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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Monteiro, José Lemos, 1944-


Morfologia Portuguesa /José Lemos Monteiro.
4' edição revista e ampliada. -Campinas: Pontes, 2002.

Bibliografia
ISBN 85-7113-056-6

1. Português - Morfologia 1. Título

91-2056 CDD-469.5

Índices para catálogo sistemático:

1. Estrutura da palavra: Português: Lingüística 469.5


2. Morfologia: Português: Lingüística 469.5
3. Palavras: Estrutura: Português: Lingüística 469.5
Sabemos já que existem dois tipos de flexão: a interna, realizada mediante
a ocorrência de morfes alternantes, e a externa, em que as categorias gramati-
cais são indicadas por meio de sufixos denominados de desinências.

Revisemos algumas noções básicas sobre o m.ecanísmo das oposições


desinenciais:

Para os verbos há duas flexões: uma que marca o modo e o tempo (desinência
modo-temporal), outra que indica o número e a pessoa (desinência número-
pessoal). Como o paradigma verbal enquadra diversos tempos e modos, é lógico
que existem bastantes marcas desinenciais nas conjugações verbais portuguesas.
Por outro lado, em relação aos nomes (substantivos e adjetivos) e prono-
mes, no máximo há quatro desinências, conforme o seguinte esquema:

masculino - 0
Desinência de gênero (DG)
feminino [a]

singular - 0
Desinência de número (DN)
plural - [s]

Observemos que nem todo nome ou pronome possui essas quatro


subcategorias. Estruturalmente, uma subcategoria sempre se opõe a outra. Ou
seja, uma palavra só apresenta a marca do masculino se tiver um feminino
correspondente. Não há plural sem singular e vice-versa.
Os masculinos saco, ele, doutor, ateu e espanhol estão marcados pela
desinência zero (0) que se opõe ao morfe [a] dos femininos saca, ela, douto-
ra, atéia e espanhola. Quer dizer: há uma oposição entre dois morfes. Como
*
um deles está presente e o outro, ausente ([a] 0 ), diz-se que há uma oposi-
ção privativa.

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Pela adjunção de sufixos, temos um processo morfológico, porém
Há dois tipos de oposição na estrutura da língua: a privatíva (ou derivacíonal. Em vez de casa, se anexarmos sufixos, diremos casarão ou casi-
contraditória) e a eqüipolente (ou polar). Oposição privativa é aque- nha. Os morfes aditivos não são desinências . mas sufixos derivacionais.
la em que uma determinada marca se opõe à ausência de marca numa Através do emprego de adjetivos, temos um processo puramente sintático.
forma correspondente. Em bonito ot bonitos há oposição privativa A forma do substantivo permanece sem nenhuma alteração. Para casa usamos
porque o [s] se opõe ao vazio (0) do singular. Oposição eqüipolente é o adjetivo ou pequena, sem que a palavra sofra flexão, embora expres-
a que ocorre entre formas que apresentam marcas distintas, sem que se a noção de grau aumentativo ou diminutivo.
nenhuma delas ausente. Em ot o [mos] se De modo igual se comportam os adjetivos. Estes se submetem aos graus
ao [ ) vez que ambas as desinências es- e sempre mediante processos derivacionais ou expe-
tão presentes. dientes de natureza sintática.
pode ser de de inferioridade e de
Notemos que em vocclbulos como não há Em caso, o adjetivo deixa de sofrer alteração mórfica.
quer marca para o masculino, porque faltam os femininos *sacrária e
*cinzeira. Exemplificando:
De modo análogo, em caneta, criatura e o [a] final
não constitui desinência de género, mas vogal temática. Será erro considerar João é tão inteligente quanto Maria. (igualdade)
o morfe zero como traço desinencial opositivo do gênero das palavras cita- João é menos inteligente que Maria. (inferioridade)
das. O zero deve ser usado sempre na ausência de rnorfe,jarnais na inexistência João é mais inteligente que Maria. (superioridade)
de morfema.
Com relação a formas do tipo casa e O superlativo se obtém por meio de mortes derivacionais, corno em belíssimo
se fala em desinência de gênero, embora haja as formas caso e e celebérrimo. Mas, além desse recurso, existem diversas possibilidades de
carteiro. É que falta a correspondência semântica, fundamental na caracteri- formação, que eliminam o caráter obrigatório e sistemático específico do me-
zação do gênero. canismo flexional. Entre essas possibilidades, citamos:
Todo possui o morfe zero em oposição ao [a] e outro zero contrastivo
com o [s] do plural. Já no pronome tudo não há zeros flexionais, pois não a) Repetição do adjetivo
ternos *tuda nem *tudos. Ex.: Isto é lindo, lindo, lindo! (= lindíssimo)
O [a] final dos substantivos comuns de dois gêneros não deve ser conside-
rado desinência de feminino, já que no masculino ele também está presente. b) Uso de formas aumentativas
Ex.: Aquele rapaz é valentão! (=valentíssimo)
Trata-se de um [a] temático que elimina a desinência [a] pelo fenômeno da
crase. Assim: dentista + a = dentistaa --+ dentista.
c) Uso de formas diminutivas
Assim sendo, o paradigma flexional dos nomes portugueses é sempre esta-
Ex.: O caçula é queridinho. (= queridíssimo)
belecido por oposições desinenciais. O feminino se caracteriza por um [a], que
contrasta com a ausência de desinência do masculino. O plural é marcado por d) Emprego dos morfemas [ultra], [hiper], [arqui], [super] etc.
um [s], que não aparece no singular. Lembremos, pois, que a marca da flexão Ex.: É um avião ultra-rápido (=rapidíssimo)
é sempre urna desinência.
Daí deduzimos que, para os nomes, só há flexão de gênero e de número. O e) Breves comparações
grau não deve ser entendido como flexão, já que se forma através de processos Ex.: Ele é forte como o diabo. (=fortíssimo)
inteiramente diversos.
Vejamos: f) Expressões idiomáticas
O grau dos substantivos se divide em aumentativo e diminutivo. Em ambos Ex.: Ela é linda de morrer! (=lindíssima)
os casos, há pelo menos duas possibilidades de formação: a adjunção de sufi-
xos ou o emprego de determinantes que modifiquem o conteúdo semântico Por outro lado, a superlativização do adjetivo não obedece a qualquer víncu-
com o acréscimo das noções de grandeza ou pequenez. lo de concordância com o substantivo. Ou seja, o grau acontece para o adjetivo,

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sem que necessariamente ocorra para o substantivo. Em rapaz,.,,,,.,..,.,....,""''""""' c) Aplicação do morfema subtrativo que, ao contrário do aditivo, consiste
o substantivo se mantém sem marcação de grau. O aumentativo ou diminutivo na supressão de do corpo fónico da Ex.: réu ~ ré.
também não determina qualquer processo de concordância. A não ser assim, em
vez de criancinha teríamos que dizer criancinha lindinha. *
d) Alternância vocálica lê/ fé! ou ló/ '1- ló/, de caráter redundante, além da
Por todas essas razões, é necessário desfazer esse equívoco de nossas gra- desinência de feminino. Ex.: este+ a= estea ~ esta; sogro +a= sogroa ~sogra.
máticas. Câmara Jr. (1971: 50) comenta:
Sistematicamente, se existir alternância vocálica no feminino, tam-
Na realidade o que se tem com os superlativos é urna bém haverá na formação do plural. Para saber se o plural tem o timbre
muitos como para muitos substantivos há a fechado ou basta comparar com o feminino. Assim: caridoso (ô)
diminutivos e para a dos aumentativos. Em outras caridosa (ó)·-+ caridosos (ó); ovo (ô)- ova (ó)~ ovos (ó). Ao contrá-
do grau não é um processo em rio: esposo (ô) - esposa (ô)~ esposos (ô). As citam como
porque não é um mecanismo e coerente, e não estabelece é sogros (ô), em vez de sogros (ó).
exaustivos e ele termos exclusivos entre si.
Resta-nos agora interpretar alguns casos um pouco mais complexos:
Os gramáticos que falam emflexão de grau encontram problemas em clas-
sificar o advérbio como palavra variável ou invariável, já que, tal como o adje- • Nomes em -ão
tivo, ele possui os graus comparativo e superlativo. Ora, esse problema não
simplesmente porque o grau não é flexão e com isso o advérbio, em Se o nome terminado concretamente em [ão] no singular possuí a forma
qualquer caso, continua sendo uma palavra invariável. teórica em [õe] (tirada do plural), há pelo menos duas possibilidades para a
.i~. . gora, examinemos com certa cautela as ílexôes norninais. Tratare1nos da
formação do feminino:
formação do feminino e do plural, observando as aparentes irregularidades,
a) Desnasalização após a queda da vogal temática. Ex.: leitão~ *leitõe
tentando compreendê-las de modo coerente.
+ a = leitõea ~ leitõa ~ leitoa.
FLEXÃO DE GÉNERO
b) Desenvolvimento de umq. consoante nasal /n/ antes do acréscimo da
desinência, quando [ão] for um sufixo aumentativo. Ex.: valentão~ *valentõe
O feminino se enquadra numa regra única: adjunção da desinência [a] com ~ valentõ ~ valenton + a.
a supressão da vogal temática, se esta estiver presente no masculino:
Se o nome terminado em [ão] no singular não faz o plural em [ões], a
autor + a autora formação do feminino pode ser interpretada de duas maneiras:
juiz + a = juíza
o+ a oa ~a a) Após a adjunção da desinência, queda da vogal temática e conseqüente
justo + a= justoa ~ justa elisão do [a] desinencial. Ex.: anão+ a= anãoa ~ anãa ~anã.
jarro + a = jarroa ~ jarra
aluno+ a= alunoa ~ aluna b) Simples supressão da vogal temática, sendo o feminino marcado por
oitavo+ a= oítavoa ~ oitava um morfema subtrativo. Ex.: órfão~ órfã; irmão~ irmã.

Há algumas situações que parecem formar novas regras, mas constituem • Nomes com alomorfia na raiz
simples casos de alomorfia:
a) Ocorrência do morfe alternativo /ô/ - ló/, em vez da desinência de fe- Em pares do tipo:
minino. Ex.: avô~ avó.
rei ~ rainha
b) Além de uma alternância vocálica redundante, inserção de um iode
abade ~ abadessa
para evitar o hiato, após o acréscimo da desinência e elisão da vogal temática.
diácono ~ diaconisa
Ex.: ateu+ a= ateua ~atea~ atéia.

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considera-se que na forma feminina, além da desinência [a], existe um sufixo no de genro deveria ser genra. Como não existe na língua, apelamos para a
derivacional. contudo, que sincronicamente o valor semântico des'se heteronímia ou processo supletivo, outra palavra que possa suprir
sufixo se esvaziou completamente, razão por que julgamos conveniente não essa lacuna. Mas no caso não há flexão de Outros exemplos:
segmentá-lo. Para nós, [raính], [abadess] e [diaconis] são respectivamente
alomorfes de [re], [abad] e [diacon]. cavalo -7 égua
cão -7 cadela
O mesmo se aplica aos seguintes exemplos: boi -7 vaca
pai -7 mãe
cônsul -7 consulesa bode -7 cabra
herói -7 heroína
maestro -7 maestrina Nomes de gênero único
príncipe -7 prmcesa
profeta -7 profetisa Sernelhantemente ao item anterior, substantivos como
tribo e sentinela não podem morficamente ser considerados como masculinos
Seria de esperar que os masculinos de tais substantivos fossem u,,."",,..""'· ou femininos, porque lhes falta o traço desinencial contrastivo. Entretanto, a
e inexistência de oposição na estrutura mórfica é compensada por oposições na
Por diversas vezes, já comprovamos que mesmo professores e alunos de estrutura sintática.
Letras não têm consciência da presença do sufixo. Por incrível que pareça, até Com efeito, tribo e sentinela se enquadram na subcategoria do
em poucos destacam o elemento [inha]. E, quando o fazem, perce- feminino, uma vez que os determinantes que os acompanharem terão que estar
bem que o conteúdo semflntico se toínou vazio. no ferninino. Assín1, en1 o substantivo é reconhecido co1no
Associamos a este fato, em favor de nossa interpretação, a freqüente feminino mediante um critério puramente sintático. De igual modo, em cadá-
discordância em relação ao ra] final dessas formas, tido por uns como desinência ver o termo principal é enquadrado sintaticamente na subcategoria do
de gênero e por outros, como vogal temática. Não se verificando a marca masculino, marcada pelo gênero do determinante frio. Às vezes, porém, é o
derivacional, é evidente que o la] indicará o feminino, classificando-se pois determinado que indica o gênero do determinante (cf. moça inteligente).
como desinência.
A alomorfia no radical funciona como um traço redundante na distin- A maioria dos temas em [e] deixa de apresentar flexão de gênero
ção dos gêneros, urna vez que de fato a flexão se opera pela desinência. (cf. ponte, dente, poente, cliente, forte etc.). Os que apresentam se-
Assim, os casos analisados acima parecem bem semelhantes aos que se guem a regra geral: parente + a = parentea -7 parenta; chefe + a =
seguem: chefea -7 chefa; mestre + a = mestrea -7 mestra.

frade -7 freira As gramáticas portuguesas dizem que os substantivos, além de masculinos e


judeu -7 judia femininos, podem ser sobrecomuns, comuns de dois e epicenos. Na realidade, só
meu -7 minha há dois gêneros. O substantivo epiceno onça é privativamente feminino, ao pas-
teu -7 tua so que o sobrecomum cadáver é masculino. Analisando por esse ângulo, enten-
demos que os nomes portugueses se diversificam em três grupos, a saber:
Em todos esses exemplos, encontra-se a marca flexional do feminino, em- a) nomes de gênero único
bora as raízes estejam em variação mórfica. Ex.: (a) tribo, (a) flor, (o) cadáver, (a) vítima.

• Gênero heteronímico b) nomes de dois gêneros não marcados por flexão


Ex.: (o, a) estudante, (o, a) cliente, (o, a) dentista.
Há substantivos masculinos que não têm femininos con-espondentes em
termos morfológicos. Mulher não é feminino de homem; é apenas uma pala- c) nomes de dois gêneros marcados por flexão
vra privativamente feminina que supre a falta da flexão de homem. O femini- Ex.: (o) leão - (a) leoa, (o) filho - (a) filha.

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E SEXO Outros exemplos:

Há um certo equívoco de nossos gramáticos na associação que costumam barco - barca lenho - lenha
fazer entre gênero e sexo. André (1974:93) define: "Gênero é a propriedade bolso - bolsa madeiro - madeira
que tem o nome de representar o sexo real ou convencional dos seres". Cegalla braço - braça manto - manta
(1976), com o mesmo conceito, fala em "sexo real ou fictício". Ora, os mais caneco - caneca mato - mata
simples raciocínios comprovam o engano. O gênero é uma categoria gramati- cesto - cesta ovo - ova
cal; o sexo é um conceito biológico. As correspondências nem sempre ou qua- chinelo - chinela poço poça
se nunca ocorrem. Citemos apenas três ~11.ua•~u,,~ cinto - cinta porto -
barraco - barraca sapato - sapata
a) Inúmeros substantivos objetos ou abstra- iarro - tamanco - tamanca
sem que por isso deixem de no masculino ou no feminino. horto horta - tampa
Ex.: a alma, a justiça, o jarro.
Conforme raciocina Lang (1990), nesses casos, o morfe [a] é usado para
b) Há termos sinônimos de gêneros distintos. Ex.: a ave e o pássaro, a marcar diferenças de dimensão entre o masculino e o feminino, de maneira
criança e o menino. muito semelhante à adjunção de sufixos aumentativos.
Observe-se que os derivados com o sufixo [dor] parecem manter essa distin-
c) Certos substantivos mudam de gênero no aumentativo ou diminutivo. ção. Assim, secador e secadora se distinguem pela noção de tamanho ou forma,
Um mulherão tem o mesmo sexo feminino de uma mulher ... menor para o masculino, maior para o feminino. Parece ser esta a razão da escolha
entre as formas feminina e masculina do sufixo na produção de um derivado. Por
pois, necessário ter em mente a seguinte observação de Gleason Jr. isso, tem-se abridor (objeto pequeno) e lavadora (máquina de lavar).
(1978:240):
DESINÊNCIA DE GÊNERO OU SUFIXO?
Nas línguas européias existe certa correlação entre o género e o sexo. Ela
reflete-se nas nossas designações tradicionais de masculino, feminino e Alguns autores entendem que o morfe [a], marcador do gênero feminino,
neutro. Contudo, tal correlação pode ser extremamente vaga. Os nomes de se alista entre os sufixos derivacionais, quando o vocábulo for um substantivo.
muitos objetos assexuados são atribuídos ao masculino ou ao feminino, Nessa linha, Bechara (1999) parece defender a idéia de que inexiste o processo
mesmo nas línguas que possuem o neutro. flexional na distinção entre os gêneros dos substantivos. E Azeredo (2000),
acatando a mesma opinião, afirma que a análise do gênero como flexão, embora
Hjelmslev (1976) alude à hipótese defendida por Gabelentz, segundo a muito difundida e consolidada, precisa de uma reformulação. A rigor, segundo
qual, num determinado período antigo (pré-histórico), empregou-se o gênero tais estudiosos, em lobo - loba tem-se uma derivação, desde que as formas do
somente com uma significação de sexo, mas depois tal emprego se estendeu, masculino e do feminino expressam significações inerentes diversas.
por analogia, a outros casos e ao mesmo tempo perdeu sua significação. E É evidente que, sendo a hipótese difundida por nomes consagrados como os
Hjelmslev (1976: 152) conclui: "a categoria de gênero teve um conteúdo se- de Bechara e Azeredo, não é para ser desprezada sem uma reflexão mais acurada.
mântico, porém já não o tem; é uma relíquia de algo ultrapassado." A favor dela há, entre outros, o argumento de que o morfe [a] não se aplica
sistematicamente a todos os substantivos. Mas esse mesmo argumento poderia
GÊNERO E ESPÉCIE valer, por exemplo, para os chamados adjetivos uniformes (doente, etc.).
Desse modo, o grande problema para a aceitação da proposta reside no fato
O masculino, em muitos casos, mantém com o feminino uma relação do de que, morficamente, o adjetivo tem sob esse aspecto o mesmo comportamento
tipo gênero e espécie. Assim, sob o aspecto do significado, pode-se entender do substantivo. Como se pode entender que ambos são nomes, apenas diversifi-
que, enquanto o nome no masculino tem uma aplicação genérica, o do femini- cados quanto à função, afirmar que ocorre flexão, quando se trata de adjetivo, e
no quase sempre tem um sentido mais específico. No par fruto - fruta, o pri- derivação, quando o nome é substantivo, termina descaracterizando a flexão e a
meiro elemento é não-marcado. derivação como processos morfológicos. Se a coerência e a simplicidade são

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princípios que devem nortear uma boa descrição, parece que tais princípiqs Casos especiais:
deixam de ser levados em conta, ao se admitir que o [a], embora seja desinência
de gênero nos adjetivos, é sufixo derivacional nos substantivos. 1- Se o nome termina por uma consoante/ 1/, !si, lzl ou Ir/, pressupõe-se
Além disso, há outros fatos complicadores. Conforme explica Azeredo uma temática teórica [*e], depois se acrescenta a desinência:
(2000: 111 ), em vocábulos que são potencialmente substantivos e adjetivos
mal -1 *male + s males
embaixador, sabichão etc.) "existem contrapartes femininas regu-
larmente formadas por flexão". Ora, a nosso ver, insistimos mais uma vez, subs- cônsul -1 *cônsule + s cônsules
vez -1 *veze + s vezes
tantivos não são classes de mas · o capítulo final
mês -1 *mese +s meses
sendo pouco encontrar-se um critério capaz de
um nome funciona exclusivamente como ou como elixir -+ *elixire + s elixires
substantivo. Os que se caracterizam como substantivos (inte-
O /e/ que aparece antes do /s/ é de fato vogal temática.
em não de caso em que o
se presente, náo é desinência nem muito menos sufixo derivacional. no entanto, preferem outras explicações. Silva & Kock (
a terminação -es alomorfe de /si. Azevedo Filho dá uma
Por outro lado, se entendermos que em pares do tipo coelho e coelha náo
se tem a mesma palavra, porém duas palavras distintas, o que dizer dos interpretação ainda menos adequada: "Em alguns exemplos, há uma vo-
pronomes ou numerais que admitem a oposiçáo de género? Os femininos gal de ligação entre o lexema e o morfema de plural". (grifo nosso)
ela, duas etc. seriam também palavras distintas dos masculi-
nos correspondentes? Se o nome terminado em Is! for não se a
Por essas razões, parece prudente manter nesse ponto a tradição gramati- o plural será marcado apenas sintaticamente (cf. o lápis -7 os
cal que considera a marca mórfica de género como um mecanismo flexional.
Mas o assunto continua polêmico e merece novos estudos. Geralmente os que possuem forma teórica em *le sofrem algumas altera-
ções morfofonêmicas depois da adjunção da desinência:

*carnavale + s = carnavales -1 carnavaes -1 carnavais


A flexão de número se resume numa única regra: o acréscimo do [s] ao *azule+ s =azules -1 azues -1 azuis
singular. *coronele + s coroneles -1 coronees -1 coronéis
*lençole + s = lençoles -1 lençoes -1 lençóis
Exemplos:
Ou seja: acréscimo da desinência, síncope da líquida intervocálica e
vítima+ s =vítimas ditongação. Se a vogal antes de *le for /i/, há duas possibilidades:
mesa + s = mesas
• /i /(átono)
O [s] é a marca privativa do plural, oposta ao vazio do singular. Mas este
[s] possui alomorfes, como /z/ em mesas altas, que se pronuncia /mezazaltas/ *fóssile -1 *fóssele + s = fósseles -1 fóssees -1 fósseis
Trata-se de um arquifonema, sempre representado na escrita por s, fato que
nos faz conservar esta letra para designar o morfema do plural, qualquer que Antes de receber a desinência, ocorre a permuta do /iJ para /e/. Depois,
seja a sua realização. síncope e ditongação.

O termo arquifonema costuma ser usado com referência ao fonema • /i/ (tônico)
que apresenta diversas realizações. Assim, dependendo de fatores como
o ambiente, o /s/ pode ser pronunciado /s/ (lutas), /z/ (lutas atrozes), /xi *barrile -1 barriles -1 barries -1 barriis -1 barris
(lutas cruéis), /j/ (lutas graves).
Acréscimo da desinência, síncope do/!/, ditongação e crase.

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II- Os nomes terminados concretamente em oferecem certa dificuldade 2.bistribua os nomes abaixo em três grupos: I - os de gênero único; II - os de
na interpretação do Devemos distinguir três possibilidades: dois "gêneros sem flexão; UI - os de dois gêneros com uma flexão redundante.

a) O plural se forma regularmente, sem registro de qualquer alomorfia: abelha - chefe - cônjuge - aprendiz - onça - colega - pulga - mesa - saco -
chinelo - indivíduo - aluno - pessoa - mestre - soprano - solista - personagem -
cristã+ o+ 0 cristã+ o+ s ferrugem - pavão - professor
mã +o+ 0 mã +o+ s
3 Explique a formação do feminino em:
b) Antes de receber a desinência [s], dá-se a troca do por a) bisavô ~ bisavó
b) mau ~ má
capitã + o + 0 ~ +e+s c) duque ~ duquesa
cã +o+ 0 ~ cã + + s d) --+ poetisa
+o+0 ~ +e+s e) solteirão ~ solteirona

c) Além da troca da vogal temática, há uma alternância na vogal /ã/ do 4. Descubra a diferença semântica entre os femininos:
radical: a) embaixadora e embaixatriz
b) trabalhadora e trabalhadeira
sermã +o+ 0 ~ sermõ +e+ s c) imperadora e imperatriz
paixã +o+ 0 ~ paixõ +e+ s
5. Forme e explique os plurais de:
Deve-se buscar sempre a forma básica no plural, sobretudo para a forma- a) açúcar g) pastel
ção de derivados em que geralmente desaparece o til ou se desenvolve um /n/: b) café h) anzol
c) ananás i) réptil
*limõ +e ~ limoeiro d) abacaxi j) anelzinho
*cã +e ~ canil e) virgem k) · girassol
*sã+ o ~ sanar ônibus 1) qualquer
*barõ +e ~ baronesa
*carvõ +e ~ carvoeiro /6.Jndique, nas palavras abaixo, aquelas em que o [a] constitui desinência
*ferrõ +e ~ ferroada de gênero:
*botõ +e ~ abotoar a) aquela f) as
b) jarra g) besta
EXERCÍCIO V c) bolsa h) criança
d) vaca i) duas
·(i") A flexão nominal é quase sempre redundante. Em moça bondosa, e) rainha j) mestra
além da desinência [a], o feminino de bondoso é marcado por um processo
sintático (concordância com o substantivo) e pela alternância da vogal tôni- 7. Coloque nos parênteses VT (Vogal temática) ou DG (Desinência de
ca /ô/ - ló/. Identifique nos exemplos abaixo as redundâncias na flexão de gênero) para a vogal final do primeiro componente de cada exemplo abai-
gênero ou de número: xo:
a) o leitão ~ a leitoa ( ) aluno-mestre ( ) decreto-lei
b) teu sogro~ tua sogra ( ) cirurgião-dentista ( ) boa-vida
c) a florzinha~ as florezinhas ( ) quinta-feira ( ) mestre-escola
d) o papelzinho ~ os papeizinhos ( ) tenente-coronel ( ) cabeça-chata
e) a obra-prima~ as obras-primas ( ) manga-rosa ( ) peixe-espada

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