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INTRODUÇÃO
No final do século XX, o Brasil sofria modificações para atender aos objetivos
da interdependência. O desenvolvimento industrial desenfreado ocasionava implicações
sociais no ensino de ciências. A implantação da Lei 5.692/71, pedagogia tecnicista,
priorizava no currículo as disciplinas profissionalizantes, tendo como objetivo o
crescimento econômico do país, prejudicando a área científica e a formação dos
profissionais em educação.
A legislação em vigor e os precários cursos de formação de professores não
habilitavam os profissionais, e nem possibilitavam sua atualização. Devido à falta de
preparo, os professores passaram a depender dos manuais escolares, que vinham sendo
utilizados nas escolas públicas desde 1960, para atender a ampliação de vagas e
propostas assistencialistas criadas pelo Estado.
Nas décadas de 1970 e 1980, os manuais didáticos passaram a ocupar
importância central, impondo-se o modelo denominado “estudo dirigido”. Tornaram-se
necessários e determinantes no ensino-aprendizagem, norteando a estrutura do currículo
nas escolas e auxiliando os professores no planejamento e prática pedagógica em sala de
aula.
A investigação desenvolveu o trabalho de análise das produções didáticas de
ciências, de quinta a oitava séries: A Terra, Zoologia e Botânica; O corpo humano e A
Energia da primeira coleção Escola Moderna, e A Terra, Os seres vivos, O homem e A
Energia da segunda coleção, dos autores Waldemar Ens e Samuel Ramos Lago, editadas
pelo Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas (IBEP), recursos educacionais de
grande utilização nas escolas de ensino fundamental do país, neste período.
O estudo dos manuais aconteceu dentro do contexto histórico, observando todos
os fatos e acontecimentos ocorridos com a educação, bem como os preceitos sociais da
época e o atendimento das necessidades pedagógicas educacionais. De modo especial a
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Licenciada em Ciências Biológicas pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
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Doutor em Educação pela PUCPR. Professor da educação básica da SEED PR e do Curso de
Licenciatura em Ciências Biológicas da PUCPR.
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Belo Horizonte, Campus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
08 a 11 de outubro de 2014 | ISBN: 978-85-62707-62-9
Anais Eletrônicos do 14º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia – 14º SNHCT
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A educação foi muito afetada pelo regime militar, que estava preocupado com o
desenvolvimento econômico do país. O ensino nas escolas não estava bem, havia altos
índices de analfabetismo, baixa produtividade, evasão escolar e repetência.
Como o governo brasileiro mantinha negociações com empresas estrangeiras,
passou a importar a educação desejada por estas empresas. Conforme Saviani (2007,
p.362), “para ajustar a educação aos reclamos postos pelo modelo econômico do
capitalismo do mercado associado dependente, articulado com a doutrina da
interdependência”.
Adotou a pedagogia tecnicista que era voltada para o trabalho profissionalizante,
onde a razão era a fonte do conhecimento. Como salienta Saviani (2007, p.381),
“perdeu de vista a especificidade da educação, ignorando que a articulação entre escola
e processo produtivo se dá de modo indireto e por meio de complexas mediações”.
Até a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em 1961, as aulas
de Ciências Naturais eram ministradas nas duas últimas séries do antigo curso ginasial.
Com a aprovação da Lei 5.692 de 1971, as aulas de Ciências passaram a ter caráter
obrigatório nas oito séries do primeiro grau. A pedagogia oficial do país passou a
modelar o comportamento humano e padronizar a mão de obra especializada,
favorecendo a revolução industrial e contribuindo para o aumento da dívida externa,
distanciando o aluno de valores sociais, como: justiça, solidariedade, amor e paz,
inviabilizando o trabalho pedagógico.
A insegurança instalara-se no país, ocorrendo a abertura democrática em 1974,
no governo Geisel, prosseguido no governo Figueiredo em 1979. Os educadores
organizavam-se em sindicatos, muitas greves aconteciam nas escolas exigindo do poder
público: “uma escola pública de qualidade, aberta a toda a população e voltada
precipuamente para as necessidades da maioria, isto é, a classe trabalhadora”, afirma
Saviani (2007, p. 402).
A particularidade da década de 1970 foi a busca de teorias que constituíssem
alternativas à pedagogia oficial, como esclarece Saviani (2007, p. 400), “surgiu naquele
momento: a necessidade de construir pedagogias contra-hegemônicas, isto é, que em
lugar de servir aos interesses dominantes se articulassem com os interesses
dominados’’.
A pedagogia tecnicista também era discutida na área acadêmico-científica, que
estava a favor da suspensão da educação voltada para a produção, como mostra Saviani
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O conteúdo das produções didáticas de ciências dos autores Ens e Lago, das
décadas de 1970 e 1980, de quinta a oitava séries do primeiro grau, estava de acordo
com as orientações constantes no Currículo do Estado do Paraná da época.
Os livros da quinta série, denominados A Terra, abordam o ar e a importância
que ele exerce na vida diária do ser vivo, na formação dos ventos, pressão atmosférica e
explorações espaciais. Ao enfocar a água usa exemplos práticos, mostrando o valor, as
mudanças dos estados físicos e os respectivos ciclos. Explica a densidade, purificação e
o tratamento da água. Quanto ao processo de distribuição de água, recurso que até
algum tempo pensou-se inesgotável, é abordado pelo princípio dos vasos comunicantes.
Na análise do solo há prioridade para as camadas da terra e a caracterização das rochas,
minerais e minérios. Quanto à formação do solo é essencial aprender como deve ser
preparada a terra para o cultivo e para o combate da erosão e da poluição. Como mostra
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Krasilchik (1987, p.24) “nem sempre o tratamento dos problemas leva ao exame das
causas econômicas e às possíveis consequências do uso indevido do ambiente em
atividades industriais e agrícolas”. O volume A Terra, da primeira coleção, aborda
Ecologia e Saúde, incentivando a prática do reflorestamento e mostra a importância do
petróleo e demais riquezas minerais do Brasil, enquanto o volume da segunda coleção,
também denominado Terra, explica os fenômenos meteorológicos e o clima.
Na sexta série do primeiro grau, os livros analisados recebem os títulos de
Zoologia e Botânica e Os seres vivos. O estudo de Zoologia mostra a importância e
utilidade dos animais para o homem. É vista a nomenclatura e a classificação dos
grupos zoológicos de acordo com a proposta curricular do Estado do Paraná, das
décadas de 1970 e 1980, e que tradicionalmente ainda é usada em grande parte dos
currículos escolares. As características gerais dos vertebrados, mamíferos e aves são
destacadas. Quanto aos répteis, consta a distinção entre cobras venenosas e não
venenosas e os principais soros antiofídicos. São abordadas, a metamorfose dos anuros
e a diferenciação entre peixes ósseos e cartilaginosos. Algumas espécies de
equinodermas e moluscos são reconhecidas, pelo valor econômico e médico, bem como
a nocividade de alguns artrópodes e as medidas profiláticas contra as principais
verminoses e os protozoários. Em Botânica, os volumes mostram o valor dos vegetais e
o que representam para o ser humano. Fazem o reconhecimento da raiz até a
germinação da semente, caracterizando os vegetais superiores, destacando-se as
angiospermas. Constam as características e utilidades das gimnospermas, pteridófitos,
briófitas, fungos, bactérias, algas e líquens. No livro Zoologia e Botânica é ensinada a
maneira de organizar uma horta e cultivar hortaliças, também descreve a sistematização
das cadeias alimentares, com a denominação de Ecologia e Saúde, enquanto o livro em
relação ao conteúdo Os seres vivos mostra a forma de conservação dos recursos naturais
e as agressões ao ambiente, decorrentes do desenvolvimento industrial desenfreado.
Os volumes, O corpo humano e O homem, dos manuais didáticos de ciências da
sétima série do primeiro grau, mostram as funções e estruturas da célula, componente
fundamental dos tecidos e a utilização do microscópio. Também caracterizam os
alimentos: glicídios, protídeos, lipídios, vitaminas, sais minerais, água e oxigênio,
mediante a utilização de regras de higiene.
A análise dos tecidos serve de auxílio no estudo dos aparelhos digestivo,
excretor e respiratório, bem como na assimilação dos sistemas do corpo humano. A
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Os manuais didáticos de ciências dos autores Ens e Lago, nesta época, serviram
de material de apoio aos professores, no planejamento escolar e na prática pedagógica
em sala de aula, norteando o currículo e o ensino de ciências das escolas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A sociedade brasileira vem resgatando a história da educação que tem como eixo
comum o conhecimento. Na década de 1970, o desenvolvimento de indústrias
estrangeiras e o domínio do capitalismo, ligados à doutrina da interdependência,
impulsionaram a ditadura militar a estabelecer reformas na educação, que atendessem às
exigências da sociedade industrial e tecnológica.
A pedagogia tecnicista, adotada no Brasil pela Lei 5.692/71, introduziu nas
escolas brasileiras um currículo por áreas de estudo, não reconhecendo as disciplinas
científicas e prejudicando a formação e atualização dos profissionais em educação,
dando prioridade às relações capitalistas que demandavam a teoria do capital humano.
Nas décadas de 1970 e 1980, ocorreu o desenvolvimento da produção
acadêmico-científica. Os manuais didáticos escolares, que eram utilizados desde 1960,
tornaram-se prioritários e passaram a nortear a estrutura curricular do ensino, para suprir
as péssimas condições de trabalho e a falta de preparo dos professores, tornando
possível a prática pedagógica e objetivos relacionados à área de ciências que
possibilitavam ao aluno compreender o mundo, de acordo com os preceitos sociais da
época.
Neste período, as coleções didáticas de ciências dos autores Ens e Lago, do
ensino fundamental, ocuparam lugar de destaque nas produções culturais utilizadas em
escolas entre 1970 e 1980. No estudo dos manuais didáticos, constatou-se a
concordância e equivalência entre os objetivos do currículo e os conteúdos, atendendo
às propostas de ensino do Currículo do Estado do Paraná de 1973.
Também foi possível verificar sequência e organização nos conteúdos dos
volumes analisados individualmente, ocorrendo fragmentação nas coleções, já que não
há continuidade e ampliação dos conhecimentos abordados de uma série para outra. Na
primeira coleção, denominada Escola Moderna, na última unidade, constam temas que
abrangem ecologia e saúde, não acontecendo na segunda coleção analisada.
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FONTES
ENS, W. ; LAGO, S.R. Ciências: escola moderna. (A Terra). São Paulo: IBEP, s/d.
v.1.
ENS, W. ; LAGO, S. R. Ciências: escola moderna. (A energia). São Paulo: IBEP, s/d.
v.4.
REFERÊNCIAS
FRACALANZA, H; NETO J. M; HÖFLLING, E. M; LEÃO, I. A; AMORIM, A. C;
SERRÃO, S.M. O livro didático de Ciências no Brasil. Campinas: Editora Komedi,
2006.
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