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Priscilla Caro- RESUMO: Este artigo tem como objetivo observar as tensões que surgem quando um movimento social
line de Sousa de orientação radical empreende ações no âmbito das instituições políticas. Para tanto, parte-se do
Brito estudo de um caso específico: o Movimento Passe Livre de Brasília (MPLJ.
ABSTRACT: This article intends to observe the tensions that may arise when a social movement of
Graduanda do radical orientation engage in actions within the ambit of political institutions. Given this purpose, the
curso de Ciência analysis is centered on a specific case study: the Passe Livre Movement of Brasília.
Política I UnB
Palavras-chave:
Movimento Passe
Livre; Instituições
Introdução vação inicial, a disponibilidade de informações so-
bre o movimento e a facilidade de acesso ao grupo
políticas; Identi-
tornou-o um caso interessante para um estudo
dade; Estratégia; O Movimento Passe Livre Nacional surgiu a
Ação direta. no âmbito da graduação.
partir de uma série de manifestações contra o
A metodologia adotada foi a realização de ob-
aumento das tarifas do transporte público. As
KeyWords: servação participante em reuniões do Movimento
primeiras ocorreram em Salvador, em 2003, e fi-
Passe Livre Mo- e três entrevistas com militantes do MPL, entre
vement; Political caram conhecidas como a "Revolta do Buzú". No
os meios de abril e maio do mesmo ano, basea-
institutions; ldenti- ano seguinte, ocorreu "A Revolta da Catraca", em
das em um roteiro semi-estruturado com doze
ty; Strategy; Direct Florianópolis 2 .
action. questões abertas. Como explicarei mais adiante,
Embora o passe livre já constasse na pauta de
no período da pesquisa poucos militantes partici-
reivindicações do Movimento Estudantil há muito
pavam ativamente das reuniões. O éritério de es-
tempo, era visto como garantia de acesso à edu-
colha dos três entrevistados foi, portanto, o da
cação. A partir das manifestações, começou a
maior freqüência nas reuniões observadas. Neste
incidir sobre a demanda a influência de grupos au-
trabalho, optei por oferecer-lhes o anonimato,
tônomos, especialmente os de orientação anar-
como uma forma de resguardá-los dos erros que
quista, o que levou a uma ampliação do seu sig-
eu possa ter cometido na análise das informa-
nificado. O passe livre passou a ser visto não só
ções coletadas.
como meio de acesso à educação, mas também
As atividades da pesquisa foram muito impor-
à cultura, ao lazer, ao trabalho (ABRAMO, 20071.
tantes porque permitiram esclarecer algumas
Posteriormente, na constituição do Movimento
dúvidas e conhecer o movimento com um pouco
Nacional, a postura se radicalizou e ganhou a di-
mais de profundidade. Pela própria trajetória de
mensão de tomada da cidade. A partir daí a de-
luta do movimento, defini como foco da pesquisa
manda passou a ser o passe livre universal.
a forma como o movimento concilia a sua pers-
Visto como uma forma de ação política anta-
pectiva autonomista de negação ao sistema ca-
gonista, fundamentada explicitamente no princí-
pitalista e às formas tradicionais de organização
pio da autonomia, o MPL é um caso em que os
política com a necessidade de diálogo com as ins-
dilemas que surgem da interação com as insti-
1 O trabalho é fruto de tituições políticas. Ou seja, de que maneira lida
1uma pesquisa de três meses tuições políticas são importantes no sentido de
desenvolvida no âmbito da com o dilema entre identidade e estratégia.
disciplina de "Política e Mo-
definir concretamente as suas capacidades. A
vimentos Sociais", ministrada identidade do movimento impõe dilemas à atua-
IPela professora Marisa von
IBülow, no primeiro semestre ção do grupo de Brasília: ele precisa conciliar a Bases teóricas
de 2008, na Universidade de
!Brasília.
identidade autônoma e a necessidade de diálogo
com o Governo. Na teoria social, diferentes definições são da-
2 Agradeço a lsadora A motivação inicial da pesquisa era fazer um das para os movimentos sociais. Estas definições
Cruxên pela paciência na
!leitura de várias versões do estudo de caso com um dos movimentos juvenis apresentam algumas diferenças importantes en-
il:exto e, principalmente, pela
ajuda na revisão da versão
de Brasília que se destacasse pelas ações em- tre si, já que o seu conteúdo simbólico se relacio-
final. Agradeço também aos preendidas. Para tanto, fiz um mapeamento pré- na diretamente com o contexto político onde os
comentários de Paíque à ver-
são inicial. Por fim, agrade- vio, em março de 2008, que permitiu a identifi- movimentos se encontram e as dimensões que
ço a todo o grupo PET-POL,
cação do Movimento Passe Livre como um ator as suas ações atingem. Ou seja, a preocupação
que sob a valiosa orientação
da professora Marisa von relevante na rede. Em seguida, uma análise das em formular teorias que tentem explicar que tipo
IBülow, se consolida como
IL!ma importante experiência informações disponibilizadas no blog do grupo de de ação coletiva é o movimento social advém da
acadêmica no âmbito da gra- Brasília e no site do Movimento Passe Livre Na- importância dos movimentos como sujeitos his-
duaçáo.
cional revelou algumas características do ·grupo, tóricos. Como característica constante entre as
um pouco de sua história, os princípios adotados definições, identifico a atribuição de que os mo-
e os tipos de ações empreendidas. Além da moti- vimentos se caracterizam principalmente pelas
MOVIMENTO PASSE LIVRE DE BRASÍLIA: POR UMA VIDA SEM CATRACAS REVISTA TRÊS (eee) PONTOS
6.1
ações que empreendem em prol da mudança. atores, coordenação social e estratégia política:
Não cabe reproduzir aqui a discussão teórica problemas conceituais dos movimentos sociais. O
que envolve a definição de movimentos sociais. trabalho é uma proposta de conciliação de ele-
Mas, como gancho para a análise, retomo o con- mentos das abordagens européia e americana a
ceito culturalista proposto por Goodwin e Jas- cerca dos movimentos sociais. A conclusão ao
per (20051. Estes autores definem movimentos comparar as duas correntes é a de que nem uma
sociais como esforços conscientes, mantidos e das duas abordou satisfatoriamente o problema
compartilhados por pessoas comuns para mudar da estratégia:
alguns aspectos da sociedade usando meios ex-
tra-institucionais CGOODWIN & JASPER, 20051. "Meu objetivo final é, então, mostrar que
Trata-se de uma definição útil, mas que apre- uma síntese que parta das contribuições
senta algumas limitações. Uma delas é o fato de dos estudiosos americanos e europeus
que, no processo de definição de suas estraté- para depois superá-/as pode ser útil para
gias, os movimentos sociais se deparam com a revelar novas facetas do problema da es-
neces9idade de diálogo com as instituições polí- tratégiapolítica"CMUNCK, 1997, p. 41.
ticas. Em muitos casos, as demandas só podem
ser alcançadas por meio de rearranjos no interior
Munck define os movimentos sociais como "um
dessas instituições. Este é um grande desafio
tipo de ação coletiva orientada para a mudança"
para os movimentos sociais que comprometidos
CMUNCK, 19971. Ou seja, o movimento precisa
com a mudança precisam se organizar de forma
se orientar para alcançar um objetivo, pesando
coordenada e coerente- o que o coloca como ato-
as conseqüências de suas ações no meio que o
res estratégicos nos conflitos do campo social.
circunda e, ao mesmo tempo, manter a coesão da
Segundo Melucci, a sociedade moderna lem-
sua identidade. Isso suscita uma tensão que pode
bra um "campo interdependente constituído por
ajudar ou prejudicar o desenvolvimento do movi-
conflitos e continuamente preenchido por signi-
mento, dependendo das escolhas que são feitas.
ficados culturais opostos" CMELUCCI, 19971. O
Para o autor, o fracasso ocorre tanto no caso das
desafio de conciliar a sua perspectiva de mudança
estratégias se sobreporem à identidade quanto
com o diálogo com as instituições políticas não é
no caso contrário.
um tema novo nos estudos de movimentos so-
O autor lembra que o movimento está situado
ciais. O que é novo, ou melhor, "novíssimo" 3 , é a
no âmbito da sociedade, esfera que o leva a distin-
forma como esse dilema se configura no que diz
guir quatro "caminhos" a serem seguidos. Ao ser
respeito aos movimentos sociais que surgem no
formado, o movimento é definido como autolimitado,
contexto do processo de globalização.
situação na qual ele contrapõe-se à esfera político-
Reunidos sob o título de Movimentos "Antiglo-
institucional, restringindo-se à arena da sociedade
balização" ou "Aiterglobalização", esses movimen-
civil e assim mantendo uma coerência entre meios
tos foram responsáveis por uma série de aconte-
e fins . .Permanecer aí, no entanto, pode comprome-
cimentos da história política recente. Entre eles,
ter seu compromisso com a mudança. Ao deparar-
os protestos anti-OMC, em Seattle (1 9981, con-
se com o os problemas da estratégia, ele pode se
tra a reunião do Fundo Monetário Internacional
tornar "politicamente orientado", uma "força políti-
e do Banco Mundial em Praga (20001 e contra o
ca populista" ou uma "força política fundamentalis-
GB, em Gênova (2001 J. Esse contexto de ques-
ta" CMUNCK, 1997, p. 101.
tionamento da ordem social vigente e das formas
de organização até então utilizadas para mudá-la
ajuda a explicar o surgimento de uma ação coleti- "Se por um lado, a identidade dos movimen-
va como o Movimento Passe Livre. tos está associada a sua capacidade de atu-
Os dois marcos significativos desse novo con- ar de forma autônoma, ou seja, não dirigida
texto são a globalização e o neoliberalismo, que por partidos ou governos, por outro lado,
impulsionam em uma geração de jovens tipos de a eficácia política dos movimentos depende
movimentos que "recriam uma agenda política ca- das relações que suas lideranças são ca-
racterizada pela afirmação da autonomia e pela pazes de estabelecer com o meio político-
negação dos espaços institucionais que se colo- institucional. Esses princípios {autonomia e
cam como passíveis de humanização da opressão eficácia}, embora não sejam excludentes,
e das injustiças sociais ocasionadas pelo modelo trazem exigências de operação distintas,
capitalista" CLÜCHMANN & SOUSA, 20051. Os conformando um âmbito próprio de dilemas
movimentos juvenis, particularmente, tomam for- e tensões constitutivas às relações entre
3 Sobre os "novíssimos
ma de "uma rede de diferentes grupos" nos quais esses dois campos" ITATAGIBA, 2008J. sujeitos" que entram em
cena, ver GOHN, Maria da
novos modelos culturais são testados e coloca- Glória. "Novas teorias dos
movimentos sociais". São
dos em prática CMELUCCI, 19971. Com o fracas- Colocadas como tipos ideais, essas categorias Paulo: Edições Loyola, 2008.
so das experiências socialistas no final do século são úteis na análise porque permitem levar em conta
XX, emergem as críticas às "velhas" formas de a dinâmica da ação coletiva. No entanto, não devem 4 No entanto, é preciso
ressaltar que apesar da crítica,
organização associadas a elas 4 . ser tomadas como categorias exclusivas, no sentido o socialismo é resgatado no
interior desses movimentos
Para tratar da forma como o dilema entre de que as mudanças deveriam ocorrer em um único sob diferentes leituras.
identidade e estratégia emerge no Movimento sentido. Como veremos, a dinâmica dos movimentos
Passe Livre utilizarei como principal referência o permite que eles se orientem de diferentes manei-
trabalho de Gerardo Munck (1 9971, Formação de ras, a partir do contexto em que se situam.
REVISTA TRêS (eee) PONTOS Priscilla Caroline de Sousa Brito
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Na "Plenária Nacional pelo Passe Livre" fÔram fi- do princípio da independência e a substituição do
xados os princípios que orientariam as ações dos princípio de politização pelo de anticapitalismo.
grupos nas cidades: apartidarismo, autonomia, A horizontalidade é proposta no sentido de
horizontalidade e anticapitalismo. que não há uma organização hierárquica interna.
Além da questão da garantia de acesso à edu- Apesar do movimento se dividir em grupos de tra-
cação, o movimento, de forma geral, incorporou a balho para organizar as atividades, as decisões
crítica às formas de organização do espaço social. são tomadas preferencialmente por consenso.
Estar próximo das pessoas em aglomerações ur- Claro que isso não elimina o fato de que há mili-
banas coloca diferentes possibilidades que rede- tantes que participam mais ativamente e outros
finem as interações sociais. "Os agentes sociais que apenas comparecem às manifestações.
são constituídos como tais nas e pelas relações A decisão de não se vincular a partidos foi co-
que estabelecem em um determinado espaço so- locada desde a consolidação do movimento em
cial" (NUNES, 2007). O espaço físico é também, Florianópolis. Na prática, o apartidarismo repre-
simbolicamente, o espaço social. Mudá-lo significa senta a negação da atuação política dos partidos.
transformar as relações sociais existentes. Como A autonomia, por sua vez, é proposta no senti-
o preço das passagens é visto como o instrumen- do do movimento escolher suas próprias formas
to de exclusão social, a mudança só seria possível de atuação; enquanto a Independência tem a ver
com a instituição do passe livre universal. com o não recebimento de financiamento estatal
A partir dali pipocaram movimentos em di- ou privado. Por fim, o anticapitalismo, refere-se à
negação do sistema capitalista.
versas cidades do país. Em Brasília, o processo
teve algumas particularidades. O Movimento não É importante perceber que há aí uma forte
influência do anarquismo, o qual permite uma
nasceu de forma "espontânea" como em Floria-
dupla negação: tanto dos espaços institucionais
nópolis. Na verdade, a demanda foi usada como
vigentes, como das experiências socialistas co-
uma forma de articular ações ativistas radicais.
nhecidas. De um modo geral, o reconhecimento
Segundo um dos militantes,
da identidade do movimento se dá, portanto, na
afirmação de princípios como os do Movimento
"Quando a gente começou a desenvolver o
Passe Livre.
Centro de Mídia Independente [CMI] aqui
em Brasília, um coletivo de ativismo radical,
não existia mobilização no sentido da luta As estratégias de ação e afirma-
autônoma. {... }Mesmo assim começamos ção da autonomia
a nos articular para incentivar as coisas
aqui. O resultado foi o Encontro dos Grupos
Autônomos [2005}, que na verdade reuniu "Não somos um movimento reformista, pro-
pessoas com uma perspectiva parecida, pomos mudanças reais. Mas não podemos
autônoma, porque os grupos ainda não negar que estamos dentro de um modelo
existiam". (informação verbal, 2008). de sociedade e que temos que lidar com
ele. É por isso que mediamos em algumas
Inspirado nos Encontros de Grupos Autôno- situações" (informação verbal, 2008).
mos do Brasil, ocorridos em São Paulo em 2004,
o Encontro teve como objetivo propor formas di- Para entender melhor a atuação do movimen-
ferentes de atuação política, sem depender do fi- to no período estudado, é preciso levar em conta
nanciamento privado ou estatal (MENDES, 2007). algumas especificidades das fases pelas quais ele
Algumas pessoas que participaram das manifes- passou. Na primeira fase do movimento em Brasília,
tações em Salvador e Florianópolis estavam vin- a principal luta era pelo passe livre para estudantes
culadas ao Centro de Mídia Independente (CMIJ 5 . e desempregados. De forma a começar a empreen-
Portanto, a demanda pelo passe livre e suas novas der ações diretas, contudo, o grupo se envolveu em
formas de interpretação já eram conhecidas pelo diversos conflitos relacionados ao transporte, des-
g'rupo. Dada a precariedade do sistema transpor- de manifestações contra os aumentos das tarifas
te público em Brasília, a conjuntura era favorável até o questionamento do estado de conservação
para a criação de um grupo que propusesse a re- dos veículos. Em Brasília, o estado de conservação
5O lndependent Media
flexão sobre as maneiras de modificá-lo. Além dis- dos veículos é lastimável e com o crescimento po- Center (Centro Independente
de Mídia) é uma rede de co-
so, "cada grupo tinha uma pauta diferente, mas pulacional, problemas como os engarrafamentos municação dirigida coletiva-
eles se uniram em torno da pauta do passe livre. são cada vez mais constantes. mente que visa à criação de
narrações mais fidedignas so-
A partir deste momento, houve uma relação maior bre as ações dos movimentos
entre eles", como afirma Ufl2 dos participantes (in-
sociais ao redor do mundo.
'Tempo de espera na parada, estado de con- Foi criado por volta de 1999,
formação verbal. 2008J. servação dos ônibus, reclamações, insatisfa- por organizações e ativistas
da mídia independente e al-
A adesão do movimento de Brasília ao Movi- ção, indignação! "Os problemas mais comuns ternativa, com o propósito
mento Nacional foi feita oficialmente por meio de são em relação a manutenção da frota. Os de oferecer uma rede para
a cobertura jornalística dos
carta aprovada em assembléia dia 13 de maio ônibus não têm menor condição de uso, já protestos de novembro de
1999 contra a OMC em Seat-
de 2006. Antes constituído como um grupo à estão bastante ultrapassados e isso compro- tle (ANTOUN, 2001 ).
parte, o MPL de Brasília tinha como princípios a mete a segurança do profissional, quanto dos
autonomia, a horizontalidade, o apartidarismo e passageiros. São problemas de freio, pneu
a politização. A vinculação acarretou a inclusão careca, excesso de ruído e excesso de calor,
~EVISTA TRÊS (eee) PONTOS Priscilla Caroline de Sousa Brito
6.1
Eu diria que o serviço de transporte coletivo mesmo aconteceu com outros grupos da sociedade
em Brasília está, totalmente, abandonado", civil, como os sindicatos (Informação verbal, 20081
relata João Osório, presidente do Sindicato As ações diretas se tornaram atraentes para
dos Rodoviários" CMONACO, 20051 os jovens e para a mídia principalmente por causa
da linguagem criativa utilizada. A partir das infor-
Essa ampliação da demanda permitiu que mes- mações obtidas nas entrevistas, elaborei o quadro
mo aquelas pessoas que não se identificavam com o a seguir, que contém uma breve explicação das prin-
ativismo radical passassem a apoiar o movimento. O cipais formas de protesto empreendidas pelo MPL:
modificando, embora não seja possível delimitar como das formas de organização que se opunham
em que medida se trata da influência do MPL. a elas, vinculadas ao socialismo.
Na perspectiva do trabalho de Gerardo Mur:l-
"As cidades devem possibilitar a mobilidade ck (1997), o MPL tem dificuldade de lidar com â
e a convivência juvenil, facilitando aos jovens necessidade de diálogo com as instituições políti-
o acesso à educação, ao trabalho, à cultura cas. Por isso, a ênfase recai sobre as ações dire-
e ao lazer. Para isso, é preciso que haja tas, realizadas no âmbito da sociedade civil. Como
uma maior interação entre a gestão e a or- uma experiência em pequena escala, o movimen-
ganização do espaço urbano com as ques- to é capaz de influenciar outros grupos, pois sua
tões juvenis" (I CONFERÊNCIA NACIONAL forma de ação antagonista faz dele um "desafio
DE JUVENTUDE, 2008) . simbólico", nas palavras de Melucci (19971.
Não existem, contudo, conquistas objetivas.
No entanto, vale lembrar que esta perspec- O desafio, portanto, é conciliar a natureza da sua
tiva foi ressaltada na pesquisa por conta de uma identidade com as estratégias que o orientam. A
de suas limitações: os militantes entrevistados verdadeira aspiração, o passe livre universal, de-
são os mais ativos em um período de baixa mo- pende da força e da capacidade do movimento de
bilização, quando o movimento saía da sua fase transformar de fato a realidade. Pela sua forma
se reclusão. Ou seja, são os atores que melhor atual, o caminho é longo e o risco de limitar-se a
se identificam com o conflito e dão sentido a ele. uma política de identidade é significativo.
É preciso considerar também as dificuldades
Nesse caso, participar do movimento é mais in-
de chamar a atenção despertada no início do mo-
teressante pela experiência que ele permite do
vimento. Não há muitas perspectivas de conse-
que pela conquista da sua demanda. Talvez para
guir-alcançar a tarifa zero, porque isso implicaria
outros, a demora na obtenção do direito motiva
mudanças significativas na percepção do espaço
a não-participação. A postura fundamentalista
social, o que dificulta a mobilização. O compro-
faz com que as interpretações sobre o signifi-
misso com a mudança, como um todo, fica com-
cado político do movimento se multipliquem e o
prometido. Embora haja o empenho por parte dos
grupo perde a capacidade de coordenar-se em
fundadores em continuar com as ações diretas,
prol da mudança.
é até difícil para novos integrantes perceberem o
significado profundo da demanda.
Conclusões Gerais Por isso, a dificuldade com classificação dada por
Munck diz respeito aos aspectos temporais da dinâ-
O Movimento Passe Livre (MPLl constituiu-se mica do Movimento. Embora o caso tenda a encai-
como um dos grupos de destaque do ativismo ju- xar-se na definição de autolimitado, esta definição
venil de Brasília. Sua demanda, o passe livre uni- não dá conta dos dilemas específicos que surgiram
versal, é um desafio através do qual se questiona da fase de reclusão do movimento, momento da defi-
a exclusão social promovida pela forma de organi- nição dos novos termos utilizados nas ações.
zação do espaço urbano. O importante é perceber, portanto, que apre-
Os princípios nos quais o movimento se afirma sentar os dilemas que envolvem o diálogo entre o
são mais bem compreendidos no contexto histó- movimento e as instituições políticas nos termos da
rico e social da geração nascida nos marcos da dicotomia identidade e estratégia não pode implicar
globalização, do neoliberalismo e do fracasso das a redução do significado que o movimento assume
experiências socialistas. Embora nem sempre como ator estratégico dos conflitos sociais. Sua
diretamente/citado, o anarquismo constitui-se atuação se desenvolve por meio de um processo .
como uma referência importante porque permite fluido e contingente, que muitas vezes vai além das
e dupla negação: tanto das instituições políticas nossas possibilidades de apreensão da realidade.
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REVISTA TRÊS (eee) PONTOS
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