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ADNA LUANA DA COSTA SOUZA

A BR 319 E SUA IMPORTÂNCIA ESTRATÉGICA PARA A DEFESA NACIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Escola Superior de Guerra – Campus Brasília, como
exigência parcial para a obtenção do Título de
Especialista em Altos Estudos em Defesa.

Orientador: Prof. Cel Gustavo de Souza Abreu

BRASÍLIA
2020
Este trabalho, nos termos de legislação que
resguarda os direitos autorais, é considerado
propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE
GUERRA (ESG).

É permitida a transcrição parcial de textos do


trabalho, ou mencioná-los, para comentários e
citações, desde que sem propósitos comerciais e
que seja feita a referência bibliográfica
completa. Os conceitos expressos neste trabalho
são de responsabilidade ao autor e não
expressam qualquer orientação institucional da
ESG.

_______________________________________
A BR 319 e sua importância estratégica para a Defesa Nacional
Adna Luana da Costa Souza1

RESUMO
Este artigo científico tem como foco explicar os efeitos negativos decorrentes da falta de
investimentos na BR 319, quanto aos interesses que têm relação com o tema Defesa Nacional.
O déficit nas contas públicas, o discurso de proteção à biodiversidade e aos povos da floresta,
reduzem a possibilidade de investimentos no setor de transportes, comprometendo a integração
nacional, o desenvolvimento regional, o intercâmbio fronteiriço do Brasil com os países
vizinhos e as ações estratégicas do MINFRA. Ao relacionar o projeto da BR 319 e as ações
estratégicas, identificou-se vazios demográficos, a ausência do Estado, a carência de integração
com as demais regiões do país e países fronteiriços, o que torna a região vulnerável a ação de
organizações que cometem crimes ambientais e transnacionais. Ao final deste artigo, se espera
equacionar esses problemas através de um planejamento de longo prazo, no qual se aplique
políticas públicas que envolvam todas as instituições, em especial o Ministério da Defesa,
propiciando o desenvolvimento sustentável à região amazônica, a fim de que a presença do
Estado seja consolidada e se possa garantir efetivamente a soberania brasileira na região, com
reflexos positivos para a Defesa Nacional.
Palavras-chave: BR 319. Desenvolvimento. Defesa Nacional.

BR 319 and its strategic importance for National Defense


ABSTRACT
This scientific article focuses on explaining the negative effects resulting from the lack of
investments in the BR 319 highway, as to the interests that have to do with the National Defense
theme. The deficit in public accounts, the discourse on protection of biodiversity and forest
peoples, reduce the possibility of investments in the transportation sector, compromising
national integration, regional development, Brazil's border exchange with neighboring
countries, and MINFRA's strategic actions. By relating the BR 319 project and the strategic
actions, demographic gaps were identified, the absence of the State, the lack of integration with
the other regions of the country and bordering countries, which makes the region vulnerable to
the action of organizations that commit environmental and transnational crimes. At the end of
this article, it is expected that these problems will be addressed through long term planning, in
which public policies involving all institutions, especially the Ministry of Defense, will be
applied, providing sustainable development to the Amazon region, so that the presence of the
State will be consolidated and Brazilian sovereignty in the region can be effectively guaranteed,
with positive reflexes for National Defense.
Keywords: BR 319. Development. National Defense.

1
Assessora Técnica da Diretoria de Defesa e Segurança Nacional da Secretaria de Assuntos Estratégicos da
Presidência da República. Trabalho de Conclusão do Curso de altos Estudos em Defesa (CAED) da Escola
Superior de Guerra (ESG), Campus Brasília, 2020.
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1 INTRODUÇÃO

Um levantamento histórico mostra a importância da construção de rodovias e em


incentivos à migração, a intenção do Governo Federal era possibilitar a ocupação
da Amazônia de forma a garantir o controle estratégico sobre a região. Nesse contexto, a BR
319 foi aberta e construída entre 1968 e 1973, a inauguração oficial aconteceu em 27 de março
de 1976.
A rodovia BR-319, à época, exerceu papel fundamental na integração territorial após
1973, ano que começou a oferecer trafegabilidade. Até a década de 90, um fluxo contínuo e
constante de veículos existiu entre as cidades e vilas, ao longo do traçado rodoviário, composto
pelas linhas de ônibus que interligavam Manaus às rodoviárias de Porto
Velho, Cuiabá, Brasília e São Paulo. Assim, não se pode deixar de fazer referência ao
transporte de carga, já que, apesar da navegabilidade dos rios Amazonas e Madeira, uma
parcela significativa do transporte de produtos alimentícios e de componentes para o Polo
Industrial de Manaus ocorria pelo modal rodoviário.
A conservação e manutenção da BR-319, pela importância da rodovia no processo de
integração e desenvolvimento da Amazônia Ocidental e pelo potencial produtivo da região é
fundamental para a região e para o Brasil.
Partindo do pressuposto da importância do assunto que é discutido por mais de três
décadas por vários entes públicos e políticos e grande parte da sociedade, por se tratar de um
tema que privilegia uma visão integrada de desenvolvimento e considera diversas dimensões
de transversalidade, surge a tese que será abordada pela pesquisa. A BR 319 e sua importância
para a defesa nacional em vários eixos de interesse.
Diante da exposição da importância da recuperação da rodovia em discussão, surgem
alguns questionamentos que motivam a presente investigação e que serão objetos de pesquisa
ao longo do desenvolvimento do artigo científico. Esta indagação se formula no sentido de
buscar entender o abandono da BR 319, fundamental acesso por terra de dois estados
amazônicos fronteiriços. A pergunta que fica é: quais as implicações da continuidade da falta
de investimentos na recuperação BR 319 para a Defesa Nacional?
O objetivo geral deste artigo científico é explicar as implicações da falta de prioridade de
investimentos à BR 319, notadamente quanto aos interesses nacionais de modo compatível com
a estrutura político-estratégica do pais, de forma a garantir a integração dos povos regionais e
internacionais, e o desenvolvimento econômico através do modal terrestre. Para se alcançar este
objetivo, (05) cinco objetivos específicos foram delineados: a) caracterizar a vantagem
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estratégica da BR 319 para a integração do Brasil com o restante da Amazônia Legal; b)


destacar a importância do desenvolvimento regional e a área de influência física da rodovia; c)
evidenciar a importância da ligação terrestre entre Manaus e Boa vista com o sistema viário
nacional e o corredor de exportação e importação de parte da América do Sul com o Brasil; d)
ressaltar a importância da capacidade do modal terrestre para a defesa dos interesses nacionais;
e) apresentar as ações estratégicas do MINFRA que beneficiarão, a longo prazo, a BR 319 e
concluir sobre os efeitos negativos decorrentes da falta de investimentos para a Defesa
Nacional.
As estradas significam circulação de riqueza, alternativas e possibilidades de novas
atividades econômicas, e o fator primordial para a integração de novas fronteiras. Nesse
contexto está a importância de reabertura da BR 319, com a conservação e manutenção da
rodovia. A viabilidade de reabertura da rodovia é um argumento que vai além do
desenvolvimento da Amazônia Legal, sendo um assunto que transcende os interesses regionais,
tornando-se uma questão de interesse nacional que busca garantir a soberania de um pais e
prover o bem estar de seu povo.
Para o desenvolvimento da argumentação do tema em questão, foram consultados a
Política Nacional de Defesa (PND), a Estratégia Nacional de Defesa (END) e o Livro Branco
de Defesa (LBD). Com o intuito de entender também o pensamento estratégico voltado para a
infraestrutura do sistema viário nacional foi consultado o Caderno de Estratégias e o Plano de
Estratégia do Ministério de Infraestrutura, e os projetos previstos para o setor até 2022. Sob a
perspectiva acadêmica, Abreu (2018) destaca a transversalidade entre o sentido do
desenvolvimento nacional e a Defesa do Estado Brasileiro.
A Amazônia, pode-se afirmar, é um inderrogável patrimônio do Brasil
constituído por bens e interesses nacionais importantíssimos para o Estado e
sua sociedade. Além de representar cerce de metade do território nacional,
onde vive não desprezível parcela da população nacional, inclusive a maior
parte da sua sensível população indígena, a região é percebida interna e
internacionalmente como uma inesgotável reserva de riquezas naturais de toda
ordem. Por isso constitui pólo de atração de pesquisadores, empresários,
turistas, e também, de indesejados expropriadores, criminosos ostensivos de
toda ordem bem como os trasvestidos de outras categorias (ABREU, 2018, p.
173).

Por meio das fontes levantadas e já elencadas, além de outras, que surgiram no decorrer
do desenvolvimento deste artigo, buscou-se realizar uma pesquisa bibliográfica e documental,
analisando, registrando e correlacionando os aspectos e as variáveis do tema, inclusive
coletando dados diretamente em órgãos governamentais, como o Ministério da Defesa (MD) e
o Ministério da Infraestrutura (MINFRA).
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Diante desse quadro, a pesquisa se apresenta organizada em 05 (cinco) partes


subsequentes e as considerações finais.
Inicialmente, fez-se uma análise da BR 319, destacando a importância da recuperação da
rodovia no sentido de integrar completamente, uma parte esquecida da região amazônica ao
restante da Nação Brasileira; Na sequência, analisou-se a rodovia sobre o eixo do
desenvolvimento regional, citando a área física que será diretamente atingida positivamente
com a recuperação da rodovia; Em seguida é apresentada a necessidade, não somente de
integrar a área em questão às demais regiões do país, mas também integrar o Brasil aos países
fronteiriços, incentivando assim as importações e exportações, o que somente será possível
através da reativação de uma rodovia que estará entre os centros políticos e econômicos,
interligando-os às fronteiras e propiciando uma base física para existência dos fluxos comerciais
e de pessoas entre os países. Logo após, foi destacada a Capacidade de Mobilidade Estratégica,
a qual refere-se a condição de que dispõem a infraestrutura logística do País, ressaltando a
importância da capacidade do modal terrestre, que permita, as Forças Armadas deslocar-se,
rapidamente, para a área de emprego, no território nacional, quando assim a defesa dos
interesses nacionais forem impostas. E por fim apresentou-se as principais ações estratégicas
do MINFRA, correlacionando-as com o projeto de recuperação da BR 19 e o motivo de cada
ação estratégica está diretamente ligada, de forma eficiente ou ineficiente, no que se refere a
proporcionar facilidades para a garantia da soberania sobre o território amazônico.
As considerações finais fecham o trabalho, oportunidade na qual é apresentada a
confirmação da hipótese de que a continuidade da falta de investimentos na recuperação da BR
319 trazem implicações que impactam negativamente a manutenção da soberania com reflexos
na Defesa Nacional. A solução a esse problema contempla ações estratégicas e projetos de
Estado de longo prazo que proporcionem a integração da região em questão com o restante do
país e o seu desenvolvimento sustentável. É o que será apresentado a seguir
.
2 ASPECTOS CONCEITUAIS
Inicialmente, se faz necessário definir alguns conceitos, antes de uma abordagem mais
detalhada sobre a importância da BR 319.
É relevante ressaltar que a Amazônia representa um dos focos de maior interesse de
Defesa no contexto de Pan-Amazônia.
A Pan-Amazônia, equivalente à totalidade da Amazônia na América do
Sul, tem, em números aproximados, 40% da área continental sul-americana e
detém 20% da disponibilidade mundial de água doce. A maior parcela de
extensão amazônica pertence ao Brasil – cerce de 70%. O Brasil afirma sua
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incondicional soberania sobre a Amazônia brasileira, que possui mais de 4


milhões de km², abriga reservas minerais de toda ordem e a maior
biodiversidade do planeta (LBD, 2016, Território, apud ABREU, 2018).

O primeiro deles é o desenvolvimento econômico. Sob o prisma econômico,


“desenvolvimento é, basicamente, aumento do fluxo de renda real, isto é, incremento na
quantidade de bens e serviços por unidade de tempo à disposição de determinada coletividade”
(FURTADO, 1961, p. 115-116).
O segundo conceito, e não menos importante, é o de Defesa Nacional. A Política Nacional
de Defesa e a Estratégia Nacional de Defesa (PND/END), aprovada pelo Presidente da
República em julho de 2020 (BRASIL, 2020, pag 11) define Defesa Nacional como ‟o conjunto
de atitudes, medidas e ações do Estado, com ênfase na expressão militar, para a defesa do
Território Nacional, da soberania e dos interesses nacionais contra ameaças
preponderantemente externas, potenciais ou manifestas. ˮ
A defesa Nacional é essencial para a consecução do desejado grau de segurança do Brasil.
Seguindo nessa linha de raciocínio, há de se considerar que existem diferentes perspectivas
sobre a Defesa Nacional. Para o presente trabalho será usada a perspectiva abrangente, na qual
o espectro da Defesa Nacional não se restringe somente à esfera militar, mas também às esferas
do desenvolvimento, da integração e o cunho social.
Não há como se dissociar a defesa do País de seu desenvolvimento, na medida em que
depende das capacidades instaladas, ao mesmo tempo em que contribui para o aproveitamento
e a manutenção das potencialidades nacionais e para o aprimoramento de todos os recursos de
que dispõe o Estado brasileiro.
Mas como correlacionar defesa, segurança, desenvolvimento com a BR 319?
Quais as reais implicações da continuidade da falta de investimentos na recuperação BR
319 para a Estratégia Nacional de Defesa?

2.1 A BR 319 COMO FATOR DE INTEGRAÇÃO NACIONAL

A região Norte do Brasil ainda precisa ser, completamente integrada ao restante da Nação.
(BOGONI, et al, 2015, p. 103), em seus estudos sobre desafios para a integração, narra que
houve um tempo, que além de estar distante dos centros do poder, a região estava esquecida,
para não dizer abandonada à própria sorte.
Já Gheller, Gonzales e Mello (GHELLER et al, 2015, p. 20), em seus estudos sobre a
Amazônia e o Atlântico Sul, definem que “a criação de uma infraestrutura seja um objetivo de
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longo prazo, sobretudo pela dificuldade em integrar e conectar a região como um todo, tendo
em vista suas características naturais.” Além de que, há muitas dificuldades de se construir
novas malhas viárias ou recuperar as que foram abertas em décadas passadas, em especial
quando cortam reservas ambientais. A obtenção de licença ambiental, pressões internas e
externas e pendengas judiciais, levadas a cabo contra o Estado por organizações não-
governamentais (ONG) e de determinados grupos em defesa dos povos indígenas são exemplos
concretos dessas dificuldades.
Entre 1970 e 2015, houve mudanças substanciais no controle e na
destinação de parcelas territoriais, situadas ao longo das rodovias amazônicas.
No passado, foram destinados 100 km de cada lado das grandes rodovias para
uso federal, disponibilizados à implantação de projetos de colonização e
mineração. Contudo, ainda hoje, depois de quatro décadas, essa cartografia
mostra outro panorama, pois o Governo Federal e seu aparato político e jurídico
intervieram no ordenamento territorial, no sentido de que os blocos de
florestas, situados nas margens destas rodovias, num raio de 10, 50, 100, 200
km, fizessem/façam parte de um conjunto de unidades de conservação, além
de consistirem, em alguns casos, de terras indígenas e parques nacionais. Isso
registra a interferência com inserção de políticas voltadas para diminuir as
ações predatórias sobre uma parcela da Amazônia (OLIVEIRA NETO;
NOGUEIRA, 2016, p. 21).

No caso da BR 319, existem unidades de conservação ao longo de sua extensão, o que


dificulta o desenrolar do processo de repavimentação da rodovia. O mapa da figura 1
exemplifica a infraestrutura da BR 319, identificando, inclusive, os trechos intrafegáveis, as
comunidades que se encontram isoladas nas margens da rodovia e as unidades de conservação
existentes ao longo da BR.
Figura 1 - Mapa situacional da BR 319

Fonte: Software QGIS (BRASIL, 2020).


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Hoje, após quatro décadas, as mudanças substanciais nos processos de ordenamento


territorial brasileiro, a questão ambiental e a inserção do Brasil no comércio mundial devem
servir como elementos balizadores para a abertura ou recuperação de estradas na região
amazônica. Primeiramente, deve-se deixar claro que a pressão migratória para a região é muito
inferior à do passado; não há, por parte do Estado brasileiro, novos projetos de colonização e
assentamento na região, nem de estímulo à migração, a qual, para a região amazônica, tem se
voltado mais para as cidades do que para o mundo rural. A Amazônia também participa da
integração brasileira ao mercado mundial, e, numa integração sul-americana, ela é central, ou
seja, deverá ser cortada por diversos fluxos. A população amazônica também tem direito à
mobilidade ampla, rápida e integral como em outras regiões do país, não ficando confinada,
refém do transporte fluvial, lento e desconfortável. Enfim, os mecanismos de controle
ambiental, instituídos pelo Estado, podem determinar formas específicas de regulação para
abertura desses empreendimentos.

2.2 A BR 319 COMO FATOR DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Segundo o Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas


(IDESAM), foi realizado um trabalho que intensifica a sua posição contrária à obra de
recuperação da BR 319, onde afirma que a retomada da obra poderá gerar um desmatamento
estimado entre 5,1 e 44 milhões de hectares da Amazônia Legal. O estudo acrescenta que a área
de influência física da rodovia BR-319 atinge diretamente 11 municípios, atravessando seus
territórios, sendo estes: Beruri, Borba, Canutama, Careiro Castanho, Careiro da Várzea,
Humaitá, Manaquiri, Manaus, Manicoré, Tapauá, e Porto Velho. E que é capaz de influenciar,
também, municípios conectados à BR-319 por outras rodovias como Lábrea pela rodovia
federal BR-230 (Transamazônica) e Autazes pela rodovia estadual AM-254 (Meirelles et al.
2018).
O estudo de impacto ambiental (EIA) da BR-319 afirma que “no âmbito econômico, a
rodovia tem como objetivo ser uma opção de escoamento da produção industrial de Manaus
para o centro-sul do país” (UFAM; DNIT 2009, vol. 1, p. 33), porém estudos realizados
contradizem a presunção de viabilidade econômica dessa afirmação (FEARNSIDE; GRAÇA
2006; TEIXEIRA 2007; FLECK 2009). A análise comparativa dos custos de diferentes opções
para o escoamento da produção de Manaus para são Paulo indicou que transporte via a BR-319
seria 19% mais caro que a principal modalidade atual (balsas carregando carretas até Belém,
seguido de transporte rodoviário de Belém até São Paulo). Uma análise econômica pelo
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Conservation Strategy Fund indicou que a BR-319 causaria prejuízo atualizado de até 316
milhões de reais em um período de 25 anos, demonstrando que a reconstrução da BR-319 não
é viável economicamente, e este prejuízo pode ser maior se forem considerados os custos
ambientais e as medidas mitigatórias e compensatórias que devem ser implantadas para reduzir
os impactos ambientais (FLECK 2009).
Por outro lado, os transtornos decorrentes da desestruturação da rede provocaram, em
escala local, uma “desordem” numa velocidade sem precedentes, estabelecendo processos de
abandono de propriedades, desde residências, fazendas e até postos de combustível. Uma
década após a inauguração da rodovia, ela já apresentava inúmeros problemas que afetavam,
diretamente, o fluxo de veículos que a utilizavam e, em pouco tempo, a BR-319 se constituiu
numa via intrafegável aos veículos que circulavam diariamente, apresentando problemas para
o fluxo de passageiros e escoamento de mercadorias entre as cidades de Manaus, Manicoré,
Humaitá e Porto Velho.
Muito se fala sobre a também chamada de Rodovia Manaus - Porto Velho mas sempre se
tem algo a somar. É um direito de ir e vir; além de uma possibilidade para o turismo; o retorno
da rota para escoar a produção do Polo Industrial de Manaus; mais uma alternativa de acesso
ao restante do país; inclusão de Manaus e Boa Vista na malha rodoviária nacional. Rodovias
significam alternativas de acesso e possibilidades de novas atividades econômicas.
“Não há país desenvolvido sem uma infraestrutura de transporte efetiva”. E partindo dessa
frase dita pelo Ministro de Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, o Caderno de Estratégias
(CE), lançado no ano de 2019 pelo MINFRA, teve como base a Política Nacional de
Transportes (PNT) e vislumbra “um país com mais produtividade e oportunidades, regiões
geoeconômicas mais integradas e desenvolvidas.” (grifo nosso) (BRASIL, 2019, p. 4).

2.3 A VISÃO DA BR 319 COMO EIXO DE IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO (IIRSA)

O Estado brasileiro esteve presente ao longo da elaboração de projetos viários de


integração territorial para a Amazônia. O princípio da integração do território pelas redes físicas
se perpetua até o início do século XXI, apesar das preocupações ambientais dominarem o
discurso de instituições do próprio Estado. É clara a semelhança dos projetos rodoviários
elaborados antes do governo militar e implantados durante esse regime, bem como com os
atuais projetos da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana-IIRSA
e do Programa de Aceleração do Crescimento-PAC. A cartografia mostra isso, afinal, os pontos
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de conexão permanecem praticamente os mesmos, referendando a ideia do condicionamento


espacial.
Atualmente, não basta diminuir as barreiras comerciais entre os países para estabelecer
fluxos entre ambos, é necessário, inicialmente, que se garanta uma estrutura capaz de
possibilitar esses fluxos entre os territórios, seja uma ponte entre duas cidades fronteiriças ou
uma rodovia entre os centros políticos e econômicos, interligando-os às fronteiras e propiciando
uma base física para existência dos fluxos comerciais e de pessoas.
A própria ação do homem sobre um objeto geográfico ocasiona ordens e desordens, como
se pode observar, ao longo dos anos com a interrupção dos fluxos na rodovia BR-319. A secção
na rede física promoveu o rompimento de inúmeros fluxos e diversas redes, sejam elas de
relações sociais ou de transporte, propiciando uma mudança no fluxo que, naquele momento,
era rodoviário, passando a se intensificar no fluvial, pela hidrovia do rio Madeira.
Em seus estudos, o renomado General Meira Mattos, prevê três polos de irradiação no
norte do país, passando por Boa Vista, Tabatinga e Rio Branco (MATTOS, 1980). Esses polos
seriam responsáveis pelo intercâmbio fronteiriço do Brasil com Venezuela, Guiana, Colômbia,
Equador, Peru e Bolívia e pela conexão com o restante do país. “As áreas polos atuarão como
verdadeiros dínamos, aumentando os benefícios econômicos e sociais […] Há necessidade de
polos bem distribuídos e conectados por sistemas viários.” (MATTOS, 1980, p. 174). Tais ações
abrangem: a melhoria das estruturas existentes na BR 319, rodovia que liga Porto Velho a
Manaus e consequentemente interliga os três polos de irradiação do norte do país, conforme
mapa da figura 2, abaixo.
Figura 2 - Mapa de integração do Brasil com países fronteiriços da região, após a recuperação BR 319

Fonte: Software QGIS (BRASIL, 2020)


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2.4 A BR 319 E SUA IMPORTÂNCIA PARA A DEFESA NACIONAL

A Estratégia Nacional de Defesa busca estruturar os meios de defesa em torno de


capacidades, e considera as Capacidades Nacionais de Defesa aquelas compostas por diferentes
parcelas das expressões do Poder Nacional. Dentre essas CND, esse trabalho procura destacar
a Capacidade de Mobilidade Estratégica, a qual refere-se a condição de que dispõem a
infraestrutura logística do País, ressaltando a importância da capacidade multimodal e de
transporte, que permitam, as Forças Armadas deslocar-se, rapidamente, para a área de emprego,
no território nacional, quando assim a defesa dos interesses nacionais forem impostas. A
mobilidade e a presença só estarão garantidos com a previsão de projetos que busquem manter
a qualidade da estrutura existente e ampliar a malha viária, de modo que atinjam todos os
modais e tenham amplo alcance no território amazônico.
A END também ressalta a importância da Capacidade Logística para a Defesa Nacional
e baseia-se na Logística Militar e suas ações sistematizadas (logística militar e empresarial),
criando o envolvimento direto e indireto dos vários setores nacionais capacitados nas sete
funções logísticas (Engenharia, Manutenção, Recursos Humanos, Salvamento, Saúde,
Suprimentos e Transporte), que, de forma harmônica, é coordenado pelo Sistema Logístico de
Defesa - SisLogD, mantendo as logísticas militares, específicas de cada Força Singular, com a
interoperabilidade necessária ao atendimento do interesse da Defesa Nacional.

2.5 AÇÕES ESTRATÉGICAS DO MINFRA VOLTADAS PARA A BR 319 ATÉ 2023.

Os investimentos na matriz de transportes tem se apresentado cada vez mais escassos.


Segundo o Caderno de Estratégias do Ministério de Infraestrutura (BRASIL, 2019), o
investimento em infraestrutura, em 2014, correspondia a 1% do Produto Interno Bruto (PIB).
Este valor apresentou um decréscimo ao longo de 4 (quatro) anos e chegou, em 2018, a 0,4%
do Produto Interno Bruto, o que é insuficiente diante dos enormes desafios existentes no setor.
O Caderno de Estratégias do Ministério de Infraestrutura prevê, como uma das Ações
Estratégicas para o setor, a otimização da distribuição dos modos de transporte na matriz viária
brasileira. Os focos principais seriam a contínua integração intermodais/multimodais, levando
em consideração à ampliação das plataformas logísticas e a definição das combinações modais
ótimas para os corredores logísticos mais relevantes. Estas ações estão perfeitamente alinhadas
com as necessidades da região amazônica, e em especial se considerarmos o caso do Rodovia
319 que está a décadas entregue à própria sorte.
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Faz-se uma rápida comparação do Caderno de Encargos do Ministério da Infraestrutura


com a Política Nacional de Defesa. A Política Nacional de Defesa (BRASIL, 2012, p. 10) prevê
a sua “contínua interação com as demais políticas governamentais, visando o fortalecimento
das infraestruturas de transportes”. E mais, ao estabelecer os Objetivos Nacionais de Defesa, a
Política Nacional de Defesa (BRASIL, 2012, p. 10), enfoca que as Forças Armadas poderão ser
empregadas “contra ameaças à soberania e à indissolubilidade da unidade federativa”. Por fim
a Política Nacional de Defesa (BRASIL, 2012, p. 5), ressalta a importância da “presença do
Estado e da vivificação das fronteiras na região amazônica”.
Ao estudar o citado caderno, observa-se que há pouca ou quase nenhuma menção à Defesa
Nacional ou às estratégias de defesa específicas para a região. No entanto, algumas
macroestratégias do Ministério de Infraestrutura, mesmo que implicitamente, vão ao encontro
do que necessita o Estado Brasileiro, com vistas a garantir a defesa do território amazônico. O
que se quer em ambas as áreas (infraestrutura e defesa) é o desenvolvimento do país e da
Amazônia, integrando as unidades da federação, mantendo a coesão e a unidade nacional,
defendendo a soberania e aprimorando a matriz de transportes.
Visando atingir o objetivo de desenvolvimento, o Ministério de Infraestrutura criou vários
projetos até 2023. Todos os projetos são de domínio público e podem ser vistos no site do
Ministério de Infraestrutura, citado nas referências.
O desenvolvimento econômico da região amazônica, proporcionado pela melhoria da
infraestrutura de transportes trará a reboque um maior povoamento dos vazios demográficos e
a integração geoeconômica com as demais regiões do país. A conquista desse objetivo terá que,
obrigatoriamente, superar os entraves legais, fortalecidos pelo discurso interno e externo da
proteção à biodiversidade da floresta amazônica e aos povos indígenas.
O Planejamento Estratégico realizado pelo Ministério de Infraestrutura delineou as
estratégias para a infraestrutura viária brasileira calcada em três eixos estruturantes: resultados
para a sociedade; foco de atuação; e processos internos.
A figura 3, representada pelo Mapa Estratégico retirado do Caderno de Estratégias do
Ministério de Infraestrutura (BRASIL, 2019 apresentado na próxima página é uma ferramenta
de comunicação que auxilia as organizações a traduzirem sua estratégia em objetivos que
direcionam o comportamento e o desempenho de todos. O referido Mapa do Caderno de
Estratégias do Ministério de Infraestrutura (BRASIL, 2019, p. 5), traz de forma didática, cada
ação estratégica planejada.
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Figura 3 - Mapa Estratégico, MINFRA, 2019

Fonte: Caderno de Estratégia do MINFRA (BRASIL, 2019, p.5)

O trabalho, a partir desse momento, procurou analisar, com foco na Defesa Nacional,
algumas ações principais do Mapa Estratégico. A escolha foi baseada em critérios de afinidade
com o tema. Por exemplo: a estratégia de “melhorar a competitividade da infraestrutura
logística nacional” guarda sua relação com o tema defesa e, ao mesmo tempo, os projetos de
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recuperação das rodovias da Amazônia podem ser encaixados nessa estratégia, como é o caso
do Licenciamento da BR 319.
Seguindo os critérios mencionados, dentro do primeiro eixo estruturante do CE, destacou-
se a ação que visa à melhoria da competitividade da infraestrutura nacional. No segundo eixo
foram selecionadas 3 ações estratégicas: o fortalecimento da articulação institucional, assegurar
a qualidade da infraestrutura de transportes e a otimização da aplicação de recursos públicos.
A primeira ação estratégica selecionada, melhoria da competitividade da infraestrutura
logística nacional, busca “melhorar os índices de produtividade e reduzir os custos logísticos,
por meio da oferta da infraestrutura de transportes integrada, moderna, segura e eficiente.”
(BRASIL, 2019, p. 6).
Quanto ao “fortalecimento da articulação institucional”, não se identificou correlação
com o projeto de Licenciamento da BR 319 a essa ação estratégica, todavia ele foi considerado
muito importante para a DN, tendo em vista que trata das relações institucionais. Este ponto é
considerado essencial, pois o Brasil deve “buscar a interação da PND com as demais políticas
governamentais, visando fortalecer a infraestrutura de valor estratégico para a defesa nacional.”
(BRASIL, 2012, p. 10).
No segundo eixo estruturante, o fortalecimento da articulação institucional com os atores
do setor, visa a “fortalecer o diálogo com diferentes esferas do governo […] de forma a
identificar, políticas, estratégias e ações prioritárias.” (BRASIL, 2019, p. 6).
Seguindo o segundo eixo, a ação estratégica: assegurar a qualidade da infraestrutura de
transportes, possui a finalidade de “manter a infraestrutura de transportes existente em
condições adequadas, por meio de estratégias, métodos e tecnologias para atuar […] na sua
melhoria, conservação, revitalização ou restauração.” (BRASIL, 2019, p. 7).
Finalizando, a otimização da aplicação de recursos públicos significa “priorizar os
investimentos do setor público e os impactos na economia, na sociedade e no meio ambiente,
considerando a distribuição modal ótima da matriz viária brasileira.” (BRASIL, 2019, p. 7).
Observa-se que o projeto de Licenciamento da BR 319 se encaixa em todas as estratégias.
Como exemplo, nesse caso, o projeto foi enquadrado dentro da estratégia “melhoria da
competitividade da infraestrutura logística nacional”, tendo em vista que, realizando a
concessão de uma rodovia federal à iniciativa privada, haverá significativa melhora desta
rodovia, gerando maior competitividade no âmbito da logística nacional.
O Quadro 1 da página seguinte faz a comparação entre as ações estratégicas selecionadas,
o projeto de Licenciamento da BR 319 do MINFRA, e o previsto na PND e na END. A última
coluna explica o porquê de determinada ação estratégica está diretamente ligada, de forma
17

eficiente ou ineficiente, no que se refere a proporcionar facilidades para a garantia da soberania


sobre o território amazônico.
Quadro – Estratégias e Projeto do Ministério da Infraestrutura, pontos positivos e oportunidades de melhorias
dededmelmemmelhoriasmemelhoria.
OBJETIVOS PROJETO JUSTIFICATIVA À LUZ DA PND /END
ESTRATÉGICOS
Melhoria da Licenciamento da Segundo a PND (BRASIL, 2012, p.1) “a defesa do país é
competitividade da BR 319 (RO -AM) inseparável do seu desenvolvimento”. Por isso, a estratégia aqui
infraestrurura logística nacional representada pode ser consideracomo eficiente em relação à
soberania do Brasil sobre território amazônico, pois todos os
projetos, praticamente, puderam ser enquadrados nessa estratégia,
que visa a melhorar os índices de produtividade e reduzir custos
logísticos, gerando desenvolvimento ao país e, indiretamente,
favorecendo a DN.

Fortalecimento da O Brasil deve “buscar a interação da PND com as demais


articulação institucional políticas governamentais, visando fortalecer a infraestrutura de
valor estratégico para a defesa nacional.” (BRASIL, 2012, p. 10).
O mesmo se observa no CE do MINFRA, dada a importância de se
fortalecer a articulação entre as instituições. No entanto, esta ação
pode ser considerada como ineficiente, pois apesar dessa interação
estar prevista, não há registro de projetos que interajam com o MD.

Assegurar a qualidade Os investimentos públicos na infraestrutura de transportes


da infraestrutura de transportes estão aquém das necessidades e têm diminuído ao longo do tempo,
chegando a 0,4% do PIB (BRASIL, 2019, p. 3). Diante as
dificuldades da atual situação econômica é essencial para a DN que
toda a matriz existente esteja em boas condições de conservação, a
fim de permitir a mobilidade estratégica das FFAA (BRASIL,
2012, p. 54). A estratégia aqui apresentada foi considerada como
ineficiente, haja vista o pouco percentual de investimento no setor.

Otimização da aplicação A aplicação dos recursos públicos estão mais focados na


de recursos públicos recuperação e manutenção dos modais existentes e pouco voltado
para o aumento e melhor distribuição da matriz viária. É sabido que
a atual situação das contas públicas não favorece o aporte de
vultosos recursos, porém é essencial para a SN e para a soberania,
que a matriz existente seja aprimorada e equilibrada, a fim de
garantir a mobilidade estratégica das FFAA (BRASIL, 2012, pg
54). A estratégia apresentada foi considerada ineficiente, haja vista
não haver projetos de novas rodovias.

A análise realizada no quadro anterior pode ser resumida, de forma a facilitar o


entendimento, conforme descrito nos dois parágrafos seguintes.
Ações estratégicas identificadas como eficientes: Melhoria da Competitividade da
Infraestrutura Logística e Participação Privada no Setor. Motivos: ao buscar melhorar os índices
de produtividade, reduzir custos logísticos, e executar/recuperar empreendimentos estratégicos,
os citados objetivos geram desenvolvimento e integração, favorecendo a DN e a manutenção
da soberania brasileira sobre o território amazônico.
Ações estratégicas identificadas como ineficientes: Fortalecer a Articulação
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Institucional, Assegurar a Qualidade da Infraestrutura de Transportes e Otimizar a Aplicação


de Recursos Públicos. Motivos: não foram identificadas as ações concretas de interação com
o MD, nem tampouco disponibilidade satisfatória de investimentos na recuperação/reabertura
da BR 319 para a vivificação de uma parte da região amazônica que se encontra isolada,
porque não dizer abandonada a sua própria sorte.
As dificuldades apresentadas pela crise política, o grande deficit nas contas públicas do
Governo Federal, além da instabilidade da economia mundial, onde acaba de se anunciar uma
recessão mundial, reduzem as possibilidades de investimentos no setor de transportes.
As observações apresentadas têm o objetivo de opinar sobre o trabalho realizado pelo
MINFRA. Não são, deforma alguma, uma crítica ao cronograma que está sendo realizado. O
trabalho em andamento, representa aquilo que está ao alcance da capacidade e dos esforços do
Ministério, o qual tem sido incansável na tentativa de atrair recursos privados e tem o seu
mérito reconhecido em âmbito nacional e internacional.
Nos parágrafos anteriores, após análise das ações estratégicas previstos no CE do
MINFRA, obteve-se como 03 (três) estratégias, que foram consideradas como ineficientes e
que podem ser aprimoradas.
Esta proposta de melhoria das estratégias do MINFRA para a infraestrutura de transportes
do Brasil, em especial para a região amazônica, será feita considerando-se o pressuposto teórico
do renomado geopolítico, bem como premissas constantes do CE do MINFRA. O geopolítico
é o General Meira Mattos, que prevê três polos de irradiação no norte do país, passando por
Boa Vista, Tabatinga e Rio Branco (MATTOS, 1980, p. 168). Esses polos seriam responsáveis
pelo intercâmbio fronteiriço do Brasil com Venezuela, Guiana, Colômbia, Equador, Peru e
Bolívia e pela conexão com o restante do país. “As áreas polos atuarão como verdadeiros
dínamos, aumentando os benefícios econômicos e sociais […] Há necessidade de polos bem
distribuídos e conectados por sistemas viários.” (MATTOS, 1980, p. 174).
Junta-se a este pressuposto teórico a premissa do MINFRA, baseada na missão descrita
no CE: “Proporcionar infraestrutura viária integrada e confiável para mobilidade segura e
eficiente de pessoas e bens, com vistas ao aumento da competitividade nacional.” (BRASIL,
2019, p. 2). Destaca-se a expressão “infraestrutura viária integrada e confiável” (grifo nosso),
tão necessária à DN, em especial no tocante a região amazônica.
A estratégia que implica no fortalecimento da articulação institucional entre os atores do
setor é a primeira identificada com a necessidade de aprimoramento. Não está claro, ao se
analisar o CE, que o MINFRA considera o MD um órgão ou instituição que faça parte dos
atores interessados no setor de transportes brasileiro, apesar da existência do Projeto Calha
19

Norte, também chamado de Projeto Rondon, desde 1985.


O tema DN é confuso no Brasil e “sempre ficou restrito ao segmento militar e à
diplomacia, deixando a maioria das lideranças políticas e a sociedade à margem da discussão e
formulação de políticas e estratégias afins.” (PAIVA, Artigos Estratégicos, 2017, p. 4). É o que
afirma o General Rocha Paiva2, deixando claro o alinhamento implícito do Brasil com a Teoria
Tradicional, também conhecida como estreita.
Desde a criação da PND e da END, o pensamento brasileiro pouco mudou, por isso,
observa-se certa dificuldade de integração entre o MINFRA e o MD, no que tange às estratégias
traçadas para o desenvolvimento da infraestrutura viária brasileira. Para que ocorra uma efetiva
articulação entre ministérios há que se quebrar alguns paradigmas que ainda persistem no
Estado Brasileiro. O primeiro deles é que o assunto DN deve ser, sim, um interesse de todos,
estado e sociedade. Segundo, é que estabelecer políticas de estado que interessem e se articulam
com a DN, proporciona desenvolvimento econômico e social, à medida que a sensação de
segurança em todo país gera estabilidade, especialização da força de trabalho e
desenvolvimento científico-tecnológico. Por esses pontos, o MINFRA deve procurar articular
suas estratégias e objetivos com o MD, encaixando o tema Defesa Nacional dentro de sua
missão e visão de futuro.
As próximas estratégias foram agrupadas em uma única proposta de melhoria, por serem
considerados temas afins. “Assegurar a Qualidade da Infraestrutura de Transportes” e
“Otimização da Aplicação de Recursos Públicos” correspondem respectivamente à segunda e
terceira estratégias classificadas como oportunidades de melhorias.
Como já dito anteriormente, é fundamental que os objetivos estratégicos do MINFRA
estejam alinhados com os objetivos do Estado, em particular àqueles voltados para a DN e a
soberania da região amazônica. Na END, no capítulo referente às Diretrizes Estratégicas, está
previsto que “a defesa da Amazônia exige avanço de projeto de desenvolvimento sustentável e
passa pelo trinômio monitoramento/controle, mobilidade e presença” (BRASIL, 2012, p. 14).
Atualmente, o Brasil possui enorme deficit nas contas públicas, ocasionando uma baixa
disponibilidade de orçamento para investimentos em infraestrutura. É normal que diante dessa
situação se priorize onde aplicar os recursos disponíveis e, consequentemente, alguns modais

2
O General de Brigada Luiz Eduardo Rocha Paiva possui doutorado em Aplicações, Planejamento e Estudos
Militares na Escola de Comando e Estado–Maior do Exército (ECEME – RJ). Fez o Curso de Estado-Maior na
Escola Superior de Guerra do Exército Argentino e é Professor Emérito da ECEME. Tem publicado diversos
artigos sobre temas políticos e estratégicos, em jornais e revistas nacionais e estrangeiras.
20

acabam não sendo contemplados. É nesse ponto que se verifica a possibilidade de melhoria
dessas duas estratégias.
É nítida a necessidade de investimentos na manutenção e ampliação da matriz de
transporte da região amazônica. E essas necessidades são sempre maiores que as
disponibilidades orçamentárias, mas essa assertiva não pode ser justificativa para que se deixe
de pensar em projetos para todos os modais.
O que se propõe é que sejam elaborados projetos estratégicos com previsão de execução
gradativa ao longo dos próximos trinta anos, conforme disponibilidade de recursos.
Os projetos devem ser pensados como de estado e não de governo, para que tenham
perenidade, mesmo diante das trocas sucessivas de chefes de estado ao longo desse tempo
previsto. Além disso, os projetos devem prever a manutenção e ampliação do modal de
transporte.
As propostas de transformação das OM em PP descritas acima, apesar de distintas,
possuem três objetivos comuns: associar a Defesa Nacional aos demais campos do poder,
dominar a pluralidade dos transportes na Amazônia e integrar o Amazonas e os países
fronteiriços ao restante do país.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sem a menor presunção de descobrir soluções fáceis para proporcionar a melhoria do


transporte rodoviário da região, até porque em relação a esse tema não há soluções fáceis em
se tratando de Amazônia, o presente trabalho, fundamentado em dados atualizados e
informações fornecidas pelo MD e pelo MINFRA, tem o propósito de confirmar o prognóstico
de que a continuidade da falta de investimentos na recuperação da BR 319 trazem implicações
que impactam negativamente a manutenção da soberania com reflexos na Defesa Nacional.
Essa relação ficou clara nas subdivisões apresentadas, em especial quando foi
identificado que esse discurso é tão mais forte quanto menor for a integração geoeconômica
da região e quanto maior o vazio demográfico lá existente.
A Integração, o desenvolvimento regional sustentável, a ocupação dos espaços vazios,
a garantia da soberania sobre o território amazônico, fortalecendo o amplo espectro da Defesa
Nacional, devem fazer parte do rol dos objetivos permanentes do Estado Brasileiro. A
conquista desses objetivos depende em grande parte do planejamento estratégico de uma
infraestrutura rodoviária eficiente, e priorize a integração do Amazonas com as demais regiões
do país.
21

Urge a necessidade, não somente de integrar parte da região amazônica às demais


regiões do país, mas também integrar o Brasil aos países fronteiriços, incentivando assim o
intercâmbio fronteiriço do Brasil com Venezuela, Guiana, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia
e pela conexão com o restante do país.
Torna-se imperioso implementar na região amazônica uma Estratégia Nacional de
Defesa, buscando estruturar os meios de defesa em torno de capacidades, mantendo as
logísticas militares com a interoperabilidade necessária ao atendimento do interesse da Defesa
Nacional.
Ressalta-se a importância de um programa eficiente de desenvolvimento sustentável de
longo prazo, alinhado às estratégias do MINFRA e articulado com os interesses do Estado
quanto à Defesa Nacional.
A PND destaca a presença do Estado e da vivificação das fronteiras na região amazônica,
daí a importância de assegurar a qualidade da infraestrutura e a otimização da aplicação de
recursos públicos na matriz de transportes.
Somente através de investimentos em projetos de infraestrutura, onde se apliquem
políticas que envolvam todas as instituições, em especial o Ministério da Defesa, e articulem
diversos setores na busca do desenvolvimento econômico sustentável e da integração da região
amazônica, é que será possível alcançar os objetivos estratégicos relacionados à Defesa
Nacional, garantindo e fortalecendo a soberania do Brasil sobre a região Amazônica.
22

REFERÊNCIAS

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