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PARTIDOS POLÍTICOS NO
BRASIL
AULA 2

Profa. Karolina Roeder


CONVERSA INICIAL

Na aula passada, vimos para que servem os


partidos e como eles surgiram na Europa e no

Brasil Império. Agora, chegamos no


ano de 1889, na Primeira República e aqui aqueles partidos
(Conservador e
Liberal) não existem mais, foram extintos com o fim da monarquia Constitucional
e

ascensão da República Federativa. Vejamos quais partidos existiram na


Primeira República (1889-
1930), em qual contexto eles se formaram, como
funcionavam e o que defendiam, tendo em vista,

como em todas as nossas aulas, o


sistema de governo, a forma do Estado e o regime político da
época. Bons
estudos!

TEMA 1 – O CONTEXTO DE SURGIMENTO DOS PAÍSES


REPUBLICANOS

Em 1870, ainda no Império, o partido Republicano surgiu no


Brasil com a publicação do

“Manifesto Republicano”, datado naquele ano. Apesar


de ter feito propaganda de seus ideais, os civis
tiveram pouca influência na
derrubada do Império em 1889, havia dificuldade ou desinteresse em

mobilizar o
povo em prol da República (Motta,
1999). Não havia noção de cidadania e participação
popular, o historiador José
Murilo de Carvalho narra que, quando Marechal Deodoro proclamou a

República, o
povo assistiu “bestializado”, sem saber ao certo o que estava acontecendo (Carvalho,
1987). O próprio militar não era muito afeito às ideias republicanas.
As causas determinantes para a
formação do partido Republicano – muitas vezes,
emaranhadas – foram de ordem
econômica, cultural, militar e política. Econômica no sentido de que

a origem
do partido está estreitamente ligada às novas condições da lavoura de café, ao
deslocamento da lavoura cafeeira para a Zona da Mata e para o Sul e à nova
condição de trabalho
agrícola, capitaneado pelas influências da revolução
industrial e o fim da produção escravista.

Nessas regiões acabaram


concentrando-se, naturalmente, a agitação republicana. Além dos
militares, os
fazendeiros de café, proprietários de terra e advogados formaram o partido

Republicano. Culturalmente,   as causas foram a influência do positivismo,


estampado em nossa
bandeira (“Ordem e Progresso”). Segundo Franco, havia um
número pequeno de positivistas

praticantes, dentro e fora do Exército (Franco,


1974).

Os principais autores do
movimento republicano foram, portanto, os militares, mais
especificamente, o
Exército. A prova disto é que o primeiro presidente do Brasil republicano foi
um

militar, Marechal Deodoro da Fonseca. Como descreve o historiador Afonso


Arinos de Melo Franco,
“o Exército foi se tornando, no fim do Império, uma
espécie de partido “sui generis”, partido que

funcionava fora do jogo


constitucional, mas que nem por isso dispunha de menor prestigio” (Franco,

1974, p. 55). A proclamação da República foi a primeira intervenção


política dos militares em nossa

história e, a partir de então, estes se


tornaram figuras centrais nos acontecimentos do país,
retornando em outras
ocasiões (Motta,
1999).

Nós veremos que a falta de cidadania do povo brasileiro, a


opção pela forma federativa, o

sistema presidencialista, as ações das elites e


as intervenções militares influenciaram em nossa
participação política e, consequentemente,
na representação política partidária da população

brasileira.

TEMA 2 – O SURGIMENTO DOS PARTIDOS NA PRIMEIRA REPÚBLICA

Foi somente em 1894, após


a consolidação da República e a ocorrência de conflitos armados,
que “os
republicanos civis conseguiram se organizar e chegar à presidência do Brasil” (Motta, 1999,

p. 39). Quando seus fundadores lançaram o


Manifesto em 1870, todos eles estavam situados na

capital do Brasil, Rio de


Janeiro.

Seus fundadores
encontraram dificuldades em criar uma organização de caráter nacional. No

início do período, integrantes da elite nacional formaram alguns partidos


distintos, o Partido
Republicano Federal, o Partido Republicano Conservador
(1910) e o Partido Republicano Liberal

(1913) – tentativas frustradas de


partidos nacionais. Não saíram do papel e eram, no fundo,

manifestações de
causas pessoais, não ideológicas e programáticas.

Os grupos regionais
acabaram se organizando de forma independente, com núcleos em várias

províncias
e, após a proclamação da República, se firmaram como partidos estaduais,
destacando-

se nesse processo o Partido Republicano Mineiro, Partido Republicano


Paulista, Partido Republicano

do Rio Grande do Sul, entre outros. Este último


era o único que “levava a sério” o republicanismo
doutrinário e não apenas a
República de fato, segundo Chacon (1998).

TEMA 3 – O QUE PENSAVAM OS PARTIDOS NA PRIMEIRA


REPÚBLICA?

Os partidos regionais devem


ser pensados no contexto da implantação republicana. A República

foi
caracterizada por uma reação ao forte centralismo do Estado imperial. Os
problemas nacionais,
tais como a fraca representatividade dos partidos, a
corrupção eleitoral, eram atribuídos ao excesso

de centralismo do Império. Na
proclamação da República, adotou-se reformas com função

descentralizadora, com
o objetivo de diminuir o poder central e aumentar o poder dos governos

estaduais (ex-províncias) (Motta,


1999, p. 40).

O Brasil, a partir de então,


passou a ser composto por uma federação de estados autônomos e

independentes do
governo federal – clara influência dos Estados Unidos da América e sua

experiência com o federalismo, país estável, rico e com estados autônomos. A


nossa República
nasceu, portanto, sob forte influência dos ideais federalistas.
As unidades da federação, os estados,

contavam com várias prerrogativas, tal


como possuir cada estado a sua própria constituição e

presidentes (os
governadores de hoje), a constituição estadual deveria dialogar com a da
República,

que era a lei maior. Além disso, os estados criaram suas próprias
corporações militares (germe da
polícia militar) com estratégia de proteger a
autonomia estadual. Havia ainda grande desconfiança

com relação às instituições


nacionais. Tornou-se claro, então, o rompimento com a tradição

centralista
luso-brasileira (Motta,
1999).

A desconfiança para com


instituições nacionais, entretanto, influenciou na não formação de

partidos
nacionais. Os grupos republicanos tenderam a atuar de forma fragmentada, a
partir das

bases provinciais, das oligarquias locais, muito fortes naquele


período. Franco (1974) resume muito
bem a ideologia daquelas
elites quando diz que “a mentalidade republicana era federal em primeiro

lugar; em segundo, antipartidária, no sentido nacional”. Os partidos,


nesse período, refletiam a
política dos grandes estados.

Para além da imagem


federal que os governos passavam, havia o corpo nacional e sua unidade

precisava se apoiar em algo, na falta de um partido nacional. Isso resultou na


alternância de poder
entre Minas Gerais (partido Republicano Mineiro) e São
Paulo (partido Republicano Paulista). Dessa

maneira, acabou se consolidando uma


estrutura partidária estritamente regional, representando as

oligarquias
existentes, dominando o poder sem dar espaço a qualquer outra força. Não havia

competição partidária, o partido oficial sempre ganhava as eleições, mesmo


porque era raro
aparecer alguma corrente disposta a disputar. A competição
ocorria de fato no interior dos PRs,

entre facções que disputavam a estrutura


partidária, já que a simples indicação do partido como

candidato à presidente
estadual, já significava ser eleito. A competição ocorria, portanto, no
interior
dos partidos (Motta, 1999).

TEMA 4 – QUEM OS PARTIDOS REPUBLICANOS REPRESENTAVAM?

Na Primeira
República ainda não havia democracia no Brasil, no sentido moderno de

democracia, conceituado por Dahl (2012) a partir dos critérios de


inclusividade e existência de

oposição. A falta de representatividade ainda era


muito grande e os partidos davam voz apenas às
classes dominantes,
proprietários rurais (coronéis) e integrantes das oligarquias locais. Além
disso,

a corrupção eleitoral continuou tão grande quanto no Império.

No que diz
respeito ao sufrágio, nesse período foi ainda mais restrito, e quantitativamente
pior

que no Império. Com a exclusão dos analfabetos, que perderam o direito ao


voto, foram excluídos
80% dos homens maiores de idade, já que naquela época o
analfabetismo era muito comum. Além

disso, houve uma elevação da renda mínima


exigida para os eleitores, e as eleições passaram a ser

diretas, sem distinção


como havia antes (Motta, 1999, p. 45). Podemos conferir
na Tabela 1 o
percentual da população que participou das eleições parlamentares
dos anos de 1872 e 1886. As

mulheres ainda não tinham direito ao voto.

Tabela 1 - Ano e percentual da


população participante das eleições

Ano eleição Percentual da população


1872 11%

1886 0,80%

1894 2,2%

1930 5,6%

Fonte: Motta
(1999) (adaptado pela autora)

Esperava-se que,
com a exclusão dos analfabetos, as fraudes nas eleições, como o voto de

cabresto, diminuiriam. No entanto, o único desdobramento dessa legislação foi a


exclusão do
processo eleitoral de grupos sociais inferiores. Apesar de essa
legislação ter sido criada ainda no

Império, em uma reforma eleitoral de 1881,


foi tácita a aprovação dos republicanos da Velha
República, não a alterando, mantendo-a
da mesma maneira. A única alteração feita pelos

republicanos foi a exclusão do


critério de renda, ação notadamente de inspiração democrática, mas

com baixo
resultado nas eleições seguintes, como podemos ver na tabela acima. As eleições
de

1930 foram as mais concorridas da Primeira República (Motta, 1999).

TEMA 5 – ORGANIZAÇÃO DOS PARTIDOS NA PRIMEIRA REPÚBLICA

A Primeira
República foi ainda menos plural e inclusiva que o período imperial, critérios

determinantes para a existência de democracia. No Império, havia partidos e projetos


distintos e

concorrentes, o Liberal e o Conservador, enquanto no primeiro


período republicano o poder era

concentrado nos partidos republicanos, que


detinham a hegemonia dos partidos e do poder. Fatores

exógenos à organização
são importantes para entendermos a ausência de organização dos partidos

republicanos. Em 1889 a 1930, a maioria da população brasileira vivia na zona


rural (entre 70 a 80%)

e as pessoas mais ricas e influentes eram os coronéis,


proprietários de terras (Motta, 1999). Aqui
nos valemos do conceito
de Victor Nunes Leal:

Concebemos o
coronelismo como resultado da superposição de formas desenvolvidas do regime
representativo a uma estrutura econômica e social inadequada. Não é, pois, mera
sobrevivência do

poder privado, cuja hipertrofia constituiu fenômeno típico de


nossa história colonial (...) Uma

adaptação em virtude da qual os resíduos de


nosso antigo e exorbitante poder privado tem
conseguido coexistir com um regime
político de extensa base representativa. (Leal, 1948, p. 20)

A maior parte da população era analfabeta, não conhecia seus


direitos, tampouco sabia como

reivindicá-los. Não havia organizações sociais


que canalizavam as demandas da população, os
partidos, como mostramos acima,
representavam os interesses de uma elite bastante específica,
não cumpriam a
sua função nos termos dos partidos modernos.

NA PRÁTICA

A participação feminina na
política ainda não era realidade na Primeira República. Hoje, no

Brasil, as mulheres representam 52% da população. Na Câmara dos


Deputados elas ocupam 9,9%
das cadeiras e no Senado, 13%. O Brasil está atrás
da média mundial, de 22,1% (União Inter-

Parlamentar, 2014) e, entre 190 países,


ocupa a 116ª posição no ranking de representação feminina

no Legislativo.
Países como a Argentina (40%), Finlândia (41,5%), Suécia (47%) e Ruanda (48,8%)

estão muito à frente no que se refere à representação feminina. Nosso


parlamento está distante da

pluralidade da sociedade e os partidos políticos, com


sua organização e possibilidade de distribuir

incentivos aos filiados e


filiadas, têm o papel de canalizar essas demandas.

FINALIZANDO

Sendo a política
regionalizada e os pleitos resultados de costuras políticas entre oligarquias

partidárias estaduais, durante a “política dos governadores” (acordos entre o


presidente da república

com os líderes dos estados), não havia necessidade de partidos


estruturados, fortes e organizados

funcionando, ou melhor, podemos pensar que


partidos assim não existiam por não haver um terreno

propício. A grande parcela


da população não participava do escrutínio, logo, não era representada e

não podia
se organizar em partidos. Os partidos republicanos regionais da Primeira
República se
caracterizaram, portanto, pela política regional, das oligarquias
regionais, com irrisória

representatividade da população.

REFERÊNCIAS

CARVALHO,
J. M. de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São
Paulo:

Companhia das Letras, 1987.

CHACON,
V. História dos Partidos Políticos Brasileiros. Brasília: Editora Universidade
de Brasília,

1998.
DAHL, R.
Poliarquia: Participação e Oposição. São Paulo: Editora da Universidade
de São Paulo,

2012.

FRANCO,
A. A. de M. História e Teoria dos Partidos Políticos no Brasil. São
Paulo: Alfa-Omega,

1974.

LEAL,
V. N. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo
no Brasil. São

Paulo: Alfa-Omega, 1948.

MOTTA,
R. P. S. Introdução à História dos Partidos Políticos Brasileiros. Belo
Horizonte: Editora

UFMG, 1998.

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