau-presságio de mais cedo,
entro no carro e saio dali com o coração apertado.
— Você está bem? — Laura pergunta; — Tô.
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Falo e volto minha atenção para a estrada. Paro na porteira do maldito


sítio e ligo para o telefone do maldito dono.
Ele atende no primeiro toque.
— Alô.
— Como vai assassino de animais…!?
— Ah! Oi, Coverick, assassino justiceiro! Eu vou bem e você, como
vai???
— Vim conversar com você pessoalmente. Pode me atender?
— Claro, já está aqui!?
— Já.
— Ótimo, vou liberar sua entrada.
Ele diz e desliga. Parecia confiante. Vejo um dos capangas atender o
rádio e logo libera a nossa entrada.
— Vamos deixar o carro aqui…
Resmungo e Laura concorda. Uma das coisas que sempre achei bom nela:
ela nunca discordava de mim.
— Se algo acontecer…
Começo a dizer, mas ela continua.
— Apagar e correr. Um procura o outro, só sairei de lá de dentro com
você!
Ela continua o nosso lema padrão de forma errada e sai do carro. Vejo se
a pequena faca continuava segura dentro da bota de cano curto e ela estava.
Eu tinha duas armas no cós da calça, uma nas costas e outra na frente. Mas
sabia que ele não ia me deixar permanecer lá dentro, sem me revistar, então
seria só eu, a faca, e ele. Laura vestia as botas que começou a usar desde
quando chegou nessa cidade fria; usava as botas até acima do joelho, uma
blusa grossa até o meio das coxas e eu não imaginava como ela ia estar
pronta para uma possível luta com tudo aquilo de roupa. Eu sabia que ela era
capaz, mas que era estranho, era.
Caminhamos até a frente do casarão e um dos capangas nos recebe.
— Senhor Juliano está na sala de estar! Ele espera por vocês.
O cara fala e Laura me olha desconfiada. A noite estava extremamente
silenciosa. Eu podia sentir o cheiro da morte, de dama-da-noite, e sangue.
— Ora, ora… o que te trás aqui, tenente? Trouxe até uma guarda-
costas!!!
Juliano vai direto ao ponto. Eu me adianto para me aproximar e Laura
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permanece perto da entrada, eu sabia que ela estava atenta á tudo ao nosso
redor.
— Vim conversar á respeito de minha mulher, e fazer o que você faz de
melhor por aí, cobrança!!!
— Te devo alguma coisa e não tô sabendo…!?
— O cavalo frísio que dei de presente á Ellen, morto de forma cruel e
sem necessidade nenhuma, por você… você não á amedrontou, só fez com
que ela te odiasse mais do que já odiava. Quero o valor que paguei nele, com
juros para começar, e quero você fora de Minas Gerais ainda hoje!
Eu digo e ele começa á rir.
— Acho que virou rotina virem até aqui para me acusar! Vocês dois,
estão sendo enganados!!! Eu crio cavalos, amo os animais, mato velhos,
mulheres e homens que me devem, ou que se colocam no meu caminho,
nada, além disso… e além do mais, você não pode entrar na minha casa para
me acusar e me expulsar da minha cidade, ainda não nasceu homem capaz
disso e você não passa de um moleque chorão!!! Nunca deixaria Ellen em
suas mãos, ela ainda será minha e não preciso matar seus animais para isso
acontecer! Ela virá até mim por livre e espontânea vontade e é assim que vou
te ferir! Ela vai saber quem é você!
Ele diz olhando nos meus olhos como se falasse do tempo. Estava sentado
no sofá com sua roupa de Cowboy e pose superior. Bebia um whisky e me
olhava com humor.
— Ela nunca virá até você! Esquece isso! Aceite de uma vez por todas
que Ellen nunca amou você e nunca vai amar, e ela já sabe de tudo! Ellen já
sabe da minha vida em Manaus porque eu contei, a primeira coisa que fez foi
dizer que não se importava. Nem me deixou terminar a confissão. Agora
vamos ao que interessa…
Eu digo e posso ver o ódio da surpresa em seu olhar.
— Vamos conversar sobre esse envelope… aqui dentro tem as provas dos
milhares de crimes que você cometeu, diversas cópias espalhadas e prontas
para serem enviadas para a policia federal. Vamos resolver isso, vamos falar
da transferência bancária, vamos falar sobre o país para o qual você irá se
mudar para sempre, e sobre a paz que dará para mim, para minha mulher e
minha família. Senão, além de todos esses documentos, falaremos de um
funcionário meu que nesse mesmo momento está no edifício Londres no
centro de BH, preparado para entregar uma pizza por engano e um brinde
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infantil para a nossa pequena Sofia!!! No envelope tem umas fotos nossas
para te provar que eu estive com elas pessoalmente.
Eu falo e entrego os documentos, por um breve momento, vejo um
semblante de pânico ao citar Sofia, mas do nada, ele abre um sorriso maior
que o do Coringa dos quadrinhos, chama o tal do Nonato pelo rádio, e fica
em silêncio sorrindo para mim, até ele chegar.
— Senhor… !?
Nonato me olha assustado, mas disfarça.
— Nonato, pode por gentileza, revistar meu convidado de honra?
Ele ordena e o capanga entrega apenas a arma da frente, ignorando a das
costas. Que bom, pelo jeito eu tinha um aliado ali dentro…
— Agora o da senhorita Laura, por favor!
Ele diz enquanto checa ‘meio por cima’ os documentos e as fotos, e
Nonato repete o procedimento e retira dela duas armas e duas facas que
escondia em um cinto, colocado por baixo do casaco, nas costelas, e entrega
para o verme.
— Acho interessante o mais interessado nessa conversa vir com uma
arma só! Pouca proteção para quem entrou em minha casa para me
ameaçar… — ele diz e sorri pra mim.
— Só precisava de uma para apagar você, caso não concordasse com a
minha proposta! Mas também posso fazer isso com as minhas próprias mãos!
— OU... com a outra que carrega nas costas e que Nonato deixou passar,
o meu mais antigo funcionário, o que eu achava ser o mais fiel, o melhor de
todos, o que eu mandei pessoalmente até a sua chácara e que foi pego por
você, interrogado, e até quase torturado e morto se não fosse pelo ‘coração
mole’ da minha morena linda.
Juliano diz ainda sentado e parecendo despreocupado, com a arma
cromada de Laura nas mãos. Ouví-lo chamando Ellen de “minha morena
linda”, quase me faz mudar de ideia e furar a sua testa naquela mesma hora,
mas me seguro!
— Sabe que apaguei os rastros de minha filha e minha ex-mulher de tudo
quanto é lugar!? Ninguém poderia saber delas… ninguém as acharia nem nos
sistemas da inteligência brasileira, afinal, mudaram de nome, de registros,
tudo…
Ele diz sem parar e Nonato começa á tremer.
— Sabe como eu cobro traição, não é, seu José!?
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Ele questiona o capanga e Nonato é rápido, ele olha pra mim e diz
rapidamente enquanto Juliano engatilha e aponta a arma pra ele.
— Cuide deles, por favor. Diga o quanto eu os amava.
Ele diz e fecha os olhos, mas Laura, como sempre, é mais rápida ainda.
Tira o famoso grampo do cabelo e acerta seu pulso fazendo ele se assustar á
ponto de deixar a arma cair no chão. O grampo é fino demais, mas nos dá
tempo, e o ferimento não é tão profundo, mas o distraiu como queríamos.
— Ninguém vai morrer aqui, á não ser você!!!
Laura diz e corre na direção de Juliano pegando a arma e o fazendo
refém.
— Vai pra casa. Nonato! — eu digo e ele sai correndo. — Vamos falar
sobre nosso acordo ou não? Não tenho a noite toda!
Eu encaro o caipira e ele sorri novamente.
— Só se for bebendo um café fresquinho, ninguém sai do meu sítio sem
tomar um bom café, não queira correr o risco de virar meu inimigo!!! Vamos
tratar de negócios sem provocar um banho de sangue na minha propriedade,
não é preciso nada disso aqui, não é mesmo!?
Ele diz e chega a minha vez de sorrir pra ele.
— É a mais pura verdade. Por que não!? Adoraria um café!
Ele sorri ironicamente e se retira da sala com Laura em sua cola.
Me sento no sofá e respiro fundo, eu sabia que aquilo era um plano para
armar alguma coisa, só que me pegar de surpresa ele não ia.
Assim que ele chega trazendo uma bandeja consigo, e Laura logo atrás
apontando a arma para a sua cabeça, os dois homens de preto que estavam lá
fora, entram na sala, deixando Laura “sem saída” aos olhos do verme.
— Gostaria que vocês levassem a senhorita Laura, com segurança e toda
a cordialidade que eu ensinei á vocês, até o carro deles que está estacionado
lá fora! Terei uma conversa em particular com seu amigo, e logo os dois
partirão.
Ele diz e os dois caras se aproximam de Laura.
— Se tocar em mim, vai ficar sem o piu-piu…
Ela diz e todos se retiram.
Juliano coloca o café nas duas xícaras e bebe da sua imediatamente.
— Olha, você pode tomar! Veneno é coisa pra mulherzinha! Sua amiga
Laura que o diga…
— Mas ela é muito boa para matar de outras formas também!
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Eu digo e ele ri.


— Não duvido. Como você disse: vamos ao que interessa!!! Me garanta
que seu capacho permaneça longe do edifício de minha filha, saia do meu
caminho e desapareça da vida de Ellen e eu não vou matar a sua amiga, neste
momento. Nem sua amiga, e nem seus familiares que estão sendo vigiados de
perto por homens meus!
Ele diz calmamente, eu tiro o ponto do meu ouvido, jogo no chão e piso
nele. O que aconteceria dali em diante, Jon não precisava ouvir.
— Não me importo com ela, você pode tentar matá-la agora mesmo… e
na minha casa tem três militares, os melhores que conheço. Você também
pode tentar, se quiser.
Eu digo e ele trava, mas disfarça bem.
— Caramba, bem que me disseram que você é pior do que seu pai!
— Você ainda não viu nada!
— Tem certeza???
— Já demorou!
Eu respondo, ele pega o rádio e diz ‘apaga’ após apertar o botão. Na
mesma hora começamos á ouvir os disparos!
— E começou a festa... - ele cantarola e eu sorrio em triunfo.
— Seus capangas são tão bons que precisam de fogos de arma de fogo
para acabar com uma garota de vinte e sete anos.
Digo e ele se exalta levantando e batendo na mesinha, quase vira o café
que não tomei.
— EU NÃO VOU SAIR DA MINHA CASA!!! NÃO VOU TE DAR
PAZ, SEU IMBECIL!!! ACHOU QUE VEIO MAIS PREPARADO DO
QUE EU??? UMA PALAVRA NO RÁDIO E MEUS FUNCIONÁRIOS
INVADEM SUA CHÁCARA E ESTRANGULAM TODA A SUA
FAMÍLIA PATÉTICA, SEU BOSTA!!!
Ele diz apontando a arma pra mim e eu paro de me controlar como estava
desde quando cheguei aqui.
So quei a cara dele até dizer chega, ele é mais velho do que eu, eu tinha
mais fôlego do que ele, por isso a briga foi boa para mim e ruim para ele, isso
porque enchi Ellen de porra antes de sair de casa, sim, deixei dentro dela toda
a minha energia e ainda sim estou melhor que ele. Os socos na cara, no
estômago e costelas o fizeram cair rapidamente. Coitado, sem uma arma ele
não era nada, foi o cara mais fácil de desarmar do mundo.
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— Isso é por tudo! Você tem sorte que tenho mais bom senso do que
tempo! Seu maníaco doente!!!
Recomponho-me e ao mesmo tempo os tiros cessam.
— Pronto, perdeu a guarda-costas, quer perder até os velhinhos ou vai
libertar a minha filha??? Eu estou evitando fazer tudo isso “na frente” de
Ellen, mas você não está me dando escolha… — ele ri nervoso e se levanta
com extrema dificuldade — Você não está me dando escolha…
Eu queria bater nele, mais ainda, queria muito!!!
— Diz o que me impede de atirar em você, playboyzinho de merda!?
Ele questiona tirando outra arma do tamanho de um isqueiro do casaco, e
Laura entra na sala. Juliano era patético, por que não atirava logo??? Eu
estava começando a achar que ele nunca tinha matado ninguém, que quem
fazia o trabalho sujo, eram seus capangas, e pior, estava começando á achar
que ele não me queria morto, ele até esqueceu a arma nas minhas costas.
— Isso responde sua pergunta??? — falo e ele faz cara de paisagem —
Pega o notebook e faça a transferência. Depois disso levarei você até o carro
para sumir daqui!
Eu digo e faço o sinal para Laura. Ela entende, tira dele o rádio e a arma,
pega o notebook que estava na mesa de centro da sala, e o coloca em seu
colo.
— Eu vou fazer você pagar por isso!!! E não vai ser pouco, Coverick!!!
Ele resmunga e eu ignoro. Laura fica ao seu lado e garante que ele apenas
entrará no site do banco, como combinamos.
— Quantos subiram, lá fora? — pergunto pra ela.
— Nenhum! Todos mantiveram o combinado, falei sobre os documentos
como combinamos, o que aconteceria se ficassem aqui, e escolheram o lado
certo, foram cada um para a sua casa com uma boa quantia da mochila,
ficarão tranquilos para procurar um emprego mais digno! Só atiramos pra
cima para a cena ficar mais real. — ela ri. — Mas vamos logo com isso
porque não existem silenciadores nessa joça, o barulho que fizemos lá fora
deve ter chamado atenção da redondeza toda…
Ela diz e concordo. O sítio era isolado, mas mesmo assim não podíamos
arriscar.
— Quanto??? — Juliano questiona nervoso.
— Noventa mil.
— Por um Frísio que eu não abati? Tá de brincadeira comigo???
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— Preciso pagar minha guarda-costas, os funcionários que estão na frente


do Londres, o espião que contratei… tem toda a logística da coisa…
— Está me extorquindo!!!
— Pela primeira vez, não é você quem está fazendo isso, é horrível, não
é!? Matou o presente de minha mulher, eu deveria é matar você, não pedir
para pagar o que deve…
— EU NÃO MATEI O MALDITO CAVALO!!! — ele grita e depois
fala mais baixo como se estivesse com uma dificuldade muito grande em se
acalmar — Pensei que só matava por encomenda!!!
— E quem disse que já não me encomendaram a sua???
Questiono, ele me olha curioso, e volta a sua atenção para o notebook.
— Pronto, agora prove que minha filha está segura seu mauricinho, filho
da puta!!!
Ele rosna, eu ligo para o cara que contratei e coloco no viva-voz.
— Oi. Você já pode sair da frente do hotel. Ele já pagou, deposito o
restante do seu pagamento assim que eu chegar em casa!
— Ok. — ele diz e eu desligo.
— Pronto.
— Como vou saber que não vai mais ameaçá-la???
Ele pergunta e Laura retira o notebook do seu colo para fazer o que
combinamos. Ela coloca um pen-drive especial no aparelho e faz seu trabalho
limpando todo nosso vestígio. Juliano não tinha se acalmado com a ligação,
parecia que a fama de mau que minha família tinha, realmente o tinha
impressionado.
— Eu não sou você! No caminho para ‘o raio que o parta’, você pode
ligar para as duas. As duas estão bem. Você nunca mais mexe com minha
família que eu nunca mais mexo com a sua!!! E não adianta retirar elas de lá
achando que pode reaparecer e me infernizar novamente, se isso acontecer,
eu vou encontrá-las!!!
Eu digo e ele me olha como se eu fosse um demônio.
— Terminei!
Laura diz, se levanta e volta á ficar parada ao meu lado.
— Vamos levá-lo até o carro! — e u digo.
— Acho melhor matá-lo. Ele pode aprontar assim que a gente sair, se for
real o que ele falou sobre ter caras dele na chácara, sua família pode estar em
perigo!
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Ela diz baixo e eu começo á me estressar.


— Minha querida assassina sexy, me matar não vai impedí-los de agir!
Você mata por prazer não é!? Conheço esse olhar! Já conheci muitas pessoas
como você, sociopatas, malucas, que não tem senso do que é moral, que não
tem consciência do que faz… você consegue ser mais maquiavélica do que
eu!!!
Ele rosna baixo e sorri com ironia para Laura que na mesma hora
responde sua provocação dando um chute em sua cara, tirando sangue de sua
boca.
— Amarre-o e vamos comigo buscar o carro dele, vamos verificar todo o
local, se não tem câmeras, se não deixamos nada passar, como sempre
fizemos. Não podemos deixar rastros aqui!
Digo, ela concorda, e eu saio para a noite fria. Eu não tinha certeza se
estava fazendo a coisa certa, eu sei que era melhor apagá-lo, que era mais
garantido, que eu podia me arrepender em deixá-lo viver… mas meu maior
medo era Ellen voltar a si e sentir culpada pelo resto da vida, por causa do
seu pedido. Algo me dizia para não fazer isso, que se eu fizesse, eu ia
estragar a sua vida.
Chego perto da porteira e olho tudo ao redor, nos postes de iluminação
não tinha câmeras, com relação á digitais fiquei tranquilo pois Laura e eu
usávamos luvas, na guarita bem estruturada não tinha sistema de câmeras, só
uma televisão digital e pequenos eletrodomésticos. Olhei tudo. O cara não era
tão obcecado por segurança como eu imaginava, não temia seus inimigos
como pensei que fosse. Juliano não era nada! Nada além de um cara cheio de
pose!
— Ele tá amarrado no sofá… é sério Tay, precisamos apagá-lo! Vivo esse
cara vai voltar a aprontar!!!
— Já disse que não! Ellen nunca vai se perdoar por isso!
Falo e esqueço que era um segredo.
— O que ela tem a ver com isso???
— Ellen pediu para matá-lo, pelo o que fez com Lodov, disse que era
melhor, que isso evitava que fosse eu, sua mãe, ou seu tio em uma caixa…
— Nossa! Nunca pensei que ia dizer isso, mas pelo jeito ela tem razão e
bom senso, né!? Tay, acorda! Ele vai nos prejudicar!
— Eu já disse não, Laura!!!
Eu falo e ela faz aquela cara que faz quando está revoltada.
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— Tudo bem, é da sua família que estamos falando. Eu não tenho nada á
perder. Não tenho ninguém!!! — ela diz e me sinto péssimo novamente.
— Você tem á mim e ao Pedro. Só me dê mais alguns dias para digerir o
que você fez comigo, não quero guardar rancor, é minha amiga, mas eu
preciso de um tempo… você deu muita mancada, quase me matou. Mas está
aqui agora, se arriscou por mim e por Ellen, só me dê um tempo!!!
Eu falo e ela diz ‘ok’ sem me olhar nos olhos. Juntos, conferimos tudo e
voltamos para o casarão deixando a porteira aberta para o corno e Laura
saírem de lá, direto para o aeroporto, como havíamos combinado.
Ao chegar na grande porta, escutamos o barulho da janela do fundo
batendo na parede, janela essa que antes estava fechada e agora estava
arreganhada. Antes de pensar que o filha da puta havia fugido, logo o vejo
tombado de lado no sofá. Suspiro. Juliano estava morto com um tiro na testa.
— Você fez isso???
Questiono Laura, mas corro para a janela sem esperar a resposta, logo
vejo o matagal na frente balançar, indicando que havia acabado de passar
uma pessoa.
— Claro que não. Eu estava com você!!!
Ela grita, mas não perco meu tempo com ela. Saio correndo na direção
em que a pessoa correu, e escuto o barulho que ela fazia mais á frente, eu era
rápido, estava próximo. De repente, quando fico mais próximo ainda de seu
barulho, do nada, tudo fica em silêncio. Parecia que só havia eu na floresta
fechada, a mesma que fazia fronteira com a minha chácara, em direção a
famosa cachoeira que Ellen nadava nua.
Olho para todos os lados e não encontro ninguém, mas eu sentia que
estava sendo vigiado, que alguém me encarava de algum lugar.
— Eu sei que tem alguém aí, apareça! Posso guardar segredo sobre o que
você fez minutos atrás, é só confiar em mim!
Eu digo, mas não obtenho respostas. Ando mais á frente, passo por pedras
enormes, olho tudo ao redor e não encontro um ser vivo, quem dirá humano.
Me canso da brincadeira e volto pelo caminho percorrido por mim, eu tinha
um corpo para dar fim, e me lamentava por aquilo. Alguém tinha matado
Juliano quando eu havia decidido que ele precisava ficar vivo! Eu era pura
frustração e ódio. Ao chegar na orla da floresta por onde entrei, pude ver
Laura pela janela aberta, andando de um lado pro outro na sala, e com a ajuda
da luz forte que refletia de lá de dentro, algo no gramado bem cuidado me
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chamou atenção, brilhando como diamante. Me abaixo e encontro a corrente


de Ellen caída, faltando a medalhinha que servia para protegê-la há anos.
Coloquei-a rapidamente no bolso antes de Laura ver, e olhei um pouco mais
para ver se a encontrava. Demoro um pouco, mas graças á Deus, a encontro
um pouco mais distante, perto da janela.
Eu não sabia o que sentir ou o que pensar, Ellen matara Juliano á sangue
frio, quem era ela? Que raiva era aquela? Só por Lodov? Não podia confiar
que eu a protegeria? Tinha ficado aqui para fazer o serviço como prometeu,
caso eu não fizesse? Meu Deus… Ellen era assim como eu, uma assassina.
Eu não poderia julgá-la sei disso, mas ela se arriscou demais, deixou uma
evidência na cena que comprovava sua estada lá, e ainda conseguira o que eu
temia e tanto evitava: ter culpa pela morte de seu ex-amigo.
— Viu quem era??? — Laura questiona.
— Não! Não vi. A pessoa corre mais rápido do que eu! Precisamos dar
um fim nele… não temos mais tempo!
Laura e eu limpamos a “sujeira”, colocamos fogo e enterramos o corpo
bem longe do casarão, bem para dentro da floresta fechada.
— Foi melhor assim…
Laura diz quando terminamos. Eu estava inseguro, tinha medo de Ellen
ter deixado algo mais caído por lá!
— Não, não foi não!!!
Eu falo e começo a andar. Fechamos a casa, e fomos embora dali. Nem
dirigir eu consegui. Laura fez todo o percurso em silêncio e eu só olhava para
a noite escura me perguntando como ia ser dali pra frente, com Ellen, será
que ela ia me contar o que fez??? Podia apostar que não.
Deixo Laura em seu hotel, no centro, e vou pra casa. Estaciono na frente
do lago e vou até a clareira, pois ouço barulho de música lá. Estão todos
comendo, bebendo e dançando na frente da fogueira, aposto que foi ideia do
meu pai para aliviar toda a tensão. Mas em sua pequena reunião não vejo
meus avós, Ellen, e Pedro.
— Aonde esteve???
Minha mãe se aproxima, me abraça, sente o cheiro de fogueira em mim,
mas não fala nada.
— Na verdade eu estava em uma fogueira com a Laura. Fui resolver um
problema e paramos para curtir uma festinha de uns amigos do curso que tem
família por aqui.
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Eu falo, ela faz cara feia porque falei de Laura, e não acredita na história,
mas finge.
— Hum. Está com fome?
— Tô. Cade Ellen? Pedro? Meus avós???
Vejo Larissa brincando e dançando com meus primos e Lulu, meus tios
dançando agarrados e apaixonados, e meu pai conversando com Jon, mais
afastados.
— Seus avós estão na cama como sempre… Pedro disse que ia pegar a
máquina fotográfica para Lulu tirar fotos dele com a namorada, mas não
voltou faz muito tempo, e Ellen, não tenho a menor ideia!!!
Ela diz e eu volto á fitar a fogueira.
Pedro chega minutos depois com uma câmera nas mãos e entrega pra
Lulu. Me olha por um momento, sorri de alívio e finge que nada aconteceu.
Já Ellen chega depois, parecendo estar cansada.
— Tay…
Ela corre na minha direção e me abraça. Sinto seu coração acelerado e
não correspondo ao seu abraço.
— O que foi? Está tudo bem??? — ela fica tensa ao notar minha
“indiferença”. — Aconteceu alguma coisa???
Ela pergunta preocupada e cheia de um cinismo que não reconheço.
— Não, só estou cansado!!! — eu digo e ela volta á me abraçar.
— Eu sabia que ia voltar pra mim! Deu tudo certo? — Ela pergunta.
— Sim. Tudo certo. Como a gente previa!!!
Eu respondo olhando para seu pescoço nú e ela disfarça mudando de
assunto, perguntando se eu queria comer ou beber alguma coisa, se eu tinha
tomado o remédio porque senão, ela buscaria, que ainda dava tempo de
tomar… e por aí vai, um festival atuação fora do comum.
— Eu tô bem Ellen, só preciso descansar, vou me deitar um pouco. Curta
a fogueira!
Digo e me retiro dali, saio com os olhares de meu pai e Jon, e decido que
conversaria com os dois em uma hora melhor. Estava bravo demais porque
notei que Ellen não me contaria a verdade, como eu suspeitava!
Entro na cozinha e ela aparece atrás de mim quase que no mesmo
momento.
— Algo deu errado? Eu fiz alguma coisa? Se tiver algo para me contar,
conte agora, fale de uma vez!
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Ela diz, dá a volta na mesa e para na minha frente.


— Ah, quer que eu diga!? Onde você esteve essa noite? Mandei você
ficar em casa, mas minha mãe disse que você desapareceu. Onde esteve,
Ellen???
Eu falo e ela parece engolir uma bile.
— Eu saí. É esse seu problema? Ciúmes por ter saído sozinha? Vida, para
com isso...
Ellen diz manhosa e eu coloco seu colar na mesa da cozinha, sem dizer
uma só palavra. Logo que ela vê, seu semblante falso muda e ela beira o
choro descontrolável.
— Tay…
Ela sussurra e eu que tinha esperanças dela dizer que aquilo estava errado
e que algo fantástico aconteceu para aquilo ter parado lá, quebro a cara! Ellen
assume a culpa tentando me segurar pela blusa e suas lágrimas se fazem
presente.
— Não tenho condições emocionais de lidar com o que você fez, com a
merda que você fez hoje, então vou subir, tomar um banho e dormir! O sofá é
seu, ou melhor, a cabana! Bem longe de mim, porque não sei mais quem você
é! Não podia ter feito isso comigo, não podia ter feito isso com você
mesma!!!
Eu falo e me viro para ir embora, mas ela passa por mim e barra a minha
passagem.
— Tay, eu fui lá só para te ajudar caso precisasse, não podia deixar você
sozinho com duas cobras peçonhentas! Só quis ajudar, cheguei lá e o vi
morto no sofá, saí correndo para você não me ver, não ficar bravo comigo!!!
— ela diz chorando e eu me forço á não me comover.
— JÁ O ENCONTROU MORTO??? Eu fui para a porteira e ele ainda
estava vivo, quando voltei com Laura ele estava morto!!! Você disse que se
eu não fizesse você faria! Eu já estou perdido, mas você acabou com sua
vida, e deixou lá uma prova do seu crime, o colar no gramado,
completamente visível para quem quisesse ver. Até retirou o perfume no
banho, não é!? Te ensinei algo útil, nem notei que estava lá!!! Se arriscou
demais, podia ter morrido e só o que eu pedi, foi para ficar em casa, porra!!!
Como consegue atuar tanto? Disse que acreditava que eu voltaria, disse que
confiava em mim, foi atrás de mim pra quê? Como teve coragem? Foi tudo
por Lodov??? Sei que sofreu, sei que era um amigo que você amava, mas
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você era o ser mais puro que eu conhecia, por que fez isso com você??? Por
que não confiou em mim???
Eu evitava gritar e ela chorava.
— O que está dizendo? Eu não o matei!!! Por favor, acredita em mim! Eu
cheguei lá e já era tarde demais, Tay!!! Por favor… acha que eu teria
coragem de fazer isso??? Eu não o matei!!!
— MATOU! VOCÊ O MATOU!!! — Grito, mas depois abaixo o tom.
— Eu o deixei vivo, quando cheguei ele estava morto e você saiu
correndo!!!
Eu falo e ela me olhava como se minhas palavras lhe causassem uma dor
aguda.
— Tay, acredita em mim! Você me conhece…
— Eu não te conheço! Não sei mais quem você é!!! Agora vou ter que
voltar lá, e me certificar de que você não deixou cair mais nada, e nem tocou
em nada da casa. Garanti uma forma dele nunca mais nos perturbar, devia ter
confiado em mim, devia ter confiado no amor que eu sentia…
Percebo que falei uma besteira grande. Dou um passo em sua direção,
mas ela se afasta me olhando horrorizada.
— Sentia???
— Ellen…
— Sentia??? É isso? Você sentia? Não me ama mais por que
supostamente eu fiz o que você faz por profissão??? Quer falar sobre “quem é
quem” aqui? — ela diz e sinto alguém se aproximando da sala de estar.
— Fala baixo! — eu digo, mas ela começa á gritar.
— NÃO FALO BAIXO MERDA NENHUMA!!! SE VOCÊ NÃO ME
CONHECE, ENTÃO NINGUÉM AQUI CONHECE VOCÊ! FOI
TORTURADO NAQUELA BASE ESCONDIDA NO MEIO DO MATO
DESDE CRIANÇA E NÃO FALOU PRA NINGUÉM DA FAMÍLIA…
— Ellen, cala a boca…
— ME ABANDONOU AQUI, PORQUE SEU AVÔ FEZ UMA
LAVAGEM CEREBRAL EM VOCÊ E VOCÊ NÃO QUIS SER FELIZ
AQUI, VIVER SUA VIDA AO LADO DE TODOS QUE AMAVA PARA
SER TORTURADO ATÉ OS DEZENOVE ANOS NAQUELE MALDITO
LUGAR POR CULPA DELE, DELE E SUA!!! E ESCONDEU ISSO DE
TODO MUNDO!!! AGORA QUER ME JULGAR POR ALGO QUE NÃO
FIZ…??? JURA???
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— ELLEN, CALA ESSA BOCA!!!


Eu grito e me aproximo de meus avós que apareceram na porta da
cozinha de repente e escutavam tudo o que ela falava... com a lentidão que
minha avó empurrava a cadeira de rodas do meu avô, pelo jeito, eles tinham
pescados desde o início da história. Minha avó chorava com a mão na boca, e
meu avô chorava gemendo baixo, e esfregando o lado esquerdo do peito, o
coração. Nem força para chorar ele tinha mais. Me ajoelhei e não pude
suportar vê-los daquela maneira. Era desesperador, era inexplicável a dor que
eu sentia ao ver a dor que os dois sentiam. Meu avô chorava como uma
pessoa que perdeu um ente querido para a morte, estava de luto, era essa a
impressão que eu tinha, e aquilo era dolorido, me causava uma dor física fora
do comum... nunca senti essa dor na minha vida, nem as facadas e
queimaduras das torturas em Manaus doeram tanto.
— Vovô…
— Torturado… você… torturado… me perdoa… me perdoa… eu sinto
muito, sinto muito, sinto muito…
Seu Luiz chorava de soluçar, e sua voz cada vez mais diminuía e ficava
rouca. Ele repetia as palavras para colocar ênfase e me fazer entender tudo o
que ele sentia porque naquele momento, ele não conseguia formar uma frase
clara e objetiva. Meu avô estava fraco demais, principalmente fraco demais
para sofrer.
— Vovô, não peça perdão, nada disso foi sua culpa, eu te amo, vô! Eu te
amo!!! Foi o melhor avô do mundo, eu amo o senhor!!!
Eu tento fazer com o que o choro não me atrapalhe e falo em alto e bom
som olhando em seus olhos. Ele nega com a cabeça, eu o abraço para tentar
reconfortá-lo de alguma maneira, mesmo sabendo que era impossível, e o que
temi a minha vida inteira acontece ali, diante dos meus olhos: de repente sua
cabeça cai no meu ombro e seu choro cessa!
— Vô… vovô!!!
Eu o chacoalho, mas ele não responde. Ellen para de chorar e corre para
olhar seu pulso enquanto eu estava prestes a começar á gritar por ajuda... ela
fica uma eternidade, depois passa seus dois dedos para o pescoço e
choraminga alto: — Eu… eu… eu sinto muito Tay, sinto muito… muito
mesmo!!!
Ellen começa á chorar mais ainda ao invés de dizer que meu avô se foi e
eu já não sinto nada. Só sinto que perdi tudo o que eu tinha. Nada me restava
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na vida.
— Vai embora daqui… nunca mais olhe na minha cara!!! Não ouse me
procurar nunca mais, não importa o que aconteça, nunca mais chegue perto
de mim, de novo!!!
Eu falo decidido enquanto ainda olhava para meu avô e via em seu rosto,
que tinha naquele momento um semblante de tristeza, a dor que eu causei,
tudo por culpa dela.

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16 VALIUM
Nunca pensei que conseguiria fazer tanta merda em um só dia na minha vida.
E não foi só merda propriamente dita, cometi um crime, eu matei o avô de
Tay, literalmente causei sua morte e não há palavras para descrever o horror
que eu sentia. Quando eu pensava que a morte impiedosa de Lodov seria o
auge do pesadelo que eu poderia passar, veio a vida e me mostrou que tudo
pode piorar ao máximo, independe das circunstâncias.
Tay ter me expulsado de sua vida, foi o mínimo que ele poderia fazer, á
respeito disso nem irei descrever como me senti na hora, e como me sinto
agora. É o de menos, tendo em vista toda a situação.

Caminho pela noite gelada tremendo pelo desespero que tomara conta do
meu corpo e de minha alma, chego na fogueira onde todos estavam e desligo
o enorme som de Max. Todos me olham assustados e eu não consigo nem me
mover e nem falar nada. A culpa havia tomado conta de mim e paralisado
todos os meus músculos, infelizmente menos o miocárdio. Tia Hella e Marina
que estranharam minha reação e estavam mais próximas do que os outros, se
aproximaram e questionaram ao mesmo tempo o que havia acontecido.
— Eu sinto muito!!! Eu não sabia que eles se aproximavam, eu não
imaginava… eu estava tão nervosa! Pelo amor de Deus, me perdoem…
Resmungo um pedido de perdão em meio á palavras desconexas e Marina
precisa me chacoalhar para eu voltar á mim.
— Fala menina! O que está acontecendo???
— Tay, precisa de ajuda na cozinha! Seu Luiz ouviu uma conversa nossa…
eu sinto muito!!!
Falo e as duas correm para a cozinha fazendo todos á seguirem por
curiosidade. Fico no mesmo lugar, sozinha, sem saber para onde ir e o que
fazer, até que volto á chorar de soluçar. Fito a fogueira que crepitava em
minha frente e me aproximo, a chama era como um ímã, me chamava e eu
atendia seu chamado. Talvez morrer acalmaria minha alma culpada, talvez eu
merecesse a companhia da fria morte por tê-la feito levar seu Luis. Eu já não

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desejava viver, eu não queria passar por aquilo, eu me recusava á continuar


sentindo aquela dor horrorosa. Assim que toda a minha pele começava arder,
sinto uma mão firme segurar o meu braço esquerdo. Era Max. Todos
correram, mas ele ficou, ou foi até lá e voltou, não sei direito, não tinha a
menor ideia de quanto tempo eu estava na frente do fogo.
— O que pensa que está fazendo??? Está maluca???
Ele questiona, eu olho em seus olhos e noto que já estavam vermelhos. Ele já
sabia. Deveria me incluir em sua lista negra, e me empurrar para o fogaréu
me consumir, mas ele estava fazendo o contrário, eu só não sabia o porquê.
— Só acabando com a dor… preciso acabar com essa dor… isso está me
matando e não vai parar nunca. Não vai parar nunca.
Digo e vejo o fogo por detrás de poças d'água que se juntaram nos meus
olhos.
— Não adianta se sentir culpada, isso só vai te fazer mal. Você não tem culpa
de nada!!! Vem aqui!
Max me puxa para um abraço e eu desabo ali.
— O que faz aqui, depois do que fiz???
— Te vi de lá de cima, só evitando que você faça uma besteira sem
tamanho!!! Tudo vai ficar bem, menina, já era a hora dele.
Ele diz e me afasto, olho para ele e me retiro de lá em direção á cabana. Eu
não tinha mais coragem de ficar perto dele, eu não tinha mais espírito para
continuar naquele lugar. Àquela altura, todos já sabiam o que eu tinha feito,
não conseguiria encarar ninguém, nunca mais. Então caminhei até a cabana
“me abraçando” e sentindo o mundo desabar embaixo dos meus pés. Me
deitei na cama, e agarrei o travesseiro. Permaneci chorando e me lamentando
profundamente até o dia nascer. Não tinha a menor ideia de que horas eram
quando tio Renan entrou de supetão no quarto. Olhei para a porta, voltei á
deitar a cabeça no travesseiro, e pude escutar sua respiração pesada como
quem lamentava por tudo, incluindo por me ver daquela forma.
Ele tira seu chapéu, larga nos “pés” da cama e dá a volta para sentar do meu
lado. Puxa meu corpo como se quisesse que eu levantasse e me abraça muito
apertado. Mas mesmo apertado e consolador, não foi capaz de tirar de mim
toda a dor que eu sentia.
— Eu matei o seu Luis, tio… matei ele!
— Não fala bobagem!!! Foi um acidente, você não podia prever! Estavam os
dois conversando… ele chegou de repente!
Ele diz e eu o encaro enquanto enxugo o rosto.
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— Quem te contou???
— Max.
— Devem estar me odiando…
— Ninguém lá odeia você. Tira isso da sua cabeça!
— Todos me odeiam, só não vão falar. Tay me odeia ainda mais, ele mandou
eu ficar quieta porque estava vindo alguém, mas eu não escutei, não percebi,
agora essa culpa nunca mais vai sair de dentro de mim. Eu quero morrer tio,
quero morrer para isso passar!
Eu digo chorando novamente e ele se afasta sem acreditar no que eu dizia.
— Se repetir isso pra mim novamente, eu interno você! Tranco você dentro
de um quarto e nunca mais abro!!! Não volte á falar esse absurdo nunca mais
na sua vida, Ellen! — ele diz com raiva e eu nego com a cabeça.
— Não vou suportar essa dor, não vou suportar! Não conseguirei viver com
isso!
— Vai passar, você vai superar!!! Fica calma, princesa, pelo amor de Deus!!!
Ele implora me abraçando novamente e ouço a porta da sala se abrir. Minha
mãe entra no quarto e corre para me abraçar.
— Está tudo bem, meu amor… eu estou aqui! Só soube agora, porque não
acordei bem disposta e só cheguei ao casarão agora, mas estou aqui!!! Fica
calma, mamãe vai cuidar de você!
Minha mãe resmunga baixo e me nina como se eu fosse uma criança
entristecida. Meu tio se levanta para dar espaço á ela, mas não sai do quarto,
os dois ficam comigo. Minha mãe depois de um tempo diz que vai fazer um
chá de camomila pra mim, volta, me dá um comprimido que diz ser calmante,
eu bebo o chá, tomo o remédio e quase que imediatamente depois de acabar,
me sinto mais calma, mais leve, depois sonolenta e enfim apago. Agradeci á
Deus pela vida de minha mãe, antes da escuridão reconfortante me acolher
por inteira.

Abro os olhos devagar e logo vejo meu tio na poltrona do quarto, dormindo
sentado. Olho ao redor e tudo estava fechado, não conseguia ver que horas
eram, pois até meu celular eu não tinha ideia de onde estava. Encosto
novamente minha cabeça no travesseiro e agradeço a ausência de dor de
cabeça. Pelo menos isso.
— Já acordou. Está com fome?
Meu tio diz limpando a boca e esfregando os olhos. Renan é um homem
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bonito demais, forte, o típico cowboy grosseirão de barba mal feita, que
despertaria curiosidade e desejo em toda e quaisquer menininha de cidade
grande que olhasse para ele, cidade grande e moça do mato também!!! Agora
ao invés de estar por aí namorando, paquerando, vivendo... estava dormindo
em uma poltrona, morrendo de medo de sua sobrinha já adulta fazer alguma
besteira. Eu era um nada naquele momento.
— Não. Quanto tempo dormi? Que horas são?
— Sua mão te deu o remédio ontem de manhã, agora são… — ele olha para
seu relógio de pulso. — 19:30 da noite. Vou fazer algo para você comer, já
volto! — ele diz e se retira.
Bati o recorde no sono, vai ver era a culpa, dor, o cansaço, o estresse, a perda,
o luto… podia ser muita coisa, não tinha como saber. Só o que eu sabia era
que eu queria outro comprimido daquele.
Vinte minutos depois, meu tio chega com um lanche que eu finjo que vou
comer, e por isso só belisco.
— Posso pedir um favor?
Digo mordiscando o pão sem vontade nenhuma e ele diz sim.
— Me ajuda á sair daqui? Quero ir pra minha casa!
Eu digo e ele se sente contrariado.
— Seu carro está no lago! Não ouse á querer sair daqui escondida, não fez
nada de errado, não foi…
— Só diga se vai me ajudar ou não, tio. — resmungo e ele me encara. —
Quero retirar as minhas coisas daqui o quanto antes, minhas roupas, objetos
pessoais, sozinha eu levaria muito tempo, quero ir hoje… não conseguirei
carregar tudo sozinha floresta acima. Só preciso que coloque o carro na orla e
que me ajude com as coisas mais pesadas. Farei com ou sem o senhor.
Digo e ele toma um gole do suco que pegou para si mesmo. Nem precisava
confirmar, eu sabia que ele faria tudo para me ajudar.
Deixo o lanche na bandeja, vou pro banho, me troco, e começo a sessão
“libertação”. Eu tinha esperanças de que se eu nunca mais pisasse nesse
lugar, aquela culpa e aquela noite maldita, seria só uma lembrança triste.
Juliano morto, seu Luis morto, Tay me expulsando de sua vida, o desespero
de Marina, Max se esforçando para não me odiar… eu achava que precisaria
muito mais do que uma mudança para esquecer aquela noite, mas vamos por
partes. Empacoto tudo com a ajuda de seu Renan, e não olho de forma
saudosa para a casa que vivi durante muitos anos, não, faço tudo o que
preciso e saio de lá sem olhar para trás, praticamente fugindo. Chego até a
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orla da floresta que dava na pequena clareira, e de longe posso ver Tay, ainda
de luto, vestindo preto e jogando pedras no lago, com Lulu. Não espero ele
olhar para mim e ajudo meu tio a colocar o restante das coisas no carro. Eu só
tinha roupas e objetos pessoais então coube tudo. Pouco antes de entrarmos
no carro e partir, vejo tia Hella, Max, e Rafael descerem a pequena ladeira em
direção ao carro. Acelero o passo e abro a porta para demonstrar que já
estávamos de saída, mas não adianta muito. Logo vejo Lulu abandonar o
irmão e descer correndo atrás de seus pais. Não olho diretamente para ele,
mas vejo sua sombra negra entrar no casarão sem hesitar.
— Vai á algum lugar?
Max se aproxima e toca meu ombro com delicadeza, mas eu me afasto e
minha tristeza vira raiva. Por que diabos esse homem não me xinga? Não me
bate? Não grita comigo???
— Sim, para minha casa. — falo e tia Hella e Rafa também se aproximam. —
Por favor, não façam com que eu me sinta pior do que já estou, na verdade
acho até que isso é impossível… eu não consigo olhar pra vocês, não entendo
como ainda não saí daqui algemada por homicídio culposo.
— Pare de se culpar, amazona, você tem tudo, menos culpa!!! — Rafael diz.
— Deixa a gente te ajudar á passar por isso, meu amor! Ninguém aqui te acha
culpada! Ninguém acusou você! Foi um acidente lamentável, mas vamos
superar. Você não tem culpa. Meu sogro descansou, não foi culpa sua!
Tia Hella diz e seus olhos se enchem de lágrimas.
— Eu já me culpo o suficiente, por todos! Não vou pedir perdão pra vocês,
porque o que eu fiz é imperdoável, só queria dizer que lamento demais e que
nunca me perdoarei pelo o que fiz naquela noite, se puderem passar o recado
para dona Jô, eu agradeceria muito, espero que ela saiba o quanto eu me
condeno e lamento demais.
— Ela também não te culpa! Só não está aqui porque está muito triste e
debilitada. Se não tivesse, seria a primeira á querer vir. Você não tem culpa
de nada… nós amamos você!
Ela diz e minha garganta se aperta.
— Eu sinto muito, muito mesmo! Eu faria qualquer coisa, daria qualquer
coisa para voltar no tempo e ficar calada.
Eu digo, me adianto para entrar no carro, mas Lulu corre e agarra minha
cintura. Ela fica me olhando por um momento e não sei o que fazer, fico
parada ao invés de corresponder seu abraço e... espero.
— Você vai voltar, não é!? Eu disse pro Tay que você ia ficar para sempre
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com ele por ter ganhado um presente de mais de cinquenta mil e que
precisava amá-lo pra sempre para poder pagar a dívida!
Ela diz e não me vejo na obrigação de sorrir pra ela. Mataram Lodov de
forma cruel então também não me sentia em dívida.
— Eu sinto muito pelo prejuízo nas suas contas, Lulu!!! Mas eu nunca mais
voltarei aqui, e tenho certeza que não conseguirei amá-lo pra sempre!
Digo com tristeza e faço carinho na sua cabeça.
— Posso ir ver você então???
Ela pergunta triste e Max se aproxima para tirar Luiza de cima de mim e
parar com aquela tortura.
— Filha…
Max resmunga e ‘baixa’ a versão de Hella na menina. Ela para de fazer seu
biquinho que sempre funcionou comigo, e passa a ser ela mesma.
— “Filha” nada, hein papai! Me solta! Vocês não estão ouvindo o que ela tá
dizendo, não??? Ela nunca mais vai voltar porque meu avô teve um troço por
ouvir a verdade!!! Estamos todos de luto e sofrendo, mas ela não tem culpa!
Vocês não podem deixar ela ir embora! Quando o luto de Tay passar ele
nunca vai se perdoar, ele vai sofrer ainda mais!!!
Ela fala rápido demais olhando para a face de todos!
— Andem! Falem alguma coisa, ela não pode fazer isso!!! — Ana Luiza diz
apontando pra mim. — Pai!!! Faça alguma coisa!!! Agora!!!
Ela ordena batendo o pé para o próprio pai e antes de Max se ajoelhar para
implorar pela filha, eu me adianto.
— Eu já vou, Ana, não posso ficar aqui! Não estou bem para ficar aqui
depois do que fiz! Tay disse que não quer que eu o procure de maneira
nenhuma, sob nenhuma circunstância, e ele tem direito! Vou acatar seu
pedido! Vou me afastar e não vou voltar. Um dia você vai entender a
gravidade disso tudo.
— Ele é um babaca e vai se arrepender! Vai me deixar aqui com esse bando
de adultos infantis? Preciso de você!!! Preciso chamar a atenção de alguém
por comprar ração importada sem ter necessidade ou comprar botas de
montaria, uma de cada cor para combinar com os look's de caipira
moderninha e me deixar com dívidas nos bancos, para ter um passa-tempo!
Vamos lá, é você quem dá vida neste lugar!!!
Ela diz, todos sorriem, e meus olhos e minha garganta ardem.
— Você já é bem grandinha, mais adulta que muita gente que conheço, mas
não sabe de muita coisa! Aprenda á ouvir ‘não’ como resposta!
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— Então aprenda á enfrentar suas dificuldades sem fugir, que eu vejo o que
posso fazer com relação á ser mimada! Entre mimada e medrosa…
Ela diz, ergue uma sobrancelha, e põe a mão na cintura.
— Eu não estou fugindo de uma crise, ou problemas no namoro! Estou
fugindo de uma vida que tirei, de um pesadelo que nunca mais na minha vida
eu vou esquecer! Eu te amo Lulu, mas preciso ir! Até mais!
Eu digo, dou um beijo nela e entro no carro, meu tio que já havia entrado,
gira a chave e põe o carro em movimento. Saio dali como se tivesse saindo de
uma penitenciária. Paro rapidamente na porta de casa e meu tio me ajuda a
guardar tudo, coloco as caixas todas no meu quarto, e as roupas na cama.

— Mãe…
Mais tarde, entro na cozinha e a encontro com meu tio. Os dois conversavam
enquanto ela preparava a janta. Logo que entro o diálogo cessa.
— Que foi, princesa!?
Ela diz se aproximando de mim, toda preocupada.
— Pode me dar mais um daquele comprimido?
— Não! — meu tio já protesta e eu o ignoro.
— Você não pode se entregar Ellen, não fica assim filha!
Minha mãe toca meu rosto e eu volto á chorar.
— Só queria dormir, não consigo dormir…
— Ainda é oito da noite, não precisa dormir!!!
Meu tio resmunga e minha mãe faz uma cara feia pra ele.
— Por favor, mãe, só mais um… só quero mais uma noite sem dor, sem
culpa, sem tristeza... desespero. Só mais um!
Eu imploro e ela respira fundo.
— Só depois de jantar, se comer toda a comida que eu colocar no prato, te
dou mais um! Você só mordiscou um lanche depois de ficar horas dormindo.
Se tu se alimentar bem, te dou comprimido!
Ela diz e toco seu rosto agradecendo.
— Isso, faz a menina ficar problemática, viciada!!! Você é maluca!? Ela
acabou de acordar, ficou mais de 24hs dormindo!!! Vai matá-la!!!
Ouço meu tio resmungar quando paro no corredor. Me recuso á dar atenção e
volto pro quarto. Eu olho para as coisas, os móveis, as roupas, os retratos e
decido me livrar de tudo. Vou até o banheiro, pego a lixeira que era de inox,
tiro a sacolinha de lixo e deixo lá, passo na sala, pego o isqueiro que meu tio
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sempre deixava no braço do sofá junto com seu fumo, e volto para o quarto.
Pego as fotos do Rio Grande do Norte, da praia, do pôr do sol, algumas que
imprimi dele, a flor seca, e coloco fogo, uma por uma. Mas dessa vez não
choro, me sinto vazia, mas nada dói, e pra mim, a ausência de dor já era algo
que eu deveria celebrar. Eu não estava querendo esquecer Tay, só queria
esquecer o homem cujo avô eu matei.
Coloco minha mão no pescoço e não sinto minha correntinha. Saí da cozinha
tão destruída que a deixei na mesa, era melhor assim, que ele guarde se
quiser, ou dê um fim mais digno que o fogo na lata de lixo do banheiro.
Janto empurrando a comida garganta á baixo só para conseguir o remédio, e
logo depois minha mãe o coloca na mesa com um copo d'água do lado, sem
vontade nenhuma. Ela sofre, meu tio sofre... eu deveria acabar com aquilo,
mas de que jeito? Penso á respeito e cinco minutos depois, graças á Deus, já
me sinto sonolenta e logo apago.
Acordo não sei que dia e nem que horário, com Pedro e Lari dentro do meu
quarto.
— Boa noite!
Lari resmunga e se aproxima sentando na minha cama.
— Que horas são? — questiono e ela sorri.
— Quase oito.
— O que estão fazendo aqui? — pergunto me sentando.
— Viemos ver como você estava!
Pedro diz e eu olho para ele.
— Já viram?
— Estamos preocupados com você, amiga!
— Vou ficar melhor, Larissa, mas no momento não quero receber visita de
ninguém. — falo e ela parece magoada.
— Eu disse…
Pedro resmunga e Larissa diz ‘Pedro…’ olhando feio para ele.
— Nunca gostou de mim, nem você e nem a cobra! Por que veio?
— Porque eu e Larissa estamos juntos! Vou onde ela for. E não é que nunca
gostei de você, é só que nunca gostei de quem Tay se tornou por sua
influência!
— O que, por exemplo!? Decente, apaixonado, carinhoso, fiel… caseiro???
— ironizo e de tão ridículo ele concorda assim mesmo.
— Ele já soube quem matou o Juliano?
Questiono baixo para minha mãe não ouvir e Pedro se levanta para responder.
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— Não tive muito tempo para conversar sobre isso com ele, mas o que tudo
indica é que ele continua achando que foi você! Afinal… foi não é!? Ele
encontrou sua correntinha na cena do crime. — ele diz e minha raiva volta.
— Você acredita nisso?
Pergunto para Lari e ela quase chora ao responder.
— Amiga, confio em você! Mas não vejo outra pessoa que poderia ter sido!
Se você fez isso, teve motivos e continuo sendo tua amiga. Juliano merecia!!!
— Vai embora daqui.
Digo sentindo uma ânsia de vomito, ainda olhando para ela, imediatamente
depois de terminar a sua frase.
— Ellen…
— Vai embora!!!
Eu repito e por um momento, ela não acredita que estou expulsando-a de
minha casa.
— Acho que você merece passar por tudo o que está passando! Pra ficar mais
humilde!
Ela cospe as palavras na minha cara e eu sorrio pra ela.
— Talvez! Talvez eu mereça, afinal sou burra demais! Passei anos de minha
vida te chamando de “amiga”… como Juliano mesmo dizia: você não passa
de uma nota de três reais! Falsa, fingida e invejosa!
Eu digo de forma calma e ela ameaça grudar no meu pescoço, eu não me
mexo, já não temia nada antes, quem dirá agora… Pedro é rápido e a puxa
para se levantar e se afastar de mim. Podia jurar que ele ia deixar...
— Vou denunciar você, sua vadia assassina!
Ela rosna baixo para minha mãe não saber quem ela era realmente e eu sorrio
de novo.
— Denuncia, uai! Só tome cuidado para a polícia não achar um fio de cabelo
do seu namorado sem-sobrenome, e do loiro deus grego que você tanto
desejou, mas que nunca te deu bola… eles e sua nova melhor amiga, podem
se prejudicar demais!
Eu digo e Pedro a puxa para fora do quarto. Assim que eles saem respiro
descontroladamente e me recuso á chorar. Me levanto, pego minha mochila e
uma mala gigantesca e coloco todas as minhas roupas. Eu precisava sumir
daquele inferno imediatamente. Como se o destino não cansasse de brincar
com a minha vida, me presenteando com desgraças atrás de desgraças, minha
mãe entra no quarto bem na hora.
Ela me vê fazendo as malas e não diz nada.
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— Não vai me impedir!


Eu falo e continuo fazendo tudo com pressa.
— Não vou mesmo! Quero que seja feliz, e que tenha paz. Se aqui você não
tem, eu te apoio, vá para onde você quiser, vai viver sua vida em outro lugar!
Você merece e precisa ser feliz, já passou da hora!
Ela diz e eu choro alto escondendo o rosto nas roupas, e na mesma hora que
ela chega perto de mim me puxando para um abraço. A dor havia voltado.

— Guardou dinheiro, não é!? Vai poder segurar a onda até arrumar um
emprego… precisa de algum?
Meu tio questiona enquanto me ajudava com as malas do lado de fora.
— Guardei, não se preocupem… ficarei bem! No dia que eu voltar quero ver
o senhor feliz e casado, hein, seu Renan. Trabalhe menos, namore mais!!! —
eu digo e ele sorri para mim.
— Eu queria tanto ir com você… tanto! — minha mãe chora e me abraça.
— Eu sei mãe, mas não dá! Quero ficar sozinha, e também tem a vovó,
Ritinha, elas precisam do seu cuidado, precisam de você aqui!
— Como vai ficar a clínica e a loja?
Meu tio sempre preocupado...
— Vou decretar o fechamento ou alugar, talvez tirar o site do ar, mas
enquanto eu puder, vou pagar as prestações… assim posso sobreviver dos
aluguéis quem sabe… não sei. Não sei de mais nada.
Eu falo e abraço os dois ao mesmo tempo. Me sinto feliz pelo apoio dos dois,
mas obviamente não é o suficiente para eu me sentir melhor. Eu não podia
ficar naquela casa me acabando com remédios ou sofrendo um pouco á cada
dia que passava, eu precisava ir embora dali, imediatamente. Essa era única
coisa que eu sabia. Era a única certeza que eu tinha, eu precisava deixar tudo
aquilo para trás.
Despeço-me sentindo uma dor horrorosa no ‘coração que eu achei que não
tinha mais’, e entro no carro. Respiro fundo e choro fitando minha pequena
família de dois ficando cada vez menor pelo retrovisor. Era o meu começo e
ao mesmo tempo o fim de tudo o que eu era, de tudo o que vivi ali. O adeus.

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Dirijo á caminho do centro, rota necessária para chegar á qualquer lugar, e


me lembro que preciso fazer algo importante, não por mim, mas por aquela
família que eu tanto amava. Ligo para o chefe deles, ele atende, digo o que
preciso, e em menos de dez minutos ele aparece no parque do centro ao meu
encontro, como combinado por telefone.
— Por que aqui?
Max já pergunta e eu respiro fundo. Era muito difícil olha para a ‘cara’ dele.
— Só estou de passagem, me lembrei que tenho algo importante pra contar,
parei o carro e te liguei!
— Está indo embora da cidade??? — ele questiona e dá um passo á frente.
— Só me escuta, Max…
— Não acha que está começando a exagerar? Passar do ponto? Ellen, não
precisa fazer isso…
— Vai me deixar falar ou não? Eu juro… se não me deixar falar, vou embora
sem contar e aí terei notícias de vocês, na sessão policial do jornal!!! — eu
digo e ele se cala chateado. Respiro fundo.
— Quando eu fui tirar satisfações de Juliano depois que vi que você ia
machucar o capanga dele, ele me falou algumas coisas. Ele disse coisas á teu
respeito, me contou sobre a sua amiga que você matou, sobre o passado de
Tay, enfim… Juliano fez uma pesquisa extensa sobre a família Coverick
toda! Muita coisa eu já sabia, como Haiti, Síria e tudo o que você sofreu e
teve que fazer para sobreviver, mas ele me contou algo muito estranho que…
— pauso a fala para respirar. — por causa de todas essas coisas que
aconteceram nos últimos dias, acabei esquecendo e não dando muita bola.
Afinal achei que tudo o que ele tentava fazer era me colocar contra vocês, me
colocar contra a família. Ele chamou o Pedro de Pedro sem-sobrenome,
mandou eu questionar você “como quem não quer nada”, á respeito de um
sargento Carlos, tenente Carlos não me lembro ao certo…

Cada vez que eu ia falando via Max mais nervoso e aflito. Quando eu falei no
nome de Carlos, ele forçou o maxilar e seu olhar era de pura fúria, uma fúria
indescritível. Max parecia ter tirado uma máscara ou colocado uma, e tinha
mudado totalmente de personalidade. Ouso até mesmo dizer que eu
suspeitava que Max havia voltado á ser o Max que sobreviveu á terroristas. O
Max assassino!
—… E o que o Pedro e esse tal de Carlos têm em comum!
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Eu termino de falar e me afasto um pouco não sei o porquê. Ele me mede de


cima á baixo quando percebe que fico aflita por sua reação e eu faço um
esforço grande para continuar olhando diretamente em seus olhos.
— Carlinhos… Carlos Júnior. — ele resmunga baixo e eu não entendo
direito.
— O quê!? Conhece esse cara que ele disse???
— Sim. Eu o matei naquela época em que Tay foi baleado. Ele ajudou Felícia
sequestrar a Hella. Pode ser o filho dele, Pedro pode ser o filho dele, já
estudou com ele na pré-escola. Mas como Tay pôde não lembrar do amigo de
escola???
Ele diz passando a mão na cabeça e parecia mais falando sozinho do que
respondendo minha pergunta.
— Ou talvez se lembre, Max! Talvez saiba quem Pedro é. Tay é forte,
inteligente, dedicado, esforçado, bom no que faz de certo, ótimo nas coisas
que faz de errado, mas ainda sim, é ingênuo, perdoou Laura facilmente, foi
enganado e envenenado e não fez nada… ele confia demais nas pessoas, não
enxerga o lado ruim delas! No mais, tem outra coisa, naquela noite, eu fui até
lá, não sei se te contaram… eu cheguei lá, e Juliano já estava morto, estava
amarrado e caído no sofá com um buraco enorme na testa. Na hora que eu
ouvi Tay e Laura se aproximando, saí correndo com medo dele brigar comigo
por ter ido até lá. Por isso brigamos e foi essa discussão que seu Luis ouviu.
Enfim, eu não seria capaz de matá-lo, não consigo pisar em uma barata.
Alguém o matou, e te garanto que não foi eu, juro que não fui eu! Juliano
negou que Larissa tenha sido espancada pelos funcionários dele, e não sei
mais se ele seria capaz de matar um cavalo já que sempre os amou assim
como eu… não sei de mais nada! Mas... hoje quando ele foi até minha casa
com Larissa... eu não sei... Pedro se divertiu ao me ver mal, de cama,
sofrendo, com Larissa deixando claro que não acreditava em mim também,
enfim... não posso provar nada, mas posso dizer que não matei o Juliano.
Eu digo e seguro o choro. Max que parecia tremer de aflição, respirou fundo
e tocou meu braço.
— Está tudo bem, menina! Eu acredito em você! Sei que não o matou como
sei que não tem culpa pela morte do meu pai!
— Max, me perdoa, me perdoa!!!
Ele falou nisso e isso me fez voltar á chorar descontroladamente. No mesmo
instante ele se aproxima para me abraçar. E eu me sinto bem sentindo seu
cheiro só porque era muito familiar, e só porque eu o amava como amava
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toda aquela família.


— Esquece isso, você não tem culpa, não tem culpa! Por favor, não vai
embora, Tay ama você, Hella e eu amamos você! Não precisa ir embora. Não
precisa fazer isso. Deixa o tempo colocar as coisas no lugar!!! Não vá
embora, não se afaste de sua família, Ellen. Somos sua família, amamos
muito você!
Ele diz e saio de seu abraço, tinha feito um esforço enorme para falar com
ele, vê-lo novamente.
— Bom, acho que eu disse o suficiente para você ficar de olho, preciso ir! Tô
muito cansada. — eu falo e passo por ele.
— Pra onde você vai? Pelo menos me diga.
— Procurar algum motivo para continuar vivendo, pra continuar seguindo em
frente. Aqui eu não tenho mais!
Eu digo já caminhando e o deixo parado na praça, como se não soubesse o
que falar, o que fazer, ou para onde ir… exatamente como eu estava.

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17
FOI TUDO PELA FAMÍLIA

São Paulo, 14 anos antes.

— O que foi, vovô?


Pergunto para meu avô e oro para que ele fale logo.
— Primeiro… quero que entenda que tudo o que eu te disser aqui, é para seu
bem. Sente-se, e escute seu avô!
— Tudo bem.
— Você precisa focar nos estudos para as provas da escola para cadetes. Mas
nos últimos meses, não te vi fazendo isso… e agora que está de repouso em
casa, mesmo tendo tempo para tal, não o fez.
— Ah, vô. Nem sei mais se eu quero ir pra Minas. Não quero ser piloto,
posso ser engenheiro, fazer outra coisa, até já falei com papai…
Eu digo e vejo vovô respirar fundo.
— Quer me ver morto? Quer envergonhar nossa família?
Ele pergunta em voz baixa e parecendo irritado, mas não entendo o porquê.
— Claro que não vô, só não quero deixar nossa família. Não quero deixar o
senhor, e nem a Ellen. Quero ficar em casa, não quero ir pra guerra, nem ficar
viajando a vida toda! Não posso deixar minha mãe como papai fez…
— Eu não criei um neto fraco, não posso ter criado… — meu avô resmunga
de repente após alguns segundos me olhando incrédulo.
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— Eu não sou fraco!!!


Digo envergonhado e de cabeça baixa. Não, eu não era fraco.
— Ah não!? E esse papo de que não pode deixar mamãe, papai, namoradinha
da roça, é o quê!? Eu não criei mais um Coverick para namorar roceira
pobretona! Essa menina nem é alguém digna pra você, garoto! Quer torrar
nossa fortuna com crianças xexelentas no meio do mato? Tá achando que
trabalhei minha vida toda para você acabar com meu patrimônio assim?
Quando você concluir seus estudos em Minas Gerais, tornar-se um militar, no
mínimo passar da patente de seu pai, aí sim, vai poder procurar uma mulher
de honra para casar e formar família. Mas essa aí, não! Não ouse envergonhar
a nossa família, não ouse a ser um fraco querendo a barra da saia da mamãe,
você já tem 14 anos, vire homem, honre a linhagem da família e não me
decepcione!
Meu avô diz e eu choro de tanta tristeza. As coisas que ele dizia eram
horríveis e faziam meu coração doer demais.
— Mas vô, eu gosto dela e ela gosta de mim. E não quero deixar minha mãe.
Não quero ir embora de casa! Quero ficar na minha casa! — Eu choro e ele se
levanta para ficar na minha frente. Preciso levantar o rosto para olhar pra ele.
— Vá até lá e faça o que mandei, ou nunca mais terei orgulho de você.
Deixará de ser meu neto. Será o único Coverick fraco que se acovardou! É
isso o que quer? Tem certeza que é isso o que você quer? Ser o elo fraco da
nossa família??? Termine esse namorico, mande essa favelada ir embora, não
ligo que você se aproveite de seus encantos um final de semana ou outro…
homem faz isso, é coisa de pele. Mas vai estudar, vai passar nessas provas,
será um militar brilhante como seus ancestrais foram, como eu sou, e como
seu pai é! E na hora de casar, vai me deixar orgulhoso, vai escolher uma
moça de posses, que não ande a pés descalços, que não tenha a boca suja, e
que não fale mais alto que você!!! Vai casar com uma mulher que abaixará a
cabeça, e essa roceira nunca será assim, todo mundo sabe disso. Esqueça ela!
Não seja fraco. Se me decepcionar, eu não terei mais neto! Ouviu bem,
menino???
Meu avô diz e eu saio correndo de lá. Eu estava horrorizado, eu não conhecia
o meu próprio avô.

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— Vai atrás dela, você vai se arrepender, se não for! Ela não teve culpa, não
sabia que o vovô ia chegar!!!
Luiza implora nervosa nervosa, colocando Dobby no chão, ele estava se
remexendo nervoso em seu colo por meia hora, demorou, mas ela perdeu a
paciência e ele se viu livre para começar a mordiscar a barra do lençol da
cama. Ontem, assim que Ellen se mudou daqui ela fez a mesma coisa, veio
até meu quarto para me encher, hoje depois que Pedro e Lari disseram que
iam até lá, ela me arrastou para meu quarto para me encher de novo, e eu
sabia que amanhã Luiza tentaria de novo. Ela é a pessoa mais decidida que eu
conheço, mas tinha uma forma de fazer ela parar. Só uma.
— Não vou fazer nada com relação á ela. Sai do meu quarto que eu quero
dormir.
Digo e ela faz cara feia pra mim.
— Já fez uma besteira dessas antes, já deixou a garota partir e depois se
arrependeu amargamente. Tay, não faça isso…
Ana Luiza quase grita e eu perco a paciência.
— Vou blo quear nossas contas conjuntas se você não sair do meu quarto
agora!
Eu digo e obviamente funciona. Luiza faz cara feia de novo, mas obedece,
sempre funciona, seu ponto fraco é grana.
Ela sai batendo a porta e eu volto para onde fiquei esses últimos dias, na
cama, me lembrando do meu avô. Não entendo o porquê que ele tinha que
partir daquela forma, não precisava ser assim, não era pra ser assim, ainda
não era a hora dele. Por que aquela garota não calou a maldita boca??? Meu
avô faleceu por sua culpa e eu sei que nunca mais vou me esquecer daquela
cena. Apenas acho que seria tão mais fácil se eu não á amasse… mas não
importava mais, nada disso, nada do que eu sentia, nada do que ela sente
importa mais, Ellen é passado, ela não significa mais nada para mim. Nada e
nem ninguém trará meu avô de volta, então eu não precisava de nada além de
trabalhar, e seguir a minha vida, infelizmente sem ele.
Tiro a medalhinha do bolso, ergo na frente dos olhos, e não paro pra pensar,
abro a última gaveta do criado-mudo onde só tem tralha e o jogo lá. Acabou

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pra mim.

De repente Pedro e Larissa entram no quarto sem bater.


— Nunca mais vou procurar por ela!!! — Larissa diz emburrada e Pedro
entra sorrindo.
— E aí, brother, como se sente!? — ele questiona.
— Tô legal. — respondo de forma seca e ele pula na cama.
— Acredita que ela expulsou a gente de lá??? — Larissa diz indignada.
— Nossa, sério, por quê?
Pergunto irônico e ela acha que eu realmente estava interessado em saber.
— Porque ela me perguntou se eu também achava que ela matou Juliano, aí
eu fui sincera, aí ela me mandou embora. Oras bolas...
— Você disse que também achava?
— Poxa, disse que não acreditava que poderia ser outra pessoa. Uai, Pedro
estava comigo, Laura contigo, quem mais poderia ser, se você até encontrou
o colar dela lá!? — Larissa diz andando de um lado pro outro. — Poxa,
sempre fomos amigas, ela faz uma merda, não me conta, vou até lá pra ficar
do seu lado mesmo assim, e ela me chama de falsa, fingida!? Sabe o que ela
disse? Que sempre invejei o relacionamento de vocês, que eu queria você pra
mim!!! Ellen está pirada! Disse que sou uma nota de três reais, que Juliano
tinha razão!
Ela fala sem parar e me seguro para não revirar os olhos. Coisa mais chata.
Mas com uma coisa eu fiquei encucado, Ellen não confessou nem para sua
própria melhor amiga. Por quê? Era a pergunta que não quer calar. Quem em
sã consciência comete um crime pela primeira vez, e não divide com
ninguém!? Se a gente não divide, o lance nos deixa maluco, e disso eu sabia
muito bem!
— Bom, vou dormir, vamos deixar o cara em paz! Tchau, brother, boa
noite!!!
Pedro que sempre dorme tarde arruma uma desculpa para comer Larissa e
tirar todo o estresse que a consumia.
— Tchau. Boa.
Eu digo e os dois somem. Quando penso que terei paz para remoer as minhas
dores sozinho, meus pais batem na porta e entram no quarto.
— Ontem você disse que não queria conversa, mas seus amigos acabaram de
sair daqui. É só com a gente que você não quer?
Ele começa e eu bufo.
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— Eles entraram aqui, falaram, viram que iam continuar falando sozinhos, e
foram embora. Não estou a fim!!!
— Mas você preciso se abrir, filho. Você não come desde que voltamos do
velório de se avô. — minha mãe começa melosa.
— Apenas não tenho fome.
Falo interrompendo-a e ela faz a mesma cara que Luiza fez pra mim.
— Preciso que vocês me deixem em paz. Perdi meu avô de um jeito bem
ruim, em uma situação dolorosa e horrível. Preciso que vocês me deixem
passar pelo luto, se é que um dia vou superar o que Ellen fez!!!
— Ela não tinha como saber que seu avô estava por perto, ela estava nervosa,
Tay! — meu pai fala e eu me sento na cama.
— Por que você a defende tanto??? Era seu pai! Ela matou seu próprio pai!!!
— beiro outro surto e ouço seu telefone tocar.
— Um minuto… — ele diz olhando pra mim, e atende. — Oi… eu vi… Você
está bem? Por quê? O que houve? Tudo bem, posso, claro! Tô indo. — ele
desliga e olha para minha mãe.
— É a Ellen.
— O que ela quer ligando pra você? — pergunto.
— Achei que não se interessava mais pela vida dela!
— Pela vida dela, não. Mas pelas ligações que ela faz para você talvez eu
queira saber… — eu falo e os dois olham para mim querendo me matar.
— Tô começando a achar que você tomou a decisão certa em deixá-la. Você
ás vezes é um babaca! — ele fala me fuzilando com os olhos. — Vou me
encontrar com ela, quer conversar comigo, parece que quer me contar algo
importante…
Ele diz para minha mãe e os dos se beijam.
— Vai e volta logo. Diga que nós a amamos. Muito provavelmente ela esteja
indo embora! Isabelle me mandou uma mensagem… traga ela de volta!
Minha mãe diz, meu pai diz que vai tentar e sai. Que merda era aquela de se
encontrar de noite com minha mulher? Ou melhor, ex-mulher? Paro de olhar
para a porta, engulo á seco minha raiva, e volto meu olhar para minha mãe.
— Seu pai é fiel á mim, e Ellen é fiel á você, não precisa se preocupar!
Minha mãe diz e eu rio nervoso.
— Ela tá livre pra ficar com quem quiser, até com ele! Não me importo!
Digo com raiva e minha mãe sorri.
— Ellen é uma mulher linda, e agora está solteira… seu pai é um gato, ambos
estão extremamente tristes. Se os dois resolverem ficarem juntos nessa noite
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fria e estrelada, eu os perdoarei!


Minha mãe diz e eu fico horrorizado.
— Está maluca??? Tomou naftalina quente???
— Só estou brincando, relaxe! Vem aqui, deixa eu fazer um cafuné em você
até você dormir. Sabe que vai se arrepender por tê-la deixado ir embora de
novo, não é!?
— Engraçado que já vivi essa cena contigo…
Digo enquanto ela faz carinho em minha cabeça.
— É porque você tem a mania de errar e nunca aprender, é por isso que
estamos nessa de novo! Mas pra mim não importa, quantas vezes você falhar,
se magoar, fazer bobagem, ficar triste… eu estarei aqui para o cafuné de
sempre, para sempre! É meu bebê amado!!!
Ela diz, beija minha face e eu durmo por ficar exausto de tanto chorar.

Acordo não sei quanto tempo depois, com meu pai me chacoalhando.
— O quê??? Droga!!! — pergunto ainda “dormindo”.
— Levanta!!! Já são quase sete da manhã, precisamos conversar. Desça para
o escritório, AGORA!!!
Ele grita e sai do quarto batendo a porta. Inferno!!!
Escovo os dentes, abro a porta, e dou de cara com Pedro.
— Bom dia.
— Bom dia, o que faz de pé tão cedo???
Ele questiona parecendo nervoso.
— Não sei, o que você faz? Nunca levanta antes das nove…
— Sei lá, vai aonde???
— Qual foi, Pedro? Tá me atrasando??? O quê que tu quer?
— Vi que seu pai saiu daqui. O que ele queria?
— Vai dormir cara, não me enche!!! É meu pai, ele entra no meu quarto só
quando quer alguma coisa!?
Eu digo e saio andando o deixando parado no corredor. Entro no escritório,
encontro Jon apoiado na mesa segurando uma xícara e meu pai andando de
um lado pro outro.
— Tem que ser muito sério para me acordar e me fazer levantar á força… —
digo olhando para os dois.
— Bom acho mais seguro você se acalmar e se sentar.
Jon resmunga tomando seu café, o líquido quente exalava uma fumaça
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espessa e charmosa.
— Fala de uma vez, Jonatas.
Falo, pois paciência me faltava, eu só queria minha cama e duvidava de que o
assunto me prenderia ou que me fizesse passar mal!
— Ellen me contou algumas coisas ontem…
Meu pai começa e sorrio com esse início. Que ótimo que perderam tempo
conversando e não curtindo a noite fria e estrelada.
—... uma delas é de que em sua última conversa com Juliano, ele lhe contou
sobre uma investigação que fez á respeito de nossa família.
— A minha vida em Manaus nunca foi segredo pra você, sempre soube que
Jon ficava atrás de mim. — falo e ele faz cara de paisagem.
— Não estou falando de seus assassinatos em série, Tay! Continue falando
alto, assim sua mãe escuta, descobre e enfarta. Dessa vez não terá mais
ninguém aqui para você culpar pela merda que você fez, pois a coitada da
Ellen foi embora da cidade, ontem!!
— Então acha que a culpa pela morte do meu avô, é minha?
— Se é sua não sei, mas da Ellen não é, e você sabe disso! Seu avô descobriu
tudo o que você passou e o que você fazia nas horas vagas, e por isso teve um
infarto. Acho que temos que concordar que quem soltou isso pros ares, pouco
importa! Coloca o ato dela como crime, mas o fato em si, e suas atitudes que
o decepcionaram, que o magoou e se sentiu culpado por eles, você ignora!!!
— Me chamou aqui para me culpar? Se foi para isso não perca seu tempo, eu
não acho que Ellen carrega a culpa sozinha. Eu a mandei calar a maldita
boca, ela se recusou, mas também sou culpado. Agora pare de falar nela, toda
vez que eu ouço você falar no nome dela tenho vontade de acabar com você!
Ellen pode sair da cidade, pode ir morar em outro continente, mas matarei
cada homem que ousar tocar nela, e isso não te exclui por ser meu pai!
Eu digo e vejo meu pai furioso. Ele se aproxima de mim, e cospe suas
palavras na minha cara. Estava realmente possesso.
— Acho melhor você calar essa boca, está nervoso porque seu avô faleceu,
terminou seu namoro, e acabou de saber que ela se foi, mas não vou tolerar
seu desrespeito para comigo! Tenho algo que você nunca ouviu falar: honra e
fidelidade. Amo sua mãe, ela é minha vida, e eu a respeito. Nunca saberá o
que é isso e como um relacionamento de verdade funciona porque só o que
sabe fazer, é comer vadias. Ellen merece um homem melhor, que a respeite,
que confie nela, que seja um companheiro apesar das circunstâncias e eu sei
que se eu não amasse outra mulher de corpo e alma como amo sua mãe, eu
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seria para Ellen, mil vezes melhor do que você foi, seria para ela o marido
que sou para sua mãe. Seria um homem, não um moleque infantil!
Ele diz e me seguro como nunca na vida para não socar o meu próprio pai.
Nessa hora, Jon se aproxima com medo de minha reação e meu ódio por ele
faz meu corpo todo tremer.
— Se eu quisesse socá-lo você não ia me impedir, Jon, então saia do meu
espaço pessoal! — digo ainda encarando meu pai, mas ele não se mexe. — E
você só está vivo depois de dizer tudo isso, porque ao te matar, eu partiria o
coração de minha mãe! Se puder me fazer um favor, nunca mais me dirija a
palavra! — eu falo e me adianto para sair do escritório.
— EU NÃO TERMINEI DE FALAR COM VOCÊ, SEU MOLEQUE
MIMADO!!! NÃO ME DÊ AS COSTAS!!! — ele grita.
— Qual é!? Tô tentando fazer o que consegui fazer com meu avô, te matar
por infarto. Assim minha mãe aceitaria melhor, e eu conseguirei o que quero
de você, distância!
Eu digo e continuo andando, mas ele segura forte em meu braço e posso
sentir sua raiva no aperto, pois começava á doer.
— Eu não quero papo contigo, você me odeia e quer me ver morto. Já entendi
e aceito isso. Mas temos algo aqui muito maior que nossas diferenças e
intrigas recentes. Você colocou o filho de um inimigo antigo dentro da minha
casa! — ele diz e eu olho para ele.
— Como é? — pergunto. Que papo de maluco era aquele???
— O que sabe sobre Pedro, Tay? — Jon questiona.
— Que já estudamos juntos do pré até a sexta série.
Digo, puxo meu braço do toque de meu pai e me afasto dele. Eu ainda queria
matá-lo de tanta raiva que eu estava.
— Então você o reconheceu. — meu pai afirma.
— Óbvio que sim, não tenho problemas mentais!
— Então por que raios colocou esse mini-verme aqui dentro?
Ele pergunta quase gritando e eu volto á me aproximar dele.
— Mini-verme…!? Dá pra falar logo!? Qual é?
— Ele é filho do cara que eu matei!!! O Carlos!!!
Ele diz algo que eu não sabia e fico com a cara no chão.
— Que história é essa?
— Não se lembra que uma vez ele te falou que eu ia morrer na guerra? Como
sempre se lembrou dele, mas não sabia de quem ele era filho???
Meu pai levanta as mãos pro céu e eu falo mais alto que ele.
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— Eu era pequeno, não sei se você se lembra, mas quando voltou pra casa eu
já estava na sexta série. Ninguém colou esse fato na minha cabeça, ninguém
falou pra mim de quem ele era filho, naquela época ninguém me contava os
detalhes “dos adultos”. No dia seguinte daquela briguinha eu já tinha feito as
pazes com ele, e até voltamos á lanchar juntos. Sempre fomos amigos! Por
isso o reconheci como amigo do colégio!!! — eu digo e ele volta a andar de
um lado pro outro.
— Então por que não o chama de Carlos? Ele mudou de nome? — Jon diz.
— Não. O nome dele é Carlos Pedro de Castro Júnior... da Silva Junior... algo
assim.
Respondo com uma cara patética porque aquela conversa estava sendo
patética.
— Ellen me disse que Juliano tentou convencê-la de se aprofundar nessa
história, não acha isso estranho? Não acha estranho o fato de Ellen jurar de pé
junto que não matou Juliano, Juliano jurar de pé junto que não matou o
cavalo, e nem bateu em Larissa...??? — meu pai questiona indignado.
— Está me dizendo que o filho do seu inimigo já morto, foi para a escola de
cadetes, cresceu comigo, continuou sendo meu melhor amigo, só para vingar
a morte do pai??? — aquilo era ridículo.
Meu pai me olha como se aquilo fosse óbvio e eu custo á acreditar.
— Isso é ridículo. Isso aqui não é uma novela!!!
— Sabe que se eu quiser posso descobrir não é!? Se ele realmente está
procurando vingança, tenho como saber, certo!?
Jon diz me olhando nos olhos com um semblante misterioso.
— Sim, Jon, sei muito bem da sua capacidade, sei que é incrível… aham… e
daí?
— E se estivermos certos de que a suspeita é verdadeira? O que você faria???
— ele continua e eu não paro para pensar ao responder.
— Coloquei o filho da puta dentro de casa, o mataria, é óbvio!
— Ótimo. Então venha escutar isso…
Jon me chama como se fosse um convite para ver um filme no notebook e eu
travo. Não podia ser…
Ele me oferece fones de ouvidos e logo o áudio se inicia.
— “... Sim, mãe, está tudo sobe controle, me passaram a informação de que
o cara estava falando o que não devia, atrasando meu lado, apaguei. E outra
que conseguirei atingir a família toda e por a culpa na jumenta… a próxima
é ela. Já tô comendo a loira-burra da melhor amiga dela, coitada, uma
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anta!!! Vou fazer aquele filho da puta pagar pelo que fez com papai…
— Matar a roceira não vai atingí-lo, se aproxima da caçula, mate a garota e
seu companheiro de serviço, o filho mais amado, o primogênito, aquela
merda daquela roceira não vai fazer falta pra ninguém. Logo Tay começa á
se relacionar de novo e esquece ela, você já me disse que ele não para com
mulher nenhuma. Vá aonde mais importa. Primeiro os filhos, depois a esposa
sem sal!!!
— Mãe, não posso matar ele, não consigo!
— Ah, é… é seu melhor amiguinho…
— Ele não tem culpa do pai que tem.
— Não importa!!! Quero esse garoto morto, ele principalmente!!! Ele, a
menina, a esposa, e depois o próprio. Quero essa família toda arruinada,
Carlos!!!
— Está bem mãe. Preciso sair agora… ele tá vindo. Tchau!
— Tchau, filho! Lembre-se, vou ficar bem depois que tudo isso terminar, me
livrarei dos remédios, da dor, da tristeza. Você vai salvar a mamãe! Essa
minha depressão maldita vai desaparecer, nossa vingança é o que me
manterá viva. Max Coverick vai pagar por ter tirado papai de nossas vidas,
eu preciso de você! Tudo pela família!
— Tudo pela família!
Pedro repete a frase de sua mãe e desliga.
Tiro os fones de ouvido e mais esse fato nas minhas costas me faz fraquejar e
me sentir cansado. Apoio a cabeça nas mãos com os cotovelos na mesa e
controlo a respiração.
— De quando é esse áudio? — pergunto ainda de cabeça baixa.
— Daquela noite, foi ele quem matou Juliano, quem encomendou a morte do
cavalo, e contratou os mesmo homens para bater em Larissa e soltar para ela
que tinha sido á mando de Juliano, não nessa ordem, claro. Ele fez tudo,
separei e nomeei a lista de áudios que você pode ouvir… aliás nem sei como
alguém confessaria por telefone tudo isso. Ele foi arquitetando tudo com o
apoio de sua mãe e recebia ligações constantemente dela. Está tudo aqui! —
Jon diz e faço que ‘sim’ com a cabeça.
— Larissa ou Laura estão envolvidas?
— Aparentemente não. Não ouvi nada nos áudios. Minha impressão é que
não. Também fui á fundo com relação á tenente e não descobri nenhuma
ligação. Nada. Eu e seu pai passamos a madrugada procurando qualquer
coisa, só descobrimos a sujeira dele. Desde criança sua mãe já enchia sua
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cabeça para essa vingança sem pé nem cabeça. Mas com relação á Laura, ela
só recebe ligações de amigos, também militares, papo sobre o amor platônico
que sente por você e estuda assuntos militares como novas aeronaves, novas
tecnologias, guerras civis, coisas sem sentido. Nada que a incrimine. — ele
fala e eu me levanto.
— Aonde vai? Precisamos combinar o que fazer… —eu pai diz e me esforço
para não ignorá-lo.
— Vou dar a vingança que ele tanto quer!
Digo e me retiro. Procuro por Pedro em seu quarto, mas vejo Larissa seminua
dormindo sozinha. Procuro pela casa toda e não encontro. Ligo em seu
telefone e só dá caixa postal.
— Mãe, viu o Pedro?
Questiono minha mãe enquanto ela cozinhava. Dona Isabelle pediu demissão
então ela fazia tudo sozinha, ás vezes com ajuda de minha tia.
— Sim. Ele levou as crianças para tomar sorvete na praça! — ela fala e eu
volto correndo para o escritório.
— Ele pegou a Luiza, Gabi e o Gustavo. Minha mãe disse que foram tomar
sorvete na praça.
Eu entro de supetão e já solto. Meu pai ameaça correr, mas o grito de Jon o
faz parar.
— Calma, amigo. Ele não sabe que descobrimos. É melhor que continue
assim. Deve apenas ter levado eles para tomarem um sorvete, mesmo. E
outra, não precisamos apavorar a família!
Jon diz, mas meu pai faz ‘não’ com a cabeça antes de falar.
— Não vou deixar aquele maluco com as crianças. Ele quer me atingir e tem
minha filha nas mãos. Tem meus sobrinhos.
— Ele parecia nervoso no corredor porque viu você sair do meu quarto, acho
melhor irmos até lá, mas concordo com Jon, a família não precisa passar por
mais essa! Vamos até lá, resolver, e voltar!
Digo e os dois concordam. Passamos por todos na casa controlando o
nervosismo e meu pai evitou a presença de minha mãe porque ela logo
saberia que havia algo de errado ao olhar para ele. Fomos até o parque e nem
sinal deles. Ligo de novo para seu telefone e quem atende é Laura.
— Tay? Cadê você? Escuta… tem uma…
— O Pedro está com você???
— O Pedro e as crianças. Elas estão bem… mas Pedro não…
— Jon, vá até o hotel em que Laura está hospedada, eles estão lá… — digo
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para Jon que dirigia e volto á falar com Laura. — O que está acontecendo aí,
Laura?
— Ele chegou com um papo meio estranho, muito nervoso, então eu o
apaguei, mas logo vai acordar, coloquei as crianças para jogarem no
computador do quarto, mas não consigo segurar ele por muito tempo. Ele...
ele estava dizendo que ia ter que matar “todo mundo”, Tay, que precisava da
minha lealdade. Fiquei com medo, ele está desequilibrado. Se ele fizer um
escândalo as crianças vão ficar assustadas, tem como vir logo???
— Tô á caminho. Faça o que for necessário para ele não sair do apartamento,
não importa o que seja. Não o deixe chegar perto das crianças, de jeito
nenhum, Laura, mas também não o deixe sair daí!!!
— Tudo bem, mas o que está acontecendo???
— Quando eu chegar, te explico tudo! Mantenha Luiza e as crianças bem
longe dele!
Digo e desligo. Jon pisa no acelerador e logo paramos na frente do hotel.
— Ele está no sofá.
Laura nos recebe na porta e a gente corre apartamento á dentro. Pedro estava
amarrado no sofá, e caído de lado. Ainda respirava.
— Ele chegou aqui dizendo que tinha que fazer um besteira, que foi
descoberto, que precisava fazer algo horroroso e que precisava de minha
ajuda, pois sozinho não ia conseguir... ele chorava baixo e me dizia coisas
sem sentido nenhum. Fiquei assustada por causa das crianças e bati em sua
cabeça. Eu já ia te ligar quando você ligou para ele. O que está
acontecendo??? — Laura fala com os braços cruzados e soando preocupada.
— Cadê as crianças??? — meu pai pergunta.
— Estão no quarto jogando com meu notebook. Chegaram aqui tomando
sorvete.
Laura diz e meu pai se retira á caminho do quarto chamando Jon. Eu os sigo e
vejo todos empoleirados na cama incrivelmente branca com os tênis sujos.
— Eita, que beleza… lindona saiu sem avisar, né!?
Meu pai se aproxima e os três levantam o olhar do computador como se
fossem gremlis.
— Mamãe deixou… e já sou bem grandinha, papai!!!
Luiza diz e meu pai a abraça forte, fazendo-a levantar da cama e virar o
notebook, que foi pego rapidamente pelos gêmeos.
— Por que o abraço, papi???
Luiza sorri surpresa e ver os dois assim, faz meu coração se apertar
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dolorosamente.
— Porque fiquei preocupado e eu te amo mais do que minha própria vida.
Não quero nunca mais que saia sem me falar, mesmo que sua mãe deixe, não
pode sair sem me falar nada nunca, nunca mais… você entendeu??? Tem que
falar COMIGO!
— Entendi, agora me solta… está me matando de vergonha! Está me
apertando... — ela diz vermelha.
— Não me importa! Você é a minha vida, e eu te amo muito! Agora Jon vai
te levar pra casa, está de castigo por ter saído sem me avisar, só para aprender
que nunca mais deve fazer isso! — meu pai solta Luiza no chão e ela fica
emburrada.
— De castigo quanto tempo? Só saímos para um sorvete e estamos na casa da
Laura, não fiz nenhuma besteira, tenha bom senso!
— Se discutir comigo…
— Blo queará meus cartões, já sei, já sei… vocês só falam isso. Vamos Jon,
vamos conversar sobre finanças no caminho, e até vou deixar você pagar um
hambúrguer para mim e para meus primos, porque esse sorvete me deixou
faminta!!!
Luiza sai do quarto, Jon diz para meu pai que os levará em segurança e que
volta logo, e sai do apartamento com Lulu e os gêmeos que choravam por ter
que parar de usar o notebook.
— E então? O que está pegando?
Laura questiona de novo minutos depois. Meu pai explicou tudo o que podia
e ela demonstrou surpresa o tempo todo.
— Nunca soube nada disso?
Pergunto e ela me olha séria demais.
— É claro que não!!! Nunca faria parte de algo tão doentio assim. Pelo amor
de Deus, esqueça aquele ‘Boa noite, Cinderela’. Eu amo você, querer te
matar, ou matar sua família não tem nada a ver com amor.
Laura quase grita, mas é meu pai quem responde resmungando.
— A última mulher que me amou e não foi correspondida, quase matou Tay e
minha esposa, e precisei acertar um tiro em sua têmpora.
— Tudo bem, mas não tenho problemas mentais. Não fui correspondida, e
estou na minha casa, de boa, sem perseguir e tentar matar ninguém. Foram
vocês que vieram até aqui. Aliás, você pode acertar um tiro em minha
têmpora se quiser, não poderei te impedir, estou bem na sua frente capitão,
não perseguindo seu filho. E de nada!!!
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Laura diz e sai da sala. Eu e meu pai ficamos em silêncio até o babaca
resmungar de dor na cabeça e acordar assustado.
— Tudo pela família, não!? — meu pai resmunga e Pedro revira os olhos.
— Sem papo furado, acabe logo com isso, se eu ficar vivo, vou matar você,
então acabe logo com isso…
Pedro diz e meu pai se agaixa em sua frente.
— Tá com pressa? Passou a vida toda planejando essa vingançinha ridícula e
agora está com pressa. O que te fez pensar que sairia vivo dessa brincadeira
patética?
— Quem disse que pensei que sairia vivo? Se eu me preocupasse com minha
própria vida, não teria virado um assassino de aluguel assim como seu filho!
— Normalmente, assassinos de aluguel são mais inteligentes, nunca
deixariam rastros. Como você fica de papinho com sua mãe no telefone, não
pensou que seria descoberto? Você é burro ou o quê!?
— Eu consegui virar amigo íntimo de sua família, dormir debaixo do teu teto,
consegui tirar sua filha de dentro de sua casa, debaixo de suas asas, e eu é que
sou burro??? Só não a matei porque não sou um monstro igual á você. Era
pra eu já ter assassinado toda sua família enquanto dormia, não fiz porque
não mato inocentes como você, você tem esse dom, eu não!!!
— Não seja patético, matou Juliano a troco de nada!!! Como não mata
inocentes!?
— Era parte do plano, uma morte necessária. A discórdia entre a roceira e seu
filho, me ajudaria. Ele decidiu não matar, o matei porque tudo o que ele
queria era Juliano vivo. Fazer ele ficar com raiva, ficar triste, ficar desolado,
era fazer você sofrer por ver seu filho sofrer. Era isso ou matá-lo de vez e eu
não conseguiria, sempre foi meu melhor amigo. Tudo o que fiz, foi para
atingir você, ver sua família desestabilizada, assim como destruiu e
desestabilizou a minha!!! Eu vim para causar o seu caos, e quero a sua vida,
como você tirou a do meu pai!
Pedro diz cada palavra do seu pequeno texto como se sentisse dor. Eram
palavras em formas de lâminas, pareciam doer, ferir.
— Você é só uma criança perdida… nem sabe o que está fazendo…
Meu pai concluí depois de um tempo olhando Pedro nos olhos.
— Eu vim disposto á matar você por ameaçar minha filha, mas… estou com
pena de você, você é uma criança coitada que tem uma mãe problemática.
Meu pai diz e Pedro cospe na cara dele. Na mesma hora meu pai tira sangue
de sua boca e Laura retorna.
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— Vou relevar isso também sua cria de verme. É um verme como seu pai era.
Mas acho que você ainda tem conserto!!!
— NÃO FALA DO MEU PAI COM ESSA SUA BOCA SUJA, SEU
ASSASSINO DOENTE!!! MEU PAI ERA DIGNO, UM HOMEM
TRABALHADOR, NÃO MERECIA MORRER!!! ERA UM HOMEM DE
UMA HONRA QUE VOCÊ NUNCA TEVE!!!
— Por acaso chegou á conhecer seu pai, Carlos? Hum??? Parece que não!
Seu pai sempre foi invejoso, sempre foi corrupto, por diversas vezes soube
que tentou me prejudicar, sequestrou Hella, á manteve em cativeiro junto
com uma ex-amiga fuzileira que tentou matar Tay primeiro atropelando-o, e
depois o baleando. Tay escapou por pouco! E outra, o matei por legítima
defesa, eu entrei na casa onde Hella tinha sido levada por ele e o próprio
sacou uma arma para me impedir. Só me defendi!
Meu pai dizia enquanto Pedro ficava negando com a cabeça.
— Meu pai não fez nada disso… você é um mentiroso de merda!!! Meu pai
era decente!!! Era um pai melhor do que você!
— Não sei como Carlos era como pai, mas como militar ele era uma bosta!
— VOCÊ É UMA BOSTA!!! VOCÊ O MATOU POR INVEJA!!!
Pedro grita novamente se descontrolando.
— Eu não acredito que sua mãe alimentou esse ódio em você, escondendo
noventa por cento da história. Não acredito…
Meu pai se levanta parecendo absorto. Tiro minha arma das costas já com
silenciador e fico distraído, balançando de um lado pro outro simplesmente
não pensando em nada.
— Cadê seu telefone? Vou provar pra você o que estou dizendo!!!
Meu pai de repente fala, pega o celular de Pedro no sofá e começa á mexer.
— Não precisa provar nada, vamos logo com isso, quero ir pra casa…
Digo e os três me olham como se eu tivesse falado alguma asneira. Não sabia
pra que tanto assunto, tanto blábláblá, era só dar um tiro na cabeça do filho
da puta e ir embora. Pronto. Meu pai de repente coloca o celular no viva-voz
e podemos ouvir os bips da chamada.
— Alô, filho? Tem novidades?
— Pedro está dormindo… — meu pai diz.
— Ah, tá. E então…!? Como ele está? Se comportando direito?
— Não como você queria. Como você faz o menino acreditar que Carlos era
um homem digno? Sei o que você o mandou fazer… acha que seu filho sairá
daqui vivo? Acha que conseguiria tirar a vida de alguém de minha família?
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— Não me importa como ele sairá desse lugar. Vivo ou morto, tanto faz,
contanto que ele mate você! Se meu filho morrer, que ele leve você junto, seu
demônio!!! Só assim poderei viver em paz! Carlos deveria ter matado aquela
égua da tua esposa, aquela nojenta! Vocês merecem toda a desgraça do
mundo! O que é um sequestro, perto do que fez com ele?
— Eu só me defendi. Pare de alimentar esse ódio contra minha família. É seu
marido quem não prestava!
— Carlos sempre foi melhor que você em tudo! Você o matou por inveja
dele! Você matou meu marido… se eu não estivesse tão doente, mataria você
com minhas próprias mãos! Você é um demônio… se meu filho não matar
você, a vida vai…
Ela diz e meu pai desliga, prestei tanta atenção no ódio que a mulher nutria
por ele que nem vi que Pedro chorava. Como meu pai disse, Pedro era só uma
criança perdida, foi enganado pela própria mãe que pelo jeito era maluca, e
estava doente, cresceu ouvindo uma história que na verdade era outra e
naquele momento se sentia como eu: UM NADA.
— O que me diz disso… hum? Ainda quer me matar?
Meu pai pergunta se abaixando de novo. E eu volto á revirar os olhos. A
campainha toca, Laura corre atender, Jon entra novamente no apartamento, e
também começa a assistir a cena melodramática que Pedro fazia.
— Não, não quero… minha mãe me enganou!!! Me perdoa!!! Eu ouvi uma
história diferente a minha vida toda…
Ele diz chorando e meu pai parece beirar o choro por causa daquilo. Jon tinha
uma sobrancelha erguida para a cena, e Laura tinha uma das mãos no rosto,
como se quisesse pegar Pedro para ninar e dizer que tudo aquilo ia passar.
— Estou disposto á te ajudar, já disse que não tenho raiva de você, não
consigo ter, apenas tenho dó por tudo o que você passou… vamos pra casa,
fique com a gente, e deixe eu ser o pai que Carlos nunca foi pra você! Ou
nunca pôde ser porque eu o matei. Eu juro que foi por legítima defesa, mas
interrompi sua vida e a possibilidade de ser alguém melhor, porque ele estava
ameaçando a minha esposa, mas deixa eu pagar isso dando a oportunidade de
você ser melhor, melhor que eu, melhor que seu pai!!!
Meu pai diz e Jon e eu nos entreolhamos embasbacados. Mas que porra era
aquela que meu pai estava fazendo???
— Max…
Começo, mas ele ergue uma mão para me calar. Jon me olha, sorri como uma
criança, mas eu não entendo.
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— E aí, Pedro!? Você aceita??? Aceita que eu seja seu pai postiço!? Vamos
esquecer tudo isso, vamos até a sua mãe para também tentar fazê-la entender,
e seremos uma família… vou ajudar com seus remédios e com tudo o que ela
precisar, prometo isso!!!
— Aceito. Se o senhor verdadeiramente me perdoar por tudo o que fiz aqui,
tudo…— Pedro diz chorando demais.
— Claro que perdoo. Laura solta ele para eu dar um abraço nessa criança
perdida!
Meu pai se levanta sorrindo feliz e se afasta se aproximando de mim, Laura
estranha por um momento, mas vai toda emocionada tirar as cordas de Pedro.
Nesse momento Pedro age rápido e grita, puxando a arma que Laura sempre
carregava nas costas para onde ia: — VOCÊ NUNCA SERÁ MEU PAI, SEU
ASSASSINO DOENTE, EU ODEIO VOCÊ!!!
Ele tira a arma dela, aponta para a cabeça de meu pai, e meu pai me olha
sorrindo e dando a permissão. Obviamente sou muito mais rápido e Pedro cai
morto na sala clean de Laura.
— NÃOOO!!!
Laura grita e corre para socorrê-lo. Ela chora de soluçar como se seu mundo
tivesse desabado, afinal, ela o amava pelo jeito, tanto quanto me ama.
— Não precisava… eu ia desarmá-lo, eu ia… eu ia… eu ia desarmá-lo… eu
ia…
Laura põe a cabeça de Pedro no colo e fica se balançando pra frente e pra
trás, desolada.
Vou até seu quarto, pego sua grande mala e jogo perto de seus pés.
— Precisamos nos livrar dele… coloque ele aqui dentro.
Eu digo, na mesma hora ela olha pra cima para me olhar nos olhos, e depois
volta seu olhar novamente para o defunto.
— Eu te amo… eu te amo, me desculpe… me desculpe…
Laura beija seu rosto frio por diversas vezes, fecha os olhos com força, e
começa a colocar Pedro na mala como mandei. Ela tinha um cuidado e uma
delicadeza que não lhe pertenciam. Só estava escondendo um defunto com
tanto amor, porque o defunto era seu amigo, porque normalmente não era
assim que ela fazia. Laura chorava de dar dó, soube disso porque meu pai e
Jon, a olhavam com ternura, e tristezas sinceras; porque eu mesmo, não sentia
nada.
— Somos um trio… somos um trio…
Ela resmunga baixo com suas mãos trêmulas ao fechar o zíper da grande
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mala. Sentada no chão estava, sentada no chão permaneceu.


— Trouxe o laptop? — pergunto a Jon.
— Sim, deixei no sofá.
— Dá pra fazer as câmeras de segurança terem um pequeno probleminha???
— meu pai questiona e Jon entorta a cabeça.
— Só se sua transmissão for online. Assim posso derrubar.
— Então faça isso… quero ir dormir. — eu digo e me aproximo de Laura. —
Laura, vá lavar esse rosto, ninguém pode te ver assim! Faça as malas e vamos
pra chácara! — eu digo e ela me olha com raiva.
— Vai pro inferno. Não vou á lugar nenhum!!!
— Levanta. — eu digo novamente e ela obedece.
— Vá lavar esse rosto e fazer as malas.
Eu falo olhando em seus olhos e ela se retira.
— Como conseguiu isso? — Jon me questiona e não respondo.
— Já sabiam que eu ia matá-lo. Como conseguiram isso?
Eu devolvo a pergunta e meu pai que responde.
— Ele merecia morrer. Eu só precisava de um motivo mais forte.
— Você me usou para matar meu melhor amigo!!! Fez ser legítima defesa só
para eu me sentir melhor…
Digo fingindo indignação e ele e Jon sorriem.
— Pedro é falso. Ia me matar de qualquer forma, vai por mim, ele já tinha
sido totalmente envenenado por sua mãe. Fiz a proposta de verdade, apesar
também de ter sido um teste. Um teste que vi os resultados na hora em que
ele começou á chorar. Se a gente o soltasse, ia continuar com seu plano.
Garanto isso á você. Mas se está revoltado, vingue-se de mim! Não perca a
oportunidade! — ele fala e Jon ri.
— Não. Não temos outra mala grande!!!
Eu falo e os dois caem na risada. Não entendia como estavam tão felizes.
Pareciam aliviados, matando a saudade dos velhos tempos. Deus... vamos
todos para o inferno!
Jon conseguiu dar a pane nas câmeras de vigilância do hotel, que graças aos
céus eram feitas por transmissão online, Laura desceu recomposta com as
malas e uma bolsa de mão parecendo uma musa pop star, sorriu para a
atendente, paguei a sua conta, mas assim que fechou a porta do hotel atrás de
si, retirou a “máscara” e deixou cair uma lágrima grossa por baixo dos
enormes óculos de sol. Demos fim de forma eficiente no corpo, paramos no
Mineiro's para encher a cara, e depois fomos direto para a chácara. Assim que
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saímos do carro, Jon toca meu braço deixando meu pai e Laura caminharem
na frente.
— Preciso te perguntar algo. — ele fala.
— Pergunte.
— Quer que eu encontre a menina Maia?
Ele fala em segredo e eu olho para o lago antes de responder.
— Não Jon, definitivamente, não.

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18
CHALÉ

Engraçado que se eu soubesse o quanto pegar um carro e desaparecer, seria


libertador, eu podia jurar que tinha feito isso antes. Saí de Barbacena fazia
mais de 22hrs. Em pausas por milhares de hotéis, música alta no carro para
eu não conseguir ouvir minha consciência culpada, fast foods “á doidado”,
paradas esporádicas para ver o pôr do sol e comemorar um novo recomeço,
fotos de todas as paisagens maravilhosas, enfim, durante essas 22hrs, eu vi a
minha vida renascer. Acredito que me sentia bem, apesar de tudo, mas só me
sentia completamente realizada, quando o carro estava em movimento. Cada
vez que me afastava mais do estado de Minas Gerais, mais meu espírito
vibrava feliz dentro de mim. Não, não estou dizendo que esqueci aquela
noite, jamais esquecerei, só estou dizendo que aceitei a minha culpa e vou
viver com ela, a morte de seu Luis já faz parte de mim e do que sou, então
apenas aceitei. Assim que entrei no estado de São Paulo, enquanto ouvia uma
poesia em forma de música que falava algo sobre “quando eu for embora”, eu
disse em voz alta para mim mesma, que eu estava bem, que eu ficaria bem, e
que tudo aquilo ia passar um dia, pois eu tinha meu bilhete para um longo
caminho. Se até a música dizia, — “I've got my ticket for the long way
around…”— por que diabos eu ia discordar?

Demorou um pouco para a ficha cair, mas quando caiu eu já estava no fim de
Rio Grande do Sul. Eram nove da noite quando resolvi parar em um hotel
charmoso que tinha cara de chalé. Nesse meio tempo desliguei meu telefone
para não receber ligações de ninguém, pois além de prestar atenção na
estrada, eu tinha que pensar na minha vida, e no que seria dela daqui pra
frente, e com ligações alucinadas de minha mãe, tio Renan, e provavelmente
tia Hella, não conseguiria fazer isso.
O hotel se chama pousada chalés, não era um só chalé, mas vários de
diversos tipos. Hospedei-me em um, no meio do verde, estilo minha cabana,
era incrivelmente linda, tanto quanto incrivelmente cara, e por esse ‘pequeno’
motivo pretendia ficar somente essa noite. Tinha TV a cabo, WIFI, frigobar,
rede na varanda, e uma cama confortável… mais do que eu precisava, e

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muito mais do que eu merecia. Tratei logo de tomar um banho, colocar


moletons confortáveis, pôr o celular para carregar e rever as fotos. Pensar em
qualquer outra coisa que não fosse em Minas, que não fosse nele.
Resolvo algumas pendências da clínica, leio e-mails do trabalho, programo
uma resposta automática para meus antigos clientes — “Estou com
problemas pessoais e por isso precisei fechar”. Mesmo assim indiquei a
clínica de uma amiga que eu conhecia, e todos ficaram felizes para sempre,
principalmente a Lu. —, mando uma mensagem cheia de carinho para
Vicente e colaboradores, e faço alguns pagamentos. Eu precisava de um lugar
fixo para ficar e trabalhar, porque muito em breve o dinheiro acabaria, mas
em contrapartida, parar em ‘lugar nenhum’ estava sendo um sonho.
Mando um e-mail para a imobiliária, e oro para que respondam amanhã até
antes das dez da manhã, horário limite de minha permanência aqui. Fecho o
notebook, ligo o celular e logo após a tela inicial aparecer, mensagens e
ligações pipocam na tela pedindo urgência para serem lidas. Minha mãe,
Renan, e tia Hella, estavam preocupados, ligaram, mandaram mensagens, e
até e-mails na caixa pessoal do telefone. Mas foi uma mensagem que me
chamou atenção, uma não, mas três. Rolando a lista para baixo, vejo os
SMS’S de Larissa, eram os últimos. Respiro fundo, abro, e pedidos de perdão
quase pulam da tela.

“Oi, olha, sei que tu me odeia… mas preciso pedir perdão! Fui muito injusta
com você… descobrimos que foi Pedro quem arquitetou tudo, ele e apenas
ele. Eu juro que não sabia de nada. Ouvi os áudios dele, a mãe dele é muito
bizarra!!! Agora que descobriram, ele desapareceu, por favor me
responda…"

— Desapareceu, ou foi morto, também!?


Resmungo e vou para a próxima mensagem.

"Ellen, por favor… tô tentando te ligar e não consigo. Me retorna. Me


desculpa, somos melhores amigas, você é tudo o que eu tenho! Eu estava
cega, Pedro encheu minha cabeça, eu estava apaixonada. Eu te amo amiga,
me responde!!!"

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— Vadia!
Resmungo de novo e apago a terceira sem ao menos ler. Eu não precisava
disso. Não precisava dela. Se fosse realmente minha amiga tinha ficado do
meu lado, mesmo que toda a merda da situação indicasse que fosse eu a
assassina, e não dar moral pra macho que tinha acabado de conhecer.
— Acabou!!!
Digo, e adiciono seu número na lista “negra” do telefone, impedindo-a de me
enviar mensagens, ligações, ou qualquer outra coisa. Paro de pensar nela e
ligo para minha mãe. Aviso que estou bem, mas não falo demais. O telefone
fazia um eco muito doido, provavelmente Jon já estava “xeretando” minha
vida, então logo desligo sem nem dar noção de minha localização, apesar de
que se ele quisesse, conseguiria. Afinal não ando com dinheiro, só com meu
cartão... para me rastrear, era rápido e fácil.
Deixo o telefone e notebook carregando, tomo um leite com chocolate de
caixinha do frigobar, e me deito para descansar, eu estava tão exausta, mas
tão exausta, que me sentia bem por isso. Coloco o celular para despertas ás
07:00hrs, e apago praticamente na hora. Graças á Deus.
Acordo me sentindo mal, olho na tela do telefone e eram 04:00hrs. Minha
barriga “gritava” alto, minha cabeça latejava, e de repente o líquido que
dançava em minha barriga, subiu de supetão para minha garganta. Corri para
o banheiro e quase não deu tempo, todo o chocolate de caixinha, foi pro ralo,
ou melhor, para a privada. Inferno. Termino a sessão tortura, fecho a tampa,
dou descarga, e me estico para pegar a caixinha e verificar o vencimento.
— Em dia, se não é vencimento, só pode ser… não…

Abro o calendário do celular e minha pressão arterial sobe ao constatar o


atraso que em mim, nunca aconteceu. Duas semanas contadas. Tay conseguiu
me deixar prenha, assim que tirou a minha virgindade, qual é!? Ele é um
coelho??? Não podia ser… não podia ser… Ok, podia, eu estava fértil!
Permaneço resmungando até o dia nascer — resmungando e chorando muito.
—, segurando o aparelho celular nas mãos, e tentando decidir se ligava ou
não, para minha mãe. Pego o carro assim que deu 06:00hrs, paro na primeira
farmácia que encontro, e volto pro chalé. Era só um pouco de xixi na ponta
do papel, nenhum bicho de sete cabeças. Era simples, era fácil, mas depois
disso, dependendo do resultado, tudo ficaria difícil e complicado.
Faço o teste, espero o que me pareceu uma eternidade, e as duas benditas
fitas rosa apareceram para me dizer que eu estava, fodida, muito ferrada,
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muito sem rumo, extremamente perdida, e sem outra alternativa á não ser…
não.
— Não.
Resmungo choramingando, me jogo na cama e cubro minha barriga com as
mãos. O normal seria chorar, certo? No caso de uma moça que se aventurou
mundo á fora, entrou para o grupo de privilegiados “sem fronteira”,
desapegada do passado, a mais nova mulher de alma livre, não poderia ficar
feliz por engravidar bem agora, certo? Precisava me lamentar, ligar correndo
para a mamãe??? Bom, naquela altura do campeonato eu não tinha mais ideia
de nada, eu nem sabia mais o que eu estava fazendo em uma pousada no Rio
Grande do Sul!!! Como vai ser minha vida depois de hoje???
Eu acabei de deixar toda a minha vida para trás, carregando comigo somente
roupa e documentos, matei um velho de infarto, meu namorado de infância
que dizia me amar, disse que era para eu nunca mais procurá-lo em hipótese
alguma, e me mandou embora de sua vida após me engravidar e me “chamar
de assassina”, e cá estou eu, recomeçando, não do zero como eu pensava, ou
como seria o melhor pra mim, não, eu recomeçava minha vida, trazendo
dentro de mim, um serzinho puro que nunca mais me deixaria esquecer o que
fui, o que fiz, da onde eu vim, e tudo o que passei. E isso era tudo o que eu
não precisava naquele momento.
Eu estava completamente ferrada.
— Não se lamente Ellen Maia, deveria ter usado camisinha! Não, espera,
você também queria dar um filho a ele. É você queria, ele queria, pois quase
te fazia plantar bananeira depois de todo o coito. Era maluco para entrar em
outros orifícios, mas só entrava no clássico porque queria um filho seu…
você é uma idiota!!!
Fico resmungando e choramingando novamente até ás oito da manhã, horário
que provavelmente o restaurante já estava servindo o café, e ao me lembrar
disso, sigo meu caminho até lá. O celular permanecia em minha mão, eu
lutava comigo mesma pensando em: “Ligar, ou não ligar, eis a questão.”
Primeiro, minha mãe tinha que saber, ela será avó. Segundo, ela não merecia
uma “dor de cabeça”, não fora ela quem “abrira as pernas”. Terceiro, eu
precisava de apoio, em uma hora dessas seria sensato e melhor para mim, me
faria bem. Quarto, se eu precisava tanto de minha mãe para me ajudar com os
obstáculos que passo em minha vida, e que ainda irei passar, por que raios fui
embora de casa??? Quinto, minha mãe quando descobrir, e um dia ela vai
descobrir, ficará extremamente decepcionada comigo.
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— Deus, os prós e contras nunca acabarão. Nunca!!! — resmungo.


Para ser taxada de infantil, mimada, e bobinha, aí vai minha conclusão a
respeito desse teste positivo para a gravidez: eu estava morrendo de medo,
super insegura, confusa, chateada, triste, me sentindo sozinha e a mulher mais
feliz do mundo por carregar o fruto do amor que vivi com Tay. Fruto do
único homem que já amei em toda a minha vida. Me julguem!!!
Tudo o que consegui foi comer um mamão e tomar um suco de laranja
natural. Nada além disso. Depois de me sentir saciada, saio correndo do
restaurante para não vomitar por causa do cheiro de ovos mexidos, que de
repente começava á me incomodar. De barriga vazia era uma coisa, de
barriga cheia, aguentar cheiro de ovo, era barra! E eu nem sabia que podia
sentir enjôo imediatamente após saber que estava grávida. Loucura. Eu queria
dar uma volta, digerir as duas linhas rosa no papel, pensar sobre o que fazer,
decidir se ligaria para minha mãe, e pensar, pensar, pensar, levando em conta
que em minha nécessaire, tinha além de absorventes intactos, também
analgésicos para segurar a barra.
Caminho pelo verde sem saber aonde daria, assim como desde que saí de
Minas. Pelo jeito não seria diferente aqui, como nos últimos dias, eu estava
"apenas"… perdida.
Chego em um lago repleto de cisnes brancos e negros, e respiro fundo. Sento-
me no gramado e faço o que estava programado desde então… começo á
pensar em tudo, principalmente no quanto minha vida mudou drasticamente
de um dia pro outro.
— Se pensar demais, pode dar um apagão aí dentro!!!
Um rapaz me puxa de volta para a realidade á força, não mais que de repente.
Sua aproximação só me deixa mais estressada. Era um rapaz bonito, atraente,
barba mal feita, vestia uma calça jeans, blusa de frio, tênis, e também
carregava uma enxada. Parecia ter a minha idade ou um pouco mais. Ele se
aproxima, começa sua cantada cafona, e fica em pé do meu lado olhando para
o lago, assim como eu olhava.
Logo que olho pra cima, ele na mesma hora olha para baixo, e nos encaramos
por um momento.
— Vai me desculpar, mas quero ficar sozinha!
Eu falo e ele parece não entender, pois se senta ao meu lado.
— Me responda duas perguntas e eu deixo você sozinha!
Ele diz e eu concordo quase protestando.
— Por que está no Rio Grande do Sul sozinha? Sei que não é daqui…
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Conhecendo? Turistando? Trabalhando?


— Estou fugindo!
— De quem???
— Essa é a segunda pergunta?
Pergunto irônica e ele sorri me mostrando seus dentes brancos e perfeitos.
— Não era, mas agora pode ser. Fiquei muito curioso!
Ele sorri olhando para mim e depois volta á fitar o lago.
— Estou fugindo da minha vida, de um passado ruim!!!
Digo e me levanto para procurar outro lugar para pensar.
Como um cavalheiro, ele também se levanta e fico curiosa.
— O que faz com essa enxada?
Pergunto e ele olha para ela enquanto coçava a cabeça, pensativo e sem
graça.
— Bom, estava plantando rosas ali atrás… por isso te vi!
— Trabalha aqui?
— De certa forma.
— O que significa, de ‘certa forma’?
Questiono de novo e ele sorri novamente.
— Apenas gosto de plantar, gosto da terra, mas é só um hobby.
— Eu também. Gosto da natureza, me faz muito bem! Foi bom falar com
você, vou nessa… — falo e viro as costas.
— A segunda pergunta seria ‘O que você faz’! Pode responder?
— Sou veterinária.
Digo e não espero mais nenhuma pergunta. Depois de um tempo, assim que
consigo me encontrar, acho o caminho para meu chalé, e decido arrumar a
bagunça para deixar aquele paraíso. Quando termino, alguém bate na porta e
ao mesmo tempo ouço meu celular tocar, era a minha mãe. Fico tensa, paro
pra pensar, e decido atender a porta. Se for importante ela retornará. — É o
tal do jardineiro.
— Oi? — falo.
— É… oi! Eu decidi vir perguntar se gostaria de caminhar um pouco. Aliás,
me chamo Yan. Não nos apresentamos direito. Eu…
— Escuta, estou ocupada, não tenho interesse em flertar agora! Minha vida…
— Não me interesso por você. Tenho namorada! — ele me interrompe, é
direto e eu travo.
— Apenas vi que você estava triste, às vezes conversar ajuda. E de qualquer
forma, quando você disse que era veterinária, fiquei interessado nos seus
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serviços, estou precisando de um, urgentemente, e como você já está aqui…


— Como soube onde eu estava hospedada? Você planta flores, por que
precisa de uma veterinária??? — pergunto curiosa e ouço meu telefone tocar
novamente.
— Na verdade eu sou o dono da propriedade que gosta de plantar flores! E
soube onde você estava porque te vi sair daqui, de manhã.
— Estava me seguindo?
— Sim e não. Não propositalmente.
Ele responde e parece nervoso com a situação. Meu telefone toca de novo e
decido atender.
— Me dê um minuto, por favor!
Falo, deixo a porta aberta, e atendo minha mãe.
— Fala mãe…
— Oi. Caramba! Por que não atende essa merda!?
— Mãe, eu saí daí porque queria paz, se lembra!? Fala logo, o que houve…!?

— Nada de mais, só me deu um negócio estranho aqui, no coração, uai,


fiquei preocupada!
— Mãe, eu estou maravilhosamente bem, em uma pousada incrível, e quero
paz! Deixa que eu te ligue, por favor!
— Tá bem, mas se demorar demais para dar notícias faço seu tio ir te
buscar!!!
— Tá bem! Beijo! Te amo, mãe!
— Você está bem mesmo, Ellen??? Tô sentindo você tão abatidinha…
— Consegue me ver abatida pelo telefone, maluca? Eu tô bem!!! Juro que tô
mãe! Qualquer coisa ligo pra senhora! Tem um funcionário da pousada aqui
na porta! Preciso desligar…
— Tá bem! Te amo princesa da mamãe!
Minha mãe diz com voz melosa e eu desligo sentindo meu coração sangrar.
Devia ter aproveitado e contado tudo. Mas essa criatura na porta tirou essa
possibilidade…
— Oi, então, não vai dar, minha mãe me atrasou aqui, preciso fazer check-
out, na recepção, senão, pago multa… preciso ir embora!
Volto para a porta e vejo Yan mexendo em uma muda de mato no chão. Uma
pequena florzinha brotava dali e isso chamou sua atenção.
— Não se preocupe, ninguém vai multar você!
— Como vai me garantir isso!?
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— Sou o dono da propriedade! Já te disse isso.


Ele diz e infelizmente o meço dos pés a cabeça.
— É, sei que deveria estar de terno e gravata. Mas não gosto. Vamos ou não?
Reviro os olhos sem querer, e fecho a porta atrás de mim.
— Então, qual seu nome? - ele pergunta depois de um tempo, andando em
silêncio.
— Ellen.
— Ellen, então… você disse que é veterinária, e eu preciso de uma. Procura
algum emprego no momento? Disse que está fugindo, então, não deve querer
voltar pra casa tão cedo…
— Bom, pretendo procurar!
— Você me parece sem rumo…
— Sim, estou sem rumo, mas é uma situação provisória! Vou procurar um
lugar para me estabelecer, uma casa ou apartamento para alugar, enfim…
— Aqui o que mais temos é lugar para ficar, como pode ver! Preciso de um
profissional, e você não tem para onde ir, acho que podemos nos ajudar!!!
— Não sei se quero ficar no Rio Grande do Sul. Acho que preciso ir para
mais longe!
— De que cidade você vem???
— Minas.
— Bem, mais longe que Bagé, só saindo do país!
Ele diz rindo e eu concordo, deveria estar com cara de boba para seu sorriso
bonito, afinal,Yan era charmoso, mas Tay era mais! Aff…
— Não seria má ideia.— resmungo e ele me olha sério.
— Cometeu algum crime?
Ele para e me olha com curiosidade. O tempo começava á esfriar, por isso me
abraço e ele olha para meu corpo, parecendo entender minha atitude.
— Não. — minto.
— Bom, a minha proposta é a seguinte: trabalhe para a pousada, pago seu
salário de acordo com a tabela, te dou um teto, e obviamente todas as
refeições são por nossa conta! Vai sair pelo mundo procurando por isso, aqui
você já pode ter, não precisa fugir para mais longe, terá nossa discrição, e
proteção. A não ser que saia nas manchetes policiais por matar criancinhas, o
que duvido muito… temos cavalos, patos, cachorros, gansos, cisnes e outros
diversos animais que nesse momento estão ficando doentes demais e eu não
sei o porquê… resolva meu problema e eu resolvo o seu, faça uma
experiência, e se não gostar, pode continuar procurando! — ele fala e eu acho
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a proposta tentadora.
— Por que apenas não liga para um veterinário nos classificados???
— Porque as consultas avulsas são caras demais aqui no sul, pra mim não
vale a pena, preciso de um doutor fixo aqui, mas é difícil encontrar. Bagé é o
fim do mundo, ninguém viria até a cidade para morar! Eu tô sempre
precisando de um veterinário.
— Bom, a proposta é tentadora, mas tenho algumas condições! — eu sou
ousada e ele para de novo para me olhar nos olhos.— Não quero assunto
comigo, não quero perguntas sobre minha vida pessoal, e nenhum registro
empregatício. Não só você, mas que essa regra se aplique a todos os
funcionários. Não vim para fazer amizade, aliás, depois de tudo o que passei
nos últimos dias, tudo o que quero é trabalhar e trabalhar. Aceito o trabalho, o
salário, a moradia, tudo, mas nenhum tipo de aproximação! Pode ser?
Questiono e ele sorri de lado cruzando os braços.
— Continue sendo essa pessoa simpática que você é, nem vou precisar
proibir os funcionários de chegarem perto de você! Ninguém vai querer!!! —
ele ri alto e eu penso em recusar a proposta.
Yan me mostra toda a propriedade, os animais, o estábulo, os lagos, tudo! O
lugar é lindo, um lugar que eu adoraria trabalhar. No primeiro momento
fiquei com medo, ainda não queria parar, não queria ficar ali, mas pensando
na recente descoberta, eu não tinha muita escolha. Precisava parar de gastar o
que eu tinha, e precisava ganhar, e a sua proposta era realmente boa. Eu não
ia ganhar mais do que ganhava com o meu próprio negócio, mas também não
ia gastar mais e nem ter burocracias administrativas, e com aquele salário eu
conseguiria continuar pagando a imobiliária e logo tudo se ajeitaria.
— Tem só mais uma coisa que provavelmente me impeça de ficar, claro que
depende de você… — eu digo e Yan questiona ‘o tal motivo’, sem olhar pra
mim.
— Eu descobri á algumas horas atrás que, estou grávida!
— Gravidez não é doença, a não ser que seja de risco. O emprego é teu,
Ellen! Pode marcar suas consultas, te dou essas horas livres, e no restante,
fica disponível para me ajudar com qualquer problema com os animais, em
qualquer horário… tudo bem?
Ele diz sem hesitar e fico impressionada. Parecia que nada que eu dissesse
seria um empecilho para ficar. Aquele homem me queria ali.
— Ok. Tudo bem! — eu falo e ele me dá as costas para voltar a andar.
Terminamos o ‘tour’, ele me ajudou com as coisas para sair do chalé onde eu
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estava e ir para outro lugar. Uma casa mais afastada no meio do mato, terreno
mais distante da propriedade onde ficavam os hóspedes. Era um sobrado
lindo e imenso.
— Vou dividir a moradia com alguém?
Pergunto olhando para a casa e ele diz ‘não’ com a cabeça.
— É grande, né!? Era minha, quer dizer, eu morava aqui… as outras
moradias estão todas ocupadas por todos os outros funcionários, só nos restou
essa. O restante são os chalés pequenos para clientes, mas... de qualquer
forma, logo seu bebê nasce, será legal ter espaço.
— Sabe que ninguém contrata mulher grávida, né? Por que está fazendo isso?
— pergunto curiosa e ele parece sem paciência.
— Já perdi alguns bichos e não consigo resolver meu problema. Só me ajude
e eu te ajudo! Não estou fazendo isso de graça. Você vai salvar os animais
que amo, e vai fazer com que a pousada volte á lucrar com eles. Você
significa grana na minha conta.
Ele diz e caminha com minhas coisas até a porta de entrada da casa.
— Quantos bichos perdeu, quais bichos e como…?
Questiono assim que ele abre a porta e entra com minhas coisas.
— Cavalos e cachorros, mais de um deles. Ficam preguiçosos, lentos, e
depois eu os encontro mortos ou beirando a morte. Já dei remédio para tudo
quanto é doença que me recomendaram. O último veterinário disse que um
remédio ajudaria, mas eles continuam adoecendo.
— Ficam próximos?
— Sim, eu deixo os cachorros soltos pela propriedade, as crianças gostam. O
estábulo fica perto do espaço dos cachorros. Com os cavalos estou
começando a perder dinheiro. Aqui cobro para montá-los, os turistas pedem.
Eu tinha quinze cavalos, agora tenho onze. Dez cachorros e agora tenho
apenas cinco. Não sei o que está havendo!!!
Ele parece preocupado e eu não preciso parar pra pensar.
— Se não estão sendo envenenados, o problema pode ser bacteriano. Vou dar
uma olhada neles assim que eu arrumar as coisas!
— Tudo bem, obrigado! Já conhece tudo… — ele faz uma pausa para olhar
ao redor. — Ali na parede da cozinha tem os horários e algumas regras
básicas que é legal tu saber… caso tenha dúvidas, a recepção tem
atendimento 24hrs, quem fica atendendo ou é Jessica, ou é o Tom, sempre
eles! São receptivos e simpáticos, vão te ajudar no que precisar. Fique á
vontade, meu número está escrito na folha das regras. Na bancada tem um
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rádio que você pode usar, assim não precisamos ficar nos encontrando para
resolver as questões dos chalés. Meu escritório fica perto da recepção,
virando a esquerda no caminho de pedras, caso precise de algo e não queira
ligar, pode ir até lá! Todos os dias chego aqui às sete da manhã, e só vou
embora depois da sete da noite e ás vezes nem vou embora. Se eu não estiver
lá, estou plantando minhas flores em algum lugar da propriedade. Vou deixar
você agora, fique á vontade. — ele diz e vai embora.
— Obrigada.
Eu resmungo, ele confirma com a cabeça e sai.
Olho em volta e me sinto feliz. Uma oportunidade incrível de recomeçar,
ainda fazendo o que eu amava, caiu no meu colo sem que eu precisasse fazer
esforço nenhum. Começava a achar que o universo estava me dando uma
chance, e agradeci por isso. Eu tinha um lugar pra ficar, um emprego, e
problemas para resolver, problemas esses que não eram meus, o que só os
tornavam melhores ainda. Era algo para me ocupar e esquecer do resto. Só
pedia a Deus que isso funcionasse.
Organizo minhas coisas, e vou para a cozinha olhar o tal papel colado na
parede. Tinha uma lista de regras de etiqueta, boa convivência, horários de
funcionamento da cozinha, agenda comercial dos hóspedes, ramal de todos os
departamentos, e mais… coloquei um agasalho, peguei o rádio, tirei foto dos
números de telefone e rádios que julguei importantes, minha maleta e fui até
o estábulo e o espaço dos cachorros. Fiz todo o procedimento de rotina, e
retirei sangue de ambos. A febre, fadiga e irritação eram problemas comuns.
Pesquisei um laboratório próximo, pedi um motoboy, guardei a notinha, e em
três dias receberei os resultados. Deus, como eu amava meu trabalho, nesse
meio tempo, esqueci gravidez, Minas e o resto. Mas assim que voltei para a
casa o tema “Um bebe vem aí” tomou conta de mim de um jeito que eu não
podia suportar, eu precisava dividir aquilo com minha mãe, senão, eu poderia
enlouquecer. Respiro fundo, tomo coragem, e aperto o botão para re-discar a
ligação que ela fez mais cedo. Se eu não escutar nenhum ruído na linha, eu
vou falar.
Ela atende quase que imediatamente.
— Oi filha! O que foi? Está tudo bem???
— Mais ou menos… tenho duas novidades, uma boa e a outra um pouco
complicada, vai depender do seu ponto de vista. Quem está em casa?
— Oh! Meu Deus!!! Só a Ritinha, estamos fazendo um bolo. Seu tio está
trabalhando.
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— Entendi. Bom, começarei pela notícia legal. Consegui um emprego na


pousada que me hospedei, te falei né!? Ela é linda, é um lugar incrível…
— Ótimo, filha, os detalhes você me conta depois. Quero saber da
complicada, eu sabia que tinha algo de errado com você. O que está
acontecendo???
— Fiquei enjoada logo de manhã. Tomei um chocolate e o vomitei todo.
Nem vencido estava. — paro para respirar fundo. — Tô atrasada mãe, duas
semanas… comprei um teste na farmácia e deu positivo, estou gravida!!!
Choro de nervoso por falar sobre isso com ela, e ela nada responde.
— Mãe…
Chamo por ela na linha, mas só escuto sua respiração. Meio minuto depois,
quando eu já começava á gritar, Ritinha fala na linha.
— Oi? Alô? Ellen?
— Oi Rita, cadê minha mãe??? Ela tá bem?
— Bom, acho que ela entrou em pânico. Vou jogar um copo d'água nela, para
ver se ela volta. Está olhando para a parede como se tivesse visto um
fantasma…
— Faça isso, preciso falar com ela, agora!!! — Rita concorda e logo ouço
minha mãe gritar.
“— Sua maluca, eu estava pensando!!! Se jogar água em mim de novo, você
vai ver só!!! Me dá esse telefone aqui e vai pra casa para eu poder conversar
com essa irresponsável. Vai, que é uma conversa particular, ninguém precisa
ouvir a bronca que vou dar nela!!!”
— Ellen, volta já pra casa!!! Vamos resolver essa situação!!!
— O quê???
— “O que” o que, menina??? Não me ouviu??? Não vai parir no fim do
mundo, sozinha… você quer me matar??? Vai vir pra casa, vai receber ajudar
daquele moleque mimado, e vai criar essa criança perto da sua família!!!
— Mãe, ele me disse…
— Não importa o que ele disse, vocês brigaram em um momento delicado,
mas estamos falando de uma criança. Arrume suas coisas e venha já pra cá,
garota!!!
— Eu não vou, mãe.
— O quê??? Ocê tá doida??? Quer me desafiar, Ellen Maia??? Vou mandar
Max achar você! Você vai ver só!!!
— Mãe, para de gritar e me escuta!!!!
— Hum… parei pra te ouvir e quase infartei…
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— Não vou voltar, consegui um trabalho aqui. Tay não quer me ver nem
pintada, não merece conhecer essa criança! Ele destruiu meu coração quando
pequena e fez isso de novo recentemente. Nos separamos então o filho é meu,
não dele! Você sabe o que eu fiz, — essa parte falo baixo, como se alguém
pudesse ouvir. — acha mesmo que poderemos brincar de casinha com a
família Coverick??? Vou me virar mãe, vou te visitar logo, logo, mas não vou
mais procurar por ele! Nunca mais voltarei á vê-lo, e se Deus quiser, daqui a
um tempo, não pensarei mais nele. Quero me livrar disso mãe. Deixa as
coisas como estão. Não conte pra ninguém, me ajude á superar isso!!!
— Ellen… é uma criança! Você não fez com o dedo…
— Eu sei mãe, eu sei! Mas o Tay não existe mais na minha vida! Ele está me
odiando, fiz o que fiz e ele está me odiando. Todos eles me culpam, a senhora
sabe muito bem disso, se não soubesse não tinha se demitido! Sabe que vão
me olhar torto pelo resto da vida, matei o seu Luis, mãe, matei ele… e sabe o
que pode acontecer, eles tem grana, podem tirar seu neto dos meus braços,
podem roubar meu filho de mim… com a raiva que ele está de mim,
provavelmente fará isso. Tay disse que queria um filho, se ele souber que
estou grávida, vai me fazer voltar, se não tirar meu bebê de mim, vai me
processar por não ter contado e vai acontecer todo aquele inferno de guerra
para decidir a guarda! Pensa bem mãe, tem tudo isso em jogo. Tem meu
recomeço, minha felicidade, meu filho em jogo…
Ouço minha mãe respirar fundo e sei que a trouxe para meu lado.
— Será uma guerra perdida…
— Será uma guerra mais que perdida! A família tem advogados, tem muito
dinheiro, e a nossa família é uma família do campo, que só tem dinheiro
contado todo mês. Sabe onde isso vai dar, então não conte para ninguém,
nem pro tio!
— Eu preciso contar para ele, menina, é seu tio, ele precisa saber!!!
— Ele continua trabalhando lá. Renan é antiquado! Vai querer matar o Tay
por ter me engravidado sem casar. Ele vai soltar para Deus e o mundo, vai
querer que Barbacena inteira saiba que “Tay fez um filho em mim e que
precisa assumir”! Então fecha a matraca, guarde isso só pra senhora!
— E como vai ser, criatura? Vai cuidar desse bebê, sozinha? Não vou
participar da sua gestação! Não vou ver essa criança nascer… — minha mãe
parece chorar.
— Temos nove meses, mãe, logo arrumo uma casa por aqui e te trago pra
perto. Claro que você vai participar! Só me dá um tempo para conhecer as
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pessoas, a cidade. Vai dar tudo certo mãe, prometo!


— Não entendo como você não surtou ainda.
— Te garanto que não está sendo fácil, já chorei, me lamentei, sofri… mas
sei que ficar mal não vai me ajudar em nada, já tem um bebê aqui dentro de
mim, espernear não vai fazê-lo desaparecer e nem sei se quero isso. No fundo
tô feliz mãe, estou grávida do único homem que amei, foi um presente! De
grego, mas foi um presente, na hora errada, mas foi um presente! Eu tô com
medo porque é muita novidade, mas estou feliz, acho que tô ficando maluca!
— Choro mais um pouco e ela ri.
— Eu entendo, essa felicidade só tem a piorar. De felicidade vai virar um
amor incondicional. Inexplicável. São os filhos que fazem isso! Você não
está louca, apenas está se tornando mãe!
— Mãe, o que eu faço???
— Nada, né? Não quer vir embora… agora procure um posto de saúde e
comece o pré-natal. Cuide da saúde, da alimentação. Nos primeiros três
meses é bom você não andar á cavalo! Só se cuide e siga o que o médico te
disser. Vai ficar tudo bem! Quando quiser, vou ficar com você!
— Tudo bem, mãe! Obrigada!
— Te amo meu bem! Tô me sentindo velha, serei vovó!!!
— Não esquece! Nada de abrir a boca.
— Já entendi.
— Tá. Vou desligar, vovó. Depois nos falamos!
— Fica com Deus, meu amor!
— Fica com ele a senhora, mãe!
Desligo o telefone e desabo á chorar. Parece que só depois que a gente
descobre é que os sintomas pioram. Eu estava chorona, e apesar de enjoada,
faminta também. Mas me livrei, com esse telefonema, dos piores dos
sintomas… eu não estava mais desesperada e me sentindo sozinha.

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19

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As decisões que você toma na vida, te levam a um curso que nem sempre
você espera. Nem sempre você colhe coisas ruins, não, mas sempre te
surpreendem. Faziam três meses desde que Ellen se foi para sempre. Eu disse
á ela que de forma nenhuma falasse comigo novamente e ela obedeceu, talvez
não porque mandei, mas por culpa. Uma coisa levou a outra, achei que ela
tinha passado por cima de um pedido meu, pedido esse que foi para o bem
dela, e ela realmente fez isso. Mas não foi até lá para matar o seu amigo, ela
foi para “me proteger”, minha selvagem me desobedeceu pensando em mim,
afinal, eu sempre soube que Ellen não fazia a linha obediente e delicada.
Claro que ela iria atrás de mim e eu sabia disso, senti isso antes de sair de
casa, mas eu tive medo, e ela teve medo também. Em resumo, briguei com
ela porque ela se arriscou e supostamente havia tirado a vida de uma pessoa,
na briga eu a magoei, supostamente ela mentiu dizendo que não tinha feito
nada, a magoei de novo por causa disso, e na raiva, após ouvir que eu não
sentia mais nada por ela, começou á gritar até meu avô ouvir e enfartar. De
quem era a culpa? Se existia um culpado, esse era eu, por ter escondido esses
anos todos tudo o que passei, por me tornar o monstro que eu era. Não ela.
Conheci Ellen e parti seu coração, depois a reencontrei e fiz tudo novamente,
e de quem era a culpa? Eu não poderia mais culpá-la. Eu já não aguentava
mais fazer isso. Eu era um covarde!

No primeiro mês, tentei encontrá-la. Enviei um e-mail para Jon e ele disse
que Ellen era impossível de ser encontrada. Em uma das conversas de meu
pai, logo depois de me retirar do escritório, o ouvi dizer para minha mãe que
pediu a Jon, á mando dela, que a encontrasse imediatamente. Minha mãe
sofreu com a partida dela, assim como Lulu. E ouvi nessa mesma conversa,
que a resposta era: " Em um dos grampos que fiz, Ellen sabia que eu estava
ouvindo e disse: Jon, se você tem alguma honra, alguma dignidade, por
favor, pare com os grampos! Eles fazem um barulho horrível e atrapalham
as minhas ligações pessoais. Não quero ser encontrada Jon, não vou voltar,
e quero que você pare de me rastrear! Sei que sabe onde eu estou, mas eu
sofri demais, matei uma pessoa, fui abandonada pela segunda vez pelo
homem que eu amava e voltar partiria meu coração em mil pedaços. Se essa

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família realmente não me odeia por tudo o que causei, e tem alguma
consideração por mim, peça á eles que parem de me procurar e deixem eu
viver a minha vida em paz. Eu já estou me remendando, quero paz, quero
minha felicidade, minha paz de espírito, se é que isso um dia será possível, e
a minha linha de telefone livre desses ruídos chatos! Me deixem em paz. "

E foi a partir daí que meus pais resolveram parar, e foi após ouvir esse
desabafo dela, que saí do luto, e passei á sofrer por outro motivo: sua
ausência e sua vontade de recomeçar sem mim. Ellen estava me esquecendo e
eu sabia que eu nunca a esqueceria.

No segundo mês os cursos começaram. Todas as aeronaves incluindo as


estrangeiras, chegaram ao Brasil e foram tragas para Minas, até a escola para
cadetes, onde o curso aconteceria. Pedro estava sendo procurado pela
FAB/Militar e Laura saiu do luto e voltava ao normal, sempre chateada,
sempre entediada e sempre reclamando de como minha mãe a tratava. Eu e
meu pai continuávamos tendo uma relação difícil, ele enchia meu saco para
procurar ajuda psicológica e minha mãe me defendia. Os dois brigavam feio
no quarto, e só paravam quando Lulu aparecia para apartar. Era um inferno!

No terceiro mês, quando minha tia ameaçou voltar para SP com minha vó,
por causa de toda aquela briga e bate-boca por minha causa, decidi me mudar
para o sobrado do vilarejo, já que não podia sair de Barbacena por causa do
curso de todos os dias. Essa decisão também trouxe mais uma briga entre os
dois, mas pelo o que fiquei sabendo pela minha tia, acabou em sexo, como
sempre. Eca! Agora, ter vindo pra cá era tão bom, quanto ruim. Eu dei paz
para a minha casa, fiquei longe do meu pai, trouxe Laura comigo e enfim ela
pôde ficar a vontade, mas em contrapartida eu estava do lado da casa de
Ellen. Por vezes me via na janela, apenas olhando, e pensando. Nesse meio
tempo, enquanto estive aqui, vi dona Isabelle saindo com malas enquanto um
táxi a esperava na porta e me aproximei.
— Oi dona Isabelle. Vai viajar?
Eu me aproximei e questionei. Lembro como se fosse hoje de sua reação. Ela
estava nervosa e aflita, ao falar até gaguejou.
— Vou sim. Algum problema?
— Vai encontrá-la, estou certo?
Eu disse de forma direta e ela parou para respirar ao responder. Seu
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semblante era de raiva, mas também compaixão.


— Vou Tay, mas fique longe de Ellen! Esqueça minha filha, porque ela já se
esqueceu de você!!!
Ela disse e na hora vi estrelas. Desde aquele dia, dona Isabelle nunca mais
voltou. Apenas seu Renan continuava na casa, e desde então, a casa estava
definitivamente sem cor e sem vida.

— Ei, bebê da mamãe!!!


Minha mãe entra no quarto, nem ouvi seu carro chegar, nem a ouvi bater na
porta.
— Oi, minha rainha.
Resmungo e ela corre pulando em cima de mim na cama. Eu amava minha
mãe. Quando tudo parecia ruir embaixo de meus pés, era ela a minha barra de
aço firme, onde eu me segurava e permanecia em segurança.
— Trouxe o seu remédio que você se esqueceu, seu notebook, e uma canja
que a nova cozinheira preparou. Só vou contratá-la se você aprovar!!! — ela
diz sorrindo e deita do meu lado apoiando a cabeça em uma mão.
— Mãe, não vou voltar. — digo triste e vejo seus olhos se encherem de
lágrimas.
— Então você vai destruir meu casamento, porque vou ficar com você. Você
não está me dando outra alternativa!!!
— Não precisa vir pra cá…
— Preciso, você está triste, precisa de ajuda com os remédios, precisa de
apoio, precisa da mamãe aqui, com você!
— Já sou homem, não notou? Já cresci, não preciso mais de você!!!
Falo e ela fica magoada, por isso me sento na cama.
— Eu apenas esqueci, mas sempre tomo os remédios, estou triste e chateado,
mas vai passar! Você precisa é cuidar da Lulu e do meu pai! Já acabou mãe,
não sou mais seu bebezinho! Precisa parar de ameaçar ele, sei que faz isso, eu
já ouvi! Você me criou para a vida, agora me deixar vivê-la da maneira que
tem que ser. Vai curtir sua filha, sua casa, seu marido… sei cuidar de mim
mesmo, dona Hella! — eu falo e ela me olha com raiva.
— Filhos são para sempre! Lulu sabe se virar sozinha, sempre soube, você
não! E eu só o ameaço para ele para de me encher, seu pai é muito chato
quando o assunto é você! Não quer que você sofra como ele sofreu e acha
que você precisa de tratamento psiquiátrico! Eu discordo. Você sempre
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dependeu de mim, cresceu colado comigo, vai ser meu bebê pra sempre, isso
não vai mudar, eu amo você!!! Sei que você não pode ficar sozinho, eu sinto
isso!
— Não estou sozinho.
— Essa cobra aí, e nada, são a mesma coisa!
— Mãe…
— Eu não vim para discutir, vim pra ficar com meu filhote, vou te fazer
cafuné até você dormir… — ela diz se aproximando e me beija no rosto.
— Não vou dormir agora! Vou sair para beber com uns amigos do curso
ainda hoje! Beber e pegar vadias, como meu pai mesmo disse! Ele sabe que é
só o que eu sei fazer. — eu digo e ela bufa.
— Seu pai se arrependeu das coisas que te falou! Quem mandou insinuar que
ele estava querendo roubar a Ellen de você! Nem a mim você respeita!
— Eu te respeito, mãe! Só que foi estranho… muita melação, muito grude!!!
— Seu pai era igualzinho, um ciúme que só pela misericórdia!!! Os dois são
cópia um do outro. Quero que se respeitem, vocês se amam. Quero minha
família intacta, unida, todo mundo junto! Agora se eu tiver que escolher entre
você e ele, vou escolher a minha cria. Custe o que custar, meus filhos são a
minha prioridade, ou vocês se entendem, ou pego Ana Luiza e sumo com
vocês dois, e não me venha com “você não é capaz, Jon vai achar você”, “não
posso sumir, tenho o meu trabalho”… arranco você dessa FAB!!! Agora vou
esquentar essa canja e pegar a dose do seu remédio! — ela esbraveja se
controlando e se retira. Pouco tempo depois ela volta.
— Hmm… está uma delícia, ela está aprovada!!! — digo após experimentar a
canja.
— Também gostei!
— Ela é novinha? — pergunto e ela faz cara feia.
— Tô começando a achar que realmente não deve voltar pra casa, seu safado!
Se controla, rapaz.
— Pra que me controlar? Estou solteiro e na seca há três meses!
— Já se esqueceu dela?
— Não. Nunca. Mas sei que preciso ou terei um troço. Não posso ficar com
ela pra sempre na minha cabeça, e no meu coração!
— Então por que não vai atrás dela?
— Não sei onde ela está. Jon se recusa a contar, meu pai obviamente nunca
falará… não vou me matar para investigar sozinho, chegar lá e dar de “cara
na porta”. Provavelmente nunca me perdoará, vai estar com outro, feliz da
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vida, e ficarei pior. Vou esperar, já, já essa dor vai passar. — eu digo e ela
respira fundo.
— E se eu descobrir onde ela está?
— Você já sabe, não é!?
— E se eu descobrir onde ela está??? Vai trazer ela de volta?
Minha mãe pergunta levantando uma sobrancelha e eu fico tenso.
— Preciso tomar banho. Tenho que sair!
Mudo de assunto porque simplesmente não sabia o que responder. Eu era
capaz de ir atrás dela, mas eu merecia Ellen? Eu deveria atrapalhar sua vida?
Não sei não… rapidamente me afasto dos questionamentos de minha mãe,
tomo meu banho, a levo até o carro, e ela vai para a chácara, mas não sem
antes me mandar ter juízo e usar camisinha.
Me obrigo a esquecer daquela conversa e vou com Laura até o Mineiro's.
Estava lotado, uma música animada tocava bem alto na pista. Assim que
entro e bebo o primeiro drinque, vejo uma cópia de Ellen bem na minha
frente. Mesmo semblante de paz, dois grandes oceanos misteriosos chamados
de olhos, boca carnuda, corpo magro, cabelos castanhos e compridos, e estilo
garota modelo. Tinha quase minha altura, mas parecia muito mais nova que
eu. Uma delícia. Seria ela. Fico olhando até ela me notar, continuo bebendo e
escutando Laura falar sobre o curso, e não tiro os olhos dela. Ela me
correspondeu, começava a dançar olhando pra mim, passava as mãos pelo
corpo me provocando e umedecia os lábios enquanto sorria. Deliciosa.
— O que está olhando?
Laura de repente pergunta e vira rosto na direção em que o meu estava.
— Sério, tenente? Ela é a cara da outra… por que não escolhe uma diferente?
— ela diz com desdém e eu olho para ela sorrindo.
— Diferente como você, por acaso? — falo e ela fica sem graça.
— Cala a boca. Já não quero mais você!
Ela fala e fica emburrada. Logo um rapaz se aproxima de nossa mesa.
— Oi, está acompanhada? Quer dançar?
Ele diz e Laura arregala os olhos pra mim.
— E se ela estivesse? — pergunto e ele sorri.
— Pediria desculpas e ia embora para evitar transtornos. Mas eu acho que,
pela cara dela, ela está emburrada e com vontade de se divertir.
Ele diz e chegava a minha vez de sorrir.
— Toda sua!
Eu digo e ele estende a mão para ela. Logo fico sozinho e vejo Laura e o
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manézão corajoso, sorrindo, dançando e flertando um com o outro. Quando


decido paquerar a minha escolhida, ela já não estava mais no mesmo lugar.
Respiro fundo, tomo mais um gole de meu drinque, e encosto-me à cadeira.
De repente a garota estava sentada do meu lado, e eu nem tinha visto como
ela foi parar ali.
— Eu pretendia começar perguntando se gostaria de dançar, mas aposto que
vai dizer que não sabe!
Ela diz simpática e ergue para mim uma sobrancelha.
— Exatamente. Então pula essa parte!!!
Eu sorrio e ela olha para a minha boca. Se levanta e também me estende a
mão.
— Eu não bebi hoje, posso te levar pra casa em segurança. — ela diz e eu
gargalho. Era ousada, gosto disso.
— Realmente estou precisando…
Ela para com o carro na porta de casa, eu desço, abro a porta do motorista pra
ela, abro a porta da sala, a deixo entrar, fecho a porta atrás de mim e ataco.
— Meu nome é Julia! E o teu? — ela resmunga no meio do beijo enquanto eu
a imprensava na parede e começava a passar minhas mãos em seu corpo todo.
— Não tenho a menor ideia, Julia!!!
Digo e aperto sua cintura na minha. Ela vestia um mini vestido de lantejoulas
preto que pensei bem antes de rasgar. Seria estranho levá-la pra casa com
uma roupa minha. Pego ela no colo e a levo para meu quarto. Sua boca tinha
gosto de hortelã, e frutas vermelhas por causa do batom. Jogo-a na cama e
arranco o maldito vestido; sua pele era bronzeada e tinha pequenas pintas e
sardas, um charme. Só tinha altura, parecia uma menina, Julia era linda!!!
Tiro seu sutiã branco com cuidado e evito olhar em seus olhos, eu estava
pronto para comer qualquer mulher, agora para me envolver, duvido que
esteja novamente algum dia!
— Você é linda!
Digo, ela resmunga algo que não prestei atenção, e eu caio de boca em seus
pequenos seios. Ela gemia baixinho e segurava em minha nuca, todo seu
corpo balançava e se contorcia. Eu queria chupar seu ponto G. até amanhecer,
mas sem saber de onde ela era, e quem Julia era, não me arriscaria. Pensando
nisso, coloco meus dois dedos no lugar certo e começo a instigá-la. A gente
se beija, começo a masturbá-la com a mão toda e logo ela implora por
consolo, colocando a mão em meu volume.
— Quero você dentro de mim, poderia fazer isso, por favor?
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Ela diz no meu ouvido e eu gargalho deixando ela sorrir sem graça.
— Caramba, com toda essa educação, como negar!!??
Digo e começo a me despir com sua ajuda. Pego uma camisinha, me protejo,
e entro dentro dela. Extremamente apertada era apelido, para ter uma noção
de como sua entrada era, eu entrei praticamente gritando e arrancando os
cabelos de sua nuca. Ela chupava a borda de minha orelha e ainda gemia
baixo ao sentir tudo aquilo.
— Oh! Nossa, o que é isso??? Alguém já entrou aqui antes não é!?
Pergunto fazendo um vai-e-vem delicioso e ela faz uma cara estranha.
— Ah. Qual é!? — resmungo ameaçando sair de dentro dela, e ela faz manha
me puxando de volta.
— Isso importa tanto? Que diferença faz quantos entraram!? Apenas me faça
gozar e logo vou embora daqui!!!
Ela diz e me sinto contrariado, por isso meto com força para aquele buraco
apertado se abrir pra mim, e ela sorri deliciosamente enquanto geme alto.
Abro ainda mais suas pernas e aumento a força. Passo a estimular seu ponto
mágico ao mesmo tempo em que a fodo com força e não demora muito para
que seu orgasmo se faça presente. Quando começava a me arranhar, fui ainda
mais fundo e logo ela gritou, mas não parei. Fiz a ninfeta se soltar de mim e
me concentrei na minha vez. Seriam três meses de porra acumulada, eu
precisava daquilo.
— Isso rapaz-sem-nome, é a sua vez. Goza pra mim…
Ela diz levantando as pernas para me dar mais acesso e rebolava ao mesmo
tempo em que eu estocava. Minha vez veio logo em seguida. Minha nossa!!!
— É Tay… — digo estocando uma última vez com extrema força para
“castigá-la”, fui tão fundo que ela gemeu alto e ficou tonta á ponto de revirar
os olhos.
— O quê?
— Meu nome. É Tay!
Eu digo e saio de dentro dela, mas não saio de cima, e não paro de encará-la.
— Nome bonito! Diferente! — ela fala e eu me abaixo para beijá-la.
— Está carente, bonitão!?
Ela questiona rindo, mas corresponde ao beijo mesmo assim.
— Acho que sim. Estranho né… te comer e te beijar depois…
— É sim, pelo o que soube, homem que a gente encontra na balada, não curte
muito isso, mas não me importo!!! Já vou indo!
Ela diz e levanta. Sento-me na cama para olhar ela se trocar, e ela sorri pra
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mim.
— Diga que tem pelo menos dezoito!
— Só agora você quer saber? E se eu disser que tenho quinze?
— Pelo amor de Deus, não diga isso nem de brincadeira!
Falo já ficando tenso, e ela gargalha colocando seus saltos novamente.
— Devo ser mais velha que você, Tay, de ninfeta só tenho a fuça. Mas da
próxima vez, pergunte antes! Isso é muito arriscado. Qualquer criança pode
entrar no Mineiro's!!!
— Desculpe. Vou me policiar.
Eu falo e ela se aproxima, acho que pretendia se despedir de mim com
educação.
— Por que já tem que ir? Papai pega no pé?
Falo tocando sua coxa direita, e ela para de sorrir.
— Está me pedindo pra ficar?
— Já disse, estou carente. — sorrio, mas Julia não.
— Está me pedindo pra ficar?
Ela repete a pergunta cruzando os braços, e eu me deito na cama cobrindo o
rosto com o travesseiro.
— Estou.
— Não ouvi!
— Estou, droga!!!
Tiro o travesseiro do rosto para poder falar, e ela sorri olhando pra mim.
Morde o lábio inferior como Ellen fazia e eu a puxo para a cama novamente.
Coloco uma de suas pernas em cima de mim e deslizo minha mão de sua
coxa até chegar no bumbum. Que pele macia, ela tinha! Beijo sua boca
carnuda e não penso em mais nada. Só queria pensar no momento, e aquele
estava sendo um passa-tempo maravilhoso, até que foi interrompido por uma
Laura maluca e bêbada.
— Tenente Coverick, seu corno! A próxima vez que me deixar na balada
sozinha, vou cortar esse seu pequeno pênis enquanto você dorme, ao invés de
te dar “boa noite, Cinderela”, filho da puta. Está avisado!!!
Laura esmurra a porta ao gritar e depois se retira. Suspeito de que tenha ido
dormir. Eu dou risada e Julia mais ainda.
— Quem é ela? Você é tenente??? Está com os oficiais fazendo o curso das
aeronaves gringas? — ela pergunta e eu estranho.
— Hmm… estou! Você me conhece??? Mora por aqui? — pergunto e ela
sorri.
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— Moro por aqui, toda a Barbacena está por dentro dos eventos da EPCAR.
Se você mora por aqui, sabe disso. Todo ano tem curso, todo ano tem evento
de encerramento com as aeronaves fazendo uma festa, como em
Pirassununga nos 07 de setembro. Isso não é segredo..
— Para uma civil comum, você está por dentro até demais. — fico tenso e me
sento na cama. — Sabe quem eu sou, ou não?
Questiono e ela se levanta para ficar mais próxima de mim.
— Ei, fica calmo. Tá neurótico. Deve pra FAB? Sou militar também,
pronto!? Satisfeito?
Ela fala e se levanta colocando novamente os seus sapatos.
— Que patente? Que área??? Você parece ter uns 17 anos. É soldado da
escola preparatória? Fala, Julia!
— Infantaria.
Ela diz e eu me levanto. Seguro em seu braço e vejo toda a sua doçura ir
embora.
— Você é uma fuzileira??? Está de brincadeira, quantos anos tem?
— Quer conversar, vamos conversar. Mas não me toque desse jeito!
— Até agora eu estava dentro de você. Agora não quer que eu te toque?
— Dei pra você com muito gosto, com meu consentimento. Neste momento
você está tocando meu braço á força e me machucando. Está doendo! — ela
diz olhando nos meus olhos e eu solto seu braço.
— Me desculpe. Desculpe, tá legal!? É que essas coisas você fala no primeiro
momento! Eu tenho mania de perseguição, sofri muito na minha base, então
fiquei assustado. Me desculpe.
— Tudo bem, mas você me deu tempo pra falar? Me trouxe para dentro já
tirando a minha roupa.
— Por que não reclamou? E outra, você disse que sabia da FAB porque
morava aqui, se eu não me tocasse, e te pressionasse nunca ia falar! — ando
de um lado pro outro e ela volta a sorrir.
— Não reclamei porque gostei. Relaxa! Vem cá… — ela me puxa pra cama e
sobe em cima de mim.
— Vamos aliviar esse estresse. È só uma patente. Aqui sou uma mulher e
você um homem. Vamos nos divertir, não tenho ninguém me esperando
voltar pra casa!
Ela diz rebolando gostoso em mim, fazendo meu volume crescer. Acabamos
enroscados até o dia nascer, mas cochilei, e quando acordei, não havia nem
sinal dela. Meu Deus. Que noite. Que montanha-russa!!!
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Me levanto com Laura entrando no quarto já uniformizada, com uma xícara


de café na mão e meu remédio.
— Anda, garanhão. Você está atrasado! Temos teórica o dia todo, quero ver
aguentar!!!
Ela diz, deixa a xícara e o remédio no criado-mudo, e se retira. Engulo o
remédio a seco, tomo um gole do café forte, e corro pro banho. Em pouco
tempo já estávamos no pátio do colégio.
— Relaxa, respira fundo, e faça um mantra, seu daddy está vindo!
Faço o que ela manda e logo que meu pai surge por de trás de mim ela presta
continência a ele e me deixa sozinho. Traidora.
— Oi. — ele fala.
— Oi. — respondo e me recuso a prestar continência pra ele. Foda-se.
— Sua mãe pediu que eu viesse falar com você, se você não voltar pra casa,
ela vai surtar! Não vamos mais brigar com você, eu não vou mais brigar
contigo. Mas volte! — ele diz e reviro os olhos.
— Aqui não é lugar pra falar sobre isso, e de qualquer jeito, a resposta é não!
— eu falo e começo a andar, mas ele me segue.
— Pare de ser mimado e infantil! Você tem problemas, tudo bem se não quer
tratar, mas não os traga para o meu casamento! Você já o salvou quando era
pequeno, não vou deixar você o destruir agora.
— Sou adulto, apenas quero morar e viver sozinho. Que mal tem isso? E se
minha mãe prefere o filho, não tenho culpa. Ela me ama e isso é o que uma
mãe de verdade, sente! — caminho em direção a sala de aula e ele continua
me seguindo.
— Não jogue sua insegurança na minha cara, eu também amo você pirralho,
nunca deixei de te amar! Só quero te ver bem, feliz, realizado. Não quero que
passe pelo o que passei! Se eu tivesse procurado ajuda naquela época eu teria
sido mais feliz. Pelo menos prometa que vai falar sobre isso comigo, depois
da aula?
Ele pede e eu só balanço a cabeça, que saco, pra que tudo isso??? Pra que
tanto estresse? Tudo o que eu queria era paz.
Entro na sala de aula e me sento próxima a Laura. Seria a primeira aula da
segunda fase. “Pane nos sistemas de aeronaves“, a aula simplesmente se
chamava: como não morrer? Simples assim. Estávamos trabalhando no caça-
tático F15-Eagle, era a teoria, e logo depois de um mês, viria a prática. A
segunda aeronave do curso, desde então.
— Bom dia, sou a capitã Castanho e darei a aula teórica do F15-Eagle.
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Para o meu espírito ainda fragilizado piorar, Julia entra uniformizada na sala
de aula. Jesus amado. Eu mereço! No momento em que se apresenta,
obviamente todos os tenentes se levantam para prestar continência e eu me
levanto atrasado por causa do susto. Ela larga seu material na mesa, e
infelizmente repara em mim, e na minha dificuldade em respirar.
— Algum problema, tenente… — ela olha para meu nome na farda. —
Coverick???
Ela se aproxima de mim e me encara séria demais. Era totalmente
profissional. Poderia dizer que estava brava até.
— Não senhora.
Respondo olhando em seus olhos e com formalidade. Talvez com um toque
de rebeldia também, mas… ela queria o quê??? Me deixar maluco?
— Foi o que pensei. Vamos ver se você é tão inteligente quanto teu pai, o
melhor piloto de caça e fuzileiro combatente que conheço!!! Lento já vi que
você é, quase me desrespeitou… à vontade, Tenentes! — ela diz e todos
voltam a se sentar. — Como sabem, a temática é simples… “Como não
morrer?” Como não se explodir com um caça-tático? É sobre isso que vamos
falar! Como já devem saber, pelo menos eu espero, McDonnell Douglas F15-
Eagle, é um caça americano altamente manobrável, que pode operar sobe
todas as condições atmosféricas… podem abrir a apostila e acompanhar as
informações enquanto eu as dou mastigadas pra vocês!!!
Abro a apostila assim como todos e vejo Laura zombar de mim com o olhar.
Eu merecia aquilo, com certeza merecia.
— O F-15 dispõe de sistemas eletrônicos e armamento para detectar, focar,
perseguir e atacar aviões inimigos seja em espaço aéreo aliado ou inimigo,
pouco importa… sua superioridade vai além disso…
Julia continuava sua aula e pelo jeito alguém levantou a mão.
— Sim, tenente!?
— Eu tenho uma curiosidade. É verdade que a senhora já escapou de pane
elétrica por diversas vezes? Com um A-29, AMX, e mais outros, enquanto
ainda era estudante???
O rapaz questiona e ela faz uma cara de paisagem.
— Sim, foram mais vezes do que gostaria que fosse. Sou uma pessoa tão
azarada quanto sortuda. Escapei de panes que me levariam ao solo em menos
de um minuto, porque soube o que, como e quando fazer, quando ainda nem
tinha saído das fraldas na FAB, e essa fama se espalhou. Consegui o feito
porque nas minhas horas vagas eu estudava, ao invés de encher a cara nos
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bares próximos da base. A leitura e o estudo incessante é a chave, a solução


de muitos problemas, e pode até salvar vidas! E é por isso que estou aqui,
porque sou qualificada e experiente. Mas da próxima vez, senhor… Phillipe...
anote sua curiosidade pessoal, e me questione em um momento mais
oportuno, ficarei feliz em te contar sobre minhas conquistas, até gosto muito
disso, mas não interrompa minha aula novamente, a não ser que eu permita!
Ela responde com um tom sério demais e a sala toda fica tensa. Saio da aula
ouvindo sussurros como: “Nossa essa capitã é foda!!!”, “Nossa ela é gata,
hein!?”, “Quero ser como ela!”, um comentário pior que o outro. Pelo resto
do dia, Laura fica na minha cola me olhando como se segurasse um riso, mas
nada falou, de certo sabia que levaria um esporro se tentasse me irritar. Eu
estava muito ‘puto’ e pelo restante do dia só pensava em como destruir a
farda daquela maldita que não tinha me contado tudo.
Que capitã Castanho não me procurasse mais, porque se fosse atrás de mim,
ia se arrepender.

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20
A NATUREZA SENTIU SUA CHEGADA
8° Mês de gestação.

[Maia: Significa "grande", ou "água", ou "ilusão", ou ainda "mãe". ]

{Naquele dia, enquanto caminhava, vi Yan de longe, parecendo absorto… Só


seu corpo estava ali…}

— Você está bem?


Yan estava com sua inseparável enxada, parado no meio do campo livre que
os hóspedes usavam para jogar bola. Naquele momento estava vazio, mas
tinha um Yan em versão estátua, parecendo triste, ou chateado, bem no meio
dele. Me aproximo questionando e ele leva um tempo para me notar ali.
— Oi, tô sim.
— Certeza? — pergunto de novo e ele se vira para mim parecendo nervoso.
— Sim. Tô bem! Como está nossa Catarina?
Ele questiona mudando de assunto e toca minha barriga. No dia do ultrasson
para ver o sexo de Catarina, Yan disse que gostaria de registrá-la em seu

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nome, que formaríamos uma família moderna — Já que não estávamos juntos
e não tínhamos nenhum tipo de relacionamento afetuoso. — e que ninguém
poderia dizer o contrário, que ‘nossa’ pequena e casta, Catarina Lis Maia era
sim, sua filha. Eu achava fofo, gostava de sua atenção e me sentia querida e
protegida, mas tinha um problema, esse lance moderno me deixava confusa.
— Ela vai bem, por que está chateado?
Eu pergunto e ele franze o cenho como faz quando tem algo o incomodando.
— Só estava pensando… nada demais.
— Me fala, me conta! Conversar ajuda, não é!?
Eu uso sua frase favorita e ele sorri.
— Eu queria te falar algumas coisas, estou ensaiando fazem oito meses, é…
— ele começa com dificuldade e Jéssica o chama no rádio, bem na hora.
“Yan, tem um cliente na recepção querendo falar contigo…”
— Tô a caminho.
Ele a responde, diz que já volta, e já ia saindo, mas não deixo. Pego em seu
braço e faço ele voltar a olhar para mim.
— O cliente pode esperar um pouco. Agora se você está ensaiando para me
falar algo fazem oito meses, acho que isso é um pouco mais urgente.
Ele me olha depois de me ouvir e chega mais perto de mim, me deixando
assustada, tão assustada que chego a me afastar um pouco, simplesmente
porque ele nunca agiu assim, me pegou de surpresa. Ele nota isso, e coloca a
mão na cintura ao falar.
— Viu!? Acho que vou ter que esperar mais alguns meses.
Ele fala e volta a andar, mas o que eu digo a seguir, o faz ficar paralisado
novamente.
— Se o que queria dizer é que sente atração por mim, é mentira, essa barriga
enorme não me deixa sexy. Agora se vai dizer que gosta de mim, a recíproca
é verdadeira. Somos uma família moderna demais, precisamos resolver
isso… me acolheu aqui, se apaixonou, e vai assumir a filha de outro, mas sou
moça de família, vai ter que me pedir em namoro e vai ter que me beijar e me
levar pra cama.
Eu digo de olhos fechados, morrendo de vergonha, e com medo de sua
reação. Não era a primeira vez que Yan tentava me contar sobre seus
sentimentos então, agilizei o processo. Me fiz de corajosa.
— Como isso funcionaria? Depois de todo esse tempo aqui, tu ainda não me
parece pronta! — ele dá meia volta e me olha nos olhos.
— Só estou nervosa, tive apenas um namorado na vida. Não estou dizendo
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que tô pronta, mas gosto de você e quero tentar. Se não der certo,
permanecemos uma família moderna! Me beija e acabe logo com isso!
Eu digo e fecho os olhos novamente, de puro nervoso. Sinto Yan se
aproximar e nossas respirações se encontram, mas o beijo demora pra
acontecer, demora tanto que volto a abrir os olhos e o vejo sorrindo ao me
olhar.
— O quê?
Gaguejo quando sinto sua mão firme na minha cintura.
— Primeiro me veja chegar perto, assim…
Ele toca sua boca na minha, me olhando nos olhos profundamente, e faz
minha boca se abrir de um jeito obsceno. Seu gosto é maravilhoso e seu olhar
é de tirar o fôlego. Nunca vi igual. Yan parecia enxergar a minha alma, ali eu
estava do avesso!!!
— Depois que eu começar, aí você pode fechar os olhos. Porque é em mim
que você deve pensar! Só em mim. Seus pensamentos registram o que seus
olhos viram pela última vez.
Ele diz e me dá um beijo que me deixa acesa demais. Estando grávida parecia
muito errado, sendo filho de outro, parecia mais ainda. Mas meu corpo
intocável por tanto tempo, desejava Yan. Meu coração eu não sei, mas meu
corpo o desejava demais naquele momento. Acho que por isso me empolguei
e quase subi em seu colo.
— Preciso ir, sua atrevida, depois terminamos isso!
Ele diz me afastando pela cintura e sorria com a cena. Sorria ao me ver sem
graça e alterada por causa do beijo. Droga.
— Já sabe… — começo a dizer ainda sem forças e ele termina.
—…não existe nenhuma Ellen aqui!!!
Ele fala sorrindo feliz, e vai embora. Meu coração parecia pular pela boca.
Estar com ele era diferente, Yan me representava um começo, o início de
algo real, maduro e sólido. Mas algo estava me incomodando demais, algo
que eu não sabia descrever direito, eu sentia que estava traindo Tay. Sim, eu
estava maluca, mas era isso o que eu realmente sentia. Podia apostar que
naquela altura ele já devia estar com a Laura nojenta da silva, se esbaldando
sem culpa nenhuma, mas eu não sou assim. Era esse o ponto, eu não era
assim… mas eu não ia deixar de ser feliz, tinha consciência disso, eu não
podia deixar de tentar. Fico me lembrando de quantas vezes visualizei a cena
em que ele chegava nesse fim de mundo e me levava embora daqui, mas
obviamente ele nunca apareceu! Tay era passado, não me merecia, não
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merecia o filho que eu carregava, e fim de história. Prometi para mim mesma
que nunca mais pensaria nele e era isso o que eu ia fazer!
Eram 14:15hrs quando decidi caminhar e fiscalizar meus animais. A barriga
já estava bem grandinha, mas sempre tive proporções pequenas apesar da
altura, sendo assim, apesar de estar nos últimos dias abrigando Catarina
dentro de mim, caminhar ainda era fácil; porém, abandonei os saltos altos por
recomendação de minha ginecologista, ou segundo ela mesma dizia, eu me
tornaria morada de além de um bebê, também de enormes varizes. Dispensei.
Eu sentia muita fome, muita fome mesmo. Dava prejuízo no restaurante de
Yan, e agradecia o fato dele nunca ter me cobrado as sobremesas e frutas
extras nas horas impróprias, — tipo de madrugada e a todo o momento. —
apenas ria disso e eu o achava lindo quando zombava por sempre me
encontrar comendo enquanto visitava meus animais, comendo na cozinha, ou
comendo em todo lugar. Eu tinha o melhor chefe do mundo.
Agora, falando em descrever as novidades desses últimos meses, minha
mamãe veio morar comigo logo que completei o terceiro mês. Ela parecia
feliz aqui, ajudava o Yan por vontade própria, ele em nenhum momento se
mostrou discordar de sua presença aqui, e se deram muito bem. O problema
era que eu achava que o coração dela ou pelo menos uma parte grande dele,
havia ficado em Minas. Minha mãe nasceu, cresceu e viveu sua vida toda lá,
não tinha como sentir falta e eu entendia isso, mas eu podia apostar que ia
‘tentar’ me fazer voltar, assim que Catarina nascesse. Nunca falamos nisso,
claro que no momento ela nunca falaria, mas apostava alto que isso ia
acontecer, se ela não me ‘arrastasse’ pra lá, ia fazer com que eu a visitasse
mensalmente. Era fato.
Faço meu tour com tranquilidade e volto pra casa. Tiro minhas botas baixas e
fico só de meia. Eu que achava que Barbacena era a cidade mais fria do
Brasil, descobri que pensava assim somente porque nunca tinha entrado nos
limites de Bagé. Sento-me no sofá, e sinto o cheirinho maravilhoso da
comida de minha mãe. Limpo o prato, repito, converso um pouco com ela e
volto pro sofá. Essa minha tranquilidade, paz de espírito, e a presença e o
cuidado de dona Isabelle, não tinham preço.
— Nossa que cheiro bom. Ainda tem pra mim???
Yan entra na sala ao mesmo tempo em que minha mãe volta da cozinha, na
hora ela abre um enorme sorriso para ele. Minha mãe dizia que eu devia
casar com ele, ele era um gato, travesso, e combinava com a filha linda dela,
dizia ela que formávamos um belo par.
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— Tem querido, vou buscar!


Minha mãe sai correndo para fazer o prato dele e o esfomeado se senta do
meu lado no sofá, pega meus pés e começa a massagear.
— Essa minha funcionária já está com a vida ganha! Terrível.
Ele resmunga me olhando e só pelo sorriso de lado que ele dá, já fico com
vontade de sentar em seu colo. Nua.
— É só minha hora de almoço, preciso fazer a digestão. — eu digo e ele ri
alto.
— Quem era lá na recepção?
— Um hóspede gringo querendo agradecer a hospitalidade.
— |E como vai seu inglês? — pergunto e ele sorri enquanto fala em um
inglês fluente.
— It's perfect , my love ! I can even say I want you forever in my life. And
that right now I want to make love to you ! Do you want?
Ele pergunta e eu sorrio. Não sou fluente, mas também não sou uma anta.
— Não posso, sua funcionária precisa trabalhar!
Eu respondo e tiro dele uma risada deliciosa.
— Já chega de trabalhar, já era pra você ter parado faz um mês! Chega
aqui…
Ele me chama, tiro os pés de seu colo, e me aproximo. Penso que ele vai falar
alguma coisa, mas ele me beija, aquele beijo doce, e difícil de descrever. Yan
era delicioso. Sua língua toca a minha e sua mão me puxa para mais perto.
Toco sua nuca, aperto com vontade, claro que inconscientemente, e minha
mãe chega com o prato de comida, toda sem graça com a cena. Ela entrega o
prato pra ele, me lança uma piscadela e desaparece pela porta de saída da
casa. Ficamos os dois olhando ela sair correndo — Yan segurava uma risada
fora do comum, e eu sentia meu rosto queimar — e logo fechar a porta atrás
de si. Assim que ela se foi, ele colocou o prato quente na mesa de centro e me
puxou para eu me sentar em seu colo.
— Vem, guria…
Ele diz com a voz grossa já denunciando a excitação e me beija com força.
Seu beijo tem um forte apelo sexual, como igualmente dizia o quanto gostava
de mim. Ele era rápido, firme, e tinha mania de beijar com as mãos. Suas
mãos não paravam de me examinar e aquilo era surreal.
— Espera… — ele sussurra e eu quase me recuso a parar de beijá-lo.
— Namora comigo! Vamos fazer isso direito. Você é uma moça de família.
— ele fala sorrindo e eu acho fofo.
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— Aceito. Agora vamos nos beijar, não faço isso há meses!!!


Ele ri e volta a me beijar com vontade.
— Oh, minha prenda… vou te fazer a mulher mais feliz desse mundo!!!
— Preciso muito disso!!!
— Eu sei. Já devia ter começado faz tempo! Assim que te vi sentada de frente
para aquele lago, eu já te queria pra mim! Já queria te fazer feliz, tirar aquela
tristeza de você!!!
Ele fala e dou risada por um momento e ele me olha de forma engraçada.
— “Não me interesso por você, tenho namorada!” — forço um sotaque que
ele não tinha e o faço rir.
— Claro! Guria mala!!! “Não tenho tempo pra flertar”, mulher enjoada!!!
Yan diz enquanto ria alto e eu não queria que aquele dia terminasse nunca.
Namoramos e ficamos agarradinhos pelo resto da tarde, só curtindo o
momento sem pensar em nada e sem culpa nenhuma da minha parte. Até
fizemos um brinde ao início de nossa vida “juntos”, eu com suco natural de
laranja e ele com um vinho nacional feito no sul. As únicas testemunhas eram
a lareira da sala rústica e o próprio fogo que nos aquecia. Ninguém mais.
— Vem, vou te levar pra cama! Nem sei se tu consegues subir essas escadas.
— Acha que eu subi todos esses dias, como? — ironizo fingindo estar
nervosa e ele ri.
— Essa sulista que não nasça logo, não… já, já tô tirando ela daí, aqui em
casa mesmo, á força!
Yan sobe as escadas comigo, me segurando pela cintura. A impressão que eu
tinha é que ele temia que eu explodisse.
— Ainda vou completar nove, homem, ela precisa ficar aqui até os últimos
momentos!
— Tá demorando muito.
Ele diz e eu sorrio para ele, mas ele não vê. Yan só prestava atenção na
escada e em minha segurança. Parecia que ser tua nova namorada mudava um
pouco as coisas. Ele sempre foi cuidadoso comigo, agora estava ao extremo e
por isso a minha felicidade não cabia dentro de mim.
{Nessa noite, Yan subiu comigo até o quarto, perguntou se eu queria um
banho, eu disse que sim — mesmo morrendo de preguiça — , e logo ele me
deu as costas para encher a banheira. Assim que me sentei na cama e me
encostei no amontoado de travesseiros para esperar a banheira encher, o
líquido que protegia meu anjinho, transbordou na cama e correu como um rio
vivo por entre minhas pernas. Catarina avisava a mamãe que era hora de vir
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ao mundo! Ao invés de gritar só chorei, ao invés de me desesperar por saber


que meu bebê lindo ia nascer de oito meses, apenas comemorei. Ela viera
para transformar a minha vida mais cedo do que eu esperava, me dando a
honra de pegá-la no colo, e de poder olhar para ela, como um presente de
Deus, literalmente. Catarina nasceu no raiar do dia, exatamente às cinco da
manhã, logo que o sol começava a surgir. Uma manhã de sábado que seria
inesquecível. E naquele dia não fez frio, naquele dia, ainda inverno, a nevasca
que os meteorologistas informaram que poderia chegar, não passou por aqui.
O céu no período da manhã, estava azul anil com pinceladas de nuvens
branquinhas, para deixar o dia ainda mais perfeito e cheio da mais pura
poesia. A natureza sentiu a chegada de Catarina. A sua doçura, sua pureza e
delicadeza, eram como magia. Yan que ficou grávido comigo durante os oito
meses, só chorava, minha mãe não sabia se chorava ou se sorria e eu… eu
não era mais a mesma. Uma Ellen totalmente transformada carregava uma
princesa loirinha de olhos azuis no colo, e eu tinha ainda em mim, tudo o que
eu tinha de melhor, todas as minhas qualidades, só que mais… agora eu era
extremamente forte, era braços acolhedores, um colo pra consolo, um sorriso
que irradiava, e era sua proteção eterna… eu era MÃE. E por último, mas não
menos importante, mas ainda sim, um detalhe que se tornou pequeno diante
daquele sábado especial, eu era Ellen.}

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21
TORTURADO DE NOVO

— Vai demorar muito???


Entro no quarto e vejo Julia de calcinha e sutiã, no momento vestindo um
vestido preto. Pois é, consegui ficar com uma mesma mulher por mais de um
ano. Achei que nunca conseguiria, depois de ter perdido Ellen de vez… sim
eu tentei encontrá-la, ouvi rumores de que estava em Bagé, no sul, mas pelo
jeito cheguei tarde demais. Mas só não foi tão difícil — esse nosso
relacionamento. — por alguns motivos: Julia é alma livre, não me sufoca, não
me controla, não dá crises, não fica no meu pé, não é dependente, quando
está comigo me trata com amor e é carinhosa. Por isso durou! Ela começou
suas aulas fixas em Barbacena para ficar comigo, Laura também se recusou a
ir embora e deixar “a dupla” que era um trio, e tudo caminhava bem, as duas
se davam bem. Eu voltei recentemente de Manaus, fiquei alguns meses para
passar o treinamento de um caça brasileiro para minha antiga equipe de
sargentos. No momento, trabalho com meu pai, nosso relacionamento ficou
estável, minha mãe e ele não brigam mais por minha causa, e agora, tudo o
que penso a respeito deles, guardo para mim, afinal, em uma das últimas
brigas feias que tivemos, dona Hella se viu obrigada a aceitar que eu não
voltaria mais para a chácara, e que eu queria apenas viver a minha vida em
paz. Bom, eu sei que aceitar ela não aceitou, mas fingiu, todo mundo fingiu
acreditar, e tivemos alguns meses de calmaria na família.
— Toda mulher demora a se vestir, amor!
— Mas você é linda até vestida de mendiga. É só um jantar…
Digo subindo o zíper de seu vestido. Engraçado que vendo ela tão linda, tudo
o que eu queria era tirá-lo.
— Sua irmã está voltando, o que significa que é um jantar especial!
— Tá bom, quando chegar lá e ver todo mundo de chinelos de dedo, vai ficar
com cara de paisagem e se sentir um peixe chic fora d'água!
Eu falo e ela se vira para me olhar nos olhos.
— Sua família? De chinelos de dedos? Tá bem!!!
Ela zomba, eu zombo de seu comentário e saio do quarto. Laura jantava
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sozinha na cozinha.
— Lá terá comida, esfomeada…
Eu falo e me sento ao seu lado. Papear talvez faça o tempo passar mais rápido
e algo aconteça com Julia, tipo um milagre…
— Eu não vou. — ela diz enquanto mastiga.
— Por que não?
— Porque tenho um encontro!!! — ela fala e eu solto uma risada alta.
— Quem em sã consciência, vai querer sair contigo? — zombo.
— Pode acreditar, existem pessoas capazes de sair comigo! E se eu te contar,
você não vai acreditar!!!
Ela fala de um modo enigmático e faz suspense parecendo feliz.
Inconscientemente fico feliz por Laura, já era a hora dela, aliás já tinha
passado.
— Pronto, meu amor. Vamos?
Júlia chega à cozinha e respiro aliviado. Seu salto alto, vestido preto até a
metade das coxas, e maquiagem caprichada, não lembrava em nada, a capitã
por quem eu tinha que prestar continência no trabalho, e fingia que eu era
qualquer um enquanto estava usando farda. Mesmo assim, de qualquer jeito,
com qualquer roupa e principalmente sem, Júlia era uma deusa.
— Vamos. Tchau, moça misteriosa, bom encontro!!!
Digo e pisco pra ela, Laura me devolve a piscadela, sorri e continua
comendo.
Abro a porta do carro pra Júlia entrar, entro no lado do motorista, e faço o
carro andar. A noite estava tranquila, o frio de sempre não estava insuportável
como de costume, e nem ao menos tinha vento. Júlia incendiou o carro com
seu perfume, mexia no celular e se mostrava distante.
— Você está bem? — pergunto.
— Estou ótima, e você?
Ela me devolve a pergunta e sorri um sorriso do doce. Júlia tinha um tipo de
sorriso para cada situação, eu sabia como estava seu humor só dela olhar pra
mim, e naquele momento ela estava normal, feliz.
Passamos um bom tempo brigando no início, por causa de seu
profissionalismo ao extremo na escola. Enquanto fardada ela não me olhava
com doçura, não me tratava como se me conhecesse, não era gentil, e não se
mostrava íntima a mim. A gente podia passar a madrugada transando, mas no
trabalho eu era apenas seu subordinado.
Naquela época achei que eu não aguentaria seu temperamento lá, ela é
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terrível e uma profissional incrível ao mesmo tempo. Quando chegava em


casa se transformava, era aberta, alegre, espontânea, outra pessoa. E eu, ao
contrário do que pensei, comecei a amar isso, comecei a me encantar com as
várias mulheres que ela me oferecia. Virou um fetiche. Ela me criticava nos
debates a respeito dos procedimentos de segurança, eu respondia suas
afirmações com “Sim, senhora!”, mas apesar de ríspida e grosseira, eu sabia
que ia chegar em casa, e ao estralar os dedos, teria aquela capitã de quatro pra
mim, literalmente, como diversas vezes aconteceu. Não me recordo de
quantas vezes cheguei em casa puto com sua patada, sua atitude, e a encontrei
nua na minha cama, às vezes nua e se tocando, só me esperando. Ela não
falava uma só palavra, tinha seu próprio modo de se desculpar, e era por
essas e outras que eu ainda não tinha me enjoado daquela mulher madura de
mil faces.
Olho pra ela. Não respondo sua pergunta e só sorrio. Ela entende. Eu não
precisava falar, ela não precisa falar. Chegava até ser engraçado.
Paro o carro no lago, tiro meu cinto, ela pega sua pequena bolsa no banco de
trás e já ia saindo, mas eu não deixo. Pego em seu braço e ela me olha
curiosa.
— Que foi? Vamos! — ela diz.
— Não, agora não. Preciso relaxar. Preciso de você!
Digo, arrasto o banco para trás e puxo-a para meu colo.
— Quer fazer isso aqui?
— Quero e vou.
Digo desabotoando minha própria calça, e enquanto levanto seu vestido na
altura dos seios e puxo sua calcinha pro lado, ela morde o lábio inferior e me
olha parecendo sentir dor.
Fico por um momento, passando lentamente o dedo sobre sua abertura
enquanto a via salivar, e parei quando sua abertura também salivava. Era o
momento. Puxo ela pra mim, faço ela sentar, e ela já desce gemendo. Encosto
a cabeça no apoio e curto o momento como se tivesse recebendo uma
massagem, uma massagem em um músculo tensionado. Literalmente.
— Rebola, minha gostosa, isso… ahhh… assim… Isso. Não para!!!
Júlia rebolava e gemia alto. Ela sentou com gosto e meu músculo estava todo
socado dentro dela de um jeito maravilhoso. Pego em sua nuca e puxo sem
dó, Júlia podia ser qualquer coisa que ela quisesse em qualquer lugar, mas
comigo, sem farda, era a minha vadia, só minha. E vadia eu tratava daquele
jeito, com muito pau e muito tapa.
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Bato em sua bunda, “arranco” ainda mais os cabelos de sua nuca, e puxo com
força o fio rendado de sua calcinha, porque eu sabia que naquele momento,
apesar de estar no cantinho, uma parte dele tocava seu ponto mágico. E ao
fazer isso por várias vezes, puxando a calcinha fazendo um vai e vem,
enquanto empurrava meu quadril pra dentro dela, ela gozou antes de mim.
— Se apóia no volante, me dá suas pernas…
Eu peço e ela obedece mesmo com dificuldade por causa da moleza de seu
corpo, causado pelo orgasmo.
Ela apóia os cotovelos nos espaços por entre o volante, coloca as pernas ao
redor do banco, na altura de meus ombros, e eu imediatamente inclino minha
cabeça na direção de sua entrada encharcada. Sugo tudo, mas não perco
tempo tentando fazê-la gozar de novo. Após deixá-la praticamente seca, faço
ela sentar de novo, porque agora seria minha vez.
— Agora cavalga. Cavalga em mim, quero ouvir você gemer pra mim, como
uma vadia. Minha vadia.
Eu mando. O carro começa a balançar ferozmente, os vidros começam a
embaçar, e quando ela pensa em cansar, pego em sua cintura e a faço
continuar pulando com mais força. Faço isso enquanto ela gritava, e só paro
quando gozo.
— Camisinha…
Ela fala em meio a gemidos finos e eu continuo estocando com força até sair
tudo.
— Deveria ter falado nisso antes, agora vai ficar com porra aí dentro pelo
resto da noite!!! Você merece isso!
Eu digo com raiva por também não ter lembrado, e inconscientemente á
culpo.
— Tay, vai escorrer por minhas pernas…
Ela resmunga enquanto tentava levantar, mas eu não deixo. Faço ela ficar
sentada por mais um tempo.
— Fica aí. Se você rebolar mais um pouco, podemos começar de novo. — eu
falo e ela ri.
— Estão nos esperando! Você é maluco!
— Não me importo, quero te foder ainda mais! Rebola pra mim.
Eu digo e ela obedece. Júlia acende a luz do interior do carro, e rebola me
olhando nos olhos. O barulho que seu movimento faz é música para meus
ouvidos. Ela Faz uma cara de safada e passa a língua na minha boca até eu
gozar de novo e foi além. Sorte que eu tinha lenços umedecidos no carro,
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porque se não fosse isso, coitada…


— Será que eu tô suja? – ela pergunta e eu sorrio ao sair do carro.
— Espero profundamente que sim!
Digo e vejo a maluca passar a luz do celular pelo vestido.
— Você está bem. Continua linda!.
— Se eu não estiver, todos saberão que a culpa é tua! — ela diz rindo.
— Graças a Deus, não é!? Podia ser culpa de outro homem… aí, não ia ser
legal!!! — eu falo, ela ri, me dá um beijo e diz que não tem a menor
possibilidade de ser outro.
— Meu Deus! O que estavam fazendo? Vimos vocês chegarem lá fora!!!
Como vai, Júlia? — minha mãe a cumprimenta e depois me beija!
— Vou bem, se… Hella! E você?
Júlia quase comete uma gafe, mas se redimiu a tempo! Minha mãe sempre
disse que não deveria chamá-la ‘senhora’.
— Vou bem também, fiquem à vontade! Seu pai foi buscá-la no aeroporto. Já
estão chegando!!!
Minha mãe estava extremamente feliz. Ana Luiza voltava para o Brasil pra
passar suas férias conosco. Ela tinha começado um curso “pré-faculdade” de
finanças. Eram dois anos e depois ingressaria em Harvard. Óbvio que
conseguiu ser aceita, e obviamente tinha obtido as melhores notas. E eu nem
precisava ver meu pai para saber que ele estava nas nuvens.
Estavam todos lá, Gabi, Gustavo, Nina, Rafa, vovó, e dona Fátima, a “nova”
cozinheira. Era possível tocar a felicidade ali, era palpável. Não tinha nada
que precisasse ser corrigido, nenhum provável problema, aquela noite era a
noite de alegria para a família e eu gostaria que ficasse assim até o final!
— Como você está, meu amor?
Sento ao lado de dona Jô, e no mesmo instante ela puxa minha cabeça para
fazer cafuné.
— Tô bem vovó, e a senhora? — pergunto e ela sorri.
— Estou cem por cento!
— Isso é bom!
— Você está a cara do seu avô… lindo, parece um príncipe!!!
Ela diz e eu me viro para olhar em seus olhos. Minha avó chorava. Ela sentia
muito a falta de seu Luis e mais do que isso, lamentava demais tudo o que
aconteceu durante todos esses anos e mais, minha vó se sentia culpada por
tudo o que aconteceu com Ellen. Ela queria ter feito alguma coisa para
tranquilizá-la, ter tentado impedir sua partida, amenizado seu sentimento de
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culpa, mas naquele dia ela estava tão abatida, que nem conseguiu. E agora
olhando para mim, pude ver que nada mudou, minha vó continuava se
sentindo muito culpada por tudo o que aconteceu comigo, e eu entendia que
talvez, nada do que eu dissesse faria aquilo passar ou deixar de existir. Por
isso só a abracei e disse que a amava muito. Foi um abraço maravilhoso e
demorado, do jeito que nós dois precisávamos.
— Vou ao toalete. — Julia diz e eu sorrio.
— Relaxa mulher, você está em perfeitas condições!
Eu falo e vejo Rafa sorrir achando aquilo engraçado, sem diretamente olhar
para nós. Ele sabia.
Esperamos por Ana Luiza durante uns vinte minutos, e naquela altura do
campeonato, Nina não conseguiu manter os jovens gêmeos sentados e
comportados, como ela gostava. Logo levantaram e começaram a competir
com “braço de ferro”.
— Vem titio, competir comigo! Gustavo sempre perde!
Gabi se levanta de repente e faz pose de musculosa.
— Eu vou, mas você vai perder!
Eu digo, me levanto, vou até a mesa de centro e finjo perder pra ela.
— Não estou dizendo? Sou a mais forte do mundo!!!
Gabi grita comemorando, e Marina quase tem um treco. Antes que ela
pudesse repreender a menina, a sala toda faz um coro: “Deixa a menina,
Nina!!!” — dou risada da cara dela e ela mostra a língua pra mim.
— Minha vez!!!
Rafa se levanta para competir com a filha e Gabi finge querer lutar com ele.
Tal pai, tal filha. Sento-me aonde ele estava sentado e agarro minha tia gata!
— Você está linda hoje, Marina Coverick!
Eu falo em seu ouvido e Marina olha para Julia rindo e fingindo fazer inveja.
Se fosse outra garota, já ia ver em minha tia “uma rival” e a implicância seria
inevitável. Mas não era qualquer uma, era Julia.
— Só fale pra ela que você também me disse isso!!! — Julia resmunga e
minha tia se diverte.
— Não sente um pingo de ciúmes pelo meu sobrinho gato, Ju???
Nina questiona e Julia nega com a cabeça.
— Não tenho porque eu confio. Sempre soube quem ele era, e por isso, sei
lidar! Sei que se eu fosse ciumenta e pegajosa, já não estaríamos mais
juntos!!! — Julia diz e Nina ri embasbacada com sua perspicácia.
— Então é uma tática… — resmungo chegando perto dela como um
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predador e ela finge estar com medo.


— Cada um usa as armas que tem, amor! – ela diz e não posso deixar de rir.
— Você então, é a primeira namorada inteligente que ele arruma!!! Apesar de
que só foram duas…
Tia Nina deixa escapar enquanto ria, e eu sinto uma dor horrorosa no
coração. Quando ela percebe o que disse já era tarde. Sei que não fez de
propósito, e não fiquei bravo, apenas me lembrei e lembrar me causava dor, e
a dor me fazia travar.
— Tay, sinto muito… me desculpa, eu…
Ela começa e faço ‘não’ com a cabeça. Assim ela sabia que era para calar a
boca eternamente. Volto para o lado de Julia, me sento ao seu lado, sorrio
fraco pra ela, e ela me devolve o sorriso tocando em meu ombro com carinho.
Ali ela dizia que estava tudo bem!
Quando eu achei que ficaria com aquela angústia dentro de mim a noite toda,
Lulu chega e acaba com ela. Ela estava enorme, quase batia na minha altura,
até seu corpo magro já estava formado. Para o sofrimento do meu pai, Lulu já
era uma mulher. E uma mulher linda!
— Ah! Qual é… achei que ia ter gritaria e balões!!!
Ela diz rindo e corre para abraçar minha mãe e depois todo mundo,
praticamente ao mesmo tempo. Quando chega minha vez ela para, me olha
nos olhos, e parecia que com ela ali, meu exterior estava exposto. Ana Luiza
me enxergava, ela me conhecia, e meu real estado de humor ficou estampado
em seu semblante. Antes dela cair no choro por algum motivo, ela me
abraçou apertado e não disse nada, não perguntou como eu estava, não disse
uma única palavra! Luiza sabia que se me perguntasse eu contaria, e a última
coisa que ela gostaria de fazer, era conversar sobre meus sentimentos na
frente de todo mundo.
— NÂO!!! Oh! My god! Você ainda está aqui… — Luiza exclama ao ver
Julia.
— Estou e permanecerei! — as duas riem. — Como você está, cunhada? —
Julia pergunta e Lulu sorri ao responder.
— Estou maravilhosamente bem!!! Trouxe um monte de presente gringo!
Você vai amar!!!
Ela fala e Julia demonstra interesse. Lulu vai passando de mão em mão e não
parece cansar nunca, seu sorriso sincero chegava aos olhos, minha irmã
claramente demonstrava estar feliz por estar em casa.
— E então Ana, o que você estuda lá???
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Julia puxa o assunto na mesa e Lulu sorri ao contar.


— Estudo finanças na universidade Ithaca em Nova York. É uma parte
separada, não é curso superior, só extensão, uma introdução para chegar em
Havard e ser a melhor!
Ela diz rindo e todos sorriem ao vê-la falar sobre o assunto. Os olhos do meu
pai brilhavam.
— E você está trabalhando?
— Não, ainda sobrevivo com o dinheiro da família. Mas saí de lá com uma
proposta tentadora para trabalhar em uma multinacional. Com meu curso
quase terminado e um currículo aceito em Harvard, algumas portas já se
abriram pra mim. Sem contar… — Lulu para de falar e olha pro meu pai —
que recebi algumas propostas para fotografar…
Ela fala e faz sua carinha de anjo para meu pai.
— Pode continuar sobrevivendo com o dinheiro da família!!! Foi para isso
que seu bisavô, seu avô e eu, trabalhamos tanto! Jamais precisará ser
“modelo”. – ele fala e a mesa toda dá risada da cara dele e de seu ciúme.
— Papai, são só umas fotos para uma campanha!!! Vai ser incrível!
Ela fala sorrindo e a cara do meu pai não é muito boa.
— Falamos sobre isso depois!
Minha mãe diz pra ela segurando o riso, e meu pai parece agradecer dona
Hella só com olhar. Nesse momento minha mãe toca sua mão na mesa e
parece transmitir uma onda de calmaria pra ele. O tempo passou e ela e
minha vó continuavam a serem as únicas que sabiam lidar com ele.
— Bom, de qualquer forma, não aceitei porque soube que o senhor ia fazer
essa cara, e aliás as fotos chegariam até aqui!!! Não podia arriscar receber
como castigo, ‘ter que voltar pra cá’! – ela fala com humor e meu pai parece
relaxar!
— E como vão os namorados?
Vovó provoca e todos, até Lulu, olham pro meu pai.
— Bom, vovó, sabe como é, Nova York, inverno pesado…
Lulu fala com minha vó, mas olha pro meu pai segurando o riso.
— BRINCADEIRA!!! Não tenho namorado. Não ainda!!!
— Me mostra alguém que pretende estudar em Harvard e consegue juntar
estudos com namoro ao mesmo tempo, e eu te dou a benção! — meu pai
resmunga irônico, e Lulu releva.
— Não existe, papai!!! É por isso que sou uma bela jovem encalhada e com
notas boas, em NY.
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— Graças a Deus! — ele diz levantando as mãos e até eu consigo rir disso.
— Aliás, eu não queria falar de trabalho hoje, mas só para comunicar,
gostaria de falar com Jon a respeito das nossas propriedades no sul. Eu não
tenho certeza, mas acho que recebi um e-mail do poder publico brasileiro.
São impostos, IPTU, ITBI, e bom, não entendo muito bem, mas parece que
tem notas não pagas há anos. Quero resolver isso antes de voltar para Nova
York, pelo que vi, podemos perder as propriedades sem direito nenhum!!! —
Luiza diz e meu pai concorda.
— Quer ir até São Paulo? Jon já é superintendente de toda a administração da
FAB em Pirassununga, não sei se terá tempo para vir até aqui! — ele fala e
ela confirma com a cabeça.
— AGORA… — ela quase grita — Que tal vermos o que eu trouxe para todo
mundo??? — ela se anima e o gêmeos pulam da cadeira.
Dona Fátima e algumas auxiliares que eu nem sabia que existiam lá, retiram
as sobremesas da mesa, após levantarmos, e minha mãe pede que o café seja
servido na sala.
Ana Luiza trouxe duas malas enormes só de presentes, quase uma delas
inteira era só com roupas para minha mãe.
— Eu sei que você não gosta de muito paparico então pra você, trouxe um só.
— ela resmunga e quando se aproxima de mim, fala baixo. — Se eu fosse
você, só abriria em casa!!!
Eu concordo, agradeço pelo presente com um beijo, e ela retorna para
entregar os restantes. Dona Fátima traz os cafés, e ficamos ali por um bom
tempo. Só falando de Nova York, Harvard, e presentes.
Os gêmeos ganharam muitos brinquedos, Nina Jóias, Rafa um par de luvas
autografadas por alguém importante e camisetas de um time de basquete
famoso. Vovó ganhou uma caixa florida com diversas lembranças dos lugares
que Nina conheceu e algumas outras coisas como roupas e jóias. Para Júlia
um par de saltos alto que a deixou radiante por algum motivo, acho que pela
marca. E na hora de entregar o do meu pai ela zombou: — E pra você, papai,
o que será que eu trouxe!? — ela coloca as mãos na cintura e olha pra ele. Ele
sorri.
— Aposto que nada… a não ser os boletos de mais de dez dígitos…— ele
resmunga rindo.
— Bom, isso também, Quem mandou querer outro filho!? Sem contar o fato
de estar solteira e ainda virgem, o que é um ótimo presente para o senhor…
— ela ri e meu pai fecha a cara. —… eu também te trouxe isso aqui!!!
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Meu pai abre a caixa, mas logo fecha por causa das crianças. Era uma pistola
Tanfoglio, prateada e maravilhosa, chegava a brilhar. A cara dele.
— Como conseguiu passar pela alfândega com isso???
Meu pai estava feliz pelo presente que ele ia somente emoldurar e jamais
usar, mas também estava assustado com sua pequena princesa que estava
prestes à fazer dezenove aninhos e andava por aí armada.
— Bom, em um dos meus passeios pelo Texas, fiz o curso para brasileiros,
tirei a licença, comprei, e sendo somente uma, e com todos os documentos
em dia, a alfândega não pôde me impedir. “No Texas, qualquer presa pode
ser o predador.” até uma garotinha brasileira!!! — ela diz sorrindo e dá um
abraço nele. — Vai papi, dá um sorriso! Não é melhor estar ciente de que
com porte, posso me defender até no Bronks?
— Por que você frequentaria o Bronks? — ele sorri e pergunta.
— Simplesmente porque é aonde tudo acontece!!!
Ana Luiza diz isso rebolando e meu pai volta a se sentar. Ele ignora os risos
soltos de todos e fica vermelho igual pimentão. Eu estava amando ter Luiza
de volta.
— Bom, já vou indo!!! Estou exausto! É muito bom ter você de volta! Eu
estava morrendo de saudade!
Algumas horas depois chego a minha irmã e falo baixo.
— Já vai? Vai voltar amanhã??? — ela pergunta com um semblante triste.
— Vou sim! Que tal sairmos só nós dois? Matar a saudade… conhecer o
Bronks mineiro…
Eu falo e ela ri colocando a mão na boca. Maluca.
— Combinado!!! Te espero aqui!
Ela diz, ganha um abraço meu muito apertado, cumprimenta Julia, e depois
de dar ‘tchau’ para toda a família, nós vamos embora.
— Como você está?
Julia saiu do banho primeiro e passava seus inúmeros cremes, sentada na
cama. Me sento ao seu lado, visto uma camiseta, e respondo sua pergunta.
— Estou bem. Muito bem, meu bem! — resmungo e ela ri.
Me jogo na cama e deito de bruços. Estava tão cansado que nem abri o
presente de Lulu. Só cheguei em casa e fui pro banho, estava tão perdido que
nem perguntei para Laura quem era o corajoso que tinha aceitado sair com
ela. Me esqueci.
— Amor, esqueci minha bolsa na sua casa…
Julia fala e eu fico com preguiça de responder.
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— Tudo bem, vou sair com a Lulu amanhã. Passo lá e pego!


Eu falo, fecho os olhos e apago.
Acordo cedo com Julia em cima de mim.
O dia estava ensolarado e parecia perfeito para um passeio. Me levanto,
escovo os dentes, e sento na poltrona para abrir o presente de Lulu enquanto
aproveitava que Julia ainda dormia. Se Luiza tinha dito para não abrir na
frente dos outros, talvez Julia não fosse uma exceção.
Dentro da enorme caixa havia uma carta escrita a mão, e uma agenda grossa
com a estampa de um cavalo. Na carta estava escrito: "Meu irmão, estou eu
aqui, linda em NY, brincadeira… estava à toa arrumando as minhas malas
para voltar para a nossa família, e organizando os presentes que comprei
para todos. Procurei em todos os lugares dessa cidade grande, alguma coisa
que talvez você gostasse e então, não encontrei nada. Você é completamente
desapegado, tão desapegado que nem tem algo que goste tanto… você não
coleciona mais as aeronaves que papai te dava, não joga mais seu
videogame nem PSP, sei que não é fã de leitura, e apesar de ter um estilo
único, não é muito ligado em roupas ou relógios. No fim, voltei pra casa
pensando em te dar apenas um abraço, principalmente porque sei que pra
você, seria o suficiente. Mas, ao organizar as minhas coisas, encontrei um
objeto que roubei da casa de dona Isabelle há muitos anos atrás, em uma das
visitas que fazia a Ellen — leio esse nome e a dor volta. —, quando papai
deixava, e ela estava de folga da chácara. Passei uma tarde com ela, pedi
para o papai deixar eu dormir lá porque íamos fazer uma ‘festa do pijama’, e
enquanto ela lavava o rosto, depois de eu ter feito algo horroroso nela, (ela
chamava de maquiagem fofa, mas ficou bizarro.) eu mexia em suas coisas
maravilhosas de adulto, encontrei essa agenda, e escondi em minha mochila
para poder ler. Aí me veio um estalo, tinha sim, algo que você queria mais
que tudo nesse mundo, algo que você desejava para toda a sua vida, e só
pensava nisso: ELLEN.
Sei que fiz errado, eu roubei para poder ler, e meu irmão, tudo o que Ellen
escreveu nesse diário, fez valer a pena o pequeno delito. Não me julgue mal,
não trouxe o assunto á tona para magoar você, te deixar ferido, ou causar
alguma mágoa. Eu só pensei em te mostrar, como Ellen via você, o que ela
sentia, e o que você significava pra ela, pois para Ellen, você nunca deixou
de ser aquele Tay. Aquele Tay que nossa família ainda tem esperanças de ver
outra vez! Sei que está com Julia, mas sei que nunca foi tão feliz como
quando Ellen estava conosco. Ainda tenho esperanças de te ver sorrir à toa,
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de contar piadas chatas, e de sorrir simplesmente porque não tem nada


melhor do que isso, a não ser fazer os outros sorrirem. Então pensei que se
soubesse o quanto foi amado, se soubesse o quão especial e essencial você
foi para uma pessoa um dia, isso poderia te ajudar a se lembrar do porquê
você é tão amado, até hoje, incluindo por ela, tenho certeza absoluta!
Não brigue comigo, amo você com todas as minhas forças, e meu maior
sonho é ver você e papai se entendendo novamente, mesmo porque, quando
vocês não brigavam tanto, ele não me sufocava tanto. (kkkkkkkk) Eu te amo,
papai te ama, mamãe também, e toda nossa família temos muito amor por
você, um amor inestimável!!! Nunca duvide disso meu irmão querido!
com amor, sua Lulu."

Leio a carta da pirralha evitando chorar como um bebê, e me controlando


para não sair do eixo. Meu coração parecia que ia explodir ao tocar a agenda
grossa, cheia de papéis, adesivos, e mais alguns trecos. Eu tinha a impressão
de que Ellen tinha tocado na agenda ontem mesmo, pois eu podia jurar que o
perfume dela ainda estava ali. Eu tinha um cuidado imenso ao tocar, porque
parecia que a qualquer momento ela ia se desmanchar na minha mão, de tão
velha que estava. Abro a primeira página da agenda e vejo pequenas
anotações sobre o tempo, e alguns desenhos feitos à mão! Leio texto por
texto, dia por dia de sua vida, cada palavra, cada verso, e chorava a cada
declaração de amor e raiva. Passei pelo momento em que toquei seu ombro
no quintal, e ela se apaixonou a primeira vista. Depois ao andar de cavalo, e
para ela eu era um príncipe. Depois nossas mensagens, viagem, e a noite mais
terrível de minha vida. Choro quando leio o que ela sentiu naquela noite e
não agüento. Fecho a agenda e na hora em que levanto o rosto, vejo Julia
olhando pra mim.
— Presente de grego?
Ela pergunta sonolenta e eu rapidamente guardo tudo de volta na caixa e
sorrio para disfarçar.
— Lulu é uma boba…
— O que ela te deu?
Ela pergunta se levantando e eu coloco a caixa no chão, ao meu lado.
— Uma carta, e sua agenda antiga!
Eu minto simplesmente para que aquele assunto não me cause mais dor e
desconforto.
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— Fez o café?
Ela se senta no meu colo e aperta sua intimidade na minha.
— Não, levantei e me lembrei que ontem eu não tinha visto o que era… nem
desci pra cozinha! — falo, ela seca meus olhos, e me beija profundamente.
— Vamos começar o dia bem, me leva pra cama…!?
— Não consigo…
— Mas que carta é essa que te faz recusar sexo??? — Julia me olha espantada
e com razão.
— Só li verdades, verdades e histórias que nunca mais se repetirão. Só fiquei
depressivo. Já, já vai passar. — eu digo e ela parece ficar triste com isso. —
Não esquenta mulher, na janta eu dou um jeito em você. — digo.
— Vamos pular o almoço também?
Ela faz manha beijando meu pescoço e eu me levanto pegando ela no colo, e
fazendo-a ficar de pé com delicadeza.
— Vou fazer nosso café. Sossega.
Eu falo e ela sorri para mim. Deixo-a sozinha, e desço pra cozinha, fazer
alguma coisa. Faço o café, coloco tudo na mesa. E escuto alguém buzinar no
portão. Saio para atender, e era um rapaz no carro, nunca o vi mais gordo.
— Por gentileza, Julia!?
— Quem gostaria?
— Pode dizer que é Santos.
Ele fala e eu concordo. Entro, grito ela da escada, e ele desce alguns degraus,
ainda de camisola.
— Tem um ‘tal de Santos’ te procurando lá fora! — eu falo e ela faz uma
cara preocupada.
— Quem é? – pergunto.
— Meu tenente. Vou trocar de roupa!
Ela diz e sobe correndo. Volto pra mesa e bebo meu café sozinho. Ela desce
de calça jeans e camiseta, vai atender o portão e volta três minutos depois,
com um semblante preocupado.
— O que ele queria???
— Só conversar a respeito um trabalho que eu indiquei pra ele.
Ela mente. Olho para a cara dela e vejo que não está muito boa, mas ignoro
porque não queria mais dor de cabeça hoje. Tomamos o café em silêncio,
Julia continuava pensativa, e Laura chega trinta minutos depois.
— Vai me contar quem é o maluco ou não? — falo rindo e ela fecha a cara.
— Bom dia! Bom dia, Julia!
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Laura diz e Julia não sorri pra ela como de costume. Laura percebe a
carranca, e olha para mim levantando uma sobrancelha. Me canso do silêncio
profundo e vou tomar um banho para ir pegar Lulu. Quando saio do banheiro
encontro Julia se arrumando.
— Vai sair? — faço a pergunta óbvia e ela responde sem me olhar nos olhos,
e de cara fechada.
— Sim. Mais tarde estou de volta.
— Vai aonde?
— Sair.
Ela é ríspida e minha paciência acaba.
Vou até ela e a pego pelo braço, do jeito que ela não gosta.
— Se tiver algum problema comigo, me fala, não faça joguinhos. — falo
baixo porém irritado.
— Só não estou bem, não é nada com você. Fica em paz e me solta!
Ela manda, mas não obedeço.
— Pode comandar um batalhão, mas dentro de casa é minha mulher, então
aja como tal. Aqui é você quem abaixa a cabeça. Não tente me rebaixar aqui,
não faça tipo! Você nunca foi assim! Estamos juntos há mais de três anos,
porque você sempre teve bom senso. À partir do momento que você perder a
noção, eu deixo você! Me conta porque está brava, eu te escuto, nós
conversamos, e resolvemos a situação. Não me conta, você continua brava,
eu fico bravo, solto seu braço, e vou embora, e acredite, no momento em que
eu estou, do jeito que eu estou, vou embora e não volto mais!!!
Eu falo e seu semblante muda de ódio para raiva, de raiva para uma leve
chateação e de chateada ela para em um semblante preocupado.
— É um problema de família, Santos é meu primo! — ela fala baixo, eu solto
seu braço e ela diz “Obrigada”.
— Qual é o problema? — pergunto enquanto me trocava.
— Não quero falar disso. Se não se importa, prefiro guardar pra mim e ir
resolver!
— Você quem sabe. Saiba que estou aqui se precisar de ajuda.
— Eu sei, já vou!
Ela pega sua bolsa e se adianta pra porta. Faço ‘psiu’' para ela, e a bonita
entende que estava faltando alguma coisa. Ela dá meia-volta, me dá um beijo
na boca, e se retira. Termino de me arrumar, pego a caixa no chão para pensar
em um lugar para guardar, e abro mais uma vez. Eu não havia terminado de
ler, e ia deixar para fazer aquilo outro dia, mas abri mesmo assim e encontrei
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a carta aberta como se tivesse sido lida. Eu me lembrava de ter lido e fechado
logo em seguida. Julia havia ficado curiosa demais porque tinha me visto
chorar, porque neguei fogo, e porque menti, ela também sabia quando eu
mentia, e por isso estava brava. Respirei fundo por algumas vezes, guardei a
carta, e escondi a caixa. Eu não poderia culpá-la, até eu ficaria. Tudo bem
sermos liberais e não contarmos tudo, mas mentir era pesado, e eu melhor do
que ninguém sabia disso.

Paro o carro no lago e vejo Nina caminhar até meu carro. Ela vestia uma
calça preta, casaco grande marrom, e botas. Apesar de característico, não me
lembrava em nada à criança que tinha praticamente crescido na chácara.
— Então o que achou do presente???
Ela pergunta meio apreensiva. Fiz uma cara séria, mas depois sorri e ela
relaxou com a mão no coração.
— Eu amei, tua ladra!!!
— E então? Aonde vamos? — ela ri e questiona se balançando.
— Cinema, shopping, teatro, parque de diversões, restaurante… podemos ir
pro centro, se quiser, BH é mais completa!!! — eu digo e ela nega.
— Pra mim um bar e umas biritas, tá de bom tamanho!
Ela fala e não fico surpreso. Só sorrio.
— Vou te levar no melhor lugar da cidade. Bom, melhor não, é o único que
conheço desde que cheguei aqui… vai curtir! Mas como fica a “menininha do
papai” bebendo???
— “A menininha do papai” fica bêbada, ora essa… e tem mais, assim que eu
chegar no casarão, ele vai te culpar. Meu lado ficará aliviado!!!
— Que bom que tem consciência disso. Mas e aí, não namorou mesmo? É
serio?
— Não, nem dá… — ela mente. — Os cara são gatos, não que eu não tenha
visto carne boa, mas é que o grupo de pessoas que conheço querem a mesma
coisa, sabe? Namoro está no final da fila.
— Entendo!!!
— Engraçado você estar com a Julia há tanto tempo!!! Achei que era só um
caso, apenas uma noite, nunca achei que teria coragem de ficar com outra
pessoa seriamente…
Ela diz e meu coração dói demais. Eu não entendia o que eu precisava fazer
para aquilo parar. Aquela dor absurda ia acabar me matando.
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— Chegamos.
Eu não respondo nada e Lulu nota minha fugida de assunto. Encosto o carro
na calçada e entro com ela no Mineiro's. Podia passar o tempo que fosse,
aquele lugar continuava incrível. As luzes baixas, cortinas escuras, estilo
pub… era um ambiente incrível. Toda vez que eu entrava aqui, me lembrava
de Pedro, o traidor.
— Responde!
Lulu diz assim que a gente senta à mesa. Respiro fundo, olho bem em seus
olhos e falo: — Por que está me fazendo falar disso?
— Porque te achei muito mal, ontem! Muito triste! E nada nunca te derruba,
a não ser papai, e o tema Ellen. Então como eu sabia que vocês dois tinham
dado uma trégua…
— Eu tenho cortes no coração que não cicatrizam. Julia é aquele tipo de
pomada anestésica que faz a dor passar, sabe!? Faz o ferimento parar de
arder. Não cura, mas alivia. — eu digo e Lulu sorri fraco pra mim.
— Por que você nunca a procurou? Eu soube que o papai sempre soube onde
ela esteve e por onde andou!
— Como soube? Quem te disse isso?
Eu pergunto e Lulu faz aquela cara de “falei o que não devia ter falado”.
— Mamãe sabia que ele sabia. Pronto, falei!
Meu coração ia explodir, mas antes de acontecer, Larissa aparece para
receber nossos pedidos. Mal olho pra ela.
— Oi, Tay! Ana Luiza, como cresceu, tudo bem?
— Tudo Lari e você? — Lulu é simpática.
— Bem também, graças a Deus.
Lari parecia abatida demais, cansada demais, mas não disse nada.
— O que vão pedir?
Ela pergunta sorrindo e depois de receber nossos pedidos, ela se retira.
— Ela sabia que ele sabia, ou sabia da localização exata???
— Não sei, tá legal!? Relaxa, também! Eu acho que ele só sabe onde ela
mora. Isso já faz muito tempo, irmão. Acho que agora já não dá mais pra
você fazer alguma coisa, não fez antes, perdeu tempo! — ela diz emburrada e
as bebidas chegam.
— Eu fui atrás dela. — eu digo e Lulu quase engasga.
— E aí???
— Demorei demais, ouvi papai falar com Jon pelo telefone, ouvi o nome da
cidade ‘Bagé’, de um hotel que nem me lembro mais o nome, enfim, isso foi
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há muito tempo atrás, perdi tempo demais me perguntando se ela ia me


aceitar de volta, como ia reagir, se ia mesmo me atender, ou jogar um balde
de água na minha cabeça… pensei se eu era o cara certo pra ela, se ela era
mulher pra mim, e até você sabe a resposta para essa minha dúvida. Ellen era
maravilhosa, me amava, me entendia, era especial, madura, responsável, não
merecia alguém como eu, não merecia a vida conturbada que eu levava, ela
merecia mais! Cheguei lá tarde demais, a moça da recepção disse que uma
Ellen Maia havia se hospedado lá sim, mas que já tinha partido fazia um
tempo… Disse que queria falar com um gerente, ela chamou um deles, e ele
me disse o mesmo discurso. Cheguei tarde.
Eu digo e Lulu lamenta.
— Não sabia disso…
— Foi há muito tempo, eu já estava com Julia quando me deu “um negócio”
e tomei coragem para ir. Mas aconteceu o que tinha que acontecer. Era pra
ser assim. Se fosse para ficarmos juntos, eu não tinha escolhido a FAB, não
tinha escolhido ficar aqui ao invés de ir procurá-la até no inferno se fosse
necessário!!!
— Bom, a história dos nossos pais provam que tudo é possível! — ela fala e
eu tomo um gole do meu drinque.
— Julia leu a sua carta. Viu a agenda…
— Eita! E agora?
— Agora nada. Me pegou chorando, menti quando ela me perguntou sobre o
que era o presente, e quando fui fazer o café, ela foi conferir. Ficou brava sem
me contar o que era, depois mentiu falando que era problemas na família, e
saiu. — eu falo apenas e ela parece surpresa.
— Eita, será que ela vai terminar contigo?
— Claro que não!!! Talvez só me faça dormir no sofá, mas terminar, não…
— Melhor assim…
— É. Melhor mesmo! Julia me faz bem. Faz minha vida parecer normal,
parecer completa. Agora chega desse papo. Me conta mais sobre suas
pretensões profissionais! Deveria abrir uma empresa própria, acho melhor do
que trabalhar para os outros!
Ela ri e dá mais um gole de sua caipirinha, estava bebendo demais. Já era seu
segundo copo. Meu pai ia me matar.
— Você trabalha pro governo, cara de pau!!! Como pode dizer isso?
Ela resmunga e rimos juntos. Ficamos ali por mais de duas horas, pedimos
porções para “almoçar”, bebemos mais um pouco, e fomos pra casa. Lulu
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estava bem, pelo jeito tinha treinado muito com o grupinho que “só pensava
nos estudos” lá em Nova York. E eu estava feliz porque tinha tido uma tarde
super agradável e divertida com ela. Tirando, claro, a parte dolorosa.
Entro com ela no casarão, ela diz que vai tomar um banho e trocar de roupa,
procuro por todos e não encontro ninguém. Entro no meu antigo quarto, me
deito um pouco e sem querer cochilo por mais tempo do que eu deveria.
Afinal era pra isso que servia os sábados, não é mesmo!? Pois então…
quando desperto, já eram 20:00hrs. Desço as escadas e encontro meu pai e
minha mãe na sala. Vejo que estão discutindo — ela sentada no sofá e ele
caminhando pra lá e pra cá. — e dou uns passos degraus à cima para poder
me ‘incluir fora dessa’. Eu estava correndo de briga, isso sim! Paro no topo
da escada e me lembro que ele podia estar bravo com Lulu, afinal a levei para
beber e chegamos um pouco tarde. Pensando nisso decido ouvir, pois estar
preparado para o sermão me daria pontos á sua frente, e desço novamente
alguns degraus.
—… Que história é essa!? Ela devia ter nos contado!!! Que absurdo!!! Isso é
um absurdo, Hella!!!
— Amor, por favor, fala mais baixo. Ela disse que ia passar aqui, ela vai
passar! Vamos tentar entendê-la. Vamos conversar pessoalmente e com
calma.
— Você sempre relevando a atitude de todo mundo, não é? Hella, já está na
hora de você parar com isso… estamos falando de uma criança!!!
— O que você não entende, é que se não tem alguém aqui para ser a “calma,
a tranquilidade, a paciência, e a compreensão” aqui, nessa família, estaríamos
todos destruídos!!! Você é o que mais tem sorte de eu ser como sou, afinal
passei minha vida esperando você, te perdoei inúmeras vezes, aceitei você,
seus segredos, seus defeitos e tudo o mais, por ser como sou, Droga! Agora
para de andar pra lá e pra cá, senta, respira, se acalma, e vamos conversar,
entender, e ficar feliz por ela estar aqui…
Penso que já ouvi o suficiente para entender que não era de mim ou de Lulu
que eles falavam, e volto pro quarto. Mas não mais calmo. Ando de um lado
pro outro pensando naquilo e resolvo descer, não encontro ninguém na sala,
então decido ir pra casa. Aquele papo estranho martelava em minha cabeça.
Assim que chego à porta de casa, procuro meu telefone para ligar pra Julia.
Se ela ainda não estivesse em casa, eu iria buscá-la. A gente precisava
conversar, e se entender. E não era ficando o dia todo fora de casa, ou nos
evitando, que a gente ia conseguir. Procuro meu telefone e nada de encontrar.
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Não estava no meu bolso, nem em nenhum lugar do carro. Só quando estava
começando a ficar nervoso que me lembrei que tinha tirado do bolso para
poder deitar. O celular estava no meu criado-mudo, e também me esqueci de
pegar a sua bolsa.
Viro o carro, faço o retorno, e volto pra chácara. Tirando o meu carro, o do
Rafa, do meu pai, e do Renan, tinha mais um carro estacionado no lago. Era
uma Mercedes prata. Tínhamos visita.
Entro pela cozinha, e encontro Fátima.
— Boa noite, dona Fátima.
— Oi, querido! Boa noite! Quer um pedaço de bolo? Ainda tá quentinho!!!
— ela me responde carinhosa.
— Não, obrigado! Só vim pegar meu telefone e a bolsa da Ju. Deixei no meu
quarto, vou subir lá! Sabe se temos visita? Eu saí agora pouco e não tinha
ninguém… tem um carro aí fora!
— Tem, meu amor, acabaram de chegar!!! Estão todos na sala.
Ela sorri pra mim e eu devolvo o seu sorriso.
Saio da cozinha, passo pela sala de estar, e ouço aquela voz. Voz que eu
nunca esqueci. Paro por um momento e penso que tô ficando maluco. Já não
bastava meu pai querer que eu me internasse, era preciso provar para ele que
eu também ouvia vozes, assim como ele, quando eu era pequeno. Era só
confessar, que ele me internaria na hora. Volto a caminhar tentando tirar
aquilo de mim e o meu mundo para de girar assim que eu entro na sala. Ellen
estava de pé, conversando com meus pais. Era ela… eu tinha certeza.
Eu só não sabia o que era pior, vê-la de novo, ou achar que ela estava na
minha frente. Ellen continuava Ellen, mas estava diferente. Será que me
explicar seria o suficiente? Será que era possível alguém entender o que
acontecia ali? Meu mundo literalmente parou, perdi os sentidos naturais, nada
parecia real, nada ali parecia certo, e nada mais no mundo fazia algum
sentido. Eu não me lembrava qual era meu nome, onde nasci, onde vivi, o
que eu fazia, nada. Ellen estava na minha sala e parecia um imã, ela tirava de
mim tudo o que eu tinha, todas as frases ensaiadas durante todos os anos em
que esteve fora. Todas as pedras que carregava para apedrejá-la e culpá-la por
toda a culpa que eu me recusava a carregar sozinho. Eu não tinha nada, eu
não era nada.
Ela olhava para mim com a face endurecida, minha mãe me olhava parecendo
sentir uma dor descomunal, e meu pai olhava para frente parecendo não saber
o que pensar, o que falar, e como reagir, assim como eu. Eu não ia tentar
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dizer nada, não ia fazer nenhum questionamento, pois eu não conseguia, não
podia, e principalmente tinha a consciência de que não tinha direito algum.
Eu não sabia quanto tempo fiquei na entrada da sala, parado feito uma
estátua, mas quando eu fui recuperando meus sentidos, voltando a ter olfato,
audição, e tato, algo me chamou atenção atrás dela. Dei alguns passos para
me aproximar, mas ainda sim estávamos em uma distância muito grande.
Baixo meu olhos na pequena sombra que se remexia em suas costas, e uma
criança de cabelos compridos e loiros demais, com aproximadamente quatro
ou cinco anos, me olha com timidez. Só um olhinho dela aparecia por de trás
do corpo de Ellen, ela parecia estar tímida demais para sair de lá. Ficou me
medindo com um só olhinho e depois foi mostrando mais o rosto, como se
quisesse brincar comigo. Me aproximo mais um pouco, dou um passo pro
lado, só para tentar entender o que eu via, e de repente ela sai de trás da Ellen
se colocando em sua frente, e agarrando sua cintura enquanto me olhava nos
olhos, e sorria como se eu tivesse a descoberto em seu esconderijo secreto,
muito secreto.
Eu olho para ela, o sentido do olfato melhora um pouco mais, e a razão e
consciência que trabalhavam juntos, voltam á ativa me fazendo ficar tonto. A
menina era minha cópia, era meu rosto todinho, meus olhos, meu queixo, a
cor de meus cabelos quando tinha sua idade, meu sorriso, e minha alegria,
que era capaz de encantar qualquer estranho, assim como tinha me encantado.
A menina era eu, uma versão minha só que de vestido azul marinho, meia
calça, e laço no cabelo comprido. Eu não entendo o porquê e nem sei ao
menos explicar, mas lágrimas extremamente grossas caem dos meus olhos e
eu não sei como secar. Quando eu achava que aquela dor no meu coração era
ruim, eu ainda não sabia de nada, mas aquela dor era diferente, era uma dor
que me preenchia, que fazia eu me sentir vivo, e eu tinha a impressão que eu
só vivi a minha vida toda para passar por aquilo, para sentir aquilo. E era a
primeira vez que eu sentia algo como aquilo. Era surreal.
— Quem é ela?
Pergunto olhando para Ellen e meu pai se levanta. Fecho os olhos e respiro
fundo porque sua atitude já era a minha resposta. Dou um passo para frente e
chego no começo do tapete da sala. Agora eu estava tão perto que precisava
olhar para baixo para poder olhar para a pequenina.
— Quem-é-ela?
Eu questiono pausadamente. Eu só precisava ouvir de sua boca.
Ellen tinha seu semblante frio, mas preocupado, um tanto triste, mas de nariz
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em pé e um autocontrole de se invejar. De repente ela olha para alguém e


meus olhos seguem os dela. Eu não tinha notado, mas o tal “gerente” da
pousada de Bagé — que me atendeu. — estava na minha sala. Ela faz um
sinal e ele levanta para pegar a menina. Ellen queria conversar sem ela por
perto.
— Vem… vamos dar uma volta lá fora, rapidinho!!!
Ele estende a mão para a menina e ela se recusa a sair.
— Não quero, papai, quero ficar com a mamãe!!!
Ela o chama de pai, e a dor que estava no meu coração se espalha por todo o
meu corpo, me rasgando de fora á fora, e eu tinha certeza que um cho que de
mais de 220 volts era mais aceitável. Eu olho para Ellen no mesmo momento
e ela fecha os olhos respirando fundo, mas abre imediatamente como se
lutasse consigo mesma. Aquela dor me dilacerou por inteiro, me fez sangrar
por dentro, e eu que matei todas as pessoas que deveria matar, não usaria
aquilo que eu estava sentindo como tortura, em nenhum deles. A dor que eu
estava sentindo era indescritível, e parecia que nunca teria fim. Eu era só dor
e desespero puro. O gerente conseguiu fazer a pequena sair, e eu não repeti
mais a pergunta. Olhei em seus olhos e esperei pela resposta.

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22
PERTURBADO

Tay estava bem na minha frente. Era difícil colocar em palavras o que eu
estava sentindo. Eu nunca achei que o veria novamente, pelo menos não
nessa vida. Se não fosse Ritinha estar seriamente doente, eu nunca mais
colocaria meus pés aqui. Eu cheguei, fui até minha casa, Laura estava
entrando na casa de Max, ao lado da de minha mãe, — e essa parte eu não
entendi. — me viu, fez uma cara de surpresa ao olhar para Catarina na
calçada, e entrou. Aposto que ligou para ele e avisou que eu estava aqui. Dez
minutos depois, Max foi entrando na minha casa sem pedir licença,
juntamente com tia Hella, e bastou olharem para minha filha, para o caos e a
choradeira começarem.
— O que significa isso, Ellen???
Ele perguntou. Levei os dois para o meu quarto para conversar e não
aborrecer Ritinha, nem deixar minha filha assustada. Começava ali, o
momento da minha vida que eu sempre quis evitar. A descoberta.
— É a minha filha.
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Respondo sua pergunta, ele olha pro alto como se tivesse sem paciência, e
depois volta a me olhar nos olhos. Tay parecia estar descontrolado, triste,
decepcionando, e literalmente em estado de pânico. Em nada ele parecia mais
velho, o tempo só fez bem pra ele. Suas roupas eram a mesma escuridão, seu
olhar perdido continuava perdido, e seu temperamento parecia o mesmo. Tay
continuava sendo um homem lindo por fora, e por dentro eu ainda não sabia
dizer. Estar naquela casa me deixava triste, confusa, e de coração partido, eu
mandei Max e tia Hella ir embora, em respeito á Ritinha, e eles confirmaram
que iam sair, contanto que eu fosse até a chácara naquele momento. A parte
que ordenou, foi o próprio Max, óbvio. Hella tinha dito que Tay não estaria
lá, que ela queria ver Catarina, e conversar melhor, ela era avó, eu entendia.
Naquele momento ela parecia sofrer junto com o filho, Max parecia temer
pela atitude de Tay ao ouvir a verdade de minha própria boca, e o próprio,
parecia desejar morrer, ao invés de estar passando por aquilo. Ao mesmo
tempo em que eu ficava imensamente feliz em vê-lo pagar por ter me
arrancado de sua vida, com crueldade, duas vezes, eu ficava triste porque
nunca desejei seu sofrimento, seu mal.
— Sua filha??? O que foi? Inseminação, ou foi o gerente de Bagé que tem o
cabelo mais preto azulado do mundo?
Travo quando ele se refere ao Yan. Como ele sabia à respeito de Yan? Tay
me investigava? Ele parecia segurar o seu ódio com todas as forças que
podia, e Max em pé ao seu lado, parecia achar que a qualquer momento o
filho surtaria. Acho que Hella, que chorava como um bebê, e eu também,
pensávamos da mesma forma. Respiro fundo e me concentro na situação
horripilante em que eu passava, meu medo parecia querer me engolir.
— O que você quer ouvir?
Pergunto com uma agonia surreal e sua explosão vem antes mesmo do que eu
pensava.
— QUERO OUVIR A VERDADE!!!! — ele grita com toda sua força e
depois se controla, ele dá um passo a frente e repete a resposta. — Quero
ouvir a verdade, só me diga, por favor!!!
Ele chega muito perto e Max fica tenso. De seus olhos caem lágrimas
espessas.
— Ela é tua.
Eu digo olhando em seus olhos e minha pose vai pro saco, aquela situação me
tirou o chão e então as lágrimas silenciosas me deixavam ver um Tay
destruído e levemente borrado. Ele cobre o rosto com as mãos e chora feito
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uma criança. Aquela era a situação mais difícil que passei na minha vida. Não
me entendam mal, não por ele, não pelo o que fez, não pelo o que eu sentia,
não pela nossa antiga história, mas porque o assunto era a história da vida de
minha filha. Hella se levanta para abraçar o filho e Max se aproxima para
fazer o mesmo.
— Como pôde fazer isso comigo? COMO VOCÊ PÕDE FAZER ISSO
COMIGO???
— EU FIZ O QUE VOCÊ MANDOU!!!
Grito de volta, e ligo o botão do ‘foda-se’. Já era. Fingir que estava tudo bem
já não adiantava mais. Max me descobriu. Agora eu queria que a situação
toda viesse á tona de uma vez só.
— EU MANDEI VOCÊ SAIR DA MINHA VIDA QUANDO ESTAVA
BRAVO. COMO NÃO ME CONTOU QUE ESTAVA GRÁVIDA? EU
TINHA O DIREITO DE SABER, EU ERA O PAI, PORRA!!! QUERIA ME
PUNIR, É ISSO???
Ele gritava ignorando o consolo dos pais.
— SIM!!! Era exatamente o que eu queria fazer, punir você, fazer você sentir
o que está sentindo agora. Só assim vai entender o que passei minha a minha
vida inteira!!!
Eu dou um passo á frente, encaro seus olhos de cabeça erguida, e Max e
Hella se afastam. Eu conseguia sentir o cheiro de seu perfume e seu hálito de
tão perto que estávamos.
— Casava com Juliano, o roceiro que você defendeu, o falso gerente…
qualquer merda! Mas não precisava usar minha filha para me punir. Uma
criança!!! Que dignidade você pensa que tem???
Ele volta a falar alto como eu estava falando, mas para de gritar. Ele toca com
o indicador no meu peito, na hora em que se refere a mim, e eu me afasto.
— Não a usei, no que dependesse de mim, nunca mais olharia nessa sua
cara!!! No que dependesse de mim, você nunca chegaria perto daquela pobre
criança inocente que não merece nem respirar o mesmo ar que você! Você é
uma pessoa ruim, perturbada e de caráter sujo. Catarina tem direito de saber
quem é seu pai de sangue, mas ela não merece a sorte que a vida lhe deu.
Yan, o nome dele é YAN, ele sim, é o pai dela, você nunca será!!! Ele
mereceu ser chamado de pai, quando ela decidiu fazer isso!
Eu digo e ele demora demais para responder. Sinto que o ódio que eu sentia
por ele me fez pegar pesado, mas gostei assim!
— Acha que me conhece??? Acha que sabe quem eu sou? Ficamos juntos por
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algumas semanas e acha que pode falar do meu caráter, quando fugiu porque
terminei contigo e quis me punir mandando outro criar a minha filha? Eu só
mandei você calar a maldita boca. Esse é seu problema, muito mal educada,
inconsequente, selvagem. Já fiz muita coisa errada na minha vida, Ellen, fui
capaz de matar um homem que eu suspeitava que te fazia mal, tudo para você
ficar em paz e não sair mais machucada. Depois que descobri que quem te
fazia mal era meu melhor amigo, eu o matei sem culpa nenhuma e
continuaria tendo o caráter muito sujo se isso fizesse com que você nunca
fosse prejudicada. Você se arriscou indo atrás de mim, limpei a sujeira que
você deixou pra trás, tentei falar com você na floresta e você me deixou
falando sozinho, enquanto só o que eu tentava fazer era te proteger. E quando
eu cheguei em casa, bravo por supostamente ter perdido sua pureza, disse
uma bobagem, e quando tentei consertar, você se afastou de mim como se eu
tivesse uma doença contagiosa retribuindo a “gentileza” gritando na porta do
quarto de meu avô que ele era culpado por meu sofrimento, tortura, e por
nossa relação precocemente interrompida. Fala uma coisa pra mim, ‘donzela
do coração partido pelo príncipe montado a cavalo’, você se acha uma santa
nessa nossa história cheia de desgraça e tristeza, do inicio ao fim????
Mesmo????
Tay fala e suas palavras me machucam como nenhuma outra. Ouso dizer que
uma parte de sua frase foi retirada de uma agenda que eu tinha, mas logo me
livrei desse pensamento maluco.
— Eu matei seu Luis. Eu o matei. — confesso de olhos fechados e em voz
alta. Faz anos que eu queria falar aquilo em voz alta. Nunca antes havia
conseguido. — Eternamente me sentirei culpada, você não precisa jogar isso
na minha cara…
— Não estou jogando na sua cara, não. A culpa pela morte do meu avô foi
inteiramente minha. Você só podia ter calado essa boca maldita, uma vez na
vida, pra variar. Podia ter relevado ao me ver falar asneira depois presenciar a
morte do meu avó bem nos meus braços. Ele morre na minha frente, de forma
triste e dura, me deixa sem chão, sem me ouvir pedir perdão de coração por
ter escondido algo tão sério, e só o que te magoou foi ouvir de mim para não
me procurar nunca mais… — ele me interrompe e fico sem ter o que dizer.
— Agora já foi. Se existe justiça, com relação ao seu avô e minha boca
maldita, pagarei. Espero que você pague a sua, ainda nessa vida. Estamos
‘quites’, Tay. Eu saí de coração partido, fiz o que você mandou, e você fez o
mesmo que teu pai fez com você! Perdeu os primeiros passos de sua filha, o
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primeiro dia na escolinha, você não sabe nem seu nome completo, o que
gosta, o que não gosta, o seu jeito… e sinceramente não me arrependo de ter
tirado isso de você. Você mereceu. Cada vez que Catarina chama Yan de
'pai', meu coração se alegra! Dei para minha filha o melhor pai que ela
poderia ter.
Eu digo, ele limpa as lágrimas com a manga da blusa, e balança a cabeça
negando alguma coisa.
— VOCÊ escolheu aquele cara, ela nasceu e já o encontrou na sua vida. Por
seu egoísmo, falta de responsabilidade, e até maldade, a privou de conviver
com seu pai de verdade. Vamos ver o que ela decide… vou lutar pela minha
filha e você vai ter que me engolir. O cara perturbado, de caráter sujo e ruim,
acabou de saber que é pai e vai se tornar um. Você me deu o filho que eu
sempre quis ter com você e arrancou de mim a possibilidade de tê-la por
perto, não precisava ficar comigo, só poderia me permitir arcar com a
responsabilidade que era minha, apenas isso. Você cometeu um crime
arrancando-a de mim. Talvez a minha vida seria outra com ela aqui, talvez eu
tivesse deixado de fazer tanta merda só para ser o melhor pai que ela poderia
ter. Vou processar você por ter ido embora com minha filha, por ter
escondido sua existência, seu nascimento, e pedirei sua guarda, ou metade
dela, porque é meu direito! Vou arrancar a minha filha de você nem que seja
a cada quinze dias, Ellen!!! Vai se arrepender amargamente por ter feito isso
comigo.
Ele diz e anda em direção as escadas. Meu desespero é tanto que não vejo
nada na minha frente. Apenas corro em direção a seu pescoço e jogo Max —
que já queria me parar. — longe.
— VOCÊ NÃO OUSE A TENTAR TIRAR A MINHA FILHA DE MIM!!!
SEU DESGRAÇADO!!! VOCÊ É UM DESGRAÇADO!!!
Eu grito e bato nele de todas as formas, mas ele não se defende, só fica
parado. Max tenta me tirar de perto dele mais umas duas vezes, mas quando
Tay diz “Pode soltá-la. Deixe-a desabafar!”, Max obedece e me deixa
continuar gritando e o socando até eu cansar. Obviamente que minhas
investidas contra ele nem o tiram do lugar, ele nem se moveu. Mas eu
precisava fazer aquilo. Bato o mais forte que conseguia, grito mais alto que
podia, xingo todos os seus ancestrais e choro muito. Eu queria que aquela
briga fosse feia, que Tay tentasse me espancar de tanta raiva como Max
suspeitava, mas não, ele só continuou parado me segurando para eu não cair
por causa do salto alto que eu usava, e quando cansei, não percebi que havia
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encostado-se a seu ombro para chorar e continuar o ofendendo. Só que com a


voz mais baixa e cansada.
—… Desgraçado… você é um desgraçado…
Resmungo me sentindo cansada e sinto que seu blazer estava todo molhado,
mas não me importo. Assim que me acalmo e calo a ‘maldita boca’, ele se
afasta com cuidado para não me derrubar, olha nos meus olhos sem esboçar
nenhum tipo de sentimento, e sobe as escadas. Tay quando entrou na sala
ficou sem chão ao me ver, mostrou com o olhar e com sua reação, que seu
amor por mim ainda estava intacto. Ao contrário do que pensei durante todos
esses anos, ele não havia deixado de me amar. Mas no momento que disse
que ia tirar a minha filha de mim, seu olhar não me dizia nada. Nada. Tay
estava decidido, viria contra mim com todas as forças que conseguiria, e
aquilo era o que eu sempre temi. Agora eu precisava tomar uma atitude
imediatamente, eu precisava agir.
Pego minha bolsa e saio dali, corro contra o tempo e peço a Deus que dali em
diante ele guie meus passos, e minhas atitudes, pois coloquei tudo em suas
mãos.

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23
ÓDIO

Entro no quarto e perco rumo das coisas. Continuo não sabendo mais quem
eu sou, o que vim fazer aqui, onde eu estava, ou qual era meu próprio nome.
Eu era pai.
Acabei de descobrir que tinha uma filha, aliás uma filha linda demais. A
menina parecia vinda de um filme de contos de fadas, ela era a criança mais
linda que já vi em toda a minha vida. Apesar de não ter um pingo da mãe.
Nada, ela não tinha nada da Ellen, era todinha eu. E Ellen tirou ela de mim, a
escondeu, levou a minha filha para outro cara criar, e viví-la chamando ele de
pai, acabou comigo, me destruiu completamente.
— Você não pode fazer isso, está me ouvindo!? Vá até ela e retire o que
disse! Diga que estava nervoso, que falou sem pensar, qualquer coisa…
Minha mãe entra no quarto sem bater, eu caminhava pra lá e pra cá, e
continuei fazendo isso.
— Você ainda não viu nada, mamãe… Cabeças vão rolar!!!
Eu digo sorrindo, sentindo uma mistura de sentimentos indescritíveis, e meu
pai entra logo em seguida.
— Aonde foi que eu errei com você???
Minha mãe me olha incrédula e eu sorrio pra mim mesmo.
— Eu espero que você tenha percebido que Ellen desapareceu carregando um
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filho meu, dona Hella. Eu tenho esperanças de que a senhora tenha entendido
essa parte. — eu ironizo e respiro fundo. — E você não errou comigo, sempre
foi uma boa mãe. O problema sempre esteve aqui dentro!!! Aqui dentro!!!
Eu toco a têmpora, fecho os olhos, e o rosto de Catarina aparece em minha
memória. A dor que eu sinto me faz gritar, perder o controle, alguma coisa
acontece dentro de mim, e minhas coisas que eu tinha deixado aqui e que
estavam na estante, vão parar no chão. Meu pai, como sempre estava
esperando por aquele momento. Ele passou a sua vida sabendo que aquele
momento ia chegar para mim, como já tinha chego para ele. A dor parecia mil
vezes pior do que as facadas que já levei, e os ‘apagões de bitucas de
cigarros’ que deixaram marcas até hoje no interior de minhas coxas. Era a dor
da culpa. Ajoelhei-me e quando a dor aumentou de intensidade, não suportei.
— EU FIZ TUDO ERRADO!!! EU FIZ TUDO ERRADO!!! MATEI ELE,
PAI!!! EU O MATEI!!!
A dor e a agonia me consomem, eram muitos anos guardando tudo aquilo pra
mim… faz anos que aquela angústia estava pra sair e só meu pai sabia que ela
existia. Ele me abraçava no chão e eu podia ouvir minha mãe chorar. Acho
que alguém de salto alto entrou no quarto, deveria ser Lulu ou Julia, eu não
sabia, não me importava, só queria que aquela dor me matasse ou me ferisse
tudo o que tinha para ferir, de uma única vez, para que aquilo logo passasse.
— Você não tinha como fazer nada. Não podia ter contado… você não podia
ter contado! — meu pai resmunga e me aperta.
— ELE MORREU SE SENTINDO CULPADO, NÃO OUVIU MEU
PEDIDO DE PERDÃO. EU CHAMEI POR ELE, EU CHAMEI POR ELE E
ELE NÃO RESPONDEU. EU DISSE QUE O AMAVA, MAS ELE JÁ
ESTAVA MORTO. ELE JÁ ESTAVA MORTO… JÁ ESTAVA MORTO.
— sinto alguém me abraçando do outro lado e era Lulu.
— COMO FAZ ISSO PARAR? COMO FAZ ISSO PARAR??? ISSO NÃO
VAI PARAR NUNCA… NUNCA VAI ACABAR, NUNCA VAI PASSAR.
O QUE EU PRECISO FAZER PRA ESSA DOR DESAPARECER DE
DENTRO DE MIM???
Pergunto, mas ela só chora. Grito ainda mais porque a dor já tinha atingido
minha cabeça e um zumbido azucrinava os meus ouvidos. A dor era terrível,
meu corpo todo parecia ‘infeccionado’.
— Tay, por favor, se acalma!!!
Lulu pede colocando sua mão quente no meu ombro. Eu olho para ela e não
vejo seu rosto, vejo apenas borrões.
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— Eu tenho uma filha. Eu tenho uma filha linda. — eu falo dessa vez rindo e
ela chora mais ainda.
— Agora é o momento de você correr atrás do tempo perdido, lutar pela
minha neta, não atacar sua ex-mulher. Catarina chegou tarde, mas chegou na
hora certa. Ela é o seu presente assim como você foi o meu. Você me salvou,
salvou meu casamento, e nossa família. Catarina é sua salvação, se apegue
nisso. — meu pai diz esperançoso.
— Na primeira oportunidade que ela tiver, ela vai sumir de novo com minha
filha. Eu não posso deixar isso acontecer! Não posso deixar aquele cara criar
a minha filha como se ela fosse dele. Eu não vou permitir isso, vou meter
uma bala na testa dele!!!
— VAI METER UMA BALA NA TESTA DE NINGUÉM! — ele tenta se
acalmar. — E se ela desaparecer, a gente encontra!!! Quando foi que a gente
deixou alguém nos prejudicar? Quando foi que os Covericks perderam
alguma guerra? Eu quero conviver com minha neta, sua mãe quer isso mais
do que tudo. Vamos lutar! Se entregar para a dor não vai resolver o seu
problema. Eu estou com você, mas vamos fazer isso do jeito certo.
Ele garante, ignoro, me levanto do chão ainda sentindo aquela dor terrível e
me sento na cama. Luiza diz que ouviu tudo da escada e que sentia muito.
Meu pai e minha mãe me deram um sermão gigantesco e somente ouvi. Nada
mais eu podia fazer ou falar. Toda a merda que eu tinha feito, já foi. Eu só
precisava pensar em como recomeçar, o que fazer para trazer minha filha
para perto de mim e tentar corrigir as minhas falhas para poder ser o melhor
para ela. Era tudo o que eu queria.
— Pensa bem no que vai fazer, pensa muito bem, porque você pode acabar
afastando Ellen de você e se você afastar Ellen, você afasta
consequentemente, a sua filha também. E limpa isso!
Minha mãe continua seu sermão, aponta para a sujeira que fiz, me abraça
forte, me beija e sai do quarto. Meu pai faz o mesmo, e Lulu ao olhar pra
mim, entende que não era a hora para as suas milhares de perguntas, e se
retira também. Fico ali sem saber o que fazer ou por onde começar e me
deito. As palavras de Ellen e as palavras que eu disse, passeiam por minha
cabeça e sei que verei o sol nascer por causa disso. De repente meu telefone
toca e é Julia. Tinha milhares de ligações perdidas dela.
— Oi.
— Oi amor. Onde você está?
— Tô na chácara.
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— Você está bem? Voz estranha…


— Não. Não estou bem. Você está aonde?
— Já tô em casa. Nem Laura está aqui… quando você vem pra casa??? A
gente precisa se entender, não é!? Fiz mal em sair, ficar brava à toa, já está
tudo bem, vem pra casa!
— Já estou indo! Precisamos mesmo, ter uma conversa.
— Tá. Tô te esperando. Não esquece minha bolsa!
— Tudo bem!
— Beijo.
Ela diz e eu desligo. Estava ai o primeiro passo de tudo. Contar para Julia.
Levanto-me na mesma hora, dessa vez me lembro de por meu celular no meu
bolso, pego sua bolsa na sala, e vou embora. Paro o carro no portão de casa, e
vejo a Mercedes estacionada na frente da casa de dona Isabelle. Menos mal,
ela ainda não fugiu com minha filha. Entro em casa, encontro Laura tomando
“café da tarde” e paro um pouco para respirar.
— Julia disse que você não estava aqui. Já soube…? — pergunto e ela ergue
uma sobrancelha.
— Acabei de chegar, dei uma saída rápida. Eu que vi e contei pro teu pai, e
antes que me dê um sermão… tentei te ligar primeiro, você devia estar
fazendo alguma coisa muito importante, pois não me atendeu. A menina é tua
fuça, parabéns, papai!!! — ela diz rindo e não consigo evitar sorrir.
— Ela é linda, não é!? Muito linda… — viajo no momento em que a vi, mas
depois volto a mim. — Se arruma, preciso falar com você sobre tudo isso.
Vamos resolver essa situação toda.
Eu falo baixo para Julia não nos ouvir, e Laura sorri tirando a arma do cós da
calça e verificando o pente.
— Faz muito tempo que a gente não tem “situações para resolver”. Tô cheia
de saudade.
Ela diz e coloca a arma de volta no cós. O que tinha de assassina sangrenta
tinha de engraçadinha.
Subo pro quarto e vejo Julia deitada só de camisola, com seus óculos de grau,
e lendo algum livro que não parei para prestar atenção.
— Você leu a agenda e a carta. — eu me sento na cama e afirmo olhando pra
ela.
— Fui imatura. Você não quis fazer amor comigo, então, tive medo de que
fosse ‘'outra mulher’ naquela agenda. E acertei.
— Acertou.
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Digo balançando a cabeça e ela sorri parecendo compreender. Enquanto eu


respiro fundo, ela larga o livro, e tira os óculos.
— Eu li uma boa parte, vi as datas. É uma história antiga, compreendo.
Aceito que teve alguém no teu passado que…
— Não é uma história antiga. Não é passado. Muito pelo contrário Julia, essa
história nunca saiu do meu presente, e voltou agora com mais força ainda!!!
— O que é? Ela está de volta na cidade? É isso?
— Está de volta e com uma criança ainda por cima. Pacote completo. Uma
criança que é minha filha e um padrasto de bônus.
Eu digo e ela se levanta da cama. Suspeitava que ela começasse a andar pra lá
e pra cá, e foi dito e feito.
— Filha?
— Filha!
— Você sempre soube???
— Não. Acabei de descobrir. Ela deve ter uns quatro anos.
— Ela fugiu daqui grávida…
— Sim.
— Por que voltou?
— Laura a viu aqui na casa onde a mãe dela morava, e ligou para meu pai.
Não soube o porquê, esqueci de perguntar isso, ela disse algo como “Ritinha
doente...”, não sei ao certo. De qualquer forma ela voltou, e eu tenho uma
filha.
Eu falo, ela joga o cabelo para um lado só e cruza os braços. Depois de muito
tempo sem fazer pergunta nenhuma ela se aproxima e me abraça. Eu
correspondo ao seu abraço tocando suas costas, e ela beija o alto da minha
cabeça.
— O que vai fazer?
— Me aproximar dela, entrar com um processo, ganhar o direito de vê-la.
Pretendo assumir a minha responsabilidade.
— Mas por que não tenta fazer isso conversando com a mãe dela? Precisa
mesmo acionar a justiça?
— Ellen está me odiando. Fiz muita merda, ela já saiu daqui me odiando!
Disse que se dependesse dela, eu nunca saberia da existência de Catarina.
Veio fazer algo importante e foi descoberta, só foi até em casa se explicar
porque Laura a viu. Com ela não vai ter conversa… ela me odeia. — eu digo
e Julia toca meu ombro.
— Como pode ter tanta certeza disso? Você é maravilhoso, um cara lindo,
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gato, gostoso demais, carinhoso quando quer, — ela ri. — não existe uma só
mulher que tenha ficado contigo, e que diga que não gosta de você, ou que te
odeie… é impossível. — ela diz e eu quase sorrio de ironia.
— Eu a acusei pela morte do meu avô, briguei com ela, parti seu coração por
diversas vezes. Eu era muito diferente!
— Tudo bem. Ok. Só que agora você mudou. É meu marido! Posso dizer que
te conheço e você é lindo por dentro e por fora. Prendo por desacato quem
disser o contrário!!!
Ela diz e me beija pedindo amor, mas eu não estava no clima. Ela senta no
meu colo, começa a me beijar, mas eu viro o rosto e quando eu faço isso, ela
se afasta.
— Você ainda a ama?
— Mais do que a mim mesmo! Mais do que antes. Com todas as minhas
forças!!!
Confesso de cabeça erguida porque assim seria mais fácil. Evitaria problemas
posteriores.
— Eu admiro sua coragem em confessar, mas não entendo como tem
coragem de dizer isso na minha cara. — ela fala e se afasta mais um pouco,
super magoada.
— Nunca quis machucar você! Nunca quis te magoar! Eu adoro você, te devo
muita coisa!!! Sou muito grato…
— Mas nunca me amou, não é!?
— Não. Me perdoa! — eu falo e ela volta a me olhar nos olhos.
— Perdoo.
Ela diz, pega o óculos, seu livro, e sai do quarto me deixando lá. Choro por
aquela situação chegar aonde chegou e me recomponho. Me arrumo, ‘pego’
Laura na cozinha e saio de casa.
No portão, dou de cara com Ellen e o gerente tendo uma pequena discussão
na porta da casa de dona Isabelle. Eles tentavam falar baixo, mas pareciam
exaltados demais para conseguir tal feito. Tranco o portão como de costume,
dou a volta para entrar no carro e fingir que não estava vendo nada, afinal
apesar de brigarem ele não tocava nela, que era só o que faria eu me
intrometer, e abro a porta do motorista enquanto Laura também abria a porta
dela. Assim que Laura entra e faz barulho com a porta, ele me vê e
praticamente corre na minha direção. Olhei para trás só pra ter certeza de que
o papo/briga seria comigo, e quando tive certeza, esperei.
— Quem você pensa que é, seu playboy de uma figa!? Tu pensa que é quem
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para ameaçar a minha mulher???


Ele empurra meu ombro, Laura desce do carro, Ellen se coloca no meio de
nós dois, e eu fico morrendo de vontade de dar um tiro na cara dele, por isso
logo olho pro portão para ver se Catarina estava por perto. Ao me lembrar
dela, penso que preciso me controlar, se eu saísse da linha, Ellen poderia usar
isso contra mim. E eu que nem tinha conhecido minha filha, já ia perdê-la. Eu
precisava ser melhor, então respirei fundo!
— Pra começar, trabalho desde pequeno e em segundo lugar, no meu portão,
tem duas câmeras e uma delas está bem na sua cara, agora mesmo!!! Melhor
se controlar, gerente!
Eu digo baixo enquanto ele gritava, e ele fica espumando pela boca.
— Não ouse chegar perto de minha filha!!! Não é uma ameaça, é uma
promessa! Se você tentar se aproximar de minha família, eu mato você com
minhas próprias mãos! — ele fala de Catarina e meu sangue ferve.
— Faça isso agora. Vai, me mata. Tu é homem mesmo, pra isso? Só criou
minha filha porque mentiu pra mim naquela tarde. Se eu tivesse tido a chance
de falar com Ellen, eu tenho certeza que você não ia ter lugar aqui. Mas eu
ainda tenho tempo, agora tenho tempo. Vou conquistar minha filha e você vai
ser só um ex-padrasto!
Cuspo as palavras em sua face e ele me acerta um soco bem na minha cara.
Eu dou alguns passos para trás, Ellen o empurra para longe de mim com
grosseria, e Laura corre dando a volta no carro. Ela tira sua arma da cintura,
mas deixa abaixada, porém pronta pra usar.
— Vai selvagem, leva seu macho daqui antes que ele vire apenas um pedaço
de carne podre no chão!!!
Laura rosna na minha frente e Ellen a encara assustada com uma mão no
peito do gerente como se pudesse controlar toda a situação. Ela vai
empurrando ele, mas o corno quase não sai do lugar. Tinha os olhos
arregalados para a arma de Laura. Tremeu na base.
— Guarda isso, Laura!
Eu digo uma vez só e imediatamente ela obedece e se afasta. Me
recomponho, ando em sua direção e Ellen se desespera.
— Vamos embora, isso parece briga de galo! Duas crianças competindo para
ver quem é o mais idiota! Vamos embora, para de se rebaixar, YAN, vamos
embora!!!
Ela resmungava e tentava puxar ele, antes que eu chegasse perto demais.
Ellen temia pela segurança do gerente porque me conhecia muito bem.
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— Se minha ex-mulher te disse que sou um playboy, ela deve ter dito que
você tem muita sorte por Catarina existir! Por ela, vou entrar nesse carro e
fingir que você não brincou com a própria vida, aqui.
Olho bem nos olhos dele, me viro para entrar no carro, mas antes disso eu
ouço: — É, ela me disse muitas coisas. Coisas que me garantirá com relação
a você, uma distância razoável de minha filha! Problemático, dependente de
remédios porque é fraquinho, sem caráter…
— YAN!!! CALA A BOCA!!!
— Criminoso, bebê torturado, assassino do próprio avô que morreu de tanto
desgosto, filho rejeitado…
— CALA A BOCA!!! CALA A BOCA!!!
Ellen grita com o gerente corajoso novamente enquanto eu sentia meu corpo
todo tremer… um ódio monumental cresce dentro de mim, e qualquer um que
parasse para prestar atenção, podia notar o quanto desequilibrado eu estava,
ao ouvir o que ele dizia. Enquanto ele não parava de usar meus “pontos
fracos” para me atingir, eu olhava em seus olhos e já o via morto. Eu o queria
morto. Até que Catarina grita por Ellen no portão e meus olhos, vão do ser
prestes á ser baleado no portão de casa, até aquela princesa que chamava pela
“mamãe” segurando nas mãos de dona Isabelle. Naquele momento, Catarina
faz minha arma parar de pedir para ser usada, ela me tira o foco, me acalma,
me coloca no meu lugar e me deixa sem sentido nenhum. Ellen me olha
morrendo de medo d'eu fazer alguma coisa na frente dela e eu olho em seus
olhos. Ellen era a mulher mais linda que existia no mundo. Seu peito subia e
descia denunciando o nervosismo e a aflição, e seus olhos brilhavam. Aquela
mulher linda que estava na minha frente, me odiava com todas as suas forças,
mas eu a amava tanto, mas tanto… que esse amor chegava a doer. Volto a
olhar para o portão e fico o máximo de tempo que eu podia, olhando para
aquele anjo. Como se fosse possível esquecer seu rosto. Não. Nunca
esqueceria. Tudo o que eu queria era chegar perto e ficar olhando para ela, só
olhando. Ela não precisava sorrir, nem falar comigo… eu só queria olhar pra
ela. Penso em pedir para chegar perto, mas logo entendo que não era um bom
momento. Olho nos olhos da mulher ainda aflita em minha frente, e oro para
que meus olhos refletissem o amor que eu sentia por ela. Respiro fundo
olhando para a sua boca maravilhosa, e segurando o desejo de tomá-la pra
mim e volto a abrir a porta do carro. Antes de entrar vejo Julia debruçada na
janela, ela tinha visto tudo. Entro no carro, respiro fundo, e saio dali devagar.
Só porque notei que ficar calmo, incomodava demais o gerente de Bagé.
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— Você tá legal? — Laura questiona enquanto eu dirijo.


— Não. — Sou sincero e a vejo olhar para frente, revoltada.
— Quer que eu faça? É só não falar nada. Faz silêncio e tudo isso será
resolvido. Sem rastros, sem…
—Não.
— Vai deixar esse merda viver, Tay? Tá de brincadeira comigo???
— Não posso fazer isso. Matá-lo fará com que ela sofra. Fará as duas
sofrerem. Ellen já está atenta comigo, se algo acontecer com ele, ela saberá
que foi eu, ou você recebendo ordens minhas. Preciso dele vivo! Quero
conhecer minha filha! Quero que ela goste de mim, não quero ser motivo de
vergonha e decepção para ela, eu sempre quis essa menina. Encomendei
ela!!! — eu digo e ao sorrir sinto dor no lábio inferior.
— Que papo mais sem noção! Sabe que com ele vivo, nunca terá Ellen de
volta!
— Pode passar o tempo que for, aconteça o que acontecer… amo aquela
selvagem. Se ela tiver que ser minha, vai ser! Se não for é porque o ama. De
qualquer forma nunca conseguiria ficar com uma mulher que não gosta
realmente de mim. Meu foco é Catarina!!! Se eu conseguir reconquistar a
mãe junto, serei o homem mais feliz do mundo!
— E vai fazer o que, agora? — ela pergunta e eu sorrio.
— Processá-la.
— Você tem sérios problemas… — Laura diz sorrindo e me olha negando
com a cabeça.
— Ellen não vai me deixar chegar perto dela. Quero minha filha de qualquer
jeito, tenho direito!!! Vou tentar conversar quando nossos ânimos se
acalmarem. Dependendo do que ela me dizer, vou processar e pedir a guarda
compartilhada. Se eu tiver que começar uma guerra, vou começar, Laura. Por
aquela menina, vou começar!
Eu falo e ela diz que é “bonitinho me ver falando daquele jeito”. Ameaço dar
umas porradas na militar fraquinha para ver o “bonitinho” e ela me convida
para um “5 minutos, sem perder a amizade”. Sorrio para ela, aceito, e ela diz
“Fechou”.
Estacionamos em um bar diferente para fugir dos possíveis fuxicos de Lari.
Bebemos, conversamos, eu disse tudo o que eu tinha pra dizer, e apresentei
seu mais novo trabalho. Ficamos lá em torno de umas quatro horas, e
voltamos mais cedo do que deveria, pois seria segunda-feira e eu precisava
trabalhar, aliás, nós dois precisávamos!
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Chego em casa, não encontro Julia em lugar nenhum, tomo um banho e deito
para dormir. Decido ligar em seu celular, mas ela não atende então desisto e
apago. Acordo com uma rotina diferente, Catarina é meu primeiro
pensamento. Laura parece saber que Julia não dormiu em casa e entra sem
bater com sua xícara de café e um pedaço de papel na mão.
— Vamos papi, é hora de acordar!
Ela resmunga e me entrega o papel que depois, notei ser um bilhete.
“Oi, tive que viajar, fui convidada para dar uma palestra em Brasília, e não
tive tempo de contar. Afinal sua vida está um pouco agitada agora. Quarta tô
de volta, talez! Amo você, Tay!”
— Ela foi mesmo?
— Nops! Está na mãe dela!
— Ok. Agora sai daqui que eu tô nu!
Eu falo e ela faz pouco caso, mas sai na hora. Vou pro trabalho, cumpro com
meu dia, converso um pouco com meu pai, e vou direto para a chácara. Julia
não estava em casa, Laura é péssima em qualquer coisa que não seja matar
direito, principalmente cozinhar, e eu estava cansado e faminto. Durante meu
dia todo pensei em Catarina.
Estaciono no lago e quando vejo a Mercedes, entro em casa sem demora.
Estavam todos na sala, minha família, Ellen e minha filha, menos o gerente.
Ignoro todo mundo, me aproximo da pequena, e ela me olha com uma cara
séria. Vestia uma calça jeans, botinhas, e blusa grossa, era uma mini
selvagem, a mais linda de todas.
— Oi! — eu falo com ela, ela inclina a cabeça, pensa um pouco, e me
responde.
— Oi!
Sua voz é fina e como música para meus ouvidos. Sorrio pra ela e olho para
todos.
— O que estou perdendo?
— Estamos resolvendo tudo… — meu pai diz e eu sorrio nervoso pra ele.
— Pensei que o certo seria eu tomar uma providência e de novo, vocês
querem resolver os meus problemas.
— Foi eu quem decidiu vir e conversar! — Ellen diz de cabeça erguida.
— Devia ter me procurado em minha casa. Não aqui!
— Eu não tinha certeza se você morava lá, ou se era somente seu harém… —
ela é irônica e eu devolvo na mesma moeda.
— Na verdade não é bem isso. Moro com minha esposa e hospedo uma
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amiga. Do que se trata? Quer fazer um acordo? Eu já pretendia procurar por


VOCÊ para falar á respeito.
Eu digo, Ellen faz a cara de paisagem como sempre, e parece pensar antes de
responder.
— Vamos sair para eles poderem conversar melhor…
Minha mãe resmunga e meu pai levanta concordando, mas não deixo.
— Não, ninguém precisa sair. Podemos ir até o escritório ou conversamos
aqui mesmo! Nossas desavenças não são segredos pra ninguém.
Falo em um tom educado, e Ellen se abaixa para falar com a filha.
— Poderia ficar um pouco com a tia Lulu pra mamãe conversar com o amigo
dela?
Ela diz e a menina olha sorrindo para Ana Luiza que naquele momento
sentava ao lado do meu pai.
— Vai ser rapidinho??? — ela questiona.
— Vai ser muito, muito rapidinho!!!
— Ela pode me levar para ver os cavalos?
— Ela pode te levar para onde você quiser ir, é só falar com ela… só não
pode montar, já está tarde e esfriando!!!
— Tudo bem.
Ela fala para Ellen e corre para pegar Lulu pela mão. Sigo as duas com o
olhar até desaparecerem e depois caminho até o escritório. Ellen me segue
pisando firme. Abro a porta pra ela, e ela entra sem me olhar nos olhos.
— Pensei que fugiria. — eu logo falo.
— Pensei em fazer isso. Pensei em voltar pra casa e esperar o processo rolar,
mas sei que se você ganhar alguma coisa, eu morando lá, vai ficar muito
complicado quando ela estiver com você. Teria que ficar distante e me
recuso. Pensei em desaparecer, mas sei que, mesmo que demore, Jon me
acharia, e fugir com ela, pode me fazer mal. Sei que não é o certo, tenho
consciência disso!
Ela diz e eu me sento na cadeira de meu avô porque estava cansado demais
pra ficar de pé. Olho para ela, e decido esperar ela terminar de falar tudo o
que tinha pra falar.
— Eu só vim pela minha prima, realmente não gostaria que você chegasse
perto dela. Realmente pensei em desaparecer com minha família, mas pensei
bem, refleti, e decidi não fazer isso. Você é o pai, ela precisa aceitar isso,
fazer o quê!? Só gostaria que você não chegasse perto do meu noivo nunca
mais.
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— Como é??? Não cheguei perto dele em momento nenhum. Ele entrou na
minha casa da primeira vez, e na segunda me atacou na rua!!!
— Eu sei que o que ele fez foi errado e já conversamos. Já falei com ele e
agora estou falando com você. Não quero ficar viúva então já resolvi isso. Ele
não chegará perto de você, e nem você dele. Não vai prejudicar meu
relacionamento, nem o relacionamento que ele tem com a filha dele, ou uso
isso contra você e consigo te proibir de chegar perto dela por motivos óbvios.
— eu olho para ela e a sua frieza extrema me deixa com frio.
— Já contei para Catarina que os Covericks são “a outra família da mamãe”,
que Hella é sua avó, Max o avô, Lulu é sua tia e por aí vai… não tenho nada
contra sua família, sempre me trataram como se eu fizesse parte dela, e se
você não fosse quem você é, eu nunca teria fugido, adoraria que eles tivessem
contato com ela. Conversei devagar, com cuidado, disse que ela deveria
conhecer todos da família, e que todos a amavam, e que era por isso que de
vez em quando, eu ia trazê-la até aqui. Não sou perfeita, gostaria de dizer pra
ela que ela nunca deveria chegar perto de você, porque você é a pior pessoa
que eu conheço no mundo, mas sei que é errado, isso se chama alienação
parental e é um pecado fazer isso com uma criança. Eu tenho motivos para
não querer nunca mais olhar pra você, mas ela não, então…
Ellen anda de um lado para o outro e não me olha nos olhos ao falar.
— Se esquecer essa história de processo, vou deixar você ter contato com ela,
vou deixar você conhecê-la. Aos poucos. Mas só se ela quiser, não vai
obrigá-la a nada. Se eu souber que encheu a cabecinha dela com bobagem, se
eu souber que tenha feito qualquer coisa que eu ache que vai prejudicar a
minha filha, eu mesma entrarei com um processo contra você. Você terá um
dia apenas na semana para vê-la, só para começar, só para ela se acostumar…
não ficar confusa, com toda essa mudança! Ela já está assim porque saímos
de casa, então, você vai ir com calma. Se não concordar com algum dos meus
termos, eu mesma te processo, alegando que não é uma boa pessoa para ter
contato com a filha, trago á publico tudo o que sei à seu respeito, incluindo
sua profissão em Manaus, e nunca mais vai chegar perto dela. — ela diz e
enfim me olha de cabeça erguida e nariz em pé.
— Quero os sábados, e pegar ela na escola. Você leva, eu pego.
— Não.
— Então você vai ter que me processar e entregar meus podres para a polícia.
Você tem o número do Jon? Ele pode reunir provas concretas a meu respeito.
Na verdade meu pai também. Vou autorizar os dois a te darem o que você
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quiser! Só estando preso para não lutar pela minha filha! Para conseguir me
afastar dela, só me entregando!
Eu digo e me levanto porque eu sabia que o papo já tinha acabado.
— Não pense que não tenho coragem!
Ellen dá um passo em minha direção e eu caminho o restante para me colocar
em sua frente.
— Não. Eu sei que tem. Está me odiando. Mulher quando tem tanta mágoa e
um filho em jogo, é capaz de tudo! O problema é que eu não tenho medo.
Talvez seja uma boa opção, pagar os meus pecados e sair da prisão um
homem livre de erros, com a esperança de que um dia, minha filha sinta
orgulho de mim. Por ela eu faço isso!
Eu digo e inspiro para sentir seu cheiro. Ela estava tão próxima de mim.
— Tem certeza que não vai aceitar? — ela pergunta e eu afirmo.
— Tenho certeza. — eu digo e ela balança a cabeça.
— Aproveite seus últimos dias de liberdade, então! — ela diz e ameaça sair.
— Todo prisioneiro tem seu último pedido. Me deixa fazer o meu!
— Tô sabendo disso não. — ela fala e coloca a mão na cintura.
— É só uma volta com ela. Só eu, ela, e um sorvete talvez… alguns doces…
Eu falo e ela me olha com um ódio surreal, mas depois sorri como nunca vi
antes, era tão lindo, mas tão estranho. Pensei que ela ia me xingar, dizer
`não`, me ofender, qualquer coisa muito ruim… mas ela sorri como se tivesse
feliz da vida.
— É claro que sim!!! Só uma volta com sua filhaa antes de ir pra cadeia e sair
de lá com ela já casada e uns dez netos nossos. Vou te dar isso, Coverick!
Vou te dar isso. Só vou chamá-la.
Ela diz rindo e sinto uma coisa muito ruim dentro de mim. Saio depois dela
do escritório, e me sento na sala junto com os outros. Depois de alguns
minutos ela chega com Lulu e Catarina, e logo fala com a filha.
— Princesa, o amigo da mamãe quer dar uma volta contigo pra você
conhecer a cidade, tomar um sorvete, comprar um presente lindo, o que acha?
— Ellen sorri olhando pra mim, e Catarina segue seu olhar.
— Ah! Não. Muito obrigada…
Catarina diz e todos ficam tensos. Só depois disso eu entendi o que ela fazia.
— Mas ele disse que você vai amar, aposto que tem uma loja aberta perto do
pet shop da mamãe, que vende um monte daquelas Barbie's que você tanto
ama!!! Sem contar que a mamãe até deixou ele te comprar doces antes do
jantar. Vai, filha. Será divertido!
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Ela diz, faz com que a menina dê alguns passos na minha direção, mas a
pequena trava.
— Mas eu não quero, não! Não quero ir!
Catarina parecia que a qualquer momento choraria se sua mãe forçasse a
barra, então Ellen se levantou e olhou profundamente nos meus olhos.
— Então está bem. Já que você não quer fazer um amigo novo… dê um
abraço nos seus avós, nos seu tios e primos, e vamos pra casa!!!
Ela diz e seu sorriso desaparece. Ela coloca fim na sua farsa enquanto nossa
filha não prestava atenção e eu entendi. Ellen definitivamente me odiava mais
do que tudo no mundo.

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24
SEGUNDA

— Como foi lá?


Yan estava na cozinha segurando uma xícara de café, apoiado na pia.
— Melhor do que pensei que seria! — me aproximo e o beijo. Um beijo bem
demorado e libertador. Quando vejo que Cat correu para abraçar a sua vovó,
continuo falando. — Vou acabar com ele. Vai apodrecer na cadeia! Mostrei
pra ele o que vai ter que enfrentar ao tentar chegar perto de Catarina. Ele
pensou que seria fácil. Coitado! Catarina falou um belo não pra ele, um ‘não’
tão imenso que me fez a mulher mais feliz do mundo! Quase pulei de alegria.
— desabafo e mordo uma maçã.
— Isso parece mais vingança do que qualquer outra coisa!!! — ele diz e eu
olho bem para seu rosto.
— E se for? E daí!?
— “E daí” que se você tivesse superado, você seria uma pessoa melhor,
mostraria pra ele o que ele perdeu, mas faria a coisa certa. Teria bom senso,
não usado nossa filha para machucá-lo. O que você está me dizendo que fez,
foi cruel, foi maldosa demais. Nós brigamos e quase o matei porque nós,
homens, ‘temos o nosso mesmo ponto fraco’, e o de nós dois se trata da
mesma pessoa: Catarina, a nossa filha. Discuti com ele, peguei pesado, perdi
a razão, porque ele ameaçou tirar Cat de você, mas agora eu entendo o porquê
ele fez isso. Tu tá usando Catarina para atingi-lo, por causa de assuntos mal
resolvidos que vocês tem no passado! Passei essa nossa pequena vida juntos,
todinha, dizendo pra ti que tu tinha que procurá-lo, que ele merecia saber…
— ele fala e me sobe um ódio imenso.
— Tá do lado dele, é??? Casa com ele, então!!! Disse isso a vida toda, mas
quando ele me procurou disse que eu não estava! Deixou ele ir embora sem
mim!!!
— Eu não sabia o que tu tinha feito de errado, não sabia o que você devia,
quis proteger você! Sempre combinamos de dizer que você não estava, seja
pra quem fosse, e eu nem sabia quem ele realmente era. Ellen, — ele se
aproxima de mim quando viro a cara, e me abraça — entenda… não estamos
mais falando de um triângulo amoroso ou uma paixão que não terminou

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muito bem, estamos falando da nossa pequena. Ela merece e tem direito de
saber quem é o verdadeiro pai, ele pode ter sido horrível contigo e acredito
nisso, mas você não me disse que ele queria demais ser pai!? Pode ser que
não, mas também pode ser que ele suba no seu conceito com relação a isso…
deixe Catarina conhecer o pai dela! — ele diz e eu me afasto.
— Nunca ouvi de você tanta merda em um parágrafo só. Ele não presta! Não
viu o que fez comigo? Esqueceu de como estava meu psicológico, quando
você me encontrou e me salvou?
— Nunca me esqueci. Nunca! Mas só vou te falar uma coisa, estou do teu
lado, você fazendo o certo, ou o errado, estarei do teu lado como sempre
estive. Só não vou passar a mão na tua cabeça. Tu quer começar uma guerra
com seu ex-namorado, comece, mas não vai colocar a minha filha no meio
dessa sujeira!!! Eu te amo mais do que amo qualquer outra pessoa no mundo.
Sei que se você seguir com essa vingança sem sentido, Catarina vai odiar
você, quando crescer e descobrir que além de eu não ser o seu pai verdadeiro,
sua própria mãe colocou seu pai na cadeia! Pensa bem, minha prenda, já vai
ser um baque quando ela descobrir que você fugiu quando estava grávida, já
vai ser… agora é a mãe que a escondeu de seu verdadeiro pai e a privou de
conviver com seus familiares de sangue, prendeu o seu pai, e a fez crescer
achando que eu era o pai dela. E eu vou levar ferrão junto, porque eu sempre
soube de tudo e “resolvi apoiar e não dizer nada”. Pensa nisso! Vou me
deitar, te espero na cama!
Yan diz, vira meu corpo a força, me beija, e se retira. Fico lá sozinha,
pensando e me corroendo. Minutos depois Catarina se aproxima com sua
Barbie e me olha nos olhos.
— Quero um copo d'água, por favor.
— Te ensinei… por que você não vai pegar? — eu digo e ela sorri como uma
criança levada.
— Tudo bem, vai!
Ela vai pisando firme, pega o copo na estante, vai no filtro do lado da pia,
estica o pesinho, enche o copo de água, vira para mim sorrindo orgulha com
teu feito e vejo Tay estampado em sua face.
— Por que tá me olhando desse jeito? — ela questiona e finjo que não ouvi.
— Senta aqui. — eu estico uma cadeira para ela, e me sento na próxima.
— O que achou da outra família da mamãe? — pergunto e ela põe o dedinho
no queixo fingindo pensar.
— Achei legal a tia Lulu!
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— Mas e seus avós?


— Hum… gostei!
— A chácara é legal, não é!? Quer ir lá brincar de vez em quando?
— Sério??? Eu vou??? Mesmo???
— Já não te falei que vou te levar lá sempre!? Então, só quero saber o que
você quer! Vamos passar um tempo aqui até a mamãe resolver aquele
problema de adulto que te expliquei, e de vez em quando, pra resolver
algumas coisas, vou ter que deixar você com sua avó e sua tia. Você sabe que
a prima Ritinha tá muito dodói, e a sua vó Isa tá cuidando dela. Papai também
vai ter que voltar pro Sul de vez em quando pra cuidar lá de casa. Vai ter
vezes que você vai precisar ficar com a vó Hella! — eu digo e ela parece
pensar.
— Por que a prima Ritinha está dodói?
— Por que? Bom… aconteceu! É uma doença chata, mas ela vai se recuperar,
logo, logo ela ficará bem!
— Ah, entendi.
— E daquele amigo da mamãe, você não gostou? — eu pergunto e ela pensa
de novo.
— Não sei.
— Como assim?
— Ah! Ele me olha assim, ó! — ela faz uma careta divertida abrindo bem os
olhos.
— É ele te olha assim mesmo. — eu digo e dou risada, não posso evitar.
— Por que ele me olha assim, mami?
— Porque você é linda. E ele te ama muito, muito, muito!!! E você é tão
linda que o faz ficar um tanto quanto bobão. — e inconsequente, penso, mas
não falo. — Igual a vovó e vovô, todos amam você!
— Ele é família?
Ela pergunta e não sei o que dizer. Yan volta do quarto, para no batente da
porta e me manda seguir com a resposta pra ela. Seu olhar é de quem me
apoia!
— Ele é alguém especial… me diga uma coisa, você entende como você
nasceu?
— Sim, pela cegonha, oras.
Ela diz na lata e Yan quase se mija de rir, colocando a mão na boca.
— Por que o Yan é teu pai, Cat?
— Porque ele beija a mami!?
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Ela mexe os ombrinhos e eu desisto. Me levanto e faço que ‘não’ para ele,
não sei como falar disso pra ela.
— Cat, a mamãe tá tentando te falar uma coisa muito delicada, mas que é
muito simples e fácil de entender, principalmente se tratando de uma guria
tão esperta e inteligente como você é!!!
Yan pega Catarina no colo e enche ela de cócegas. Fico tensa, mas não deixo
de sorrir.
— O que é? — ela fica curiosa e minha barriga dói de tão aflita que fico.
— É que a princesa Catarina, do condado de Bagé, no sul do país… Tem a
honra, a sorte, e a maravilhosa graça de ter dois papais!!!
Yan diz quase gritando e ela sorri com a boca aberta como se dissesse “que
babado fortíssimo!”, e “Não acredito nisso, jura? Dois???”
— Legal, não é? — Yan fala e a solta no chão.
— É. Quem é?
— Mamãe vai te apresentar a ele, por isso estamos aqui!!!
Yan diz e volta pro batente da porta.
— Ah. Entendi.
Ela diz simplesmente, pega a sua Barbie, e vai sentar no sofá com a vovó.
Yan me olha como se dissesse, “viu!? Não é um bicho de sete cabeças”, e se
aproxima.
— Agilizei seu trabalho, portanto, pode vir para a cama, por favor?
Ele me abraça e sei que quer amor.
— Obrigada, por tudo. Você é incrível!!!
Falo baixo e ele me pega no colo.
— Não adianta achar que só deve agradecer e que está tudo certo. Quero
casar contigo e quero que seja logo. Já que eu sou esse pai e noivo
maravilhoso, diz logo um ‘sim’ pra mim, e aceita ter esse “cara incrível”,
para sempre na tua vida!!!
— Eu aceito, seu maravilhoso!!! — eu digo rindo então ele aperta minha
bunda e me solta no chão.
— Então vamos comemorar, encomendando um irmãozão para a Catarina.
Vem! — ele sorri de lado, pega na minha mão e me leva pro quarto.
— Ei… preciso por Cat na cama.
Eu digo quando entro no quarto e ele já começa tirar minha roupa.
— Eu coloco.
— Tá bem, então vou tomar um banho…
Ele sorri para mim, chupa minha língua por uma última vez e se retira.
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Entro no banho, e revivo todo aquele dia. Estar nessa cidade novamente, não
era o que eu planejava. Tay apesar de tudo parecia ser outro cara, casou,
continuou vivendo ao invés de lutar por mim, se controlou quando viu
Catarina e não matou Yan como faria antigamente. Ele parecia mudado
demais. Mas eu não ia confiar nele nunca mais, pretendia pegar com Jon
todas as provas que ele tem contra ele, e entregar para a polícia. Mas o que
Yan disse, era verdade, como Cat ia reagir quando descobrisse tudo isso?
Será mesmo que Tay poderia mudar como pessoa, por ela? Era o certo, mas
parecia tão injusto, depois de tudo o que ele fez, ter o amor de minha filha, a
atenção dela. Eu estava tão confusa.
Saio do banho, me deito ao lado de Yan, e ele se achega. Eu não tinha a
menor vontade de namorar. Os meus problemas estavam começando a me
atrapalhar emocionalmente, pois não sabia o que fazer da minha vida. Ele
beija meu pescoço, vejo seu olhar em mim tentando me ler enquanto eu
olhava pro teto, e então ele para sem dizer nada. Olho pra ele, pois me
assusto com sua atitude, ele sorri, beija minha testa, vira pro canto e dorme.
Eu não merecia Yan. Ele realmente era incrível.

— Mami, vai me levar pra conhecer o meu outro papi?


Catarina questiona na mesa do café e minha mãe quase infarta.
— Que história é essa? Contou pra ela?
Minha mãe questiona baixo para ela não ouvir.
— Yan disse que era o melhor a fazer. Que Cat merecia saber, e que Tay tem
direito!!!
— Esse Yan… tomem cuidado!!! Pode bagunçar a cabeça da menina!!!
— Ela parece bagunçada, mãe? Cat é esperta! Está tudo bem, vamos com
calma! Como está Ritinha? — eu questiono e ela faz uma cara péssima.
— Eu e seu tio decidimos voltar com ela pro hospital. Ela não quer, nós
dissemos que íamos respeitar a vontade dela, mas o médico disse que ela tem
uma chance, que tem cura. Afinal, não é terminal. Só precisamos convencê-
la.
— Vamos conseguir!!!
— Não se preocupe com isso! Trate de resolver essa sua situação maluca com
o Tay!
— Já está tudo resolvido, ele não aceitou minha proposta, não vou dar o que
ele quer! Se me processar, acabo com a vida dele!
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— Vocês ainda se amam, está escrito na tua testa! — ela diz e eu gargalho.
— Tomou seu remedinho hoje, não é!? — falo e volto minha atenção para
Cat que já estava me encarando nervosa.
— Vou te levar, assim que eu puder! — eu digo e ela faz uma cara de brava.
— Mas quero ir agora!
— Você não tem que querer nada ainda. Tá pensando o quê? Ele deve estar
no trabalho, Catarina! Você vai conhecê-lo, mas com calma!
— Por que, Calma? Por quê? Vamos logo!!!
Ela para de brincar com a Barbie, cruza os braços, e fica emburrada. Yan
entra na cozinha de cabelos molhados e questiona o porquê do ‘bico’, quando
olha pra ela.
— Mami disse que eu tenho outro papi! Mas não quer me mostrar! — Yan ri
e olha pra mim.
— Eu sei onde ele trabalha, quer que eu leve você?
Ele fala e ela sorri. Saio da cozinha e obviamente ele me segue.
— Por que está fazendo isso? Quer me atingir? Por que está querendo juntar
os dois???
— São pai e filha, precisam se conhecer! Que mal faz, mulher teimosa?
— Tay não a merece! Ele não a merece!!!
— POR QUE, ELLEN? POR QUE ELE TERMINOU COM VOCÊ??? —
Yan se descontrola, mas respira fundo. Meu ódio me deixa muda e ele
continua. — Quer odiá-lo eternamente, odeie, melhor pra mim que não tenho
o casamento ameaçado, mas não desconte suas frustrações em Catarina! Para
de bobagem à toa, leva logo a menina para conhecer ele. Não desconte nela!
Você a leva ou eu terei que fazer isso? — ele questiona e me sinto frustrada.
— Eu levo. Assim não corro o risco dele te matar na frente dela. Mas vamos
conversar seriamente depois que eu voltar. Se for continuar contra mim, não
quero mais manter esse relacionamento. Preciso de apoio, de amor, de
parceria. Não quero mais um homem na minha vida que só me diminui, que
me dá as costas nos momentos difíceis como esse, que me machuque! Pensa
na merda que está fazendo. Se continuar com essa atitude, será o fim pra nós
dois!
Eu falo revoltada e tento sair de perto dele, mas ele segura em meu braço.
— Vou relevar o que acabou de dizer porque está nervosa. Porque não gosta
de ver o cara que tanto odeia, ou ama, não sei dizer, perto da nossa filha. Vou
relevar Ellen, ou pelo menos tentar. Se voltar e eu ainda estiver aqui, teve
sorte! Vou pensar.
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Ele fala e eu puxo meu braço com grosseria. Pego minha bolsa, Catarina, e
dirijo em direção á escola. Eu não entendia o que Yan fazia, parecia que
estava me empurrando para meu ex, que atitude estranha. Qualquer outro
morreria de ciúmes, mas ele fica ajudando o outro, parece burro!
— Será que ele vai gostar de mim??? —— ela pergunta e eu viro o rosto pra
bufar.
— Impossível. Você é uma princesa, uma menina maravilhosa! E eu já disse
que ele te ama mais do que tudo, você já até o conhece!
— É o amigo da mamãe? — ela pergunta e quase perco o controle do carro
por causa do susto.
— Como sabe???
— Ah! Ele parece comigo. E eu já vi uma foto dele no meu castelo!
— Aonde???
— Na “caixa de segredos, mamãe”, aquela que a Cat não pode mexer de jeito
nenhum!!!
Ela fala de uma caixa que eu tranco com chave. Eu tinha pensado que havia
queimado todas, mas no dia que fui desfazer as malas, na casa do hotel, eu a
encontrei e guardei.
— Quem abriu? Você abriu???
— Ela caiu da minha mão e abriu sozinha! Sozinha, eu juro! — ela fala
penteando a Barbie com os dedinhos.
— Meu Deus… seu pai viu? — eu pergunto e ela só balança a cabeça. Pelo
menos isso.
— Mas deixa eu te falar uma coisa, ele é muito ocupado, você não pode ficar
querendo ver ele sempre, está bem?
— Tá bom!
Estaciono na frente da escola e entro a pé com Catarina. Falo o meu nome na
recepção e mostro minha identidade. Digo que quero falar com o tenente
Coverick e eles me mandam aguardar. Tay aparece dois minutos depois e
parecia que estava correndo. Quando vê Catarina, parece relaxar voltando a
respirar.
— O que aconteceu?
Ele se aproxima de mim e questiona. Vestia o macacão verde musgo então
pelo pouco que sabia, estava lidando diretamente com uma aeronave. Até
porque, seu uniforme padrão é azul.
— Explica pra ele o que viemos fazer aqui! Sua responsabilidade, você não
quis vir?
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Abaixo, falo com Catarina e Tay se abaixa para ouví-la melhor.


— Você — ela aponta pra ele. — é meu outro papi!
Ela fala e eu me levanto. Tay parecia estar no céu. Parecia ter ganhado um
troféu por conquistar o mundo. Ridículo!
— É, eu sei disso! E você é minha filha!
— Eu sou uma princesa… uma princesa… — ela perde o rumo do que ia
falar e puxa a minha blusa para eu ajudar.
—… do condado de Bagé, no sul do país… que tem a honra, a sorte, e a
maravilhosa graça de ter dois papais!!!
Eu falo soando entediada, mas me segurei para não sorrir, porque sei aonde
ela queria chegar. Ela tinha mania de repetir o que Yan falava. Catarina era
uma criança metida que gostava de se exibir, e levava á serio esse lance de
ser princesa.
— Entendi. — Tay dá risada e parece super feliz.
— Eu estou trabalhando! A senhorita quer entrar ou só está de passagem,
princesa? — ele questiona e ela olha pra mim.
— Você que sabe, mas eu acho que não devíamos atrapalhar!!! — resmungo
e oro para ela dizer não.
— Você não vai me atrapalhar!!! Se quiser pode entrar. Estou trabalhando em
um caça… gosta de aviões?
— Gosto.
— Quer subir em um?
— Quero.
— Então vamos lá!
Tay diz e Catarina o segue, pego em sua mão para ela não correr e seguimos
o babaca do pai dela até uma espécie de hangar. A escola é gigantesca, tem
um jardim maravilhoso, e a sede parece um palácio, aqueles casarões que tem
em toda sede do exército. Só que maior.
— Como é seu nome?
Ela solta da minha mão com força e se aproxima dele.
— Tay! — ele apenas diz.
— Que nome bonito.
— Obrigada, o seu também é!!!
— Eu sei! — ela diz e viro o rosto pra sorrir.
Chegamos perto de um caça enorme e Catarina se empolga.
— Oh! Meu Deus!!! Aposto que você é a Catarina!!!
Um cara com a mesma farda que o Tay vestia, se aproxima dela assim que
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chegamos.
— Como você sabe, hein!?
Ela põe a mão na cintura e faz uma cara séria.
— Você é a cara do seu pai!!! E eu já te conhecia! Seu pai não para de falar
em o quanto você é linda!!! — ele diz e eu evito fazer uma careta.
— Esse caça se chama Mirage! Quer entrar lá?
Ele pergunta e Catarina demora pra responder.
— É melhor não! Vou sujar meu vestido!
Ela diz com medo e Tay não sabe o que responder.
— Tem certeza? Aposto que sua mãe não vai ligar se você sujar.
— Tenho certeza.
— Então tá bem. Mas eu preciso testá-lo! Não vai sair daqui, não é!?
— É claro que não!!!
Cat responde e vejo Laura descendo do caça. Nem tinha visto ela ali! Inferno.
— Tenente. Sistema OK. Mas as chances de você morrer são enormes, e
segura aí que o capitão está vindo!
Laura diz e depois de descer as escadas parece notar nós duas ali.
— Vou planar antes dele chegar aqui!
— Não dá tempo, ele já te viu! — ela se aproxima, olha pra Catarina e depois
pra mim. — Oi, Ellen, Tudo bem?
— Tudo. — só falo.
— Oi, Catarina!
Ela sorri para minha filha e eu tenho vontade de tirar Cat dali na mesma hora.
— Mas todo mundo sabe meu nome é!?
— Claro que sabemos, afinal seu pai é um tremendo de um chato! Só fala em
Catarina, Catarina, Catarina!!! Mas agora eu entendi o porquê, você é muito
linda.
Laura diz com simpatia e Cat a mede de cima a baixo.
— Você também é linda!
— Muito obrigada!
Laura diz sorrindo e pisca pro Tay. Deus o que eu estava fazendo ali?
— Ronan! Envia um pedido de cancelamento de aterrissagem do Mirage,
Agora! — Max chega e se aproxima.
— Oi Ellen, que bom te ver aqui!
Ele me olha e se abaixa para beijar e abraçar Catarina.
— Sem esperanças, Max. Só estou aqui porque ela me forçou!!!
Eu resmungo depois que ele se levanta.
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— Sem problemas!
Ele diz sorrindo e fico puta. Abusado! Irônico!
— Já fez, Ronan? — Max se vira para o grupo e nos deixa ali.
— Não, senhor!
— E precisa do que pra fazer?
— Da ordem do meu tenente.
— Quer algumas aulas de hierarquia de novo?
— Não, senhor. É só que a ordem veio da ADM, senhor, estamos dentro do
plano pro dia. O teste foi aceito para controle geral. Só temos o Coverick, não
temos mais nenhum tenente e vamos perder pontos se o Mirage passar o dia
sem planar. — o cara diz e Max parece que vai explodir.
— Nogueira… — ele resmunga e Laura segura um riso descomunal.
— Não, senhor!
— Pai…
Tay que em todo aquele tempo só tinha olhos para Catarina, começa á prestar
atenção no debate que os três faziam e eu não estava entendendo nada. Tay
estava escorado em uma barra de ferro e de braços cruzados, desde que Max
chegou, parecia saber que seu pai chegava para brigar.
— Está tudo bem! Testarei Mirage, como testei o tucano na sexta. Como fiz
em todos os outros.
— Essa aeronave está há meses parado. Não deviam ter convocado você para
fazer o primeiro teste! — Max parece implorar, e eu começava a entender.
— Os testes separados foram ‘ok’! Turbina zerada. Desde que cheguei aqui o
mantive ligado, o…
— Uma coisa é ligado em solo, outra coisa é ligado até você atingir mais de
onze mil metros. Até você atingir a altura padrão, vai forçar a turbina que não
é usada há meses, abusar do combustível, — ele fala baixo para Catarina não
ouvir, mas eu escuto. — você-vai-explodir-no ar, porra! — Max desabafa e
parece cansado de falar.
— Tá com medo de quê? Sou capaz, pai! Vou conseguir! Para eu ser bom
preciso ter a minha primeira vez. — Tay diz e Laura cruza os braços.
— Capitão, a ordem já foi dada. Tay pode recusar e alegar…
— Eu sei que ele tem direito de seguir, já estou aqui a mais tempo do que
deveria, quando era tenente, você usava fralda. Só estou dizendo que não é
seguro!
— Senhor, esse não é o primeiro caça que ele pega no primeiro teste!
O tal Ronan diz, mas Max nem olha para ele, só olha para o filho!
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— Ele chegou de Anápolis ontem. Preciso devolvê-lo hoje até o fim do dia.
Estamos perdendo tempo! — Tay resmunga.
— Acha que ter casado com uma fuzileira que ama o perigo de escapar das
quedas, te faz um bom sobrevivente? Julia pode subir nesse Mirage, ficaria
despreocupado, mas você não está pronto! Vamos para Belo Horizonte,
consigo um simulador para você se divertir! — Max diz, e parece que nunca
ia desistir de tentar.
— Fico tremendamente honrada pela sua confiança em mim, meu sogro! Mas
fui eu quem autorizou meu marido! Sei que ele é capaz.
Ouço a voz de uma mulher e ela entra na roda da discussão. Tay olha para o
pai como se tivesse falando “pelo menos ela né…”, e eu sinto meu coração
travar.
Ela se aproxima, olha para mim e para minha filha, mas só sorri para ela.
— Você deve ser a Catarina, como vai? — depois ela olha pra mim — Como
vai Ellen, prazer, Julia! Tudo bem?
Ela é tão simpática, mas tão simpática e linda, que não desce na minha
garganta. Dou um passo pra trás e respondo com simpatia.
— Vou maravilhosamente bem, Julia! Obrigada!
Não pergunto como ela está e vejo Tay sorrir, se divertindo.
— Bom, tenente, vai ser hoje ou não!?
Julia diz e Catarina me olha com uma cara estranha.
— O que estão dizendo, mamãe?
— Só estão decidindo se o Tay vai voar! — eu falo baixo e continuo
ouvindo.
— Deixa eu ir! — Max pede uma última vez.
— Pai para de pirar.
— Eu vou contar pra tua mãe!!!
Max fala movido por um impulso e todos dão risada até o próprio Tay. Até
Catarina, mesmo sem saber de nada.
— Sem essa, velho! Tu acha que algo vai acontecer agora? Ainda preciso te
dar muita dor de cabeça ainda…
Tay desencosta da grade e se aproxima da nave. Ronan lhe entrega alguns
equipamentos e Julia se aproxima dele.
— Lembre-se, o teste é válido em rotas baixas. Atinja a altitude padrão o
quanto antes. Não plane antes. Se as turbinas falharem, você tem chance de
planar até o solo com…
— Tá parecendo meu pai, fica calma! Não disse que confia!? Tu falou sobre
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como proceder aquele semestre inteiro, tive que aturar você gritando na
minha cabeça por mais de seis meses. Vamos lá, mulher, Confia!
Tay resmunga, a deixa falando sozinha e se aproxima de mim.
— Vim te dar tchau! Até daqui cinco minutos!
Tay estende a mão para Catarina e ela corresponde.
— Você vai voltar? Vai cair de lá de cima?
Quando eu achei que ela não estava prestando atenção…
— Mas é claro que não vou cair, vou voltar, sim. Sou o melhor piloto dessa
escola! Até mais que seu avô!!! — ele diz sorrindo e me olha nos olhos.
— Acho melhor eu levá-la pra casa, você está ocupado. — eu falo.
— Não, ainda nem falei com ela direito! Já volto! São só cinco minutos.
Depois tô liberado!!!
Ele diz esse “cinco minutos” de um jeito diferente, e eu me recuso a sentir
medo dele se explodir lá em cima. Era bom que se explodisse, assim não teria
que dividir minha filha com um… com um… pé no saco que nem ele. Ele me
olha profundamente como se tivesse coisas para me dizer, depois rouba um
beijo de Catarina, passa por Julia, ela toca seu ombro, ele olha pra ela, e
depois sobe na escada para entrar na aeronave.
— Pegue o rádio pra mim, Nogueira! — Julia pede e Laura ri.
— Ele vai ficar bravo…
— Não vou chamá-lo, só ficar aqui!!!
Ela resmunga mal-humorada e Laura obedece.
— Precisamos sair agora!
Ronan diz e Max pega Catarina “emprestada” no colo. Me retiro junto com
todos, e saímos para a parte aberta, onde tinha a pista reta por onde ele
passaria. Era tão reto que parecia um túnel. Tinha um espaço aberto e onde
sentar; Max nos levou até lá, colocou protetores de ouvidos em Catarina e em
mim, e aguardamos.
De repente o barulho dos motores começou a azucrinar nossos ouvidos, e
Catarina dançava como se ele fosse música. Ela estava radiante. O barulho foi
se intensificando e logo Tay passou com o caça ao nosso lado e
imediatamente subiu ao céu. Foi incrível, o “úhul” de Catarina foi
contagiante. Mas eu tinha um aperto no coração que não estava sabendo lidar.
Eu queria ir embora! Estar ali parecia errado.
Tay fez suas manobras e durante uns três minutos tudo corria como o
planejado, aparentemente. Mas... depois de alguns minutos, uma fumaça
preta começou a marcar o caminho que ele fazia. Nessa hora, Max chama
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Tay por um rádio.


— Tay.
— Eu já vi, Capitão.
— Pousa!!!
— Está tudo sobe controle! Nunca viu rastro de poeira? Minha filha está por
perto?
— Isso não é rastro de poeira, são as turbinas pegando fogo. Tem uma
diferença entre fumaça cinzenta e fumaça preta, tóxica! E não, ela está um
pouco distante! — Max mente e eu não sei o porquê.
— Ela é linda não é, pai!? É a minha cara… acho que é por isso que ela é
linda! — ele ri. — Eu amo essas duas, pai! Mais do que tudo no mundo…
Ok. Já entendi. Foda-se.
— Concentra. — ele vai falando e Max vai ficando mais nervoso.
— Cheguei, velho!
— Eu sabia que chegaria!
Max diz sorrindo e limpa algumas lágrimas que escapam. Tay dá uma risada
alta e gostosa do outro lado da linha.
— Cara de pau! Sabia nada. Tava com medinho de perder o primogênito.
Como fica, agora? Vou contar pra minha mãe que você me pediu um abraço
antes de entrar no caça… — ele ri de novo. — Vou contar só pra ver a cara
dela!!! — mais risos. — Vai ter que me dar uma boa grana para eu não soltar
essa!!!
— Tay…
— O quê?
— Reparou que está fazendo piadas sem graça nenhuma, e está ficando
ridículo como era antes?
— Minha filha me deixa de bom humor!
— Vou mandar ela ir embora agora mesmo! Você fica muito chato de bom
humor!
— Manda não, acabei de conhecer a pessoinha que eu mais amo e vou amar
incondicionalmente na minha vida. Deixa ela aí, velho!
Tay diz e um chiado na linha interrompe a ligação. A fumaça preta fica mais
intensa, e meu coração vem na boca. De repente tudo para, a fumaça das
turbinas cessam e vejo o caça ‘fazendo o retorno’ diferente do que eu poderia
dizer como leiga. Parecia que a aeronave estava caindo.
— O que houve??? O que houve??? — pergunto e Max me olha sorrindo.
— Ele estabilizou um caça que estava parado. É isso o que houve… — ele
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diz e volta a olhar pro alto.


— E por que caiu a ligação??? — questiono e ele me olha nos olhos
profundamente.
— Tá preocupada com meu filho???
— Óbvio que não. — eu falo e ele ri.
— Caiu porque ele desligou, cansou de ouvir minha voz e não quis dizer, ou
a cabine desligou automaticamente porque ele vai pousar!
Max diz, eu olho pro alto e vejo o caça minúsculo ficando grande. Ele vem
vindo cada vez mais, e parece que vai nos atingir. Catarina tampa os olhos
com as mãos e Tay entra com tudo no túnel por onde saiu. Aquele barulho
imenso volta, e quando para, Max nos leva de volta.
Quando Tay desce da cabine, Laura, Ronan, Julia e Max correm para
comemorar o feito. Pelas festas que eles fazem, Tay tinha feito algo muito
complicado.
— Não vamos comemorar também!? — Catarina me pergunta.
— Eu não. Você quer?
— Ah… também não!!! — ela diz e eu dou risada.
— Pensou que ia se livrar de mim??? — Tay se aproxima e questiona.
— Pois é, minhas orações não foram atendidas! Quem sabe na próxima!? —
ele sorri ao me ouvir e eu não correspondo seu sorriso. Ridículo.
— Quando vai me deixar vê-la de novo?
Tay questiona na porta da escola. Max levou Catarina na cantina para
comprar algo para ela comer no caminho pra casa. Eu não queria ficar ali
mais nenhum minuto sequer.
— Vai aceitar a proposta que eu fiz? Só vim porque ela e meu noivo
forçaram a barra. Meu pensamento permanece, continuará igual. Se não
aceitar, não vou permitir que chegue perto dela!
— Por que está fazendo isso comigo, Ellen? Pare de tentar me punir, quer um
pedido de perdão? Quer que eu me ajoelhe? Me diz o que quer e eu faço…
— Faça o que mandei e aceite apenas um dia.
— Porra eu acabei de saber que sou pai uma criança enorme. Acabei de
conhecê-la, nunca fiz parte de sua vida, e isso era tudo o que sempre desejei,
Catarina é tudo o que sempre sonhei. Só pedi que me deixasse buscá-la na
escola!
— Isso é muito pra você! É muito! Não confio em você, não confio nas
pessoas que te cercam, não confio no seu passado…
— Acha que não sou capaz de proteger a minha filha? Ou machucá-la de
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alguma forma? Eu era um monstro, mas monstro com quem merecia.


Nós dois discutíamos muito baixo. Quem via, achava que era apenas duas
pessoas conversando, mas eu queria voar em seu pescoço! Quem ele pensava
que era, Deus? O pai do ano que tinha direitos?
— Acho. Você tem muitos podres. Conheço essa sua família! Podem usar
minha filha para atingir você. Não vou permitir!
— Eu mato qualquer um que olhar torto pra ela, só de pensar em ameaçá-la!
Risco do mapa, Ellen. Eu a amo sem ao menos conhecê-la, conviver com ela.
Catarina é minha vida, eu dou a minha vida por ela!
— Não me importa, Tay! É um dia, ou nada. Se insistir, faço o que eu disse
que ia fazer! Processo você. Acabo com sua vida! — eu falo e vejo avô e neta
se aproximando.
— Tudo bem. O sábado.
— Segunda.
— Segunda eu trabalho, segunda ela estuda. Está zombando com a minha
cara!!??
— Ela está sem aula, ainda preciso escolher a escola. Acabamos de chegar
aqui! Até lá, se vire! SEGUNDA!
Eu falo e dou-lhe as costas. Catarina me abraça e mostra o lanche que
ganhou, e nessa hora a tal da Julia volta do além, e abraça e beija seu marido
na boca.
— Vamos pra casa? — ela questiona.
— Vamos! Você vem, pai?
— Não. Vou ficar mais um pouco. Resolver uns problemas aqui! — ele se
aproxima e se despede de Catarina. — Tchau, princesa!
— Tchau! — Cat responde e ele se retira.
— Bom, já vou indo. Tchau!
Eu digo e já ia andando, mas Tay se desvencilha da grudenta e se aproxima
de Cat.
— Vou poder te ver logo não é!? Você quer?
— Não sei. Acho que sim! Tchau, Tay!
— Tchau, princesa!
Ele diz e vou embora sem olhar pra trás. Entramos no carro e fomos direto
pra casa. Cat ao chegar foi direto pra cama dizendo que estava sonolenta
demais. Procuro por Yan, e não o encontro em lugar nenhum.
— Mãe? Cadê o Yan? — questiono e ela me olha triste.
— Ele disse que precisou ir resolver algo no hotel. Que era para você esperar
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que ele te ligasse. Que precisa de um tempo sozinho.


Ela diz e o chão se abre embaixo dos meus pés.

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25
O CAÇADOR

Pelo ponto de vista de Ana Luiza

— Vai demorar mais, daddy? Eu que sou uma garota, não demoro tanto!
Bato no quarto do meu pai e ele grita que ‘já vem’. Podem passar anos e
esses dois não se desgrudam. Aposto que namoravam. Toda vez que meu pai
vai trabalhar, viajar, ou sair de casa para ir na padaria, era o mesmo lenga-
lenga, os dois se enroscavam de um jeito que parecia que aquele “tchau” era
um “adeus”. Eu reclamava, mas sempre achei bonito esse amor dos dois. São
obcecados um pelo o outro e eu esperava encontrar um amor assim, um dia,
não sei se será com Chris, esperava que sim, mas eu queria, com certeza.
— Pronto, filha! Vamos.
Meu pai chega à sala enquanto eu dava um beijo e um apertão nos gêmeos, e
na minha pequena família.
— Amém!
Eu digo rindo e minha mãe sorri para mim. Ela me abraça pra se despedir e
tia Nina diz: — Pensei que você ia sozinha!

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— Pensei o mesmo. Ia passar a noite na casa da vovó. Mas seu Max, bom... é
o Max! — eu digo e ele bufa.
— Só quero passar um tempo com minha filha. Ou você quer ir sozinha!?
Sozinha pra quê? Achei que gostaria de ficar comigo.
Ele questiona me olhando de cara feia e eu dou risada.
— Papi, eu vou amar passar esse tempo com você! Agora vamos!
Eu digo e saio rapidamente. Quando o vejo grudado na minha mãe de novo,
eu volto, puxo ele, e os dois dão risada.
— Mas que grude…
Resmungo fingindo estresse.
— Sua mãe é meu grande amor, minha paixão! É duro partir…
— Já sabe, posso ir sozinha, tenho…
— Não! É duro, mas eu consigo!
Ele diz e olha para mim erguendo uma sobrancelha. Saco.
Faltava pouco tempo para chegarmos a São Paulo quando paramos para
lanchar, pois já havia passado muito tempo da hora do almoço. Eu gostaria de
falar sobre Chris com ele, mas não tive coragem. Não sabia como ele ia
reagir, e eu sabia que pra mim seria mais seguro contar perto da mamãe.
— Papai. — eu inicio o assunto enquanto ele dirigia.
— Peça. Vou pensar no teu caso!
Ele fala com um semblante serio, eu sabia que ele já sabia do que se tratava.
Meu pai fechava a cara toda vez que esse assunto vinha a tona.
— Por que não me deixa namorar? Nem andar sozinha para nenhum lugar?
Nem me dá autonomia pra nada?
Pergunto e o vejo forçando o maxilar. Deus, cadê minha mãe???
— Você mora sozinha em outro país, como não te dou autonomia?
— Pai, sei que Jon também fica de olho em mim, um amigo da universidade
me disse que meu computador foi duplicado! Ele é especializado. Acessando
meu computador, que é vinculado a conta do meu aparelho celullar, sei que
ele sabe meus passos, o que eu acesso, pesquiso, compro… Pensa que não!?
Não me subestime, eu sei! Por isso vivo saindo sem celular!
Eu deixo escapar a última parte da frase, e ele parece beirar o surto, mas não
grita.
— Está dizendo que enquanto eu achava que você se comportava, você me
enganava para ir a farra???
— Não. Tô dizendo que sou maior de idade! — eu digo e ele balança a
cabeça.
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— Sendo assim, contratarei seguranças. Eu juro que não queria fazer isso,
mas você não me deu escolha! Achei que você iria sair do país para estudar,
crescer, pensar no futuro, achei que podia confiar em você!!!
Meu pai parecia magoado demais, e apesar de brava por sua atitude, meu
coração doeu ao vê-lo assim comigo.
— Bom, você já não confiava, não é!? — eu digo.
Mas que mania de querer controlar o mundo!!!
— Sempre confiei. Nunca mandei Jon me ligar contando onde você estava!
Nunca fiquei no seu pé, te seguindo… A ordem era ‘só para se algo de
estranho acontecesse’. Você sempre foi tão focada nos estudos e no seu
aprendizado desde criança que nem me importei com nada, confiei
cegamente que seus passos seriam para no máximo uma festa entre amigos,
lojas e mais lojas, faculdade, e o apartamento. Nunca foi de demonstrar
interesse em namorico! Achei que você continuava só pensando em estudar,
mas estou errado!
— Pai, eu amo estudar, estou focada! Te mando minhas notas por e-mail,
todo mês. Você, e a mamãe acompanham tudo! Sou a melhor da minha
turma, fui a melhor no curso de inglês da escola toda, melhor nota, primeiro
lugar. E continuo assim!!! Mas é que sou mulher, sou maior…
— Ah! Faça-me o favor, Ana Luiza! Você acabou de fazer dezoito, ainda é
uma criança, cheira a leite! Cresça, estude, trabalhe, tenha seu próprio
sustento, se forme, e aí sim, pense em namorar!
— Sabemos que até depois disso, você ainda vai me proibir! — eu resmungo
e ele concorda rindo.
— Provavelmente, sim! É minha filha, eu te amo! Você é o que tenho de
mais precioso! Quero te ver crescer com responsabilidade, formada,
construindo uma vida profissional maravilhosa! Não pode desperdiçar sua
inteligência, cuidando de fraldas sujas. Não quero te ver machucada, iludida,
grávida e com a vida toda interrompida. Primeiro conquiste sua vida, depois
queira construir algo com alguém. Namoro está no fim da lista, e eu não vou
mudar de ideia!
— Pai, eu não vou engravidar. Existem remédios para impedir isso, sabia!?
— eu digo e o vejo respirar fundo.
— Se insistir nesse assunto, cancelo seu curso e te trago pra casa!
Ele diz como se falasse do tempo. Simplesmente assim.
— Posso pagar todo o meu curso sozinha, e em Harvard, ganhei uma bolsa
integral! Posso me virar com o que poupei a minha vida toda! Só vivo com o
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seu dinheiro, porque você faz questão!


Digo e novamente ele balança a cabeça convencido, tem feições mais calmas
e fala pausadamente.
— Se insistir no assunto, expulso você de casa, tomo tudo o que você tem,
cancelo suas contas, todas elas, e não terei mais uma filha! Aliás, se é capaz
de discutir com seu pai, entrar em desavença comigo por causa DESTE
assunto, realmente não é mais minha filha. Porque minha filha de
antigamente, nunca faria isso! E aí? O que acha dessa?
Ele fala e eu engulo o choro. Como ele conseguia ser tão ruim???
— Ah! Então não sou sua filha, OK! Meu pai era mais compreensível, então
você também não é meu pai. Você está muito diferente! — eu digo
emburrada e ele ri de novo.
— Diferente? Com você? Acho que você tá pirando! Sempre fui assim
contigo, sempre cuidadoso demais, possessivo, protetor. A diferença é que
agora, é VOCÊ quem está diferente. Perdi meu passarinho! Passei a vida te
mantendo em uma gaiola, e agora quer voar livre pelo Bronks! — ele fala e
não posso deixar rir. — Ouse a rebolar como rebola no Bronks, e eu uso uma
das celas para militares, e te prendo em Pirassununga para sempre!
Ele diz serio demais sem me olhar nos olhos, e não aguento segurar. Dou
muita risada.
Estacionamos o carro dentro do pátio privado, e caminhamos até a
administração. Pelo o que eu ouvi enquanto meu pai falava com Jon, ele já
estaria dando fim a sua jornada de trabalho do dia, mas ia nos aguardar
mesmo assim.
Eu me lembrava daqui, era um lugar que eu me sentia bem. Lembro-me de
ainda criança, no tempo em que morávamos no condomínio, que ele me
trazia aqui sempre. Principalmente em dia de eventos, 07 de setembro, e por
aí vai!
Chegamos na frente da administração e tinha um homem com o uniforme
azul, mas sem o quepe. Ele parecia assinar uns papeis, e ler alguns
documentos, totalmente entretido. Tinha seu porte um pouco mais magro que
meu pai, também parecia ser mais novo, e ao chegar mais perto, notei ser o
cara mais lindo que já vi na minha vida.
— Jon! Muito ocupado???
Meu pai diz e quase caio de costas no chão. AQUELE era Jon??? Deuses…
— Senhor! Aproveitei que ia ficar até mais tarde e agilizei algumas
pendências de amanhã.
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Ele fala sorrindo, aperta a mão de meu pai, o abraça, e enfim me olha.
— Senhorita Luiza. Como vai?
Ele me estende a mão e eu o correspondo. Não parecia ter ficado surpreso,
não! Pelo menos não como eu fiquei. Mas eu sei quando deixo um cara
balançado e com Jon, não foi diferente!
— Oi, tio! Lembra-se de mim??? Não nos vemos faz tantos anos, que até já
me esqueci seu rosto.
Eu digo, e meu pai e ele dão risadas pelo comentário. Eu o chamava de ‘tio’
antes, quando era pequena, e dessa vez escapou, saiu naturalmente. Mas só de
olhar para aquele ‘tio’, minhas partes íntimas latejaram, e minha calcinha
ficou encharcada na hora. Que tio, misericórdia!!!
— Eu preciso me lembrar! É a preciosidade de meu melhor amigo, capitão e
irmão! — ele diz e papai bate em suas costas.
— Me deixa só guardar esses documentos aqui, que a gente já sai! Vamos até
o condomínio, lá conversaremos melhor!
Ele diz e entra na administração. Sento-me nos bancos de espera que ficam
logo a frente, e ‘fecho a cara’. Eu estava brava com meu pai há alguns
minutos atrás, e precisava continuar, tinha que fazer um teatro. Afinal, Jon
me tirou o rumo ali. Sua barba que parecia estar começando a crescer, —
assim como meu pai, todos os militares precisavam manter a barba feita. —
aqueles olhos verdes que não haviam me olhado como a ‘garotinha do papai’,
aquele cheiro de perfume masculino e roupa muito bem lavada com
amaciante caro, o aperto forte na mão, e o sorriso enorme, me deixaram
totalmente desestabilizada. Jon era um pedaço de mau caminho, caminho
esse que eu queria percorrer logo em que o vi.
— Esquece isso menina maluca!!!
Murmuro decidida e meu pai questiona ao se sentar do meu lado: —
Esquecer, o quê?
— Nosso assunto! Ou você quer que eu tente mais vezes? — minto e ele
fecha a cara.
— Pois é, esqueça mesmo!!!
— Então!!! — falo e ele me abraça a força.
— Eu te amo! Só estou fazendo isso para seu bem! Você é a minha vida. Se
alguma coisa acontecesse com você, não sei o que eu seria capaz de fazer…
quer dizer, eu sei bem. Traria o inferno para a terra. Mataria e morreria.
— Não fala bobagem, papai!
— Eu falo sim, e não é bobagem! Você me devolveu minha vida de antes, ao
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nascer. Você trouxe luz para a vida do seu pai. Eu estava tomado por trevas,
traumas, e dor. Você me salvou, filha! — ele suspira segurando um choro e
eu lamento me culpando. — Você é minha princesinha, e minha princesinha
não cai na lábia de marmanjo por aí!!! Muito menos de marmanjo americano!
Ele diz “marmanjo americano” como se tivesse nojo. Veja se posso com isso!
— Papi!!!
Exclamo e ele bagunça meu cabelo. Jon chega e eu paro de ser a menininha
do papai.
— Vamos?
Ele questiona e eu me levanto junto com meu pai. Voltamos para o pátio,
pegamos o carro, e seguimos Jon, até o condomínio onde eu morava. Todos
os sobrados são padronizados, muito parecidos. Só o que mudava era seu
interior, e a decoração da casa de Jon era muito sofisticada. Pelo jeito ele
sabia bem o que fazia com o salário que ganhava da FAB e o que ganhou de
meu pai durante todos esses anos. Sua esposa parecia ter bom gosto. Jon tinha
dois filhos, os vi pouco, deviam ser um pouco mais velhos do que eu, não me
lembrava direito.
— Onde estão todos? — pergunto e Jon olha de um jeito estranho para meu
pai.
— Bom, minha ex foi pra casa da mãe dela!!! Fico com meus filhos só no
final de semana. — ele diz me olhando nos olhos e parece triste.
— Nossa, tio… sinto muito!!! — Sinto nada. Penso, “que maldade Ana
Luiza!!!” — faço uma carinha triste.
— Tudo bem! Já faz um tempo… — ele fala e coloca as mãos no bolso da
calça.
— Como ela está, Jon? As crianças…!? — meu pai fica triste.
— Bom, as crianças sofrem, apesar de já terem idade para entender, né! Mas
ela parece bem, cortou o cabelo, mudou o estilo de roupas, parece mais
ousada… mulher quando muda assim, é porque já superou. — ele sorri fraco
e eu sinto uma vontade de consolar ele, só que nua. Em cima dele e... —
Bom, querem um café? Suco? Água…!? — ele oferece e logo nego.
— Aceito uma água! Mas deixa que vou buscar, sei o caminho e quero ir ao
banheiro!!! Vou me sentir á vontade, Jon…
Meu pai resmunga, e os dois sorriem um para o outro. A amizade dos dois era
bonita de se ver.
Jon, faz alguma piada em resposta a gracinha do meu pai, mas eu não escuto,
pois prestava atenção em seu rosto. Meu pai toca seu ombro, passa por ele,
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nos deixa a sós, e Jon se senta no sofá a minha frente. Ele olha para mim,
sorri com simpatia e eu fico hipnotizada. Eu escolho a opção de não dizer
nada, pois, Jon me tirava essa opção, ele me deixava extremamente mexida e
de um jeito que nunca me senti antes.
— Como vai Nova York, senhorita?
— Se não for capaz de me chamar de Lulu, tio, pode me chamar só de Luiza.
E vai bem, você sabe… afinal me investiga e segue meus passos desde que
cheguei lá!
Digo e não sabia se olhava para seus olhos ou o seu sorriso. Ele se mexe
desconfortável, ajeita a gravata parecendo estar com um calor que não existia
ali, e responde com sua voz grossa e olhar penetrante.
— Sinto muito por isso!
Ele corresponde meu olhar, só que com mais “timidez”, e chega a minha vez
de me mexer nervosa. Ele olha para meu corpo notando meu estado atual, e
volta seu olhar para mim.
— Sente mesmo? — eu pergunto.
— Não!!!
Ele ergue a cabeça para responder, responde na lata e não conseguimos evitar
o riso. Ele ri de nervoso, e eu, porque achei engraçado ele assumir, afinal,
espionar a mim, minha família e qualquer pessoa que meu pai quisesse, era
seu trabalho. Ficamos rindo, até que ele para primeiro, e mede meu corpo
inteiro com um desejo difícil de esconder apesar de muito tentar.
— O que foi engraçado?
Meu pai questiona rindo, pois a nossa risada o contagiou.
— Tio Jon perguntou como estavam as coisas em NY, eu disse que a
pergunta era um tanto quanto patética, já que ele me espiona!
Digo e continuo rindo, mas meu pai faz uma cara feia.
— Não liga não Jon, ela está estressadinha porque quer permissão para
namorar! Por isso foi grosseira!
Meu pai diz se sentando, e eu olho nos olhos dele. Ele não mais me
corresponde. Meu pai chegou, então voltei a ser a preciosidade de seu
amigo/irmão.
— Não se preocupe, ela tem a idade dos meus, sei lidar!!!
Ele diz isso sorrindo e sinto vontade de socar os dois.
— Tudo bem! A criança aqui, que tem idade para ser a filha de vocês, e que
não pode beijar na boca, veio até aqui para resolver um problema que os
adultos aí, deixaram passar batido! Vamos perder a propriedade do sul!
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Quero resolver isso antes de voltar para Nova York, pois não quero perder
dinheiro! Meu pai perde, eu perco!
Digo me levantando e ando de nariz em pé. Entrego o e-mail impresso para
Jon, e ele para pra ler o documento com curiosidade.
— Nunca deixei de pagar os impostos de nenhuma propriedade, nunca! Estão
todos em dia! — ele diz franzindo o cenho.
— Eu vim aqui para dizer que você está enganado!
Eu falo e ele me olha de uma forma esquisita. Eu levanto uma sobrancelha e
ouço meu pai rir da situação.
— Do que você está rindo???
Jon pergunta estressado e meu pai ri ainda mais.
— Ele está rindo da sua cara!!!
Eu digo séria e sinto que ainda não foi o suficiente. “Ela tem a idade dos
meus!” Tá.
— Pare de ser implicante, filha! — ele diz ainda rindo e encara Jon. — Jon só
viemos para saber como proceder. Não entendo nada disso, meu negócio são
aeronaves. Luiza que veio conversar contigo pra saber como resolver esse
problema, só a acompanhei para não deixá-la sozinha! — ele fala e Jon volta
seu olhar para o documento.
— Impossível! Eu paguei tudo, não é possível…
Jon se levanta, pega seu notebook na estante da TV, e começa a fazer
diversos downloads de comprovantes de pagamento. Ele abre alguns
procurando o comprovante certo, mas as datas que faltavam, são justamente
as datas dos boletos que “não foram pagos”.
— Eu disse! — eu resmungo e meu pai me lança um olhar matador.
— Vou resolver isso, viajo ainda essa noite! — Jon resmunga coçando a
cabeça, mas eu interrompo.
— Eu que vou! Vim aqui para isso! Vou até o sul!
— Ah! Mas não vai mesmo! — meu pai já diz.
— Ah! Pai, não começa! É uma viagem rápida! Não quer que eu continue
cuidando dos negócios da família, porque ninguém de casa dá conta!? Eu não
saí da chácara para vir até Pirassununga, à toa! Tô de férias, mas recebi as
cobranças dessas dívidas, lá em Nova York. Eu vou e pronto! Se não for isso,
passo a semana toda nos shoppings, bares e baladas com a Júlia e tia Nina,
para matar a saudade de Minas Gerais, e encontrar um “peguete” mineiro! —
eu falo e ele para pra pensar.
— Pai, eu ando em Nova York de cima a baixo, resmungando um inglês
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fluente como se eu fosse de casa. Posso muito bem, pegar um avião e ir até o
sul! Fico em casa, ou com minhas tias, ou em um hotel, resolvo tudo e volto.
E outra, você não pode ir, vai trabalhar! Não vou engravidar em um cartório
ou repartição pública. — eu digo e ele rosna.
— Tudo bem!!! Mas só se Jon puder ir junto! Sozinha você não vai! —
nossa, seu Max, obrigada!
— Não preciso de um guarda-costas! — eu falo fingindo bem.
— Eu não sou um guarda-costas! — Jon diz estressado, e olha para meu pai.
— Eu posso ir, sim!
— Por que não posso ir sozinha, só me diz??? — pergunto, mas a ideia de ir
com ‘Jon gostoso demais’, já tinha me conquistado.
— Porque eu não quero. Aceita que sou seu pai, Ana Luiza, eu mando e você
obedece, não o contrário. Você vai com Jon, ou não vai, é só decidir! Ele
pode te ajudar, é experiente, é a sua responsabilidade, e com ele por perto, me
sinto mais seguro! — ele diz e eu encaro o bonitão.
— Não é nada pessoal, tio! É só que estou cansada de ser tratada como
criança. Devia ter deixado a casa ir á leilão, e depois enviar uma cartinha para
ele, escrito: eu sabia!!! — eu falo e pego minha bolsa. — Já terminamos,
aqui? Quero ir embora, estou cansada! Ou nem isso posso? — resmungo e
viro as costas.
— O quê? Hum? Parar de resmungar? Claro que pode!!! — Meu pai quase
grita comigo, e volta a falar com Jon. Me aproximo de sua estante, olho tudo
“ignorando os dois”, e vendo as fotos que ele ainda guardava. — Jon, eu
espero que eu não esteja te pedindo muito, sei que trabalha muito, sei que
minha filha não está em uma fase muito boa e você terá que aturá-la, enfim,
se não puder ir, arrumo um jeito de resolver isso a distância! — ele diz e ouço
Jon dizer: — Já disse que vou, não vai me atrapalhar em nada. Tenho um
encarregado, posso ficar lá até resolver isso tudo, sem problema nenhum!
Afinal, foi irresponsabilidade minha!
— Que isso!!! Essas coisas acontecem. Aposto que vocês vão chegar lá, e
descobrir que está pago, e que foi um erro! — meu pai diz e os dois se
levantam.
— Se não aguentar ficar perto dela, coloque-a em um avião e a mande de
volta. Não precisa aturar. — meu pai diz e os dois dão risada.
— Dois engraçadinhos.
Se me deixasse namorar, eu tinha certeza que ficaria menos estressada, papi!
Penso.
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— Vamos indo! Vou ficar aqui no condomínio! Vou deixar você descansar!
Comprarei as passagens, as reservas, tudo! Nos vemos logo!
— OK. Até já! — ele diz e cumprimenta meu pai.
— Tchau, tio!
Eu me viro para dar ‘tchau’, quando meu pai já havia passado pela porta, e o
vejo me medir de cima a baixo, deixando seu olhar parar demoradamente em
meu traseiro! Eu falo sorrindo e ele responde um ‘tchau’ sem emoção
nenhuma, olhando para mim e parecendo envergonhado por ter sido pego no
flagra. Jon gostava do que via e lutava com o que estava sentindo. E essa não
é a pior parte. A pior parte é que eu amei o jeito que ele me olhou.

— Obedeça-o! — meu pai fala segurando meu rosto com as duas mãos. Ele
fez questão de nos trazer até o aeroporto, claro. — Jon, já sabe! Se ficar de
má-criação, coloque-a no primeiro voo para Belo Horizonte! Não quero
baladas e bebidas, não faça nada que você saiba que vai me decepcionar!!! —
ele termina e beija minha testa. — Tchau, até logo, amigo! Juízo hein, não
quero marmanjo paquerando minha princesa, se chegar perto, já sabe… e isso
te inclui!
Meu pai brinca com Jon e ele olha para meu pai querendo arrancar a sua
cabeça e morrendo de vergonha.
— Pirou, Max!? — Jon questiona baixo.
— Relaxa, estou tirando uma com tua cara! Cuida dela!!!
Meu pai zomba rindo de novo, e volta a se aproximar de mim, para me
abraçar de novo.
— Se cuida! Eu te amo!!!
— Também te amo, pai!
Eu digo e — sinto o olhar de Jon em cima de mim. — meu pai estranha!!!
— Você nunca me chama de pai!
— PAPAI! Vai embora, está me matando de vergonha com essa melação!!!
— eu o empurro, mas ele me agarra.
— Vai minha executiva favorita! Eu te amo, teamo, te amo, e te amo muito!
Tchau, Jon!
Meu pai se despede me enchendo de beijos e vira as costas, fico olhando ele
caminhar até seu tamanho ir diminuindo, e noto que por onde Max Converick
passava, pescoços femininos se viravam em sua direção. Era como se meu
pai tivesse um imã que atraíam as mulheres. E o mais interessante disso tudo,
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é que ele andava olhando pra frente, somente pra frente, não correspondeu o
olhar de nenhuma delas, jamais. E aquilo me fez sorrir!
— Precisamos ir, senhorita!
Jon me puxa para a terra novamente, e eu começo a andar, apenas pensando
no quanto minha mãe tinha a sorte de ser tão amada.
Jon e eu fizemos check-in, entramos na sala de espera do aeroporto de
Guarulhos e enquanto eu aguardava o voo mexendo em meu celular, Jon relia
página por página do e-mail que eu imprimi. Ele não conseguia entender o
que tinha acontecido. Eu o encarava curiosa enquanto ele parecia estar
quebrando a cabeça para encontrar aonde foi que ele errou, porque algo não
fazia o menor sentido. Eu só pensava em o quanto Jon era lindo, charmoso e
misterioso. Parecia o tipo de homem que guardava milhares de segredos.
— Precisa de alguma coisa, senhorita?
Ele pergunta olhando para as páginas. Me pegou no flagra sem nem olhar
para mim e eu devo ter ficado vermelha como um tomate.
— Preciso que pare de me chamar assim, tio!
— Então para de me chamar de tio!
— Sempre te chamei assim!
— Mas quero que pare!!!
— Por que??? Fiz algo de errado?
Eu questiono e Jon me olha parecendo não acreditar. Ele para um minuto
para pensar enquanto me fitava, e logo baixa os olhos para a papelada
novamente. Cinco minutos se passou, e a sala começava a encher, Jon notou
assim como eu, e me mandou trocar de lugar com ele. Me sentar na ponta, me
deixaria inacessível.
— Não precisa fazer tudo o que meu pai manda!!!
Obedeço-o emburrada, pois achei sua atitude infantil.
— Se eu fizesse tudo o que ele manda, a essa altura ele já saberia que você
tem um caso com um rapaz. Chris, vinte e dois anos, norte-americano. Um
estudante de finanças da sua turma!
Ele fala enquanto folheia algumas páginas dos boletos bancários. Minha
nossa, ele sabia de tudo. Óbvio que sabia.
— Por que ainda não contou pra ele?
Pergunto mas ele não me olha nos olhos quando responde.
— Porque não acho certo ele te colocar em um colégio-interno na Austrália,
só por causa de um namorico sem sentido e sem futuro nenhum!
Praticamente te vi crescer, meio que me importo com seu bem-estar. De
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nada! — ele diz todo arrogante.


— Quem te disse que é sem futuro? Sem sentido? Está completamente
enganado!
— Assim como sei tudo sobre sua vida em Nova York, sei a dele! É sem
futuro e sem sentido, sobrinha!!!
Ele diz com arrogância novamente e uma mágoa sem tamanho me atinge de
um jeito que não consigo explicar. Eu cresci ouvindo da capacidade absurda
de Jon, de conseguir o que queria. Saber da vida de uma pessoa, saber onde
ela está, seus podres, históricos médicos, e tudo o mais. Então uma das
dúvidas que estavam me matando no momento, era: O que Chris me
escondia? Deveria ser grave, já que Jon se baseava nisso ao dizer que nós
dois não tínhamos futuro nenhum juntos!
Paro de me remoer e olho no aparelho de telefone para ver se ele estava
online no chat. Não estava. Penso em ligar para um amigo em comum, mas
eu não era maníaca. Se Chris não estava online era porque estava ocupado e
pronto, não necessariamente me traía. Levanto-me e penso em fazer algo para
sair de perto dele e me distrair, mas não adiantou, assim que me levantei, Jon
fez o mesmo, e ficou o tempo todo atrás de mim, bancando o guarda-costas
que ele disse que não era. Ignorei e aproveitei para dar uma passada nas lojas
que tinham por ali para comprar algumas peças de roupas que pretendia
comprar em Porto Alegre mesmo, afinal nem mala eu tinha.
Chegou a hora do voo, embarcamos, encontramos nossos lugares, e Jon se
mantinha preocupado com a papelada. Não me atrevi a puxar assunto, nem
voltar a olhar pra ele. Jon nunca me daria bola, era completamente fiel ao
meu pai e a sua amizade com ele. E além do mais eu tinha Chris, precisava
me controlar, me comportar, e era isso o que eu faria! Ou pelo menos ia
tentar.
Desembarcamos em Porto Alegre, aeroporto Salgado Filho, uma hora e meia
depois. Já eram quase nove horas, no Brasil era difícil os horários serem fieis
ao que a gente esperava. De táxi, fomos ao hotel que meu pai escolheu,
localizado bem no centro, perto de tudo, e assim que pisamos no hall de
entrada, minha barriga já dava sinais de fome.
— Já que está tarde, é melhor descansar, sairemos amanhã bem cedo, e
depois de resolver tudo, partimos para Belo Horizonte.
Jon diz enquanto aguardava o recepcionista simpático fazer o check-in.
— Eu não sei você, mas vou sair pra jantar, tomar um drinque, conhecer
Porto Alegre, e só depois pensarei em descansar. — digo e o recepcionista
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sorri para meu comentário.


— Não. — Jon diz e eu ignoro.
— Você deve conhecer muitos lugares aqui… — paro para ler seu crachá e
continuo. — Tiago. Sabe de algum point bem maneiro???
Eu pergunto rindo, Jon fala ‘não’ olhando para Tiago novamente, e ele ignora
a cara feia de Jon, ao responder.
— Conheço até demais. Se quiser tenho uns flayers aqui. Também saio daqui
a pouco, já tenho um encontro marcado com alguns amigos, se quiser
companhia!!! — Tiago fala e eu amo a ideia.
— Já disse que não! — Jon diz para o menino, já surtando.
— Para de ser rabugento e vamos juntos, Jon! Meu pai não precisa ficar
sabendo! Você pode ir, ou ficar no hotel, de qualquer forma amanhã bem
cedo, estarei de pé para nosso compromisso.
Eu falo e ele faz ‘cara feia’. Pelo jeito eu ia ter que sair escondida.
Nossos quartos ficavam porta a porta. Claro que meu pai não deixaria nós
dois no mesmo quarto, ele confiava em Jon, mas já que Jon não era gay então
não era assim tão confiável. Entro no meu quarto, não paro para prestar
atenção na decoração luxuosa, e corro para tomar uma ducha rápida. Visto
um vestido curtinho preto que comprei no aeroporto, nada muito
extravagante, mas valorizada meu corpinho magro. Dei um jeito no cabelo,
usei a pouca maquiagem que sempre carregava comigo, e o telefone do
quarto toca assim que termino de me arrumar.
— Ei, é o Tiago! Tô na porta do hotel. Tá de pé? Tu vem?
— Claro que vou!!! Já estou pronta.
— Aquele cara, teu tio, sei lá... não vai brigar contigo?
— Acho que vai, mas vou sair escondida! — eu rio. — Já estou descendo.
— Demorou!
Desligo o telefone, pego minha bolsa e evito fazer barulho ao fechar a porta.
Pego o elevador, agradeço sorrindo ao fato de Jon não ter me visto sair, e
assim que entro na sala ao lado da recepção, que era meu caminho, dou de
cara com Jon sentado em um dos sofás e mexendo no celular.
— Vai a algum lugar? — ele pergunta assim que paro. Ele nem me olha ao
questionar.
— Sim, e já falei pra onde.
Eu digo e me adianto, mas quando vejo ele se levantar, eu paro de andar.
Simplesmente porque estava curiosa demais para saber o que ele ia fazer.
— Se quer ser tratada como adulta, aja como uma. Não serei seu babá, não
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tenho vocação para guarda-costas. Estou cansado e quero me deitar. Se você


não subir para teu quarto, ligarei para teu pai.
— Ligue então. Vamos ver o que ele vai poder fazer estando lá em Minas
Gerais!!! — eu digo e passo por ele.
Encontro Tiago parado na porta do hotel, e ao me ver ele sorri. Tiago era
gatinho, parecia ter minha idade, loiro dos olhos azuis, tinha minha altura, e
um estilo bem bacana. Parecia um cara legal.
— E ai!? — ele me cumprimenta e ganha um beijo meu no rosto.
— Para onde vamos?
— Para um barzinho aqui perto, você disse que queria jantar. Lá tem comida
sulista, petiscos, de tudo! E bem do lado, tem ‘A balada’! Você vai gostar.
Ele diz sorrindo e abre a porta do carro que estava estacionado pra mim. Eu
entro e fico agitada com a aventura. Naquele momento, muito provavelmente
Jon já ligava para meu pai, mas eu queria é mais! Só queria me divertir e
aquilo não era pecado.
Eu e Tiago encontramos seus amigos no barzinho, e ele foi me apresentando
para todos. Duas garotas e três rapazes que pareciam modelos. Conversamos
muito, bebemos todas, nos divertimos, e assim que fechamos a conta,
entramos em uma boate chama La Bamba, duas casas depois do bar. A rua
era lotada de bares e baladas, tinha muita gente nova, bonita, e a balada não
ficava por baixo. Era incrivelmente linda por dentro. Tinha um toque gótico,
a luz baixa, gárgulas, vitrais na parede, lustres de cristais… tudo muito
harmônico e charmoso! Escolhemos uma mesa, mas eu nem parei nela, fui
para a pista dançar assim que pisei lá dentro; apenas segurava meu drinque
sereiano que Tiago pediu para que eu experimentasse, e não queria parar de
dançar nunca mais. Estava tudo muito lindo e tudo muito maravilhoso.
— E aí, Ana… O que achou???
Tiago questiona no meu ouvido, depois que fui me sentar para descansar e
pedir mais um drinque.
— Achei maravilhoso, essa boate é linda!
— É mesmo, eu disse que você ia gostar! E dos meus amigos, tu gostou? O J.
já te quer, não para de olhar pra ti!
Ele diz e eu olho para J. O garoto me olhava no mesmo momento em que eu
olhei. Era gatinho, elegante, e pelo pouco que vi muito simpático, apesar de
não falar muito, mas eu estava “tranqüila”.
— Ele parece ótimo, é gato, simpático, mas eu estou “de boa”.
Eu digo e ele sorri demonstrando compreender.
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Uma música latina estilo zumba começa a tocar e eu já achava que estava
tempo demais sentada. Provavelmente amanhã mesmo eu iria embora, então
deveria aproveitar cada minuto daquele momento. Porque eu era assim,
sempre fui. Então decido chamar J. para uma dança, já que ele não teria um
pouco de Lulu naquela noite, eu daria a ele aquela música latina maravilhosa.
Eu convido e ele aceita na hora.
J. Podia ser todo bom, bonito, cheiroso, simpático, mas se controlar na hora
dança, não era seu forte. Eu dançava em sua frente e ele não conseguia me
acompanhar muito bem, só ficava me olhando como se tivesse hipnotizado, e
às vezes passava sua mão em meu corpo como se quisesse ter certeza de que
eu era real. Me viro para dançar de costas pra ele, encosto as minhas costas
em seu peito e sinto seu músculo crescer no meu bumbum. Bom, o ruim seria
se não acontecesse nada, não é mesmo!? Ignoro o fato, continuo dançando, e
o rosto de Jon aparece quando fecho os olhos para deixar aquela música me
levar. Me pergunto o porquê não era Chris que invadia de meus pensamentos
e sorrio já sabendo a resposta. Assim que abro os olhos vejo Jon na minha
frente. A bebida já começava a me deixar estragada. Toco seu peito enquanto
rebolava no músculo duro de J. e noto que o armário em minha frente era
real.
— Se não se importa, vou trocar o meu par por um momento…
Me viro, falo em seu ouvido e J. concorda. Ele sai da pista, caminhando em
direção a mesa e eu me viro novamente. Jon estava parado feito uma estátua
no meio da pista de dança. E a parte em que eu me esfrego em J. para
provocá-lo? Pelo jeito não ia ter. Essa minha vida, em nada parecia um filme,
ou uma história típica dos livros de romances.
— O que faz aqui? Achei que não era babá, tio! — digo em seu ouvido e ele
só fica me encarando parecendo bravo. — Por que não veio quando eu te
convidei? Quando te convida, perde a graça pra você, não é? É um caçador
nato, não é, Jon??? Me deixou fugir na frente, só para ter o prazer de me
rastrear.
Eu sussurrei em seu ouvido e pelo jeito parecia que eu tinha adivinhado o seu
segredo obscuro, pois Jon afastou seu corpo do meu para eu não ver a reação
que eu causei ao falar aquilo — mas eu podia ver o quanto tinha ficado
enorme. —, e muda de assunto na mesma hora.
— Vamos embora. — ele diz e segura meu braço.
— Só depois de uma dança!!!
Me solto dele e agarro seu pescoço. Graças ao salto que eu usava, não ficava
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muito mais baixa que ele. Eu podia olhar em seus olhos, beijar seu pescoço, e
rebolar no ponto certo livremente. Jon também não se mexia, não dançava,
mas ao contrário de J. também não me tocava. Então peguei suas mãos e
comecei a passar pelo meu próprio corpo, enquanto me esfregava
deliciosamente nele. Eu achava que tava ficando maluca, mas parecia que Jon
tinha uma bela vocação para ser estátua. Meus beijos leves em seu pescoço, e
no canto de sua boca, meu bumbum no seu volume enorme, e minhas frases
sujas ao pé do ouvido, não o fizeram se mexer. Jon não esboçava nenhuma
reação.
— Você não me quer, tio? — pergunto e olho em seus olhos.
— Não. Nem agora, e nem nunca. — ele diz e sinto minha garganta se fechar.
— Isso aqui, diz o contrário!
Toco com vontade seu músculo enorme, fazendo movimentos sugestivos, e
ele faz cara de paisagem.
— Isso aí fica desse jeito até pelas minhas próprias mãos. Não faz diferença,
foi feito para ficar duro, não se sinta tão importante. Eu não quero você,
criança! — ele diz e me sinto um lixo.
— Bom, acho que é só você então!
Eu digo, e já ia atrás de J., mas ele me segura, e bem na hora a música acaba
e começa outra.
— Acabou a sua dança, seu vexame. Vamos embora. Você está bêbada.
— Não vou embora.
— Vamos ver.
Ele me puxa para fora da pista e eu me solto dele com grosseria.
— EU NÃO VOU!
Eu grito e ele revira os olhos. Ele vai até a mesa em que eu estava sentada,
pega minha bolsa, e se retira da balada. Obviamente não ia ficar sem meus
documentos na rua, então o sigo e puxo a bolsa de suas mãos. Só eu ali
parecia uma criança birrenta, Jon era o homem adulto, gostoso e cheio de
juízo que não me queria, e não ia me dar bola.
O táxi parou ao seu sinal, ele abriu a porta para mim sem falar nada, e eu
entrei. Fizemos todo o caminho até o hotel sem dizer nada um para o outro.
Só senti o peso de tudo o que bebi quando cheguei, eu estava tonta e enjoada.
Quando ele notou, me segurou pela cintura, e me levou até o elevador. Seu
cheiro era espetacular, sua voz, seu corpo, suas mãos grandes em minha
cintura… Eu queria Jon, ali mesmo, no elevador, e mesmo bêbada. Eu olhava
pra ele, mas apesar de estar com meu corpo todo colado nele, ele me ignorava
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como se eu fosse nada, e nem ninguém que valesse seu tempo. Encosto
minha cabeça em seu peito e lamento sua atitude, o desprezo dele me fazia
sentir uma dor fora do normal. Não sei se porque eu não estava acostumada a
levar foras, ou porque estava alterada demais.
— Vá tomar um banho frio! Vou buscar um café preto, forte. — ele diz
quando me solta dentro de meu quarto.
— Não quero tomar banho, só quero dormir. — eu me jogo na cama.
— Vá tomar um banho frio, menina!
Ele repete me fazendo levantar e praticamente me arrasta até o box do
banheiro. Olho em seus olhos com um ódio profundo e na mesma hora ele
liga o chuveiro frio. Quase levo um choque térmico, a sensação era horrível.
Meus banhos sempre foram quentes, odiava me molhar em água fria, e para
se ter uma ideia, piscina era raro… naquele momento grito de frustração pela
agonia, pelo vestido e o sapato que ficaram molhados e podia jurar que uma
brecha de puro humor, passou pela sua face ao me ver daquele jeito. Decido
acabar com sua graça, e abro o zíper do vestido, ficando nua. Ele percebe o
que eu fazia, e de novo, trata a minha atitude como se fosse patética. Jon me
mede só de calcinha — aquele vestido não dava para usar com sutiã. — de
cima a baixo, lentamente, e quando seus olhos chegam aos meus, ele me fita
por alguns segundos e me dá as costas. Era isso, Jon além de me desprezar,
queria me tirar do sério. Ele parecia me achar pouco pra ele, inferior, uma
qualquer, e eu também achava que temia por minha pouca idade, e por meu
pai. O que Jon tinha de gostoso, tinha de covarde.
Tomo o banho chorando de agonia, me seco, me troco, seco meu cabelo, e
me afundo nos travesseiros da cama, me lamentando e chorando por algum
motivo desconhecido. Era o álcool. Em pouco tempo Jon volta e me estende a
xícara de café. Eu pego e ele fica parado ao lado na cama me olhando beber.
— Eu posso beber o café sem precisar de uma babá, tio. Você já pode ir!
Eu digo, ele vai, e eu fico mal porque ele foi. Dou risada da minha
bipolaridade, e me deito ao terminar o café. Me afundo no travesseiro
pensando nele, no seu olhar, em tudo o que aconteceu, e adormeço.

Acordo com alguém batendo na porta. Eram seis da manhã.


— Pra que tão cedo? — resmungo e vou abrir a porta. Era Jon. O caçador.
— Você está atrasada.
— Você disse ‘amanhã bem cedo’, não ‘amanhã às seis’!
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Eu digo e bato a porta em sua cara.


Me arrumo, coloco uma roupa social porque sou dessas, e saio. Eu podia
apostar que ele me esperava na recepção e lá estava ele. Nem esperei, passei
pela sala e continuei andando até a porta de saída do hotel. Faço um táxi
parar, aguardo até ele abrir a porta, e entro como se eu fosse a rainha do
mundo. Se ele queria brincar de desprezo eu faria isso. Ia ser divertido,
mesmo porque não ia ficar enchendo sua moral quando tudo o que ele queria
era que eu parasse com aquilo. Então eu ia parar. Paramos em uma padaria no
caminho, tomamos café em um silêncio constrangedor, e partimos para a
prefeitura.
Chego na recepção, pergunto pelos responsáveis que poderiam me ajudar em
um caso como aquele, e a recepcionista me ensina o caminho do escritório
que eu precisava ir.
— Olá, Me chamo Ana Luiza Coverick, e este é Jonatas, meu funcionário!
Digo estendendo a mão para cumprimentar o funcionário público que atende
a porta, e ele sorri para mim me convidando para entrar. Enquanto ele
cumprimenta Jon, eu olho ao redor, o rapaz vivia em uma bagunça que se
chamava escritório.
— Sou Sílas, senhorita Ana Luiza. Em que posso te ajudar?
Ele fala e seu olhar escapa para meu decote. Nesse momento, Jon se mexe
desconfortável em sua cadeira.
— Gostaria de saber se consegue identificar os pagamentos desses impostos.
Eu posso jurar que meu funcionário efetuou o pagamento deles, antes do
vencimento, mas acho que perdemos o comprovante! Poderia me ajudar?
Eu entrego os documentos e ele dá a volta em sua mesa.
— É claro. Sente-se, fique à vontade!
Sílas começa a mexer em seu computador, e eu me sento. Jon se senta ao meu
lado e mesmo sem olhar para ele, posso ver que me encarava, não sei porquê!
— Bom... esses boletos não foram pagos! — Sílas diz, e eu suspiro.
— Desculpe a pergunta e a inconveniência, mas, tem certeza?
— Desculpe a pergunta indelicada mas, quantos anos a senhorita tem?
Ele fala e antes deu responder, é Jon quem fala.
— A resposta para essa pergunta pode nos ajudar com o problema do imposto
que não foi pago???
— Não, é só curiosidade…
— Então eu acho que não tem porquê… Vamos direto ao assunto…
— Eu tenho dezoito. Como podemos pagar por isso, e evitar que nossa
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propriedade seja leiloada pela prefeitura, Sílas?


Eu corto a fala de Jon, e deixo Sílas impressionado e sem graça.
— Bom, se eles não estivessem tão atrasados, eu poderia apenas fazer dois
novos boletos, mas vou ter que atualizar o seu cadastro, e terão que pagar
imediatamente. Não pode ser via boleto, você terá que pagar aqui mesmo, na
prefeitura. Dê-me um minuto, por favor. É um pouco burocrático. Com
licença. — Sílas diz e se retira.
— Poderia não me interromper novamente? — Jon questiona em voz baixa.
— É só não se intrometer. Você só veio até aqui, como meu guarda-costas.
Deixa que eu limpo a bagunça que você fez.
Eu digo e ele não fala mais nada. Resolvo toda a burocracia sozinha, ficamos
naquele inferno por mais de três horas, e eu já estava mais do que estressada.
No caminho para o hotel, Jon parecia tão estressado quanto eu, mas tinha
algo a mais, estava mais do que estressado, parecia estar aborrecido com
alguma coisa.
— Quer ir almoçar antes de ir para o aeroporto? — ele pergunta enquanto eu
destrancava a porta do quarto.
— Vou descansar agora, depois vou almoçar sozinha. Quando eu quiser ir
para o aeroporto, eu te mando uma mensagem e você providencia as
passagens. — eu falo e me assusto quando ele invade meu espaço pessoal.
Imediatamente minhas costas batem na porta e ele parece prestes a me
engolir.
— Não me trate como seu empregado, só porque te dei um fora.
— Você é o cara mais covarde que já conheci, Jon, o caçador.
Eu resmungo olhando para sua boca e entro no quarto. Ele me segue.
— Está revoltada, mas eu não posso fazer nada. Não fico com você porque
tenho medo, não fico porque não quero! Você não me desperta interesse.
Eu coloco minha bolsa na cama e caminho até ficar em sua frente.
— Então por que foi atrás de mim na boate? Deixou eu me esfregar em você,
cuidou de mim quando eu estava bêbada, deu um esporro no funcionário
público que ficou interessado em meus seios fartos, e agora, ao invés de
continuar me ignorando, está aqui, dentro do meu quarto, duro como rocha, e
olhando para a minha boca enquanto falo. Talvez esteja se perguntando o que
meu pai vai dizer se um dia ele descobrir que você estava louco para comer a
princesinha dele. Ou deve estar com medo de acabar virando a sua caça,
acabar morto pelo assassino Max, o militar que é capaz de matar qualquer um
que tente prejudicar sua família, ou principalmente sua única filha. Ou
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melhor, talvez não tenha medo de nada disso, ficou se segurando e se


controlando desde que chegamos aqui… talvez seu medo seja somente,
acabar gostando. Vejo o jeito que me olha, tio, eu sei que você me quer. —
coloco minha mão em sua nuca e ele não se afasta. — Não tenha medo não,
não passe vontade. Sei que foi dormir me querendo ontem. Sei que viu o dia
amanhecer porque não conseguiu tirar a cena do banheiro de sua cabeça.
Vem cá, Jon…
Puxo-o para se sentar na cama, subo em seu colo, e antes dele se arrepender
eu já estava o beijando. Enfio minha língua toda em sua boca e tiro toda a
minha roupa ao mesmo tempo. Antes que eu continuasse mantendo o
controle da situação, ele me joga na cama com selvageria, pula todo o
protocolo “padrão” de sexo, e abre minhas pernas para me chupar. Minha
nossa. Jon tinha uma boca habilidosa demais, ele lambia e me sugava com
força parecendo ter pressa, muita pressa. Ter começado primeiro me
chupando, dava a impressão que era a parte mais urgente; que ele queria
aquilo fazia um bom tempo, e eu entendi, amei aquilo. Minha cintura chegava
a desencostar da cama quando ele a agarrou com as duas mãos, e enterrou
ainda mais a sua cabeça no meio de minhas pernas. A sensação era surreal,
Jon estava maluco, sua boca com a língua ousada, sua barba arranhando
minha virilha, suas mãos fortes deixando minha cintura marcada pela força
excessiva, e seus gemidos de homem das cavernas misturados aos meus
gemidos finos e baixinhos, faziam toda aquela situação extremamente
gostosa, ser melhor que cena de filme pornô. Eu poderia filmar só para ficar
revendo depois. Era a fera devorando a bela, o ogro sugando tudo o que a
princesa delicada tinha. Era o caçador se alimentando da presa.
Quando aquela sensação única veio, gozei em sua boca e ele chupou tudo,
mas não parou. Me chupou de quatro, de pernas pra cima, em pé e com ele
ajoelhado como se estivesse me adorando... me sugou e me virou do avesso.
Enquanto via estrelas e imaginava que seria a sua vez de se aliviar me
fodendo com força, o vi se sentar limpando os cantos da boca com a cabeça
baixa, como se tivesse lamentando. Junto todas as minhas forças, e vou até
ele. Eu estava no céu, ele parecia estar vivendo em um inferno interno.
— Ei… porque parou, tio!? É a sua vez. Vem cá.
Tento puxá-lo, mas ele tira a minha mão de sua blusa. Foi com delicadeza,
mas não deixou de ser grosseira a sua atitude.
— O que foi?
— Não posso fazer isso. Não devia ter feito isso! — ele resmunga e se
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levanta.
— Ah! Qual é!? Arrependido agora?
— Me desculpa.
— NÃO. Não desculpo, começou termina! Seu erro não será menor se parar
por aqui. Eu te quero, você me quer, então vamos em frente. — eu me
levanto e me encosto na porta, barrando a sua passagem. Grudo em seu
pescoço, e o beijo implorando por mais. — Falta a parte principal, por favor,
não faça isso! Fique. Quero você desde que te vi em Pirassununga. Não
estamos cometendo nenhum erro aqui, sou maior, sou independente, posso
sobreviver se meu pai ficar bravinho, e de qualquer forma, não pretendo
contar! Seja meu por esta tarde, tio! Termine o que começou. Por favor!
Eu imploro sentindo meu gosto em sua boca, e empurrando minha parte
íntima na direção de seu músculo ainda mais duro do que nunca. Mas de
repente, ele me afasta com grosseria, e consegue abrir a porta, demonstrando
irritação, como se eu tivesse o ofendido com alguma coisa que eu disse. E
para piorar toda aquela minha situação lamentável, antes de sair, e me deixar
lá sozinha e machucada, ele diz: — Você foi um erro. Isso aqui foi erro. Não
vale a pena perder uma amizade de anos por uma hora ou mais, com você.
Esqueça o que houve aqui, ou você vai acabar em um colégio interno na
Austrália com a minha ajuda. Não se aproxime mais de mim.
Ele me diz sem me olhar nos olhos, sai batendo a porta, e me deixa
completamente sozinha, perdida e humilhada.

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26
PAI, MARIDO E IRMÃO

— Por que mentiu?


Chego em casa e questiono Julia. Não preciso de muito para entrar em
detalhes, ela sabia do que eu falava.
— Só precisava de um tempo. Queria saber se viria atrás de mim. Mas já vi
que não vai ser fácil, manter nosso casamento será um trabalho solo.
Ela fala tirando a farda que vestia. Fica nua em minha frente e eu me assusto
quando noto que ela não me apetece mais. Sento-me na cama e começo a me
despir, precisava de um banho, e descansar um pouco.
— Não vamos ficar juntos por muito tempo se permanecer fazendo isso.
Eu falo e ela me faz parar de tirar a roupa, senta no meu colo, e segura meu
rosto com suas duas mãos.
— Não sou de ficar com homem que me despreza, homem que me beija
pensando em outra, mas eu amo você! Acho melhor você focar em nós, focar
em nossa vida, cuidar dos assuntos de sua filha, assumir suas
responsabilidades de pai, e de meu marido. Aquela mulher não te quer mais,
pelo anel enorme em seu dedo, ela vai casar. Por tudo o que me contou, ficou
claro que acabou para vocês dois então pensa bem. Sempre estive do seu
lado, sempre estive aqui, sempre fomos parceiros, e eu tô disposta a enterrar
sua declaração de amor eterno por ela. Você é meu, cuido de você e de nossa
felicidade há anos, não cabe uma terceira pessoa aqui, não posso deixar isso
acontecer. Eu sou sua realidade, sou o que você tem. Deixe sua ex-mulher
viver a vida dela, e viva a tua, vocês tem uma filha linda e posso aceitar isso,
posso conviver com isso, conseguirei dormir a noite. Mas vou lutar por você,
vamos nos casar na igreja e no papel, como mereço, e nada vai te faltar, nem
na vida e nem em nossa cama. Se você fosse um moleque no auge dos seus
dezoito, eu mesma te ajudaria a reconquistá-la, a lutar por esse amor, a viver
esse romance, mas você já está entrando na casa dos quarenta, aceite que
acabou e aproveite o que tirou disso, uma linda criança e uma madrasta
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bondosa e gentil. Aja como homem e me respeite, respeite o que temos, os


anos que me dediquei a você, respeite a história que tem comigo, e dê um
jeito de corresponder esse amor que eu te ofereço, porque pela atitude que
teve comigo, no fundo nem o meu amor você merece.
Ela desabafa olhando nos meus olhos, chupa a minha boca, alisando minhas
partes íntimas, e se levanta para ir até o banheiro. Eu não falo nada, pois
estava pasmo com sua atitude, e não queria começar uma guerra. O seu
discurso poderia funcionar a alguns dias atrás, sem Ellen aqui, mas com ela
de volta, enquanto ela estivesse na minha vida, de forma alguma eu pensaria
em me casar, ou viver uma vida com outra pessoa, de jeito nenhum. Nunca.
De forma alguma.
— Oi, meu bebê!!! Veio procurar colinho???
Minha mãe questiona na sala, ela e dona Jô conversavam e assistiam TV. Saí
de casa enquanto Julia tomava banho, e só me troquei, precisava pensar,
esfriar a cabeça, me distrair…
— Na verdade não, mas isso também é bom! Oi, vovó!!! Cadê meu pai?
Falo e as duas ganham um abraço e um beijo meu.
— Me ligou dizendo que chega mais tarde. Deixou Lulu e Jon no aeroporto
em São Paulo, e está voltando pra casa. — minha mãe diz e eu me sento no
sofá.
— Para onde os dois foram?
— Para Porto Alegre resolver um problema com uma propriedade nossa.
Lulu disse que podemos perdê-la, que pode ser leiloada!
— Mas meu pai a deixou ir sozinha com Jon?
— Deixou Tay! O que tem isso?
Minha mãe questiona sorrindo e eu acho isso muito estranho.
— Ele é tão ciumento e a coloca nas mãos de um marmanjo!?
— Jon é confiável, não é um marmanjo, é um homem de família e respeita a
nossa! Se seu pai confia nele, eu também confio! — ela diz e minha vó
concorda.
— Jon é um rapaz de bom coração, nunca faria nada que não fosse o correto.
Seu avô era doido por ele!
— É vovó, mas eu não confio em homem nenhum. — eu resmungo e minha
mãe sorri.
— Tá bom, Max júnior. Relaxa, Lulu está em boas mãos.
Ela diz e decido ficar calado. Mas que eu achava essa “dos dois viajar
juntos”, muito estranho… Ah! Eu achava…
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— Vou me deitar um pouco. Julia está impossível. Vou pensar se volto ou


não para casa…
Falo me retirando, as duas ganham mais beijos, e sorriem pra mim.
— Quer que eu te leve algo pra comer, bebê da mãe? Está com fome?
Minha mãe pergunta e dona Jô diz que estou magro demais.
— Agradeceria muito minha rainha linda! Estou faminto.
Eu falo e ela logo se levanta indo em direção a cozinha. Eu começo a seguir
meu caminho, mas minha vó me chama.
— Que foi, velha gata?
— Senta aqui, um minuto… — eu me sento e ela pega em minha mão.
— As coisas que aconteceram entre você e seu avô, foram muito tristes, eu
sei, mas tenho certeza que ele ficaria muito feliz se você tivesse o seu
merecido final feliz. Acha mesmo que é com essa mulher, que você terá a
felicidade que merece? — ela solta na lata e meu coração se espreme.
— Julia me disse uma coisa interessante hoje, vovó. Nem o amor dela eu
mereço… acho que devo ficar sozinho, ter um final pelo menos ‘Bom’,
sozinho.
Eu digo, a abraço apertado, e subo. Deito-me na cama e tento não pensar em
nada, mas minha pequena princesa invade meus pensamentos. Ela e sua mãe.
Meus dois grandes amores. Como se não bastasse todos aqueles últimos dias
agitados, as pessoas batem na porta e entram em meu quarto, as minhas duas
paixões.
— Oi! — eu exclamo feliz me sentando na cama.
— Oi, Tay! — Catarina diz, se senta na cama, e me encara como se não
soubesse o que dizer.— Eu acho, que vou ficar uns dias aqui…— ela diz e eu
olho para Ellen.
— Preciso viajar e minha mãe estará muito ocupada com os cuidados a
Ritinha. Queria uma oportunidade para ser pai. Conseguiu!
Ela diz parecendo querer estar em qualquer lugar, fazendo qualquer outra
coisa, menos ali, me pedindo aquilo.
— É claro que cuido dela, será um prazer, eu vou amar!
— Devemos ter umas coisas… — Cat começa a dizer e estende a mãozinha
para Ellen. Ellen revira os olhos sorrindo, e entrega para ela um caderninho
pequeno com a estampa da Barbie. —... umas coisas que você terá que fazer
para uma princesa. Porque as princesas são bem tatadas…— ela diz e eu fico
aguardando pacientemente.
— Isso aqui… — sua lista é feita de desenhos e não palavras — é você me
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levando para o shopping, aqui uma Barbie na caixa, essa é eu andando de


cavalo, esse é você lendo um livro para eu ir dormir, e isso aqui é um parque
de diversões!!!
Ela diz, olha pra mim, depois pra sua mãe, e não entende o porquê eu não
respondia nada. Era porque eu não conseguia. A vontade de chorar era
gigante.
— Eu… — pigarreio. — Claro, faremos tudo o que está na sua lista!
— O que mais, filha?
Ellen a faz prosseguir, e Catarina abre o caderno novamente, só que em outra
página.
— Esses são meus remédios para alergia, minha vitamina, a hora de dormir e
a hora de acordar…— ela vai falando e eu seco os meus olhos.
— Porque você tá chorando? Quer que eu vá com a mamãe?
Ela questiona preocupada e eu trato de desfazer o mal entendido.
— Esse choro é de felicidade, porque estou feliz por cuidar de você por esses
dias. É muita felicidade por te ter aqui comigo. — eu sorrio pra ela e ela diz
que entendeu. — Por que você não vai mostrar sua lista para a vovó para ela
poder me ajudar caso eu esqueça de algum detalhe da nossa agenda de
compromissos??? — eu questiono e ela se levanta.
— Está bem.
Ela pega as suas coisas, sua mochila, a agenda e sai do quarto.
— Foi ideia sua?
Eu questiono e Ellen faz a sua cara de paisagem cruzando os braços.
— Foi. Eu disse que ela podia pedir o que quisesse, se colocasse muita
diversão, nem ia ver o tempo passar e logo eu estaria de volta! Vai fazer tudo
o que ela pedir, comprar tudo o que ela quiser, vai mimá-la o máximo que
conseguir para minha falta não ser tão sentida, e se ela quiser falar comigo,
não importa a hora que for, você vai me ligar! Vocês ficarão aqui, não é sua
mãe que vai cuidar dela, é você, e não quero aquela mulher perto dela. Não a
conheço, não sei se pode descontar suas frustrações em minha filha, então a
quero longe!!!
Ela joga as suas ordens para cima de mim e eu me levanto. Me aproximo dela
e ela dá um passo apra trás demonstrando nervosismo.
— Está dizendo que para cuidar de minha filha, preciso deixar minha mulher
em casa, sozinha? — eu estava pouco me fodendo para tudo aquilo, só queria
saber da minha filha, mas eu queria jogar e ver qual era a dela. — Foi isso
mesmo o que eu entendi? — eu vou me aproximando e ela vai se afastando.
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— É exatamente isso.
Ela diz sem nem hesitar. Era um teste. Fez um teste que sabia que eu passaria.
— Entendi.
— Qual vai ser?
— Ficarei aqui, cuidarei dela aqui, como você ordena.
Eu digo olhando para sua boca, e daria qualquer coisa para beijá-la. Qualquer
coisa mesmo.
— Se eu chegar e ela estiver com um arranhão, mato você!
— Vou cuidar bem dela, vou protegê-la. Eu a amo. — eu respiro fundo. — E
amo você.
— Você não ama ninguém. Só você mesmo!!!
— Eu te amo. Te amo muito.
Ela encosta as costas na parede e eu fecho suas possíveis saídas com os
braços.
— Não me importo.
— Diga que me ama também! Diga e agente faz amor na minha cama, para
relembrar os velhos tempos. Eu bagunço toda a minha vida, só para organizar
do jeito que deveria ser, com você e com nossa filha. Passo o resto dos meus
dias cuidando de vocês duas e te dando amor. Corro atrás do tempo perdido,
e largo tudo só para corrigir tudo o que fiz de errado, e me dedicar para te
reconquistar cada vez mais, todos os dias, pra sempre. — eu imploro e ela
toca meu rosto.
— Eu não tenho mais interesse em você. Se me ama, me deixe em paz. Eu
amo o Yan, ele é o melhor para mim e você não significa mais nada.
— É!? E daqui a alguns anos vai jogar na minha cara que eu mereço tudo de
ruim, porque quando tentei, você me disse essas coisas e eu desisti fácil
demais?
— Três tentativas é burrice. Yan é melhor que você em tudo, e é por isso que
estou indo pro sul, vou buscá-lo. Vou me casar, vou ser feliz, e você vai
receber o convite do meu casamento em primeira mão! Se aceitar pode até ser
padrinho, quero que participe de minha felicidade. Quero que veja o que
perdeu.
Ela diz e eu me afasto. Por um momento ela parece insegura, mas depois se
recompõe.
— Fez alguma lista daqueles remédios? De todas as suas regras sobre a rotina
dela?
Eu pergunto de repente, mudando de assunto, e ela gagueja ao responder que
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sim.
— Então me dá, quero ver.
Eu digo, ela tira o papel da bolsa, e me entrega.
— Tá ok. Tem algo que preciso saber? Ou está tudo aqui?
Pergunto dando uma olhada na lista extensa e ela fala depois de pigarrear.
— Creio que já disse tudo, mas qualquer coisa ligo pra cá.. Apenas faça o que
está aí.
— Certo. Tchau.
Eu falo, continuo olhando pro papel, e me sento na cama para ler direito. Ou
Catarina tinha uma rotina extremamente regrada, ou Ellen só queria me
provocar. A lista, — tirando seus remédios para a alergia, e com a saúde dela
eu não ia brincar. — era um pé no saco. Uma chatice só. Sinto um
formigamento na nuca, levanto meu olhar e vejo que Ellen continuava ali.
Por que ela continuava ali???
— Precisa de mais alguma coisa?
— Cuide dela. Não deixe que ninguém machuque nossa filha!
Ela sussurra como se não quisesse que ninguém escutasse aquilo, seus olhos
se enchem de lágrimas, minha garganta se fecha, e eu me aproximo dela.
— Eu sou capaz de matar quem tentar. Não precisa nem conseguir, só pensar
nisso ou planejar já será o suficiente. Seja quem for, não importa como…
mato quem tentar fazer minha filha sofrer, e faço o mesmo por você. Seu
noivo está vivo porque Catarina o ama, e você o ama. Vou passar por isso,
vou aguentar, sobreviverei. Enquanto ele te fizer feliz, e tratar minha filha
bem, ficará vivo. Pode ir atrás dele, casar se quiser, aceito o convite de
casamento também, vou amar te ver de branco, e feliz, mesmo não sendo
comigo. Mas se um dia eu te ver chorando e suspeitar que o motivo é ele, eu
o mato, coloco fogo em seu corpo, e me livro do rastro como fiz com Juliano,
e com Pedro, só por pensarem em te fazer mal.
Eu digo enxugando suas lágrimas com os polegares, e me afasto para abrir a
porta. Ela caminha devagar, passa por mim, me olha nos olhos, e se retira.
Depois que fecho a porta, eu fico com minha dor, e todo o amor que eu sentia
sozinho. Eu sei que vou amar aquela mulher pra sempre.
Desço para a cozinha porque acho que minha mãe tinha se esquecido da
minha comida, e Catarina foi, mas não voltou. Encontro as duas conversando
na mesa e dona Fátima cozinhando algo que pelo cheiro, parecia muito
gostoso.
— Oi, e aí!? O que a vovó achou da sua lista?
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Pergunto e Catarina que estava debruçada na mesa, sorri e olha pra ela.
— Acho que ela gostou. Mas mudamos umas coisas, ela me mandou pedir
mais uma Barbie na caixa, por dia! — ela diz e minha mãe ri.
— Acho que vou falir, certo!?
— Certo!!!
Ela diz rindo e eu nem tinha certeza se ela sabia qual era o significado de
“falir”.
— Bom, você já jantou não é!? — eu pergunto e ela para pra pensar.
— Já, mas a tia Fátima disse que está fazendo um lanche da noite…
— Pois então vamos comer que eu também estou com fome, e aí você vai pra
cama! Pelo o que está escrito na sua rotina, você está atrasada para dormir,
faz uma hora… — eu digo e ela para de me olhar para fitar as próprias
mãozinhas.
— Vou gostar de você se me deixar ir ver desenhos antes de ir dormir…
Mamãe não deixa sempre. — ela fala e minha mãe ri da situação.
— Mas eu acho que se eu deixar, sua mãe não vai gostar nada, nada de mim!
— Mas você prefere minha mãe, ou eu?
Ela questiona olhando para o seu desenho e eu vejo uma mini-Ellen
manipuladora na minha frente.
— Bom, eu prefiro você, é claro! — eu sorrio e ela me olha contente.
— Então, tá.
Ela diz baixinho e minha mãe e dona Fátima riem alto. Ficamos ali até os
lanches saírem. Comemos, conversamos, ouvimos as pérolas que Catarina
dizia, e logo a fiz escovar os dentes, tomar seu remédio, e ir pra cama.
Quando eu já estava na porta ela me chama, eu tinha esquecido que precisava
contar as tais histórias para ela dormir. Eu ri disso, voltei, peguei seu livro de
contos em sua mochila, e li a história da Bela Adormecida. Era a história que
ela queria. Li por várias vezes e nada dela dormir, deu meia-noite e nada…
— Você não dorme nunca? — eu pergunto cansado tocando seu cabelo
amarelado.
— Tô com saudade da minha mãe! — ela fala e levanta para ficar sentada.
— Ela volta logo. Amanhã vamos fazer tantas coisas juntos que você nem vai
notar a demora. Logo ela estará aqui.
— Tá. — ela diz e deita de barriga pra cima.
— Eu te amo muito, sabia??? — eu falo e ela me encara.
— Sabia.
— Como você sabia?
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— Mamãe contou!
— E o que mais ela contou?
— Que você ia cuidar de mim, e me proteger!
— Ela está certíssima, vou cuidar de você e te proteger. Também vou cuidar
dela e protegê-la.
— Meu papai cuida dela.
— Mas eu também vou cuidar, e seremos dois. Quanto mais, melhor, não é?
— É. — ela para de falar e depois recomeça. — Pode deixar o abajur aceso,
quando eu dormir?
— Claro que posso.
Eu digo e ela fecha os olhos. Fico olhando ela dormir e meia hora depois eu
me levanto e ando devagar para não fazer barulho.
— Eu ainda tô acordada!!!
Ela diz emburrada e dou risada. Sento-me no pé da cama e ela me pede a
mão, que era para ela saber que eu não ia sair de lá. Fico sentado segurando
sua mãozinha por horas e quando vejo que ela realmente dormiu não consigo
sair. Deito-me ao seu lado e adormeço de mãos dadas com minha princesa.
Acordo com minha mãe me chacoalhando em silêncio e sorrindo para a cena.
Eu estava todo torto na cama, deitado de bruços e ela também. Mas eu estava
até de sapatos.
— Até tirei uma foto, mandei pra Ellen… olha que lindo!!!
Minha mãe resmunga sorrindo e mexendo no celular. Que vexame. Me
levanto devagar para não acordá-la e começo meu dia com o pé direito.
— Quer ir comprar a Barbie depois do almoço?
Pergunto para Catarina que tomava seu café da manhã na sala de jantar. Seu
café de princesa, como ela mesma dizia.
— Quantas Barbie's?
— Quantas quiser.
— Presta atenção nisso, depois vira uma mini-Lulu, aí você tem que fazer
hora extra para bancar todo o gasto!!!
Meu pai aparece de repente, dá bom dia para todos, beija minha mãe, os
gêmeos e Catarina, e se senta. Nesse mesmo momento Catarina diz que já
terminou seu café e pede para ir brincar na sala, eu dou permissão e as
crianças correm. Na mesa só fica Rafa, Nina, dona Hella, vovó, meu pai, e
eu.
— O que houve com o carro? — minha mãe logo questiona.
— Furou os quatro pneus de uma vez só, sorte que estava na frente de um
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hotel…
— Sorte, não é!? — minha mãe parece brava. — Vê se eu posso, nessa altura
do campeonato, “pneu furando, hotel por perto...” Se eu desconfiar te capo
nos dentes. – ela diz baixinho e todo mundo ri, menos meu pai.
— Me respeite, mulher. Tá maluca? — meu pai resmunga parecendo meu
avô, a encara bravo com o desaforo, mas não agüenta a pressão e corre se
sentar ao seu lado para encher ela de beijos.
— Já consertou??? Quer que eu dê uma olhada? — Rafa fala.
— Quê isso, obrigado! Concertei hoje cedo, tive que comprar três pneus,
nossa… um saco!
— Deixou Lulu ir viajar sozinha com Jon? — pergunto e ele sorri.
— Deixei. Uma verdadeira prova de confiança.
Ele fica sério, e se serve de suco. Minha mãe olha para mim e mexe a cabeça
levemente me dizendo para calar a boca.
— Bom dia, família! Vim procurar um marido fujão, vocês viram, por aí? —
Julia entra na sala quase gritando. Tia Nina é quem ousa responder.
— Quem esse aqui? — ela aponta para mim e Julia deposita um beijo em
minha boca.
— Por que não me ligou?
— Esqueci. Quis umas férias!
— Dá sua mulher? Justo eu que te amo tanto?
Ela fala com ironia e todos acham engraçado.
— Tem que me amar sim, mas também tem que parar de torrar a paciência.
— sorrio pra ela e ela sim, engole o desaforo. — Senta aqui do meu ladinho...
— zombo apertando sua cintura para aliviar o clima. —... tome café com a
gente. — eu falo e ela obedece fazendo manha.
— Olha Tay, meus primos tem massinha! Olha o que eu fiz!
Catarina chega correndo e me mostra um amontoado de algo que não consigo
identificar, mas que com certeza ‘estava o mais lindo do mundo’!!!
— Que coisa mais linda, filha!!! — eu digo e vejo Julia olhar para ela com
surpresa.
— O que ela faz aqui tão cedo? — ela pergunta para mim, mas é Catarina
quem responde.
— Esta é a casa do Tay, e ele é meu pai! Mamãe disse que isso tudo é meu!
Eu tenho um castelo em Bagé, e tenho esse em Barbacena.
Catarina responde fazendo gestos para se aparecer — e já notei que ela era
mesmo assim, era seu jeito de ser. —, e Julia ergue uma sobrancelha.
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— Ah! Sua mãe disse isso é!?


Julia pergunta “como quem não quer nada” aparentemente irritada com
aquilo e Catarina não gosta do que ouve.
— É, ela disse! É meu castelo! MEU, NÃO SEU!!!
Ela fala e mostra a língua para Julia. Eu me levanto e me retiro porque o
clima estava estranho. Pego Julia pelo pulso e saio com ela dali. Entro com
ela no quarto de minha avó que era o mais próximo, e me tranco com ela.
— O que faz aqui?
— Vim tentar entender o que se passa nessa sua cabeça. Por que não foi pra
casa? Não me ligou?
— Ellen trouxe Catarina e acabei me esquecendo. Fiquei ocupado com ela.
— Ah! Que ótimo… Bela atitude. — ela diz parecendo magoada e prestes a
chorar. — Acha que eu sou o quê? Sua amiga? Sua parceira de balada? Acho
melhor você começar a me respeitar. Estamos juntos, não pode me deixar em
casa sozinha pra dormir na mamãe.
— Eu não ia dormir aqui, só dormi por causa dela.
— Por que não a levou para casa? A sua casa?
— Porque eu não quis, quis ficar aqui… já estava tarde! Olha, não vou ficar
me explicando pra você, nunca fiz isso. Só me faça um favor, não volte a
olhar para ela daquela maneira, nem questionar o que ela diz. Ela só tem
quatro anos!
— Ela já me odeia!!! A mãe dela deve ter enchido a cabeça dela contra mim,
não vê? — ela fala e se aproxima. — Da onde ela tiraria isso, de que “a casa é
dela, só dela”? Ellen não vai com a minha cara, você já se afastou de mim
quando ela chegou, agora então a gente só briga, só se afasta cada vez mais.
Ela aparece do nada, larga a menina com você e você me deixa de lado por
causa dela. Por que não me chamou? Não me mandou vir pra cá? Não quer
ficar perto de mim.
— Ellen deve ter falado isso porque é a verdade. É minha filha, a casa é dela!
E ela não LARGOU a menina, apenas deixou para o pai cuidar! Eu saí de
casa porque você estava chata demais, e pelo jeito continua. Vai embora,
Julia! — eu falo e ela me abraça.
— Não vou embora, não vou deixar você!!! — ela começa a chorar e minha
paciência vai pro saco.
— Para de chorar!
— Não consigo. Você quer me deixar, eu sei que quer!!!
— Se não parar agora, vou te deixar nesse momento.
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— Tá bem, olha, já parei… — ela me olha sorrindo e secando os olhos. Eu


rio da cena e ela me rouba um beijo.
— Vou me comportar, eu prometo que vou! Eu prometo!!!
— Tá bem, agora me larga. Preciso ver onde está minha filha, não posso
deixar ela ficar lá fora sozinha… é perigoso aquele lago. — eu digo e ela me
solta.
— Eu vou junto. E tem que falar com ela sobre como me tratou. Não pode
me ver como inimiga!
— Vou falar, mas que você mereceu, você mereceu! — eu digo, ela faz um
bico e eu saio do quarto.
Catarina continuava na sala. Pergunto se ela queria sair, e os gêmeos dizem
em uníssono que também queriam ir.
— Se for dar trabalho, posso ir junto, cunhado!
Rafa diz ao ouvir e eu faço não com a cabeça. Catarina se levanta do tapete,
pega em minha mão e me leva para mais distante de Julia.
— Ela não vai não é!? Ela é chata.
— Ela pode ir, ela também quer passear, por que você não gosta dela e falou
com ela daquele jeito?
Eu me ajoelho e questiono. Catarina olha para Julia que conversava com os
gêmeos, e faz uma cara feia.
— Ela é a bruxa má do castelo! Não quero que ela vá.
— Ela não é nem bruxa, e nem má. Vamos deixá-la ir, e se você não gostar
dela, prometo que nunca mais sairemos juntos, tudo bem? Você vai ver que
está enganada, Julia é muito legal, e gosta de você.
Catarina faz uma careta e seus olhos enchem d'água.
— Não. Não quero! Ela é malvada! Ela é malvada!!!
Ela começa a chorar alto enquanto apontava o dedo para Julia e assusta todo
mundo, até a mim. Não sei o que fazer e olho ao redor pedindo ajuda. Minha
mãe e meu pai se aproximam e perguntam o porquê que ela chorava. Quem
via, parecia que ela tinha de repente ganhado tipo um beslicão de mim. Fiquei
muito assustado.
— Não quero ela aqui!!! Ela é má!!! Não quero que ela vá passear! Só pode o
Tay e meus primos, só a gente, ela não!!!
Ela faz uma birra, bate o pé no chão, cruza os braços, e deixa uma situação
constrangedora no ambiente. Eu me levanto e olho para Julia. Ela olha para
Catarina, depois pra mim, se levanta do tapete e vira as costas indo em
direção a cozinha. Provavelmente vai embora. Me senti péssimo com aquilo.
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Péssimo!!!
— O que eu faço? — pergunto para minha mãe, mas ela não sabe o que dizer.
— Quer saber? Eu te falo! Vai levar tua filha e teus primos para passear!
Meu pai resmunga e eu faço o que ele sugere. Óbvio que minha filha era
minha prioridade, mas o que Catarina fez Julia passar, ninguém merecia,
muito menos ela. Anotei mentalmente sobre conversar com ela a respeito
disso depois, e ir atrás de Júlia para me desculpar pela atitude de Catarina.
Depois de muito pensar a respeito, fomos todos para o centro. Passamos um
dia incrível, compramos uma montanha de brinquedos, milhares de Barbie's,
lanchamos, fomos ao parque na cidade vizinha que tinha brinquedos legais, e
nos divertimos muito. Eram um sonho que tinha se realizado. A filha que eu
tanto quis, estava ali comigo, e seu sorriso enchia meu coração de amor.
Catarina é inteligente, indisciplinada, agitada, mimada, manhosa demais,
birrenta, e por isso me apaixonei ainda mais, simplesmente pela oportunidade
de conhecê-la melhor. Ela não era uma criança como minha irmã era, por
exemplo, calma, tranquila… não! Catarina era exibida e irritadiça. As coisas
tinham que ser do jeito dela ou não era de jeito nenhum, quando ela batia a
sapatilha no chão, algo deveria ser feito. Eu podia jurar que se eu não fizesse,
ela gritaria algo como “Cortem-lhe a cabeça!!!” e aí eu perdia o jogo. Me
senti na obrigação de mimá-la como se eu tivesse tentando suprir tudo o que
perdi desde seu nascimento, numa busca assídua para conquistá-la e agradá-
la. Se ela pedisse o mundo, eu daria. Mas eu sabia que aquilo estava errado,
algo na educação dela não estava legal. Talvez Ellen tivesse a tratado a “pão
de ló” simplesmente por culpa, por tudo o que aconteceu, ter tirado ela de
mim ainda na barriga… não sei. Mas ela precisava de disciplina, saber o que
era certo e o que era errado, e quando Ellen chegar eu vou conversar com ela
a respeito disso.
— Estou cansada, quero ir pra casa.
Ela diz assim que sai do brinquedo pula-pula, com os primos.
— Mas Cat, ainda tem sol, podemos ficar mais!!!
Gabi sai do brinquedo, mas continua pulando.
— Vamos naquele ali Cat, são carrinhos de super-heróis!
Gusta grita tentando persuadir Cat, mas ela “fecha a cara”. Provavelmente,
me baseando nas anotações de Ellen, ela estava com sono, e era hora de sua
soneca. Ellen havia escrito: …”Nessas horas ela fica ainda mais chata.
Aguente.”
— Tem certeza que não quer brincar mais? — eu pergunto.
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— Tenho, já brinquei muito! — ela diz e os gêmeos ficam tristes.


— Vamos lá, vamos pra casa, ela está com sono! Depois o primo traz vocês
de novo! No próximo final de semana a gente volta, eu prometo.
Eu digo para os dois, procurando amenizar a tensão, e eles sorriem pra mim.
Cat escuta e me olha de um jeito estranho.
— Eu também, não é!?
— Você é minha princesa! Minha princesa também virá quantas vezes
quiser!
Eu não me aguento e quando ela sorri, a pego no colo. Faço todo o percurso
até o estacionamento a carregando, e logo sinto sua cabeça pousando devagar
no meu ombro. Assim que chegamos ao carro, Cat já dormia.
Entro em casa, a coloco na cama, tiro sua sapatilha e desço. Eram 18:00hrs.
Minha mãe me faz contar tudo como foi, e depois ganho um abraço seu.
Dona Hella chora e não entendo o porquê as mulheres choram por tudo.
Sento-me do lado de Rafa no sofá, e fico conversando um pouco com ele. Ele
dá sua opinião á respeito de Julia, Catarina, Ellen, e ficamos conversando ali
por muito tempo. De repente meu telefone toca. Era Ellen. Eu me levanto,
vou até a janela e atendo.
— Oi.
— E aí, como ela está?
— Ótima. Fomos ao parque, brincou bastante, ficou cansada, quis vir
embora, e veio o caminho todo dormindo!
— Ela difícil, não é!?
— Não mais que a mãe!
— Tá. Eu recebi a foto de sua mãe. Gostei de saber que não a deixou dormir
sozinha. Ela tem um pouco de medo…
— Eu notei. Nunca a deixaria.
— Onde você está?
— Na chácara! Precisamos conversar quando você voltar.
— Sobre o quê?
— Aqui conversamos. Ela está dormindo agora, quando acordar, peço para te
ligar.
— Está bem.
— Quando você volta?
— Amanhã.
— Tá ok. Tchau!
— Tchau!
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Ela diz e eu desligo. Assim que começo a pensar em sua voz, e no amor que
eu sinto, vejo um táxi chegando. Era Luiza e Jon. Meu pai aparece na sala, já
sabendo e aguarda com todo mundo. Lulu entra gritando como sempre
animada, e é recebida com amor, mas aquilo tudo era uma farsa, ela não
estava bem e só eu via. Pelo jeito eu e minha mãe.
— De novo sem balões, não é!?
Ela brinca. Abraça todo mundo e na minha vez, também me abraça. Seu olhar
para mim me dá pena, Lulu estava triste e vestia uma máscara patética de
felicidade planejada e teatro puro. Eu olho para Jon, ela abaixa a cabeça, e eu
entendo. Eu sabia.
— E então. Como foi!?
Meu pai questiona olhando para os dois e em nenhum momento, os dois se
olham.
— Bom, realmente não tinha sido pago, eu sinto muito!!! — Jon fala e eu me
aproximo.
— Sem problemas. Foi resolvido? Tá tudo certo, filha?
— Sim, papi!!! Tivemos que pagar todos os atrasos em débito automático,
ficamos lá por mais de três horas, foi chato demais… mas está tudo ok!
Lulu diz e meu pai se senta ao seu lado para abraçá-la mais.
— E então. Saíram? Foram pra farra? Ela aprontou Jon???
Meu pai sorri, mas nenhum dos dois sorriam.
— Ela até tentou… essa carranca aí é porque eu não deixei! — ele diz e
Luiza parece querer matá-lo.
— Tentou ir para onde, filha?
— Só conhecer a cidade pai, nunca tinha pisado lá… — ela fala.
— Tudo bem! Não tem problema. Qualquer dia vamos só nos dois! Vou te
mostrar Porto Alegre. — meu pai diz e ela sorri fraco pra ele.
— Nada mais? Nenhuma novidade? — meu pai insiste. — Vocês parecem
chateados um com o outro!
— Não é nada. Só não trabalho com ele nunca mais! Jon consegue ser pior
que você em tudo. Banca o guarda-costas, o pai, e é meu tio ao extremo!
Deveria ter ido sozinha.
Lulu desabafa e se retira. Eu olho para minha mãe, e meu pai chama Jon para
conversar a sós. Eu subo atrás de Lulu, e a encontro chorando de soluçar na
cama.
— Não quero conversar! — ela resmunga com o travesseiro abafando sua
voz.
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— Me conta o que ele fez, ou o que vocês fizeram, melhor dizendo…


Eu resmungo e tranco a porta. Ela se senta na cama limpando o rosto com as
mãos e depois me olha triste.
— Não houve nada, é só TPM.
— Fala de uma vez, Ana Luiza.
— Nós ficamos juntos. — ela diz em voz baixa e eu beiro o surto psicótico.
— O QUÊ???
— Fala baixo, por favor, fala baixo… — ela gruda em mim e implora.
— Ele… ele…
— Não, olha pra mim!!! Fui eu, eu mesma…
— Você não… não!!!
— Sou a típica garota inocente, não é!? Escuta o que vou te dizer, eu que quis
e insisti, estou péssima porque ele me rejeitou!
Ela fala enquanto eu andava de um lado pro outro tentando digerir aquilo.
Lulu tentava me fazer parar e olhar para ela, mas eu só queria descer lá e
matar Jon. Eu não sabia o que dizer ou o que pensar. Como um cara que já
devia ter seus quarenta anos, se envolver com uma menina de dezoito. Isso
além de parecer preconceituoso parecia tão errado.
— Vou matá-lo!!! Vou matar ele!
— Tay! Eu me joguei pra cima dele, e ele disse que não valia à pena trocar
anos de amizade, por causa de mim! Mas olha, foi apenas um beijo, e ele
parou, ele me tirou de cima dele e saiu do meu quarto!
— O que ele fazia no teu quarto???
— Não vou te dar detalhes!!! PARA DE ANDAR PRA LÁ E PRA CÁ E
OLHA PRA MIM, PRESTA ATENÇÃO AQUI! Eu gostei dele desde
quando o vi, o provoquei até conseguir beijá-lo, ele me rejeitou por causa de
minha idade e do papai, e viemos o caminho todo sem se falar. Acabou. Não
conte nada pra ninguém, guarde isso pra você! Não me traia!
— Você só tem dezoito anos! Ele seduziu você!!! — eu digo e ela ri
enquanto chora.
— Vai por mim, irmão, foi o contrário, te garanto. Não sou mais uma
menininha inocente, papai só me vê como uma princesinha indefesa porque
quer, ele se nega a acreditar que cresci, se nega a ver que mudei! E quer saber
do que mais: tenho um namorado em NY, não sou mais virgem, e eu queria
Jon, e Jon me queria também.
— CALA A BOCA! — eu grito e ela se afasta de mim. — Cala essa boca!
Você… quem é você??? Eu não sei quem é você!!!
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Não consigo digerir aquilo e regurgito palavras duras em cima dela.


— Não sou mais sua irmã porque virei mulher? — Luiza parece indignada.
— Não é mais minha irmã porque é uma mentirosa! Como pôde!? Você é
uma menina, é só uma menina. Usa uma máscara para ninguém saber quem
realmente é. É uma fingida!!! — eu falo e ela volta a chorar. Eu me sinto
péssimo e mesmo com raiva, dela, do Jon, e de mim mesmo por ser um
babaca, eu a abraço. — Me desculpa. Não tô sabendo lidar. Me desculpa!!!
Eu imploro e ela gruda em mim. Lulu sofria, e não estava contando tudo.
— Eu tô tão confusa! Tão confusa… — ela diz com a boca no meu peito.
— Papai se descobrir, vai executar Jon! Ele vai matá-lo a sangue frio. Não de
porrada, não “em modo de dizer”, mas no sentido literal da palavra. Papai vai
matar Jon! — eu falo mais comigo mesmo e ela me olha desesperada.
— Ele não pode, foi tudo culpa minha. Jon é um babaca medroso, fui eu
quem forçou a barra e mesmo assim ele não quis. Ele não me quis. Papai não
pode saber de nada. Tay me prometa!!!
— Não preciso prometer, você é péssima atriz. Ele já sacou. O chamou ele
para conversar a sós. Você é quem vai acabar entregando tudo! Olha pra
você, parece destruída, desolada!!!
— Estou assim porque ainda quero ele!!!
— É, e por querer, vai causar a sua morte!
— Não dia isso nem de brincadeira. O que eu faço??? Me diz o que eu
faço???
Eu respiro fundo e me controlo. Minha vontade era de gritar com ela até o dia
nascer!
— Primeiro vai lavar esse rosto, refaça essa maquiagem toda borrada, se
recomponha, e atue melhor. Se ele não souber, tudo vai ficar bem, aja
naturalmente e em uma melhor oportunidade, fale com a mamãe, conte tudo
pra ela. Ela também já suspeita! Conhece você! Só ela pode parar nosso pai
quando toda essa merda for jogada no ventilador, só ela, não eu, nem você,
ninguém… Sua melhor aliada é a mamãe! Agora vai tomar um banho. — eu
falo e ela me abraça. Meu pai bate na porta e ela corre para o banheiro.
— ANA LUIZA!!! — ele grita. — ABRE ISSO, FILHA!!!
Eu espero ela fechar a porta do banheiro, e vou abrir a porta. Ele estranha me
ver lá.
— O que faz aí de porta trancada?
— Conversando com a Lulu, ela me perguntou a respeito de Julia… Tranquei
a porta para a gente não ser interrompido. — eu falo e ele me olha por um
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momento.— Que foi velho?


Pergunto e minha risada o faz confiar em mim.
— Cadê ela?
Ele anda pelo quarto olhando ao redor.
— Ela disse que precisava tomar um banho rapidinho e mandou eu esperar.
Estava deitado na cama. O que aconteceu? — eu questiono e ele coça a
cabeça.
— Não sei! Ela quem vai ter que me responder… Jon se demitiu! Fiz
algumas perguntas do porquê que ela parecia triste, ele disse que foi porque a
proibiu de me desobedecer, me contou sobre ter encontrado ela na recepção e
ter feito ela voltar pro quarto, enfim, foi fazer o que eu mandei, e acabou a
magoando. Disse que por causa deste erro com as notas, porque se sentiu
responsável por quase nos fazer perder uma propriedade, ele quer se demitir,
disse que Luiza era inteiramente capaz de fazer o que ele fazia. Onde já se
viu? Desculpa esfarrapada, — meu pai andava pra lá e pra cá. — Jon não tem
o perfil de pedir demissão por uma coisa ridícula como essa, aconteceu
alguma coisa! Eu sei que aconteceu!!!
— Bom, no fundo você não confia nele, não é mesmo!?
Eu ironizo, me deito na cama despreocupado, e ele opta por não responder.
Dez minutos depois, Lulu sai do banheiro só de toalha, e totalmente
“recomposta”.
— O que foi agora?
Ela pergunta olhando nos olhos dele, e eu fecho os olhos. Luiza era muito
ruim para esconder o que sentia, ela era muito transparente.
— O que aconteceu lá?
— Pai, ele só foi chato. Igual você!!! Qual é!? O que quer ouvir???
— Ele deu em cima de você? Te ofendeu? Te chateou de alguma forma?
— Não, pai, que horror!
Ela fala e ele inclina a cabeça. Lulu se aproxima dele, segura sua face com as
duas mãos, e diz: — Ele é como um tio, apesar de ter sido um pé no saco e ter
me proibido de sair para beber, ele em nenhum momento faltou com respeito
comigo. Minha chateação é pelo cansaço do nervoso que passei lá, e pelo
vôo. Tudo bem? Acredita em mim, papai! Está tudo bem!
— Então por que ele se demitiu? — Ele pergunta e ela demonstra estar
surpresa.
— Jon foi de São Paulo até o Rio Grande do Sul, folheando os e-mails que eu
imprimi. Quando o cara disse que não estavam pagos, ele queria morrer de
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tanta decepção consigo mesmo. Acho que ele pegou pesado na hora de me
proibir de sair por causa disso, e como brigamos, acho que ele ficou
esgotado. Para um homem que sempre fez tudo de um jeito perfeito, errar
causa um impacto enorme. Quem foi corrigir o incrível Jon-sabe-tudo, foi
uma garotinha de dezoito anos. Ele deve estar péssimo. Perca seu tempo
ajudando ele a superar essa bobagem. Entre nós dois, nada de mais
aconteceu!!!
Ela diz com cara de tédio e dessa vez, fico impressionado. Meu pai toca seu
rosto, faz um carinho com um semblante indecifrável e diz: — Minha
princesa, tão linda. Eu já te disse que você é minha preciosidade não é!? É
sim… quando você nasceu levou todos os meus fantasmas embora, você
consertou, curou meu coração, e se não fosse por você, eu nem sei se estaria
aqui hoje! Tão doce, pura como um anjo… eu amo você mais que minha
própria vida!
Ele diz, sorri para ela, quando lhe dá as costas seu sorriso se desmancha, e sai
do quarto sem me olhar nos olhos. Meu pai não é bobo. Olho para Lulu e
coloco a mão na boca fazendo sinal de silêncio. Ela se senta na cama e cobre
a face com as mãos. Tínhamos um problema de proporções catastróficas aqui.

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27
ATENÇÃO

— Não precisava ter vindo, ter deixado Cat lá… — Yan diz assim que entro
em seu escritório.
— Eu precisava. Preciso de você! Preciso me desculpar também. Exagerei,
você estava tentando me ajudar e eu… estraguei tudo!!! — chego perto dele e
ele se afasta.
— Você por acaso, mudou sua forma de pensar? Concorda comigo que Cat
precisa se aproximar de sua família, de seu verdadeiro pai?
Ele pergunta e eu penso antes de responder. Assumir tudo isso era doloroso,
mas dependendo do que eu falasse, poderia estragar tudo novamente.
— Concordo com você. Você está completamente certo. Mas não posso
deixar de dizer que me dói assumir isso, que eu não queria que ela fosse
descoberta. Eu sei, estou errada, mas não queria nenhum tipo de
relacionamento ou aproximação com ele. Você me deu tudo, um lar saudável,
um relacionamento saudável e baseado em confiança, uma vida tranquila…
Eu amo essa casa, Yan, amo esse lugar, só aqui me sinto bem, você me faz
feliz aqui, não queria que isso mudasse…
— Eu não disse que mudaria!
— Mas vai, não é!? Como posso voltar com minha filha pra cá, agora? Como
vou afastá-la dele agora? Impossível! A felicidade da minha filha está
começando, mas a minha acabou!
— Por que???
— Porque ele nunca vai me deixar em paz! Sempre vai tentar de novo. Tay
nunca desistirá de mim!
— Não exagera. Ele é casado!
— É casado, mas me ama. — eu falo e ele se aproxima de mim.

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— E você o ama. E eu te amo. E Catarina nos ama. Desde quando amar é um


problema, vida? — Yan toca meu rosto e lamenta.
— Preciso de você! Preciso da tua força, da tua sabedoria, do teu amor!
Eu digo e ele me solta para trancar a porta. Depois ele volta a ficar na minha
frente, e começa a abrir o cinto do meu sobre-tudo.
— O que está fazendo??? — pergunto sorrindo e ele continua sério demais.
— Tirando sua roupa. Vou te dar tudo o que precisa, nesse momento o
“amor” está mais fácil.
Ele diz e começa a me despir. Sobre-tudo, vestido, meia-calça, botas, e por
fim, lingerie.
Fico nua em sua frente e primeiro ele me olha, passa seu olhar em mim,
lentamente, como se precisasse desse tempo para curtir o momento. Como se
somente me olhar fosse a parte mais importante, do “fazer amor”. Yan se
ajoelha, beija minha barriga, passa para minha virilha, e depois fica por um
longo momento, passando sua língua no meu ponto mágico, e então
praticamente se enrosca embaixo de minhas pernas para fazer o serviço
direito.
Em um rompante magnífico, depois de me deixar completamente seca, Yan
se levanta, me pega no colo, e parecendo apressado e um tanto desnorteado,
me joga no sofá e começa se despir enquanto me beijava com vontade. Sem
me avisar, de repente ele me preenche com uma grosseria tão gostosa quanto
assustadora, e vejo estrelas.
— Oh! Tay… — eu deixo escapar e ele bate na minha bunda com força.
— Então é Tay quem está aqui!? É nele que pensa quando eu fodo essa b…
— ele se refere a minha parte íntima de forma escrachada, e eu sinto um tesão
imenso nisso. Não estava preocupada mais, com medo dele ter se ofendido,
ou ficado triste. Liguei o botão do foda-se, e abri ainda mais as minhas pernas
— …??? É nele???
— É nele, Yan! É SIM. — eu digo querendo chorar, e ele mete com mais
força.
— Eu sei, sempre soube. Não é a primeira vez que troca meu nome!!! Quer
dar pra ele, Ellen? Você sente vontade de abrir essas pernas pra ele?
— Sinto! Muita!!!
— Eu te autorizo! Quer ser uma vadia, seja uma vadia com meu
consentimento! Faça o que seu corpo sente vontade, faça o que seu coração
mandar. Eu te amo e quero ver você feliz. Se quiser matar a saudade, mate-a!
Não passe vontade! A vida esta aí para ser vivida!
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Ele diz e eu olho em seus olhos.


— Você bebeu? — eu pergunto e ele ri. Ri tanto, que até para de me comer.
— Por que estou dizendo que não ligo de você se envolver com ele?
— Sim, né!!! — eu falo e ele ri ainda mais.
— Ellen… eu sei aonde isso vai dar. Vi como você o olha, vi como ele olha
pra você. Notei como correu para a FAB quando eu dei a carta branca. Você
sempre foi decidida, nunca fez nada que não queria, nunca fazia o que Cat
implorava fazendo birra, você sempre foi dura demais com ela… você queria
ir até lá mais do que ela, por isso vim embora, quis te dar esse tempo para
fazer o que achava melhor. Não imaginei que viria até aqui. — ele me olha
parecendo sentir dor e continua. —Quer mais sinceridade ainda??? Vocês
dois nasceram um para o outro, é um romance de infância, então não posso
lutar contra isso. Vão acabar juntos, mais cedo ou mais tarde, vão ficar
juntos. Não estou dizendo que sou liberal, ou que quero um relacionamento
aberto! Tô dizendo que te amo tanto, mais tanto, que faço e aceito o que for
necessário para te ver feliz, para te ver sorrindo! E se isso significa saber que
vocês fazem amor, quando não está em casa, eu aceito. Cuido da nossa filha
pra você, e te espero na cama para dormir de conchinha! Você é minha,
minha mulher, e quando fui contigo até a casa dele, vi que não era só minha,
não ia adiantar dar murro em ponta de faca, sofrer, chorar, ou te sequestrar
para te levar para longe dele. Aceite que você tem dois homens que fariam
tudo por você, e eu aceito que somos três!
Ele diz e eu perco até o rumo das coisas. Mas que maluquice era aquela?
Nunca pensei que ia ouvir um absurdo daqueles de ninguém na minha vida,
muito menos de Yan!!!
— Você usou drogas enquanto esteve aqui sozinho. Só pode…
Digo me levantando, mas ele me puxa.
— Quer fingir que eu não disse nada, finja! Mas vem… sente-se aqui amor!
— ele diz e eu obedeço.
Me esqueço da sua loucura e cavalgo até cansar. Eu precisava daquilo, Yan
precisava, e fazer “as pazes” daquela forma, era um sonho. Eu merecia.
— Bom dia! Cadê ela???
Chego a Barbacena e vou direto buscar a minha filha. A saudade que eu
estava de minha menina era tão grande mais tão grande, que eu não sabia
descrever. Yan fez questão de ir comigo até a chácara e eu gostei disso. Com
Yan lá, Tay não tentaria nenhuma gracinha. Pelo menos eu achava.
— Ainda está na cama. — Tay diz parecendo um pouco incomodado com a
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presença de Yan ali.


— O que queria conversar comigo?
Eu questiono e ele se senta. Eu e Yan nos sentamos e esperamos ele começar.
— Você, por acaso, disse coisas ruins a respeito de Julia para a Catarina?
— Não, eu nunca faria isso. Não a conheço! — eu digo e ele confirma.
— É que Cat meio que surtou ontem. Como eu disse que faria, fiquei aqui
com ela, não voltei para casa, fiquei ocupado o dia todo, saímos, nos
divertimos e eu esqueci meu celular no silencioso. Julia me ligou a tarde toda
e como eu não respondi, ela veio até aqui! Perguntou o que Catarina fazia
aqui, e ela não gostou. Catarina disse que — ele diz rindo. — esse aqui era o
castelo dela, tudo isso era dela, e que enfim, eu era seu pai, e ela estava no
lugar certo, “na hora certa”… — ele fala, eu seguro o riso mas Yan não.
Ficam os dois rindo da situação enquanto eu me segurava. — Julia perguntou
se era você quem disse isso, e ela surtou logo depois. Julia queria ir conosco e
com os gêmeos ao parque, se aproximar dela, mas ela não deixou. Chorou,
bateu o pé, e fez Julia ir embora!
Tay termina de falar e eu olho pra Yan. Eu não sabia o que dizer.
— Eu sinto muito. Não a conheço, não sei como ela vai tratar a minha filha e
foi por isso que eu disse que não a queria perto dela. Mas nunca falei a
respeito de Julia perto da Catarina, nem bem e nem mal. Nunca falei dela de
forma nenhuma.
— Mas falou a respeito dela ser a dona do castelo? Ela disse que era dona do
castelo e que Julia era a rainha má.
Tay diz e Yan ri de novo. Eu chamo a sua atenção e ele para colocando a mão
na boca!
— Eu disse, afinal é direito dela. Tudo isso aqui é dela! — eu falo sem culpa
nenhuma, minha filha merecia arrancar tudo o que ele tinha. — Ela disse que
tinha que voltar para o castelo dela em Bagé, junto comigo, mas eu disse que
ela também tinha um castelo aqui, dois castelos para cuidar, que eu precisava
ir sozinha, mas que ela deveria se manter ocupada cuidando desse. Agora
com relação a sua opinião sobre a sua mulher, é coisa dela. Deveria prestar
atenção, procurar saber o que foi que ela fez, criança não mente, criança é
transparente. Se Catarina diz que ela é maldosa, algo tem!
— Eu sei, de qualquer forma só queria tirar a prova. Se não foi você quem
disse, aí a coisa muda de figura. E com relação aos direitos de Catarina, eu
estou ciente. Não se preocupe com isso.
— Pois é. Ser pai não é só levar ao parque. Pode ser pai colocando a chácara
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em seu nome, as propriedades que te pertencem, procurando o melhor colégio


particular para a matrícula já que estarei ocupada resolvendo nossa vida aqui.
Os cursos, Ballet, as Barbie's, roupas, material, dentista, médico… vou deixar
tudo em suas mãos, e não fará mais do que sua obrigação. Não faz questão de
ser pai? Será de forma completa.
Eu digo levantando a sobrancelha e fico incomodada com o jeito que ele me
olha. Tay me olha com amor mesmo com Yan ao meu lado.
— Concordo com tudo isso, vou providenciar. Só que tem mais… notei que
Catarina está acostumada com tudo do seu jeito. Se ela não tem, bate o pé.
Sendo filha de quem é, eu até entendo, mas isso não pode acontecer.
Precisamos mudar isso. Eu acabei de conhecê-la não posso chamar sua
atenção, quero que ela goste de mim, então fiz tudo para isso acontecer,
deixei Julia ir embora magoada, enchi o carro de Barbie tanto que o porta-
malas não fechou, fiz tudo o que ela queria… mas ela não sabe ouvir não, e
isso pode prejudicá-la quando crescer, pode se tornar uma adulta egoísta.
— Catarina não é assim lá em casa! — Yan diz e Tay olha pra ele sem
entender nada.
— Ela faz a birra dela, mas não me parece que falamos da mesma criança. —
eu digo e Tay parece confuso.
— Cat é a criança mais esperta que já conheci. Agiu assim, provavelmente
porque sabe que você quer o seu amor, que você quer conquistá-la! Ela não é
boba!
Yan diz e Tay entrelaça os dedos das mãos parecendo pensativo.
— Ela me manipulou, me pediu algo que não me lembro bem, antes de
dormir, não sei se era ver TV até mais tarde, ou ficar na cozinha com a minha
mãe até mais tarde. Disse que ia gostar de mim se eu permitisse. Eu falei que
você não ia gostar de mim se eu fizesse o que ela queria e passasse por cima
de suas regras, então ela me perguntou, quem eu preferia… ela ou você! —
Tay diz e eu fico impressiona. Yan ri de novo.
— E então, obviamente, você fez o que ela queria. — digo irônica e ele
assente.
— Fiz sim.
— Vou falar com ela. Vou até o quarto!
Eu digo, mas nem dá tempo. Cat desse as escadas correndo e de pijama.
— MAMÃE!!! PAPAI!!! — ela corre e nos abraça.
— Como você está, minha princesa?
— Tô bem!!!
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— Você se divertiu???
— Muito… Eu amei! Esse meu castelo é maior que o de Bagé, da até pra
andar de bicicleta!!! — ela fala rindo e empolgada.
— Se comportou direito, Cat? — Yan pergunta e ela pisca pro Tay.
— Claro que sim, papai.
— Jura que não maltratou ninguém? Não foi mal educada com ninguém???
— pergunto e ela parece pensar.
— Só com a bruxa má. Não gosto dela!
— Por que não, filha? Sempre te ensinei a ser educada com todo mundo…
— Ela me olha com cara feia quando ninguém está olhando! Ela não gosta de
mim, e não gostou de eu ter um castelo aqui! E ela não gosta de você
também!!! Eu ouvi ela brigando com meu Tay no quarto da biza. E ela
levantou uma sobrancelha assim, oh! — ela imita uma cara de malvada —
Quando me viu aqui. Aí não deixei ela ir no parque com a gente!!!
Ela diz orgulhosa de si mesma e Tay mostra um semblante difícil de decifrar,
provavelmente Catarina não tinha dito nada daquilo perto dele.
— Por que não me contou isso, Catarina??? — Tay questiona e ela faz cara
de choro. Não responde. — Eu disse que se você não gostasse dela, eu nunca
faria você ficar perto dela! Por que quando eu te perguntei você só chorou e
disse que ela era malvada, não me contou o que ela faz quando ninguém está
olhando?
Tay fala novamente e Catarina chora. Eu não estava entendendo nada.
— Vem aqui. — Tay chama e ela se aproxima dele.
— Sua mãe disse que lá no seu castelo do sul você não age assim, por que
está fazendo isso aqui?
— Porque lá não tinha bruxa má! Não quero ela aqui, nunca mais!
Ela diz chorando e Tay a abraça até ela parar.
— Ela é sua madrasta Cat, não pode proibi-la de vir aqui! — Yan diz e ela
olha pro Tay.
— Ela não vai vir mais, não é!? — ela pergunta e Tay não pensa antes de
responder.
— É claro que não. — ele diz.
— Não é assim que se resolve esse tipo de coisa!
Eu falo e ele não me olha nos olhos.
— Posso arrumar outras namoradas, mas não posso trocar de filha! Pra ficar
comigo tem que amar Catarina. Nunca ficaria com alguém que a destratasse.
Primeiro ela, depois relacionamento.
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Tay diz e ganha um beijo da pequena manipuladora.


— Eu acho que sua mãe veio te buscar, por que não pede ajuda pra ela
arrumar suas coisas contigo? — Tay diz e ela olha pra mim.
— Mas eu já vou embora?
— Acho que sim, vai matar a saudade de sua mãe, da sua vó…
— Mas quero ficar mais. Ainda não andamos de cavalo!!!
Ela fala e eu reviro os olhos. Eu mereço!!!
— Vamos fazer suas malas. Nem pense em fazer birra.
Levanto depressa e vou com ela até o quarto para pegar as suas coisas.
Quando volto, Yan está sozinho na sala.
— Cadê ele?
— Perguntou se eu queria beber algo e eu disse que sim! Aqui não tem
chimarrão, então uma cerveja seria bem vinda!
Ele fala e fico querendo matar ele. Ele não tinha noção do quanto era ruim
ficar perto dele.
— Relaxa. — ele resmunga ao notar minha expressão. E Tay volta com a
bebida.
— Mas e pra você? Vou beber sozinho?
Yan questiona e vejo Tay sorrir pra ele. Meu Deus, EU VI TAY SORRIR
PARA ELE.
— Não vou ficar aqui vendo isso. Isso é totalmente errado. Vou embora.
Eu resmungo e os dois riem. Mas antes de me retirar, Lulu desce correndo e
me dá um abraço apertado.
— Que saudade!!!
Ela chega e parece que abriu a porteira, todo mundo desce.
— Quanto tempo, né???
— Sim! Muito!!! Tenho tanto para te contar! Fico feliz que esteja de volta. —
ela fala e eu sorrio pra ela.
Eu amava Lulu, sempre amei. Essa era a parte difícil de tudo aquilo. Por
causa de Tay e dos erros que cometi, me afastei de todos não só dele.
— Hella e eu estamos pensando em fazer uma festa amanhã. Uma fogueira.
Por que não vem, Yan? Vai ser legal. — Max diz e Yan sorri.
— Eu aceito o convite!
Yan responde eu olho de cara feia pra ele. Onde já se viu?
— Não surta Ellen, agradeça que não tem ninguém matando ninguém… Será
só uma festa entre família. Uma família um tanto quanto excêntrica, mas uma
família.
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Max diz rindo e eu passo a olhar para ele da mesma forma. Nesse momento
Jon desce as escadas e fico assustada.
— Jon? Você aqui?
— Eu mesmo e aqui!!! Como vai Ellen? — ele fala sem sorrir.
— Vou bem, eu acho! Está tudo bem por aqui?
— Engraçado como minha presença representa problemas à vista, não é!?
Mas está tudo bem, sim.
Ele fala e eu olho para Max. Ele sorri pra me tranquilizar.
— Jon tirou umas férias. Vai passar uns dias aqui para curtir o interior. — ele
fala, mas algo parece errado, muito errado.
— Bom eu já vou…
Trato de fugir dali o mais rápido possível, mas quando tento, de novo não
consigo. Laura entra correndo na sala e trava confusa ao ver todo mundo. Ela
parecia nervosa, extremamente preocupada e aflita.
— Bom dia. — ela pigarreia, todos respondem, e ela tenta se acalmar. —
Tay, pode vir até em casa comigo??? — ela fala e nos deixa todos tensos.
— O que aconteceu??? — Hella logo questiona e Tay se levanta.
— Nada. Nada demais não, é só uma conversa que eu queria ter…
— Fala logo, Laura!
Tay diz fingindo estar calmo e Laura respira fundo olhando para Catarina.
— Yan, leva Cat para os estábulos… deixa ela dar uma volta antes de irem
pra casa. Sei que tô devendo esse item da nossa lista de compromissos.
Tay pede e Yan rapidamente se retira com Cat. Ela pula de felicidade e nem
nota que sua saída foi estratégica.
— Agora fala! — ele diz e Laura se aproxima.
— Eu não dormi em casa. Cheguei hoje bem cedo e vi o armário de remédios
da cozinha todo revirado. Entrei no seu quarto para perguntar sobre isso, e
encontrei Julia na banheira, toda coberta de remédios, alguns inteiros, outros
regurgitados, enfim, chamei uma ambulância. Você não atende esse celular…
eu…
— Que hospital???
Tay corre para pegar a chave e Laura responde o seguindo. Naquele momento
o clima de festa vai embora. Estavam todos em pânico e preocupados. Se eu
entendi bem, Julia saiu daqui depois de Catarina “tê-la expulsado”, e tentou
se matar. Se ela queria atenção, conseguiu.
— Vai me dizer que ninguém notou que é uma tática para chamar atenção?
— questiono quando fico incomodada com o silêncio fúnebre.
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— Eu sempre tive medo dessa mulher ser uma Felícia da vida. — Max
resmunga.
— Mesmo sendo tática, isso é um assunto muito sério, minha filha!!! Tay
precisa ajudá-la! — dona Jô diz com carinho.
— Ajudá-la uma óva…— eu resmungo e vejo Max rir.
— Fica calma, Ellen! Tudo vai ficar bem! Tay não vai cair na dela.
Lulu diz e não me convence. Tay sempre escolhe o lado errado, o lado que eu
não estou incluída.
— Essa moça é esperta! Fingir depressão é uma tática antiga e que muito
funciona. Tay vai se sentir culpado e vai ceder. Quando ceder vai aceitar
tudo, casar no papel, na igreja, com comunhão de bens e tudo!!!
Jon resmunga e Max olha torto pra ele.
— Ele não vai cair nessa. Meu filho, não!
Minha paciência se esgota, pego minha bolsa no sofá e falo: — Avisem Yan
que eu já volto, por favor. Vou dar uma saída. — eu falo.
— Vai aonde? — Max quer satisfações.
— Cuidar dos interesses de minha filha. — eu falo e Max levanta uma
sobrancelha.
— Tipo…?
— Tipo manter essa maluca longe das nossas vidas! Catarina começou e foi
muito bem, eu continuo a partir daqui. Eu voltei!
Eu falo e vejo a família toda sorrindo com alegria. Dou as costas para todo
mundo e caminho até meu carro. Saio da chácara e no caminho ligo para
Laura, Tay parecia não saber para que serve o celular.
Ela me passa o endereço — um hospital no centro da cidade vizinha. — e eu
acelero. Chego e os encontro na sala de espera. Tay parecia estar aflito e
preocupado demais. Só estavam os dois na sala. Eu chego e Laura se retira,
pelo menos os anos ajudaram e ela estava mais educada.
— Como ela está? — pergunto e ele levanta a cabeça me notando ali pela
primeira vez. Parecia extremamente triste e culpado.
— O que faz aqui?
— Vim te buscar. Vamos embora! Sua filha está na sua casa, combinou de
levá-la para andar de cavalo, não era para ter mandado Yan fazer isso, era pra
você fazer. Vai cuidar de sua filha!
— O que está dizendo???
— Tô dizendo que você precisa escolher o certo agora. Isso é uma tática pra
chamar sua atenção, mas não vou deixar você cair nessa!!! — eu falo e ele se
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levanta.
— Catarina está bem, preciso de notícias da Julia. Não posso abandoná-la.
— Laura está aí pra isso! Faça ela ficar de plantão e te ligar quando tiver
notícias. Vamos! — eu viro as costas e ele pega em meu braço.
— Você me ama? Está aqui porque me ama???
Ele questiona e eu respiro fundo. As palavras que saem de minha boca, me
cortam e me deixam sangrando por dentro.
— Não. Não amo. Estou aqui por Catarina. Nossa filha não gosta dela, ela fez
pouco caso e destratou a nossa filha! Então não vou deixar você cair nessa,
não vai casar com essa mulher baixa, ela não vai te dar filhos para competir
tua atenção com a minha filha. Essa daí não! Estou aqui para cuidar dos
interesses de minha filha, não por você, não te amo mais.
Eu falo e ele parece beirar o choro. Não fico mais nem um minuto olhando
pra ele, eu não conseguia. Dou as costas e começo a caminhar até o carro.
Saio do hospital, e vejo Laura sentada na mureta e falando no celular. Tay se
aproxima dela e eu espero para ouvir, porque sou dessas.
— Preciso ir pra casa, fique aqui e me dê notícias. Molhe a mão de alguém e
faça o que combinamos, sem erros, sem dar foras. — Tay diz e meu coração
acelera.
— Sim, senhor!!!
Laura diz sorridente, tira os óculos escuros que usava, e entra no hospital.
— O que vai fazer? Quero ela fora das nossas vidas, não morta!!!
Eu digo segurando em seu peito, mas ele se afasta de mim como se eu tivesse
uma doença.
— Não vou matar ninguém. Fica fora disso!!!
Ele diz e caminha até seu carro. Eu entro no meu, e “juntos”, vamos embora
dali.
— Tá me tratando assim por que eu disse que não te amo mais??? Depois de
tudo o que me fez, não devia ser novidade…
Pergunto depois de estacionar. Tay sai do carro e caminha rápido demais sem
me esperar.
— Não, tô te tratando assim, porque estou exausto! Você foi embora com
minha filha na barriga, não me contou nada, voltou, e colocou a minha vida
de ponta-cabeça! Volta praticamente casada coloca o seu noivo para sentar no
meu sofá, e acha que pode me exigir tudo. Eu estou cansado, Ellen!!!
Tay se vira para me olhar nos olhos e desabafa com fúria. Depois de
desabafar se aproxima mais de mim e posso sentir o cheiro de seu hálito e
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suas roupas limpas. O meu cheiro favorito do mundo todo. Ainda.


— E pra piorar, ainda diz que não me ama… você diz que não me ama. —
Tay tem seus olhos vermelhos, mas não saem lágrimas, ele parecia estar “por
aqui” comigo, triste e realmente cansado. Ele sussurra cansado e eu me sinto
péssima. — Escolheu não fugir de mim com minha filha depois que eu a
descobri. Escolheu ficar para me fazer pagar por tudo! Catarina é minha vida
e eu a amo, mas você está transformando a minha vida em um inferno!!!
Ele fala e meu coração se parte em mil pedaços. Eu sempre achei que ele não
conseguiria fazer aquilo novamente. Sempre achei que eu estava calejada o
suficiente, mas não, Tay ia sempre partir meu coração, não importava em
quais circunstâncias.
— Você é um babaca.
Eu digo sentindo aquela dor dos infernos e ele olha pra mim, força o maxilar
como Max faz e se aproxima de mim. Encosta sua testa na minha e passa os
polegares em minha face.
— Me perdoa. Eu tô cheio disso! Me perdoa. Eu amo você, mais que
qualquer outra coisa no mundo, nunca vou deixar de amar. Mas não me
machuque mais, não traga mais esse cara aqui, eu imploro!!! Eu passei minha
vida inteira te amando, e ainda amo. Já pedi perdão por tudo o que fiz, pago
até hoje pelo que fiz contigo, mas chega… pare de me machucar, você está
me fazendo sofrer e eu só te amo cada vez mais. Não faça mais isso, não o
traga mais aqui.
Eu sinto uma agonia gigantesca e o toco com minha boca em sua bochecha,
sem necessariamente beijá-lo. Eu só queria sentir o seu cheio, receber o seu
carinho… eu estava fora de mim, triste, e com saudade.
— Pensei que tinham se dado bem. Yan não odeia você!!! — eu falo e ele se
afasta para me olhar nos olhos.
— Ellen, seu noivo me odeia com todas as suas forças. Ele me odeia, ainda
mais do que eu o odeio. É por isso que está aqui dentro, é por isso que está se
aproximando de mim, apoiando você a me deixar ter contato com a Cat. Sabe
por que, princesa? Porque eu já te magoei demais, te fiz muito mal, te fiz
sofrer demais… ele quer que você volte a confiar em mim cegamente, porque
aí, com nossa filha envolvida, você não vai pensar duas vezes antes de acabar
comigo na próxima merda que eu fizer; tu vai embora, vai me processar, tirar
a Cat da minha vida, ou me fazer algum mal. Yan espera pacientemente que
eu parta seu coração de novo. Se sente ameaçado demais, e te ama demais!
Ele sabe que a gente se ama mais do que tudo, mesmo com as mágoas,
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mesmo com todas as brigas, mesmo com tudo de errado. Ele sabe que nosso
amor está intacto, é inteligente, sabe como fazer e o que fazer para me
destruir. Julia é uma boba “tentando se matar”, é com a tática de seu noivo
que eu estou preocupado! Ele quer assistir meu fracasso de camarote, mas ele
está completamente enganado e iludido! Não quero mais ele aqui! Não o
traga aqui, nunca mais!
Ele fala, me dá um beijo na testa e caminha até o casarão me deixando sem
reação. No campo aberto, lá em baixo, posso ver que Yan e Catarina
andavam de cavalos tranquilamente. Entro no casarão e encontro Max e Jon
na sala. Nina, dona Jô, Rafa, e tia Hella eu não via, mas os gêmeos corriam
pela sala de jantar brincando de patinar na neve usando as meias como patins,
e ainda vestindo pijamas.
— Trouxe seu homem pra casa, é assim que se faz!!!
Max zomba e me seguro para não mostrar o dedo do meio.
— Pois é. Eu trouxe. Vai me contar porque Jon está aqui, ou vou ter que
proibir a vinda de minha filha nesta casa? Porque se tiver um maníaco
ameaçando a família como sempre, não quero Catarina fazendo parte disso e
correndo o risco! — eu me sento no sofá da frente e os dois riem.
— Eu já disse o que ele faz aqui. Minha neta está segura! — Max diz e eu
finjo que acredito.
— Hum.
Eu resmungo e Tay volta da cozinha com um copo de suco, e um lanche nas
mãos. Ele senta ao lado de Jon, e o clima pesa com sua atitude. Tinha mais
espaço no meu sofá, mas ele se recusou. Aquilo fez Jon e Max me olharem
confusos.
— Como ela está? — Jon questiona.
— Não sei.
— Oras!? Não foi lá pra saber? — Max diz.
— O médico disse que ia fazer alguns exames e que logo voltaria. Mas, Ellen
chegou lá e me mandou vir embora.
Ele fala sem me olhar e Jon e Max dão risada.
— Isso é que é o amor…
Jon resmunga e minha face esquenta. Tay ri e me olha por um momento, mas
logo volta sua atenção para seu lanche enorme.
— O que você fez? Saiu de lá, e pronto…!? Cadê a Laura?
Max pergunta e Tay termina de mastigar o lanche. Não sei como pode comer
tanto e não engordar.
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— Ela ficou! Mandei ela fazer um serviço pra mim. Vai me dar notícias…
— O que você fez??? — Max já pergunta.
— Ele se preveniu. — Jon responde e Tay sorri pra ele.
— Não pode matar a garota! Julia não merece tanto! Ligue pra Laura, mude
esses planos, garoto!!!
Max fala cochichando e eles parecem ter esquecido que eu estava ali.
— Pai, você devia escutar mais o Jon, ele é muito inteligente!
Tay resmunga. Yan e Catarina entram na sala meia hora depois.
— Tay!!! Você não sabe! Eu andei de cavalo e ganhei na corrida com o
papai!!!
Cat grita e Tay olha para mim. O fato de Cat não o chamar de pai, mas
chamar o Yan, o incomoda demais. Olho para Yan e vejo seus olhos
brilharem com aquilo, só agora eu podia ver o que não via. Tay estava certo.
Yan se divertia com aquilo e queria ver Tay se foder de camarote.
— É filha!? Que legal! Acho que na próxima vez tem que competir comigo
pra ver se ganha de mim, não é!? — ele diz e ela sorri roubando seu copo de
suco.
— É claro! Vou ganhar também.
— Eu acho que não! Mas vamos ver… está com fome? Vamos fazer um
lanche???
— Vamos!!! Tô mortinha de fome!
Ela grita de novo, e todos olham sorridentes pra ela. Minha filha era brilhante
e muito amada.
Os dois vão pra cozinha, Yan se senta do meu lado e me abraça.
— E então, foi até lá pra saber da garota? Como ela está???
Ele questiona e eu encaro os dois que imediatamente se retiram.
— Bom, o médico ia fazer exames quando cheguei. Não quis esperar.
— E Tay veio contigo, nem ficou?
— Não, ele deixou a amiga dele lá, para dar notícias… acho que ela vai ficar
bem.
— Essa situação toda fica estranha já que Cat se aborreceu com ela, né!?
Pode colocar a culpa em nossa filha…
— Sim, é com isso que estou preocupada! Ela está enciumada, vai querer se
livrar da Cat…
Eu falo olhando pra ele e ganho um beijo no rosto. Tay e Catarina chegam na
sala com mais lanches, ela nos oferece, e se senta no tapete usando a mesinha
de centro como mesa de jantar da princesa. Tay se senta no sofá e começa
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devorar seu segundo lanche. Yan aperta o braço de forma possessiva em meu
pescoço, e começa acarinhar meus cabelos. Nesse momento Tay larga o seu
lanche demonstrando estar totalmente incomodado, o que o faz perder até a
fome, e eu me levanto. Não queria mais fazer aquilo.
— Vou procurar Lulu. Falar um pouquinho com ela. Quando Cat terminar me
chame, vamos pra casa! — eu digo e Yan concorda.
Eu subo as escadas e a encontro na janela de seu quarto.
— A princesa está trancafiada!? — eu questiono e ela sorri.
— Vem, senta aqui!!! — ela sobe em sua cama e eu faço o mesmo.
— Como você está??? — ela pergunta e eu não disfarço.
— Tô indo, não é!?
— Soube da Ritinha!!! Foi por causa dela que veio, né!? Ela vai ficar bem,
tenho certeza.
— Eu também! Ela só precisa aceitar o tratamento. Ela vai ficar bem,
também acredito muito nisso!!! Mas e você? Como você está?
Eu pergunto e ela corre olhar para o corredor, tranca a porta e volta pra cama.
— Tô aprontando. — ela ri. — Quero Jon pra mim!!! — ela fala e eu fico
sem ter o que falar.
— Como assim???
— Viajamos juntos para cuidar de um assunto de uma propriedade do sul por
ordem do papai, foi uma droga, discutimos, ele queria ser um guarda-costas
como meu pai mandou… mas acabei que dei em cima dele e ele me deu um
fora, e tem mais, ele sabe que tenho um namorado em NY.
Ela diz e não consigo fechar a boca. Meu Deus, estava tudo de cabeça pra
baixo.
— Começa do começo, Ana Luiza! Não estou entendendo nada do que você
está falando! — eu peço em choque e ela me conta tudo.
— Seu pai vai matar Jon!!! Por que ele ainda está aqui???
— Não sei!!! Não tenho a menor ideia. Penso que meu pai tenha pedido pra
ele ficar, pra tentar tirar isso a prova de alguma forma, ou Jon está tramando
algo. Não sei, Tay não sabe também. Enfim, quase tenho um treco toda vez
que ele passa por mim.
— Eu te acho muito nova pra tá metida nessa… mas também sei que não
adianta isso de colocar barreiras, afinal me envolvi com teu irmão ainda
muito criança. Sou suspeita pra falar.
— E como vocês estão? Você age como se o odiasse! Você o odeia???
Ela pergunta entristecida e eu olho pra ela. Algo me diz que para Lulu eu
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podia me abrir e eu não via a hora de poder me abrir com alguém…


— Eu não queria voltar porque eu sabia que não estava pronta, sabia que meu
coração ainda não havia superado tudo. Eu amo teu irmão, não consigo ficar
perto dele, não consigo respirar quando o vejo, não consigo conciliar o que
acontece ao redor quando ele fica no mesmo ambiente. Eu o amo, Lulu, mais
do que nunca. Mais do que antes. E agora com Cat se aproximando dele, fica
tudo pior, eu fico vendo pai e filha convivendo e parece que Yan está no
lugar errado. Fui atrás dele, no sul, precisamos casar logo, preciso resolver
essa minha vida. Nunca mais vou confiar no seu irmão, mas é tão difícil, ficar
longe…
Eu digo e ela parece lamentar todos aqueles sentimentos confusos que faziam
parte de mim.
— Preciso confessar uma coisa: eu roubei aquele seu diário quando eu era
pequena, e dei pra ele assim que voltei de Nova York.
Lulu diz e eu jogo um travesseiro nela.
— Sua bruxa!!! — eu grito. — Sabe quanto tempo fiquei procurando por ele,
sua ladra de meia tigela!!! Não acredito! Por isso que ele disse algo sobre
“Príncipe montado em um cavalo”. Era assim que eu o descrevia! Te odeio,
Luiza! — eu digo e ela ri.
— Me perdoa! Foi para o bem dele! Não quero vê-lo casando com a Julia.
Gosto dela, não nego, mas prefiro você!!!
— Gosta dela, sua traíra? Sua sobrinha disse que a amada Julia, olha pra ela
com cara feia quando ninguém está olhando!!! — eu falo e ela fica surpresa.
— Não acredito!!! Que vadia!!!
— É, e você aí de fã número 1.
— Nunca notei isso, nunca percebi, e Cat também nunca disse nada…
— É! Ela disse assim que cheguei, nem Tay suspeitou! Ela foi me contando e
pude ver o ódio estampado na face dele, ou algo parecido com uma fúria sem
tamanho!!!
Eu falo e alguém bate na porta. Eu mesma atendo. Era Max.
— O que fazem de porta trancada?
Ele questiona e eu olho pra Lulu, que revira os olhos.
— Que papo é esse, Max???
— Não liga não, Ellen, ele está me investigando! Vai ver pensa que estou de
namorico no quarto com alguém!!! Mas relaxa pai, a Ellen não faz meu tipo!
— Lulu diz e era Max quem revirava os olhos.
— Só estou cuidando!!!
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— Cuidando ou me sufocando? Quer que eu vá embora? É só dizer!


— Pode chamar do que quiser! Eu digo que estou cuidando e pronto! Aliás
não vim ver se está de namorico, acho meio improvável já que estamos em
família. Só queria ver se não tinha saído sem falar nada! Já que pelo o que eu
soube, você é boa em dar perdidos e deixar o celular em casa… — Max entra
e abraça a filha à força.
— Cada ano que passa mais estranho você fica! Não confia na própria
criação que deu pra filha. — eu resmungo e Max sorri pra mim.
— Não se intrometa!
— Me intrometo, sim. Deixa a menina namorar e ser feliz, ela já está na
idade! É melhor embaixo do teu teto, do que na rua, longe do teu alcance!
Colocar ela numa redoma só vai piorar as coisas! — eu falo e dou um beijo
em Lulu. — Vou pra casa. Podemos combinar de sair, o que acha!? Só nós
duas! Sem interrupções? — ergo uma sobrancelha para Max e ele ri.
— Vamos! Eu vou amar, cunhadinha!!! — ela diz e eu faço cara feia.
Saio e dou de cara com Tay falando no telefone, andando pra lá e pra cá no
corredor.
—… Tudo bem. Estou indo!!!
Ele fala, me vê, e entra em seu quarto, obviamente eu vou atrás.
— Quem era? — pergunto.
— Ninguém.
— Era Laura? Vai atrás daquela mulher???
Eu perunto e ele me olha torto. Ele pega um casaco, algo que parece com
uma carteira e passa por mim para sair do quarto, mas eu não deixo.
— Vai atrás dela?
— Vou me despedir de minha filha! Você já vai!? Quando vou poder vê-la de
novo? — ele muda de assunto e tira minha mão de seu braço.
— Vai atrás dela???
— Vou resolver um problema na rua, assim que minha filha ir pra casa. O
que eu faço quando ela não está, você não precisa saber!
Ele diz e eu me aproximo dele, me enrosco em seu pescoço e encosto meu
nariz no seu. Eu queria tanto beijá-lo, mas eu não faria isso. Não nessa vida.
Eu não podia.
— Diz que não vai atrás dela. Diz que vai escolher o certo. Sou a mãe de tua
filha, não quero te dividir…
Eu sussurro e ele toca minha cintura com sua mão enorme e forte.
Ele cheira meu pescoço e eu me aproximo ainda mais de seu corpo, só pra
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ver seu músculo crescendo por mim, de novo, depois de muitos anos sem
presenciar aquilo. Eu estava morrendo de saudade de ver ele duro por mim.
— Ôh! Minha princesa linda. O que você tem gostosa e sensual, tem de
manipuladora, tal mãe, tal filha, não é!? Mas não se preocupe, não gaste suas
energias tentando me seduzir para conseguir o que quer. Julia já perdeu
quando te vi naquele quintal se fazendo de muda. Eu só quero saber de minha
filha, escolho ficar sozinho e virar um padre, mesmo se você decidir casar
com aquele pela-saco. Não quero saber dela, não vou cair em sua chantagem
emocional. Vou te mostrar que não sou um tolo como todo mundo pensa.
Cometi o erro de deixar você partir, e vou pagar por isso enquanto estiver
vivo, mas com você de novo na minha vida, não quero saber de mulher
nenhuma, não tenho olhos pra ninguém. Eu te amo e escolho você mesmo
que ainda não possa mais me escolher. Eu escolho viver para Catarina, e
escolho te amar pelo resto da minha vida, mesmo que você agora decida
escolher não me corresponder!!!
Ele diz me olhando nos olhos, e quando fita minha boca, eu me entrego.
Minhas lágrimas caem se misturando ao beijo e ele não liga. Chupa minha
língua como se aquilo fosse a última coisa que faria em vida. Eu correspondo
sem culpa e me enrosco em seu pescoço, um parece prestes a engolir o outro,
com força, e com muita vontade. Ali procuro confessar o que eu nunca diria
em voz alta e pela sua atitude, seus beijos, e a suas mãos que tentavam matar
a saudade de meu corpo, ele dizia ter entendido. Ele encosta minha costas na
parede sem muita delicadeza, mata a minha saudade, e pressiona sua
intimidade na minha.
Logo Tay para com o beijo e noto seu rosto molhado, não sei se pelas minhas
lágrimas ou se também chorou. Ele encosta seu rosto no meu e ficamos os
dois tentando controlar a respiração, controlar os ânimos para não passar do
ponto. Depois de recomposto, ele dá um passo pra trás e vai até o espelho na
parede.
— Eu tirei todo seu batom. As nossas bocas estão vermelhas. Corrija isso
antes de descer.
Ele diz se limpando e acho incrível da parte dele não querer me prejudicar,
usar isso contra Yan. Eu vou até o espelho do banheiro, limpo tudo, e quando
volto ele não está mais lá.
— Vamos embora meu amor!?
Eu digo para Cat e ela concorda com cara de choro.
Yan me olha com uma cara estranha e eu correspondo seu olhar.
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— Tchau, Tay! Prometo que depois eu volto!!!


Cat corre pra abraçar seu pai e fico olhando para a cena.
— Se prometeu, tem que cumprir, hein!? Acho que sua mãe vai deixar você
ir comigo ver uma escola bem legal pra você estudar! Você quer ir??? — ele
pergunta e Cat olha feliz pra mim.
— Só se tiver aula de Ballet!!!
— Se não tiver, a gente procura em outra escola, assim você faz nos finais de
semana!
— Tá, bem!
Ela sorri, beija e abraça ele. No abraço, Tay fecha os olhos e meu coração dói
por culpa. Me recuso a passar por aquilo, a sentir pena dele, ou me culpar, e
saio na frente. Yan vai com Cat se despedir de todos e eu vou pro carro
sozinha. Naquele momento tia Hella se aproxima do vidro.
— Quero saber se pode trazer Cat na fogueira? Vamos amar ter ela aqui!!! —
ela pede e eu respiro fundo.
— Posso ver se trago! Ou peço pro Yan trazer e depois vir buscá-la. Não
posso ficar vindo aqui, tia! — eu digo e ela parece querer chorar.
— Esse menino aqui, faz mal pro Tay. Ele sofre! Não quero vê-lo aqui! Eu
entendo sua decisão de seguir em frente, tenho consciência de todo mal que
Tay te causou! Mas não posso ver meu filho sofrendo, não posso e não vou.
Ele já pagou tudo o que fez quando viu que perdeu a infância da própria filha,
por puro orgulho. Faça isso parar Ellen! Já chega!!! Se não quiser participar,
e você seria muito bem vinda, afinal os olhos do meu filho brilham ao te ver,
é só me dizer e eu mesma busco Cat. Mas não quero mais esse rapaz aqui!
Me desculpe. — ela diz e eu entendo.
— Tudo bem! Ele me disse que se sente mal… Yan não virá mais aqui! Eu
prometo!
Eu falo e ela me dá um beijo no rosto e vai embora. Logo vejo Yan e Cat
caminhando até o carro.

— E então!? Como se sente? Recebeu notícias?


Yan me pergunta na mesa do café.
— Eu tô bem, todos sabem que não quero notícias, não vão me ligar!
— Entendi.
— Vou levar a Cat lá, mais tarde. Talvez ela durma lá, e a gente possa sair,
ver um cinema… qualquer coisa!!! — eu falo e ele sorri.
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— Você poderia ficar na festa! Não tem problema…


— Yan, para!
— Qual é o problema?
— Qual é o seu problema??? Para de me empurrar pra ele!!!
— Não estou fazendo isso. Só não quero sair hoje! Leve Cat, e fique,
aproveite a festa! Só isso…
— Sei o que está fazendo, mas não vai funcionar!!!
Eu digo e antes dele perguntar o que é, minha mãe entra na cozinha contando
as novidades de Ritinha. Ela havia aceitado o tratamento e ela com tio Renan,
tinham a levado para o hospital.
— E tenho mais novidades, viu. Acho que seu tio arrumou uma namorada! —
ela diz rindo e eu fico imensamente feliz.
— Nossa. Que bom, mãe!!! Cadê ele?
— Então, atendeu o celular e saiu.
Ela ri ainda mais e eu já ganho meu dia. Meu tio merecia!
Naquele momento a porta da cozinha estava aberta e eu podia ver Cat
brincando com suas milhares de Barbie's novas. Ela já havia tomado café e
saiu correndo para abrir as caixas. Eram muitas. De repente ela corre para o
portão, quase enfia a cabecinha pelo vão, e sai pra rua. Corro atrás dela e vejo
o que ela queria. Ela tinha escutado o barulho do carro de Tay, e queria vê-lo.
Ele chegava em casa com Julia no banco do carona. Logo Cat trava ao ver a
“bruxa má” lá dentro.
— Menina!!! O que está fazendo???
Eu grito e ela me ignora. Me aproximo e tento tirará-la de lá, mas ela não
deixa. Ela ia abraçar Tay, mas hesitou.
— O que ela faz no teu carro? — Cat pergunta e Tay parece inseguro.
— Eu só estou ajudando! Ela acabou de sair do hospital e eu fui buscá-la. Ela
ficou muito doente, precisou da minha ajuda!!! — ele fala e ela cruza os
braços.
— Você disse que eu não ia mais vê-la. Olha lá, como ela está me olhando!!!
Tay e eu olhamos para ela, e Julia parecia entediada e arrogante. Nos olhava
como se tivéssemos atrapalhando. E na verdade estávamos mesmo.
— Vem filha, vamos entrar!!! Tay está ocupado, agora!
Eu digo e Cat olha pra mim já ameaçando chorar, mas obedece.
— Não vai me dar um beijo de despedida?
Tay questiona e eu paro para esperar caso ela fosse se despedir. Mas Cat o
ignora, solta minha mão, e corre pra dentro de casa. Eu o olho, e não consigo
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lamentar. Eu mesma não podia fazer nada, não ia obrigar Cat a engolir a
madrasta.
— O que houve?
Yan e minha mãe questionam. Pelo jeito Cat passou batido e se trancou no
quarto.
— Ela viu Tay chegar e correu para dar um “oi”, mas quando viu Julia dentro
do carro, ela se decepcionou!
— Mas por quê, meu Deus? — minha mãe pergunta.
— Ela diz que a madrasta não é “boa bisca”, diz que olha feio pra ela quando
ninguém tá olhando!
— Credo! Pra que tratar uma criança que não tem culpa de nada, assim??? —
minha mãe fica indignada.
— Tá voltando do hospital… tentou se matar!!! Ela é uma surtada, mãe!
Eu digo e minha mãe solta um: ‘MISERICÓRDIA!!!’ que me faz rir. Vejo
Yan me encarando e ignoro. Não ia esconder o quanto achava aquela morena
linda, um porre!!! O que tinha de deusa, tinha de tonta.
Nesse momento seu Renan entra e começo com as perguntas. Ele nega tudo e
logo foge.
— Bom, vou dar uma saída agora pela manhã. Vou ir ao banco e resolver
algumas pendências do hotel. Cuidar de tudo a distância é complicado! Quer
algo da rua?
Ele se levanta e me questiona. Eu digo não, então ele beija minha boca, e sai.
Dá seis horas da tarde e nada dele voltar. Eu ligo e só da caixa-postal.
Vou até o quarto e encontro Cat brincando de Barbie na cama. Depois do
acontecido naquela manhã, ela ficou amuadinha o dia todo.
— Ei, vamos tomar um banho para eu te levar na fogueira, lá na chácara?
Eu me sento na cama e ela não me olha nos olhos.
— Não quero ir!
— Por que não??? Vai ser legal, filha!
— Mas eu não quero!
Ela diz emburrada e eu não insisto. Na mesma hora Tay me liga.
— Olha é o Tay. Aposto que quer saber se você vai!!!

— Oi. Ela já está arrumada? Vai trazê-la, ou posso ir buscar?


— Ela está chateada. Não quer ir!
— Fala sério!!! Por que não?
— Por que você acha!? Deixa ela, outro dia vocês se vêem!
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— Não vê não!!! — Cat grita.


— Ouviu?
— Ouvi! Passa o telefone pra ela!
Eu passo e quase que Cat se nega a atender, coloco no viva-voz porque sou
dessas, e escuto tudo.
— Oi, princesa? Por que não quer vir ficar com a gente na festa?
— Porque não…
— Me fala!
— Não quero ver a bruxa má! Você mentiu pra mim!
— Eu não menti, ela precisava da minha ajuda, princesa! Você entende que
antes de eu te conhecer eu era casado com ela?
— Não.
— Então, eu era! Mas escuta… depois que você ficou brava comigo, eu
ajudei ela se deitar, dei os remédios que o médico mandou, e a levei pra casa
dela. Entendeu? Você não vai mais vê-la! Eu te prometo, nunca mais vai vê-
la! Ela foi embora, deixei a mãe dela cuidando dela! Eu fiz por ela, o que eu
faria por qualquer pessoa que precisasse de ajuda, entende? Ela nunca mais
vai te destratar, nunca mais vai olhar feio pra você! Eu fiz isso por você!
— Tá bem!!!
— Amigos de novo?
— Sim. Mas precisamos ir ao parque de novo, e comprar as roupas das
Barbie’s!
— Já entendi. — Tay ri. — Preciso pagar pela tua confiança.
— Primeiro Cat, as namoradas tem que amar Cat. Ela não me ama!
— É verdade!!! — ele ri novamente. — Foi isso mesmo o que eu disse!
Agora vai tomar um banho e ficar linda, porque vou te buscar! Está bem?
— Tá bem.
Cat me dá o telefone, eu tiro do viva-voz e coloco no ouvido para ver se ele
já tinha desligado.
— Está aí? — ele questiona.
— Estou. Vim ver se você desligou!
— Ouviu o que eu disse?
— Ouvi.
— Eu a levei embora! Só precisei ir buscá-la, não tinha ninguém pra fazer
isso. Já tirei ela das nossas vidas!
— Ótimo!
— Eu te amo, Ellen.
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— Tanto faz, Tay! E deixa que eu vou levar a Cat. Não precisa vir até aqui.
— Por que?
— Por nada. Vou dar banho nela e a levo.
— Está bem. Tchau! — ele diz e eu desligo!
— Pronto, sua danadinha!!! Vamos tomar um banho!
Eu digo rindo e ela me estende os braços para vir para meu colo.

— Por que você não coloca um vestido de princesa também?


Cat me pergunta assim que termino seu cabelo.
— Mamãe não vai ficar, só vai te levar!
— Mas por quê?
— Porque sim!
— Ah! Mais eu quero que a mamãe fique comigo!
Ela fala fazendo manha e eu corto seu barato.
— Essa sua carinha de anjo só funciona com teu pai, garota! Nem tente fazer
isso comigo, porque você não vai conseguir! — eu falo e ela sorri.
Cat parecia uma princesa! Estava linda. Corro tomar um banho, ligo pro Yan,
e ele não atende novamente. Desisto de tentar e de me preocupar, e me
arrumo. Eu não sabia o porquê tentava ficar linda se só ia deixá-la na porta,
mas mesmo assim capricho. Coloco uma calça semelhante a uma legging,
preta, botas acima do joelho, blusa de manga comprida, e casaco. Estava
realmente linda.
— Como está gata minha mulher! Decidiu ir? — Yan entra no quarto e me
assusta.
— Posso saber onde você estava?
— Fiquei preso em um engarrafamento naquela avenida. Teve um acidente,
se pesquisar saberá que é verdade! E também demorei muito no banco,
procurei imobiliárias a tarde toda, vi uns planos, pesquisei, enfim… trouxe
tudo, depois te mostro!!! — ele diz e me beija.
— Hum… sei. Vou querer ver mesmo! — eu falo e ele sorri se deitando na
cama.
— Você está linda!!!
— Obrigada! Vou tentar não demorar! Está bem!?
— Tudo bem. Vou aproveitar e dormir um pouco! Se chegar e eu estiver
dormindo, me acorde!
Ele diz e eu concordo. Dou um beijo nele, e saio dali procurando por Cat.
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Dez minutos depois estaciono no lago.


— Vocês estão lindas!!!
Tay diz olhando para mim e para Catarina. Abraça a filha e me dá um beijo
demorado no rosto.
— Que bom que veio!!!
Tia Hella me diz e também diz o quanto estou bonita.
— Nossa essa minha nora está uma deusa!!
Max diz, Tia Hella ri olhando para Tay, e Tay fecha a cara.
— Sério, pai? Cuidado para minha mãe não ficar enciumada.
— Eu sei que seu pai só tem olhos pra mim! É melhor você se controlar, isso
sim!
Tia Hella diz e Tay se afasta levando Cat para dar um beijo em sua “biza”
como ela mesma diz!
A fogueira estava incrível, música boa tocando, muita comida, amigos da
família que moravam na redondeza. Estava incrível, apenas tinha uma
decoração mais requintada. Aposto que era coisa de Lulu.
— Oi gatinha! Tá linda, hein!? Gostou da décor? Toda minha!!!
Ela se aproxima de mim, e depois de fazer sua gracinha, me abraça com
gentileza.
— Sabia!!! Está maravilhosa, Lulu! — eu digo rindo e volto a olhar para o
lugar.
Em um canto mais afastado, Tay fingia dançar com Cat, mas na verdade só
ela dançava.
— Ele está lindo não é!? — Lulu questiona.
— Seu irmão pode vestir até saco de arroz. Ele fica lindo de qualquer jeito.
Um dia queria ver ele vestido com outras cores, sem ser esse preto de sempre.
Mas realmente a cor o veste como uma luva. Tay mostra em suas roupas,
como se sente por dentro!!!
— Mas eu não estava falando dele!!!
Lulu diz cantando e zombando de mim, e sinto meu rosto queimar como
brasa.
— Nossa… desculpe! De quem falava?
— Dele!!!
Ela olha para Jon e eu entendo. Jon era um homem muito bonito, e bom, os
dois fariam um belo par, se um sobrevivesse para fazer isso ser possível. O
que não ia acontecer, infelizmente.
— Vou fazer amor com meu caçador hoje. De hoje não passa. Eu sei que ele
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me quer, olha como ele me olha!!! Aposto que já está duro como rocha,
vendo esse corpinho aqui, em uma renda francesa!
Olho para Jon, e ele parece querer comer Lulu com os olhos. Ela estava
realmente linda com um vestido até o meio das coxas, todo de renda, estava
um encanto! Não tinha como não ser desejada por ele. Apenas dou risada.
— Você ri, é!? — Lulu diz e eu rio ainda mais.
— Acho melhor você disfarçar. Se seu pai pega esses seus olhares, ele mata
vocês dois!!!
Tia Hella se aproxima de nós duas, e faz carinho nos cabelos loiros de Lulu.
Ela dava seu recado sorrindo e, mas seu sorriso não chegava em seu olhar.
Tia Hella estava em pânico. Ela só diz e sai.
— Você não me contou que sua mãe sabia… — eu resmungo.
— Mas eu achei que ela não sabia!!!
Ela diz e me olha demonstrando estar em pânico também.
— Meu Deus…
Eu digo e tento voltar a respirar, mas não consigo.

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28
PAI

Como pode ser tão linda? Como pode me tirar o fôlego só de me olhar???
Ellen estava toda de preto, e eu que nem gosto de preto... a minha selvagem
estava deliciosa. Eu estava tão feliz, estava com minha pequena princesa e
minha rainha, bem ali. E eu que achei que tinha perdido minha princesinha,
tão ciumenta quanto a mãe. A mini-selvagem… Catarina estranhou Julia e
não havia quem a fizesse mudar de ideia. Coloquei Julia na cama, fiquei
andando de um lado pro outro e não consegui deixá-la ali, não sabendo que
tinha magoado Catarina. Ela me deixava completamente doido, a pequenina
já me tinha em suas mãos. Eu e Julia conversamos, e por incrível que pareça
disse que entendia, e que também queria voltar para sua casa. Não sou burro,
sei que ela vai aprontar uma hora ou outra, mas estarei preparado pra ela. Pra
ela e aquele gerente filho da puta!
— Dança assim, ó Tay!
Catarina roda pela clareira e não consigo dançar, só quero olhar pra ela. A
mãe dela fica ali, parada, só olhando. Não sei como descrever a vontade que
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eu tinha de tê-la em meus braços. Mas não podia ser o cachorro, ela estava
noiva, e eu precisava provar que a respeitava, que mudei, mas só Deus tinha
noção da força que eu fazia para me segurar.
— Quer dançar?
Eu pergunto para a morena mais linda da festa, quando Cat decide ir brincar
com seus primos.
— Não. E você nem sabe dançar, estava envergonhando sua própria filha.
Ela diz se segurando para não rir, e evitar me dar abertura.
— Se a Ritinha estivesse aqui, ela ia aceitar dançar comigo! Como ela está,
alias?
— Decidiu que vai se tratar, agora melhora!!!
— Que bom!
Resmungo e olho em volta procurando Cat, mas não a encontro. Ela saiu da
minha vista. Olho em todas as direções e não consigo vê-la. Dou um passo
pra frente e Ellen me puxa.
— Ali!
Ela aponta me mostrando Cat no colo de Lulu, e eu respiro aliviado.
— Precisa ficar mais atento… — Ellen resmunga e me sinto mal.
— Pois é, não posso deixar você me desconcentrar de novo. Vou ficar com
minha filha! — eu resmungo caminhando e ela ri.
— Não faz mais que obrigação. Finja que não estou aqui!
Ela que olhava pra Cat, de repente olha apra mim, e volta seu olhar para ela.
Decido me afastar para deixá-la sozinha. Acho que para ela era melhor
“sozinha do que mal acompanhada”.
— Prometo que farei o possível. Não volto mais a te importunar!
Eu digo sem demonstrar raiva e ela deixa seu sorriso desaparecer. Ponto pra
mim.
Me aproximo do grupinho que estava todo babando em minha filha e a escuto
falar sobre as Barbie’s novas. Ao me ver, Cat abre um sorriso gigantesco e
aponta pra mim.
— Ai ele disse, — ela aponta. — que vai me dar mais roupas, e me levar ao
parque…
— Nossa, que pai lindo você tem! — Lulu diz e Cat balança a cabeça.
— É meu pai número dois!
Ela diz e mostra o número dois com os dedinhos. Toda vez que ela me
lembrava que tinha Yan em sua vida meu coração sangrava.
— Não esquenta. Isso vai mudar… — meu pai resmunga baixo e bate no meu
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ombro.
— A mãe dela se casará com o pai número um, isso nunca vai mudar.
Eu digo e saio dali para esperar a dor passar. Doía demais, doía muito. E nada
podia fazer aquilo passar, sempre ia acontecer, e sempre ia doer. Catarina
sempre ia vê-lo como pai e eu como o “amigo da mamãe”, afinal, ele a viu
nascer, esteve com ela esses anos todos, e amor de pai e de mãe, ninguém
consegue tirar da pessoa. Mas a dor que eu sentia, toda vez que ela me falava
dele, tocava em seu nome, dizia o que ele fez, o que ele comprou, o que ele
achava… eu morria aos poucos por dentro. Era um sofrimento indescritível.
Sofrimento esse que eu estava fadado a passar pelo resto de minha vida. Por
culpa minha.
— O que seu pai disse, é verdade… a menina vai te ver como pai, é só
questão de tempo!
Jon se aproxima de mim, para me consolar, mas a dor ainda estava aqui.
— Jon, me desculpa, mas agora não quero falar disso. Quer me consolar?
Vamos mudar de assunto! Que tal o tema “minha irmã”? O que sente por ela?
— Pirou é???
— Ela me contou.
Eu olho para ele e aproveito que meu pai está longe.
— Droga de menina bocão!
— Ela confia em mim, e não pode passar por isso sozinha! Eu sei, minha mãe
sabe, e meu pai suspeita. O que faz aqui? Quer morrer na frente dela??? — eu
pergunto e ele coça a cabeça mostrando nervosismo.
— Estou protegendo a Ana. Seu pai pretende trancafiar sua irmã em um
colégio interno, e não vou deixar isso acontecer! Se acha que vai descobrir
algo, se isso acontecer, que eu esteja por perto, que eu consiga proteger sua
família toda da loucura dele. Por causa do que descobriu fuçando nas minhas
coisas enquanto eu estava fora, ele está de olho… sabe do namorado dela em
Nova York, suspeita que ela não é mais uma criança, sua princesinha! Não
vou deixar Max machucar a própria filha!
Ele diz e eu não consigo digerir e nem comentar sobre aquilo.
— Eu também não vou! Ele não vai fazer isso com ela. — eu falo e ele
assente.
— Não vai mesmo. Não enquanto eu estiver vivo!
— Então você a ama! Isso é bom.
Eu digo e me retiro dali. Mudar de assunto tinha afastado a dor. Se preocupar
com os problemas de Luiza me fez esquecer os meus.
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A moda de viola lenta e romântica tomava conta de tudo. Peguei na mão de


Lulu e ela colocou Cat no chão.
— A senhorita me daria a honra de uma dança, essa noite? — pergunto a ela
e todos riem.
— Ah! Se não fosse meu irmãozinho… — ela diz fingindo suspirar e
reponde.
— Claro meu senhor, com prazer!!! — ela sorri pra mim e eu abraço sua
cintura.
— Jon me contou que papai só quer um deslize para te levar para um colégio-
interno, ele disse que papai descobriu sobre seu namorado em Nova York, e
está beirando um surto psicótico por causa disso. Tome cuidado. Ele suspeita.
Jon diz que não vai embora até ter certeza de que você está segura. Eu acho
que ele ama você, se não, não se arriscaria tanto. Ele conhece papai, sabe do
que ele é capaz pela família, por você!
Eu digo baixo em seu ouvido e ela não diz nada. Apenas deita a cabeça no
meu ombro e fica dançando comigo ali, até a música brega acabar.
— Você está bem?
Quando a música acaba, ela se afasta e eu questiono. Lulu tinha seus olhos
vermelhos, e semblante arrasado. Ela me olha, faz um esforço pra sorrir, e a
vejo sair da clareira à francesa. Me aproximo das mesas dos doces, encho a
mão com o máximo que eu conseguia, e me mato de comer, era só o que eu
podia fazer. Ao levantar meus olhos, vejo Jon usando a mesma estratégia e
respiro fundo angustiado.
— Deus do céu, que essa noite se mantenha tranquila. Tenha misericórdia!
Eu resmungo como se Deus pudesse escutar e ajudar um assassino, e finjo
que funcionaria. Não custava tentar.
— Falando sozinho?
Uma moça bonita, achava que morava na chácara vizinha, se aproxima de
mim e puxa assunto.
— Sim, eu falo, muito!!! — eu digo e ela sorri.
— Quer dançar?
Ela pergunta e eu fico nervoso. Poderia aceitar por educação, mas Ellen ia
pensar que eu estava tentando provocá-la, então evitei.
— Bom, eu não sei dançar. Deixa pra próxima.
— Tudo bem.
Ela diz sorridente e eu saio de perto dela. Ellen fuzilava a garota morrendo de
ciúmes. Finjo não notar tentando segurar todos os doces sem derrubar no
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chão, e me sento em um tronco mais afastado para começar a comer um por


um. Nesse momento Cat se aproxima e eu me preparo psicologicamente para
a dor voltar. Muito provavelmente ela voltaria.
Ela pega um doce da minha mão, abre e come.
— Tá gostoso?
Ela se senta do meu lado e balança a cabeça. Catarina comia com vontade,
tinha um apetite como o meu. Era bom quando eu encontrava semelhanças
entre nós, ficava feliz.
— Tá muuuuito gostooooso!!!
Ela arregala os olhos, e reafirma. Ficamos ali até os doces estarem perto de
acabar, mas obviamente, sua mãe chega e estraga o nosso prazer.
— O que eu disse sobre comer tanto doces?
Ellen põe a mão na cintura e Cat arregala os olhos de novo.
— Mas meu pai deixou!!!
Ela aponta o dedo pra mim, e meu coração falha. Eu não sabia se ela queria
me ganhar só para ter sua defesa, mas como poderia saber que meu maior
sonho era me chamar de pai? Ninguém a mandaria fazer isso, ninguém ali
jogaria tão sujo, então pressuponho que ela disse porque se sentiu a vontade.
Eu me sentia o homem mais feliz e realizado do mundo.
— Você o chamou de pai?
Ellen se abaixa quando vê que não consigo dizer nada.
— Chamei, oras. Ele não é!?
Ela sacode os ombrinhos e eu sorrio fraco, ainda sem reação. Ellen sorri e
pede que ela leve alguns doces para sua tia, eu a puxo para um abraço
demorado demais, seguro o choro de emoção para não assustá-la, e deixo ela
ir.
— Tenho que dizer que foi mais rápido do que eu gostaria. Mas… — ela para
pra pensar se deve me dizer ou não. — Fico feliz por você, sei o quanto sofre
quando ela fala do Yan. Mas não vai se empolgando… Yan continuará sendo
seu verdadeiro pai, ela não vai deixar de considerá-lo, por mais que isso doa
em você… eu sei que…
Ela fica tagarelando para me tirar a felicidade, e eu lhe dou as costas
deixando-a falar sozinha.
— Tay! Tô falando com você!!! — ela grita e me puxa pelo braço. — Por
que me ignora? Eu estava falando. É pro teu bem, não quero magoar você,
nunca quis, falei pra você não ficar iludido e sofrendo!
— É pro meu bem, não! Tu tá querendo é me foder! É isso o que você quer.
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Quer cortar meu barato. Estragar meu momento. Não consegue assumir que
conquistei Catarina! Quer me ver sofrer, e não é pouco não! Quer me ver é
sofrer muito!!! Deveria ser difícil não é? Ela deveria me destratar, não é? Não
entende que eu fiz isso com meu pai porque era grande, já entendia??? Agora
Catarina não! Minha filha não tem motivos para me odiar, nunca a
abandonei, ela foi arrancada de mim!!! Tirada de mim!!! E não entende nada
assim, nem sabe o que é rancor, mágoa, raiva… ela é um anjo! Não continue
com isso, Ellen, se quer me esquecer, esqueça de vez, mas pare de me odiar.
Ou me perdoa de vez, completamente, ou me despreze! Não venha até minha
casa tentar me fazer mal! Seja melhor que eu, seja superior e se afasta de
mim!!!
Eu digo me sentindo um lixo e sinto as lágrimas molharem meu rosto. Paro
no meio do caminho, depois de dar as costas a ela, e seco o rosto. Vou até
Catarina e aviso que vou dormir. Ela diz “Tá bem, pai! Também vou dormir
aqui, mas agora não vou não!!!” e eu sorrio cheio de sentimento bom pra
ela. Eu estava no céu depois de ouvir ela me chamar de pai e não ia deixar
Ellen estragar o meu momento por pura vingança sem sentido. Subo o
pequeno morro, entro no casarão, subo as escadas, e bato a porta. Estava
exalando felicidade pela minha filha, e com raiva pela atitude de sua mãe.
Catarina quando chama Yan de pai, já me castiga o suficiente, mas ela não
entendia isso, ela queria sempre mais. Me jogo na cama e sinto meus
sentimentos se dividindo. Pensava em tudo o que vivi, em Ellen, nas nossas
brigas, no amor que a gente sentia, mas que pelo jeito o seu estava cada vez
mais diminuindo, e em todo o resto, os coadjuvantes, a capitã enjoada e
suicida, e o gerente pegajoso. Dois minutos depois Ellen entra no quarto atrás
de mim e eu reviro os olhos.
— Não adianta fazer cara feia, é a minha vez de falar e você vai me ouvir,
seu babaca mimado…
Ela começa a desabafar e depois do tema “morte do meu avô” eu já não
prestava mais atenção. Eu só olhava pra ela e sua voz não mais saía. Ela
gesticulava enquanto falava e eu olhava para seu corpo. Ela devia estar
xingando todos os meus ancestrais, mas eu não ouvia. Só a admirava. Sua
pele, seus olhos claros, sua boca carnuda, corpo violão, diferente do que era
antes da gravidez… sim, Ellen era praticamente reta, deliciosa, mas
magérrima. Agora tem curvas mais acentuadas, ganhou um bumbum novo,
seios maiores, ela estava ainda mais gostosa.
De repente ela se aproxima da cama, continua gritando parecendo se
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perguntar se eu estava ouvindo, mas eu ainda não a ouvia. Me sento na cama


e tenho acesso a seu corpo todo. Começo abrindo seu casaco, mas ela bate em
minha mão e continua falando. Tento de novo, mas ela faz o mesmo e então
me levanto e a beijo. Eu tinha sede dela, eu precisava urgentemente dela! No
primeiro momento ela me empurra, mas eu tento de novo e consigo. Nosso
beijo é quente e indescritível. Aperto seu corpo todo, mas não com grosseria,
eu não queria fodê-la, queria amá-la. Amá-la muito.
Quando parece se cansar de se perguntar se era isso mesmo que deveria fazer,
ela começa a tirar meu cinto com pressa e eu volto a ouvir sua voz.
— Eu te amo, entendeu? Seu mimado, babaca! Eu te amo!
Ela fala, chora, e tira minha roupa tudo ao mesmo tempo.
— Eu sei. Eu sei disso! E eu te amo ainda mais, você é a minha vida!
Eu digo e a coloco na cama. Tiro a minha roupa e depois a dela. Tudo
lentamente. Paro o ritmo! Eu não sabia se ela ia mudar de ideia, se aquilo
daria tempo para ela fugir, mas eu queria guardar aquela noite para o resto de
minha vida, mesmo que na manhã seguinte ela corra para se entregar ao
outro, só para tirar meu cheiro do seu corpo ou tentar me esquecer.
Começo chupando sua parte íntima, a parte que eu mais tinha saudade, meu
gosto favorito. Ela geme alto e eu me esqueço da porta aberta. Eu liguei o
botão do foda-se e não estava nem aí. Eu queria mais é que todos soubessem
que eu tinha aquela mulher de novo.
Antes de gozar, eu subo e dou atenção para seus seios enormes. Ellen estava
deliciosa. Faço isso com lentidão e ela se contorce embaixo de mim.
— Eu estava com tanta saudade… tanta saudade!!! Por que me mandou
embora da sua vida?
— Porque sou um babaca, um burro!!! Eu pastei todos esses anos me
lamentando e te procurando em outros corpos. Obviamente nunca mais fui
feliz, e sei que vou pagar por isso. Releve o que eu disse, você tem razão, —
eu toco sua intimidade e continuo falando. — nunca será o suficiente! Para
pagar por ter feito o que fiz e ter perdido você, mereço mais do que seu
desprezo! Muito mais. — entro dentro dela e continuo. — Olha isso… como
aguentei esses anos todos ficar sem esse corpo, sem essa mulher maravilhosa
que eu tanto me amava? Se nunca mais olhar na minha cara, é pouco! Eu
mereço que o caos se instale na minha vida, mas você é minha paz de
espírito!
Eu digo e começo a entrar e sair de dentro dela, com delicadeza. Eu nunca fiz
aquilo na minha vida, será que aquilo era amor? É aquela lentidão toda??? Eu
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devia ter outra forma de dizer o quanto a amava porque daquele jeito não
dava certo pra mim. Eu queria amá-la com força para a saudade ir embora,
para deixar marcas, ser como canivete. Eu queria tocá-la, mas não
superficialmente, eu queria ser a tempestade, pois calmaria não era do meu
feitio. Eu queria ouvir ela gritar bem alto porque eu sabia, que se ela tivesse
senso de justiça, ela nunca mais me perdoaria, e eu sabia que mesmo
mudando completamente, nunca mais eu ia merecer aquela dádiva que ela era
em minha vida. Eu queria que seus gritos ecoassem pela casa, balançassem
meus tímpanos, para que eu nunca mais esquecesse daquele momento,
porque sons baixos, quase não entram, e eu queria que entrassem em mim, e
uma possível dor de ouvido seria pouco... e encontrá-la para pegar minha
filha e notar sua ronquidão, seria um bálsamo. Eu queria marcas, e não era
nada parecido com lentidão, que as fariam parte de sua pele.
— Eu preciso de mais! Preciso de mais!
Eu resmungo enquanto ela beijava meu pescoço e gemia baixinho. Ela parece
não entender nada e antes de me perguntar algo a respeito, eu já estoco com
mais força. Ao invés de chamar minha atenção ela arreganha as pernas e
implora.
— Sim, mais!!!
A cama batia na parede, os quadros chacoalhavam, os gemidos no meu
ouvido aumentaram, as suas unhas encravaram-se nas minhas costas, e eu
subia ao céu como se tivesse sido lançado e não voando. Ellen era minha.
Pelo menos naquela noite, ela era minha.
— Oh! Tay… não para!!! — ela implora e eu sorrio.
— Não quero parar nunca mais, mulher. Nunca mais!
Continuo metendo com força e com força falo do meu amor. O barulho que
nosso atrito fazia era poesia, arte pura. Pura música! Aumento a velocidade e
a vejo revirar os olhos.
— Goza em mim, minha selvagem! Goza.
Eu vou mais fundo e com mais força e não paro até sentir tudo esquentar
ainda mais lá dentro. Demoro para sair de dentro dela e quando saio, beijo
sua boca.
— Me perdoa, Ellen. Por favor, me perdoa! — imploro olhando em seus
olhos.
— Perdoo. Eu perdoo.
Ela diz e me sinto o homem mais feliz do mundo. Faço ela se sentar em mim,
e tiro seu cabelo molhado de sua testa.
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— Você é meu homem. Vai ser pra sempre.


Ela diz rebolando e esfregando o ponto mágico, como sempre gostou de
fazer.
— Vou ser pra sempre, eu prometo.
Eu confirmo e ela começa a cavalgar. Me deito na cama e admiro a cena, seus
seios e cabelos balançam como se o quarto tivesse vento. Parecia uma deusa.
Uma deusa em seu cavalo. Ela geme e não para de pular, quando sinto que
estou chegando lá, me levanto e ajudo ela pular com mais vontade.
Novamente vejo a deliciosa revirando os olhos e seus gemidos ficam finos e
dengosos demais. Só isso já é o suficiente para saber que já chegava lá. Ela
goza de novo enquanto eu acompanho e chegamos juntos no paraíso.
Repetimos tudo de novo, e de novo, e não paramos enquanto o sol não bateu
na janela.

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29
PRIVACIDADE

Pelo ponto de vista de Ana Luiza Eu não sabia o que meu pai planejava,
não sabia que sua proteção ultrapassaria os limites do bom senso. Eu sempre
soube que tinha um pai ciumento, possessivo, agora preferir me ver
trancafiada longe, a me ver namorando, pra mim já era surreal demais!
Colégio interno? Era pra tanto? Por que não me disse que descobriu sobre
Chris? Pra que esconder o fato ao invés de vir falar comigo? Eu tinha a
impressão de que meu pai maquinava algo, uma ruindade sem tamanho.
Porque eu podia jurar que se ele soubesse sobre Chris faria um escândalo no
ato! Eu estava assustada, nervosa, me sentia triste por saber de seus planos,
decepcionada e com muito, mas muito medo.

Debruço-me sobre a pia e respiro fundo, bebo um copo de água como se água
fosse calmante, e começo a pensar em uma forma de me ver livre do meu pai,
uma forma de pará-lo quando toda a merda fosse jogada no ventilador,
quando sua fúria chegasse no auge. Obviamente nada me veio. Cada minuto
que eu passava pensando naquilo, mais desesperada eu ficava. Eu ainda podia
ouvir a música caipira que tocava do lado de fora, e nesse momento escuto
passos em minha direção e seco as lágrimas de pavor que borravam minha
maquiagem e provavelmente deixavam meus olhos vermelhos e inchados.
— Você está bem? Te vi fugindo…
Jon entra na cozinha e se aproxima.
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— Não. Não estou, Tay me contou tudo…


Eu digo e ele dá mais alguns passos em minha direção.
— Eu imaginei, por isso vim!
Ele diz e eu acabo com nossa distância, chegando ainda mais perto dele. Ele
toca minha face e eu o abraço voltando a chorar.
— Ele vai me mandar pra Austrália, como você disse… como vou ficar em
um colégio interno? Como vai ser a minha vida???
— Ele não vai fazer isso, você é maior de idade e eu não vou deixar,
entendeu? Eu não vou deixar ele fazer isso com você! Por isso estou aqui,
vou te proteger!
Ele diz e meu coração fica acelerado. Eu queria Jon mais que tudo,
simplesmente por estar tão carente e triste.
— Vai embora, se ele me vir com você vai matar nós dois. Vai matar você!
— eu digo e me afasto.
— Seu pai suspeita. Você mesma nos entregou aparecendo brava comigo
aqui. Já era, Ana! Eu não tenho medo dele.
— Estava brava com razão. Você não tem, mas eu tenho! E gostei do Ana,
ninguém me chama assim!
Eu começo a falar com amargura e depois sorrio ao ouvir como soava meu
primeiro nome em sua voz.
— Eu já disse que não vou embora, ele não vai te fazer mal algum! E me
desculpe por tudo o que fiz e falei lá, eu estava realmente com medo, fiz e
falei bobagem, — ele se aproxima novamente e meu coração para. — tive
ciúmes, realmente deixei você fugir para te rastrear… estava certa o tempo
todo!
Jon falava baiixinho, e voltava a caminhar em minha direção.
— Certa em tudo? Você ter me desejado não foi coisa da minha cabeça?
— Não. Eu te queria do mesmo jeito que quero agora. — Jon me alcança e
toca minha nuca — Como é que eu consigo evitar estragar tudo com você
desfilando assim na minha cara? Quero rasgar esse vestido todo, aliás… quer
me matar do coração se vestindo assim???
Ele diz com a voz rouca e minha parte íntima começa a latejar.
— Jon… esse vestido custa uma parcela do seu salário na força aérea!
— Acredite em mim, posso comprar um desses por dia, só para pagar o
estrago, e te mimar! Se eu vivesse só com o salário da FAB, estava passando
fome!
Ele fala e nós dois rimos. Jon me fazia esquecer da loucura do meu pai, dos
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meus problemas, e do tempo.


— O que você faz, Jon? Fora cuidar dos assuntos de meu pai e da
administração da FAB de Pirassununga? — eu pergunto, ele para de sorrir e
se afasta.
— Espiono, investigo, caço…
— Mata também??? — pergunto e ele não responde.
— Seu silêncio diz tudo!
Eu digo e sento-me à mesa. Era arriscado ficar perto dele. Ele vê minha
atitude como uma fuga e decide se sentar em minha frente. Toda sua atitude,
seu modo de andar, de olhar como se tivesse tentando ler minha reação,
expressões corporais… tudo era semelhante a um caçador sondando a presa,
tudo!
Ele fica calado só me olhando, não diz nada, não pergunta nada, e só me olha
nos olhos.
Naquele momento meu pai entra na cozinha e eu fico tentando controlar a
respiração. Do jeito que Jon estava, Jon ficou, não mudou sua expressão em
nenhum momento, parecia querer ver como eu reagia com meu pai por perto.
Meu pai ali, entrando na cozinha e pegando nós dois, não era sua maior
preocupação, sua preocupação era olhar pra mim, era me estudar, me
conhecer.
— Estava procurando os dois! O que fazem aqui? Jon???
Meu pai tenta entender o que ele tinha, Jon parecia ter sido paralisado.
— Conversando, estou sendo interrogado!
Jon diz e ri. Nesse momento meu pai parece relaxar.
— Só perguntei oras, que mal tem?
Eu falo tentando não estragar tudo com a minha voz toda desregulada.
— O que perguntou a ele, filha ?
— Se ele já matou alguém!
— E o que você disse, Jon?
— Eu não disse.
Jon responde sorrindo para meu pai, e meu pai devolve a gentileza.
— Fico feliz em saber que fizeram as pazes! Agora vem, vocês dois! Vamos
voltar pra festa! — meu pai diz e eu me levanto.
— Não pai, já vou dormir.
Chego perto dele e dou um beijo em seu rosto para me despedir.
— Você está com o olho vermelho. Chorou, é?
— Chorei.
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— Por que??? O que Jon aprontou dessa vez?


— Pai, pare de culpar Jon por tudo o que acontece comigo! Chorei porque
não quero mais ser vigiada, seguida, exposta, não quero mais que invadem a
minha privacidade, nem que fiquem no meu pé.
— Mas quem está fazendo isso?
— Você, pai! Pare de me perseguir e me deixe viver!
— Eu não estou fazendo isso, filha!
— Ah! Não? Então o que faz aqui?
Eu pergunto e ele olha pra Jon. Jon já ia saindo para nos dar privacidade, mas
meu pai o faz ficar.
— Só vim te procurar, achei estranha tua ausência! Qual é o problema, Ana
Luiza?
— O que está acontecendo?
Minha mãe entra na cozinha e parece em pânico com a cena.
— Estou pedindo para meu pai parar de me controlar! Ele já veio atrás de
mim, não quero ninguém atrás de mim! — eu praticamente grito e depois
volto a me controlar.
— Max…— minha mãe começa e se cala quando ele olha pra ela.
— Já tenho dezoito, pai. Já sou maior, sou independente mesmo você não
aceitando isso, e não quero que fique atrás de mim. Tenho meus direitos de ir
e vir constituídos pela lei. Sou maior, quero poder beijar na boca, namorar,
amar alguém, sem que eu precise ficar com medo de você. Quero poder sair
de uma festa, ou entrar nela, sem Jon ou você, na minha cola. Se você não
mudar de ideia e de atitude comigo, vou embora e não piso mais aqui. Você
pode me ameaçar com os cartões, com minha conta corrente, com tudo! Se
não parar com isso, eu desapareço! — eu digo e ele parece segurar uma fúria.
— Eu não estou entendendo o porquê de tudo isso. — minha mãe diz
nervosa.
— Ela só está se rebelando porque eu vim atrás dela. Não a vi na clareira e
vim procurá-la! A minha única filha, criada como uma princesa, com tudo o
que tem de melhor nesse mundo, virou uma rebelde sem causa. — meu pai
responde minha mãe se segurando.
— Vamos lá, pai, vamos ser realistas e bem sinceros aqui… você faz tudo o
que faz com orgulho então mantenha essa honra e pare com o cinismo!!!
— Acha que pode medir forças comigo? — sua fúria se faz presente. — Eu
troquei muitas fraldas suas enquanto tua mãe descansava de madrugada
menina!!!
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— Pois é, mas aquele tempo já passou. Não uso mais fraldas. É isso que você
precisa entender, hoje uso Victoria Secrets. Confortáveis e sexy.
Eu falo e minha mãe chega mais perto dele. Eu tinha a família mais bizarra
do mundo.
— Você está de castigo, não vai sair do quarto até entender e aceitar quem eu
sou! Sem telefone, sem cartões, sem carro, sem visitas, sem nada! Sua mãe te
levará as refeições no quarto, não sairá nem pro corredor. Até me pedir
perdão por ser tão mal educada, sem noção, e desrespeitosa. Principalmente
por tanta ingratidão. Eu te dei a minha vida e você está pisando nela!
— Max…
Jon começa e eu levanto a mão para pará-lo. Jon estava bem atrás de mim, eu
não podia vê-lo, mas só me sentia segura porque ele estava ali.
— Não esquenta, Jon! Eu achei que poderia ser pior do que isso, por isso
chorava pelos cantos. Ficar trancafiada aqui não vai ser um problema, já me
sinto prisioneira desde que coloquei meus pés aqui dentro. — eu me
aproximo e olho bem nos olhos dele. — Bem que Ellen disse, você é tão
ruim, mas tão ruim, que não confia na própria educação que me deu, e você
tem razão em não confiar na capacidade de ser bom pai, afinal, foi um horror
pro Tay, agora está sendo péssimo comigo. Não vou gritar e dizer que te
odeio, porque sei que isso é bobagem, não sou pré-adolescente, não odeio
você. Eu só… — o meço de cima a baixo. — tenho pena, me sinto triste. Não
te odeio, mas também não tenho mais orgulho de ser filha de quem sou, não é
mais o melhor pai do mundo, me diminui, me prende, me trancafia, me
espiona, me castiga sem motivo, me ameaça… você é uma péssima pessoa,
vai se arrepender de tudo o que está fazendo, e quando escutar minha mãe,
escutar Jon, Tay, e o resto da família toda e se tocar que me deve um pedido
de perdão e me libertar, eu vou dizer que não aceito, vou arrumar as minhas
malas, e você nunca mais vai ver meu rosto. E não escute a mamãe quando
ela te disser que falo essas palavras porque eu estou nervosa, que foi na hora
da raiva, porque é mentira. Não estou com raiva, só decepcionada.
Eu digo e caminho de cabeça erguida até a minha cela.

Entro no meu quarto e choro demais, choro por tudo, choro de soluçar, até a
vontade passar e demorou viu!? Uma hora depois, como eu previa, minha
mãe entra no quarto. Ela tem os olhos vermelhos, e um molho de chaves nas
mãos.
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— Não sou o Tay, não preciso do seu cafuné! — eu falo e ela se senta na
cama.
— Sei que não é ele! Vocês são muito diferentes. Tay nunca foi tão invadido
como você foi, e em contrapartida nunca falaria aquelas coisas horrorosas
para seu pai! Não tô dizendo que ele está certo, nem que você está errada,
mas ele é retrogrado como o seu avô, e você escolheu o modo mais difícil de
resolver as coisas. Eu podia te ajudar, Tay podia, deveria ter falado comigo,
mas não…
— MÃE, SOU MAIOR DE IDADE, SOU LIVRE, TENHO
INDEPENDÊNCIA, TENHO MINHA PRÓPRIA VIDA LÁ FORA E NÃO
SOU MAIS UM BEBÊ!!! — eu não grito, mas aumento o tom de voz.
— Mas gritar comigo não adianta. Filha, seu pai é obcecado pela família, por
você… ele não entende que não pode mais proteger a princesinha dele, que
não pode pegá-la no colo. Você fez seu pai mudar pra melhor, salvou a vida
dele, a sanidade dele, você é o milagre da vida dele, e perder isso, é como se
tudo fosse voltar como era antes. Ele tem medo dos fantasmas dele, tem
medo de que o que vivia antes de você nascer, volte a assombrá-lo. Seu pai
tem medo de perder você! Tem como tentar entender isso? Ele não tem mais
sua idade, não tem sua cabeça.
— Para de justificar a loucura dele, para! Nada justifica o que ele está
fazendo! Ele prefere me ver mal, triste, chorando, do que me ver feliz e livre!
Mas que inferno de amor é esse? Isso não é amor não, mãe! Isso é doença,
precisa de tratamento! A hora que eu conseguir que alguém me traga um
telefone aqui, vou denunciá-lo por cárcere! Se for ter que tirar a liberdade
dele, só para eu ter a minha, vou tirar sem pestanejar! Ele não pensou duas
vezes antes de me fazer mal. Tay me contou que ele só espera uma “bola
fora” pra me jogar em um colégio interno na Austrália! Soube do meu
namoro em NY, suspeita de Jon, ele é maquiavélico! Está só esperando as
coisas virem à tona, tá no meu pé, notou que Jon e eu sumimos e foi atrás!
Ele acha que pode tomar conta da minha vida, mas não pode não!!!
— Fica calma, filha! Por favor. Eu vou resolver isso…
— Ah! Mãe, me poupe! Nem se você realmente pedir o divórcio ele mudará.
Não vai mudar nunca, é igual o vovô, quer dizer, pior que o vovô. Mesmo
porque, seu Luis a gente até entendia, nasceu em outra época, era outro
tempo, outra cabeça, mas ele não. Pelo o que passou contigo, na idade que
vocês tinham, devia se colocar no meu lugar! O tempo passou ó — eu estalo
os dedos. — pra caramba! Faz muitos anos que esse método de educação
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passou. Nem é mais recomendado, é crime mesmo. É loucura!


— Luiza, o que você quer que eu faça?
Minha mãe pergunta e vejo uma lágrima cair de seus olhos. Ela não sabia o
que fazer, coitada.
— Nada mãe, você não pode me ajudar, ninguém pode! Agora sai, — eu olho
para a sua chave e respiro fundo. — pode trancar!
Eu falo e ela chora ainda mais, ela vai até a minha bolsa, tira apenas um
cartão de bandeira nacional e coloca na cama. Se aproxima de mim, tira do
bolso da blusa um aparelho de telefone que eu nunca vi, uma cópia da chave
que eu imaginava ser da porta, me abraça e me beija.
— Não vou te dar o RG porque é o primeiro item que ele vai procurar. Pode
tentar fugir se quiser, mas ele está totalmente arruinado com tudo o que ouviu
de você, então nem dormir ele vai. Vai ficar acordado a noite toda como em
todas às vezes quando fica triste, ou preocupado contigo. — ela lamenta pelo
marido e eu entendo. — Só tome cuidado, use esse telefone para chamar a
polícia se quiser, pelo menos ele é detido e você conseguirá sair. De qualquer
forma, não faça nada que você possa se arrepender faça o que tem certeza!
Ele está gritando com Jon por tentar te defender lá no escritório, então você
tem alguns minutos para chegar até o carro. Vou tentar distraí-lo! Ficarei na
sala, se decidir ir e descer, eu entro no escritório e simulo um ataque ou
começo a gritar, sei lá, qualquer coisa!
Ela sorri sem graça nenhuma, beija minha testa, e sai trancando a porta.
Eu não tinha fugir como uma opção válida. Se meu pai não fosse atrás de
mim, Jon iria por ficar preocupado. Ele me traria de volta pra casa, e eu ia
gastar minhas energias à toa e se não fizesse isso, meu pai o mataria por
desobedecer. Ligar para a polícia faria minha mãe que não tem culpa de nada,
sofrer, e além do mais eu não queria problemas e desavenças na família só
queria minha liberdade para viver do modo como me desse na telha, nada
além disso.

Permaneço chorando até as duas da manhã. O sono não vem, a fome não
vinha, só a tristeza e a solidão me consumiam. Meu pai tinha me
decepcionado de um jeito que eu nunca pensei que faria. Eu esperava uma
explosão dele, revolta, gritos, qualquer coisa do tipo. Esperava até apanhar de
cinto pela primeira vez, isso porque meu pai nunca ergueu a mão pra mim,
nunca foi de usar palmada para disciplinar e aliás nunca precisei. Agora me
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colocar de castigo depois de velha, com essa “crueldade”, presa sem nem
poder sair no corredor, era pior que um tapa na cara; não o fato em si, mas ele
pensar em fazer isso, ele agir assim comigo, estava doendo demais. Eu não
esperava.
Quando deram três horas da manhã fui acordada de um sono leve —
normalmente meu sono é muito pesado. — com um barulho na porta. Olhei
no celular, acendi o abajur, e esperei.

Jon entra no quarto como se não estivesse fazendo nada de mais.


— Como abriu a porta?
— Grampos não servem só para prender o cabelo!— ele diz sério e se senta
na ponta da cama.
— Conversou com ele? O que ele disse?
— Na verdade ele não falou muito, ele mais me ouviu. Seu pai está em estado
de choque com o que ouviu de você. Até eu ficaria puto com o lance das
calcinhas sexy’s e confortáveis... — ele ri por um momento. — Mas está
irredutível quanto ao teu castigo! Ele vai te manter aqui, e voltar a planejar o
seu ingresso até a Austrália. De qualquer forma não se preocupe, nada disso
vai acontecer. Ele está mais triste do que nervoso.
— Mereceu tudo o que ouviu!
— Mereceu, sim!
Ele diz me apoiando e eu gosto disso. Pelo menos não fez como minha mãe
que tentou justificar sua loucura.
— Por que está aqui, Jon? — eu pergunto após alguns minutos de silêncio.
— Queria saber como você estava.
— E como eu estou?
— Triste, decepcionada, chateada, com medo, linda…
— Veio me consolar?
— Vim fazer o mínimo que eu posso, te ouvir, fazer você se sentir segura, te
apoiar…
Ele fala e eu engatinho pela cama até me aproximar dele.
— Eu quero mais tio, quero mais…
— Você vai acabar me matando, mulher…
— Tenho certeza que você não tem medo de morrer, Jon, o caçador!
Eu digo e sento em seu colo, sem ter tocado Jon, ele já estava duro.
— Se for por você, minha princesa aprisionada, eu não tenho!
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Jon diz e me beija um beijo apaixonado, urgente. Suas mãos me apertam e


examinam meu corpo todo. Ele implorava por mim e eu tinha sede dele.
Enquanto meu caçador chupava minha língua eu rebolava em cima de seu
músculo sem de fato querer fazer aquilo, era meu corpo que agia sozinho, eu
não queria Jon, eu precisava dele dentro de mim naquele momento.
Levanto-me, tiro meu pijama enquanto seus olhos me encaravam famintos, e
ele segura minha mão para me impedir de tirar a calcinha. Ele puxa meu
corpo para mais perto, e faz o trabalho no meu lugar, lentamente, uma tortura.
Depois de me despir, Jon me pega no colo, me coloca na cama, e começa a
matar a saudade, ele me suga e eu tinha certeza que ficaria ali por muito
tempo, eu sabia que ele estava morrendo de saudade. Umedecia os lábios
enquanto me fitava na clareira, constantemente.
— Tão doce…
Ele geme e eu vejo estrelas. A sensação era indescritível, por vezes enquanto
olhava pra ele, eu me lembrava do nosso pequeno momento no sul, do que
sua boca era capaz de fazer. Era difícil ter ele em casa, ter ele por perto sem
poder tocá-lo, sem poder beijá-lo, e nem com Chris eu me sentia dessa forma.
— Jon, por favor…
Eu imploro depois de gozar, eu não aguentava mais.
— Eu vou dar o que você quer princesa. Vou te dar!!!
Ele promete e entra dentro de mim com lentidão, mas não fica por muito
tempo naquela “preguiça”. Logo Jon começa a me estocar com força e quanto
mais eu sentia ele dentro de mim, mais eu o queria. Jon era gostoso demais,
era bom naquilo, era experiente, tocava no ponto certo e parecia ouvir os
meus pensamentos, pois fazia tudo o que eu amava. Me preenchia com
violência enquanto me beijava, por vezes puxava os cabelos de minha nuca e
aumentava a força das investidas, enchia meus ouvidos de palavras doces e
de baixo calão ao mesmo tempo, não deixava a mão parada em um só lugar
enquanto estocava, acarinhava meu ponto mágico, meus seios, o bumbum…
Jon era simplesmente maravilhoso. Parecia que estava no lugar que mais
queria estar, do meu lado.

Ele parecia ter chego ao auge da luxúria, começou a me estocar com força me
mandando abrir ainda mais as pernas. Eu estava deliciosamente exposta ainda
mais, parecia que aquela entrada — apertada e suculenta como ele mesmo
disse. — pertencia a ele. Jon socava fundo e sem dó, sem medo de me
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machucar, sem medo da “bonequinha de porcelana” reclamar e aquilo era


bom. Ele me fodia direito, me tratava como uma mulher, não como criança, e
eu amei aquilo.
— Isso, gostosa, geme pra mim, geme. Que delícia você é, Ana!
Jon parece esquecer que aquela foda era sigilosa e resmunga em voz alta, mas
do jeito que eu estava e me baseando em tudo o que eu estava sentindo… Eu
não me importava mais com nada!
— Vou gozar, princesa, vou tirar… ah! — ele geme quando eu puxo para ele
gozar dentro. Sim, me dava prazer. — Sua doida, maluca… — ele reclama,
mas goza me estocando com raiva, uma raiva deliciosa e assim tenho um
orgasmo no mesmo momento, de tanto prazer.
— Não pode sujar minha cama, e não é certo fazer isso… quero tudo dentro
de mim, caçador! Depois o remédio dá conta! — eu falo e ele nega o absurdo
com a cabeça.
— Mulher deliciosa!
Jon resmunga depois que chegamos de mãos dadas no céu pela segunda ou
terceira vez, não sabia ao certo.
— Posso dizer o mesmo de você!
Eu falo e ele me abraça rindo. Ele ri baixo no meu ouvido e o som de sua
risada vira minha música favorita do mundo todo. Era raro ver Jonatas
sorrindo, sempre foi muito fechado e na dele. Mas agora eu o tinha pra mim,
ali, na minha cama e na minha vida, e seus sorrisos eram só meus. Eu tinha
algo dele que jamais ninguém teve.
— Pode nada. Estou velho demais para te acompanhar! Você é que é
maravilhosa.
— Não gosto quando me lembra que sou nova demais, não acho isso
relevante. Sou maior, não quero que fique me lembrando tua idade, isso não
importa pra mim.
Eu digo e Jon levanta seu rosto para me olhar.
— Me desculpe, linda! Não quis te chatear. Do mesmo jeito que isso não é
uma barreira pra você, tu tem que se acostumar a falar e a ouvir sobre isso,
afinal, quando descobrirem, isso será a pauta principal do discurso. Esse tema
não pode te dar dor de cabeça. Tente levar isso com naturalidade, ou não vai
aguentar ficar comigo. A não ser que seus planos sejam só algumas noites,
sem nada realmente sério… — ele diz e sorri.
— Sou muito nova para ter um relacionamento sério, Jon Hunter!
Eu digo e ele para de sorrir na hora.
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— Ah, minha nossa, estou sendo iludido por uma novinha! Como o mundo
mudou, Meu Deus!!!
Ele finge estar bravo, ameaça ir embora e eu o puxo de volta.
— Seu bobo, tô brincando… vem aqui, é mais fácil você me iludir, partir
meu coração e me deixar!
Eu digo, ele volta a entrar embaixo das cobertas, me abraça e fica comigo de
conchinha. Faço seu braço de travesseiro e me sinto protegida.
— Minha linda, escuta bem o que eu vou te dizer, eu jamais partirei seu
coração, jamais vou deixar você, serei seu enquanto você quiser, e talvez até
depois disso. Vou te proteger enquanto eu viver, e você nunca mais vai
precisar se preocupar com nada. Entendeu bem? Dorme tranquila, meu anjo!
Jon sussurra no meu ouvido, eu concordo feliz, e quase que imediatamente
adormeço me sentindo nas nuvens.

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30
FÁCIL DEMAIS

Espreguiço-me na cama e pisco algumas vezes para me acostumar com a


claridade do quarto. Tay dormia tranquilamente do meu lado na cama, e pela
noite que tivemos se eu deixasse ele dormir, era provável que ele
permanecesse ali até de tarde. O problema é que eu não queria, queria mais
dele, pois a saudade ainda existia.
— Ei… já está na hora de levantar!
Eu resmungo beijando seu pescoço e ele acorda sorrindo.
— Eu morri e fui pro céu…
— Não, você está bem vivo. Muito vivo aliás, muito mesmo…
Eu resmungo tendo a certeza ao conferir o meu produto. Eu sabia que todo
homem acordava duro, normal querer me aproveitar da situação, afinal eu
também estava muito viva.
— Eu achei que não ia te encontrar ao acordar, tive medo de dormir. Que
bom te ver aqui!
Ele se vira pra mim, me abraça, e tira uma mecha do meu cabelo do olho.
— Aonde mais eu poderia estar? Estou na minha casa, com o pai da minha
filha, o homem que nunca deixou de ser meu!
— Você não tem noção do quanto me faz feliz dizendo isso.
— Você não tem noção de quantas saudades eu senti, e do quanto me fez
feliz ontem.
Eu digo e ganho um beijo na boca. Eu me deito de barriga pra cima puxando
ele pra mim, e ele imediatamente abre minhas pernas já deixando claro o que
queria. Antes de entrar em mim e me dar prazer antes do café da manhã,
Catarina entra no quarto sem bater.
— Eu dormi com os meus primos…
Ela resmunga, senta na cama e cruza os braços sem olhar para nós dois.
Estava emburrada e queria mimo.
— Bom dia, filha! — eu e Tay falamos e uníssono, mas ela não responde. —
Eu não queria dormir lá! — ela resmunga de novo.
— Desculpa filha, é que seu pai e eu começamos a conversar e acabamos
pegando no sono!!!

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Eu digo entrando embaixo do lençol e entrego a coberta fina para Tay se


cobrir e ir pro banheiro. Era bom que ela não tinha maldade, mas aquilo não
deixava de ser uma situação chata.
— Tô com fome…
Ela diz e começa a mexer nas coisas de Tay. Ela mexia em tudo.
Tay toma seu banho, eu entro depois, e quando saio vejo os dois conversando
e vendo fotos antigas. Me aproximo e logo vejo nossas fotos, as mesmas que
eu rasguei, e eu nem sabia que ele tinha cópias.
— Como conseguiu fotos nossas???
— Enviei pro meu telefone naquela época. Sempre tive.
Ele olha pra mim e sorri. Tenho vontade de agarrá-lo, mas com Cat ali, seria
estranho, ela poderia ficar confusa.
— Bom acho que já te mostrei tudo. Vamos tirar esse pijama e tomar café?
Tay questiona Catarina e a convence de ir na frente. Quando ela sai, ele abre
a última gaveta do criado-mudo, tira meu antigo colar, coloca de volta no
pescoço, me dá um selinho rápido, e vai atrás da filha. Meu coração chega a
inchar de tanto amor e de tanto amor, chega a doer.

— Acho que você esqueceu de contar algo importante pro teu pai… Acho
que ele não vai se lembrar, então seria legal você dizer!!!
Digo pra Cat na mesa do café e ela sorri.
— Dia três, — ela mostra nos dedinhos, como sempre. — é meu aniversário!
— ela fala e Tay sorri.
— Não acredito, caramba!!! Vamos ter que fazer uma festa então, certa? O
que acha?
— Da Barbie!
— Da Barbie, é isso mesmo.
Tay diz sorrindo lindamente e dá um beijo na filha.
— E o que quer de presente, Cat? — Rafa questiona.
— Uma Barbie…
— Mas poxa, você já tem tantas! Não quer outra coisa?
— Não, eu gosto de Barbie, quero Barbie…
— Tudo bem então, eu e tia Nina vamos procurar alguma que você ainda não
tenha! O que acha?
— Acho bom. — ela fala simplesmente.
— Tô sabendo que já conseguiu abrir uma franquia da tua academia aqui…
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Parabéns! — Tay diz para Rafa e ele e Nina sorriem.


— Já não era sem tempo! Não aguento mais ficar parado. Sua tia será a
recepcionista, — Rafa ri. — vai trabalhar comigo!
— Já disse que vou pensar. Fiquei muito tempo na vida boa, começar a
trabalhar assim, tem que ser aos poucos. — ela fala e ri. — Brincadeira amor,
claro que vou te ajudar! Estamos juntos nessa!!! — Nina diz e beija o marido.
— Cadê meus pais, Lulu, Jon…!?
Tay questiona e ninguém sabe responder, normalmente eles eram os
primeiros a descer, mas hoje era uma exceção. Cinco minutos depois de falar,
Jon desce e cumprimenta a todos. Ele pega em uma bandeja tudo o que vai
comer, e caminha até a cozinha. Tay se levanta, vai atrás dele, e volta cinco
minutos depois com um semblante de ódio. Ele passa reto e sobe as escadas,
aviso pra Cat que já volto, coloco Nina de babá por uns minutos e vou atrás
dele.
— Aconteceu alguma coisa? O que houve?
— Lulu está trancada. — ele fala e bate na porta dela. — Lulu??? — ele não
grita, tenta não chamar atenção.
— Tay!?
— Você tem como abrir?
— Tenho, mas é melhor não entrar, ele não quer nem que eu tenha visitas…
— Abre logo.
Tay diz impaciente e quando Lulu abre, eu entro junto. Ela explica todo o
ocorrido, chora, lamenta, e a cada minuto que passa vejo Tay se
transformando.
— Ele só pode estar pirando de novo. Você quer que eu te tire daqui?
— Não. Não adianta ir embora, ele sempre vai me achar, não adianta. É
melhor pra mim que ele entenda, mas isso não vai acontecer, e nós sabemos
disso!
— Bom, você quem sabe! Não posso te forçar a sair daqui também, não
posso fazer o que ele faz. Você sabe o que é melhor pra você mesma. Confio
em você. A mãe te deu um telefone, se precisar me ligue, eu venho correndo.
Preciso ir trabalhar, mas eu venho correndo!
Tay diz, os dois se abraçam, e meu coração se aperta. Lulu parecia outra
pessoa, triste, magoada, sem brilho, dava dó só de olhar. Não parecia a
mesma! Saio de lá morrendo de tanta tristeza por ela. Max tinha pirado de
vez, não era possível!

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— Escuta… você vai até lá? Vai falar com ele? Quando virá pra cá? Quero
você e Catarina comigo, aqui, o mais rápido possível!
Tay diz sem parar pra respirar no corredor.
— Calma, não é tão simples, mas sim, vou falar com ele. Venho pra cá assim
que der! — eu digo e ele me abraça.
— Não demora! — ele fala e eu o beijo. Apressadinho. — Tem mais uma
coisa, como vai ficar o registro dela? Até me esqueci de falar sobre isso,
aconteceram tantas coisas. Posso resolver isso? Mesmo que seja dois nomes,
eu quero ter o meu lá…
Ele fala e eu me aproximo mais de seu corpo. Não conseguia entender porque
eu amava tanto aquele homem.
— Cat não tem nome nenhum. Só o meu. Nós fomos até lá para registrá-la,
mas na hora vacilei, não consegui deixá-lo assinar. Ela é tua, só tua, sempre
foi, desde que nasceu…
Eu digo baixinho e vejo seus olhos se enchendo de lágrimas. Ele chora de
felicidade, sorri, me abraça, e eu fico feliz por ter decidido fazer a coisa certa.
É o ‘verdadeiro’ pai de minha filha que terá seu nome no registro dela, e
naquele momento eu era a mulher mais feliz do mundo todo.
Descemos para pegar Catarina na sala de jantar, e vemos Max e tia Hella de
pé. Hella colocava café da manhã em uma bandeja, e Max conversava sobre
alguma coisa com Rafa. Tay praticamente já começava o sermão ao pai, mas
eu o barrei. Queria tirar Cat dali antes daquilo tudo começar.
— Espera Catarina ir embora… — eu sussurro e ele concorda. — Eu te amo!
Dou um beijo nele, entro na sala de jantar, faço Cat se despedir de todos, e
Tay nos leva até meu carro. Fui embora com a certeza que Tay colocaria fogo
no pai e na casa inteira, até Lulu ser tirada do castigo.

Chego em casa e Yan tomava café sozinho na cozinha. Ele não sorri ao me
ver chegar.
— Desculpe não ter…
— Tudo bem.
Ele me corta e eu não tento de novo. Sento-me na mesa, e tomo outro café,
pois nem tive tempo de tomar no casarão. Yan pergunta a Cat como a festa
foi, e ela vai contando todas as novidades. Assim que ela se refere a Tay
como “papai”, seu semblante muda completamente, — para raiva. — mas ele
disfarça.
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—… e você não acredita, a mamãe e o papai, dormindo juntos e deixou a Cat


dormir com meus primos… fiquei muito brava!!!
Cat solta e eu engasgo. Yan me olha com uma feição misteriosa demais, e
não tento me explicar. Assim que ela tirasse sua soneca, conversaríamos
longe dela, eu queria Cat longe da bagunça que estava minha vida.
— É mesmo??? Não acredito que a mamãe fez isso!!! Mas não se preocupe,
princesa, mamãe nunca mais vai fazer isso de novo! Eu tenho certeza!
Yan responde sorrindo e volta a comer, sem me olhar nos olhos.
— Está bravo?
Pergunto no quarto, assim que Cat dorme. Já eram três horas da tarde.
— Não. Eu permiti… apenas não gostei de não ter me avisado, pois acabei
ficando acordado e te esperando. Mas não estou bravo não, amor.
Yan diz, tenta me beijar na boca, mas eu viro o rosto.
— O intuito era te ver feliz, e não me rejeitando. — ele fala, eu me levanto e
me afasto.
— Ficamos juntos como você já sabe. Não queria magoar você, mas é que
quero tentar de novo. Quero dar uma chance a ele…
Eu digo com dor no coração, e Yan age como se já esperava. O que eu acho
estranho demais…
— Tudo bem, você o ama, eu te entendo. Eu sempre soube desse risco. Te
amo, mas ficarei bem, vou esperar você voltar pra mim porque te garanto que
eu sou o melhor para você e nossa filha. Só gostaria de pedir que não
afastasse Cat de mim. Cat é minha filha, eu a criei!
— Eu nunca faria isso! Você é o pai dela, como ela mesma diz, o pai número
um. E será sempre, Yan, sempre! Mas isso não vai acontecer, Tay não me
magoará!
Eu falo, ele sorri, e me abraça. Eu correspondo ao seu abraço e me desarmo.
Não esperava que fosse tão fácil assim.
— Yan, eu sou muito grata a você. Você…
— Não. Não quero ouvir nada disso. Sem essa, tá bem!? Vou pegar minhas
coisas, ir para um hotel e ver o que faço. Se eu decidir voltar, passo aqui para
me despedir de vocês, e você sabe onde pode me encontrar para qualquer
coisa que precisar.
Ele diz e não consigo deixar de me sentir triste e um tanto quanto diferente.
Yan parecia confiante de que as coisas não eram como pareciam. Ele
demonstrava acreditar que tudo ficaria bem, que a gente ia ficar juntos e que
nada mudaria.
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Meia hora depois eu o sigo até o portão com meu coração doendo de angústia
por ele. Yan podia não demonstrar, mas sofria demais.
Assim que ele entra no carro e vai embora, outro carro estaciona na frente do
meu portão. Era a maluca que parecia modelo, mas que era suicida, e
rejeitada.
— Tudo bem? Podemos conversar? Entra aí…
Ela fala e meu estômago fica embrulhado.

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31
UMA SITUAÇÃO PIOR QUE A OUTRA

— Quando vai tirar ela de lá???


Pergunto pro meu pai assim que Ellen e Cat vão embora.
— Quando ela me pedir desculpas. — ele resmunga falando comigo e volta
sua atenção ao Rafa. — Será que ela consegue chegar até Minas sem…
— Não cansa de dar bola fora não???
Questiono de novo e ele me ignora. Minha mãe chega perto e toca meu
ombro.
— Se acalme, brigar com ele não vai adiantar. Não é batendo boca que
vamos resolver isso. Seu pai vai colher tudo o que está plantando, já disse
isso pra ele!
Ela diz para todos ouvirem e meu pai também ignora isso.
Desisto de tentar fazê-lo entender, e me arrumo para ir pro trabalho. Meu pai
só ia entender as coisas quando se fodesse. Pelo jeito seria pior do que como
foi com meu avô!
Chego na escola, e vou direto pro hangar. Laura me cumprimenta com
formalidade, e me entrega os documentos que pedi para providenciar.
— Você a viu?
— Está distribuindo as tarefas da semana, mas já tem um tempo que pegou o
carro e saiu.
— Por que não a seguiu?
— Tenho trabalho, oras. Não fui, mas tenho alguém de confiança no pé dela.
Vão me ligar e me informar assim que ela parar.
Ela diz e eu não posso deixar de ‘rosnar’. Esse lance de mandar terceiros
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fazer o trabalho, eu simplesmente odiava.


— Aí… É ele!
Ela diz quando teu telefone toca, e se afasta pra atender. Começo meu
trabalho de inspeção na aeronave do dia, antes de tirar ela do chão, e logo
Laura volta.
— Tay, ela foi atrás da Ellen… — ela fala tranquilamente e já entro em
pânico. — Relaxa, ela parou o carro, falou alguma coisa e saiu de lá, nem
desceu do carro, não encostou nela!!!
Ela diz, mas não fico despreocupado. Ligo apra Ellen e ela atende
rapidamente.
— Oi.
— Oi, linda, você está bem?
— Estou e você?
— Tô legal. Julia te procurou?
— Sabia. Está me seguindo, Tay???
— Estou seguindo ela, apenas te protegendo e mantendo vocês duas em
segurança, longe daquela louca!
— Fica em paz! Ela só veio para perguntar se podia falar comigo. Pediu para
eu entrar no carro e ir para um lugar mais reservado, mas eu disse não. Minha
mãe e meu tio estão com Ritinha no hospital, não posso sair e mesmo que
pudesse não iria.
— Ótimo. Não vai mesmo, ela deve estar furiosa. Assim que eu sair, passo aí.
Conversou com ele?
— Sim. Fez as malas e saiu de casa, nem reagiu, Tay, só saiu.
— Só?
— Só. Não gritou, não deu crise, não brigou, nem nada…
— Isso é estranho demais.
— Também achei. Mas agora está tudo bem…
— Mesmo assim, cuidado, tá!? Eu te amo, Ellen! Amei nossa noite, já estou
com saudade. Nem acredito que me perdoou tão fácil, eu sei que não mereço
você, eu...
— Para. Não tem porquê enrolar, fingir que nada aconteceu, dificultar... estou
cansada de ficar sem você, você é minha felicidade, minha única felicidade.
Você e nossa filha, e Yan sabe disso. Sempre soube que eu só seria feliz
quando voltasse pra ti. Eu te amo, minha vida!
— Ah, Deus, quero engolir você! — eu falo e a ouço rir. — Vou voltar pro
trabalho, logo, logo nos vemos. Qualquer coisa ligue! Não hesite, não pare
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pra pensar, apenas ligue!


— Farei isso, beijo!
— Beijo!
Eu desligo e minha insegurança cresce a medida que o tempo passa. Como
assim o gerente apenas arrumou as malas e foi embora? Não, isso não era
normal!
— Sentido!
Julia chega meia hora depois e pega todos os oficias que trabalhavam na
aeronave de surpresa.
— Emerson, Goes, Nogueira, e Lourenço, continue com a vistoria na
aeronave. Nogueira, — ela se aproxima de Laura. — você dá o apoio no ar
para o Lourenço, na semana que vem passará para a pilotagem, vamos sair
dessa de co-polioto, já chega! — ela diz e Laura parece beirar um infarto de
raiva, mas eu sabia onde Julia queria chegar… — Coverick e Santos, essa
semana a burocracia chata da papelada de vistoria é de vocês, sem hora para
ir embora, quero tudo pronto e nos conformes, tem muita vistoria checada e
que não bate com os relatórios, nem que vocês saiam daqui meia-noite, quero
tudo em ordem. À vontade!
Ela diz tudo aquilo sem me olhar nos olhos e vira as costas para ir embora.
Vou atrás dela e a faço parar.
— Tudo isso é para me punir? Quer que eu pare de pilotar pra quê?
— Primeiro desencosta de mim, tenente, se não tirar essas mãos sujas da
minha farda te prendo por desacato. E todo piloto precisa saber passar a
vistoria pro papel, e você nunca fez, não é mesmo!? Decidi te dar a
oportunidade. Não vou mais aliviar, agora não somos mais casados, nossa
única relação é profissional, e como sua capitã, meu papel aqui é fazer de
você o melhor tenente, e se for preciso infernizar a sua vida para conseguir,
farei isso. Não sai daqui hoje até colocar tudo em dia, e meu primo vai
garantir que suas horas aqui sejam muito bem aproveitadas, da melhor
maneira.
— Tão amargurada. — resmungo.
— Tão moleque, lixo humano…
Ela resmunga em resposta parecendo estar com dor e sai. Minha cabeça
parecia explodir de tanta raiva. Julia não estava amargurada, estava destruída.
Algo em sua essência havia mudado completamente. Aparentemente eu
acabei com sua auto-estima.
— Ela quer nos separar, te deixar fraco! Sempre soube que sempre fui sua co-
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polioto, quer me punir pra te atingir… — Laura começa.


— Preciso fazer alguma coisa para me livrar dela, — digo baixo. — ela quer
me deixar aqui hoje, a noite toda cuidando de papelada, quer atrasar a minha
vida…
— Vamos mandar subir essa vadia!
— Não. Isso não. Não ainda…
— Por que não? Enquanto ela tiver aqui, não vai cansar até te destruir, pode
destruir sua carreira…
— Que se foda minha carreira! Ela quer é me manter longe da Ellen, longe da
minha filha! Ellen disse que Yan nem se manifestou, apenas pegou as malas e
saiu de casa. Devem estar juntos, ele deve achar que tudo vai ficar bem, que
Ellen vai voltar pra ele. Estão armando uma…
— Eles nem se conhecem, Tay!
— Depois de tudo o que passamos você ainda duvida desse tipo de coisa???
— eu questiono e ela parece pensar.
— Se não quer se livrar dela, o que vai fazer?
— Vou tirar ela de Pirassununga.
— Viva ela vai retaliar. Pode descontar em Ellen ou Catarina…
— Ela não seria capaz. Não é possível que me casei com uma mulher que
nem conheço. — eu falo e Laura me olha como se eu fosse um tolo.
— Em casa conversamos e resolvemos isso. Por hora vamos trabalhar…
Passo o dia mexendo com papéis e amaldiçoando aquela filha da puta. Eu
tinha que fazer alguma coisa, só precisava pensar. A última coisa que eu
queria era pedir ajuda pro meu pai, eu queria era trancar ele em um quarto
como fez com Lulu, mas se fosse necessário pedir sua ajuda para eu ter paz
novamente, eu ia fazer isso, sem nem pensar duas vezes.
Saio da FAB já era quase uma da manhã. Ligo pra Ellen e ela não atende.
Paro com o carro em sua casa. Entro, e bato na janela de seu quarto, ela
atende com o cabelo todo bagunçado e cara de sono. Linda demais.
— O que faz aqui…?
— Me deixa entrar.
Eu digo e ela se afasta da janela, eu pulo e vejo Cat na cama.
— Fiquei te esperando… o que aconteceu?
— Julia. Está me punindo. Me tirou da pilotagem, não posso mais voar, me
enviou para a administração, mandou fazer uma trabalho que ela sabia que
seria longo só para me punir, me afastar de você! — eu digo e Ellen me
abraça.
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— Denuncie ela!!! Faça alguma coisa! Conte isso pra alguém, pro Max, pro
Jon… eu não pensei que isso aconteceria, que algo assim podia acontecer,
então disse pra Cat que você passaria aqui. Ela ficou te esperando por horas
até dormir chateada. Não deixe essa vadia estragar tudo, acabamos de ficar
juntos de novo, depois de tanto tempo! Não deixe ela atrapalhar a nossa vida!
Ela mia como um gato tristonho e eu a pego no colo para me sentar com ela
no seu pequeno sofá.
— Não vou deixar, te prometo! Agora me escuta, eu acho que a atitude de
Yan é muito suspeita, então não confie nele, não converse com Julia, não dê
moral para os dois. Aposto todas as minhas fichas que estão planejando tudo
isso, juntos!
— Yan nunca me faria mal!
— Não precisa fazer mal para nos separar, basta plantar uma picuinha e eu
parecer errado aos seus olhos, como eu já disse, ele espera que eu te
decepcione e quer ver isso de camarote. Prometa que vai confiar em mim,
prometa acreditar quando eu disser que te amo, quando eu disser que vocês
duas são a minha prioridade! Nunca mais vou te magoar, nunca mais partirei
seu coração, nunca mais vou machucar você de novo!!!
Eu digo baixo para não acordar Catarina, e ela senta em meu colo de frente
pra mim.
— Confio em você. Confio em você, não deixarei ninguém nos separar,
nunca mais! Agora teremos o nosso “felizes para sempre”!
Ela diz e começa a me beijar. Fizemos amor gostoso e bem baixinho, fazendo
juras de amor um para o outro até cansar e depois a coloquei na cama para
enfim, voltar a dormir. Depois de alguns minutos olhando — mais
admirando, na verdade. — minhas duas princesas enquanto dormiam, voltei a
pular a janela, e fui pra casa.
Quando cheguei, vi um carro diferente no lago. Entrei e encontrei minha mãe,
Rafa, Jon, meu pai, e Jade, na sala, conversando.
— Jade, quanto tempo!!! Como está?
Eu a cumprimento esticando a mão, e ela sorri me abraçando. Seu abraço era
acolhedor, e apesar de Jade continuar sendo uma linda e jovem mulher, —
era estranho, ela não envelheceu nada, exatamente nada. — ela tinha um
abraço daqueles de avó, que tirava toda a angústia e tristeza da gente. Quando
ela me soltou eu me senti novo em folha, e com as forças renovadas.
— Melhor agora?
Ela questiona sorrindo e erguendo uma sobrancelha.
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— Muito melhor.
— Cada ano que passa você fica mais parecido com aqueles príncipes dos
filmes, tão lindão… como vai a saúde???
— A minha vai bem, apesar de ter que tomar remédio todos os dias!!!.
— Você escapou da morte um dia, ter apenas que tomar remédio equivale a
um presente. Agradeça por isso sempre!
— Farei isso. — eu digo e ela sorri.
— Desculpe invadir tua casa, acabei de chegar!!!
Ela fala com alegria e volta a se sentar. Eu me sento no espaço livre do sofá e
escuto tudo.
— Então, como eu dizia, farei tudo o que puder para te ajudar! Mas pra
começar soltará a menina amanhã pela manhã. Vai deixá-la sair, deixá-la
viver sua vida como quiser viver, e será seu pai, não seu carrasco!
Jade diz e meu pai esfrega o rosto com as mãos. Jade tinha saído de São
Paulo para vir até aqui colocar juízo na cabeça de meu pai.
— Ela é muito nova pra namorar… — ele começa.
— Pelo que sei você começou aos treze ou quatorze. Dezoito está de bom
tamanho.
Ela diz direta e reta, e Jon ergue uma sobrancelha em apoio.
— Não sei se consigo…
— Claro que consegue, olha pra mim! — ela diz e meu pai a encara. — Sua
filha te ama, será sempre sua princesinha mesmo depois de adulta, casada,
com filhos, morando longe, ou em outro país. Seus fantasmas encontram a
luz, são seus amigos, não te perturbarão. A guerra acabou, Max, o conflito
passou. Entende isso?
— Entendo. — meu pai diz na hora.
— Entende que está fazendo errado? .
— Entendo, estou fazendo errado.
— Vai tirar ela do quarto e deixar ela viver, certo?
— Certo.
— E quando vai fazer isso?
— Amanhã, pela manhã.
Meu pai responde e Jade sorri. Mas que porra era aquela?
— Ótimo.
Eu, Jon, e minha mãe, tínhamos a mesma cara. Apenas Rafa olhava para
aquela situação como se fosse normal.
— Agora vamos dormir, vamos todos descansar, e amanhã continuamos essa
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conversa! Não vejo a hora de ver meus netos, e minha nora linda…
Jade se levanta e dá em Rafa um abraço apertado. Minha mãe a leva para um
dos quartos, e eu e Jon ficamos na sala. Conto tudo o que aconteceu com
Julia e ele não parece surpreso com sua atitude.
— Você terminou seu casamento pela ex, claro que ela ia armar alguma
coisa, te forçar a trabalhar demais, te punir, abusar do poder de capitã, é o
mínimo, achei que pegaria ainda mais pesado. Mas não acho que Julia precise
sair do mapa, posso afastá-la da FAB sem muita dificuldade!
— Você faria isso?
— Claro. Só não será do dia pra noite por causa da burocracia, mas consigo
fazer isso em dois ou três dias, normalmente o prazo seria um mês.
— Já é alguma coisa, de trinta pra três é maravilhoso. Não queria ir ao
extremo com ela, são alguns anos de convivência, eu a quero muito bem,
contanto que não me atrapalhe. — eu digo.
Conversei com Jon até bem tarde, falamos de Luiza, Julia, Ellen…
conversamos sobre tudo. Usei nossa pequena conversa secreta para conhecê-
lo melhor, Jon parecia ser um homem de honra, respeitável, e gentil… meu
pai deveria agradecer por ter sido ele, a escolha de Luiza.
Me recolho minutos mais tarde, mas vejo o dia nascer. Estava preocupado,
aflito, e com muito medo, medo de algo acontecer e eu perder a minha linda
novamente. Hoje depois da meia-noite, seria o aniversário de minha princesa,
Ellen chegou com ela no café da manhã, e recebeu a ajuda de Nina para
contratar buffet, serviços para a festinha em cima da hora, e de fato
conseguiram. Pelo o que ela me disse, ela tinha planejado e pago algumas
coisas no sul, não imaginava que viria para cá e permaneceria… quando disse
isso, ganhou um carinho meu escondido dos olhos de todos. Eu agradecia o
fato dela ter vindo, e ficado em minha vida. Não importava quantas vezes o
destino ou minhas burradas nos separassem, em todas às vezes ficaríamos
juntos, eu tinha certeza.
— Está tudo certo, buffet, decoração, tudo. Amanhã de tarde, teremos uma
festa da Barbie!!!
Ellen canta e Cat pula de alegria. Eu nem preciso dizer que eu estava
radiante…
Jade conversava com meu pai a sós na sala, e o resto da família tomava café
tranquilamente. O dia parecia feliz e tranquilo, mas meu inferno começaria
assim que eu pisasse na FAB. Me despedi de Ellen e disse que ia comprar o
presente de Cat, porque provavelmente mais tarde naquele dia, eu não teria
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tempo. Julia me prenderia lá, e só ia me soltar tarde da noite, como uma bela
covarde amargurada.
— Recebi sua mensagem, seja breve…
Encontro-me com Laura no meio do caminho, depois de ler um SMS dela.
— Tenho duas notícias, uma ruim, e a outra óbvia. A ruim é que Julia tentou
me passar para o lado dela me prometendo a patente de capitã no fim do ano.
Ela é uma vadia. E a óbvia é que ela realmente tem falado com o gerente
gostoso demais da silva!
Ela diz e me mostra fotos dos dois juntos no centro da cidade, na porta de um
hotel.
— Ela foi até ele depois de me procurar, provavelmente vai tentar persuadi-lo
também. Ela está decidida a acabar com teu relacionamento!
Laura diz e eu concordo com a cabeça.
— Espero que consiga fazer dele seu aliado. Faz tempo que quero me livrar
daquele cara e isso seria um bom motivo. Se ele é capaz de fazer uma
sujeirada para me afastar de Ellen, com certeza não é uma boa pessoa e não
será um bom pai para minha filha, e não sendo alguém bom o suficiente pra
ela, farei o favor de manter minha filha distante dele. Mande essas fotos para
meu e-mail. Tenho algumas coisas para resolver agora.
Me despeço dela, compro o presente de Cat e volto pra chácara. No caminho
todo penso sobre contar ou não para Ellen, mas contaria o quê? Eu não sabia
se ela só estava tentando trazer o gerente para o lado dela, ele poderia ter dito
não, não sei… então optei por: por enquanto não dizer nada.
— Pronto. Agora suba lá e a chame para tomar café. Diga que ela está livre, e
que não vai mais se intrometer em suas decisões. Faça tudo e fale da forma
como combinamos, como o homem maravilhoso que você é e sempre foi!
Jade diz para meu pai. — estavam todos na sala assistindo aquilo de bocas
abertas. — Meu pai escuta, e obedece tranquilamente.
— Está controlando ele??? — eu pergunto e ela sorri.
— Que isso, seu pai tem plena consciência do que está fazendo, e quer
realmente fazer isso. Ele quer ir até lá, quer se desculpar quer trazê-la de
volta, só o que dei a ele foi um tiquinho de coragem, paz no coração, e
tranquilidade para fazer isso! — ela diz e eu fico bobo.
— Isso é um tanto quanto bizarro demais, sem querer ofendê-la, claro!
Ellen diz e Jade sorri pra ela.
— Quer acreditar?
Jade questiona mostrando a palma das mãos, mas Ellen diz “não, obrigada”
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sorrindo feito boba e morrendo de medo. Cinco minutos depois meu pai
desce.
— O que disse a ela? — Jade pergunta.
— Disse que sentia muito, que não ia fazer isso nunca mais, e que não ia
tentar atrapalhar a sua vida… essas coisas!
— E ela te desculpou?
— Não. Apenas me olhou de um jeito estranho e não disse nada.
Ele fala e Lulu enfim, entra na sala e me cumprimenta com um abraço.
— Fui libertada de minha prisão! — ela diz sorrindo para Jade. — Que
irônico uma bruxa ajudar a princesa a ser libertada, precisamos ter uma séria
conversa com a Disney. — ela cumprimenta e beija Jade.
— Vai tomar seu café, se puder depois, quero conversar com a senhorita. —
Jade diz e Lulu sorri.
— Tudo bem, mas minha resposta será ‘não’, e não adianta jogar essas suas
‘magias’ em mim!
— Sem magia! É uma promessa!
Jade diz cruzando e beijando os dedos, e se senta ao lado de meu pai. Lulu
vai tomar seu café e todos se dispersam. Em nenhum momento Lulu olha em
direção ao meu pai, parecia que aquele clima ia perdurar mesmo com ela fora
de seu castigo.
Tento esquecer um pouco daquilo e chamo Cat para dar um abraço apertado
nela e ir pro trabalho. Arrasto Ellen para o corredor e me aproveito de alguns
minutos com ela ali. Foi opção dela esperar um pouco para contar pra todos
que havíamos voltado e que estávamos juntos, então eu sabia que todos já
sabiam, — eu sorrio ao pensar nisso. — porque quando é segredo, nunca é
segredo. E ela pensava também em como a cabecinha de Cat ficaria, e eu
entendia isso.
— Eu vou e volto logo. Ficará aqui, não é!?
Eu pergunto beijando todo seu pescoço e ela ri alto.
— Sim, ficarei… farei algumas compras nesta tarde com a Nina, e dormirei
aqui. Vou esperar você chegar, cheia de amor pra te dar. Mais do que nunca.
Ellen diz e sinto vontade de engolir ela por inteira.
— Não fala assim se não nem vou trabalhar! Te tranco no meu quarto e não
te solto nunca mais! — eu digo e ela ri.
— Vai, seu Max.
— Não. Te trancaria para me aproveitar, te fazer feliz e não te fazer sofrer.
Eu digo e rimos juntos. Vou trabalhar sem a menor vontade, chego no
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escritório e dou de cara com Julia e seu primo. Ontem ele ficou tentando me
atrasar, mas dei logo um esporro que ele ficou quietinho. Julia só colocou ele
ali para me encher o saco e me espionar.
— Bom dia!
Eu digo por educação e ela se aproxima de mim.
— A partir de agora, só fale comigo em posição de sentido. Comece seu
trabalho e tenha um maravilhoso dia.
Ela diz como sempre estressada, e sai.
Faço tudo o que tenho para fazer até as sete, organizo tudo, coloco tudo em
seu devido lugar, e saio da administração. Assim que eu me aproximo do
hangar, que era caminho para o estacionamento, Julia me alcança.
— Você ainda tem relatórios… aonde pensa que vai?
— Não tenho não, Julia. Já preenchi todos!
Eu sorrio de nervoso com a situação e ela parece querer explodir de raiva.
— Eu vi que tem mais, pode voltar, vou te mostrar! Não sairá daqui tão cedo!
Ela fala, eu olho em volta pra ver se tinha alguém por perto, e me aproximo.
— Julia, não faça isso, não aja assim comigo! Não me castigue por não
corresponder o seu amor. Sempre te respeitei demais, sempre fomos bons um
para o outro, a gente sempre adorou, sempre se admirou. Vamos acabar tudo
isso com uma amizade de verdade, você foi maravilhosa comigo esses anos
todos, sempre foi o lado mais adulto dessa relação. Não faça isso. Sei que me
ama, guarde esse amor contigo, me deixe fazer parte de sua vida e retribuí-lo
de uma maneira legal, com meu apoio, meu companheirismo, minha
amizade! Não precisamos terminar com nosso casamento de uma forma tão
baixa, não precisa ser assim! Você foi essencial para mim, para meu
amadurecimento. Eu preciso daquela Julia.
Eu começo a dizer e ela chora. Seu semblante é de dor, tristeza, raiva, e ódio,
muito ódio. Tudo misturado. Sinceramente morro por dentro por fazê-la
sofrer.
— Não pode ficar casado comigo e me trocar dessa forma, você não podia ter
feito isso comigo. E eu que pensei que nosso relacionamento era sólido,
verdadeiro, de cumplicidade… só fui sua muleta esses anos todos, sua boia,
botes salva-vidas, sabe!? Me enchi de remédios para ver se a dor passava, se
essa mágoa aqui dentro diminuía, perdi meu amor próprio, minha confiança,
minha independência emocional! Você acabou comigo. Tudo porque sua
filha, uma criança birrenta e mal educada disse que eu não era boa o
suficiente pra você, depois de anos comigo, uma criança conseguiu abalar o
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que você sentia.


— Catarina não tem culpa de nada!
— Tanto faz, Tay. Não me importa mais! Tudo o que eu puder fazer para te
atingir, te machucar, te atrapalhar, eu farei, aqui dentro! Quero que sinta nem
que seja algo próximo do que tô sentindo agora. Dor, desespero, tristeza, tudo
ao mesmo tempo! Quero que pague por tudo o que fez comigo, tudo! Na sua
mesa tem mais relatórios, tenha uma boa madrugada de trabalhos! — ela se
vira para ir embora, mas ainda fala enquanto caminha. — Acostume-se com
isso, vai passar a ser o administrador oficial da EPCAR de Barbacena, no que
depender de mim nunca mais vai voar e nem chegará a tempo para o jantar e
etc, e etc…
Ela vai embora e eu entendo que precisava agir imediatamente. Eu precisava
fazer alguma coisa ou aquela mulher ia acabar me fazendo agir por impulso e
meter uma bala na testa dela. A mulher com quem eu fui casado, meu Deus!
Eu não podia acreditar, não podia acreditar que isso estava acontecendo
comigo. E eu já gostei tanto de Julia, tanto… naquele momento queria matá-
la com minhas próprias mãos. Laura estava certa, eu precisava apagar aquela
mulher.
Ligo o botão do foda-se e vou pra casa. Julia queria me deixar louco, mas eu
não ia permitir.
Chego na chácara e vejo a família toda fazendo trabalhos manuais com a
temática da Barbie. Pisco para minha princesa mãe, agarro a princesa filha, e
pergunto pelo meu pai. Minha mãe diz que ele está no escritório com Jon,
entro sem bater e já saio falando.
— Preciso de ajuda, pai!
Eu digo e ele se levanta da mesa, aposto que pensava que eu tinha feito uma
besteira.
— O que houve?
— Julia ia me prender lá de novo. Disse com todas as letras que se
dependesse dela ia foder com minha vida lá dentro… pai, eu preciso de ajuda,
ou vou acabar matando-a.
Eu desabafo e ele olha para Jon procurando uma solução.
— Vou dar alguns telefonemas.
Jon diz e sai. Fico conversando com meu pai e ele volta parecendo apressado.
— Tem um carro vindo na estrada. Será que é ela? Você saiu fora da hora,
sem fazer os relatórios? Algum procedimento? Ela pode te enquandrar...
Jon questiona preocupado e meu pai e eu o seguimos até a varanda do
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casarão. Não era o carro dela, na verdade era aqueles Táxis em carro comum.
Um rapaz loiro sai do carro com uma mala de mão, e um papel na mão livre.
Ele sobe o pequeno morro do lago até a varanda olhando para todos os lados
e para o papel, parecendo comparar se tinha chegado no lugar certo mesmo.
— Hi… ann… Olár! — ele lê o papel em sua mão. — Sou Chris, é aqui que
mora Luiza?
O pobre rapaz já condenado a morte por seu Max, mal conseguiu falar
português, nem lendo o papel. Eu e minha irmã estávamos metidos em uma
situação pior que a outra, logo agora que eu precisava do meu pai, e pelo jeito
não teria sua atenção; e Luiza que tinha acabado de sair do castigo ia voltar
para ele hoje mesmo.

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32
PASSAGEM SÓ DE IDA PARA O HOSPÍCIO

Pelo ponto de vista de Ana Luiza.

— Não titia, deixa que a Cat faz. Você não sabe!


Catarina tira de mim a latinha de doces e o adesivo da Barbie, e começa a
ajudar tia Nina por conta própria, obviamente ela alinhava os adesivos
melhor do que eu.
— Luiza!!!
Tay me chama da porta da sala, e faz sinal com a mão para eu me aproximar.
Eu o sigo e seu caminho é direto até a varanda. Quando eu vejo o que ele
quer me mostrar, beiro o colapso nervoso.
— Chris...!? O que faz aqui?
Resmungo um inglês com dificuldade, pois não conseguia pensar direito.
Meu pai se controlava quase sem sucesso, e Jon não esboçava reação
nenhuma, ele só olhava para Chris.
— O que eu faço aqui? Você desapareceu, não atende minhas ligações, fiquei
preocupado! Foi fácil vir, já tinha tudo arrumado, combinamos de vir juntos,
se lembra!? Dá pra fazer eles pararem de me olhar assim?
Ele diz e meu pai fala com ele.
— O que faz aqui, garoto?
Eu pensei que meu pai nem mais falava inglês, mas se era pra tirar satisfação,
ele arranhava, e Chris entendeu muito bem.
— Vim ver minha namorada!!!
Ele diz e Jon desvia o olhar, ele olha para o lado onde ninguém podia ver sua
face provavelmente cheia de fúria. Meu Deus, eu vou perder meu caçador.
— Sua namorada? Tirando as crianças que incluo Luiza, todas as mulheres
dessa casa são casadas! Que namorada você tem aqui?
Meu pai não gritava, apenas questionava! Suas mãos estavam fechadas em
punhos.
— O senhor deve ser Max, o pai dela! — ele estende a mão para meu pai,

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mas ele ignora. — Com todo respeito, senhor, namoro sua filha faz mais de
seis meses. Se o senhor me der uma oportunidade, podemos conversar
melhor, e verá que minhas intenções para com sua filha é as melhores
possíveis!
Ele diz e Jon parecia beirar um ataque de nervos. Tentava respirar, mas
parecia beirar um treco de tão nervoso.
— Melhores possíveis? Por que você não faz um favor para a sua vida, e
desaparece moleque? Você não é bem vindo aqui!
Jon diz. — meu pai encara Jon de um jeito diferente demais o medindo e
parecendo tentar entender o porquê de sua implicância com o garoto, e eu
fecho meus olhos. — e demonstra querer tocar em Chris para “ajudá-lo” a dar
meia-volta.
Mas Chris levanta as duas mãos pro alto e praticamente grita, — “No touch
me, no touch me!!!” - pois estava nervoso demais com a recepção calorosa
que meu caçador e papai ofereciam a ele. Nesse momento, por causa de sua
voz elevada, Chris chama a atenção da casa toda.
— Chris... - eu resmungo puxando ele para mais perto de mim, e estou tão em
‘pânico’ que nem sei o que dizer para amenizar tudo. — Entra, por favor!
Eu digo antes da situação piorar, e meu pai me olha querendo me matar.
— É só uma conversa, ele veio dos Estados Unidos até aqui, releva, respira
fundo e não pira!
Eu rosno para a cara feia dele e entro com Chris no escritório.
— Quer me ver morta??? Por que veio???
Chris tenta me abraçar, mas eu me afasto, ele não podia ter feito isso.
— Baby, você estava há dias sem falar comigo. Disse como seu pai era,
fiquei preocupado!
— Pois, é! Eu te disse como ele era e você ainda sim, veio até aqui. Eu estava
sem meu celular, pois ao tentar falar com ele sobre namoro, fui trancafiada
dentro de um quarto sem poder sair nem para o corredor, sem receber visitas,
sem meus cartões, sem falar com ninguém, nada! Ele descobriu sobre você, e
aposto que nesse exato momento arquiteta sua morte! Arriscou-se vindo até
aqui, vai me prejudicar, e pior, nem sei se sairá vivo!
— Meu amor, se ele fosse me matar, tinha feito isso lá fora. Vem cá, estou
morto de saudades, baby!
Ele tenta me abraçar, mas eu me afasto novamente.
— Não! Algumas coisas mudaram aqui, Chris!
Eu digo e ele me olha desconfiado.
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— É mesmo? Tipo o quê?


— O que você me esconde? Você tem segredos não é!? Sei que tem... é
homem o suficiente para me contar? Foi preciso partir de NY para saber que
você me engana, que você mente pra mim. Eu sei de tudo, Chris!
Eu digo e ele fica tão nervoso, mas tão nervoso que começa a andar de um
lado para o outro e coçar a cabeça parecendo aflito, uma atitude no mínimo
estranha.
— Baby, não sei do que você está falando!
— Sabe sim! Sabe sim... seja homem Chris!
— Quer terminar comigo e procurar motivos aonde não tem? O que você está
fazendo? Vim até aqui por você, já disse que não fiz nada, nunca te traí,
nunca te enganei, não sei do que está falando!!! Quem tentou envenenar você
contra mim??? — ele parece dizer a verdade e me sinto confusa!
— Você não quer falar, não fale, não importa. Acabou de qualquer forma. É
melhor mesmo que você seja um cafajeste. Não devia ter vindo, meu pai
nunca aceitará você, meu pai nunca vai me deixar namorar, e se deixar, vai
me tirar tudo o que tenho, e não sei se quero isso! Quero estudar, quero...
— STOP!!! - ele grita. - Não vai terminar comigo sem motivo algum, ainda
mais depois de ter me arriscado, vindo até aqui sem saber se te encontraria
viva... sem saber se eu mesmo iria sair daqui vivo! Não pode fazer isso
comigo!
— Mesmo que eu ainda quisesse lutar por isso Chris, não dá. Você chegou na
hora errada em todos os sentidos! Eu estou lutando para ter autonomia, tomar
as rédeas da minha vida, o que significa que eu posso fazer isso contigo,
principalmente pelo fato de que sei que me esconde alguma coisa. Estou sem
culpa e de consciência tranquila. E além do mais, — respiro fundo e tomo
coragem para confessar. — gosto de outro cara.
— YOU ARE CRAZY??? — está louca? — TEM APENAS UMA
SEMANA AQUI E O SENTIMENTO POR MIM EVAPOROU, LOUIS? —
meu nome em seu sotaque soa dessa forma. — VOCÊ SÓ PODE ESTAR DE
BRINCADEIRA COMIGO!!!
— Pare de gritar.
— DIZ NA MINHA CARA QUE AMA OUTRO HOMEM E QUER QUE
EU FAÇA SILÊNCIO??? VOCÊ ESTA LOUCA, MEU DEUS!!!
Chris andava de um lado pro outro e eu temia que ele fosse apagado por estar
gritando tanto comigo. Eu via meu pai entrar naquele escritório com tudo e
socá-lo até cansar. Eu pedia para ele parar, mas nada funcionava.
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Então me sentei, tapei os ouvidos, pois já estava com dor de cabeça, e nesse
momento Chris puxa com tudo meu braço, achando que o que fiz foi de
pirraça.
— ME SOLTA!!! FALE SEM POR A MÃO EM MIM, NÃO PÕE AS
MÃOS EM MIM!
Chris não me machucava, ele me pegou pelos braços me fazendo deixar os
ouvidos livres e me puxou, para que eu levantasse. Assim que fiquei de pé,
ele falava, e tinha suas duas mãos como garras, acima de meus cotovelos.
Não doía, mas os chacoalhões estavam chatos demais.
— NÃO PODE FAZER ISSO, ESTÁ ME OUVINDO!? POR QUE ESTÁ
FAZENDO ISSO? O QUE EU FIZ PRA VOCÊ? COMO PODE ACABAR
CONOSCO ASSIM? O QUE ESTÁ DIZENDO???
Ele diz e vejo Jon entrar com tudo no escritório, ele primeiro, depois meu pai,
Tay, e minha mãe.
— Sai de cima dela!!!
Jon diz ainda sem tocar nele, Chris obedece sua ordem na hora.
— Só estávamos conversando!!!!
Eu digo tentando acalmar os ânimos, mas...
— Seus braços estão roxos! Isso não me parece um diálogo saudável.
Jon olha para as marcas que Chris deixou em minha pele pálida, e então todos
passam a reparar.
— Podem nos deixar conversar em paz???
— Não. — meu pai diz e eu olho para minha mãe pedindo ajuda. — Essa
conversa não é mais particular. Já chega Ana Luiza, não abuse de minha
sanidade. Pela tua mãe, pelas crianças que estão na sala, levarei esse menino
de volta pro aeroporto agora mesmo, e vou fingir que ele não veio até aqui!
Vou esperar lá para ter certeza de que ele embarcou, e então voltarei pra cá.
— Não, pai.
Eu digo de cabeça baixa e o escritório todo treme com a tensão. Jon respira
fundo sem olhar pra mim, Tay passa a mão na cabeça, e minha mãe fecha os
olhos lamentando profundamente o que provavelmente viria a seguir.
Me aproximo de meu pai, seguro o impulso de abraça-lo e chorar, chorar,
chorar até cansar, e apenas falo enquanto minha mão repousa leve em teu
peito.
— Pai, me escuta... eu acabei de dizer que ele não devia ter vindo, que ele
cometeu um erro, e que ter ficado com ele foi um erro, foi bom ele ter vindo
porque pude dizer isso pessoalmente! Acabou! Só quero continuar estudando,
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ele me deu motivos para não confiar mais em suas palavras, e eu estou bem!
Tudo acabou bem. Apesar de tudo, Chris sempre me tratou muito bem, e foi
minha única amizade em Nova York durante muito tempo, me ajudou muito.
Ele fez uma viagem longa, cansativa, deixe a mamãe acomodar ele em um
dos quartos vagos para descansar essa noite, não faça isso, não me mate de
vergonha! Não deixe-o sair daqui tendo a certeza que minha família não bate
bem, pelo amor de Deus! Deixa-me tratá-lo como uma visita, como a gente
trataria qualquer outra pessoa... não o maltrate, não o machuque, não seja um
ogro! Eu quis namorá-lo, não desconte nele, pai. Por favor! Leve ele amanhã.
Eu peço orando a Deus que aquilo funcione e meu pai leva muito tempo
pensando.
— Uma noite, até amanhã bem cedo. — ele começa e Jon sai do escritório
muito, mas muito bravo, meu coração chega a ficar espremido ao vê-lo fazer
isso. Eu definitivamente perderei meu caçador, simplesmente por não
expulsar Chris de minha casa! — Você dormirá em nosso quarto, nada de
visitinhas de madrugada, nada de bate-papo!
Ele diz e nem consigo sorrir. Jon saiu do escritório e tirou de mim a
possibilidade de ficar feliz por meu pai ter relevado.
— Obrigada!
Eu digo, olho para minha mãe, ela toca o ombro de Chris levando-o para fora
do escritório, e meu pai os segue. Fico ali perdida com Tay me encarando e
sinto o mundo ruindo sob meus pés. A dor e o caos que eu sentia, eram
horripilantes. Aquelas eram as piores férias de minha vida.
— Ele vai entender, não é mais um moleque...
Tay diz e eu lamento enxugando as lágrimas.
— Não viu o jeito que ele saiu daqui? Ele não entendeu. Dei a entender que
fiz uma escolha e ficou bem claro pra ele quanto pra mim. Talvez eu pensaria
da mesma forma...
— Duvido. Você entenderia! Tenho certeza! É só dar um tempo pra ele.
— Eu estou tão cansada, tão cansada!
Eu digo escondendo o rosto com as mãos e de repente sinto o abraço amoroso
de meu irmão ao redor de mim. Tay estava cheio de problemas, mas parou de
focar nos dele para cuidar dos meus! Seu abraço me mantinha de pé, e
segurava além do meu peso, toda a tristeza que eu sentia. E aquilo era sim,
consolador. Agradeci por isso.

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Me deitei pra dormir cedo, fiquei por muito tempo tentando falar com Jon e
me explicar, mas não consegui. Ele fugia de mim, dos meus olhares... parecia
chateado e extremamente triste. Eu queria saber o que ele estava sentindo,
queria poder abracá-lo e confortá-lo na esperança de que eu pudesse também
me sentir melhor. Mesmo não estando arrependida, mesmo sabendo que
minha decisão não tinha nada a ver com os dois... eu me sentia mal por Jon e
sentia sua falta perto de mim. Ele gostava de mim, Jon gostava de mim do
mesmo jeito que eu gostava dele, e aquilo era incrível do mesmo jeito que me
dava medo. Cada vez que pensava nele, mais dor eu sentia, e mais mal eu
ficava por causa de nossa situação.
— Ei... Lulu!!!
Acordo com Tay me chacoalhando levemente.
— O que foi?
Resmungo morrendo de sono, tinha dormido mal a noite toda.
— Desce. Você precisa ouvir isso!!!
Eu me levanto já preocupada e vejo que a cama de meus pais já estava
arrumada. Escovo os dentes, coloco uma roupa mais decente do que meu
pijama de girafas, e desço.
— O que houve???
Estavam todos na sala. Menos, Nina, Ellen, e as crianças.
— Se encontrou com aquele pirralho de madrugada?
Meu pai começa o interrogatório.
— Claro que não! Dormi do lado de sua cama, posso apostar que se eu
tivesse levantado o senhor notaria na hora. — eu digo e ele respira fundo.
— Fui até o quarto dele. Mandei fazer o café mais cedo para que ele pudesse
se alimentar e ir para o aeroporto. Quando entrei lá, não o encontrei. Ele
sumiu sem deixar rastros.
Meu pai diz e eu ouço um silêncio sepulcral, todos na sala esperavam por
uma reação descontrolável da minha parte, e eu podia sentir que já
preparavam o discurso, ‘'tudo vai ficar bem!’ ou ‘ele está bem, deve ter ido
embora sem querer atrapalhar ou incomodar ninguém...’.
— Já estão procurando por ele?
Pergunto olhando para Jon, mas ele ainda não me olhava nos olhos.
— JÁ ESTÃO PROCURANDO POR ELE???
Eu grito pra ver se ele reage, mas não adianta muito. Jon continua parecendo
uma estátua. Tinha a cabeça apoiada nas mãos e parecia pensativo. Como se
“quisesse ser incluído fora dessa”.
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— JON!!! — eu grito de novo e enfim ele me olha.


— Não. Acho que ninguém começou a procurar. Não sei sobre seu pai ou seu
irmão, mas eu não farei nada. Não vou procurá-lo, senhorita Luiza!
Ele diz sem demonstrar sentimento nenhum e meu coração se enche de dor.
Fico morrendo de medo, mas pergunto mesmo assim: — E por que não?
— Porque não estou a fim. Suspeito que ele tomou chá com juízo para
suportar o frio mineiro ontem à noite, e “meteu o pé” logo cedo! Ele veio até
aqui por conta e risco, é maior, vacinado, responsável por si mesmo, e não
tem vínculo nenhum comigo.
— E nem comigo você tem? Hum???
Eu questiono e ele me olha de forma diferente como se dissesse: “Tome
cuidado com o que vai dizer, menina!”
— Eu sempre cuidei da senhorita. Me importo com você, juro! Mas com ele
não.
Jon diz de forma profissional e tenho certeza de que foi ele quem sumiu com
Chris. O que será que ele fez com Chris???
— Disse que me protegeria... Você disse que me protegeria!
Solto pro universo e mando “todo o mundo ir pro inferno”.
— Você está segura.
— Não com Chris desaparecido. Os pais dele vão procurá-lo, chegarão até
aqui, chegarão até nossa família!!!
— Não seja tola, Ana Luiza, nem pais ele tem, ele não tem ninguém! Foi
bom ele ter saído do seu caminho.
Jon diz e me sinto tonta com toda aquela nova informação. Eu fui
apresentada aos pais dele, como assim Chris não tinha ninguém?
Jon ameaça sair da sala, mas eu o impeço. Eu estava mais do que furiosa,
chateada, e putaça.
— Foi você, não foi? O que você fez? O que você fez, Jon???
Eu rosno de raiva e medo pela vida de Chris, e Jon se afasta dos meus
empurrões que nem o tiravam do lugar.
— Vê se não me torra a paciência! Seu pai não tem o número dele, e eu não
quero abrir meu notebook para pesquisar, não perderei meu tempo. Antes de
me acusar, apenas ligue para ele e pergunte onde ele está! É mais simples do
que criar ideias mirabolantes! Aquele pirralho não merece nem uma bala do
meu revolver!
Ele diz e sai da sala, simplesmente se retira. Meu estava com um semblante
indecifrável, mas eu havia mandando toda aquela situação pro inferno, então
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não me importei.
Pego o celular que minha mãe me deu — meu pai revira os olhos ao ver o
aparelho diferente, mas eu ignoro. — e disco o número que eu sabia de cor.
Chris atende no terceiro toque.
— Chris... graças a Deus. Onde você está???
— Estou fugindo desse hospício.
— Por que está dizendo isso? Por que partiu sem falar comigo? Meu pai está
te procurando, estão todos preocupados, o que está fazendo?
— Seu novo namorado me fez sair correndo daí, logo que todos foram se
deitar. Disse que era melhor eu sair de noite, do que não sair. É um tremendo
maluco, praticamente ameaçou tirar minha vida, o cara colocou o cano de
uma arma na minha boca. Se é por ele que está apaixonada, te desejo boa
sorte, vai precisar! Aliás, quer saber!? Vocês se merecem, você, ele, sua
família... sua mãe até que foi receptiva e até se desculpou comigo, mas o
resto... não quero te ver nunca mais, Louis, nunca mais. Perdi tempo demais
com você! No fim acho que é você que não me merece! Eu mereço uma
mulher de verdade, não uma patricinha mimada que não consegue cuidar da
própria vida! Tenho é pena de você! Adeus!
Chris diz com rancor e desliga o telefone na minha cara.
— O que ele disse? — meu pai pergunta curioso assim que desligo.
— Disse que precisava fugir desse hospício.
Eu resmungo concordando e subo para minha cela. Eu precisava usar a minha
camisa de força, ou faria alguma besteira sem concerto, sem volta.

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33
QUANDO O ANJO SE ENCANTA PELA CRUELDADE DO DEMÔNIO

— Que clima todo é esse???


Pergunto ao Tay, assim que chego da rua com Nina e as crianças. Tay se
levanta depois de abraçar e beijar Catarina, e apenas toca meu rosto com a
mão, em respeito ao meu pedido para se controlar perto de Cat.
— O ex-namorado da Lulu foi embora sem avisar ninguém.
Tay diz e eu entro em desespero.
— Ele está bem? Ele está bem, não é?
— Está, ele está bem! Lulu ligou pra ele e ele disse que já estava indo pra
casa!
— Por que ele fez isso? O que aconteceu? — eu pergunto e Tay segura um
riso.
— Eu acho que Jon colocou o moleque pra fora de casa no meio da
madrugada!
— Ai que dó… não acredito!!! Que maldade do Jon…
— Eu faria o mesmo!
Tay diz sem sorrir e eu me sinto feliz. Começo a ver a atitude do Jon de
forma diferente e enfim ele sorri, entendendo o que aconteceu com minha
mudança de opinião.
— Eu tenho que ir, volto logo!!!
Tay se retira da sala horas depois e eu o sigo. Ele me abraça, envolve minha
cintura com seus braços fortes e eu me sinto a mulher mais amada do mundo.
— Tente não demorar, por favor!!! Tenho medo dela te prender lá, Cat ficará
triste se você demorar muito ou não aparecer!
— Ninguém no mundo vai me impedir de participar do primeiro aniversário
da minha princesa! Ninguém. Não se preocupe com isso! Eu amo vocês, amo
mais que tudo no mundo!
Nos beijamos por um momento e naquela tarde fria começamos a sentir um
calor de outro mundo.
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— Temos tempo???
Pergunto tentando abrir o botão de sua calça, mas ele só sorri.
— Não. Não temos. Preciso chegar mais cedo, não quero dar motivos para
aquela megera me punir justo hoje. Controle-se e quando eu chegar, depois
que a festa acabar, eu cuido de você!
— Cuida é!?
— Cuido!!! Precisamos de um moleque agora, nunca troquei as fraldas de
Catarina, preciso saber como é a sensação!!!
— Não vai perguntar se quero ter mais filhos?
Eu questiono rindo, e Tay parece triste.
— Não quer???
Ele pergunta e encosta a sua testa na minha. Tay fecha os olhos para ouvir a
minha resposta.
— Até antes de voltarmos, não queria, nunca mais! Mas agora é tudo o que
mais quero. Quero encher essa casa com nossos filhos, um monte de
príncipes e princesas. Nem babá eu vou querer, vou te dar um mundo de
fraldas pra trocar. Vou fazer de você o homem mais feliz do mundo! Não sei
se reparou, mas eu tenho um belo de um traseiro agora… acho que dá para
aumentar mais um pouquinho!!! — eu digo e ele sorri me beijando.
— Eu reparei assim que te vi! Vou me esbaldar nesse traseiro hoje à noite!
Eu te amo, meu bem!!! — ele ri. — Meu bem…
— Oh! Como você foi velho agora, vai trabalhar, meu bem! Meu gostoso!!!
Te amo mais!
Eu digo agarrando o meu príncipe. Por que era tão difícil me despedir? Eu
não sabia dizer ao certo. Eu só sabia que com Tay por perto minha vida
ganhava mais cor, meu dia-a-dia ficava mais ensolarado, e minha felicidade
só aumentava, por isso não via a hora dele tirar umas férias iguais a de Jon!
Queria Tay pra mim por tempo indefinido. Quem sabe poderíamos viajar nós
três, voltar para o Rio Grande do Norte, agora com uma filha… quem sabe!?
Eu ia amar!
Passo o dia resolvendo as questões do aniversário de Catarina junto com tia
Hella, Nina e Lulu e Rafa se propôs a ser o babá do dia, e levou as crianças
para passear para que a gente pudesse resolver tudo com tranquilidade. Por
diversas vezes pensei em ligar para Yan e chamá-lo para participar, pois eu
sabia que Catarina ficaria feliz em vê-lo. Mas eu sabia que essa felicidade não
ia se estender para a família toda! Então eu pensei, pensei, e decidi ligar
depois, nem que fosse para levar Cat lá fora, para ele dar um abraço, um
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presente, que seja… Eu sabia que era o certo a se fazer apesar de tudo, e
lamentava por ter que ser assim.
Tudo aconteceu tão rápido, terminei com Yan sem pestanejar, o fiz sofrer de
repente, foi tudo tão rápido... mas eu estava tão feliz, tão feliz...
A festa estava marcada para as sete horas. Chegou as quatro da tarde, cinco,
seis, seis e meia, e nada do Tay chegar. O buffet chegou, as crianças que tia
Hella convidou das fazendas vizinhas chegaram, os amigos da família, minha
mãe, meu tio, todos chegaram na hora certa, menos ele. Dei banho em
Catarina, coloquei sua fantasia de Barbie princesa, e logo ela tratou de me
questionar.
— Cadê o papai Tay? Ele não vem???
— Claro que vem, filha! Ele já deve estar saindo do trabalho…
Eu digo e ela sorri balançando o tule do vestido. A cada minuto que passava,
mais nervosa eu ficava. Tay havia me prometido que ninguém o impediria de
vir participar da festa de nossa filha, ele não podia deixar ninguém fazer isso.
Não podia fazer isso com Catarina.
— Está tudo bem? — Max se aproxima de mim e questiona algumas horas
depois.
— Não, estou preocupada! Tay ainda não chegou, se ele ficar preso lá, Cat
ficará extremamente chateada! Não sei o que fazer!
Olho para Cat brincando com as crianças de longe, e peço a Deus que Tay
apareça logo.
— Já tentou ligar pra ele?
— Só umas mil vezes… — eu digo e ele para pra pensar.
— Ellen, está na hora. Já foram todos servidos muito bem, já comeram,
beberam, acho que está na hora de cantar!
Tia Hella se aproxima e eu olho ao redor, a decoração rosa e preta impecável,
os garçons servindo todos com elegância, a música infantil alta, a alegria, o
sorriso de todos… passo meus olhos por toda a sala com decoração
requintada como Catarina merecia, procurando forças em algum lugar por ali,
mas não encontrava de jeito nenhum.
— Vou procurar por Jon, aguenta mais cinco minutos Hella, vou pegá-lo e
vamos juntos procurar por Tay!
Max diz e sobe em direção aos quartos. Fazia um tempo que eu não via nem
Lulu e nem Jon, mas também, de tão preocupada que eu estava, nem tinha me
trocado, eu continuava de calça jeans e camiseta, mesmo tendo comprado um
vestido de Barbie para ficar “tal mãe, tal filha”. Minha angústia não me
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deixava participar de corpo e alma daquela festa. Um mau presságio parecia


tomar conta de meu coração e com relação a Jon e Lulu, naquele momento,
não foi diferente.
— Mami, cadê o papai???
Catarina pergunta pela milésima vez, no mesmo momento que eu desligava o
telefone, tentando pela última vez entrar em contato com Tay.
— Ele já está vindo, Catarina! Tenha paciência, filha!!! Só mais dois
minutos!!! — eu me abaixo e peço com um nó enorme na garganta. Catarina
abaixa a cabeça entristecida, e eu a abraço… — Eu juro que ele vem, eu
prometo!!!
Acabei de assinar a minha sentença prometendo algo que eu não poderia
cumprir. Apenas confiei no homem que nos amava!!!
— Psiu!
Escuto alguém chamar nossa atenção e quando olho pro alto vejo Yan parado
em nossa frente. Ele estava arrumado e com um enorme presente nas mãos.
Mas Catarina demonstrou empolgação ao vê-lo, mas não conseguiu esconder
sua tristeza.
— Oi, princesa!
— Oi, papai!
— Feliz aniversário!!!
Yan diz e abraça Cat com carinho. Eu só me perguntava como ele soube da
festa, se eu mesma esqueci de ligar.
— Trouxe um presente!!!
Ele diz e Cat sorri ao ver o tamanho do presente, mas só o abraça, e apóia a
cabeça em seu ombro.
— Obrigada. Pode colocar na caixa!!!
Eu aponto para a caixa de presentes e peço para Cat ir brincar com seus
novos amiguinhos e primos.
— Pensei em te ligar, estou tão preocupada que acabei esquecendo. Como
soube da festa? — eu pergunto quando ele volta.
— A ex-madrasta dela me avisou por SMS que teria uma festa de aniversário
pra ela. Achei que tinha direito de participar.
— Claro que tem! Tem sim! Vocês andam se falando bastante?
Eu questiono e Yan sorri.
— Ela me procurou para me juntar a ela, e me vingar de vocês como em um
filme, — Yan ri. — mas me sinto muito velho para essas coisas! Pensei sobre
tudo e recusei, só quero te ver feliz, não importa com quem seja, mesmo que
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isso me destrua completamente. Como você está? — ele diz e me sinto


péssima.
— Péssima. Ela está fazendo de tudo para nos destruir e hoje vai conseguir…
está atingindo Catarina, provavelmente prendeu Tay na escola, estamos
atrasados para cantar parabéns, e Catarina não para de perguntar por ele.
— Agora eu entendi o porquê da mensagem, é para ele dar mancada e eu ser
o herói de Catarina. Ela quer atingi-lo. Ela realmente parece muito triste.
Nem se interessou pelo presente que me pedia há dias. Catarina não merece
passar por isso!!!
Yan falava parecendo falar consigo mesmo e olha pra ela, Catarina estava
sentada olhando as crianças brincarem e parecia muito chateada, beirando um
choro de doer o coração. Ele volta a me olhar, respira fundo, e se despede me
dando um beijo no rosto.
— Aonde vai? Pelo menos VOCÊ tem que ficar, não é!? Catarina vai sofrer
sem um, quem dirá sem os dois.
— Bobagem. Vou fazer a coisa certa. Aquela cão-de-caça dele foi
convidada? Está por aqui?
— A Laura? Não… eu, realmente não estou com cabeça, também não liguei
pra ela, realmente não estou pensando direito hoje, Yan...
— Vou até a casa deles. Eu já volto.
— O que vai fazer?
— Trazer o sorriso de minha filha de volta. E o teu também!!! Vai se
arrumar, você fica linda de qualquer jeito, mas só tem você descabelada, de
calça jeans e chinelos de dedos por aqui!!!
Yan sorri para mim e sai apressado do casarão. Eu fico travada pensando se
entendi direito… Yan ia buscar o Tay??? O YAN, AJUDAR o TAY????

Pelo ponto de vista de Yan

— Ai, Yan… você é um tremendo babaca!!!


Resmungo enquanto afundo o pedal do acelerador.
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— Não sou não. Catarina não merece sofrer, Catarina não tem culpa de
nada… é um anjo, uma bebê linda que só merece a felicidade, minha filha
amada, e por ela eu sou capaz de pisar no meu orgulho ferido, meu ‘H’
maiúsculo, minha dor de cotovelo, e minha raiva por aquele playboy de
merda!
Resmungo de novo e balanço a cabeça. Eu estava pirando.
Fiz o certo em falar ‘não’ para Julia, eu não podia me rebaixar a tanto. Sou
homem, sou digno, e muito provavelmente perdi Ellen porque ela realmente
não me amava, simples assim. Meu lema sempre foi: “Amar não é pecado,
não é uma desgraça”, por isso continuarei amando Ellen, Ellen continuará
amando o filho da puta, e daí por diante. Antes torcia para que ele a
machucasse só para ela notar quem ele realmente era, que o desgraçado não
havia mudado nem um pouco, mas sei que isso é egoísmo, amor não é assim,
não é isso, e eu realmente amo Ellen Maia. Naquele momento só esperava
não me arrepender, esperava que ele a fizesse feliz, muito feliz.
Grito pela mulherzinha irritante no portão após estacionar e ela sai parecendo
ter acabado de sair de um cochilo.
— Que foi, pedra???
Ela me chama assim quando me atende no portão.
— Pedra? — eu pergunto e ela revira os olhos.
— É! Pedra no caminho, pedra no sapato… fala de uma vez que tô ocupada,
Yan gostosão dos santos!!!
— Seu chefe está desaparecido. Não apareceu até agora no aniversário da
Catarina, e ela está beirando um ataque de choro, lá! O ataque. Está sofrendo!
Você precisa me ajudar a encontrá-lo!
Eu digo e ela sai de trás do portão, vestindo um pijama minúsculo e
colocando o cano de sua arma em minha têmpora.
— Tá de brincadeira comigo, galã? Eu sei que você está metido com aquela
vadia suja da Julia! Antes de tentar me colocar em uma armadilha, eu mato
você aqui e agora! Acha que tá lidando com quem? Some da minha frente!!!
Vai, vou te dar uma chance de sair correndo daqui, e me deixar dormir!
Ela fala apertando o cano em minha cabeça e já começava a doer. A mulher
era um demônio, um demônio com o corpo mais lindo que já vi, mas um
demônio. Ia de rainha da crueldade, a miss força aérea brasileira em pouco
tempo. Gostosa e má.
— Não vou a lugar nenhum! Vou deixar você falar com a Ellen e confirmar
tudo! Se não me ajudar, Julia vai conseguir o que tanto quer, e seu chefe
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nunca irá te perdoar por não ter acreditado e o ajudado.


Eu falo, ela tira a arma de minha cabeça, sai do meu espaço pessoal, eu fico
meio confuso entre pegar o celular e olhar pra ela, mas quando decido, ela
atende Ellen no telefone, confirma tudo, e corre para se trocar. Ela veste uma
roupa preta em que nada parecia confortável pra mim, mas pra ela, muito!
— Já usou uma arma?
Ela pergunta no banco do carona enquanto eu “corria” para a escola.
— Não.
— Pois hoje terá que usar!
— Não farei isso.
— Vai ter que se virar. Não vou poder ajudar os dois, vou ter que descobrir
onde ele está, não posso ser sua babá!
— Não se preocupe comigo. — eu digo e ela me encara.
— Por que está fazendo isso por ele?
— Não é por ele, não mesmo! Faço isso porque vi Catarina triste.
Eu falo e ela volta sua atenção para as armas e facas em seu colo.
Chegamos na entrada da escola, e ao vê-la, um soldado já abre a cancela.
Caminhamos rapidamente até a administração e vejo pela grande janela, Júlia
e mais um homem também fardado.
— Nogueira. O que faz aqui?
Julia ignora minha presença, se levanta da mesa, e interroga Laura de uma
maneira agressiva.
— Apenas vim buscar Tay! Hoje é o aniversário da menina dele, ela está
triste, está esperando pelo pai. Posso saber onde ele está, senhora?
Laura questiona olhando ao redor, como se procurasse não por Tay, mas por
pistas de seu paradeiro.
— Claro que sim! Ele foi preso por desacato hoje mais cedo.
Ela diz e Laura olha pra ela com uma fúria indescritível.
— Posso apostar que o desacato foi justo contra sua pessoa… seria incrível se
não fosse!
Ela fala e Julia levanta a cabeça.
— Foi sim, tentou me agredir.
— Posso apostar que tentou. — Laura sorri. — Posso falar com ele? Tenho
direito. Aliás, até onde eu saiba com relação as nossas normas, a família
deveria ter sido avisada na hora do ato. A senhora esconder a prisão resulta
em reclusão e até perda de sua patente.
— Bom, por hoje a senhora não terá contato com ele.
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Julia diz calmamente e como se já estivesse preparada, faz sinal para o


soldado ao seu lado, e ele se levanta da cadeira e caminha em direção a
Laura. Laura apenas sorri ao ver a cena. Quando vejo o que ele pretendia, dou
um soco — minha mão é pesada. — bem no seu nariz, e sinto uma dor
sinistra em minha mão. O cara só dá alguns passos para trás, mas Laura não
perde tempo, e acerta um chute em sua cara, fazendo jorrar sangue pelo
cômodo todo.
— Vamos lá, não tenho a noite toda.
Laura diz para Julia depois de fazer o soldado desmaiar, e chegara a vez de
Julia sorrir. Naquele momento a única coisa que tinha minha atenção eram
meus dedos que começavam a inchar. Eu definitivamente era um marica.
Acho que tinha socado o cara de mal jeito, ou estava ficando velho demais
para brigar pela dignidade de uma mulher. Laura era um demônio, mas ainda
sim, seria um brutamontes socando uma mulher, e isso eu não ia deixar
acontecer.
Naquele momento Julia voa na direção de Laura e acerta um soco em sua
face cortando seu supercílio de fora a fora. Laura não tem tempo de limpar o
sangue e pelo jeito lutava com o auxílio de apenas uma visão. Eu ficava
andando de um lado pro outro, prestando atenção no marmanjo caído, e
tomando cuidado para não ser atingido pela luta brutal que acontecia bem na
minha frente.
As duas estavam quebrando a sala toda. Como ninguém ouvia aquilo? Laura
parecia dominar com os pés, Julia pelo jeito tinha o domínio nos socos.
Estragou a cara sexy de Laura em pouco tempo, mas o demônio não ficava
pra trás, Julia a todo momento estava no chão.
— Isso parece uma briga de calcinhas, sua vadia! Faça melhor!!!
Laura resmunga e quando o auge da briga chega, Julia estava caída, e Laura
apontando uma faca para seu pescoço.
— Não… não faça isso, Laura, eu estou grávida!!! EU ESTOU GRÁVIDA
DELE!!!
Julia implora pela sua vida, e eu que fiquei travado por causa da briga o
tempo todo, continuei assim ao ouvir sua declaração.
— Como é que é!?
Laura questiona gargalhando, se afasta dela, caminha até chegar em minha
frente, em uma mesa que tinha quase voado para cima de mim, e arranca o fio
do telefone olhando nos meus olhos. Oh, demônio lindo.
— Tá grávida é!? Espere aí que vou dar um jeito nisso!!!
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Ela resmunga prestando atenção no fio, enfim o arranca com violência, pisca
pra mim, e volta para Julia, a quase morta.
— Dá o pescoçinho aqui, sua vadia mentirosa! Sua nojenta.
Laura resmunga, coloca o fio em volta do pescoço de Julia que se debatia
para evitar morrer e meu desespero cresce. Laura consegue dar umas duas
voltas, e puxa o fio com extrema crueldade para enforcar Julia. Laura estava
fora de si.
— Vamos ver se você não ganha esse bebê hoje…
Laura puxava cada vez mais e Julia ainda tinha forças para se debater quando
eu me intrometi.
— Solta ela, ela está grávida! Laura deixa ela ír, SOLTA ELA!!! SOLTA A
MULHER!
Eu tentava tirar Laura de perto da Julia, mas ela era forte demais. Tentei por
vezes colocar meus dedos por entre o fio para dar alguns segundos de
oxigênio a Julia, mas não adiantava, Laura apertava demais e eu não podia
contra ela, não sabia o que fazer!!!
— ELA É A RUIM, AQUI! ELA É O MONSTRO, NÃO VOCÊ. NÃO
PRECISA MATÁ-LA!!! JÁ SABEMOS ONDE ELE ESTÁ, CADA
MINUTO AQUI, MAIS CAT FICA TRISTE… DEIXE ELA AÍ!!! TAY
NÃO A QUER MORTA!
Eu digo no nome de Tay, e ela sai de um transe surreal, me “obedecendo”.
Julia que já estava mais lenta e perdendo o sentido com seus olhos revirados,
começa a tossir com dificuldade e se deita de lado querendo manter distância
do corpo de Laura.
— Olha só, nosso amigo aqui salvou você.
Laura diz, se levanta, bate em sua roupa para tirar a sujeira do tecido preto, e
se recompõe. Ela me dá as costas e se aproxima de um espelho cheio de post-
its e anotações da administração. Acho que queria verificar se estava muito
ruim, e notou o fato.
— Qual cela? — ela diz em volta alta, enquanto Julia ainda tomava fôlego.
— QUAL CELA, VAGABUNDA!
Laura grita e Julia sussurra.
— Bloco A… 3…
Ela fala, e Laura nos dá as costas após ouvir. Eu a sigo tomando uma
distância segura dela, e não sabia o porquê. Ela para em um bebedouro feito
de cimento, e lava o rosto, tirando o máximo que podia do sangue quase seco
de sua face. Caminhamos até as celas, e sua entrada foi liberada sem
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dificuldade.
— Brair, me dê as chaves da cela do Coverick!
Ela diz para um guarda que quase dormia sentado em uma cadeira, e ele na
hora obedece.
— A capitã sabe!?
— Não.
Laura diz simplesmente, e o tal de Brair, parece ignorar querendo que o
mundo se explodisse.
— Boa noite!
Laura diz para o playboy que andava de um lado pro outro dentro da cela.
— Por que demorou? Vai me dizer que foi a Julia que fez um estrago nesse
rostinho!? Que bosta, hein!? — ele resmunga, e os dois riem.
— O que esse mané faz aqui?
Ele questiona enquanto caminhávamos para o estacionamento, depois de
pegar seus itens pessoais em uma sala.
— Ele que foi em casa me chamar. Eu não sabia de nada, estava dormindo,
ele me contou que você não tinha chego na festa e que Cat estava
perguntando por você.
Laura diz sorrindo e Tay me encara por um momento.
— Sei que não fez por mim, mas obrigado!
Ele diz e eu reviro os olhos pra ele. Mesmo com toda minha boa intenção
pela minha filha, ele não me descia, nem me agradecendo de forma humilde
ele me descia.
— Não me agradeça. Fiz pela mulher que você diz amar, mas logo vai se
decepcionar por saber que Julia espera um filho seu!
Eu resmungo e ele olha para Laura estranhando o assunto.
— Ela “lançou essa” antes deu meter uma faca em seu pescoço.
Ela fala se explicando e os dois dão risadas de novo. Ele parecia certo de que
ela não estava grávida, pois nem se preocupou em negar a história pra mim.
Eu estava de mau humor, minha mão doía, minha cabeça girava com dor por
causa de todo o nervoso que passei, e não tinha tempo para oficializar a
bandeira branca e nem queria. Só precisava de um remédio urgentemente.
— Se puder parar no meio do caminho para eu descer no centro… Quero ir
até o posto de saúde.
Eu digo antes de chegarmos no carro e os dois me medem como se
zombassem de mim.
— Estômago fraco, galã?
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— Não, é só minha mão.


Eu digo sentindo a mão latejar cada vez mais. Nessa hora Laura para, se
aproxima e segura minha mão.
— Ah, é! Ele deu um soco no Santos em minha homenagem, para me honrar,
acredita Tay!? – ela fala sorrindo.
— Que fofinho!
Tay resmunga, e continua andando.
— Está tudo bem, não quebrou nada! O médico vai mandar por gelo, mas
quando chegar no casarão, a Laura pode te ajudar com isso! — Tay diz.
— Como sabe que não quebrei nada!? Nem olhou para minha mão seu
playboy metido à besta!!!
Eu digo e ele nem olha na minha cara. Filho da puta, nem se incomoda.
— Se tivesse quebrado você estaria se contorcendo de dor até agora lá na
administração. Só está com luxação, pare de miar bebê chorão, manézão!
Ele resmunga e Laura ri. Meu Deus, o que eu estava fazendo ali? Nem me
lembrava do porquê eu não tentava enforcar ele também…
Chegamos ao casarão e Ellen tinha feito o que recomendei, tinha se arrumado
toda, ficado linda, e usava um vestido idêntico ao de Cat. Estava como uma
princesa, igual a nossa filha. Cat ao ver o pai, corre para abracá-lo e com isso
parte meu coração em milhões de pedaços. A dor era um bilhão de vezes
mais dolorosa que a que eu sentia na mão. Meu coração não estava luxado,
estava triturado. Vejo Ellen abraçar o pai de sua filha e minha garganta se
fecha, eu não ia aguentar aquilo, não podia suportar, não ainda. Viro as costas
para ir embora dali, mas a demônio se coloca no meu caminho.
— Aonde vai corazón partido? — ela pergunta sorrindo.
— Para bem longe daqui…
Eu dou um passo, mas ela toca meu peito me impedindo.
— Espera! Te prometo que com o tempo essa dor absurda que você está
sentindo, não passará de uma lembrança longínqua. Juro pra você que não vai
doer para sempre. — Laura diz olhando para os dois e me parece saber
exatamente sobre o que falava, tipo por experiência própria! Só vendo seu
semblante saudoso que pude me lembrar de tudo o que Ellen me dizia dela e
sua paixonite pelo patrão e companheiro de trabalho. — Deixa eu ver essa
mão e depois você vai! Cinco minutos. Eu te devo isso!
— Você não me deve nada.
— Deu um soco nele para me defender, foi realmente bonitinho. Ninguém
fez isso por mim, nunca! Me deixa retribuir colocando um gelo, por favor! –
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ela fala e concordo.


Laura tinha seu supercílio inchado demais, cortes superficiais pelo rosto todo,
mas sua “preocupação” era com minha mão. Pelo jeito a demônio tinha um
coração, ou algo parecido com um.
Fico prestando atenção em suas unhas bem feitas pintadas de vermelho
sangue, e me pego lembrando daquelas garras super femininas puxando o
cordão em volta do pescoço da ex-amiga. Quem era Laura? Uma só pessoa
eu tinha certeza de que ela não era.
— Pronto. Vai ficar tudo bem, tome um remédio pra dor quando chegar em
casa, e vai acordar muito melhor! De qualquer forma acho que não deveria ir
embora. Também é o pai dela e aposto que ela vai perguntar por você.
Ela diz tocando com cuidado a trouxinha de gelo em meus dedos inchados.
Ela tocava a palma de minha mão por baixo, para apoiar melhor, e aquilo era
estranho. Eu me sentia estranho.
— Não vai não.
Eu respondo me lembrando da dor monumental dentro de mim. E naquele
momento Catarina entra na cozinha com Ellen e Tay segurando em suas
mãos.
— Papi, já é hora de cantar parabéns. Você não vai vir? Vem também, tia
Laura!
Cat diz e Laura sorri olhando para mim toda irônica. Forço-me a olhar para
os três e digo que vou sim. Por Catarina, suportaria, eu não tinha escolha,
realmente não podia ir embora.

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34
DESCONHECIDA
“Max vai pegar vocês dois juntos, vai se transformar no próprio caos que
carrega dentro de si, vocês entrarão em pé-de-guerra, lutarão, um
machucará o outro na carne por arma, na alma por palavras duras, e sangue
fresco inundará esse gramado o transformando em um lago vermelho, e
desse pedaço de terra, planta nenhuma nascerá — ela toca o gramado verde
com suas mãos cheias de anéis. — Vocês só vão parar as custas do
sofrimento de Ana Luiza! Ele te deu um milhão de chances para ouvir de
você a verdade, Jon, e você se negou a confessar. Se não mudar de tática
teremos uma grande tragédia nessa família! Você não foi cético a vida toda,
homem, só se nega a acreditar no que não vê e desconfia de todos ao redor,
porque foi traído pela mulher, enganado, magoado, e desconta tudo em si
mesmo. Teve o coração pisoteado uma vez e acha que vai ter sempre. Mas
não é bem assim. Já pode parar de caçar, Jonatas, ela está bem ali, — ela
fala rapidamente e nesse momento olha para Ana Luiza. — é só ir até lá e
enfrentar seu melhor amigo. Não precisa temer virar a caça, precisa soltar o
arco e a flecha, não vai ganhar e nem perder pro seu oponente, pois o mesmo
é seu melhor e único amigo, é o homem que luta por sua dignidade — da
filha. — e não pelo seu coração, (ELE) não é uma ameaça pra você. Sua
verdadeira guerra é contra você mesmo. O lado da batalha que tem o amor
como bandeira, sempre vencerá! Você ainda tem o dia de hoje.”

Trecho da versão de Jon e Chris do blog, onde Jade diz para Jon tudo o que ia acontecer se ele não
confessasse a Max o amor que sentia por Ana Luiza. Acesse www.marjorylincoln.com.br e tenha
acesso a mais extras da série.

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...E aí eu vejo aquela cena bizarra e sinto o climão no ar… Laura cuidando
dos machucados do gerente no maior love. Olho por um momento para a face
de Ellen e seu semblante é indecifrável. Não sei se ela tinha gostado, odiado,
ou ficado indiferente ao que presenciamos.
— Vamos, vamos logo, logo, logo!
Cat canta chamando os dois e Yan se livra do gelo. Ele evitava olhar
diretamente para nós, e eu sei que o que fez pela felicidade de Cat e Ellen, foi
um sacrifício e eu entendi isso, admirei também.
— VAMOS CANTAR PARABÉNS MEU POVO LINDO!
Cat grita fazendo todos gritarem e darem risadas ao mesmo tempo assim que
voltamos para a sala.
— Espera meu amor, falta o vovô e seus tios!!! Espere aí que vou chamá-los!
Minha mãe sobe as escadas correndo, demora um pouco, e volta com um
semblante aterrorizado, mesmo! Ela faz um sinal para eu dar continuidade e
coloca a mão na testa parecendo estar sem rumo e totalmente perdida. Só de
olhar para ela eu já estava preocupado, mas avisei para Ellen começar, e ela
assentiu olhando para minha mãe sem fazer perguntas.
Cantamos, cortamos o bolo, oferecemos as lembrancinhas, fizemos todo o
ritual e enfim, pelo que me pareceu uma eternidade, a festa acabou, e só nos
restou a família.
— O que houve, mãe? O que você tem? Cadê o papai, Lulu e o Jon?
Eu pergunto e ela me olha em pânico.
— Estão no quarto. Acho que ele pegou os dois juntos! Não me deixou entrar
e nem deixou os dois saírem. Seu pai está fora de si, gritou comigo, até a sua
voz estava diferente…
Minha mãe começou a falar e isso chamou a atenção da família. Fizemos um
aglomerado e logo em seguida, todos falavam ao mesmo tempo.
— Tay…
Ellen resmunga baixo no meio de todo alvoroço, mas eu escuto com precisão.
— Me ajude a colocá-la na cama!
Cat tinha adormecido em seus braços. Eu a peguei no colo e subi com Ellen
ao meu lado para colocá-la para dormir. Coloquei ela na cama, tirei suas
sapatilhas cor-de-rosa, e dei um beijo em sua testa desejando uma noite de
sono maravilhosa.
Desço da cama e proveito os últimos minutos de silêncio e “paz” para abraçar
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bem apertado minha linda mulher.


— O que Max vai fazer? Acha que devo ir pra casa com a Cat? É melhor,
né!?
— Não, vocês não sairão de perto de mim, nunca mais! Vamos resolver isso,
meu pai vai superar isso. Tem que superar. E a louca da Julia está por aí, ela
me prendeu alegando desacato depois de me proibir de sair do escritório,
Laura a arrebentou, então não quero facilitar. Não quero vocês longe do meu
alcance, de jeito nenhum.
Eu digo, ela concorda, e voltamos para a sala logo em seguida.
— O que acha que devemos fazer, Jade?
Eu questiono assim que percebo que Jade era a única que não pronunciava
uma única palavra, e todos ficam em silêncio para ouvir o que ela tinha a
dizer.
— Não há nada a fazer. Apenas esperar.
Ela diz parecendo estar longe demais daquela sala.
— Mãe…
Rafa que andava de um lado pro outro, chama a atenção da mãe.
— Só podemos esperar, — Jade repete a frase com calma para o filho
entender. — disse a Jon que ele precisava enfrentar, assumir isso, contar para
Max e ele não o fez. E não o culpem! Ele tinha medo de sua reação somente
por não saber o que Max faria com a filha! Jon tem o coração mais nobre que
eu já conheci… tinha total devoção a seu irmão de espírito, mas ela mudou
assim que viu Luiza. Agora ele pertence a ela, sua lealdade é somente para
com a menina, Jon a idolatra. Max deveria ficar feliz, mas o sentimento de
traição está cegando seus olhos, deturpando seu juízo. Ele deu a ele diversas
oportunidades para falar as claras, mas Jon temeu pela segurança dela. Agora
ele descobriu encontrando os dois juntos e dessa forma, a dor é similar a uma
facada nas costas. Nada posso fazer contra sua fúria momentânea, em nada
posso ajudar!
— Pode sim!!!
Rafa quase grita e Jade respira fundo! Nina que também tinha colocado os
gêmeos para dormir, volta, e se aproxima do marido.
— Rafa se acalma, se sua mãe está dizendo que não é possível, é porque não
é!
Nina diz e Rafa sai pisando duro em direção a cozinha.
— Do que ele tá falando?
— Bobagem! Se tivesse uma única possibilidade de tudo ficar bem por aqui,
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eu faria. Eu sinto muito, Tay!


Ela diz e vai atrás do filho. Jade sai e deixa um silêncio fúnebre no recinto.
Sento-me no sofá e Ellen me abraça imediatamente. Cinco minutos depois
ouvimos passos na escada, meu pai desce como se tivesse perdido uma
guerra, um parente, um amigo, ou melhor, uma filha. Ele segurava sua arma
com silenciador na mão esquerda e tinha sua cabeça baixa, costas encurvadas
e olhos inchados.
Todos nós levantamos ao mesmo tempo, mas é minha mãe quem corre ao seu
encontro.
— Max…
— Não me toca! Você sabia! Esse tempo todo, todo mundo sabia e ninguém
fez questão de me contar, não me toca!
Meu pai quase derruba minha mãe no chão ao passar por ela, e se senta no
sofá vazio.
— Cadê eles? O que você fez?
Pergunto e ele apóia a cabeça nas mãos.
— Não fiz nada. Jon está se vestindo, o peguei semi-nu, se enroscando em
tua irmã! Engraçado que vocês pensaram que eu ia matá-lo, não é!? Só
conversei, mandei ele ir embora e nunca mais pisar aqui, nem procurar por
minha filha. Mereço uma estrelinha de boa conduta na testa!
— Eles se amam, Max! Não entende o que é isso?
Minha mãe diz com raiva.
— Amor? Não. Só amei apenas uma mulher pela vida toda. Só uma, e não
era minha sobrinha! Não tinha parentesco, não troquei as fraldas dela. Aliás,
foi a primeira que me esfaqueou pelas costas!
— Eu não traí você! E Jon nunca foi tão ligado assim à Luiza! Não exagera.
Ele é íntegro, decente, trabalhador, é teu melhor amigo, irmão, que seja, e
quem melhor para namorá-la senão um homem que a gente confia e sabe que
a manterá segura!?
— ELE ME TRAIU!!! — ele grita com toda sua força, e Jade volta com Rafa
da cozinha. — TRAIU MINHA CONFIANÇA, MENTIU, ME
ENGANOU!!! CONFIEI MINHA FILHA EM SUAS MÃOS PARA
VIAJAR, E ELE SE APROVEITOU DELA, UMA MENINA! ABUSOU DA
MINHA FILHA!
— Uma menina, não! Uma mulher! Foi Luiza quem se interessou por Jon
primeiro, foi ela quem o procurou, ele não abusou dela, ficaram juntos! Luiza
já é uma mulher há muito tempo, eles são maiores de idade, estão juntos, se
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amam e você não pode fazer nada contra isso!


— ELA É SÓ UMA MENINA!!! É MINHA FILHA, E POSSO FAZER O
QUE EU QUISER! VAI ESTUDAR E TRABALHAR, APENAS ISSO!
— Você é um tolo, Max! Um hipócrita ridículo, um babaca!!! Ficamos juntos
pela primeira vez eu era menor, me entreguei pra você quando ainda era uma
criança! Nós dois éramos crianças! Luiza só quer namorar e estudar, os
tempos são outros, não estamos na década de vinte, não encarne seu Luis!
— Pois é!!! Luiza não precisa cometer esse erro!
Meu pai diz e minha mãe parece ficar tonta com as palavras que ele joga nela.
Ela procura digerir suas palavras cheias de espinhos, mas parece não
conseguir.
— Está dizendo que nossa vida é um erro? Tudo o que passamos, tudo o que
vivemos, o que a gente disse um para o outro, nossa história… É um erro???
— Sim. Começamos errados, e daí foi uma sucessão de erros. Da minha parte
e da sua! Eu reconheço isso, você não???
Ele diz e duas lágrimas extremamente grossas caem dos olhos de minha mãe.
— Reconheço. Reconheço agora!
Minha mãe resmunga, tira a aliança do dedo e deposita com cuidado e uma
certa lentidão na mesinha do vaso de minha vó que estava ao lado do sofá.
Pela cara dos dois o casamento acabou ali. Meu pai pegou muito pesado e
com o semblante duro estava, assim ficou. Ele não parecia se arrepender de
ter dito aquelas palavras, e eu tinha duas impressões com relação àquilo: Meu
pai magoou a minha mãe para ela partir, porque ele não se julgava mais digno
de tê-la, e segundo: Meu pai quis dizer uma coisa, minha mãe interpretou
outra, e meu pai não quis se explicar ou se corrigir para ser melhor entendido.
Ou as duas coisas ao mesmo tempo, eu não sabia! Eu estava cansado e
extremamente triste. Já minha mãe parecia sentir apenas uma coisa:
Decepção.
Naquele momento Luiza e Jon descem as escadas e meu pai se levanta ao vê-
los de mãos dadas.
Lulu tinha os olhos inchados, e Jon uma fúria estampada claramente em seu
semblante.
— Cadê suas malas? — meu pai pergunta.
— Não vou embora, Max! Não sairei de perto dela e se eu for, ela vai
comigo, eu já te disse isso lá em cima! Ela não quer ir, por isso, permanecerei
aqui.
— Não abuse de minha bondade, Jon! Optei por não matar você em respeito
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aos anos que me serviu com lealdade. Por mais que isso tenha acabado,
considerei você. Arrume suas coisas e se mande daqui antes que eu mude de
ideia!
Meu pai avisa e Jon sorri nervoso.
— Eu amo tua filha. Ficaremos juntos. Por que não aceita logo de uma vez?
Não sou digno dela? Sou mais pobre? Menos estudado? Não tenho os olhos
azuis como todos que entram para a família? Não, espera, a família da bruxa
tem os olhos negros… qual é o MEU problema? Minha idade? Minha
profissão? As pessoas que já matei, que aliás, são números menores que os
teus!? O empregado da família não pode ter a mão da filha do patrão que é
muito areia para o caminhão dele? Nível muito acima!?
— Jon, para de falar bobagem!!!
Luiza resmunga sussurrando e chorando ao mesmo tempo.
— Eu não preciso dar explicações a você! Não quero e pronto!
Nessa hora meu pai já tinha fechado o punho e já estava beirando o limite.
— Você nem tem razões nenhuma, Max! É um bobo assustado, porque notou
que a princesinha já cresceu e nem gosta mais de brincar de bonecas! É a
minha vez de cuidar dela, vou cuidar muito bem, não se preocupe! Vamos te
dar lindos netinhos de olhos verdes, sogrão!!!
Jon zomba na hora errada e meu pai explode deixando sair o que estava
segurando há horas. Ele voa pra cima de Jon, o soca sem dó, quebram
diversos vasos e enfeites milenares da sala, e o arrasta para fora da casa com
uma força sobrenatural. Eu tento separar e levo um soco, Rafa que sempre foi
forte é praticamente jogado longe. A gritaria começa, Luiza se desespera,
minha mãe — que havia subido assim que tirou a aliança. — desce as escadas
assustada com a gritaria, e tudo piora quando Jon lança meu pai escada
abaixo da varanda.
Mando Ellen ir ficar com Catarina — eu tinha medo dela acordar assustada e
não encontrar ninguém por perto. — e volto a tentar parar aquela briga
patética.
— Vai me dar netos, é!? Vamos ver se você ainda vai conseguir dar conta
depois que eu capar você, seu filho da puta, desgraçado!!!
Meu pai resmunga e senta em cima da barriga de Jon logo após se levantar da
queda.
— PAI, PARA COM ISSO!!! PARA PAI!!!
Luiza grita com todas as suas forças, seu desespero era grande demais!
— Quantas vezes pedi que confessasse? Quantas chances eu te dei?
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Jon era bom na luta, era forte, rápido, mas meu pai era mais preparado. Ele
estava tirando sangue de Jon por prestações. Aquela era a briga mais feia que
eu já tinha visto, isso porque eu estava acostumado a ver uma por dia, durante
anos!
— Só vai me impedir de me casar com ela me matando, irmão Jon fala com
dificuldade e sinto Rafa se aproximar de mim.

— NÃO-ME-CHAMA-DE-IRMÃO SEU TRAIDOR! SAFADO!!!


Meu pai responde e chuta a barriga de Jon a cada pausa.
— Vou chamar a polícia, cara!!! Vou chamar a polícia! Ele vai matar o Jon!!!
— Rafa diz.
— Não. Ainda não!
Eu digo, pois não queria polícia metida na chácara. Eu tento separará-los de
novo, Rafa me ajuda, mas meu pai consegue de novo se livrar de nós dois.
— Se encostarem em mim, vou atirar! Não quero nem saber…
Ele diz nos avisando e volta a segurar e arrastar Jon pelo pescoço.
Eu ainda podia ouvir Luiza soluçar de tanto chorar, e ver os rostos
apavorados do restante da família. No momento em que meu pai começa a
bater a cabeça de Jon em uma pedra, eu o agarro por trás com toda a força
que eu tinha e o atraso um pouco, pois se Jon ainda estava vivo, depois
daquilo não ia permanecer por muito tempo. Jon não consegue se recuperar,
praticamente estava desacordado. Meu pai me acerta uma cotovelada no meu
estômago, acerta um soco em Rafa de novo, e volta a sua atenção para o Jon
novamente.
Nesse momento vejo Luiza sair correndo para dentro de casa e não consigo
fazer nada, eu ainda estava caído no chão tentando recuperar o fôlego. O soco
foi forte demais e quase desmaiei sem conseguir respirar, eu não tinha forças,
não conseguia levantar.
Ainda deitado, vi Rafa apanhar muito, minha mãe gritar, Nina tentando
ajudar o marido, Jade parecendo em transe, e Ellen chorando e tentando sem
sucesso, abrir a janela emperrada do meu quarto após me ver caído no chão.
Aquela janela estava com defeito.
Tudo parecia sem cor, tudo estava em câmera lenta, pedras e poeira caíam em
direção aos meus olhos e também já não enxergava direito.
Um borrão me fazia ver tudo desfocado, mas vi Rafa tombar para o lado,
Nina cair de costas no chão, meu pai sacar uma arma e apontar para Jon
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desacordado… e minha irmã descer lentamente as escadas da varanda com


uma arma na mão. Eu não conseguia gritar, levantar, me mover, ou fazer
nada, então chorei. Luiza tinha a postura de fracasso, fracasso e desistência.
Assim que ela caiu de joelhos, colocou o cano da arma na própria têmpora, e
a engatilhou, nessa hora tudo ficou em silêncio. Todo mundo parou para
olhar da onde vinha aquele barulho baixinho, e meu pai lamentou
profundamente ao ver a cena, lamentou tanto que afastou o cano da arma que
já havia deixado pronta para disparar.
Nada mais fazia sentido, meu pai tentava matar Jon, Jon tentava fazer meu
pai entender que amava a minha irmã, mas quem mais sofria ali, era
Luiza.Luiza chorava balançando os ombros e se balançava pra frente e pra
trás, e quando decidiu que já era a hora, fechou os olhos, eu fechei junto, e
pude ouvir o disparo.

Do que adiantava tanta luta por amor? Do que adiantava tanta resistência por
parte de meu pai se no fim Luiza morreria? Minha irmã, minha irmã que
tanto amo…
Assim que tomo coragem para abrir os olhos novamente, vejo todos,
inclusive Luiza, olhando para uma Laura vestida de roupão e cabelos úmidos
ao lado de um Renan também de roupão e parados nos encarando. Ela
caminha lentamente até Luiza, tira com cuidado a arma de sua mão, e faz um
sinal para Renan a tirar dali. Ele a pega no colo como se ela fosse um bebê e
entra pro casarão. Depois, Laura caminha até minha direção, olha para meu
corpo com uma certa preocupação procurando possíveis ferimentos e me
coloca sentado. Ali eu permaneço, mas ainda sim, não consigo falar. Meu
coração estava ferido e meu estômago estava latejando dolorosamente.
Ambos os ferimentos que ela não podia tratar.
Meu pai se recupera da fúria e se arrasta para longe do corpo de Jon, parecia
olhar ao redor e se perguntar o que tinha acontecido, o que ele tinha feito.
Eu nada ouvia, nada falava.
Rafa se recuperava, Nina parecia ter dificuldades para levantar depois da
empurrada que recebeu do irmão, minha mãe não saía do choque em que
entrou, e Jade já tinha saído do seu transe assim que Laura apareceu.

— Você está bem?


Laura me questiona assim que me recupero e volto para fora. A enorme poça
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de sangue que pertencia ao Jon tinha um formato arredondado enorme.


Brilhava de um jeito horroroso. A ambulância já tinha o levado e Rafa o
acompanhou.
— N-não. Quase vi minha irmã se matar, levei um soco forte na boca do
estômago, estou sentindo a dor até agora, e fiquei pela primeira vez em minha
vida, impotente. Não, eu não estou bem! — eu respiro fundo e olho pra ela.
— Como chegou até aqui? Ouviu a gritaria?
— É normal, não era uma gangue se matando, era sua família. Ouvi um
baque forte na porta da cabana, eu estava lá com Renan. Levantamos para ir
ver o que era, e não vi ninguém, saí na varanda e aí sim pude ouvir o barulho.
Alguém abriu a porta, alguém me pediu ajuda, só não sei quem foi. — Laura
diz simplesmente.
— Obrigada.
— Sou paga pra isso!
— Não. É sério! Obrigada!
Eu digo e ela diz “sim” com a cabeça.
— Era ele o cara daqueles encontros que você disse que tinha!?
— Sim. Já tem um tempo! Você sabe… — ela dá de ombros.
— Bom, vou me trocar e vou para o hospital ficar de olho no seu cunhadinho
quase morto, e liberar a volta de Rafa pra casa! Sua irmã ficará bem logo,
assim que o boy magia dela se recuperar. Ela não é uma suicida, fez aquilo
para parar seu pai e conseguiu! Eu reconheço suicidas de longe e ela não é
uma, então fica tranquilo, acabou! Amanhã é outro dia.
Laura diz, toca meu ombro com gentileza e sai. Ellen desce as escadas da
varanda com seu tio, e fica olhando ele partir.
— Tudo bem?
Eu pergunto, ela balança a cabeça, e sobe novamente. Ela sobe as escadas até
nosso quarto, entra no banheiro, e a vejo tirar os brincos e amarrar os cabelos.
— Você sabia? Que eles estavam juntos?
Ela pergunta me olhando através do espelho e eu logo respondo.
— Não. E você não gostou da ideia, não é!?
— Nenhum pouco!!! — ela responde sem hesitar. — Mas a vida é dele!
Minha preocupação agora é com a nossa vida! Quero tirar Cat daqui, não
quero que ela conviva com esse Max de hoje. É um ambiente muito pesado,
instável pra criança, e falo pelos gêmeos também! Seu pai está fora de si, foi
sorte demais ela não ter acordado e presenciado tudo!
— Concordo! — eu digo e me aproximo.
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— Como Jon está?


— Não sei. Laura foi pro hospital. Rafa ainda não ligou, Luiza quer que eu a
leve até lá. Vou tomar um banho e partir.
— Mas ela está bem para ir para o hospital???
— Ela queria ir junto com a ambulância, conseguimos impedir. Minha mãe
deu um banho nela, Jade fez um chá. Mas ela não vai sossegar até vê-lo. —
eu digo e ela concorda.
Chego com Ana Luiza no hospital e ela imediatamente procura por um
médico. Obviamente não teríamos notícias tão cedo, então ficamos na sala de
espera, esperando por muito tempo. Libero Rafa para ir descansar e ele diz
que só precisava de um banho, mas que logo voltaria.
— Precisa descansar, vai trabalhar amanhã… você pode ir se quiser. A Laura
está lá fora, não ficarei sozinha!!! — Luiza diz parecendo cansada.
— Ficarei bem aqui com você! Não vou te deixar sozinha!!!
Eu falo e ela coloca sua cabeça em meu ombro. Luiza estava cansada, triste, e
parecia acabada. Só não desistia de tudo ali, por Jon.
— É tudo culpa minha! Se alguma coisa acontecer com Jon, nunca vou me
perdoar!
— Ninguém tem culpa! Até papai que passou dos limites, tem suas razões. Vi
o jeito que ele ficou assim que “acordou” do transe furioso dele, ele nem sabe
direito o que fez, ficou maluco! Ele te ama, vai se desculpar com vocês dois,
vai aceitar esse namoro.
— Já não quero mais a aceitação dele, Tay. Não quero olhar na cara dele,
nunca mais na minha vida.
— Não fala isso, papai morreria!
— Não me importo!!!
Ela me olha com raiva e vejo a verdade em seus olhos.
Horas depois, quando minha mãe, Jade, e Rafa já tinham chego, o médico
aparece.
— São os amigos de Jonatas? — respondemos e ele continua. — Sou
Fernando, o médico responsável pelo seu atendimento! Bom ele está estável,
encontrei ferimentos de diversos níveis, perdeu um pouco de sangue,
hematomas por todo o corpo, um caso típico de quem foi espancado… não
quebrou nada, mas teve apenas uma complicação… — o médico mostra um
exame em raio-x que só me pareceu um borrão. — Muito provavelmente
perdera a memória de longo prazo, não se lembrará de algumas coisas por um
tempo. Jonatas não teve traumatismo craniano por muito pouco, mas as
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pancadas que levou na cabeça deixaram alguns danos no sistema responsável


por essas memórias. Esse é um exemplo de um exame de um paciente
saudável que peguei para que vocês possam entender melhor… — ele coloca
o exame na lousa branca luminosa e aí posso ver, ele mostra uma espécie de
via-láctea dentro de um crânio. — E esse é o resultado de Jonatas… — No
exame de Jon algumas estrelas haviam se apagado, muitas delas. — Não é
definitivo, aos poucos com exercícios especiais ele pode recuperá-las, poderia
ter sido pior! Ele está sedado agora, terão que ter um pouco de paciência, e
bom, esperanças de que ele melhore rápido também seria bom, fará bem a
ele! Ele ficará mais alguns dias em observação, e assim que for liberado, terá
que tomar a medicação devida, e precisará muito do apoio da família, já que é
uma situação complicada e difícil para o paciente! Por enquanto é isso, assim
que ele for pro quarto libero a entrada da visita. Ele tem mulher? Filhos?
— Tem! — eu digo e Luiza me olha de forma estranha.
— Preciso do contato deles! Precisamos informá-los, está bem!? Então é
isso! Qualquer dúvida, estou no plantão.
O médico diz parecendo ter feito tudo o que podia e Luiza volta a se sentar,
arrasada.
— Viu, ele ficará bem!!!
— Ele não se lembrará de mim. Papai não o matou, mas fez algo tão cruel
quanto, Jon não saberá mais quem eu sou. Sua ex em breve estará aqui, junto
com seus filhos, e eu serei apenas uma estranha. O pouco que vivemos, os
nossos beijos e declarações de uma hora atrás, para ele, não existe mais.
Papai tanto fez que arrancou a força o sentimento que Jon tinha por mim,
literalmente!

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35
INCONSCIENTEMENTE AMOR
Ponto de vista de Ana Luiza

Era fim de tarde, a fazenda Pôr do sol presenciava o fenômeno da natureza


que levava seu nome. O céu tinha rabiscos em tom aquarelado de laranja,
vermelho, e rosa clarinho, meu tom favorito.
Como em forma de protesto eu vestia preto, não em tom de zombaria, mas
porque simplesmente sentia que tinha perdido algo na noite anterior, eu tinha
perdido algo fundamental, e não sabia dizer o que era, mas sentia o luto.
O aperto na garganta, a dor no coração, o desânimo dominical, a ausência do
apetite, e a simples falta de vontade! Vovó me olhava sofrida do seu canto
favorito do sofá, ela ficava pequenina no meio de tantas malas empilhadas de
modo “organizado”.
Rosa claro era a cor que me deixava calma, parecia um presente dos céus
depois de tanta desgraça. O vento quase noturno passava por mim na janela, e
meus cabelos balançavam com uma certa preguiça, acho que era porque
parecia domingo.
— Ainda acho que devíamos esperar. Tenho certeza que a qualquer momento
o médico vai ligar, a visita será liberada!
Minha mãe se aproxima da janela. Não vestia preto, mas tinha a face de luto
também. Minha mãe estava sofrendo demais.
— Eu volto assim que ele liberar, no mesmo momento dou meia volta! Só

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não quero mais ficar nesse lugar, mãe. Daqui ainda posso ver o sangue de Jon
no gramado. Ainda consigo sentir o que eu sentia ao querer apertar o
gatilho… o desespero! Não quero mais sentir isso!
Eu digo e ela me abraça.
Tay, Ellen e Cat descem as escadas, enquanto Jade sai do escritório direto pra
cozinha, ela conversava com meu pai por mais de duas horas, como se
diálogo ajudaria em algo. Eu tinha dó da Jade, pena por ter se metido nessa
família. “A culpa era toda de Nina!” Penso, e sinto o humor negro que
chegava na hora errada, coitado do Rafa também, coitado de Jon… coitado
de qualquer pessoa que tentasse entrar para essa família.
— Podemos ir?
Tay pergunta e eu volto a olhar para o céu. Os planos eram: passar o resto da
semana na vila até Tay conseguir a transferência de urgência, e de lá, voltar
pra São Paulo para a casa de vovó, onde “caberia” todos nós. Gostei da ideia
simplesmente por saber que uma hora ou outra, Jon voltaria pra
Pirassununga, e aonde ele fosse, eu estaria.
Eu penso um pouco, confirmo para meu irmão com a cabeça, e ouço meu
telefone tocar, era Laura que fazia plantão na sala de espera do hospital.
— Oi, Laura, tem notícias?
— Oi. Na verdade tenho! Acho que seria melhor tu vir pra cá, viu, o médico
acabou de liberar a visita, acho que ele vai te ligar, mas a mulher dele e os
filhos chegaram primeiro. Achei que gostaria de estar
presente nesse momento.
— Com certeza! Obrigada, Laura!
Repito as palavras de Laura e o telefone de Tay toca, era Fernando, o médico
dele avisando que Jon fora pro quarto.
— Vamos então…
Eu resmungo e Nina, Rafa, e os gêmeos entram na sala. Nina deixa claro que
era melhor ficar e não lotar o quarto de Jon, pensando no teu bem-estar e eu
concordo. Além do mais ele não conheceria ninguém ali, não tinha porque
todos irem até lá. Apenas Tay e minha mãe fizeram questão de ir, e Tay não
quis deixar Ellen e Cat para trás, ele não disse, mas eu sabia que temia pela
segurança de ambas por causa da louca da minha ex-cunhada.
— Vamos até o hospital, e de lá direto pra vila. Assim não precisamos fazer
um vai-e-volta!
Tay resmunga para todos depois que Nina diz a respeito de ir logo para o
sobrado, arrumar tudo, e verificar como anda a cozinha.
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Assim que me despeço daquela linda obra de arte no céu, e pego minha bolsa,
um barulho de carro na estrada chama nossa atenção. Tay olha por um
momento e diz ser Julia.
Ele corre pro quarto, volta, e Ellen e ele trocam olhares difíceis de descrever.
Assim que nota seu nervosismo, ele a beija e diz que a ama, por um momento
invejo o amor tão lindo de meu irmão, os dois tinham uma linda história de
amor, e eu naquele momento, não tinha mais nada, nada além de lembranças
que não poderia dividir com ninguém, nem mesmo com Jon.
Sento-me no sofá e preparo meu psicológico para aturar Julia e seu possível
ataque de fúria, irritabilidade, ou chororô. Eu estava cansada e parecia que a
calmaria nunca faria parte de minha vida no Brasil.
— Boa tarde! Posso falar com você lá fora!? É importante!
Julia adentra a sala e vejo minha tia bufar, minha mãe espumar pela boca, e
Ellen se enroscar no corpo de Tay, possessivamente.
— Boa tarde, Julia! Não, eu estou ocupado agora, preciso ir pro hospital…
enfim, se tiver algo pra falar, pode falar agora e rápido porque tenho pressa!!!
Meu irmão diz e Julia parecia ter escutado o que queria. Ela abre sua bolsa,
tira um papel, e entrega para ele. Sua chegada faz meu pai e Jade saírem do
escritório para verificar o movimento diferente na sala, e podia apostar que
ele ouviu o barulho do carro dela, afinal, nunca deixava nada passar.
— O que é isso!?
Tay pergunta e Julia mede Ellen de cima a baixo ao responder.
— É um exame de sangue, estou grávida!
Ela fala e eu encosto minha cabeça no apoio do sofá, só consigo ver minha vó
resmungar: “Deus de misericórdia, minha nossa senhora de Aparecida!!!”
— Como é que é?
Ellen resmunga se afastando de Tay e parecia beirar o maior dos surtos! Se é
que me baseando nos últimos dias, eu conseguiria comparar quem mais
surtou, e o quão mais intenso foi…
— Fica calma! Vem aqui…
Tay ignora o papel e tenta trazer Ellen de volta para si, mas ela caminha de
costas e se não fosse por Tay, tinha caído por causa dos degraus que limitam
a sala para as escadas que dá no andar de cima.
— Fica calma??? Como assim???
Ellen tem seus olhos cheios de lágrimas, e ao ver a reação da mãe por causa
do que acabou de ouvir, Cat se pronuncia.
— Não fica triste mãe, ela é uma mentirosa! Uma bruxa malvada!!!
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Cat mostra a língua para Julia e Julia sorri.


— A bruxa malvada vai te dar um irmãozinho! Acho que não vai ser mais a
princesinha do papai!
Julia diz com maldade, eu me levanto, e Tay corre pra fazer ela engolir o
papel depois de falar daquela forma com Cat que já chorava por ouvir aquele
absurdo. Julia tinha pirado, TAMBÉM…
— Você já está em saldo negativo comigo já tem dias, não me faça terminar o
trabalho de Laura!!! Sua nojenta! Assim que descobri quem você realmente
era, me preveni. Paguei ao seu médico para realizar um teste depois de você
“tentar se matar”. Você não está grávida coisa nenhuma! Suma daqui antes
que eu faça uma besteira das grandes…
Tay rosna totalmente furioso e Julia gagueja.
— Eu estou sim! Faremos um DNA quando nascer, e tu vai arcar com suas
responsabilidades.
— Eu sempre estarei um passo á frente de você Julia! — ele fala e se
aproxima de Ellen. — O que eu pedi para Laura fazer aquele dia, não era
matá-la, só cuidei de possíveis problemas, mais mentiras que provavelmente
nos separaria de novo, como essa. Já que tentou se matar assim que descobriu
que eu ainda te amava, para dizer que estava grávida era só questão de
tempo! Ela não está grávida, esse exame vai te mostrar isso, eu te amo! A
única mulher que me dará filhos é você! Cat é minha única filha, e será filha
única até você engravidar e me dar outro presente!
Tay diz, entrega um exame para Ellen, e depois de ler, eles se abraçam com
Cat agarrada em Ellen, ainda chorando!
Tay se abaixa, pega minha sobrinha no colo e enche ela de amor, nesse
momento olho para Julia que assistia tudo aquilo e sinto medo. Medo não,
pavor por Tay, Ellen e Catarina, pois Julia carregava dentro de si, um ódio e
uma ira difíceis de descrever, mas que estavam ali, para quem quisesse ver.
Só sei que era horripilante.
— Você está cheia de ódio e inveja, vai acabar doente, sem nada, e sozinha!
Tem beleza demais por fora, mas seu interior é horrível! Sabe que vai perder
não é, menina!? Seu fim será horroroso!
Jade se aproxima dela, mas mantém uma distância segura.
— Se tem alguém aqui que vai perder, são vocês!!! É UMA PROMESSA!!!
Julia resmunga levantando uma sobrancelha para Jade e sai pisando duro.
— Tome cuidado com essa garota, ela vai ameaçar a sua vida, e dessa vez,
muito provavelmente, Laura não conseguirá ajudar muito. Mantenha a
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distância e os olhos abertos.


Jade diz em voz alta, depois balança a cabeça como se tivesse tido um surto
momentâneo, e volta com meu pai para o escritório. Tay aperta o abraço em
sua pequena família e segue Jade com o olhar até ela desaparecer.
— Ela vai me dar um irmãozinho? Cat não é mais a princesa do papai?
Cat resmunga ainda chorosa e Tay sorri pra ela.
— Já não disse que ela é mentirosa? Você mesma sabe disso, não é!? Claro
que ela está mentindo, eu só tenho uma princesa que é você! A única,
entendeu?
— Entendi. A Cat não quer irmãozinho não… eu quero ser a princesa só eu!!!
Ela diz e ganha um beijo e um abraço cheio de mimo de todos, inclusive de
mim. Não tinha como não mimar aquela pequena jóia. Cat era só uma criança
e Julia foi maldosa demais, sua idade mental era menor que a de Cat.
Quando Tay e Ellen conseguiram fazer Cat esquecer o assunto polêmico,
colocamos as malas no carro, e nos preparamos para ir pro hospital. Vovó se
recusou a deixar meu pai e a chácara e Jade assegurou minha mãe de que
cuidaria deles. Minha mãe estava um caco, tinha uma marca branca, vazia e
sem significado no dedo esquerdo agora nu. Assim que Tay saiu do escritório
depois de se despedir do meu pai, ela foi até a porta do escritório, mas não
entrou. Esqueceu que eu ainda estava ali, encostou a testa na enorme porta,
chorou, e deu meia-volta secando as lagrimas.
— Ele é seu marido, devia ficar, mãe! Eu vou entender, sabe disso. Não
precisa fazer uma escolha, não. Tem que ficar com ele.
Eu digo e ela parece me notar ali.
— Não faço somente por você. Não posso continuar com um casamento de
mais de vinte anos que foi uma sucessão de erros. Seu pai precisa ficar
sozinho, nosso casamento acabou.
Ela fala olhando em direção a ele, e eu podia jurar que lá dentro, ele também
chorava. Eu apenas não lamentava, ele havia colhido o que plantou.
Estacionamos no hospital que Jon estava internado alguns minutos depois, e
meu coração se aperta. Na sala de espera não tinha ninguém. Fomos até a
recepção, Tay e eu pegamos os crachás para vê-lo, e recebemos a notícia que
a visita seria de apenas dez minutos por cada acompanhante, visando o estado
atual do paciente. Pelo o que a recepcionista que ficou tonta com a beleza de
Tay disse, Jon podia ter fortes dores de cabeça se passasse por estresse, então
era preciso ir com calma, não forçar a barra, e entender o real estado de saúde
dele: ele não se lembrava de nada, nem de sua própria identidade e assim
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permanecerá por um bom tempo, e que apoio, amor, e compreensão, só


ajudaria e em excesso faria a diferença em sua recuperação.
— Quem vai agora!?
Doutor Fernando questiona na recepção alguns minutos depois, e Tay decide
ir depois de mim. Meu coração acelera, sinto o suor frio congelar a minha
testa e minhas mãos ficam trêmulas. O doutor me leva até o quarto dele e
noto que as portas tinham enormes corredores de esperas com cadeiras, e
vidros que mostravam quem estava dentro e de lá, quem estava do lado de
fora.
— Espere aqui que vou avisar a família que o tempo esgotou!
Ele diz com simpatia e eu só balanço a cabeça. Dou alguns passos na direção
da enorme janela e meu coração para ao vê-lo. Sua cabeça estava enfaixada,
mas não via machucados por sua face, Jon parecia apenas Jon mesmo!
O médico entra, começa a gesticular, e o olhar de Jon se volta em minha
direção. Ele me olha nos olhos enquanto eles conversam, sua ex-mulher
estava com suas mãos segurando as dele e ver aquilo me deixou furiosa e
morrendo de ciúmes! Não o traiu? Não o enganou? Então o que fazia ali,
daquele jeito???
Olho para suas mãos e Jon segue meu olhar, ele me olhava de forma
diferente, com curiosidade e algo mais. Algo em mim prendia seu olhar, e o
que me prendia ali era que aquela situação estava toda errada. Eu devia estar
nos seus braços, ele não devia estar ali, seu olhar deveria dizer que me
amava, e seu coração deveria estar batendo alto, mas dá distância que eu
estava, eu não poderia dizer se Jon sentia tudo aquilo… Ele só correspondia
meu olhar desesperado e amedrontado, e ele não devia estar segurando na
mão daquela vadia!
Eu penso nisso mais uma vez e ele solta a mão dela. Sua atitude é um tanto
brusca e ela se assusta ao ponto de parar de olhar pro médico. Ela olha para
ele, segue seu olhar, e então me vê! De propósito, não faço questão de olhar
para ela, eu só queria olhar para ele, só queria estar com ele, abraçar, beijar,
sentir meu caçador perto de mim, e aquela vaca estava falando demais,
demorando demais, eu queria entrar, precisava entrar…
— Eu te amo tanto…
Eu resmungo sussurrando sem saber direito o porquê disse aquilo em voz
alta, e ele sorri pra mim como se tivesse entendido, ou escutado. Deveria ter
dito isso antes, enquanto ele ainda sabia quem eu era, enquanto ele ainda me
amava escondido, me tocava, e era meu homem. Agora nem adiantava falar,
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adiantava. Eu era só uma estranha cheia de respostas para as perguntas que


ele tinha, e nada além disso. Seu amor por mim provavelmente desapareceu,
eu o conquistei praticamente pegando pesado com ele, forçando a barra,
como repetir o feito em um homem tão fragilizado? Impossível… talvez eu
tivesse que esperar anos para reconquistá-lo, ou orar a Deus que acontecesse
uma mágica e ele gostasse de mim logo de cara. Será que isso seria possível?
Será que alguém gostaria de mim, assim, só olhando? Não. Eu sei que não.
Só olhando, eu seria a fútil, patricinha, enjoada, nojenta, mimada, riquinha,
infantil, e por aí vai… nunca em sã consciência, ganharia Jonatas tão
facilmente, não um Jonatas!!!

Eu fico ali, olhando para seus olhos verdes ainda sem o brilho da saúde, e me
enchendo de questões que não me levariam a lugar nenhum… Logo vejo a
vaca se levantando da cadeira e seus filhos, já dois garotões a acompanhando
em direção a porta. Eles eram mais altos do que eu. Me lembro de brincar
com os dois no play do condomínio militar.
— Quem é você? — ela questiona assim que sai da sala.
— Ninguém que te importa! — eu digo e um dos garotos sorri pra mim.
— Não está reconhecendo minha paixão pré-adolescente lá do condomínio,
mamãe!? Essa é Ana Luiza Coverick, a filha do chefe do papai! — ele diz
bem-humorado e eu achava que poderia ser Matheo, me lembrava dele.
— Eu fui sua paixão?
Pergunto por curiosidade e vejo o médico se divertindo com aquela cena.
— Foi, sim! Mas superei.
— Fico feliz!
Eu falo e ele ri alto. O outro garoto sai andando na frente, impaciente.
— O que faz aqui menina?
A mulher questiona de novo e eu perco a paciência.
— Vim ver meu namorado e você? O que você faz aqui? — eu questiono e
ela fica sem palavras, ela trava e não diz nada, estava Cho-ca-da! — Doutor,
já posso entrar?
Pergunto e o médico diz “sim” me dando passagem. Jogo o cabelo e passo
por ela batendo minha sola vermelha no piso gélido do hospital, como se
fosse a cara dela. Como é a frase do momento aqui no Brasil? Sambando nas
inimigas??? Eu tinha certeza que pela cara dela, eu tinha feito isso!
Entro devagar na sala e ele me mede com uma certa timidez. Parece
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questionar o que uma garota como eu fazia ali. Me aproximo com um certo
receio sem saber o que fazer e o que falar, e então só me obrigo a sorrir e
espero.
— Olá! E você, quem seria?
Jon diz e ouvir sua voz me faz chorar de emoção, e ter a certeza de que me
esqueceu também. Estava um tanto quanto diferente, mas ainda sim era a
mesma voz que sussurrava promessas amorosas e picantes ao pé do meu
ouvido, minha música favorita.
— Eu acho que somos namorados, quer dizer… você não havia feito o
pedido, então, eu não sei! Acho que agora sou só uma desconhecida! — eu
digo chorando e me lembro do que a recepcionista disse. Rapidamente me
controlo. — Me desculpe, meu choro é de felicidade, eu…
Eu começo e ele me interrompe rindo sem graça.
— Como é? Espera um momento… somos o quê???
— Estávamos juntos antes de você se machucar!
Eu digo e olho para ele sem entender onde ele queria chegar, por que era tão
difícil de acreditar?
— Juntos??? Nós dois, juntos mesmo??? Assim… juntos???
— Sim. Bem juntos. Por que está tão surpreso? Acha que é mentira?
— Não. Não teria porquê vir até aqui e mentir para um homem que nem sabe
aonde está e nem quem ele mesmo é. Só me parece surreal…
— Não sente nada ao olhar pra mim? Nadinha? Nenhuma lembrança vaga???
Pergunto e algumas lágrimas voltam a cair. Inferno. Ele me olha por um
momento, demora pra responder, mas quando responde meu coração para e
meu mundo muda de cor completamente.
— Sinto. Sinto meu coração bater mais forte, dói um pouco… esse seu
cheiro, — ele diz e eu me aproximo sem querer, e ao me aproximar, ele toca
meu rosto. — sua voz, eu não sei… é estranhamente familiar, é difícil…
Ele resmunga e coloca a mão na cabeça.
— Tudo bem, Jon, não se esforce. A enfermeira disse que pode sentir dor.
Não vim para te causar mais males do que já causei!
— Causou? Você sabe o que aconteceu comigo?
— Sei.
— Me conta!
Ele pede e eu respiro fundo me sentando na cadeira.
— Você e meu pai são melhores amigos, ou eram, não sei. Ele também é
militar assim como você, você trabalha pra ele… — eu conto tudo e chego ao
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final. —… e então ele pegou nós dois na cama, vocês saíram na porrada,
você disse que nunca me deixaria, chamou ele de sogrão e tudo, então ele te
bateu demais, a briga foi feia.
Eu falo e ele sorri, por incrível que pareça.
— Que aventura vivemos! Você é minha… o que viu em mim senhorita...?
— Luiza!
— O que viu em mim, Luiza?
— Não sei o que vi em você. Sempre foi um grosso, chato comigo, e passou
um bom tempo me dando um gelo! Eu só… — respiro e tomo coragem. —…
eu só amei você assim que te vi, amei muito, muito mesmo! Mas quase
causei sua morte, foi tudo culpa minha, eu nem devia te procurar de novo,
trouxe caos pra sua vida.
— Você me parece o tipo de garota que eu lutaria para manter segura, e acho
que foi isso. Dizer isso em voz alta me parece verdade pura! Pelo o que me
contou não teve culpa de nada. É muita nova ainda, eu fui o responsável
querendo ou não!
— Não. Você só me deu amor, só amor. Nada de ruim! Você foi
maravilhoso. — eu digo e ele olha para frente.
— Como posso ter vivido isso contigo, se sou casado?
Sabia que aquela vadia ia jogar sujo.
— Você é separado, Jon! Sua mulher traiu você, e você se separou dela! Me
contou isso no dia em que fui te ver no condomínio. Meu pai já sabia, você
sempre contou tudo pra ele! Se ela disse que vocês ainda são casados, é
porque te quer de volta e não vou deixar isso acontecer!
Eu digo e ele me olha confuso. Parece não querer pensar a respeito disso, ou
pelo menos suspeitava que sua “mulher” não era boa bisca!
— Eu namoro a garota mais linda que já vi na minha vida! Isso é muito
bizarro! Você é linda! Como consegue?
Ele diz e eu sorrio em meio a prantos.
— Você nem lembra das garotas que viu na vida! — dou risada. — Você é
mais bonito do que eu, por dentro e por fora. Lutou contra seu melhor amigo
por mim. Eu que tinha sorte!
— Você valia à pena. Eu sei que valia!
— Jon… — eu resmungo e ele toca minha face de novo.
— Pare de chorar, princesa! Eu vou voltar, vou me lembrar de tudo, você vai
ver!!! — ele diz e eu o abraço forte. — Olha aqui pra mim. Não consigo
parar de te olhar, não entendo como você pode ser minha, mas amei a ideia!!!
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Eu não estou acreditando neste feito! Saí na porrada com meu melhor amigo
porque me apaixonei pela filha dele, — ele ri. — eu sou um maluco, olha
aqui. Quero olhar pro teu rosto para sempre, menina! — ele diz e eu obedeço.
Olho em seus olhos e ele sorri enquanto eu só chorava.— A gente… eu já
disse que te amo?
— Não com essas palavras.
— Com quais!?
— Você dizia que eu pertencia a você, só a você. Você até expulsou meu ex
da minha casa no meio da noite, porque não o queria perto de mim. Quando a
gente fazia amor você sussurrava pra mim que me queria para sempre, que eu
era maravilhosa, que nunca mais ia me deixar, que ia me proteger e cuidar de
mim, essas coisas… acho que significa o mesmo, não é!? — eu digo e ele
fica tímido.
— Oh! Meu Deus!!! A gente… oh, minha nossa!!!
Ele parecia olhar para mim sem acreditar, Jon estava completamente confuso,
mas ainda sim radiante com a novidade.
— Eu queria tanto me lembrar, tanto…
— Você vai, com o tempo! Eu só espero que não demore, porque não
aguento mais de saudade!
— Senhorita Luiza, seu tempo acabou. Seu irmão precisa entrar!
O doutor diz da porta e eu lamento.
— Preciso ir! — eu falo, ele concorda, e eu sussurro enquanto o abraço.
— Quando você sair, quero muito que fique com a gente. Quero cuidar de
você! Por favor, não vai com ela! Eu te amo, Jon!
Eu falo e ele me faz olhar pra ele.
— Não se preocupe, vou cumprir tudo o que eu te prometi, todas as
promessas que te fiz! Eu juro. Vou me lembrar de você!
Ele fala, beija minha testa e eu saio chorando do quarto, assim como entrei.
Jon amava uma desconhecida, eu tinha certeza.

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36
O SOFRIMENTO LHE MOTIVA, SEMPRE FOI ASSIM.

Encontro Ellen sentada na borda da cama de nosso quarto provisório, eu tinha


acabado de colocar Catarina pra dormir, ela não parava de dizer que não
queria um irmãozinho, Julia conseguiu tirar a paz de minha filha. Foi difícil
acalmá-la, muito difícil.
— No que está pensando?
Eu pergunto fazendo carinho e beijando devagar, toda a linha do pescoço até
o seu ombro.
— Em muitas coisas, a principal delas é que eu gostaria que você pedisse
uma licença maior, umas férias! Estou cansada, preciso de você comigo!
— Eu estou aqui, contigo! — eu digo e ela se afasta.
— Você entendeu. Quero um tempo maior com você, nunca tivemos isso,
nunca tivemos paz! Preciso de você, longe dessa bagunça, longe de todos, só
eu, você e nossa filha, como deveria ser!
— Eu concordo, vou tirar umas férias! Para onde quer ir? — eu pergunto e
ela sorri.
— Qualquer lugar?
— Qualquer lugar! O mundo é teu! — eu digo e ela me abraça apertado.
— Posso te fazer uma pergunta?

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— Uma você já fez. — ela faz careta e continua.


— Quanto tempo sua raiva durou? Daquela última briga? Você ainda me
culpa, de alguma forma?
— Durou pouco. Não te culpei diretamente falando, culpei esse seu bocão,
culpei o jeito extremo que fica quando está brava comigo, mas obviamente
passou, sempre soube que meu avô se foi porque era a hora dele. Só não
soube lidar com o luto, ele morreu sem me perdoar e isso foi o fim pra mim,
eu o decepcionei, não conseguia me culpar, culpei você e assim te
decepcionei também. Foi tudo culpa minha desde o princípio da mentira, de
tudo o que eu escondi, devia tê-lo deixado saber assim que voltei, fui
covarde. Mas já aprendi a lidar com esse sentimento, já não dói mais!
— Eu discordo quando diz que tem culpa nisso, no fundo acho que ninguém
tem, simplesmente aconteceu. Agora com relação a minha gravidez, você me
perdoou?
— Não. Ter sumido com Catarina? Não perdoei! — eu começo e ela fica
triste com o que escuta. — Vai ter que me dar outro filho para que esse
perdão chegue!
— Viu que Catarina não quer um irmãozinho nem tão cedo, não é!?
— Ela não sabe o que diz… vai amar quando souber, quando o conhecer,
principalmente sendo irmão do mesmo pai e da mesma mãe, que é o que
importa para nós dois! Mesmo com trinta irmãos Catarina será minha
princesinha pra sempre, ela saberá disso!
— Só espero que você não fique igual seu pai! — eu dou risada.
— Não ficarei, principalmente pelo fato de que notei que Cat tem mais
ciúmes de mim do que eu dela! Será independente, livre, e terá meu apoio
para qualquer coisa! Serei diferente, eu te prometo! Mas só vai namorar se eu
conhecer e dar a permissão, vamos ver o histórico do cabra… se merecer
Catarina, se for como “um Jon”, alguém que cuide dela, a proteja, respeite,
que a ame… eu farei muito gosto! Quero que Catarina cresça uma jovem
feliz, sem amarras, sem essas loucuras. Não teremos esse tipo de problema
em nossa casa! Agora com a mãe dela, o assunto é um pouco mais embaixo!
— eu sorrio e puxo seu corpo para mais perto de mim. — A mãe não divido
nem sobe tortura! É minha e só minha! E se aparecer um gerente por aí,
mando subir! Sem remorso! Não sou meu pai, não vou aposentar minha
automática brilhante!
— Não tem a menor chance disso acontecer.
— Eu vou amar você pra sempre, não importa quantos anos passem Ellen
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Maia, será minha enquanto eu estiver vivo e até depois disso. Eu amei você
se fazendo de surda e sendo selvagem naquele quintal, e vou adorar e amar
você até meu último suspiro!!!
— Tão romântico assim, aposto que quer me ver nua…
Ela zomba e eu jogo mais sujo ainda.
— Não. Na verdade estou com fome, vou descer para comer algo, e aí,
quando eu subir, talvez eu queira te ver nua, não sei… vou pensar!!!
Eu falo, tiro ela de cima de mim, e ela me olha desanimada com a sua famosa
cara de paisagem.
— Peguei você! Sua boba!!!
Jogo ela na cama e a devoro como se fosse a última vez que eu tomaria posse
de seu corpo. Por causa disso foi mais intenso, ainda mais mágico, de outro
mundo. Adorei seu corpo, toquei com cuidado como se fosse frágil, voei por
cada curva e me senti nas alturas, bem alto, muito alto. Sua respiração
ofegante, seu cheiro misturado ao hidratante que usa depois do banho, seu
gosto natural, suas palavras cheias de amor no meu ouvido, suas ordens
obscenas que me tiraram o juízo, seus gemidos baixos e secretos, eram todos
os segredos que só eu tinha acesso. Porque por mais que outro homem a
tivesse tocado um dia, eu tinha certeza que minha selvagem só se despia de
alma comigo. Só eu via, ouvia, sentia… só eu, seu homem!

— O que faz fora da cama, tão tarde?


Questiono minha mãe que tomava uma xícara de café encostada na pia. Eram
quatro horas da manhã e Ellen e eu ainda não tínhamos parado. Não
conseguia largar aquela mulher, não tinha sono, e seu gosto viciante não me
deixava parar nunca. Desci só pra tomar uma água… Eu queria mais de
minha mulher, queria muito mais. Mas ao ver minha mãe, esqueci das
necessidades do meu corpo e coração, e só pensei na necessidade dela, cujo
nome deveria ser: Max.
— Não consegui pregar o olho. Faz muitos anos que não durmo sem seu pai,
nem sabia como seria, não pensei que seria tão difícil. Não consigo… — ela
começa a chorar e eu lamento vê-la daquele jeito. — Eu só penso nele, o
tempo todo, o tempo todo, não consigo viver sem ele. Não consigo comer,
pelo jeito não dormirei, não vai ser fácil essa separação! Sem seu pai na
minha vida não tem o menor sentido, mas ele é tão cabeça dura, tão turrão.
Acho que me casei com uma cópia de seu Luis e me perdoe dizer isso, mas
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na maior parte do tempo, seu avô era sempre tão detestável e desprezível…
não sei o que fazer, nem o que pensar, só queria estar com ele!!!
— Eu te levo lá!!! Vamos até lá, agora!!! Não precisa ficar assim, não precisa
passar por isso! Aposto que ele está profundamente arrependido, mãe! Me
pediu perdão pela briga quando fui me despedir, ele se condena, se culpa, e
está extremamente arrependido! Meu pai não vai aguentar viver sem você,
sem Lulu!!!
Eu digo e ela deposita a xícara vazia na pia.
— Ele vai. Vai sim, está bem acompanhado pela Jade, ela cuidará dele!
— Não tem medo dos dois acabar se envolvendo, não!? Não é Jade quem
deveria cuidar dele, apoiá-lo, essa pessoa deveria ser você!
— Assim, você não ajuda!!!
— Ué! Tô mandando a real, pediu a separação, vai deixar meu pai solteiro,
ele é um ímã pra mulher você sabe bem disso, até minha sogra baba litros por
ele, desde jovem… e não só ela né, todas as mulheres que conheço adorariam
ver meu pai solteiro! Vai perder mãe, toma cuidado! Pode se arrepender!
Primeiro que é seu marido, não devia deixá-lo sozinho, e se dá espaço é
porque está pedindo para ver o que não quer, e se acha que está solteiro
agora, não tem noção do que é sofrimento quando vê-lo com uma namorada!
— eu digo e ela faz cara feia.
— Seu pai me ama! Nunca ficou com mulher nenhuma, nunca faria isso
comigo!!!
— Tem certeza disso?
— Não sei, não importa, o casamento acabou e pronto! Só quero que ele se
cuide, procure um tratamento, e melhore esse jeito dele! Reconquiste sua
irmã. Os dois se amam demais, mesmo que ela não assuma. Só estou
sofrendo, desabafando! Agora nossa história acabou, como ele mesmo disse,
eu fui um erro!
— Ele disse na hora da raiva, mãe!
— Ele disse o que o coração dele estava cheio! Na hora da raiva a gente deixa
escapar mentiras verdadeiras, não sou boba, sei que ele foi sincero, tanto que
não se corrigiu, não retirou o que disse nem depois que a tempestade passou,
seu pai acha que fui um erro, seu nascimento foi um equívoco, você chegou
na hora errada, cuidei de você sozinha! Ele se culpa e preferia que essa
gravidez nunca tivesse acontecido, mesmo que tenha dito que desejou me
engravidar e que você foi um presente! Não consigo esquecer as palavras que
ele me disse, preferia que ele tivesse me espancado, me dado um tapa na cara,
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ia doer menos! — ela se aproxima e me abraça. — Esquece tudo isso e foque


agora na sua família, em Ellen que te ama mais que tudo, e em minha neta
linda, nosso casamento acabou, mas o seu só está começando!!!
Minha mãe diz triste, e sobe pro quarto me deixando lá, confuso e triste
também.
— Você demorou!!!
Ellen diz assim que entro no quarto. Por um momento só olho para ela e seu
corpo nú em minha cama. Era um sonho tê-la de volta em minha vida.
— Minha mãe estava lá embaixo! Ela está péssima.
— Por causa do seu pai?
— Sim. Agora vamos esquecer isso! Vem cá, quero um pouco mais de você!
Quero que o mundo todo acabe lá fora, não me importo! O meu mundo está
todo aqui, nessa cama! Minha felicidade está aqui e no quarto ao lado! E eu
não preciso de mais nada nessa vida!
— Nada mesmo?
— Bom, no momento, preciso que você abra bem essas coxas grossas para eu
poder entrar!
Eu digo e ela obedece na hora. Toco sua intimidade quente, beijo sua boca
carnuda apaixonadamente, e entro dentro dela, devagar, e quase gozo só
entrando. Ellen era maravilhosa em todos os sentidos e eu era o cara mais
sortudo de todos os tempos!

— Bom dia! Acorda bicha preguiçosa!!!


Balanço Ellen devagar e ela acorda sorrindo. A visão do paraíso.
O dia amanheceu bonito apesar de frio como sempre, mas apesar do vento
gelado demais, parecia um daqueles dias que te dariam a oportunidade de
recomeçar!
— Já vai trabalhar? Cat já levantou?
— Não vou trabalhar, Cat já levantou, tomou café, e está brincando com os
primos na sala! Só você que ainda está na cama.
— Que mal educado de minha parte!!! Vem cá…
Ela me puxa pra cama e a gente namora um pouco antes da preguiçosa tomar
coragem de levantar e ir tomar um banho.
Eu tinha certeza que faríamos amor matinal se seu celular não tivesse tocado,
eu com certeza ia amar e ela queria muito. Pego o aparelho já que eu estava
mais perto, e vejo na tela que era o gerente.
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— Oi, Yan! Não, desculpe, é que acabei de acordar… tudo bem, que horas?
— ela fala com o telefone na orelha.
— Tudo bem, o quê??? — pergunto e ela faz careta pra mim.
— Hum, ok! Até logo!
— O que era? Por que não me respondeu?
— É Yan querendo ver a Cat, ele vai voltar pro sul pra ficar uma semana, e
então queria se despedir, passar o dia com ela!
Ellen se explica levantando e me sinto mal com aquilo!
— Por que não me consultou antes de concordar?
— Porque sabia que você ia fazer esse bico enorme, mas Yan tem direito de
vê-la. Não precisamos tornar isso uma briga, nem ficar com mal-estar! Cat
ama você, e ama Yan, da mesma maneira! Não precisa ficar enciumado!
— Eu só não entendo. Estamos juntos, ela é minha filha, não dele, eu devia
opinar!
Eu digo já me sentindo estranho e chateado. O dia ali, já tinha mudado de cor
e ficado feio.
— Tay, é só um passeio! Achei que tinha entendido sobre o relacionamento
dos dois!
— Não é só um passeio. Você é minha mulher, estamos juntos de novo, e o
assunto é sobre minha filha! Deveria perguntar minha opinião! Julia está à
solta procurando uma oportunidade pra foder a minha vida! Não vou deixar
minha filha sozinha com um despreparado como ele!
— Não tem problema, vou junto! Ficaremos bem!
Ellen toca meu braço com carinho e eu tiro sua mão de mim.
— Aí que lindo! Vai matar a saudade da antiga família! Que bonitinho!
Mamãe e padrasto juntos! Quero até mandar um paparazzi para fotografar o
dia incrível que vocês terão!
— Tay, não pira! Não começa, já chega disso! Eu não me separei dele pra
ficar com você e ouvir essas palhaçadas, pegue leve nas babaquices, tá bem!?
— Catarina é minha filha e por enquanto eu decido sobre seu dia-a-dia, sua
agenda, seus compromissos, e começo hoje! O gerente terá dias certos pra
pegar Catarina, tudo bem organizado, a vez dele já foi, passou, você é minha!
Agora ele terá que me consultar! Chamarei Laura para acompanhá-los nem
que seja de longe, sem incomodar, sozinhos eles não vão. Mas você não vai
de jeito nenhum, deveria ter me perguntado antes de decidir qualquer coisa
sobre ela. Não é mãe solteira, sou o pai dela, porra!
Eu digo e vejo seu humor mudar na hora.
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— Eu vou acompanhar os dois e ficará tudo bem.


— Laura pode fazer isso e ficará melhor ainda!
— Acha que não vi o clima que eles estavam na cozinha!? Yan merece
alguém melhor! Laura não é pro bico dele!
Ela diz e meu sangue ferve de um jeito que não consigo explicar. Eu tinha
prometido que brigas por bobagens como essas, nunca mais iam se repetir,
mas eu odiava, sinceramente detestava a autonomia e o título de pai número
um que Ellen dava a Yan. E aquele ciúme de Laura e o gerente juntos??? Mas
que porra era aquela?
— Mas que papo é esse de querer assinar em baixo, dar apoio ou aprovar as
mulheres que ele quer comer, namorar ou casar? Tá com ciúmes do ex? Vai
falar pra ele o que disse pra mim? “Quero uma madrasta melhor pra minha
filha!”, “Essa daí, não!!!”?
Eu questiono e isso pareceu tê-la chateado. Eu poderia estar sendo um
babaca, mas aquilo estava estranho demais. Pensei que a gente ia se casar,
formar a família que a gente sempre quis. Como assim decidir o rumo das
coisas sozinha, e querer sair a três com o ex-marido? Não eu não era um Max
da vida, mas também não estava escrito trouxa na minha testa, não!
— Não faça isso de novo…
— Não faça você! Ele quer vê-la, pode ver! Quer ter contato, que tenha!!! Já
disse que deixarei Catarina livre para decidir o que quiser da vida dela e
assim será! Mas se você tá pensando que eu sou um trouxa, esta enganada!
Para a segurança dela, Laura vai cuidar deles para a doente mental não se
aproximar, e você não vai ousar a me humilhar saindo com o ex-marido para
matar a saudade e evitar que Laura paquere o “Yan gostosão dos santos”
como ela mesma diz! Se tem insegurança vai atrás dele, eu já disse que o que
realmente importa é minha filha! Não vou ficar com uma mulher que não me
ama, não! Disse por diversas vezes que se quisesse ficar com ele, eu só queria
te ver feliz, que envelheça com ele, case com o marica, mas se quer ficar
comigo, é comigo, vai me respeitar e não vai chegar perto de ex nenhum! Já
devo uma pra ele por ter me ajudado a não magoar Catarina, já estou em
dívida e odeio isso, já preciso aturá-lo porque Catarina o ama, e também
suportarei isso! Agora você é minha, ou pode ir e ficar com ele. É você quem
decide, sempre fez o que quis, pode escolher um ou outro, eu espero você
decidir! Agora eu não sou trouxa, não!!! Não vou engolir seu ciuminho por
ele, nem sua vontade de “manter a amizade” por Catarina! Catarina só precisa
vê-lo, não precisa que vocês saiam juntos, e já está na hora dela entender que
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vocês se separaram, já fez cinco anos, já pode entender certas coisas, tipo
isso!!!
Eu desabafo extremamente estressado e alterado e Ellen muda de humor de
repente. Do nada estava que nem uma tonta sorrindo feito uma bocó pra mim,
e eu só sentia vontade de encher ela de tapas. Eu respiro fundo ainda
caminhando de um lado pro outro e não consigo relaxar, aquele papo me
deixou alterado.
— Tá rindo do que, palhaça?
— De você que fica um escroto com ciúmes! De tão escroto fica tão gostoso,
perigoso, mortal, sexy… — ela ri e se aproxima de mim com aquele maldito
pijama minúsculo. — Eu queria que acreditasse em mim quando digo que
não sinto nada por Yan! Apenas um carinho e respeito.
— Exclui esse carinho maldito aí, também!
— Então só o que te importa é Catarina!? Se eu quiser voltar pra ele, tudo
bem contanto que eu seja feliz!?
Ela resmunga se pendurando no meu pescoço, e fala baixinho, quase miando
como um gato.
— Feliz porra nenhuma, volta pra ele e eu infernizo sua vida, filha da puta!!!
Eu odeio você!!!
Eu rosno de pura raiva e eu desconto tudo nas estocadas ferozes. Eu queria
um pouco de amor matinal e eu tive. Ellen era minha de qualquer jeito, e ia
seguir as minhas ordens. Acabou o tempo daquele gerente de uma figa, ele
não conquistou o coração de minha mulher e sei que nunca conseguiria, pois
seu coração me pertencia. Agora ele que tente se reaproximar que ele vai ver,
mando subir o condenado e faço parecer que ele não presta atenção nos freios
daquela lata velha dele. Aqui não tinha espaço para uma terceira pessoa
principalmente pelo fato de que nesse exato momento, Ellen gozava gemendo
meu nome, de pernas abertas e era a cena mais linda que eu ia ver naquele dia
frio, tinha até vontade de filmar aquilo, até saí de dentro dela pra olhar e
poder saborear depois. Quanto mais eu tinha acesso ao seu corpo mais eu me
sentia possessivo. Ellen era minha!
— Só minha!
Eu resmungo e começo a chupá-la com grosseria. Sua intimidade já estava
toda vermelha de tanto eu dar os tapas que ela merecia, e as chupadas bem
fortes. Esse seria seu castigo por discutir comigo e me contrariar.

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— Mamãe não vai junto???


Cat pergunta assim que termina de ser vestida após o banho. Eu estava lendo
algumas notícias pelo notebook e Ellen a tirou da sala para tomar um banho e
se arrumar assim que o gerente ligou avisando que já estava próximo. Nós
nos atrasamos porque ela precisava do castigo, não tinha como não dar.
Apanhou até dizer chega, filha da puta. Como eu amo essa mulher…
— Não. Só vão vocês dois!
Eu digo e Cat se aproxima de mim quando Ellen começa a organizar a
bagunça do banho.
— Mas por que não podemos ir todos?
— Porque a mamãe e o Yan… Bom… não estão mais juntos! São só amigos,
não um casal como era antes, entende? — eu falo e ela parece confusa. —
Está tudo bem, Catarina! Vai ser divertido!
— Está bem. — ela concorda, mas parecia triste.
Assim que o gerente chega faço questão de levar Catarina até lá fora.
Entrego minha filha para ele sem a menor vontade e assim que ele chega,
Laura chega minutos depois, porque eu já tinha ligado pra ela.
— Oi. Cadê a Ellen?
Ele questiona como se não quisesse ser atendido por mim.
— A minha mulher está ocupada. Quer conversar sobre algo a respeito de
minha filha!? Porque se for, estou apto a tirar suas dúvidas, e farei isso daqui
pra frente.
Eu digo e ele resmunga. Abraço minha pequena e a vejo entrar no carro com
o coração apertado. Laura se aproxima e eu finalizo o assunto.
— E só mais uma coisa, precisamos resolver os dias exatos de você pegá-la,
logo ela começará a estudar em São Paulo, vamos nos mudar, e ficará um
pouco complicado. Melhor organizar para não virar bagunça! E por hoje, só
pedi que Laura acompanhasse vocês porque a Julia continua me ameaçando e
tentando me prejudicar, é melhor que Laura esteja por perto para terminar o
serviço que ela começou, caso seja necessário!!! — eu digo e Laura pisca pra
ele.
— Tudo bem! Como quiser, pai biológico!
Ele diz com ironia e fico puto, mas me recuso a socar a cara dele na frente de
Catarina.
— Vai pela sombra ex-padrasto! — eu digo olhando nos olhos dele e me
dirijo a Laura. — Cuida da minha filha, se ela voltar com um arranhão você
perde o emprego e a vida!
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— Sim, senhor.
Laura resmunga sorrindo e entra em seu carro quando vê que o gerente já
entrava no dele.
Entro em casa e me sento na sala para assistir TV com minha mulher e minha
família linda, na mais santa paz e pura harmonia. Estava tudo maravilhoso. O
cheiro bom do almoço que já estava quase pronto, os carinhos de Ellen e
beijos cheios de dengos, e a tranquilidade de não ter nenhuma briga por perto.
Meu pai fazia falta ali, mas sua ausência trazia uma onda de calmaria rara na
família, o que era muito triste.
Duas horas depois assim que bloqueio o celular depois de ler a mensagem
‘tdo ok!!!’ de Laura, avisando que o passeio estava de acordo. Alguém aperta
a campainha, e Rafa e eu caminhamos até o portão para ver quem era. Era
Jade e vovó.
Rafa abre o portão correndo, ajuda minha vó a descer os degraus do portão e
a entrar em casa. Jade tem uma feição entristecida e chateada, quase
envergonhada.
— O que houve? O que aconteceu???
Eu pergunto assim que Jade adentra a sala onde estavam todos. Lulu tinha
sua cara amassada de sono, pois naquele momento tirava uma soneca, e só
levantou porque ouviu o barulho do portão, também estranhou a presença das
duas ali.
— Bom, eu conversei demais com Max, como vocês notaram, ficamos por
horas batendo papo, e dialogando. Mas o que houve foi que ele decidiu fugir
daquele lugar também, assim como todos. Max foi embora. Foi embora e
decidiu que precisava viver sozinho, vai passar no hospital para ver Jon,
conversar com ele, e vai partir, diz ele para não mais voltar.
— E você acreditou nisso? Isso é verdade? Não está blefando???
Minha mãe questiona assustada e todos olham aflitos para Jade que parecia
querer chorar a qualquer momento.
— É a mais pura verdade que ele já disse! Foi a vontade de seu coração. Ele
se foi!!! E na verdade, sinceramente falando, acho que fez o certo, ele precisa
de um tempo para refletir.
Jade diz e vejo Nina, vovó — que já chegara com os olhos vermelhos. —, e
minha mãe chorarem, Rafa lamentar profundamente, Ellen ficar
extremamente triste com a notícia, e Lulu, bom… Lulu eu não tinha ideia do
que sentia!

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37
ANTIGAS ORIGENS

— E aí? Cadê ele?


Tay questiona tia Hella assim que ela pisa na sala. Assim que soube, ela foi
atrás dele para conversar.
— Foi embora. Como já disse para ele um milhão de vezes, é compreensível,
Max nunca fica!
Tia Hella diz, sobe para o quarto, e Nina, sua cunhada e eterna confidente vai
atrás dela.
Abraço meu amor para “tentar reconfortá-lo”, e ele não fica muito. Logo sobe
para o quarto e eu sigo atrás.
Entro no quarto e o vejo deitado na cama, deito ao seu lado e me aninho junto
a ele.
— Quer ficar sozinho ou posso ficar aqui?
Pergunto e ele puxa meu corpo para mais perto dele.
— Prefiro que fique, bem quietinha e comportada, se você for capaz.
Ele resmunga e eu sorrio sentindo sua intimidade crescendo em meu
bumbum.
— Como ficar comportada com esse trem aqui?
Eu dou risada e ele beija meu pescoço.
— Eu te amo, princesa!
— Eu te amo, meu príncipe no cavalo branco!
Eu digo e me sinto sonolenta demais. Eu estava cansada como se tivesse
trabalhado o dia todo e aquilo era estranho, talvez deveria ser o clima pesado
da casa. Não sei, só sei que apaguei e ao acordar já tinha anoitecido.
— Ei, bebê dorminhoca!!!
Tay me acorda com beijinhos leves e eu sorrio pra ele.
— Oi! Cadê a Cat? Já chegou?
— Já, chegaram assim que você adormeceu.
— E você não dormiu? Alguém te acordou?
— Não dormi. Estava preocupado demais, e queria um denguinho…
Comecei a beijar seu pescoço e quando notei que você não me agarrava como
uma oferecida vi que você estava dormindo. Peguei a Cat, fiz ela tomar

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banho, coloquei ela na cama depois que comeu, e fui até a escola já…
— Nossa, que pai exemplar! Só faltou o jantar na cama, tô tão faminta.
Eu digo e ele ri.
— Se você ao menos se levantar, vai ver que até isso eu fiz, preguiça!!!
Eu me ajeito no travesseiro e vejo a bandeja feita com uma flor decorando, e
um envelope.
— Meu Deus. Como sou sortuda! Namorado lindo, eu tenho!!! — digo
pulando em seu colo.
— Namorado é uma palavra fraca demais. E pensando nisso… — ele se
estica e pega o tal envelope. — comprei um presente pra você, ou melhor…
para nós três!
Ele diz animado e eu abro o envelope rapidamente.
— Três passagens aéreas, não acredito!!! Eu te amo!
Beijo meu príncipe encantado e choro de felicidade, choro literalmente!
— Mas espera que eu nem vi para onde é. — ela volta a ler. — Como assim?
Não tem destino?
— Não, é especial, eles verificam pelo código! São passagens surpresas, só
vai saber pra onde eu vou te levar, quando a gente chegar! A tão sonhada
férias que você queria, entre família! Só paz, muita felicidade com nossa
princesa, e muito amor, muito amor…
Ele resmunga me amando e eu me derreto toda!
— Dá só uma dica? Por favorzinho!!!
— Não, sossega! Não vou falar nada. — ele diz, e eu faço bico.
— Quando vamos???
— Bom, eu passei na escola e me lembrei que tem o evento de demonstração
dos novos caças. Tinha até me esquecido… até já consegui ser afastado pra
gente se mudar pra Pirassununga, mas meu Major só permitiu que eu vá
depois do evento então, pensei que a gente pudesse ir depois disso! O evento
é no próximo final de semana.
— Será que toda a família vai esperar? Pra poder participar?
— Não. Nina e Lulu querem ir logo, eles vão e a gente fica! Mas Rafa
garantiu que volta no fim de semana para trazer a família, e todos estarem
presentes.
— E seu pai? Será que aparece? Tentou falar com ele?
Eu digo e me arrependo. As feições de Tay mudam de alegria pra tristeza no
ato.
— Tentei. Ele não atende ninguém! Minha mãe está trancada no quarto desde
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a hora em que chegou, também não fala com ninguém! Não quer saber de
comer, estou preocupado!
— Ela ficará bem, amor.
Eu digo beijando seu rosto todo e decido mudar de assunto.
— Tem mais novidades com relação à escola?— eu questiono e ele sorri.
— Não a vi! Não me encontrei com ela, graças a Deus!
— Que bom…
Digo como quem não quer nada, e ele zomba me fazendo cócegas e me
chamando de ciumenta.
— Me deixa comer, vai, seu chato!!!
Apenas belisco a comida e já me sinto satisfeita.
— O Yan disse como foi o passeio? Para onde eles foram?
Pergunto ainda na cama, enquanto Tay procurava uma roupa para eu me
vestir ao sair do banho.
— O que realmente quer saber, Ellen?
— Exatamente o que eu perguntei!
Eu falo e ele me olha desconfiado.
— Não. Não disse nada. Laura que me contou que foram ao parque em que a
levei uma vez, comeram, e se divertiram bastante. Nada de mais.
— Entendi.
Eu respondo e ele me olha de novo. Eu sabia que estava preocupado com um
possível ciúme. Uma desconfiança e provavelmente ganharia o maravilhoso
castigo que ele me deu da última vez.

— Estava pensando em te levar pra jantar fora. Só nós dois. O que acha? —
Tay me abraça assim que saio do banho. — Um jantar bem romântico, uma
conversa sobre as nossas vidas, uns beijos calientes porém discretos, minha
mão boba na sua coxa, um amor gostoso e lento para finalizar… uns chupões,
puxões de cabelo…
— Já entendi meu amor. Já entendi…
Eu digo rindo e me solto dele para me trocar.
— Eu topo, mas tenho outra ideia! Deixa eu te levar em um lugar especial!
Eu digo enquanto ele sorri com uma timidez que não lhe pertencia.
Parei o carro em um bar chamado Mariah, no vilarejo vizinho ao nosso. Não
tinha o luxo que Tay estava acostumado, não tinha “gente bonita” nem
comida requintada, mas tinha coxinhas mineiras especiais, quitutes feitos na
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hora, cerveja, gente humilde e simpática com todos, e karaokê! E a melhor e


última parte, mas não menos importante: estava lotado, e agitado.
— Meu Deus, como essa minha mulher é romântica! — ele diz e eu solto sua
mão da minha.
— Proponho que hoje sejamos amigos. Vamos encher a cara juntos, bater
papo, zombar um da cara do outro, e falar algumas verdades entaladas, sem
perder a amizade e nosso futuro casamento. Topa?
Eu digo e ele sorri olhando pra minha boca.
— Não vou aguentar ficar sem te beijar.
— Eu sei. Você é Louco por mim, fissurado, viciado no meu gosto…
— Tá se achando demais, menina!
— É a verdade…
— Então topo sua proposta, e sugiro mais uma! Uma aposta! Se até o final da
noite eu ir bem, sendo somente seu amigo e não te beijar, eu ganho, e você
me paga. Se eu falhar, pode me pedir qualquer coisa, e eu te dou.
Ele diz e me sinto muito feliz. Me aproximo dele e posso sentir o perfume
que me deixa acesa.
— Combinado. Vou ganhar essa!!!
Eu falo e voltamos a caminhar até achar uma mesa legal!

(...)

— Tudo!
Tay resmunga e bebe o resto de caipirinha do seu copo.
— Eu não acredito.
— Ah! Fala sério. É só uma agenda! Seu segredo está guardado comigo! —
ele diz e chama o garçom para pedir outra bebida. — Fala pra mim, o que
sentiu quando me viu entrar na sala do casarão aquele dia?
— Me senti triste, feliz, irritada, emocionada, com vontade de te amar para
matar a saudade, te bater para te punir, sair correndo de lá e fugir, e por aí
vai…
— Um tanto quanto bipolar… — ele ri.
— E você?
— Me senti tonto, desnorteado, mas feliz. E quando vi Catarina, me senti o

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homem mais realizado do universo, e agora sou, conheci a minha menina,


meu bebê que tanto desejei. Duvidei que podia existir um homem mais feliz
do que eu ao ver minha mulher e minha filha, ali, no meio da sala. E no fundo
eu sabia que você seria minha de novo, porque não importa quanto tempo
passe, nosso amor é incondicional. Nada nos separa!
Ele diz e presto atenção na menina animada que ainda não tinha conseguido
espantar todos os fregueses do seu Tião, o amigo e ex-namorado de infância
de dona Isabelle. Se eu deixasse aquilo me tocar, ia me aproximar e perder a
aposta, então me concentrei na música que dizia que para dançar Lá bamba
se necessita um pouco de graça, só que em espanhol!
— Você fica vermelha quando fica tímida! Sabia?
Ele questiona e seu sorriso me deixa como uma manteiga derretida. Como um
homem tão lindo como Tay, podia me amar tanto?
— Acho que sim, sinto meu rosto esquentar!!!!
Eu falo rindo e fico ainda mais tímida.
— Gosto de ver sua face rubra, você também fica assim depois que tem
orgasmos. Suas maçãs do rosto, assim como sua parte íntima, ficam rosadas!
Só de me lembrar já estou duro aqui… não preciso chupar com gosto, nem
dar aqueles tapas que acertam no ponto mágico e te fazem ver estrelas. Ficam
rosadas sem esforço algum!
Tay diz alto como se não se importasse se alguém pudesse ouvir, mas eu
sabia que era só porque a música estava alta demais. Sinto minha calcinha
ficar encharcada e olho para a minha taça de chope de vinho.
— E então, o que fez enquanto casado? Voltou pra Manaus?
— Não. Só viajei a trabalho, mas continuei morando aqui. E você? O que
você fez?
— Bom, tive uma vida comum demais, fiz reformas na minha casa, ensinava
Cat a montar desde menor, dava atenção pra ela, cuidava dos bichos da
pousada! Tudo normal.
— Catarina consegue montar a cavalo sozinha???
— Consegue. E uma curiosidade… quando ela disse que queria conhecer o
outro pai dela, e fomos até a escola, ela disse que sabia quem era você! Ela
disse que viu uma foto sua em minhas coisas uma vez, e reconheceu.
Acredita? Disse que vocês dois eram parecidos.
Eu digo e Tay se enche de alegria e seus olhos brilham. Só brilham daquela
forma quando fala dela.
— Acredito! Ela é linda, nossa princesa.
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— É, sim! Acho que é porque tem sua cara. Aliás, lá na escola eu ouvi você
no rádio do seu pai! Ele mentiu, eu e Cat estávamos bem perto.
Eu digo e ele ri tímido.
— Mentira… que banana!!! Deixa ele. — ele respira fundo, bebe de sua
caipirinha, e continua. — Você gostou de ouvir? Ficou com medo de eu
explodir no ar?
— Gostei de ouvir, e claro que fiquei! Seu pai amou me ver daquele jeito!
Ridículo!!!
Rimos juntos e logo o silêncio constrangedor toma conta. Tay me olhava o
tempo todo, fitava minha boca, meu decote, e parecia ter um autocontrole
sem igual. Já eu só evitava olhar pra ele, aquela aposta seria importante, as
possibilidades de pedidos que eu poderia fazer eram enormes e eu não queria
perder. Na verdade, só ganhar dele em qualquer aposta, seria um deleite pra
mim.
— O que mais gosta de fazer?
Ele pergunta de repente e eu paro pra pensar se é pegadinha ou não, e então
decido responder a questão da forma exatamente como foi perguntada.
— Cuidar da nossa filha, ficar com você, trabalhar, andar á cavalo, fazer
compras, gosto de ler quando tenho um tempo extra, e dançar. São as coisas
que mais gosto de fazer!
— Entendi.
Ele diz rindo e me recuso a perguntar o porquê, e questionar sobre seus
gostos.
— Fez mais alguma besteira enquanto estive fora?
— Algumas.
— Matou pessoas? — eu pergunto e ele nega com a cabeça.
— Não.
— Com qual frequência pensava em mim?
— Pelo menos uma vez ao dia. Todos os dias antes de dormir, durante todos
esses anos.
Ele fala rapidamente e me deixa sem ter o que dizer.
— E você?
— Todas ás vezes que olhava para face de Catarina. Até hoje.
Eu digo e chegava sua vez de ficar com cara de bobo, e sem ter respostas.
— Vem amiga, vamos dançar essa música…
Tay toma coragem de repente, e me estende a mão. Tocava um Black Music
bem paradinho e romântico, e algumas pessoas já dançavam…
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— Deuses!!! Você bebeu muito. Está me convidando pra dançar, você nunca
dança!
— Eu estou disposto a fazer muitas coisas, e ter algumas ‘primeiras vezes’
contigo. Quero que nossa relação seja especial! É claro que de vez em
quando terei que tomar umas pra ficar corajoso, mas saberemos lidar com
isso!
Ele sorri, caminha comigo até o salão de mãos dadas, e depois finge que é um
cavalheiro beijando a minha mão antes da dança.
— Brother, chega mais perto… — ele pressiona minha cintura na sua e então
começa a se mexer devagar e dançava bem demais, fiquei impressionada. —
Pensei que sabia dançar. Nesse tipo de música você tenta me seduzir — ele
me faz virar de costas e dá tapinhas discretos na lateral do meu bumbum para
falar. — e isso aqui, você mexe bastante!!!
Tay resmunga com humor, pressiona sua vara em meu bumbum e eu o sinto
cheirar o meu pescoço.
— Pra quem nunca dançou, virou um especialista.
— Treinei muito em Manaus!!! — ele diz e fico emburrada. — Não pode ter
ciúmes, nesse momento somos apenas amigos!
— Pois é… também tive várias experiências em Bagé.
Eu falo e notei que ele já esperava. Por isso no mesmo momento já crava os
dedos nos cabelos de minha nuca e diz baixo no meu ouvido.
— Não ouse a passar do ponto, amiga, é melhor evitar e brincar direito!
Ele diz em tom real de ameaça, mas depois volta a sorrir.
— Tudo bem, eu confesso… nunca dancei na minha vida! Apenas não queria
assumir isso. Mas já que descobriu, sim, meu talento nasceu comigo!
Ele ri e quase me beija, por um momento esqueceu, mas logo se lembrou!
— Quase… Quase…
Ele resmunga dando uma gargalhada gostosa, finjo lamentar e ele aperta
minha cintura. Ignoro os olhares das mulheres ao redor, e continuo dançando
com meu amigo gato! Tay era divertido, sempre soube, mas só voltou a ser
novamente, depois que Catarina apareceu em sua vida. Antigamente era raro
vê-lo sorrir, agora apesar de tudo e de todos os nossos problemas, ele sorri o
tempo todo, principalmente quando está com ela.
— Isso amiga, agora sim.
Tay resmunga me olhando rebolar colada ao seu corpo e não para de rir.
A música acaba e decidimos voltar pra mesa para continuar o bate-papo
descontraído — só que não. —, e assim que me sento, vejo Julia entrando no
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bar. Aquilo acaba com a minha noite na hora. Qual a probabilidade dela
aparecer ‘por acaso’ no mesmo bar que nós dois??? Aquela doente foi capaz
de seguir a gente? Se ainda é louca por Tay, porque viria atrás dele para vê-lo
feliz comigo? Ela tem problema? É maluca?
— Quero ir pra casa!
Digo de repente pegando minha bolsa e o sorriso de Tay desaparece.
— Falei algo errado? Fiz alguma merda? O que foi?
Ele parece triste e preocupado e meu coração se aperta em vê-lo assim. Por
isso me sento mais próxima dele e o abraço. Me nego a deixar aquela vadia
nojenta estragar a nossa noite.
— Não. Não disse nada meu denguinho lindo!!! — eu digo e ele zomba do
meu palavreado carinhoso. — Só estou cansada! Vamos!?
— Muito cansada?
Ele diz de repente bem baixinho no meu ouvido, deixando aquela pergunta
bastante sugestiva.
— Cansada só pra ficar aqui, mas aposto que quando a gente chegar em casa
e essa aposta ter oficialmente acabado, eu já estarei bem e cheia de energia.
Eu falo e pisco pra ele. Assim que ele pega minha bolsa, meu suéter, e a
chave do carro na mesa, ouço aquela voz do inferno.
— Tay!? Que surpresa!!!
Ainda agarrada nele posso sentir seu corpo todo ficar tenso, e continuo
olhando para a sua face ao se virar e olhar para ela. Tay parecia bastante
nervoso. Julia estava vestida como uma deusa indiana, e tinha um guarda-
costas ou amigo ao seu lado. Nunca o vi na minha vida.
— Fala.
Ele é grosso e eu agradeço. Ainda estava sendo é muito educado com aquela
nojenta inconveniente.
— Nossa, só vim desejar ‘boa noite’.
— Ok. Tchau!
Tay se levanta, pega em meu antebraço para me auxiliar com o salto alto
como um cavalheiro, e a gente se afasta da mesa.
— Já decidiu quando vamos conversar sobre o nosso bebê? Temos um filho,
te provei isso, logo poderemos fazer outro exame se você quiser, é claro…
mas é seu filho, aposto que dessa vez vai querer acompanhar desde o início,
saiba que não vou fugir com ele na barriga, te prometo isso, nosso filho terá o
amor do papai e da mamãe dele…
Ela começa a tagarelar para que a gente ouça suas provocações antes de
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partir, e ao citar minha história como indireta, não consegui me segurar. Juro
por Deus que até tentei, mas não rolou. Me aproximei da mesa, joguei o resto
do meu vinho na fuça dela, grudei nos cabelos da vagabunda e a arrastei o
quanto pude. Até Tay conseguir separar, cravei minhas unhas em seu pescoço
pra ver se ela apenas morria, e ela acertou um soco bem no meu nariz, me
tirando sangue. Eu soquei a cara dela, mas assim que ganhei o soco, Tay
interrompeu. O amigo dela nem se moveu, parecia que havia recebido ordens
para não se meter.
— Vem sua vadia porca! Deixa eu cuidar do meu enteado! Sua nojenta,
abusada. ME SOLTA, CARAMBA!!!
Grito com Tay, mas obviamente ele se recusa. Com ele segurando em minha
cintura eu nunca mais conseguiria me mexer.
— Não. Vamos embora daqui, ela não merece nem apanhar, não merece um
minuto de atenção! E você está sangrando, vamos…
— Eu falei sério. Precisamos falar sobre nosso filho!!!
Julia repete rindo e tocando o leve ferimento que deixei em seu canto
esquerdo do lábio inferior, e eu fico ainda mais agitada. Ela não podia tá
falando sério, ela não podia estar grávida dele. Um amontoado de gente
começa a fazer uma roda ao nosso redor e vejo seu Tião se aproximar.
— Eu vou te pedir uma última vez, me deixe em paz!
Tay rosna tentando se controlar, mas eu grito, eu já tinha perdido a linha
mesmo, me segurar agora pra quê?
— Última vez nada! Acaba com essa vaca desgraçada! Eu duvido que essa
coisa ruim, mal amada e invejosa conseguiu engravidar! Gravidez em gente
ruim desse jeito é difícil vingar, ninguém merece ser seu filho. Deus tem que
ter é misericórdia!!!
Eu falo e ela sorri mandando beijinhos pra mim.
— Leninha, o que tá acontecendo aqui?
Seu Tião questiona e sinto o sangue de meu nariz manchar minha blusa nova.
— Nada, seu Tião! Essa jumenta de uma figa veio aqui só para me perturbar.
É bicho ruim, essa condenada! Se eu fosse o senhor colocava pra fora. Vai
impregnar seu bar de energia ruim!!!
Eu falo e ele olha pra ela, Tay me puxa, coloca o dinheiro da nossa conta na
mesa e sai dali me arrastando até o carro, mas não consegue me impedir de
ver Tião expulsando a vadia do lugar. Eu queria voltar lá e quebrar a cara da
filha da puta. Meu Deus! Que inferno de vida! Será que a gente nunca ia ter
paz? Nunca???
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— Toma! Usa isso.


Tay me estende um lenço e eu estanco um pouco do sangue.
— Qual a probabilidade dessa vadia estar grávida mesmo de você, hein!? Me
diz! Seja sincero de uma vez, acaba logo com isso.
Eu grito, pois estava nervosa mas Tay não, ele fala baixo e é carinhoso
comigo.
— Te disse que fiz o teste, Ellen, ela não está grávida!
— Então por que essa porra dessa mulher maldita insiste nisso??? Mas que
inferno!!!
Eu choro de tanto nervoso e ele que já dirigia, para o carro no meio fio e me
olha espantado.
— Fica calma! Ela insiste porque quer atingir você. É uma idiota! Vai chegar
em mim e falar de gravidez enquanto você se doer. Faça as contas amor, o dia
que fiz o teste, depois o dia que ela veio dizer que estava! Teve ovulação em
dois, três dias? É maluca? Tomou uma poção mágica? Não tem a menor
possibilidade, amor! Para pra pensar! Tirando uma vez por acidente, sempre
me cuidei, nunca quis engravidá-la! Ela quer me punir por tê-la abandonado,
mas, por favor, não a deixe prejudicar nosso relacionamento, é uma maluca,
só merece sua pena, nem odiá-la você devia!
Ele diz, mas mesmo assim não consigo parar de chorar.
— Quero ir embora daqui!!! Amanhã!!! Não me importa nada! Trabalho,
FAB, evento, nada! Quero paz, Tay! Quero ir embora! Tô cansada disso, de
nunca conseguir ser inteiramente feliz com você! Ter sempre alguém
querendo acabar com a gente. Ou a gente vai embora, ou a gente senta e
espera essa condenada acabar com nosso relacionamento, igual Laura, Pedro,
Juliano, e por aí vai. Não quero mais isso! Não quero mais. Quero ir
embora!!!
Eu falo no meio do choro e ele me abraça.
— Tudo bem, amor! A gente vai! Você está certa, sabe que é só você que me
importa! Amanhã bem cedo passo na escola, e de lá vamos embora, antes das
nove da manhã já estaremos a caminho de São Paulo, tudo bem assim?
Ele questiona limpando minhas lágrimas e me dando selinhos cheios de
amor, e eu balanço a cabeça.
— Tudo bem, está bem assim! Mas você acabou de perder a aposta, me
beijou!!! Tenho um pedido! — eu digo soluçando e ele sorri.
— Você tem qualquer coisa, não precisava dessa aposta para me pedir, eu te
darei o mundo se você quiser! — ele fala e eu sorrio pra ele.
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— Também, com uma ex dessa, e essa vida cheia de inimigos, merecia vários
mundos e muitas coisas!!!
— É verdade! Mas não se preocupe, meu bebê! Amanhã tudo isso acaba. eu
te prometo!
Ele diz, me beija com carinho e põe o carro pra andar.
Chegamos em casa, tomo um banho demorado e ele me espera na cama com
um chá, e um lanche que mal toquei. Não queria nada, só queria meu homem
me fazendo cafuné para tirar aquele desespero de mim. Não aguentava mais
aquilo, aquele inferno todo, era só ficar bem para algo acontecer, parecia uma
maldição, e eu tinha certeza que ela ia atacar de alguma forma, fazer alguma
coisa a qualquer momento, por isso eu queria sumir dali o quanto antes,
desaparecer, evaporar… ou eu ia acabar matando aquela doente com filho ou
não, na barriga!!!
Vou até o quarto onde Cat dormia com os primos, dou um beijinho nela, e
volto pra cama. Tay me aperta em um abraço gostoso e carinhoso e ainda sim
me sentia triste, mesmo aquecida, confortável, e cheia de amor.
— Quer fazer amor bem devagarinho para dormir melhor? Eu meto em ti
desse jeito aqui que você está mesmo. Tipo em segredo...
Tay beija minha nuca e sinto que sorria.
— Não. Só quero um cafuné e chorar até dormir… só vai ter “amor
devagarinho” quando a gente pisar em terras paulistanas. Tu que não me leve
amanhã bem cedo não, que você vai ver!!!
— Já disse que vamos selvagem chorona! Eu te amo, muito, muito muito!
Faço tudo por você e por nossa felicidade! — ele fala e eu me viro pra olhar
em seus olhos.
— Promete?
— Prometo! Agora descansa… farei seu cafuné!
Ele resmunga sorrindo, eu me viro novamente pra dormir de conchinha, e
apago ouvindo ele repetir inúmeras vezes que me amava, que eu era tua
prioridade, tua vida, e mais outras coisas lindas de se ouvir…
Não sabia quanto tempo tinha se passado, mas ao fundo, bem no fundo do
“túnel”, ouço a voz de Tay me chamando. Mas sabe quando a gente tem
aquele corpo trancado, que a gente tenta acordar, responder, e não consegue!?
Parecia até que sua voz vinha de um sonho…
Acordo de repente, não o encontro na cama, e fico preocupada. Eram duas da
manhã. Desço na cozinha, abro devagar o quarto da Lulu, vou até a sala, olho
os banheiros da casa… aquela casa é imensa, mas ele não estava em lugar
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nenhum. Volto pro quarto, ligo em seu telefone e ele não atende, abro uma
pequena fresta da janela e não encontro seu carro na calçada. Tay saiu. Ele
me chamou creio eu que para se certificar de que eu dormia, e assim, saiu.
Para onde será que ele tinha ido?
Ligo para Laura, só chama. Ela não atende. Se não estivesse com Tay, ela
ficaria preocupada e atenderia para saber o que eu queria, afinal não falo
muito com ela. Mas já que não se preocupou em atender, era sinal de que ela
sabia que ele estava bem, pois eles estavam juntos. Agora a questão era:
fazendo o quê, uma hora daquela? Sinto um calafrio só de pensar e desisto de
ligar. O jeito era esperar, e orar para que ele não volte às suas antigas origens.

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38
MEDO

Chego da rua já eram nove da manhã, o dia começou bem, tenso, porém nos
conformes. Cat pula no meu colo assim que eu entro na cozinha.
— Onde esteve, papai? Eu estava te procurando!!!
— Meu amor! Papai foi na escola resolver algumas pendências pra gente
poder viajar!
Encho seu rosto delicado de beijinhos e me sinto feliz e relaxado.
— Tudo bem, é que eu queria me despedir do vovô, e passar pra pegar aquele
vestido da Barbie na loja! Você me prometeu que compraria… — ela pensou.
— em uma outra oportunidade. Mas a gente vai embora!
— Vamos passar lá, filha! Mas seu avô foi viajar, vai ficar difícil se despedir
dele. Logo, logo ele se encontra com a gente em São Paulo! Eu espero. Cadê
a mamãe???
— Está no quarto!
Ela diz e corre para a rodinha que os gêmeos faziam no tapete.
Entro no quarto e vejo Ellen olhando a rua pela janela. Pelo clima que senti,
ela estava uma arara, não vi seu rosto, mas sabia que lá, estava estampado
uma carranca certinha.
— Posso saber onde esteve!?
Ela pergunta sem me olhar nos olhos, e eu deposito as minhas chaves e minha
blusa na cama. Sento-me e me desfaço inteiro para tomar um banho. Logo
Laura chegaria, e deveríamos partir imediatamente.
— Não.
Respondo porque simplesmente não ia dizer nada e pronto.
Sinto ela me fitar e se aproximar de mim.
— Onde esteve?
Ela para em minha frente e repete a pergunta.
— Não precisa saber do que faço na rua.
— Teremos direitos iguais?
— Não, de forma nenhuma! Já arrumou as coisas? Estava com pressa…
Eu resmungo indo em direção ao banheiro, e ela se aproxima de minha
camisa na cama.

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— Isso é sangue? O que fez, Tay?


Ela questiona já chorando. Eu nunca me sujava, nunca. Mas dessa vez não
teve como, me descontrolei. Engraçado que Ellen nunca precisaria se
preocupar com marcas de batom na minha roupa, e sim de sangue.
— Não me faça perguntas, Ellen…
— Achei que tinha mudado, que era uma pessoa melhor.
— Eu sou. Sou bom até não machucarem ou ameaçarem minha família. Ela
tirou seu sangue ontem, apenas tirei tudo o que pude dela.
— Achei que Cat tinha mudado você…
Ela resmunga horrorizada e eu me aproximo, ignoro o passo que ela deu pra
trás, e seguro em seu braço.
— Cat me deixou melhor, mas também um homem ainda mais ruim e
violento, no ponto certo para protegê-la. Vamos fazer do jeito certo, não vou
mentir pra você, não vamos arrumar motivos para brigarmos. Eu sou um
assassino, você sabe disso, todos aqui, sabem. Sabe que quem se aproxima de
vocês duas, eu apago, sempre foi assim contigo, e agora será ainda mais. Yan
só está vivo por causa de Cat, sabe disso, então ao invés da gente brigar e me
obrigar a agir sempre escondido, aceite minha situação, e me apoie, fique do
meu lado e quando eu chegar, todos os dias, depois de ter tirado mais uma
pedra do nosso caminho, me ofereça amor, me ofereça seu corpo de bandeja
para que eu te ame, descanse, e tenha tudo o que preciso dentro de casa.
Depois de mais uma noite lutando para nunca mais ver você machucada e
chorando. Me receba de corpo, alma e pernas abertas. É assim que será, te
darei o mundo, uma vida confortável, paz, proteção, amor incondicional, e
você me dá apoio, seu corpo, e um sorriso, nada de cara emburrada, nada de
frescura, manha, charminho, nada… só amor, muito sexo, no máximo um
banho quente e uma refeição maravilhosa. É só o que eu peço.
Eu digo e passo o polegar na maçã de seu rosto. Fico morrendo de vontade de
tê-la em meu braços, mas não dou um passo.
— Tenho um presente! Tenho direito, você me prometeu!
Ela diz e se aproxima de mim como uma cobra peçonhenta.
— E o que você quer?
— Quero ver! Quero ver com meus próprios olhos do que você é capaz.
Quero conhecer todos os seus lados, inclusive esse. Quero te conhecer.
— Nunca. Peça outra coisa! Peça uma casa, uma ilha, cavalos… seja normal,
me peça um mundo de sapatos. Isso não.
— Quer que eu aceite quem você é, mas não posso ver!?
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— Já disse. Peça outra coisa.


Eu falo e ela me beija de forma intensa. Eu sabia que tentaria me pedir
novamente enquanto me faria gozar e foi exatamente isso o que ela fez, mas
eu continuei dizendo não enquanto estava dentro dela.

A casa estava “cheia”, minha sogra, seu Renan, Yan, “os de casa” e em breve
Laura chegaria. Minha mãe continuava mal, excluída, e extremamente triste.
Todos estavam ali para principalmente, se despedir de nossa pequena Cat, a
menina estrela!
— Caramba!!! Eu sou uma princesa muito rica! Agora terei 4 condados, não
é papi!? — ela diz feliz pro Yan, e o gerente sorri.
— Sim, filha, você é muito sortuda.
— Você virá com a gente. não é!?
— Vou até lá pra te ver, mas não hoje!
Ele diz e ela parece triste, saio correndo dali para não presenciar aquela cena
bizarra, e vou pro portão respirar ar puro. Laura chega assim que eu saio.
— E então???
Pergunto e ela me olha nervosa. Usava suas roupas pretas, como sempre de
couro, e como sempre uma cópia das minhas, e usava uma camiseta um
pouco larga por baixo do casaco aberto, e eu sabia que se vestia assim quando
estava armada dos pés á cabeça.
— Foi o que eu previ. Falei para não soltá-la, falei para subir aquela vadia…
fiquei com dois unos atrás de mim, me seguiram até a minha casa de manhã,
por isso nem dormi. A filha da puta não vai desistir nunca! Já não vou mais
executar as suas ordens, essa desgraçada está me cansando, assim que eu
tiver uma melhor oportunidade, vou matá-la, você ficando com dózinha ou
não. Não me importa quanto anos foi casado com aquela sebosa, vou cortar a
sua garganta assim que ela aparecer novamente na minha frente!
Laura desabafa em voz baixa e passa por mim para entrar em minha casa.
Que jeito que eu ia sair de São Paulo, com aquela maluca no meu pé? Por que
ela não desiste? Não posso mais segurar, evitei de todas as formas em
respeito ao nosso antigo relacionamento, a sua família, mas não dava mais,
Julia seria morta pelas minhas próprias mãos. Só a surra que eu mesmo dei
nela não adiantou, deixar a Laura por meia hora brincando com o pescoço
dela, não rolou, não a assustei o suficiente, preciso perder o respeito e “minha
dignidade”, e matá-la a sangue frio!!!
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Vejo Laura entrar na cozinha, abraçar e beijar Cat com carinho,


cumprimentar todos com educação, e abraçar por tempo demais seu Renan, e
nessa hora os olhos de Yan brilhavam de ciúmes, e raiva. De repente, ainda
agarrada ao pescoço de Renan, Laura olha para Yan e pisca discretamente,
Yan bufa silenciosamente, e vira o rosto para outra direção. Até onde entendi,
Ellen viu, e revirou os olhos. Aquilo me deixou puto, mas engoli. O que será
que tinha acontecido naquele passeio?
Nina tinha cozinhado, na mesa posta havia diversos tipos de bebidas e sucos,
enfim, uma espécie de despedida para Yan, Renan, e dona Isabelle. Não era
uma festa, mas como os planos tiveram que mudar por causa da alta tardia de
Jon, então não podíamos sair cedo de Barbacena, deveríamos esperar até uma
da tarde, ir até o hospital buscar Jon, e levá-lo para São Paulo. Esse eram os
planos de Lulu que havia recebido a ligação de aviso de alta do médico
Fernando mais cedo, naquele mesmo dia.
Ellen não parava de olhar de Laura para mim, parecia não estar nada
satisfeita. Ela mantinha sua cara emburrada, mas com Yan lá dentro, eu
agarrei em sua cintura e não mais soltei, ela ficou imóvel e obediente.
— Eu vou atrás, sozinha. Se forem arriscar a própria vida nos atacando, será
o meu carro. Se fizerem isso e cobrir nossas laterais, posso proteger todos os
carros estando por último, mas aposto que não vai rolar nada disso…
Laura explica no quintal enquanto bebia um drinque e Yan escuta a conversa
e se intromete.
— Quem vai atacar os carros?
Ele se aproxima e não olha pra Laura, só pra mim.
— Não se intrometa, gerente.
Eu digo e ele diz sim com a cabeça.
— Tudo bem, vou ver se Ellen sabe de algo a respeito!
Ele ameaça entrar em casa para importunar minha mulher e minha reação é
imediata.
— Mais um passo e eu atiro na sua cabeça como sempre sonhei em fazer,
gerente de Bagé!
— Ótimo. Então me conta tudo! Ou assombre o sono de nossa filha ao ver a
cena. Qual vai ser? Se alguém está ameaçando a vida de minha filha e Ellen,
quero saber!
Ele resmunga e ainda sim não olha pra Laura.
— Deixa, eu conto pra ele! Vem delícia, vamos até o carro!
Laura me olha de um jeito estranho, e o gerente fica assustado.
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— ELLEN!!!
Ele chama alto e ela sai para saber do que se trata.
— Só queria te avisar que vou aqui no carro da senhorita Laura rapidinho. Se
eu demorar, poderia ir me chamar e ficar um tanto quanto desconfiada se eu
não voltar pra cá!?
Ele questiona “como quem não quer nada”, e ela concorda desconfiada.
Laura ri.
— Claro, Yan.
Ellen diz me olhando nos olhos e entra de volta na cozinha. Fico mimando
minha pequena princesa enquanto a mãe dela arrumava tudo, e todos
conversavam na sala.
— Jade!? — eu chamo a cigana que brincava descalça com as crianças no
tapete enquanto a gente conversava. — Posso falar contigo a sós?
— Claro!
Ela diz e me segue até o meu quarto. Eu a deixo entrar, fecho a porta, e ela
para olhando pela janela. Não diz nada, só olha. Pela janela posso ver que
Laura afastou o carro para bem longe do nosso portão, e os vidros já estavam
embaçados.
— Sua amiga me parece apaixonada. — Jade diz sorrindo.
— Acho que ela está dividida, entre um e outro!
— Não. Ela nunca ficou dividida, já se decidiu. Está agora com quem quer
estar pro resto da vida, e ele também entregou seu coração a ela.
Ela diz e eu volto a olhar para o carro.
— Quer respostas!? — ela fala de repente, se virando e me encarando — Pois
bem… posso te dizer que é seguro viajar, pode ir tranquilo! Nossa família
chegará em São Paulo com segurança. E mesmo não tendo bebê nenhum
dentro de sua barriga, você devia ter ouvido sua parceira fiel, Julia vai
continuar usando desse falso testemunho para machucar Maia! Sou contra
qualquer tipo de violência, mas essa mulher só te deixará em paz, quando
morrer. Sua lealdade sairá contestada, será impedida de salvar você. Você
pode se decidir para que lado caminhar, seu coração será ferido, e vai ter que
escolher entre ser como realmente é, aceitar as suas origens, ou não, e nunca
ter paz. Se escolher viver, sua confiança vai ser prejudicada, se escolher
morrer, para ser leal a quem precisa, fará sua família inteira sofrer. Serás bom
e sofrerá consequências graves, se fores ruim, vai ter que conviver com isso
para o resto de sua vida.
Jade diz, e como sempre acorda do transe e parece nem saber o que me disse
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a segundos atrás.
— Não consegue falar uma única palavra sem parecer uma charada? Como
você faz essas coisas?
Eu pergunto e ela sorri tímida. Já parecia outra mulher.
— Não sei. Não sou bem eu mesma quando acontece. São meus ancestrais
que tomam posse de mim para ajudar.
— Já conheceu alguma pessoa que teve um futuro diferente do que você
preveu?
— Já. Muito do que falo pode mudar, depende das escolhas da pessoa!
Ela fala enquanto caminha pra lá e pra cá.
— Vou escrever meu próprio destino, Jade! Não aceito morrer agora.
Eu digo e ela sorri.
— Às vezes você morre enquanto vivo! — ela para, respira, e caminha em
minha direção. Olha nos meus olhos e continua. — Salvei sua vida naquele
acidente, controlei a enorme hemorragia enquanto sua mãe gritava por ajuda
e me perguntava o porquê eu não fazia nada e ficava parada. Doei meu
sangue pra você. Um pedaço da minha vida, uma fina camada de Éter que
pertence aos meus ancenstrais. Meu sangue corre em suas veias agora, era pra
você ter morrido naquela calçada fria, mas não deixei, vi seu funeral
enquanto Rafael corria para frente da escola. Eu vi sua morte, mas escolhi
mudar isso, eu mesma decidi que ainda não era a sua hora. Você sempre
controlou seu destino, desde àquele momento, tem esse dom. Portanto use-o.
Se trabalhar isso em você, não precisará mais de minha ajuda pra nada. Se
prestar atenção, vai notar que continuará sendo o mesmo a partir de agora. Se
olhe no espelho, e veja! — ela diz e me sinto estranho.
— Não consegue me dizer nada sem parecer ser um enigma??? — repito a
pergunta e ela ri.
— Estou te falando do futuro, tô te dando enormes passos à frente. Não serás
pego de surpresa. Não poderia ser mais fácil do que isso. Há sempre dois
lados de uma mesma moeda. Eu te dei as respostas que você precisa, agora
reflita, e decida o que fazer. Fazer melhor que isso, seria deixar você ir
descansar e lutar pela tua felicidade no teu lugar!
Ela diz e eu sorrio.
— E existe a possibilidade de você fazer isso? — eu questiono e ela ri alto.
— Realmente Catarina faz milagres. Precisamos dela sempre perto de você.
Ela fala rindo e sai do quarto. Depois disso Ellen sai do banheiro e me deixa
paralisado.
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— Você quando fica ansioso, fica imprudente.


— Como entrou aqui?
— Eu já estava aqui. Subi quando você estava na sala. Aprendi a usar quase
nada de perfume, desde àquela noite na floresta, virou uma espécie de neura.
Ela dá de ombros e se senta na cama.
— Aceito tudo e qualquer coisa pra a gente ter paz, aceito Laura por perto
para garantir nossa segurança, aceito ela apaixonada por Yan, e aceito que
você precise se livrar de Julia antes que ela me machuque ou machuque
Catarina. Mas não aceito que você se sacrifique por qualquer coisa, não
aceito sua morte, não aceito que me deixe, de forma nenhuma. Faça o que
tiver que fazer, mas você ainda não me pediu em casamento, e Catarina
precisa de você, não de Yan, de você. Se vira, Tay, dê um jeito, mas acabe
com isso de pé.
Ellen diz e sai do quarto me deixando ali, sozinho e ainda mais confuso.
— Eu não acredito que vou ficar sem minha princesa linda… prima Ritinha
queria te ver, acho que vou ter que levá-la até São Paulo quando sair do
hospital. — Renan diz segurando Cat no colo.
— Mas titio, será que vocês conseguem chegar até lá? Você vai demorar???
— É claro que não vamos demorar. Acha que eu conseguiria ficar por muito
tempo sem você?
Ele questiona e ela sorri lindamente.
Laura entra na cozinha sozinha com sua pele levemente avermelhada e seu
cabelo frisado.
— Vamos, Cat!!! Dá tchau pra vó Isa, pro tio Renan, e vamos! Acelere seu
pai!
Laura diz e Catarina obedece. Olho pra ela e já percebo o quanto está triste.
Parecia querer sair dali o quanto antes. Arrumo o que falta, vejo enfim, minha
mãe descer as escadas, abraçar Renan e dona Isa, e ir direto pro carro de
Laura. Tinha seus indispensáveis óculos escuros para esconder as olheiras, e
seus enormes cabelos negros em um coque desarrumado e que parecia não ter
sido penteado há anos, e suas roupas antes caras e requintadas, deram agora,
um lugar ao jeans envelhecido, jaqueta simples, e tênis de malhar. Minha mãe
estava cada vez mais péssima.
— A bruxa vai no carro com os gêmeos!? Se dona Jô quiser ir comigo e com
sua mãe, meu carro estará vazio, será mais confortável pra ela.
Laura diz na calçada e eu concordo. Logo Yan se aproxima.
— Acho que vou até lá. Não consigo ficar aqui, não depois…
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— Não se preocupe. Tenho bons motivos para dizer que Julia não vai
aparecer tão cedo. Se está dizendo que vai por preocupação, fique tranquilo!
Se está dizendo que vai por causa de Laura, vocês que se entendam!
Eu digo ao gerente de Bagé, auxilio minha vó a entrar no carro de Laura e
continuo meu serviço. Coloco Cat na cadeirinha do meu carro, Lulu ao seu
lado segurando a bolsa que Ellen faz para viagens com tudo o que Cat
precisa, e Ellen se senta na frente.
Rafa sai na frente depois de me cumprimentar e desejar boa viagem, e eu
espero para ver o que o gerente decidiu. Ele e Laura pareciam discutir
discretamente, mas Yan tinha um semblante entristecido e apaixonado
enquanto Laura estava furiosa e amargurada. Pelo jeito fazia doce, algo
aconteceu e ela não queria a presença dele lá.
— O quê?
Eu me aproximo quando o gerente atravessa a rua para partir.
— Me deixa.
Laura diz simplesmente e engole o choro. Mas que desgraça era aquela?
Caminho atrás do gerente, pergunto o que estava acontecendo e de novo
recebo uma patada.
— Não é da sua conta, pai biológico! Com quem está preocupado? Com o
gerente de Bagé ou a funcionária que sempre desprezou?
Ele fala, dou um passo pra trás, e ele arranca com o carro dali seguindo
direção ao caminho oposto. O dia estava tenso, e algo me dizia que não
melhoraria.

Assim que saio com o carro do vilarejo, e passo para comprar a bendita roupa
de Barbie para Cat, ligo para Laura e a autorizo seguir viagem. Não precisava
ir até o hospital, seria uma parada inútil para ela. Paro o carro no
estacionamento e sigo com Luiza até a sala de espera.
— Entra comigo!
Ana Luiza pede e eu concordo. Pegamos os crachás e um sorriso enorme se
forma na face de minha irmã ao entrar no corredor do quarto de Jon. Era
incrível ver alguém feliz naquelas circunstâncias em nossa família, então, que
fosse pelo menos ela.
— Ei!
Ana Luiza exclama e se aproxima de Jon para beijá-lo. Ele já não usava a
faixa na cabeça e parecia bem melhor. Dobrava suas roupas e fazia as malas,
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mas Jon não sorriu ao vê-la.


— O que faz aqui?
Ele questiona virando o rosto e o selinho que Luiza daria nele vira um beijo
no rosto mais comportado.
— Como assim? Você teve alta, vim te buscar. Não sei aonde vamos ficar
ainda, mas daremos um jeito! Acho que vamos nos espremer na vovó, mas
será bom. Será bom ficarmos juntos, vou cuidar de você!
Luiza sorri fraco, mas já tinha os olhos cheios de lágrimas prestes a fugir. Jon
me olha triste e sem graça, e eu entendo. Droga.
— Vou deixar vocês conversarem a sós.
Eu falo, mas Luiza grita.
— NÃO. Tudo bem, fica! Quero que seja testemunha do que ele vai me dizer
agora, eu já suspeito. Vim de casa até aqui sentindo um aperto enorme no
coração, claro que não seria simples, fácil…
— Vou pra casa com minha esposa. É lá que devo estar, é lá que preciso
ficar.
— Mas você não tem esposa! Você tem uma namorada que sou eu, esposa
não.
— Ana…
— Jon!!!
— Eu ainda não me lembro de nada, de ninguém, nem de você! Só o que sei
e tive certeza é de que tenho filhos…
— Filhos esses que você via raramente porque aquela vadia te meteu um
chifre e os arrancou de você. Jon, não faça isso…
Luiza o abraça e eu me recuso a olhar a cena em que minha irmã ia ser
rejeitada daquela forma. Viro o rosto, mas não adianta. Eu ainda podia ouvir
Jon despedaçando o seu coração.
— Você ainda é jovem. Tem uma vida inteira…
Jon começa, mas Luiza interrompe.
— Cale a boca. Cale a boca…
Ouço Luiza dizer e olho para os dois. Só Jon chorava, ela não. Jon parecia
achar que fazia a coisa certa, tinha perdido a memória, mas amava Luiza
como Luiza o amava. Fico me perguntando o porquê onde tinha tanto amor,
tinha que ter tantos desencontros daquele jeito.
— Agora eu entendo porque meu pai me protegia tanto, mas tanto… era
incrivelmente chato quanto sufocante, mas nada é tão horrível, quanto a dor
que eu estou sentindo agora, Jon! Depois de tudo o que passamos, eu nem
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acredito que estou aqui ouvindo isso de você. Minha mãe disse que ele veio
aqui te pedir desculpas, ele foi embora para que eu pudesse viver o que eu
queria viver, coisa que com ele aqui, não seria possível, e você ainda faz isso,
por causa de um casamento que já nem existe mais, filhos mais velhos do que
eu mesma, eu não acredito que sua desculpa para me dar um fora é uma perda
de memória, minha idade, e uma vida de mentira.
— Por favor…
— Ah, Jon, não me toca. — Luiza parece desanimada. — Esquece. Minha
família foi inteira destruída para que eu pudesse ficar contigo, e… agora isso.
Eu sou uma idiota, meu pai só quis me proteger disso e eu, nossa, eu… — ela
encosta na maca e parece passar mal, psicologicamente falando. — Tay, por
favor…
Eu me aproximo dela, pego sua bolsa na cadeira e saio dali com Luiza
desolada, ela não conseguia mais falar, nem xingar ele, nem ameaçar, nada.
Ela estava desolada, mas não chorava. Sua face era de puro arrependimento e
amargura. Assim que chegamos do lado de fora do hospital ela se senta nos
degraus da entrada e chora, chora muito. Chora igual um bebê, demais
mesmo. Eu tento me aproximar, mas ela mostra a palma da mão e não me
deixa chegar perto dela. Ela só agarra os próprios joelhos e chora como uma
criança que acabou de perder algo muito importante, não sei se posso fazer
comparações, mas não é tão grave quanto perder um ente querido, e nem tão
leve quanto apenas um brinquedo quebrado. Nunca vi minha irmã daquele
jeito. Sempre fomos diferentes, ela nunca curtiu carinho e abraços para
espantar a tristeza, a dor sempre a deixava mais forte, Luiza era meu oposto.
Não queria o colo da mamãe, a proteção do irmão mais velho, nada disso. Eu
sabia que assim que ela se acalmar, vai levantar daquelas escadas, irá erguer a
cabeça, e sair dali outra pessoa. E assim foi exatamente assim que aconteceu.
A semana correu lenta e tranquila por incrível que pareça. Fiquei em
Pirassununga com Ellen, Cat e Laura, e o restante da família em São Paulo.
Soube que minha mãe se trancou na nossa antiga casa, e Lulu cuida da vovó
com a ajuda de Nina na casa dela. A família separada, um mal estar que
parecia que nunca ia passar e um mau-presságio que não saía de mim, desde a
última conversa com Jade. Mas ainda sim, Julia não havia dado sinal de vida.
— Recebi um telefonema da ADM, não conseguimos escapar da
demonstração e aqui também vai ter. Precisaremos pilotar aqui.
Laura diz enquanto Cat me fazia brincar de Barbie no chão da sala. Ellen
estava no banho, dentro de pouco tempo sairíamos para jantar fora.
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— Eu não tinha certeza se em todas as bases teria…


— Confirmei, até em BH vai ter! Foram enviados caças para todos. Também
achei que só teria nas escolas pra cadetes, mas não.
— Tudo bem. Meu problema não é trabalhar, meu problema é a presença
dela.
Resmungo e não cito o nome de Julia, pois queria manter o sorriso lindo na
face de Cat, que naquele momento também fazia Laura brincar com as
bonecas.
— O que aconteceu com vocês dois? — eu pergunto e Laura fecha a cara.
— Ele quer mais do que posso dar, parceiro.
— Mas você gosta dele.
— Querer não é poder, Tay!
— Você precisa pensar em você, dispenso seus serviços, está na hora de
começar a viver por você mesma, precisa ser feliz. — eu falo e ela rosna.
— Tomo sua vida e a vida de seu pai como um exemplo, a nossa vida não
permite que a gente seja feliz, ter alguém para amar é perigoso, e não quero
vê-lo partir. Gosto dele, até demais, mas meu trabalho vem primeiro, você me
paga bem, mas ainda não tenho dinheiro o suficiente para descansar como eu
quero. E eu não esqueci o juramento que fiz. Vou estar do seu lado até partir
dessa pra melhor, vou viver para proteger você e sua família, e de qualquer
forma, você é tudo o que me resta. E agora eu tenho essa princesinha aqui,
não é!? — ela sorri para Catarina. — Jamais vou abandoná-la.
Ela diz, eu fico sem ter o que dizer, e Cat senta em seu colo.
— Tia, quer comprar um castelo também? Meu papai pode te dar um!!!
Ela resmunga e faz Laura sorrir. Antes de Laura responder e possivelmente
me xingar de “mão de vaca” para minha filha, seu celular toca, e vejo de
relance vejo o nome de meu pai.
— Quem é? — pergunto e ela fecha o rosto.
— Não é da sua conta.
Ela resmunga e agradeço por pelo menos não ter mentido, falado outro nome,
e me escondido a verdade. Mas o que ela e meu pai tinham para conversar?
Não digo nada, e também não pergunto. Possivelmente estava dando notícias
da família para ele, era a cara de meu pai fazer isso, por isso esse assunto não
deu voltas em minha cabeça.
Deixamos Laura de babá da Cat, e saímos. Eu estava tentando de todas as
maneiras agradar Ellen, fazê-la feliz, e relaxar um pouco, pois, andava
extremamente estressada, triste, e chateada com tudo. Com medo da Julia,
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medo do que Jade me disse sobre meu futuro, as férias que tanto queria tirar
comigo e com Cat, e por aí vai... e ao retornar encontramos Laura no sofá
com a Cat dormindo em cima dela, ambas sujas de maquiagem, descabeladas,
e descalças. A cena me faz sorrir, mas Ellen resmunga: — Eu deixei minha
filha com um homem solteiro e despreparado.
Ela fala e esconde o rosto ao sorrir, quando se aproxima para pegar a Cat e
levá-la pro quarto.
— Oi… desculpe. Dormi com um só olho aberto, a pestinha me deixou
exausta, eu não sabia onde ela desligava… — Laura resmunga prendendo o
cabelo.
— Já se olhou no espelho, né!? — pergunto rindo e ela segura o riso.
— Olhei, quando eu disse que ia tirar ela perguntou se foi porque eu não
gostei e fez uma carinha tão tristinha, mas tão tristinha, que não tive como
tirar! Estava esperando ela dormir, mas até acho que dormi primeiro que ela,
ela é terrível.
— Deu a janta dela???
— Não sou a melhor babá do mundo, mas também não deixei a garota passar
fome. — ela ri. — Assim que comecei a me cansar da brincadeira ela
questionou: “Oh, tia Laura, você não vai me dar nada pra comer não?” — ela
fala e ri.
— Da próxima vez contratamos uma profissional!
Ellen resmunga fingindo estar decepcionada.
— Quero ver Catarina aceitar!
Laura ergue uma sobrancelha e sai dali direto pro banheiro. Ellen guarda
todos os brinquedos jogados, e parecia feliz e realizada.
— Gosta daqui? — eu pergunto e ela se senta no meu colo.
— Gosto.
— Depois que voltarmos de viagem, quero procurar outra, quero uma casa
nossa, com nossa história, nossas coisas, um novo começo!
Eu digo e ela parece concordar.
Vou para o quarto a levando no colo e a jogo na cama.
— Preciso de um banho. — ela diz e sorri.
— E eu preciso de você!
Eu resmungo e faço amor com ela até o dia amanhecer, literalmente. A
sensação que eu tinha era que nossa vida seria dividida em antes e depois
daquela noite, então dessa vez foi diferente. Fizemos amor com as luzes
acesas, prometendo e nos declarando, confessamos os segredos mais
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obscuros de nossa alma, e eu tive que jurar que aquela não seria a última vez
que a gente se amava, tive que jurar para Ellen parar de chorar
descontroladamente após gozar e assim se acalmar.
Ela dizia que eu agia como se tivesse me despedindo dela, mas não era bem
isso, eu sentia um mau-presságio horrível e queria tudo dela, eu tinha medo,
mas não sentia que fosse exatamente a última vez, e sim sentia que assim que
o dia amanhecesse eu precisaria ser outro homem. Então Ellen não se
desmanchava nos meus braços pela última vez, como ela pensava, Ellen
apenas fazia amor com aquele Tay, mas não o faria novamente com o
mesmo, seria outro cara, e não pela última vez.
— Aposto que não dormiu, você tem olheiras enormes.
Laura me diz assim que entro na cozinha e vejo a mesa posta por ela.
— Bom dia. Já de farda? Que tenente exemplar. Você sabe qual é o caça que
pegamos?
— MGL 25 Taiken* Um coreano fodidaço semelhante ao Carcará. Mesmo
sistema, painel digital, zerado, maior, mais rápido, e ainda mais potente! Te
mandei a ficha técnica por e-mail, pra você não gaguejar ao se encontrar com
o major! — ela ri. — Ele sairá daqui diretamente para ocupar o lugar da águia
em Manaus! Só depois de saber disso suspeitei do porquê pegamos justo esse,
o caça mais rápido do evento! Não é porque você é o melhor piloto, é porque
você será mandado de volta pra Manaus numa melhor oportunidade.
Ela diz sem respirar e eu só quero saber de comer, pois estava faminto. Ellen
desce com Cat enquanto discutimos sobre a nave, e ganho um abraço
apertado de Catarina já tomada banho e sem o batom rosa pelo rosto todo.
— Minha princesa gosta de maquiagem é? Deixou tia Laura linda ontem? —
eu falo e ela sorri.
— Ela ficou uma princesa, não é papi!?
— Espetacular, uma pena que tirou, agora tia Laura voltou a ficar horrenda
como sempre!!! — eu digo e Cat faz cara feia.
— Não falei assim da tia, papi! Não gosto disso!
Ela fala e as duas batem as mãos no ar.
— Nossa que pena, já até disse que ia contratar outra babá pra você filha.
Uma babá melhor!
Ellen zomba e Cat volta a fechar a cara e cruzar os ombros.
— Não. Tia Laura cuida de mim, só ela sabe cuidar de princesas!
Cat diz e Laura sorri e mastiga ao mesmo tempo. Ellen sorri se serve de café,
e Cat só desmancha o bico quando a gente diz que tudo aquilo é brincadeira.
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— Vou na frente para cuidar da averiguação e revisão da nave ching-ling.


Fica de olho nesse telefone, qualquer coisa eu ligo! — Laura se levanta da
mesa, fala e agarra Cat. — Tchau minha princesa favorita! Se seus pais
falarem de novo, em arrumar outra babá e se livrarem da tia Laura faça o que
combinamos, tá bem? Cruze os braços e faça um bicão enorme!!! — Cat sorri
concordando pra ela e Laura vai embora.
Tomo banho, cuido da roupa de Cat, visto a farda, e faço tudo o que preciso
fazer com o olhar pesado e choroso de Ellen. Não entendia o porquê que a
mulher chorava e miava tanto.
— Vem cá. — eu a puxo da poltrona para poder abraçá-la e confortá-la. Não
suportava mais vê-la daquele jeito. — O que foi? O que você tem???
— Não sei!!! Não quero que pilote hoje, não quero que saia de casa. Vamos
ficar. — ela chora sem motivo.
— Já consegui a transferência, preciso trabalhar, se não for lá, será aqui. Não
fiz o que você queria? Viemos embora, agora estamos bem. Para de chorar
Ellen, está tudo bem amor, eu estou aqui. Vou fazer o que faço sempre.
— Ah, mas não sei, tô sentindo uma sensação estranha!!! Por favor, Tay.
Vamos viajar, vamos sair do Brasil!!! Quero descansar, tô cansada.
— Já disse que podemos ir amanhã! Lembra que Lulu dizia que pra casar
contigo eu precisava continuar trabalhando? — eu sorrio pra ela. — Então,
não voltei pra Manaus, saí de Barbacena, não deixei você, mas preciso
continuar trabalhando. Consegui umas férias, amanhã ou hoje à noite
poderemos viajar, mas preciso pilotar agora! É só um evento, será um voo de
demonstração por dez minutos, e aí eu pouso e a gente vai direto pro
aeroporto se quiser, tudo bem? Aguenta meu amor!
— Tay… — ela chora ainda mais e eu abraço.
— Antigamente me chamava de denguinho. Cadê aquele denguinho? — eu
zombo e ela bate em meu peito. — Se eu tivesse tempo faria um denguinho
contigo, mas estamos em cima da hora, não posso mostrar com meu corpo o
quanto te amo, só com palavras, então olha pra mim. — ela olha e eu seco
suas lágrimas. — Eu te amo com todas as forças, sou seu e serei para sempre,
quero que você confie em mim quando eu digo que meu amor por vocês
duas, ultrapassam razões, explicações, estudos… ninguém nesse mundo, vai
amar alguém como amo vocês, ninguém!!! E não importa o que eu passe, não
importa o que eu precise fazer, confie em mim, nunca mais vou deixar vocês
duas e isso é uma promessa! Eu te prometo que depois que eu sair daquele
hangar hoje, levarei vocês duas para um lugar mágico, e você vai ser a
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mulher mais amada do universo, e Catarina a filha mais mimada do mundo.


Sem preocupações, medo, interrupções, problemas, nada, absolutamente
nada, entendeu bem?
Eu digo olhando em seus olhos e ela balança a cabeça concordando, sorrindo
e chorando, tudo ao mesmo tempo.
Dirijo com ela ao meu lado e Cat na cadeirinha até o estacionamento da
escola. Cat estava radiante porque “ia ver o papai ser o piloto melhor do
mundo inteiro”, e Ellen caminhava agarrada em minha cintura e me
apertando como se quisesse tirar um pedaço de mim, mas pelo menos não
mais chorava, só começou a planejar nossa viagem em voz alta pra se distrair,
sem colocar vírgulas nas palavras, mas não reclamei, era isso ou chorar
desesperada.
— Tem que ligar pro Rafa, ver se eles já chegaram!
Ela diz em uma pausa, e eu concordo, coloco a mão no bolso enquanto
caminho, mas não sinto meu telefone.
— Deixa, eu ligo do meu…
Ela resmunga assim que eu digo que era tarde demais para voltar e procurar.
Bem que a Laura ainda me disse pra eu ficar de olho. Inferno!
— Eles estão vindo. — ela diz e guarda o telefone.
Chegamos na sala de eventos ao lado do hangar e não encontro Laura. Vou
até a pista de decolagem com Ellen e Cat ao meu lado, e encontro uma cena
bizarra. Laura gritava com nossos oficiais, — de patentes altas. — totalmente
fora de si, e descontrolada. Estava praticamente pulando no pescoço de cada
um, e eu não entendia o porquê ainda não tinha sido presa por desacato.
— ELE NÃO VAI ENTRAR AÍ!!! OUVIU BEM??? EU NÃO VOU CO-
PILOTAR, MEU TENENTE NÃO VAI ENTRAR NESSA NAVE, DE
JEITO NENHUM!!! DE JEITO NENHUM!!! NÃO ESTOU BRINCANDO!
NÃO VAMOS NOS MATAR!!!

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39
PANE
— Senhores.
Tay passa Cat pro meu colo e cumprimenta formalmente seus superiores,
ambos quase o ignoram, pois quem tinha toda a atenção era uma Laura
histérica e descontrolada, eu não estava entendendo nada. Ela gritava coisas
desconexas com algumas frases que dizia “recusar a entrar na aeronave”.
— TAY… VOCÊ… — ela se aproxima de Tay, segura o rosto dele com as
duas mãos e encosta sua testa na dele, como se fosse se declarar ou implorar
e é exatamente o que faz — confia em mim, não é!? Confia em mim, não
confia??? — ela fala baixo agora, olhando nos olhos dele, Tay não se move,
fica ali olhando para ela e parece paralisado. Ele confirma com a cabeça a
resposta para sua pergunta, e então ela continua. — Não entra na nave! Eu
imploro, não entra na nave, se tem alguma consideração ou confiança em
mim… por favor, não pilote hoje! Não pilote. Eu imploro.
Ela chora como um bebê, e ele olha para a aeronave por um momento.
— O que você viu, Laura? — Tay questiona com a voz muito baixa.
— Ela, — Laura sussurrava muito, mas muito baixo, só ouvi porque ao ver
seu desespero, também me grudei em Tay por instinto, e Cat agarrou meu
pescoço. — eu a vi, ela está aqui, Julia trabalhou hoje, também conseguiu
transferência, e quando suspeitei e fui me certificar, soube que ela colocou o
nome do Fragoso nos documentos, mas quem revisou a nave foi o santos! Por
favor, Tay…
Laura implora, tocando a farda do amigo com cuidado e Tay não olha mais
pra Laura, ele parecia estar longe. Meu desespero cresce e o da Laura
aumenta ainda mais a cada minuto que passava, ao ver que o amigo não
reagia a nova informação, e os seus oficiais também parecem perder a
paciência a cada minuto ali.
— Tenente Coverick, poderia me explicar o que sua co-polioto alega em se
negar a pilotar hoje?
Um dos oficiais questiona e Tay se aproxima deles, Laura fica ao meu lado
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parada, e olhando para ela posso ver o pavor que sentia.


— Laura… — eu sussurro sem ter certeza de que me ouviria… — O que está
acontecendo? — questiono e ela olha para a Cat.
— Não importa o que aconteça, não importa qual seja tua ideia Ellen, se você
acha que algo pode impedir o Tay de subir nessa nave, faça. Desmaie, tenha
um crise, qualquer coisa, mas não deixe ele voar hoje!!!!
Ela fala e eu volto a prestar atenção em Tay que conversava com os oficiais.
— Ela está histérica… mas não nos deu provas… se a nave foi sabotada,
precisamos de provas… gritou comigo… Isso é inadmissível… ou vocês
planam… não tem conversa, Tenente… é isso…
Pesco pequenos pedaços de declarações e constato o pior.
— Faça alguma coisa, se a Laura está dizendo que é perigoso, é porque é!
Tay, não faça isso! Lembra do que me disse, por favor, você prometeu.
Tay…
Eu sussurro quando ele volta e vejo toda nossa família chegar e ficar em um
canto, aumentando os espectadores.
— Confia em mim?
Ele pergunta e Laura que prestava atenção na carranca dos oficiais, agora
olha pra Tay em minha frente.
— Confio, mas preciso de você vivo… — eu digo e Laura começa a surtar.
— Não. Não. Não.
— Eu já volto. Vou ficar bem.
— NÃO. NÃO. NÃO!!! Não pode fazer isso comigo, não depois de todos
esses anos, não pode me matar! Não pode se matar!
Ela recomeça e vejo Yan se aproximar de nossa família.
— Você não vai, eu vou, Laura, fica calma! Se não levantarmos voo,
estaremos arruinados e vamos os dois presos. Você fica e se comporta, me
diga como funciona a ejeção desse caça, é igual da ave? Me diga!!! Laura…
Me diga e eu vou ficar bem!!!
Tay diz parecendo compreensível, mas Laura não diz uma palavra, não
conseguia, não sabia, ou tinha esperança de que se não falasse, ele desistiria.
— Darei um jeito! Cuida delas!!!
Tay diz e lágrimas já tomam conta da minha visão. Meu desespero me causa
uma dor indescritível e eu preciso me controlar para não derrubar Cat no
chão…
— Papi! Cat não quer que você vá! Cat quer papi aqui!!!
— Filha, papai vai voltar em dez minutos, não liga pra crise da tia Laura ela é
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uma boba, Cat é princesa corajosa!!!


Ele diz e Laura se abaixa e abraça o próprio joelho parecendo desnorteada.
Cat começa a chorar dizendo que vai obedecer e não ficar brava com a
mamãe se ele decidir ficar, e meu coração ao ouvir aquilo vira cinzas.
— Você é a filha mais perfeita do mundo, papai te ama!
Tay diz a abraça apertado, me olha nos olhos, diz “me espera”, e caminha em
direção ao rapaz que vai entregar os equipamentos padronizados.
— POR FAVOR, TAY!!! POR FAVOR!!! EU IMPLORO!
Laura se desespera agarrando as pernas de Tay, e Tay olha pra frente
parecendo pouco se importar pelos sentimentos de Laura. Sigo seu olhar, vejo
toda nossa família fazendo o mesmo e vejo Julia em um canto mais afastado,
coberta de “seguranças” e toda costurada, devido à surra que levou dos dois.
— TENENTE NOGUEIRA, ME APEGUEI NO RESPEITO QUE TENHO
PELA SENHORITA, E NO FATO DE MEU AVÔ TER TIDO A HONRA
DE LUTAR AO LADO DE SUA MÃE, A MELHOR MILITAR QUE
CONHECEU. A SENHORA TEM OU NÃO, ALEGAÇÕES
CONTUNDENTES, QUE NOS FORCE A ABORTAR O VOO??? SE NÃO
AGIR DE ACORDO COM O PROTOCOLO, VOU PRENDE-LA!!!
Um oficial grita perdendo totalmente a calma e a postura e Tay se abaixa e
levanta Laura. Ela olha para os oficiais, depois olha pra Julia, e resmunga
sem voz por tanto gritar.
— Se eu levantei a suspeita, deveriam investigar…
— A revisão está feita, checamos, não há nada de errado!
O oficial diz e ela revira os olhos respirando fundo, parecia cansada.
— Por favor, não faça isso! Pensa ao menos na Cat, na Ellen, sua mãe... Não
faça isso!!!
Laura diz parecendo desanimada e Tay faz um sinal para um tenente próximo
prende-la. Assim que Tay volta seu olhar para Laura, e o rapaz chega pelas
costas dela, ela o derruba sem olhar pra ele, e depois disso, TODOS os
soldados e tenentes dali, recebem a ordem para controlá-la e Laura é atacada
por uns dez caras fardados que tentavam prendê-la sem sucesso. Todos iam
caindo um a um, a luta parecia marcial, mas eu não tinha certeza. Ela usava
os próprios caras como armas, fazendo uns bater nos outros, até que todos
estavam no chão, com machucados leves e parecendo tontos.
— Já chega, Laura! Já chega. Para.
— Nunca. Não vou ver você morrer. Me recuso. — ela olha pra ele, e
lágrimas e caem de seus olhos. — Não vou sobreviver. Éramos um trio.
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Ela fala e Tay anda até ela, nervoso. Ele se aproxima dela e eu pensei que
Laura ia bater nele até ele se afastar dela e deixar ela em paz, como ela fez
com a tropa toda. Mas não. Laura faz pior. Ela chora em silêncio de soluçar,
balança os ombros por causa dos espasmos fortes, e parecia derrotada,
destruída, e extremamente machucada. Nunca pensei que a veria daquele jeito
um dia. Nunca pensei que ia viver para vê-la perder uma ‘batalha’.
— Vai sobreviver, sim. Você é tão teatral que me irrita. Eu te amo, você é
minha amiga e irmã, quero que cuide delas, e fique bem, me prometa!
— Não.
Laura resmunga e Tay a entrega algemada para um dos oficiais que a leva
dali para longe. E agora? Sem Laura ali, o que eu ia fazer? Quem ia impedir
ele de entrar? Entrego Cat para Rafa segurar, e olho ao redor para tentar
pensar em algo que o faça ficar longe daquela nave maldita.
— Ellen, o que vai fazer?
Tia Hella se aproxima de mim, e os oficiais já me olham torto. Tay coloca os
equipamentos, sobe as escadas e entra na nave.
— Nada, agora é tarde. Tay não vai mais voltar pra nós, tia. Seja qual for os
motivos de Laura, ela falhou, Julia venceu.
Eu falo, tia Hella chora ainda mais do que já havia chorado, e eu só penso na
agonia que estava sentindo todos esses dias, na sensação ruim, mau-
presságio. Eu ia perder meu grande amor, e me perguntava o porquê de tantas
voltas para acabar daquele jeito. Por que daquele jeito? Por que diabos, Tay
ia subir naquela merda de nave?
— Vamos todos sair, todos para a sala de eventos!
Um oficial grita e não consigo retirar os pés dali. Naquele momento outro
rapaz com um rádio na mão, toca o outro e parecem discutir algo novo.
“Abortar”… eu leio os lábios de um deles, abortar? Fico me perguntando, até
que o cara chama a cabine de Tay e avisa sobre a nova ordem: “abortar”.
Trinta segundos depois, Max aparece no recinto com um batalhão de
mecânicos vestidos de verde, e sinto tia Hella apoiar em meu braço para não
cair pra trás. Ficar tanto tempo sem vê-lo deveria ser difícil. Max passou reto,
foi até os oficiais e vejo Cat se debatendo em Rafa para se soltar a força e
descer do colo dele. Quando ele deixa, Cat corre no meio dos militares e
agarra as pernas de seu avô. Max sorri pra ela, a abraça bastante e devolve a
fujona para Rafa, prometendo falar com ela depois.
Impaciente, Tay desce da cabine, e encontra com o pai, nenhum dos dois
sorri para o outro, só se abraçam por um momento.
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— Vamos dar uma olhada minuciosa! Meu filho não vai decolar sem que eu
garanta que é seguro!
Max resmunga depois de um tempo e faz os oficiais ficarem com cara de
paisagem. Tay corre pra perto de mim, me abraça, pega Cat no colo do Rafa,
e fica próximo a nós. Max entra na nave, embaixo, sobe, e fica assim por
mais de meia-hora, Jade se aproxima, resmunga algo na orelha dele, e volta a
caminhar, discretamente. Max em nenhum momento olha em minha direção,
ele fugia de Hella, fugia do contato visual, fugia da tentação de vê-la tão
debilitada, e parecia focado demais. Até na hora de chamar pelo filho não nos
olhou nos olhos, e Hella só chorava em silêncio.
Os dois conversam por um momento, ele põe Tay deitado na tábua de
rodinha, Tay entra embaixo da nave e sai branco como um papel. Um por um
dos oficiais fazem isso e aos poucos os mecânicos vão se aglomerando e
tomando o lugar dos oficiais para resolver o problema.
— O que encontraram? — eu pergunto quando ele retorna.
— Uma gambiarra que daria na certa uma pane elétrica. Mas já vamos
resolver, vai ficar tudo bem.
— Não vai mais pilotar, né!? Já foi provado que tentaram te prejudicar, farão
uma perícia, algo assim, não podem tocar na aeronave, tem que provar que
ela tentou matar vocês! A Laura foi presa… ela foi…
— Não é bem assim. Ela fez parecer um problema comum, que realmente
acontece, a desordem no sistema que acontece com naves recém
transportadas, aquilo é comum, por isso sempre tem a revisão, e a
documentação por escrito com as anotações. O que ela fez foi depois da
revisão, então quem fez a documentação será punido, não ela.
De qualquer forma “não parece” pra eles, uma sabotagem! Vão consertar e
vou pilotar! — Tay diz e já começo a chorar. — Talvez depois investiguem
mais minuciosamente, mas com o problema resolvido, vou pilotar. — ele
toca minha face com carinho. — Olha só, é meu pai quem está cuidando de
tudo! Ficarei bem! Prometo!!! Julia vai pagar por isso!
Ele diz, Max faz de longe um ‘ok’ com a mão, Tay se afasta, e novamente
entra na nave. Tivemos todos que sair dali, ir pro espaço aberto e seguro do
hangar, e como perdemos todos os falatórios e apresentação do evento dentro
da sala, corremos para ver a próxima nave decolar, que seria do Tay.

— Max, ele está bem? A nave…


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Chego perto dele e ele não me olha nos olhos pra responder.
— Está tudo nos conformes, Ellen!
Ele diz verificando os rádios na bancada.
— Volta pra casa, Max! Cat não para de perguntar de você, ela sofre. Tia
Hella não come, não dorme, não vive, não faz nada… e Tay não dorme mais
e em consequência disso também não durmo. Precisamos de você! Nina,
dona Jô, Lulu! Precisamos de você!
Eu tento, tocando em seu braço e ele coloca os fones de ouvido.
— Preciso trabalhar, Ellen, você está me atrapalhando, e não quero
conversar. Meu casamento acabou! — ele diz e eu me afasto. Seu jeito de
falar foi muito grosseiro.

O céu estava nublado, o dia parecia feio demais, assim como estava o interior
e o psicológico de toda a família, era como se o tempo soubesse que aquele
não era um bom dia, era como se a natureza pudesse sentir tamanha tristeza.
Rafa, Nina, e dona Jô estavam cabisbaixos e assustados, tia Hella não parecia
estar ali, Lulu só chorava e não parava mais, Jade continuava parecendo em
transe como desde que chegou ali, e eu só orava para que meu bebê lindo
voltasse pra mim.
— E agora a aeronave que vocês verão, é o MGL— 25 Taiken*, o caça
coreano mais potente, rápido e ainda mais moderno que a nossa ave de
rapina, o Carcará, da Amazônia! Ele sairá daqui direto pra Manaus para
deixar nosso sistema de busca e reconhecimento de área ainda mais
moderno…
O militar tagarela no microfone e ouvimos o barulho imenso do caça.
— Papai vai voltar, não é?
Cat pula no meu colo e eu confirmo dizendo que “É claro que sim, meu
amor”. Ele tinha voltar, não podia deixar a gente ali. Eu não via mais Yan em
lugar nenhum, provavelmente tinha ido atrás da Laura. Permaneço seguindo
as manobras que o caça dá, e aqueles dez minutos pareciam dez horas, nunca
passavam. De repente o maldito caça começa soltar aquela fumaça preta, que
pelo o que Max já havia dito daquela outra vez que viemos aqui, que era
fumaça tóxica, fumaça de pane elétrica! Me aproximo e escuto ele chamar
inúmeras vezes pelo filho, mas Tay não responde, a pane dessa vez foi
‘literalmente’, Tay não estava pousando, o rádio da cabine foi desligado,
nada funcionava e de fumaça preta, algumas faíscas avermelhadas
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começaram a aparecer e iluminar o céu nublado. Rafa tirou Cat do meu colo e
saiu dali com as crianças, e Max começou a mexer em todos os rádios, e
apertar diversos botões ao mesmo em uma tentativa fracassada de manter
contato com o filho.
— Max… trás ele de volta! Trás ele de volta!!!
Comecei a chacoalhar meu sogro segurando pelo seu macacão, mas ele não
me notava ali. De repente a chama cresceu, ergui meus olhos ao céu, e um
estrondo como de um trovão encheu os nossos ouvidos. Toda a pequena
arquibancada se levantou, uns com a mão na cabeça, outros já chorando de
desespero, outros fechando os olhos e se lamentando, e uns que era meu caso,
em choque, apenas olhando toda aquela tragédia acontecer. O caça explodiu
no ar, criando um bola de fogo no céu e de tão cruel e horrível, brilhava e
lançava pequenos feixes de luz como se fossem estrelas cadentes direto ao
chão, ainda em área militar.
Max larga os rádios em sua bancada e pula o alambrado que nos separava da
pista, correndo em direção aos destroços do caça que já estavam no solo
como se pudesse fazer algo pelo próprio filho.
Me sentei no banco perto dali e olhei para as próprias mãos, ali tinha minha
aliança de formatura, e o anel de compromisso que só vinha até o início do
dedo indicador. Nossas lembranças, tudo o que havia restado de nós dois,
pequenos objetos que perduraram por um longo tempo. Laura falhou, e eu e
Max também, agora Tay estava morto e eu estava ali, vendo aquilo, sem
poder fazer nada. E não me desliguei do mundo, Deus havia sido cruel
demais comigo. Eu ouvia os murmúrios, os lamentos, o choro doído de tia
Hella, Lulu agarrada em Nina, e dona Jô gemendo de dor, eu podia ouvir
tudo, tudo, e o som dos destroços caindo no solo não era muito distante, eu
estava viva, sentindo cada desgraça daquele momento horripilante. Meu
namorado, futuro noivo, marido, amante, meu grande amor, o pai da minha
única filha… me prometeu voltar mas não cumpriu.

Tay se foi.

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40
EM PÂNICO

O botão do pânico pisca desesperadamente, ouço o som das turbinas


diminuírem e falharem por um instante, e a voz de meu pai desaparece
deixando no lugar um chiado horrível. Foi o que eu pensava, os fios em
desordem técnica era só uma distração. Bendita seja Jade!
Nesse momento penso em minha bebê linda! Será que eu veria o rostinho da
minha filha de novo?
— Minha princesa… eu te amo tanto, tanto! Papai ama você!
Eu resmungo e era a vez da mãe dela se materializar em minha frente. —
Você prometeu!!! — Ela diz toda chorosa e dengosa, me forçando a não
desistir. Quis pilotar para provar que sabotaram a nave, precisava voltar com
vida para tirar minha parceira do cárcere e juntos, acabar com ela e aquele
miserável do “primo” dela. E ia ser assim. Eu não podia deixar os meus
amores, a minha família… Catarina precisava do pai, Ellen precisava de mim,
e eu tinha que dar um jeito!
Fui casado com aquela maldita por anos, como não consigo escapar se o
único assunto que a vadia falava era sobre como escapar de naves que
despencavam em direção ao solo, de encontro com a morte? Eu era um
imbecil que não conseguiu tirar nada de proveito daquela relação medíocre e
sem amor? Só por sexo??? Não.
Paro pra pensar e sinto quando perco uma turbina, o céu ao meu redor fica
amarelo borrado de vermelho fogo e pelo que me lembro de suas aulas
incrivelmente chatas e cansativas, — e que me salvarão, eu esperava. — é de
que eu tinha vinte segundos para perder a outra. Subo a aeronave até o
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máximo que posso para meu paraquedas abrir com segurança caso consiga
ejetar, e quando alcanço, o sinal de falha na mangueira do combustível grita
para eu parar de ser uma lesma. Bingo! Eu tinha menos de dez segundos.
Tento o código do Carcará, de um monomotor, ST, e quando paro para me
lembrar de uma das aulas da maldita sobre caças e linguagens orientais no
painel, me ejeto, e vejo o pobre Taiken explodir embaixo de mim. A força de
ejeção é incrivelmente forte, abro meu paraquedas e graças a força do vento
daquele tempo feio, consigo ir para longe das chamas da nave. Era um
milagre. Eu estava vivo.
— Ei! Pai!!!
Digo sem fôlego por correr ao encontro do meu pai que ignorava os técnicos
que procuravam pelo meu corpo “carbonizado”, ele corria para além dela e ao
me ver ele para, se apoiando nos joelhos e chorando igual um marica.
— Fala sério, velho! Com essa idade!?
Eu zombo e ele me ignora completamente. Apenas me abraça e chora.
— Eu te amo tanto, mas tanto!!! Não sei o que seria de mim se algo tivesse te
acontecido! Você conseguiu! Eu sabia!!! Mas não vai fugir, eu proíbo você
de pilotar qualquer coisas que se mova, pelo resto da sua vida! Vai fazer uma
administração, um curso de culinária, e está de castigo! Pra sempre!!!
— Tudo bem, seu Luis, tudo bem! — ironizo. — Sou homem feito, não
esqueça. Eu tô bem, pai! Eu te amo!
Eu digo e fico ali com ele, até o velho acalmar o coração.
— O que ela fez??? — ele questiona quando me solta.
— Nó falso na mangueira… truque tão antigo… — digo e ele pragueja.
— O que vai fazer? Vai esperar ela ser presa?
— De jeito nenhum! Depois de manchar toda sua reputação de piloto
maravilhosa, vou autorizar que Laura faça o serviço, com ela não sujarei
minhas mãos, só quero saber de minha família, e minhas férias! Quase morri
queimado… aliás, tire Laura de lá pra mim, pode fazer isso?
Questiono, ele confirma, e depois caminho com ele até o hangar. Os
paramédicos tentam me parar para me examinar, mas não deixo, eu estava de
paraquedas, não tinha um arranhão, só queria ver minha mulher e minha
filha. Entro na área aberta e vejo que poucas pessoas sobraram ali. Ao verem
a tragédia foram todos saindo aos poucos e era o esperado. Só encontrei
alguns gatos pingados, e Ellen sentada sozinha, fitando as próprias mãos, e
parecendo destruída.
— Oi, meu denguinho!
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Eu digo sorrindo e me ajoelhando na frente dela, mas ela apenas olha nos
meus olhos profundamente arrasada, parece não acreditar que eu realmente
estava ali.
— Você prometeu, não cumpriu. — ela sussurra.
— Cumpri sim! Sou eu, amor, tô aqui, voltei pra você! Voltei porque te amo,
minha vida, tô aqui amor!
Eu digo, ela hesita, mas toca meu rosto com medo. Ao notar que eu era real e
não um fantasma dizendo que ficara maluca, ela enfim chora, e me agarra.
Levanto-a do banco com carinho e a abraço forte.
— Você voltou… voltou pra mim! Eu não acredito, Tay! Por que fez isso
comigo? Por que entrou naquela aeronave maldita?
— Eu precisava, amor! Eu precisava. Mas agora acabou. Você disse que
confiava em mim, não foi!? Então… fez bem em confiar. Agora está tudo
bem, eu disse que nunca te deixaria, nunca deixarei você de jeito nenhum!
Você é a minha vida! Você e Catarina são a minha vida!
Eu falo baixinho e a beijo com vontade, sem me importar com os olhares, os
aplausos, ou a gritaria. Eu precisava de um pouco dela, cada vez mais, e
aquele beijo foi libertador. Ellen era minha, e eu pertencia a ela. Aquele beijo
violento tinha gosto de batom de morango e lágrimas, e ao pensar nisso —
lágrimas. —, Cat e Laura me vieram a mente.
— Me prometa que nunca mais vai me deixar, me prometa que nunca mais
fará algo desse tipo! Sei que nunca mais vou conseguir dormir!!! Prometa
que não vai mais me assustar assim!
— Eu prometo, amor! Prometo! Nunca mais isso vai acontecer! Nunca mais
vou assustar você. Mas discordo, realmente você não vai voltar a dormir tão
cedo porque não vou deixar!
Eu digo sorrindo e ela me beija. Minha linda.
— Vou sempre cumprir minhas promessas! Eu escolhi você! Escolhi viver
por você e pra você! Você é meu tudo! Não sou nada sem você! Nada.
— Eu te amo!
Ela diz me dando selinhos no rosto todo.
— Também amo você. Cadê nossa filha? Cadê Catarina??? Preciso vê-la.
— Rafa tirou ela e as crianças daqui quando viram a fumaça… foi melhor
assim, ela estava tão assustada!!! Tão assustada…
Ellen choraminga e demonstra não querer me soltar nunca mais.
— Vamos atrás deles, preciso vê-la.
Eu falo e saio dali com Ellen empoleirada em mim. Encontro minha família
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no pátio da escola e Cat corre quando Rafa coloca ela no chão e aponta pra
mim.
— PAPAI!!!
Ela corre e pula no meu colo. Parece a mãe, chora e sorri ao mesmo tempo.
— Por que o chororô???
— Eu pensei que você não voltaria. Cat estava triste.
— Mas eu não disse que em dez minutos voltaria, sua boba!? Não confia em
mim?
Ela me olha triste e eu enxugo suas lágrimas.
— Confio, mas eu vi seu avião sair fumaça. Fiquei assustada!!!
— Aquilo às vezes acontece mesmo, é normal! Mas dá próxima vez confie
no seu pai! Se eu disse que voltaria em dez minutos é porque é a verdade!
Entendeu? Papai nunca vai deixar a minha princesa, sempre vou voltar pra
você, e sempre cumpro o que prometo! Nunca mais fique assustada por
bobagem, está bem? Nunca mais! E pare de chorar…
Digo e aperto ela todinha. Minha princesinha linda. Eu estava no céu, não
literalmente, graças a Deus, e a Jade!
Recebi abraços de todos, e segui caminho onde eu sabia que encontraria meu
pai.
— Tenente, como se sente? Você está bem?
Meu major questiona no meio do caminho e apenas confirmo.
— Fico muito feliz e orgulhoso de você. Seu nome entra para a história
novamente. Garanto-lhe que providências serão tomadas e novos protocolos
serão revisados em teu nome, para a melhoria da segurança na revisão,
documentação, e a inspeção das aeronaves. Gostaria de dizer a família — ele
dirige seu olhar a Ellen. — que sentimos muito pelo susto, e que a senhorita
Laura terá suas honrarias apesar de todo o desacato que agora sabemos, teve
seu motivo. Ela é mais do que uma co-piloto, é uma grande amiga, o senhor é
um homem de sorte. Mais uma vez peço perdão pelo dia de hoje, em nome da
FAB de Pirassununga! É claro que sabemos que esse tipo de acidente pode
acontecer com qualquer piloto, mas me responsabilizo pela negligência!
— Obrigado, senhor! Esse tipo de coisa acontece, não tem como prever!
— Bom, agora terás as férias de que tanto precisa, ainda mais depois de hoje,
e que não tira há anos. Descanse, tenente! Parabéns pela rapidez, perspicácia,
e sabedoria em um momento crítico como aquele, apesar de tudo!!!
Ele diz, presta continência pra mim, — o major, pro tenente. — e se retira.
— OH! MEU DEUS!!! SEU DESGRAÇADO, INFELIZ! SEU RIDÍCULO!
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BABACÃO! VOCÊ ESTÁ VIVO!!!


Laura levanta se afastando de Yan, onde sentava ao seu lado no banco frio de
madeira, e me abraça assim que coloco Cat no chão.
— Você é um babaca!!! Ridículo…
Ela repete as ofensas, mas me beija e me aperta.
— Pensei que se ofereceria para pilotar em meu lugar, sua desnaturada,
medrosa!!! — eu dou risada.
— Morrer por você, Coverick, seu imbecil? Mas nunca!!! — ela mente. Só
não subiu porque sabia que nunca conseguiria planar, não tem autorização. —
Achei que nunca mais ia te ver. Fiquei tão desesperada. E você me prendeu,
filho da puta, a próxima vez que fazer isso, quebro seu nariz! Eu odeio você!
— Mas eu te amo! Obrigado por se arriscar por mim, por tentar salvar minha
vida! — eu digo e ela sorri chorando.
— E a minha, e a de Cat… a da família! — Ellen começa e faz Laura
arregalar os olhos. — Mas ainda não seremos amigas, não me venha com
esse sorrisinho! — Ellen ri. — Ainda não gosto de você!
— Cat, gosta, logo você vai gostar também! — Laura resmunga e me sinto
feliz.
— É mami, tia Laura não é bruxa! Tem que gostar dela!
Cat resmunga e Ellen revira os olhos. Cat ganha um abraço de Laura, depois
sai correndo em direção aos primos favoritos, e Ellen nos deixa a sós para
“chamar a atenção da pequena por correr daquele jeito”.
— E então!?
Laura pergunta baixo e vejo meu pai passar por nós.
— Vou viajar, comprei as passagens ainda em Barbacena e preciso de umas
férias! Já que suspeito que Ellen e Catarina não me deixarão sair de perto
delas nem tão cedo, quando eu voltar quero ir até a lápide daquela doente!
Eu digo praticamente em seu ouvido e os olhos dela brilham.
— Posso? Mesmo???
— Ela não ameaçou os meus, apenas me ameaçou, te ameaçou! Então ela é
tua, um presente que eu te devia há tempos! Acabe com ela por ter tentado
nos matar, e que seja lento, dolorido, como você gosta e como ela merece!
Não quero essa mulher nunca mais nas nossas vidas, nunca mais, e não quero
falhas, nem rastros. Que seja como sempre fizemos, bem feito e sem erros.
Eu digo e vou buscar minha mulher e minha filha, estava morrendo de
saudade das duas, como se eu não as vissem por anos.

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— Não vamos fazer check-in? Para onde está nos levando???


Ellen questiona ansiosa assim que chegamos ao aeroporto internacional. Ela
estranhou quando não entramos pela passagem normal.
— Relaxa, vida! Faz parte da surpresa! Como vou fazer check-in sem você
ouvir a mulher falando para onde nós vamos?
Eu pergunto e ela sorri. Faço o caminho até o escritório da companhia, entro
na sala de espera com ela e com Cat, entrego os documentos para a
recepcionista e logo somos autorizados a ir até o hangar particular.
— Vamos de jatinho, seu metido!?
Eu não sabia se ela perguntava ou afirmava, mas Ellen parecia estar nas
nuvens.
— Este é um Jato executivo, Boeing BBJ! Se gostou dele por fora é porque
não viu por dentro!!!
Eu digo e ela abre seu sorriso enorme pra mim.
— Senhor.
O piloto presta continência formal para mim, e eu só sorrio. Entro com as
duas no jato, e ambas se seguram para não gritar, mas Catarina, claro, corre
pelo seu novo pequeno palácio temporário, que realmente parecia um. O jato
era imenso, tinha uma sala com um espaço colossal, mesas, poltronas
enormes nas janelas, sala de TV, uma pequena biblioteca com sofás enormes,
uma cozinha, e por último os quartos, era nessa ordem, e eu sabia porque já
havia entrado em um!
— Meu Deus! Como é lindo. Tudo isso só pra eu não saber para onde
vamos?
Ellen me abraça e eu tiro os olhos de Catarina que estava espevitada com o
mundo de bonecas Barbie’s que mandei colocar na sala de TV.
— Não, aluguei esse pequeno mimo para as mulheres da minha vida, por dois
motivos. Um: não queria perder tempo esperando um luxo resolver fazer a
rota que preciso. É burocrático, seria no tempo deles, na data deles, e alugar é
mais prático, eu decido! Dois: Aqui teremos privacidade, paz, e lazer pra
você e para nossa pequena, não vão ficar cansadas e estressadas por causa das
horas aqui dentro, com dores no corpo por causa das poltronas que só
reclinam e falta de espaço, não, vocês merecem o que tem de melhor no
mundo e aqui, tem uma cama sensacional!!! — eu sorrio, agarro sua cintura,
e falo em seu ouvido. — Já teve um orgasmo á uma altura de mais de dez mil
metros do solo, denguinho? — vejo ela morder o lábio e meu músculo lateja.
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— É meu fetiche, um sonho antigo que eu queria realizar, amar você no meu
lugar favorito do mundo todo, no céu!
— Tay…
Ela resmunga implorando por mim naquele momento, me abraça forte, e
morde de leve meu pescoço.
— Mais tarde, amor. Quando nossa pequena dormir, vou fazer você gemer
alto e cavalgar tanto… vou te amar com tanta força, que eu espero que esse
jato aguente nós dois. Espero que ele suporte a vontade que estou de você, a
saudade que eu estou de te preencher, e espero que você chegue inteira
naquele país maravilhoso, pois vai precisar andar direito para conhecer os
lugares incríveis… talvez eu pegue leve, mas talvez não.
Falo em seu ouvido e seu corpo responde com sua mão apertando forte minha
cintura.
— Papi, eu amei esse jato de princesa! Como eles sabiam que eu gosto tanto
da Barbie???
Cat grita, pula, e eu olho uma última vez para sua mãe, toda tímida e
vermelha.
— Como assim, “como eles sabiam”!? Foi seu ‘pai maravilhoso’ que mandou
trazerem tudo isso aqui pra você!!! Tá pensando o quê?
Eu falo e ergo minha princesa no ar. Cat me faz brincar de Barbie até a hora
da decolagem, e dali em diante eram só sorrisos, e só felicidade, eu e minha
pequena família linda… mas assim que Cat dormiu no sofá da sala, a
coloquei em sua cama, peguei sua mãe no colo, e os sorrisos e felicidades
acabaram para dar lugar á gemidos altos, gritos, e palavras “sujas” na suíte do
Boeing. Mais detalhes, contarei assim que eu conseguir acalmar meu coração
e a minha vontade dela.

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41
ELE ME DEU O MUNDO DE PRESENTE

— Vem… ela dormiu!


Eu lia uma revista no sofá. Estava tranquila e despreocupada, o que era raro.
Tay me estende sua mão, e depois de anos, ainda fico com borboletas no
estômago com sua atitude.
— Acho que… acho que, preciso de um banho.
Eu gaguejo enquanto ele entra comigo na suíte, e me rodeia como se tivesse
admirando sua presa antes de comê-la.
— Tá nervosa?
Ele questiona levantando uma sobrancelha, e para na minha frente me
sondando.
— Não. Só ansiosa.
— Não precisa! Deixa eu me livrar disso aqui.
Ele retira meu casaco lentamente.
— Os comissários… não entrarão aqui!?

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— Claro que não! Relaxa…


Ele fala e eu respiro fundo. Eu estava a ponto de ebulição. Eu ia viajar com
meu amor, estávamos longe de Julia e suas loucuras, longe de todo o caos
que era nossa vida, e eu estava em um quarto de um jatinho — jato enorme,
na verdade. — luxuoso, com um Tay em transe por estar realizando “o sonho
de um fetiche antigo”. — sorrio. — Como podia em poucas horas quase tê-lo
perdido, e no outro eu tê-lo por completo, só para mim e mais ninguém?
Inteiro meu, de corpo e alma!? Era uma benção.
Ao me deixar somente de calcinha e sutiã, ele me olha mais um pouco, como
se quisesse ter certeza de que eu realmente estava ali, vivendo tudo aquilo,
solta meu rabo de cavalo alto, deixa minhas ondas caírem nos meus ombros
tampando uma pequena parte de minha lingerie nova, e se livra do pompom
logo em seguida.
— Você não tem ideia do quanto queria que esse momento chegasse. Um
pouco de paz, só com você e nossa filha. Te amar sem pressa, sem me
preocupar com nada… agora o caos está lá em baixo, estamos indo embora, e
nem sei se quero voltar, me sinto como se tivesse indo direto pro paraíso,
com as duas pessoas que mais amo no mundo, e mais nada, mais ninguém. E
nesse momento, tudo o que quero, é estar dentro de você, o lugar que mais
amo estar no mundo! — ele sussurra. — Dentro de você.
Ele fala, fico sem resposta, ele abaixa lentamente uma alça do meu sutiã,
caminha até ficar atrás de mim, coloca meu cabelo para um lado só, e beija de
leve meu pescoço e meu ombro, sem pressa nenhuma e isso me mata. Seus
beijos são molhados, suas mãos tocam de leve meus seios cobertos pelo sutiã
enquanto tua boca trabalhava com maestria. Tay era alto, um pouco mais do
que eu e seu tamanho era ideal, me puxa de leve para minhas costas tocar seu
peito, beija meu pescoço e minha nuca ao mesmo tempo, e quando se
empolga um pouco, invade o interior do meu sutiã com as duas mãos e me
faz beijar sua boca do mesmo jeito que eu estava, de costas.
— Eu nunca quis tanto alguém, como quero você!
Ele diz no pé do meu ouvido bem baixinho, toca minha intimidade ainda por
cima do tecido de renda, e me deixa ainda mais molhada do que já estava.
— Vem aqui!
Ele me pega no colo, me põe deitada de lado na cama, entra embaixo das
cobertas da enorme cama da suíte, e me abraça apertado. Meu bumbum sente
seu músculo se remexer tão duro quanto deveria, e eu mordo o lábio inferior.
Tay não deixou uma única fresta em nossos corpos. Passa sua mãos
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lentamente pela minha barriga, chega à virilha e eu inconscientemente aperto


ainda mais o meu bumbum contra seu corpo. Seus dedos brincam procurando
alguma coisa e quando encontra, gememos juntos. Sinto retirar a própria
calça e continua sua brincadeira sacana de beijar e lamber minha nuca e meu
pescoço e me tocar insanamente.
— Gosta disso?
— Muito… Mas quero mais!
Digo tateando sua cueca a procura de meu consolo, e ele me aperta e se mexe
de um jeito gostoso, ainda vestido. Aquilo que ele fazia se chamava tortura.
De repente ele me preenche com um dedo, examinando toda a extensão; dois
dedos colocando fundo fazendo um entre e sai barulhento e gostoso; três,
atingindo o ponto que me faz ver estrelas, e depois de implorar por mais, ele
usa quatros dedos para ouvir meus gemidos altos, e eu estava literalmente no
céu. Eu queria mais.
— Por favor…
— Calma. Sem pressa.
Ele resmunga e volta a me encochar e apertar com violência meus seios já
doloridos por estarem tão duros.
— Quero logo…
— No meu tempo. Eu mando aqui hoje! Eu quase morri, quero ficar nessa
lentidão e te foder aos poucos porque agora sei que tenho todo tempo do
mundo para amar você! — ele fala e volta brincar com os dedos.
— O que está fazendo?
— Tô te deixando molhada o suficiente, quero matar minha sede, e é muita
sede, viu!!!
Tay resmunga, volta a mordiscar meu pescoço, e quando se dá por satisfeito,
entra embaixo das cobertas, e começa a me chupar deliciosamente, com
força, com vontade, mas ainda sim, sem pressa.
— Oh! Tay…
Resmungo alto, e ele enfia o máximo que podia de sua língua em mim. Sua
língua parece um vibrador, seus dedos continuam entrando e saindo nas
pausas. Me estocava com os dedos, chupava os dedos, sugava tudo o que
saía, me deixava limpa, e repetia. Ficamos assim até eu gozar em sua boca.
Quanto mais eu gemia, mais ele arreganhava minhas pernas e quando mais eu
ficava aberta e entregue eu ficava, mais ele rosnava como um homem das
cavernas. O que aconteceu foi um poço de luxúria e muita safadeza, por isso
ele ascendeu todas as luzes e me deixou exposta. Deitou-se ao meu lado
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como estava antes, colocou minha calcinha de lado só pra me sacanear, e


ficou esfregando a cabeça de seu músculo delicioso na minha entrada, só pra
me matar, e muita coisa acontecia com meu corpo naquele momento, mas eu
sabia que meu coração parar era a última coisa que poderia acontecer.
— Você pode se aproximar mais de mim, se quiser, denguinho…
Ele diz — minutos depois. — rindo de um jeito filho da puta e eu aceito o
conselho. Quando me aproximo, sua enorme vara me pega de surpresa e entra
um pouco dentro de mim me fazendo arfar. Suspiro com a sua novidade e
gemo alto.
— Tay…
Eu digo e ele ri baixo no meu ouvido, muito baixo, uma gargalhada gostosa e
sexy demais. Safado.
— Vem mais, amor… vem!
Ele provoca, viro a cabeça para olhar em seus olhos, e quando empurro o
bumbum dessa vez com mais “vontade”, vejo seu sorriso safado sumir, e dar
lugar a um semblante sério, surpreso, e perigoso.
— Oh! Minha nossa, o que você fez, não sabe brincar, mulher?
Ele fala e puxa com tudo minha cintura contra a sua. Seu músculo entra com
tudo dentro de mim, e nosso bom humor desaparece. Inclino meu corpo pra
frente, empino ainda mais, e ele estoca uma, duas, três vezes e parece que
quanto mais me fode por trás, com mais “raiva” ele fica.
— Chega de brincadeira!
Ele fala e sobe em cima de mim sem avisar, abre minhas pernas e me come
como se fosse a primeira vez depois de anos sem comer mulher nenhuma.
— Não sabe pegar leve!? Não vamos pegar leve!!!
Ele põe ainda mais força nas investidas e não ouço a linda cama box se
mexer. Putz.
— Não para!!!
Eu imploro e ao abrir os olhos, o vejo me olhar com raiva e o sinto ir mais
fundo dentro de mim, sem dó, sem medo de me machucar; esse era o
momento que ele tinha pressa. Me fodia olhando fundo nos meus olhos,
como eu amava.
— Diz pra mim a verdade, alguém já conseguiu fazer você sentir o que sente
quando está assim, comigo?
Ele rosna e eu respondo sem demora.
— Claro que não, nunca!
— Como conseguiu ficar tanto tempo sem mim? Como você conseguiu,
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Ellen?
— Não sei como… Não sei! Não sei como aguentei! Acho que por isso só
fazia por fazer. Sempre foi apenas fisiológico.
Eu respondo chorando e gemendo e ele continua pegando pesado — puxando
meu cabelo, e batendo de leve em minha face, e com mais força em minha
bunda —, me estocando descontroladamente e eu sabia que só ia parar
quando gozasse.
— Nunca fui completo. Nunca fui eu mesmo! Só me sinto feliz quando você
está por perto! Foi embora e levou tudo de mim, me deixou infeliz, levou
meu coração e só o tive de volta quando você voltou! Todas as vezes que me
lembro dos anos que me obrigou a ficar sem amar você, me sinto um nada
porque eu era um nada. Naquela maldita nave, enquanto estava prestes a
morrer, me perguntava se eu ainda ia ter você em meus braços, e se por Deus,
eu morresse naquela maldita nave você ia ter que se contentar em transar com
um fantasma maluco pra sempre, porque eu ia perseguir você enquanto você
vivesse!!!
Ele diz e não aguento, dou risada e ele me acompanha. Tinha que ser sem
noção até na hora que me comia? Esse era aquele menino que eu amava
quando criança, que me fazia sorrir até nos momentos impróprios. Um brinde
à chegada de minha filha, Catarina, que o trouxe de volta pra mim.
— Para de rir, maluca!
Ele fala, beslica meu ponto mágico com maldade e quase choro.
Ficamos ali por horas, na verdade muitas horas, e Tay me fez ver estrelas
estando no céu, o que era engraçado. Ele me senta e me faz cavalgar forçando
minha cintura pra baixo com brutalidade. Me faz ficar de quatro e quase “erra
sem querer, a entrada”, me arranha as costas, morde de leve meus ombros,
chupa minha língua enquanto me faz pular, me estoca com força deitada de
costas, me bate, me xinga, me beija, me aperta, e me leva ao paraíso até
amanhecer. Sem pausa, sem parar pra respirar, sem piedade. Como ele
mesmo disse, talvez pegaria leve, mas não pegou!
— Descansa, meu neném! Você tem umas três horas para tentar descansar!!!
Vou ver como nossa filha está, e falar com o piloto!
Tay diz em algum momento com a voz mais longe do que deveria, e não me
importo com nada, estava exausta. Mas parece que mudou de ideia, pois,
depois de dez segundos ele volta.
— Ei, dorminhoca, levanta, vamos pousar!
— Pensei que tínhamos três horas!
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— Mas eu disse isso vai fazer três horas, minha gostosa! Vem…
Ele resmunga no meu cangote e eu abro os olhos com dificuldade. A luz do
sol entrava na suíte de um jeito mágico, parecia conto de fadas, era incrível,
diferente de tudo o que já vi. Beijo meu amor, me levanto de vagar e vou até
a janela. Só o que vejo são nuvens branquinhas, e um sol maravilhoso lá
longe…
— Que lindo!!!
— Você é linda!!!
Ele diz. Estava sentado na cama, me olhando feito bobo.
Subo na cama ao seu lado, sento em seu colo, e ele suspira ficando duro.
— Não posso apagar seu fogo matinal, nossa filha está na sala brincando de
Barbie sozinha e nos espera pra tomar café!
— Eu te amo, Tay! Te amo muito!
Eu digo, ele seca uma lágrima boba minha, e sorri.
— Te amo também. Mais do que qualquer um no mundo. Mais do que
qualquer outra coisa. — ele sorri me tocando, por que ele sempre faz isso? É
pra me matar??? — Agora vai tomar um banho, estou faminto e já vamos
pousar.

— Papi, fala logo aonde vamos! Eu quero saber!


Cat resmunga na mesa do café.
— Já vamos pousar e você vai ver, menina ansiosa, parece sua mãe!
Tay responde, bagunça suas mechas loiras, e aperta minha coxa por baixo da
mesa.
— Tão chato… — eu resmungo zombando.
— Tão deliciosa… — ele sussurra em meu ouvido. — Vai amar essas férias,
vai curtir, te prometo isso! Será nossas férias dos sonhos! De dia e de noite!
Ele fala baixo, sorri pra Cat, me olha faminto, e fita minha boca enquanto
tento me controlar. Eu já estava vivendo um sonho ainda sem descer daquele
avião.
Arrumamos as coisas, organizo minha bolsa pessoal com os documentos, e a
bolsa de mão da Cat, cumprimentamos todos os comissários que foram super
simpáticos e discretos, aliás quase não os notava por ali, Cat fez questão de
levar o quanto de Barbies ela podia e obviamente quase surtei com aquilo
mas seu pai autorizou, e logo desembarcamos em algum lugar do mundo.
— Seja bem vinda a Orlando Internacional Airport.
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Tay sussurra ao meu ouvido enquanto aperta minha cintura e eu olhava ao


redor.
— Flórida!!!
Digo espantada e ele sorri.
— Pra começar… o jatinho é nosso, depois que Catarina se cansar da Disney,
nossa próxima rota pode ser Paris, Suíça, Alemanha, Caribe… qualquer lugar
do mundo! Você escolhe, e assim que voltarmos a terras brasileiras,
poderemos dar uma longa parada naquela praia da Pipa, o nosso lugar!
Relembrar o dia mais feliz da minha vida, onde amei você pela primeira vez.
Ele diz e vejo Cat surtar ao ver “o Michey” entregando chapéus com grandes
orelhas de ratos para todos que passavam por ali — assim como acontecia a
entrega de colares no Havaí, uma recepção linda em um país lindo. — Isso
porque ainda não tinha visto nenhuma princesa. Catarina teria primeiro as
férias dela, depois eu ia amar meu homem em algum país qualquer que eu
escolhesse e alí, no meio daquele aeroporto movimentado, eu era a roceira
selvagem mais feliz e domada do mundo.

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42
A BAILARINA
Alguns anos atrás. Praia da Pipa. Rio Grande do Norte.

“Eu digo e ele volta á me beijar estendendo os beijos para além de nossas
bocas.
— Eu gosto de você! Vamos ficar juntos pra sempre.
Ele diz e eu sinto vontade de chorar.
— Você promete?
— Prometo! Vamos namorar até ficar adultos, e vou te pedir em casamento
lá na chácara para todo mundo ver. Vamos ficar juntos até ficar velhinhos.
Ele diz, eu dou risada da ‘parte de ficar velhos’ e ficamos juntos por mais um
tempo...”

Dias atuais.

Laura e Yan aparecem em casa assim que a gente chega de viagem. Ficamos
quase um mês e meio fora, foi a lua de mel/férias mais maravilhosa do
mundo, mesmo sendo minha primeira viagem pra fora com Ellen, mesmo

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sendo a primeira viagem em família. Eu sabia que seria inesquecível e foi!


Cuidei e mimei minha pequena princesa, a enchi de presentes, tiramos fotos,
passeamos só a “papai e filha” enquanto sua mãe se esbaldava em compras, e
curtimos muito. Já minha rainha linda conheceu países pra caramba, foi
amada demais, presenteada, e também muito mimada, como merecia. A parte
triste foi ter que voltar.
— O que foi aquilo de mãos dadas???
Questiono Laura que tomava um drink comigo na cozinha enquanto Ellen
cozinhava alguma coisa. Yan estava “matando a saudade” de Cat na sala, e
nós três conversando na cozinha.
— Ora essa… estamos juntos!
Ela diz sorrindo e vejo Ellen olhar pra minha cara só para saber como eu me
sentia.
— Ele é um palerma. O que viu nele?
— Simples. Ele é uma palerma! — Laura repete minha afirmação e rimos
muito disso. — Yan me conquistou, ele é adorável, fiel, carinhoso, eu não
sei… tanto insistiu que não consegui dizer não, e não consigo mais ficar
longe e a parte mais engraçada de tudo isso é que apesar de não ter sentido
nenhum, ele faz com que eu me sinta protegida…
Laura desabafa e não parece a mesma pessoa pra mim.
— Que foi? — ela ri. — Tá me tirando, né!?
— Fala sério!
Eu nego com a cabeça e mudo de assunto. Laura e Yan em um
relacionamento sério. Tsc, tsc…
— E nosso problema…!?
— Resolvido. Sem estresse. — ela me garante com o olhar e fico aliviado.
Laura já tinha me mandado uma mensagem dizendo que tinha feito, mas quis
ouvir de sua boca só para garantir. — Deixa eu morder minha Branquela, tô
morta de saudade dela!
Ela fala de Catarina e sai em direção à sala. Me levanto da bancada e me
enrosco no corpo de minha morena linda enquanto ela lavava alguns
vasilhames completamente despreocupada.
— O cheiro está bom, será que ficará comestível?
Zombo e ela joga espuma de detergente bem na minha cara.
— Se continuar zombando, vai passar fome!
— Nunca. — aperto meu músculo em seu bumbum e já desejo arrancar sua
roupa. — Você não seria capaz…
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Ela me olha sorrindo e muda de assunto.


— O que é “nosso problema”?.
— Não quero que fique se preocupando com os assuntos que tenho com ela.
Sabe que não são nada bons, nunca! Não quero te ver triste, não quero que
ouça ou fique por dentro de assuntos que te farão mal. Não te quero
preocupada.
Eu falo e ela se vira pra mim agarrando o meu pescoço e mantendo sua mão
toda branca de sabão bem longe de minha roupa.
— Laura a matou, Tay?
Ela me olha triste e eu fico com o coração apertado. Decido por falar a
verdade e oro pra que ela não surte.
— Sim.
— Entendi. — ela sussurra.
— Tudo bem!?
— Tudo ótimo. Eu te amo, tô do teu lado, agora teremos a paz que sempre
merecemos!!!
Ellen mordisca minha boca sensualmente e eu beijo sua boca com vontade.
— Eii…
Ela ri e resmunga durante o beijo quente e não entendo, por isso paro. Olho
para ela, ela olha para baixo, e vejo Catarina nos olhando de forma estranha.
— Oi, meu amor, o que foi?
Eu pergunto e ela olha pro lado, meio confusa.
— Eu não entendo…
— O que você não entende???
Largo de Ellen e me ajoelho para falar com ela.
— A tia Laura deu um beijinho no meu pai Yan, mas a mamãe beija o pai
Yan… a tia Laura beija o papi, também???
Ela pergunta, Laura que entrou logo em seguida tosse nervosa com a
possibilidade, e eu dou risada.
— Não. Veja bem… eu e sua mãe, nos beijamos e namoramos desde criança.
Uma vez a gente brigou, ela foi morar em Bagé, bem longe de mim, e lá
conheceu seu pai Yan, que cuidou de você até depois de crescer… daí,
quando ela voltou, eu percebi que a gente ainda se amava, então sua mãe
voltou a ser minha namorada, e ficou só uma amiga de Yan, entendeu ou
ficou confuso???
— Entendi. Então tia Laura é namorada do pai Yan? — ela diz e vejo Yan
lançar um olhar questionador a Laura. — E mamãe é amiga do pai Yan!?
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— Isso. E amigos não se beijam! Mamãe só beija o papai!!!


— E tia Laura é o que do papi?
— Amiga.
Eu falo e ela parecia ainda mais confusa, mas não pediu mais explicações.
— Entendi.
Catarina anda calmamente olhando para os quatro rostos que a encarava e
então sai da cozinha. Tadinha da minha filha, eu estava bagunçando a cabeça
dela.
— Sinto muito gente, cheguei lá, dei um beijo nele e nem parei pra pensar em
como ela veria isso… — Laura começa a se desculpar.
— Relaxa. Cat é inteligente e isso não tem problema nenhum. Ela precisa
entender e já era hora dela saber a respeito, na verdade eu pensava que ela já
tinha entendido. — eu falo e Ellen concorda.
Almoçamos juntos e não vou dizer que foi tudo um conto de fadas, não. Ellen
e Laura começavam a se entender e não rolava mais ciúmes de nenhuma
parte, mas eu não ficava completamente à vontade com aquele gerente de
Bagé ali, na minha casa. Não gostava de vê-lo ali, não gostava de vê-lo
olhando para Ellen, não gostava de vê-lo conversando com ela independente
do assunto, podiam falar sobre basquete, curso de gerente, ração pra
cavalos… tanto faz, eu odiava ver Yan perto dela. Não dava. O cara é ex
dela, já se deitou com a minha mulher, já beijou, já… Aff… senti um nó no
estômago ao pensar nisso, mas guardei pra mim, abstraí, e fingi demência
para ter uma tarde agradável, “agradável”.
— Me leva no play, tia Laura!? Vamos papi???
Catarina inventa depois do almoço e eu sorrio pra ela. Olho para Ellen e ela
confirma.
— Vai que depois de trinta minutos ela voltará desmaiada, já está na hora da
soneca, ela está enganando o sono.
— Vamos juntos!
— Vou lavar a louça do almoço, e deitar um pouco! Tô exausta!!! — ela diz
e eu concordo.
— Eu te ajudo.
Yan diz e aquilo me assusta ao me pegar desprevenido; olho pra ele e ele
sorri achando graça da minha cara.
— Não. Tenho certeza que Cat quer você no play também!
— É! Pai, vamos também!! — Cat grita de alegria e ele sorri pra ela.
— Vamos então! — Yan pega ela no colo e sorri pra mim.
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— É!!! Vamos então!!!


Eu repito e vejo Laura, Ellen, e o bocó sorrindo. Tenho cara de palhaço?
Beijo minha mulher antes de ir e só saio quando todos já estavam lá fora.
— Vai, ciumento! Volta logo!
— MINHA.
Eu digo bem alto, ela concorda porque era esperta demais para me contrariar
e eu saio. Chego no play com o casal dez e Catarina e logo aparece a
surpresa. Encontro Jon, a ex-mulher, — acho que no momento ex-atual-
mulher. — e os filhos, batendo papo e jogando xadrez nas mesinhas dentro da
redoma de areia do playground do condomínio. Eita.
Ao me ver ele força a vista, para pra pensar, e então parece juntar minha
imagem ao fato em si!
— Tay, não é!?
Ele pede uma pausa a sua família e se aproxima de mim.
— Oi Jon, sou eu sim, Tay! Como você está?
Eu pergunto, mas não levo em consideração o que ele diz a seguir, na minha
opinião Jon estava melhor de saúde, mas seu psicológico estava
completamente abalado.
— Tô bem, devagar e sempre!
Ele sorri tímido e passa a mão na cabeça um pouco desnorteado.
— Tá fazendo o tratamento???
Pergunto puxando assunto e sinto Cat se aproximar se agarrando em minha
cintura como toda criança faz quando a gente quer conversar com
tranquilidade.
— Sim, sim! Não posso parar. O médico garantiu que vou melhorar logo,
logo.
— Que bom! Essa é minha filha! Catarina! Fala ‘oi’ pro Jon, filha!
— Oi. — Cat diz simplesmente.
— Oi, Catarina, você é linda. A menina mais linda que já vi! — Jon é
simpático e ela sorri.
— Obrigada! Você sabia que eu fui pra Disney, pra França, e para um monte
de países com a mamãe e com meu papai???
— Não sabia! Que demais! Você se divertiu?
— Muito! Papi me prometeu que vai me levar de novo, logo, logo!
Ela fala, um sorri pro outro e ela corre brincar.
— Como ela está?
Jon pergunta por minha irmã e fico com raiva.
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— Ela está bem! Meu pai voltou pra casa, ela voltou a ser sua princesinha
então está feliz, radiante. Os dois são um grude, ele dá muita força pra ela!
Logo ela arruma um namorado com o apoio dele, e ela te esquece!
Eu minto para exaltar minha irmã porque sou desses, e tenho certeza que
minhas palavras cortam seu coração.
— Seu pai esteve em minha casa. Quase me bateu de novo, conversamos
muito e foi bem compreensível apesar do instinto grosseiro. Tay eu… — ele
começa, mas se arrepende. — Bom, eu vou indo, espero que ela esteja
mesmo bem! Foi um prazer conhecer sua menina, ela é linda, parabéns!!!
Jon fala e seus olhos já estavam vermelhos de agonia, aquela vermelhidão
pré-choro. Apostava que queria desabafar comigo, falar dela, mas também
não queria me alugar...
— Obrigado, Jon! Que você tenha uma recuperação rápida! Que você
melhore bastante e possa perdoar minha família por toda essa situação!
— Que isso, já disse que está tudo bem, e continuará assim. Não vejo a hora
de me lembrar de tudo. Sei que preciso fazer isso logo, antes que seja tarde!
Ele fala e volta a se sentar na mesa de jogo. Fico pensando em toda aquela
história cheia de tragédia, mas logo esqueço, graças à alegria e a luz que
Catarina reluzia. Minha filha, minha razão de viver!
Fico emopurrando Cat no balanço até cansar, ela pula, corre, faz Laura e Yan
de bobos, e recebe muito amor como sempre. Assim que se cansa, diz que vai
tirar a sua soneca, se despede de Yan e Laura, e volta comigo pra casa. Ligo
para meus velhos, faço planos secretos, e vou pro quarto curtir a mulher mais
linda do mundo.
— Estava no telefone?
Entro no quarto e ela logo pergunta. Não deixa passar nada.
— Sim, com seus sogros. Convidaram-nos para passar o final de semana em
família lá em Barbacena. Achei a ideia boa, estão morrendo de saudades e
loucos para receberem os presentes que a gente trouxe!
— Legal! Vamos sim.
Ela fala e boceja. Me agarro nela e tenho certeza de que adormecemos com a
TV do quarto ligada. Eu tinha planos para por em prática, uma pesquisa de
imobiliárias para procurar nossa casa, escola pra Cat… Enfim, muita coisa,
mas eu estava tão exausto quanto ela. Só fechei os olhos e apaguei.
Acordei por um momento com a Cat subindo em nossa cama, pois o seu
cochilo era de apenas duas horas, mas a coloquei quietinha no meio de nós
dois e ela logo adormeceu novamente. Sim, viajar é muito bom, mas que
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cansa, Oh, se cansa!!!


Acordei era sete da noite, fazia frio e garoava, levantei devagar pra não
acordar as princesas, e fui preparar algo para deixar pronto para assim que as
duas levantassem. Cat já estava há muito tempo sem comer, e no caso de
Ellen, levar comida na cama, sempre a agradou e eu tinha certeza de que mais
tarde meu cansaço e sono desapareceriam, e eu provavelmente ia querer
aquela mulher miando no meu ouvido até amanhecer, então encher ela de
mimo não era mais do que minha obrigação. Ellen me dava tudo o que eu
precisava, eu estava feliz, realizado, satisfeito, e conheci uma versão da Ellen
mais maravilhosa do que a que eu já conhecia: a Ellen, ‘noiva’. Eu dava amor
e recebia amor em dobro.
Passo um café, deixo o leite de Cat pronto, faço torradas com pão de forma e
entre outros lanches para três, arrumo a bandeja como um marica, com uma
Barbie e xícaras de brinquedo — espero que Cat goste da ideia e não me
mate. — e flores para conquistar minha delícia, a patroa.
Dou risada ao terminar, olhando para a bandeja, tiro foto pra por no grupo da
família, e atendo a porta no momento em que a campainha toca. Corro
atender para que o barulho cesse.
— Senhor. Tenho correspondência de extrema importância. Assine para mim,
por gentileza.
Um cabo me oferece uma caneta e eu travo. Respiro fundo e me controlo
prestando atenção nas batidas irregulares do meu coração.
— Muitos oficiais receberam, cabo?
Assino e pergunto em voz baixa.
— Sim, senhor. Aqui ‘do três’, praticamente todos.
— Até tenente Nogueira?
— Sim, senhor. Ela também.
Ele diz, afirmo com a cabeça e agradeço pelo serviço.
— Não…
Resmungo e me sento no sofá. Tomo coragem, abro o envelope e confirmo o
que eu já tinha certeza: correspondência de extrema importância/ Soldado
entregando pessoalmente e recolhendo assinatura de recebimento:
convocação de tropas oficiais para deixar o país. Era o padrão.
— Síria. Não. Não…
Me sinto mal ao ler a carta e ouço meu telefone avisar sobre a chegada de um
SMS.
“Oi, fique atento, receberá uma carta de convocação, acabei de receber a
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minha. PS: Pacificação, Síria.”


— Não.
Resmungo de novo e amasso o papel. Vou pra cozinha, jogo a bola de papel
no lixo, pego a bandeja e Ellen entra na cozinha na mesma hora.
— Eii… sua sem graça, era uma surpresa.
Eu falo e ela ri alto olhando para a bandeja.
— Desculpa, amor! Ai meu Deus… que lindo!!! — ela ri, solto a bandeja
fingindo desânimo e ela me abraça. — Desculpa, eu senti sua falta na cama e
desci atrás. Escutei a campainha, quem era!?
Ela pergunta e eu desenho um sorriso bobo na hora.
— Correio. — pelo menos não menti. — Volta pra cama ou nunca mais levo
comida pra você!
— Volto. Só vai na frente porque Cat acordou e eu já vi que você não
embelezou a bandeja com o coquetel de vitaminas e anti-alérgicos dela.
Ela ri e fico literalmente triste. Como pude esquecer!?
— Relaxa. Vivo esquecendo…
Ela mente, me dá um selinho, e me dá as costas para abrir o armário de
remédios e separar todos os vidros que precisava. Corro pro quarto e encontro
a pequena assistindo Discovery Kids, e coçando os cabelos loiros.
— Trouxe um café de princesa, para uma princesa.
Eu quase grito e graças aos céus ela gosta da ideia de usar suas xícaras cor-
de-rosa para colocar o seu “mamá”.
— Que lindo meu café de princesa, papi!!!
— Você gostou?
— Eu amei. Podemos fazer isso todo dia?
Ela pergunta olhando pro teto e dou risada.
— Eu acho que a mamãe trouxe um jogo de xícaras de porcelana lá da
França, com corações e tudo pra você! Acho que seria melhor usarmos ela,
porque esse plastiquinho aqui, não vai aguentar seu mamá de todo dia!
— É verdade, boa ideia!!!
Ela ri, Ellen entra com os potinhos de remédios dela e sorri pra nós.
— Hora das vitaminas da princesa!!!
Ela exclama, faz a gatinha tomar tudo e sobe na cama sentando no meio de
nós dois. Cat reclama que me tirou de perto dela — rimos. — e Ellen me faz
ficar no meio, me dividindo pela metade. Mais um momento maravilhoso de
muitos que estavam por vir, pelo menos no que dependesse de mim, assim
seria.
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— Dormiu. Agora só amanhã!


Ela fala entrando mais tarde, no quarto e seu semblante estava um tanto
quanto diferente.
— Você está bem?
Pergunto mas ela não fala nada. Estranho. Me sento direito na cama e olho
pra ela — esperava por uma DR das boas. —. Ela fica alguns segundos me
olhando de um jeito diferente, depois tira seu pijama ficando só de lingerie, e
sobe na cama com cuidado. Seu olhar era de uma intensidade difícil de
escrever, extremamente difícil de por em palavras. Eu não conseguia dizer o
que ela sentia, mas podia dizer o que eu estava sentindo ao vê-la ali, olhando
para mim daquele jeito, eu sentia amor. O mais puro, forte, e intenso amor
que chegava a doer, literalmente doer demais. Apertava o meu peito, me
deixava sem fôlego, uma agonia gostosa e inexplicável.
Ela olha para minha boca, pega o controle com delicadeza e uma
sensualidade fora do comum, coloca no canal de músicas da TV a cabo, e
senta no meu colo.
O canal que ela seleciona é de Black Music, paradinha e charmosa, o tipo de
música que eu podia jurar que ela não ouvia, e que ela supostamente não
gostava. — apenas uma vez dançamos naquele bar, no dia em que Julia
apareceu. — Só que lindo engano. A música começa, ela se achega ainda
mais encostando sua intimidade, — já encharcada, aposto. — na minha, e
começa a rebolar exatamente na batida do som. Calminho, gostoso, e nada
dura, sua cintura parecia que tinha mola, nunca a vi rebolar daquele jeito. —
fiquei besta e com cara de bobo. — Rebolava direitinho e parecia já conhecer
a cancão, pois a cada pausa, ela freava e parava bruscamente, fazendo meu
músculo latejar de vontade de entrar nela.
Eu estava com aquelas bermudas de ficar em casa, e ela só de calcinha e
sutiã. Ameaço tocar meu ponto favorito, mas ela nega com a cabeça, segura
minhas mãos, e continua dançando em cima de mim. Depois me aperta mais
um pouco, coloca ainda mais sua entrada escorregadia na cabeça, — no lugar
certo. Era só um movimento e eu a preenchia, se eu estivesse nu, claro. —
ergue meus braços pra cima e começa a lamber e mordiscar a minha boca.
Tudo isso de luz acesa, sem tirar os olhos dos meus, e dessa forma podia ver
sua íris aumentar de tamanho por causa do tesão que sentia, todo amor que
guardava por mim, e sua paixão avassaladora. Paixão essa que era
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correspondida.
Quase que imediatamente fico duro, e assim que ela se cansa de me deixar
preso, pega minhas mãos e sob seu controle me faz deslizar pelos seus
ombros, colo, seios, barriga, coxas, e logo o bumbum, uma tortura
excruciante. Delírio.
— Gosta disso?
Ela pergunta no meu ouvido ao mesmo tempo em que para ao som da batida,
sincronizada com o ritmo, filha da puta.
— Isso é tortura!!!
Reclamo sussurrando, e ela faz pior. Me puxa para sentar na borda da cama, e
vira de costas esfregando o bumbum, primeiro pro alto, “bem na minha cara”,
e depois na minha vara já dolorida implorando para se aliviar. A música que
começa é ainda mais sexy e charmosa que a anterior e então ela me presenteia
deixando minhas mãos livres, segura no próprio joelho rebolando demais na
minha frente e eu não me aguento.
Solto seu cabelo, toco os bicos de seus seios por cima da peça, e a pontinha
da extremidade de sua abertura por baixo da calcinha, mas logo ela tira minha
mão, pois não se concentrava em dançar quando eu desenhava círculos
rápidos em seu clitóris.
Chupo meus dedos, seguro em sua cintura, e passeio pelo seu bumbum
durinho. Era só isso que eu podia fazer, pois se eu pudesse fazer mais, ela não
tinha noção do que eu faria com ela.
— Você me quer, príncipe? — ela fala baixinho.
— Quero muito, amor, chega disso, por favor. Senta aqui, não aguento mais!
— Não, não vai me tocar hoje!!!
Ela diz séria e fico com medo. Na verdade apavorado, por isso coloco meu
músculo extremamente duro pra fora, puxo ela pra mim, e levanto sua
cintura.
— Desculpe, minha rainha, mas não existe um dia que eu consiga não te
tocar. Não suporto nem ouvir isso de você. Te quero muito.
Eu falo e ela desliza sorrindo.
— Dança, agora!
Falo irônico, mas ela obedece mesmo assim, já comigo em seu interior.
Começa a rebolar conforme a música e no mesmo instante já sinto a familiar
quentura subindo de minha barriga, até o peito, lentamente, e apostava que
ela sentia o mesmo.
— Danço, sim.
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Ela geme com a voz dengosa e meu pau chega a tremer, me avisando que
chegava a hora.
— Ah! Porra, Ellen!!!
Tento me controlar, mas ela desiste. Começa a cavalgar como cavalga em
seus cavalos, pulando feito amazona, e eu olho pra baixo, inclino seu corpo
um pouco pra trás e vejo o que eu queria ver: Sua — normalmente pequena.
— fenda aberta de modo circular, circundando toda base do meu músculo
com suas veias dilatadas, e o brilho da umidade que saía dela. Uma cena de
dar água na boca. Seu sobe e desce é desesperador e antes de chegar lá, soco
mais fundo, com mais força, vendo sua abertura ficar ainda mais arreganhada
e deliciosa.
— Diz que nunca vai me deixar, por nada!!!
Ela implora gemendo muito e quase não presto atenção. Eu estava em transe
ao ver como eu transformava sua pequenina fenda, em uma abertura
apetitosa.
— Nunca vou deixar você por nada nesse mundo. Se você visse o que estou
vendo agora, nem me perguntaria esse absurdo. Você é deliciosa, tão
molhada… não posso viver sem.
Respondo, molho os meus dedos na minha própria boca, e estimulo seu ponto
mágico enquanto ela cavalgava furiosamente.
— Diz que a FAB não significa nada. Que não foi nada pra você, que ter ido
embora e me deixado pra estudar foi um erro e que nunca vai partir, não sairá
do país, não vai deixar sua esposa e sua filha sozinhas.
— Você é minha única prioridade. Nossa família. A FAB não é nada pra
mim, meu trabalho não significa nada, quero você pulando todos os dias na
minha vara e então serei o homem mais feliz do mundo, não sairei do país,
não sairei do seu lado nunca. Prefiro isso aqui, pra sempre!
Dou meus tapas ardidos em sua intimidade e ela chora miando e gemendo
alto como uma puta profissional. MINHA puta profissional, só minha.
— Goza pra mim, quero chupar você toda. Tenho sede, meu denguinho!
Sussurro e seu limite chega. Não espero acabar, saio de dentro dela
rapidamente, coloco dois dedos em sua abertura doce, e não deixo o tamanho
de seu botão de rosa voltar ao normal. Deixo suas pernas arreganhadas e
mostrando o buraco da largura de meu músculo, e presencio a obra de arte
mais linda do mundo: o seu líquido escorrendo quente de lá de dentro. Enfio
a língua toda, sugo tudo, me satisfaço com minha mulher, e repito. Até de
manhã… como em todas às vezes.
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43
PROMESSA DE INFÂNCIA

— Eu não sabia que você dançava! Por que nunca dançou pra mim assim
antes!?
Tay questiona após fazer amor comigo por horas. Ia dar seis horas da manhã.
Dancei em seu colo, em sua frente, e ele se empolgou, não queria que eu
parasse nunca.
— Acho que esse tipo de coisa a gente já nasce sabendo.
Respondo tímida e encosto a cabeça em seu peito para ouvir seu coração.
Essa foi sem dúvida, uma das melhores noites que tivemos, claro que a
primeira vez, e a primeira vez depois que voltou, foram especiais, mas essa
de hoje, foi uma delícia. Tay estava insano, e isso refletiu em suas atitudes.
Ele quase me virou do avesso.
Mas além de super feliz eu estava péssima por dentro. Vi o militar sair pela
janela do quarto, e desci para averiguar. Peguei o único papel que tinha no
lixo e li. Tay ia me deixar, faria o que eu temia, ia pra guerra. E
provavelmente Laura também ia, Max sendo veterano, ia como capitão do
próprio filho. Uma desgraça. Se Max voltou do jeito que voltou e tem
problemas até hoje por causa da experiência extremamente traumática, o que
isso faria com a cabeça do meu bebê que já tinha sua cota de problemas no
passado toda preenchida!? Não dava. Tay não podia ir, não podia passar por
isso, e além de tudo isso, ele não podia me deixar. Não podia abandonar
Catarina, não dava.
Eu sabia que era um tanto egoísta, já que a experiência poderia alavancar sua
carreira militar, fazê-lo subir de patente, ajudar na situação crítica que era a
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situação da Síria, mas eu não conseguia aceitar sua possível partida. Não
tinha como, não de novo, principalmente sabendo que dessa vez não dava
nem pra saber se ele voltaria. Por isso tirei minha roupa, esqueci o assunto
por algumas horas, e fiz meu homem feliz. Quem sabe assim ele não pensa
bem e decide ficar, por mim!? Ter esperança não mata.
— Foi delicioso! Quero que dance assim no meu colo sempre!
Ele diz e levanto minha cabeça para olhar pra ele e o ver sorrir.
— Farei isso!!! Farei sempre! Faço qualquer coisa para te fazer feliz.
— Só tenho uma pergunta. Por que você falou tanto em não deixar você? Por
que essa ideia fixa???
Ele pergunta e fico nervosa. Não queria mentir, mas contar que xeretei o lixo
para saber se ele me escondia alguma carta do militar que eu vi, era dizer que
não confiava nele, foi uma atitude feia, e não era isso, só achei que era uma
carta oficial, queria ter certeza, e tive. Queria saber se ele me contaria, foi
errado, mas não me arrependo, pelo menos preparava meu psicológico para a
hora que ele quisesse me contar e dizer que ia partir. Eu estava me sentindo
péssima por causa desse assunto, muito péssima.
— Não sei, só uma sensação ruim… Coisa do momento! Ja passou.
Eu começo e ele me interrompe.
— Olha pra mim! Quando eu fizer uma pergunta, me responda olhando nos
meus olhos.
Ele fala e fico surpresa, nem tinha notado que escondi o rosto para ele não me
ver.
— Desculpe! — olho em seus olhos. — É sério, bobagem! Quando fico
contigo fico meio sensível, sei lá! Á flor da pele faço manha. Não me leve á
sério!
— Sei…
Tay sorri, ganha um selinho meu, e eu me levanto. Tinha certeza que eu não
ia mais dormir, pois me lembrar do assunto já me machucava por dentro.
Ainda mais. Só o ‘trabalho’ fazia eu me esquecer das minhas preocupações,
então eu deveria procurar algo pra fazer e rápido.
— Vai aonde?
Ele logo pergunta segurando em meu braço. Possessivo. Amado.
— Vou tomar um banho e sair.
— Pra onde?
— Não sei. Ver a escola da Cat, arrumar o ballet que ela tanto quer, fazer
umas compras pra essa casa…
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Eu falo e Tay não me parece tão satisfeito.


— Eu disse que ia ver a escola!
— Eu só preciso dar uma volta.
— O que você tem? Sabe que pode me falar qualquer coisa!
Tay resmunga. Parece entristecido e confuso. Digo que está tudo bem e vou
pro banho. Assim que saio, o encontro andando de um lado pro outro.
Não digo nada, ele para e se senta na cama, me olha enquanto me visto —
trava ao me ver tirar a toalha e acho isso engraçado, podíamos ficar um dia
inteiro na cama, mas Tay sempre conseguia sentir tesão e travar ao me ver
nua. — e também não diz uma só palavra.
— Eu já venho!
Eu digo, beijo sua boca, mas ele não corresponde, e aquilo dói meu coração.
Então sento no seu colo, o faço olhar pra mim levantando seu queixo, e
encosto minha testa na sua.
— O que foi? Não me ama mais??? — faço charme e ele rosna nervoso.
— Não fala bobagem, Ellen.
— Não quis me beijar, o que quer que eu pense!?
— Quero que me diga o porquê está chateada, quero que fale comigo sobre
tudo, quero evitar brigas bobas. Se não me disser o que está te incomodando
não posso deixar você sair, não assim, não chateada. Deveria querer
conversar comigo pra resolver, não fazer compras!
Ele fala e a verdade absurda machuca.
— Só prometa que não vai ficar bravo comigo!? Fiz uma coisa que você não
vai gostar…
Eu digo e ele sorri aliviado.
— Tipo leu a minha convocação? — ele pergunta e eu faço “cara feia”.
— Se já sabia por que não economizou no meu estresse?
— Eu só soube enquanto a gente fazia amor. Mas agora só perguntei para ter
certeza, eu precisava saber. — ele sorri pra mim parecendo aliviado, Tay
parecia suspeitar que eu estivesse chateada por algo que ele fez, ou alguma
outra coisa, e não pela carta. — Bobagem deixar aquela carta te deprimir. O
que eu disse pra você enquanto a gente se amava, quando mandou eu falar a
respeito disso!?
— Disse que não nos deixaria!
— Então… por que está assim??? Por isso perguntei, achei que era outra
coisa, algo que eu tenha dito, algo que fiz sem notar e você não gostou… não
isso, já disse pra não se preocupar, não tem a menor possibilidade de eu
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abandonar você, ficar longe da minha filha. Nada me faria ficar distante de
vocês, nada no mundo! Muito menos uma profissão que não escolhi pra mim,
que nunca desejei.
Ele diz e meu coração se concerta no ato.
— Só tive medo. É seu trabalho, não pode dizer não.
— Posso e vou.
— Mas não é obrigatório?
— É. Mas vou dar um jeito! Não se preocupe. Te garanto que nada vai me
fazer ficar longe de você! Tenho exemplos de que ir para guerra e deixar a
mulher em casa não funcionam muito bem. Quando meu pai voltou eu já
estava grande e minha mãe noiva de outro cara! — ele fala rindo.
— Acho melhor você ficar então…
Eu brinco e vejo sua cara sexy se transformar em uma carranca.
— Tá bem! Você não sabe brincar! Agora chega. Não tem mais com o que se
preocupar, agora pode tirar essa roupa e voltar pra cama. Ainda temos
algumas horas até que Catarina acorde e me roube de você!
— Ainda preciso sair. Preciso resolver essas coisas! — ele faz uma cara feia
e fica alguns segundos me encarando chateado. — Volto logo, prometo!
— Tudo bem. Me ligue se algo acontecer, se precisar de qualquer coisa, e
mesmo se achar que pode resolver sozinha como uma selvagem, me ligue
mesmo assim!
— Relaxa. Ficarei bem!
Saio do quarto sorrindo e sentindo o peso do olhar dele. A impressão que eu
tinha era que pro Tay era muito difícil me ver sair sozinha, sem sua
‘proteção’, não sei se por causa de Julia, se por causa do que já passamos no
passado, ou se era só ciúmes mesmo. Mas que estava sendo difícil me deixar
sair sem ele, ô se estava!
Caminhei um pouco, fiz minhas compras, procurei por escolas, resolvi tudo o
que tinha pra resolver, e até vi algumas vagas de emprego que muito me
interessaram. Só precisava trazer Cat para ver o que ela achava da escola, e
falar com Tay a respeito de ter um trabalho. E em falar em Tay, a criatura me
ligava a cada cinco minutos, se não fosse tão gostoso, fofo, e amoroso, e se
eu não o amasse tanto, com certeza ia ficar puta com isso.
Volto pra casa e encontro ele com Laura, os dois estavam na sala e ela
chorava, muito, de soluçar.
— O que houve?
Pergunto e ela abaixa a cabeça. Olho pro Tay, ele apoiava a cabeça com as
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mãos.
— É Yan, entrou na sala e eu estava lendo a convocação, discutimos muito,
ele dormiu na sala, e hoje de manhã quando acordei, ele já não estava. Só
deixou um bilhete.
Pego o bilhete sem a autorização dela e leio.
"Fui embora, enfim você conseguiu o que sempre quis, se ver livre de mim,
afinal! Se mudar de ideia quanto a essa viagem suicida e sem sentido, me
ligue!"
— Bom, ele tem razão! Você nunca quis esse namoro, sempre disse que era
perigoso pra ele, todo aquele mimimi, por que está chorando?
Eu pergunto e ela revira os olhos.
— Eu gosto dele! Sempre evitei o namoro porque simplesmente é perigoso!!!
Ele se arrisca. É arrumar mais um inimigo e ele vira o alvo para me punirem,
será usado para me machucarem, ameaçarem. Tay sabe como isso funciona,
vive no teu pé, teme por esse tipo de coisa também, só que ele é mais
corajoso, não quero que Yan se machuque!
— Ok, mas então… qual o problema!?
— Ele está assim porque eu disse que ia! Disse que eu não podia negar,
preciso partir.
— Tay não vai, por que não faz o mesmo e diz ‘não’?
— Porque não sou Tay, não sou rica, não tenho família, nem estrutura! Tay
vai abandonar a carreira e ficar desempregado se disser ‘não’ para a FAB, se
não ir preso ainda por cima! Meu sustento vem do meu trabalho! Quanto
mais subo de patente, mais o salário sobe de acordo, e amo o que eu faço,
minha mãe sempre desejou isso pra mim, participar de uma pacificação, de
uma guerra como essa, é fazer parte da história! Todo militar quer…
Ela diz, seca os olhos, e se levanta.
— O que Tay te paga é mais do que a FAB te dá em meses, Laura!
— Nem tudo é dinheiro, Ellen!
— Ah, que maravilhoso, e vai deixar ele???
Pergunto e os dois olham pra mim com cara feia.
— Sim, eu preciso!
— Então não chora, decidiu vai e faça! Nunca na minha vida eu pensei que
veria você chorando!
— Pois é!
Ela resmunga, parece meio perdida sem saber o que falar ou o que fazer, e vai
embora.
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Converso com Tay a respeito, me sinto péssima, e não paro de pensar nisso
nenhum minuto depois. No sofrimento de Yan, na escolha corajosa de Laura,
e no trecho da conversa que tivemos em que ela diz tudo o que Tay enfrentará
só por dizer não, só para ficar comigo e com Cat.
Sofro por isso, e sofro por ele, mesmo que por antecipação!

— Bom, nós vamos viajar pra Minas, mas eu queria passar em um lugar que
eu quero que você conheça!
Escuto Tay conversar com Cat no quarto e não entro! Só olho da porta.
— Aonde, papi?
Ela brincava com as suas bonecas e olhava pra ele curiosa.
— É um lugar muito especial em São Paulo, que abriga famílias de
refugiados, tem muitas crianças lá!
— Refugiados?
— Sim, são pessoas que saíram de seus países para fugir da guerra, do horror
da violência, da fome… gostaria que você conhecesse aquelas crianças, que
você visse como elas vivem, e eu pensei que podíamos levar alguns
brinquedos seus que você não brinca mais, pra elas ficarem felizes. Assim
você pode fazer muitos amigos! O que acha?
Eu sorrio com a proposta e entro para ver o que Cat vai fazer, como ela vai
reagir.
— Dar meus brinquedos? Não sei se quero fazer isso…
— O papai compra um brinquedo novo toda vez que a gente sai. Por que não
divide com alguma criança que não tem nenhum? Você vai ficar muito feliz
fazendo isso, te garanto!
Tay diz e ela continua com o semblante chateado.
— Tudo bem. — ela diz, mas não convence.
— Era só uma ideia. Não é obrigada a fazer isso, não vou te forçar a ir. Só
achei que gostaria de ajudar! Tem crianças lá que não tem nada, filha!
Entendeu?
— Entendi! Tudo bem!
Ela diz e Tay sorri. Beijo meu amor lindo demais e corro arrumar nossas
coisas.
Seguimos viagem, passamos no centro de acolhimento que Tay tinha dito,
chorei, ri, abracei e brinquei com um monte de bebês carentes e fiquei
apaixonada. Catarina um pouco antes de sair de casa disse para seu pai que
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iria para conhecer, mas que não queria dar seus brinquedos pra ninguém, Tay
disse que estava tudo bem e mudou de assunto, mas assim que Cat se distraiu
ele pegou o saco de brinquedos que ela havia separado e colocou no carro.
Perguntei o que ele fazia, e o espertinho disse para eu confiar.
Assim que chegamos e Cat viu as crianças, e viu toda a situação, ela olhou
para nós dois por um momento, mas não disse nada. Logo uma das crianças
se aproximou dela e ofereceu a mão chamando-a para brincar. Ela pensou um
pouco, mas foi.
— Como você se chama? — a menina pergunta.
— Catarina. E você?
— Jeniffer! Você quer brincar de bonecas???
— Eu quero!!! Eu amo bonecas!
Cat sorri para Jeniffer e Jeniffer puxa Cat para correr e mostrar os seus
brinquedos.
— Você fica com essa aqui, ela se chama Bela! E eu fico com essa, a Sofia!
Jeniffer diz e entrega nas mãos de Catarina uma boneca de plástico já judiada
pelo tempo, com o cabelo branco um pouco embaraçado, mas ainda sim,
muito limpa e na medida do possível bem cuidada e arrumada por Jeniffer.
Com lacinho azul e tudo!
Catarina olha para a boneca, olha para seu pai, olha de novo para a boneca e
não sabe o que fazer. Jeniffer se senta no chão sem ainda notar a reação de
Catarina e Cat logo se senta ao seu lado, mas não tira os olhos de Tay.
— Você só tem essa boneca? — Cat pergunta.
— Só essas duas… aqui a gente tem que dividir as doações que a gente
recebe! — Jeniffer sorri alegre.
— Doações?
— Sim, as pessoas trazem… elas não dizem, mas sei que é pra gente se
distrair e não pensar no nosso país!
Jeniffer diz mostrando perspicácia e um nó se cria na minha garganta.
— De que país você fugiu?
— Da Síria! Falo português porque meu pai é brasileiro e me ensinou! Até
minha mãe aprendeu!!! Estava muito difícil viver lá! Vimos muita maldade e
não tínhamos paz.
— Quantos anos você tem, Jeniffer? — eu pergunto.
— Eu tenho seis, tia!
Ela responde e vejo Catarina tentando desembaraçar o cabelo da boneca, e de
repente, pegando nós três desprevenidos, ela começa a miar, e depois
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balançar os ombros compulsivamente chorando de soluçar, do nada.


— Ei… O que foi??? Por que está chorando???
Tay questiona e nós dois nos aproximamos dela.
— Nada… não sei…
Catarina diz e eu choro por vê-la chorando.
— Muitas crianças fazem isso quando vem aqui! É um Choque de realidade,
eu ouvi tia Nari falar! — ela se ajoelha na frente da Catarina e passa a
mãozinha em seus cabelos. — Está tudo bem, Catarina! Nós estamos muito
bem, aqui! Você não precisa ficar triste. Quer brincar de outra coisa? Não
gostou da boneca?
— Não sei!
— Vem, eu acho que consigo outra boneca pra você com a minha irmã! As
dela são mais bonitas.
— Não quero. – Cat fala ainda chorando.
— O que quer fazer, Catarina? Pare de chorar, filha!!!
Eu falo e ela esfrega os olhos.
— Quero ir buscar os brinquedos, pra dar pra Jeniffer! Eu não trouxe e ela
não tem, não dá pra brincar com uma boneca desse jeito. Tá muito, não dá
pra brincar.
Ela olha pra boneca em suas mãos e olha para seu pai que também beirava o
choro.
— É claro que dá! A Jeniffer sempre brinca, essa boneca é só o que ela tem, e
eu tenho certeza que ela se diverte muito!
Eu falo e ela olha pra Jeniffer que sorria sem graça.
— Olha aqui! — Tay pede. — Papai trouxe os brinquedos que você separou
para se caso você mudasse de ideia! Que tal a gente ir buscar para a Jeniffer
escolher o que ela quiser?
Tay propõe, Cat para de chorar no ato e logo aceita, Jeniffer esboça um
sorriso gigante, e eu me sinto extremamente feliz ao vê-la feliz por querer ser
solidária. Tay foi esperto, sabia que a filha mudaria de ideia, sabia que
Catarina ia querer ajudar e assim foi. Ela fez Jeniffer escolher alguns
brinquedos, brincou com ela por alguns minutos enquanto via sua nova amiga
ficar enlouquecida com uma Barbie ainda fechada, se empolgou, e saiu com o
saco oferecendo brinquedos para quem quisesse até o saco esvaziar. Foi lindo
de ver e emocionante, Tay havia feito uma transformação em nossa filha, e a
transformação foi tanta que ela logo quis saber quando poderia voltar para
ver Jeniffer de novo, e trazer os brinquedos que ela separaria.
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— Viu! Eu disse que isso ia te fazer bem!!!


Tay resmunga beijando toda sua face.

Chegamos a Barbacena já era quatro horas da tarde. A família toda nos


recebe na sala e fico feliz em ver minha sogra vivendo de novo. Max estava
de volta, então ela voltou a ser a Hella radiante que sempre foi. — de algum
jeito, após o episódio onde achamos que Tay tivesse “se machucado”, eles se
encontraram e se acertaram. — O tempo como sempre estava frio, e o vento
mais gelado que o de São Paulo! Logo tomei um banho, troquei o “look São
Paulo”, pelo “Look Barbacena (Botas e blusões)” meu e de Cat, e no
momento seguinte fomos todos para a clareia onde fazíamos a famosa
fogueira da família, com amigos, músicas, e muita comida boa!
Chegando lá vejo que a decoração havia mudado, e estava estranha porém
linda. Tinha milhares de bandeirinhas em formato de coração espalhados pela
clareira inteira, nas cordas, nas árvores, na mesa dos comes e bebes, bexigas
em formato de coração douradas, velas, flores, lamparinas rústicas, UM
BOLO DE TRÊS ANDARES, e milhares de itens requintados e
maravilhosos. Lindo! Tudo extremamente lindo, rústico e de bom gosto.
— O que está havendo aqui?
Pergunto e Tay não diz nada, parecia que não tinha notado a diferença.
— Oi meu amor, como você está? Estava com tanta saudade!!!
Minha mãe me abraça enquanto meu tio apertava a Catarina e logo trocamos
de par.
— Eu ia passar lá mais tarde, o que fazem aqui? Por que isso tudo???
— Não gostou da minha decoração, cunhadinha???
Lulu se aproxima de mim e brinca.
— Eu amei, está linda, mas por que tão caprichada?
— Quis inovar. — ela diz e sorrio.
Maluca. De repente as violas caipiras param de tocar, Tay se aproxima de
mim juntamente com todas as pessoas presentes, e fazem uma espécie de
roda natural ao nosso redor.
— Na verdade essa festa está assim porque é um noivado. O nosso noivado.
Uma vez eu te disse quando a gente era criança, que eu te pediria em
casamento, aqui na chácara, na frente de todos, lá no Rio Grande do Norte,
então tô cumprindo! Eu disse que a gente ia envelhecer juntos e você até riu
disso, mas envelhecer ao seu lado é tudo que sempre desejei durante a minha
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vida toda! — Tay falava e eu via muitas pessoas chorando, inclusive Hella,
minha mãe, e... eu. — Amor, eu te amo muito e não quero passar mais um
único dia sendo só seu “namorado”… — meu Deus, ele ajoelha e abre uma
caixinha me mostrando um anel divino com um diamante delicado e
espetacular, brilhava demais — Ellen, você aceita envelhecer ao meu lado?
Aceita se casar comigo???
Ele pergunta, mas quase não espero ele terminar de formular a frase.
— SIM!!!
Eu falo, ele deixa um sorriso enorme transparecer em sua face, pois enquanto
falava parecia tímido e nervoso, se levanta, coloca o anel em meu dedo, me
abraça, me beija apaixonadamente, e não se desgruda mais de mim.
Cat pula de alegria, todos sorriam, uns gritavam de emoção, batiam palmas, e
logo Lulu trouxe a clássica taça de champanhe para comemorar. Eu só
chorava, e Tay parecia aliviado e radiante. Não tiro mais meus olhos dele, e
fico pendurada em seu pescoço pelo resto da noite e a partir dali seria pelo
resto de nossas vidas.

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44
A PROFECIA
— Temos uma novidade…
Max se levanta na sala após todos tomarem café.
— Hella está esperando outro filho meu.
Ele continua, vejo Tay cerrar os olhos, Lulu sorrir desanimada, e o restante da
família comemorar com gritos.
— Eu só espero que um dia vocês parem de procriar! Chega de aumentar essa
família. Já estamos com vagas lotadas!
Lulu diz rindo e todos a levam na brincadeira. Parecia que só eu tinha achado
seu comentário estranho. Ela abraça os seus pais e já ia virando as costas,
quando Max a segura pelo braço. Ele a faz olhar pra ele, e ela ergue uma
sobrancelha parecendo emburrada.
— De qualquer forma, não importa se nós procriarmos por mais três
décadas… você será sempre meu milagre, minha filha amada, minha favorita
de todo o universo! — ele diz e conquista um sorriso seu.
— Acho difícil… — ela resmunga sorrindo e sai.
— Mas é a verdade absoluta!
Ele diz e ela faz um ‘jóia’ com a mão sem olhar para ele, e por um momento
não consegui deixar de comparar mãe com filha. Tia Hella tinha saído da
fossa, enquanto sua filha estava começando a entrar. Depressão já prevista.
Cumprimento os dois, conversamos mais um pouco e eu subo “descansar”.
Meu noivo e eu havíamos tido outra noite maravilhosa e nem dormimos, mas
toda a minha preocupação recente era relacionada a esse tema.
— Tudo bem?
Ele entra no quarto e se deita ao meu lado. Suas mãos passeiam por meus
cabelos e eu já podia apostar que estava querendo ainda mais.
— Tudo, sim!
— Tem certeza?
Ele me olha desconfiado e eu sorrio.
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— Só preocupada… já faz um tempo que também tento te dar outro filho e


até agora nada. Estou sentindo as dores e incômodos da TPM. Talvez
Catarina seja filha única por um bom tempo…
Eu falo e ele sorri tocando meu rosto e se aproximando.
— Relaxa, mulher! Eu às vezes encho o saco, mas sinceramente não tenho
pressa de te ver descabelada, com olheiras, cansada, e sem vontade de dar pro
seu homem por estar com dores ou enjoada. Você é jovem, linda e fértil. Me
dará muitos filhos, muitas alegrias, e mesmo que isso não aconteça por algum
motivo, sei que Catarina ainda nos dará trabalho por muito tempo, não
sentirei falta! Se vier serei o homem mais afortunado do mundo, se não vier,
serei mais ainda porque enquanto essa barriga não cresce, terei sua atenção,
seu amor, e seu corpo só pra mim. Todo meu, só meu… — ele me beija aos
poucos enquanto fala, e já o sinto duro. — muito meu e de ninguém mais! E
esquece esse assunto, já que quer tanto mais um cabeludinho amarelo, vamos
tentando, quanto a isso posso te garantir, te apoiarei todos os dias se quiser,
— ele pisca. — treinar é comigo mesmo. Sou seu, minha pequena. Não fique
triste! Você faz de mim o homem mais feliz do mundo!
Ele diz baixinho, aperta minha cintura, e me ama mais do que nunca. A todo
o momento me olha nos olhos e promete me amar por todos os dias de sua
vida, pra sempre.

Levanto cedo no domingo e não encontro Tay na cama. Escovo os dentes,


lavo meu rosto, me visto apropriadamente, e resolvo ir atrás de meu noivo —
era engraçado pensar assim. — e minha filha. Paro no alto da escada e ouço a
voz de Laura, até tinha achado estranho ela não ter vindo junto, no final veio
depois.
— E você, pai… não me disse se foi convocado!!!
Ouço Tay dizer.
— Claro que fui. Santos subiu também, eu iria como o capitão de vocês.
Imagino que seria demais estarmos juntos em campo, mas prometi para sua
mãe há muitos anos atrás que nunca mais partiria, então, vou cumprir.
— Eu entendo. Também acho que ia ser demais…
Tay diz e meu coração sangra. Ele tinha vontade de ir, só não ia por minha
causa.
—... só que prefiro minha mulher. Minha mulher e minha filha. Além do
mais, sei que não tenho vocação para padre como o senhor teve, sei que lá
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combatentes femininas são escassas, e vou me casar, amo a Ellen! Prefiro não
arriscar perdê-la. Ellen não é tão paciente como minha mãe, apostaria um rim
que logo que eu voltasse, ela estaria fazendo aniversário de casamento.
Todos riem.
— Pois é… sexo é uma questão a ser pensada. Já no meu caso não posso
recusar, serei uma freira, provavelmente freira morta.
Laura resmunga.
— Já disse que posso mexer meus pauzinhos. Está indo porque quer, Laura!
— Max fala.
— Estou indo porque preciso! Não tenho outra escolha.
— E Yan? Deu notícias?
— Não. Nem sinal. Ele espera que eu o procure e entendo isso. Mas não é
possível!
— Não vai nem se despedir?
— Não tem como. De qualquer forma o exame é amanhã! Preciso ficar,
preciso trabalhar, não posso correr atrás dele para curar suas feridas, para
“pedir perdão”. Eu o amo, amo mesmo, mas não tem como. Pensei muito, e...
eu preciso ir. Será bom para minha carreira.
Ela fala e parece que todos refletiam sobre o que ela disse, e então eu desço.
— Eis o motivo pelo qual ainda vivo!
Tay diz e todos resmungam zombando. Rafa também estava junto, eu só não
o ouvi.
— Você é tão romântico, moço sem vocação para padre! Pensei que não ia
porque não queria, não porque não consegue ficar sem sexo!
Digo e ele primeiro tenta me ler pra saber se eu falava com humor ou se
estava brava. Não sorrio, mas também não fico séria, digo ‘bom dia’ para
todos, me direciono para a cozinha, e aí sim, sorrio ao notar que ele me
seguia.
— De tudo o que eu disse, só reparou quando eu disse que lá, as mulheres são
escassas e que eu não tinha vocação para padre? Está brava?
Ele questiona, entro na cozinha, e ainda encontro a mesa posta, mas não tinha
mais ninguém.
— Tô falando contigo, mulher!
Ele me vira à força e quando encontra meu sorriso parece relaxar. Mas não
muito.
— Relaxa. Bom saber que você conhece as próprias fraquezas e assume,
prefere evitar e você tem toda razão, Tay Coverick. Te apoio se quiser ir, faz
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parte de tua profissão, seria maravilhoso para tua carreira, mas não sou tia
Hella. Quando você chegasse me encontraria casada, amando muito, e com
uma família imensa e linda. Eu ainda seria capaz de ir até Pirassununga para
me despedir de você e terminar oficialmente o nosso relacionamento, mas
não digo que seria fácil, não, não seria. Eu ficaria muito brava, então, talvez
eu me vingasse de você ao te dar o último abraço. Roubaria o estilete que
Laura sempre carrega naquele sutiã, e arranco isso, — pego com jeito em seu
músculo já duro por me ver falar assim, e ele arfa gostoso. — pra guardar de
lembrança, pra ficar aqui, comigo, porque não vou me contentar com
lembranças e fotografias. Se desejasse me deixar, eu entenderia, mas nunca
mais iria comer mulher nenhuma, viraria uma mulherzinha! Isso aqui me
pertence, poderia ir se quisesse, mas isso aqui é meu, fica comigo, pra
sempre, como disse ontem à noite enquanto ele estava dentro de mim,
fazendo parte de mim, no seu devido lugar!
Eu falo olhando em seus olhos, Max entra na cozinha, vê a cena toda e não
me importo! Tiro minha mão, rosno pra ele e saio dali pois tinha perdido a
fome. Sorrio feliz ao chegar na sala pois tinha tido a certeza de que eu
precisava, Tay não iria embora e não porque não podia, mas porque me
amava muito. Vi isso em seu olhar.

— Vou procurar Jade! Ela poderá me dizer, algo a respeito, tenho certeza!
Digo para minha sogra enquanto estava com ela, na rede, do lado de fora.
— Relaxe, minha linda! Tenho certeza absoluta que logo, logo você dará a
luz! Só não entendo o porquê tanta pressa…
Tia Hella diz e eu olho pro lago.
— Ainda me sinto culpada por ter levado Catarina. Sinto que devo isso a ele,
Tay tem direito a ver os primeiros passos de seu filho, dar mamadeira, trocar
fraldas. Eu devo isso, e eu o amo. Quero ter muitos filhos com ele, um
monte!
— Não se prenda a essa culpa sem sentido. Tudo o que aconteceu, é porque
deveria. Só Deus sabe o que nos reserva, você nada podia fazer. Carrega uma
cruz que não é sua!
Ela diz tocando o meu rosto e me fazendo olhar em seus olhos enquanto
falava.
— Mesmo assim, quero falar com Jade. Tenho certeza que ela pode me dizer
alguma coisa.
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Eu falo e tia Hella sorri concordando.


Naquele momento vemos um carro entrar na estradinha em alta velocidade.
Eu e tia Hella levanta da rede ao mesmo tempo e vejo Max e Tay se juntar a
nós possessivamente, e nada discretamente. A atitude de ambos era natural,
sempre foi.
— Cadê Catarina? Ainda dormindo, não é!?
Pergunto e ele balança a cabeça afirmando.
— ME AJUDA AQUI!!! POR FAVOR!!!
Um rapaz moreno que eu já havia visto antes sai do carro correndo, dá a volta
e puxa uma mulher para fora com dificuldade extrema. Ele era pequeno, não
tinha força. Ao ver que era Jade, todos suspiram assustados e Tay se
desespera. Ele corre pega a cigana como se fosse apenas um saco de feijão e
entra no casarão.
— Quem é você? O que houve com ela???
Tay pergunta demonstrando estar desesperado.
— Sou Jake, um dos filhos dela, o filho mais novo! Viajamos uma grande
parte da noite, ela disse que precisava falar com a família, fomos até São
Paulo e vocês não estavam, tentou falar com todos no telefone, mas parece
que aqui o sinal não é muito bom, não sei ao certo… ela… Ela desmaiou do
nada, á horas tento fazê-la acordar.
O rapaz diz aflito e faz Tay gritar.
— E por que diabos você não a levou em um médico?
— Por que ela tem isso sempre, pelo menos sempre que tem uma visão forte
demais!
Rafael entra na sala correndo e responde a pergunta que o rapaz não
conseguiu, pois parecia estar amedrontado com Tay assim tão perto, em seu
espaço pessoal.
— Como vai, irmão?
Rafa abraça o irmão e se aproxima de sua jovem e bela mãe.
— Vai buscar um copo d'água pra quando ela acordar…
Ela fala e Jake olha ao redor, mas é Tay quem bufa e vai atrás do copo
d'água.
— Por que está tão nervoso? Ela está bem, Rafa já disse!
Eu falo e o vejo pegando a água do filtro, parecia estressado.
— Não sei. Só me preocupo com ela, me importo!
Ele diz e sai, me deixando na cozinha sozinha.
Volto pra sala e vejo Rafa acomodando seu pescoço em uma almofada e Tay
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se apoiando apenas em um joelho, aflito e nervoso demais.


De repente Jade pisca algumas vezes, e desperta aos poucos.
— Ei… Você!
Ela diz sorrindo para ele e aquilo me incomoda profundamente.
— Quer nos matar do coração? O que foi isso???
— Jake…
Ela resmunga tentando se levantar e o rapaz se aproxima dela.
— Filho…— ela sorri pra ele e faz carinho em sua cabeça.
— Desculpem pelo susto, isso acontece sempre, só não tinha acontecido
enquanto eu viajava, ainda…
— Tudo bem. Mas diga de uma vez, o que te traz aqui? Aconteceu alguma
coisa??? — Max pergunta e ela sorri.
— Pra vir aqui precisa ter motivo!?
— Jake nos contou que foram até São Paulo, que vocês tentaram nos ligar,
não pode estar desesperada por apenas uma visita, não chegando aqui por
causa de uma “visão forte”. Diga de uma vez, Jade!
Max diz sem paciência, ela se apóia em Tay para se levantar, e encara Max.
De repente olha para seu cuidador e resmunga.
— Você pode voltar a respirar agora. Eu tô bem, rapaz!
Ela fala e Tay cerra os olhos pra ela. Ela volta seu olhar para Max e respira
fundo.
— Estou fraca demais. Preciso descansar, paciência é um dom!
— Dom que eu não tenho… O que você viu? O que você viu, Jade?
Ele fala, ela passa por ele o encarando o tempo todo, e para na frente de
Hella, — corajosa. Eu jamais ignorava Max assim. Dou uma risada
silenciosa. — olhando para sua barriga.
— Parabéns. Eu o vi chegar, será lindo, forte e corajoso, como o irmão!
Ela diz e Hella chora.
— É um menino???
— Sim.
As duas se abraçam e vejo Laura rir e revirar os olhos.
— Engraçado você rir, daqui a dois minutos vai ficar espantada, e depois vai
chorar. Você zomba de mim, mas te darei um presente… — ela pausa sua
fala enquanto ainda sorria para tia Hella, e vira o rosto de repente, olhando
para a Laura. — Eu vejo dois pontos de luzes aqui nesta sala, um nesta
barriga que seguro agora, — ela põe a mão na barriga de minha sogra. — e o
outro na tua.
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Laura ri sem acreditar e vejo Jade inclinar a cabeça lendo a militar em sua
frente. Todos sorriam, mas Tay olhava para a amiga também não querendo
acreditar, totalmente perplexo.
— Tem um exame de sangue no seu trabalho amanhã, portanto não irá pra
Síria! E se burlar o sistema como sempre faz para conseguir o que quer,
morrerá com certeza absoluta, e levará seu filho junto!
Jade profetiza e Laura olha para Tay.
— Já você, minha doce criança… sossega essa alma aflita e respire aliviada.
Você é fértil como minha deusa. Encherá meu protegido de alegrias,
futuramente. Mas agora não é a tua hora!
Jade toca meu rosto com as duas mãos e sorri pra mim.
— Agora com relação a você, e a você — ela aponta para Tay e depois para
Max. — Falarei em particular, não agora, não depois, mas quando eu estiver
bem, e descansada!
Jade sorri erguendo uma sobrancelha para ele, e de repente olha para a
escada. Ela trava e olha fixamente pra lá, por isso todos seguem seu olhar.
Sentada na escada estava Catarina, olhando escondida por entre os vãos do
grande corrimão.
Depois de alguns segundos olhando, Jade abaixa o olhar, e segue em direção
a cozinha fazendo sua saia voar com o movimento brusco que ela deu.
Tay me olha confuso, caminha em direção a Catarina e eu me sento ao lado
de Laura.
— E agora? O que vai fazer?
Eu toco em seu joelho para ver se a traria para a terra novamente, e para
tentar trazer algum “conforto”. Ela me olha com os olhos mais vermelhos que
já vi.
— Vou procurar uma farmácia. E se essa bruxa estiver certa, pegarei um
avião ainda hoje. Vou para aquele fim de mundo buscar aquele gaúcho
irritante, mandão, e provavelmente, papai!
Ela fala e eu concordo. Era o certo a fazer e ela estava sendo sensata.
O dia correu como esperado, Tay levou Catarina pra passear, me dava
atenção quando não dava para a nossa filha, almoçamos, tomamos café da
tarde, tudo na maior paz. Entre aspas. Tay e Max não diziam, mas estavam
aflitos, e era nítido. E nítido também, era o motivo: “O que tanto Jade tinha
pra dizer?”
Eram 18:00hs quando estávamos na sala conversando sobre a Síria, com a
família inteira, menos Rafa e Jade. Laura chega de repente, e parecia péssima.
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Seus cabelos estavam desgrenhados, seus olhos levemente avermelhados, e


suas feições já demonstravam o óbvio. A “bruxa”, como ela mesma disse,
estava certa, é claro. Laura estava mesmo grávida.
— Minha mãe está chamando você, cunhado!
Rafael desce as escadas e parecia preocupado. Me arrependi de não ter
entrado escondida no quarto para poder ouvir e fico aflita por isso. Será que
Tay me contará o que ela vai dizer a ele? Provavelmente não. Será que isso
me deixará chateada? Provavelmente sim.
Ouço todos encherem Laura de perguntas e não fico lá, já sabia que
confirmaria. Vou até a varanda e espero Tay vir atrás de mim, pois sabia que
ele faria isso e assim foi.
Ele se aproxima e não diz nada. Sinto sua aproximação em minhas costas,
mas ele não me toca.
— Vai me contar o que ela vai te falar?
— Se eu puder...
— Se for a respeito de Catarina, quero saber, tenho direito!
— Perguntarei se posso dividir com você. Se não tiver problemas,
consequências, falarei.
Ele fala de um modo insensível e não aguento mais ficar ali. Entro e o deixo
lá. Ele demora um pouco, entra depois, e fico distante sentindo seu olhar em
mim, mas não correspondo. Minutos depois Max desce, diz que é a vez do
filho, e vejo de relance ele me olhando uma última vez, mas de novo não
correspondo. Sigo meu caminho até a cozinha para beber um copo d'água e
fugir do barulho e do choramingo de Laura. Estava em pânico pelo resultado
positivo, não se via ‘mãe’, não se via cuidando de um bebê, não se via
casada… um porre sem sentido!
Tay fica trancado no quarto com Jade por mais de meia hora, e quando sai,
Laura o aborda e consegue dele uma carona até o aeroporto. Vou até o
estábulo e fico por lá até eu me acalmar, até minha respiração estar
controlada e ele entra depois de algumas horas na rua.
— Deixei Laura no aeroporto…
— Eu sei.
— Não posso te dizer o que Jade viu. Ela mesma disse o quanto é perigoso
compartilhar isso… o futuro pode mudar, pra algo bom, ou infelizmente algo
ruim. Melhor não arriscar.
Ele fala e continuo do jeito que eu estava. Sentada no chão de uma baia vazia,
tinha colocado a calça e as botas de montaria, mas não me animei em montar,
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estava aflita. Porém, o cheiro e o ambiente em si, já me ajudavam. Ali era


meu lugar, minha casa.
— Certo. — eu resmungo olhando para as botas que fazia tempo que eu não
usava e ele entra na baia.— Quero ficar sozinha.
— Não vou sair daqui.
— Eu não quero você perto de mim. Não enquanto me esconder as coisas. É
o futuro de Catarina, sou a mãe dela. Vai dividir isso comigo!? Fique. Não
vai!? Desapareça. — olho em seus olhos e o vejo vermelhos, assim como
apostava que o meu também estava. — Não me importo, se vai me deixar no
escuro, não te quero perto de mim.
Eu falo, Tay fecha os olhos lentamente demonstrando que o que eu disse
doeu, mas não sai dali como mandei. Ele caminha até mim, se senta do meu
lado, e fica ali sentado ali, parecendo sofrer demais. E vê-lo assim me destrói.
Encaro seu semblante sofrido, mas ele não diz nada, só me puxa para subir
em seu colo de repente, e sem olhar pra mim em nenhum momento.
— Não tente me afastar de você, não vai funcionar. Se estiver brava comigo,
respire fundo, e espere passar. Se falar esse tipo de coisa novamente, farei
você se arrepender de ter voltado pra mim!
Ele fala acarinhando o alto de minha cabeça, e não consigo deixar de ter
medo dele. Olho em seus olhos e vejo uma fúria violenta e controlada, então
faço o que é recomendado nesses casos, deixo ele soltar aquela fúria toda
dentro de mim, para se acalmar, e me perdoar pela bobagem enorme que eu
disse. Saí um pouco arranhada e quase sem os cabelos da nuca, mas não me
importei… ele me deu mais do que eu merecia.

— Façam ótima viagem!!!


Tia Hella diz assim que Tay colocava as nossas malas no carro. Todos se
aproximam para nos cumprimentar, um a um… até que Jade se aproxima de
mim e eu me esquivo de sua mão que ia em direção a minha face.
— Com o tempo entenderá e me perdoará por isso. — ela diz assim que me
afasto dela.
— Tá.
Só resmungo e sinto o clima pesar ao redor. Todos notavam o olhar
carregado que eu dirigia a ela.
— Espere!
Lulu corre com sua bolsa e uma pequena mala em nossa direção.
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— Eles ficarão mais um pouco, posso voltar com vocês?


Ela pergunta e sua boca é uma linha reta. Luiza pedia ajuda para fugir dali.
— Não gosta de nossa companhia?
Max pergunta e ela respira fundo antes de me dar as costas.
— Claro que gosto. Só que vocês sabem que não estou bem. Uns dias sozinha
na vovó, me farão bem!!!
Ela fala e Max parece ter levado um tapa na cara.
— Há algo que eu possa fazer pra você melhorar?
— Sim, papai! Prepare minha viagem de volta para começar o ano letivo em
Harvard, e alugue outro apartamento para eu não ser perturbada! Só preciso
de uns dias de descanso para refletir e depois ir embora. Isso vai me ajudar
muito! E não se sinta mal com isso, vai passar! — ela abraça o pai e fala
baixo. — Eu te amo!
Ela sorri pra ele, faz carinho em tia Hella que sorri de volta, e toca em meu
ombro ao entrar no carro e se juntar a sobrinha na cadeirinha do banco de
trás.
Aceno para todos, Tay os cumprimenta e partimos dali diretamente para São
Paulo.
Chegamos ao centro era uma da tarde. Tay conseguiu fazer com que Lulu
passasse pelo menos aquela noite conosco e ela concordou. Seu irmão tinha
medo de deixá-la sozinha e ela sabia disso, mas concordou contanto que bem
cedinho no dia seguinte, fosse levada para São Paulo, para a casa de Jô.
Chegamos ao condomínio e demos de cara com Jon, a única pessoa na face
da terra que ela não queria ver. Tay agarrou Luiza e pela cintura e de cabeça
erguida entrou em casa. Eu estava um pouco mais atrás dos dois, segurando
Cat no colo então pude ver, Jon sentia uma dor absurda e um amor
inexplicável por Ana Luiza. Assim que a viu, travou, e duas enormes olheiras
chorosas se formaram em sua face, fazendo meu coração doer ao testemunhar
aquilo. Podia apostar que Jon nem ao menos sabia o porquê sentia aquilo
tudo por uma “estranha” e aquilo era surreal.
— Oi, Jon!
Eu sussurro ao passar por ele, toco seu ombro, e por um momento me
esqueço que ele nem me conhecia. Por isso ao estar ciente de sua realidade,
ele só assente. Que péssima era toda aquela situação!!!
— Você nem tocou na comida, não vou deixar você se trancar no quarto!
Tay chateia sua irmã ao ver que já se levantava da mesa de centro horas
depos. A comida japonesa estava deliciosa, mas Lulu estava com o apetite
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totalmente comprometido.
— Me deixa, por favor!
Ela pede sem paciência, e Tay bufa. Alguém toca a campainha e Lulu que já
estava de pé, pronta pra subir pro quarto, se prontifica a atender.
— Oi. Posso falar com você um minuto?
Jon estava parado na porta da sala, ainda mais abatido do que vi á minutos
atrás. Na verdade sua face demonstrava agonia e desespero.

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45
ELA NÃO ENTENDEU

Pelo ponto de vista de Jon.

Eu pergunto e ela me olha de um jeito diferente. Aquela princesa na minha


frente fora minha um dia, não dava pra acreditar, não mesmo. E eu não sabia
o que estava fazendo ali, só me toquei quando apertei a campainha, e agora
era tarde. Eu precisava ver Luiza, precisava estar com ela, era uma vontade
urgente e desesperada. Só esperava que ela me recebesse, mas nada podia
garantir isso, muito pelo contrário, as chances dela bater com porta na minha
cara eram grandes demais e eu esperava por isso. Mas ali, enquanto eu olhava
em seus olhos, ela me correspondia e eu não sabia dizer o que ela estava
sentindo, mas ainda não havia batido a porta na minha cara.
— Não. Não temos nada pra conversar. Não mais!!!
Ela diz, mas insisto e entro sem ser convidado. Dou de cara com seu irmão e
a morena rústica que nunca vi na minha vida. Quer dizer, acho que ela disse
um ‘oi’ pra mim hoje. Não sei, pensar doía!!!
— Acho que você não ouviu minha irmã, Jon. Ela disse que não quer!
Seu irmão rosna.
— Eu só preciso de um minuto, não vim para magoá-la. Só preciso conversar
com ela, por favor, deixe-me fazer isso!!!
Eu falo, Tay se levanta, pois comia algo sentado no chão e a morena se
levanta em seguida. Ela olha para ele, e ele muda totalmente seu semblante e
sua atitude, estava totalmente domado, era diferente do seu pai, era mais
controlado, controlado por ELA. Então, depois de respirar fundo, ela sai e o
leva pro andar de cima puxando-o pela mão e segurando a saia leve que ia até
o pé. Sem conhecê-la, imaginava que tinha raízes campestres como eu.
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Olho para a princesa em minha frente e vejo seus olhos vermelhos, eu tinha a
impressão que se segurava para não chorar na minha frente. Meu coração
voltou a bater naquele momento, tinha parado naquele dia, no hospital, e só
tinha voltado naquela hora, perto dela! Ela fecha a porta por onde entrei e se
senta no sofá, eu me sinto um pouco perdido e decido por segui-la e me
sentar ao seu lado. Quando faço isso, ela se afasta um pouco como se tivesse
nojo de mim e aquilo acaba comigo.
— Ana…
Eu tento fazer ela olhar pra mim, mas não funciona.
— O que você quer? Veio acabar ainda mais comigo? Me humilhar? Esfregar
na minha cara sua escolha, de novo??? — ela pergunta olhando pra frente.
— Não. Vim dizer que não sei como e nem porquê, mas… Amo você, amo
muito você!
Eu falo e ouvir isso a faz me olhar, mas não suporta. Chora e grita comigo na
mesma hora.
— VAI EMBORA DAQUI!!! AGORA!!!
Eu me levanto e me aproximo dela. Ela continua gritando e batendo em meu
peito.
— Não. Eu vim aqui pra te dizer algumas coisas e vou dizer! Primeiro me
escuta e depois pode me expulsar daqui! — eu seguro em seu braço e ela se
solta rosnando com raiva. — Desde que te vi pelo vidro daquela porta do
quarto do hospital eu sabia que você tinha feito parte da minha vida, não
precisava afirmar tudo o que afirmou, tudo o que me contou, foi só olhar pra
você e eu soube que você era especial, sabia que era minha mulher. E eu
soube, quando te vi olhando torto para minha esposa que segurava em minha
mão, que…
— EX!!! EX-ESPOSA!!! ELA NÃO É MAIS CASADA COM VOCÊ, ELA
METEU UM CHIFRE GIGANTESCO EM VOCÊ, PARTIU PRA OUTRA,
LEVOU SEUS FILHOS EMBORA E TE ABANDONOU!!! EX, JON! ELA
É TUA EX!!!
Ela grita e sinto vontade de me ajoelhar pra pedir perdão por ter dito aquilo,
não pensei antes de falar.
— Eu sei, princesa, me perdoa, falei sem pensar! Vem aqui, por favor! Não
se afasta de mim!
— Não me chama de princesa, nem de Ana, nem de nada…
— Por que não???
— Porque me lembra de quando você me conhecia, de quando era meu
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homem, de quando me amava!!! Agora eu sou só uma estranha pra você, e eu


não te reconheço, é só um estranho pra mim. Dizia ser louco por mim, dizia
querer ficar comigo pra sempre, mas foi só ter um problema para voltar pra
ex-mulher e me deixar!
— Você não entende! Eu preciso me lembrar da minha vida, quero muito me
lembrar do que vivemos. Eu só te amo demais, mas não sei qual seu nome
completo, não sei qual sua comida favorita, e não quero recomeçar, quero
continuar de onde paramos! Você me disse as coisas que eu falava enquanto a
gente se amava, me recuso a aceitar que não me lembro desses momentos, de
você comigo… quero essas memórias de volta, quero nossa vida de volta,
Ana!
Eu falo e não posso conter o choro, será que antigamente eu choraria na
frente dela??? Não sei, mas chorar assim, ali, era muito estranho, tão estranho
que enquanto ela chorava também, meu choro chamou sua atenção e ela
quase se desarmou, quase, mas manteve a armadura.
— Você é uma princesa, precisa ser cuidada, mimada… Não sei porque, mas
sinto que preciso proteger você, só não sei como. Sinto que preciso de mais
tempo, que preciso me tratar e ter minha saúde de volta para ser o melhor
namorado do mundo pra você, mas esses últimos dias, desde que voltei pra
cá, sinto que cada dia que passa, quanto mais os dias passam, mais perco
você, mais você fica distante de mim, sinto que tô te perdendo, e olha, eu
odeio com todas as minhas forças a sensação que tenho ao sentir isso. Odeio
o fato de estar perdendo você e não estou conseguindo suportar tudo isso!!!
Por favor…
Eu peço tentando abraçá-la, mas de novo ela se afasta e aquilo de novo
parecia errado, deixar ela se afastar de mim parecia muito errado. Sinto uma
dor aguda na cabeça e tento não demonstrar para não preocupá-la mas não
funciona muito bem pois a dor me deixa tonto.
— Vai embora, está com dores! Não precisa ficar aqui, não adianta discutir
comigo! Nada do que me disser vai me fazer pensar de forma diferente, é
com ela que você está.
Ela diz e vira as costas caminhando sem parar e de braços cruzados.
— Não estou com ela, é ela que está na minha casa. Ela me ajuda, mas…
— Não quero saber.
— Ela me ajuda, mas já disse a ela, eu não a amo! Tenho certeza que nem
antes e muito menos agora! Eu amo você, e quero você. Sei que não posso te
pedir pra me esperar, pra ter paciência, mas da mesma forma, você não pode
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jogar sua vida fora virando minha enfermeira, ficando magoada toda vez que
eu esquecer uma data importante, seu aniversário, seus gostos… minha
cabeça ainda está muito fraca, Ana, você não merece passar por isso! Você é
linda, não merece ficar comigo nesse estado. — continuo falando e segurando
a têmpora. Minha cabeça parecia prestes a explodir. Eu jamais poderia pedir
para aquela princesa sacrificar sua vida para cuidar de um “inválido”.
— Eu faria qualquer coisa pra repetir todas essas informações, quantas vezes
fossem necessárias, até você gravar…
Ela diz lentamente e parecia que nunca ia parar de chorar. Finjo que a dor
diminuiu e me levanto.
— Não posso te pedir pra cuidar de mim, sei que em breve cursará Harvard,
não posso me mudar e deixar meu tratamento, e nem meu emprego… não
posso sair do país e deixar meus filhos, não tenho condições de cuidar de
você, não agora.
Eu falo e ela chora ainda mais, seu choro acaba comigo.
— Não se lembra de mim, de nada, mas se lembra de vasculhar a minha vida
e saber dos meus planos como se fosse um deus. Vai embora, Jonatas!!! Veio
aqui para repetir tudo o que não pode fazer, já ouvi tudo isso, vai embora!
Ela vira de costas e eu chego perto, perto o suficiente para sentir o cheiro de
seus cabelos lindos, os longos fios dourados. Ao fechar os olhos enquanto
sentia o seu perfume, pequenos flashes me vêem a memória, mas não sei se
são lembranças ou se são imagens que minha mente inventava na hora. Seu
cheiro me deixa excitado e me causa uma tristeza e uma vontade enorme de
tê-la pra mim, ali mesmo.
— Me lembrei de algumas coisas…
Eu começo falando baixo e ela se assusta com minha aproximação ao se virar
e notar que eu invadia seu espaço pessoal, mas não se afasta.
Ela me olha curiosa, mas parece se recusar a demonstrar interesse e
questionar, por isso falo mesmo assim. Princesa orgulhosa.
—… Me lembrei de você abrindo uma porta, não sei da onde… e eu… eu…
eu entro no quarto atrás de você, acho que a gente briga, você tem uma cara
tão brava, — sorrio ao visualizar. — tão irônica. E aí eu…
— Abre as minhas pernas e faz o que sentia vontade de fazer á horas. Você
me chupa!!! — ela diz sem vergonha nenhuma e eu olho pro chão, sinto meu
rosto queimar e fico duro. — Sim, essa foi nossa primeira vez e por causa do
medo, você fez isso e fugiu de mim. Estávamos juntos no Rio Grande do Sul,
e foi uma delícia! Me apaixonei ainda mais. Depois desse dia nunca mais
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esqueci você e aí tudo desandou! Mas antes disso, quando fugi para ir pra
uma balada, você me rastreou, foi me buscar, e eu dancei colada em você,
você ficou duro enquanto eu me esfregava, mais duro do que está agora. Eu
já fui do México até o Zimbábue, Jon, mas ir pro Sul com você, foi a minha
melhor viagem, só porque foi você quem me levou.
— E como quer que eu desista de você me dizendo tudo isso??? Eu quero me
lembrar dessas coisas, sem essas memórias não sou nada! No momento Ana,
eu não sou nada!
— Você fez a sua escolha…
— Eu vim aqui dizer que amo você e eu nem sei quem você é. Isso não
significa nada pra você? Não é importante. porra???
Me irrito e ela também fica irritada ao invés de chateada.
— NÃO ME IMPORTA!!! SE VOCÊ SOUBESSE O QUANTO QUERO
ODIAR VOCÊ… NADA DO QUE VOCÊ ME DIZ IMPORTA, NÃO É
COMIGO QUE VOCÊ ESTÁ!!!
Ela se exalta e eu sorrio nervoso.
— Sua maior preocupação é ela! Pelo amor de Deus! Vem cá!!! — agarro sua
cintura e ela se debate, mas não solto, precisava fazê-la entender. — Escuta
bem o que vou te dizer, talvez ajude você a entender… desde que voltei do
hospital, durmo no meu quarto sozinho, olha pra mim, SOZINHO! Tirando
alguns, ‘bom dia’, ou ‘boa noite’, não falo com ela, não nos tocamos, não
chego perto dela, não desejo aquela estranha e não dou abertura para algo
mais íntimo com ela, conseguiu entender!? Penso em você vinte e quatro
horas por dia, menina! Mal olho para a face dela, você não sai da minha
cabeça e eu sinto que sem você estou no lugar errado. Eu amo você, mas não
te conheço e não sei como lidar com isso. Minha cabeça lida com você de
uma maneira: antes do hospital, nunca tinha te visto na minha vida, mas meu
coração pertence a você, te conhece e isso é confuso, machuca, é doloroso e
não sei lidar!!! Eu não sei lidar. Eu amo você, mas eu não sei como amo
você, porque eu “nunca te vi na minha vida”.
— Eu entendo. — ela me olha nos olhos e sinto vontade de mergulhar
naquele azul sem fim. — Entendo, afinal a culpa é toda minha, do meu pai…
e não adianta dizer que não. Mas mesmo assim não aceito. Eu não aceito
você ter terminado comigo, não me parece uma atitude do Jon que “dizia” me
amar tanto, do Jon que eu amava… você não é ele.
— Não diga isso. Não diga “amava”, você não me ama mais?
Eu pergunto, ela abaixa a cabeça e eu solto uma mão de sua cintura para
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levantar seu queixo novamente.


— Você não me ama?
— Não. Amo o outro Jon, o de antes do meu pai querer te matar.
— Mas eu continuo sendo eu mesmo, só que sem memória nenhuma, eu
esqueci de tudo, tudo o que vivi em minha vida toda, mas a única coisa que
ficou aqui, foi o meu sentimento por você. Me esqueci de quem eu era, mas
não me esqueci do quanto sou maluco por você, não me esqueci de que te
amo mais do que amo qualquer pessoa no mundo… — aperto seu corpo no
meu e ela não resiste. — Eu amo muito você, amo muito, você é a minha
vida, Ana… você é tudo o que tenho, tudo o que me restou, o único
sentimento que permaneceu quando tudo se foi. Meu amor por meus filhos
surgiu com naturalidade porque me disseram que eram meus filhos, agora
meu amor por você nunca saiu daqui, e eu te amei quando te vi lá naquele
bendito hospital, te amei ainda mais do que antes quando coloquei meus
olhos em você, tenho certeza, e passe o tempo que passar, esse amor só vai
crescer, só vai aumentar e me dará forças para levantar cedo e voltar todos os
dias, naquele hospital, só para recuperar pelo menos as nossas lembranças,
farei isso só para me lembrar de você, de nós dois, dos nossos momentos
juntos. Me lembrar de nós é minha prioridade, e se eu só me lembrar disso,
serei o homem mais feliz do mundo, simplesmente porque tenho certeza de
que minha vida se divide em antes e depois de você.
Eu digo e a beijo. Eu choro, ela chora, e corresponde ao beijo apaixonado e
cheio de uma saudade gigante. O beijo é agridoce pelo batom de cereja e
nossas lágrimas. Pego ela no colo, sento no sofá sem parar de beijá-la, e a
abraço forte. O beijo é desesperador porque estávamos do mesmo jeito:
desesperados. Mato a saudade de seu corpo com as mãos e ela parecia matar
a saudade rebolando em meu colo. Duas formas óbvias e distintas. Tiro sua
blusa, sua camisa com perfume de rosas, e seu sutiã de renda um tanto quanto
transparente. Ao vê-la assim minha dor de cabeça cessa. Esqueço que tinha
gente em sua casa, e enquanto chupo um de seus mamilos, aperto o outro
fazendo-a gemer baixinho e de um jeito que me deixou ainda mais maluco.
— Jon… pare! — ela geme.
— Não. Preciso de você, agora!!!
Volto a beijar sua boca e a deito no sofá. Tiro sua calça, seus sapatos, depois
sua calcinha do mesmo tecido do sutiã, e a chupo com muita vontade. Nesse
mesmo momento, mais alguns flashes de nossos momentos aparecem e eu
ignoro por enquanto. Ana estava ali pra mim, ao vivo, então recuperar nossas
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memórias ficaria pra depois.


Passo minha língua em sua intimidade fazendo-a gemer com a mão na boca e
alterno entre lamber, mordiscar, sugar com força e chupar como chupava seus
lábios, como um beijo de língua romântico em sua intimidade rosa-bebê. Seu
gosto é divino e não sinto vontade de sair dali nunca mais na minha vida!
Quando sinto que ela vai gozar, paro, faço ela se sentar em meu colo, beijo
sua boca com vontade, e ao sentir seu gosto em minha boca, ela pira, abre
meu zíper, e senta me fazendo quase gritar. Eu gemo alto.
— Ah! Jon!!! — ela geme demais enquanto pulava. — Oh! Eu estava com
tanta saudade! Ah! Por favor… isso!!! Ah!!!
Seus gemidos me fazem perder a razão e ela não me espera para chegar até o
céu, depois de alguns minutos fazendo um barulho delicioso enquanto pulava
em mim, ela goza muito e eu posso sentir o tanto de líquido quentinho que
deixa meu pau encharcado lá dentro. Tanto que escorre pra fora,
exageradamente, delicioso.
Deito seu corpo nu por um momento, abro bem suas pernas e estoco com
força. Jogo todo meu quadril em sua direção e ela revira os olhos mordendo o
lábio inferior. Me aproximo de sua face e ela morde minha boca por causa da
raiva e do amor que sentia, por isso bato em sua bunda e meto uma vez de
forma grosseira, como castigo… ela geme alto abafando o som com a mão, e
sinto meu músculo duro ficando quentinho lá dentro de novo. Aperto um de
seus seios com vontade, estimulo seu clitóris, puxo seus cabelos longos com
extrema raiva, estoco sem parar e repito. Ia demorar para eu me cansar
daquela princesa apertadinha.
— Você é minha princesa! Já me lembrei de mais momentos nossos, você é
minha vida, meu tudo! Não desiste de mim amor, não desiste da gente!!! —
eu peço e meto nela com mais força.
A vontade, a saudade, e a adrenalina eram como álcool e fósforo. Um perigo.
Faço ela se sentar novamente, ela rebola de um jeito atrevido, e quando passa
a pular novamente olhando em meus olhos, eu gozo dentro dela e sinto a
melhor sensação do mundo. Aquela garota era ‘a minha garota’ e nunca
deixou de ser. Pra sempre seria.
— Você será a última mulher da minha vida, eu te prometo isso! Prometo
minha alma, meu coração, minha devoção, e fidelidade á você! Para sempre,
Ana!!!
Eu sussurro enquanto ainda respirávamos com dificuldade e algumas
lágrimas caem de seu rosto de boneca que já estava úmido pelo esforço em
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cavalgar em mim. Tão apertada…


— Vamos comigo pro Estados Unidos, Jon! Largue tudo isso, eu te ajudo a
se lembrar de mim, assim, dessa forma, revivendo tudo! Por favor, amor, vem
comigo!
Ela me pede segurando meu rosto com as duas mãos, e eu me sinto um lixo.
— Não posso, vida! Me perdoa!
Eu digo, ela continua olhando nos meus olhos como se pudesse ler minha
alma, e se levanta, deixando meu fogaréu esfriar com sua ausência, e
morrendo de medo das consequências de minha decisão.
— Garanto a você que não é uma escolha entre você e ela, ela não significa
nada, eu amo você!
— Só amar não é o suficiente. Quem ama fica, quem ama abre mão. Quem
ama não tem medo, e você é o cara mais covarde que conheço! Palavras
bonitas até eu sei dizer, não sei o porquê fiz isso, nunca deveria ter transado
com você de novo, depois de tudo o que causei, depois de ter me dado um
fora colossal para voltar com a ex… sou uma idiota. Suas justificativas são
fracas, suas desculpas são de um garoto de treze anos. Me jurou amor eterno,
mas só ficou na lábia. Vai pra casa, Jon! Volte pro teu ninho “estável”. Não
quero ver você nunca mais na minha vida.
— Ana, por favor…
— VAI EMBORA!!! — ela grita. — Não ouse a me procurar novamente. Se
me procurar de novo faço meu pai e meu irmão caçar você até o inferno, e
vou comemorar namorando, casando e sendo muito feliz em Cambridge, bem
longe de você! — ela diz isso olhando em meus olhos e só Deus sabe o
tamanho do ódio que sinto ao ouvir aquilo dela, com tanta sinceridade no
olhar e na voz. — Não vou esperar por você, não terei paciência, não te darei
outra chance, quero que você desapareça da minha vida! Pra sempre!!!
— Não minta! Nunca será feliz, nunca vai amar alguém como me ama! A
gente se ama, você é minha e eu sou seu! Não pode fazer isso comigo, vai me
esperar, você tem que me esperar!
Eu imploro vendo ela se vestir e ela ri irônica.
— Espera pra ver!!!
Ela diz, e eu fico ali, perdido e desolado. Assim que termina, caminha até a
porta, abre e me expulsa de sua casa e de sua vida.
— Não posso ir embora com você assim, irritada comigo, brava desse jeito!
— Veio aqui, conseguiu o que queria, eu caí na tua, conseguiu me comer…
agora volta para aquela sua vida de mentira, que é isso o que você faz de
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melhor! Quando cair na real e ver a merda que está fazendo, vai ser tarde.
Brava eu já estava desde o início… desde sempre! Nunca teve um dia que eu
não estivesse furiosa com você, até nos momentos bons, mas agora acabou,
Jon! Acabou! Se você não sair, eu vou gritar!
Ela fala olhando pra porta e minha tristeza volta. Como pode amar tanto, mas
me odiar tanto ao mesmo tempo? Eu era um maluco fissurado em uma garota
que parecia inocente, mas era o caos quando eu menos esperava. Ana Luiza
era o meu caos, literalmente minha vida do jeito que estava atualmente!
— Eu vou, mas não vou desistir de você, NUNCA!!! Se pensa que vou, tire a
bolsa de grife da chuva. Mimada, teimosa! Amo você!
Eu digo fazendo ela olhar pra mim, saio dali com raiva e ouço a porta bater
furiosamente atrás de mim. Viro para olhar e vejo seus pés pela fresta. Podia
apostar a minha vida que Luiza sofria e chorava feito uma criança. Me
aproximo da porta, penso em bater, encosto minha testa, fecho os olhos e fico
ali me sentindo próximo dela e me lembrando do nosso momento
maravilhoso e surreal no sofá, de alguns minutos atrás. Ana se entregou pra
mim e ao negar seu pedido para seguí-la até os Estados Unidos, tirou de mim
toda minha força, determinação, e “alegria momentânea”, Ana Luiza me tirou
o pouco que eu tinha, mas eu saí de lá mais ‘pesado’ do que entrei. Era
irônico! Nós, ela e toda a situação. Eu definitivamente amava aquela menina,
e parecia que ir atrás dela para os Estados Unidos, era o que o Jon de antes
faria sem pensar, mas pra mim era impossível.
Paro de chorar, caminho até minha casa, e a encontro sentada no sofá,
acredito eu, me esperando.
— Onde você estava? — Sara pergunta de forma direta.
— Não importa. Não é da sua conta. — passo direto e ela me segue.
— Me diga! Estava com ela? Aquela criança patricinha que nem saiu das
fraldas???
— Sim. — falo olhando em seus olhos e ela ergue a cabeça.
— O fizeram? O que você fez???
— Acho melhor você não perguntar, senão, vou responder. Eu a amo e isso
nunca vai mudar.
Eu digo, ela abaixa a cabeça e eu viro as costas me perguntando o que seria
de mim sem minha princesa mimada. O que seria do Jon-sem-passado, sem
Luiza, seu maior presente?

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46
AGORA, MARIDO

Me abaixo apoiando em uma perna só e toco levemente o círculo enorme


aonde Jon quase foi morto. Ali nunca mais nasceu mato nenhum, nada. Duas
semanas se passaram desde que ele esteve em minha casa procurando por
Luiza e depois daquele dia, nunca mais a procurou, eu acho.
Hoje é a véspera de meu casamento com Ellen, o nosso grande dia,
agilizamos todos os preparativos por pura pressa, eu não via a hora de tê-la
como minha esposa, e ela também estava ansiosa, acho que não mais do que
eu, mas estava.
A chácara estava cheia, Ritinha recebeu uma liberação do médico para
participar, e até Dobby que tinha ficado com seu Renan aqui na chácara
estava de gravatinha, sem coleira, correndo e matando a saudade de Lulu. O
cão estava enorme.
— Não quero saber de mulheres nuas nessa despedida!
Ouço sua voz atrás de mim e sorrio.
— Despedida de solteiro tem de tudo!
— Se eu souber, anulo o casamento!
Ellen me beija e me olha nos olhos.
— Ciumenta.
Eu resmungo e vejo meu pai se aproximando.
— Ellen, preciso te mostrar uma coisa, pode vir comigo, um momento?
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Ele fala e Ellen sorri pra mim. Não suportava homem nenhum perto dela, e
meu pai não ficava de fora, meu pai era um homem bonito, forte, e os dois
faziam um par tão estranhamente perfeito, que vê-los juntos me corroia!
Confiava em ambos, mas ainda sim, me deixava incomodado.
— Claro, sogro! — ela diz e me beija.
— Seja breve! Quero minha noiva de volta!
— Agora ela é minha. Só vai vê-la amanhã, talvez…
Meu pai diz para me provocar, e nós três rimos, mas meu riso é de puro
nervoso.
— Largou o preto de vez. Você fica muito bem de branco, imagine de outras
cores… já vou dizer que meu presente de casamento são diversas camisetas
coloridas.
Jade se materializa do meu lado e quase pulo de susto. Sorrio para ela e ela
continua. Minha decisão de mudar as peças de roupas devia-se ao fato de que
dentro de um dia minha vida “mudaria completamente”, eu estaria casado
com a mulher que eu amava, formando uma família “de verdade”, pretendia
mudar e ser um pai melhor para minha filha, e sair daquela escuridão, tanto
nas roupas quanto na vida, era meu primeiro passo.
— Tem ciúmes de seu pai?
Ela pergunta já sabendo a resposta enquanto nós dois via Max e Ellen
desaparecer em direção a cabana.
— Tenho ciúmes até da minha sombra, Jade! — eu falo e ela ri.
— Os dois se amam muito. Mas como família, não existe maldade!
— Bom saber… — eu respiro fundo e me coloco em sua frente. — Agora me
diga cigana, como será o dia de amanhã?
Eu pergunto e ela toca meu rosto ao falar.
— Você é corajoso. — ela sorri. — Será incrível.
— Você não me parece profetizando.
— Eu não preciso, não dessa vez. Apenas sei.
Ela diz e vira as costas seguindo seu caminho em direção ao casarão.
— Jade… — eu chamo, e ela se vira para me olhar. — Você me salvou mais
de uma vez, sempre me ajudou, protegeu minha família… existe alguma
forma de retribuir o que fez por nós durante todos esses anos?
Eu questiono e ela sorri.
— Uma parte de você está comigo, uma parte de mim está com você. Sua
família é minha família. Quando Catarina completar dezoito anos, minha
filha mais nova completará também, e nesse dia eu partirei. As duas serão
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unidas, e você vai salvá-la em um determinado momento, vai cuidar dela


como se fosse sua, e aí, sua “dívida” comigo estará paga.
Ela fala e eu me aproximo assustado.
— Partir pra onde?
— Vou descansar…
— Como???
— Não importa agora! Fica tranqüilo, menino ansioso!
— Jade… você… não!!! — eu me desespero e ela sorri.
— Achou que eu ia ficar aqui pra sempre?
— Achei.
— Estou cansada, Tay. Se eu pudesse, partiria antes, estou muito velha…
— Velha??? Tá maluca?
— Quantos anos acha que tenho, menino?
Ela pergunta e me sinto estranho. Eu daria 22 fácil, fácil.
— E os seus sei lá, milhões de filhos que você ajuda? Vai deixá-los???
Mudo de assunto de propósito.
— Rubi terá dezoito, será maior e responsável, é a mais nova e a última.
Passarei para ela tudo o que sei e ela cuidará de Catarina, cuidará de você,
por mim! E meus filhos, bom, serão adultos e terão você, terão Rafael, nossa
família.
Jade sorri como se tivesse falando sobre receitas de bolo de chocolate.
— Você fala como se tivesse escolhido a data! É isso, não é!? E ainda vai me
deixar outra filha pra cuidar, tá de brincadeira comigo? Não pode fazer isso!!!
— Posso e vou!
Jade fala e toca meu rosto de novo, demonstrando “sentir muito”, parecendo
dizer que a conversa tinha acabado ali pra ela.
— Ah, sem essa…
Me sinto péssimo com aquilo e saio dali deixando-a sozinha. Como assim,
“vou partir”, Jade tinha enlouquecido… bom, já estava na hora, só restava
ela, ou na verdade sempre foi uma maluca, só eu que não tinha notado antes.
Muitos convidados tinham vindo para Minas antes, mas alguns deixaram para
a véspera mesmo… Íris, Kall, tia Martha e os restante da família do sul já
estavam todos presentes. Enchemos a casa e a pequena cabana de Ellen de
camas de solteiros e contabilizando quem a gente tinha hospedado em um
hotel, couberam todos de forma confortável. A família Coverick, e a Família
Maia estavam se dando muito bem e já ouvimos rumores até de romances
entre as famílias. Os primos sulistas chegaram e gamaram nas primas
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selvagens de Ellen, e eu já esperava por aquilo.


Laura e Yan chegaram e logo em seguida um tal de Vicente também, disse
ser o melhor amigo de Ellen e que ficaria hospedado com Dona Isa e seu
Renan. Foi só olhar para ele que eu já vi que não ia descer, mas eu estava
feliz demais para ter crise de ciúmes.
— Bom, Ellen já foi para sua despedida… está na hora da sua!
Meu pai fala, e Laura bate no quarto alguns instantes depois.
— O que faz aqui??? — Max pergunta e ela sorri.
— Estou a caminho da boate para a despedida da selvagem, só vim fazer um
favor para Hella, ela está na clareira e disse para dar um pulo lá, que
precisava da tua ajuda…
Ela diz, meu pai franze o cenho e obedece. Com minha mãe grávida de novo,
meu pai ficava em estado de alerta constante, não saía de perto dela.
— Me chamou? Posso saber o porquê fiz isso?
Ela pergunta apontando para meu pai, e eu olho para a noite estrelada lá fora.
— Quero que sequestre a Ellen.
Eu digo e a vejo revirar os olhos.
— Já disse que pesquisei, Ellen fez o que combinou contigo, sem Ricardões
com volume gostoso na cueca, sem azaração, sem traição free, nada de "noite
das garotas", só uma baladinha de leve. E estou indo junto, me certificarei…
— Eu sei. Mas ainda sim, quero que a sequestre. Tire ela da boate e a leve
para esse endereço.
Entrego o papel em suas mãos e ela ri ao ler.
— Sério!? Despedida de solteiro com a própria noiva? Tay não seja tão
brega…
— Só faça o que estou mandando.
— Yan não vai gostar…
— Temos um pacto, nossa parceria não vai morrer porque você vai casar com
o mala e ficou prenha! Se esqueceu de nossa promessa? Tudo mudou? Não
me traia!!! Não agora…
Eu falo e ela bufa.
— Só faço se pedir desculpas e chamá-lo pelo nome!
Ela me diz séria, cruza os braços, eu pego meu casaco na cama, me visto, e
paro em sua frente olhando bem em seus olhos antes de sair.
— Não.
Respondo e saio dali em direção ao meu carro. Eu já tinha combinado com
todos os homens da família que minha despedida não ia acontecer e que era
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segredo, todos iriam para o barzinho que escolhi, mas sabiam que eu não ia
aparecer, menos meu pai, que nunca concordaria com aquilo. Ele só saberia
na hora… já Ellen estava a caminho da boate escolhida pelas mulheres, ela só
não sabia que não ia ficar lá por mais de uma hora.

Dirijo por quinze minutos no KM13 seguindo para Três Rios e chego ao meu
destino. Uma pousada maravilhosa e romântica no meio do mato.
Acerto a parte burocrática, sigo até o quarto, e vejo o quão lindo tudo foi
arrumado, velas, champanhe, pétalas de rosas, e comida quentinha em uma
pequena mesa de jantar maravilhosa, á luz de velas, é claro.
Eu não me sentia brega, não… eu só não tinha conseguido ficar perto dela o
dia todo, e nem ontem, muita coisa pra resolver, buffet, decoração,
convidados, atenção para os familiares… eu não queria ir para uma balada,
encher a cara, ver mulheres nuas, e tratar meu futuro casamento como se
fosse uma maldição eterna, como se eu tivesse que aproveitar aquela noite
porque depois do grande dia, eu nunca mais seria feliz… não. Eu não queria
saber de nada, só queria ela, todos os dias, toda hora, e sempre que desse, até
na véspera do meu casamento, porque eu amava Ellen mais do que tudo no
mundo, MESMO!!!

Sirvo-me de vinho porque estava nervoso demais e caminho até a enorme


janela/portas abertas que davam para uma área coberta do lado de fora, com
almofadas no piso de madeira, velas, e vasos com flores, tudo aberto, tudo de
encontro com a natureza quase silenciosa, quase. Parecia um ambiente para
fotografar e publicar em revistas caras… já me imaginava com ela ali, e sabia
que ela ia amar.
A noite estava quente e calma, o tempo estava passando e eu a cada minuto
que passava ficava mais nervoso, ansioso por vê-la. Decidi então pensar em
outra coisa, o pedido de demissão negado pela FAB, a profecia que Jade
contou a respeito de Catarina, a carinha triste de Lulu durante a recepção
toda, a carranca do Yan pro Renan, minha mãe quase enlouquecendo meu pai
e sendo mimada por ele de diversas formas, meu pai que ligou para Jon um
dia antes e o convidou para vir ao casamento… alguns acontecimentos que de
fato mereciam minha atenção ou preocupação, mas não era bem assim, Ellen

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tomava conta de meus pensamentos, sua demora ao chegar era a única coisa
que me deixava nervoso.
Meia hora depois, Laura abre a porta e entra com Ellen vendada no quarto,
sorrio ao ver seu sorriso. Ela deixa Ellen no meio quarto, pisca pra mim e vai
embora sem dizer nada.
— Ei, tô sentindo seu perfume. Sei que está aí, posso tirar isso?
Ellen continuava sorrindo. Estava vestida com um vestido preto brilhante
mais curto do que deveria, saltos altos, cabelos soltos, e acho que estava
maquiada também, mas a venda estragava tudo. Me aproximo dela, beijo seu
pescoço, sigo em linha reta até sua boca, e após um beijo com ela ainda
vendada, tiro a venda devagar, e ela pula em meu pescoço quando me vê.
— Você é maluco. Por que fez isso? — ela ri. — Tô com tanta saudade,
amor, tanta saudade. Fiquei triste hoje, só pensei em você. — ela diz baixinho
no meu ouvido, manhosa. — Muita saudade, meu denguinho!
— Eu também estava, por isso te sequestrei. Não aguentava mais de saudade.
Sei que é assim que funciona e que deveríamos nos separar nas vésperas, mas
não consegui, não consegui ficar longe de você, não quero mais dividir sua
atenção com aquele mundaréu de parentes, quero minha mulher só pra
mim… Pelo menos nessa noite.
Eu digo e ela se afasta um pouco.
— Achei que me tirou de lá por ciúmes. Te disse que não teria homens e nem
nada do clássico… — ela me aperta dengosa e me enche de beijo — Eu sei,
confio em você, apesar de saber que essas coisas quase nunca fogem do
clássico e vocês mulheres, se unem para aprontar… — dou risada. — Estou
brincando, sei que é fiel ao nosso relacionamento, sou eu que não quero
despedida, mulheres nuas, nada disso! Te pedi em casamento porque te amo
muito e quero ficar contigo pra sempre, faz muito tempo que me despedi
dessa vida de balada, não preciso fazer isso hoje, não quero fazer. Quero
você!!!
— Teremos uma lua-de-mel pré e pós!? — ela ri.
— Não precisa ser lua de mel, pode ser uma despedida para ambos, um
último jantar ainda solteiros, — mostro a mesa decorada, segurando em sua
mão. — uma conversa sobre a vida como daquela vez no bar da vila que você
me levou, também não precisamos fazer nada ou falar nada, só ficar aqui. —
eu a levo para o ambiente externo do quarto. — vendo as estrelas, curtindo o
momento…
Abraço a selvagem e me sinto feliz.
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— Ou podemos ter nossa pré lua-de-mel, conversar sobre qualquer coisa,


ficar nus de novo, jantar, se amar em cima dessas almofadas, e me pegar de
quatro no banho!
Ela diz de um jeito sexy e fico duro.
— Ellen…
Eu resmungo sem saber o que dizer e ela se coloca em minha frente.
— Eu te amo, Tay. Desde menina eu amo você com todas as minhas forças.
Sou capaz de fazer qualquer coisa por você, por nós dois e tenho certeza que
te amarei até o infinito, até depois do fim. Você é tudo o que desejo.
Ela toca meu rosto e eu a amo por isso. Fecho meus olhos e posso sentir seu
amor no ar, era palpável.
— Faça amor comigo, tô morrendo de saudade de fazer amor contigo, meu
corpo sente falta do teu… muita falta.
Ela sussurra de um jeito que me mata e eu não perco tempo, beijo sua boca
com toda a paixão que eu sentia, me sento nas almofadas do chão, trago ela
pro meu colo e sinto suas mãos abrindo meu zíper. Sinto vontade de rasgar
aquele vestido maldito e chupar todo o seu corpo, mas ela não me dá chances,
coloca sua calcinha pro lado e senta em mim, se encaixando e fazendo de nós
dois, uma só pessoa.
— Posso saber o porquê vestiu um vestido tão curto para ir pra uma balada?
Pergunto enquanto ela rebolava com meu pau todo dentro dela. Não entendia
como ela conseguia dar pra mim quase todos os dias e ainda permanecer
apertadinha. Tentação.
— Pensei em invadir seu quarto quando eu chegasse, ontem e hoje mal nos
vimos, queria fazer uma surpresa rapidinha para matar a saudade. Me vesti
pra você. Fico de mau humor quando não cavalgo em você.
— É mesmo!?
— É. Se soubesse a vontade que eu tava de você me foder…
— Tão romântica…
Resmungo e ela ri jogando a cabeça pra trás. Começo a falar outra coisa, mas
ela tapa minha boca e rebola com mais vontade me fazendo ver estrelas. Tiro
todo seu vestido e lingerie, e a deixo nua, fazendo sua pele eriçar. Só sobrou
sua calcinha vermelha minúscula que estava toda torta, rachando a metade de
sua intimidade e aquela cena me deixava maluco.
Ela pula algumas vezes, volta a rebolar com intensidade mostrando que
estava chegando lá, me chupa me olhando dentro dos olhos, e ao vê-la dessa
forma, gozo junto, dentro da boca dela.
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— Você é tão gostoso… quero mais!


Ela diz e não perde tempo nenhum, me chupa ainda mais, e geme alto
deixando meu músculo duro de novo quase que imediatamente.
— Oh, minha nossa… isso, delícia. Ah! Mas eu também tô com saudade,
amor. Senta aqui na minha boca, senta! Me deixa sentir seu gosto, quero que
goze na minha boca, gostosa!
Resmungo com dificuldade e ela para. Olha para mim com cara de safada,
tira algumas almofadas das de trás de mim, me faz deitar, e senta em minha
boca ficando de quatro na minha frente e retomando o trabalho que fazia
antes. Eu chupava sua intimidade já podendo sentir seu líquido quente descer
pela minha garganta e eu não via a hora de gozar na boca dela, de novo. Ela
mamava tudo e eu desejava naquela noite, outro lugar para explorar.
Ellen rebolava na minha boca e seu líquido precioso vazava um pouco pela
minha bochecha, eu me esbaldava. Minha mulher era apetitosa e estava ainda
mais nessa noite. Totalmente depilada, suas sobrinhas carnudas me davam
vontade de morder de tão suculentas e aveludadas que estavam. Molhadinha,
lisinha, adocicada, e apetitosa… eu chupava com vontade sugando tudo, e em
resposta, ela não mantinha a cintura parada, afundava seu botão de rosa com
gosto de mel em minha boca e eu delirava.
Assim que gozamos um na boca do outro gemendo muito e acabando com o
silêncio daquela floresta que nos espiava, sorrimos nos olhando que nem
bobos. Ela deitou no meu peito e me olhava como uma boba apaixonada, e
sorria docemente.
— Você é tão linda… tão deliciosa. Seu gosto é divino, amor! Divino!!!
Eu sussurro e ela esfrega sua intimidade no meu pau de novo. Filha da puta.
— E olha como você me deixa… você me deixa louca!
Ela sussurra e eu fico duro outra vez.
— Deixo é?
— Deixa.
Ela sorri um sorriso lindo.
— Dá pra acreditar que amanhã seremos mais do que namorados?
— Só teremos um papel para confirmar o que sempre soubemos. Eu sou tua e
você é meu, seremos marido e mulher oficialmente, mas tem algumas
semanas que já somos!
— É especial, será o dia em que verão a mulher mais linda do mundo
caminhando em minha direção, se casando comigo… todos os holofotes
estarão em você, mais do que o normal, e eu vou sentir vontade de acelerar a
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celebração só para ter você só pra mim!


— Não ouse a sequestrar no meu próprio casamento.
— Pois não ouse me proibir. É minha, só minha, e se eu achar que devo te
sequestrar, vou fazer isso.
Eu digo e ela não discute, apenas me dá um selinho rápido. Ficamos ali por
um momento, jantamos á luz de velas, nos amamos ainda mais, conversamos
sobre nossos planos, nos amamos na cadeira após jantar, depois mais um
pouco, e logo em seguida partimos dali em direção a chácara. Ellen dizia que
precisava dormir, descansar, ou no dia seguinte eu acabaria me casando com
um par de olheiras… mas tudo o que eu mais queria era continuar amando
minha deusa selvagem, e sentindo seu gosto viciante descendo quente pela
minha garganta.
— Onde estava?
Assim que estaciono no lago, meu pai nos aborda.
— Em um hotel, na nossa despedida de solteiro.
Eu falo rindo e Ellen sorri toda tímida por causa do meu pai. Abraço ela por
trás e ela consegue sentir meu músculo duro novamente em seu bumbum,
exclusivamente por sua culpa. Ninguém mandou vir o caminho todo me
instigando, acarinhando e lambendo a cabecinha enquanto eu dirigia… estava
frustrado por não ter gozado de novo.
— Nunca consegue seguir o clássico, não é!?
Ele ergue uma sobrancelha e eu dou risada, mais ainda.
— É que seu filho me ama demais, capitão! Não tinha porque ir a uma boate
se me tem como noiva.
Ellen resmunga e me dá as mãos para entrar no casarão.
— Ele faria a mesma coisa… — eu cochicho e ela ri.
— Pois você, — ele entra em nossa frente, barra nosso caminho e olha para
Ellen. — vai dormir, agora! E você, — ele toca meu peito com o indicador.
— tem uma despedida de solteiro pra cumprir! Se fugiu do clássico com
algumas vadias, não poderá fugir da despedida ousada de pai e filho!!!
Ele fala e tem aquela cara que faz quando não poderia dizer tudo, e não posso
recusar.
— Vou levar minha mulher até a porta do quarto dela. Já venho.
Digo depois de pensar um pouco e puxo Ellen pelas mãos.
— Aonde será que ele vai te levar?
Ela pergunta assim que alcançamos o corredor.
— Acho que para um bar, conversar sobre paternidade… — dou risada. —
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Eu acredito que ele tem algumas coisas para me falar já faze alguns anos.
Não se preocupe com nada, amor. Volto logo!
— Promete que…
— Prometo. Eu te amo! Sou seu, sou fiel, e nunca vou desejar mulher
nenhuma porque você é o suficiente pra mim.
Eu sorrio para ela e vejo seu semblante preocupado. Ellen não sorri pra mim.
— Assim que eu voltar colocarei uma rosa ao seu lado na cama, assim,
quando acordar, saberá que está tudo bem e que nada mudou! Sou maluco
por você, te amo mais do que á mim mesmo!
Eu falo, ela enfim sorri, dou um beijo em sua boca, e saio dali em direção ao
lago. Meu pai me esperava no mesmo lugar.
— Qual é o lance? — pergunto.
— Você, eu, meu presente, na floresta, agora.
Ele diz colocando um silenciador em sua arma maravilhosa, — de costas para
o casarão. — a que ele ganhou de presente da Lulu, e sorri diabolicamente.
De repente seu olhar procura por alguma coisa e cai na direção das janelas do
casarão. Ele sentia que estava sendo observado, e “o curioso” era Ellen. Ela
olhava para nós dois da janela e dali eu não sabia dizer em qual estado estava
seu humor.
Fico mais do que curioso com a ideia do meu pai e o sigo em direção a
clareira, passamos pela cabana, e depois entramos na mata densa morro
abaixo. Caminhamos por uns quatro minutos e logo chegamos ao nosso
destino. Ali as árvores eram cumpridas e juntas, dando uma sensação de
filme de suspense inacreditável, e o que “piorava” a sensação era a névoa
branca de neblina que cobria a extensa área. Vi algumas silhuetas próximas
as árvores, e enquanto caminhava com dificuldade por causa da escuridão, vi
que tinha alguém sentado em uma cadeira no meio do “círculo” que as
pessoas faziam. Ao me aproximar reconheci todos, era Laura, Yan, Jon, e um
cara que não conheço.
— Posso perguntar o que está havendo?
Eu começo e meu pai entra na minha frente.
— Na época da sua viagem, me reuni com Laura e quis saber a respeito dos
planos de vocês para Santos e Julia, ela me contou que já tinha dado um jeito
em Julia e que o próximo passo seria encontrar Santos antes que ele abrisse a
boca. Pedi que ela o encontrasse e o deixasse sobe cárcere até o momento
certo. Precisava cuidar de tudo, você não estava aqui, precisava garantir que
os dois não tivessem juntado nada contra vocês para jogarem no ventilador
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por meio de terceiros depois que ambos subissem. Cuidei de tudo, recolhi as
“provas” em potencial e esperei. Achei um bom momento para acabar com
ele, sua verdadeira despedida da “vida de solteiro”, a vida que você levava
antes de Ellen voltar para ela. Quero que acabe com ele hoje, e nunca mais
faça isso de novo, por Ellen e por Catarina. Nunca mais!
Meu pai fala e tira o saco da cabeça de Santos. Ele estava amordaçado e
desacordado. Olho para Jon e ele não parecia tão “esquecido” assim, Laura
tinha seus olhos brilhando de excitação, e Yan me olhava de cabeça erguida,
parecia estar acostumado com o que ia ver, aliás, parecia querer tanto ver
aquilo como qualquer um ali. Já o outro rapaz tinha a postura de segurança e
eu podia apostar que era capanga ou de Laura ou de meu pai, e que estava ali
para fazer o serviço sujo, (se livrar do corpo).
— Depois vamos conversar bem sério sobre fazer as coisas sem me informar!
Principalmente assuntos que dizem respeito a mim!
Falo olhando para os dois e tento não me sentir “traído” com a atitude deles.
Eu tinha voltado e relaxado, deixando Ellen até sair sozinha na rua enquanto
aquele verme estava “solto”… mas que merda!!!
— Quando quiser…
Meu pai fala, sai de perto do filho da puta, e se coloca do meu lado. Pego a
arma de sua mão, pois a que carregava comigo não estava silenciada, e
disparo para acabar logo com aquilo. Nenhum barulho foi feito, Santos
continuou quieto como já estava, só que agora estava morto. Menos um.
Devolvo a arma para ele e me aproximo de Jon.
— Do que você se lembra???
— Graças à bruxa, só do conveniente pro teu pai. Só dá vida que eu levava
como funcionário dele. Ela meio que me deixou em transe, lembrei de muita
coisa com relação a isso…
Ele diz olhando para o corpo, na parte que diz “com relação a isso”.
— E voltou a ser leal?
— Nunca deixei de ser.
Jon resmunga e me sinto triste por Lulu. Ele estava ali a mando de meu pai,
de novo, não por ela, dela ele ainda nem se lembrava. Me perguntava porque
Jade não tinha feito o trabalho completo e a resposta surgiu na minha cabeça:
Jon teria quatro anos para se lembrar sozinho, tempo que Lulu tinha para ir
embora e terminar seus estudos. Isso era meu pai dando um de ‘Deus’ na vida
dela, de novo.
Paro pra pensar, penso... penso... e concluo: era melhor assim. No momento
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era melhor deixar as coisas como estavam, e Lulu voltar a pensar somente em
seu futuro.
— Seja bem-vindo a vida de “bom moço”!
Laura se aproxima de mim, diz, me abraça, e eu correspondo olhando para o
outro “pai” de minha filha que não parecia se incomodar nenhum pouco com
aquela aproximação.
Ouço meu pai conversar com o cara e ele logo retira Santos da cadeira e some
com ele dali para mata adentro. Carregava seu corpo como se fosse um saco
de estopa.
— E esse cara!?
Questiono assim que ele sai.
— É um dos meus. Confiável. Foi o líder que me ajudou pegar a vadia.
Laura resmunga e diz com o olhar que eu podia confiar. Respiro aliviado,
pois confiava nela.
— É estranho saber que nunca mais farei isso! — eu falo e ela ri.
— Existe tiro ao alvo! Se acostume. Sua vida vai mudar, precisa manter sua
mulher e sua filha longe de tudo isso, fora de perigo. Precisa ser o herói que
ela acredita que você seja.
Meu pai responde e Laura confirma com a cabeça.
— Existe mais alguma coisa que eu precise saber?
Pergunto olhando para ela e ela faz cara de tacho.
— Ela não morreu da forma como combinamos, dei um tiro em sua testa, foi
rápido, sem sofrimento. Eu estava nervosa e me deixei levar.
Ela diz simplesmente, e a impressão que eu tinha era que ela acreditava que
era meu direito saber daquilo. Falou de uma vez.
— Pois bem. Acho pelo menos isso eu devia á ela, talvez fizesse dessa forma.
Apesar de tudo, tivemos um relacionamento.
— Ela era uma vadia nojenta.
— Que seja, Laura!
Dou de ombros e viro as costas, queria fugir da presença da morte. Era a
véspera do meu casamento, eu só queria energias boas, e amor ao meu redor.
Se eu soubesse disso, teria esperado mais para mandar aquele filho da puta
subir.
Caminhamos de volta assim que meu pai se livrou da cadeira e da corda que
estavam ali, e ao subir a pequena ladeira de volta para o caminho da cabana
de Ellen, sinto o perfume dela no ar.
— Alguém esteve aqui. — Jon resmunga.
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— Ellen.
— Ellen.
Eu, Laura e Yan falamos ao mesmo tempo. Olho para ele e não entendo o
porquê ele ainda reconhecia o cheiro da minha mulher. Por que aquele ódio
por ele não passava?
Meu pai me olha preocupado e faço ‘não’ com a cabeça, não era isso o que
ela sempre pedia? Para ver? Pois ela viu. O problema agora era continuar
querendo se casar comigo depois de ver o monstro que eu realmente era.
Penso em ir atrás dela no quarto, mas paro pra pensar. Eu era o que era, se ela
se recusasse a se casar comigo, assim seria. Eu posso querer obrigá-la a fazer
certas coisas estando comigo, — na real nunca consegui fazer isso. — mas
não podia forçá-la a ficar comigo, isso não dava, não estava em minhas mãos.
Deixo ela ter o resto da noite pra pensar no que viu, mas o medo de sua
reação não me deixa dormir. Eu pensava, pensava, pensava, minha cabeça
dava voltas e sempre caía na mesma cena: Ellen não aparecendo no altar e me
deixando lá, plantado… morrendo de dor, tristeza, e com um sentimento de
abandono sem tamanho. Será que ela me amava o suficiente para não deixar
que a cena que viu mudasse suas vontades? Seu sentimento por mim? Seu
desejo de estar ao meu lado? Será que Ellen me amava na mesma medida que
eu a amava, o suficiente? Porque se fosse o contrário, não a deixaria sair
daquela chácara sem estar casada comigo, não tinha a menor possibilidade,
não importava o que ela fizesse.
O dia amanheceu lindo, nem o frio apareceu, parecia que os anjos queriam
esse casamento e queriam que fosse perfeito. Assim que levanto da cama,
Jade entra no quarto sem bater e eu me assusto.
— Acho que precisa de mim. — ela logo diz.
Coloco minha camiseta e tento me esquecer de nossa última conversa.
— Então responda minha pergunta mental… já que é tão boa nisso.
Eu falo mau humorado e ela me abraça mesmo eu não correspondendo. Só
fico parado ali, enquanto ela me dizia “bom dia” sorrindo.
— Ela te ama mais do que ama qualquer pessoa no mundo. Para de ter
medo… agora vem, preciso te apresentar a uma pessoa!
Ela me pega pela mão, mas eu me solto.
— Espera um minuto, preciso pelo menos escovar os dentes…
Eu sigo para o banheiro e faço minha higiene, como assim ela queria que eu
levantasse e saísse daquele jeito? Vou com ela até um dos quartos e um
homem me esperava. Ele vestia roupas extravagantes, mas muito requintadas,
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muito estiloso.
— Oh! Minha nossa…
Ele exclama com a mão na boca ao me medir de cima á baixo.
— Meu Deus! Mãe, bem que você falou, ele parece uma versão mais
maravilhosa do Thor… Ou seria o Arrow!? Bom que seja, ambos são bons.
— ele ri de um jeito muito engraçado. — Prazer! Pode me chamar de Bia!
Ele fala com uma voz muito gay, e eu olho para Jade. Sério que era isso o
que ela dizia de mim? Bia vestia um colete com pentes e tesouras pendurados
nele, o cabelo joãozinho com a parte da frente caindo no olho, usava
maquiagem, e eu tinha a impressão de que por trás de toda aquela aparência,
foi uma pessoa que sofreu muito na vida. Muito mesmo.
— Oi, Bia. Sou Tay...
Eu digo e ele pisca pra mim.
— Senta aqui, príncipe Tay, vamos dar um jeito nessa ‘prova clara’ de que
não dormiu a noite toda, mas não será muito difícil te deixar divo!!!
Ele dá pulinhos e Jade sorri, não pude evitar sorrir também.
— Tay esse é meu filho lindo, o mais velho, também o adotei, ele é
cabeleireiro e vai cuidar muito bem de você! — ela sorri para mim e eu digo
‘sim’ com a cabeça — Se comporta viu, meu amor!!!
Ela fala com ele, dá um beijo carinhoso em seu rosto, e se retira dali.
— Obrigado Mami! Óbvio que vou me comportar, só não posso dizer o
mesmo do nosso Thor aqui… — ele nos faz gargalhar. — Agora sai para eu
me concentrar!!!
Ele fala com a Jade e ela logo obedece.
O rapaz tagarela o tempo todo e cuida de tudo, era nove da manhã quando
começamos. Mexeu no meu cabelo curto, garantiu que só ia meter
maquiagem na minha olheira, deixa minha barba melhor do que eu imaginava
e por fim, me faz parecer gente.
— Pronto, Thor, olhe para você!!!
Ele exclama com orgulho me puxando em direção ao espelho, e eu sorrio.
Estava um galã mesmo, modéstia à parte.
— Obrigado! Você fez um belo milagre!!!
Eu resmungo me sentindo bem e ele pisca todo derretido.
— Que isso, você é lindo… ainda está cedo, sua farda estará aqui em pouco
tempo. Pode ir dar uma volta para ver como a decoração que sua futura
esposa escolheu ficou, tô amando tudo! Ela é a rainha da décor rústica
deluxe! Ameeei!!!
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Ele fala sorrindo, me despeço e desço para a sala lotada. Recebo


cumprimentos, a tropa para a cerimônia militar chega, alguns amigos meus, e
mais familiares do sul que estavam hospedados nos hotéis.
— Como você está? — meu pai pergunta.
— Tô bem. Cadê todo mundo? Mamãe, Cat, Luiza, Nina???
— Estão com Ellen.
— Então ela não desistiu…
— Não e nem vai. Ela te ama. Nada do que viu ou ouviu lá, era segredo. Ela
sempre soube e te aceita assim.
Ele bate nas minhas costas, e eu sigo meu caminho para fora. Dou de cara
com uns três fotógrafos, tirando fotos e filmando tudo, toda a decoração
estava localizada no grande pasto vazio, mas uma pequena parte dela estava
espalhada por todos os lugares. O cercado estava aberto, os bancos de
madeira bem no meio do campo aparado estavam de modo clássico, com um
caminho no meio, igual das igrejas, e ao invés de tapete vermelho eram
pétalas de rosas brancas que demarcavam o caminho que Ellen faria para
chegar até mim. Eram muitas pétalas, parecia neve, um verdadeiro conto de
fadas!
Nas cadeiras tinham mudas de flores do campo com fitas grossas de cetim na
cor lilás, o arco antes e depois do caminho, também tinha diversas flores e o
cheiro de Ellen estava ali, por toda a parte. No outro extremo do campo
também tinha tudo, uma pequena pista de dança, mesas dos convidados
decoradas com latas de azeite antigas que serviam como vasos vintage para as
flores, as mesas do Buffet feita com pallets e decorada de muitas formas,
incluindo nossas iniciais, lanternas que seriam acesas assim que o sol se
pôr… Tudo vintage, rústico, alguns itens reciclados, mas ainda sim luxuoso,
a cara dela! Milhares de comidas mineiras, bebidas para todos os gostos,
sobremesas diversas, opções veganas, e muito mais, com fome ninguém ia
sair dali!
As lembranças eram pequenos kits com sementes de árvores, sachês de
comida orgânica para gatos e cachorros, perfumadores de ambientes naturais,
ramalhetes de incensos naturais, e além de tudo isso, no kit feminino, vinha
produtos de beleza feitos artesanalmente, (esfoliante, sabonete, hidratante,
protetor labial, produtos para cabelos, e etc.) minha mãe enlouqueceu quando
Ellen trouxe amostras para mostrar pra ela, e só sei de tudo isso porque Ellen
não cansava de pedir minha opinião sobre os produtos que a empresa que ela
tinha contratado mandavam lá pra casa. Achava fofa sua vontade de me
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incluir em tudo e sempre parava o que estava fazendo para dar minha
opinião.
Enfim, estava tudo lindo, tudo com muito bom gosto, e sem fugir da proposta
campestre que Ellen amava. Suas raízes estavam ali, e por causa disso, aquela
era a decoração mais linda do universo.
Caminho olhando tudo enquanto via mais fotógrafos registrando todos os
detalhes, e só pensava no meu avô… ele deveria estar aqui para ver, para
fazer parte disso, fazer parte de nossa história. Sorrio ao sentir que tudo
estava bem apesar de tudo, e acreditava que ele estava feliz por nós, era
melhor pensar assim.
Volto para o casarão caminhando com tranquilidade e consigo perceber que o
percurso do pasto até o casarão era todo sinalizado com placas indicando o
caminho, muito divertido e criativo, e todas as placas eram decoradas. Sorrio
pra elas também. Ellen tinha pensando em tudo.
Mas por mais feliz que eu estivesse, não consigo deixar de me preocupar com
a noite anterior, com o que Ellen estaria pensando. Eu daria qualquer coisa
para falar com ela antes da hora, mas podia apostar que o telefone de todas
estavam no modo offline. Minha mãe, Lulu, Nina, nenhuma delas iam me
atender, muito menos me deixar falar com Ellen, e eu sofria por isso. Meu
medo era enorme.
— Parece que foi ontem o dia que cheguei aqui e te conheci, um moleque
alegre e sorridente, hoje é um homem que está prestes a casar.
Meu primo Call diz, ao me encontrar.
— E você cada dia que passa mais se parece com meu pai!
Eu falo e ele ri. Era só olhar para ele que já dava vontade de rir, ele era
engraçado até de boca fechada.
— Só que sou mais guapo, já falei da última vez!
Ele sorri pra mim, me abraça, me deseja muitas felicidades, me parabeniza
pela esposa linda — a irmã “gêmea mais nova” da minha mãe, ele disse. —
que eu tinha, e caminha em direção aos primos que ficaram no casarão.
Estavam todos reunidos na sala, alguns empregados serviam comes e bebes
para todos e gostei de ver que todos pareciam satisfeitos e felizes. Fujo do
amontoado de gente e volto pro quarto. Me deito na cama e penso nela, pedia
a Deus que ela não me deixasse, não fugisse com medo de mim, magoada ou
chateada.
Quando deu onze e meia, Bia me forçou a me vestir já garantindo que
chegava a hora e por causa disso eu fiquei mais nervoso ainda. Ele recebeu
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um telefonema, logo depositou a farda com cuidado em meus braços,


arrumou minha face estragada novamente — eu chorei um pouco, mas não
contei, achei que não precisava. —, e suspirou nervoso.
Vesti toda a minha farda branca, segurei o quepe nas mãos e Bia me
empurrou para o espelho novamente.
— O que acha? — perguntei.
— Está um deus grego, mas só precisa soltar era ruguinha de preocupação
aqui, — ele toca com o dedo em minha testa. — será lindo, Ellen estará uma
deusa do matagal maravilhosa — eu dou risada. — e você não precisa se
preocupar. Tudo dará certo!
— Você a viu?
— Recebi uma foto pela minha mãe, mas não vou te mostrar… nem que me
implore!!!
— Então ela vem…
Resmungo aliviado e ele me olha de um jeito estranho.
— Por que ela não viria!? Claro que vem! Quem em sã consciência deixaria
esse pedaço no altar!? Abandonado que nem um vira-lata sarnento!?
Ele aponta pro espelho com a outra mão na cintura e me faz rir.
— Certo, agora vamos. Preciso ver como seu pai e os restantes dos padrinhos
estão. Vocês irão juntos até o altar, o carro dela vai parar por aqui!
Ele resmunga correndo, pegando alguns objetos pessoais da bagunça do
quarto, e vai comigo até o quarto de meu pai, lá encontro ele, Rafa, Yan,
Renan, e Jon se arrumando. Jon e meu pai vestem os uniformes de gala da
aeronáutica, blazer preto — cheio de suas medalhas. — e calça branca. Já a
minha era diferente, era tudo branco, Rafa e Yan também padrinhos, vestiam
somente um smokey comum. Logo meus primos que fariam par com algumas
madrinhas de Ellen chegaram para se juntar á nós.
— Ei! — meu pai diz.— Pronto para casar?
— Prontíssimo.
Sorrio nervoso e enquanto eles me zoavam por estar quase enfartando, vou
para a janela e vejo os carros parando no lago. Laura, minha mãe, Isabelle,
Nina, Ritinha, Lulu, e umas três primas próximas de Ellen, descem dos
carros. Todas elas vestiam vestidos longos e leves, sem detalhes, em tons
diferentes de caramelo, meio marrom, bege… Estavam lindas. Será que Ellen
vestiria branco? Achava que sim, ela nunca me deu dica nenhuma sobre
como era o vestido, só sabia que devia estar linda.
— Estão todos okays, meus deuses soberanos?
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Bia resmunga alto batendo palma para chamar atenção, e uns sorriam para o
outro.
— Mas que olhos são esses, amado!? Verde floresta misteriosa… — ele se
aproxima e avalia Jon. — Deixa eu só dar um jeito nessa olheira, parece que
combinaram de não dormir hoje, eu hein…
Jon sorri pra Bia e confia completamente nele.
— Você nasceu assim… nem olheira tem, só essas cicatrizes que te tornam o
Zeus da turma. — Bia olha pro meu pai e suspira fazendo-o rir. — A
verdadeira definição de “Tanto faz”, mesmo!!!
Ele fala olhando para todos e depois pega sua pequena maleta para nos
acompanhar até o pasto aberto, local da cerimônia.
Caminho junto com todos até o lado de fora e vejo a limusine prateada
entrando bem devagarinho lá no início da estradinha que dava acesso a
chácara, era ela.
Chego até a entrada do pasto e sinto meu coração na garganta. Dois mestres
da fanfarra que estava ao lado da mesa do cerimonialista, se adiantam para
frente um do lado do outro, lançam á trombeta aos céus, e tocam a marcha
padrão. Param, caminham até o meio do corredor, voltam a tocar a segunda
parte, e caminham até chegar ao final do corredor. Ali eles param de novo, e
aguardam ficando um de frente pro outro na entrada por onde todos
passariam, era a hora do pelotão entrar. Fico aguardando ali e vejo os
militares entrarem em formação após a voz de comando do tenente. Eles
formam fila um do lado do outro e entram marchando pesado fazendo meus
olhos se encherem de água, dez de cada lado, um de frente pro outro, fazendo
a proteção simbólica de quem passava pelo meio. O tenente grita os
comandos padrões, eles ficam na posição de sentido, e a dupla de mestres
recomeçam a tocar a terceira parte do hino padrão de casamento militar, essa
era a brecha para os padrinhos entrarem par a par e se posicionarem atrás da
mesa do cerimonialista. Aquilo parecia que nunca ia acabar. Minha mãe e
meu pai seguiam ao meu lado e conforme foi chegando nossa vez, mais
nervoso eu ficava. Meu pai tinha sua farda de capitão, linda, e minha mãe
usava um vestido marrom, longo, valorizando suas curvas de sereia que
davam de dez à zero em muitas primas novinhas que estavam por ali. Ela
estava linda, radiante, e chorava.
Assim que os últimos padrinhos chegaram ao seu destino, eu me encontrava
no meio de meu pai e de minha mãe, na entrada do altar. Logo o tenente deu
voz de comando, a tropa ficou em posição de sentido movendo as espadas
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com precisão, primeiro segurando-as com as duas mãos e depois formando o


famoso ‘teto de aço’ para a gente entrar, tudo muito ensaiado. Eles batiam as
espadas umas nas outras, e faziam um barulho de parar o coração. Não sei se
era porque eu estava nervoso e sensível como um marica, mas sentia que ia
ter um troço de tão emocionado que eu estava. Nada ‘daquele sonho parecia
real’. Nós três passávamos embaixo do teto, ouvindo as trombetas, e a passos
lentos. Meu pai sorria, minha mãe chorava, eu segurava a emoção, e os
fotógrafos á nossa frente caminhando de costas, registravam tudo.
Terminamos nosso trajeto, me posicionei a esquerda, meus pais à direita, e
esperei aflito. Dentro de poucos minutos Ellen seria minha esposa e eu não
sabia o que sentir, o turbilhão de emoção chegou, ficou e eu sabia que só ia ir
embora depois de ouvir o ‘sim’ de sua boca, não antes disso.
O pelotão entrou em última forma (posição anterior) guardando as espadas ao
lado do corpo, a música cessou, e só continuaram quando avistamos Ellen.
Ela não veio com a limusine até o cercado do enorme pasto como imaginei,
não. A criatura veio lá de cima, montada em um cavalo tão negro como a
noite, e galopava nele, nem tão depressa, mas não tão lento… a velocidade
fazia seu vestido leve esvoaçar com o vento deixando a cena digna de um
filme de Hollywood, e seus cabelos soltos voavam e brilhavam por causa do
sol. Lá de longe já dava pra ver que ela estava uma rainha, maravilhosa, uma
deusa, e ao vê-la assim que parou e desceu do cavalo, eu chorei.
Ellen estava descalça e em um dos tornozelos tinha uma corrente delicada de
flores. Enquanto montava no cavalo, suas pernas ficavam de fora por causa
do corte sexy e rústico que o vestido tinha e por isso vi seus pés. Até a cintura
ele era colado, da cintura pra baixo, era como as saias que usava, era um
pouco soltinho, tinha dois cortes, rendas florais, e era tão branco que brilhava
quase me cegando. A alça era estilo babaloo, caía nos ombros de lado e
mostrava um colo sexy, clean, porém comportado, uma parte minúscula de
seus seios apareciam deixando-a sexy e clássica ao mesmo tempo, e seu
quadril largo deixava claro para quem quisesse ver, que aquela mulher tinha o
corpo mais bonito do mundo. Nos cabelos soltos tinham pequenos ramos de
flores do campo nas laterais, perto das orelhas; Em sua face, uma maquiagem
bem simples só valorizava sua beleza natural; E nas mãos, um buquê com as
mesmas flores se faziam presente, pequeno e delicado. Ela era a
personificação da flora, enquanto na vida real era a fauna, aquela mulher
abalava a natureza em sua volta e por isso o sol brilhou ainda mais depois que
ela saltou do cavalo imenso, e lindo. Ele competia com ela tentando brilhar
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mais, mas perdia, ele a deixava mais maravilhosa, e Ellen era seu próprio sol.
Tinha magia ali.
Ela me olha, não consigo fazer as lágrimas pararem de cair, e no meio de
borrões fracos, a vejo sorrir pra mim. Ela vira as costas, alisa a face do
cavalo, fala alguma coisa, e ele sai dali cavalgando de volta em direção ao
casarão, sozinho… e nesse momento um monte de "Oh! Nossa! Que linda!
Meu Deus!" se fizeram presentes.
Seu Renan que esperava por ela na entrada do corredor, segura em seu braço,
os dois sorriem um para o outro, e ouço o tenente dar voz de comando para o
pelotão celebrar a chegada da noiva. Os mestres entram na frente deles
tocando as trombetas novamente só que dessa vez é a marcha nupcial. O
pelotão grita, entra em forma, erguem as espadas e balançam o teto de aço
para ela passar. Assim que os mestres alcançam a lateral do altar, perto de
mim, Ellen e Renan começam a caminhar.
Ela estava radiante, sorria para todos, olhava ao redor, e por diversos
momentos dirigia seu olhar dos fotógrafos até mim. Era indescritível, suas
feições, sua aura, seu sorriso… todo o conjunto da cena, seu vestido, sua
postura… ela estava mais do que maravilhosa e eu não conseguia parar de
olhar pra ela.
Segundos depois do que me pareceu uma eternidade, Renan a entrega para
mim e eu o cumprimento.
— Se não cuidar bem dela, já sabe…
Ele fala sério, mas depois sorri.
— Vou cuidar muito bem, com certeza.
Eu digo e logo volto meu olhar para ela. Me aproximo, lágrimas escapam de
meus olhos, — de novo. — e deposito um beijo mais do que apaixonado e
comportado em sua testa.
— Eu te amo! Nada mais importa, Eu te amo!
Ela sussurra baixinho e me olha de um jeito diferente. Ela falava de ontem, e
só por me dizer aquilo tenho a certeza de que nunca mais pararia de chorar.
Ela sorri enquanto também chora, seca as minhas lágrimas com os dedos, e se
apoiando em minha mão estendida, caminha comigo até ficar na frente do
cerimonialista.
Ele começava a falar, falar, falar e eu nada ouvia. Não conseguia olhar para
frente e prestar atenção nele, eu só queria olhar para ela o tempo todo. Estava
magnífica, e por saber que seria oficialmente só minha, era ainda melhor, eu
estava em transe.
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Enquanto me pegava admirando sua beleza, viajei para aquele quintal, anos
atrás, para a nossa viagem, o estábulo quando nos reencontramos, e depois
em minha sala, com nossa filha agarrada em sua cintura. Nossas noites de
amor, nossas brigas… Enfim, nossa vida. Tudo… E o choro não cessava.
Minutos depois ela se virou para mim, me virei para ela em resposta, e só
olhava em seus olhos enquanto ela percorria toda a extensão do meu rosto.
Todos se levantam da cadeira e eu só entendo o porquê quando vejo Catarina
vestida de daminha de honra com um vestido diferente e lindo, igual ao dá
sua mãe, trazendo o Dobby que carregava uma cestinha de palha na boca e
balançava o rabo, feliz da vida.
Ela para á certa distância, tira a cestinha da sua boca, entrega pra mim, e sai
com Dobby pela lateral, toda comportada e sorridente, uma princesa.
O cerimonialista se aproxima, segura as alianças nas mãos, fala algumas
palavras, e depois de um longo tempo, enquanto eu me forçava a olhar para
ele e não para ela, ele faz a pergunta que não queria calar… Eu digo um SIM
em alto e bom som, e na vez dela, travo, aflito. Seu ‘sim’ soa como se falasse
“Claro que aceito, amor, eu amo você”, e aquilo tocou uma parte de mim que
eu nem sabia que existia, eu estava em um misto de alegria, euforia, e
felicidade profunda fora do comum. Ela diz olhando profundamente nos
meus olhos, sorrindo, e deixando cair algumas lágrimas soltas e nessa hora,
eu sinto buracos dentro de mim, sendo preenchidos, ferimentos sendo
cicatrizados, sofrimentos antigos se dissipando, traumas indo embora,
felicidade absoluta me revigorando… Parecia que eu tinha atingido o nível
máximo no Karmma, se Sidarta fosse capaz de sentir inveja, aquela seria a
oportunidade. Eu tinha experimentado o auge da felicidade, amor, e
realização pessoal, sem fazer meditação.
— Repita comigo Tay… Eu, Tay Coverick…
Ele pede e eu obedeço enquanto colocava minha aliança dourada em seu
dedo. Eu repito suas palavras que diziam algo como “lhe entregar essa
aliança como prova do meu amor e aceitar Ellen na alegria, na tristeza, na
saúde e na doença por todos os dias de nossa vida, até que a morte nos
separe”. — e nem a morte! Penso. — e na sua vez, Ellen repete todo o ritual,
com muito amor no olhar. Eu não via a hora de colocar aquelas alianças.
—… Eu vos declaro, marido e mulher, pode beijar a noiva.
Ele dá continuidade finalizando a cerimônia, me aproximo dela, beijo
novamente sua testa em sinal de respeito, as trombetas começam a tocar
novamente, a tropa refaz o teto de aço de forma padrão, os gêmeos saem na
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frente jogando pétalas vermelhas para nós dois passarmos, e eu me sinto o


cara mais feliz do mundo inteiro.
Eu queria ter aquela mulher pra mim, pra sempre, e naquele momento eu
tinha, era fato, Ellen era minha esposa agora.
— Meu marido está tão lindo com essa farda. Tão lindo, e tão meu!
Ela cochicha discretamente enquanto caminhamos em direção a saída. Ellen
sorria para todos e eu só olhava para ela, por isso ela sabia que eu a tinha
escutado e muito bem.
— E eu não consigo parar de olhar pra você…
— Notei.
Ela responde, pisca e sorri me olhando nos olhos só por um momento. Minha
linda, a mais bela de todas.

— Oi, gente… então… acho que é a hora mais esperada pelo meu
irmãozinho…
Lulu sorria no palco, estava linda, parecia uma deusa, mas ainda sim odiei
vê-la ali. Era a hora de discursar.
Ela parou a música alta, fez todos se sentarem, e como uma ótima anfitriã que
era, conduziu tudo.
— Bom, já que fui eu quem passou por cima de suas ordens e tive a ideia de
incluir esse momento maravilhoso na grade do casamento, vou começar… sei
que esse momento é o mais feliz de sua vida… — Lulu começa, sinto o nó na
minha garganta e o que eu temia aconteceu, no altar tudo bem, mas ali, os
olhares se virariam todos para mim, todos me veriam chorando. Sem contar
no fato de quando minha vez chegasse… —… eu quero muito que vocês
sejam felizes, desde pequena torço por isso. Acho que lutar por quem você
ama é primordial, é bonito, e uma grande prova de amor, e vocês dois
entendem muito bem disso!!! — ela continua e vejo Jon abaixar a cabeça
entristecido. — A história de vocês dois dariam um livro. Te amo Tay, você é
meu irmão, meu melhor amigo, meu herói, e dou minha vida pela tua. E
Ellen, te digo o mesmo, minha cunhada favorita, — as duas riem, e Ellen me
olha fingindo dizer: Viu!? Sou a favorita. — minha confidente, minha caipira
fashionista viciada em comprar botas de montaria… você é muito especial
pra mim!

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Uma vez eu disse pro meu irmão que pra ele ficar contigo tinha que trabalhar
muito porque você ia dar trabalho com as rações para seus animais, — elas
riem de novo. — mas estava enganada, ele tem mais é que te dar o mundo
mesmo, você é maravilhosa, o faz feliz, e por isso te amo, só o mundo não é o
suficiente! Você é minha família e estará sempre no meu coração! Obrigada
por ter nos dado esse presente vindo direto de seu ventre, nossa princesa Cat,
e obrigada por ser sempre mais do que todos precisam. Que sorte nós temos,
que sorte seus animais têm… nós te amamos muito!!!
Lulu cantarola no final, todos batem palmas e nós dois tentamos ao máximo
enxugar as lágrimas.
— Minha vez…
Minha mãe sobe no palco e eu choro só por vê-la lá. Ela parecia tímida
demais e com razão, dona Hella tinha para si, todos os olhares do lugar.
— Eu não vou falar muito porque não quero te envergonhar, não hoje, e
prometo não te chamar de… — ela ri e chora. — Bom, vamos lá! Eu devia
estar com raiva dessa mulher por estar tirando meu filho de mim… — ela
aponta rindo para Ellen. — O fez homem, um jovem que amava pela primeira
vez, um homem mais responsável, um pai, e por último um marido, pai de
família… esse é um dos motivos pelos quais não posso ficar enciumada e
triste, essa mulher linda, forte, e tão parecida comigo te trouxe de volta, te
transformou, me deu uma neta linda e te faz muito feliz. Como não amá-la?
Eu a vi crescer, jovem turrona, foi para minha casa de mala e cuia só para
cuidar de você quando ainda era uma criança e nunca deixou de te amar… —
minha mãe olha pra mim. — Eu te amo Ellen, quero ser pra você o que dona
Jô é pra mim, quero ser uma mãe, quero ser sua amiga, sua irmã, sua
confidente, e você terá minha gratidão, meu apoio, e meu amor, como tem
desde criança, para sempre. Fico em dívida eterna com você só por ver esse
sorriso lindo estampado na face dele… eu sempre desejei essa união, e quero
que dure pra sempre! — minha mãe sorri e Ellen seca os olhos. — Agora
você, — ela olha diretamente pra mim. — me desculpe, prometi que não ia
dizer isso, mas terei que dizer: VOCÊ SERÁ PRA SEMPRE MEU BEBÊ!
Pra sempre, não importa se você não gosta ou se quer se vir livre de mim,
normalmente é assim que funciona — ela sorri triste — nunca vou te deixar,
sempre farei qualquer coisa para te proteger, e meu amor por você, bom, por
você e por sua irmã, será incondicional, eterno. Você sofre, eu sofro, você
fica feliz e eu fico mais ainda. Impossível não me lembrar de quando éramos
só nós dois, porque enquanto seu pai lutava fora, você lutava dentro de casa,
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todos os dias, só para me ver sorrir, e eu sabia que muitas vezes era você
quem precisava de um sorriso, mas não suportava me ver triste. Tão
inteligente, rápido, perspicaz, sensato, e totalmente coração… claro que por
anos vestiu a farda como se fosse armadura para ninguém ter acesso a ele,
mas agora tudo mudou, meu menino lindo e carinhoso está de volta e eu me
sinto a mulher mais feliz do universo. Eu te amo, filho, muito, você faz
minha vida ter sentido, e com você por perto tudo fica mais iluminado! Te
amo bebê da mãe!
Choro ao ouvir minha mãe falar e sinto meu rosto queimar de vergonha, mas
não ligo. Eu a amava e não era tão ruim assim, ser chamado de bebê em
público. Eu estava tão feliz que nem aquilo me deixou chateado.
Jogo um beijo pra ela e meu pai sobe o pequeno palco.
— Bom, você sabe que se eu pudesse voltar no tempo e fazer tudo diferente
com relação a sua infância, a sua vida, sua criação, ‘sua fase: sem pai’… Eu
não faria. — todo mundo dá risadas nessa parte. — Sua mãe fez um
maravilhoso trabalho sozinha! — meu pai começa e eu dou risada, Ellen se
achega ao meu lado e sorri pra mim. — Inúmeras vezes brigamos, quase
saímos na porrada, e de mim partiu diversos pedidos de perdão, por isso, hoje
eu não farei isso. Vim só te dizer algo rápido, breve, e que eu acho que nunca
disse. Sou meio torto no jeito de amar, mas eu amo você, amo você mais do
que a mim mesmo, tenho muito orgulho de você, você é meu filho de ouro, e
assim como sua mãe, também sou capaz de tudo por você, tudo, e você sabe
disso! Não canso de dizer que você salvou a minha vida, e que sem você eu
nem estaria aqui e é a verdade. Eu sei que você acha que meu amor por vocês
dois é um maior que o outro, que Luiza é a favorita, que por vezes te deixei
de lado para estar com ela… essas coisas que os filhos dizem quando ficam
enciumados, mas isso nunca aconteceu aqui. Meu amor por vocês é diferente,
mas tem a mesma proporção. No teu caso sei que é forte, sei que dá conta, sei
que não precisa de um telefonema todo dia, não precisa de mim, é
independente! É um homem! Agradeço a Deus por ser tão diferente de mim,
e até seus defeitos são melhores que os meus, mas não esqueça você não tem
noção do tamanho do meu amor por você! Foi o melhor presente que aquela
sereia ali, — ele pisca pra minha mãe. — poderia ter me dado, e não importa
se amanhã a gente sair na porrada, discutir, me mandar te dar espaço, gritar
comigo mesmo fardado porque não tem disciplina nenhuma, — ele sorri. —
ou mandar eu parar de dizer para meus amigos novos que meu filho é o
tenente Tay Coverick… não importa, amarei você mesmo assim. E por mais
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que eu tente te dar uma lição de forma errada, te ensinar de forma errada, te
provocar, te proibir de se arriscar pilotando aeronaves novas por medo, gritar
com você, te envergonhar, ser duro demais, que seja, saiba: eu sou errado e
todo problemático até na hora de fazer algo pro teu próprio bem. Você não só
me salvou quando me fazia sorrir, como fazia a sua mãe, assim que cheguei
trazendo um trauma de tamanho colossal, você me salva todos os dias porque
todos os dias eu tento ser um pai melhor para você, por mais que você não
reconheça, ou não consiga perceber!!! E mesmo depois de homem feito…
você continua sendo meu presente. Tem meu respeito, meu amor de pai, e
minha lealdade, para sempre!
Meu pai termina e não chora nenhuma vez… já eu… Droga.
Enquanto ele descia sendo aplaudido Ellen me abraça para me dar carinho.
— Te amo.
Ela diz simplesmente, bem baixinho no meu ouvido.
— Tive tanto medo de você não aparecer por causa do que viu. Estava tão
preocupado! Você viu minha verdadeira face pela primeira vez na véspera do
nosso casamento e eu… eu tive tanto medo…
Encosto minha testa na sua, e sussurro pra ninguém em volta ouvir.
— Eu vi o que sempre soube. O matou porque ele tentou te matar, quis
proteger nossa filha daqueles dois malucos, quis me manter longe dele… eu
te amo desse jeito, vida! Amo sua bondade e amo seu lado maligno. Você é
meu protetor, meu herói, e preciso de você para nos proteger, me sinto segura
nos seus braços, e te amo por isso! Só saí correndo por medo de você brigar
comigo por te seguir, de novo. Ela ri. — Tudo o que eu queria era estar ali
contigo, do seu lado, e comemorar ‘menos uma pedra no nosso caminho’
com um beijo apaixonado, terminar o que comecei a fazer no carro quando a
gente voltava pra cá! É meu amor, um anjo dentro de casa, e um demônio na
rua, com quem merece, com quem ameaça nós duas, como deve ser! Sou
maluca por você… nunca mais duvide de meu amor!
Ela diz aquecendo meu coração, beijo sua boca movido pela intensa paixão,
controlo os ânimos, e volto a prestar atenção vendo que meu pai já havia
sentado e que Nina tomara seu lugar.
Nina fala, dona Isa vem em sequência, depois seu Renan, Jade, Rafa, os
gêmeos, vovó, Laura, amigos, primos, parentes, e até Yan, um após o outro
até que me levanto.
— Tudo o que vou falar aqui é sincero, mas também é pra te fazer chorar,
pois hoje chorei demais, meus olhos e minha cabeça estão doloridos e você
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está aí… só um pouco borrada aqui… — minto tocando no canto de um de


meus olhos e ela sorri. — É injusto. — eu pisco pra ela e ela muda a posição
das pernas, descruzando e cruzando novamente. Respiro fundo ao vê-la fazer
isso, e continuo. — Agradeço a vinda de todos aqui, vocês testemunharam o
dia mais feliz da minha vida. Você não tem noção de como me sinto hoje, e
nada do que eu disser vai te fazer entender a realidade disso como realmente
é, a profundidade do meu sentimento. Estou mais do que feliz, estou no céu.
Nos amamos desde criança, assim que te vi roubando, — eu dou risada. —
quer dizer, CUIDANDO, da bananeira da minha antiga casa, eu sabia que
você seria a mulher da minha vida, a única que eu amaria por toda a minha
vida e assim é. Mesmo sendo só um moleque, eu sabia, acredite! Sei que você
nunca deixou de me amar, assim como nunca deixei de amar você. Sempre
cuidou de mim. Tem um jeito único, descontrolada, ciumenta, bicho do mato,
simples, a roceira selvagem… Minha roceira selvagem, e principalmente por
isso, por ser tão singular, sou completamente apaixonado por você, até hoje.
Minha mãe tem razão quando se questiona, “como não amar!?”. Normal eu
ter passado um terço de nossas vidas afastando todos os meus rivais, é
esperado amar você, é fácil, é óbvio. Tudo o que sempre quis era ser seu
marido, então por agora, não desejo nada na minha vida, além de fazer de
você a mulher mais feliz do mundo! Não ligo para as crises, para as botas de
montaria em excesso, — vejo Lulu sorrir. — para as rações importadas, os
pedidos constantes para eu tirar férias, nada disso… eu amo você e todo o
conjunto, tudo o que vem no pacote, você sabe disso. Vou cuidar de você,
vou honrar teu nome e o que você significa pra mim, vou te proteger contra
tudo e todos mesmo que seja à custa de minha própria vida, porque sem você
nada faz sentido. Lutarei por você e pelo seu amor todos os dias mesmo “sem
precisar”, e prometo assumir a missão de te conquistar e te fazer se apaixonar
por mim, fazendo disso um hobby. Te darei flores não só em datas especiais,
não só para me desculpar por alguma bobagem, mas porque sei que você ama
receber.
Quero deixar registrado aqui que hoje sou outro homem, transformado, um
homem melhor, um pai mil vezes melhor, mas continuarei prometendo e
cumprindo, continuarei levando seu café na cama, aceitando suas crises, e até
sua TPM sem reclamar, e sem reclamar continuarei aceitando sua insistência
para eu tomar todos os dias os remédios na hora certa… continuarei
atendendo suas ligações de tarde, mesmo sabendo que são sempre para
perguntar se eu já comi ou se já tomei o remédio. Continuarei ouvindo seus
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conselhos sobre aeronáutica, sobre as minhas aeronaves, sobre o meu


trabalho como se você entendesse do assunto e aceitarei tudo, porque tua
opinião sempre será a única que importará para mim, e além de tudo isso
permanecerei fiel a você como sempre fui, contando as horas para chegar em
casa e te ouvir, dizendo ‘te amo’ á toda hora não importando o lugar, andar
de mãos dadas, reclamar do cumprimento de suas roupas, te buscando e te
levando, e sendo acima de tudo seu amigo, namorado, amante, parceiro, e
agora marido. Amarei você pelo resto de minha vida, Ellen e até depois disso
com certeza absoluta. Eu te amo, selvagem!
Eu desabafo esquecendo que falava para uma multidão, todos aplaudem,
Ellen chora como um bebê, — me vinguei. —, vou até ela, beijo sua boca
como se fosse a última coisa que eu fosse fazer na minha vida, e curto o resto
da tarde e o início da noite ao lado dela. Dançamos a dança dos noivos,
conversamos, tiramos fotos e cumprimentamos todos, fizemos a sessão de
fotografias pós-wedding com ela naquele cavalo maravilhoso, eu com os
padrinhos, ela com as madrinhas, nossas famílias, amigos… Enfim, todo o
ritual clássico. Mais felizes, impossível.
Óbvio que teve “uma briga de olhares” provocado por ciúmes, óbvio que um
convidado indesejável apareceu, óbvio que dei uma segurada no ciúme que
sentia ao vê-la nas mãos de todos os homens da família… Mas esses detalhes
conto depois. Nesse momento Catarina insiste que eu preciso dançar uma
valsa com a “minha filha favorita”.
Precisava fazer meu papel de pai, dançar com ela até ela cansar, continuar
dando atenção para os convidados enquanto trocava olhares com minha
esposa gata, e na manhã seguinte, partir dali direto para o aeroporto, para
amar e curtir minha selvagem do jeito que a gente queria e precisava, a lua de
mel que ela merecia. Amar demais e ser amado, muito amado.

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EPÍLOGO

Volto pra casa depois de uma lua de mel maravilhosa no nordeste. Estava
radiante, feliz, realizada e casadíssima! A aliança dourada brilhava no meu
dedo, e eu não conseguia parar de olhar, era incrível. E o que ela representava
na minha vida era mais do que isso, estar casada com o homem que eu
amava, era surreal.
Chegamos, fomos direto para dona Jô buscar Catarina, e lá encontramos a
família toda reunida. Matamos a saudade, entregamos os presentes, e
passamos o dia todo juntos antes de ir pra casa.
— Como você está?
Pergunto pra Lulu assim que ficamos sozinhas em seu quarto.
— Eu estou indo, empurrando… me preparando para partir. Chego ao EUA
em um dia e começo a estudar no dia seguinte. Será bom assim, fico com a
mente ocupada.
Lulu se esforça pra sorrir e parecer equilibrada.
— Vocês conversaram no casamento?
Pergunto e depois penso se deveria tocar no assunto. Tarde demais. Lulu
perde o sorriso que já era fraco e parecia beirar o choro de tão extremamente
triste que estava.
— Não foi bem uma conversa. Ele tentou demais e eu só fugi a festa toda,
queria distância. Teve uma hora que ele me arrastou até o banheiro, insistiu
em conversar sobre… enfim, você sabe, você estava lá… — eu concordo e
não conto que a babá eletrônica da sala estava ligada no ponto do meu quarto
e do quarto da Cat. Ouvimos a conversa movidos pela falta de bom senso e
assim que eles pararam de falar, Tay desligou correndo… tinha a carranca de
Max, mas não fez nada. Respeitou o espaço da irmã. — Me tirou de perto de
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um primo seu que me paquerava e tentava me tirar pra dançar, e me arrastou


quase pelos cabelos até o banheiro do casarão… não entendo Jon, não
entendo o porquê ele estava aqui, porque meu pai o convidou, e olha que meu
pai viu ele me tirando do campo e não fez nada, só olhou e voltou a dar
atenção pra minha mãe.
Ela diz revoltada e eu sorrio.
— O que ele queria?
— Conversar. Claro que primeiro me tirar de perto de seu primo, depois
conversar sobre o que aconteceu, aquele discurso todo errado, pedindo que eu
entendesse, que eu aceitasse sua decisão, que eu esperasse por ele, que me
amava, uma baboseira atrás da outra. Ele até gritou comigo, quis exigir que
eu aceitasse o seus termos, acredita!? Ah! Vá se ferrar… Ele desiste de mim,
me abandona, volta pra mulher, aparece no casamento para me deixar
perturbada, e depois quer me cobrar!? Que ele vá á merda, Ellen! Não quero
nunca mais saber dele, não vejo a hora de sair do país, estudar, e esquecer
aquele… aquele babaca!!!
Ela desabafa e balança a cabeça fazendo seus brincos de esmeraldas raras se
agitarem nas orelhas.
—… E então vocês transaram no banheiro!
Eu arrisco erguendo uma sobrancelha, ela me olha torto e depois dá risada se
jogando de costas na cama e cobrindo o rosto com a mão.
— SIM!!! MUITO!!! Transamos muito… — ela ri. — Não aguento aquele
homem, sou maluca por ele. Jon me deixa completamente sem rumo!
Brigamos, transamos e transamos brigando um com o outro, ao mesmo
tempo, de novo. Minha nuca está faltando tufos de cabelos, ele acabou
comigo e eu amei, ficamos lá por mais de uma hora. Ele… ele é tudo de bom,
— ela começa a rir e depois chorar. — mas não quero mais, Ellen, não quero
mais passar por isso, vou aceitar a decisão que ele tomou, não quero mais vê-
lo, nunca mais vou me entregar pra ele, nunca mais! Ele fez sua escolha,
agora já era!
— Tay disse que Bia falou pra ele que seus olhos eram da cor “verde—
floresta misteriosa”, — eu falo para descontrair e consigo, pois ela ri. —
achou ele um gato!!!
— E quando está excitado fica ainda mais verde. Verde musgo, iluminado…
ele é lindo, mas não é pra ser, não é pra mim. Acabou…
Ela fala com um amor que chega a doer e eu concordo. A decisão era dela.
— Agora me fala… a lua de mel, como foi???
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Ela pergunta limpando as lágrimas.


— Foi selvagem! — rio alto. — Foi incrível, Tay está ainda mais romântico,
fofo, cuidadoso, atencioso, continua possessivo como sempre foi, mas com
relação a isso nunca me incomodei. Ele me deu tudo, fez da lua de mel um
conto de fadas com jantares, passeios de mãos dadas, flores, fotos juntos,
tivemos tudo o que a gente tinha direito e mais um pouco. Parece que cada
dia que passa mais apaixonado fica e eu fico mais boba ainda… vou amar seu
irmão pelo resto da minha vida.
Eu falo e ela parece feliz, feliz por mim.
— Que bom que pelo menos você e a mamãe estão felizes! Essas mulheres
da nossa família só entram em relacionamentos complicados. Parece carma.
Tem que sofrer demais primeiro, para ser feliz só depois, nunca vi isso!
Ela diz e eu concordo. Pensava da mesma maneira.

— Acho que deveríamos ficar, quero levar Lulu no aeroporto amanhã, seria
melhor do que ir pra Pirassununga e depois voltar aqui. Tudo bem pra você?
Tay me questiona após o jantar. Suas mãos agarram minha cintura e ele sorri
ao falar. Tay só sorria, desde o nosso casamento sorria por qualquer motivo,
até sem motivo.
— E aonde vamos dormir?
— Na casa da minha mãe. Ela trocou minha cama do quarto por uma de casal
já faz um tempo, para essas ocasiões, para eu não ter desculpas quando disser
que não posso ficar. — ele ri. — Podemos ficar lá e colocar Catarina no
quarto de hóspedes…
— Tudo bem! Vou amar ficar aqui. Agora com relação a esse assunto,
precisamos procurar a nossa casa, logo! Não aguento mais ficar pra lá e pra
cá. Que seja uma casa simples, mas nova, uma casa nossa!
— Eu sei, concordo, amor! Vou resolver isso, quer dizer, vamos resolver
juntos! Vamos comprar uma casa linda!!!
— Muito bom!
Eu resmungo, ele me beija, e vai brincar com Catarina de trocar as roupinhas
das suas Barbie’s. Vou até o quarto de Hella na dona Jô, onde eu tinha
colocado minha bolsa e encontro as duas conversando.
Dona Jô logo me chama para um abraço e começa a me dar conselhos para
um casamento duradouro que consistia em: “deixa o homem pensar que
manda, pensar que a casa não é nada sem sua liderança, sem seus cuidados,
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mas mantenha tudo sobe controle sem ele saber que é você quem manda na
área”. Apenas ri. Hella só sorria concordando também, parecia realmente
fazer sentido e funcionar.
Tay entra minutos depois, procurando por mim, dizendo já estar com
saudade. Ele mima sua avó, enche sua mãe de beijos, e conversa com a gente
muito bem humorado, como ultimamente, fazendo todas rirem.
— Ellen, tem um homem aí fora te procurando!!!
Rafa entra falando comigo e encarando Tay ao mesmo tempo, como se
tivesse “meio assim” pra avisar. Inconscientemente meu marido lindo e
enciumado se aproxima de mim, e passa o braço ao redor de minha cintura.
— Ele disse quem era?
É Tay quem faz o questionamento. Tinha deixado o sorriso desaparecer e
parecia aflito.
— Não. Diz que se chama Roberto.
Rafa fala e Tay sai na minha frente como se a visita fosse pra ele. Olho para
Hella e ela sorri levantando os ombros.
Vou até lá fora e escuto Tay dizer.
—… Sou Tay, o marido dela, como vai?
— Vou muito bem, obrigada. Vim de Barbacena até aqui, sou amigo do
Renan o encarregado de vocês na fazenda Pôr do sol…
— Olá! Sou Ellen!
Eu digo e ele sorri pra mim de um jeito estranho, pega em minha mão e se
apresenta. Tay se mexe incomodado com aquilo e eu finjo não notar.
Roberto aparentava ter a idade dele, moreno, olhos azuis, bem arrumado e
educado.
— Fez uma viagem longa, quer entrar? Foi meu tio quem te mandou?
Eu pergunto.
— Aceito, obrigado. Não dessa forma, só pedi seu endereço, soube por ele
que estava em São Paulo.
Ele fala, o convido para entrar novamente e Tay fica por último, entrando
logo em seguida.
— Então, do que se trata…!?
Tay questiona assim que Roberto toma o seu copo d'água.
— Bom, faz alguns anos que te enviei um convite indireto para fazer parte da
minha equipe de hipismo, — ele fala diretamente comigo. — pelo teu tio…
— eu me lembro do dia em que meu tio me fez o convite, eu nem tinha
Catarina. — Agora mais do que nunca preciso de uma atleta, pois a última se
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machucou e está se tratando, sua melhora é lenta, gradativa. Meu convite é


que você participe das seletivas para representar Barbacena. Sei que ama o
animal, é veterinária, tratadora, você é a pessoa mais indicada para isso, seria
minha atleta de ouro, tenho certeza… — ele fala sorrindo.
— Bom, sou especialista na doma de cavalos, agora não tenho nenhum
contato com o hipismo, não diretamente.
— Seu tio fica muito empolgado com a ideia de te ver competir, você sabe,
sempre quis… acho que por isso ele me mostrou alguns vídeos seus,
inclusive do que fez no teu casamento. Ele disse que você nem treinou o
cavalo, o fez voltar para o lugar de onde veio sem rédea, sem cavaleiro, e eu e
você sabemos que tem tratadores especiais, só os especiais conseguem o
feito, e vi a afinidade que você tem com ele, vi os vídeos, a facilidade com
que eles te aceitam e te reconhece, então imagina do que você seria capaz de
fazer se eu te desse algumas semanas para treinar algumas técnicas do
hipismo… você se sairia maravilhosamente bem, tenho certeza absoluta.
Nasceu para isso. Fará o que estudou para fazer, vai treinar os animais, é só a
técnica que é diferente!
Ele fala e penso no assunto. Antes eu não tinha aceitado porque estava
trabalhando, ocupada, não podia me dedicar, mas e agora? O que eu fazia?
Cat ia estudar, Tay voltaria para a FAB porque o pedido de dispensa foi
negado e o seu “não” para ir pra Síria foi “milagrosamente” aceito, então
porque não me ocupar com alguma coisa que eu sabia que ia adorar!?
— É algo que eu precise pensar… mas gosto da proposta. O que você acha?
Pergunto para Tay e ele não me olha nos olhos ao responder.
— É uma decisão só sua.
— Nos casamos, é uma decisão nossa!
Eu falo e ele nega balançando a cabeça.
— Eu tenho toda a proposta impressa, — ele me entrega um envelope. —
você será remunerada e a primeira competição vale quinze mil, terá liberdade
na hípica de treinamento, receberá ajuda de um profissional da área, será
muito bem preparada, enfim, está tudo escrito aí. E aqui… — ele mexe no
bolso do seu casaco. — está meu cartão, te darei três dias para pensar no
assunto, que tal!?
— Que tal uma semana? — pergunto sorrindo e ele cede.
— Tudo bem, estou aflito, mas aguento sete dias. Só peço que me ligue e me
informe após o prazo, mesmo que a resposta seja não, me ligue!
— Claro. Vou ligar, óbvio! — eu digo e ele diz que concorda.
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Me cumprimenta, cumprimenta Tay, nós dois o levamos até o portão, e ele


vai embora dizendo que ia esperar meu contato.
Assim que o carro sai, Tay entra em casa e vai direto pro quarto. Vou atrás e
o vejo separar roupas para tomar banho. No quarto de Hella tinha roupas de
Max e ele procurava algo entretido, só para não conversar comigo.
— Você odiou a ideia, não é!?
Eu entro no quarto e tranco a porta.
— Não. Só não gostei muito…
Ele fala, joga a roupa na cama e eu me aproximo dele.
— Por que?
— Acabamos de nos casar, nossa prioridade agora devia ser ficar grudados,
viver esse sonho que a gente realizou, curtir um ao outro, viajar nos finais de
semana, passear, e nas horas livres em que Catarina não estiver ou estiver
dormindo, fazer amor! — sorrio. — Pensei que queria muito engravidar,
deveríamos transar todos os dias, principalmente no seu período fértil, sei lá,
aproveitar esse momento de recém-casados.
— Jade disse que vou engravidar na hora certa, não preciso ficar preocupada,
e nem você! E é claro que quero viver tudo isso contigo, claro que quero
curtir…
— E como vamos fazer isso com você assumindo compromissos como esse?
Ele pergunta colocando a mão na cintura e parecendo bem triste.
— Então vai me proibir de trabalhar, suponho!
Eu resmungo e ele sorri.
— Pensei em tentar…
Ele ri, eu me sento na cama e após respirar fundo, se ajoelha na minha frente.
— Escuta, esquece tudo isso. Não vou proibir você de nada, e não quero
brigar. Você perguntou minha opinião e eu te respondi. Pra começar já não
gostei do jeito que ele olhou pra você, se fosse um velho com cara de
“respeitador” já ganharia um ponto comigo… mas se aceitar essa proposta
estarei no banco da frente com Catarina, vestindo camisetas personalizadas e
te aplaudindo de pé! Torcendo por você, e, aliás, sei que será a melhor! Ele
tem razão, também acredito que você nasceu pra isso, aposto que se dará
muito bem! — ele fala sorrindo pra fingir que não estava magoado. — Mas
estou sendo egoísta, não quero que trabalhe, não quero te dividir, não quero
chegar e não te encontrar em casa, quero você perto de mim.
— Mesmo assim, uma hora ou outra vou precisar trabalhar, serei remunerada.
Quinze mil por uma única competição, você ouviu isso?
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— Ellen, eu te dou trinta pra você me esperar em casa, vestindo uma lingerie
maravilhosa enquanto cozinha pra mim.
Ele se faz de machista e eu não consigo rir de sua piada.
— Você não entende.
— Entendo sim, — ele se levanta e se senta do meu lado, olhando pra frente.
— quer trabalhar, ser independente, ter seu próprio dinheiro e melhor ainda
se conseguir isso trabalhando com o que ama. Eu entendo você. Você tem
uma semana para pensar, o que você decidir, vou te apoiar, vamos dar um
jeito! Mesmo porque aposto que tudo precisará ser reformulado em nossa
vida, afinal, vai treinar em Barbacena mesmo! Vamos ter que nos mudar, de
novo.
Ele fala parecendo cansado.
— Eu te amo. Fica tranquila e pensa nisso com carinho. Estou com você, pra
sempre! Prometi e vou cumprir! Sua felicidade é a minha!
Eu me sento em seu colo o pegando de surpresa.
— Tudo bem, então me diga… você quer que eu faça parte disso? Ficará
sinceramente feliz por mim só porque vai notar que eu estou feliz? Como
lidaria com tudo isso? Quero sinceridade, a verdade!!!
E falo e ele inclina a cabeça.
— Não quero que você trabalhe, não quero te ver convivendo com aquele
cara estranho que te olhou com desejo, quero que dê cem por cento de seu
tempo para nossa família, quero ter você embaixo de minhas asas, sobe meu
controle, e te ver sempre que eu decidir que devo. Quero chegar em casa e te
encontrar, não quero dormir sozinho, não quero ter que te ver chegando tarde
demais, cansada e com dores por ter pegado pesado no treinamento ou
trabalhando, e principalmente não quero te ver machucada. Agora em
contrapartida, o que isso importa? Você nunca tomou decisões se baseando
em mim, nosso casamento não pode ser uma prisão pra você, você não tem
vocação para ser mulher submissa e dona de casa… eu me apaixonei por uma
selvagem que não precisa e não depende de homem nenhum pra nada, então
não precisa mudar agora.
— Vou usar essa semana pra pensar! Tem algo aqui embaixo de mim que não
consigo ficar longe… — eu rebolo e ele aperta meu bumbum sorrindo. —
Podemos encontrar um meio termo, uma solução, sei que posso trabalhar,
cuidar de nossa filha e dar conta do meu marido, sou mulher, estamos
acostumadas a fazer mil coisas ao mesmo tempo. Só não quero me sentir
inútil, me sentir um lixo humano escorada em você e vivendo sem
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perspectiva nenhuma. Tantas mulheres vivem assim, quero conseguir


também! Você me entende? Acredita que consigo?
Eu digo baixinho e sinto seu músculo crescendo embaixo de mim.
— Você é maravilhosa e eu acredito em você! Ja disse, te apoio! Óbvio que
você vai dar conta é por ser tão forte que eu te amo!!! Fui criado por uma
mulher de fibra que dava conta e sinto muito orgulho dela, muito mesmo, e
aposto que você será capaz também. Só quero deixar bem claro que você
pode fazer o que quiser, trabalhar, treinar, estudar, qualquer coisa, e
principalmente não fazer nada. Prometi cuidar de você e você só vai trabalhar
se quiser, porque você não precisa, tudo bem!? Você entende isso??? — ele
me imita rindo. — Entende que não precisa de nada porque posso te dar
tudo???
— Entendo.
— Pois bem, decida o que quer fazer, e mesmo não concordando com sua
decisão, ficarei do teu lado! Te apoiarei com todo o meu coração, e com
sinceridade. Qualquer problema que aparecer, resolveremos.
Tay diz e me beija. Seu beijo tem gosto de paixão, suas mãos examinam meu
corpo com uma vontade fora do comum, e sua postura implora por amor.
Ele se empolga, procura por minha intimidade com um desejo ardente e me
levanta em seu colo quase correndo pro banheiro.
Suas mãos bobas arrancam meu vestido sem delicadeza e faz o mesmo com
minha lingerie. Assim que sua mão encontra minha entrada molhada e seus
beijos ficam mais agressivos, Catarina bate na porta do quarto pedindo para
entrar. Ele para sem graça e sem fôlego e se vira para atender a filha. Eu ligo
a água da banheira e espero. Ele só volta quando já tinha feito tudo o que
precisava e eu já estava na cama sonolenta. Tinha tomado meu banho,
perguntado para Hella onde ela ia ficar, ela deu autorização para ficarmos em
sua cama já que Tay tinha colocado a Cat para dormir com os gêmeos, e já
estávamos aqui. Tomamos o seu quarto.
— Dei as vitaminas, o leite, e a coloquei pra dormir. Amanhã vai reclamar
por ter que dividir o quarto com os primos. Cheguei tarde!? Está com sono?
Ele pergunta beijando de leve meu pescoço e digo que sim. Esperei por
tempo demais e estava exausta.
— Tudo bem. Descansa. Eu te amo!
Ele fala e cai de costas do meu lado. Apago o abajur, ele apaga o do lado dele
e eu me achego em seu corpo para dormir agarradinha, mas foi só ele ficar de
conchinha comigo que o sono passou. Eu estava na cama com um deus grego,
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quem em sã consciência dormiria?


Começo a rebolar discretamente e encosto a nuca em sua clavícula. Penso
que ele vai zombar ou dizer algo, mas ele não é bobo, fica quieto e aproveita
a oportunidade já que meu fogo ascendeu.
Sua mão escorrega devagar em minha cintura, passa pela minha barriga, e
quando entra em minha calcinha eu empino o bumbum em sua direção.
Enquanto seus dedos se moviam rapidamente para me dar prazer e sua
respiração pesada iam direto para meu ouvido, eu procurava um jeito de tirar
meu consolo pra fora com rapidez, sede, e uma vontade imensa. Coloquei sua
extensão toda no meio de minhas pernas e só o que atrapalhava era a calcinha
por isso não demorei, a coloquei pro lado e ele cuidou do resto, fazendo a
cabecinha entrar de pouquinho em pouquinho, uma tortura.
Tay entrava e saía de um jeito gostoso, mas ao mesmo tempo era um
pesadelo.
— Não aguento isso… abra as pernas.
Ele resmunga com raiva e eu sorrio pro escuro do quarto. Obedeço, ele sobe
em cima de mim e me invade sem nenhuma delicadeza, parecia raivoso.
Me enrosco em seu pescoço e abro mais as pernas, ele me estoca com força e
faz a cama se bater contra a parede do quarto que devido a nova posição,
dava pro quarto onde Nina e Rafa dormiam.
— Ei, olha o barulho!
Falo com dificuldade em meio a gemidos baixos e ele rosna.
— Não ligo. Não quero saber. Não ouse fechar essas pernas.
— O que você tem, por que está assim?
— Por que ia te amar no banheiro, entrei aqui, e você não esperava por mim.
Por que não me esperou?
— Tay…
— Não.
Tento fechar as pernas e ele sai de dentro de mim se sentando na cama.
Vou atrás dele, ligo um dos abajures, sento em seu colo e faço ele olhar pra
mim. Sento em sua vara ainda mais dura e cavalgo gostoso, olhando em seus
olhos.
— Mimado…
Resmungo e ele me castiga puxando os fios de minha nuca, e fazendo um
carinho grosseiro em minha face.
— Quieta! Cavalgue.
Ele rosna e eu sorrio. Tay excitado se transformava.
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— Quero falar, não quero ficar quieta.


— Quero bater em você e nem por isso o farei.
— Amor… mete mais fundo!
Eu sussurro, saio de cima dele, empino o bumbum apoiando na cama, e ele
vem por trás pra me satisfazer.
— Oh! Isso! Não para…
Eu provoco e ele pira fazendo meus cabelos virarem um rabo de cavalo.
Quando goza, se joga na cama e me puxa pra si.
— Nunca mais faça isso. Nunca mais vá dormir sem me esperar, sem me
deixar amar você, nunca mais! Ouviu?
Ele fala no meu ouvido e me sinto feliz. Fingia estar bravo, mas eu sabia que
sua mágoa tinha passado.
— Nunca mais… Meu mimadinho!
Resmungo feliz e ele dá um tapa em minha bunda. O tapa que queria dar faz
tempo, mas podia apostar que sua vontade era de bater na minha cara. Sorrio
ao ter certeza disso. Sabia que ele já devia ter feito isso antes, mas nunca ia
me dizer.

— Bom dia.
Ele diz assim que abro os olhos, estava sentado na poltrona do quarto me
olhando dormir e parecendo pensar.
— Bom dia, amor! Há quanto tempo está aí? O que estava fazendo?
— Acabei de trazer seu café, estava te olhando.
— Poderia ter me acordado com beijos cheios de amor…
— Gosto de te ver dormir.
— Gosto de sexo matinal. — eu devolvo e ele ri.
— Você precisa tomar café e se arrumar, vamos levar Lulu até o aeroporto.
Depois que voltarmos podemos passar o dia juntos.
— Cadê Catarina?
— Brincando com os gêmeos!
Ele fala, se senta do meu lado e me olha comer.
Terminei, tomei um banho, coloquei um de meus vestidos limpos da mala, e
fui até a sala. Só faltava eu.
Chegamos ao aeroporto por volta das 13:00hs, passamos em um restaurante,
fizemos uma última refeição juntos, conversamos, brincamos, Tay continuava
no seu melhor humor e Lulu parecia fingir felicidade, estava triste por estar
partindo sem Jon ao seu lado, mesmo não querendo assumir.
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— Vou sentir a falta de todos…


Ela resmunga perto do portão de embarque.
— Só que mais a minha, tenho certeza!
Max resmunga, Lulu mostra a língua pra ele, e ele ri ao ver que Hella chorava
de novo, totalmente “descontrolada”.
— Como é o apartamento que você alugou, pai? Na primeira folga que eu
tiver vou querer ir com a Cat e a Ellen… — Tay fala e Max sorri.
— Foi pensando nisso que aluguei uma casa, enorme…
— Foi só para eu me sentir ainda mais sozinha!
Lulu resmunga e Max a abraça.
— Eu te amo, sabe disso não é!?
— Ama, é?
— Amo tanto que mudei, “tô deixando”, você ir embora pra lá de novo, não
vou colocar Jon na sua cola, não colocarei seguranças para te seguir, não
bloquearei seu cartão e vou até te deixar namorar… menos aquele Chris, ele
eu não aceito, Jon me mataria com certeza, mas pode namorar, curtir as festas
das irmandades lá da universidade, pode fazer o que quiser, curta sua
juventude… qualquer plano que sair errado, saiba que eu estarei aqui e te
ajudarei, eu e toda a sua família.
— Até se eu engravidar antes de me formar?
Lulu testa o Max, brinca com a sorte erguendo uma sobrancelha, e o ouço rir.
Algo inesperado.
— Se engravidar agora, é porque é burra. — toda a família ri, até Lulu. — E
eu acho que de burra você não tem nada. Foi aceita em Harvard, é linda,
jovem, e tem um milhão de predicados. Faça da sua vida o que achar melhor,
e colha sempre o que plantar. Farei meu papel de pai, ficarei do seu lado,
independente do que aconteça!!!
Max fala e Hella chora ainda mais. Por isso recebe um abraço caloroso de sua
filha. Lulu agarra a mãe e pisca para o pai.
Mas seu semblante muda assim que o abraço termina. Ela olha para o outro
lado do aeroporto e trava sem saber o que fazer e por ser tão transparente,
todos nós seguimos o seu olhar. Era Jon, estava parado olhando para ela, se
despedindo só com o olhar, de longe, parecendo triste e cabisbaixo. Se fosse
em outra época nós nunca saberíamos que ele estava ali, mas... aquele não era
realmente Jon, não o Jon de antes.
De repente Max faz um sinal e chama por ele. Lulu se desespera.
— O que está fazendo? Não quero vê-lo, não quero me despedir.
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Ela olha chorosa para o pai e fala baixo.


— Ele veio até aqui pra te ver, dê um ‘tchau’, seja educada…
— Não vou fazer isso.
Ela vira as costas, mas Max não a deixa entrar no portão.
— Faça. Não é mais uma criança! Jon tem problemas maiores do que você
pode imaginar e por minha causa. Me deixa ajudar.
— Teve uma época em que você o mataria por chegar perto de mim, agora
me empurra pra ele! Você é maluco, pai!
— Não estou te empurrando pra ele. Vai chegar em Nova York e se
arrepender de não ter dito adeus á ele e vai sofrer. Deixe-me amenizar tudo
isso, tudo o que eu causei, você não precisa sofrer arrependida, e nem fazê-lo
sofrer mais ainda, Jon está arrasado.
— No casamento não pareceu.
— Pois bem, ficaram juntos, eu sei e saber disso me causou pesadelos
durante todos esses dias, mas eu aprovo o Jon agora! Mudei de ideia com
muita dificuldade pra te ver feliz! Quero a felicidade de vocês dois. E esqueça
aquela oportunista, Jon ama você, ter vindo até aqui é uma prova e tanto
disso. Fale com ele, Ana Luiza!
O discurso rápido de Max deixa todos impressionados e assim que termina,
Jon nos alcança e o tempo de Lulu fugir acaba. Aquele era outro Max.
— Oi.
Jon diz e ameaçamos sair de perto. Mas ela impede a gente de deixá-los á sós.
— Não, fiquem todos. Oi, Jon. O que quer?
— Vim te ver, pela “última” vez. Me despedir…
Ele diz isso e até meu coração dói. Luiza trava por um momento, mas se
recompõe.
— Já viu!? — ela pergunta e ele nega com a cabeça.
— Eu te amo!
Jon fala para todos ouvirem e vejo Hella sorrir.
— De nada me serve. Cadê sua esposa? Está no carro te esperando?
— Ela não é minha esposa. Eu a deixei em casa, está ciente de que vim me
despedir de você, de que estou sofrendo por causa de tudo o que aconteceu, e
de que nunca a amei, de que nunca vou amar mulher nenhuma como amo
você. E eu também disse que assim que eu melhorar, vou pegar as minhas
coisas e ir atrás da mulher que eu amo, que se ela está me ajudando e me
dando apoio para tentar retomar nosso casamento, ela vai cair do cavalo. Isso
nunca vai acontecer.
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Jon se declara de forma criativa e Max força o maxilar ao ver uma lágrima
cair de seu olho direito. Luiza chora, mas sem perder a pose.
— Quero que você esqueça que eu existo!
Ela fala parecendo lamentar demais, sua dor era notável e comovente. Eu
tinha vontade de pegar Lulu no colo e ninar ela.
— Está aí uma coisa que seu pai não conseguiu me fazer, esquecer você.
Chega a ser irônico! — Jon sorri com sinceridade. — Se com muita pancada
e ficando a beira da morte, eu não te esqueci e não deixei de te amar, não é
agora que isso vai acontecer só porque está emburrada e mandando. Faça
uma boa viagem, Ana! Parabéns e boa sorte na universidade!
Jon diz e vai embora do mesmo modo que chegou, com as mãos nos bolsos
do casaco e costas arqueadas parecendo ter perdido uma batalha importante.
Ele caminha a passos lentos, e em nenhum momento olha pra trás.
Lulu fica ainda mais descontrolada emocionalmente, mas esconde tudo para
dentro de si, ela olha para o pai como quem pergunta: “viu o que você fez!?”,
puxa a alça da bolsa do chão, diz que já vai e caminha em direção ao portão,
também sem olhar para trás em nenhum momento!
Muito triste.
— Vai atrás dela.
Hella resmunga e vira as costas saindo dali. Max obedece no ato. Ele vai
atrás da filha, puxa seu corpo para um abraço, e Lulu corresponde, parecendo
chorar muito, e precisando do abraço consolador e carinhoso do pai.

— Outra convocação?
Tay atende a porta e volta aflito. Se senta no sofá e eu jogo o pano de prato
na mesa de centro. Catarina tirava sua soneca de tarde após o café, e eu
limpava a cozinha ainda pensando sobre a despedida de Lulu e o sofrimento
dos dois. Coisas do amor.
Antes de atender a porta, Tay pesquisava novos endereços e marcava visitas
para conhecer algumas propriedades.
Sento no seu colo e ele abre a carta tremendo um pouco.
— Parece que sim…
Ele resmunga e me inclino para ler junto. Reforço/urgente/Rio de Janeiro,
partida imediata.

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— Quanto tempo?
Pergunto porque ainda não tinha encontrado a informação, e ele responde
com pesar.
— Um mês.
Ele fala, coloca a carta de lado, e me abraça triste.
— Tudo bem, trinta dias passa rápido.
Tento amenizar a notícia ruim, mas seu semblante não melhora. A notícia me
pegou no susto, me deixou péssima, e eu tentava parecer normal.
— Lamento, não posso recusar, amor! Me desculpa.
— Eu entendo.
— Vou fazer uma ligação. Eu já volto.
Ele sai e sei que vai ligar para o pai. Quando volta, me pega no colo e me
leva até o quarto. Lá ficamos deitados e agarrados se consolando.
— Quando você vai? É por causa das olimpíadas?
— É sim, quando a urgência é imediata, é na madrugada do dia da
convocação. Vou partir as 05:00hrs, meu pai disse. É horário padrão pra
chamada de reforços!
— Vai ter que falar com Catarina, explicar tudo pra ela, vai ser muito difícil.
— Vai ser muito difícil para nós três. Não sei como vou conseguir ficar longe
de vocês duas.
— Vai dar tudo certo.
— Também acho, tem até um ponto positivo.
Ele diz e fico curiosa. Tem mesmo??? Ficar sem o homem da minha vida por
um mês inteiro, tinha ponto positivo???
— Qual?
— Essa é a “desculpa” que precisava para aceitar aquela proposta. Você pode
ir pra Barbacena, treinando o tempo passará mais rápido.
— Hum…
Resmungo e Catarina entra no quarto. Saio para pegar os remédios dela, e
aproveito para demorar e deixá-los conversando. Era bom que eu tinha um
tempo para pensar naquela notícia. Tay ia me deixar sozinha por um mês.
Como ia ser aquela distância toda??? Como ele mesmo disse, somos recém-
casados, como a gente ia lidar com uma separação agora? Um mês inteiro.
Trinta dias sem vê-lo. Meu Deus…
— Tudo bem?
Tay me abraça enquanto eu bebia um copo d'água olhando pela pequena
janela da cozinha. Minha mente já estava em outro lugar.
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— Tudo bem! Vai descansar, não pode viajar exausto… vai ter muito
trabalho assim que chegar lá!!!
Eu me viro pra ele e olho em seus olhos.
— Estamos sofrendo por antecipação…
Ele sorri e sussurra como se o que falasse ali, fosse segredo e ninguém podia
ouvir.
— Não quero que vá! São trinta dias, Tay… não quero que vá!
— Entende agora como tenho medo de me distanciar de você!? Vamos fazer
isso dar certo, vamos nos falar todos os dias. Prometo que passará rápido!!!
— Não minta. Nunca vai passar rápido. Vamos sofrer, vai demorar muito!
Vamos falar a real, ser bem sinceros um com o outro. Estamos falando de um
mês sem se ver, estou sofrendo sim, desde agora! Será horrível, já estou
morrendo de saudade de você!
Eu falo evitando chorar e ele ri.
— Vem, vamos cuidar dessa saudade enquanto eu posso.
Ele desiste de conversar sobre o assunto e arruma um jeito de resolver da
maneira que melhor sabia. Me amando.
A gente se ama ate dar a hora dele partir, ele se declara pra mim o tempo
todo, se recusa a me deixar ir até a FAB com ele, e diz “já volto, meu amor”
ao invés de “até o mês que vem”. Eu ‘apenas’ choro de soluçar assim que ele
sai.

[***]

— Vamos, mami! Estamos atrasadas!


Catarina reclama pela milésima vez, mais de um mês havia se passado desde
que Tay viajou pro Rio. Nunca era dia de voltar, nunca podia voltar, o
trabalho com a segurança nunca estava concluído. As olimpíadas acabou, as
paraolimpíadas chegaram, e ele nunca era liberado pra voltar pra casa…
Aceitei o convite para treinar hipismo, me instalei na casa de minha mãe
mesmo Tay dizendo que o casarão e o sobrado tinham mais espaço para mim
e pra Catarina, e fiquei ali, em Barbacena, sem ele.
Com a ajuda e a companhia de minha família, tudo era mais fácil. Tay não
havia dito, mas eu sabia que tinha deixado um segurança para me perseguir
para todos os lados. Matriculei Cat na escolinha, implorei para que Max e
Hella não se mudassem também, porque eu ficaria bem só com minha mãe,
eu daria conta do recado, e toquei minha vida de dona de casa e atleta da

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melhor maneira, acreditava eu.


A primeira semana sem ele foi a pior, a saudade apertou, veio a dor, a agonia,
a solidão, a tristeza, e depois dos telefonemas pra dizer que nunca era o dia de
voltar, veio a raiva.
Era uma tortura ficar sem ele, só ouvindo sua voz pelo celular não era o
suficiente, eu precisava dele, do seu corpo, de sua paz, e às vezes até de seu
caos, mas eu precisava de sua presença. Eu era apenas metade de mim sem
meu marido, e não sabia o que pensar ou o que fazer sem isso. Aquele mês
pareceu um ano.
— Já vou garota, relaxa, por favor!
Eu falo e continuo insistindo comigo mesma de que o meu salto mais baixo
— minhas pernas estavam doloridas. — estava no armário, mas logo desisto.
Estávamos mesmo atrasadas, Tay já deveria ter chego à EPCAR, mas apesar
de muito brava com ele, eu estava morta de saudades, queria estar linda para
recebê-lo.
— Pronto, vamos!!!
Coloco um salto qualquer, e sigo para a escola com Cat no banco de trás.
Assim que chegamos já vejo que o evento já tinha sido iniciado. Meu marido
lindo estava em pé, ombro a ombro com seus companheiros de trabalho, e
ouvia o discurso do militar que falava sobre o trabalho incrível da
aeronáutica, e os serviços efetivos e de suma importância que a EPCAR de
Minas Gerais e a FAB de Pirassununga tinham prestados para o Rio de
Janeiro.
Estavam todos sentados em seus devidos lugares, e todas as atenções
direcionadas ao militar que discursava. Catarina estava agitada e empolgada
para ver o pai e olhava em todas as direções dizendo não encontrá-lo. Paro no
corredor da entrada, visualizo nossos lugares vazios, e me abaixo.
— Filha ele está lá na frente junto com os amigos dele!
— Não está não, não consigo ver! — ela choraminga.
— Vamos nos sentar, — eu falo ainda mais baixo. — assim que a gente se
sentar te mostro onde ele está!
— Me mostra agora! Quero o meu pai!!!
Ela cruza os braços e faz bico. Eu entendia. A saudade era enorme.
— Ali, viu!? — aponto para os militares que naquele momento se levantaram
e ficaram em posição de sentido. — Primeira fileira, bem na frente. Conta até
quatro… um, dois, três, quatro! — vou movendo o indicador. — Ele está ali,
do lado do rapaz moreno! Agora vamos sentar…
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Eu começo, mas paro quando ela grita “já vi”, e sai correndo pelo corredor
em direção ao pai.
— Catarina!!!
Eu sussurro irritada, mas não adianta, ela corre de mim como um raio, não
ouso a tirar os saltos e tentar impedí-la porque eu sabia que tudo ia ser pior se
eu a segurasse pelo braço e a impedisse de chegar perto do pai. Catarina faria
um escândalo colossal que entraria para a história da FAB. MESMO! Então
só esperei e lamentei.
Catarina termina o corredor, invade o grande salão, e agarra os joelhos do seu
pai. Ela o abraça tão forte que dali eu podia sentir. Catarina sofreu, teve febre,
e ficou mais chatinha do que já é normalmente, tudo por causa da ausência de
Tay nesses quase quarenta e cinco dias.
Tay se balança um pouco com o impacto, sorri ao ver a filha, e a pega no
colo. O abraço dos dois me deixa muito emocionada. E eu não fui a única.
—… porque não basta ser patriota… — o militar falava. — Eita, mas o que é
isso? Que emoção!!! — o militar leva na esportiva ao ver uma criança invadir
o salão e sorri para todos. — Isso tudo é um mês fora de casa, Coverick!?
Tudo bem… como eu dizia…
Ele continua, Tay põem Cat no chão, fala com ela sorrindo, beija, abraça, fala
mais alguma coisa, pega ela no colo e também quebra o protocolo deixando a
formação para vir até mim.
Ele caminha em minha direção e meu coração parecia pular na garganta. Eu
estava com tanta saudade do meu denguinho. Tay parecia mais forte, mais
sábio, mais másculo, mais gostoso, mais tudo! Estava lindo! Meu marido
deus grego, todo fardado, estava apetitoso!
— Segura firme, amor, — ele a me entrega no colo, e sorria com aquele
sorriso branco e lindo. — tem que prestar atenção nessa princesa fujona, é
minha única filha, minha encomenda preciosa!
Ele fala, sorri pra mim, e vira as costas após piscar de um jeito sexy para
voltar pro seu lugar. Ele precisava ficar lá até o final, e fardado não podia ter
nenhum contato físico comigo. Não ali!
— Não é sua única filha, você tem duas preciosidades, recebeu a outra
encomenda!
Eu não aguento esperar e falo ali, sussurrando, no meio do evento. Ele para
de andar, espera um momento acho que para ter certeza de que ouviu mesmo
o que eu disse, e se vira pra mim com os olhos cheios de lágrimas.
— Parabéns papai!
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Eu digo chorando, evitando ficar empolgada, e sorrio pra ele. Tay parecia
radiante e realizado assim como eu estava, ficou como eu fiquei quando fiz o
teste no banheiro da nossa casa. Ele ficou extremamente feliz!

A HISTÓRIA CONTINUA, LEIA PRÉVIA NA PÁGINA SEGUINTE: Prólogo de ‘Faço


você lembrar’.
Romance de Jon e Ana Luiza.

“— Minha linda, escuta bem o que eu vou te dizer, eu jamais partirei seu
coração, jamais vou deixar você, serei seu enquanto você quiser, e talvez até
depois disso. Vou te proteger enquanto eu viver, e você nunca mais vai
precisar se preocupar com nada. Entendeu bem??? Dorme tranquila, meu
anjo!”

Trecho do capítulo ‘Privacidade’ - Livro 2.

São Paulo.

Cerca de quatro anos depois.

Aquele sábado era um sábado como outro qualquer. Nada em especial, nada
de diferente aconteceu e eu sabia que continuaria assim por um bom tempo.
Eu vivia minha vida de forma simples e prática: FAB, bares com os amigos
de vez em quando, visitas do meu filho Matheo nos finais de semana, e os
mesmos trabalhos de quando eu estava saudável, mentalmente falando.
Caçar, rastrear, sondar, pesquisar, invadir, adulterar, e “machucar” também,
de vez em quando. Resolver problemas que ninguém queria - ou não davam
conta (de) - resolver.
Eu tinha recuperado uma boa parte de minha memória. Eu estava ciente de
que algumas lacunas ainda deveriam ser preenchidas mas eu já estava de
volta á ativa devido as poucas memórias que voltaram para seu devido lugar.
E se lembrar de tudo - ou quase tudo. - foi o meu castigo.
Reflito sobre a vida após comer a janta que Mariana preparou e escuto o
celular gritar no criado-mudo.
Era ela.
—Fala, Mari!
— Oi, já comeu?
— Acabei de comer...
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— Tem certeza?
— Tenho, mulher.
— Está bem. Só liguei para confirmar! Matheo já chegou? Se ele não chegar
me liga e vou até aí!
— Não precisa, Mari, hoje é sua folga. Ele está atrasado mas já, já chega!
— Certo. Mais tarde vou ligar pra saber se jantou. Me atenda, Jonatas!
— Certo, obrigado!
— Beijos...
Ela resmunga e desligo.
Mariana era um presente. Cozinhava, limpava, cuidava de mim, e até nas
folgas não parava de ligar. Se preocupava comigo, era atenciosa, linda, e
gentil. O oposto de minha ex, quando ocupava seu lugar. Assim que me livrei
dela pela segunda vez após me lembrar de quem ela realmente era, contratei
Mari pela agência, e ela está comigo até hoje.
Matheo é meu filho mais novo, vai fazer vinte e seis anos. Vem pra minha
casa todo final de semana e é um parceiro. Agora meu outro filho, Marcelo, é
grudado com a mãe, não aceita o fim do nosso casamento e não quer saber de
olhar na minha cara. Meu palpite é que ele é fraco, Sara faz uma lavagem
cerebral no moleque que o coitado fica até perturbado, já Matheo é vacinado
contra ela. É meu melhor amigo, e só por causa dele eu me sentia vivo, sentia
que tinha alguém para mim e por mim.
Jogo o telefone na cama e me deito. Sinto minha cabeça doer e acho que é o
cansaço. Eu pensava demais e pensar demais era dolorido.
"Max vai pegar vocês dois juntos, vai se transformar no próprio caos que
carrega dentro de si... um machucará o outro na carne por arma, na alma
por palavras duras, e sangue fresco inundará esse gramado o transformando
em um lago vermelho, e desse pedaço de terra, planta nenhuma nascerá...
vocês só vão parar às custas do sofrimento de Ana Luiza!... foi traído pela
mulher, enganado, magoado, e desconta tudo em si mesmo. Teve o coração
pisoteado uma vez e acha que vai ter sempre.... Já pode parar de caçar,
Jonatas, ela está bem ali... Sua verdadeira guerra é contra você mesmo. Você
ainda tem o dia de hoje.
Trechos de conversas antigas me vêem na memória e a dor é insuportável.
Zumbidos, gritarias, disparos de arma de fogo, choro... o choro dela.
Minha princesa...
Me sento na cama e gemo de dor. Que dor absurda, meu Deus!
— Cadê suas malas???
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— Não vou embora, Max!


— Não abuse de minha bondade, Jon!!!
— Eu amo tua filha. Ficaremos juntos. Por que não aceita logo de uma
vez??? Qual é o MEU problema? Minha idade? Minha profissão? As
pessoas que já matei, que aliás, são números menores que os teus...!? O
empregado da família não pode ter a mão da filha do patrão que é muito
areia para o caminhão dele? Nível muito acima?!
— Jon, para de falar bobagem!!!
— Eu não preciso dar explicações a você! Não quero e pronto!
— Você nem tem razões nenhuma, Max! É a minha vez de cuidar dela, vou
cuidar muito bem, não se preocupe! Vamos te dar lindos netinhos de olhos
verdes, sogrão!!!
Caminho com dificuldade, tudo rodava e a sensação que eu tinha era de que a
casa ia cair em cima de mim. Eu não sabia se eu segurava a parede ou a
parede me segurava. Me arrasto até o armário da cozinha e procuro por
analgésicos. Fazia muito tempo que eu não sentia aquelas dores, tanto que já
fazia algumas semanas que eu não comprava os remédios receitados pelo
médico.
— NÃO ME CHAMA DE IRMÃO, SEU TRAIDOR!!! SAFADO!!!
“Ouço” mais vozes e minha vista escurece. A escuridão me toma e eu me
entrego. Sentir dores cansa.
Apago na cozinha e a dor desaparece.

— PAI!!! PAI!!! OH, Meu Deus...


Desperto sendo chacoalhado por Matheo. O moleque tinha força demais pra
“pouca” idade.
— Ei... ei... tô bem, eu tô bem!
Estico o braço, e bato de leve em sua perna assim que ele realmente começa a
se desesperar.
— Que droga! Você me assustou, levanta, vem!
— Espera um minuto.
Digo olhando pro teto da cozinha. Tudo rodava. Ainda.
— Qual o problema, pai? O que houve?
Matheo parece muito assustado. Estava ajoelhado sobre meu corpo e parecia
pálido de tão nervoso.
— O problema é que me lembrei!
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— Isso é bom. Mas do que você se lembrou?


Ele fica curioso e eu respiro fundo.
— De tudo. E isso não é nada bom!
Me levanto devagar com a ajuda de sua mão estendida para mim e me
recupero. A dor era mais suportável do que a verdade. Max, meu irmão de
coração, não me achava digno de sua filha e além de tudo, tentou mesmo me
matar de uma forma cruel e sem sentido.
— Ele deveria ter me matado...
Resmungo me apoiando no armário e Matheo questiona o que eu dizia.
— Nada. Vou dar uma saída. Volto logo.
Respiro, bebo um copo d'água, pego as chaves do carro e Mat surta.
— Vai pra onde, nesse estado? Pai pelo amor de Deus...
— Tô bem, Mat! Se Mariana ligar, diga que tô dormindo. Não conte nada
disso pra ela.
— Aonde você vai???
— Preciso pagar uma dívida... não gosto de dever pra ninguém.
Principalmente uma divida de anos.
Eu respondo colocando o casaco já na porta da sala. Matheo tenta de todas as
formas me fazer ficar, mas não consegue. Ele bate no vidro dizendo “vai com
calma”, se afasta, e eu tiro o carro da garagem.
Depois de anos minha cabeça recupera mais um pedaço daquele dia
desgraçado e eu não conseguia ficar feliz por ter dado mais um passo no
avanço do meu tratamento. Toda a minha vida de casado eu já tinha
recuperado, FAB, minha relação com a família Coverick, mas a pequena
história que eu tive com Ana, ainda faltavam pedaços, eu tinha certeza que
faltava.
Uma hora depois estaciono na frente da casa dele e entro sem me anunciar.
Estava Max, Hella, Tay, Ellen e o pequeno Dom, filho do Tay com a Ellen.
Olho bem para a cara dele, minha respiração fica descontrolada, Max faz
Ellen sair com o bebê só olhando para ela, e logo se levanta ficando bem na
minha frente.
Acerto um soco forte em seu nariz e não consigo fazê-lo sangrar. Droga.
— Você destruiu a minha vida e a vida dela! Você me feriu gravemente e não
falo só da minha cabeça, das minhas memórias, Max!!! Éramos irmãos e
você tentou me matar porque a gente se apaixonou. Eu não consigo entender,
qual era meu problema? Qual era meu problema?
Eu falo enquanto ele massageava o nariz.
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Hella se aproxima do marido e me olha com desespero, já Tay ficou do jeito


que estava. Sentado e sorrindo para a cena. Tirou uma nota de cinquenta da
carteira e entregou pro pai. Minha revolta havia virado tema de apostas.
— Mat é perspicaz, sabia que você viria. E eu continuo bom em seguir meus
instintos, sabia que viria para descontar a sua raiva.
Ele fala e eu sinto vontade de jogar Hella longe para continuar socando ele.
— E ficou para apanhar? Suponho que é porque sabe que merece, não é!?
— Eu sei. Eu mereço. Já te pedi perdão e peço novamente agora... fui um
babaca, bárbaro, egoísta, e medroso. O problema era comigo, Jon, só depois
da besteira que eu fiz, que eu refleti e vi que você era uma opção maravilhosa
para cuidar dela. Eu devia ter ouvido minha família, Ana Luiza seria muito
bem cuidada por você, protegida, amada... mas tive medo, medo de soltá-la e
reconhecer que eu não tinha mais minha princesinha para me amar. Eu
precisava de um incentivo para ser um homem melhor e o nome dele era Ana
Luiza, até que vi que na vida dela não tinha mais espaço para seu pai super-
herói. Você “estava tomando meu lugar na vida dela”, era essa a impressão
que eu tinha. E você me apunhalou pelas costas, não confiou em mim, se
recusou a confessar, mentiu pra mim, me enganou. Precisei ver minha filha
contigo na cama pra poder descobrir, foi dose! Exagerei, estava transtornado
e alucinando. Sinto muito por tudo isso, Jon, sinto muito mesmo e vou
lamentar pra sempre! O problema nunca foi você, seu trabalho, seu dinheiro,
sua idade, ou qualquer outra coisa. O problema era eu e minhas inseguranças.
Ele fala e me sinto vazio, quase liberto de sentimentos ruins...
— Eu me lembro, eu queria ir até as últimas consequências para aquilo
acabar logo, e acabou não é?! — viro as costas para ele e respiro fundo, eu
estava exausto — Vou embora, só vim te trazer esse presente!
Eu resmungo e já ia saindo quando ele volta falar.
— Do que exatamente se lembrou?
— Da profecia da bruxa, de quando descemos de mãos dadas... da briga e só!
Não se preocupe, ainda não me lembrei de quase nada do que passamos
juntos... ainda não posso tomá-la de você!
Eu ergo uma sobrancelha pra ele e ele se aproxima de mim.
— Já disse que isso não é mais um problema para mim. Luiza pode escolher
quem quiser para namorar, casar, formar família. Melhor ainda se for você!
— Seu apoio veio um pouco tarde. Luiza namora, frequenta baladas, continua
com notas maravilhosas, e recebe rosas vermelhas e orquídeas quase toda a
semana. Ela me esqueceu de vez.
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Eu falo e ele parece surpreso. Eu fiquei ainda mais por saber que ele não
acompanhava a filha de longe. Tinha prometido deixá-la em paz e cumpriu.
— Você a esteve investigando?
— É só o que sei fazer, e é só o que posso fazer, tendo em vista as
circunstâncias.
Eu olho em seus olhos e vejo compreensão.
— E o que sabe sobre o rapaz?
É tay quem pergunta, de repente tão aflito quanto o pai.
— É um mauricinho com a metade da minha idade, e que tem a ficha mais
limpa e impecável que já vi. Faz até caridade. Um ótimo genro.
Eu digo com ironia, uma dor forte no coração e volto a caminhar em direção
á porta. Aquela casa me lembrava ela, de alguma maneira eu sentia sua
presença ali, seu cheiro, e aquilo estava me incomodando demais.
— Semana que vem vamos até lá para a formatura dela. Gostaria que viesse
com a gente!
Max diz, eu paro pra ouvir, e quando ele termina eu saio. Estava bravo, me
lembrar de tudo o que descobri ao investigar a sua vida me deixava arrasado,
falar disso então, nem se fala. Foram quatro anos para tentar esquecer uma
garota da qual eu literalmente não me lembrava. Isso fazia algum sentido?
Com certeza não.
Quatro anos, quase cinco, e por que o tema “Ana Luiza” ainda mexia
comigo? Por que eu ainda pensava nela? Não podia só lembrar com carinho?
Não. Eu precisava continuar pensando, me corroendo, caçando, procurando
sarna para se coçar. Esse idiota, era eu.

— Bateu nele, não é?!


Matheo tem seu semblante bem-humorado apesar de tudo. Ele via TV na sala
e vestia uma muda de roupa minha.
— Só um soco. Só um. E foi pouco, se ele estivesse sozinho eu juro que
matava ele...
— Matava nada. Vocês se amam. Você o ama! Quando ele fez o que fez
estava surtado. Homem nenhum estando com a sanidade perfeita faria o que
ele fez e você está bem, velho! Você é diferente, você não é ele! — Mat bate
no meu ombro com força e sorri. — Foi um soco bem-vindo, ele disse que
podia apostar que você daria um belo soco nele, ele entendeu. — eu bufo.
— Tinha mais é que entender mesmo. Queria que ele revidasse. Max é um
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bananão.
Ele ri e se anima mudando de assunto.
— Ok. Vamos dar uma volta. Eu não fugi da dona Sara pra aguentar outro
descompassado. Vamos sair, fazer um rolê “pai e filho”, pegar umas garotas,
se divertir um pouco...
— E Karina? Já terminaram? — pergunto e ele ri.
— Já, não consigo me prender. Não era ela!
— “Não era ela”. Que papinho mais sem pé nem cabeça, moleque. Tome
vergonha!
Eu falo e ele revira os olhos.
— Ela era complicada, me sufocava. Mas não vamos falar sobre
relacionamentos, aposto que nesse quesito você perde pra mim. - ele ri alto, e
se joga na minha cama de tênis. - Você é muito, mas muito ruim nesse
quesito!!!
— Cale a boca.
— Fala sério, pai... o que você viu na minha mãe??? Sério, eu a amo... mas
ela é um demônio com você. Sempre foi, mas depois do acidente quando
você “terminou” com ela de novo, ela piorou!!!
Matt exclama e eu tiro a blusa para correr pro banho. Penso bem e decido não
falar mal da mãe dos meus filhos pra ele. Não era justo.
— Como você mesmo disse, não vamos falar sobre relacionamentos.
— O que é isso???
Ele se aproxima de mim assim que tiro a blusa e anda ao meu redor. Inferno.
— Quando fez essas tatuagens??? Nunca vi... pai, tá piradão???
Ele fica espantado e eu reviro os olhos.
— É só uma tatuagem.
— O que significa?
— Código binário.
Eu respondo e ele para na minha frente me impedindo de fugir pro banheiro.
Minha tatuagem pegava as costas inteiras, a parte de cima do meu peito, e
acabava bem acima dos cotovelos. Fiz no começo da semana e ele ainda não
tinha visto. Hoje eu vestia uma blusa de mangas compridas, até me esqueci
de que elas estavam ali.
— Não subestime meu intelecto. - ele resmunga e tenta me fazer virar de
costas. — Vai pai, me deixa ler. Decodifico isso em dois minutos!
— Não. Não é pra ser decodificada, é pessoal, Matheo! Vai cuidar da sua
vida!!!
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— Vai esconder? Uma hora vou ler sem você perceber!!!


— Pois tente... — falo e ele bufa.
Entro no banheiro com ele resmungando e eu sabia que nem tão cedo ia
esquecer essa história. Matheo era muito curioso, além de inteligente, desde
pequeno amava um mistério. Se tinha algo que o deixava entusiasmado e
encucado, era arte de resolver enigmas, problemas e por aí vai... parecia eu
quando mais novo. Era determinado, nunca foi de desistir, engolir sapo, ou
travar por qualquer barreira que aparecesse em seu caminho. Tinha mania de
se provar, mania de questionar, e por isso não cabia nos seus vinte e cinco
anos. Matheo era o oposto de Marcelo.
— É um texto. O padrão é longo, vai até sua lombar, pega a nuca, o peito e
desce até os cotovelos! É um texto...
Ele resmunga enquanto eu dirigia.
— Mas que texto você escreveria assim, de um jeito que ninguém poderia
ler...?! Não. São informações sigilosas. — ele pra pensar. — Temos
endereços, nomes, números, palavras desconexas que só você entenderia... —
ele para e eu dou risada. — Se não me disser vou enlouquecer.
— Pois não pense nisso, filho! Me deixe em paz, Mat.
Eu peço e ouço ele respirar pesado.
— Certo. Desculpe! Não vou mais falar disso. Se um dia quiser me contar vai
ser muito irado! — ele diz com compreensão e meu coração transborda
gratidão. — Se me deixar traduzir então, nossa!!!
Rimos juntos. Sua animação me divertia.
— Um dia... — eu olho para ele e depois volto minha atenção para a estrada
— Prometo!
Eu falo e meu filho sorri para mim. Dirijo discutindo a respeito de nossa vida
e ouço sua opinião a respeito de tudo. Usei de muita paciência e bom humor
porque se eu o levasse á serio, nesse momento estaria “me envolvendo com
alguma mulher, e pensando em ter outros filhos. Casar e ser muito feliz
porque eu merecia”. Ok.
Estaciono na frente do bar que ele indicou e me assusto ao chegar e ler a
placa.
— Me trouxe para um puteiro, moleque???
Matheo sorri e também fita a placa com luzes neons.
— Isso não é um “puteiro”, pai! Vai muito além disso. Um amigo disse que
as melhores estão aqui!
Ele ri e entra na frente me obrigando a seguí-lo.
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O lugar era típico. Comum até demais, mas tinha seu toque requintado.
Sentamos em um sofá confortável de couro preto, e logo fomos atendidos por
uma garçonete vestindo um vestido curto e sexy até demais.
— Olá. O que vão pedir?
Ela pergunta parecendo estar entediada, mas se esforça. Lara, estava no
crachá. Parecia que Lara não estava em um bom dia.
Era morena (eu achava) dos olhos negros, traços finos, corpão, usava peruca
com corte chanel branco e olhos bem marcados pela maquiagem. Ela não era
a única ali.
— Uma dose de conhaque, bem velho! E para mim uma cerveja preta, não
quero copo!
Matheo pede por ele e por mim. Ela anota e antes de se retirar Mat pega em
sua mão, sorri pra ela e diz que ela é a garota mais linda do lugar. Lara
ganhou sua noite e saiu sorrindo.
— Vou matar você... — eu resmungo.
— Relaxa, velho.
Ele ri da minha cara e eu fico com raiva. Mas que droga eu estava fazendo
naquele lugar!? Antes da resposta surgir na minha mente, sinto alguém se
sentar do meu lado.
Era uma menina.
— Oi. — ela sorri pra mim.
— Oi.
Respondo e lanço um olhar questionador ao Mat que sorria olhando pra
frente.
— Temos, quartos aqui... quer subir?
Ela sussurra no meu ouvido parecendo artificial demais. Tinha absoluta
certeza de que ela não se sentia atraída nenhum pouco por mim, de nenhuma
forma. Podia até dizer que ela me abordou porque era sua vez ou porque
todas as outras garotas já estavam ‘ocupadas’. Aliás era normal isso, ela era
uma prostituta.
A garota era uma morena incrivelmente linda assim como parecia ser
incrivelmente nova.
— Como você se chama?
— Natasha.
Ela responde jogando os cabelos lisos pra trás.
— Me chamo Jonatas, Natasha. Obrigado pelo convite, mas eu estou de boa...
— Ah! Tudo bem!
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Ela diz desanimada e olha aflita para o cara grande que fazia coquetéis no
balcão.
— Posso te perguntar uma coisa?
— Se for pessoal, não. Sou proibida de falar sobre mim.
Ela novamente se levanta e já começava a se retirar.
— Eu pago.
Eu digo a palavrinha mágica e ela me olha surpresa. No canto esquerdo de
seu lábio superior, seu batom estava borrado, então assim que ela se sentou
do meu lado, eu limpei.
— Quer pagar só pra me fazer uma pergunta?
— Sim.
— Por que? Sou feia?
— Não. — dou risada porque achei fofa sua insegurança e decido ir logo
direto ao assunto. — Quantos anos tem?
Natasha parecia nervosa e constrangida.
— Dezoito.
— Você parece muito nova... tem certeza que é mesmo dezoito?
— Olha, não posso ficar de papo com você, se não vai subir me deixa ir
embora...
Ela parece muito assustada e fico nervoso com aquilo. Podia apostar que
naquela altura, Matheo pensava: “O que meu pai está fazendo que ainda não
subiu com a garota?”
— É nova nisso. É sua primeira vez aqui, não é!?
Eu questiono de novo e ela pula em meu colo. A menina tinha a mesma idade
que Ana tinha quando nos envolvemos, se é que ela dizia a verdade, o que eu
duvidava.
— Você parece um daqueles clientes que as meninas chamam de “raridade”,
“tio carente”, “o que faz amorzinho”, o cliente que se importa. Se importa
comigo, Jonatas? — ela acaricia minhas partes íntimas e eu fico duro quase
no ato, e devido a reação que ela me causou ao fazer aquilo, apenas confirmei
com a cabeça. — Ótimo, então vou jogar a real: nunca fiz isso na minha vida,
e nem sei por onde começar, mas vivo sozinha, não tenho onde morar, e estou
perdida. Se eu continuar batendo papo com você, vou levar uma surra e ser
expulsa daqui. Então eu te pergunto: você quer subir?
Suas mãos continuam me acariciando, agora por dentro da minha calça, mas
minha raiva é maior do que a carência.
— Me diga um nome e eu fecho isso aqui. Acabo com ele.
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— E eu perco meu emprego...


— Quanto quer para ir embora?
— Você é muito maluco!!!
Ela resmunga me olhando incrédula, e sai da mesa praticamente correndo. Eu
estava oferecendo ajuda para uma criança e por isso sou “muito maluco”.
— Que papo de maluco é esse??? — claro. — O lance é subir e esquecer os
problemas, pai! Não tentar salvar a garota e bancar o herói dos prostíbulos,
herói salvador das putas recém-formadas!
Matheo se achega a mim no banco de couro e eu faço sinal para uma
garçonete.
— Essa menina está sem rumo e eu suspeito que é de menor...
— Então uma garotinha que tem peitões, virou puta hoje, e acariciou você!
Meu Deus...
— Ela só fez cena, o chefe é o bartender grandão ali, não pode ficar de
enrolação com o cliente senão apanha. Tem que abordar e arrastar o cara pra
cima... não acredito que me trouxe em um lugar como esse!!!
— Ouvi recomendações boas! Como eu ia saber!?
— Tem que pesquisar. Já parou pra pensar que poderia ter transado com uma
criança de quinze, dezessete!? Isso é nojento.
Eu falo e ele parece lamentar.
— O que vai fazer?
Ele pergunta me olhando nos olhos e parecendo preocupado.
— Primeiro beber outra dose, não entendo como essas coisas acontecem só
comigo. Quanto eu mais fujo...
— Pai, eu acho que você foi com a cara da menina porque...
— Não ouse.
Dou só um aviso e ele vira o resto da garrafinha de cerveja na boca.
Eu não podia deixar ele tocar no assunto “proibido”, principalmente hoje...
naquele momento eu tinha comprado uma briga, tinha um problema que
acabava de virar pessoal, e era algo realmente válido. Pensar nos problemas
dos outros e não em minhas angústias, me ajudava demais. E outra, eu tinha
acabado de dar um soco no meu melhor amigo por ter tentado me matar, eu
havia me lembrado de muita coisa... precisava demais esquecer (novamente)
aquele assunto.
Assim que faço os últimos pedidos e termino meu conhaque, eu chamo o
chefia, o cara que bate em mulheres... cafetão.
— Pois não?
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O velho musculoso questiona fingindo simpatia.


— Aquela mulher com quem eu estava falando... acabamos não combinando
nada, mas gostaria de vê-la antes de ir embora. Tem como?
— Claro. Vou chamá-la. Tudo bem se pagar aqui!?
Ele pergunta e eu lamento, me recusava a pagar pela garota, e mesmo que de
forma indireta ser conivente, mas eu não tinha escolha. Faço o pagamento e
Natasha estende a mão para me levar pro quarto assim que ele manda uma
outra garota buscá-la.
O lugar parecia bem estruturado e limpo.
Natasha entra na frente, arranca o vestido, e se deita na cama enquanto eu
automaticamente virava de costas. Totalmente despreparada, realmente.
— Vista-se.
— Não vou falar da minha vida pra você. Podemos transar ou descer.
Qual vai ser?
Eu olho para trás e ela ainda não havia colocado o vestido então decido
ignorar o fato pois, não podia ficar de costas por uma hora e meia.
— Eu paguei então podemos fazer o que eu quiser, portanto escolho
conversar! — falo olhando para o chão. — Coloque a roupa e me responda:
quantos anos realmente tem?
— Dezoito.
— A verdade...
— Dezoito.
Ela insiste e eu olho para ela erguendo uma sobrancelha. Ela revira os olhos,
bufa, e engatinha até sua bolsa que estava jogada no criado-mudo.
— De-zoi-to.
Ela volta trazendo seu RG e me abraça por trás enquanto praticamente
esfregava o RG na minha cara. Pego de sua mão e verifico. Era autêntico.
— Natália Alves dos Santos. — resmungo.
— Natasha...
Ela sussurra no meu ouvido de forma sexy e eu fujo.
— Bom, isso muda tudo. Mas mesmo assim é muito nova para estar aqui. —
eu me levanto e ela inclina a cabeça para me fitar. — Deveria estar
estudando. Se precisar de ajuda, ou querer sair dessa com dignidade, me
procura. Deixarei meu cartão aqui.
Tiro um cartão pessoal do meu bolso e coloco na mesa ao lado do kit-higiene.
— Por que está fazendo isso?
— Você me lembra alguém por quem tenho um carinho imenso. Tem os
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olhos dela, a idade que ela tinha quando eu a conheci. Está presa em um
corpo e uma vida que não combina, é só uma menina. Uma menina perdida...
Eu caminho para a porta e o que ela diz me faz parar.
— Ela deve ser muito especial. Quer falar sobre ela? Você ainda tem uma
hora e meia...
— Antes de perdê-la eu ainda tinha um dia.
Eu digo com meu coração doendo e saio dali. Aquilo também era demais pra
mim.

— Pai... é o seu telefone. Não vai atender???


Matheo questiona domingo de manhã enquanto tomávamos café. O telefone
fazia a mesa vibrar.
— É o Max. Já sei sobre o que quer falar, mas não quero ouvir!
Eu digo e ele dá de ombros.
O telefone toca mais umas três vezes e eu me recuso a atender. Assim como
naqueles últimos quatro anos, naquela manhã de domingo eu queria paz.
— Por que não vem morar comigo?
Pergunto para Matheo assim que o assunto “minha mãe é um saco”, começa.
— Eu ia me amarrar, mas sei que ela irá triplicar a implicância com você e
Marcelo ia ficar mais pirado do que já está.
— Deixa que com ela eu me resolvo. A gente se dá bem e me sinto muito
sozinho aqui. Aborde o assunto com ela e pense nisso. Se decidir vir, ficarei
muito feliz!!!
— E Mariana? Ela não te faz companhia???
Ele ri erguendo a sobrancelha.
— Esquece disso. Preciso me distrair e não arrumar mulher. Mariana é ótima,
mas se eu der brecha ela não sai daqui nunca mais! Me trata mais como
moleque rebelde do que como homem, e outra, se eu me aproximar ainda
mais dela, ela pode confundir as coisas. Acho que gosta de mim, de certa
forma...
— VOCÊ ACHA??? Só agora você ACHA???
Matheo zomba e na hora certa a campainha toca. Às vezes, quase sempre,
Mat era um saco.
Na porta, era Marcelo, sua visita me deixa mais do que surpreso.
— Oi? Está tudo bem?
Eu pergunto e ele faz cara de tacho.
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— Está. É só a mamãe que está impossível hoje...


— HOJE???
Matheo entra na sala e zomba mais uma vez, só que dessa vez do irmão. Ele
ri e eu o faço parar só com o olhar.
— Vai me deixar entrar ou só o Mat pode? - Marcelo questiona enciumado
como sempre, dou um passo pro lado, e ele entra - Hoje eu acho que posso
lidar com você, porque com ela, não sei não...
Ele se joga no sofá e olha pro teto.
— O que houve com ela, afinal?
Eu pergunto e Matheo ergue uma sobrancelha se segurando para não
avacalhar.
— Ela fica falando umas coisas... te xingando. Tudo é “não seja como teu
pai”, “aff, seu pai falava dessa forma!”, “vou te mandar pro condomínio!”,
“achei que você me apoiava, mas você e o Mat só quererem saber dele!”,
“pede isso pro seu pai, não passa de sua obrigação!”. — ele bufa. — Só pedi
pra ela parar de ficar comprando, comprando, comprando. É uma doença, eu
pesquisei! Aquele armário dela não fecha mais!!! Não sei mais o que fazer!
—- Marcelo se senta no sofá e esconde o rosto, nesse momento Mat que
estava no outro sofá também se levanta e vai até o irmão para consolá-lo —
Não sei como ajudá-la, não sei como consolar ela! Minha mãe tá sofrendo
muito. Tô cansado, tô exausto disso tudo.
Ele chora de soluçar e eu vejo a gravidade da situação. Me sento do outro
lado, o abraço, e não sei bem o que dizer. Só dói demais vê-lo assim.
— Ela fala o tempo todo de você e parece um pouco óbvio do porquê as
minhas tentativas são fracassadas. Ela precisa de VOCÊ e eu não sou você!
— Marcelo, já disse que eu não posso fazer nada... não tenho com ajudá-la,
mesmo porque nesse momento ela mais me odeia do que me ama, filho! Não
posso ficar com sua mãe.
Eu lamento demais. Marcelo nunca ia entender.
— Mas pai, não pode por quê??? — ele pergunta, se levanta, e anda pra lá e
pra cá. Nessa hora que vejo Mat limpando as lágrimas. Ele chora pelo irmão
e lamenta tanto quanto eu. — Você está solteiro há anos, não arruma mulher
nenhuma e minha mãe ama você, está doente de tanto sofrer!!!
— Mas eu não a amo, Marcelo!
— E ama quem? Luiza Coverick? O amor de infância do Mat?! — Marcelo
apunhala meu coração com uma adaga em brasa, ao falar dela. — Eu lembro
dela indo te ver no hospital, não consegui ficar perto dela nenhum segundo.
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Era uma criança, tinha mais ou menos a nossa idade. Acabou com a chance
que vocês tinham de se acertar. Era uma pirralha, uma pirralha que destruiu
ainda mais a nossa familia, pai!
Marcelo vai falando e uma fúria vai crescendo dentro de mim.
— Como pode ter trocado minha mãe, por uma ninfeta de dezoito anos???
Minha mãe que era esposa exemplar, cuidava da gente...
— CALE A BOCA, MARCELO!!! Cale a boca. Não fale dela assim, Luiza
não teve nada a ver comigo e sua mãe, quando ela apareceu já estávamos
separados há muito tempo. Você não a conhecia e pelo jeito não conhece a
própria mãe!!!
Digo porque nenhum dos dois sabiam que ela havia me traído. Preferi não
contar.
— Por que você fala desse jeito? Você sempre insinua as coisas! Não temos
mais dezoito, pai! Somos homens feitos! Diga o que minha mãe fez, ela te
traiu, foi isso??? Porque se for muita coisa muda, muita coisa!!! Conte para
mim e para meu irmão o que houve naquela época! Por que mandou minha
mãe embora, por que não quis ficar com a gente, por que se separaram e
fizeram nossas vidas virarem um caos??? Ela traiu você??? FALA PAI!!!
Marcelo se exalta e eu me recuso a “sujar” a imagem da mãe deles. Sara
podia ter feito qualquer coisa, mas por mais que isso doesse, eu não queria
transferir essa dor para meus filhos, nem se eles estivessem com trinta anos.
A dor era minha. A mãe deles continuava sendo a mãe deles, e nesse quesito
ela sempre foi boa e responsável. Pelo menos até a gente se separar, mas que
seja, sempre tive minha honra e dignidade e ia permanecer com ela, enquanto
eu vivesse.
— Não importa o que houve no passado. Nosso problema foi que o amor
simplesmente acabou. Da minha parte o amor acabou, da parte dela não havia
mais cumplicidade e assim foi. Casamentos acabam, Marcelo. Só tenta
entender, eu imploro, se coloca no meu lugar. Não posso ficar com alguém
que eu não amo só para vocês dois ficarem felizes. E eu? Tudo bem se sua
mãe se recuperar, se essa sua fase ruim passar e você ver sua família “unida”
de novo, mas á custa do meu sofrimento??? É isso o que você quer? Que eu
viva em um inferno, preso, infeliz, só pra vocês dois ficarem bem???
Eu pergunto e ele nega.
— Claro que não, pai. Não desejo isso pra ninguém, muito menos pra você.
Só pensei que pela família, pelo o amor que a gente sente um pelo outro, as
coisas poderiam melhorar e dar certo. Achei que ficar juntos poderia ser a
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nossa prioridade...
Eu me aproximo dele e toco seu ombro.
— Eu amo você, amo mais que tudo. E amo teu irmão, são as minhas
prioridades, mas é só. Sei que você nunca deixaria ela sozinha, mas se
dependesse de mim, os dois viriam morar comigo. Eu amo vocês! Mas o
amor que eu sentia pela tua mãe acabou. — eu também me nego a dizer que
nunca a amei realmente. — Gostaria que você desistisse de tentar juntar nós
dois, porque não vai dar certo. Foi ela quem te mandou aqui?
— Não. Nem eu sabia que ia acabar aqui. Vim dirigindo sem rumo, só notei
quando li a placa da força área na marginal.
Ele resmunga e vejo outra criança perdida na minha frente. Toco de leve em
sua cabeça e o puxo para um abraço que por milagre ele aceita.
— Que maravilhoso... olha que lindeza!!! — Mat bate palmas. — Fizeram as
pazes, muito bom, muito bem... o papai e seus filhinhos! Que tal a gente
aproveitar o momento fofo e dar um rolê por aí???
— NÃO!!!
Eu quase grito, solto Marcelo, e os dois dão risadas. Marcelo ri enquanto
limpava as lágrimas.
— Por que? O que ele aprontou???
Ele questiona se sentando e bagunçando o cabelo do irmão. Ia começar a
contar aonde ele me levou no último “role”, quando o interfone toca
interrompendo o primeiro bate-papo de leve que eu teria com meu filho em
anos. Se é que ele acharia leve o tema “puteiro”.
— Deve ser sua mãe vindo atrás de você!!!
Eu resmungo e ele nega.
— Não duvido nada... veio buscar o primogênito!!!
Ouço Matheo zoar o irmão “favorito” iniciando uma pancadaria falsa, e
atendo o telefone.
— Senhor, tem uma garota querendo entrar. Disse que se chama Natália ou
Natasha, para você se lembrar. Posso liberar?
O soldado diz e eu fico pasmo.
— Claro, deixa ela entrar.
— Quem é? É ela???
Marcelo pergunta e eu até gaguejo.
— Não. É só uma amiga que conheci precisando de ajuda. Fica frio!!!
Eu imploro e vou pra porta.
Abro e lá está ela. Era “Natasha”, só que uma Natasha com um enorme roxo
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no olho esquerdo. As roupas vulgares, e a maquiagem borrada de “ontem”,


continuavam do mesmo jeito. Me pergunto como ela havia me encontrado.
— Entra!!!
Eu peço e ela assente.
Assim que pisa na sala atrás de mim, Matheo põe as mãos na cabeça e solta
um: “Oh-meu-Deus!”, e Marcelo bufa olhando para a menina parecendo ter
nojo.
— Não vou participar disso, e não quero nem saber... tô saindo fora!!!
Ele resmunga, pega o casaco que jogou no sofá e sai batendo a porta fazendo
um barulho grosseiro. Pois que ótimo, além de mimado demais tinha um
péssimo pai. Faltei na educação daquele garoto.
— Sinto muito... Jonatas!
Natália resmunga quase chorando ao ver como Marcelo saiu, e eu respondo:
— Eu também!

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