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Como fazer uma liderança humanizada na

prática
Em seu novo livro "O Coração do Negócio", Hubert Joly, ex-CEO da Best Buy, dá dicas para
humanizar a gestão e engajar a equipe.
Por Bruno Carbinatto Atualizado em 12 ago 2022, 09h39 - Publicado em 12 ago 2022, 06h37

 Arte/Getty Images/VOCÊ S/A

Quando Hubert Joly assumiu a liderança da Best Buy (BBYY34), tradicional rede
americana de lojas de eletrônicos, o desafio era grande. Era 2012, e a empresa tinha
investido pesado numa expansão internacional que se mostrou decepcionante. Agora,
tinha de arcar com o prejuízo. 
Além disso, a ascensão da Amazon estava massacrando o varejo físico de eletrônicos.
E importantes fornecedores da Best Buy, como Apple, Microsoft e Sony, passavam a
abrir lojas próprias, aumentando ainda mais a competição.

Para piorar, o CEO anterior havia renunciado após a descoberta de um relacionamento


inapropriado com uma funcionária.

Resultado: lucro em queda livre, ações despencando e todos apostando que a rede
fecharia as portas.

Mesmo assim, Joly conseguiu recuperar a empresa. Entre as medidas, estava o maior
foco no online, a criação de “mini-lojas” 

temáticas dentro das Best Buys para as grandes marcas (Apple, Samsung etc.) e
treinamento para os funcionários, para que eles conseguissem guiar os clientes em
suas escolhas e explicar sobre os produtos (como acontece nas lojas das fabricantes).

O que Joly diz ser o segredo do sucesso, porém, é outro: uma mudança na cultura da
empresa, com o intuito de focar mais nas pessoas (clientes e funcionários) – uma
filosofia que ele chama de “mágica humana”, e que seria capaz de criar mais
engajamento e produtividade nos colaboradores, e mais desejo de compra nos
consumidores.

Não é a primeira vez que você lê algo assim. O assunto “gestão humanizada” virou
clichê faz tempo, e de tão repetido soa como abstração pura. Mas em O Coração do
Negócio, novo livro de Joly, ele detalha esse modelo com exemplos práticos. No trecho
a seguir, o executivo dá dicas de como atingir a “mágica humana”.
Capítulo 9  – Primeiro ingrediente: conectar sonhos

“Qual é o seu sonho?” 

Jason Luciano, gerente da loja da Best Buy em South Bay, Dorchester, sul de Boston,
fazia essa pergunta a cada membro de sua equipe. Toda resposta era escrita num
quadro branco na sala de descanso, junto ao nome da pessoa. Depois de registrá-la,
Jason sempre dizia ao funcionário: “Vamos trabalhar juntos para ajudar você a realizá-
lo”. 

Visitei a loja de South Bay em 2016, mais ou menos no início do plano de crescimento
Building the New Blue. Como sabiamente me disse Shari Ballard, a fenomenal
presidente de varejo da Best Buy até 2019, não era possível liderarmos uma companhia
como a Best Buy a partir de planilhas em nossos escritórios. 

Eu já sabia que a loja de South Bay vinha se saindo bem e estava ansioso para
descobrir o que o pessoal de lá estava fazendo, para que outras lojas pudessem
aprender. Constatou-se que muito do sucesso se devia à simples pergunta “Qual é o
seu sonho?” e ao que Jason fazia com cada resposta. Ao imaginar o que impulsionava
as pessoas de sua equipe, ele se conectava genuinamente com cada uma delas. Porém
o mais genial era que ele encontrasse um modo de conectar os sonhos daquelas
pessoas ao propósito da empresa.

Jason me contou a história de uma vendedora que sonhava morar sozinha. O que a
impulsionava era o desejo de ser independente. Se permanecesse na base de salário
por hora no departamento de celulares, seria difícil ter condições de pagar por uma
moradia própria. Juntos, eles conceberam um plano para que ela se tornasse
supervisora ou gerente assistente. O que isso exigiria? Que competências ela precisava
desenvolver para conseguir essas promoções? E como ele poderia ajudá-la a chegar
lá? 

Com o apoio de seu gerente e de sua equipe, a jovem ganhou confiança, ajudou a
melhorar o desempenho de sua unidade e se tornou alguém que inspirava seus
colegas. Quando surgiu uma vaga de liderança no departamento de computação, ela foi
escolhida. Após um tempo, realizou seu sonho e passou a ter sua casa. 

O comprometimento do gerente da loja em ajudar todo membro de sua equipe a realizar


seu sonho foi extraordinário, e foi incrível testemunhar isso de perto. As equipes
ganharam energia, o que, somado aos seus talentos, levou a loja a um alto
desempenho. O lema de enriquecer a vida dos clientes por meio da tecnologia permitiu
aos funcionários enriquecer a própria vida quando gerentes os ajudaram a ver como
isso se relacionava com seu sonho, qualquer que fosse. Eles compreenderam que
propósito e relações humanas – entre o gerente de loja e todos da equipe, bem como
entre os camisas azuis [Blue Shirts, os funcionários da Best Buy que lidam diretamente
com o público], clientes, fornecedores, comunidades e acionistas – estão no coração do
negócio.

Engajar-se no propósito da empresa porque ele está em sintonia com o que faz você se
levantar da cama toda manhã é um dos ingredientes essenciais do comprometimento
com o trabalho. Articular claramente e alimentar essa conexão entre o propósito pessoal
e o corporativo em cada membro da equipe é, portanto, um dos papéis cruciais de
qualquer líder, desde altos executivos até gerentes de loja. 

Se, como eu, você teve uma formação focada em dados e análises objetivas, pode
achar isso piegas. No início da minha carreira, eu talvez concordasse com você. Mas
funciona. É o tipo de conexão que testemunhei na Best Buy e vi resultar em algo que
alguns caracterizariam como milagre improvável. 
Humanidade é o que liga o propósito pessoal ao coletivo. A maioria das pessoas quer
fazer algo bom para os outros. Quando uma empresa se esforça para fazer o bem e
ajudar as pessoas, é fácil estabelecer uma conexão entre a motivação pessoal e o
propósito nobre da empresa. Um número crescente de empresários concorda com isso.
Mas como funciona na prática? Como fomentar e alimentar essa conexão?

Expressar claramente a filosofia de “começar pelas pessoas” 

No dia 20 de agosto de 2012, a segunda-feira em que foi anunciada minha indicação


para CEO da Best Buy, eu me dirigi a um grupo de cerca de 500 diretores e funcionários
da companhia, na sede. Expressei, é claro, meu grande entusiasmo para me juntar à
Best Buy, expus minhas ideias sobre a empresa e relatei estar confiante em que,
unidos, conseguiríamos virar o jogo. Também falei sobre minha filosofia de gestão, que
gira em torno de pessoas, negócios e finanças – nessa ordem –, sendo o lucro um
resultado e um imperativo, não o objetivo. E deixei clara minha convicção de que o
propósito de uma empresa não é ganhar dinheiro, mas contribuir para melhorar a vida
das pessoas. 

É importante articular essas ideias cedo e com frequência, para que criem raízes e se
entranhem na organização, nutrindo o terreno para que todos floresçam. 

Shari Ballard foi magnífica em afirmar a nossos 125 mil funcionários que cada pessoa é
importante. Ela enfatizou, enérgica e repetidamente, que o tamanho da empresa não faz
diferença: nós tocamos a vida de cada uma das pessoas. Shari incentivou nossos
gerentes de loja e nossos camisas azuis a olhar para os clientes do jeito que olham para
seus familiares e amigos. Como você ajudaria sua mãe ou seu pai a escolher uma TV
nova? Ou sua irmã? 

[…]

Em março de 2020, pouco depois de eu ter anunciado que deixaria de ser CEO e quase
oito anos após aquele primeiro grande encontro na sede, recebi uma mensagem de um
técnico da Califórnia, Arnie, me agradecendo por ter articulado durante todos aqueles
anos o valor de ser você mesmo, de servir aos outros e de descobrir nosso propósito.
Arnie disse que isso o havia ajudado não apenas no trabalho, mas na vida. Suas
palavras de agradecimento me tocaram profundamente, é claro. Também me fizeram
perceber que expor com clareza essas crenças tinha tocado mais pessoas do que eu
imaginava. 
Explorar o que impulsiona as pessoas à sua volta

Já vimos como isso funcionou na loja de South Bay, em Boston. Mas testemunhei
outros exemplos. O retiro da equipe executiva em que trocamos histórias pessoais
marcantes e nossas motivações gerou uma conexão entre nós, bem como aprofundou
nosso entendimento da ligação que havia entre nós e a missão da empresa. Lembro
também que, em minha entrevista para a vaga de CEO na Carlson, Marilyn Carlson
Nelson me disse: “Fale sobre sua alma”. Ela queria saber o que me motivava e se isso
se alinhava com o propósito e os valores da companhia. Contei o que havia extraído
dos exercícios de Loyola: a importância da minha vida espiritual, como tinha evoluído
com o tempo e minhas ideias sobre lucro e o propósito das corporações. Estávamos
num voo de Paris a Minneapolis que duraria nove horas, ou seja, tivemos muito tempo
para discutir a questão. 

Após décadas de “negócios em primeiro lugar” como credo corporativo dominante, é


hora de encontrar significado no negócio. Isso começa com o propósito de cada um de
nós. Começa por compreendermos como nosso propósito pessoal está alinhado – e se
está alinhado – com o propósito da empresa. 

Compartilhar histórias para incentivar a geração de exemplos 

Nosso cérebro é estruturado para se conectar mediante o ato de contar histórias. A


narrativa nos dá a sensação de experiência e humanidade compartilhadas. É algo em
que encontramos naturalmente significado e inspiração. Contar histórias cotidianas – de
funcionários, clientes, comunidades e de como eles impactam a vida uns dos outros –
fomenta o propósito e a conexão com a empresa em que trabalhamos e as pessoas
com quem trabalhamos. 

Há maneiras fáceis de fazer isso em qualquer organização. O blog da Best Buy coleta e
publica histórias. Camisas azuis realizando cirurgia num dinossauro de brinquedo
quebrado, funcionários ajudando veteranos sem-teto e famílias que perderam seus bens
nos incêndios na Califórnia, pais e filhos usando camisas azuis são mais exemplos de
como ligar propósito à prática. 

Acho que ter modelos a seguir ajuda também. Compartilhar explicitamente experiências
de trabalho significativo e articular a conexão com o propósito da companhia fomentam
um sentido coletivo dentro de uma organização. Isso também cria um ambiente fértil e
educativo para que as pessoas identifiquem seu propósito e sinaliza que é algo
importante. Mesmo agora que estamos avançados na campanha de crescimento
Building the New Blue, toda reunião começa com o tema dos exemplos inspiradores. As
pessoas contam sua história pessoal de mudança, por que isso importa para elas e
como a Best Buy e o propósito da empresa se encaixam nisso. 

[…]

Pode parecer que estou fazendo propaganda, mas essas histórias relembram a todos
na Best Buy qual é o propósito da empresa, como cada funcionário contribui para esse
propósito e como ele impacta a vida das pessoas. Manter essa conexão é crucial para o
comprometimento. 

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