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FORMAÇÃO DE FORMADORES BÁSICOS to, tenha de lançar mão de habilidades tecnológicas (Soares,
1992). Quer sob o ponto de vista mais individual (satisfação),
Pedro Demo* quer sobretudo do ponto de vista social, coletivo (participação),
qualidade denota intrinsecamente uma questão política, ou
Introdução seja, processo e produto tipicamente humano. Qualidade
política não se contrapõe à qualidade formal, técnica, metodo-
Trata-se de discutir, de modo introdutório e tentativo, a lógica, antes uma implica a outra, cada qual com sua lógica
relevância da profissão de formadores básicos, considerada própria. Com isto, fica patente que a formação dos professores
desde logo estratégica, no sentido de condicionar decisivamente será o fator mais decisivo da qualidade educativa básica.
as oportunidades de desenvolvimento da sociedade e da
economia. Embora ainda esteja marcada pela seleção negativa, De outro lado, no contexto do planejamento estratégico,
porquanto não desempenha atração profissional entre os jovens torna-se consenso cada vez mais comum que educação represen-
nem lhes garante futuro promissor, teríamos de rever radi- ta a vantagem comparativa (competitiva) mais decisiva face às
calmente tal situação, na dupla dimensão da valorização oportunidades de desenvolvimento, desde que qualitativa e
profissional (remuneração, carreira, organização política, etc.) moderna. Diante do desafio de construir projeto moderno e
e da competência técnica (capacidade de estar cientificamente próprio de desenvolvimento, educação emerge como fator
à frente dos tempos). No pano de fundo está a nova maneira de crucial tanto no repto "moderno" (manejo e produção do
visualizar o papel da qualidade da educação, que, sem jamais conhecimento, fator principal das mudanças que se impõem
decair em panacéia, de modo geral ocupa a posição de estraté- neste fim de século), quanto no repto "próprio" (humanização da
gia primordial de desenvolvimento. Algumas hipóteses de modernidade¹ e fecundação vantajosa a partir das identidades
trabalho são aqui cruciais. culturais). Educação significa a possibilidade de realizar
modernidade que seja menos parametrização externa (de fora
De um lado, a problemática da qualidade, valorizada hoje em para dentro, de cima para baixo, via produção econômica,
todos os âmbitos políticos, sociais, econômicos, tecnológicos, consumo e meios de comunicação), e mais conquista por parte
ambientais, aponta invariavelmente para o fator humano como
gerador/promotor específico de qualidade, ainda que, para tan-
1 Tomamos modernidade aqui no sentido simplificado de desafios de mudança
que sobrevém à sociedade e a economia neste fim de século, sem entrar em
polêmica conceituai. Trata-se de mudanças estruturais em todos os níveis, cujo
Doutor em Sociologia e Pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica móvel mais relevante seria educação (ciência e tecnologia), desde que qualitativa.
Aplicada (IPEA).
Terceiro, é mister, mais que aprimorar os professores, recriar É mister, no desafio de compor o progresso técnico com o
a profissão em muitos sentidos. A razão mais fundamental é o humanismo, imprimir nos educadores e na universidade como
reconhecimento de que se t r a t a de profissão estratégica, em um todo o compromisso com a pesquisa, a elaboração própria,
cujas mãos está, em grande parte, o futuro do país em termos a teorização das práticas, a crítica e a criatividade, superan-
de desenvolvimento. Por conta disso, corresponde-lhe, de um do-se a cópia da cópia, o mero ensino e a mera aprendizagem.
lado, competência clara e sempre renovada em termos de É fundamental atualizar o humanismo, ainda perdido em
manejar e produzir conhecimento, e, de outro, valorização velharias típicas de ciências h u m a n a s discursivas e super-
profissional definitiva, para que seja marcada pela seleção ficiais. É fundamental "educar" a modernidade, para que o
positiva. Ademais, todos os professores deverão deter com o progresso não persista tão insistentemente na concentração da
tempo pelo menos formação de 3º grau, eliminando-se a renda. A universidade teria de ocupar o lugar que a sociedade
diferença odiosa e arcaica entre professores menores (normalis- e a economia dela esperam, a saber, o lugar onde se discute, se
tas) e maiores (Pimenta e Gonçalves, 1990; Alves, 1992; monta, se ensaia, se efetiva o futuro (Greenfield, 1988; Salm,
Candau, 1991). 1991).
Faz parte desse repto, assim, também a participação da Cabe ressaltar o impacto da qualidade educativa sobre a
universidade em termos de formação dos professores de competitividade e qualidade da economia, algo que os educado-
educação básica e de reciclagem permanente, tomando-se em res geralmente têm receio de colocar, por conta do risco de
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