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Prometheus Asset Management Jr.
IPO’s: retrospectiva histórica
Sobre o artigo
O presente artigo tem por objetivo realizar uma análise histórica no lançamento de
IPO’s na bolsa brasileira, ao menos no período que vai de 2007 a 2020. Pretendo nessa
análise mostrar quais são os fatores que impulsionam o lançamento de novas ofertas
públicas de ações, bem como mostrar que no momento em que escrevo este texto,
vivemos um período de “boom” de IPO’s. Por fim, traçarei paralelos entre os IPO’s da
bolsa brasileira e da bolsa estadunidense em 2020.
O que é um IPO?
Initial Public Offering – o processo de abertura de capital
Oferta pública inicial (do inglês initial public offering – IPO) é o processo pelo qual
ativos começam a ser comercializados no mercado de capitais. Para empresas, o IPO
significa a abertura de capital, ou seja, a distribuição de suas ações na bolsa de valores
pela primeira vez, seja no mercado primário ou secundário.
De maneira geral, empresas de capital fechado são companhias limitadas. Ao abrir
seu capital, essas empresas ganham novos acionistas, de forma que seu controle se
torna mais diluído.
2.
IPO’s: retrospectiva histórica
Os primeiros meses de 2020 foram positivos, mas o que se viu a partir março foi algo
sem precedentes. O restante do ano foi totalmente atípico. Vivemos momentos de
muitas incertezas não só na bolsa de valores, mas na economia como um todo. Uma
crise sanitária que atingiu tudo e todos gerou, ao redor do mundo, graves problemas
econômicos, que mobilizaram bancos centrais dos principais países e blocos do mundo
para gerar liquidez e “salvar” a economia.
Após uma forte queda, a bolsa passou o ano se recuperando, finalmente alcançando
patamares pré-crise no mês de dezembro. Um movimento curioso é que, mesmo com
todos os problemas, o mercado de IPO’s no Brasil não ficou parado. Como pode ser visto
na figura 1, esse ano tivemos a maior captação de empresas por meio de IPO’s,
superando por larga margem o ano de 2007, ano em que 64 empresas abriram capital
na B3 (contra somente 28 em 2020).
140 70
Bilhões
64
120 117 60
100 50
80 40
60 56 30
28
40 20
20 10
0 0
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
Fica claro pela figura acima que o ano de 2007 se destaca na primeira década do
século, ao passo que 2020 se destaca na década atual. Visto isso, devemos agora
explorar os pontos que esses dois anos têm em comum, em busca de esclarecer a
grande dúvida que esse artigo se propõe a responder: o que motiva um aumento no
fluxo de empresas realizando IPO?
3.
IPO’s: retrospectiva histórica
14,00%
12,00%
10,00%
8,00%
6,00%
4,00%
2,00%
2,00%
0,00%
Figura 3 – Pessoas físicas cadastradas na bolsa Figura 4 – Distribuição do capital levantado em IPO’s
3,5 80%
Milhões
3 70%
2,5 60%
50%
2
40%
1,5
30%
1 20%
0,5 10%
0 0%
2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2007 2017 2019 2020
4.
IPO’s: retrospectiva histórica
Repare que em 2007 a situação foi bem diferente, com os estrangeiros dominando as
ofertas. De fato, faz sentido esse número estar diferente hoje. Veja, com a crise causada
pelo coronavírus, investidores buscaram moedas fortes para se proteger, como o dólar, por
exemplo. O que vimos foi um grande volume de saída de dólares do Brasil, e não por
coincidência o câmbio chegou próximo da cotação de R$6,00 a cada US$. Com a
recuperação gradual das economias mundiais e as boas expectativas de vacinas, os
investidores voltaram a tomar riscos em países emergentes, cujas moedas ficaram
desvalorizadas em relação ao dólar. O real brasileiro é uma dessas moedas. Por esse
motivo o fluxo de dólares entrando na B3 aumentou nas últimas semanas de 2020,
pressionando o câmbio para baixo.
Soma-se aos juros baixos a grande liquidez mundial proporcionada pelos bancos
centrais, principalmente pelo FED e pelo BCE, que inflaram seus balanços e afetaram a
forma como todo o mundo lida com o dinheiro. Juntando essa liquidez com a maior
demanda pela bolsa, tem-se como resultado uma onda de IPO’s acelerada por uma forte
recuperação de mercado, onde investidores estão mais propensos a aceitar valuations
mais esticados e, portanto, os olhos dos empreendedores brilham mais forte para entrar
na bolsa nesse momento.
Aqui finalmente chegamos em um ponto importante que merece uma certa reflexão.
Investidores, na euforia de uma série de IPO’s aparentemente atraentes, aceitam
valuations mais esticados por parte dos banqueiros coordenadores das ofertas. Uma vez
que as ofertas são lançadas e negociadas por um tempo, o mercado percebe que talvez o
preço pago não esteja em linha com a capacidade de geração de caixa das empresas e
começam a se desfazer de suas posições. Tal enredo pode ser verificado na rentabilidade
mediana dos papéis após o início das negociações. Se tomadas uma a uma, as 28 ações
que passaram pelo processo de IPO oferecem um retorno médio até o dia 23/12/2020 de
16%, retorno muito distorcido por uma ação em específico, a LWSA3, que acumula alta de
263,79%. Olhando para o retorno mediano, ficamos em somente 1%, com 14 ações no
negativo e outras 14 no positivo.
Consolidando o pensamento, tivemos uma evidente mistura de maior liquidez e alta
demanda na bolsa em 2020, e por isso qualquer oferta lançada era aceita pelos
investidores, mesmo com um preço mais esticado do que o normal, o que ajuda a explicar
o alto volume de captação dos IPO’s desse ano, mesmo em menor número de ofertas do
que em 2007.
Mas quais são as semelhanças entre o cenário de 2007 e 2020? Em 2007 também
víamos um mercado muito mais líquido no âmbito global, cercado de otimismo e que
atraia mais investidores de grande porte para a bolsa de valores. As semelhanças são
simples e evidentes, e nos ajudam a entender que o otimismo do mercado e a maior
demanda na bolsa são fatores que influenciam diretamente no lançamento de novas
ofertas.
dados da B3, o principal índice da bolsa brasileira, o Ibovespa, fechou o ano de 2008 com
uma queda acumulada de 41,22%, após uma alta de 43,65% em 2007. Por sua vez, o índice
MSCI Brasil acumulou, em dólares, uma queda de 58% no período posterior a 2007.
Devemos nos preocupar para 2021?
Como pode ser notado, evidências históricas sugerem um período de ressaca pós
euforia, e isso de fato pode acontecer no ano que vem. No entanto, apresentarei alguns
pontos que, ao meu ver, sustentam a tese de um mercado acionário seguindo em alta
para o ano que logo se iniciará.
Em primeiro lugar, o Brasil ainda possui um mercado de ações pouco desenvolvido em
termos de número de empresas listadas, o que nos leva a crer que mais empresas abrindo
capital num ritmo relativamente intenso pode ser saudável por mais alguns anos. Vale
lembrar que já chegamos a ter cerca de 550 empresas listadas no Brasil, número que hoje
não chega nem a 450.
Ademais, devemos refletir sobre toda a liquidez injetada na economia. Se olharmos o
volume médio de transações diárias na B3 (figura 5), percebemos que desde 2017 o
aumento acontece em um ritmo forte, o que não foi visto em 2007. Todo o dinheiro
injetado na economia global não vai simplesmente desaparecer de um ano para outro, o
que nos induz a pensar que esses níveis de volume podem se sustentar por mais algum
tempo antes de diminuir.
30 29
Bilhões
25
20
15
10
5
5
Por fim, mas não menos importante, vemos que a alocação em bolsa por parte dos
investidores institucionais e estrangeiros ainda está abaixo do que pode ser dado o fraco
cenário de renda fixa que vemos hoje no país. Isso fica explicito na figura 6, que compara
o patrimônio líquido total de fundos de investimentos com a alocação média dos fundos
em ações.
6.
IPO’s: retrospectiva histórica
Bilhões
5.000
20,00%
4.000
15,00%
3.000
10,00%
2.000
5,00%
1.000
0 0,00%
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
7.
IPO’s: retrospectiva histórica
8.
IPO’s: retrospectiva histórica
Figura 7 – Percentual de ações que saíram Figura 8 – Retorno médio do primeiro dia de
acima do teto negociação das novas ações da bolsa
70% 65% 80%
61%
60% 70%
50% 60%
50%
40% 32%
40%
30%
30%
20% 20%
10% 10%
0% 0%
IPO Retorno médio do primeiro dia de
negociação
Fonte: The Wall Street Journal Fonte: The Wall Street Journal
Conclusão
Os IPO’s vão continuar?
Quando algo parece muito óbvio no mercado de capitais, geralmente estamos
deixando passar algum detalhe que pode fazer toda a diferença. Eu diria que é
praticamente impossível fazer previsões certeiras sobre o rumo dos mercados nos
próximos anos, ainda mais depois de tudo o que vivemos em 2020.
No entanto, espero com esse texto ter demonstrado alguns fatores que ajudam a
entender o atual cenário de alta no número de IPO’s, assim como semelhanças entre
diferentes épocas positivas e negativas com os dias de hoje.
Algo que acredito ser importante extrair desse texto é que não podemos nos deixar
levar por momentos de euforia somente pelo “medo de ficar de fora da festa”. Em
momentos como o que vivemos, certamente muitas oportunidades aparecem e vão
continuar aparecendo, mas devemos manter um pé atrás e ponderar muito antes de
entrar em qualquer oferta, afinal, nada melhor que o mercado para surpreender aqueles
que se acham muito espertos.
9.