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Universidade Federal de São João Del Rei Campus Dom Bosco - UFSJ

Leonardo Érick de Andrade

Giordano Bruno a inquisição e o pensamento reacionário

São João Del Rei


2022
Leonardo Érick de Andrade

Giordano Bruno a inquisição e o pensamento reacionário

Orientador: Paulo Roberto Andrade de Almeida

São João Del Rei


2022
Bibliografia:

CIORAN Emil. Exercícios de Admiração, Ensaios de Perfis. Editora Rocco 2011

https://www.todamateria.com.br/giordano-bruno/#:~:text=Giordano%20Bruno%20(1548-
1600),natureza%20divina%20de%20Jesus%20Cristo.

https://www.bbc.com/portuguese/geral-43081130

Filme: Giordano Bruno 1973


Giordano Bruno foi um dos mais importantes pensadores da era medieval/renascentista
e certamente um dos mais polêmicos. Desde noviço ele chamava atenção por seus
pontos de vista controversos e originais em relação a questões teológicas da época, mas
em 1575 após se tornar padre e concluir o curso de teologia em Nápoles o cerco em
relação as suas idéias começa a se fechar lentamente. Após ser excomungado algumas
vezes de vertentes da religião cristã como a dominicana, luterana e calvinista ele viajou
por diversos países da Europa, por necessidade de refúgio ou para estudos, mas sempre
mantendo uma característica notável em relação a seu pensamento, a controvérsia. Ao
apoiar teorias como o heliocentrismo e a questionar a santidade de cristo, ainda mais
nessa época conturbada da inquisição e da religião católica é possível dizer que ele
começa a alimentar as chamas de sua fogueira, visto que a obra de Copérnico,
fundadora da teoria heliocêntrica, já havia sofrido censuras bastante severas. Algum
tempo depois após ter sido denunciado por Mocenigo o destino de Bruno foi traçado e
mesmo ele tendo renunciado as suas teorias na esperança de mais alguns anos de
liberdade para espalhar sua doutrina é dito que no ultimo interrogatório ele se nega a
abjurar e assim em 17 de fevereiro de 1600 ele acaba sendo queimado pela inquisição.

O pensamento de Giordano Bruno era certamente inusitado levando em conta o que se


sabia naquela época, ele não apenas defendia a teoria do heliocentrismo de Copérnico,
mas ia mais além ao defender que o universo era infinito, que existiam diversos outros
planetas além dos que já eram conhecidos na época e também dizia que haviam diversos
sóis e planetas cheios de vida como a terra espalhados pelo universo. Obviamente essas
teorias não tinham base cientifica alguma, mas sim religiosa de seu ponto de vista
panteísta, mas foram surpreendentemente acuradas para a época e esse é um dos
motivos desse pensador ter sido tão relevante mesmo séculos depois de sua morte na
fogueira. Após sua morte ele leva o título de mártir do pensamento livre que nas
décadas seguintes dá origem ao movimento iluminista no inicio da revolução industrial
na Europa.

Como exatamente que Giordano Bruno continuou tão atual mesmo tanto tempo depois?
Se o pensamento dele não fosse tão revoltante para os dogmas da época, tão cruamente
direto em suas pautas em relação a santidade de Cristo, tão abertamente desafiador e
jocoso em relação aos velhos ensinamentos que as grandes autoridades da igreja católica
da época transmitiam, Giordano Bruno não seria tão relevante. Ele não teria sido tão
importante para o desenvolvimento do pensamento renascentista e moderno se ele não
tivesse causado angustia e alarde no coração de tantos membros do Clero que sentiam
que precisavam calar esse homem da forma mais rápida o possível e que mesmo assim
viram sua doutrina se espalhando feito uma infecção pelo resto da Europa, queiram eles
ou não. Giordano Bruno com todos os holofotes virados para si foi o exemplo perfeito
da frase “Podem matar o homem, mas não a idéia”, idéias não morrem e nem tem fim,
as idéias são transmitidas através da linguagem, logo, já era tarde demais para consertar
o estrago que a execução deste homem causou, ainda mais numa época de decaimento
da fé cristã tal qual foi o renascimento e as eras posteriores, tendo um fundo mais
antropológico e humanista.

Um dos exemplos mais escancarados do pensamento reacionário e do conservadorismo


pode ser observado de forma bastante clara em todo o processo do renascimento, mas
principalmente no caso especifico da execução de Giordano Bruno. Você tem em suas
mãos a igreja, que mesmo com influência o bastante para executar aqueles que são
contrários aos seus dogmas, tem um poder que vem decaindo em virtude do movimento
humanista e antropocêntrico que vem florescendo rapidamente durante aquele tempo,
não podendo impedir essas idéias de crescer mais e mais com o passar do tempo.

Uma das características fundamentais para essa linha de pensamento é a estabilidade das
idéias levando a um tipo de mundo estático desprovido das conseqüências que vem com
as mudanças. Usando de algumas descrições acerca do homem reacionário expostas
pelo pensador romeno Emil Cioran no livro “Exercícios de Admiração” é possível ter
uma idéia bem clara de como essa linha de pensamento funciona: “Muitas vezes o
reacionário é apenas um sábio habilidoso, um sábio interesseiro que, explorando
politicamente as grandes verdades de metafísicas, vasculha sem fraqueza nem piedade
os segredos do fenômeno humano, para revelar seu horror. Um aproveitador do terrível,
cujo pensamento – coagulado pelo calculo ou pelo excesso de lucidez – minimiza ou
calunia o tempo”, “Contudo, o reacionário, este conservador que tirou a mascara,
tomará emprestado das sabedorias o que elas tem de pior e de mais profundo: a
concepção do irreparável, a visão estática do mundo.”, nós temos esse pensador que
utiliza do que já foi feito, da admiração pelo que já foi, pelo conceito de um mal
irreparável que assombra a humanidade em suas raízes mais profundas para tomar as
rédeas da sociedade onde vive, não para consertar algo, mas deixar aquilo que está
quebrado em seu lugar, porque não há motivos para alterar ordens superiores de um
tempo melhor que o nosso.

Giordano Bruno ao tentar chacoalhar o mundo ainda engatinhando para fora do


medievo com suas idéias se vê vitima de uma reação bem severa do Clero na época,
sendo preso e queimado em praça publica posteriormente. Uma atitude bastante
esperada da igreja naquele momento de mudança que foi a renascença é de se estimar
que o catolicismo esteja perdendo força. E eles usaram de tudo a sua disposição para
calar o homem, fazem seu julgamento divino usando de toda a força da fé que possuíam
na época. Novamente voltando a Cioran conseguimos observar no seu livro citado
anteriormente uma passagem certamente extravagante, mas em linha com o pensamento
da igreja renascentista, “Toda a sabedoria e com muito mais razão, toda a metafísica são
reacionárias, assim como toda forma de pensamento que, em busca de constantes, se
emancipa da superstição do diverso e do diverso e do possível. Um sábio ou um
metafísico revolucionário é uma contradição em termos. A um certo grau de indiferença
e de clarividência, a historia não tem mais valor, o próprio homem deixa de ser
importante: romper as aparências é vencer a ação e as ilusões que resultam dela.
Quando nos debruçamos sobre a miséria essencial dos seres, não nos detemos naquela
que resulta das desigualdades sociais, nem tentamos remedia-la. (Podemos imaginar
uma revolução buscando seus slogans em Pascal?)”, certamente uma passagem que
ataca muita gente, mas que não deixa de ser verdades em certos pontos. A igreja busca
em si e em seus dogmas a sua reação a mudança, isso ocorreu tanto naquela época
como ocorre hoje dependendo das vertentes das quais se observa.

Certamente eles tentaram impedir o progresso dos homens, mas o tempo não para pra
esperar, e parando pra analisar a situação a igreja foi colaboradora das revoluções
seguintes. Com a morte revoltante de Giordano Bruno que, de acordo com relator, lutou
até o fim pelo livre pensamento e pela ciência, você consegue uma figura revoltante,
atual e notória, que dá o pontapé para movimentos como a revolução francesa no fim do
século XIII e a inauguração da era moderna. Giordano Bruna engatinhou para que o
pensamento iluminista pudesse caminhar décadas depois de sua morte. Contudo, mesmo
com esse baque do movimento do livre pensamento na Europa e a desmistificação dos
sistemas políticos explorados na revolução francesa, ainda há de uma forma ou de outra
oráculos do pensamento reacionário, um lugar de honra para essa época cabe a Joseph
de Maistre, desprezador ávido da revolução francesa, que por desilusão ou coincidência
percebe as falhas do movimento liberal e o decaimento do pensamento utópico burguês
da época. Ainda assim se mantendo preso aos dogmas do catolicismo como um bom
reacionário da época, definindo a raça humana (e se deleitando no processo) como
“escravos em correntes flexíveis”.

Seja por má índole ou por um desejo genuíno de encontrar sua utopia num passado que
sequer existiu muitas vezes, o pensamento reacionário resiste ao tempo e ao avanço que
tanto detesta, talvez por sua simplicidade ou por sua fácil reprodução - afinal no fim de
toda revolução quando a ordem se instaura o revolucionário rapidamente inverte seu
papel – ele sobrevive ao curso das coisas, mesmo que revoluções não possam ser
impedidas, como prova a morte de Giordano Bruno e seus impactos no mundo
ocidental.

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