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Eletrónica 2, LEEC

Trabalho Laboratorial N.º 2


Espelho de Corrente
DEEC - Universidade de Coimbra

1. Introdução
A polarização dos diversos andares de amplificação que constituem um amplificador ope-
racional (AmpOp) implementado em circuito integrado é realizada através de espelhos de
corrente, com circuitos do género daquele que se exemplifica na Fig. 1. Para além de permi-
tirem evitar a implementação em circuito integrado de componentes passivos (resistências
de polarização e condensadores de acoplamento) – é tecnologicamente mais complexo, ou
mesmo inviável, fabricar resistências e condensadores, sobretudo de valores mais elevados,
do que fabricar transı́stores em circuito integrado –, os espelhos de corrente:

• Não limitam a resposta do AmpOp a baixas frequências, tal como acontece com o uso
de condensadores de acoplamento;

• Facilitam a compensação de desvios de tensão de saı́da (tensões de offset), porque per-


mitem programar facilmente a corrente de polarização dos vários andares de amplificação
com base numa mesma corrente de referência que é espelhada nesses vários andares,
com rácios de transferência não necessariamente unitários;

• Devido à sua elevada resistência de saı́da, podem funcionar como cargas ativas dos an-
dares de amplificação, possibilitando a melhoria das suas caracterı́sticas dinâmicas, i.e.
ganhos de tensão mais elevados, resistências de entrada mais elevadas e resistências
de saı́da mais baixas. É objetivo deste trabalho laboratorial estudar e ensaiar um espelho
de corrente baseado em BJTs.

O circuito da Fig. 1 é um espelho de corrente básico baseado em BJTs. Esta designação


deve-se ao facto de, para dois transı́stores com igual área da junção base-emissor e a fun-
cionarem à mesma temperatura, a corrente IO , i.e. a corrente na carga (e.g. um andar de
amplificação que se pretende polarizar), ser exatamente igual ao valor da corrente de re-
ferência IREF , se se desprezar as correntes de base (i.e. considerando β → ∞) e o efeito
de Early dos transı́stores.
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Fig. 1: Espelho de corrente baseado num matched transistor pair.

Na Fig. 1, como o transı́stor Q1 tem o coletor ligado à base, costuma-se designar por
“transı́stor ligado como dı́odo”. O transı́stor estabelece uma tensão base-emissor, VBE , co-
mum aos dois transı́stores e fixa nessa tensão o potencial no seu coletor. Em circuitos reais,
a fonte de corrente IREF é habitualmente implementada através da ligação de uma resistência
R entre o coletor de Q1 e a tensão de polarização VCC . Desta forma, a corrente de referência
é dada pela equação:

VCC − VBE
IREF = . (1)
R
Mesmo com β finito e considerando o efeito de Early, o circuito da Fig. 1 pode ser implemen-
tado em circuito integrado para funcionar aproximadamente como um espelho de corrente,
desde que os dois transı́stores formem um matched transistor pair, i.e. um par de transı́stores
com as mesmas caracterı́sticas e estejam acoplados termicamente. Embora seja muito difı́cil
conseguir satisfazer estas duas condições com transı́stores discretos, é possı́vel fazê-lo com
facilidade em circuito integrado devido à proximidade fı́sica dos dois dispositivos implemen-
tados sobre um mesmo substrato de silı́cio.

VBE
IC ∼
= IS .e VT
. (2)

Mesmo com dois transı́stores matched, o acoplamento térmico entre os transı́stores é fun-
damental para o bom funcionamento do espelho de corrente representado na Fig. 1. Como é
fácil perceber pela eq. (2), i.e. a equação de Ebers-Moll que estabelece a relação entre IC e VBE
dos BJTs que constituem o espelho de corrente, mesmo assumindo a igualdade VBE1 = VBE2 ,
uma pequena discrepância de temperatura entre os dois transı́stores pode conduzir a uma
acentuada discrepância entre a corrente de coletor dos dois transı́stores. Acresce que, se
não houver acoplamento térmico entre eles, o aquecimento de um dos transı́stores conduz
a um aumento da sua corrente, que por sua vez favorece um aquecimento ainda maior do

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transı́stor, potenciando assim um fenómeno de realimentação positiva, designado habitual-


mente por embalamento térmico, que tende a tornar instável o funcionamento do espelho de
corrente.
Para se assegurar um comportamento adequado do espelho de corrente quando é imple-
mentado com transı́stores discretos, i.e. com transı́stores que, apesar de serem da mesma
referência, podem não ter exatamente as mesmas caracterı́sticas e que, para além disso, não
estão acoplados termicamente e podem portanto operar a temperaturas diferentes, é habitual
adicionar resistências de estabilização no terminal emissor dos dois transı́stores, tal como no
circuito representado na Fig. 2 (ver página seguinte).

2. Objetivos
É objetivo deste trabalho estudar e ensaiar o espelho de corrente baseado em BJTs que está
esquematizado na Fig. 2. No final do trabalho, deverá ser capaz de:

• Compreender o princı́pio de funcionamento de um espelho de corrente;


• Compreender as limitações do espelho de corrente, nomeadamente a influência do valor
finito de β e do efeito de Early dos transı́stores no seu rácio de transferência de corrente;
• Dimensionar um espelho de corrente;
• Compreender a importância do uso de um matched transistor pair e do acoplamento
térmico dos transı́stores na implementação do espelho de corrente.

3. Equipamento
• Placa breadboard;
• Componentes eletrónicos (ver sec. 3.1);
• Fonte de alimentação DC;
• Voltı́metro digital;
• Condutores de ligação.

3.1. Componentes eletrónicos


• 2 transı́stores 2N3904 (ver Fig. 3);
• Resistências de 0.25 W: 750 Ω, 1 kΩ, 1.2 kΩ (duas) e 4.7 kΩ;
• Potenciómetro (resistência variável) de 10 kΩ.

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VCC = 10V

RP
RL
10K
IREF
IO

Q1 Q2

RE1 1K2 RE2 1K2

Fig. 2: Espelho de corrente com resistências de emissor.

Fig. 3: Pinout do transı́stor 2N3904 com invólucro de plástico TO-92.

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PREPARAÇÃO DO TRABALHO LABORATORIAL
Nome:
Turma: Data: / /

Considere os circuitos esquematizados na Fig. 1 (pág. 2) e na Fig. 2 (pág. 4), que são objeto
de estudo neste trabalho laboratorial.

a) No circuito da Fig. 1, não despreze as correntes de base nem o efeito de Early dos
transı́stores. Considere que os dois transı́stores têm o mesmo ganho de corrente, β,
e a mesma tensão de Early, VA . Deduza uma expressão do rácio de transferência de
corrente do circuito, IO /IREF , que mostre a sua dependência dos valores de β, VA e VO .

b) Tomando como base a expressão obtida na alı́nea anterior: i) Assumindo VO = VBE ,


qual é a variação relativa (em %) do rácio de transferência de corrente quando β varia de
50 para 100? ii) Para β = 100, qual é a variação relativa (em %) do rácio de transferência
de corrente quando VO aumenta de 0.7 V (i.e. VO = VBE ) para 5 V. Considere VA = 50 V.

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c) No circuito da Fig. 2, despreze o efeito de Early, assuma VBE = VBE1 = VBE2 = 0.7
V e que o valor de β dos transı́stores é suficientemente elevado para se poder despre-
zar também o seu efeito no rácio de transferência de corrente, IO /IREF . Quanto vale o
rácio de transferência de corrente, IO /IREF ? Calcule para que valor deve ser ajustada a
resistência variável RP para se obter IO = 1.8 mA.

d) Agora não despreze a diferença VBE1 − VBE2 = ∆VBE no circuito da Fig. 2. Reescreva
a expressão IO = f (IREF , ∆VBE ). Considere que num transı́stor BJT dVBE /dT ∼
= −2, 2
mV/o C. Partindo de uma situação de equilı́brio térmico entre Q1 e Q2 à temperatura ambi-
ente de 20 o C, com VBE1 = VBE2 = 0.7 V (i.e. os dois transı́stores à mesma temperatura e
∆VBE = 0 V), calcule a variação relativa (em %) de IO /IREF , i.e. ∆IO /IREF , quando a tem-
peratura de Q2 fica 4 o C superior à temperatura de Q1 . Tire conclusões relativamente à
sensibilidade do espelho de corrente a diferenças de temperatura entre os transı́stores.

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e) Assumindo o valor de RP calculado na alı́nea c), considere a situação em que o valor da


resistência RE2 é alterado para 750 Ω no circuito da Fig. 2. Considerando VBE1 = VBE2 e
desprezando a influência de β e do efeito de Early, deduza a nova expressão do rácio de
transferência de corrente, IO /IREF . Quais são os novos valores de IO /IREF e de IO ?

f) Obtenha as expressões de Ro2 (só com literais) para os espelhos de corrente da Fig. 1 e
da Fig. 2, i.e. as expressões da resistência “vista” do coletor de Q2 .
Nota: Para simplificar a análise da resistência de saı́da do espelho da Fig. 2, despreze a re-
sistência equivalente da parte esquerda do espelho (transı́stor ligado como dı́odo), “vista” da
base de Q1 . Isto significa que a base de Q2 aparecerá no modelo para pequenos sinais ligada ao
ground.

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g) Considerando VA = 50 V e β = 50 nos espelhos de corrente da Fig. 1 e da Fig. 2,


e os valores de RP , RE1 e RE2 usados na alı́nea e) para o circuito da Fig. 2, use as expressões
obtidas na alı́nea anterior para calcular o valor de Ro2 nos dois circuitos.

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PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL
Nome:
Turma: Bancada: Data: / /

Antes de iniciar o procedimento experimental, verifique se dispõe de todo o equipamento


necessário (ver sec. 3, na pág. 3).

a) Use a funcionalidade do multı́metro para ter uma indicação das eventuais diferenças
entre os valores de β dos dois transı́stores que está a usar1 . Monte o circuito da Fig. 2,
pág. 4 com RL = 1 kΩ.

b) Ligue a fonte de alimentação DC e ajuste RP até obter IO = 1.8 mA. Não meça diretamente
a corrente com um amperı́metro. Meça antes a queda de tensão em RL e ajuste RP
até obter uma diferença de potencial igual a 1.8 V. Evitando manipular o cursor do po-
tenciómetro após o ajuste, desligue-o do circuito e meça com o multı́metro para que
valor de resistência foi ajustado. Compare com o valor que foi calculado na alı́nea c) da
preparação do trabalho e justifique as eventuais diferenças observadas.

1
Use para o efeito a função hF E do multı́metro.

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c) Altere a resistência RE2 para 750 Ω. Verifique se é válida a expressão do rácio de trans-
ferência de corrente, IO /IREF , obtida na alı́nea e) da preparação do trabalho. Justifique
as diferenças observadas entre os valores agora obtidos e os valores obtidos anterior-
mente.

d) Mantendo o valor de RE2 usado na alı́nea anterior, altere agora a resistência RL para
4.7 kΩ. Meça a tensão VCE2 e meça indiretamente IREF e IO , medindo as quedas de
tensão em RP e em RL , respetivamente. O circuito ainda funciona como um espelho de
corrente, sendo ainda válida a expressão do rácio de transferência de corrente, IO /IREF ,
obtida na alı́nea e) da preparação do trabalho? Explique porquê.

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