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RIBEIRÃO PRETO - SP
Julho de 2021
“Suponho que o leitor seja músico, sem o que poderia encontrar muitas coisas
ininteligíveis na exposição que farei. Penso haver grande distinção entre um músico e um
notista1: o primeiro é aquele que, considerando a música como a ciência dos sons, vê as
figuras musicais apenas como sinais convencionais que as representam e que, pelos olhos,
transmitem o resultado ao pensamento, como as letras lhe transmitem as palavras, e estas,
as idéias. O segundo é aquele que a considera como a ciência das figuras, que atribui
grande importância a seus nomes, cuja verdadeira acepção lhe é desconhecida, e que
espera, para compreendê-la, a época em que estudará harmonia, vendo-as somente,
enquanto espera, como outras tantas ordens para tocar uma ou outra tecla do piano,
prender tal corda com tal dedo, em tal lugar, no violino, no violoncelo, na guitarra, etc.;
ou para abrir ou fechar tal chave, ou furos, da clarineta, da flauta, etc., e que é o
instrumento que, pelo ouvido, transmite à cabeça o resultado de todas as combinações de
figuras musicais”.
Fernando Sor, Méthode pour la Guitare, 1830
Introdução
Além de apresentar uma descrição das técnicas de se tocar violão as quais utilizava
Sor, o Méthode Pour La Guitarre também pode ser lido como um documento que reflete
um momento histórico tanto na consolidação do violão em meio à organolodia dos
cordofones como também das transformações políticas, culturais e sociais ao entorno da
revolução Francesa a qual Sor foi adepto ao ponto de se radicar na França e não mais
retornar para a Espanha, no fim de sua vida. (JEFERRY,1977).
Sendo assim, o presente trabalho visa discutir alguns excertos da obra Grand
Sonata Op.22 de Fernando Sor e suas possibilidades de execução tendo como base o
Méthode Pour La Guitarre.
Tendo como base a seguinte afirmação de Sor em seu método: “Não ouvi em
minha vida um único guitarrista cuja execução fosse suportável se tocasse com unhas;
elas só podem dar pouquíssimas nuanças à qualidade do som: os pianos nunca podem
ser cantantes nem os fortes suficientemente cheios; seu toque é para o meu o que o
cravo é para o piano: as passagens em piano são sempre metálicas e, nos fortes, ouve-se
mais o ruído das teclas que o som das cordas”. É possível inferir que os acordes iniciais
devem ser executados com o polegar sem o uso das unhas, atacando com a carne lateral
do dedo, promovendo assim uma sonoridade robusta.
Tendo em vista também que a técnica atual de se tocar violão incorpora o uso de
unhas de maneira quase unânime, a angulação da mão direita ao pungir as cordas em
linhas melódicas também deve ser repensada para produzir uma sonoridade mais
“quente” e consequentemente mais próxima ao toque sem unha.
Os acodes do quarto compasso também suscitam indagação. Tendo como
referência o fato de Sor descrever raramente usar o dedo anular:” Já expus na primeira
parte as razões que tive para estabelecer como regra geral só empregar ordinariamente
três dedos; assim, mantenho sempre a mão a uma altura que possibilite ao polegar
percorrer quatro cordas, e os outros dedos diante das outras duas cordas” é possível
abordar a execução deste acorde usando o polegar para tocar as notas Si e Fá, na quinta
e quarta corda respectivamente e os dedos indicador e anular para as notas Sol e Ré na
terceira e quarta corda, respectivamente. Desta mesma forma, o seguinte trecho pode ser
abordado sob uma perspectiva similar.
Figura 2
Podemos inferir que o uso dos dedos indicador e anular para a parte superior e do
polegar para a linha inferior poderá produzir um efeito mais próximo ao imaginado pelo
compositor. É importante ressaltar que a escolha de digitação da mão direita tem não
somente um sentido de facilidade e fluência na execução mecânica, mas também um
sentido musical e de controle sonoro, a escolha dos dedos também implica em uma
escolha de timbres.
Outro ponto interessante desta obra se dá no seguinte trecho:
Figura 3
CONCLUSÃO
Fernando Sor e seu Méthode Pour La Guitarre representam não somente
um marco no desenvolvimento do violão e da escrita musical para o instrumento, mas
também um documento repleto de informações sobre os paradigmas históricos vigentes
consequentes ao choque de um mundo “antigo” com um mundo “moderno”. É também
uma grande fonte de informações que podem nortear a interpretação da obra de Fernando
Sor e na compreensão do que concerne as práticas interpretativas da música do século
XIX.
REFEÊNCIA BIBLIOGRÁFICA