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A globalização é um fenômeno de muitas faces, Milton Santos divide

este fenômeno em três categorias, a globalização como fábula, como ela é


vendida para o mundo de uma forma que constrói ideias extremamente
positivas a respeito deste fenômeno, a globalização perversa, ela como de fato
é, podendo incluir em sua perversidade até mesmo a própria globalização
como fábula já que funciona como um instrumento de dominação e disfarce, e
por último, a globalização como possibilidade, o que de positivo essa realidade
pode de fato nos proporcionar.
A possibilidade que a globalização pode nos conceder será o alicerce
deste texto, já que sem ela mesmo que em meio a tantos problemas envolvidos
neste processo ainda sim existem benefícios. Durante a década de 1970 o
apartheid ainda estava vigente e com toda sua força na África do Sul, essa
grande segregação racial cai como uma luva para as propostas empresariais
desta época dentro do país, onde a maximização dos lucros devido
principalmente ao sub assalariamento onde a maioria das pessoas se
encontravam.
E dentro deste cenário e de ideais contrários a todo este contexto
narrado, estudiosos marxistas como Martin Legassic e Neville Alexander que
irão tecer o conceito de capitalismo racial, onde agora a noção de raça e capital
estão totalmente atrelados, assim a segregação promovida pelo apartheid foi
tão brutal, que a raça passa a ser um norte dentro do capitalismo sul africado.
A expressão “capitalismo racial” nasceu entre os sul-africanos
que lutavam contra o regime do apartheid na década de 1970. A África
do Sul era uma sociedade capitalista e racista, um país que acumulava
fabulosas somas de dinheiro rebaixando o valor do trabalho com
segregação, humilhação e despossessão de negros. Mas os liberais
sul-africanos e os gurus da ordem mundial se recusavam a chamar as
coisas pelo nome. Juravam que o apartheid era uma aberração, um
caso desviante na casa desta senhora virtuosa que é a economia de
mercado.(PARRON, Tâmis. 2020,  2º número do volume 2 da Revista
Rosa)

Esse conceito põe em pauta uma questão importantíssima que está em


vigência até os dias de hoje, que seria, a superação do racismo necessita
primeiro da superação do capitalismo? Esta questão é importantíssima pois é o
momento em que possibilita o direcionamento de lutas presas a recortes
nacionais específicos e alcem voo para uma visão global, mirando um inimigo
em comum a todos.
Graças ao Black Lives Matter, o conceito de capitalismo racial
de Cedric Robinson ganhou nova projeção. Seu uso tem sido relevante
porque direciona o movimento negro para a luta contra a organização
estrutural do capitalismo, amalgamando tendências particularistas,
identitárias e nacionalistas da luta antirracial numa energia social
unificada contra a exploração do capital. (PARRON, Tâmis. 2020,
2º número do volume 2 da Revista Rosa)
Durante todos estes ocorridos, na mesma década de 70, os Estados
Unidos passavam por um conturbado momento, onde as políticas neoliberais
de Ronald Reagan que incentivaram o encarceramento em massa e o
desinvestimento no setor público apenas catalisaram toda a futura resposta a
estes atos, levando o Black Lives Matter a abraçar os ideais anticapitalistas e
ajudando a direcionar a luta antirracista e internacionalizando a luta, algo que
não seria possível sem as trocas de informações presentes dentro da
globalização, é o uso desta rede que é utilizada para explorar e oprimir sendo
subvertido.
Fala-se, igualmente, com insistência, na morte do Estado,
mas o que estamos vendo é seu fortalecimento para atender aos
reclamos da finança e de outros grandes interesses internacio-
nais, em detrimento dos cuidados com as populações cuja vida
se torna mais difícil. (SANTOS, Milton. Por Uma Outro Globalização,
pag. 19)

As falácias neoliberais engendradas no sistema capitalista constroem a


nossa noção do que seria a própria globalização como fábula, “conto” que
acaba por ser vendido por Reagan que leva os negros americanos para mais
uma dessas grandes crises, e do outro lado temos o apartheid que em conjunto
com o governo antes citado, ajuda a refutar as ideias de conexão, acesso à
informação e diminuição das distâncias que nunca estiveram tão longe. Porém
dentro de todo este caos se articula uma resistência, essa que em seu caráter
principal realmente unifica grupos em torno de um ideal, essa união que só se
faz possível graças a globalização, uma outra globalização que almeja a real
emancipação da população e sua autonomia, que surge como resposta a este
festival de mortes e injustiças que hoje ainda é vendido como fábula.

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