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Estava tão quente quanto se podia imaginar, não dava para andar descalço na calçada

e poucos minutos debaixo do sol já causavam marcas que durariam semanas. Esse
era sem dúvidas um dos piores verões que já acontecera.

Remus se arrastou pela parede sentindo sua cabeça deitar na almofada que antes
apoiava suas costas, passou a próxima página soltando um suspiro. O livro "a
fantástica fábrica de chocolate" apesar de muito bom e divertido deixava Remus
passando vontade. Queria ele poder ter uma fábrica de chocolates.

Ouviu os passos delicados nas escadas, mas não moveu os olhos já sabendo o que
seria. Continuou deixando as palavras se misturando com seus pensamentos, quando
na realidade nem as via. Conseguia visualizar perfeitamente Willy Wonka e seus
Oompa-Loompas com roupas avermelhadas.

— Remus, querido? — chamou Hope entrando no sotão, afastando a cortina que


havia no local da porta.

Havia um copo de suco de laranja em sua mão direita e um prato com bolo de
chocolate na esquerda, sorriu levemente apreciando seu menino lendo, caminhou
para mais próxima e colocou ao lado ele o copo e prato:

— Obrigada. — murmurou Remus em tom baixo.

— Por nada, meu bem. — respondeu ela sorrindo levemente dando meia-volta em
direção as escadas novamente. Afastou as cortinas e começou a descer. — Depois
você poderia colocar os livros para devolver lá embaixo, babe?

— Hurum...

Remus desviou os olhos do livros e se ajeitou voltando a ficar sentando, procurou


com os olhos seu bloco de notas, mas não encontrou... Ouviu um som de um apito
escoar em seus ouvidos, não muito alto, fechou o livro sem nem se importar com a
marcação de páginas.

Engatinhou em direção a janela retangular empurrando o prato com as pontas dos


dedos, se sentou apoiando na parede, colou a testa no vidro meio sujo e encarou as
crianças.

Um garoto loiro, mais ou menos da sua idade, descalço usando apenas um short e
um boné azul prendia uma bola de futebol no chão com os pés. Remus observou ele
girar a bola jogando ela para cima e pegar com o joelho, jogar para cima novamente e
repetir mais uma vez. Um circulo se formou em volta dele enquanto outras crianças
contavam quantas vezes ele conseguia fazer isso. Ele parou na dezenove, o que foi
motivo para risos e animação entre as crianças.

Remus abaixou o olhar para o prato se afastando da janela e deu uma mordida,
limpando a boca com as costas da mão e lambendo logo em seguida. Olhou
novamente para os meninos e observou outro - um ruivo - fazendo exatamente a
mesma coisa, esse chegou aos vinte e três. Remus repassou o plano mental que
estava tendo nas últimas três semanas, ele sabia que conseguiria se tentasse, mas
tinha tanto medo dos pais ficarem decepcionados com ele...

Uma garotinha de cabelos castanhos - mais nova que a maioria - colocou um


banquinho de madeira no canto da calçada e segurava um pedaço de madeira com a
ponta queimada. Tinha um apito preso por um cordão em seu pescoço.

Mais algumas garotas vestidas com vestidos azulados chegaram junto com outros dos
garotos. O time estava completo, Remus já havia contado, eram quinze crianças no
total, cada time sempre tinha cinco jogadores contando com o goleiro. Remus não
sabia com eles se separavam, mas eles simplesmente sabiam.

As partidas não duravam muito, mas eram tão viciantes. Todos os dias de segunda a
sábado... Frequentemente Remus via algum deles sinalizar chamando ele para
descer, mas ele apenas negava com a cabeça e murmurava um "desculpe".

Se esticou para pegar o suco e bebeu um gole. Remus pode ver mais uma vez um por
do sol brilhantes, as luzes dos postes se acenderem e os garotos continuarem a jogar,
exaustos até que alguns pais aparecessem chamando eles para jantar. Eles se
despediam animados e já conversavam sobre o amanhã com uma animação que
Remus nem podia suportar. Ele odiaria a admitir isso, mas sentia uma profunda
vontade de ser qualquer um daqueles garotos normais, que vão pra escola e que
jogam bola na rua.

Jogou a almofada no colchão improvisado que arrastou para o sotão a algumas


semanas. Esse era seu lugar favorito, haviam pilhas de livros que tinham a metade de
seu tamanho rodeando o lugar, desenhos mal-feitos colados nas paredes, uma
coleção de quadros de sua mãe, alguns livros do trabalho de seu pai e álbuns de
fotos.

Desceu as escadas pulando dois degraus por vez, passou pelo seu quarto com uma
plaquinha de madeira "Aqui dorme Remus Lupin", mas já fazia um tempo que não
dormia ali. Um cheiro maravilhoso de frango assado e respirou fundo, soltou um
sorriso. Levou o prato e o copo na pia, sua mãe mexia uma colher de madeira na
panela e mexia o corpo no som da música que cantava:

— Mamãe, vai demorar? — perguntou Remus chegando mais perto e olhando para
os olhos brilhantes da mais velha.

— Não, meu amor. É o tempo do senhorzinho tomar um belo banho. — disse ela,
sorrindo gentilmente. Remus assentiu rapidamente e correu para a direção banheiro.

Este provavelmente tenha sido seu banho mais rápido do verão, já que normalmente
gostava de aproveitar a sensação de refrescamento que a água gelada proporcionava.
Se enrolou no roupão branco e correu pra fora. As panelas estavam sendo colocadas
na mesa magicamente por seu pai enquanto sua mãe trazia os pratos. Lyall sorriu
para o filho:

— E ai garotão, como foi seu dia? — perguntou animado. Remus sorriu.

— Foi bom, papai. Hoje eu terminei Pollyanna e comecei A fantástica fábrica de


chocolates. — respondeu Remus.

Lyall contornou a mesa, abaixou um pouco, circulou o rosto do filho com as mãos
apertando um pouco fazendo Remus rir e beijou sua testa:

— Parabéns garotão. Você é incrível. — disse, Remus sorriu. — Vou tomar um banho
e nós já jantamos. Vá se trocar.

Remus desviou para o quarto, colocou roupas limpas e calçou seus chinelos
amarelos. Quando saiu, o chuveiro ainda estava ligado e sua mãe estava terminando
posicionar o suco:

— Quer pegar? — perguntou Hope, passando a colher para o filho, que assentiu
animado.
Nas últimas semanas Hope tem deixado seu filho fazer tarefas "perigosas" sozinho,
como se aproximar de panelas quentes, acender o fogão e essas coisas. Remus
derrubou um pouco na borda da panela, mas isso só fez que Hope risse. Já estava
bem melhor que na semana passada quando se queimou apoiando a mão na panela.

Lyall saiu do banheiro já vestido, depositou um beijo na bochecha do filho e começou


apegar comida:

— Hoje um grupo de fantasmas julgou ser uma excelente ideia invadir uma mansão
de trouxas, deve ter sido um recorde o tanto de feitiços de esquecimento que o
ministério teve que produzir. — comentou Lyall.

— Quando eu vou aprender a fazer feitiços, papai? — perguntou Remus antes de


colocar um garfo cheio na boca. Hope e Lyall se entreolharam.

— Ah, querido. O papai anda muito ocupado essas semanas, mas vou pegar férias em
novembro, podemos praticar o quanto quiser, o que acha? — sugeriu o mais velho.

Remus assentiu sem se importar muito, ele realmente queria aprender feitiços como
o pai, queria poder levitar as coisas, faze-las mudar de tamanho e se transformarem.
Parecia ser tão incrível. Mas até lá teria tempo, se seu pai havia prometido, então
seria feito.

O jantar foi comentado em notícias do jornal local, perguntas sobre o dia de Hope e
sobre os livros que Remus leu. Terminaram de separar os livros que seriam
devolvidos a biblioteca do vilareijo e os deixaram para Lyall levar na manhã seguinte.

Deixando Remus no sofá separando as cartas para o jogo de cacheta que teriam no
próximo minuto, Hope e Lyall foram atender a pessoa que batia na porta.

Lyall arregalou os olhos:

— Boa noite, sr. e sra. Lupin, os senhores tiveram um dia agradável? — perguntou
Dumbledore gentilmente, olhando por cima dos óculos meia-lua.

Lyall fechou a porta e passou a chave com rapidez. Hope e ele já estavam esperando
por isso a algum tempo, desde que a primeira carta havia chegado a quase duas
semanas. Respiraram fundo, aliviados por ignorar isso, imaginando que Dumbledore
iria embora visto que ninguém desejava a sua presença.
Mas estavam enganados. Remus nunca vira uma figura tão estranha, cabelos brancos
que se misturavam com sua barba, olhos azuis brilhantes, usava roupas longas como
vestidos, verde brilhante. Seu rosto demostrava gentileza e um sorriso fraco em seus
lábios.

— Você é Remus? — perguntou, caminhando em direção a poltrona alaranjada perto


do sofá.

Remus seguiu ele com o olhar, a boca entreaberta e uma cara de surpresa,
chacoalhou a cabeça e assentiu voltando a realidade:

— Sim. — respondeu.

— Eu sou Alvo Dumbledore, Remus. — disse Dumbledore.

Hope e Lyall se assustaram quando retornaram a sala e observaram Dumbledore


contando ao filho sobre Hogwarts, se entreolharam nervosos:

— Saia já da minha casa! — ordenou Lyall, mas Dumbledore ficou feliz em ignora-lo
completamente ainda contando sobre todos os espaços de Hogwarts.

Remus mal piscava, parecia um sonho, poderia finalmente sair, brincar com outras
crianças e ainda aprenderia sobre magia. Poderia incrível demais para ser verdade:

— Você gostaria de ir a Hogwarts, Remus? — perguntou Dumbledore por fim.

— Eu? — perguntou Remus surpreso. — Eu realmente poderia ir?

— É claro. — respondeu Dumbledore — Por que você não poderia ir?

— Porque... — a voz de Remus vacilou, Hope franziu a testa e semicerrou os olhos


confusa, seus, olhos se encontraram com os do marido que tinha a mesma feição. —
Porque... Senhor, talvez não seja uma boa ideia... Eu... tenho... eu sou... diferente.
Um monstro.

Hope levou a mão na boca sentindo que iria chorar, fechou os olhos e prendeu as
lágrimas. Comparando todas as dores que já sentiu no mundo, nenhuma doeria mais
do que saber que o filho se sentia um monstro.

— Um monstro? — perguntou Dumbledore. — Há um monstro aqui? Não vejo


nenhum monstro.

— Não, senhor. Eu sou um monstro. Eu sou um lobisomem.

— Oh, eu vejo — murmurou Dumbledore, alisando o queixo com os dedos


cumpridos. — bem, deixe-me dizer-lhe algo. Neste momento, tudo o que posso ver à
minha frente, Remus Lupin. É um jovem bruxo inteligente que não pode esperar para
provar seu valor. Então, Remus, vou-lhe perguntar mais uma vez. Você gostaria de ir a
Hogwarts?

— Sim!

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