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Curso de Licenciatura em Pedagogia e Teatro

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
Material de apoio

Profa. M.A. Marcia Souza Gerheim

Rio de Janeiro – RJ
2020 / 1
SUMÁRIO

Apresentação ......................................................................................... 03
1 A PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA ................................................................ 04
1.1 O SUJEITO: OBJETO DE ESTUDO DA PSICOLOGIA ......................................... 04
1.2 ÁREAS DA PSICOLOGIA: A PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO ................ 10
1.3 NEUROCIÊNCIA E DESENVOLVIMENTO HUMANO ....................................... 16
2 O CICLO DA VIDA HUMANA ..................................................................... 22
2.1 DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA PRIMEIRA INFÂNCIA ....................... 23
2.2 DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA SEGUNDA INFÂNCIA ...................... 27
2.3 DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA TERCEIRA INFÂNCIA ....................... 33
2.4 DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO DO ADOLESCENTE ................................ 44
2.5 DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO DO JOVEM E ADULTO .......................... 52
2.6 DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA TERCEIRA IDADE ............................. 53
REFERÊNCIAS ............................................................................................... 58

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Apresentação

Por meio da constituição deste material de apoio, buscamos propiciar o


desenvolvimento de conhecimentos a respeito das principais teorias do
desenvolvimento em consonância com as teorias da aprendizagem de maior
reconhecimento para o campo da educação.

A primeira parte desse material compila textos que levantam questões sobre o tema
da psicologia como ciência a fim de apresentar seus principais modos de conhecer o
sujeito, seu objeto de estudo.

A segunda parte desse material, intitulada O ciclo da vida humana, agrupa outros
textos e formula perguntas. Blocos temáticos abordam diversos elementos
característicos do desenvolvimento psicológico das chamadas primeira, segunda e
terceira infâncias; bem como, do adolescente, do jovem e do adulto, incluindo aqueles
que avançam na terceira idade.

Em síntese, ao propormos interrogar o estudante sobre os textos aqui compilados,


visamos promover o seu conhecimento sobre as principais abordagens, os elementos e
os fatores que são considerados para se caracterizar os processos de desenvolvimento
do sujeito humano.

Bons estudos!!!

Profa. Marcia Souza Gerheim

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1 A PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA

1.1 O SUJEITO: OBJETO DE ESTUDO DA PSICOLOGIA

QUESTÃO 1
Com fundamento no texto a seguir, apresente resumidamente as ideias de Piletti e
Rossato (2017, p. 207-211) sobre o que o estudo do desenvolvimento em relação ao
adulto envolve, segundo a abordagem histórico-cultural da psicologia humana.

[A] Psicologia histórico-cultural, ao tecer suas considerações acerca do


desenvolvimento, defende que este se constitui com a apropriação dos objetos da
cultura, nas e pelas relações estabelecidas com o mundo, com as pessoas, com o
desenvolvimento das forças produtivas, de que o sujeito social faz parte.
[O] ser humano, ao se relacionar com a realidade, busca aten-der às suas
necessidades de sobrevivência, bem como às postas naquela relação e o faz por meio
de uma atividade principal. Como vimos, no primeiro ano de vida da criança, a
atividade principal, pela qual ela se relaciona com o mundo e atende às suas
necessidades de sobrevivência física e psíquica, é a de comunicação emocional, ou
seja, a de contato emocional com o adulto. À medida que a criança vai alcançando
novas aquisições, novos aprendizados, estabelece formas cada vez mais com-plexas
de relação com o mundo. [...].
No entanto, a passagem de um estágio a outro, com o domínio de atividades
diferentes, ou seja, o desenvolvimento humano, não ocorre naturalmente com o
tempo, a partir de uma suposta natureza humana universalmente concebida e
destituída do complexo de relações constituídas histórica e culturalmente e das
condições concretas de vida. Como afirma Vygotski (1996), a periodização do
desenvolvimento não advém das mudanças verifi-cadas no corpo do sujeito ou por
indicadores externos do desenvolvimento, mas por passar a existir algo novo no
psiquismo (que é reequipado), proveniente das condições materiais, num processo de
mudanças revolucionárias, conflitos, retrocessos. Num processo ativo de adaptação.
No caso do adulto, devemos considerar que o seu psiquismo difere do da
criança, pelo processo de desenvolvimento percorrido até constituir-se em adulto, em
razão das experiências já vivenciadas, das atividades de estudo concretizadas ao longo

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dos anos, ou seja, da educação escolar, das relações estabelecidas com o outro, com a
cultura, da metamorfose da criança em adulto, determinadas a partir de um modo
particular de vivência em con-dições concretas de vida históricas e sociais. Como
aponta a professora e doutora em Psicologia Graziela Lucchesi da Silva (2011: 256),
fundamentada em Vigotski, é o "mundo criado pelo trabalho e pela luta de
inumeráveis gerações humanas que fornece ao homem o que ele possui de
verdadeiramente humano mediante o processo de apropriação efetivada no curso do
desenvolvimento de relações reais do sujeito com o mundo".
Quando se trata do adulto, o meio pelo qual este se desenvolve, ou seja, a
atividade principal que domina neste período da vida é o trabalho, considerada como
vital. [...].
Entretanto, como afirma Miranda (1999), as condições concretas pelas quais o
processo de desenvolvimento se efetiva não garantem que o adulto seja, de fato, um
homem pleno e pronto para assumir a condição de sujeito. As objetivações do sujeito,
seu trabalho, podem não significar para ele possibilidades de constituição e
reconhecimento. O trabalho na sociedade capitalista de produção não se estabelece
para o trabalhador como uma forma de realização de suas capacidades e de suas
necessidades [...].
O indivíduo não se realiza, não se reconhece no seu trabalho e não obtém os
proventos necessários para o modelo de condição de vida, de consumismo exigidos,
para suprir as "suas" necessidades, então é culpabilizado por sua incapacidade, por
estar à margem do poder de consumo, de inserção social, de realização, toma-se um
"adulto problema". O adulto bem-sucedido seria então aquele que acumula bens
materiais, que corresponde aos prazos e objetivos a serem alcançados, como adulto
capaz, independente, estável. Com isso, o sentido de ser pode ser substituído pela
necessidade e valorização de possuir objetos, de ter, dando a falsa sensação de que
isso completaria o sujeito.
Referindo-se às possibilidades de apropriação das conquistas do
desenvolvimento humano, explica Leontiev (1978: 274-5) que elas não são acessíveis
a todos em razão "[...] da desigualdade econômica, da desigualdade de classes e da
diversidade consecutiva das suas relações com as aquisições que encarnam todas as
aptidões e faculdades da natureza humana, formadas no decurso de um processo

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sócio-histórico". Para ele, além da concentração da riqueza material, a classe
dominante concentra também a riqueza intelectual, limitando o acesso e a
apropriação das formas mais elevadas de produção humana, como a ciência, a arte, a
filosofia. [...].
Assim, as características do adulto estão relacionadas ao aprendizado à
apropriação da cultura constituída historicamente. Nesse aspecto, para a Psicologia
histórico-cultural, as condutas do homem e suas capacidades cognitivas estão
imbricadas com a sua história educativa, ocorrida em determinado contexto social e
histórico. Vygotski (2001) afirma que o sujeito, neste caso, o adulto, desenvolve sua
subjetividade e sua humanização num contexto educativo. Além disso, como afirmam
Vygotsky e Luria (1996), o adulto é produto do contexto social e histórico, de maneira
que sua essência encontra-se na essência das condições sociais. Desse modo, o intuito
de compreender o pensamento e o comportamento do adulto requer que sejam
contemplados e estudados como frutos de um longo e complexo processo do
desenvolvimento desde a criança, constituída sob determinadas condições sociais.
Com isso, deve-se levar em conta que o estudo do desenvolvimento "[...] coincide
com o estudo da pessoa concreta, imersa numa trama de relações sociais e num
sistema político e econômico, e outra coisa não é senão o estudo da história
objetivada particularmente em cada indivíduo" (Martins e Eidt, 2010: 682).

QUESTÃO 2
Com fundamento no texto de Piletti e Rossato (2017, p. 104-109), que nos apresenta
a infância como uma construção histórica, descreva a criança da sociedade
contemporânea em contraste com aquela da antiguidade.

Os sentidos e as relações estabelecidos com a infância são constituídos


historicamente, elaborados em diferentes tempos e lugares e combinados [à condição
social]. [A] criança, [é] um sujeito social e histórico, de direitos, que é constituído pela
sociedade, pelas riquezas da cultura, das mediações e que ativamente também é
sujeito na constituição da sociedade.
A ideia de criança como ser em crescimento, que necessita de cuidados, afeto,
proteção e orientação dos pais/adultos, no que tange aos aprendizados e
desenvolvimentos, é mais característica da sociedade contemporânea. Tal concepção

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repercute em pressão sobre os pais para vigiarem os processos de desenvolvimento
dos filhos, baseados em seus conhecimentos sobre aprendizagem e desenvolvimento,
mas, sobretudo, fundamentados em especialistas da infância, em "lugares formais" -
separados dos pais -, como as instituições escolares em geral.
Colin Heywood (2004), professor da História Social e Econômica na
Universidade de Nottinghan (Inglaterra), afirma que o deslumbramento pelos anos da
infância, como especiais e diferentes, em acordo com os estudos disponíveis, é
relativamente recente. [Na antiguidade,] as crianças eram apreciadas como adultos
imperfeitos, deficientes, [adultos em miniatura].
Os estudos clássicos do historiador francês Philippe de Ariès (1981) sobre a
história da família e infância indicam que em geral a criança não se constituía como
um valor na Idade Média (Europa Ocidental), não havia espaço para a infância ou o
sentimento em relação a ela ou ainda uma indistinção em relação ao adulto (não
havia o quarto da criança - como espaço específico -, não havia literatura
propriamente infantil, nas guerras não havia limite de idades, as roupas não se
diferenciavam das do adulto, sua representação pictográfica sinalizava um adulto em
miniatura) [...]. À medida que diminuiu a alta mortalidade infantil e há a possibilidade
de apego, bem como devido ao surgimento dos ideais de uma nova moral
fundamentada na necessidade de preservação da inocência conjeturada nesta fase da
vida (Ferreira e Araújo, 2009), os adultos vão deixando de ver a criança como adulto
em miniatura e institucionalizam-se lugares para ela (como as escolas, as classes
específicas em conformidade com a idade), lançando-a para o futuro. No século XIX, a
expectativa de um futuro adulto civilizado, trabalhador, demanda uma especificidade
de cuidados, como forma de prever e "garantir" o desenvolvimento das crianças.
Com a ideia de criança como "chave para o futuro" [...], tem-se grandes
investimentos "em sua educação com o objetivo de moldá-la e transformá-la no
adulto que cada um idealizava para a sua nação" (Rizzini, 2008: 98). Nessa linha, o
futuro do Estado dependia da forma como se educava uma criança; os católicos
defendiam, para tanto, que a escola deveria ser o centro do poder, mantendo a
criança sob vigilância. Aos adultos foi destinado um novo lugar: aqueles que deveriam
"conter as emoções em relação a ela, aplicar-lhes castigos e ensinamentos morais,

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acompanhar o seu desenvolvimento" (Veiga, 2010: 25). Além disso, foram submetidos
a fortes críticas quanto ao abandono de crianças e à necessidade em assumir suas
responsabilidades no cuidado delas.

QUESTÃO 3
Para Piletti e Rossato (2017, p. 104-109), a infância é uma construção histórica, uma
"invenção" cultural sujeita às forças socioeconômicas. Associe as ideias do texto à
imagem do outdoor em exposição na estação de metrô em Botafogo, no Rio de
Janeiro, em novembro 2019.

[Diante da] necessidade de maior qualificação das novas gerações, o estudo é


apontado como essencial e tem início cada vez mais cedo, pois significaria maior
chance de igualdade de oportunidades sociais. Em favor disso, as escolas são
reestruturadas e as ciências que têm como foco a criança prosperam, com indicações
de ações consideradas importantes aos seus processos de desenvolvimento e de
aprendizagem desde o nascimento, vislumbrando as futuras oportunidades de
trabalho, seu sucesso quando adulto. Assim, a Psicologia e as demais ciências que
objetivam o estudo da criança têm grande repercussão, na busca por decifrar essa
transitoriedade, essa etapa da vida. Lembremo-nos de que a infância está sujeita,
ainda que de modo particular, às mesmas forças sociais que os adultos.
Como defende Levin (2007: 19), na contemporaneidade, temos a diferença entre
criança e adulto marcada por uma concepção mercantil de infância, que consiste
numa "invenção cultural e socioeconômica que generaliza e ao mesmo tempo
especializa o status da criança". Com isso, consagram-se os especialistas em infância,
os objetos e brinquedos adequados às suas necessidades de desenvolvimento. Os
brinquedos são fabricados, a partir da década de 1930, como materiais didáticos (para
aprender e não necessariamente para brincar) e são propícios a executarem
determinadas atividades de acordo com a especificidade de cada idade: "[...] criança e
brinquedo são 'padronizados', determinando-se assim a universalização uniforme do
desenvolvimento infantil" (Levin, 2007: 24). Vemos na contemporaneidade, que se
dirige cada vez mais à infância vivenciada por crianças que "escolhem e sabem" o que
querem, um mercado específico de produtos para elas. É possível verificar isso nas
roupas, nos produtos de higiene, nos brinquedos que preenchem a dificuldade em

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dividir momentos lúdicos com o adulto - por seu escasso tempo e até mesmo pela
compreensão de que o jogo e a brincadeira são coisas do mundo infantil.
Em suma, a partir do século XIX, muitos cientistas e educadores passaram, numa
grande proporção, a debruçar-se sobre os estudos da infância, [evidenciando, ao
longo da história,] concepções diferentes das nossas, mas [nunca a] total ausência
delas.

QUESTÃO 4
Castro (1998, p 56-70) define a cultura do consumo e situa o lugar da criança e
do adolescente nesse contexto. Articule as ideias da autora ao anúncio
apresentado na questão anterior.

[O] estabelecimento [da] "cultura do consumo" [...] não só promoveu uma vertiginosa
expansão e diversificação de mercadorias e bens, como também instalou uma nova
compreensão a respeito do “mundo das coisas”. Estas passaram ao status de
veiculadoras de algum tipo de informação a respeito daqueles sujeitos que as
ostentam. Assim, de meros objetos, as coisas se tornam porta-vozes dos gostos, dos
interesses e dos valores subjetivos, de modo que se estabelece uma economia de

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bens simbólicos onde a demanda, a oferta, a monopolização e a distribuição destes
bens determina estilos de vida e a posição estrutural dos sujeitos e dos grupos nas
interações sociais. Consequentemente, grandes mudanças podem também ser
observadas no âmbito das identidades. De maneira geral, a base identitária, assim
como o sentido de reconhecimento social, dinamizavam-se a partir da posição do
sujeito na estrutura ocupacional determinada pela profissão ou ocupação, ou seja,
como cada um “ganha a vida”. Mesmo que estas orientações profissionais e
ocupacionais ainda sejam válidas para rastrear construções identitárias, o que é
importante observar é que, contemporaneamente, na cultura de consumo, o status
ocupacional torna-se um meio de atingir índices simbólicos de posição social através
de formas de consumo tais como a aquisição de bens e experiências. Neste sentido,
consumir, e o que consumir, adquirem uma importância decisiva para definir “quem é
quem” no mundo social.
A cultura do consumo, enquanto rótulo genérico para os processos
econômicos e culturais emergentes nas formações sociais da contemporaneidade
neste final de século, fundamenta-se em práticas sociais relacionadas não somente ao
ato de adquirir bens, mercadorias e experiências, como também à criação e
perpetuação de desejos em relação ao que não se tem. Neste sentido, a cultura de
consumo consiste, sobretudo, num componente ideológico que se articula à condição
de que o desejo humano não se satisfaz jamais, sendo constantemente ativado pela
ausência de algo que nos falta. [...].
Na cultura contemporânea crianças e adolescentes deixaram seu lugar de
penumbra enquanto cidadãos de uma sociedade racionalizada e adulto-centrada em
favor de uma posição social notória definida pela acentuada oferta de bens e serviços
de que são objeto. Esta cena contemporânea rompe os limites estreitos que
delimitam o lugar da criança dentro do contexto educacional.
A cultura de consumo introduz uma outra forma de cidadania para crianças e
adolescentes, projetando-as no epicentro das trocas sociais, enquanto dinamizadoras
dos processos de circulação e consumo de bens e experiências.

1.2 ÁREAS DA PSICOLOGIA: A PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

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QUESTÃO 1
Monte um quadro com listando os elementos de cada domínio do desenvolvimento
tal como apresentado no texto de Martorell (2014, p. 20-27).

Os cientistas do desenvolvimento estudam três amplos domínios ou áreas do self -


físico, cognitivo e psicossocial - nos diferentes períodos de desenvolvimento. O
desenvolvimento físico inclui o crescimento do corpo e do cérebro, as capacidades
sensoriais, as habilidades motoras e a saúde. O desenvolvimento cognitivo envolve a
aprendizagem, a atenção, a memória, a linguagem, o pensamento, o raciocínio e a
criatividade. O desenvolvimento psicossocial abrange as emoções, a personalidade e
os relacionamentos sociais.

QUESTÃO 2
De acordo com Martorell (2014, p. 20-27), cientistas associam o desenvolvimento de
cada pessoal e de cada faixa faixa etária a elementos inatos (hereditários e
maturacionais) e fatores ambientais (adquiridos com as experiências de vida). Liste
os elementos e fatores citados pela autora.

Os cientistas encontraram formas de medir as contribuições da hereditariedade, ou


natureza, e do ambiente, ou educação, para o desenvolvimento de traços específicos
em uma população. Por exemplo, ainda que a hereditariedade afete fortemente a
inteligência, fatores ambientais - tais como estimulação parental, educação e
influências dos pares - também a afetam. Teóricos e pesquisadores contemporâneos
estão cada vez mais interessados em explicar como natureza e criação operam juntas
em vez de discutir sobre qual fator é mais importante.
Muitas mudanças típicas da primeira infância, tais como o aparecimento da
capacidade de andar e falar, estão atreladas à maturação do corpo e do cérebro - o
desdobramento de uma sequência natural universal de mudanças físicas e padrões de
comportamento. Esses processos maturacionais que são observados mais claramente
nos primeiros anos de vida ocorrem em harmonia com as influências da
hereditariedade e do ambiente. À medida que as crianças tornam-se adolescentes e
adultos, as diferenças individuais nas características pessoais inatas (hereditariedade)
e na experiência de vida (ambiente) desempenham um papel crescente durante sua
adaptação às condições internas e externas.

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QUESTÃO 3
Quais são os exemplos para os conceitos de fator de desequilíbrio, mecanismo de
assimilação e de assimilação os quais Martorell (2014, p. 20-27) apresenta ao
discorrer sobre a teoria dos estágios cognitivos de Piaget?

Quando se pensa em desenvolvimento humano, Piaget é considerado um dos teóricos


que mais se difundiu e tornou-se conhecido, trazendo à baila uma teoria de dupla
perspectiva: estruturalista e genética (Quadros, 2009). Além disso, debruçou-se sobre
a investigação empírica, considerada uma das maiores realizadas sobre o
desenvolvimento humano, sintetizadas em seus mais de setenta livros (Oliva, 2004).
Em suas teses, busca explicar como se dá o processo de aquisição do
conhecimento, ou seja, como se dá o desenvolvimento cognitivo. Explica que a gênese
do conhecimento encontra-se no próprio sujeito, o pensamento lógico, pois se
constitui na interação homem/objeto. Entende, pois, o desenvolvimento como a
busca de um equilíbrio superior, como um processo de equilibração constante. Nesse
processo, vão surgindo novas estruturas, novas formas de conhecimento, mas as
funções de desenvol-vimento permanecem as mesmas. Da criança ao adulto,
modificam-se as formas de conhecimento do mundo, as formas de organização da
atividade mental, mas permanecem as mesmas funções. Quais são essas funções? O
homem pensa e age para satisfazer uma necessidade, para superar um desequilíbrio,
para adaptar-se às novas situações do mundo que o cerca.
A professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Angela Donato Oliva (2004), esclarece
que Piaget defende que a aprendizagem deriva do desenvolvimento, processo esse
que implica, a priori, uma longa construção de estruturas cognitivas, as quais são
possibilitadas pelas ações dos sujeitos. No entanto, o bebê ao nascer é possuidor de
algumas estruturas de natureza reflexa, condição necessária para a construção de
esquemas e estruturas possibilitadores e limitadores de novas ações. A ação sobre o
meio é fundamental para as chamadas construções iniciais. Com o de-senvolvimento,
a criança passa a agir segundo regras, estratégias, planos e outras construções
mentais.
Piaget concebe estágios/períodos de desenvolvimento cognitivo compreendidos

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por quatro fases de transição, nas quais a criança desen-volve determinadas
estruturas cognitivas, que podem ser notadas pelas mudanças verificadas em seu
comportamento. O desenvolvimento avança a partir do que foi construído em
estágios anteriores, e as mudanças produzidas envolvem o início de outro período de
desenvolvimento.
Piaget explica a existência de mecanismos funcionais comuns a todos os estágios,
como o de que toda ação (pensamento, sentimento) é regida por uma necessidade.
Desse modo, agimos movidos por motivos, por necessidades, que revelam a
existência de um desequilíbrio, em razão das transformações ocorridas interna e
externamente ao indivíduo, sendo preciso um reajustamento da conduta, em que
"[...] cada nova conduta vai funcionar não só para restabelecer o equilíbrio, como
também para tender a um equilíbrio mais estável que o do estágio anterior a esta
per-turbação" (Piaget, 2007: 16).
O desenvolvimento segue uma linha que caminha de um estado de menor
equilíbrio para um de maior equilíbrio. Esse movimento se rei-nicia, ou seja, nossa
ação é desequilibrada pelas transformações que se sucedem (colocadas, por exemplo,
pela necessidade de fome, por uma exigência externa, como a de aprender a falar),
requisitando um novo equilíbrio. Essa tendência à busca de equilíbrio, ou seja, de
adaptação ao ambiente, ocorre continuamente, por meio da ação humana.
Assim, diante das necessidades postas, o sujeito reage e faz uso dos
mecanismos de assimilação, em que aplica sua experiência anterior atribuindo
significações às estruturas que já possui, sem alterá-las. Situações e objetos são
assimilados quando se puder responder a eles com as experiências, os conhecimentos
e aprendizagens prévios. Assim, por exemplo, diante da tarefa de tomar o leite em
uma xícara, o bebê vai utilizar-se de sua experiência de sucção do peito materno, da
mamadeira. No entanto, na medida em que lhe é oferecido um alimento em uma
colher, inicialmente irá utilizar-se da estrutura, da experiência que possui e tentará
sugar este alimento. Mas com a exigência para além de sucção, numa situação nova,
como a de mastigação, o bebê precisa de novas estruturas, da realização de outros
movimentos com a boca, de novas estratégias para alimentar-se. Temos, com isso, um
processo de acomoda-ção. Portanto, com as novas situações e exigências colocadas

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ao sujeito poderá ocorrer um processo de modificação das estruturas existentes, de
criação de novas ou, ainda, a combinação de antigas a fim de responder aos desafios
postos.
[A] partir das estruturas biológicas da criança e de suas ações sobre o meio, ela
gradativa e sequencialmente constrói suas estruturas cognitivas, numa organização
cada vez mais complexa, criando e recriando--as de maneira que a partir de estágios
anteriores se constituam os novos.

QUESTÃO 4
De acordo com Martorell (2014, p. 20-27), a Teoria dos estágios cognitivos de Jean
Piaget define a organização, a adaptação e a equilibração como os três processos
básicos para o desenvolvimento cognitivo. Descreva resumidamente de que modo a
autora os define.
Nossas compreensões de como as crianças pensam se deve muito ao trabalho do
teórico suíço Jean Piaget (1896-1980). Piaget, formado em biologia e filosofia, via o
desenvolvimento como o produto dos esforços ativos das crianças para compreender
e agir em seu mundo.
Piaget sugeriu que quando o desenvolvimento cognitivo começa, ele
inicialmente se baseia em atividades motoras, tais como os reflexos. Ao buscar um
mamilo, sentir a superfície ou explorar os limites de um cômodo, as crianças
pequenas primeiro aprendem a controlar e refinar seus movimentos e, então, a
explorar o mundo com seus corpos. Desse modo, elas desenvolvem uma
compreensão mais precisa de seu ambiente e mais competência para lidar com ele.
Esse crescimento cognitivo ocorre mediante três processos interligados: organização,
adaptação e equilibração.
Organização é a tendência a criar categorias, tais como pássa-ros, observando
as características que membros individuais de uma categoria, como pardais e
cardeais, têm em comum. Segundo Piaget, as pessoas criam estru-turas cognitivas
cada vez mais complexas chamadas de esquemas ou modos de organizar
in-formações sobre o mundo. Esses esquemas podem ser de natureza mental ou
motora. Consideremos, por exemplo, o sugar. Um bebê recém-nascido tem um
esquema simples para sugar, mas em breve desenvolve variados esquemas de como
sugar no seio, na mamadei-ra ou o polegar. O bebê pode ter que abrir mais a boca,

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virar a cabeça para o lado ou sugar com intensidade variável.
Adaptação é o termo de Piaget para como as crian-ças lidam com novas
informações à luz do que já sabem. A adaptação ocorre mediante dois processos
complemen-tares: (1) assimilação, captar nova informação e incorporá--la às
estruturas cognitivas já existentes, e (2) acomodação, adequar as estruturas
cognitivas para que se ajustem à nova informação.
A equilibração - um constante esforço por um equilíbrio estável - motiva a
conversão da assimilação para a aco-modação. Por exemplo, uma criança sabe o que
são pássaros e vê um avião pela primeira vez. A criança rotula o avião de "pássaro"
(assimilação). Com o tempo, a criança nota a diferença entre aviões e pássaros, o que
a deixa ligeiramente inquieta (desequilíbrio) e a motiva a mudar seu entendimento
(acomodação) e dar um novo rótulo para o avião. Ela, então, está em equilíbrio. Ao
longo da vida, a busca de equilíbrio é a força impulsora por trás do crescimento
cognitivo.
Piaget relatou a ocorrência do desenvolvimento cognitivo em quatro estágios
qualitativos. Em cada estágio, a mente de uma criança desenvolve um novo modo de
operar. Desde o nascimento até a adolescência, as operações mentais evoluem do
aprendizado com base em atividade sensorial e motora simples para o pensamento
lógico e abstrato. Uma implicação dessa visão é que as mentes das crianças não são
mentes adultas em miniaturas. Elas fundamentalmente pensam de maneira diferente
dos adultos.

QUESTÃO 5
Com fundamento em Martorell (2014, p. 20-27), descreva resumidamente a Teoria
sociocultural de Lev Vygotsky.

O psicólogo russo Lev Semyonovich Vygotsky (1896-1934) concentrou-se nos


processos sociais e culturais que orientam o desempenho cognitivo das crianças.
Vygotsky via o crescimento cognitivo como um processo colaborativo. As crianças,
segundo ele, aprendem por meio da interação social e de atividades compartilhadas.
Mais do que acreditar em aspectos universais do desenvolvimento, Vygotsky
acreditava que há tantas formas de se desenvolver quanto existem culturas diferentes

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e experiências distintas.
Segundo Vygotsky, adultos ou pares mais avançados devem ajudar a dirigir e
organizar o aprendizado de uma criança. Essa orientação é mais eficaz para ajudar as
crianças a atravessarem a zona de desenvolvimento proximal (ZDP), o espaço
psicológico imaginário entre o que as crianças são capazes de fazer e o que poderiam
realizar com o auxílio de outra pessoa. No decorrer do tempo, à medida que as
habilidades de uma criança aumentam, a responsabilidade pelo direcionamento e
monitoramento da aprendizagem gradualmente passa do adulto para a criança - por
exemplo, quando um adulto ensina uma criança a flutuar, o adulto primeiramente
apoia a criança na água e depois a solta de forma gradual à proporção que o corpo
relaxe em uma posição horizontal. Esse apoio temporário que país, professores ou
outros dão à criança é conhecido como provisão de andaimes.

1.3 NEUROCIÊNCIA E DESENVOLVIMENTO HUMANO

QUESTÃO 1
Descreva os exemplos utilizados por Martorell (2014, p. 58-60) para descrever a
interação genótipo-ambiente.

Interação genótipo-ambiente em geral refere-se aos efeitos de condições ambientais


semelhantes em indivíduos geneticamente diferentes. Uma discussão dessas
interações é um modo de conceitualizar e conversar sobre as diferentes formas pelas
quais natureza e criação interagem. Para citar um exemplo familiar, muitas crianças
são expostas ao pólen e à poeira, mas aquelas com uma predisposição genética são
mais propensas a desenvolver reações alérgicas. Interações também podem ocorrer
no sentido inverso: crianças geneticamente semelhantes muitas vezes se
desenvolvem de maneira diferente dependendo de seus ambientes domésticos
(Collins, Maccoby, Steinberg, Hetherington e Bomstein, 2000). Uma criança nascida
com um temperamento difícil pode desenvolver problemas de adaptação em uma
família e prosperar em outra, dependendo de como os pais respondem à criança.
Assim, é a interação de fatores hereditários e ambientais, não apenas um ou outro,
que produz determinados resultados. Na realidade, existem múltiplas maneiras em

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que diferenças individuais - guiadas pela genética - e o ambiente interagem para
produzir resultados.

QUESTÃO 2
De acordo com Martorell (2014, p. 58-60), o que possibilita que irmãos sejam
diferentes?

Você poderia presumir que irmãos, por compartilharem aproximadamente 50% de


seus genes, poderiam ser bem semelhantes uns aos outros. Contudo, irmãos podem
diferir muito em intelecto e, sobretudo em personalidade, e essa diferença aumenta
com a idade (Plomin e Daniels, 2011). Uma razão podem ser as diferenças genéticas,
as quais levam as crianças a necessitar de diferentes tipos de estimulação ou a
responder de maneira distinta a um mesmo ambiente doméstico, e assim a
desenvolverem-se por caminhos cada vez mais divergentes. Por exemplo, estudos
realizados com gêmeos identificaram que diferenças genéticas entre im1ãos
determinam em parte como o conflito familiar é experimentado (Horwitz et al., 2010).
Além disso, existem também efeitos ambientais não compartilhados que resultam do
ambiente único em que cresce cada criança em uma família. Crianças em uma mesma
família têm um ambiente compartilhado - o lar em que vivem, as pessoas nele e as
atividades conjuntas em que a família se envolve - mas, mesmo que sejam gêmeas,
elas passam por experiências que seus irmãos e irmãs não compartilham. Pais e
irmãos podem tratar cada criança de uma maneira diferente; um primogênito recebe
atenção exclusiva, mas os nascidos posteriormente devem competir por ela. Alguns
eventos, tais como doenças e acidentes, e experiências fora do lar afetam uma criança
e não outra. Na verdade, alguns pesquisadores concluíram que, embora a
hereditariedade seja responsável pela maioria das semelhanças entre irmãos, o
ambiente não compartilhado é responsável pela maioria das diferenças (Plomin,
2004). Entretanto, outros pesquisadores apontam para a conclusão mais moderada
de que efeitos ambientais não compartilhados não sobrepujam grandemente os
compartilhados; em vez disso, parece haver um equilíbrio entre os dois (Rutter, 2002).

QUESTÃO 3

17
Com fundamento no texto de Martorell (2014, p. 58-60), o que é temperamento e
como ele se diferencia da personalidade?

O temperamento é um modo característico de responder ao ambiente, que é visível


desde a primeira infância, e um precursor da personalidade. Ele parece ser em grande
medida inato e muitas vezes constante no decorrer dos anos (Thomas e Chess, 1984).
Irmãos tendem a ser semelhantes em temperamento (Saudino, Wertz, Gagne e
Chawla, 2004). Um estudo observacional realizado com 294 pares de gêmeos (cerca
de metade de monozigóticos e metade dizigóticos) constatou influências genéticas
significativas em regulação de comportamento, atividade, sociabilidade e emotividade
(Gagne e Sandino, 2010; Schmirz, Sandino, Plomin, Fulker e DeFries, 1996).
Cientistas identificaram genes diretamente ligados a aspectos específicos da
personalidade, tais como um traço denominado neuroticismo, o qual contribui para
depressão e ansiedade (Lesch et al., 1996). A herdabilidade de traços da
personalidade parece situar-se entre 40 e 50%, e existe pouca evidência de influência
ambiental compartilhada (Bouchard, 2004).

QUESTÃO 4
Para PILETTI e ROSSATO (2017, p. 83-92), a neuropsicologia do desenvolvimento
busca compreender relações entre o comportamento humano e os fundamentos
(biológicos e psico-lógicos) pela observação de funções superiores da mente tais
como: linguagem, memória e atenção. Para caracterizar cada uma dessas funções,
descreva resumidamente os elementos apresentados pelos autores.

As pesquisas sobre a linguagem, com destaque para os estudos sobre a afasia do


francês Paul Broca, tomaram esta função superior um assunto hegemônico entre os
neurologistas, a ponto de se destacarem quanto à formação da Neuropsicologia.
Para o médico, professor e diretor do Instituto de Ciências da Saúde da
Universidade Católica Portuguesa, de Lisboa, Alexandre Castro-Caldas (2004: 166),
mesmo antes da expansão da Neuropsicologia, a análise sobre a linguagem teve um
"papel de relevo" para a Psicologia clássica e para os diversos ramos da Psicologia,
constituindo-se em um tema sempre dominante "na história dos eventos que

18
conduziram o nosso conhecimento até as neurociências da cognição dos nossos dias".
Ainda, para o mesmo autor, em um estudo sobre Neuropsicologia da
linguagem, o interesse em se compreender a linguagem está no fato de, por um lado,
permitir a comunicação interpessoal e, por outro, por se relacionar "com atos do
pensamento" (2004: 165); função que nos torna aptos a "fazer operações mentais de
metarrepresentações simbólicas sobre o universo". Nesse sentido, para Ana Luiza
Navas, doutora em Psicologia Experimental e professora do curso de Fonoaudiologia
da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (2005: 93): "O uso da
linguagem é um comportamento unicamente humano; é o que nos distingue dos
demais seres vivos."
A memória
Os autores Mello e Xavier (2005), Orlando Amodeo Bueno, doutor em Neurociências e
coordenador do Centro Paulista de Neuropsicologia da Escola Paulista de Medicina
(Unifesp), e Maria Gabriela Menezes Oli-veira, doutora em Neurociências e professora
de Psicobiologia da Unifesp (2004), descrevem vários tipos de memória, tais como:
Memória primária: posteriormente chamada de memória de curto prazo ou de
memória imediata. Tem pouca capacidade de armazenamento de informações e as
guarda por pouco tempo a fim de serem utilizadas, descartadas ou organizadas para
serem armazenadas.
Memória secundária: posteriormente chamada de memória de longo prazo ou
duradoura. Ela se forma quando as informações são armazenadas por tempo
ilimitado.
Memória operacional ou memória de trabalho: corresponderia e substituiria o
conceito de memória de curto prazo por ser "responsável pelo armazenamento de
curto prazo e pela manipulação "on-line" da informação necessária para as funções
cognitivas superiores, como linguagem, planejamento e solução de problemas (Cohen
et al., 1997)" (Bueno e Oliveira, 2004: 138-9). A informação tende a ser descartada
após o uso. Por exemplo: "a memorização temporária de um número de telefone"
(Mello e Xavier, 2005: 108).
Memória emocional: refere-se a acontecimentos carregados de uma carga emotiva,
que são mais bem lembrados que outros (Bueno e Oliveira, 2004: 150).

19
Memória episódica: registra informações que dizem respeito à história pessoal, sobre
acontecimentos específicos ou "individualmente vivenciados" (Mello e Xavier, 2005:
107).
Memória semântica: "corresponderia ao armazenamento de informações relativas
aos conhecimentos gerais, incluindo conceitos, significados de palavras e fatos
socialmente compartilhados"; não possui um contexto espacial ou temporal
específico (Mello e Xavier, 2005: 107).
Memória declarativa, consciente ou explícita: configura-se quando "a pessoa tem
acesso consciente ao conteúdo da informação e pode, assim, declará-la" (Mello e
Xavier, 2005: 107).
Memória não declarativa, inconsciente ou implícita: envolve o desempenho de
atividades previamente treinadas, tais como: teclar um computador, andar de
bicicleta, caminhar etc. (Mello e Xavier, 2005: 107). Também pode ser chamada de
memória de procedimentos (Chaves, 1993).
A atenção
A atenção é a capacidade de se concentrar, direcionando a consciência de modo a
selecionar determinado evento ou objeto. Esse direcionamento pode se dar por um
período curto ou longo. De acordo com a bióloga, professora e escritora Tatiana
Rodrigues Nahas e com o professor de Neurofisiologia do Instituto de Biociências da
USP Gilberto Fernando Xavier (2005: 46), a "atenção corresponde a um conjunto de
processos que leva à seleção ou priorização no processamento de certas categorias de
informação; isto é, 'atenção' é o termo pelo qual se refere aos mecanismos pelos
quais se dá a seleção".

QUESTÃO 5
De acordo com Pilleti e Rossato (2017, p. 83-92), após Gardner demonstrar que a
inteligência é um potencial não se pode mais afirmar que a pessoa inteligente é
aquela capaz de se destacar em qualquer atividade já que existem sete tipos de
inteligência. Descreva resumidamente os elementos apresentados no texto para
caracterizar cada uma delas.

Gardner é considerado um dos "demolidores" da teoria dos Quo-cientes de


Inteligência (Qis) (Fanelli, 2007), que medem a inteligência das pessoas a partir de

20
testes específicos da psicometria clássica, desen-volvidos inicialmente por Alfred Binet
(1857-1911), psicólogo francês.
A psicometria clássica "media, basicamente, a capacidade de dominar o
raciocínio que hoje se conhece como lógico-matemático, mas durante muito tempo
foi tomado como padrão para aferir se as crianças correspon-diam ao desempenho
escolar esperado para a idade delas" (Ferrari, 2012). Para Gardner a visão tradicional a
respeito da inteligência, que prevalece há centenas de anos, sustenta que em nosso
cérebro existe um único computador, de capacidade muito geral. Quando funciona
bem, a pessoa é inteligente e capaz de destacar-se em qualquer atividade. Se o
desempenho for apenas razoável, o portador consegue resultado satisfatório em
diversas circunstâncias. Mas se funcionar mal, o dono desse equipamento é um tolo,
incapaz de estabelecer relações coerentes (apud Fanelli, 2007).
Gardner discorda disto, acreditando que a "relação cérebro-mente pode ser
descrita como um conjunto de [...] sistemas distintos de elaborações fundamentais".
Nesse caso, "um deles pode atuar muito bem enquanto outro apresenta rendimento
mediano e um terceiro funciona mal" (apud Fanelli, 2007).
Acerca desse conjunto de sistemas distintos, Gardner (1995: 15), durante suas
pesquisas sobre a natureza do potencial humano, descobriu inicialmente a existência
de sete tipos de inteligência, também descritas como categorias de capacidade ou
competências intelectuais humanas. São elas:
l. Inteligência linguística: "é a habilidade de aprender idiomas e de usar a fala e a
escrita para atingir objetivos" (Ferrari, 2012), possivelmente "exibida em sua forma
mais completa" pelos poetas (Gardner, 1995: 14). Os poetas, segundo Gardner (1994:
57-61), são dotados de uma sensibilidade ímpar e se guiam por uma lógica tão austera
quanto a dos dentistas aplicada à área da Semântica (capacidade de preservar os
significados e nuances das palavras), da Fonologia (habilidade de preservar os sons e
ritmos das palavras tomando o discurso algo belo), da Sintaxe (capacidade de seguir
regras gramaticais ou de violá-las a seu bel-prazer), aplicadas às diferentes funções da
linguagem: entusiasmar, convencer, estimular, informar ou agradar.
2. Inteligência lógico-matemática: "é a capacidade de realizar ope-rações numéricas e
de fazer deduções" (Ferrari, 2012).

21
3. Inteligência espacial: "é a capacidade de formar um modelo mental de um mundo
espacial e de ser capaz de manobrar e operar utilizando esse modelo", mais
desenvolvida "em marinheiros, en-genheiros, cirurgiões, escultores e pintores"
(Gardner, 1995: 15).
4. Inteligência musical: "é a aptidão para tocar, apreciar e compor padrões musicais"
(Ferrari, 2012).
5. Inteligência corporal-cinestésica: "é a capacidade de resolver problemas ou de
elaborar produtos utilizando o corpo inteiro, ou partes do corpo", mais comum ou
altamente desenvolvida em "dançarinos, atletas, cirurgiões e artistas" (Gardner, 1995:
15).
Por fim, Gardner aponta para a existência de duas formas de inteligência
pessoais (Gardner, 1995: 15):
6. A inteligência interpessoal, definida como a "capacidade de com-preender outras
pessoas: o que as motiva, como elas trabalham, como trabalhar cooperativamente
com elas", mais desenvolvida em "vendedores, políticos, professores, clínicos
(terapeutas) e líderes-religiosos"; e,
7. A inteligência intrapessoal, que "é uma capacidade correlativa, voltada para dentro.
É a capacidade de formar um modelo acurado e verídico de si mesmo e de utilizar
esse modelo para operar efetivamente na vida".

O CICLO DA VIDA HUMANA

QUESTÃO 1
Com fundamento no texto de Pilleti e Rossato (2017, p. 117-120) cite quais fatores
exercem influência no desenvolvimento do psiquismo humano segundo a
perspectiva de Vigotski ou da psicologia histórico-cultural.

Vigotski (2001) focaliza o homem como um ser social, histórica, cultural e


economicamente constituído nas interações que estabelece com a sua realidade
social. Prioriza e valoriza o acesso à cultura como determinante para o
desenvolvimento, numa primazia do princípio social sobre o princípio natural-
biológico. Para além de uma visão calcada na natureza humana, vê no homem um ser
com características construídas pelo tempo, pela sociedade e pelas relações [e pelas]

22
influências de seu tempo histórico, que contempla também as gerações passadas.
Nessa perspectiva, o psiquismo humano se desenvolve por meio da atividade
social, é resultante da interação do indivíduo com o mundo, mediado por objetos
construídos pelos sujeitos humanos, numa apro-priação da realidade. Como esclarece
Leontiev (1978: 282), o homem não nasce com as aquisições históricas da
humanidade, desenvolvidas ao longo das gerações, "não são incorporadas nem nele,
nem nas suas disposições naturais, mas no mundo que o rodeia, nas grandes obras da
cultura humana. Só se apropriando delas no decurso da sua vida que ele adquire
propriedades e faculdades verdadeiramente humanas". E assim o faz, na sua relação
com o outro, com o mundo, mediados pela linguagem. Em suma, Vigotski, ao explicar
o processo de desenvolvimento humano, considera a existência de uma linha
biológica e de uma linha histórica, linhas que caminham de modo a entrelaçarem-se
"dialeticamente no processo de desenvolvimento, formando uma unidade no
processo de humanização, ou seja, o aspecto biológico é o ponto de partida do
desenvolvimento humano, mas se altera no decorrer do processo de apropriação da
cultura pelo sujeito" (Asbhar e Nascimento, 2013: 420).
Assim, inicialmente (linha de desenvolvimento biológica), a criança se
relaciona com o mundo a partir de seus comportamentos mais reflexos, espontâneos,
sobre os quais não exerce ainda controle, planejamento, ou mesmo consciência.
Todavia, à medida que se relaciona socialmente com o mundo, com parceiros mais
experientes, e se apropria da experiência humana criada e acumulada ao longo da
história (por conta do trabalho, das atividades humanas) e incorporada aos objetos da
cultura material e intelectual, interaliza e desenvolve as funções tipicamente humanas
(fala, pensamento, imaginação, memória etc.), aprende a utilizar tais objetos, ou seja,
se apropria das funções para as quais foram criados. Nesse processo, desenvolvem-se
(não linearmente ou gradativamente) novas condutas, novos níveis de compreensão
da realidade, sua inteligência, sua personalidade. Nesse aspecto, destacamos ainda o
papel primordial da comunicação, da linguagem, pois a qualidade da comunicação da
criança com outros homens pode determinar de modo mais direto a qualidade do seu
desenvolvimento.

DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA PRIMEIRA INFÂNCIA

23
QUESTÃO 1
Cite os principais elementos que Pilleti e Rossato (2017, p. 117-120) descrevem para
caracterizar o desenvolvimento da criança na primeira infância de acordo com o
entendimento de Vigotski ou da psicologia histórico-cultural.

Em linhas gerais, Vygotski (2000) explica que no desenvolvi-mento cultural da criança,


em princípio, o recém-nascido possui estruturas primitivas, determinadas pelas
peculiaridades biológicas de sua psique, e, à medida que estas primeiras estruturas se
desenvolvem em contato com a cultura, surgem outras, constituindo-se em novas
relações e em estruturas superiores com a destruição e reorganização das primitivas.
Os chamados comportamentos naturais (promovidos pelas estruturas primitivas)
verificados no recém-nascido, em que encontramos os reflexos incondicionados,
exemplificados em sua capacidade de chorar, sugar, balbuciar, são ainda insuficientes
para a sua adaptação às novas situações da vida. Os órgãos de percepção, por
exemplo, ainda não funcionam para ele, pois não existe um mundo de coisas
habitualmente percebidas. As suas sensações primitivas iniciais se dão pela boca, seu
elo com o mundo, haja vista que possui sensações orgânicas restritas ao corpo. Essas
estruturas primitivas, os princípios orgânicos de existência, com a revolução do
desenvolvimento, começam a ser substituídas pelo princípio da realidade externa,
pelo mundo social. O sujeito transforma-se, no sentido de que a natureza psíquica
representa o conjunto de relações sociais, passadas do externo para o interno. [...].
Assim, inicialmente, encontramos nos bebês a falta de condições de satisfazer
suas necessidades básicas de sobrevivência, característica desse período inicial de
desenvolvimento que envolve o primeiro mês. A vida do bebê "[...] fundamenta-se na
separação do bebê do organismo da mãe, convertendo sua existência em individual, e
caracteriza-se pela fusão de sensação e afeto, indistinção de objetos sociais e físicos,
passividade e ausência de vivência social" (Pasqualini, 2009: 36).
A comunicação social, atividade principal/dominante do bebê, ocorre à
medida que ele e as pessoas ao seu redor se relacionam, es-tabelecendo uma forma
de comunicação emocional/social, pelo olhar, pelo movimento corporal, e se constitui
na principal possibilidade de inserção na sociedade até mais ou menos completar o

24
seu primeiro ano de vida. Com isso, nas suas relações com o adulto, utiliza-se do
recurso do choro para demonstrar as sensações dolorosas, incômodos que está
tendo, e também do sorriso, para expressar a satisfação. As necessidades e até
mesmo possibilidades iniciais obrigam o bebê a manter uma comunicação e
socialização máxima com o adulto, com suas ínfimas possibilidades de comunicação.

QUESTÃO 2
Martorell (2014, p. 146-148) demonstra que, para Vigotski, o desenvolvimento é um
processo psicossocial que resulta do entrelaçamento das relações sociais, do
temperamento e do modo único que cada um tem de sentir emoções. Descreva
sucintamente de que modo os autores definem o temperamento e as emoções.

O recém-nascido Zev foi um bebê feliz. Ele chorava pouco, dormia em horários
relativamente regulares e passava grande parte do tempo tranquilo, observando o
mundo com seus grandes olhos castanho. Amigos e família comentavam sobre sua
tranquilidade perguntando aos pais como eles conseguiram moldar o comportamento
dele dessa forma. “Não moldamos” os pais respondiam, “ele parece ter nascido
assim”.
Ainda que os bebês compartilhem padrões de desenvolvimento, cada um,
desde o início, demonstra um modo relativamente consistente e previsível de
responder ao ambiente. Cada bebê tem seu próprio temperamento único. Um bebê
pode em geral ser alegre; outro, facilmente irritado. Uma criança pode brincar
alegremente com outras; outra prefere brincar sozinha. Esses modos característicos
de sentir, pensar e agir afetam a maneira como as crianças respondem aos outros e se
adaptam a seu mundo. A partir do primeiro ano de vida, o temperamento se
entrelaça com as relações sociais, combinação chamada de desenvolvimento
psicossocial. [...].
Emoções são reações subjetivas à experiência que estão associadas a
mudanças fisiológicas e comportamentais. O medo, por exemplo, é acompanhado por
aceleração dos batimentos cardíacos. [...] O desenvolvimento emocional segue um
cronograma [relativamente] padronizado que [se] inicia nos primeiros meses de vida.
Trata-se de um processo ordenado; emoções complexas desdobram-se de emoções
mais simples. As emoções também se tornam cada vez mais sociais e incluem as

25
emoções de autoconsciência, como vergonha e constrangimento.

QUESTÃO 3
Descreva alguns dos exemplos encontrados no texto de Martorell (2014, p. 146-148)
para demonstrar que crianças com menos de 2 anos são capazes de ter reações
empáticas e demonstrar altruísmo de modo espontâneo.

Um convidado do pai de Zev, então com 18 meses de idade – uma pessoa que Zev
jamais tinha visto - derrubou sua caneta no chão: ela rolou para baixo de um armário
onde o convidado não podia alcançá-la. Zev era suficientemente pequeno para
engatinhar sob o armário pegar a caneta e dá-la ao convidado. Ao agir por
preocupação com um estranho sem expectativa de recompensa, Zeg demonstrou
comportamento altruísta (Warneken e Tomasello, 2006).
As raízes do altruísmo podem ser vistas nas primeiras reações empáticas no
primeiro ano de vida. Por exemplo, bebês de 2 a 3 meses reagem às expressões
emocionais dos outros (Tomasello, 2007). Bebês de 6 meses valorizam alguém
conforme o modo como aquela pessoa trata os outros. Em uma série de experimentos
(Hamlin, Wynn e Bloom, 2007), bebês de 6 e 10 meses viram um personagem de
madeira ("o alpinista") tentar várias vezes subir uma colina. Às vezes, o alpinista era
auxiliado por um “ajudante”, que o empurrava por trás ou era empurrado para baixo
por um “estorvador”. Quando tiveram a escolha posteriormente, os bebês, em sua
maioria buscaram o ajudante. O comportamento altruísta parece desenvolver-se
naturalmente nas crianças pequenas. Bem antes do segundo aniversário, as crianças
com frequência ajudam os outros, dividem pertences e comida e oferecem conforto
(Warneken e Tomasello, 2007). A empatia parece igualmente desempenhar um papel:
em situações em que percebem que uma pessoa precisa de ajuda, crianças de 18
meses tendem a oferecê-la de modo espontâneo. Esse tipo de comportamento
aparece durante o segundo ano e aumenta com a idade (Eisenberg, 2000).

QUESTÃO 4
Em referência ao texto de Pilleti e Rossato (2017, p. 135-136), descreva
resumidamente de que modo Vygotski percebe que as relações da criança com
adultos e objetos da cultura oportunizam a substituição das atividades instintivas
iniciais do recém-nascido pela atividade intelectual intencional e ação organizada.

26
Com a contínua comunicação e relação com o adulto, em que este apresenta o
mundo de objetos à criança, fazendo uso de suas funções específicas, agindo com
eles, a comunicação emocional dá lugar a uma colaboração prática. Isso significa que,
por volta do final do primeiro ano, através da linguagem, a criança mantém contato
com o adulto, com o mundo ao seu redor e aprende a manusear os objetos colocados
à sua disposição, organizando a comunicação e a colaboração com os adultos
(Vygotski, 1996).
Esse processo, que envolve o desenvolvimento de um novo tipo de linguagem
com palavras, indica uma nova etapa no desenvolvimento, caracterizada pelo
surgimento de novas e significativas relações entre a criança, os adultos e os objetos.
A criança também começa a andar, o que amplia suas possibilidades de contato com o
mundo dos objetos e da descoberta de outros novos.
Assim, por volta dos 2 anos, a criança apresenta grande evolução da linguagem
e tem mais condições de compreender as funções simbó-licas, o que exige uma
operação intelectual consciente e mais complexa. Com o domínio crescente da
linguagem, compreende cada vez mais a ação socialmente elaborada com os objetos;
tem início a formação da consciência e a diferenciação do eu infantil (Facci, 2004).
A riqueza e a variedade de possibilidades de tateio e exploração dos objetos,
ainda que inicialmente sem se relacionar com a função social que têm para os adultos,
para o mundo da cultura, permitem a descoberta de características e propriedades
desses objetos, por meio do exercício da observação, da concentração, do
pensamento, da atenção, da memória, da fala, a relação com outras crianças com as
quais brinca, compartilha e disputa os objetos; permite maior comunicação com
outras crianças e com os adultos por ampliar as possibilidades de nominar objetos, de
conceituá-los, de interagir com eles. [Ao] longo do seu desenvolvimento cultural, a
criança se transforma, responde às necessidades postas e cria novas, de maneira a
adquirir habilidades propícias a fim de utilizar as ferramentas criadas pelo homem.
Inicialmente, por exemplo, a criança usa o objeto, como colher, o copo, de modo
indiferenciado (bate nos objetos com eles, produz sons, leva à boca, joga-os no chão)
e, posteriormente (mediados pelos adultos, por meio da fala, da ação), com o intuito
de conseguir o que deseja (levar a colher com comida e o copo de suco até a boca

27
para alimentar-se). Para a realização de uma ação organizada, é importante que as
atividades instintivas iniciais do recém-nascido sejam substituídas pela atividade
intelectual intencional, e, para isso, são fundamentais as oportunidades de relações
com adulto e com os objetos da cultura.

DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA SEGUNDA INFÂNCIA

QUESTÃO 1
Segundo Martorell (2014, p. 200-202), o desenvolvimento do autoconceito se dá na
medida em que as crianças compreendem como os outros a veem e se tornam
capazes de compreender e regular, ou controlar, os próprios sentimentos. Explique
porque a autora afirma que a autorregulação emocional é um avanço fundamental
na segunda infância.

"Quem sou eu no mundo? Ah, eis o grande quebra-cabeça", disse Alice, personagem
de Alice no País das Maravilhas, depois que seu tamanho mudou abruptamente -
outra vez. Resolver o quebra-cabeça de Alice é um processo vitalício de conhecer a si
mesmo. A compreensão de nós mesmos é informada pelo autoconceito, pela
autoestima e por nossa capacidade de compreender e regular as emoções. [O]
autoconceito é nosso quadro geral de nossas habilidades e traços que determina
como nos sentimos em relação a nós mesmos - quem nós pensamos que somos. É
uma construção cognitiva (Harter, 1996) que inclui representações do self. Ela
também tem um aspecto social que incorpora a crescente compreensão das crianças
de como os outros a veem. Por exemplo, uma criança que é cronicamente rejeitada
por outras pode formar um autoconceito de si mesma como desagradável. Durante a
segunda infância, o autoconceito se desenvolve por mudanças na auto definição e é
influenciado pela cultura. [...]
"Eu te odeio", Maya, de 5 anos, grita paro sua mãe. "Você não é uma boa
mãe!" Com raiva porque sua mãe a mandou para seu quarto por beliscar o irmão
bebê, Maya pensa que jamais voltará a amar sua mãe. "Você não tem vergonha de
fazer o bebê chorar?", pergunta o pai para Maya um pouco depois. Maya faz que sim
com a cabeça, mas apenas porque sabe a resposta que ele quer. Na verdade, ela
sente uma mistura de emoções – das quais pena de si mesma não é a menor.

28
A capacidade de compreender e regular, ou controlar, os próprios sentimentos
é um dos avanços fundamentais da segunda infância (Dennis, 2006). Crianças capazes
de compreender suas emoções podem controlar melhor o modo como elas as
mostram e ser sensíveis ao sentimento dos outros (Garner e Estep, 2001). A
autorregulação emocional ajuda as crianças a guiar seu comportamento (Eisenberg,
Fabes e Spinrard, 2006) e ajustar suas respostas para satisfazer expectativas da
sociedade.

QUESTÃO 2
Cite alguns elementos que Pilleti e Rossato (2017, p. 130-139) apresentam para
caracterizar os períodos sensório-motor (0 a 2 anos) e pré-operatório (2 a 7 anos) tal
como definidos por Piaget.

O grande avanço e diferencial [do período pré-operatório] em relação ao período


sensório-motor (0 a 2 anos) é o desenvolvimento da capacidade simbó-lica. Já o
sensório-motor se destacava pela dependência da criança de suas sensações, de seus
movimentos, de suas relações perceptivas com o mundo ao seu redor, com a
realização de imitações de respostas de início mais simples, para chegar ao final do
período com outras mais complexas, repetindo intencionalmente as ações que
produzem resultados específicos (puxar faz o brinquedo se mexer), com o
desenvolvimento do que Piaget denomina de inteligência sensório-motora.
No período pré-operatório, como dissemos, a criança utiliza-se da capa-cidade
simbólica, de maneira a substituir um objeto ou acontecimento por sua representação
mental, distinguindo um símbolo, uma imagem, uma palavra (significador) daquilo
que significam - o objeto ausente. Assim, pensa o am-biente, as situações ao redor
com a utilização de símbolos, representando-os por meio da linguagem verbal, da
imitação, do desenho, da dramatização etc.; pode representar brincando, em que um
galho seco se transforma numa varinha mágica, uma caixinha de fósforo num carrinho
e ainda utilizar-se de brinquedos, de objetos, para expressar seus desejos, suas
angústias. Com a possibilidade dessas ações, a criança cria, recria, faz de conta, dá
vida a seres inanimados, atribui características humanas a seres não humanos e
utiliza-se cada vez mais de um amplo vocabulário. A criança experimenta, portanto,
modificações qualitativas no desenvolvimento cognitivo.

29
Na acepção de Piaget (2007), com a aquisição da linguagem, a criança tem a
possibilidade de modificar suas ações, reconstruindo-as, expressando-as através de
suas narrativas, inclusive antecipando-as por via verbal. Além disso, enquanto a
criança brinca e faz outras atividades, fala sozinha em voz alta, utiliza-se de
monólogos como auxiliares da ação imediata.
A criança desse período apresenta um pensamento pré-operacional, com
comportamento egocêntrico, concebendo a existência de um mun-do a partir de sua
própria perspectiva, centrada em si mesma, em suas ideias, e apresenta dificuldade
em se colocar abstratamente no lugar do outro.

QUESTÃO 3
Com fundamento em Pilleti e Rossato (2017, p. 130-131), explique de que modo o
desenvolvimento da linguagem pode ter impacto positivo no desenvolvimento do
pensamento e capacidade de intercâmbio social.

A interação da criança com o entorno social - pessoas e objetos - cresce


qualitativamente com o desenvolvimento da linguagem, de sua capacidade de
simbolização, que permite se apropriar e intemalizar o mundo, nomeá-lo e
representá-lo de diferentes formas. As crianças intensificam sua expressão pela
linguagem oral, desenho, modelagem, dramatização, faz de conta, escrita, de maneira
a ampliar suas pos-sibilidades de se colocar, seu intercâmbio social. Com o domínio da
linguagem, a criança organiza e estrutura seu pensamento, ingressa no universo
simbólico da cultura, transformando qualitativamente a sua relação com o outro, com
os objetos, com a cultura e consigo mesma, participando ativamente desse processo e
constituindo uma forma social e peculiar de desenvolvimento psicológico. [...]. Boa
parte do que acontece, desde os 2 anos até aproximadamente os 7 anos, gira em
torno da linguagem, tais como as primeiras experiências de socialização, envolvendo a
interação com outras crianças, principalmente através do brinquedo, além de um
maior desenvolvimento do pensamento, o desenvolvimento afetivo, a apreensão das
regras e valores morais importantes para a convivência. Daí a importância de
estabelecer uma contínua e qualitativa comunicação com a criança, de maneira a
promover a apropriação da linguagem, e isso envolve não esperar que ela esteja

30
"pronta, apta" para falar. É fundamental falar com a criança, nomear os objetos ao
seu redor, os que ela toca, observa, os que estão próximos, distantes; nomear as
ações que a criança realiza, as que realizam com ela etc. Em suma, inscrevê-la no
mundo da linguagem, ajudá-la a compreender a importância em ouvir o que diz, em
ouvir o outro; dar-lhe oportunidade para expressar-se, para dizer o que pensa, o que
sente, como sujeito que é ativo nesse processo de aquisição da linguagem. [...]. A
linguagem acompanha a criança em sua atividade prática cotidiana e desempenha
papel importante ao auxiliá-la nessa prática, pois, enquanto age, ela também fala, de
maneira a nortear sua ação, ajudando-a a atingir seu objetivo. Assim, a fala é tão
importante e necessária quanto as mãos, os olhos, em sua apropriação do mundo de
objetos.

QUESTÃO 4
Para Pilleti e Rossato (2017, p. 130-131), as mudanças do mundo moderno e
contemporâneo demandam a máxima do desenvolvimento infantil desde muito
cedo. De que modo, segundo os autores, a escola e os especialistas da infância
atuam nessa direção?

As mudanças do mundo moderno e contemporâneo (econômicas, tecnológicas,


dentre outras), as necessidades de preparo para o futuro mercado de trabalho e, com
isso, cada vez mais cedo institucionalizar as crianças, a compreensão de que elas são
seres com capacidade (desde muito cedo) de desenvolvimento e de aprendizagem e a
organização de políticas de atendimento e de proteção à infância, essas são algumas
das questões que promoveram as crianças desse período ao status de seres com
grande potencialidade, da qual depende projetar-se um adulto "melhor ou não".
Assim, são programadas inúmeras atividades apoiadas por especialistas da infância, a
fim de promover ao máximo o seu desenvolvimento. A criança vai para a escola não
somente para ser cuidada, protegida, mas também para que sejam garantidas suas
possibilidades de socialização, de descoberta de si e do mundo, de se colocar no
mundo, de agir nele, como ser possuidor de necessidades próprias e com capacidade
para desenvolver novas. Desenvolve sua autonomia, a capacidade de planejamento
de suas ações, descobre o mundo dos objetos, explora-os, utiliza-os para além de sua
função própria.

31
QUESTÃO 5
Segundo Vigotski (2001) e de acordo com o texto de Pilleti e Rossato (2017, p. 130-
131), porque a linguagem como um sistema sim-bólico é importante?

[H]istoricamente a criança, de ser incapaz, passa a ser vista como possuidora de


condições de compreender o mundo que a cerca, de internalizá-lo, de representá-lo,
de atribuir-lhe sentido e de, em suas relações com a cultura, com o mundo simbólico,
com o mundo adulto, participar mais ativamente. [...].
De acordo com Vigotski (2001), a linguagem como um sistema sim-bólico tem
um papel primordial, pois a relação do ser humano com o mundo e consigo mesmo é
mediada por sistemas simbólicos. É através da fala e de outros sistemas simbólicos
elaborados, como a linguagem de sinais, que nos comunicamos uns com os outros,
expressamos nossos pensamentos, planejamos, refletimos sobre nossas ações
presentes, passadas e sobre ações a serem realizadas, extrapolamos o momento, o
campo de percepção visualmente apreendido, pois podemos fazer presentes objetos
e situações que não estão. A linguagem é fundamental no desenvolvimento da
consciência, amplia a autonomia do pensamento e as possibilidades de ação sobre o
mundo [...].

QUESTÃO 6
Qual é a importância, para Pilleti e Rossato (2017, p. 130-131), da atividade lúdica
característica das crianças no período pré-escolar?

Como aponta Vygotski (1996), na primeira infância, a linguagem re-presenta a linha


central do desenvolvimento da criança, pois a consciência se move no plano de algo
imbuído de sentido. A criança, em paralelo à compreensão verbal de suas ações e à
comunicação consciente com os outros, tem uma impulsão ao desenvolvimento da
consciência.
Com o desenvolvimento da linguagem e a ampliação de relação com os
objetos, em que o foco de interesse lança-se para a função deles, a criança utiliza-se
da imitação das ações e das relações sociais dos adultos, no faz de conta, no jogo
considerados, sua atividade principal até por volta dos seis anos.

32
Ao exercitar o jogo de papéis, as ações e funções sociais dos adultos na
atividade lúdica do faz de conta, a criança coloca-se no lugar deles, compreende e
realiza a seu modo os diferentes papéis sociais percebi-dos ao seu redor; reproduz o
mundo adulto, a realidade que o cerca e também exercita a aprendizagem do
controle de sua própria vontade, de suas ações, de maneira a ampliar seu
conhecimento do mundo. Além disso, por meio dessa atividade principal, tem a
possibilidade de cultivar o desenvolvimento da imaginação, da memória, da atenção,
da linguagem oral, do pensamento.
Em suma, brincando, imitando, fazendo de conta, a criança aprende novos
papéis e desenvolve-se. No entanto, essas atividades lúdicas nem sempre são vistas
como essenciais no processo de desenvolvimento da criança, sendo tomadas muitas
vezes apenas como um entretenimento, menosprezando sua importante função, ou
ainda tomando-as como atividades a serem vigiadas e sujeitas à incisiva intervenção
do adulto. Isso comumente pode ser apreciado nas discussões referentes à educação
infantil, no que tange à valorização dessas atividades com as crianças, permitindo
espaços, objetos que propiciem sua realização. Propiciando, desse modo, que a
criança expresse por meio da brincadeira a percepção que tem do mundo dos objetos
humanos, que se desenvolva psicologicamente e que se prepare para a transição para
a atividade de estudo, que se constitui numa nova etapa de desenvolvimento.
Os pesquisadores russos Luria e Ydovich (1987: 18), amparados em Vigotski,
explicam que a criança de aproximadamente 4 e 5 anos, ao deparar--se com alguma
dificuldade, algum problema a ser resolvido, utiliza-se de fala externa, ou seja, fala em
voz alta, mas sem dirigir-se a um interlocutor. Assim o faz de maneira a relatar para si
o problema com que se defronta, numa espécie de cópia verbal, e então reproduz as
"[...] conexões da sua experiência passada que podem tirá-la de suas dificuldades
presentes". O que ocorre, então, é uma "intervenção da linguagem como mediadora
na conduta, através da mobilização de conexões verbais que ajudem a resolver um
problema difícil". Vigotski, diferentemente de Piaget, defendeu que esse falar em voz
alta da criança não se constituía em uma fala egocêntrica afetiva. Essa ação da
criança, em auxílio às suas dificuldades, de falar em voz alta se enfraquece
paulatinamente, torna-se sussurro e depois se converte em fala interna, capacitando

33
a criança de mais ou menos 7 a 8 anos a incluir as conexões verbais na organização de
sua atividade.

DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA TERCEIRA INFÂNCIA

QUESTÃO 1
De que modo Martorell (2014, p. 256-257) define o crescimento emocional e o
domínio das habilidades valorizadas pela sociedade os quais caracterizam o
crescimento cognitivo durante a terceira infância.

À medida que ficam mais velhas, as crianças tomam-se mais consciente de seus
próprios sentimentos e dos sentimentos dos outros. Elas conseguem regular ou
controlar melhor suas emoções e reagir ao sofrimento emocional das outras pessoas
(Saarni, Campos, Camras e Witherington, 2006).
Por volta dos 7 ou 8 anos de idade, a criança normal-mente sabe quando sente
vergonha e orgulho e tem uma noção mais clara da diferença entre culpa e vergonha
(Olthof, Schouten, Kuiper, Stegge e Jennekens-Schinkel, 2000). Essas emoções afetam
a opinião dela sobre si mesma (Harter, 1996). A criança também compreende suas
emoções conflitantes. Por exemplo, na fala de Emily: "Acho que os meninos são bem
nojentos e não gosto da maioria deles. Meu irmão é OK, mas, às vezes, ele é bem
irritante. Eu o amo, mas ele me deixa louca. Mas eu não grito com ele, porque senão
ele chora e eu fico me sentindo culpada.”
Na terceira infância a criança está ciente das regras de sua cultura sobre o que
é aceitável na expressão de emoções (Cole, Bruschi e Tamang, 2002). Ela descobre o
que a deixa com raiva, triste ou com medo e como as outras pessoas reagem quando
exibe essas emoções, e aprende a comportar-se adequadamente.
[Assim,] terceira infância é o momento no qual a criança deve aprender
habilidades valorizadas pela sociedade em que vive. Garotos arapeches na Nova
Guiné aprendem a fazer arcos e flechas e a colocar armadilhas para ratos: as meninas
arapeches aprendem a plantar, arrancar ervas daninha e a colher. Crianças inuítes do
Alasca aprendem a caçar e a pescar. Crianças de países industrializados aprendem a
ler, escrever, fazer operações matemáticas e usar computadores.

34
QUESTÃO 2
Como Martorell (2014, p. 267-268) caracteriza as mudanças na agressividade típicas
da terceira infância? Descreva como ela diminui, se torna mais instrumental e pode
evoluir de maneira hostil e relacional. Defina os elementos que podem compor um
ciclo de agressividade e quais fatores o promovem; assim como, de que modo se
pode contribuir para evitá-lo.

A agressividade diminui e muda durante o início da vida escolar. Depois dos 6 ou 7


anos, a maioria das crianças fica menos agressiva à medida que vai deixando de ser
egocêntrica e passa a ser mais empática e cooperativa, e se comunica melhor. Agora a
criança consegue se colocar no lugar do outro, compreender os motivos da outra
pessoa e encontrar maneiras positivas de se impor. A agressão instrumental, a
agressividade dirigida à obtenção de um objetivo, característica do período pré-
escolar, torna-se mais incomum. Contudo, enquanto a agressividade diminui de modo
geral, a agressividade hostil - ação com intenção de ferir outra pessoa - aumenta
proporcionalmente (Dodge et al., 2006), e com frequência ocorre na forma verbal em
vez de física (Pellegrini e Archer, 2005). Meninos continuam a manifestar uma
agressividade mais direta, e meninas apresentam uma chance cada vez maior de
demonstrar agressividade social ou indireta. Apesar disso, uma metanálise recente
identificou que as diferenças entre gêneros são insignificantes, o que coloca em xeque
a disseminação da imagem de agressividade indireta como uma forma de
agressividade predominantemente feminina (Card, Stucky, Sawalani e Little, 2008).
Uma minoria de crianças não aprende a controlar a agressividade física (Coie e
Dodge. 1998) e parece processar as informações sociais com uma tendência de
atribuição hostil, pressupondo de forma imediata que as outras crianças agem com
intenção hostil. Esse tipo de criança, em geral meninos, costuma partir rapidamente
para o ataque, seja em retaliação ou autodefesa, e também tem probabilidade de
apresentar problemas sociais e transtornos psicológicos. Embora esteja claro que a
identificação e a interpretação de indícios sociais sejam fracas nessas crianças, não
está evidente se a agressividade causa esses problemas ou se é uma reação a eles, ou
ambos (Críck e Grotpeter, 1995).
Devido ao fato de as pessoas frequentemente se tornarem hostis em reação à
agressividade que lhes é dirigida, uma predisposição hostil pode desencadear um ciclo

35
de agressividade (de Castro, Veerman, Koops. Bosch e Monshouwer, 2002).
Tendências de atribuição hostil se tornam mais comuns dos 6 aos 12 anos (Aber,
Brown e Jones, 2003). Além disso, crianças com grau elevado de agressividade
costumam incitar umas às outras a atos antissociais. Desse modo, meninos em idade
escolar que são fisicamente agressivos podem se tornar delinquentes juvenis na
adolescência (Broidy et al., 2003). Observou-se que fatores como sexo masculino,
apresentar temperamento reativo, separação dos pais, maternidade precoce e criação
controladora contribuem para a agressão física dos 6 aos 12 anos (Joussemet et al.,
2008). Crianças rejeitadas e aquelas expostas a uma criação ríspida também
apresentam probabilidade de tendência de atribuição hostil (de Castro, Veennan,
Koops, Bosch e Monshouwcr. 2002).
Embora agressores costumem ser malvistos no âmbito pessoal, meninos
agressivos fisicamente e algumas meninas que exibem agressividade relacional - como
aquelas que fazem fofoca pelas costas de outra menina ou a excluem socialmente -
são percebidos como os mais populares em sala de aula (Cillessen e Mayeux, 2004;
Rodkin, Farmer, Pearl e Van Acker, 2000). Em um estudo com crianças rejeitadas pelos
pares no quinto ano, meninos agressivos tinham mais propensão a avançar no status
social ao final do sexto ano, o que sugere que pré-adolescentes podem encarar o
comportamento condenado por crianças mais jovens como "maneiro" ou "radical"
(Sandstrom e Coie, 1999). Em um estudo longitudinal norte-americano realizado com
um grupo multiétnico de 905 alunos urbanos do 6 o ao 9o ano, a agressão física
recebeu menor índice de desaprovação quando as crianças avançavam para a
adolescência, e a agressividade relacional foi cada vez mais reforçada pelo status
elevado entre os pares (Cillessen e Mayeux, 2004).
Os adultos podem ajudar a criança a conter a agressividade ao ensiná-la a
reconhecer quando estão ficando com raiva e como controlá-la. Em um estudo na
cidade de Nova York, as crianças expostas a um currículo de resolução de conflitos
envolvendo debates e dramatização em grupo mostraram menos tendência de
atribuição hostil, menos agressividade, menos problemas de comportamento e mais
respostas efetivas a situações sociais do que crianças que não participaram do
programa (Aber et al.,2003).

36
QUESTÃO 3
De que modo, de acordo com Martorell (2014, p. 267-268), a violência que
predomina nos meios de comunicação de massa pode afetar o comportamento?
Existe alguma mídia de entretenimento que se destaca nesse contexto?

"Ah, mãe, por favor, por favor, por favor!", implorou Emily, "Eu realmente quero
assistir! É proibido só até 13 anos e todos meus amigos já assistiram!” Devido ao fato
de cada vez mais a televisão, os filmes, os videogames, os celulares e os
computadores assumirem um papel significativo no cotidiano da criança, é vital
compreender o impacto que os meios de comunicação de massa têm sobre o
comportamento infantil. As crianças passam mais tempo com mídias de
entretenimento do que realizando qualquer outra atividade que não seja o tempo
passado na escola e dormindo. [Especialistas recomendam] que os pais limitem a
exposição da criança às mídias para 1 a 2 horas por dia; contudo, na média, crianças
passam cerca de 4 horas por dia na frente da televisão ou do computador (Anderson
et al., 2003).
A violência é predominante nos meios de comunicação norte-americanos,
Cerca de 6 em cada 10 programas de televisão retratam violência, em geral
glamourizada, glorificada ou banalizada (Yokota e Thompson, 2000). Os videoclipes
musicais apresentam uma quantidade desproporcional de violência contra mulheres e
negros. As indústrias cinematográficas, fonográficas e dos videogames utilizam uma
estratégia de marketing agressiva, focada em crianças, para vender produtos
violentos, com classificação para adultos (AAP Committee on Public Education, 2001).
Em um estudo recente com crianças norte-americanas, 40 filmes com classificação R
(menores de 17 anos apenas acompanhados pelos pais), com forte conteúdo de
violência, foram assistidos por uma média de 12,5% das crianças entre 10 e 14 anos
de idade [...].
Devido à quantidade significativa de tempo que a criança passa interagindo
com mídias, as imagens a que está exposta podem se tornar os principais modelos de
vida e fontes de informação sobre como as pessoas se comportam. Evidências de
pesquisas conduzidas ao longo dos últimos 50 anos sobre exposição à violência na
televisão, em filmes e em videogames sustentam uma relação causal entre violência
nos meios de comunicação e comportamento violento do expectador (Huesmann,

37
2007).
Como a violência nas mídias leva à agressividade a longo prazo? Estudos
longitudinais evidenciaram que a exposição da criança a mídias violentas aumenta o
risco de efeitos de longo prazo com base em aprendizado por observação,
dessensibilização e aprendizado pela prática que ocorre automaticamente em
crianças (Huesmann, 2007). As mídias proporcionam uma excitação profunda sem
mostrar o custo humano e levam a criança a encarar a agressão como aceitável. A
criança que observa personagens utilizando violência para atingir seus objetivos pode
concluir que a força é um modo eficaz de resolver conflitos. Reações negativas a cenas
violentas diminuem em intensidade quando a exposição é frequente (Huesrnann e
Kirwil, 2007). Quanto mais realista for o retrato da violência, mais chance ela tem de
ser aceita (AAP Committee on Public Education, 2001; Anderson et al., 2003). No caso
de crianças que já são agressivas, a situação é pior. A criança com alto nível de
agressividade é afetada mais intensamente pela violência nas mídias do que a criança
menos agressiva (Anderson et al., 2003).
Pesquisas sobre os efeitos dos videogames e da internet sugerem que
aumentos de longo prazo no comportamento violento podem ser ainda maiores no
caso de videogames do que da televisão e dos filmes. Usuários de jogos violentos são
participantes ativos que recebem um reforço positivo para ações violentas
(Huesrnann, 2007). Em estudos experimentais, jovens usuários de videogames
apresentaram diminuição no comportamento pró-social e aumento de pensamentos
agressivos e de retaliação violenta a provocações (C. Andersen, 2000).

QUESTÃO 4
Com fundamento em Martorell (2014, p. 268-269) defina o que é bullying. Quais são
os seus tipos? Quais são as características do bullying e das suas vítimas? Quais são
os fatores de risco para se tornar vítima; seus efeitos e prejuízos?

Agressividade se torna bullying quando é dirigida deliberada e persistentemente a um


alvo específico: a vítima. O bullying pode ser físico (bater, socar, chutar, destruir ou
tomar objetos pessoais), verbal (ameaças ou insultos) e relacional ou emocional
(exclusão social e fofocas, frequentemente pelas costas da vítima) (Berger, 2007;
Veenstra et al., 2005). Meninos com frequência usam agressividade física; meninas

38
podem usar agressividade relacional (Boulton, 1995; Nansel et al., 2001).
O cyberbullying - postar comentários negativos ou fotos depreciativas da
vítima em um website - está tornando-se cada vez mais comum (Berger, 2007). O
aumento no uso de celulares, envio de mensagens de texto, e-mail e salas de bate-
papo proporcionou novos lugares para o assédio das vítimas sem a proteção da
família e da comunidade (Huesmann.2007).
O bullying pode refletir uma tendência genética para agressividade associada a
influências ambientais, como pais coercitivos e amigos antissociais (Berger, 2007). A
maioria dos agressores são meninos que em geral vitimam outros meninos; meninas
voltam-se para o tormento de outras meninas (Berger, 2007; Pellegrini e Long, 2002;
Veenstra et al.,2005). Cerca de 24% das escolas das séries iniciais norte-americanas,
42% das escolas de ensino fundamental e 21% das escolas de ensino médio relatam
bullying na escola pelo menos uma vez por semana (Guerino, Hurwitz, Noonan e
Kaffenberger, 2006). Essa prática também é um problema em outros países
industrializados (Hara, 2002; Kanetsuna e Smith, 2002; Ruiz e Tanaka, 2001). Em um
levantamento com 50 mil crianças em 34 países europeus, quase um terço das
crianças afirmou que era agressor, vítima ou ambos (Currie et al., 2004). No Japão e
na Coreia, o bullying na escola foi associado a um crescente número de suicídios
estudantis e pensamentos e comportamento suicidas (Kim, Koh e Leventhal, 2005;
Rios-Ellis, Bellamy e Shoji, 2000).
Ao contrário do padrão de bullying, a probabilidade de sofrer a agressão
reduz-se paulatinamente. Com o avançar da idade, a maioria das crianças pode
aprender como desencorajar a prática, deixando uma quantidade menor de vítimas
disponíveis (Pellegrini e Long, 2002). A maioria das vítimas tem pequeno porte, é
passiva, fraca e submissa e costuma culpar a si mesma pela ocorrência. Outras vítimas
são provocadoras, elas incitam seus algozes e elas mesmas podem até atacar outras
crianças (Berger, 2007; Veenstra et al., 2005).
Os fatores de risco para se tornar vítima parecem ser semelhantes em outras
culturas (Schwartz, Chang e Farver, 2001). As vítimas não se conformam à regra social.
Em geral, são ansiosas, deprimidas, cautelosas, quietas e submissas, e choram
facilmente, ou, então, discutem muito e são provocadoras (Veenstra et al., 2005). Elas

39
também têm poucos amigos e podem viver em ambientes familiares ríspidos e
punitivos (Nansel et al., 2001; Schwartz, Dodge, Petit, Bates e Conduct Problems
Prevention Research Group, 2000). Em um estudo realizado com 5.749 crianças
canadenses, indivíduos com sobrepeso tinham mais probabilidade de se tornar
vítimas ou agressores (Janssen, Craig, Boyce e Pickett, 2004).
O bullying, sobretudo em sua forma emocional, é pre-judicial tanto para as
vítimas quanto para os agressores - e pode até mesmo ser fatal (Berger, 2007). Os
agressores correm mais risco de delinquência, crime ou uso abusivo de álcool. Em
uma onda de chacinas escolares que vem ocorrendo desde 1994, os perpetradores
com frequência eram vítimas de bullying (Anderson et al., 2001). Vítimas crônicas têm
propensão a desenvolver transtornos do comportamento. Podem se tornar mais
agressivas ou então deprimidas (Veenstra et al., 2005). Além disso, o bullying
frequente afeta o ambiente da escola, conduz a baixo rendimento escolar
generalizado, alienação da escola, dores de estômago e de cabeça, relutância em ir à
escola e ausências frequentes (Berger, 2007).

QUESTÃO 5
De acordo com Pilleti e Rossato (2017, p. 143-146), qual é a importância da
escolarização? O que a aprendizagem na escola e a atividade de estudo promovem?
De que modo os adultos e professores contribuem para esse processo?

O período considerado escolar, pela marcante "entrada da criança na escola", é em


nossa cultura e sociedade muito valorizado, por representar uma intensificação do
desenvolvimento da criança, por conta da riqueza de apropriações de conhecimento,
da cultura, pela possibilidade de con-vivência e aprendizado com seus pares. Também
não poderíamos deixar de mencionar que esse momento da vida da criança pode
representar o "início" da preparação para o futuro mercado de trabalho.
Em relação à importância da escolarização, como possibilidade de domínio da
escrita, da leitura, domínio esse que por muito tempo foi considerado pertencente ao
mundo do adulto, o teórico norte-americano Neil Postman (1999) argumenta que,
com a invenção da tipografia, o oralismo medieval perde espaço, cria-se um novo
mundo simbólico, o que exige uma nova versão de idade adulta, excluindo, assim, as

40
crianças dela, restritas a ocupar o mundo definido por infância. A leitura "cria", então,
a idade adulta, e pertencer a esta remete à apropriação dos segredos culturais
transmitidos pela educação. O autor entende que, antes do aparecimento da
necessidade da leitura e da escrita, todos compartilhavam o mesmo mundo
intelectual e social, e a infância findava aos 7 anos, tendo início a idade adulta. As
crianças são separadas do mundo adulto, pois se tornou essencial o aprendizado da
leitura e da escrita. Com isso, a partir dos séculos XVI e XVII, a infância passou a ser
definida pela frequência escolar.
Com o imperativo da frequência escolar, da tarefa de aprender a ler e escrever
passa-se a estipular e correlacionar idade cronológica à necessidade de ler (aos 4, 5 ou
6 anos) e posteriormente de escrever. Vão sendo criadas as diferentes fases de
aprendizagem, com características próprias e, com isso, muitas mudanças e exigências
vão sendo colocadas para cada vez mais diferenciar o mundo do adulto do da infância.
As mudanças em relação à valorização da escola e aos sentimentos de infância
estão interligadas, o que levou ao arranjo das classes por idades. Com o crescente
processo de escolarização, há o prolongamento da infância, estendendo-a para além
dos cinco ou sete primeiros anos de vida, e a organização e delimitação dos espaços e
tempos destinados às crianças (Hillesheim e Guareschi, 2007).
Com a necessidade social de que as crianças sejam formalmente educadas, as
famílias também passam a ter responsabilidades e funções educacionais (mandar
para a escola e possibilitar uma educação suple-mentar em casa). Os adultos tomam-
se "capacitados" a estabelecer as condições para que uma criança se torne um adulto.
O adulto educador influi sobre a invenção dos estágios da infância, por exemplo, "ao
escrever livros escolares seriados e organizar classes escolares de acordo com a idade
cronológica [...]" (Postman, 1999: 59). Criam-se, assim, hierarquias de habilidades e
conhecimentos, implicando também uma definição do desenvolvimento infantil, de
condutas exigidas, tendo como coadjuvante a aplicação da disciplina como medida de
coerção à natureza da criança, sendo esta considerada um empecilho ao aprendizado
escolar.
Antes de adentrar na vida escolar da criança, devemos lembrar que, de acordo
com Vigotski, a aprendizagem da criança começa muito antes da aprendizagem

41
escolar. Desse modo, toda a aprendizagem da criança tem uma pré-história,
encontrada em seu cotidiano, quando, por exemplo, se relaciona com as noções de
quantidade, de adição, subtração, com uma "pré-escola" da aritmética. Além disso,
vimos que nas fases anteriores de desenvolvimento, a criança já está inserida no
mundo das informações, do conhecimento e apropriação da linguagem, dos objetos e
de sua fun-ção. No entanto, o processo de aprendizagem, que se realiza antes da
entrada da criança na escola, difere de maneira essencial do campo de noções que se
adquirem no percurso do ensino escolar. "Aprendizagem e desenvolvimento não
entram em contato pela primeira vez na idade escolar, portanto, mas estão ligados
entre si desde os primeiros dias de vida da criança" (Vigotski, 2006: 110).
Entre 6 e 7 anos, a criança tem intensificada sua vida escolar e sua atividade
principal passa a ser a de estudo. O estudo torna-se um importante intermediário
entre todo o sistema de relações da criança com os adultos, ampliando a
comunicação com a família. Esta também passa a se relacionar de forma diferente
com a criança, atribuindo-lhe um lugar e espaço (com mesa e horário de estudo)
diferenciado na casa, pela importância atribuída ao estudante, que também passa a
ter maiores responsabilidades, novas tarefas e deveres. Toda uma mudança na rotina
da escola acontece para que haja a apropriação dos novos conhecimentos e a
aquisição da escrita concretizada. Há, portanto, uma importante alteração no lugar
social da criança.
De acordo com Vygotski (1996), a criança por volta dos 7 anos con-quista certa
autonomia, em razão da relativa maturidade física (expressa pela autonomia de
movimentos) e do desenvolvimento cognitivo (impulsionado pela apropriação da
cultura). Essa etapa é muito importante para o desenvolvimento como um todo, pois
a criança toma conhecimento dos seus sentimentos, de si, de maneira a estabelecer
novas relações consigo mesma; passa a se autoavaliar. Assim, percebe e significa as
suas vivências, a realidade que a rodeia e a si mesma, experimenta ser ela e ser o
outro, reproduzindo diversos papéis e personagens apoiada no que já vivenciou.
Nessa linha, apresenta comportamentos intencionais, planejados e com determinados
fins em relação ao outro. Em suma, experimenta o autoco-nhecimento e inicia o
processo de elaboração de um autoconceito.

42
Intensifica-se a apropriação dos signos criados pela sociedade ao longo da
história, como meios do homem para o contato com o mundo, ou seja, do sistema de
números, mapas, da escrita, da linguagem, com a ampliação desta e o aumento do
vocabulário. A apropriação e a internalização dos signos promovem o seu
desenvolvimento, passando a ser objetivados, por exemplo, nas produções textuais
da criança. Com a apropriação dos signos temos também o desenvolvimento da
memória, do pensamento, da atenção voluntária, dentre outras funções psicológicas
superiores.
O ensino escolar promove o desenvolvimento psicológico, pois estimula a
apropriação das formas desenvolvidas da consciência social e das capacidades de
atuar diante das suas exigências. Com a entrada da criança na escola, ocorre a
sistematização de conhecimentos e, além disso, o aprendizado destes promove o
desenvolvimento psicointelectual, por atuar na zona de desenvolvimento próximo,
sobre os processos e aprendizados que ainda estão ocorrendo, para os quais a criança
precisa de auxílio, de pistas dos adultos, da mediação dos professores, podendo com
o tempo fazer por si própria.
O conteúdo da atividade de estudo é o conhecimento teórico, e seu intento é
promover a formação do pensamento conceitual [...]. A importância primordial da
atividade de estudo está determinada, ademais, porque através dela se mediatiza
todo o sistema de relações da criança com os adultos que a circulam, incluindo a
comunicação pessoal na família.
Deve ser promovida a transmissão dos conhecimentos científicos na escola,
condição necessária para a formação do pensamento teórico. A aprendizagem escolar
é de suma importância para o desenvolvi-mento da criança e nisso, para a Psicologia
histórico-cultural de Vigotski, a escola tem papel primordial no processo de
apropriação, de objetivação da cultura humana constituída historicamente, no
processo de humani-zação de nossas crianças. Destacamos, com isso, que o professor
tem papel essencial como mediador dessa cultura, de maneira a organizar um ensino
intencional, promotor do aprendizado e do desenvolvimento de seus alunos, de
neoformações como a consciência e o pensamento teórico, que ampliem sua
capacidade de reflexão, de análise e de crítica.

43
QUESTÃO 6
Cite alguns elementos que, de acordo com Pilleti e Rossato (2017, p. 147-148),
Piaget descreve para caracterizar o período entre 7 a 12 anos de idade.

O período compreendido entre aproximadamente 7 a 12 anos tem como


característica principal a utilização do raciocínio lógico, de maneira a superar, como
salienta Quadros (2009), o caráter instável e subjetivo do pensamento próprio do
período anterior. A inteligência mostra-se um caminhar progressivo a fim de alcançar
maior adaptação, nesse caso a assimilação e a acomodação realizam um papel
essencial entre o indivíduo e o meio. A criança apresenta capacidade de raciocinar
sobre o mundo de modo mais lógico, mais adulto, com um sistema cognitivo coerente
e integrado, conseguindo transcender o que chega até seus olhos. [...].
A criança desse período preocupa-se em compreender o pensamen-to do
outro, bem como em se fazer compreender e ver aceitos os seus argumentos, com a
necessidade, portanto, de transmitir o que pensa; há o início da reflexão. Segundo
Piaget e Inhelder (2006), ocorre um significativo aumento de empatia da criança para
com os sentimentos e condutas dos outros, manifestando ainda sentimentos morais e
sociais de cooperação, com a colaboração efetiva entre os colegas.

DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO DO ADOLESCENTE

QUESTÃO 1
Com fundamento em Martorell (2014, p. 319), podemos afirmar que a rebeldia
adolescente é um mito?

Os anos da adolescência foram chamados como a época da rebeldia adolescente,


envolvendo um turbilhão emocional, conflitos com a família, segregação da sociedade
adulta, comportamento imprudente e rejeição dos valores adultos. Mas essa
caracterização é verdadeira?
A maioria dos jovens se sente próxima e se dá bem com seus pais, compartilha
opiniões semelhantes sobre temas importantes e valoriza a aprovação dos pais (J. P.
Hill, 1987; Offer, Ostrov e Howard, 1989). A maioria dos adolescentes se adapta bem

44
às experiências de vida. Os relativamente poucos adolescentes com grandes
problemas em geral vêm de famílias desestruturadas e, como adultos, continuam a
levar uma vida familiar instável e rejeitam as normas culturais (Offer, Kaiz, Ostrov e
Albert, 2002).
Mesmo assim, a adolescência pode ser uma época difícil para o jovem e seus
pais. Conflito familiar, depressão e comportamento de risco são mais comuns que em
outras fases da vida (Arnett, 1999). Emotividade negativa e mudanças do humor são
mais intensas durante o início da adolescência, talvez devido ao estresse ligado à
puberdade. Pode ser também que um pouco da intensidade do comportamento
rebelde seja normal do ponto de vista do desenvolvimento (Moffitt, 1993; Steinberg,
2001). Ao final da adolescência, a emotividade tende a se estabilizar (Larson, Moneta,
Richards e Wilson, 2002).

QUESTÃO 2
Defina o conceito de pensamento operatório formal e descreva, de acordo com
Pilleti e Rossato (2017, p. 207-211), o desenvolvimento cognitivo do adolescente
segundo a teoria piagetiana?

Piaget explica o pensamento do adolescente através da possibilidade deste em


realizar operações, denominadas de operações formais, que lhe permitem pensar de
modo mais sistemático sobre as suas experiências cotidianas e acerca do ambiente à
sua volta.
Nesse sentido, os adolescentes são mais capazes de solucionar proble-mas, de
explicar suas ações e pensamentos do que eram quando crianças; por isso, refletem
com maior frequência sobre suas ideias e imaginação, sobre como resolver possíveis
problemas futuros (Sprinthall e Collins, 2003). Enfim, raciocinam de forma mais
abstrata e flexível do que concreta.
Isso se deve ao pensamento formal, que amplia sua capacidade de resolver
problemas, pois se tomam capazes de formular hipóteses, justificar e provar
logicamente os fatos, modificar sua maneira de pensar sobre si, sobre seus
relacionamentos, sobre o mundo, elaborando planos para o seu e o futuro da
sociedade, com muitas ideias que vão para além da situação imediata. Em suma, o

45
pensamento operatório formal do adolescente, de acordo com a teoria piagetiana,
colabora para a resolução sistemática de um problema, para a construção de teorias e
para a reflexão sobre o seu próprio pensamento. Reflexão essa que lhe permite fugir
do concreto atual, em direção ao abstrato. Daí a necessidade de construir novas
teorias acerca de concepções já conhecidas, no meio social, almejando uma
concepção das coisas que lhe seja própria e que tenha maior repercussão e sucesso
(Piaget e Inhelder, 1976).
Com esses apontamentos, evidenciamos o pensamento formal típico do
adolescente, de acordo com a teoria piagetiana, em que as opera-ções formais
concedem ao pensamento um novo poder ao libertá-lo do real, na medida em que
desenvolve operações independentemente dos objetos, construindo a seu modo as
reflexões e teorias, com ideias de transformar o mundo.
Segundo Piaget e Inhelder (1976), o adolescente passa por inúmeras
alterações devido ao amadurecimento das faculdades intelectuais e morais, o que
provoca um desequilíbrio provisório, que conduz, posteriormente, a um equilíbrio
superior.
As estruturas formais colaboram para o equilíbrio, que se estabelece pouco a
pouco no sistema de interação entre os indivíduos e o meio físico. Nesse sentido, a
compreensão e colaboração dos pais e dos professores são fundamentais para o
alcance desse equilíbrio, na medida em que trabalham com projetos futuros, que
ajudam a delinear os passos para a concretização destes. Além disso, a educação
escolar pode colaborar na discussão das políticas, da participação social, da cidadania.
Piaget esclarece que o desenvolvimento na adolescência é um mar-co que se
estende até a idade adulta, haja vista que, atingido o grau de maturidade mental
representado pela oportunidade de realizar operações mentais formais, essa será a
forma predominante de raciocínio utilizada pelo adulto. Isso não significa que o
indivíduo para de desenvolver-se, mas que ocorrerá uma ampliação de
conhecimentos tanto em extensão como em profundidade e que não haverá, por
outro lado, a aquisição de novos modos de funcionamento mental.

QUESTÃO 3
Relvas (2017) ressalta diversos aspectos biopsicológicos a fim de promover a

46
compreensão do cérebro do adolescente.

[D]urante a maior parte do século XX e o início do século XXI, os adolescentes têm


sido retratados como anormais ou desviantes. [...]. Atualmente novas interpretações
sobre a adolescência vêm sendo repensadas, como ganho positivo dessa fase e
desenvolvimento, tais como:
✔ competência, que envolve a percepção positiva das próprias ações em áreas
de domínio específico - social, acadêmico, físico, carreira etc.;
✔ confiança, que consiste em ter uma noção positiva global de autoestima e
autenticidade e eficácia;
✔ conexão, que caracteriza-se pelas relações com a família, pais, escolas,
comunidade;
✔ caráter, que é o respeito pelo outro nas regras sociais, integridade do certo ou
errado;
✔ compaixão, ou seja, inteligência emocional ao se colocar no lugar do
sofrimento da outra pessoa.
É importante destacar alguns aspectos biológicos que justificam
cientificamente o comportamento do adolescente.
O cérebro do adolescente ainda não está totalmente desenvolvido nessa fase,
pois a teia neuronal precisa ser fortalecida, e as conexões aumentam pelos processos
da aprendizagem cognitiva, emocional, social. Durante esta etapa da vida, o sistema
nervoso passa por uma reorganização, pela qual sofre perdas ou podas neurais que,
em alguns organismos, alcançam seu ápice de maturação.
O desenvolvimento cerebral tem dos grandes princípios a produção de
neurônios e as conexões nervosas e, logo depois, o remodelamento do Sistema
Nervoso Central. Até a puberdade, milhões de novas sinapses ocorrem. Durante a
adolescência, alguns neurônios são desativados, sendo outros fortalecidos, podendo
essa fase ser denominada de poda neural, ou seja, o que não é usado é descartado.
Esse processo ocorre para que haja um refinamento das estruturas e funções
cerebrais, podendo, muitas vezes, influenciar o comportamento juvenil.
Constata-se que, até o período da puberdade, a substância cinzenta é formada
por uma grande quantidade de corpos celulares de neurônios distribuída na

47
superfície dos hemisférios cerebrais e do cerebelo, envolvida no controle muscular,
percepção sensorial, visão, audição, memória, emoção, fala. Nesta fase, essa
substância diminui, enquanto acontece o contínuo aumento de substância branca
subcortical que é formada de prolongamento de neurônio, os axônios.
O aumento em volume da substância branca ao longo da infância e da
adolescência corresponde ao espessamento das fibras nervosas, resultante da
mielinização que isola eletricamente os axônios, permitindo que os impulsos sejam
mais rápidos. A formação de mielina funciona como fixador das conexões neurais.
No desenvolvimento embrionário, o cérebro cresce de baixo para cima em
camadas intrincadas de neurônios, e nas laterais da parte mais inferior para a
superior, fixando-se por meio da região denominada aderência intertalâmica, no
corpo caloso, que une os hemisférios direito e esquerdo.
O córtex do lobo frontal é a última grande divisão do cérebro a "amadurecer"
(por volta dos 30 anos) em estrutura, funções cognitivas e emocionais mais
elaboradas ligadas a planejamento, representações mentais, raciocínio lógico e
produção da fala. Ele também é responsável pela inibição de impulsos e utilização da
aprendizagem do passado para aplicar em situações atuais ou criar estratégias
futuras.
Essa estrutura cerebral é responsável pelo desenvolvimento psicossocial e,
durante a adolescência, é mais bem compreendida como a região da busca do
autoconhecimento, de resposta à pergunta "Quem sou eu?". As mudanças que
ocorrem durante os anos da adolescência, o surto de crescimento, o despertar sexual,
o ingresso para uma escola maior e impessoal, mais amizades íntimas e a aceitação de
riscos, tudo desafia o adolescente a encontrar sua "identidade", ou seja, sua
autodefinição a estabelecer a integridade da personalidade, ou seja, alinhar as
emoções, o pensamento e o comportamento para que mantenha a consistência
quaisquer que sejam o lugar, o momento, as circunstâncias e o relacionamento social.
O córtex do lobo parietal é uma das primeiras regiões corticais a iniciar o
processo de amadurecimento, atingindo o seu volume máximo nos meninos aos 12
anos e nas meninas aos 1O anos de idade, período esse onde ocorrem as maiores
transformações da puberdade.
A partir daí, começa-se o refinamento sensório-motor, proporções corporais, o

48
que impacta na autoimagem.
O córtex do lobo temporal durante a adolescência, mesmo que o cérebro já
tenha chegado às suas dimensões adultas, ainda se podem observar variações
progressivas, mielinização e regressivos processos sinápticos. O lobo temporal é
envolvido nas funções da linguagem, memória e audição, chegando ao ápice da sua
expansão durante a adolescência, aos 16 ou 17 anos. Essa área é fundamental para
a compreensão da linguagem e para a assimilação da memória e o processamento
emocional (hipocampo e amígdala cerebral). Um incremento da mielinização dessa
área acelera a integração das informações visuais e auditivas que recebe das áreas de
percepção primárias e pode melhorar as funções linguísticas, como, por exemplo, a
leitura. [...].
Embora os adolescentes sejam capazes de emoção muito forte, seu córtex pré-
frontal não se desenvolveu adequadamente até o ponto em que consigam controlar
essas paixões. É como se o córtex pré-frontal não tivesse o "freio" necessário para
reduzir a intensidade emocional da amígdala cerebral. Uma análise a ser considerada
é que o cérebro do adolescente sofre intensa plasticidade neuronal devido às
experiências ambientais vividas e que influenciam o seu neurodesenvolvimento.
É no período da adolescência que se aprende a tomar decisões, quais amigos
escolher, com que pessoa namorar, fazer sexo ou não, ir para escola ou universidade.
Ser capaz de tomar decisões competentes não garante que os indivíduos façam isso
na vida diária, na qual uma série de experiência geralmente entra em cena. A maioria
das pessoas toma melhores decisões quando estão calmas do que quando excitadas
emocionalmente, podendo ser uma verdade essa condição para os adolescentes. O
adolescente precisa de escuta e orientação.
O desejo e a atração sexual na adolescência estão exatamente nas mudanças
que acontecem no sistema de recompensa do cérebro, sendo considerado o conjunto
de estruturas que premiam com uma sensação de prazer e provocam no cérebro do
adolescente a vontade de querer mais e mais coisas que promovam a sensação de
bem-estar.
Em contrapartida, a área do córtex pré-frontal é uma estrutura do cérebro
humano que atua como autorregulador do processo emocional e de recompensa e
regula todas as reações provocadas pelo sistema emocional.

49
O córtex pré-frontal é considerado a área do cérebro social, sendo que, no
jovem, esse sistema está em pleno desenvolvimento e fortalecimento das conexões
neurais, que são por meio da aprendizagem cognitiva que promovem a plasticidade
neuronal intencional, sendo essa elaborada e fortalecida pela orientação social ou
pela educação cognitiva dos pais e educadores. [...].
Os adolescentes precisam de mais oportunidades para praticar e discutir a
tomada de decisão realista. Muitas decisões no mundo real, como temas sobre sexo,
drogas e direção perigosa, ocorrem em uma esfera de estresse que inclui restrições de
tempo e envolvimento emocional. Um caminho fundamental para reconhecer essas
oportunidades é o envolvimento da família e da escola na integração desse
aprendizado com e para os jovens.
Embora a adolescência seja um período importante no desenvolvimento das
habilidades de pensamento crítico, se uma base sólida de habilidades fundamentais,
sejam elas cognitivas e emocionais, não for alicerçada no período da infância, alguns
possíveis gaps poderão ocorrer no período da adolescência. Por isso, fomentar o
pensamento crítico torna-se fundamental para a qualidade das conexões neurais do
adolescente. [...].
Conclui-se, então, o quanto é necessário educar a mente em formação em
todos os sentidos. O adolescente em especial passa por grandes questionamentos e
conflitos, e, muitas vezes, não entende nem a si mesmo e, algumas vezes é solicitado
a compreender algo mais complexo.
O importante é ter o olhar de “guia” nessa travessia de um “mar de
tormentas” e educá-los por meio de estímulos coerentes para que atinjam o
amadurecimento neurocognitivo, emocional e social para assumir a vida adulta.

QUESTÃO 4
De que modo Pilleti e Rossato (2017, p. 181-184) caracterizam a adolescência de
acordo com a abordagem histórico-cultural?

[O] homem nasce candidato à humanidade, no entanto, não nasce (não é


naturalmente dado a ele) dotado das aptidões e habilidades históricas da
humanidade, uma vez que elas se encontram no mundo material, cristalizadas nos

50
objetos, na cultura, nas palavras e nos fenômenos da vida humana, e necessitam ser
apropriadas nas relações com este mundo historicamente constituído, para que sejam
processadas no seu desenvolvimento, para que se humanize. A partir disso, podemos
afirmar que as condições, as possibilidades de acesso, de apropriação desse mundo da
cultura e dos objetos, são distintas para diferentes pessoas e, com isso, serão
produzidas também diferenças no desenvolvimento delas. Assim, reafirmamos que o
desenvolvimento, no caso dos adolescentes, não ocorre naturalmente.
Como salienta Bock (2004: 39), a adolescência é uma construção social que
tem suas repercussões na subjetividade e no desenvolvimento do homem moderno.
[É] significada, interpretada e construída pelos homens. Estão associadas a ela
marcas do desenvolvimento do corpo. Essas marcas constituem também a
adolescência como fenômeno social, mas o fato de existirem como marcas do corpo
não deve fazer da adolescência um fato natural. [...].
Elkonin (1987: 119), um estudioso da Psicologia histórico-cultural, aponta que,
na Psicologia, ainda se considera a entrada na adolescência como o período mais
crítico, em que as causas concentram-se nas mu-danças em si do organismo e na
maturação sexual. [O] autor considera que o desenvolvimento do adolescente no que
tange às mudanças físicas, biológicas, mas, sobretudo, às relações sociais
empreendidas com o mundo circundante, com seus pares, exer-ce influência
fundamental no desenvolvimento do seu psiquismo, num processo dialeticamente
contraditório, com interrupções de continuidade, por conta das novas formações que
surgem.
Na adolescência, o que predomina em termos de motivos nas relações sociais
é o estabelecimento de relações pessoais íntimas entre os adolescentes, ou seja, a
comunicação e as ações com outros adolescentes são abalizadas por determinadas
normas morais e éticas (códigos do grupo), de forma a reproduzir as relações
existentes entre os adultos. Na análise da professora e doutora em Psicologia Marilda
Gonçalves Dias Facci (2004), o adolescente torna-se crítico em função das
reivindicações que lhe são colocadas, das qualidades particulares dos adultos, dos
conhecimentos teóricos adquiridos. De acordo com Elkorun (1987: 120), esse modo
pecu-liar de interação se diferencia, pois, "seu conteúdo fundamental é o outro

51
adolescente, como indivíduo com determinadas qualidades pessoais". Essa relação e
forma de comunicação possibilita a construção de concepções, de percepções sobre o
mundo, sobre a vida, sobre o futuro, sobre si, sobre o sentido pessoal de sua vida,
com a constituição da autoconsciência, que se compõe na interiorização da
consciência social. "Graças a isso, surgem as premissas para que se originem novas
tarefas e motivos da atividade conjunta, a que se converte em atividade dirigida ao
futuro e adquire o caráter de atividade profissional de estudo" (Elkonin, 1987: 121).
A atividade de estudo, ponto forte das crianças em idade escolar, continua
preponderante nos adolescentes, de maneira que sucede o "domínio da estrutura
geral da atividade de estudo, a formação de seu caráter voluntário, a tomada de
consciência das particularidades individuais de trabalho e a utilização desta atividade
como meio para organizar as inte-rações sociais com os companheiros de estudo"
(Facci, 2004: 71).
Na perspectiva da Psicologia histórico-cultural, na adolescência formam-se as
funções psicológicas superiores, o pensamento em conceitos e a possibilidade de um
maior desenvolvimento do pensamento abstrato, propiciando ao sujeito melhores
condições de compreensão da realidade, a constituição de concepções de si e do
mundo.

DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO DO JOVEM E ADULTO

QUESTÃO 1
Quais elementos Pilleti e Rossato (2017, p. 193-194) descrevem para caracterizar o
sujeito adulto na contemporaneidade?

A noção de sujeito surge na modernidade, num momento histó-rico assinalado por


muitas mudanças políticas, econômicas, sociais e culturais, na transição do modo de
produção feudal para o modo de produção capitalista, resultando em uma concepção
de homem e de mundo diferentes. Com isso, como explicam a psicóloga Soraia Klug

52
Possidônio e a professora doutora Marilda Gonçalves Dias Facci (2011: 260), o homem
passa a ser percebido e concebido como um indivíduo livre, produtor e consumidor,
sujeito de sua vida, o que "possibilitou que a subjetividade pudesse ser pensada como
uma experiência indi-vidual privada e universal".
De acordo com as pesquisadoras em Psicologia Nádia Eidt e Lenita Cambaúva
(2011), com o desenvolvimento do capitalismo, temos tam-bém a constituição e
caracterização do homem que se insere e participa desse sistema. Assim, surge a ideia
de um sujeito que não depende de forças externas, mas tem sua individualidade em
que o que predomina é a sua vontade e ação [...]. [Não] há um centro de referência
com padrões comuns, não há unicidade; o real existente depende da interpretação do
sujeito. Assim, todos os homens são ditos iguais em direitos e se desenvolvem por seu
próprio esforço. [...].
O que de fato se observa é que as relações sociais estão vincu-ladas às
necessidades de mercado e marcadas por desigualdades e hierarquizações, em que
imperam as mais diversas exclusões, princi-palmente no tocante às possibilidades de
inserção e participação dos indivíduos na sociedade a partir de suas condições
socioeconômicas. Os indivíduos não possuem mais lugares preestabelecidos no
mundo onde poderiam se situar, com isso, devem lutar "livremente", com suas
próprias forças e riscos, a fim de se colocar numa sociedade cada vez mais desigual,
seletiva econômica e socialmente. Para o filósofo e pedagogo Galdêncio Frigotto
(1998), são justificadas a exclusão e a desigualdade como essenciais à competitividade
e, nesse processo, o indivíduo desempregado é acusado de incompetência e pouco
esforço pessoal, o que resulta em sua exclusão. Deslocam-se as responsabi-lidades
sociais para o plano pessoal, e os indivíduos devem adquirir competências e
habilidades para se tornarem competitivos e empre-gáveis e buscar requalificação
para, assim, ter um lugar no mercado.
Ao identificarmos essas características da sociedade e do indivíduo que se
constitui nas relações sociais, situamos também o adulto, que vivencia os dilemas de
ter que ser produtivo e estável profissionalmente e vivenciar a exclusão do mercado
de trabalho, por exemplo. Como esclarece Sousa (2007), na sociedade pós-moderna
os adultos refletem a sua existência num panorama de dilemas, de oposições e de

53
dialética, em que tem de reinventar-se constantemente. [...].
Desse modo, um conjunto de valores e ideais são difundidos e tomados como
verdades naturais e indissociáveis da condição humana, como padrões e obrigações a
serem seguidos. Somos influenciados e constituídos pelas condições socioculturais e
econômicas do momento histórico no qual nos encontramos. Assim, em tese, de
acordo com o que em geral se espera de um adulto, este estaria pronto, com suas
capaci-dades individuais plenas desenvolvidas, com maturidade física, sexual,
emocional, cognitiva e social.
Contudo, como afirma a professora e pesquisadora de Psicologia Marília
Gouvêa Miranda (1999), o sujeito não é mecanicamente determinado, tem papel
ativo nesse processo e, na medida em que é constituído, também é constituinte da
sociedade, ainda que reconhe-çamos suas dificuldades em tornar-se sujeito nesse
processo, em nossa sociedade excludente e desigual. Em suma, a constituição do
homem está atrelada às relações sociais que este estabelece com uma realidade
histórico-social determinada.

DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA TERCEIRA IDADE

QUESTÃO 1
Cite os elementos utilizados por Pilleti e Rossato (2017, p. 239-240) para definir,
descrever e caracterizar a velhice segundo o viés histórico-cultural da psicologia do
desenvolvimento.

De acordo com a Psicologia histórico-cultural, a passagem de um período de


desenvolvimento a outro é marcada, delimitada pelo que Elkonin (1987) chama de
crise. Assim, o fim e o estabelecimento de uma nova atividade na vida do sujeito são
delimitados por uma crise. A crise no desenvolvimento humano que talvez pudesse
delimitar a passagem da vida adulta para a velhice parece ser construída pela
aposentadoria. O psicólogo e pesquisador Clayton Washington dos Reis (2011), em
pesquisa com idosos, verifica que o momento de crise que poderia marcar a transição
entre a vida adulta e a velhice é a saída do mercado de trabalho, ou seja, a chegada
da aposentadoria.
Com isso, o sujeito necessita neste estágio de vida buscar e encontrar novos

54
sentidos, significados, projetos de vida, realizando outras amizades não apenas com o
sentido de ocupar seu tempo livre, mas principalmente por se constituir na
oportunidade para outras relações, outros espaços sociais, novos aprendizados, novas
motivações, fortalecer as amizades e os vínculos. Todavia, isso não pode ser pensado
como um movimento restrito ao sujeito, como se fosse um problema individual e que
dependesse apenas de sua vontade. Oportunidades precisam ser geradas na família,
na comunidade, nas políticas públicas, nos programas sociais e educacionais.
Reis (2011), ao realizar estudo sobre a- velhice fundamentado na Psicologia
histórico-cultural, levanta a possibilidade de que a atividade trabalho seja considerada
a que norteia o desenvolvimento do idoso. Na pesquisa de Reis (2011: 132), averígua-
se que o idoso continua a se re-lacionar com a atividade trabalho. "E essa atividade
parece efetivamente guiar o desenvolvimento humano, sobretudo porque ela está
presente na vida do idoso, seja de forma direta ou de forma indireta". O autor explica
que o tema trabalho está presente na fala, mesmo entre aqueles idosos que não
exercem uma atividade laboral remunerada. Em todas as situações, os idosos
mantinham alguma relação com o trabalho, ainda guiavam sua vida por ele, seja para
dizer o que já fez, o que faz ou o que não faz mais. Como afirma Vigotski (1996), na
vida adulta, o homem tem como atividade principal o trabalho. Relaciona-se,
portanto, com a realidade, apropria-se dela, por meio da atividade laboral, e poderia
supor-se, de algum modo, que esta atividade também se estenderia à velhice.
A velhice não pode ser entendida unicamente por suas mudanças físicas,
psicológicas e sociais, deve ser também vista pela interação dessas mudanças
conjugadas à história de alterações ocorridas, à cultura, às condições concretas e às
relações que o sujeito tem com essas mudanças, com o seu desenvolvimento.
Precisamos ouvir, conhecer nossos idosos e suas necessidades, seus modos de
ser e de vivenciar a velhice, suas características psíquicas cons-tituídas num processo
de envelhecimento socioeconômico, de maneira a refletir sobre os padrões de
velhice, de não velhice aos quais estão submetidos e, muitas vezes, sentem-se
obrigados a corresponder (a um único modo de viver a velhice), a fim de não serem
excluídos pela socie-dade. As exigências colocadas com a experiência do
envelhecimento, de, por exemplo, aprender uma técnica, outra habilidade, de

55
desempenhar uma nova atividade, de se relacionar com uma pessoa diferente do seu
grupo, podem provocar novas necessidades, novos movimentos, novas aprendizagens
e promover desenvolvimento.

QUESTÃO 2
Que elementos Pilleti e Rossato (2017, p. 204-205) descrevem para caracterizar a
maturidade em uma perspectiva psicodinâmica?

A partir de uma abordagem psicodinâmica (que tem Freud como pioneiro), busca-se
compreender como a personalidade é adaptada pela experiência passada e pelo
funcionamento da mente. São diversos os teó-ricos que a assumem e, de acordo com
Glassman e Hadad (2006), apesar de suas diferenças, têm em comum a ênfase nas
experiências principais da infância quando intentam compreender a personalidade
adulta.
O professor e psicanalista Flávio Fortes D'Andrea (2012), numa leitura
psicodinâmica, destaca que a fase da chamada maturidade compreende o período
que decorre mais ou menos dos 20 aos 50 anos, envolvendo do fim da adolescência
ao climatério. Questões muito prementes da existência do ser humano são
evidenciadas, como as responsabilidades em relação à sociedade e a si mesmo.
Nosso jovem adentra na fase adulta, ou seja, no período comumente
compreendido como de maturidade, na medida em que tem uma iden-tidade
formada e que "é capaz de viver intimamente com um membro do sexo oposto, está
definido profissionalmente e está apto a associar-se com outras pessoas em
condições de igualdade" (D'Andrea, 2012: 109).
Assim, o autor divide esse período de maturidade em:
✔ adulto-jovem (20 aos 35 anos), com grandes responsabilidades consigo mesmo
e com a sociedade, como o ajustamento profis-sional, o casamento e a
paternidade;
✔ meia-idade (35 aos 50 anos), período em que as pessoas colhem os resultados
dos investimentos vitais, têm o clímax de seu de-senvolvimento, a maturidade
propriamente dita. Na concepção do teórico, é o momento de colher os frutos
que plantou, ou seja, o conjunto de características que conseguiu formar e que

56
o definem, em relação a si e ao mundo, "como uma pessoa reali-zada". Essas
características estão em sincronia com um adequado desenvolvimento do ego,
"implicando numa adequada adaptação ao princípio da realidade e num
harmônico entrosamento com o superego" (D'Andrea, 2012: 131). O autor
complementa que a maturidade do adulto dependerá da capacidade do
sujeito em aprender com a própria experiência, bem como com a daqueles
com quem convive, de maneira a aguentar o sofrimento que acompanha esses
aprendizados. Os conhecimentos adquiridos nesse processo devem ser
transmitidos com um mínimo de dú-vida e incertezas. "Em nenhuma outra
época da vida, a condição finita do ser humano é percebida tão
realisticamente como na meia-idade" (D'Andrea, 2012: 132); percebe-se isso
através dos traços físicos, como as rugas, com as fragilidades na saúde. As
perdas podem desencadear reações depressivas, por conta de um ego
amadurecido que prevê o fim de sua existência;
✔ climatério (por volta dos 50 anos): exerce influências marcantes na
personalidade do adulto, principalmente no sexo feminino, quando ocorre a
diminuição da atividade glandular sexual e modificações físicas peculiares, que
perturbam o equilíbrio do aparelho psíquico [...].

QUESTÃO 3
De que modo Pilleti e Rossato (2017, p. 214-217) caracterizam a velhice como um
período de desenvolvimento?

Ao partir do princípio de que todas as pessoas (mais novas, mais velhas)


desenvolvem-se, de algum modo, em decorrência de uma mul-tiplicidade de fatores,
contextualizaremos o desenvolvimento do idoso. O olhar e as relações estabelecidas
com a velhice vão sendo de-limitados ao longo da história pela cultura, pelas políticas,
pelas con- dições de existência, pela totalidade concreta da estrutura social, pelas
concepções de mundo, de homem, de homem produtivo. Portanto, a velhice é
composta por papéis e imagens antagônicos, de sabedoria, de acúmulo de
conhecimentos, de degradações, de perdas, de conquistas, de improdutividade.
A concepção de velhice, ou daquele que vivencia esse período, o idoso, é em

57
geral envolta por uma série de estigmas sociais, de concepções negativas, difundidas
na sociedade, na história, na cultura, e subjetivadas pelo sujeito (o olhar do outro
sobre nós reflete em nossa autoestima, na percepção de nós mesmos). [...]. Uma
cultura negativa da velhice (em suas manifestações simbólicas e concretas) opõe-se às
possibilidades de desenvolvimento. [...]. Em nossa sociedade de consumo, um dos
sentidos infligidos à saúde do corpo é o de que ele é um bem a ser adquirido, um
padrão a ser obtido.
Assim, cresce o mercado de consumo de bens e serviços, em favor de reparar
as marcas do envelhecimento, projetando, de acordo com Debert (2011), um corpo
jovem na concretude do corpo envelhecido e negando a velhice progressiva como um
aspecto do avanço da idade cronológica, o que pode impedir e conturbar a criação
social de uma estética da velhice. Aliada a isso, temos a suposição de que uma "boa
aparência" é sinônimo de bem-estar. Assim, aqueles que mantêm seu corpo em "dia"
(regularmente vigiado e com boa aparência) viverão mais. Além da vigilância
constante do corpo, é muitas vezes repassada ao indivíduo a responsabilidade pela
sua própria saúde, como se esta dependesse apenas dele, excluindo as demais
dimensões a ela vincula-das, como a econômica.
Muitas conquistas e perdas são parte da realidade ao longo da vida, mas no
período da velhice podem-se intensificar as perdas em razão de situações reais,
concretas, e pela sensação do próprio sujeito relacionada às cobranças definidas pela
cultura, pela sociedade, enquanto ideais de homem, de corpo, de produtividade; e
ainda pelas limitações de possibilidades de inserção social, de aprendizado, de
desenvolvimento impostas pela sociedade. Comumente são atribuídas essas e outras
características apenas às mudanças biológicas ocorridas durante o processo de
enve-lhecimento, como se elas estivessem desvinculadas da cultura, do social, das
múltiplas dimensões com as quais estão relacionadas.
Postuladas essas reflexões preliminares, passaremos a caracterizar os idosos e
a velhice como um período de desenvolvimento vivenciado por eles, tangenciado pelo
significado do processo de envelhecimento em nossa cultura e pelas condições
socioeconômicas sob as quais vivem. Deparamo-nos, pois, com o desafio de fortalecer
uma cultura positiva do idoso, de novas necessidades para além das forjadas na

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sociedade de consumo; de potencialidades e de possibilidades de inserção ativa na
sociedade; num processo de envelhecimento que possa abranger diversas velhices,
dadas as também diferentes formas de ser, de estar numa sociedade de
desigualdades e de exclusões como a nossa. Assim, os idosos podem desenvolver-se,
experimentar percepções de "ama-durecimento", de crescimento, podem vivenciar
um bem-estar físico, social e psíquico, ampliando sua qualidade de vida, numa velhice
feliz, amparados para além do biológico por condições sociais, políticas, econômicas,
culturais.

REFERÊNCIAS
CASTRO, L. Rabello. Consumo e infância barbarizada. In: Castro, L. R. Infância e
adolescência na cultura do consumo. Rio de Janeiro: NAU, 1998.
MARTORELL, G. O desenvolvimento da criança: do nascimento à adolescência. Porto
Alegre: AMGH, 2014.
PILETTI, N.; ROSSATO, S. Psicologia do desenvolvimento. São Paulo: Contexto, 2017.
RELVAS, M. P. A neurobiologia da aprendizagem para uma escola humanizadora. Rio
de Janeiro: Wak Editora, 2017.

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