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Hermenêutica Bíblica

Material Teórico
Hermenêutica e Exegese

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Paulo Roberto Pedrozo Rocha

Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Hermenêutica e Exegese

• Hermenêutica e Exegese.

OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Apresentar a afinidade entre o exercício hermenêutico e o exercício exegético a partir dos
significados de hermenêutica e de exegese.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
para trocar ideias!
Determine um Isso amplia a
horário fixo aprendizagem.
para estudar.

Mantenha o foco!
Evite se distrair com
as redes sociais.

Seja original!
Nunca plagie
trabalhos.

Não se esqueça
de se alimentar
Assim: e de se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como seu “momento do estudo”;

Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma


alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo;

No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos
e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam-
bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua
interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de
aprendizagem.
UNIDADE Hermenêutica e Exegese

Hermenêutica e Exegese
A partir do Renascimento, fixam-se três tipos básicos de técnica de inter-
pretação: hermenêutica teológica (sacra), filosófico-filológica (profana) e
jurídica (juris). (BRAIDA apud SCHLEIERMACHER, 2006, p. 7)

Para iniciar esta unidade, retomaremos, por um instante, a aula anterior. Na-
quela aula, estudamos o que vem a ser hermenêutica e como seu significado abre
a possibilidade de usar o termo “hermenêutica” como sinônimo de interpretação,
mais precisamente de uma interpretação especial: jurídica, literária, filosófica ou
bíblica (teológica por extensão).

Em algumas ocasiões, a expressão “a hermenêutica do/da” – por exemplo, a ex-


pressão “a hermenêutica da palavra fé”– expressa uma interpretação especial que se
dará a algum evento, fenômeno ou fato. O exemplo dado acima, embora muito usado
para se referir a ações interpretativas lexicais, não é correto, pois, ao se fazer a análise
de uma palavra para melhor entender seu significado e seus usos, estamos no campo
da exegese, e não mais da hermenêutica. Esse é um equívoco comum, principalmente
em áreas como a oratória, a retórica, a teologia e a filosofia, e que pode ter sua causa
entendida a partir da opinião de Braida (apud SCHLEIERMACHER, 2006), ao co-
mentar o projeto hermenêutico de Schleiermacher, na continuação do parágrafo no
qual se insere o extrato dado como epígrafe à aula.
Os estudos de hermenêutica de Friedrich D. E. Schleiermacher estão
inseridos tanto na tradição exegética da teologia protestante, como no re-
nascimento dos estudos de filologia clássica, no final do século XVIII. [...]
Todavia, esse ideal aparece reorientado por uma exigência filosófica de
extração kantiana [no entendimento de Ricoeur], qual seja, a de analisar
as condições gerais sob as quais a compreensão ocorre e de fornecer as
razões do processo de interpretação. A sua investigação procura funda-
mentar o procedimento a partir de um conceito geral de compreensão.
Esse conceito será imediatamente associado, em meados do século XIX,
ao problema epistemológico da justificação metodológica as ciências hu-
manas. (BRAIDA apud SCHLEIERMACHER, 2006, p. 7)
Explor

Assim, entramos no assunto desta aula: qual a relação entre hermenêutica e exegese?

Celso Braida, ao apresentar a tradução brasileira para a Hermenêutica de


Schleiermacher, diz o seguinte:
A história da formação da hermenêutica, enquanto arte e técnica de in-
terpretação correta de textos, começa com o esforço dos gregos para
preservar e compreender os seus poetas e desenvolve-se na tradição
judaico-cristã de exegese das Sagradas Escrituras. [...] Neles encontramos
o antigo ideal exegético de reconstruir o sentido original de um texto.
(BRAIDA apud SCHLEIERMACHER, 2006, p. 7)

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Essa opinião, o tradutor e apresentador da obra de Schleiermacher obtém pela
leitura do próprio autor da Hermenêutica, uma vez que, em introdução ao discurso
acadêmico de 1829, ele relata:
Quando, mais ou menos há vinte e cinco anos atrás, eu comecei a mi-
nistrar, em Halle, cursos de exegese sobre os textos neotestamentários,
considerei como indispensável fornecer uma justificação dos princípios
do procedimento com a maior exatidão possível, para avançar com segu-
rança na interpretação e tornar claro e firme o meu juízo sobre os outros
intérpretes. (BRAIDA apud SCHLEIERMACHER, 2006, p. 25)

Parece circular, mas não é. A relação entre hermenêutica e exegese é estreita e


isso nos leva a definições recorrentes, em que o sentido de uma depende do sentido
da outra. É correto imaginar que, ao iniciar o esforço de entendimento de seus poe-
tas, os gregos não precisassem se entender com procedimentos exegéticos. Afinal,
eles estavam procurando entender seus poetas, poetas de língua grega, que, mes-
mo mortos há muito tempo (como Homero ou Hesíodo), deixaram firmes sua mar-
ca no tempo através da tradição de conservação oral da memória cultural. Quando
nos encontramos mais tarde no campo da interpretação das Sagradas Escrituras, o
ideal relatado por Schleiermacher de reconstruir o sentido original do texto se torna
imperativo e não apenas para a teologia ou para a religião cristã, principalmente
após a Reforma Protestante, como também para o estudo da filosofia, da literatura
clássica e do direito; para a oratória e a retórica também como consequência.

Exegese: é uma palavra grega. exaigesis; aigesis vem de agein, agein é conduzir, e ex é para
Explor

fora. Agein com “g”, o “g” antes do “e” é mudo.


Agein: é o verbo básico, conduzir. É o processo que decorre do uso, do significado do texto
fora da letra, de maneira que ele seja apreendido pelas mentes dos ouvintes e leitores.

Assim, se a hermenêutica após Schleiermacher nos diz como e por que nos de-
bruçarmos sobre textos para os quais buscamos um sentido fundador, originário, a
exegese nos indica o caminho de restabelecimento do sentido original dele. É nesse
sentido também que Paul Ricouer entende a hermenêutica e a exegese a partir de
uma relação intrínseca entre elas (RICOEUR, 1986).

O problema hermenêutico foi colocado, segundo ele, em primeiro lugar nos


limites da exegese, isto é, no contexto de uma disciplina que se propõe a compre-
ender um texto a partir de sua intenção, baseando-se no fundamento daquilo que
ele pretende dizer. A exegese suscitou, assim, um problema de hermenêutica; quer
dizer, um problema de interpretação, porque toda leitura de texto, por mais ligada
que ela esteja ao quid – aquilo em vista de que ele foi escrito, sempre é feita no
interior de uma comunidade, de uma tradição ou de uma corrente de pensamento
vivo, que tem pressupostos e exigências.

A exegese implica uma teoria do signo e da significação – isso quer dizer que, se
um texto pode ter vários sentidos, por exemplo, um sentido histórico e um sentido

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UNIDADE Hermenêutica e Exegese

espiritual, é preciso recorrer à noção de significação muito mais complexa que a


dos signos. Enfim, o próprio trabalho de interpretação revela um desígnio profun-
do: o de superar uma distância, um afastamento cultural; o de equiparar o leitor a
um texto que se tornou estranho e, assim, incorporar seu sentido à compreensão
presente que um homem pode obter dele mesmo.

Daí que nenhuma interpretação significativa pode constituir-se sem fazer em-
préstimos aos modos de compreensão disponíveis numa determinada época: mi-
tos, alegorias, metáforas, analogias. Há um vínculo da interpretação, no sentido
preciso da exegese textual, com a compreensão no sentido amplo da inteligência
dos signos. Faz-se necessário, então, estender o conceito de compreender; ele
não é só um modo de conhecimento, mas um modo de ser, o modo desse ser,
que existe compreendendo.

A exegese já se habituou à ideia de que um texto tem vários sentidos, de que tais
sentidos se imbricam um no outro, de que o sentido espiritual é transferido do senti-
do histórico ou literal por acréscimo de sentido deste. Para Ricoeur, a interpretação
é o trabalho de pensamento que consiste em decifrar o sentido oculto no sentido
aparente, em desdobrar os níveis de significação implicados na significação literal e
haverá interpretação onde houver sentidos múltiplos, já que é na interpretação que
a pluralidade dos sentidos torna-se manifesta.

No exercício hermenêutico que iniciamos ao final da unidade anterior, a segunda


tarefa proposta pelo método hermenêutico de Schleiermacher era encontrar a ori-
ginalidade da composição, o que não parece simples ao se propor a hermenêutica
de um artigo como este. Qual o motivo da dificuldade? Ora, determinar a origi-
nalidade de uma composição não é uma tarefa simples e tem encaminhamentos
diferentes para campos hermenêuticos diferentes se estamos no campo filosófico,
teológico, literário ou jurídico. Em alguns casos, determinar a originalidade de uma
composição passa por um trabalho exegético, por um estudo de detalhes, tais como
opções de tradução da língua original do autor para a língua do leitor, ou mesmo
o estabelecimento da língua original em que o texto foi escrito, e pode passar, ain-
da, pela necessidade de entender o estabelecimento do texto usado como original.
Entretanto, esse original pode ter sido estabelecido a partir de vários outros textos
e essa referência se perde de vista na composição final. Esse distanciamento das
fontes textuais iniciais pode causar dificuldade e engano na interpretação do texto.

Para o artigo do exercício, isso não será necessário. Não há necessidade de


trabalho exegético mais elaborado, uma vez que esse artigo foi escrito em inglês
moderno e não há versões anteriores dele, apenas há trechos que pedem um traba-
lho de exegese, digamos, exploratória. Um exemplo é a possibilidade da tradução
de “deixou de acreditar em Deus, [...]” ser essa mesma, já que podemos entender a
pesquisa feita como motivada pela pergunta “por que algumas pessoas acreditam
em Deus e outras não?” no lugar da pergunta “por que algumas pessoas deixam de
acreditar em Deus enquanto outras ainda acreditam?”. Em termos de originalidade,
o assunto tratado no artigo pretende ser original. Assim, a originalidade não está
no texto, mas na abordagem que se dá para um problema recorrente.

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A partir do exercício hermenêutico do artigo, podemos dizer que, para o artigo
em questão:
• Quem fala: Robin Marantz Henig, jornalista; portanto, não especialista no as-
sunto tratado ou em áreas afins;
• Para quem fala: público do NY Times Magazine; público não especialista no
assunto ou em áreas afins;
• Como fala: em linguagem jornalística. Originalmente em inglês, nós o lemos
em português e não há questões aparentemente relevantes que nos peçam por
um estudo mais profundo das opções de tradução do artigo a não ser verificar se
o autor fala mesmo sobre deixar de acreditar em Deus ou nunca ter acreditado;
• A partir do que fala (ou de quem): a referência principal é Scott Atran e,
desde o 7º parágrafo, Henig fala a partir de Atran. Há ainda duas referências
secundárias: os biólogos Stephen Jay Gould e Richard Lewotin e o psicólogo
Justin Barret;
• E ainda: que a atenção ao ano de publicação – 2007, em face ao ano de leitura
do artigo – 2012, encaminha possíveis questões exegéticas como a de determi-
nar o avanço das pesquisas indicadas no texto embora o texto mesmo só peça
um trabalho exegético (nesse sentido) para o 6º parágrafo e para o 13º pará-
grafo, o da conclusão. No 6º parágrafo, Henig assume a pesquisa de Atran e
passa “a falar como ele”, mas a partir de recortes próprios que não refletem
necessariamente a fala total de Atran. Isso faz com que o trabalho de Atran
seja explorado em busca de precisões conceituais que estariam direcionando a
argumentação de Henig e, até mesmo, sua motivação. Já no 13º parágrafo, o
parágrafo da conclusão, Henig faz afirmativas com as quais é fácil concordar a
partir das hipóteses apresentadas no artigo, mas que precisam ser comprova-
das se estamos em um trabalho de pesquisa especializada.
Explor

Como isso implica no trabalho hermenêutico-exegético das escrituras?

Quando interpretamos as Escrituras, há diversas coisas a serem consideradas


que trazem dificuldade a uma compreensão espontânea do significado primitivo
da mensagem. A distância histórica entre nós e aqueles que as escreveram, que é
a mesma entre nós e os leitores de muitas outras épocas antes de nós. Em segun-
do lugar, existe uma distância cultural, resultante de significativas diferenças entre
a cultura dos antigos hebreus e a nossa e entre a nossa dessa época e de outras
épocas e mais, entre a nossa, a dos hebreus e a de outros povos de descendência
cultural diferente da nossa ou da dos hebreus. Outra dificuldade à compreensão
espontânea da Bíblia é a diferença linguística, além das várias versões e traduções
dela: a Bíblia foi escrita em hebraico, aramaico e grego – três línguas que possuem
estruturas e expressões idiomáticas muito diferentes da nossa própria língua.

A mesma coisa pode acontecer ao traduzir-se de outras línguas, se o leitor ig-


norar que frases como “O Senhor endureceu o coração do Faraó” podem conter

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UNIDADE Hermenêutica e Exegese

expressões idiomáticas que dão ao seu sentido primitivo algo diferente daquele
comunicado pela tradução literal. Outra dificuldade ainda, e não menos significati-
va, é lacuna filosófica. Opiniões acerca da vida, das circunstâncias, da natureza do
Universo diferem entre as várias culturas.

Portanto, a hermenêutica é necessária por causa das lacunas históricas culturais,


linguísticas e filosóficas que obstruem a compreensão espontânea exata da Palavra
de Deus.

No estudo da Bíblia, a tarefa do exegeta é determinar tão intimamente quanto


possível o que se queria dizer em determinada passagem, e não o que ela significa
para mim de modo que o exercício hermenêutico nos dê um campo seguro para a
assertiva dessas interpretações em respeito às exigências exegéticas. Assim, para
que se tenha uma base para o estudo hermenêutico, é necessário então alguns
acordos e um deles é considerar que as palavras podem ser usadas em sentido
literal, figurativo ou simbólico.

Já Agostinho de Hipona, em seu livro sobre a doutrina cristã, estabeleceu regras


para a exposição/entendimento das Escrituras, entre elas, as seguintes: o intérprete
deve possuir fé cristã autêntica; deve ter em alta conta o significado literal e histórico
da escritura; a Escritura tem mais que um significado e, portanto, o método alegórico
é adequado; há significado nos números bíblicos; o Antigo Testamento é documento
cristão porque Cristo está retratado nele do princípio ao fim; compete ao expositor
entender o que o autor pretendia dizer e não introduzir no texto o significado que
ele, expositor, quer lhe dar; o intérprete deve consultar o verdadeiro credo ortodoxo;
um versículo deve ser estudado em seu contexto, e não isolado dos versículos que o
cercam; se o significado de um texto é obscuro, nada na passagem pode constituir-se
matéria da fé ortodoxa; o Espírito Santo não toma o lugar do aprendizado necessário
para se entender a Escritura. O intérprete deve conhecer hebraico, grego, geografia
e outros assuntos; a passagem obscura deve dar preferência à passagem clara; o ex-
positor deve levar em consideração que a revelação é progressiva.

Em outra passagem de Doutrina Cristã (estudaremos este livro mais adiante),


Agostinho justifica uma interpretação alegórica de 2 Coríntios 3:6. Como demons-
trar que esse tipo de interpretação é também uma dimensão ou nível de significação
da palavra das Escrituras. E, a partir disso, passou a admitir um sentido quádruplo
da Escritura. Esses quatro níveis da significação seriam:
1. A letra mostra-nos o que Deus e nossos pais fizeram;
2. A alegoria mostra-nos onde está oculta a nossa fé;
3. O significado moral dá-nos as regras da vida diária;
4. A analogia mostra-nos onde terminamos nossa luta.

Revisando os pontos que foram estudados até aqui, nós podemos resumi-los en-
quanto acrescentamos alguns parâmetros mais técnicos ao exercício hermenêutico
de modo a tornar a tarefa factível.

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• Primeiro ponto: o sentido da análise histórico-cultural e contextual tão
importante para a hermenêutica. Determinar o ambiente geral histórico e cul-
tural do escritor e de sua audiência significa basicamente: a. Determinar as
circunstâncias históricas gerais. B. Ter clareza sobre as circunstâncias e normas
culturais que acrescentam significados a determinadas ações. c. Discernir o
nível de compromisso espiritual da audiência;
• Segundo ponto: determinar o objetivo que o autor tinha em escrever
um livro, mediante: a. Notar as declarações explícitas ou repetição de frases.
b. Observar as seções parenéticas ou exortativas. c. Observar os problemas
omitidos ou os focalizados;
• Terceiro ponto: entender como a passagem se enquadra em seu contex-
to imediato sabendo: a. Apontar os principais blocos de material no livro e
mostrar como se ajustam num todo coerente. b. Mostrar como a passagem se
encaixa na corrente de argumento do autor. c. Determinar a perspectiva que o
autor tencionava comunicar – numenológica ou fenomenológica. d. Distinguir
entre verdade descritiva e verdade prescritiva. e. Distinguir entre detalhes inci-
dentais e o núcleo de ensino da passagem. f. Indicar a pessoa ou categoria de
pessoas para as quais a passagem se destinava.

Há ainda a Análise Léxico-Sintática do texto, o que parece (e de fato é) algo


mais diretamente ligado à exegese que à hermenêutica, mas que é de grande im-
portância para o entendimento correto do texto bíblico.

A análise Léxico-sintática fundamenta-se na premissa de que, embora as pa-


lavras possam assumir uma variedade de significados em contextos diferentes,
elas têm apenas um significado intencional em qualquer contexto dado. Os itens
seguintes foram dados como consensuais para a elaboração de uma análise
léxico-sintática:
• Apontar a forma literária geral;
• Investigar o desenvolvimento do tema e mostrar como a passagem sob consi-
deração se enquadra no contexto;
• Apontar as divisões naturais (parágrafos e sentenças) do texto;
• Indicar os conectivos dos parágrafos e sentenças e mostrar como auxiliam na
compreensão da progressão do pensamento;
• Determinar o que significam as palavras tomadas individualmente;
» Apontar os múltiplos significados que uma palavra possuía no seu tempo e cultura;
» Determinar os significados únicos, que o autor tinha em mente em dado contexto;
• Analisar a sintaxe para mostrar de que modo ela contribui para a compreensão
de uma passagem;
• Colocar os resultados de sua análise em palavras não técnicas, de fácil compre-
ensão que comuniquem com clareza o significado que o autor tinha em mente.

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UNIDADE Hermenêutica e Exegese

Por outro lado, na análise teológica, como parte do exercício hermenêutico, há


que se determinar: 1. A própria perspectiva da natureza do relacionamento de Deus
com o homem. 2. Apontar a implicações desta perspectiva para a passagem que
você está estudando. 3. Avaliar a extensão do conhecimento teológico disponível às
pessoas daquele tempo de maneira a não levarmos para onde não havia conceitos
e conhecimentos que não lhes pertencem e, assim, arriscarmos uma interpretação
contaminada dos textos. 4. Determinar o significado que a passagem possuía para
seus primitivos destinatários à luz do conhecimento que tinham. 5. Indicar o conhe-
cimento complementar acerca deste tópico que hoje temos disponível por causa de
revelação posterior.

Há, atualmente, várias teorias que podem dar subsídio para uma análise teológi-
ca do texto em estudo hermenêutico, uma delas é a Teoria Dispensacional. O Dis-
pensacionismo, como é tratada a teoria, é que pode ser aceito com plena confiança
por alguns hermeneutas ou ser totalmente desacredito e rechaçado por outros.
Essa teoria tem sido considerada a chave para dividir corretamente as Escrituras
para aqueles que a defendem ou a mais perigosa heresia encontrada presentemente
dentro dos círculos cristãos para aqueles que a repelem.

No Dispensacionismo, o padrão da história da Salvação é visto como três passos


que se repetem com regularidade: (1) Deus dá ao homem um conjunto específico
de responsabilidades ou padrão de obediência; (2) O homem não consegue viver à
altura desse conjunto de responsabilidades; (3) Deus reage com misericórdia conce-
dendo um novo conjunto de responsabilidades, isto é, uma nova dispensação.

Outra é a Teoria Luterana. Lutero acreditava que devemos distinguir com cui-
dado duas verdades bíblicas paralelas e sempre presentes: A Lei e o Evangelho.
A Lei refere-se a Deus, em seu ódio ao pecado, seu juízo e sua era. O Evangelho
refere-se a Deus em sua graça, seu amor e sua salvação. Um modo de distinguir Lei
e Evangelho é perguntar: isto fala de julgamento sobre mim? Nesse caso, é a Lei.
Em contraste, se a passagem traz consolo, ela é o Evangelho.

Há também a Teoria das Alianças, na qual a Aliança da Graça é o acordo en-


tre Deus e o pecador, em que Deus promete salvação mediante a fé, e o pecador
promete uma vida de fé e obediência. Todos os crentes do Antigo Testamento, bem
como os crentes nossos contemporâneos, são parte da Aliança da Graça.

Outra teoria é observar os três aspectos da Lei: o cerimonial, o judicial ou civil


e o moral. O aspecto cerimonial da lei, por exemplo, abrange os vários sacrifícios
e ritos cerimoniais.

Há, ainda, na metodologia hermenêutica bíblica que se considerar as regras


que se aplicam a gêneros específicos, como parábolas, alegorias, tipos e profecia.
As parábolas e alegorias são exemplos de metáfora. A metáfora é uma comparação
não expressa; ela não usa as palavras semelhantes, mas ideias semelhantes. A ale-
goria, por seu lado, é como uma metáfora em que a comparação não vem expressa
e o sujeito e a coisa comparada acham-se entrelaçados.

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As alegorias misturam a história e sua aplicação, de sorte que a alegoria traz
em seu conteúdo sua própria interpretação. Os provérbios podem ser considerados
ou como parábolas condensadas ou como alegorias condensadas. O foco geral do
livro de provérbios é o aspecto moral da lei – regulamentos éticos para a vida diária
redigidos em termos universalmente permanentes. Os focos específicos incluem
sabedoria, moralidade, castidade, controle da língua, associações com outras pes-
soas, indolência e justiça.

As parábolas são metafóricas e alegóricas e têm por função revelar verdade aos
crentes como é dito em Mateus 13: 10 – 12, Marcos 4: 11 ou 2 Samuel 12: 1-7.
Como um objetivo secundário, embora consequente, oculta a verdade daqueles que
endurecem o coração contra ela se aceitarmos o que diz Mateus 13:10-15, Marcos
4:11-12, ou Lucas 8:9 - 10.

Há também a ideia de “tipo”, que se desenvolveu a partir de um estudo indutivo


do uso bíblico desse conceito: tipo é uma relação representativa reordenada que
certas pessoas, eventos e instituições têm com pessoas, eventos e instituições cor-
respondentes, que ocorre numa época posterior na história da salvação.

Os tipos assemelham-se aos símbolos e podem até ser considerados uma espé-
cie particular de símbolo. Contudo, existem duas características que os diferenciam.
Primeira, os símbolos servem de sinais de algo que representam, sem necessaria-
mente ser semelhantes em qualquer respeito, ao passo que os tipos se assemelham
de uma ou mais formas às coisas que prefiguram. Segunda, os tipos apontam para
o futuro, ao passo que os símbolos podem não o fazer. Um tipo sempre precede
historicamente o seu antítipo, ao passo que um símbolo pode preceder, coexistir,
ou vir depois daquilo que ele simboliza. A tipologia deve também se distinguir do
alegorismo. A tipologia é a busca de vínculos entre os eventos históricos, pessoas,
ou coisas dentro da história da salvação. O alegorismo é a busca de significados
secundários e ocultos que sublinham o significado primário e óbvio da narrativa his-
tórica. A tipologia repousa sobre uma compreensão objetiva da narrativa histórica,
ao passo que alegorização introduz na narrativa significados objetivos.

Como classificações dos tipos, podemos ter: pessoas típicas – são aquelas cujas
vidas demonstram algum importante princípio ou verdade da redenção. Nesse con-
texto, uma figura representativa refere-se à oscilação de pensamento entre um
grupo e um indivíduo que representa esse grupo, e era uma forma hebraica de pen-
samento comum e aceita. Instituições típicas são práticas que prefiguram eventos
posteriores de salvação.

Para as profecias, é importante notar que, em ambos os Testamentos, profeta é


um porta-voz de Deus que declara a vontade de Deus ao povo. A profecia refere-se
a três coisas: 1. Predizer eventos futuros; 2. Revelar fatos ocultos quanto ao presen-
te; 3. Ministrar instrução, consolo e exortação.

Na unidade seguinte, você encontrará um exemplo de estudo exegético her-


menêutico, usando dois textos bem distintos: o artigo “Um apocalipse budista

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sino-indiano do século IV: o Fa-Mieh-Chin-Ching (Sutra da extinção da lei)” – que


mostra o resultado do trabalho exegético que Ricardo Mário Gonçalves faz do Sutra
da extinção da lei para estabelecer um viés de entendimento sobre aquele sutra – e
“A autoridade de Jesus Cristo” mais “Luiz Sayão – Lições para uma geração que
perdeu o temor”.

Como preparação para este exercício e a fim de exercitar um pouco a percepção da diferença
Explor

entre os textos, leia os artigos indicados abaixo. Depois, esboce uma resposta para a pergun-
ta: qual a diferença entre os conteúdos dos artigos e entre suas formas de redação?
• A Autoridade de Jesus Cristo, disponível em: http://bit.ly/2Kuvb3J
• Luiz Sayão – Lições para uma geração que perdeu o temor,
disponível em: http://bit.ly/2Ku1T5l

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Livros
Muito além do ensino: Reflexões sobre aspectos da vida diária a partir da Teologia, Educação e Ciências da Religião
SUÁREZ, A. Muito além do ensino: Reflexões sobre aspectos da vida diária a partir
da Teologia, Educação e Ciências da Religião.

Vídeos
Hermenêutica e Exegese Bíblica
https://youtu.be/UqQut2se7BU
Hermenêutica Bíblica II, Videoaula 1
https://youtu.be/mz8PZcMVVtY
5 Regras da hermenêutica para iniciantes / 5 Rules of hermeneutics for initiating
https://youtu.be/yT5ltGQrYlw
Hermenêutica Biblica e Exegese qual a Diferença ?
https://youtu.be/jnZFanBheVQ

Leitura
Hermenêutica: interpretando corretamente a Bíblia
http://bit.ly/2Kt9f97
Breve percurso histórico da Hermenêutica Bíblica
http://bit.ly/2KtcWvH
Hermenêutica bíblica: refazendo caminhos
http://bit.ly/2Kv4Keb
A Teoria da Interpretação e a Hermenêutica Bíblica de Paul Ricoeur
http://bit.ly/2M35Yk5
Hermenêutica
http://bit.ly/2KsvUmc

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UNIDADE Hermenêutica e Exegese

Referências
ARISTÓTELES. Retórica. Livro II. Tradução Isis Borges B. da Fonseca com Retó-
rica das paixões. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
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FERRO, M.; TAVARES, M. Análise das Obras Górgias e Fédon de Platão. 3.
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Sites visitados
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