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Vitória da Conquista-BA
2019
1 PRIMEIRO VAMOS DEFINIR O DESTINO
Já que viver é uma grande viagem, primeiro vamos definir nosso destino, neste caso,
nossos destinos. Para embarcar neste trabalho lhe convido a se despir de concepções arraigadas
que você muitas vezes nem sabe que possui, mas que aqui, talvez descobrirá. Neste estudo
falaremos da trajetória individual de algumas pessoas que vez ou outra a vida dá um jeito de
fazer se cruzar por aí, tanto nos caminhos materiais, quanto nos intelectuais. São pessoas
semelhantes, mas também muito diferentes, unidas por uma questão em comum, somos todas
mulheres!
Os caminhos que transformaram a sociedade no que ela é hoje não foram trilhados
apenas uma vez. Para que os conceitos e certezas que atualmente assumimos como verdadeiros
nascessem, foi necessário um percurso anterior de criação, credo, vivência e manutenção de
cada ideia, preconceito ou estereótipo.
Quando se fala em subjugação são vários os grupos que vêm à mente de início:
população negra, crianças, indígenas, mulheres, todos vitimados ao longo da história, ou em
parte dela, devido às condições que possuíam ou que lhe foram impostas.
Sobre as mulheres, não foram poucas as formas pelas quais experimentaram a opressão.
Sua capacidade de pensar racionalmente foi questionada, sua sexualidade foi reprimida, seus
sentimentos eram concebidos como histeria sempre que não seguiam o padrão de
comportamento predeterminado. Como se tudo isso não fosse suficiente, sua educação também
foi limitada. De início, por não acreditarem que a mulher teria competência suficiente para
aprender, e depois, por não acharem necessário povoar a mente delas com o que não fosse
considerado apropriado à natureza feminina.
Como resultado de todos os movimentos em que se engajaram para sua emancipação e
inclusão em diversas áreas da sociedade, as mulheres alcançaram vitórias significativas para
suas vidas, e uma delas foi a garantia de direito a educação.
Se hoje a escolarização feminina no Brasil é possível, até o século XIX não era. Foi
somente no início do referido período que nosso país começou a permitir a inserção de meninas
nas escolas, pois antes disso a educação, além de extremamente elitizada, era também muito
seletiva. Aquelas pertencentes às famílias abastadas estudavam limitadas às paredes de suas
próprias casas, isso quando o ensino acontecia, mas ainda assim era moldado pelos ideais de
uma sociedade machista1, que visava formá-las para as aptidões maternais e do lar, já que a elas
bastava tão somente a competência nos serviços domésticos.
Mesmo estando em um período histórico no qual as mudanças, plantadas em um passado
de embates e batalhas, já se tornam mais visíveis e vivíveis, não se pode ignorar todas as
consequências oriundas de uma história de negação de tantos direitos das mulheres.
Em vista disso, esta pesquisa surge como mais um fruto de minhas2 inquietudes
relacionadas à vida acadêmica feminina e suas singularidades, uma vez que, tão grande tem
sido a necessidade de compreender as especificidades do ser mulher na universidade que meu
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) também foi referente a esta temática. Nele pesquisei
acerca das dificuldades e superações que as estudantes da graduação que são mães, esposas,
donas de casa e trabalhadoras encontram no momento de adentrar, permanecer e atuar na
universidade, e ainda de quais estratégias se valem para não desistir dos estudos, já que têm
sido condicionadas socialmente a assumir inúmeras obrigações que as sobrecarrega e muitas
vezes as força a escolher entre estudar ou desempenhar funções esperadas pela sociedade.
O trabalho intitulado, “Mulher, mãe, dona de casa, esposa e trabalhadora: dificuldades
e superações para ingressar e permanecer na Universidade Pública”, (AGUIAR; PAES, 2018)
desenvolvido durante minha graduação, revelou que as mudanças desejadas pelas mulheres,
foco da pesquisa, ainda avançam a passos lentos, pois aquelas inseridas nas condições
delimitadas, na maioria das vezes, não recebem apoio do governo para dar continuidade aos
seus estudos e muitas delas, mesmo já inclusas no ambiente universitário, nem sabem que
possuem certas garantias, principalmente acerca daquelas relacionadas à maternidade.
Evidenciou ainda que o apoio da família pode ser o divisor de águas naquilo que se refere à
decisão de permanência, ou não, nos estudos. Em virtude de achados como estes é que se vê a
importância de pesquisar sobre a temática, para que deste modo tenhamos a possibilidade de
construir novos horizontes de discussão e de busca por mudanças efetivas, que visem auxiliar
as mulheres em sua trajetória no Ensino Superior, já que o atual perfil da maioria delas diverge
dos/as demais alunos/as, que assumem somente a função de estudante/s e não outras obrigações
socialmente expectadas.
A pesquisa atual será desenvolvida na pós-graduação, isso foi motivado primeiramente
devido ao fato de já ter realizado na graduação uma pesquisa que considero antecessora a essa,
1
Modelo de sociedade em que os homens possuem o poder, ainda que simbólico, e por isso ditam regras e muitas
vezes leis, que normatizam a vida das mulheres, cerceando a liberdade feminina em diversos aspectos.
2
Optei por utilizar a primeira pessoa do singular na escrita porque não há como falar de singularidades femininas
na academia sem me incluir. Mesmo não sendo mãe ou esposa minha condição de mulher já me insere em certas
especificidades de condição estudantil que este trabalho aborda.
que tornou possível perceber as falhas na efetivação de políticas públicas destinadas às
mulheres graduandas. A investigação oriunda do TCC ampliou meu olhar em relação à situação
das mulheres na universidade, estivessem elas na graduação ou na pós-graduação, já que, em
conversas informais com professoras que já eram mestras e doutoras, pude perceber que os
dilemas que cada uma delas narrava enfrentar eram muito característicos e se diferenciavam de
acordo com o segmento educacional em que elas se encontravam.
A instigação para a pesquisa é justificada ainda diante do fato de compreender que as
mulheres, tanto coletiva, quanto individualmente são um substantivo marcado por diversas
limitações impostas, dadas às relações de gênero, social e historicamente construídas, que
ocasionaram inúmeras consequências para diversas áreas de suas vidas. O primeiro reflexo
disso foi em sua escolarização, que aconteceu tardiamente, assim como sua entrada no mercado
de trabalho. Houve ainda a negação de muitos direitos, fato que em algumas esferas perdura até
hoje. Todavia, mesmo diante de tantos dilemas, essa classe3 também é sinônimo de resistência
e luta, já que tem sido por meio delas que vêm alcançando seu merecido espaço num mundo
que está sendo metamorfoseado manualmente por elas.
Para elucidar todos os dilemas que serão pesquisados, a questão central desta
investigação intui pensar: de que maneira as desigualdades das relações de gênero influenciam
na atuação estudantil de alunas nos Programas de Pós-Graduação de Caetité-BA e Vitória da
Conquista-BA?
Em virtude desta indagação inicial o objetivo geral deste estudo procura: analisar a
influência das especificidades da condição feminina na atuação acadêmica de estudantes que
são mães, esposas, donas de casa ou trabalhadoras nos cursos de pós-graduação do PPGEd4 -
UESB e PPGELS5 - UNEB.
Para atender a este objetivo a investigação busca conhecer o processo de escolarização
da mulher no Brasil, especificamente no Ensino Superior; refletir sobre como as desigualdades
existentes nas relações de gênero influenciam na atuação estudantil de alunas da pós-graduação
que são mães, esposas, donas de casa ou trabalhadoras, discutir as especificidades da condição
feminina na pós-graduação, tendo em vista as diferenças e desigualdades de gênero.
Existem algumas informações complementares, no sentido de melhor conhecer os
pormenores dos delineamentos de um projeto investigativo, que nem sempre cabem ser citadas
3
A mulher enquanto classe é uma designação feita por Angela Davis (2016) em seu livro Mulheres, raça e classe.
4
Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Campus de Vitória
da Conquista-BA.
5
Programa de Pós-graduação em Ensino, Linguagens e Sociedade, Campus VI, Caetité-BA.
na questão de pesquisa ou nos objetivos, em vista disso, penso ser importante especificar, logo
de início, sobre as participantes deste trabalho, que serão alunas (mães, esposas, donas de casa
ou trabalhadoras) ingressantes no Mestrado em Educação (PPGEd) em 2019.1 e do Mestrado
em Ensino (PPGELS) no mesmo semestre.
Diante de tudo o que foi exposto, este estudo pretende contribuir, não só para ampliar
os estudos e reflexões sobre a singularidade da atuação feminina na pós-graduação, mas
também para desnaturalizar as situações de sobrecarga de tarefas a que essas mulheres se
sujeitam cotidianamente para corresponder a todas as expectativas, históricas e sociais,
depositadas sobre elas.
6
A primeira turma ingressou no semestre de 2019.1.
primeiro/a assume como finalidade a obtenção de informações úteis ao estudo que está
desenvolvendo, por parte do/a segundo/a (HAGUETTE, 1997).
Nesta perspectiva, a entrevista episódica, é definida por Bauer; Gaskell (2002, p. 127),
como aquela que:
Ela surge com o intento de narrar as experiências singulares que as mulheres, pessoas-
fonte deste estudo, passam, devido ao fato de serem mulheres e estarem sujeitas às condições
que o patriarcado lhes impõe cotidianamente. Esse tipo de entrevista é concebido como o mais
adequado, pois seu foco está na subjetividade de cada uma, para depois transformar, ou não,
essa singularidade em regularidade.
Além disso, partindo do pressuposto de que para um trabalho ser considerado sólido e
confiável ele deve estar fundamentado em clássicos da área, a revisão bibliográfica também
será feita, pois:
Ela se constitui enquanto uma das partes mais delicadas e importantes da pesquisa, pois
é neste momento que as significações serão atribuídas de acordo com o que se coletou e
produziu no campo, podendo conduzir a investigação à caminhos não planejados, mas
necessários à compreensão do problema delimitado para análise.
Referências
AGUIAR, Samara Gomes; PAES, Valquíria Normanha. Mulher, mãe, dona de casa, esposa
e trabalhadora: dificuldades e superações para ingressar e permanecer na universidade
pública. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia) - Departamento
de Educação, DEDC Campus XII, Uneb, Guanambi, 2018.
FLICK, Uwe. Introdução à pesquisa qualitativa. Uwe Flick; tradução Joice Elias Costas. 3.
– ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. – ed. São Paulo: Atlas, 2010.
GOLDENBERG, Mirian. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa. 8. – ed. Rio de Janeiro:
Record, 2004.
MINAYO, Maria Cecília de Souza. O desafio do conhecimento. – 10. ed. São Paulo:
HUCITEC, 2007.