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RESUMO
A pesca artesanal, como a agricultura, é um objeto de estudo complexo, pois é influenciada
por determinantes ambientais, culturais, socioeconômicos e tecno-produtivos. A combinação
desses determinantes com as variáveis de tempo e espaço produz, para cada lugar, uma
diversidade de formas pelas quais os pescadores artesanais procuram interagir com a natureza
e dela derivar seu sustento. Na pesca artesanal, a relação com a natureza é intensa e é difícil
estabelecer um controle antrópico sobre os recursos, dada a fluidez dos recursos. Essas
contingências naturais obrigam os pescadores a se adaptarem às diferentes condições
ambientais, o que explica em parte as diferenças técnicas e socioculturais entre as
comunidades pesqueiras. Entretanto, os problemas ambientais e de gestão dos recursos
pesqueiros têm um impacto negativo na produção e na renda das famílias de pescadores
artesanais, combinado com o crescimento do turismo de massa, e levam os membros das
famílias de pescadores a se envolverem em outras atividades remuneradas ao lado da pesca
(pluriatividade), ou a abandoná-la. Assim, no presente trabalho, procuramos estudar a
necessidade de complementação de renda para os pescadores da região de Quintão - RS,
estudando as soluções encontradas para a complementação adequada de renda quando as
atividades de pesca não são suficientes para a subsistência desses profissionais. Concluiu-se
que houve transformações nas estratégias reprodutivas das famílias de pescadores, que
incorporam atividades extra pesca nos setores de serviços e industriais relacionados ao
turismo, portos e pequenas indústrias como forma de compensar a perda de renda familiar
com a pesca. Enquanto os pescadores mais velhos tendem a alternar a pesca com outras
atividades remuneradas, seus filhos tendem a abandonar as atividades de pesca. Se esta
situação persistir, a falta de sucessão nas famílias de pescadores artesanais na área de estudo
pode comprometer a sustentabilidade desta forma tradicional de produção.
Palavras-chave: quintão; pesca; fragilização.
ABSTRACT
INTRODUÇÃO
2. ÁREA DE ESTUDO
A costa do Rio Grande do Sul é uma longa (640 km) e contínua barreira arenosa
dominada por ondas (CALLIARI et al., 1998) com uma orientação NE-SW uniforme. A
plataforma continental é larga, 150-200 km de comprimento, com profundidades máximas
que variam de 100 a 140 m e uma suave inclinação de 0,5-1,5 m/km (MARTINS e CORRÊA,
1996).
A área de estudo inclui um trecho de cerca de 160 km, localizado entre Tramandaí e
Mostardas no RS, posicionado entre as coordenadas 31°12'48,60 "S, 50°52'06,44 "W e
29°58'36,36 "S, 50°07'10,94 "W. De acordo com Tomazelli & Villwock (1992), as praias do
RS são compostas de areia fina, quatzose, bem selecionada, com uma assimetria ligeiramente
negativa.
Calliari & Klein (1993) e Toldo Jr et al (1993) classificaram as praias RS como
intermediárias a dissipativas de acordo com as seqüências morfodinâmicas descritas por
Wrigth e Short (1984). Sobreposto a este modelo de comportamento morfodinâmico, observa-
se uma diferenciação biestável, com a predominância de um perfil acrecional entre novembro
e março, caracterizado por um maior estoque sedimentar na parte subaérea da praia, e um
perfil erosivo entre abril e outubro, caracterizado por um maior estoque sedimentar na parte
subaérea da praia, sendo esta biestacionalidade uma função da variabilidade do regime de
ondas.
A topografia da praia no meio da costa consiste em uma grande área com um fundo
plano e uma suave inclinação, da ordem de 1:100. Esta uniformidade morfológica é
modificada nas proximidades das praias da Mostardas e Dunas Altas, onde a largura do litoral
aumenta de seus valores médios de 1 km para mais de 3 km. Estas duas praias estão
localizadas onde ocorre a inflexão da costa, ou seja, a mudança no alinhamento da praia entre
10° e 12° (TOLDO JR et al., 2010).
As mudanças na largura dos campos de dunas costeiras e de costa ocorrem de maneira
semelhante ao longo da costa média: a região com a maior largura de costa também está
associada à região com a maior largura de campo de dunas. A largura média do campo de
dunas varia de menos de 1 km a mais de 6 km ao longo das praias de Mostardas e Dunas
Altas, respectivamente (TOLDO JR et al., 2010). Calliari et al (1998) quantificaram a altura
das dunas frontais para a costa norte e média do Rio Grande do Sul. Os autores descobriram
que as dunas localizadas entre Cidreira e Balneário de Dunas Altas, em Palmares do Sul, têm
as alturas mais altas, variando entre 6 e 8 metros. Ao sul de Dunas Altas, há uma redução
considerável na altura das dunas frontais para 1 m em um intervalo de 30 km. Nas
proximidades do farol de Mostardas, não há formação de dunas frontais, mas apenas planícies
arenosas.
Devido ao grande volume de sedimentos transportados pela deriva costeira, com uma
direção NE resultante, e o engarrafamento de parte deste volume próximo às inflexões da
linha costeira na Mostardas e Dunas Altas, o acúmulo desta areia se torna uma importante
fonte de sedimentos para o desenvolvimento do litoral, bem como do campo de dunas
costeiras. Em resposta aos frequentes ventos fortes do NE, o transporte eólico é muito ativo,
fazendo com que as dunas migrem para o interior da planície costeira em direção ao SW
(TOMAZELLI et al., 2000), desenvolvendo assim extensos campos de dunas.
2.2.1 A Orla Marítima do Rio Grande do Sul e os impactos causados pela urbanização na
pesca
A orla marítima pode ser definida como uma unidade geográfica da zona costeira delimitada
por uma faixa de interface entre a terra e o mar. Os limites genéricos estabelecidos para a orla
marítima são os seguintes:
Com a crise no setor da pesca desde meados dos anos 80, refletindo um modelo de
desenvolvimento que ignorou os limites ambientais, aumentou a necessidade das famílias de
pescadores artesanais de diversificar suas fontes de renda. Esta condição resultou em uma
redução no número de filhos de pescadores dispostos a permanecer no negócio. A situação
econômica dos pescadores artesanais atinge um nível crítico que os leva a abandonar o setor.
O abandono da pesca ocorre primeiro com as crianças, que vão trabalhar em outras atividades
econômicas. O trabalho dos filhos dos pescadores fora da pesca tem sido a principal causa da
expansão da pluriatividade em Quintão - RS. Entretanto, nos últimos anos, a gravidade da
crise e sua continuidade forçaram muitos chefes de famílias de pescadores a abandonar a
atividade ou a trabalhar fora da pesca.
Na entrevista, fica claro que a nova geração não vai continuar na atividade. O desejo
de seus filhos de continuar a tradição da pesca artesanal é dificultado pelas dificuldades de
sobreviver apenas com a renda desta atividade. Embora esta ocupação mantenha a
característica de auto-emprego, altamente valorizada em seu discurso, eles entendem que a
pesca não oferece mais um retorno econômico que garanta a reprodução social de uma
família.
Na região, os empregos assalariados permanentes oferecem a segurança de uma renda
mensal, muitas vezes em empregos considerados menos extenuantes, como no comércio,
pousadas, restaurantes, etc. Enquanto isso, os pequenos barcos artesanais carecem das
condições necessárias para evitar o frio, a chuva e os perigos do mar. A falta de
infraestruturas de embarque, como portos e molhes, expõe os pescadores à água cada vez que
saem para o mar, e a pesca no mar é mais intensa no inverno.
Embora eles não queiram que seus filhos continuem pescando, a pescadora
entrevistada não quer desistir desta atividade. Ela justifica esta posição pelo fato de estar
acostumada a ela, de gostar do que faz e de ser o que faz melhor. Neste sentido, a pescadora
valoriza a pesca não apenas pela renda monetária que ela gera, mas também pelo significado
que ela dá à sua vida. Portanto, estes objetivos também podem ser alcançados sem a mediação
e circulação de dinheiro, como é o caso em várias situações de sua vida financeira
(compartilhamento, financiamento com um intermediário, autoconsumo de pescado). Estas
experiências acabam moldando sua cultura financeira e orientando sua racionalidade
econômica não apenas sobre o dinheiro (SIMMEL, 1998).
Além disso, como são pouco instruídos, aceitam empregos mal remunerados em
outros ramos da economia. Assim, eles procuram por empregos "extras" durante períodos de
baixa produção de peixe, e retornam à pesca quando encontram peixe e/ou camarão.
A oscilação dos recursos pesqueiros e a dependência de oportunidades de renda não-
pesqueira significa que a reprodução social se baseia em fontes de renda cuja parte varia ao
longo do ano e entre anos. Entre as famílias que ampliam suas fontes de renda, os recursos
obtidos de outras atividades às vezes também são utilizados para financiar atividades
pesqueiras. Isto se torna mais claro nos casos em que o pescador, não tendo mais dinheiro
disponível para continuar pescando, procura emprego para financiar a atividade pesqueira.
Ao diversificar as estratégias de reprodução social, é possível que uma atividade de
pesca menos incisiva reduza a demanda de capital de investimento. No caso de sistemas de
financiamento informais, os intermediários aproveitam o conhecimento da vida do pescador,
proporcionado por sua proximidade, para limitar a capacidade de investimento do pescador,
embora nem sempre possam emprestar a quantidade necessária de recursos e o façam a um
custo elevado. A fragilidade econômica resultante da escassez de pescado também limitou os
recursos e resultados de novos investimentos, gerando mudanças nos sistemas de
financiamento (CAPELLESSO, 2010).
CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS
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