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1 de julho de 2019
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IDEIASAnálise
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Protesto contra Donald Trump em Nova York, em maio de 2018.MICHAEL BROCHSTEIN / GETTY
IMAGES
Os liberais vivem em choque. Aturdidos pelo impacto de uma realidade política que não
assimilam. O século XXI está lhes caindo mal. Não compreendem por que foram
golpeados tão intensamente no rosto da confiança que tinham em si mesmos. Sobretudo
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depois de terem contribuído de forma decisiva para ganhar as guerras mundiais que
acompanharam a marcha da liberdade durante o século passado.
Nos últimos 30 anos, sua importância sofreu uma guinada radical. Em 1989, a promessa
era de felicidade. As pessoas se encarapitaram no muro de Berlim, e uma primavera
liberal se apropriou da história proclamando seu fim. Não durou muito o verão dessa
hegemonia. A história voltou com maiúsculas. Trouxe consigo um duro inverno populista
que lhes faz tiritar e com a dúvida de se não estaremos no início de uma glaciação
totalitária.
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De fato, se pudéssemos retroceder uma década, alguém acharia possível ver na Casa
Branca um presidente empenhado em levantar um muro supremacista ao sul do rio
Grande? E o que dizer do mapa político da Europa? Acaso se poderia imaginar, após a
queda da Cortina de Ferro, que os defensores da chamada democracia iliberal
governariam em 11 países da União e representariam mais de uma quarta parte do
eleitorado do Velho Continente?
Com este panorama que se repete no conjunto do Ocidente, os liberais confrontam uma
época que parece empenhada em prescindir deles. Quantos secundariam hoje em dia
Václav Havel quando afirmava, durante a Revolução de Veludo, que poderia mudar o
mundo esgrimindo a verdade, o espírito livre, a consciência e a responsabilidade; sem
armas, nem vontade de poder ou arbitrariedade? Melhor não fazer o teste de contabilizá-
los. Basta dizer que se apalpa no ambiente que o desencanto e a decepção com os valores
liberais são intensos. Algo que impulsiona aqueles que, das fileiras populistas,
consideram que a democracia deve se despojar do liberalismo se quiser sobreviver e
defender eficazmente os interesses nacionais. Uma crítica que fundam na incapacidade
dos liberais na hora de lidar com a excepcionalidade permanente a que o mundo se vê
submetido desde a virada do milênio. A razão está em que não pode desenvolver um
decisionismo liberal a partir da liberdade, da lógica deliberativa, da tolerância, da
igualdade de oportunidades, do pluralismo e da defesa de um mercado não protecionista.
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Denuncia-o com valentia Rob Riemen, um dos poucos filósofos liberais que restam. Em
To Fight Against This Age (“lutar contra esta época”), ele nos lança uma advertência e
nos pede que, independentemente dos traços populistas, autoritários ou cesaristas que o
escondam, chamemos o fascismo por seu nome. Algo que exige sua denúncia e seu
combate. Atitudes que o liberalismo deve confrontar depois de atacar um esforço de
autocrítica que lhe faça pensar que coisas fez de ruim e, sobretudo, o que deixou pelo
caminho quando venceu na Guerra Fria e todos os povos do mundo pós-soviético
abraçaram suas ideias com entusiasmo.
Para isso, é preciso retroceder no tempo e compreender que o liberalismo nasceu como
uma trincheira contra o medo. Uma linha vermelha da qual protegeu a heterodoxia dos
dissidentes religiosos e o patrimônio destes frente ao todo-poderoso soberano. O primeiro
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Dois séculos e meio depois do seu nascimento, o liberalismo parece estar abatido perante
o ressurgimento do medo que tão eficazmente soube desativar no passado. Abre-se a seus
pés uma crise de fundamentação devido ao tsunami de incerteza que leva as sociedades
democráticas a desprezarem a cultura liberal dos direitos e ansiar por uma ordem
autoritária. Inclusive são cada vez mais os que desejariam encerrar-se dentro de um
bunker reacionário onde se refugiar da insegurança que lhes assedia emocionalmente. A
própria democracia parece inclinada a deslocar seu eixo de legitimação do liberalismo
para o populismo. Um fenômeno sem aparente explicação porque talvez não tenha sabido
detectar adequadamente a origem dos sismos que nos desestabilizam e que transformam
o pensamento liberal em papel molhado.
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que, entretanto, percute sobre a pele de mamífero que recobre a experiência coletiva e
individual da democracia e libera deslocamentos como a mencionada reaparição do
fascismo.
Adere a
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