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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

O campo de estudo da semântica


Profª. Veridiane Pinto Ribeiro

Descrição

O estudo do significado na comunicação em Libras, a partir de


aspectos semânticos e pragmáticos.

Propósito

Compreender os aspectos semânticos e pragmáticos na Libras para


trabalhá-los nas relações de significado
nos processos linguístico-cognitivos.

Objetivos

Módulo 1

Objeto de estudo e conceitos básicos da Semântica


Identificar o objeto de estudo e conceitos básicos do campo da Semântica da Libras.
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Módulo 2

Fenômenos semânticos

Classificar os fenômenos semânticos na Libras.

Módulo 3

Produção do sentido nas línguas naturais


Identificar a produção de sentidos nas línguas naturais.

Introdução
Neste conteúdo, vamos estudar as relações entre signo,
significante e significado, e as implicações
de sua identificação nos processos
linguístico-cognitivos da Libras, seja como primeira ou segunda
língua.

Também entenderemos os fenômenos semânticos que ocorrem


nos estudos em que os léxicos
passam por processos que envolvem sinonímia e antonímia,
parônimos, polissemia e homonímia,
além dos campos lexical e semântico. Estudaremos como
analogias de fenômenos linguísticos entre
as línguas orais-auditivas e as línguas
visuo-corpóreo-espaciais mostram o potencial semântico em
ambas as línguas.

Na produção do sentido nas línguas naturais, entenderemos


o quanto a análise do discurso e a
pragmática, em seus atos da fala, podem ajudar os
usuários da língua a interpretar diferentes
contextos e a produzir língua de forma coerente
conforme sua intenção comunicativa na Libras.

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1 - Objeto de estudo e conceitos básicos da Semântica


Ao final deste módulo, você será capaz de identificar o objeto de estudo e conceitos básicos
do campo da Semântica da Libras.

Retomando os conceitos de signo, significante,


significado e semântica
Para falarmos de estudos semânticos, é preciso
retomar alguns conceitos.

Você deve se lembrar de que os estudos


linguísticos foram marcados pelo início do século XX, quando o
linguista Ferdinand
de Saussure, em histórica contribuição, empoderou os estudos desta área com análises
descritivas. Desde então, a linguística passou a receber status de ciência e o
estruturalismo ganhou força
em meio à comunidade científica da época.

Saussure defendia que o objeto de estudo da


Linguística é o signo linguístico. No signo linguístico, temos
associados um
conceito (significado) e uma imagem acústica ou mesmo ótica (significante).
Significado e
significante são entidades abstratas ou entidades mentais.

Saussure se debruçou sobre as particularidades do


signo linguístico e o complementou, revelando que, em
sua essência, além de
significante e significado, temos, coexistindo, mais dois conceitos:
arbitrariedade e
linearidade.
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Arbitrariedade

O signo é arbitrário = cultural


Sem motivação
Som ≠ Sentido

add
Linearidade

Sucessão temporal ou espacial


Um som depois do outro
Uma palavra depois da outra

Esses conceitos podem ajudar a compreender os


processos construtivos da língua. Vamos ilustrar e
exemplificar de forma mais
concreta os conceitos de arbitrariedade e linearidade:

Em português = CASA

Em inglês = HOUSE

Em português = GATO

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Em inglês = CAT

A arbitrariedade não apresenta motivação para a


existência deste ou daquele signo linguístico. A forma não
tem relação com o
significado. Cada língua vai adotar um signo linguístico que não necessariamente tem
relação entre o som e o significado. Porém, o signo é social, é uma construção
social, um significado social.
A arbitrariedade não atribui ao individual a livre
escolha. Saussure nos alerta que este fenômeno ocorre nas
relações sociais.

O linguista, entretanto, distingue o que vem a


ser absolutamente arbitrário e relativamente
arbitrário. Nos
exemplos apresentados, “casa” e “gato”, pode-se
considerar que temos signos absolutamente arbitrários,
pois não há motivação entre
signo, significante e significado. Já para alguns signos como “Parabrisa”,
temos uma
arbitrariedade relativa, pois a função do vidro frontal do carro é bloquear vento e
chuva, ou seja,
“parar a brisa”, gerando “para+brisa”, desta forma o signo foi
criado a partir de uma motivação, na intenção
de criar um nome que representasse a
função do objeto. Porém, ao separarmos as palavras “para” e “brisa”,
estas voltam a
sua origem arbitrária.

Em linguagens simbólicas, tal fenômeno de arbitrariedade absoluta não se aplica.

Essa é uma linguagem simbólica. Ao


visualizarmos a imagem apresentada, conhecemos seu significado:
“veneno” ou
“perigo”. A motivação para a criação de tal símbolo é a relação com a morte,
caracterizada pela
imagem da caveira. Trata-se de uma linguagem cujo símbolo
que retrata não parte de uma arbitrariedade,
mas de uma motivação, de um
significado. A mesma coisa pode ocorrer numa comunicação mais semiótica
expressa nas artes visuais, na música, no cinema ou nas fotografias.

Na linearidade, Saussure nos apresenta a


necessária sucessão temporal ou espacial dos signos, fazendo
com que sua disposição
obedeça a uma ordem, na qual um vem logo depois do outro, tornando impossíveis
construções de sons ou palavras num mesmo espaço e tempo, quando expressas por um
mesmo sujeito.

m–e–n–i–n–o
Uma criança do sexo masculino não pode ser chamada de “nimeno” na
língua portuguesa, há uma ordem a
ser seguida para alinhar os sons
dessa palavra.

O menino subiu na árvore


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O menino subiu na árvore
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Também não é possível uma construção: “árvore na menino o subiu”. Há


uma ordem linear já definida em
nossa língua para garantir o
entendimento da sentença.

A seguir, temos um fluxograma do que vimos


discutindo até aqui, onde o signo “bola” se apresenta em
significante, significado,
arbitrariedade e linearidade.

Fluxograma: Signo, significante e significado nas línguas


orais

Significado e significante nas línguas de sinais

As contribuições de Saussure também são


frutíferas nos estudos das línguas de sinais. O signo “carro”
apresenta os mesmos
significante e significado em sua composição, contudo, os fenômenos linguísticos de
arbitrariedade e linearidade, não podem ser atribuídos como fenômenos comuns em
línguas visuo-corpóreo-
espaciais.

Fluxograma: Signo, significante e significado na Libras

Fazendo uma analogia com as línguas de sinais,


você pode observar o seguinte:

drive_eta
O significado não é “carro” (o objeto físico), mas a representação
mental que o sinalizante tem de tal objeto,
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representação
influenciada por suas experiências.

drive_eta
O significante desse signo é a visualização do sinal de “carro”,
essa convencionalidade gestual que
representa o signo.

A representação mental que o sinalizante tem do


sinal o ajuda a reconhecer o signo “carro”, quando
expresso, e a saber como deve ser
expresso. A língua é um sistema de signos que abriga uma relação
simbólica entre
significante e significado, sendo, portanto, simbólica. Diante do exposto até aqui,
podemos
inferir:

Signo Significante Significado

Significado união de “sons” e “ideias”

Língua escrita união de “letras” e “ideias”

Língua de sinais união de “sinais” e “ideias”

Quadro: Analogia semasiológica entre as línguas.

Elaborada por: Veridiane Pinto Ribeiro

Os estudos de Saussure são importantes para


tomarmos como parâmetros de análise da relação entre as
construções
visuo-corpóreo-espaciais e as construções da língua escrita e falada.

Arbitrariedade nas línguas de sinais

Em relação à arbitrariedade, as línguas de sinais


também apresentam diferenças em relação às línguas
orais. Voltemos ao exemplo “a”
apresentado anteriormente. O sinal “menino” é motivado por experiências
visuo-corpóreas. O sinal compõe-se por “homem + baixo”, um sinal que tem como
significado o fato de o
sujeito “menino” ser do sexo masculino e ter uma estatura
baixa, de acordo com sua faixa etária.

Lembre-se dos estudos da iconicidade dos sinais, definidos como aqueles que
apresentam a forma do seu significado. Alguns exemplos clássicos são: cigarro,

bicicleta, árvore... Entretanto, estudos que tratam da motivação para a


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convencionalidade dos sinais não se restringem ao conceito de iconicidade, pois


a
motivação se justifica por diferentes processos significativos nas expressões
linguísticas sinalizadas.

Ribeiro (2016) defende o que chama de Iconicidade


de Motivação Corporificada, na qual a
convencionalidade do sinal está ancorada nas
experiências corporificadas de seus usuários, propondo três
categorias:
Motivação Espacial, Motivação Sensitiva e Motivação de Medida.

A motivação não ocorre apenas na percepção


visual, mas em todo o esquema corporal, em todas as
habilidades do esquema corporal,
em que não há dissociabilidade entre forma e significado. Veja a seguir:

Motivação Espacial

Baseia-se na tendência de que estes sinais sejam


produzidos numa coerência espacial em relação ao nosso
corpo. Nas
experiências corporificadas, tudo que está no alto, para cima, nos remete ao
espaço elevado, o
sucesso, o êxito, o alto astral. Tudo isso tem significado
coerente quando expresso em postura altiva.

Por isso, sinais como “feliz” e “tudo-bem”


apresentam marcas não manuais e movimentos com sentido para
o alto,
incluindo expressão corporal inflando o peito, cabeça erguida, dando ao
sinal um sentido de elevação.

No caso de sinais como “triste”, “chorar” e


“cansado”, a tendência é o corpo buscar um espaço inclinado
para baixo, num
estado de baixo astral, motivando a produção de sinais que se compõem por
expressão
corporal cabisbaixa, movimento na direção de cima para baixo,
inclinando os ombros para baixo, além da
expressão facial de tristeza.

Motivação Sensitiva

Baseada nas experiências corporificadas que produzem


uma memória aos sentidos, nas quais o toque, o
paladar, a visão e o olfato
configuram-se em significado e são expressos nas construções sinalizadas.
Sinais como “abraçar”, “encontrar”, “pisar”, “azedo”, “perfumado” e “noite”
são sensitivos à medida que são
motivados pela sensibilidade do corpo em
perceber as sensações.

Motivação de Medida

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Usa as experiências corporificadas e o próprio corpo


para definir as medidas, os tamanhos. É significativo
para o sinalizante
definir as medidas em relação ao seu próprio corpo. O sinalizante produz o
sinal de
“pequeno” em relação ao seu próprio corpo, podendo ser expresso
pela aproximação dos dedos indicador e
polegar de uma mão, ou a aproximação
dos indicadores de cada uma das mãos, variando a expressão
conforme a
intenção comunicativa do sinalizante.

Quando a intenção comunicativa é expressão da ideia


de soma, o sinal de “somar” remete à ideia de junção,
já que todos os dedos
(unidades) se encontram comprimidas em uma única unidade, levando a ideia de
soma. Mais uma vez, o corpo e suas experiências tornam-se referência para o
sentido do sinal.

Linearidade nas línguas de sinais

Está na hora de falarmos de linearidade. Para


isso, observe a sentença “o menino subiu na árvore” em
Libras. Vamos lá!

Esta construção mostra uma peculiaridade das


línguas de sinais: a possibilidade de produzir sentenças em
que os sintagmas são
expressos ao mesmo tempo e no mesmo espaço. Ao sinalizar “árvore”, a posiciona
no
espaço de sinalização onde a ação do sujeito se realizará. Ao lado, sinaliza
“menino” e, em seguida, o
classificador do menino subindo no tronco da árvore até
chegar ao topo. Tanto a ordem da sentença quanto
a sucessão dos signos não se dão de
forma linear, é uma organização imagética, coerente com a
organização de uma língua
visuo-corpóreo-espacial.

Porém, não se pode dizer que a língua de sinais não apresenta linearidade em suas
construções, pois os sinais possuem parâmetros definidos a partir de uma
convencionalidade de seus usuários. O sinal “menino” compõe-se dos sinais
“homem^baixo”, nesta sequência, e cada um desses sinais com configuração de
mão,
ponto de articulação, orientação de mão, movimento e expressão previamente
convencionalizados.

O que já sabemos e o que precisamos saber?


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O que já sabemos e o que precisamos saber?
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Sabemos que a área da Linguística que estuda o


significante é a Fonologia. Já compreendemos as relações
que o significado exerce em
tais estudos, mas o foco deste módulo é o significado. O diálogo até este ponto
foi
no intuito de retomar alguns conceitos básicos, envolvendo os estudos do
significado, para que
pudéssemos chegar às áreas da Linguística que o estudam.
Estamos falando da Semântica e da
Pragmática.

Tais estudos permeiam os conceitos que


construímos em nossas mentes nos níveis do signo linguístico,
presente em uma
palavra, sentença ou texto. Como usuários da língua, adquirimos domínios de usos
linguísticos nos quais arranjos conceituais passam a fazer parte do nosso cotidiano:

Prefiro ter muito trabalho a estar desempregado.


Prefiro ter muita labuta a estar desempregado.
Os signos “trabalho” e “labuta” são sinônimos, ou
seja, têm o mesmo significado. Adquirimos esta
habilidade à medida que nos tornamos
proficientes. Conceito e conceptualização alimentam nossa
capacidade de compreender
as mensagens e produzir novos significados.

Observe a imagem a seguir:

O que vemos, de forma literal, são


as imagens de dois signos: lâmpada e muda de planta. Com base nas
experiências corporificadas em nosso meio social, a lâmpada tem uma
representação, dependendo do
contexto em que se insere, quando queremos
simbolizar o surgimento de uma boa ideia, na qual a mente se
acende para
encontrar uma solução. A muda de planta, por sua vez, remete ao meio
ambiente, à natureza, à
preservação do ecossistema, à continuação de uma
espécie. São significados produzindo novos
significados.

Signo Significante Significado

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Signo Significante Significado


Engloba os planos Lâmpada com a muda Pode levar ao entendimento de que a
“lâmpada” e “muda
de de uma planta em seu preservação do meio ambiente é uma boa
planta”. interior. ideia.

Quadro: Signo, significante e significado em uma imagem.

Elaborado por: Veridiane Pinto Ribeiro.

Vivemos experiências corporificadas no meio


social que nos levam a construir um vocabulário imbuído de
significantes. Dependendo
do que nos apresente o contexto, somos capazes de compreender as
mensagens ou de
fazer relações de significado coerentes com as construções dos significantes,
gerando
novos significados.

A Linguística Cognitiva

A Linguística Cognitiva é uma perspectiva que


acolhe uma série de linhas teóricas, as quais chamamos
“módulos cognitivos”, cujos
pressupostos se sustentam na indissociabilidade entre forma e significado na
construção da linguagem, tanto em línguas orais quanto em línguas
visuo-corpóreo-espaciais, como a língua
de sinais.

Uma das teorias da Linguística Cognitiva,


postulada por Fauconnier e Turner (1998), defende a
ressignificação, a habilidade de
construir novos significados a partir de significados já existentes. Trata-se
de um
processo de mesclagem, de integração conceptual. São domínios estáveis, ou seja,
domínios
conceptuais consolidados na mente a tal ponto que podem ser transitórios,
permitindo ao usuário a
construção de novos significados baseados em relações
coerentes de sentidos.

As metáforas são um caso clássico de


mesclagem ou integração conceptual, pois a habilidade cognitiva de
relacionar conceitos diferentes constrói um novo significado. É uma
habilidade cognitiva, perceptiva e
corporificada, da qual o sinalizante se
vale para dar sentido às suas expressões linguísticas.

A metáfora “luz no fim do túnel” signifiga


esperança.

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Nas línguas de sinais, as experiências


corporificadas norteiam processos de inputs e outputs linguísticos,
experiências
envolvendo atenção, percepção e memória, que constroem habilidades linguísticas que
subsidiam nossas relações comunicativas.

Numa perspectiva corporificada, não se admite que


construções sintáticas se façam apenas a partir de
regras gramaticais. A expressão
da língua se dá em correspondentes simbólicos (palavras ou sinais) que se
ajustam em
relações de significado. Na mente do falante, a construção sintática se dá,
principalmente, a
partir de intenções comunicativas com significado.

A Linguística Cognitiva defende que as unidades simbólicas, os sintagmas que


compõem a sentença, são relacionadas nas mentes de seus usuários conforme sua
intenção comunicativa, objetivando expressar um sentido, de modo que o foco do
usuário não está em fazer relações estabelecidas em regras gramaticais.

O usuário, ao expressar “Eu como


banana”, não se concentra no foco da ordem da sentença, mas na sua
intenção
comunicativa, no que deseja comunicar, tanto que pode dizer “Banana? Como.”;
“Como banana eu”;
“Eu como banana, eu”.

Na Libras, considerando se tratar de uma língua


imagética, que se constrói no espaço de sinalização a partir
de experiências
visuo-corpóreo-espaciais, o usuário, primeiramente, sinaliza “banana”, em seguida,
“eu”, e
finaliza com “comer”, ou, diretamente, “banana comer”. Esta ordem básica
sujeito-verbo-objeto (SVO) nem
sempre aparece na Libras. A ordem dos signos no
espaço de sinalização parte de uma lógica imagética, ou
seja, ao sinalizar,
primeiramente, “banana”, o sujeito visualiza, em primeiro lugar, o objeto que
receberá a
ação, pois o foco da intenção comunicativa é dizer o que ele come. Dessa
forma, o verbo, a ação vem depois
do objeto.

Tal construção é muito comum na Libras. Isto


porque as construções imagéticas, baseadas em experiências
corporificadas de uma
língua visuo-corpóreo-espacial, são construções de significado, não se restringindo
a
regras gramaticais. Trata-se de uma unidade indivisível e não em termos de
elementos distintos, assim
como, geralmente, é feito em modelos composicionais, mas
em componentes que se “procuram”, com o
objetivo de atribuir significado à mensagem.
O contexto e o sujeito corpóreo são o centro da composição da
mensagem.

Saiba mais
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Quando se trata de léxico, morfologia e sintaxe, o que temos é um continuum


de unidades simbólicas que
servem para estruturar todo um conteúdo semântico
no momento da fala, uma afirmação que defende as
relações inerentes entre
gramática e significado.

A Gramática de Construções Corporificadas (GCC)

Os precursores da Gramática de
Construções Corporificadas (GCC) são os estudiosos Benjamin Bergen e
Nancy Chang. Neste modelo, a perspectiva da Linguística Cognitiva se dá por
construções em uma
variedade de outros modelos cognitivos que representam a
gramática das línguas.

Ribeiro (2021) destaca a motivação que embasa


este estudo: a corporificação nos processos linguísticos.
Explica que tal
perspectiva teórica estuda a construção sintática motivada por experiências
perceptivas
corporificadas no espaço social, algo que justifica uma análise
linguística com base na língua em uso.

A GCC leva à percepção de que as pessoas usam a gramática significativamente e


funcionalmente. Uma gramática que evoca habilidades psicológicas gerais, como
memória, atenção, percepção, além de processos como categorização, abstração,
mapeamento, projeção e integração conceitual. Um processamento ocorre de
forma
rotineira e, principalmente, inconsciente.

Os pesquisados Bergen, Lindsay, Matlock e


Narayanan, em publicação no ano de 2007, descrevem como se
dá a ativação do que
chamaram de Simulação Mental. Os estudiosos fornecem evidências de que o
processamento da linguagem se vale de imagens perceptivas específicas, tanto locais
quanto descritivas,
bem como de entidades e seus atributos para simular significados
no ato de comunicação.

Fluxograma: Processo tradutório cognitivo-corporificado

Esse diagrama, proposto por Ribeiro (2021), foi


produzido com base nos princípios dos processos de
tradução e interpretação
defendidos pela Gramática de Construções Visuo-Corporificadas defendidas em
sua
tese, em 2016.
A pesquisadora explica que o diagrama objetiva
demonstrar como o processo tradutório cognitivo-
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corporificado comporta-se frente aos


estímulos intralingual, interlingual e intersemiótico. A simulação
mental é
alimentada por processos semânticos, por experiências que possuam relações de
significado no
entorno da comunicação.

A mente corpórea aciona diferentes domínios


cognitivo-linguísticos em direção à Simulação Mental. Tais
domínios são “gavetinhas”
na mente do interlocutor, evocadas à medida que são recebidos estímulos
comunicativos. Essas “gavetinhas” organizam e armazenam módulos cognitivos capazes
de produzir
significados inter-intralingual e intersemiótico. Veja a seguir:

Enciclopédia mental
Vocabulários e categorias linguísticas armazenadas e organizadas
cognitivamente.

Imagética
Expressão linguística usando o corpo como representação de
significados visuais.

Domínios locais
Espaços mentais operadores do processamento cognitivo.

Domínios estáveis
Estrutura de memória pessoal ou social, envolvendo esquemas e
frames.

Frames
Contextos conversacionais, situações, cenas do cotidiano, da língua
em uso.

Domínios semânticos
O uso e adequação dos significados estão sujeitos à situação
comunicativa.

Forma e significado
A construção linguística não se dá dissociada do significado.

Essa perspectiva teórica defende que se tratam de


domínios interligados e interdependentes, não sendo

uma relação cartesiana, mas


holística. Um processo ativado na língua em uso, em contextos comunicativos,
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nos
quais a mente realiza um processo complexo de semioses e relações semânticas. A
partir dessas
relações, o interlocutor é capaz de formular sua intenção
comunicativa, construir as sentenças e expressá-
las, um processo de simulação que
antecede a expressão.

Trata-se de uma habilidade cognitiva que


construirá um ser pensante, capaz de fazer previsões, de
raciocinar sobre suas
atividades linguísticas, organizando-as com coesão e coerência, conceito e
conceptualização.

video_library
Conceitos da Semântica
Acompanhe agora os conceitos básicos da Semântica
e seus desdobramentos na Libras. Vamos lá!

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

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2 - Fenômenos semânticos
Ao final deste módulo, você será capaz de classificar os fenômenos semânticos na Libras.

Os estudos semânticos na Libras


A linguística da Libras vem sendo estudada por
ilustres linguistas brasileiros, provocando avanços e olhares
atentos às
peculiaridades desta língua. Há vários pesquisadores que são referências para estes
estudos que
abordam desde as classes de sinais, como verbos, pronomes e advérbios,
até sua organização na sintaxe e
análise do discurso. Sem dúvida, os estudos
semânticos fazem parte deste escopo.

Os estudos semânticos norteiam as relações de significado entre signos,


expressões e contextos. Para compreendermos essas relações de significado, vale
uma rápida retomada sobre a organização básica das sentenças nas línguas de
sinais.

Destacamos, inicialmente, os estudos de Quadros e


Karnopp (2004) a respeito da ordem básica para a
composição de uma sentença em
língua de sinais: SVO (sujeito-verbo-objeto), podendo sofrer variações
conforme a
situação e intenção comunicativas (SOV ou VSO), além de seus possíveis complementos.

S j it Obj t V b Ad é bi (t i li
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Sujeito-Objeto-Verbo-Advérbio (topicalização)

EU

AULA

TER

AGORA
Para que haja concordância sintática nas línguas
de sinais, Quadros e Karnopp (2004) pontuam os
seguintes elementos constituintes das
sentenças:
1. sinais de um local particular, direcionar a cabeça e os olhos;
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2. direção da cabeça e dos olhos (e talvez o corpo);

3. apontação ostensiva antes do sinal de um referente específico;

4. pronome;

5. classificador;

6. verbo direcional ou de concordância;

7. topicalização;

8. marcas não manuais.

Comentário
Não vamos retomar todos os elementos publicados nesta obra, apenas aqueles
fundamentais à
compreensão dos estudos da semântica. A intenção comunicativa
do sinalizante determina a organização
das sentenças que recebe influências
das peculiaridades imagéticas e corporificadas das línguas de sinais.

Os exemplos retirados da obra de Quadros e


Karnopp (2004) mostram elementos aspectuais na construção
sintática em línguas de
sinais, em relação à localização dos referentes no espaço de sinalização, verbos
direcionais e marcas não manuais.

Uso de sinais de um local particular, direcionar a


cabeça e os olhos
para estes sinais:

CASA (do Pedro)

A casa de Pedro.

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CASA (do João)

A casa de João.

Usar a direção da cabeça e dos olhos (e talvez o


corpo):

CASA IX
(casa)

A casa

X
“Quando não for possível identificar o
referente contextualmente, será usado IX para indicar a
apontação [...]”
(QUADROS; KARNOPP, 2004).

Usar a apontação ostensiva antes do sinal de um referente específico:


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Usar a apontação ostensiva antes do sinal de um
referente específico:
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Casa

IX CASA

Usar um pronome:

IX(casa) NOVA

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A casa nova. (aquela)

Usar classificador:

CARRO CL
(carro passou um pelo outro)

Os carros passaram um pelo outro.

L
“Algumas configurações de mão são
utilizadas de forma padrão para identificar os classificadores
que referem
sinais que podem incluir outras informações”
(QUADROS; KARNOPP, 2004).

Usar um verbo direcional ou de concordância:


https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 22/57
Usar um verbo direcional ou de concordância:
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

(eu) IR (casa)

Eu vou para casa.

Usar classificador:

(el@) <aOLHARb> do
(el@)

Ela olha para ele.

(el@) <aAJUDARb>do (el@)

Ele a ajuda.

https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 23/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

(el@) <aENTREGARb>do (el@)Ela entrega para ele.

l@
Igual a ele ou ela.

aOLHARb>
“Quaisquer letras minúsculas
associadas aos sinais transcritos indicam as pessoas do discurso
marcadas
através da incorporação no sinal” (QUADROS; KARNOPP,
2004).

Marcas não manuais:

Marcação de negação

Marcação de interrogação
https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 24/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

Utilizar o espaço, os movimentos do corpo, a


direção do olhar, as diferentes formas da mão, sejam em sinais
ou classificadores,
está relacionado com articulações carregadas de sentido, condicionadas às relações
de
significado produzidas pelo sinalizante.

Vale destacar as expressões não manuais que têm função sintática e marcam
sentenças interrogativas, orações relativas, topicalizações, concordância e
foco. As
expressões não manuais que constituem componentes lexicais marcam
referência
específica, referência pronominal, partícula negativa, advérbio, grau
ou aspecto, as
quais são encontradas no rosto, na cabeça e no tronco. Sem a
articulação coerente
desses elementos aspectuais das línguas de sinais, o
sentido fica comprometido e,
consequentemente, a emissão e recepção por parte de
seus interlocutores.

Nestes estudos semânticos, outros elementos se


ajustam para expressar as ideias, muitos deles
diretamente ligados aos estudos
semânticos de palavras e enunciados.

Os níveis lexical e da sentença nos estudos semânticos


na Libras
Assim como nas línguas orais-auditivas, a Libras
apresenta dois níveis nos estudos da semântica: lexical e
da sentença.

Fluxograma: Campos semânticos

Semântica Lexical
Vejamos as diferentes situações relacionadas com
a semântica lexical, ou seja, os casos de antonímia,
https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 25/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

sinonímia, polissemia ou
homonímia, e paronímia.

ANTONÍMIA

Refere-se a sinais que apresentam significados


opostos, também chamados de antônimos. Veja os
exemplos a seguir:

ALT@ - BAIX@

GRAND@ - PEQUEN@

SINONÍMIA

Refere-se a sinais diferentes que apresentam o


mesmo significado, também chamados de sinônimos. Veja
os exemplos a seguir:

https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 26/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

FELIZ – existem diferentes sinais que


expressam este mesmo significado.

POBRE – existem diferentes sinais que


expressam este mesmo significado.

POLISSEMIA/HOMONÍMIA

Na polissemia, é possível usar os mesmos signos,


em contextos diferentes, o que pode levar à mudança de
sentido destes signos. Para
identificarmos o sentido que está na intenção comunicativa do emissor,
precisamos
atentar ao contexto.

No caso da homonímia, dois ou mais signos têm a


mesma estrutura fonológica ou, no caso dos sinais,
estrutura nos parâmetros, porém,
em contextos diferentes, têm significados diferentes.

Você pode se questionar: qual é a diferença entre


essas duas semânticas lexicais? Na verdade, os
estudiosos não são unânimes em
defender e comprovar uma diferença bem fundamentada. Há muitos
linguistas que
defendem a igualdade de conceito e função para polissemia e homonímia. Veja os
exemplos
a seguir:

https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 27/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

SÁBADO / LARANJA / ALARANJADO

OCUPAD@ / PROIBID@ / NÃO-PODER

AÇÚCAR / DOCE / GUARDANAPO

VIDA / EXISTIR / PRESENTE


https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 28/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

VIDA / EXISTIR / PRESENTE

PARONÍMIA

Os parônimos se referem aos sinais semelhantes na


execução dos parâmetros com sentidos diferentes.

AMANHÃ e FÁCIL

VENDER e ABANDONAR

EMPREGADA e FOME

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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

Semântica no nível da sentença

Vejamos agora o nível da sentença nos estudos


semânticos de Libras. Primeiro, vamos olhar o âmbito da
estrutura e, depois, a
questão da ambiguidade.

Estrutura
No nível das sentenças, estudamos o significado
da estrutura que pode expressar sentidos sinônimos ou
antônimos.

Sinônimos

P-E-D-R-O FELIZ SEMPRE.


close

P-E-D-R-O NUNCA TRISTE.


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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

ELA DOCE COMPRAR.


close

ELA BOMBO@ BAL@ COMPRAR.

Podemos usar termos diferentes e formas


diferentes de expressar o mesmo sentido, não apenas usando
palavras sinônimas, mas
produzindo sentenças sinônimas.

ANTÔNIMOS:

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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

EUTER CHAPÉU BONIT@.

close

EU TER CHAPÉU FEI@.

INTELIGENTE VOCÊ.
close

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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

BURRO VOCÊ.

Ambiguidade

Na Língua Portuguesa, existem muitas expressões


que são ambíguas, ou seja, é possível termos dois
sentidos em uma mesma sentença, o
que costumamos chamar de “duplo sentido”.

Fábio contou a Paulo que sua mulher saiu do emprego.


Da forma como a sentença está estruturada não é
possível saber se quem saiu do emprego foi a mulher de
Fábio ou a de Paulo.

Em Libras, existem marcadores e referentes


dêiticos no espaço de sinalização que direcionam o olhar do
interlocutor para a real
intenção comunicativa de seu emissor.

F-A-B-I-O (apontar localização de Fábio) CONTAR (verbo


direcional na direção de Fábio para Paulo) P-A-U-L-O
MULHER DELE (sinal na direção de Fábio) EMPREGO
ABANDONAR.

Fábio contou a Paulo que sua mulher (de Fábio)


saiu do emprego.

Em Libras, o uso do pronome possessivo “DELE”


direciona a informação eliminando qualquer vestígio de
ambiguidade, pois o emissor
aponta ao receptor a mulher de quem saiu do emprego.

O uso de dêiticos (apontamentos) e dos pronomes possessivos (seu, sua, dele,


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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

dela) determina e localiza os referentes no espaço de sinalização e são comuns


nas construções sintáticas da Libras, algo que contribui para a compreensão dos
significados.

video_library
Semântica lexical e semântica da sentença
Acompanhe a seguir os conceitos da semântica
lexical e da sentença por meio de explicações e exemplos.
Vamos lá!

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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

3 Produção do sentido nas línguas naturais


https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 35/57
3 - Produção do sentido nas línguas naturais
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

Ao final deste módulo, você será capaz de identificar a produção de sentidos nas línguas
naturais.

Os campos lexical e semântico na análise do discurso


O campo de estudo do significado engloba outros
campos da área da Linguística cuja compreensão se faz
pertinente para constituir uma
visão holística dos processamentos da linguagem, são os campos lexical e
semântico.
Saiba mais sobre eles a seguir:

Campo lexical

Quando estudamos significado, o campo lexical está


atrelado às relações de sentido que nossa mente
constrói à medida que se
alimenta de informações no meio social.

O campo lexical é composto por um conjunto de


palavras pertencentes a uma mesma ideia, um
pensamento, uma noção. Ao
mergulharmos em determinado contexto que compartilha léxicos que se
relacionam, o domínio do conhecimento destes favorece a interpretação e
compreensão da comunicação
que possa transitar ao longo do diálogo.

Exemplo: Se o assunto está baseado


no léxico “culinária”, podem ser arrolados no diálogo instrumentos de
cozinha, ingredientes, técnicas e profissionais envolvidos. Léxicos como:
fogão, panela, forma, frigideira,

colher, sal, açúcar, mexer, bater, chef,


cozinheiro e muitos outros estão armazenados em nossa mente em
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

uma
organização evocada a partir de estímulos comunicativos no ambiente.

Campo semântico

No campo semântico, por sua vez, uma palavra pode


assumir um conjunto de significados, algo que
podemos consultar, por
exemplo, em um dicionário.

Exemplo: Se buscamos o significado


de um verbete como carro, temos: veículo que se locomove sobre
rodas para
transportar pessoas, automóvel.

A análise do discurso

Para fazermos a análise do discurso, é


fundamental o domínio dos campos lexical e semântico. A análise do
discurso provoca
o sujeito da comunicação, extraindo os conhecimentos que o habilitem a realizar uma
análise contextual da estrutura discursiva em questão, diretamente determinadas pelo
contexto político-
social em que vive o seu interlocutor.

Na análise do discurso,
identificamos o que diz um texto, como diz e por que diz. É o campo da
língua
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

atrelado ao campo da sociedade em seus processos históricos e


ideológicos.

Esses processos ideológicos tratam


da visão de mundo de determinada classe, a maneira como ela
representa a
ordem social. Levando em conta que, nas línguas orais, há uma defesa de que
não existe
relação entre as representações e a língua, então, a linguagem é
determinada pela ideologia, por
características sociais.

É a partir da análise de todos os aspectos do


discurso que se chega ao sentido. E perceba que o sentido não
é estático, ele é
volátil e se ajusta às situações comunicativas e às intenções comunicativas.

Localização neurológica do processamento da


linguagem
Fábio Theoto Rocha, pesquisador da área de
neurofisiologia da linguagem, tem uma respeitosa contribuição
aos estudos dos
processos neurológicos para aquisição, processamento e expressão linguísticos.

Uma de suas publicações tem foco na língua


brasileira de sinais, sob o título de Libras: um estudo
eletroencefalográfico de
sua funcionalidade cerebral (2012), disponibilizada no portal ENSCER. Sua
pesquisa
concluiu que as áreas do cérebro Broca e Wernicke definem as ações e os objetos também
na língua de
sinais, por meio de gestos motores, fazendo uma analogia com a língua
falada. Essas áreas definem a
semântica e a sintaxe do verbo, bem como a semântica
de seus complementos, não sendo diferente na
língua de sinais, ou seja, a partir de
estímulos diferentes, considerando que a língua de sinais recebe os
visuais, tanto a
Língua Portuguesa quanto a Libras realizam processos de relações
sintático-semânticas nas
mesmas áreas do cérebro.

roca e Wernicke
A área de broca está relacionada com a produção da
linguagem e está localizada no hemisfério esquerdo do
cérebro, na parte
inferior do lóbulo frontal.

A área de Wernicke está relacionada com a


compreensão sonora e, normalmente, pode ser encontrada no
hemisfério
esquerdo, embora em 30% das pessoas canhotas e 10% das pessoas destras se
encontre no
hemisfério direito. Essa zona pertence ao lóbulo temporal e está
altamente relacionada com a zona auditiva.

A área de Broca e a área de Wernicke estão


conectadas por meio de um grupo de fibras nervosas conhecido
como o
fascículo arqueado.

Fonte: Gallardo, 2020.

Saiba mais
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica
Saiba mais

Rocha (2012) destaca que a complexidade da atividade cerebral para a


decodificação da linguagem na
construção de sentidos, comprovando uma
engrenagem que estrutura relações de memória, o controle da
atenção, o
processamento visual e a imaginação mental, que são, basicamente,
controladas pelo córtex
frontal, mas também envolve neurônios
distribuídos por outras áreas: parietal, temporal e occipital, além do
hipocampo e áreas adjacentes.

Rocha (2012) tomou como instrumento de análise o


texto de uma história clássica brasileira: O curupira. A
partir do
monitoramento cerebral em equipamentos tecnológicos, o pesquisador registrou a
reação cerebral
durante a sinalização de cada um dos elementos aspectuais que
compõem campos lexicais e semânticos
da linguagem.

Os resultados mostraram que a


fonação e a ação representadas pelo verbo, e o reconhecimento das formas
sonoras de campos lexicais, como “leão” e “carne”, ativam os neurônios da
área de Wernicke, que dão
acesso às áreas cerebrais que, por sua vez,
reconhecem esses elementos e definem no campo semântico o
significado dessas
palavras ou sinais.

As áreas de Broca e Wernicke


estabelecem relações sinápticas com neurônios de representação.

Esse estudo mostra que os significados,


representados em sons e palavras ou sinais, “se procuram” em
busca de relações
coerentes na construção sintática. Os dados mostram que, ao reconhecer na base do
texto o verbo “comer” na área de Broca, ocorre uma ativação dos neurônios
referentes às palavras “leão” e
“comer”, presentes na base do texto, apresentando
uma coerência na compreensão da mensagem,
comprovando que essas palavras obedecem à
sintaxe do verbo comer e fazem parte do campo semântico
da ação desse verbo,
levando à conclusão de que, tanto em língua oral quanto em língua de sinais, o
significado é um processo complexo de relações neuronais, envolvendo campos lexicais
e semânticos.

Categorização e espaços mentais


Os campos lexicais e semânticos são motivados por
representações dos significados em forma de sons,

palavras ou sinais. Ao
alimentarmos nosso dicionário mental por meio das experiências linguísticas e
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

sociais em diferentes contextos de enunciação, somos capazes de organizar nossa


mente como se
tivéssemos “gavetas” em nossa memória para armazenar essas
informações. Cada “gaveta” contém léxicos
que se agrupam com base em características
de semelhança, por pertencimento a um mesmo nicho de
significado.

Duque (2012) defende que categorização é uma


atividade cognitiva fundamental que atesta nossa interação
com o meio ambiente de
forma organizada, com base em nossas experiências corpóreas, traduzidas em
relações
com o mundo e com a cultura, revelando uma fantástica capacidade da mente humana.

Estas entidades organizadas na categorização


envolvem objetos, pessoas, lugares, mobiliários, vestimentas,
animais, veículos,
reconhecendo neles especificações que vão além de convencionalidades lexicais.

Quando categorizamos a entidade “aves”, partimos


de características que englobam penas, asas, duas
patas, bico e a capacidade de
voar. Organizar nossa memória a partir de categorização poupa espaço de
armazenamento e favorece o trabalho das sinapses quando da evocação de léxicos para
as relações de
sentido.

Veja a seguir alguns exemplos de categorização:

https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 40/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

Quando trabalhamos com língua de sinais, partimos


de um texto que aborda determinado contexto
conforme o planejamento de cada curso ou
disciplina. Isso tanto no ensino de Libras como primeira ou
segunda língua, ou seja,
para surdos ou ouvintes. Assim, temos a abordagem com base em estudos
semânticos,
que ajudam a mente a construir um dicionário mental organizado em categorização,
constituindo campos lexicais e semânticos que possibilitem organizar o pensamento e
a expressão
linguística.

Tomemos um contexto como “viagem”. A partir de um


texto que poderá conter o diálogo de interlocutores
inseridos neste contexto,
contendo léxicos iniciais que introduzem o mergulho na temática, a estratégia
baseada em motivação da categorização amplia esses léxicos, criando novas situações
comunicativas
comuns aos usuários da língua, envolvendo novas frases, expressões
formais e informais e expressões
idiomáticas.

Considere o seguinte texto:

Vamos viajar?
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica
Vamos viajar? expand_more

Carla encontra Sara em um bar:

A) Oi, tudo bem?

B) Oi, tudo e você?

A) Bem, obrigada. Soube que você viajou mês passado. Para onde você
foi?

B) Eu fui para o Recife, aproveitei um feriadão para conhecer as praias


famosas da cidade.

A) Ah, que legal! Eu não conheço Recife, mas tenho muita vontade de
viajar para o Nordeste do
Brasil, conhecer a cultura nordestina, a
cidade de Olinda, as praias, deve ser tudo tão lindo!

B) O que eu mais gostei foi Porto de Galinhas. É uma praia maravilhosa!


Fiquei em um hotel de frente
para o mar, tinha um calçadão enorme e
muitos barzinhos legais!

A) Ah, eu imagino! Você foi com seu namorado?

B) Sim, compramos um pacote de viagem muito barato, incluía passagens de


avião, hotel e alguns
pontos turísticos.

A) Nossa! Que sorte! Mas, não falarei nada ao meu namorado, vou ficar na
minha porque quero viajar
com minhas amigas. (risos)

B) Ah, você é muito engraçada.

As duas riem e brindam.

Para a sinalização do texto de forma coerente com


a construção visuo-corpóreo-espacial da Libras, vamos
convertê-lo em glosas.

VIAJAR. VAMOS? expand_more

A) O-I, TUDO-BO@?

B) O-I, TUDO-BO@ E VOCÊ?

A) BO@, OBRIGAD@. EU SABER VOCÊ VIAJAR MÊS PASSADO.ONDE?

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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

B) EU VIAJAR RECIFE, FERIADO APROVEITAR CONHECER PRAIA@ FAMOSA@ TER LÁ


CIDADE.

A) AH, LEGAL! EU CONHECER-NÃO RECIFE, MAS VONTADE TER VIAJAR NORDESTE,


CONHECER
CULTURA PRÓPRIA NORDESTE, TAMBÉM CIDADE OLINDA, PRAIA@(geral)
TUDO LINDO EU ACHAR
(expressão de possibilidade, talvez)

B) EU GOSTAR MAIS P-O-R-T-O-D-E-G-A-L-I-N-H-A-S. PRAIA MARAVILHOSA! MEU


HOTEL FRENTE
MAR, TER CALCADÃO (descritivo na frente do corpo, duas mãos
formando uma faixa do meio para
fora, inflando as bochechas, usando
classificador de alguém caminhando sobre a calçada
apreciando o mar)
TAMBÉM BAR@ MUITO (apontando vários um ao lado do outro) LEGAL!

A) AH, EU IMAGINAR! VOCÊ IR-JUNTO NAMORAD@.

B) SIM, NÓS-2 COMPRAR PACOTE VIAGEM BARAT@, TER (usar os dedos para
pontuar os itens)
AVIÃO, HOTEL TAMBÉM PONT@ TURÍSTICO@.

Atenção
Desse ponto em diante, os léxicos podem ser trabalhados em frases,
expressões, piadas, comentários,
compartilhamento de experiências ou outra
estratégia definida pelo professor para enriquecer a
categorização em
primeira ou segunda língua, produzindo sentidos cuja aquisição já se faz
presente no
conhecimento dos alunos ou para a produção de novos sentidos a
partir da relação do conhecimento já
adquirido.

Metáforas e expressões idiomáticas

Nestes estudos, podem surgir frases e expressões


metafóricas. Este é um fenômeno linguístico muito
sofisticado, que exige de seus
usuários comportamentos linguístico-cognitivos avançados, num processo
adjacente aos
domínios dos campos lexical e semântico. Porém, o uso das metáforas não se restringe
a
textos literários, a poesias, ao uso como recurso poético, a metáfora está em
nosso cotidiano, em
expressões corriqueiras que fazem parte de nosso diálogo
informal.

Lakoff e Johnson (2015) argumentam em tal sentido


e questionam o fato de muitas pessoas entenderem
que o uso das metáforas não faz
parte de usos normais da língua cotidiana. Defendem que a metáfora faz

parte da vida
diária, do pensamento e da ação. O sistema conceptual é metáfora, quando
relacionamos
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

conceitos e produzimos novos conceitos, quando compreendemos mensagens


implícitas, fazemos uso de
nossa habilidade linguístico-cognitiva de decodificar
metáforas.

Fauconnier e Turner (1998) conceituam “espaços


mentais”. Como estudiosos da Linguística Cognitiva,
apresentam contribuições
importantes com foco nos processos construcionais da linguagem. Em se
tratando de
metáforas, pontuam as relações dos espaços mentais, que vêm a ser pequenos pacotes
conceituais construídos a partir de como pensamos e falamos, para fins de
compreensão e ação local.

As metáforas são formadas de:

Estruturas de entrada
Léxicos.

Estruturas genéricas
As relações que aproximam os léxicos.

Estruturas de mesclagem
Resultado da mescla das estruturas de entrada e genérica.

Ferrari (2014) exemplifica essas estruturas a


partir da estrutura genérica: sistema, ameaça, dano. As
estruturas de entrada são:

1. organismo, visão biológica, doença;

2. computador, programa destrutivo, destruição; resultando na estrutura de


mesclagem: vírus de
computador.

Dessa forma, pode-se afirmar, em Fauconnier e


Turner (1998), que espaços mentais são construções
estruturadas por quadros e
modelos cognitivos, que estão interligados e podem ser modificados conforme
pensamos
e desdobramos o discurso.

Exemplo

Em nosso cotidiano, fazemos uso de expressões linguísticas que passam por


tal processo de mesclagem
para sua compreensão.

Além das metáforas, também é comum usarmos


expressões idiomáticas na Língua Portuguesa, que, ao
expressarmos seu sentido na
Libras, precisam passar por um outro processo linguístico-cognitivo. Isso não

significa que a Libras não tenha metáforas ou expressões idiomáticas, mas que, no
estudo da semântica de
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

uma língua, precisamos conhecer tanto seus aspectos


linguísticos-culturais na expressão e compreensão
de metáforas e expressões
idiomáticas, quanto trazer para sua compreensão, por meio da tradução, as
metáforas
e expressões idiomáticas de outra língua.

Confira algumas expressões idiomáticas na Língua


Portuguesa e sua compreensão para expressão de seus
sentidos na Libras:

Expressões idiomáticas na Língua Portuguesa e compreensão de sentidos em


Libras expand_more

a) Andar na linha
(fiel);

b) Chorar o leite derramado


(já foi);

c) Água mole em pedra dura tanto bate


até que fura (Lutar, lutar, lutar, vencer/ superar);

d) Deu uma de João sem braço


(aproveitar);

e) Tirar água do joelho


(fazer xixi);

f) Chutar o balde (cheio


cabeça);

g) Mala sem alça


(chato);

h) Está com a faca e o queijo na mão


(pronto oportunidade);

i) Ele é uma mão na roda


(pessoa ajudar++);

j) Pendurar a chuteira
(aposentar);

k) Encher linguiça
(enrolar);

l) Corda no pescoço (muito


divida);

m) Acertar na mosca (corrigir


certo);

n) Nem tudo que brilha é ouro


(atrás disfarçar);

o) Cada macaco no seu galho


(cada um na sua);

p) Pau que nasce torto morre torto


(mesmo +++);

q) Águas passadas não movem moinho


(problema passado já foi);

r) Filho de peixe, peixinho é


(pai filho igual, cópia igual);

s) Filhote de onça nasce pintado


(filho geração problema igual);

t) Cada um por si e Deus por todos


(cada um na sua Deus cuida);
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22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

u) Cada ovo comido é um pinto perdido


(oportunidade perde não adianta já foi, ou não volta
mais).

O trabalho com a compreensão de metáforas e


expressões idiomáticas na Língua Portuguesa é frutífero no
processo de aquisição da
Libras como primeira ou segunda língua, tanto para surdos quanto para ouvintes,
na
medida em que favorece a analogia entre as linguas e naturaliza os usos e
compreensão destes
fenômenos linguisticos. Para os surdos, compreender e fazer uso
de metáforas e expressões idiomáticas na
Libras liberta-os da literalidade dos
signos e os faz mergulhar na relatividade dos significados.

No livro Pequeno dicionário ilustrado de


expressões idiomáticas (1999), Everton Ballardin e Marcelo Zocchio
mostram
um trabalho ilustrado de como as expressões idiomáticas seriam compreendidas caso
não
houvesse a compreensão dos processos de ressignificação presentes nos usos da
língua.

Veja a seguir:

Minhoca na cabeça

Chorar sobre o leite derramado

Tirar água do joelho

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João sem braço

Na linguagem semiótica, em expressões artísitcas


de artes visuais, a metáfora é um recurso linguístico
amplamente usado por artistas
surdos e ouvintes para manifestacões de sua cultura e identidades surdas.

Uma publicação da Revista Espaço, no ano de 2019,


destaca o trabalho da artista surda Nancy Rourke. A
matéria apresenta seus
principais trabalhos, revelando o perfil militante da artista, que busca, na
expressão
das artes visuais, o canal para dar voz à luta do povo surdo.
A seguir, veja três exemplos de quadros da
artista surda Nancy Rourke:

https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 47/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

Além da linguagem expressada em artes visuais, as


metáforas também aparecem em expressões
sinalizadas orais. São muito comuns em
poesias sinalizadas, em textos literários, mas também estão
presentes em expressões
cotidianas. Classificadores e marcas não manuais são elementos aspectuais da
construção sintática, produzindo significados na Libras.

Não tô nem aí!


Você me paga!
Tô duro, sem grana!
Esperto! (sinal de rato)
Lavo minhas mãos!
Apenas alguns exemplos para mostrar o quanto as
línguas de sinais compartilham dos mesmos fenômenos
linguísticos que compõem as
línguas orais. Mesmo em figuras de linguagem, em metáforas, em linguagem
poética, a
Libras é uma língua visuo-corpórea-espacial capaz de expressar qualquer sentido, em
qualquer
situação, rica em elementos vivamente semânticos.

Pragmática
Tomando por base um conceito clássico de
“pragmática”, temos o estudo da linguagem em uso, em seus
diferentes contextos,
levando em conta os princípios de comunicação. Porém, a pragmática transita por
uma
amplitude de estudos que engloba estudos dos dêiticos para pronomes, de
pressuposições com base
no que foi dito, dos atos da fala e de suas condições, das
implicaturas de expressões subtendidas e dos
aspectos da estrutura conversacional.
Veja a situação a seguir:

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a) Você tem horas?

b) São seis e meia.

Os estudos da pragmática buscam explicar este


fenômeno na comunicação, em que os sujeitos
interlocutores adquirem a habilidade de
responder a um questionamento conforme o interesse do
questionador, mesmo que a
pergunta não tenha sido direta, pois em uma pergunta: “você tem horas?”, a
resposta
que se espera seria “sim” ou “não”. Contudo, o que o questionador recebe é a
resposta que
realmente busca: a hora atual.

Muitos desses fenômenos são encontrados na Língua


Portuguesa. São exemplos:

a) Você poderia me ajudar aqui?

b) Pois não, já estou indo.

a) Foi você que comeu meu bolo?

b) Pois sim, sabe que não como bolo!

Quando o interlocutor tem a intenção de responder


“sim”, responde “pois não”. Isso não prejudica a
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compreensão de quem recebe a


resposta, pois convencionalidades sociais e culturais o direcionam ao
entendimento
da mensagem. Já ao responder “pois sim”, o emissor tem a intenção de negar.
Novamente, a
expressão contrária não impede a correta compreensão da mensagem.

Essa habilidade de inferência, de captar a


intenção comunicativa do emissor, é objeto de estudo da
pragmática.

Considere o seguinte exemplo:

a) Ela se separou no ano passado.

b) O controle da TV está aqui. O volume está muito alto.

O receptor pode inferir que ela era casada. Mesmo


que essa não tenha sido a mensagem de forma direta, o
receptor faz relações de
sentido que o levam a inferir sobre as circunstâncias da mensagem. O mesmo
ocorre
com a sentença “b”. Ao receber a mensagem, o receptor pode inferir que o emissor
está solicitando
que diminua o volume da TV.

Saiba mais

Para Quadros e Karnopp (2004), a pragmática é o estudo de fenômenos


linguísticos que envolve as relações
entre a linguagem e o contexto. Mesmo
nos dias atuais, este ainda é um estudo recente no Brasil.

Ferreira-Brito (1995) vem apresentando


importantes contribuições sobre os estudos da pragmática na
Libras, com foco nos
atos da fala, entendendo fala como a comunicação em língua de sinais. Explica que a

Linguística define “atos de fala” como sendo a análise de um enunciado em relação às


intenções
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comunicativas de um sinalizante e os efeitos desta intenção comunicativa


sob o interlocutor. A
pesquisadora afirma que os atos da fala não têm por objetivo
apenas comunicar um significado, mas
também influenciar ativamente seu destinatário.
Além disso, atos da fala podem ilustrar a relação entre
intenções, situações e
significados e entre as regras de linguagem e regras sociais.

A intenção comunicativa do emissor é que vai


determinar o “tom” que vai usar para emitir a mensagem.
Convenções sociais em nossa
comunicação compõem formas de emissão que podem comunicar comando,
ordem, pedido ou
polidez. Observe o seguinte exemplo:

Estamos com fome. Compre uma pizza para nós.

Essa mesma fala pode ser emitida em tom de pedido


ou de ordem. Dependendo do “tom” com que o
emissor se dirige ao receptor, este pode
se ressentir pelo que foi dito, não pelo teor da mensagem, mas pela
forma como foi
emitida, o “jeito” que a pessoa falou.

Adquirimos a habilidade de identificar a intenção comunicativa do emissor apenas


pela leitura da forma como se dirigiu ao receptor. Se a intenção foi de atingir
de
forma negativa seu interlocutor, o “tom” vai revelar tal intenção.

A mesma leitura ocorre quando a intenção do


emissor é de se fazer entender com uma emissão mais
polida, mais cautelosa, mais
sensível, com o objetivo de se comunicar de modo mais cortês, com mais
civilidade,
urbanidade. Alguns recursos linguísticos podem ser utilizados para que essa intenção
seja
emitida de forma mais evidente. O emissor pode usar pronomes de tratamento mais
corteses, bem como
expressões de gentileza, como “por favor”, “por gentileza”,
“obrigada”, “com licença”.

Saiba mais

Em meio à cultura surda, também são convencionadas essas gentilezas, as


formas de tratamento amigável.
As demonstrações de interesse e simpatia
também são estratégias de polidez. Inclusive, é comum o uso do
sinal
“brincadeira” quando fazemos um comentário sem a intenção de ofender. O uso
deste faz parte da
cultura linguística em contexto no qual o interlocutor
sinalizante quer deixar claro que não está falando
sério.

Ainda em Ferreira-Brito (1995), destacamos


algumas variáveis sociais que definem contextos, em que as
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relações sociais já dão o


“tom” na intenção comunicativa do emissor.

Distância social

Reflete a classe social de cada


interlocutor e os bens materiais ou não materiais que
possuem.

Poder

Mostra a relação assimétrica, a


hierarquia entre os interlocutores.

Escala de Imposição

Envolve o valor do que é pedido ou


o tempo gasto.

Intimidade ou
Familiaridade

Pode ser definida como a relação


familiar existente entre os participantes de uma interação e
não
depende das classes sociais a que pertencem.

Expressões visuais e corporais dão o “tom” da


intenção comunicativa do sinalizante. Tanto pessoas surdas
quanto ouvintes, já
proficientes e convivendo cotidianamente com a língua, conhecem essas expressões e
identificam a intenção comunicativa do sinalizante. O “jeito” como o sinalizante
expressa a mensagem pode
significar diferentes intenções comunicativas.

Se o sinalizante expressa:

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a) CHEGOU CEDO!

close

b) CHEGOU CEDO.

Pode ser com expressão de interjeição ou


afirmação. A interjeição pode significar uma intenção
comunicativa de ironia,
tentando chamar a atenção do interlocutor devido a um atraso. Na afirmação, o
emissor pode ter a intenção comunicativa de comentar a chegada do seu interlocutor
antes do horário
combinado.

O que o interlocutor usuário da fala oral é capaz


de expressar por meio do tom da voz, o interlocutor usuário
da fala sinalizada é
capaz de expressar por meio do “tom” da língua de sinais. É uma língua que
compartilha
dos mesmos fenômenos linguísticos das línguas orais-auditivas. Os
estudos semânticos e pragmáticos
revelam o potencial comunicativo desta língua
visuo-corpóreo-espacial, que não difere ou limita em nada a
expressão comunicativa,
seja de que contexto for.

video_library

Produção de sentido em Libras


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Produção de sentido em Libras
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica

No vídeo a seguir, você compreenderá a produção de


sentido em Libras por meio de explicações e exemplos
sobre campo lexical e
semântico, metáforas e expressões idiomáticas, e pragmática. Vamos lá!

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Considerações finais
Como vimos, os estudos de conceitos linguísticos de
Saussure sobre signo, significante e significado se
aplicam e se explicam tanto em Língua
Portuguesa quanto em Libras, o que confere às línguas de sinais o
mesmo status linguístico
das línguas orais. Estes estudos introduzem as discussões sobre o significado em
situações
comunicativas, que se constituem de diversos fenômenos semânticos refletidos em sinonímia e
antonímia, parônimos, polissemia e homonímia, além dos campos lexical e semântico, sendo
complementados com a análise do discurso e a pragmática em seus atos da fala.

Nos estudos semânticos em língua de sinais, podemos


considerar que as expressões linguísticas são
motivadas por nossas experiências
visuo-corpórea-espaciais vivenciadas na língua em uso, nos contextos
reais que proporcionam
ao sujeito interlocutor os inputs e outputs linguísticos. Essas experiências também
subsidiam os processos de outro fenômeno linguístico: as metáforas. As línguas de sinais são
ricas em
metáforas e passam por um processo que a Linguística Cognitiva vem chamar de
Mesclagem. Este se
constitui a partir de Espaços Mentais que se relacionam em busca do
sentido.

Para finalizar, discutimos sobre os estudos do significado


a partir da intenção comunicativa do interlocutor,
a forma como tal significado é recebido e
interpretado pelo receptor, e a análise desses processos em nível
neurológico. A mente é
capaz de desenvolver habilidades que relacionam diferentes funções cerebrais, em

um trabalho
articulado e complexo, que culmina na dominância comunicativa dos interlocutores em receber,
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interpretar e subentender. A análise do discurso e os estudos pragmáticos privilegiam o


entendimento da
língua de forma holística, em contextos de uso reais, tanto em línguas orais
quanto de sinais, atribuindo ao
ato da comunicação, um objeto em movimento, pulsante, que
revela a sua complexidade e superioridade.

Referências

BALLARDIN, E.; ZOCCHIO, M. Pequeno dicionário ilustrado de


expressões idiomáticas. São Paulo: Schaffer
Editorial, 1999.

BERGEN, B. K.; LINDSAY, S.; MATLOCK, T.; NARAYANAN, S.


Spacial and linguistic aspects of visual imagery
in sentence comprehension.
In: Cognitive Science, 31, 2007.

DUQUE, P. H. Simulação semântica e compreensão de


textos. In: Cadernos do CNLF, vol. XVI, N. 03. Livro do
Minicurso e Oficinas.
2012.

FAUCONNIER, G.; TURNER, M. Conceptual integration


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FERRARI, L. Introdução à linguística cognitiva.


São Paulo: Contexto, 2014.

FERREIRA-BRITO, L. Por uma gramática de língua de


sinais. Rio de Janeiro. Tempo Brasileiro, 1995.

GALLARDO, C. P. Área de Broca e Wernicke: função


e diferenças. In: Psicologia online, 23 nov. 2020.

LAKOFF, G.; JOHNSON, M. Metáforas de la vida


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2015.

QUADROS, R. M. de; KARNOPP, L. B. Língua de sinais


brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre, 2004.

RIBEIRO, V. P. A Linguística Cognitiva e construções


corpóreas nas narrativas infantis em Libras: uma
proposta com foco na formação de TILS.
Tese de Doutorado. UFSC, Florianópolis, 2016.

RIBEIRO, V. P. Linguística Cognitiva e língua de


sinais: por uma tradução visuo-corpórea-espacial. In: Revista
Espaço. Rio de
Janeiro, 2021.

ROCHA, F. T. Libras: um estudo


eletroencefalográfico de sua funcionalidade cerebral. ENSCER, Mogi das
Cruzes/SP, 2012.

ROURKE, N. Telas da artista Nancy Rourke: força e


intensidade das cores em movimentos de resistência,
afirmação e libertação. In: Revista
Espaço, INES, Rio de Janeiro, n. 52, jul-dez 2019.
https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 56/57
22/11/22, 20:30 O campo de estudo da semântica
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Leia os seguintes textos:

Alguns aspectos semânticos da Libras: um estudo do léxico de seus sinais em suas relações de
sinonímia,
antonímia, homonímias, homógrafas e polissemia, artigo de Ediane Lima e
outros, disponibilizado pela
Associação de Linguística e Filologia da América Latina (ALFAL).

Semântica e pragmática, de Magdiel Aragão Neto, disponibilizado na biblioteca virtual da


UFPB.

Semântica da Libras: hiperônimos e hipônimos e o desenvolvimento linguístico da criança


surda, de Marcos
de Moraes Santos, dissertação de mestrado disponibilizada pela UFAL.

Assista aos seguintes vídeos:

Níveis da Linguística: Semântica, Pragmática e Discurso, com a pesquisadora Ronice


Quadros, disponível
em seu canal no YouTube.

Vídeo Semântica Libras, disponível no canal Letras Libras UFRB.

https://stecine.azureedge.net/repositorio/00212hu/02638/index.html# 57/57

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