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Fabiana Vieira Gonçalves de Souza

Teoria Literária II

Lubi faz uma alusão ao poema " Canção de Exílio" escrito por Gonçalves Dias, romancista, em 1847.
Este poema foi escrito em um período no qual os poetas buscavam criar por meio de suas poesias uma
identidade nacional. Além disso, ele foi escrito quando o poeta estava em Portugal estudando. Sendo
assim, a voz lírica recorda a saudade que sente de sua pátria e ressalta a beleza da sua terra, o Brasil.

Em contrapartida, a voz lírica do poema de Lubi está em seu país. Porém, ela não se sente em casa
nele e isto se evidencia pela anáfora das estrofes "tudo aqui é um exílio" a qual ela retoma cerca de
quatro vezes ao longo do poema. Parece que os dois poetas enxergam Brasis diferentes. Enquanto o
sujeito poético de Gonçalves Dias recorda a saudade que sente do canto dos sabiás, o de Lubi sente
saudade de se sentir em casa dentro do seu país. O Brasil retratado por Lubi é muito mais complexo
que o de Gonçalves Dias.

Alguns trechos do poema de Gonçalves Dias fazem parte do hino nacional brasileiro e isto evidencia a
importância que este poema tem até hoje para o Brasil.A voz lírica do poema usa o pronome
possessivo "minha" para se referir ao Brasil, ao passo que a de Lubi não pode chamar o Brasil de sua
terra. Uma vez que, para ela esse país não a pertence, por isso ao se referir ao Brasil, ela diz: "tudo
aqui é um exílio". É interessante perceber que ela usa o verbo ser no presente, haja vista que o Brasil
foi um exílio para os negros no período do tráfico negreiro e o que a voz lírica expõem com estes
versos é que nada mudou. Os anos se passaram e o Brasil continua sendo um exílio para quem é
negro.

Na quarta estrofe, os versos "quase todos negros" foram escrito em versos livres, a fim de ressaltar
que apesar de haver uma identificação racial dela para com o povo que aqui habita, a voz lírica se
sente exilada em "sua terra" e o seu povo não a acolhe. Na sexta estrofe, a voz lírica recorda o tráfico
negreiro. A confusão entre a saída e a chegada é devido a esse povo não ter escolhido sair de seu país
e chegar ao Brasil. Eles foram sequestrados de seu país, vendidos, escravizados, silenciados,
desumanizados e torturados.

Na sétima estrofe, essa voz lírica diz que as ondas forçadas pelo navio foram apagadas na chegada.
Essas ondas forçadas ao mar podem representar todo o sofrimento vivido por eles quando foram
brutalmente sequestrados de seu país. E o fato de terem sido retirados à força de seu país e não terem
a chance de se despedir de quem amavam. Além disso, quando chegaram ao Brasil foram obrigados a
deixar todo o seu passado e história do outro lado do Atlântico. Essas ondas podem ter sido apagadas,
mas o racismo não. Pode ser que as ondas tenham sido apagadas, mas o som delas ainda ecoam. O
som da exploração e desumanização vivênciado pelo povo negro ainda ecoa aos negros ouvidos
dizendo que aqui não é o lugar deles. O Brasil continua sendo um exílio para quem é negro. O Brasil é
muito mais que um país onde os sabiás cantam. O Brasil não é tão belo para quem é negro. Para os
negros o sabiá canta, mas a violência e o racismo cantam também.

Na oitava estrofe, a voz lírica faz uso do verbo "ser" no presente do subjuntivo o qual denota
suposição ou hipótese. Ela expressa o seu desejo de que embora tudo isso tenha acontecido e ainda
acontece, os olhos dela não deixem de ser África. É como se ela fizesse uma prece a si mesma para
não se esquecer da África. Além disso, o poema todo foi escrito em letras minúsculas, porém a única
frase que é escrita em letra maiúscula é quando ela diz "África". Esse verso é uma recordação do
apagamento cultural que o corpo negro sofreu ao chegar ao Brasil. Ao chegar os portugueses os
impediram de falar o seu idioma, eles perderam o direito de terem um nome e de praticarem os seus
rituais religiosos, afinal eles não eram mais pessoas, entretanto, mercadorias. O natural seria que
assim que eles chegassem os seus olhos imediatamente deixassem de ser África. Todavia, ela tem a
necessidade de carregar consigo a recordação do seu país, da sua cultura, do seu idioma, do seu povo
e o mais importante: de trazer em seu olhar o seu passado. Acho que "trazer de volta ao coração" a
África aqui é uma forma de recordar que ela é gente, é recordar que ela não é inferior a ninguém pelo
fato de ser negra, é recordar que ela tem um nome, é recordar que ela tem uma cultura. Recordar à
África talvez seja a única forma do corpo negro sobreviver no exílio.

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