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física!quântica!
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Fundamentos,!Formalismo!e!Aplicações!!
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Ivan%S.%Oliveira%
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Centro!Brasileiro!de!Pesquisas!Físicas!
CBPF!
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! 1!
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COM!ENSAIOS!SOBRE!A!FÍSICA!NO!BRASIL!
E!NO!MUNDO!
A!PARTIR!DO!SÉCULO!19!por!
Cássio%L.%Vieira%
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! 2!
Prefácio)
)
Escrever! um! texto! de! física! quântica! era! uma! aspiração! antiga.! Ao! refletir! sobre! seu!
formato,! a! primeira! questão! que! se! colocou! foi! a! de! como! contribuir! com! algo! que! não!
repetisse! a! fórmula! dos! muitos! excelentes! textos! existentes! sobre! a! disciplina.! Primeiro,!
tentei!atingir!um!balanço!entre!uma!introdução!que!pudesse!ser!utilizada!em!um!curso!de!
física! moderna! para! licenciatura! –! ou! mesmo! para! estudantes! das! engenharias! –! e! uma!
parte!formal!para!estudantes!de!bacharelado!em!física,!no!qual!conceitos!avançados,!como!
matriz!densidade!e!segunda!quantização,!fossem!introduzidos.!!
!
Optei!por!não!repetir!os!exaustivos!detalhes!de!soluções!de!equações!diferenciais!parciais!
que! aparecem,! por! exemplo,! na! solução! da! equação! de! Schroedinger! para! o! átomo! de!
hidrogênio.! Obviamente,! isso! não! significa! que! considere! que! esse! seja! um! tópico! menos!
importante!ou!que!o!estudante!não!deva!ao!menos!uma!vez!repetir!todos!aqueles!cálculos.!
Muito! pelo! contrário!! No! entanto,! tais! detalhamentos! podem! ser! encontrados! em!
praticamente! qualquer! livro! de! física! moderna! ou! equações! diferenciais.! Em! vez! ! disso,!
preferi! trabalhar! exemplos! de! aplicações! dos! resultados,! tanto! ao! longo! do! texto! quanto!
nos!muitos!exercícios!ao!final!dos!blocos!–!todos!com!solução!detalhada.!!
!
Outro! aspecto! que! diferencia! o! presente! texto! dos! tradicionais! é! o! bloco! “Aplicações”.!!
Aqui,! ! minha! preocupação! foi! a! de! estabelecer! um! contato! entre! as! previsões! da! mais!
importante!teoria!científica!já!desenvolvida,!a!mecânica!quântica,!com!o!!“mundo!real”,!o!
da!tecnologia,!dos!dispositivos!e!dos!produtos!de!inovação.!Talvez,!nesse!aspecto,!eu!tenha!
escrito!o!texto!que!gostaria!de!ter!lido!quando!era!estudante.!Raramente!se!verá!em!algum!
texto!clássico!a!menção!de!que!as!aplicações!da!mecânica!quântica!renderam!aos!Estados!
Unidos!–!para!citar!apenas!um!exemplo!de!país!desenvolvido!–!o!equivalente!a!30%!do!seu!
PIB,!algo!em!torno!de!U$!4,5!trilhões!em!2017.!Isso!é!muito!mais!do!que!o!PIB!brasileiro;!e!!
apenas!com!as!aplicações!da!mecânica!quântica!!!
!
A!esse!respeito,!vale!citar!o!Editorial!da!revista!Science!de!julho!de!2018,!escrito!por!Jacob!
M.!Taylor:!

! 3!
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Visando( a( estas( oportunidades,( o( Escritório( de( Política( Científica( e( Tecnológica( da( Casa(
Branca( estabeleceu( um( novo( subcomitê( dentro( do( Conselho( Nacional( de( Ciência( e(
Tecnologia(dos(Estados(Unidos,(encarregado(de(criar(uma(estratégia(nacional(para(nutrir(
um( ecossistema( quântico( completo,( por( meio( de( pesquisa( coordenada( entre( governo,(
academia(e(indústria1.(Isso(envolverá(o(engajamento(da(comunidade(para(garantir(uma(
força(de(trabalho(robusta(e(inteligente.(Combinado(com(esforços(semelhantes(em(todo(o(
mundo( isso( nos( permitirá( vislumbrar( novos( horizontes( científicos( e( desenvolver( novas(
tecnologias( que( podem( surgir( do( investimento( na( ciência( da( informação( quântica.(
(
Informação!quântica!e!outras!tecnologias!quânticas!são!tratadas!no!bloco!3!deste!texto.!!
!
Ainda! sobre! a! questão! do! ensino! da! física! e! suas! aplicações! tecnológicas,! creio! que! no!
Brasil,!salvo!exceções,!o!estudante!é!levado,!ainda!na!graduação,!a!acreditar!que!existem!
dois! tipos! de! física:! a! teórica! e! a! experimental,! como! se! existissem! duas! naturezas,! uma!
teórica! e! outra! experimental.! Muitos! acabam! completamente! desconectados! do! mundo!
real,!engalfinhados!com!teorias!que!não!podem!ser!refutadas!por!experimentos.!Na!minha!
opinião,! essa! é! uma! das! razões! fundamentais! pelas! quais,! na! física! brasileira,! não! se!
consegue! ultrapassar! a! barreira! do! puro! academicismo! e! transformar! conhecimento! em!
riqueza.!!
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Sobre!esse!problema,!vale!a!pena!lembrar!o!que!disse!um!dos!maiores!físicos!teóricos!do!
século!passado!e!ganhador!do!Prêmio!Nobel!de!Física!de!1965,!Richard!Feynman,!sobre!a!
sua!experiência!ensinando!física!no!Brasil!no!início!da!década!de!19502:!
!
Em%relação%à%educação%no%Brasil,%tive%uma%experiência%muito%interessante.%Eu%estava%dando%
aulas% para% um% grupo% de% estudantes% que% se% tornariam% professores,% uma% vez% que% naquela%
época% não% havia% muitas% oportunidades% no% Brasil% para% o% pessoal% qualificado% em% ciências.%
Esses%estudantes%já%tinham%feito%muitos%cursos,%e%este%deveria%ser%o%curso%mais%avançado%em%
eletricidade%e%magnetismo%–%equações%de%Maxwell%e%assim%por%diante.%%

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
1!O!grifo!é!meu.!
2Veja!!“O(Sr.(Está(Brincando,(Sr.(Feynman!”!Ed.!Campus!(1985).!

! 4!
%
A% universidade% ocupava% diversos% prédios% na% cidade,% e% o% curso% que% eu% ministrava% era% dado%
em%um%deles%com%vista%para%o%mar.%
%
Descobri% um% fenômeno% muito% estranho:% eu% podia% fazer% uma% pergunta,% e% os% alunos%
respondiam%imediatamente.%Mas,%se%fizesse%a%pergunta%de%novo,%de%outra%forma%–%o%mesmo%
assunto% e% a% mesma% pergunta,% pelo% que% eu% sei% –,% eles% simplesmente% não% conseguiam%
responder!%Por%exemplo,%uma%vez%eu%estava%falando%sobre%luz%polarizada%e%dei%a%eles%alguns%
filmes%polaroides.%%
%
O% polaroide% só% deixa% passar% luz% cujo% vetor% elétrico% esteja% em% uma% determinada% direção;%
então%expliquei%como%se%pode%dizer%em%qual%direção%a%luz%está%polarizada,%observando%se%o%
polaroide%está%escuro%ou%claro.%%
%
Primeiro,% pegamos% duas% tiras% de% polaroide% e% as% giramos% até% que% elas% deixassem% passar% a%
maior%parte%da%luz.%Podíamos,%então,%dizer%que%as%duas%fitas%estavam%deixando%passar%luz%
polarizada% na% mesma% direção% –% o% que% passou% por% uma% tira% de% polaroide% também% podia%
passar% pela% outra.% Mas,% então,% perguntei% como% se% poderia% dizer% a% direção% absoluta% da%
polarização%a%partir%de%um%único%polaroide.%%
%
Eles%não%faziam%a%menor%ideia.%%
%
Eu% sabia% que% isso% exigia% um% pouco% de% engenhosidade;% então,% dei% uma% pista:% “Olhe% a% luz%
refletida%da%baía%lá%fora”.%%
%
Ninguém%disse%nada.%%
%
Então%eu%prossegui:%“Vocês%já%ouviram%falar%do%ângulo%de%Brewster?”%%
–% Sim,% senhor!% O% ângulo% de% Brewster% é% o% ângulo% no% qual% a% luz% refletida% por% um% meio% é%
completamente%polarizada.%%
–%E%em%que%direção%a%luz%é%polarizada%quando%é%refletida?%%
–%A%luz%é%polarizada%perpendicular%ao%plano%de%reflexão,%senhor.%%

! 5!
%
Mesmo%hoje%em%dia,%eu%tenho%de%pensar;%mas%eles%sabiam%responder%na%hora!%Eles%sabiam%
até%que%a%tangente%do%ângulo%era%igual%ao%índice%de%refração!%%%
%
Eu%disse:%“Bem...”%%
%
Nada% ainda.% Eles% simplesmente% haviam% me% dito% que% a% luz% refletida% de% um% meio% com% um%
índice%de%refração,%tal%como%a%baía%lá%fora,%era%polarizada:%eles%tinham%me%dito%até%em%qual%
direção%ela%estava%polarizada.%%
%
Eu%disse:%“Olhem%a%baía%lá%fora,%pelo%polaroide.%Agora%girem%o%polaroide”.%%
%
–%“Ah!%Está%polarizada!”%–%%eles%disseram.%%
%
Depois% de% muita% investigação,% finalmente% descobri% que% os% estudantes% tinham% decorado%
tudo,%mas%não%sabiam%o%que%queria%dizer.%Quando%eles%ouviram%“luz%que%é%refletida%de%um%
meio% com% um% índice% de% refração”,% não% sabiam% que% isso% significava% um% material% como% a%
água.% Eles% não% sabiam% que% a% “direção% da% luz”% é% a% direção% na% qual% você% vê% alguma% coisa%
quando%está%olhando%e%assim%por%diante.%Tudo%estava%totalmente%decorado,%mas%nada%havia%
sido%traduzido%em%palavras%que%fizessem%sentido.%Assim,%se%eu%perguntasse%o%que%é%o%ângulo%
de% Brewster,% eu% estava% entrando% no% computador% com% a% senha% correta.% Mas% se% dissesse:%
“Observe% a% água”,% nada% acontecia% –% eles% não% tinham% nada% que% respondesse% ao% comando%
“observe%a%água”.%%
%
Este! foi! um! relato! do! que! aconteceu! no! início! da! década! de! 1950.! Para! citar! uma!
experiência!pessoal,!recentemente,!participei!de!uma!banca!de!concurso!para!professor!de!
física!em!uma!universidade.!Havia!cerca!de!20!candidatos,!de!diversas!especialidades,!dos!
quais! apenas! dois! seriam! selecionados.! Um! deles! havia! obtido! um! diploma! de! doutorado!
em!uma!área!teórica!e,!na!sua!defesa!de!projeto!de!pesquisa,!fez!uma!excelente!exposição!
sobre!modelos!cosmológicos.!Perguntei!a!ele!como!se!poderia!tentar!distinguir!um!modelo!
de!outro!por!meio!de!dados!observacionais,!como!as!impressionantes!medidas!de!radiação!

! 6!
de!fundo!do!universo.!A!resposta!dele!foi:!“Lá!no%nosso%grupo%nós%não%nos%interessamos%por%
dados%observacionais.”!Fiquei!chocado.!!
!
Tenho!a!sorte!de!escrever!este!texto!na!era!da!nanotecnologia!e!da!informação!quântica.!
Até! o! final! da! década! de! 1970,! emaranhamento! era! uma! propriedade! matemática! do!
espaço! de! Hilbert.! Em! 2017,! os! chineses! testaram! correlações! entre! fótons! emaranhados!
separados! por! 1200! km,! utilizando! um! satélite! em! órbita! na! Terra! a! uma! altitude! de! 500!
km,!anunciando!a!chegada!da!“internet!quântica”.!!!
!
Técnicas! de! nanofabricação! manipulam! átomos! individuais,! e! o! menor! transistor! já!
construído!(em!2017)!tem!menos!do!que!5!nm!de!dimensão,!com!30!bilhões!deles!em!um!
único!chip.!!
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A!lei!de!Moore!está!nos!seus!estertores!!A!!IBM!anunciou!um!chip!quântico!com!50!qobits!
em!novembro!de!2017,!e!a!Google!um!outro!similar!com!70!qobits!em!março!de!2018!!Os!
velhos!exercícios!de!tunelamento!quântico!através!de!barreiras!de!potencial,!ou!de!estados!
quantizados! em! poços! de! potencial! em! uma,! duas! ou! três! dimensões,! se! tornaram!
microscópios,!LEDs!e!lasers.!Sensores!quânticos!estão!sendo!utilizados!para!medir!variações!
ínfimas!na!distribuição!de!temperaturas!dentro!de!uma!célula!viva.!!
!
No! primeiro! bloco! do! texto,! o! de! fundamentos,! são! apresentados,! em! sequência! mais! ou!
menos! histórica,! os! fatos! que! levaram! à! descoberta! e! formulação! da! mecânica! quântica,!
acompanhados!de!tópicos!como!o!átomo!de!hidrogênio,!o!experimento!de!SternoGerlach!e!
métodos! perturbativos.! Aspecto! importante! do! texto! são! os! muitos! exemplos! que!
acompanham!os!tópicos.!É!feita!uma!discussão!sobre!o!efeito!AharonovoBohm!–!sobretudo,!
para!enfatizar!a!importância!do!conceito!de!fase!relativa!de!estados!quânticos.!O!bloco!é!
concluído! com! o! famoso! debate! EinsteinoBohr! sobre! a! então! nascente! física! quântica,! as!
conferências!Solvay!e!o!paradoxo!de!EPR.!!
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No!bloco!II,!são!introduzidos!aspectos!do!formalismo!da!mecânica!quântica,!com!destaque!
para! as! noções! de! segunda! quantização! e! matriz! densidade.! A! primeira! permite! que! se!
encontrem!os!autoestados!em!sistemas!com!muitas!partículas!interagentes!e!leva!à!noção!

! 7!
de! quasipartícula.! A! outra! permite! obter! diretamente,! de! um! hamiltoniano! quântico,! os!
observáveis!termodinâmicos!que!se!medem!em!laboratório.!A!combinação!da!primeira!com!
a!segunda!permite!que!modelos!quânticos!microscópicos!sejam!testados!em!experimentos!
termodinâmicos.!Ainda!nesse!bloco,!é!exemplificada!a!violação!da!desigualdade!de!Bell!por!
sistemas!de!spins!emaranhados.!!
!
No! bloco! III,! são! apresentadas! aplicações! da! física! quântica,! começando! por! estruturas!
artificiais! como! pontos! quânticos! –! também! chamados! átomos! artificiais! –,! poços! e! fios!
quânticos.! Algumas! das! técnicas! contemporâneas! mais! importantes! para! a! construção! e!
caracterização! de! objetos! em! regime! quântico,! como! o! microscópio! de! tunelamento! e!
varredura! (STM),! são! apresentadas.! Esse! bloco! também! apresenta! uma! introdução! aos!
chamados! centros! de! vacância! e! nitrogênio! (NV^Centers),! em! redes! de! diamante! e! suas!
aplicações!como!sensores!quânticos,!logo!após!uma!seção!sobre!metrologia!quântica.!!
!
Finalmente,! o! bloco! conclui! com! uma! discussão! sobre! o! processamento! da! informação!
quântica!e!suas!implementações!com!base!no!uso!da!ressonância!magnética!nuclear!e!em!
circuitos! supercondutores! contendo! as! chamadas! junções! Josephson! –! são! estes! que!
formam!a!base!dos!chips!quânticos!da!IBM,!da!Google!e!da!canadense!D^Wave.!A!seção!é!
encerrada!com!uma!breve!discussão!sobre!a!chamada!computação!quântica!adiabática.!
!
Ao! final! de! cada! bloco,! são! apresentados! problemas,! todos! com! solução! detalhada! no!
Apêndice!A.!!!
!
Finalmente,!um!importante!diferencial!deste!texto!são!os!Ensaios%sobre%a%Física%no%Brasil%e%
no% Mundo% a% partir% do% Século% 19,! escritos! por! Cássio! Leite! Vieira,! jornalista! e! doutor! em!
história! da! ciência.! Nesses! ensaios,! o! leitor! encontrará! informações! históricas! do!
desenvolvimento!da!física!no!mundo!e!no!Brasil.!Acredito!que!essa!seja!uma!boa!forma!de!
difundir! cultura! científica! ao! mesmo! tempo! em! que! o! estudante! aprende! os! aspectos!
técnicos!da!matéria.!Boa!leitura!!!
Ivan!S.!Oliveira!
Centro!Brasileiro!de!Pesquisas!Físicas!
ivan@cbpf.br!
!

! 8!
Agradecimentos)
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! 9!
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Sumário)
)
Bloco)I:)Fundamentos)
ENSAIO:)FÍSICA)NA)VIRADA)DO)SÉCULO)19)
!
I1.!Radiação!de!corpo!negro!!
I2.!Quantização!da!energia!
I3.!Bósons:!partículas!e!quasipartículas!
I4.!Observações!sobre!a!constante!de!Planck!
I5.!Observações!sobre!o!conceito!de!fóton!
I6.!Manifestações!do!caráter!corpuscular!do!fóton!!
a. O!efeito!fotoelétrico!!!
b. O!efeito!Compton!
I7.!Ondas!de!matéria,!incertezas!e!trajetórias!
I8.!A!equação!de!Schroedinger!
I9.!Valor!esperado!e!valor!médio!
I10.!Continuidade!da!função!de!onda!
I11.!Incerteza!e!comutação!de!operadores!
I12.!Superposição!de!estados!quânticos:!emaranhamento!
I13.!Fase!absoluta!e!fase!relativa:!o!experimento!da!dupla!fenda!
I14.!O!átomo!de!hidrogênio!
I15.!Spin!
I16.!Sistemas!com!muitos!elétrons;!o!princípio!de!exclusão!de!Pauli!
I17.!O!gás!ideal!de!elétrons!em!uma!caixa!
I18.! Segunda! quantização:! o! oscilador! harmônico! simples! e! operadores! de! criação! e!
aniquilação!
I19.!O!efeito!AharonovcBohm!
I20.!Métodos!perturbativos!
I21.!As!conferências!Solvay,!o!paradoxo!de!EPR,!localidade,!realismo!e!o!teorema!de!Bell;!!
Paradoxo!de!EPR!
I22.!Interpretações!da!dualidade!partículaoonda!
!!!!!!!!Problemas!propostos!
!
!
Bloco)II:)Formalismo)
ENSAIO:)A!REALIDADE!DO!FÓTON!
II1.!Postulados!da!mecânica!quântica!
II2.!Representação!matricial!de!operadores!
II3.!Emaranhamento!de!spins!
II4.!Violação!da!desigualdade!de!Bell!
II5.!Espaços!contínuos!
II6.!Momento!angular!

! 10!
II7.!Momento!magnético,!interação!spincórbita!e!interação!de!Heisenberg!
II8.!Segunda!quantização:!fótons!
!!!!!!!!Interação!entre!luz!e!matéria:!modelo!de!JaynescCummings(
II9.!Segunda!quantização:!fônons(
II10.!Segunda!quantização:!mágnons(
II11.!Matriz!densidade!
II12.! Operadores! de! criação! e! aniquilação! para! férmions;! interação! entre! elétrons! via!
fótons.!
II13.!Interação!elétroncfônon:!pares(de(Cooper(
II14.!Entropia!e!Informação!
!!!!!!!!!!Problemas)propostos)
)
Bloco)III:)Aplicações)em)Informação)Quântica)
)
ENSAIO:)A)FÍSICA)DEPOIS)DA)SEGUNDA)GUERRA)
!
III1.!“Engenharia”!de!hamiltonianos;!tecnologia!quântica!
III2.!A!visão!de!Dick!Feynman;!nasce!a!nanociência!
III3.! Estados! eletrônicos! em! baixas! dimensões:! pontos,! fios,! poços! quânticos! e!
dispositivos!!
III4.!Fabricação!e!caracterização!de!nanocobjetos!de!regime!quântico!
III5.!Metrologia!quântica:!estados!comprimidos!e!estados!NOON!
III6.! Sensores! quânticos:! centros! de! vacância! em! cristais! de! diamante! e! sensores!
atômicos!
III7.! Processamento! da! informação! quântica:! chaves! lógicas,! circuitos! e! teleporte!
quântico!!
III8.! Spins! nucleares! como! bits! quânticos;! construindo! chaves! lógicas! e! algoritmos!
quânticos!com!pulsos!de!radiofrequência!
III9.!Computação!quântica!utilizando!circuitos!supercondutores.!Computação!quântica!
adiabática!
)
ENSAIO:)A)CIÊNCIA)NESTE)SÉCULO)
!!!!!!!!!Problemas)propostos)
!
Apêndice)A!–!Soluções!dos!Problemas!Propostos!
Apêndice)B)–!Constantes!físicas!fundamentais!
!
Referências)bibliográficas!
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! 11!
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!
BLOCO!I!!
Fundamentos!
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!
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! 12!
FÍSICA)NA)VIRADA)DO)SÉCULO)19)
O! fim! do! século! 19! foi! um! período! de! grandes! transformações! para! a! física.! Houve! as!
descobertas,! por! exemplo,! dos! chamados! novos! fenômenos! ‒! ondas! hertzianas!
(eletromagnéticas),! radioatividade,! raios! X! e! elétrons! ‒,! as! quais! ocorreram! em! breve!
intervalo! de! tempo,! cerca! de! 20! anos.! E! a! ideia! básica! que! lançou! as! bases! de! uma! nova!
teoria:!o!quantum!de!energia,!em!1900.!
!
Vale! se! deter! brevemente! a! um! desses! fenômenos:! a! radioatividade,! pois,! de! sua!
descoberta,! extraiose! análise! interessante! sobre! o! período.! Se! apreciada! apenas! por! seu!
aspecto!científico,!a!radioatividade!é!fato!de!inestimável!valor,!pois!deu!acesso!aos!então!
misteriosos! mecanismos! nucleares.! Porém,! o! fenômeno! teve! consequências! sociais! e!
religiosas! impactantes! pouco! conhecidas,! que! o! físico! norteoamericano! Steven! Weinberg,!
Nobel!de!Física!de!1979,!ressaltou:!i)!a!possibilidade!de!calcular!com!precisão!as!idades!da!
Terra!e!do!Sol!e,!assim,!derrubar!argumentos!de!paleontólogos!e!geólogos!contra!os!bilhões!
de!anos!de!existência!desses!corpos;!ii)!facilitar!o!caminho!para!aceitação!da!evolução!pela!
seleção! natural;! iii)! fazer! com! que! católicos! e! judeus! tivessem! que! abrir! mão! do! sentido!
literal!da!Bíblia.!
!
Segundo! um! dos! grandes! historiadores! da! física! do! século! passado,! Erwin! Hiebert! (1919o
2012)!–!que!teve!papel!importante!na!formação!de!gerações!de!pesquisadores!nessa!área!–
,! a! física! naquela! virada! de! século! pode! ser! descrita! pelas! seguintes! características:! i)!
percepção!crescente!de!que!havia!uma!unidade!dessa!disciplina;!ii)!tentativas!de!união!do!
muito!pequeno!com!o!muito!grande;!iii)!postura!mais!relaxada!em!relação!a!especulações!
científicas;!iv)!aumento!da!colaboração!entre!grupos!de!pesquisa.!Como!um!adendo,!vale!
acrescentar!que!o!historiador!britânico!da!física!Jeff!Hughes,!especialista!em!temas!relativos!
à! física! nuclear! e! radioatividade,! via! várias! dessas! características! no! neozelandês! Ernest!
Rutherford!(1871o1937).!!
!
Esse!programa!para!a!física!daquele!fim!de!século,!segundo!Hiebert,!seria!posto!em!prática!
com! base! nas! seguintes! ferramentas:! i)! conservação! de! energia;! ii)! respeito! à! ordem! dos!
elementos!na!Tabela!Periódica;!iii)!culto!às!ideias!sobre!eletromagnetismo!do!físico!escocês!
James!Maxwell!(1831o1879),!que!as!apresentou!em!meados!do!século!19.!!

! 13!
!
No! Brasil,! país! que! havia! se! tornado! republicano! nesse! período,! o! pouco! de! física! que! se!
fazia! era! resultado! de! iniciativas! isoladas,! de,! em! geral,! engenheiros! que,! incensados! por!
ventos!europeus,!viam!valor!na!chamada!‘ciência!pura’!(entendaose,!básica).!Caso!exemplar!
nesse!sentido!foi!Henrique!Morize!(1860o1930).!Sua!tese!de!cátedra!versava!sobre!raios!X!e!
catódicos,! poucos! anos! depois! da! descoberta! desses! fenômenos! –! inclusive,! esse! francês!
naturalizado!brasileiro!usou!os!raios!X!para!fazer!imagens!do!interior!do!corpo!humano!e,!
em! um! desdobramento! empreendedor! de! seu! conhecimento! em! física,! abriu! um!
consultório! para! a! realização! desses! exames! médicos! no! Rio! de! Janeiro,! que! se! encerrou!
por!conta!de!custos!elevados!dos!tubos!e!logística!de!importação.!
!
Morize! é! um! caso! emblemático! de! que! nossa! elite! intelectual! à! época! era! atenta! aos!
desenvolvimentos!do!continente!europeu.!Reforça!essa!afirmação!a!quantidade!e!temática!
dos!livros,!jornais!e!revistas!que!chegavam!ao!Brasil!–!principalmente!ao!Rio!de!Janeiro!–!
trazidos!por!editoras!e!livrarias,!que!procuravam!se!manter!atualizadas.!
!
No!Brasil,!a!área!de!biológicas!havia!ganhado!impulso!com!a!chegada!da!Família!Real,!em!
1808,! ainda! que! as! primeiras! ações! nesse! sentido! tenham! tido! um! viés! voltado! para! a!
solução! de! problemas! práticos,! como! controle! de! doenças! e! aclimatização! de! sementes!
para! a! alimentação,! realizadas! em! paralelo! com! a! preocupação! de! conhecer! o! novo!
território!para!protegêolo!e!exploráolo.!O!Jardim!Botânico,!o!Museu!Nacional!e,!mais!tarde,!
o!Instituto!Manguinhos!são!exemplos!de!instituições!criadas!com!esse!objetivo.!
!
Esses!avanços!estão!na!raiz,!por!exemplo,!de!um!dos!trabalhos!ainda!hoje!mais!citados!da!
literatura! científica! do! Brasil! e! publicado! no! final! da! década! de! 1910:! o! de! Carlos! Chagas!
(1879o1934),!no!qual!houve!–!talvez,!pioneiramente!–!a!descrição!do!ciclo!completo!de!uma!
doença!–!hoje,!doenças!de!Chagas.!!
Por! aqui,! pesquisa! em! física! no! início! do! século! passado! era! sinônimo! de! iniciativas!
individuais,!ou!seja,!uma!atividade!que!não!contava!nem!com!o!apoio!governamental,!nem!
se! mostrava! política! de! estado.! Morize,! Manuel! Amoroso! Costa! (1885o1928),! Otto! de!
Alencar! (1874o1912)! –! autor! de! Física% e% eletrotécnica,% que,! talvez,! seja! o! primeiro! livro!
didático! sobre! física! no! Brasil! –! e! Theodoro! Ramos! (1895o1937)! eram! exemplos! de!

! 14!
engenheiros! que! se! dedicaram! à! pesquisa! teórica! ou! experimental! em! matemática,! física!
matemática,!física!ou!astronomia.!!
!
Por!exemplo,!a!tese!de!Ramos!(1918)!é!considerada!o!momento!em!que!a!matemática!feita!
no!Brasil!adentra!o!século!20.!Documentação!histórica!indica!que!esse!engenheiro!paulista,!
professor! da! Escola! Politécnica! de! São! Paulo,! foi! o! introdutor! da! mecânica! quântica! no!
Brasil.! Seu! primeiro! artigo! sobre! esse! tema! –! tratando! das! raias! espectrais! do! átomo! de!
hidrogênio! e! a! relatividade! geral! –! foi! finalizado! no! início! da! década! de! 1920,! quando! o!
assunto! estava! em! voga! no! exterior,! mas! só! publicado! no! primeiro! número! dos! Anais% da%
Academia%Brasileira%de%Ciências,!em!1929.!
!
Ramos! foi! recrutado! pelo! governo! paulista! para! contratar! professores! na! Europa,! para! a!
implantação!da!Universidade!de!São!Paulo!na!década!de!1930.!Para!a!área!de!física,!trouxe!
o!ítalooucraniano!Gleb!Wataghin!(1899o1986),!fundador!da!pesquisa!sistemática!nessa!área!
no! Brasil,! a! partir! de! 1934.! Wataghin! juntouose! a! um! pequeno! grupo! de! jovens! físicos!
brasileiros! recémoformados.! Entre! eles,! o! teórico! Mário! Schenberg! (1914o1990)! e! os!
experimentais!Marcello!Damy!(1914o2009)!e!Paulus!Aulus!Pompeia!(1911o1993).!
!
Pouco! depois,! vieram,! por! exemplo,! Sonja! Ashauer! (1923o1948)! –! que! detém! o! segundo!
doutorado! formal! em! física! no! país,! sendo! que! o! primeiro! foi! de! José! Leite! Lopes! (1918o
2006)!–,!Oscar!Sala!(1922o2010),!José!Goldenberg!e!César!Lattes!(1924o2005).!Este!último!
faria! descobertas! que! impulsionariam! a! fundação,! no! Rio! de! janeiro! (RJ),! do! Centro!
Brasileiro!de!Pesquisas!Físicas!(CBPF),!bem!como!de!instituições!políticooadministrativas!da!
ciência! no! Brasil! –! entre! elas,! o! CNPq! (hoje,! Conselho! Nacional! de! Desenvolvimento!
Científico!e!Tecnológico)!e!a!Capes!(hoje,!Coordenação!de!Aperfeiçoamento!de!Pessoal!de!
Nível!Superior).!!
!
Wataghin!trabalhava,!na!Itália,!com!Enrico!Fermi!(1901o1954),!o!qual!declinou!do!convite!de!
Ramos,! indicando! esse! seu! assistente.! Apesar! de! teórico,! Wataghin! dá! início,! a! partir! de!
1934,!à!física!experimental!no!Brasil,!a!partir!de!um!programa!que!permitia!fazer!pesquisa!
de!ponta!e!barata:!lançar!balões!carregando!eletrônica!para,!em!grandes!altitudes,!estudar!
o! comportamento! dos! chamados! raios! cósmicos,! núcleos! atômicos! extremamente!

! 15!
energéticos! que! bombardeiam! a! Terra! a! todo! instante! e! geram! novas! partículas,! ao!
colidirem!com!moléculas!da!atmosfera.!!
!
Wataghin,!Damy!e!Pompeia,!com!base!nesse!projeto!de!pesquisa,!foram!os!descobridores!
dos!chamados!‘chuveiros!penetrantes’!–!basicamente,!múons!que!chegam!ao!solo,!criados!
pelo!decaimento!de!partículas!geradas!pelas!colisões!dos!raios!cósmicos.!‘Penetrantes’,!no!
caso,! deveose! ao! fato! de! essas! partículas! –! da! mesma! família! dos! elétrons;! porém,! mais!
pesadas!–!interagirem!fracamente!com!a!matéria!ao!atravessáola.!
!
Essa!escola!criada!por!Wataghin!em!São!Paulo!tornouose!um!atrator!para!físicos!de!outros!
estados! –! por! exemplo,! Recife! e! Rio! de! Janeiro! –! e! países! da! América! do! Sul! –! como! a!
Argentina.!
!
A!época!da!fundação!da!Sociedade!Brasileira!de!Ciências!(1916)!–!mais!tarde,!Academia!–!é!
um! período! de! transformação! institucional! para! a! ciência! –! principalmente,! para! a! física.!
Esses! novos! ventos! vêm! da! recémofundada! União! Soviética.! E! uma! das! melhores! análises!
globais!desse!período!está!em!Stalin’s%great%science%–%adventures%of%Soviet%physicists!–!obra,!
infelizmente,! sem! tradução! para! a! língua! portuguesa.! Seu! autor,! o! historiador! da! física!
russo!Alexei!Kojevnikov,!descreve!as!transformações!pelas!quais!a!ciência!passou!naquele!
início!de!século:!i)!a!Primeira!Guerra!Mundial!aumentou!a!percepção!pública!da!profissão!
de!cientista;!ii)!estreitaramose!os!laços!entre!ciência,!tecnologia!e!militarismo;!iii)!cresceu!o!
interesse!dos!governos!pela!política!científica;!iv)!iniciouose!um!novo!sistema!de!pesquisa!e!
desenvolvimento!–!conhecido!como!modelo!soviético!de!ciência.!!
!
Vale!se!estender!sobre!o!último!tópico!acima.!Sua!principal!característica!era!a!fundação!de!
institutos! de! pesquisa! desvinculados! das! universidades! –! na! Rússia,! isso! foi! resposta! à!
oposição! que! os!bolcheviques!sofriam!de!lideranças! universitárias,!que!viam! as! propostas!
dessa!corrente!com!desconfiança.!!
!
Segundo! Kojevnikov,! o! modelo! soviético! de! ciência! influenciou! reformas! significativas! em!
países!como!Reino!Unido,!França!e!EUA,!promovidas!ou!apoiadas!por!lideranças!científicas,!
como!pelo!cristalógrafo!comunista!John!Bernal!(1901o1971),!pela!física!Marie!Curie!(1867o

! 16!
1934)! e! pelo! astrônomo! George! Hale! (1868o1938).! Essas! mudanças! estavam! estruturadas!
em!dois!alicerces:!ciência!deve!ser!centralmente!planejada,!e!seu!financiamento!deve!ser!
governamental.! Podemos! ver! reflexos! dessas! mudanças! em! instituições! brasileiras! da!
década! de! 1950,! como! o! CNPq! e! a! Capes! e,! ainda! que! indiretamente,! mais! tarde,! das!
Fundações!de!Apoio!à!Pesquisa.!
!
Voltando!ao!cenário!global!naquele!final!de!século!19.!Para!alguns!historiadores,!a!pesquisa!
em! física! naquele! momento! orbitava! em! torno! de! duas! questões! centrais:! i)! a! interação!
entre!matéria!e!éter!(eletrodinâmica)!ii)!o!atomismo!(termodinâmica).!!
Foi! também! naquele! fim! de! século! que! surgiram! os! primeiros! institutos! de! metrologia! na!
Europa.!A!origem!desses!programas!de!‘medir!por!medir’!está!presente,!por!exemplo,!no!
discurso! proferido,! na! Royal! Society,! em! meados! do! século! 19,! pelo! físico! irlandês! lorde!
Kelvin!(1824o1907).!!
!
Há!controvérsias!sobre!as!reais!intenções!de!Kelvin!naquela!palestra,!ao!dizer!que!“apenas!
duas! nuvens! obscureciam! o! cristalino! céu! da! física”! –! podeose! ver! aí! o! que! Hiebert!
denomina! uma! unificação! entre! o! macro! e! o! micro.! Uma! delas! seria! a! interação! entre!
matéria! e! radiação;! a! outra,! a! questão! do! éter.! Anacronicamente,! é! fácil! reconhecer! que!
essas! ‘nuvens’,! meses! ou! anos! depois,! levaram! ao! desenvolvimento! dos! dois! pilares! que!
sustentam!a!física!atual:!a!mecânica!quântica!e!a!relatividade!restrita.!!
!
Parecia! haver! um! sentimento! generalizado! de! que! a! física! havia! cumprido! quase!
integralmente! seu! programa.! E! ! ‘fim! da! física’! está! implícito,! por! exemplo,! no! fato! de!
professores! sugerirem! a! seus! estudantes! que! não! optassem! por! uma! carreira! nessa! área,!
pois! só! restaria! a! esses! alunos! a! busca! por! medidas! mais! precisas! de! constantes! da!
natureza.!!
!
Aqui,! vale! divergir! brevemente! para! analisar! aspecto! interessante! de! história:! são!
justamente! seus! protagonistas! os! que! detêm! menos! dados! para! fazer! previsões.! O!
historiador!israelense!Yuval!Harari,!em!Sapiens,!cita!muito!apropriadamente!o!fato!de!tanto!
o! cristianismo! quanto! o! islã,! pouco! antes! da! ascensão! vertiginosa! dessas! duas! religiões!
monoteístas,! terem! sido! o! reduto! de! minorias! para! as! quais! poucos! prestavam! atenção.!

! 17!
Para! ele,! se,! à! época,! alguém! arriscasse! dizer! que! elas! seriam! predominantes! é! mais! ou!
menos!equivalente!a!afirmar!que,!por!volta!de!2050,!o!movimento!Hare!Krishna!será!o!culto!
mais!importante!dos!EUA.!
!
Em!resumo:!é!justamente!aquele(a)!que!protagoniza!a!história!o(a)!mais!desequipado!para!
afirmar!como!ela!evoluirá.!!
!
No!Brasil,!ainda!no!final!do!século!19,!a!fundação!de!uma!universidade!no!Rio!de!Janeiro!foi!
barrada! por! políticos! positivistas! que! não! viam! necessidade! de! alavancar! conhecimento!
puro,!mas,!sim,!o!aplicado,!seguindo!um!modelo!francês!no!qual!se!privilegiavam!a!criação!
de!Politécnicas.!

!
I1.!Radiação!de!corpo!negro!
O! problema! da! troca! de! calor! entre! corpos! com! diferentes! temperaturas! foi! considerado!
ainda!no!século!18.!Pelos!idos!de!1700,!sabiaose,!por!exemplo,!que!as!trocas!de!calor!entre!
corpos!se!dão!de!forma!não!linear3!e!que,!quanto!maior!a!diferença!de!temperatura!entre!
os! corpos,! maior! a! não! linearidade.! ! Esse! problema! é! de! grande! importância! histórica,! já!
que!foi!dele!que!surgiu!a!física!quântica.!A!partir!do!século!19,!quatro!nomes!se!destacaram!
na! busca! pela! explicação! do! fenômeno:! Josef! Stefan,! que! em! 1879,! na! Universidade! de!
Viena,!deduziu!a!chamada!lei!T4;!o!seu!aluno!mais!ilustre,!Ludwig!Botzmann,!que!em!1884,!
trabalhando! na! Universidade! de! Graz,! na! Áustria,! mostrou! que! a! lei! de! Stefan! estava!
rigorosamente! correta 4 ;! Wilhelm! Wien,! que! trabalhando! no! Physikalisch^Technische%
Reichsantalt,! em! Berlin,! em! 1897,! relacionou! a! intensidade! da! radiação! emitida! por! um!
objeto! com! a! sua! temperatura! e! o! comprimento! de! onda! da! radiação;! e! finalmente! Max!
Planck,!que!em!1900,!trabalhando!na!Universidade!de!Berlin,!resolveu!o!problema!de!forma!
definitiva,!postulando!a!existência!dos!quanta!de!energia!eletromagnética.!!!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
3!Ou!seja,!a!quantidade!de!calor!trocado!não!é!uma!função!linear!da!diferença!de!temperatura.!!
4!O!resultado!ficou!conhecido!como!lei!de!StefancBoltzmann.!

! 18!
!
Ao! colocarmos! vários! objetos! com! temperaturas! diferentes! dentro! de! uma! cavidade! com!
paredes! perfeitamente! refletoras 5 ,! o! calor! se! distribui! de! tal! forma! que,! após! ! certo!
intervalo!de!tempo!todos!!estarão!com!a!mesma!temperatura.!A!radiação!emitida!por!cada!
um! dos! objetos! é! refletida! pelas! paredes! e! reabsorvida,! até! que! o! equilíbrio! térmico! seja!
alcançado.!!Como!as!paredes!são!perfeitamente!refletoras,!a!radiação!fica!presa!dentro!da!
cavidade.!Um!sistema!com!estas!características!se!chama!corpo!negro6.!!
!
Dentro! da! cavidade,! a! radiação! total! se! distribui! por! vários! comprimentos! de! onda,! e! a!
contribuição!de!cada!componente!depende!da!temperatura!da!cavidade.!A!dependência!da!
energia! eletromagnética! com! a! frequência! da! onda! e! a! temperatura! da! cavidade! foi!
considerada! por! W.! Wien! no! seu! trabalho! de! 18977.! Na! notação! moderna,! a! lei! Wien!
estabelece! que,! para! frequências! altas! (ou! seja,! pequenos! comprimentos! de! onda),! a!
densidade!de!energia!u(ν,T)!da!radiação!em!uma!dada!frequência!ν!e!temperatura!T!é!dada!
por8!
!
!ω 3
u(ω,T ) = exp(−!ω / kBT ) !
π 2c2 !!! (I1.1)!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
5!Significa!que!nenhuma!parte!da!radiação!“vaza”!para!fora!da!cavidade .!!
6!Teria!sido!Gustav!Kirchhoff!que,!em!1859!–!!e!portanto,!quase!meio!século!antes!do!trabalho!de!Planck,!
propos,!como!modelo!para!um!corpo!negro,!uma!caixa!com!um!pequeno!furo!e!paredes!internas!
refletoras.!Toda!radiação!que!incide!no!furo!entra!na!caixa!e!fica!presa!dentro!dela.!!
7!W.!Wien,!Philosophical(Magazine,!Series!5!43!(262)!1897!214.!!
8!Repare!que!a!unidade!dessa!quantidade!é!o!(J/m3)/Hz,!ou!seja,!densidade!de!energia!por!frequência!–!!!

naturalmente!que!no!artigo!original!de!Wien!a!notação!era!outra.!Ele!chega!à!expressão!
!
!! = !!!! exp!(− )!para!a!intensidade!da!radiação!com!comprimento!de!onda!entre!!!e!! + !"!a!uma!
!"
temperatura!!.!C!é!uma!constante.!!

! 19!
!
onde!! = 2!"; !!!!é! a! velocidade! da! luz;! !!! ,! a! constante! de! Boltzmann;! e!ℏ,! a! chamada!
constante! de! Planck! (ver! adiante).! Para! relacionarmos! a! intensidade! da! radiação! com! a!
frequência!de!uma!onda!e!a!temperatura!da!cavidade,!começamos!por!lembrar!que!o!fato!
de!as!paredes!da!cavidade!serem!perfeitamente!refletoras!implica!que!lá!dentro!as!ondas!
são!estacionárias,!ou!seja,!elas!não!“vazam”!para!fora!da!cavidade.!Ondas!estacionárias!se!
formam!pela!superposição!de!duas!ondas,!a!que!incide!sobre!a!parede!e!a!que!é!refletida!
por!ela.!Isso!será!importante!mais!adiante.!!
!
A! intensidade! do! campo! elétrico! de! cada! onda! estacionária! se! anula! nas! paredes! da!
cavidade.!A!noésima!componente!do!campo!elétrico!pode!ser!escrita!como!!
!
En (x, t) = An sin(kn x)cos(ω n t + ϕ n ) !! (I1.2)!
!
onde!!! = 2!/!! !é! o! chamado! número! de! onda.! A! condição! para! que! a! expressão! (I1.2)!
represente! uma! onda! estacionária! é! que! o! comprimento! da! cavidade! seja! igual! a! um!
número!inteiro!de!meios!comprimentos!de!onda,!como!mostra!a!Figura!I1.1.!Considerando!
a!cavidade!como!um!cubo!de!aresta!L,!teremos,!portanto!
!
λ 2π / k π
L=n =n =n ! (I1.3)!
2 2 k!
!
onde!n!é!inteiro.!Logo,!para!uma!onda!em!qualquer!direção!(ex,!ey,!ez)!dentro!da!cavidade,!
podemos!escrever!o!vetor%de%onda!como!
!
π
k=
L
( n x e x + n y e y + nz e z ) ! (I1.4)!
!
!
onde!nx,%ny!e!nz%são!números!inteiros.!!
!
Cada!onda!com!um!determinado!valor!de! ω!(ou!de!k%=% ω/c,!onde!c!é!a!velocidade!da!luz)!é!
chamada! um! modo! de! vibração.! Podemos! considerar! cada! modo! como! um! oscilador!

! 20!
harmônico!e,!baseado!no!princípio!de!equipartição!da!energia,!associar!a!energia!térmica!
kBT! a! um! conjunto! de! modos! com! a! mesma! frequência9.! Para! fazermos! essa! associação,!
precisamos!calcular!o!número!de!modos!que!existe!em!um!intervalo!de!frequência!δω.!!

!
!
Figura!I1.1!c!Dentro!de!uma!cavidade!perfeitamente!isolada,!uma!onda!estacionária!
! deve!se!anular!nas!paredes!da!cavidade.!Isso!impõe!restrições!sobre!o!
os!valores!possíveis!de!comprimentos!de!onda:!a!dimensão!da!cavidade!deve!ser!
! igual!a!um!número!inteiro!de!meios!comprimentos!de!onda!!!
!
O!cálculo!pode!ser!feito!facilmente!se!considerarmos!o!conjunto!de!pontos!definidos!pelos!
vetores!k!como!um!espaço,!que!vamos!chamar!de!espaço^k,!como!mostra!a!Figura!I1.2.!
!

!
!
Figura!I1.2!–!O!chamado!espaço!dos!momentos,!ou!espaçoTk,!é!formado!por!pontos!
discretos!que!representam!os!valores!possíveis!dos!comprimentos!de!onda!(ou!!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
números!de!onda)!dos!diversos!modos!de!um!campo!eletromagnético!preso!em!!
9!Fazendo!uma!analogia!com!um!gás!ideal!dentro!de!um!volume!V,!a!uma!temperatura!de!equilíbrio!T,!
uma!cavidade!!!
cada!molécula!do!gás!pode!ter!uma!dada!energia!cinética,!mas!a!energia!cinética!média!de!uma!molécula!
é,!segundo!o!princípio!de!equipartição,!3/2kBT.!

! 21!
!
!
!
Cada! ponto! do! espaçook! representa! um! vetor,! como! definido! em! (I1.4),! e,! portanto,! um!
modo!de!vibração!do!campo!eletromagnético!dentro!da!cavidade.!O!espaçook!se!expande!
por!meio!do!“empilhamento”!de!cubos!elementares,!cada!um!com!volume10!!
!
π3 (I1.5)!
V0 = !
L3 !
!
Repare!que!cada!cubo!possui!oito!pontos,!correspondendo!a!oito!diferentes!modos.!Repare!
também! que! o! volume! do! cubo! elementar! no! espaçook! é! inversamente! proporcional! ao!
volume! do! cubo! físico,! real,! que! representa! o! corpo! negro.! ! Finalmente,! note! que! cada!
ponto! k! é! compartilhado! com! oito! outros! cubos! diferentes,! de! forma! que! cada! cubo!
elementar!contribui!efetivamente!com!um!único!modo!do!campo.!!
!
Considere! agora! uma! esfera! com! um! raio! k! muito! maior! do! que! a! aresta! de! um! cubo!
elementar.!O!número!de!modos!dentro!da!esfera!será!igual!ao!volume!da!esfera!(4/3πk3)!
dividido!pelo!volume!do!cubo!elementar11!
!
4π k 3 / 3 4
Nk = 3 3
= 2 L3k 3
π /L 3π !
N 4 3
nk = 3 = 2 k (I1.6)!
L 3π
!
Esse! resultado! tem! que! ser! multiplicado! por! 1/8,! pois,! como! observado! anteriormente,!
cada!cubo!só!contribui!com!um!modo.!Devemos!ainda!multiplicar!por!!dois,!pois!cada!onda!
estacionária!corresponde!a!dois!modos,!um!incidente!e!um!refletido.!Logo,!a!densidade!de!
modos!!será!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
10!Considere!(I1.3)!com!n!=!1.!
11!Como!analogia!suponha!que!se!queira!medir!a!área!de!um!círculo!contandocse!quantos!“quadrados!

elementares”!cabem!dentro!da!sua!circunferência!e,!depois,!multiplicando!o!número!de!quadrados!pela!
área!de!um!único!quadrado!elementar.!Quanto!menor!for!a!área!do!quadrado!elementar!em!relação!à!
área!do!círculo,!melhor!será!a!medida!da!área.!!

! 22!
!

nk =
1 3
k ! (I1.7)!
3π 2
!
Substituindo! k% =% ω/c,! obtemos! a! densidade! de! modos! na! cavidade! em! termos! da!
frequência:!!!
!
1 ω3 (I1.8)!
nω = !
3π 2 c 3
!
Finalmente,!o!número!de!modos!com!frequência!entre!ω!e!ω%+%δω!será!
!
1 " 1
ω + δω ) − ω 3 $% = 2 3 ω 2δω
3
2 3 #(
nω +δω − nω = δ nω =
3π c π c !
δ nω 1
≡ g (ω ) = 2 3 ω 2
δω π c (I1.9)!
!
A!função!g(ω)!é!chamada!!densidade!de!estados.!Ela!nos!fornece!o!número!de!modos!do!
campo! eletromagnético! por! intervalo! de! frequência.! Multiplicada! pela! energia! média!
térmica!de!cada!modo,!ela!nos!dá!a!densidade!de!energia!por!intervalo!de!frequência!a!uma!
dada!temperatura!de!equilíbrio!T!
!
1 (I1.10)!
u(ω,T ) = ω 2 k BT
2 3
π c !

!
Essa!expressão!é!conhecida!como!lei!de!RayleighoJeans12.!Essa!quantidade!se!relaciona!com!
a! chamada! radiância,! que! é! a! potência! da! radiação! por! área! e! por! ângulo! sólido.! A!
distribuição!da!radiância!nos!vários!comprimentos!de!onda!é!mostrada!na!Figura!1I.3.!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
12!Ela!foi!derivada!em!1905;!!portanto,!após!o!trabalho!de!Max!Planck!(1900)!que!deu!início!à!física!
quântica!e!muito!depois!da!Lei!de!Wien.!!

! 23!
!

Figura!I1.3!–!Distribuições!de!energia!radiante!do!chamado!corpo!negro!para!diversas!temperaturas.!
Na!medida!em!que!a!temperatura!diminui!o!máximo!da!distribuição!também!diminui!e!se!afasta!da!
faixa!do!visível!(daí!a!denominação!corpo!negro).!A!figura!mostra!a!
previsão!do!!eletromagnetismo!clássico!em!franco!desacordo!com!a!previsão!quântica!
obtida!por!Planck!para!pequenos!comprimentos!de!onda.!Para!grandes!comprimentos!de!
onda!as!previsões!quântica!e!a!clássica!coincidem!
!
!
!
Repare! que! o! máximo! da! distribuição! se! desloca! para! maiores! comprimentos! de! onda! na!
medida!em!que!a!temperatura!abaixa.!Isso!é!chamado!lei!do!deslocamento!de!Wien!–!!em!
geral,! expresso! como! λmax% T% =% A,! onde! A! é! uma! constante! chamada! constante! de!
deslocamento! de! Wien.! Como! se! pode! ver! da! Figura! I1.3,! por! causa! do! deslocamento! de!
Wien,! à! temperatura! ambiente! (~! 400! K),! praticamente,! não! há! emissão! de! radiação! no!
visível,!e!esse!é!o!motivo!do!nome!“corpo!negro”.!!Finalmente,!o!aspecto!mais!importante!
desse! resultado:! a! teoria! clássica! (lei! de! RayleighoJeans)! falha! desastradamente! para!
pequenos! comprimentos! de! onda,! fato! que! ficou! conhecido! como! a! “catástrofe! do!
ultravioleta13”.!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
13!A!radiação!ultravioleta!possui!comprimento!de!onda!entre!0,1c0,4!µm,!região!em!que!a!teoria!clássica!
prevê!radiância!infinita.!O!termo!“catástrofe!do!ultravioleta”!foi!usado!pela!primeira!vez!em!1911!por!
Paul!Langevin.!!

! 24!
Em! resumo,! a! lei! de! Wien! descreve! o! comportamento! da! radiância! do! corpo! negro! para!
pequenos!comprimentos!de!onda!(altas!frequências),!e!a!Lei!de!RayleighoJeans,!para!longos!
comprimentos! de! onda! (baixas! frequências).! A! Figura! I1.4! mostra! uma! comparação! em!
escala! logaritmica! entre! as! curvas! de! Wien,! RayleighoJeans! e! de! Planck! (ver! adiante),! que!
resolveu!definitivamente!o!problema.!!
!
1e-23
Wien
Planck
Rayleigh-Jeans
1e-24

1e-25
Radiância / J m–2 sr–1

1e-26

1e-27

1e-28

1e-29
1e+8 1e+9
Frequência (Hz) !

Figura!I1.4!–!Comparações!entre!os!resultados!de!Wien,!Planck!e!RayleighcJeans!para!a!
radiação!do!corpo!negro.!O!resultado!de!Planck!coincide!com!o!de!Wien!para!altas!frequências!
(pequenos!comprimentos!de!onda)!e!com!o!de!RayleighcJeans!para!baixas!frequências!(longos!
comprimentos!de!onda).!Para!melhor!visualização,!utilizacse!uma!escala!logarítmica!no!eixo!
horizontal!
!
! !

I.2!Quantização!da!energia!
Em! 1900! Max! Planck! publicou! dois! artigos! nos! Anais! do! encontro! anual! da! Sociedade! de!
Física! Alemã14.! No! primeiro! usa! argumentos! de! termodinâmica! para! aprimorar! a! lei! de!
Wien,! válida! apenas! para! pequenos! comprimentos! de! onda.! Planck! deduz! a! seguinte!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
14!M.!Planck,!Verhandl.(Dtsch.(Phys.(Ges.!2!(1900)!202,!e!M.!Planck,!Verhandl.(Dtsch.(Phys.!Ges.!2!(1900)!
237.!Na!internet,!é!possível!encontrar!cópias!traduzidas!para!o!inglês!dos!dois!artigos.!!
!

! 25!
expressão!para!a!energia!da!radiação!eletromagnética!com!comprimento!de!onda!λ,!de!um!
corpo!negro!a!uma!temperatura!T%
!
C λ −5
E= !
eC/λT −1 !
!
Essa! expressão,! reproduzida! com! a! mesma! notação! do! artigo! original,! é! a! própria!
distribuição!de!Planck!sem!os!ingredientes!da!quantização.!Ela!reproduz!corretamente!a!lei!
de! Wien! para! pequenos! comprimentos! de! onda! e! se! ajusta! perfeitamente! aos! dados!
experimentais!conhecidos!na!época.!!
!
O! segundo! artigo! de! Planck! estabelece! as! bases! microscópicas! para! a! expressão!
termodinâmica! do! primeiro! artigo! –! e! é! seu! trabalho! verdadeiramente! revolucionário.! O!
sistema! físico! que! ele! imaginou! era! composto! por! um! grande! número! de! osciladores!
harmônicos!simples!em!equilíbrio!térmico!com!a!radiação.!Os!osciladores!representam!os!
átomos! das! paredes! da! cavidade! e! outros! objetos! materiais! dentro! dela.! A! pergunta! que!
Planck! faz! é! como! certa! quantidade! de! energia! se! distribui! entre! os! osciladores! e! a!
radiação.! Ao! considerar! a! forma! como! uma! determinada! quantidade! de! energia! E! se!
distribui!por!um!conjunto!de!N!osciladores!com!a!mesma!frequência!ν,!Planck!introduz!uma!
nova!constante!fundamental!da!natureza.!Em!suas!palavras:!!!!
!
Se% considerarmos% E% como% uma% quantidade% que% pode% ser% continuamente% dividida,% a% sua%
distribuição% entre% os% osciladores% pode% ser% feita% de% infinitas% formas% diferentes.% Vamos%
considerar,%no%entanto%–%e%este%é%o%ponto%essencial%da%dedução%–%que%E%é%composta%por%um%
número%muito%bem%definido%de%partes%iguais%utilizando%a%mesma%constante%da%natureza,%h%=%
6,55%x%10^27%erg.seg.!
!
Segundo!esse!postulado,!a!energia!de!um!modo!do!campo!é!dada!por!
!
ε n = n!ω (I2.2)!
h !
!≡ = 1, 05 ×10 −34 J • s
2π !

! 26!
!
Porém,! segundo! a! teoria! estatística! clássica15,! a! probabilidade! de! que! um! oscilador! seja!
encontrado!com!essa!energia!é!
!
exp(−ε n / kBT ) (I2.3)!
pn = !
∑ exp(−εn / kBT )
n !
!
Logo,!a!energia!média!por!modo!de!vibração!será!
!

!ω ∑ n exp(−n!ω / kBT )

ε n = ∑ pnε n = n
= !
n ∑ exp(−n!ω / k T ) B exp(!ω / kBT ) −1 (I2.4)!
n

!
Essa! energia! média! deve! substituir! o! termo! kBT! (oriundo! do! princípio! de! equipartição! da!
energia)!na!fórmula!de!ReyleighoJeans!(Eq.!I1.10),!resultando!em!
!
!ω 3 1 (I2.5)!
u(ω,T ) = 2 3 !
π c exp(!ω / kBT ) −1
!
Essa! é! a! famosa! distribuição! de! Planck! para! a! densidade! de! energia! do! corpo! negro.!
Podemos! imediatamente! ver! que! ela! tem! a! lei! de! Wien! como! um! caso! assintótico,! para!
altas!frequências:!
!
!ω >> kBT (I2.6)!
!ω 3 −!ω /kBT !
⇒u~ e
π 2c3
!!
E!a!lei!de!RayleighoJeans!para!baixas!frequências:!
!
(I2.7)!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
15!Por!certo!tempo,!Planck!tinha!aversão!às!ideias!de!Boltzmann,!e!não!acreditava!na!física!estatística.!O!
fato!de!que!ele!teve!de!usar!os!resultados!da!Física!Estatística!na!sua!própria!teoria,!o!levou!a!classificar!a!
estratégia!como!um!“ato!de!desespero”.!!

! 27!
!ω 3 1 ω2
u~ = k BT !
π 2 c 3 1+ !ω −1 π 2 c 3
k BT
!
Repare!que!a!constante!de!Planck!é!cancelada!na!expressão!final!para!baixas!frequências,!
como!esperado,!pois!a!Lei!de!RayleighoJeans!é!um!limite!clássico.!!
!
Da!expressão!de!Planck,!podemos!ainda!deduzir!a!lei!do!Deslocamento!de!Wien!
!

∂u ! # 3ω 2 ω 3! / kBT exp(!ω / kBT ) &


= 2 3$ − '=0
∂ω π c % exp(!ω / kBT ) −1 exp(!ω / kBT ) −1 (
⇒ 3− x = 3e− x !
!ω (I2.8)!
x=
k BT
Essa!é!uma!equação!transcendental!cuja!solução!numérica!fornece!
!
x = 2,822 !
Logo!!

2π c ! k $
ω max = = # 2,822 B & T
λ " !% (I2.9)!
!
hc
λT =
!!!!!!!!!!!!!!!
2,822kB

!!!!!!
Podemos!agora!calcular!o!valor!da!constante!de!deslocamento!de!Wien!
!
hc 6, 626 ×10 −34 × 2, 998 ×108
= −23
= 5, 097 ×10 −3 metro × Kelvin !
2,822kB 2,822 ×1, 381×10
!

! 28!
O!melhor!exemplo!físico!de!um!corpo!negro!é!o!próprio!Universo.!A!Figura!I2.1!mostra!as!
medidas!feitas!pelo!satélite!COBE16!(COsmic%Background%Explorer)!do!espectro!da!chamada!
radiação!de!fundo.!A!linha!contínua!é!um!ajuste!da!distribuição!de!Planck,!correspondente!
a!T!=!2,725!K.!Esse!resultado!é!um!dos!grandes!triunfos!da!distribuição!de!Planck!–!e,!talvez,!
o!seu!teste!mais!importante.!!
!

400
Dados do COBE
350 Distribuição de Planck

300
Intensidade (MJy/sr)

250

200

150

100

50

0
2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22
Frequência (1/cm)
!

Figura!I2.1!–!Medidas!da!chamada!radiação!de!fundo!do!Universo!feitas!pelo!satélite!COBE!
comparadas!com!a!distribuição!de!Planck!para!o!corpo!negro.!A!concordância!entre!os!pontos!
experimentais!e!a!teoria!quântica!é!notável!
!
!
!
Outro! resultado! importante! que! se! pode! derivar! da! distribuição! de! Planck! é! a! lei! T4! de!
StefanoBoltzmann,!obtida!integrandoose!a!energia!para!todas!as!frequências:!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
16!O!COBE!foi!lançado!em!novembro!de!1989,!e!a!sua!missão!durou!pouco!mais!de!quatro!anos.!!

! 29!

! ∞
ω3
u(T ) = ∫ u(ω,T )dω = 2 3 ∫e !ω /kBT

0 π c 0 −1
4
!ω ! &k T )
x≡ ⇒ dx = dω ⇒ ω 3dω = ( B + x 3 ! (I2.10)!
k BT k BT ' ! *
4 ∞
! &k T ) x3
u(T ) = 2 3 ( B + ∫e dx = σ T 4
π c ' ! * x
−1
"
0 $# $%
π 4 /15

!
Resumindo,!o!trabalho!de!Planck!foi!o!resultado!de!um!antigo!esforço!para!se!entender!o!
espectro!de!radiação!do!corpo!negro.!Para!obter!a!distribuição!correta,!Planck!postulou!a!
quantização! da! energia! e! introduziu! uma! nova! constante! da! natureza.! O! seu! resultado!
explica!corretamente!os!limites!obtidos!por!StefanoBoltzmann,!Wien!e!por!RayleighoJeans,!
além! de! obter! expressões! analíticas! (em! termos! de! constantes! fundamentais)! para! as!
constantes! de! Wien! e! de! StefanoBoltzmann.! A! função! obtida! por! Planck! descreve!
perfeitamente!a!distribuição!da!chamada!radiação!de!fundo!do!Universo.!A!ideia!da!divisão!
da!energia!eletromagnética!em!pequenos!“pacotes”!levou!ao!conceito!de!fótons,!que!são!
as!partículas!da!radiação!eletromagnética.!
!

I3.!Bósons:!partículas!e!quasipartículas!
Embora! a! distribuição! de! Planck! tenha! sido! deduzida! em! um! contexto! que! levou! à!
quantização! do! campo! eletromagnético,! ela! vale! para! toda! uma! categoria! de! partículas! e!
quasipartículas17!chamadas!bósons.!Exemplos!de!partículas!desse!tipo!são!o!próprio!fóton,!
o!núcleo!do!átomo!de!hélio,!entre!outros.!Exemplos!de!quasipartículas!são!fônons!(quanta!
de! ondas! elásticas! nos! sólidos),! mágnons! (quanta! de! ondas! de! spins! em! sistemas!
magnéticos),!entre!outros.!!
!
Assim!como!o!fóton,!quasipartículas!podem!ser!criadas!e!destruídas.!Porém,!um!bóson!com!
massa,! como! o! núcleo! do! átomo! de! He,! não! pode! ser! criado! nem! destruído18,! pois! sua!
massa!deve!ser!conservada.!Quando!se!tem!um!sistema!de!bósons!com!essa!característica,!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
17!O!termo!“quasipartículas”!se!refere!à!quantização!de!movimentos!coletivos!da!matéria,!em!geral!
observados!em!sólidos.!Por!exemplo,!a!quantização!do!movimento!coletivo!de!átomos!dá!origem!a!uma!
quasipartícula!chamada!fônon.!!
18!Descartadas!aqui!reações!nucleares.!!

! 30!
a!distribuição!de!Planck!deve!ser!modificada!para!conter!o!chamado!potencial!químico!(µ),!
que! é! a! quantidade! termodinâmica! ! associada! ao! número! de! partículas! de! um! sistema!
físico,!N,!da!mesma!forma!como!se!associam!a!pressão!com!!o!volume,!a!magnetização!com!
o! campo! magnético,! etc.! Sistemas! que! não! conservam! o! número! de! partículas! têm!
potencial!químico!igual!a!zero.!A!distribuição!Planck!contendo!o!potencial!químico!se!torna!
!
1
! (I3.1)!
exp [(ε − µ N ) / kBT ] −1

!
Naturalmente! que! esta! é! uma! expressão! geral! e! válida! para! todos! os! bósons! (com! µ% =% 0,!
quando!for!o!caso).!O!que!distingue!um!sistema!físico!de!outro!é!a!relação!da!energia!com!o!
módulo! do! vetor! de! onda,! k,! chamada! relação! de! dispersão.! Exemplos! de! relações! de!
dispersão!para!vários!bósons!são!
!
Fótons!!
ω k = ck ! (I3.2)!

!
Fônons!
! ka $
ω k = 2ω sin # & !
"2% (I3.3)!

Mágnons!
ω k = 6a 2 J 0 Sk 2 ! (I3.4)!
!
A!partir!da!relação!de!dispersão!e!da!expressão!
!
ε k = !ω k !

!
vemos! que! a! distribuição! de! Planck! muda,! correspondentemente.! Essas! diferenças! nas!
relações! de! dispersão! se! refletem,! em! geral,! na! dependência! de! observáveis!
termodinâmicos! (como! o! calor! específico,! a! corrente! elétrica,! a! magnetização,! para! citar!
algumas)! com! a! temperatura.! Por! exemplo,! o! calor! específico! de! um! gás! de! fótons! é!

! 31!
proporcional!a!T3,!e!a!magnetização!de!um!material!ferromagnético!tem!uma!contribuição!
de! mágnons! (para! baixas! temperaturas)! proporcional! a! T3/2.! Portanto,! ao! medirmos! a!
dependência! de! grandezas! físicas! como! estas! em! função! da! temperatura,! obtemos! uma!
assinatura!da!natureza!quântica!das!partículas!que!compõem!o!sistema.!
!

I4.!Observações!sobre!a!constante!de!Planck!
A! constante! de! Planck! tem! dimensão! de! joule! x! segundo,! a! mesma! da! quantidade!
conhecida! como! ação.! Outras! quantidades! com! essa! mesma! dimensão! são! o! ! momento!
linear!x!coordenada,!bem!como!momento!angular!x!ângulo.!Uma!forma!de!avaliarmos! se!
um! sistema! físico! está! no! limite! quântico! ou! clássico! é! compararmos! a! sua! ação! com! a!
constante! de! Planck.! Por! exemplo,! a! ação! de! um! fóton! com! energia!ℏ!!e! período!! =
2!/!!é!
!
2π (I4.1)!
S = !ω × = h!
ω
Logo,! um! fóton! é! seguramente! um! sistema! quântico.! Por! outro! lado,! considere! um!
oscilador! harmônico! em! movimento! com! energia! kBT! ambiente! a! uma! frequência! de! 108!
rd/s.!Sua!ação!será!
!

S = k BT × ≈ 10 −28 J • s !
ω (I4.2)!
!
Esse!valor!é!muito!maior!do!que!o!da!constante!de!Planck.!Logo,!um!oscilador!harmônico!a!
temperatura!ambiente!é!com!certeza!um!sistema!clássico.!!
!
!
!

I5.!Observações!sobre!o!conceito!de!fóton!
O!termo!“fóton”!ganhou!popularidade!quando!foi!usado!em!1926!pelo!físicooquímico!norteo
americano!Gilbert!N.!Lewis.!Embora!Einstein!tenha!utilizado!a!ideia!dos!quanta!de!luz!em!
1905!para!explicar!o!efeito!fotoelétrico,!por!quase!20!anos!provavelmente!apenas!o!próprio!

! 32!
Einstein! acreditava! na! existência! dessas! partículas.! Mesmo! após! o! experimento! de!
Compton! em! 1923! (ver! adiante)! sobre! o! espalhamento! de! luz! por! elétrons,! não! havia!
consenso!sobre!a!natureza!da!radiação!eletromagnética.!No!meio!desse!debate!na!Europa,!
em!1925,!Einstein!faz!uma!viagem!pela!América!do!Sul,!com!passagem!pelo!Rio!de!janeiro,!
então!capital!da!República19.!Embora!já!fosse!muito!famoso!por!conta!dos!experimentos!de!
Eddington! que! comprovaram! a! teoria! da! relatividade! geral,! Einstein! optou! por! fazer! uma!
das! palestras! sobre! a! natureza! da! luz.! Nela,! mencionou! a! chamada! teoria! BKS,! de! Bohr,!
Kramers! e! Slater,! a! qual! se! propunha! “salvar”! a! natureza! ondulatória! da! radiação!
eletromagnética.!Ele!também!mencionou!o!experimento!de!GeigeroBothe,!que!acabara!de!
ter! sido! feito! na! Alemanha,! para! testar! a! teoria! BKS.! Mesmo! daqui,! Einstein! estava! em!
contato!com!os!físicos!alemães,!acompanhando!os!resultados! parciais!do!experimento,!e,!
ao!final!de!sua!palestra!no!Brasil,!!mencionou!que!“os%primeiros%resultados%do%experimento%
de%Geiger^Bothe%confirmam%a%natureza%corpuscular%da%luz”.!Vale!lembrar!ainda!que!1925!foi!
o!ano!da!descoberta!da!Equação!de!Schroedinger.!Nascia!a!mecânica!quântica.!
!

!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
19!O!Presidente!do!Brasil!era!Artur!Bernardes.!!

! 33!
!
!

I6.!Manifestações!do!caráter!corpuscular!do!fóton!
a. O!efeito!fotoelétrico!
O! efeito! fotoelétrico! consiste! na! produção! de! uma! corrente! elétrica! causada! pela!
ejeção! de! elétrons! da! superfície! de! um! metal,! quando! incidido! por! uma! onda!
eletromagnética.! Existem! dois! aspectos! do! efeito! fotoelétrico! que! não! podem! ser!
explicados! pela! física! clássica:! (i)! a! energia! cinética! dos! elétrons! ejetados! não!
depende! da! intensidade! da! luz! incidente,! como! previsto! classicamente,! já! que! a!
força!elétrica!é!proporcional!ao!campo!elétrico:!F!=!o!eE;!(ii)!Existe!uma!frequência!
de!corte!abaixo!da!qual!a!corrente!elétrica!desaparece,!a!despeito!da!intensidade!da!
onda! incidente! –! segundo! o! eletromagnetismo! clássico,! o! efeito! deveria! ocorrer!
para!qualquer!valor!de!frequência.!
!
Em!1905,!Einstein!resolveu!o!problema!introduzindo!a!equação!fenomenológica20:!
!
!
(I6.1)!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
20!Artigo!original:!A.!Einstein,!Annalen(der(Physik,!17!(1905)!132.!Traduções!em!inglês!estão!disponíveis!

na!internet.!!!

! 34!
mv 2
!ω = W + !
2
!
No!lado!esquerdo,!!aparece!a!energia!do!fóton!incidente,!e!o!segundo!termo!do!lado!
direito!é!a!energia!cinética!do!elétron!ejetado.!O!primeiro!termo!do!lado!direito,!W,!
é!a!chamada!função!trabalho.!Em!termos!modernos,!a!função!trabalho!representa!a!
profundidade! do! poço! de! potencial! que! mantém! o! elétron! preso! ao! metal! (veja!
Figura!I6.1).!
!

!
Figura!I6.1–!No!efeito!fotoelétrico!uma!onda!eletromagnética!incide!sobre!a!superfície!de!um!metal!e!
elétrons!são!ejetados,!dando!origem!a!uma!corrente!elétrica.!Para!vencer!a!força!de!atração!que!
mantém!o!elétron!preso!ao!metal,!chamada!função!trabalho,!!a!energia!do!fóton!deve!ter!um!valor!
mínimo,!o!que!estabelece!uma!frequência!de!corte!que!depende!do!tipo!de!metal!
!
!
!
!
O!valor!da!função!trabalho!depende!de!cada!metal!e!pode!ser!obtido!diretamente!
do!experimento,!baixandoose!a!frequência!da!onda!até!que!a!corrente!desapareça,!
como!mostra!a!Figura!I6.2.!!
!

! 35!
!
Figura!I6.2!–!Exemplos!de!frequências!de!corte!do!efeito!fotoelétrico!em!!vários!metais!comuns!! !
! !
! O!
postulado!de!Einstein!explica!corretamente!todas!as!características!do!efeito!
fotoelétrico.!!
!
!
! !

! 36!
!
!
b. O!efeito!Compton!
Em! 1923! (quase! 20! anos! após! a! explicação! do! efeito! fotoelétrico! por! Einstein),!
Arthur!Compton!estudou!o!espalhamento!de!raios!X!por!diversos!materiais.!O!seu!
experimento! consistia! em! fazer! incidir! sobre! uma! amostra! um! feixe! de! raios! X! e!
observar! o! comprimento! de! onda! do! feixe! espalhado! em! função! do! ângulo! de!
espalhamento!θ.!
!

! 37!
detector

feixe espalhado
feixe incidente θ
!

Figura!I6.3–!No!espalhamento!Compton!um!feixe!de!fótons!incide!sobre!a!superfície!de!um!metal!e,!ao!
interagir!com!os!elétrons,!é!espalhado!de!um!ângulo!θ,!e!tem!o!seu!comprimento!de!onda!modificado.!!
A!descrição!correta!do!fenômeno!só!se!mostrou!possível!considerandocse!a!natureza!corpuscular!da!
radiação!!
!
! !
Segundo!o!eletromagnetismo!clássico,!ao!incidir!sobre!o!material,!o!campo!elétrico!
da!onda!faria!os!elétrons!oscilarem!na!mesma!frequência,!transformando!o!alvo!em!
uma! fonte! secundária! de! radiação.! Compton! observou! que! a! radiação! espalhada!
sofria!um!deslocamento!no!seu!comprimento!de!onda,!com!a!seguinte!dependência!
com!o!ângulo!de!espalhamento!(veja!Problema!5):!
!
λ ' = λ + Λ(1− cosθ ) (I6.2)!
!
−12
Λ = 2, 42 ×10 m
!!
A!constante!Λ!é!chamada!comprimento!de!onda!de!Compton.!!
!

Figura!I6.4!–!Resultado!original!de!Compton!do!espalhamento!de!raio!X!gerado!por!molibdênio!
espalhado!em!grafite,!mostrando!um!aumento!no!comprimento!de!onda!da!radiação!espalhada.!A!
! linha!tracejada!é!o!espectro!original,!e!a!contínua!é!a!radiação!espalhada!!detectada!a!90o!do!feixe!38!
incidente!!
!
!
Compton! foi! capaz! de! explicar! os! resultados! e! deduzir! uma! expressão! para! Λ! em!
termos! de! grandezas! físicas! fundamentais,! tratando! o! problema! como! o!
espalhamento!entre!duas!partículas,!ou!seja,!adotando!a!ideia!corpuscular!do!fóton,!
a! qual,! até! aquele! momento,! ainda! não! era! aceita! como! uma! realidade! física.!
Aplicando!as!leis!de!conservação!de!momento!e!energia,!Compton!deduziu!que!
h
Λ= !
m0 c (I6.2)!

!
Em! suma,! a! existência! dos! quanta! de! energia! eletromagnética! (fótons)! levou! um!
quarto!de!século!para!ser!aceita!pela!comunidade!de!física!da!época.!!!
!

I7.!Ondas!de!matéria,!incertezas!e!trajetórias!!
Em! 1924! –! ! portanto,! após! o! experimento! de! Compton! –,! ! o! francês! Louis! de! Broglie!
sugeriu,! em! sua! tese! de! doutorado,! que! partículas! materiais! teriam! um! comportamento!
ondulatório,!com!uma!onda!associada!cujo!comprimento!de!onda!é!dado!por!!
!

h p2 !2k 2 (I7.1)!
λ= ⇒ p = !k ⇒ E = =
p 2m 2m !

Por!outro!lado,!sabemos!da!física!clássica!que!existem!duas!velocidades!associadas!a!uma!
onda.!A!primeira!é!a!velocidade!de!grupo,!definida!a!partir!da!relação!de!dispersão!
!
dω (I7.2)!
vg = !
dk
!
A!partir!do!postulado!de!de!Broglie,!se!obtém!dessa!definição:!
!

dω dE " d E % d " ! 2 k 2 % p (I7.3)!


vg = ⇒$ ' $ ' ⇒ vg = !
dE dk # dE ! & dk # 2m & m

! 39!
Ou!seja,!a!velocidade!de!grupo!da!onda!de!de!Broglie!se!relaciona!ao!momento!mecânico%
da!partícula.!A!outra!é!a!velocidade!de!fase,!dada!por!
!
ω (I7.4)!
vf = λ f = !
k
!
Essa!é!a!velocidade!com!que!a!onda!se!desloca!no!espaço.!!
!
Em!1927,!C.!J.!Davisson!e!L.!H.!Germer!publicaram!resultados!de!experimentos!realizados!
nos! Laboratórios! Bell,! nos! EUA,! demonstrando! um! padrão! de! difração! de! elétrons! por!
cristais! de! níquel.! Foi! a! comprovação! da! natureza! ondulatória! da! matéria.! O! experimento!
foi! feito! simultaneamente! por! George! Thompson,! na! Universidade! de! Cambridge,! na!
Inglaterra.! Pelo! trabalho,! Davisson! e! Thompson! (mas! não! Germer)! dividiram! o! Prêmio!
Nobel!de!Física!de!1937.!!
!

!
!

! 40!
Ainda! em! 1927,! Werner! Heisenberg! percebeu! que! a! natureza! ondulatória! da! matéria!
impunha! limites! sobre! a! precisão! com! que! podemos! conhecer! os! valores! de! quantidades!
físicas!observáveis!de!partículas,!como!posição!e!momento,!energia!e!tempo,!componentes!
do! momento! angular! etc.! No! caso! das! grandezas! posição! e! momento,! a! expressão! da!
incerteza!é!a!famosa!desigualdade!conhecida!como!princípio%de%incerteza:!!
!
ΔxΔp ≥ h !
(I7.5)!
!
onde!Δ!!é! a! chamada! incerteza! na! posição,! e!Δ!,! a! incerteza! no! momento.! É! importante!
notar! que! estas! quantidades! não! são! equivalentes! aos! erros! experimentais,! intrínsecos! a!
qualquer! sistema! de! medida.! Ainda! que! fosse! possível! fazer! medidas! da! posição! e! do!
momento! de! uma! partícula! com! aparelhos! perfeitos,! livres! de! erro! experimental,! nada!
mudaria!nessa!relação,!que!é!uma!manifestação!da!natureza!ondulatória!da!matéria.!!!
!
A! impossibilidade! de! conhecermos! a! posição! e! o! momento! de! um! objeto! com! precisão!
arbitrária! implica! que,! nos! sistemas! quânticos,! a! noção! clássica! de! trajetória! deve! ser!
abandonada.!De!fato,!classicamente,!a!posição!de!um!objeto!em!um!instante!de!tempo!tk!
depende!do!conhecimento!da!sua!posição!em!momento!anterior!!tk^1:!
px (tk−1 )
x(tk ) = x(tk−1 ) + (tk − tk−1 ) (I7.6)!
m !

Naturalmente!que,!como!frisado!anteriormente,!os!limites!de!validade!devem!ser!sempre!
verificados.!Por!exemplo,!se!a!velocidade!de!um!grão!de!areia!com!massa!m%~%10^7!kg!for!
medida!com!precisão!de!Δv%=%10^5!m/s,!a!incerteza!na!sua!posição!será!da!ordem:!
!
h
Δx ~ = 10 −21 m ! (I7.7)!
mΔv
!
Esse! valor! é! muito! menor! do! que! as! dimensões! típicas! de! um! grão! de! areia,! que! pode,!
portanto,!ser!considerado!um!sistema!clássico,!com!trajetória!bem!definida.!!
No!entanto!considere!que,!para!um!elétron!em!um!átomo!de!hidrogênio,!a!incerteza!na!sua!
posição!é!da!ordem!do!raio!de!Bohr,!10!Å.!Logo:!!

! 41!
!
!
∆!~ ∆! ~10!!" !! !! !"! (I7.8)!
!
Esse!valor!deve!ser!comparado!ao!momento!do!elétron.!Tomando!a!energia!de!ionização!do!
hidrogênio,!E!=!13!eV,!podemos!calcular!o!momento!do!elétron!
!
1/2
p = 2mE = ( 2 × 9 ×10 −31 ×10 −18 ) ~ 10 −24 ms −1kg ! (I7.9)!

!
Ou!seja,!o!momento!é!da!mesma!ordem!de!magnitude!da!sua!incerteza.!Portanto,!o!elétron!
no!átomo!de!hidrogênio!deve!ser!tratado!quanticamente.!!
!

I8.!A!Equação!do!Schroedinger!!
Em! 1926,! após! os! resultados! de! de! Broglie! –! ! porém,! antes! dos! de! DavissonoGermer! e!
Thompson,!Erwin!Schroedinger!formulou!a!equação!diferencial!cujas!soluções!são!funções!
que!descrevem!as!ondas!de!matéria!
!
∂ (I8.1)!
H Ψ(r, t) = i! Ψ(r, t) !
∂t
Nessa!equação,!Ψ é!uma!função!complexa!chamada!função!de!onda,!e!H,!o!hamiltoniano!
do!sistema:!!
p2 !2 2 (I8.2)!
H= +V = − ∇ +V !
2m 2m
A! origem! dessa! equivalência! entre! o! operador! laplaciano! e! o! momento! mecânico! da!
partícula! está! no! postulado! de! de! Broglie.! Considere! uma! onda! plana! como! um! exemplo!
simples!de!função!de!onda!
!
Ψ(r, t) ~ exp {i(k • r − ω t)} ! (I8.3)!

!
Atuando!duas!vezes!com!o!operador!laplaciano!nessa!função,!obtemos!

! 42!
p2
∇ 2 Ψ = −k 2 Ψ = − Ψ (I8.4)!
!2 !

No!entanto,!atuando!apenas!uma!vez,!o!resultado!é!
p (I8.5)!
∇Ψ = ikΨ = i Ψ !
!
Dessas!duas!relações,!segue!a!equivalência!
!!
p ↔ −i!∇ ! (I8.6)!
!
A!função!de!onda!não!representa!um!objeto!físico,!como!uma!onda!mecânica!ou!uma!onda!
eletromagnética.!A!interpretação!correta!da!função!de!onda!não!foi!dada!por!Schroedinger,!
mas! por! Max! Born,! em! 192621.! Segundo! Born,! o! módulo! quadrado! da! função! de! onda!
representa! uma! densidade! de! probabilidades,! a! qual! deve! ser! usada! para! o! cálculo! das!
médias!dos!chamados!observáveis%do!sistema.!Voltaremos!a!esse!tópico!adiante.!!!!
!
Antes! de! vermos! exemplos! de! aplicações! da! equação! de! Schroedinger,! vamos! ver!
importantes! propriedades! gerais! que! podem! ser! deduzidas! diretamente! da! equação.!
Primeiro,!multiplique!à!esquerda!pelo!complexo!conjugado!de!Ψ!
!
∂Ψ
Ψ * H Ψ = i!Ψ * !
∂t (I8.7)!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
21!Artigo!original:!Zur(Quantenmechanik(der(Stoβvorgänge,!Max!Born,!Zeitschift!für!Physik,!v.37!n.!12!
(1926)!863.!

! 43!
!

Figura!I8.1–!Artigo!original!de!Schroedinger!publicado!no!Physical!Review!em!1926,!no!qual!ele!
deduz!a!sua!famosa!equação!!
!
! !

Segundo,! tome! o! complexo! conjugado! da! equação! original! e! multiplique! novamente! à!


esquerda!por!Ψ!para!obter!
∂Ψ *
ΨH Ψ * = −i!Ψ ! (I8.8)!
∂t
Agora,!subtraia!a!segunda!da!primeira!
!
∂Ψ ∂Ψ * ∂ ∂ 2
* *
Ψ H Ψ − ΨH Ψ = i!Ψ *
+ i!Ψ = i! ΨΨ * = i! Ψ ! (I8.9)!
∂t ∂t ∂t ∂t
!
Definindo!a!densidade!de!probabilidade,!ρ,!e!a!corrente!de!probabilidade,!j!
!
j ≡ Ψ * H Ψ − ΨH Ψ *
2
! (I8.10)!
ρ≡ Ψ

Obtémose!uma!equação!de!continuidade!para!a!probabilidade!
!

! 44!
∂ρ
+ ∇• j = 0 ! (I8.11)!
∂t
!
Noteose! que,! se! a! função! de! onda! for! real,! a! corrente! de! probabilidade! é! zero,! e! ρ! é!
constante.! Isso! é! o! que! acontece! em! todas! as! situações! de! confinamento,! nas! quais! o!
movimento!da!partícula!fica!espacialmente!restrito.!!
!
Considere! agora! o! caso! em! que! a! função! de! onda! total! pode! ser! decomposta! em! um!
produto!entre!uma!função!apenas!da!posição!por!outra!apenas!do!tempo:!!
!
Ψ(r, t) = ψ (r)ϕ (t) !
(I8.12)!
!
Nessa! situação,! supondo! que! H! não! depende! do! tempo,! a! equação! de! Schroedinger! se!
torna:!
1 i! dϕ
Hψ = (I8.13)!
ψ ϕ dt !
!
Como! o! lado! esquerdo! dessa! equação! só! contém! variáveis! espaciais,! e! o! lado! direito!
variáveis! temporais,! a! única! forma! da! igualdade! ser! satisfeita! é! que! ambas! as! equações!
sejam!iguais!a!um!parâmetro!comum!que!deve!ter!necessariamente!dimensão!de!energia,!
E.!Com!isso,!obtemos!
!
$ !2 2 '
H ψ = Eψ ⇒ %− ∇ +V (r)( ψ = Eψ
& 2m )
!
dϕ (I8.14)!
i! = Eϕ ⇒ ϕ (t) ~ e−iEt/!
dt !
! !
É! fácil! ver! que,! nesse! caso,! a! corrente! de! probabilidade! não! dependerá! do! tempo.! A!
equação!de!Schroedinger!independente!do!tempo!é!chamada!de!equação!estacionária.!Ela!
resulta!em!uma!família!de!soluções!{!! , !! }!que,!atendidas!as!condições!de!contorno,!são!
chamadas!de!autoestados!dos!sistema.!Todos!os!autoestados!satisfazem!à!mesma!equação!
!

! 45!
!2 2
− ∇ ϕ n + V ϕ n = Enϕ n (I8.15)!
2m !
Ou!seja:!
H ϕ n = Enϕ n ! (I8.16)!
!
Por! ser! uma! equação! diferencial! linear,! qualquer! combinação! de! autofunções! é! também!
uma! solução! do! problema.! Essa! propriedade! é! chamada! princípio! da! superposição! de!
estados!quânticos:!
!

! ! = !! !! (!)! (I8.17)!
!

!
Essa!expressão!nos!diz!que!as!autofunções!formam!uma!base!para!expansão!de!qualquer!
estado!quântico.!De!fato,!tal!como!ocorre!com!vetores!i,!j!e!k!no!espaço!ℜ! ,!os!elementos!
da!base!de!autofunções!são!ortonormais:!!!
!

∫ϕ n (r)ϕ n' (r)d 3r =δn,n' ! (I8.18)!


!
E!tal!propriedade!implica:!
2 2
! ∫ ψ (r) d 3r = ∑ cn = 1 (I8.19)!
n !
! !
Ou!seja,!os!módulos!quadrados!dos!coeficientes!da!expansão!da!função!de!onda!em!uma!
base!de!autoestados!têm!propriedade!de!probabilidade.!!
!

I9.!Valor!esperado!e!valor!médio!
O! conceito! de! probabilidade! em! mecânica! quântica! foi! introduzido! por! Max! Born! já! em!
1926,! o! mesmo! ano! da! publicação! do! artigo! de! Schroedinger.! Segundo! Born,! se! ψ(r)! é! o!
estado!quântico!de!uma!partícula,!a!quantidade:!
!
2
ψ * (r)ψ (r)d 3r = ψ (r) d 3r (I9.1)!
!

! 46!
!
representa!a!probabilidade!de!a!partícula!ser!encontrada!entre!r!e!r!+!dr!em!uma!medida!de!
sua! posição.! Em! termos! da! expansão! da! função! de! onda! como! uma! superposição! de!
autofunções!(Eq.!I8.17),!postulaose!que!a!medida!colapsa!o!estado!em!um!dos!autoestados,!
com!probabilidade! !! ! .!!
!
Para!compreender!melhor!esse!conceito,!considere!o!seguinte!exemplo.!Suponha!que!um!
sistema!quântico!seja!preparado!no!estado!ψ!abaixo:!
!

ψ (r) = ∑ cnϕ n (r) ! (I9.2)!


n

Então,!segundo!a!equação!de!Schroedinger,!podemos!escrever:!
!

H ψ (r) = ∑ cn H ϕ n (r) = ∑ cn Enϕ n (r) ! (I9.3)!


n n

Se!multiplicarmos!à!esquerda!pelo!complexo!conjugado!de!ψ!,!obtemos:!
!

ψ * H ψ = ∑ cn'*cn Enϕ n'*ϕ n


n,n'

⇒ ∫ ψ Hψ d r = ∑ c
* 3 *
n' n c En ∫ ϕ n'*ϕ n d 3r
n,n'
!
∫ ψ Hψ d r = ∑ c
* 3 *
n' nc Enδn,n'
(I9.4)!
n,n'
2
∫ ψ Hψ d r = ∑ E
* 3
n cn
n

!
Como! !! ! !são! probabilidades,! a! expressão! à! direita! representa! a! energia! média! do!
sistema,!!a!qual,!calculada!a!partir!do!conhecimento!do!hamiltoniano!e!do!estado!quântico!
do!sistema,!é!chamada!de!valor!esperado%da%energia,!!representado!por:!
!

E ≡ ∫ ψ * (r)H ψ (r)d 3r ! (I9.5)!


!
Para! entender! o! significado! físico! do! valor! esperado,! suponha! que! um! sistema! seja!
preparado! no! mesmo! estado! ψ,! e! que! se! faça! uma! medida! da! energia! e! se! encontre! um!

! 47!
resultado!particular!E1.!O!experimento!é!repetido!N!vezes,!encontrandoose!N1!vezes!E1,!N2!
vezes!E2,!e!assim!por!diante.!Naturalmente,!N!=!N1!+!N2!+!...!.!Ao!final!do!experimento,!se!
calcula!a!energia!média:!
!

E=
N1E1 + N 2 E2 +!+ N n En (I9.6)!
N !
!
Essa!média,!calculada!utilizandoose!apenas!os!dados!experimentais,!é!numericamente!igual!
ao! valor! esperado! quântico,! Eq.! (I9.4).! Ou! seja,! o! valor! esperado! de! uma! quantidade! é!
aquele!que!será!encontrado!se!um!número!grande!de!medidas!de!um!observável!for!feito!
e,!ao!final,!a!média!dos!resultados!for!calculada.!!!
!

I10.!Continuidade!da!função!de!onda!
A!função!de!onda!representa!uma!distribuição!de!probabilidades!ou,!mais!exatamente,!uma!
amplitude! de! probabilidade.! O! seu! módulo! quadrado! representa! uma! densidade! de!
probabilidades.! Como! tal,! ela! deve! ser! uma! função! contínua.! De! fato,! a! continuidade! de!
ψ(r)!é!uma!das!condições!que!devem!ser!verificadas!em!cada!problema.!A!outra!condição!é!
que! o! seu! módulo! quadrado! seja! integrável,! para! satisfazer! a! chamada! condição! de!
normalização:!
!
2
∫ ψ (r) d 3r = 1 (I10.1)!
!
!

Essa!condição!garante!que!a!probabilidade!se!conserva!em!todo!o!espaço.!!

Há!ainda!outra!condição!que!deve!ser!imposta!às!funções!de!onda:!a!sua!derivada!primeira!

também! deve! ser! contínua! (veja! Problema! 9).! Mesmo! na! presença! de! potenciais! com!

descontinuidades,!essa!condição!–!!fisicamente!relacionada!ao!valor!do!momento!linear!do!

objeto!–!garante!que!a!equação!de!Schroedinger!possa!ser!resolvida,!e,!portanto,!existirá!

uma!distribuição!de!probabilidades.!!

! 48!
Como! exemplo,! considere! uma! partícula! sujeita! a! um! poço! de! potencial! delta! em! uma!

dimensão:!
V (x) = −V0δ (x) ! (I10.2)!

Esse!potencial!é!obviamente!descontínuo,!já!que!a!função!delta!é!infinita!para!x!=!0!e!igual!a!

zero!em!qualquer!outra!parte!do!espaço.!A!equação!de!Schroedinger!para!esse!problema!é:!
d 2ψ
− k 2ψ +U 0δ (x)ψ = 0
dx 2
(I10.3)!
2mE 2mV
k= ;U 0 = 2 0
! ! !
!

Como! o! potencial! é! zero! em! toda! parte,! exceto! na! origem,! vamos! integrar! diretamente! a!

equação!de!Schroedinger!em!torno!da!origem:!

!
+ε +ε +ε
d # dψ &
∫ %$ (' ∫ dx − k 2
ψ dx +U 0 ∫ δ (x)ψ dx = 0 (I10.4)!
−ε dx dx −ε −ε !
!

Agora,!por!causa!da!condição!de!continuidade!imposta!sobre! ψ,!o!segundo!termo!se!anula,!

pois! ψ(+ε)! tende! para! ψ(oε)! quando! ε! tende! para! zero.! Logo,! integrando! o! primeiro! e! o!

terceiro!termos,!!obtemos:!

dψ dψ
− +U 0ψ (0) = 0
dx dx (I10.5)!
+ε −ε !
!

Por! outro! lado,! ainda! por! conta! da! continuidade,! fora! do! ponto! x% =% 0,! ψ! tem! que! cair!

rapidamente!para!zero,!e!a!sua!derivada!não!pode!ser!descontínua22.!Ou!seja:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
22!Por!exemplo,!ψ!não!pode!ser!uma!função!do!tipo!“degrau”.!

! 49!
ψ ~ exp(−kx), x > 0
ψ ~ exp(+kx), x < 0
E
dψ !
~ −kx, x > 0
dx (I10.6)!

~ +kx, x < 0
dx

As!derivadas!à!direita!e!à!esquerda!devem!obedecer!à!condição:!

dψ dψ
− = 2kψ (0) (I10.7)!
dx +ε dx −ε !
Com!isso:!
2kψ (0) +U 0ψ (0) = 0
U 0 = −2k
2mV0 2mE
= −2
! 2
! !
2 2
4m V0 (I10.8)!
= 8mE
!3
mV02
E=
2!3

Esse!é!o!valor!da!energia!em!módulo,!e!é!o!único!autoestado!do!sistema.!Como!o!potencial!

é!atrativo!e!infinito!na!origem,!a!energia!é!negativa!e!igual!à!chamada!energia!de!ligação!do!

sistema23.!!

I11.!Incerteza!e!comutação!de!operadores!
Ao!compararmos!a!forma!do!hamiltoniano!quantizado:!
!2 2 (I11.1)!
H =− ∇ + V (r)
2m !
com!a!sua!forma!clássica:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
23!A!energia!de!ligação!de!um!sistema!é!o!menor!valor!negativo!do!seu!espectro!de!energia.!

! 50!
p2
H= + V (r) (I11.2)!
2m !
vemos! a! relação! entre! um! operador! quântico! e! sua! variável! dinâmica!

clássica!correspondente:!
(I11.3)!
!

p 2 ↔ −! 2 ∇ 2 ⇒ p ↔ −i!∇
!
!

A! presença! de! operadores! diferenciais! implica! que,! ao! aplicarmos! operadores! compostos!

em! funções! de! onda,! a! ordem! da! aplicação! é! importante.! Por! exemplo,! considere! o! caso!

unidimensional!dos!seguintes!operadores!compostos:!

!
d
xpx = −i!x
dx (I11.4)!
d
px x = −i! x !
dx

A!aplicação!de!cada!um!deles!em!uma!função!de!onda!ψ(x)!resulta!em:!

!
d dψ
xpxψ = i!x ψ = −i!x
dx dx !
d dψ (I11.5)!
px xψ = i! xψ = −i!x − i!ψ
dx dx
!
Subtraindo!a!segunda!expressão!da!primeira!encontramos:!

( xpx − px x ) ψ = i!ψ ! (I11.6)!


Ou!seja,!!
xpx − px x ≡ [x, px ] = i! ! (I11.7)!
!
O!símbolo!com!os!colchetes!é!o!operador!chamado!comutador.!A!mesma!relação!se!verifica!
para!as!componentes!y!e!z:!
!

! 51!
!" y, py #$ = i!
! (I11.8)!
[ z, pz ] = i!
!
Componentes! cruzadas! de! posição! e! momento! comutam,! ou! seja,! seus! comutadores! são!
iguais!a!zero:![x,py]!=![y,pz]!=!0!etc.!Essas!relações!de!comutação,!bem!como!o!princípio!de!
incerteza,!são!consequências!diretas!da!natureza!ondulatória!da!matéria.!!
!

I12.!Superposição!de!estados!quânticos:!emaranhamento!
Vamos!descrever!agora!uma!das!consequências!mais!importantes!e!estranhas!que!resultam!
do! princípio! de! superposição! de! estados:! o! emaranhamento.! Sejam! ψ1! e! ψ2! duas!
autofunções!da!mesma!equação!de!Schroedinger,!com!respectivas!autoenergias!E1!e!E2.!A!
linearidade!da!equação!garante!que!a!combinação:!
!
(I12.1)!
ψ = c1ψ1 + c2ψ 2 !
!
também!é!uma!solução.!A!aplicação!do!hamiltoniano!sobre!essa!função!resulta!em:!
!
H ψ = c1H ψ1 + c2 H ψ 2 = c1E1ψ1 + c2 E2ψ 2 ! (I12.2)!

!
Se!uma!medida!de!energia!for!feita!sobre!tal!sistema,!e!o!resultado!encontrado!for!E1,!!!isso!
significa! que! o! ato! da! medida! faz! com! que! a! função! de! onda! “colapse”! de! ψ! para! ψ1.! O!
análogo!ocorre!para!E2.!Este!“colapso”!é!um!dos!aspectos!curiosos!da!mecânica!quântica,!e!
não! existe! uma! descrição! teórica! adequada! para! ele.! É! um! postulado! que! descreve! um!
processo! temporal! nãoounitário 24 !em! uma! teoria! em! que! processos! temporais! são!
formalmente! descritos! pela! equação! de! Schroedinger.! Ou! seja,! existem! dois! processos!
temporais! na! mesma! teoria:! um! governado! pela! equação! de! Schroedinger,! e! outro! sem!
uma!descrição!adequada.!!
!
Considere!agora!um!sistema!com!duas!partículas!que!em!dado!instante!interagiram!entre!si!
e,! depois,! foram! afastadas! por! uma! distância! grande! o! suficiente,! de! forma! que! não!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
24!Transformações!unitárias!serão!formalizadas!no!Bloco!II!deste!texto.!

! 52!
interajam!mais.!Se! φa!e! φb!forem!duas!possíveis!autofunções!da!equação!de!Schroedinger!
das!duas!partículas,!as!três!funções!abaixo!representam!possíveis!representações!do!estado!
de!duas!partículas:!
!
ψ1 (x1, x2 ) = φ a (x1 )φb (x2 )
ψ 2 (x1, x2 ) = φ a (x2 )φb (x1 ) !
ψ3 (x1, x2 ) = c1φ a (x1 )φb (x2 ) + c2φ a (x2 )φb (x1 )

!
É!fácil!verificar!que!essas!três!funções!são!autofunções!do!hamiltoniano!H!=!H1!+!H2!de!duas!
partículas!que!não!interagem.!!
!
Suponha! que! o! estado! das! duas! partículas! seja! ψ1.! Nesse! caso,! se! uma! medida! for! feita!
sobre! a! partícula! 1,! com! certeza! absoluta! ela! será! encontrada! no! estado! φa.! Da! mesma!
forma,! a! partícula! 2! será! encontrada! em! φb! com! 100%! de! chance.! O! análogo! ocorre! se! o!
estado!for!ψ2,!invertendoose!apenas!as!coordenadas.!!
!
Vamos! supor! agora! que! c1! =! c2! =! 2o1/2! .! Se! o! estado! for! ψ3,! antes! que! a! medida! seja! feita!
sobre!qualquer!uma!das!partículas,!a!probabilidade!de!encontrar!a!partícula!1!em! φa!e!a!2!
em! φb!é!de!50%!e!a!de!encontrar!o!oposto!também!é!de!50%.!Ou!seja,!antes!da!medida!há!
uma!indeterminação!sobre!o!estado!das!duas!partículas.!!
!
Suponha!que!se!faça!uma!medida!apenas!sobre!a!partícula!1!e!se!encontre! φa.!Nesse!caso,!
saberemos,!imediatamente!após!a!medida,!que!a!partícula!2!está!em! φb.!Mas!como!isso!é!
possível,!se:!(i)!as!partículas!estão!remotamente!separadas;!(ii)!não!interagem!entre!si;!!(iii)!
nenhuma! medida! foi! feita! sobre! a! partícula! 2;! e! (iv)! antes! da! medida,! o! estado! da! 2! era!
indeterminado?!!
!

! 53!
A!resposta!é!que!para!este!estado!(e!similares),!a!medida!sobre!uma!das!partículas!afeta!o!
estado! da! outra! que! se! encontra! remotamente! separada.! Esse! é! um! exemplo! de!
correlação25!quântica,!e!estados!deste!tipo!são!chamados!de!estados!emaranhados.!!
!
Emaranhamento! é! um! exemplo! de! correlação! quântica! entre! variáveis! aleatórias.! Para!
existir! correlação! entre! as! variáveis,! não! é! preciso! que! haja! interação! entre! os! objetos!
físicos! correspondentes.! Um! exemplo! de! variáveis! aleatórias! clássicas! correlacionadas! é!
dado!a!seguir.!!
!
Suponha!que!duas!bolas,!uma!preta!e!outra!branca,!sejam!colocadas!em!caixas!separadas,!e!
que! estas! sejam! fechadas! e! entregues! a! dois! observadores,! A! e! B.! Cada! observador! sabe!
quais!são!as!cores!das!bolas,!mas!não!sabe!a!cor!da!bola!que!está!em!sua!caixa.!!Logo,!a!cor!
é!uma!variável!aleatória!para!os!observadores,!e!a!única!informação!que!cada!um!deles!tem!
é!a!de!que!existe!50%!de!chance!da!bola!na!sua!caixa!ser!branca!e!50%!de!ser!preta.!!
!
Mantendo!as!caixas!fechadas,!os!observadores!se!afastam!um!do!outro!por!uma!distância!
muito!grande,!de!modo!que!não!haja!qualquer!comunicação!entre!eles.!Após!percorrer!a!
distância! estabelecida,! o! primeiro! ! observador! (A)! abre! a! sua! caixa! e! pega! a! bola,! a! qual!
verifica!ser!a!de!cor!branca.!Consequentemente,!ele!conclui!que!a!bola!com!o!observador!B!
é! a! preta.! Ou! seja,! o! observador! A! ganha! informação! sobre! o! objeto! que! está! com! B! ao!
fazer!uma!observação!sobre!o!seu!próprio!sistema.!O!observador!B,!então,!abre!a!sua!caixa!
e! verifica! que! a! bola! que! está! com! ele! é! a! preta! e,! com! isso,! também! ganha! informação!
sobre!a!cor!da!bola!com!A.!!
!
Suponha! que! o! experimento! seja! repetido;! porém,! dessa! vez,! com! cada! caixa! contendo!
duas!bolas,!uma!preta!e!outra!branca.!Novamente,!ao!chegar!no!seu!destino,!o!observador!
A!pega!apenas!uma!das!bolas!na!sua!caixa.!Como!anteriormente,!ele!tem!50%!de!chance!de!
pegar!a!bola!branca!e!50%!de!pegar!a!preta,!ou!seja,!antes!da!medida,!a!sua!informação!é!
igual!a!que!ele!tinha!no!experimento!anterior.!!Após!pegar!uma!delas,!ele!verifica!que!a!cor!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
25!Duas!partículas!estão!correlacionadas!se!a!medida!de!uma!grandeza!física!sobre!uma!delas!(posição,!
momento,!energia!etc.)!fornece!informações!a!respeito!do!estado!da!outra.!Correlações!podem!ser!
clássicas!ou!quânticas.!

! 54!
é! ! preta.! No! entanto,! agora,! ele! não! pode! mais! concluir! qual! será! a! cor! da! bola! que! será!
pegada!por!B.!O!sistema!ficou!descorrelacionado.!!
!
No!entanto,!se!o!sistema!fosse!quântico!(por!exemplo,!com!fótons,!spins!átomos,!moléculas!
etc.)! e! as! cores! fossem! as! propriedades! físicas! emaranhadas! (como! polarização,! nível! de!
energia,!localização!etc.),!toda!vez!que!o!observador!A!retirasse!a!bola!preta,!o!B!também!
retiraria! a! preta;! e! toda! vez! que! o! A! retirasse! a! branca,! a! do! B! também! seria! branca,! a!
despeito!de!não!haver!qualquer!comunicação!entre!eles!ou!interação!entre!os!objetos.!Ou!
seja,!em!sistemas!físicos!emaranhados!as!correlações!são!100%!preservadas.!!
!
!
Naturalmente! que! o! fenômeno! do! emaranhamento! não! é! observado! em! objetos!
macroscópicos! como! bolas,! mas,! como! se! verá! mais! adiante,! já! foi! comprovado! em!
diferentes! sistemas! quânticos.! Einstein! se! referia! a! isto! como! “ação! fantasmagórica”,! e! o!
problema!foi!o!pivô!de!uma!das!discussões!mais!acaloradas!e!frutíferas!da!Física!do!século!
20!entre!Einstein!e!Bohr.!Falaremos!mais!sobre!isto!adiante.!!
!
O! emaranhamento! não! é! restrito! a! apenas! dois! objetos;! ele! pode! ser! criado! em! sistemas!
com! muitas! partículas.! Em! 2015,! pesquisadores! do! MIT! reportaram! um! experimento! de!
emaranhamento! de! cerca! de! 3! mil! átomos26.! De! fato,! estados! emaranhados! podem! ser!
caracterizados! mesmo! em! sistemas! macroscópicos! a! temperaturas! acima! da! ambiente,!
como!nos!chamados!magnetos!moleculares27.!!
!

I13.!Fase!absoluta!e!relativa:!o!experimento!da!dupla!fenda!
O! problema! da! superposição! de! estados! afeta! o! comportamento! físico! mesmo! de! uma!
única! partícula! isolada.! Considere! as! duas! funções! de! onda! abaixo,! que! diferem! por! uma!
fase!global:!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
26!R. McConnell, H. Zhang, J. Hu, C. Senka e V. Vuletic, Entanglement with negative Wigner function of
three thousand atoms heralded by one photon, Nature (Letter) 519 (2015) 439.
!
27!A. M. Souza, D. O. Soares-Pinto, R.S. Sarthour, I. S. Oliveira, M. S. Reis, P. Brandão e A.M. dos Santos,

Entanglement and Bell’s inequality violation above room temperature in metal carboxylates, Phys. Rev.
B., 79 (2009) 0544408.!

! 55!
Ψ! !, ! !!e!!Ψ! !, ! = ! ! !" Ψ! !, ! ! (I13.1)!
!
Essas! duas! funções! têm! o! mesmo! módulo! quadrado! e,! consequentemente,! as! mesmas!
distribuições!de!probabilidade.!Portanto,!esses!dois!estados!não!podem!ser!distinguidos!por!
qualquer!experimento.!A!situação!é!bem!diferente!se!considerarmos!uma!superposição!de!
estados!com!uma!fase!relativa%entre!eles:!
!
Ψ! + ! !" Ψ! (I13.2)!
Ψ =! !
2
!
Nesse!caso,!a!distribuição!de!probabilidades!tornaose!fortemente!dependente!da!fase:!
!
2 2 2
Ψ = Ψ1 + Ψ 2 + ( eiφ Ψ1* Ψ 2 + e−iφ Ψ *2 Ψ1 )
!
!
O!último!termo!do!lado!direito!é!o!responsável!pela!interferência!entre!os!dois!estados.!Se!
a!fase!for!zero,!esse!termo!se!soma!aos!dois!primeiros,!mas,!se!for! π,!eles!se!subtraem!dos!
dois! primeiros,! mudando! totalmente! a! distribuição! de! probabilidades! final.! Para! observar!
esse! fenômeno,! não! são! necessárias! duas! partículas,! mas! duas! funções! de! onda! que!
guardam!entre!si!uma!diferença!de!fase!relativa,!e!isso!pode!ser!obtido!com!apenas!uma!
partícula.! Existem! diferentes! realizações! experimentais! que! exibem! esse! efeito! de!
interferência! entre! estados! quânticos,! o! mais! tradicional! sendo! o! experimento! da! dupla!
fenda.!!
!
O!experimento!de!interferência!em!uma!dupla!fenda!é!bem!conhecido!em!óptica!clássica.!
Uma!onda!eletromagnética!incide!sobre!um!anteparo!com!duas!fendas.!A!onda!é!difratada!
em!cada!fenda,!que!se!torna!fonte!secundária!da!radiação.!A!superposição!das!duas!ondas!
causa!franjas!de!interferência,!a!qual!pode!ser!vista!em!um!anteparo,!como!mostra!a!Figura!
I13.1.!
!

! 56!
y

θ
p(y)

!
!

Figura!I13.1–!No!experimento!clássico!da!dupla!fenda,!uma!onda!incide!sobre!um!anteparo!contendo!
dois!orifícios.!As!ondas!difratadas!por!cada!orifício!se!recombinam!causando!um!padrão!de!
interferência.!Se!o!experimento!for!repetido!com!partículas!quânticas!individuais!(fótons,!átomos,!
elétrons!etc.),!o!mesmo!padrão!é!observado,!o!que!indica!que!a!função!de!onda!de!partículas!
individuais!sofre!o!!mesmo!tipo!de!espalhamento!e!interferência!
!
! !

Se! o! experimento! for! repetido! com! fótons! individuais,! a! mecânica! quântica! diz! que! o!
mesmo!padrão!de!interferência!irá!se!formar.!E!mais,!a!mecânica!quântica!também!diz!que,!
se! o! experimento! for! repetido,! por! exemplo,! com! elétrons,! prótons! e! mesmo! com!
moléculas! relativamente! grandes,! também! haverá! um! padrão! de! interferência.! Isso,! de!
fato,!é!o!que!acontece,!como!mostra!a!Figura!I13.2!para!o!caso!de!elétrons.!!
!

! 57!
!

Figura!I13.2–!Figura!de!interferência!em!um!experimento!de!fenda!dupla!feito!com!elétrons!
individuais.!Notacse!que,!na!medida!em!que!os!elétrons!vão!se!acumulando!(do!topo!da!figura!para!
baixo),!o!padrão!de!interferência!típico!de!uma!onda!vai!aos!poucos!surgindo!
!
!
!
Outra! situação! em! que! a! interferência! quântica! pode! ser! estudada! é! no! chamado!
interferômetro! de! MachoZehnder.! O! esquema! do! interferômetro! é! mostrado! na! Figura!
I13.3.!Um!feixe!de!luz!(por!exemplo!um!laser)!incide!sobre!um!espelho!semiotransparente!
inclinado!45o!em!relação!à!direção!de!incidência.!O!feixe!se!divide!em!dois!caminhos,!um!
horizontal!e!outro!vertical,!cada!qual!com!metade!da!intensidade!do!feixe!original.!!
!
O! feixe! vertical! é! totalmente! refletido! por! outro! espelho,! colocado! a! 45o! em! um! dos!
vértices!do!interferômetro.!O!mesmo!acontece!com!o!feixe!horizontal.!Os!dois!feixes!irão!se!
encontrar! novamente! em! um! quarto! espelho! semirrefletor,! sendo! que! o! feixe! horizontal!
sofre,!antes,!um!deslocamento!de!fase.!Nesse!último!espelho,!os!dois!feixes!interferem,!e!
as!respectivas!intensidades!nas!direções!horizontal!e!vertical!dependem!do!deslocamento!
de! fase,! o! qual! pode! ser! ajustado! de! forma! arbitrária.! Isso! permite! que! as! intensidades!
relativas!dos!feixes,!nos!dois!caminhos,!possam!ser!manipuladas.!!
!

! 58!
~ sen2 ΔФ
2

ΔФ ~ cos2 ΔФ
2

Figura!I13.3!–!Esquema!de!um!interferômetro!de!MachcZehnder.!!Um!feixe!luminoso!é!desdobrado!
por!um!espelho!semitransparente!e!percorre!dois!caminhos!distintos,!para!se!recombinarem!
novamente!em!outro!espelho.!Ajustandocse!a!fase!de!um!dos!feixes,!o!padrão!de!interferência!pode!
ser!controlado!
!
! !
Suponha! que! a! fase! seja! ajustada! de! modo! tal! que,! ao! final,! apenas! o! feixe! horizontal!
permaneça.! Ou! seja,! 100%! da! intensidade! da! luz! que! entra! no! interferômetro! sairá! na!
direção!horizontal.!Nessa!situação,!suponha!que!o!experimento!seja!repetido!no!regime!de!
fótons!individuais.!Ou!seja,!um!fóton!de!cada!vez!é!emitido!da!fonte.!O!que!será!observado!
ao! final?! Exatamente! o! que! foi! observado! antes:! 100%! dos! fótons! que! são! emitidos! na!
entrada!serão!detectados!na!saída!horizontal.!Mas!isso!é!!estranho,!já!que!um!fóton!apenas!
não!tem!com!o!que!interferir!!!!
!
A!explicação!aqui!é!parecida!com!a!da!dupla!fenda:!o!primeiro!espelho!semiotransparente!
na!entrada!do!interferômetro!funciona!como!uma!dupla!fenda!que!divide!a!função!de!onda!
do!fóton!em!dois!caminhos!diferentes,!a!qual!se!sobrepõe!novamente!ao!final,!produzindo!
o! padrão! de! interferência.! Existe! ainda! outro! exemplo! interessante! de! interferência!
quântica,!o!efeito!AharonovoBohm,!que!será!tratado!em!uma!seção!mais!adiante.!!
!

I14.!O!átomo!de!hidrogênio!
Um! dos! grandes! triunfos! iniciais! da! mecânica! quântica! foi! o! cálculo! dos! autoestados! do!
átomo! de! hidrogênio,! bem! como! a! explicação! correta! para! o! seu! espectro! de! emissão.! O!
átomo!de!hidrogênio!é!um!dos!sistemas!mais!simples!da!natureza.!Consiste!em!um!elétron!

! 59!
ligado! a! um! próton! pelo! potencial! coulombiano! de! atração! eletrostática.! Por! ter! simetria!
esférica,!a!equação!estacionária!de!Schroedinger!é!escrita!como:!
!
!2 2 e2
− ∇ ψ (r, θ , φ ) − ψ (r, θ , φ ) = Eψ (r, θ , φ ) (I14.1)!
2m 4πε 0 r !
!
onde!!! !é!a!permissividade!elétrica!do!vácuo.!A!solução!dessa!equação!é!um!problema!de!
métodos! matemáticos! e! está! detalhada! em! praticamente! todos! os! livrosotexto! sobre! o!
assunto;! portanto,! ! não! vamos! repetiola! aqui;! em! vez! disso,! vamos! explorar! algumas!
consequências!físicas!dos!seus!resultados.!!
!
Primeiro,!notemos!que!as!autoenergias!do!elétron!são:!
!
!! ! 13,6
!! = − = − !!"!
4!!! ! 2ℏ! !! !!
! (I14.2)!
!
onde!n!=!1,!2,!3,...!é!chamado!número!quântico!principal.!O!sinal!negativo!significa!que!o!
elétron!se!encontra!preso!ao!núcleo,!e!o!valor!o13,6!eV!é!a!energia!necessária!para!ionizar!o!
átomo,!quando!o!elétron!se!encontra!em!seu!estado!de!energia!mais!baixa,!correspondente!
a!n!=!1,!chamada!energia!de!ligação.!!
!
As!autofunções!são!escritas!como!um!produto!de!uma!parte!radial!e!uma!parte!angular:!
!
ψ nlml (r, θ , φ ) = Rnl (r)Ylml (θ , φ ) (I14.3)!
!
!
Aqui,! além! do! número! quântico! principal! n,! aparecem! mais! dois! números! quânticos,!
associados!ao!estado!de!momento!angular!do!elétron:!l!e!ml.!O!número!l!é!natural!e,!dado!
um!valor!de!l,!teremos:!
! (I14.4)!
ml = −l, −l +1,!, l −1, +l !

! 60!
Ou! seja,! ml! varia! de! –l! a! +l! em! unidades! inteiras28.! Esse! número! representa! as! várias!
projeções! possíveis! do! vetor! momento! angular! sobre! determinado! eixo! (em! geral!
representado!como!o!eixo!z%de!um!sistema!de!coordenadas),!chamado!eixo!de!quantização.!
A! tabela! a! seguir! mostra! as! quatro! primeiras! autofunções! do! átomo! de! hidrogênio.! A!
quantidade!a0!é!o!raio!de!Bohr:!
!
4!!! ℏ! (I14.5)!
!! = = 0,53!Å!
!! !
!
!
!! !! !! ! !!!! (!, !)! !!" (!)!
1! 0! 0! 1 2
! !/!
! !!/!! !
4! !!
2! 0! 0! 1 1 ! !!/!!
! !/!
2− ! !!
4! 2 2!! !!

2! 1! 0! 6 !
cos !! !/!
! !!/!!! !
2 2! 2 6!!

2! 1! ±1! 3 !
! ±!"
sin !! !/!
! !!/!!! !
2 2! 2 6!!

!
As! funções!!!!! (!, !)!são! chamadas! harmônicos! esféricos.! Lembremos! que! essas! funções!
são! amplitudes! de! probabilidades:! ! !!" (!) ! !é! a! densidade! de! probabilidade! na! direção!
radial,! ou! seja,!! ! !!" (!) ! !"!é! a! probabilidade! de! o! elétron! ser! encontrado! em! uma!
!
distância! entre! r! e! r! +! dr! do! núcleo.! Da! mesma! forma,! !!!! (!, !) !"#$%$%& !é! a!
probabilidade!de!o!elétron!ser!encontrado!com!coordenadas!angulares!entre!θ!e!θ!+!dθ!e!!!
e!! + !".!A!Figura!I14.1!ilustra!algumas!dessas!distribuições!de!probabilidades.!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
28!Isso!está!fundamentalmente!ligado!à!constant!de!Planck,!que!é!o!quantum!de!

momento!angular.!!

! 61!
!

Figura!I14.1!–!Algumas!autofunções!do!átomo!de!hidrogênio.!Na!esquerda,!as!distribuições!radiais!de!
probabilidade;!!do!lado!direito,!as!distribuições!angulares.!Repare!que,!mesmo!para!aqueles!estados!
em!que!o!momento!angular!é!zero,!a!probabilidade!de!o!elétron!ser!encontrado!na!região!do!núcleo!é!
nula!!!!
!
! !
Um! fato! particularmente! interessante! diz! respeito! ao! estado! fundamental! do! átomo! de!
hidrogênio,!n!=1,!l!=!0.!Na!ausência!de!momento!angular,!o!movimento!do!elétron!é!radial,!
e!a!nossa!intuição!clássica!nos!diz!que!o!elétron!passaria!por!dentro!do!núcleo!!No!entanto,!
olhando! a! distribuição! radial! para! esse! caso! se! vê! que! a! probabilidade! de! o! elétron! ser!
encontrado! em! r! =! 0! é! nula.! Muitas! vezes,! a! intuição! clássica! falha! quando! lidamos! com!
situações!desse!tipo.!A!razão!é!que!estamos!acostumados!a!pensar!no!elétron!como!sendo!
um! corpúsculo! e! nos! esquecemos! de! que! ele! é! também! uma! onda.! Olhando! para! as!
distribuições! angulares,! vemos! claramente! um! padrão! ondulatório! com! figuras! de!
interferência!!
!
Os!números!quânticos!l!e!ml!referemose!aos!autoestados!de!momento!angular!do!elétron!
no! átomo,! representados! pelos! operadores! L2! e! Lz% .! Aplicados! aos! harmônicos! esféricos,!
resultam!em:!
L2Ylml (θ , φ ) = l(l +1)! 2Ylml (θ , φ )
LzYlml (θ , φ ) = m!Ylml (θ , φ ) (I14.6)!
!
!

! 62!
Como!exemplo,!considere!o!seguinte!caso:!suponha!que,!no!instante!t!=!0,!um!elétron!em!
um!átomo!de!hidrogênio!se!encontre!no!estado:!
!
1
Ψ(r, t = 0) =
10
(
2ψ100 + ψ 210 + 2ψ 211 + 3ψ 21−1 ! ) (I14.7)!

!
Repare!que!essa!função!de!onda!está!corretamente!normalizada.!Repare!também!que,!se!
adotarmos! a! imagem! clássica! do! elétron! girando! em! torno! de! um! eixo,! essa! função!
descreveria!uma!partícula!que!gira!no!sentido!horário!(ml!=!+1)!e!antiohorário!(ml!=!o1)!ao!
mesmo!tempo!!
!
Calculemos!inicialmente!o!valor!esperado!da!energia!deste!estado:!
!
1
HΨ =
10
(
2H ψ100 + H ψ 210 + 2H ψ 211 + 3H ψ 21−1 ) (I14.8)!
!
1
HΨ =
10
(
2E1ψ100 + E2ψ 210 + 2E2ψ 211 + 3E2ψ 21−1 )
!
!",!!"
onde!!! = −13,6!!"!e!!! = − !
= −3,4!!".! O! valor! esperado! será,! portanto,! dado!

por:!
!

* 3 4E1 + E2 + 2E2 + 3E2 13, 6eV $ 4 6 ' (I14.9)!


∫ Ψ H Ψd r = 10
=− & + ) = −6,8eV
10 % 1 4 ( !
!
Isso!significa!que,!se!um!átomo!de!hidrogênio!for!preparado!muitas!vezes!no!estado!(I14.7),!
e!a!energia!do!elétron!medida!também!várias!vezes,!ao!se!calcular!a!energia!média!final,!o!
resultado!será!(I14.9).!
!
Outra!pergunta!interessante!que!podemos!fazer!é!sobre!a!evolução!temporal!do!sistema.!
Por! exemplo,! partindo! desse! estado! inicial,! qual! a! probabilidade! de! o! elétron! ser!
encontrado!no!estado!! = 1!!!! = ! +1!após!t!segundos?!
Sabemos!que!a!evolução!temporal!é!dada!por:!

! 63!
!"
Ψ ! = !"# −! Ψ 0

1
= 2! !!!! !/ℏ !!"" + ! !!!! !/ℏ !!"# + 2! !!!! !/ℏ !!"" + 3! !!!! !/ℏ !!"!! !
10
! (I14.10)!
!
A! probabilidade! que! se! quer! será! igual! ao! módulo! quadrado! do! produto! escalar! entre! o!
estado!acima!e!o!estado!!!"" :!
!
2
2 1 1 (I14.11)!
∫ψ *
n11 Ψ(t)d r =3
2e−iE2t/! = !
10 5

!
Note!que!essa!probabilidade!independe!de!t.!Agora,!vamos!calcular!a!probabilidade!de,!em!
t! =! 0,! o! elétron! ser! encontrado! a! uma! distância! do! núcleo! menor! do! que! o! raio! de! Bohr.!
Para!fazermos!o!cálculo,!precisamos!usar!as!funções!radiais!correspondentes!ao!estado!de!
momento!angular,!que!são!R10!e!R21!(lembreose!de!que!a!função!radial!não!depende!de!m),!
listadas!na!Tabela!1.!Logo:!
!
a0 2 2
2 4 R10 + 6 R21 2
p(r ≤ a0 ) = ∫ ψ (r, 0) 3
d r = 4π ∫ r dr ~ 3, 6 ×10 −6 ! (I14.12)!
0 10

!
onde!se!usou!o!valor!numérico!do!raio!de!Bohr!para!se!chegar!ao!resultado!final.!Por!fim,!
vamos!!calcular!os!valores!esperados!de!L2!e!Lz!em!t!=!0:!
!
1
L2 Ψ(r, 0) =
10
(
2L2ψ100 + L2ψ 210 + 2L2ψ 211 + 3L2ψ 21−1 )
!2
L2 Ψ(r, 0) =
10
(
2ψ 210 + 2 2ψ 211 + 2 3ψ 21−1 ! )
!2 6 (I14.13)!
L2 = ∫ Ψ * (r, 0)L2 Ψ(r, 0)d 3r = (2 + 4 + 6) = ! 2
10 5
!
O!cálculo!de! !! !é!semelhante!e!fornece! !! = −ℏ/10.!!
!

! 64!
A! solução! da! equação! de! Schroedinger! para! o! átomo! de! hidrogênio,! bem! como! a!
determinação!das!autoenergias,!foi!um!dos!grandes!triunfos!iniciais!da!mecânica!quântica,!
pois!permitiu!explicar!o!espectro!de!emissão!do!hidrogênio,!problema!conhecido!desde!o!
fim!do!século!19.!Da!expressão!para!a!energia!obtemos!para!o!comprimento!de!onda:!
!
13, 6eV hc
En = − 2
= !ω n = hfn =
n λn
1 13, 6eV 1 13, 6eV 1
=− 2
=− −15 10 −1 2
!
λn hc n 4,13×10 eV • s × 2, 99 ×10 cm • s n (I14.14)!
1 1
= −1,10 ×10 5 2 cm −1
λn n

!
Essa!expressão!representa!as!autoenergias!do!átomo!de!hidrogênio!numa!escala!do!inverso!
de! comprimento! de! onda,! uma! prática! comum! entre! os! espectroscopistas.! Os!
comprimentos! de! onda! das! radiações! emitidas! nas! séries! são! obtidos! fazendoose! as!
diferenças!entre!dois!níveis!n!e!n’!correspondentes!a!determinada!transição:!!
!
1 # 1 1&
= 1,10 ×10 5 % '2 − 2 ( cm −1 ! (I14.15)!
λ $n n '
!
O! fator! numérico! multiplicativo!(1,10!×!10! )!é! chamado! constante! de! Rydberg,% R.! Com!
essa!fórmula!calculamose!as!séries!de!Lyman,!Balmer,!Paschen,!Brackett!etc.!As!transições!
relativas!a!essas!séries!são!mostradas!na!Figura!I14.2!(acima).!!
!
O!conhecimento!do!espectro!de!emissão!não!só!do!hidrogênio,!mas!também!dos!elementos!
em! geral,! permite! o! estudo! da! composição! química! dos! materiais,! o! que! é! muito!
importante,! por! exemplo,! para! a! astronomia,! astrofísica! e! as! geociências.! A! Figura! I14.2!
(abaixo)!mostra!exemplos!de!espectros!de!emissão!de!diferentes!elementos.!!

! 65!
!
!

Hidrogênio

Hélio

Neônio

Sódio

Mercúrio

!
!
!

Figura!I14.2!–!Acima,!esquema!das!transições!do!átomo!de!hidrogênio!que!dão!origem!às!várias!
séries,!de!Lyman,!Balmer,!Paschen!e!Bracket.!!Abaixo,!linhas!de!transição!observadas!em!diversas!
substâncias.!O!conhecimento!dessas!linhas!é!muito!importante!para!a!identificação!de!elementos!
químicos!em,!por!exemplo,!!astrofísica.!!
!
! !

! 66!
Para! concluirmos! essa! discussão! sobre! momento! angular,! observamos! que,! de! maneira!
análoga! às! variáveis! de! momento! e! posição,! as! componentes! do! momento! angular!
satisfazem!as!seguintes!relações!de!comutação:!
!
!! , !! = !ℏ!! , !! , !! = !ℏ!! ,!!!!!! !! , !! = !ℏ!! !!! (I14.16)!
!
o!que!significa!que!não!podemos!conhecer!com!precisão!arbitrária!todas!as!componentes!
do!momento!angular,!simultaneamente.!!
!

I15.!Spin!
Anos! antes! da! publicação! da! equação! de! Schroedinger,! os! alemães! Otto! Stern! e! Walther!
Gerlach!estudavam!o!momento!magnético!de!átomos!neutros,!passando!um!feixe!atômico!
por!uma!região!contendo!um!gradiente!de!campo!magnético.!Até!aquele!ponto!imaginavao
se!que!o!momento!magnético!µ!de!um!átomo!tinha!origem!apenas!no!movimento!orbital!
do!elétron.!Na!presença!de!um!gradiente!de!campo!magnético,!por!exemplo,!na!direção!z,!
uma!força!magnética!
!
!"
F = ! −! !" !cos !!!! (I15.1)!

!
atuando!sobre!o!momento!magnético,!deslocaria!o!feixe!para!uma!direção!dependente!do!
valor!de! θ,!o!ângulo!entre!a!direção!do!momento!e!a!do!gradiente.!Por!exemplo,!se! θ!=!0!o!
feixe!se!deslocaria!para!a!direção!– !,!e!se!θ =!π,!se!deslocaria!para!direção!+!.!Em!um!feixe!
com!uma!distribuição!aleatória!nas!direções!dos!momentos!magnéticos,!seria!de!se!esperar!
uma!distribuição!contínua!entre!os!valores!extremos!0!e! π.!Além!disso,!para!átomos!com!
momento!orbital!nulo,!L!=!0,!não!se!esperaria!ver!qualquer!tipo!de!deslocamento!no!feixe.!!
!
Stern!e!Gerlach!utilizaram!átomos!neutros!de!prata,!com!L!=!0,!produzidos!termicamente!a!
1300! oC,! correspondendo! a! uma! velocidade! média! de! 500! m/s.! Após! passarem! por! uma!
fenda!de!colimação!de!0,1!mm,!o!feixe!entrava!em!uma!região!com!um!gradiente!de!campo!
magnético!de!1000!T/m,!tudo!em!vácuo!de!10o8!atm.!!
!

! 67!
O!experimento!foi!publicado!em!1922.!O!esquema!do!aparato!é!mostrado!na!parte!de!cima!
da!Figura!I14.3!e!o!resultado!original!da!medida!na!parte!de!baixo.!!
!

Figura!I14.3!–!Acima,!esquema!de!um!aparelho!de!SterncGerlach.!Um!feixe!de!átomos!neutros!é!
produzido!em!um!forno!e!colimado!para!a!região!entre!os!polos!de!um!ímã!com!gradiente!de!campo.!O!
feixe!é!defletido!para!uma!direção!ou!outra,!dependendo!da!orientação!do!spin.!Abaixo,!artigo!e!
resultados!originais!de!Stern!e!Gerlach.!Inicialmente!os!autores!atribuíram!a!abertura!do!feixe!em!
duas!partes!à!quantização!do!espaço!!
!
! !
A!figura!da!esquerda!é!a!que!surge!quando!o!gradiente!está!desligado.!E!a!da!direita!mostra!
o!efeito!do!gradiente.!Ou!seja,!em!vez!de!uma!distribuição!contínua,!o!que!se!viu!foi!uma!
distribuição!concentrada!em!apenas!duas!regiões.!Na!falta!de!uma!explicação!clássica!para!

! 68!
o!fenômeno,!os!autores!o!interpretaram!como!uma!quantização!do!espaço29.!De!fato,!nem!
com!a!descoberta!da!equação!de!Schroedinger,!em!1926,!foi!possível!explicar!os!resultados!
de! SternoGerlach.! Além! disso,! outros! experimentos! mostravam! desdobramentos! duplos!
(dubletos)!em!algumas!linhas!de!emissão!de!determinados!elementos,!nas!quais!só!deveria!
haver! uma,! e! ainda! os! valores! semiointeiros! para! o! momento! angular! de! alguns! átomos,!
quando! se! esperavam! apenas! valores! inteiros.! Todos! esses! fatos! puderam! ser!
compreendidos!com!a!introdução!de!uma!nova!quantidade,!o!spin.!!
!

!
!
Sem! momento! orbital,! não! deveria! existir! momento! magnético,! e,! portanto,! a! força!
magnética! sobre! os! átomos! no! experimento! de! SternoGerlach! deveria! ser! nula.! Os!
resultados!sugeriam,!consequentemente,!a!existência!de!algum!tipo!de!momento!de!dipolo!
associado! a! um! momento! angular! não! originado! do! movimento! orbital! dos! elétrons! nos!
átomos.!!
!
Em! 1924! –! e,! portanto! antes! da! equação! de! Schroedinger! –! Wolfgang! Pauli! propôs! a!
existência!de!um!momento!angular!intrínseco!das!partículas!atômicas.!A!ideia!foi!elaborada!
posteriormente! por! Ralph! Kronig,! George! Uhlenbeck! e! Samuel! Goudsmit,! que! deram! o!
nome! de! spin! para! a! nova! quantidade.! Posteriormente,! em! 1928,! com! o! surgimento! da!
mecânica! quântica! relativística% elaborada! por! Paul! Dirac,! a! existência! do! spin! foi!
corroborada!teoricamente.!!!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
29!A!tradução!do!título!do!artigo!é:!“Evidência(experimental(da(quantização(espacial(em(um(campo(
magnético”.!!

! 69!
O!spin!de!uma!partícula!é!representado!pela!letra!“S”,!e,!assim!como!o!momento!angular!
orbital,!tem!componentes!Sx,!Sy!e!Sz,!que!satisfazem!as!mesmas!regras!de!comutação!que!as!
componentes!do!momento!angular!orbital:!
!
!! , !! = !ℏ!! , !! , !! = !ℏ!! ,!!!!!! !! , !! = !ℏ!! !!! (I15.2)!
!
Representado!as!autofunções!de!spin!por!!!,!! ,!temos!as!seguintes!relações!para!S2!e!Sz:!!

S 2 χ S,ms = S(S +1)! 2 χ S,ms


Sz χ S,ms = !ms χ S,ms ! (I15.3)!
ms = −S,!, +S

!
O!spin!pode!ter!valores!inteiros!e!semiointeiros.!Por!exemplo,!o!spin!do!próton!é!S!=!1/2!,!
assim!como!o!do!elétron.!O!spin!do!núcleo!do!átomo!de!hélio!é!S!=!1.!!
!
A! existência! do! spin! e! de! um! momento! magnético! intrínseco! explicam! os! resultados! do!
experimento! de! SternoGerlach! para! átomos! com! L! =! 0.! ! Outro! efeito! importante,! o!
desdobramento!de!linhas!no!espectro!de!emissão!de!alguns!átomos,!também!é!explicado!
por! meio! da! chamada! interação! spin^órbita.! Uma! expressão! aproximada! para! esse! efeito!
pode! ser! obtida! com! um! argumento! clássico.! Considere! um! elétron! girando! em! torno! de!
um!núcleo!(um!próton),!a!uma!distância!r,!com!velocidade!v.!Do!referencial!do!elétron,!é!o!
núcleo! que! se! desloca! com! essa! velocidade! e,! segundo! a! Lei! de! BiotoSavat,! produz! um!
campo!magnético!igual!a:!
!
eµ 0 r × v eµ 0 r × m p v eµ 0 r × p eµ 0 L
B=− 3
=− 3
=− 3
=− (I15.4)!
4π r 4π m p r 4π m p r 4π m p r 3
!
!
onde! µ0! é! a! permeabilidade! magnética! do! vácuo! e! mp! a! massa! do! próton.! Segundo! o!
eletromagnetismo! clássico,! esse! campo! interage! com! o! momento! magnético! do! elétron,!
dado!por30!! = 2!! !,!sendo!a!energia!da!interação!igual!a:!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! (I15.5)!
30 !! = !ℏ !é! a! unidade! de! momento! magnético,! chamada! magneton! de! Bohr,! que! vale:! !! = 9,274×
! !! !
!

!!"
10 !!/!.!

! 70!
!
!!! !! !
! = −! ∙ ! = −2!! ! ∙ ! = !!!! !!
! ∙ !!

!
O!fator!multiplicativo!à!direita!é!uma!função!de!r!e,!em!geral,!se!escreve!a!interação!spino
órbita!como!! ! ! ∙ !.!Os!valores!numéricos!dessa!interação!resultam!em!uma!energia!da!
ordem!de!milésimos!de!eV,!o!que!é!observado!experimentalmente.!!A!interação!spinoórbita!
é! ainda! importante! para! a! definição! do! estado! fundamental! de! momento! angular! em!
átomos!com!muitos!elétrons,!o!qual!impacta!diretamente!nas!propriedades!magnéticas!dos!
materiais.!!
!
Vamos! agora! retornar! brevemente! ao! experimento! de! SternoGerlach.! Suponha! que,! no!
aparato!experimental,!átomos!neutros!com!spin!S!=!½ℏ!passem!por!um!campo!magnético!
homogêneo,!apontado!na!direção!+!,!antes!de!penetrarem!a!região!de!gradiente.!O!campo!
tende! a! polarizar! os! spins! na! sua! direção,! como! mostrado! esquematicamente! na! Figura!
I14.3.!!
!
!"
Se! o! gradiente! diminui! no! sentido! positivo! de! z,! ou! seja,! !" < 0,!a! força! sobre! os! spins!

alinhados!com!+z!será!positiva!e!sobre!os!spins!alinhados!com!–z!será!no!sentido!negativo!
do!eixo.!Se,!agora,!o!campo!B0!for!girado!de!90o,!para!polarizar!os!spins!ao!longo!da!direção!
+!x,!ao!entrarem!na!região!do!gradiente,!metade!seguirá!o!curso!+!z!e!metade!–!z.!!
!
Voltaremos!ao!problema!do!spin!com!mais!detalhe!na!segunda!parte!deste!texto.!Por!ora,!
vale! a! pena! enfatizar! que,! muitas! vezes,! o! momento! magnético! de! spin! é! comparado! ao!
momento! magnético! associado! ao! momento! angular! que! surge! do! movimento! de! uma!
partícula!carregada!em!torno!do!seu!próprio!eixo.!Esta!é!uma!visão!clássica!e,!como!tal,!é!
necessariamente!incompleta.!O!spin!é!uma!propriedade!intrínseca!das!partículas,!tal!como!
a! carga! e! a! massa,! e! não! depende! do! movimento.! O! nêutron,! por! exemplo,! não! possui!
carga,!mas!tem!spin!e!momento!magnético.!O!neutrino!não!possui!carga!e!nem!momento!
magnético,!mas!tem!spin,!para!citar!apenas!dois!exemplos.!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
!

! 71!
I16.!Sistemas!com!muitos!elétrons;!o!princípio!de!exclusão!de!Pauli!
A!introdução!do!spin!no!cenário!da!mecânica!quântica!ampliou!o!conceito!de!estado,!pois,!
agora,! além! dos! números! quânticos! ligados! aos! graus! de! liberdade! orbitais,! n,! l,! ml,!
precisamos! especificar! também! o! estado! de! spin.! A! função! de! onda! total! de! um! sistema!
deve! ser! escrita! como! um! produto! da! função! orbital! e! da! função! de! spin.! Em! 1924,! Pauli!
percebeu! que,! para! explicar! o! efeito! Zeeman31,! observado! no! espectro! de! emissão! de!
átomos,! cada! conjunto! de! números! quânticos,! incluindo! o! número! quântico! de! spin,! só!
poderia! acomodar! um! elétron.! No! ano! seguinte,! o! da! publicação! da! equação! de!
Schroedinger,!Pauli!propôs!o!seu!famoso!Princípio!de!Exclusão,!cuja!versão!simples!afirma!
que!dois!elétrons!não!podem!ter!o!mesmo!conjunto!de!números!quânticos.!Naturalmente,!
sendo!uma!regra!sobre!sistemas!com!pelo!menos!dois!elétrons,!ou!dois!férmions,!de!uma!
maneira!mais!geral,!esse!princípio!terá!importantes!consequências!para!as!propriedades!de!
qualquer!sistema!físico!que!contenha!elétrons,!ou!seja,!toda!a!matéria!!!
!
O! princípio! de! exclusão! cria! uma! correlação! entre! o! estado! de! spin! e! o! estado! orbital! de!
férmions,! mesmo! que! não! exista! qualquer! interação! entre! esses! graus! de! liberdade.! Ele!
impõe!sobre!a!função!de!onda!total!de!um!sistema!a!restrição!de!que!a!probabilidade!de!
encontrarmos!dois!férmions!no!mesmo!estado!quântico!seja!zero.!Essa!restrição!é!satisfeita!
se!exigirmos!que!a!função!de!onda!de!um!sistema!de!férmions!seja!antissimétrica.!De!fato,!
essa! é! uma! alternativa! para! o! enunciado! anterior! do! princípio! de! exclusão:! a! função! de!
onda! total! de! um! sistema! fermiônico! é! antissimétrica! em! relação! à! permutação! de!
partículas32.!!!
!
Para!exemplificar,!considere!dois!elétrons!e!dois!autoestados!orbitais!!! !e!!! ,!em!que!a!e!b!
representam! o! conjunto! de! números! quânticos! orbitais.! Se! as! coordenadas! dos! dois!
elétrons!forem!r1!e!r2,!podemos!construir!a!seguinte!função!antissimétrica:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
31!O!efeito!Zeeman!é!o!desdobramento!das!linhas!no!espectro!de!emissão!de!átomos!quando!um!campo!
magnético!é!aplicado.!O!efeito!é!explicado!pela!interação!entre!o!momento!magnético!de!spin!com!o!
campo!magnético.!!!
32!Uma!função!é!antissimétrica!se!trocar!de!sinal!sob!uma!permutação!das!coordenadas!de!duas!
partículas.!!

! 72!
1
ψ A (r1, r2 ) = {ϕ a (r1 )ϕ b (r2 ) − ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )} (I16.1)!
2 !
!
Note! que,! se! permutarmos! r1! por! r2,! essa! função! troca! de! sinal.! Além! disso,! se! fizermos!
! → !,! ou! seja,! aproximarmos! os! dois! estados! quânticos,!!! → 0.! Ou! seja,! essa! função!
satisfaz!o!princípio!de!exclusão!de!Pauli.!No!entanto,!falta!ainda!a!parte!do!spin.!Como!essa!
função!é!antissimétrica,!para!que!a!função!total!seja!também!antissimétrica,!a!parte!do!spin!
deve!ser!simétrica,!ou!seja,!não!pode!trocar!de!sinal!sob!uma!permuta!dos!estados!de!spin.!
Existem! três! possibilidades! para! funções! simétricas! de! dois! spins,! que! vamos! representar!
como:!!
!
mS =+1
χ S=1 = χ1↑2↑
mS =−1
χ S=1 = χ1↓2↓ ! (I16.2)!

mS =0 χ1↑2↓ χ1↓2↑ + χ1↓2↑ χ1↑2↓


χ S=1 =
2
!
Repare!que!nenhuma!dessas!funções!troca!de!sinal!sob!uma!permutação!dos!spins.!Em!uma!
visão!clássica,!elas!representam!os!três!autoestados!de!dois!spins!½!alinhados!e,!por!essa!
razão,!são!conhecidas!como!tripleto%de%spins.!O!produto!de!qualquer!uma!dessas!funções!
pelo!estado!orbital!antissimétrico!resulta!em!uma!função!total!antissimétrica.!
!
Por!outro!lado,!se!trocarmos!o!sinal!da!função!orbital,!ela!se!torna!uma!função!simétrica:!
1
ψ S (r1, r2 ) = {ϕ a (r1 )ϕ b (r2 ) + ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )} ! (I16.3)!
2
!
Repare!que,!agora,!a!função!não!troca!mais!de!sinal!sob!uma!permuta!das!coordenadas!e!
nem!tende!a!zero!quando!!! → !.!Para!formar!uma!função!total!antissimétrica,!precisamos!
de!uma!função!de!spins!antissimétrica.!Só!existe!uma!possibilidade:!

χ1↑2↓ χ1↓2↑ − χ1↓2↑ χ1↑2↓ !


mS =0
χ S=0 = (I16.4)!
2
!

! 73!
Note! que! essa! função! troca! de! sinal! se! permutarmos! os! dois! spins.! Ela! representa! (numa!
visão! clássica)! os! dois! spins! alinhados! antiparalelamente,! e! o! estado! é! conhecido! como!
singleto%de%spins.!O!produto!dessa!função!por!!! !forma!uma!função!total!antissimétrica!e,!
portanto,!satisfaz!o!princípio!de!exclusão!de!Pauli.!!
!
Para! dar! uma! ideia! do! impacto! do! princípio! de! exclusão! sobre! as! propriedades! físicas! de!
sistemas!com!férmions,!suponha!que!dois!elétrons!interajam!via!energia!coulombiana:!
!!
!= !
4!!! !
(I16.5)!
!
onde!r!é!a!distância!entre!eles.!Vamos!calcular!o!valor!esperado!desse!hamiltoniano.!Como!
a!interação!não!depende!do!estado!de!spin!dos!elétrons,!usamos!apenas!a!parte!espacial!da!
função!de!onda,!escrevendo!as!duas!opções!de!simetria!em!uma!única!expressão!como:!
!
1
ψ± (r1, r2 ) = {ϕ a (r1 )ϕ b (r2 ) ± ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )} ! (I16.6)!
2
Com!isso:!!
!
1
H = E = ∫ ψ±* H ψ± d 3r = ∫ [ϕ a* (r1 )ϕ b* (r2 ) ± ϕ a* (r2 )ϕ b* (r1 )]H[ϕ a (r1 )ϕ b (r2 ) ± ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )]d 3r
2 !
!
(I16.7)!
!
Temos,!então,!quatro!termos:!
!
1 1
H = ∫ [ϕ a* (r1 )ϕ b* (r2 )]H[ϕ a (r1 )ϕ b (r2 )]d 3r ± ∫ [ϕ a* (r2 )ϕ b* (r1 )]H[ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )]d 3r ±
2 2 !
(I16.8)!
1 * * 3 1 * * 3
± ∫ [ϕ a (r1 )ϕ b (r2 )]H[ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )]d r ± ∫ [ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )]H[ϕ a (r1 )ϕ b (r2 )]d r
2 2
!
Os!dois!primeiros!termos!representam!o!valor!esperado!para!a!energia!coulombiana!usual,!
se!a!função!de!onda!não!fosse!simetrizada.!Os!dois!últimos!termos!são!consequência!direta!
da!simetrização!imposta!pelo!princípio!de!exclusão.!Ele!envolve!a!superposição!dos!orbitais!
!! !e!!! !e! a! troca! de! elétrons! entre! esses! orbitais.! Não! existe! análogo! clássico! para! essa!

! 74!
forma!de!energia,!chamada!de!energia!de!troca.!Para!simplificar!a!discussão!–!e!sem!perda!
de!generalidade!–,!vamos!supor!que!o!primeiro!termo!seja!igual!ao!segundo,!e!o!terceiro!
igual!ao!quarto,!de!forma!que!podemos!escrever:!
!
e2 e2
H = ∫ [ϕ a* (r1 )ϕ b* (r2 )] [ϕ a (r1 )ϕ b (r2 )]d 3r ± ∫ [ϕ a* (r2 )ϕ b* (r1 )] [ϕ a (r2 )ϕ b (r1 )]d 3r
4πε r 4πε r
!#######"0 ####### $ !#######"0 ####### $
≡EC ≡J

H = EC ± J
!
(I16.9)!
!

!
Note! que! a! energia! de! troca,! J,! se! soma! ou! se! subtrai! ao! termo! coulombiano,! EC,!
dependendo! da! simetria! da! função! de! onda,! ou! seja,! se! ela! é! par! ou! ímpar.! Vemos,!
portanto,!que!o!estado!fundamental!do!sistema!depende!da!paridade!da!função!de!onda.!
Mas,!se!a!função!for!par,!isso!significa!que!a!função!de!spin!deve!necessariamente!ser!ímpar!
(singleto! de! spin),! por! causa! do! princípio! de! exclusão.! E,! se! ela! for! ímpar,! a! parte! de! spin!
deverá! ser! par! (tripleto! de! spin).! Ou! seja,! embora! o! hamiltoniano! não! tenha! interação!
dependente!dos!spins,!a!energia!total!do!sistema!e!seu!estado!fundamental!dependem!do!
estado!de!spin.!Esta!correlação!entre!variáveis!espaciais!com!de!spin!é!consequência!direta!
do!princípio!de!exclusão!e!é!a!base!para!a!compreensão!das!muitas!formas!de!acoplamento!
entre!spins!nos!materiais!magnéticos33.!!!
!

I17.!O!gás!ideal!de!elétrons!em!uma!caixa!
Vamos! agora! considerar! os! efeitos! do! princípio! de! exclusão! em! um! gás! ideal! quântico! de!
elétrons! a% T! =! 0.! Esse! problema! é! muito! importante,! pois! tem! aplicações! em! diferentes!
áreas,!como!em!matéria!condensada,!!astrofísica!e!física!nuclear.!Ao!final,!vamos!comparar!
os! resultados! com! aqueles! do! gás! ideal! clássico! e! ressaltar! as! diferenças! entre! os! dois!
sistemas.!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
33!Quem!percebeu!que!a!energia!de!troca!era!a!chave!para!a!explicação!da!ordem!magnética!nos!
materiais!foi!Werner!Heisenberg,!que,!em!1928,!escreveu!o!seu!famoso!hamiltoniano,!! = −2!!! ∙ !! ,!
onde!J!é!a!energia!de!troca.!Esse!hamiltoniano!é!a!base!para!a!descrição!do!fenômeno!do!magnetismo.!!

! 75!
Suponha!que!N!elétrons!que!não!interagem!entre!si!sejam!colocados!em!uma!caixa!cúbica!
de!aresta!L,!com!paredes!impenetráveis.!Tipicamente!estamos!considerando!!~10!" !"!! .!
Queremos! calcular! os! autoestados! do! sistema! e! a! energia! do! estado! fundamental.!
Comecemos! por! notar! que,! como! não! há! interação! entre! os! elétrons,! a! equação! de!
Schroedinger!estacionária!será!uma!soma!de!N!equações!independentes,!contendo!apenas!
o!termo!de!energia!cinética:!
!

! 2 # ∂2ψ ∂2ψ ∂2ψ & (I17.1)!


− % + + ( = Eψ
2m $ ∂x 2 ∂y 2 ∂z 2 '
!
!
que!podem!ser!resolvidas!individualmente.!Como!as!paredes!da!caixa!são!impenetráveis,!a!
função!de!onda!deve!se!anular!em!!, !, ! = 0!e!em!!, !, ! = !.!A!seguinte!função!satisfaz!a!
essas!condições!de!contorno:!
!
!! ! !! ! !! !
! !, !, ! = !"#$ ! !"# ! !"# ! !
! ! !
! (I17.2)!
!
onde!!! , !! , !! = 1,2,3, ⋯,!e!A!é!um!fator!de!normalização,!obtido!da!condição:!
!
2
∫ ψ (x, y, z) dxdydz = 1 (I17.3)!
V =L3 !
!
Note!que!a!função!(I17.2)!se!anula!em!qualquer!face!da!caixa.!Dessa!expressão,!vemos!que!
as!componentes!do!vetor!de!onda!são:!
!
!! ! !! ! !! ! (I17.4)!
!! = , !! = , !! = !!
! ! !
!
e,!consequentemente,!as!energias!serão:!
!
(I17.5)!
ℏ! ! ! ℎ!
!(!! , !! , !! ) = =! !! + !!! + !!! !
2! 8!!! !

! 76!
!
Note! que! a! energia! é! quantizada! e! que! a! menor! energia! possível! (quantum! de! energia)! é!
igual!a!3ℎ! /8!!! ,!relativa!ao!valor!mínimo!de!|k|!correspondente!a!!! = !! = !! = !/!.!!
Considerando! agora! os! N! elétrons,! os! estados! devem! ser! preenchidos! a! partir! da! energia!
mais! baixa! para! a! mais! alta,! obedecendo! o! princípio! de! exclusão.! Ou! seja,! cada! conjunto!
(!! , !! , !! )!!pode! acomodar! no! máximo! 2! elétrons,! um! com! spin! “up”! e! outro! com! spin!
“down”.! O! último! elétron! estará! no! estado! de! energia! mais! alta,! que! terá! um! valor! de!
momento!que!chamaremos!kF34.!!
!
Note!de!(I17.5)!que!podemos!ter!vários!estados!com!a!mesma!energia.!Por!exemplo,!os!três!
estados!! 2,1,1 , ! 1,2,1 !e!!(1,1,2)!são! iguais! a!3ℎ! /4!!! .! Esse! fenômeno! se! chama!
degenerescência.!!
!
A!energia!total!do!sistema!será!a!soma!para!todos!os!valores!de!!! , !! , !! .!Naturalmente,!
uma!soma!com!1023!termos!não!resulta!em!nada!muito!prático.!É!possível!contornar!essa!
dificuldade!com!uma!aproximação!que!transforma!a!soma!em!uma!integral,!fazendo!uma!
aproximação!válida!para!N!muito!grande,!como!é!o!presente!caso35:!
!
3
∫ f (k)d k
∑ f (k) →
π3 /V
(I17.6)!
k !
!
O!fator!que!aparece!no!denominador!é!o!volume!de!uma!célula!elementar!no!espaço!dos!
!
momentos:! !! ×!! ×!! = ! ! .! Fazendo! uma! integração! por! camadas! esféricas! no!
espaçook,!podemos!escrever:!
!
!!
! ℏ! 1 ! ℏ! ! ! (I17.7)!
!!"!#$ = 2× ! ! 4!! ! !" = ! − !!"# !
8! ! 2! !!"# 10 ! ! ! !

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
34!O!subindice!“F”!é!uma!homenagem!ao!físico!italiano!Enrico!Fermi.!!
35!Este!problema!é!idêntico!ao!cálculo!feito!anteriormente!(Sec.!I1)!para!o!gás!de!fótons!(radiação!do!
corpo!negro).!!

! 77!
!
onde! o! fator! “2”! multiplicativo! se! deve! ! às! duas! possibilidades! de! spins! por! estado.! Por!
outro!lado,!o!número!total!N!é!dado!por:!
!
!!
! ! ! ! (I17.8)!
! = 2× ! ! ! 4!! ! !" = ! − !!"#
8! !!"# !! !
!
!
Como!N!é!muito!grande,!podemos!considerar!!!"# ≪ !! !para!obter:!
!
(I17.9)!
!!"!#$ 1 ℏ! !!! 3
= ! = !! !
! ! 10! 5 !
!
onde!!! = ℏ! !!! /2!!é! chamada! energia! de! Fermi.! Esta! é! a! razão! do! subescrito! “F”.! O!
número! de! onda!!! !é! chamado! vetor! de! Fermi.! Para!!~10!" !"!! ,! a! energia! de! Fermi! é!
!! !~!5 − 10!!"36.!É!surpreendente!o!fato!de!que!a!energia!total!por%elétron!seja!3/5!desse!
valor!!Essa!expressão!para!a!energia!total!representa!o!estado!fundamental!do!gás!quântico!
ideal! de! elétrons,! chamado! gás! de! Fermi.! Lembreose! de! que! consideramos! a! temperatura!
do! gás! T% =! 0.! Se! compararmos! com! um! gás! clássico,! a! energia! interna! por! partícula! seria!
dada! pelo! princípio! da! equipartição,!! = 3!! !/2!e,! portanto,! igual! a! zero! para! T! =! 0.! Ou!
seja,! ao! contrário! do! gás! ideal! clássico,! o! gás! quântico! nunca! está! parado.! Essa! grande!
diferença!é!uma!consequência!direta!da!natureza!quântica!da!matéria!fermiônica,!que!deve!
satisfazer!o!princípio!de!exclusão!de!Pauli.!!
!
!

I18.! Segunda! quantização:! o! oscilador! harmônico! simples! e!


operadores!de!criação!e!aniquilação!
!!
O!procedimento!de!substituição!de!variáveis!dinâmicas!clássicas!em!um!hamiltoniano!pelos!
operadores!quânticos!equivalentes,!como!por!exemplo!! → −!ℏ∇,!é!chamado!de!primeira!
quantização! ou,! simplesmente,! quantização.! Em! um! problema! clássico,! dado! um!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
36!Para!fins!de!comparação,!a!energia!correspondente!à!temperatura!ambiente!é!de!apenas!0,03!eV,!e!a!
energia!correspondente!à!temperature!de!fusão!do!ferro!metálico!(1811!K)!é!de!0,15!eV.!

! 78!
hamiltoniano,!temos!que!resolver!as!equações!de!movimento!para!encontrarmos!a!posição!
e!o!momento!do!sistema!em!função!do!tempo.!Para!um!oscilador!harmônico!simples!em!
uma! dimensão,! por! exemplo,! o! problema! clássico! é! resolvido! encontrandoose! as! funções!
temporais! !(!) !e! !(!) ,! soluções! das! equações! de! movimento,! obtidas! a! partir! do!
hamiltoniano:!
!
!! !!! ! (I18.1)!
! =! +! ! !
2! 2
!

onde!! = ! !/!,! o! problema! quântico! consiste! em! fazermos! a! primeira! quantização!


substituindo!esse!hamiltoniano!por:!
!
ℏ! ! ! !!! ! (I18.2)!
! = ! −! + ! !
2! !" ! 2
!
e!resolvermos!a!equação!de!Schroedinger!para!encontrarmos!os!autoestados!do!sistema.!
!
O!hamiltoniano!(I18.2),!junto!com!a!relação!de!nãoocomutatividade! !, ! = !ℏ,!permite!reo
escrevermos! o! problema! do! oscilador! harmônico! em! função! de! novos! operadores,!
chamados!operadores!de!criação!e!de!aniquilação.!!Introduzidos!no!contexto!do!oscilador!
simples,! estes! operadores! são! muito! úteis! para! a! descrição! de! sistemas! com! muitas!
partículas,! procedimento! conhecido! como! segunda! quantização,! como! veremos! mais!
adiante!neste!texto.!Muito!mais!do!que!apenas!!!!!uma!forma!alternativa!de!notação,!a!ideia!
da!segunda!quantização!leva!a!novas!noções!como!a!de!quasipartículas!e!é!uma!ferramenta!
poderosa!para!solução!de!problemas!complexos.!!
!
Usando!o!oscilador!harmônico!em!1D!como!exemplo,!comecemos!por!definir!uma!variável!
adimensional:!
!
!" (I18.3)!
!! ≡ ! !!!

!
Em!termos!dessa!nova!variável,!o!hamiltoniano!se!torna:!

! 79!
!

!ω " d 2 2
%
H= $− 2 + ξ ' (I18.4)!
2 # dξ & !
!
No!entanto,!da!relação!de!comutação!podemos!escrever:!
!
d d d d
[ x, p] = i! ⇒ x − x =1⇒ ξ −ξ =1 (I18.5)!
dx dx dξ dξ !
!
Usando!essa!propriedade!no!hamiltoniano,!chegaose!à!seguinte!equação!de!Schroedinger:!
!

!ω " d %" d % " !ω %


$ − + ξ ' $ + ξ 'ψ = $ E − 'ψ (I18.6)!
2 # dξ &# dξ & # 2 & !

!
Vamos!definir!agora!os!seguintes!operadores:!
!
1 # d &
a+ ≡ %− + ξ (
2 $ dξ '
1 # d & (I18.7)!
a≡ % +ξ (
2 $ dξ ' !

!
Note! que! esses! operadores! satisfazem! à! seguinte! regra! de! comutação:! !, !! = 1.! Em!
termos! dos! novos! operadores,! a! equação! de! Schroedinger! para! o! oscilador! harmônico!
simples!se!torna:!
!
!ω a + aψ = E 'ψ ! (I18.8)!
!
onde! ! = ! − !ℏ!/2 .! Até! aqui,! essa! equação! nada! mais! é! do! que! a! equação! de!
Schroedinger!original!escrita!de!uma!outra!forma.!!
!
Vamos! agora! estudar! propriedades! dos! novos! operadores.! Primeiro,! apliquemos! o!
operador!a!à!esquerda!na!equação!de!Schroedinger:!

! 80!
!
ℏ!" !! ! ! = !′!"! (I18.9)!
!
Agora,!usando!a!relação!de!comutação,!podemos!substituir!os!dois!operadores!da!esquerda!
para!obter:!
! (I18.10)!
ℏ! 1 + ! !! ! !" = !′!!
Ou!seja:!
ℏ! !" + ℏ!!! ! !" = ! ! !" !
ℏ!!! ! !" = ! !′ − ℏ! !" ! (I18.11)!

!
Esta! última! equação! nos! diz! que,! se! ψ! é! autofunção! do! hamiltoniano! original,! com!
autoenergia!E’,!então!aψ!também!é!autofunção!do!mesmo!Hamiltoniano!com!autoenergia!
!′ − ℏ!.!Em!outras!palavras,!a!aplicação!do!operador!a!produz!um!novo!autoestado!cuja!
autoenergia!é!igual!à!anterior!subtraída!de!um!quantum!ℏ!.!Se!repetirmos!o!procedimento!
n! vezes,! ao! final,! teremos! um! autoestado! !!! !!com! autoenergia!!′ − !ℏ!.! Porém,! esse!
procedimento! não! pode! ser! aplicado! indefinidamente,! pois! o! oscilador! harmônico! (como!
qualquer! outro! sistema! físico)! deve! ter! uma! energia! mínima,! ou! seja,! um! estado!
fundamental 37 .! Chamando! de!!! !a! autofunção! do! estado! fundamental,! a! aplicação! do!
operador! a! nesse! estado! deve! resultar! necessariamente! na! condição!!!! = 0.! Na! forma!
diferencial,!essa!condição!se!torna:!
!
dψ 0
+ ξψ 0 = 0 (I18.12)!
dξ !
!
Essa!equação!pode!ser!facilmente!resolvida!para!encontrarmos:!
!
! /!
!! ! = !! !! ! (I18.13)!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
37!De!fato,!todo!sistema!físico!real!deve!necessariamente!ter!um!estado!fundamental.!Devecse!ainda!notar!
que!como!o!hamiltoniano!é!positivo,!os!seus!autovalores!devem!ser!não!negativos.!!

! 81!
onde! A! é! um! fator! de! normalização.! Em! termos! da! variável! x,! já! com! o! fator! de!
normalização,! deduzose! que! a! função! de! onda! do! estado! fundamental! do! oscilador!
harmônico!é:!
1/4
! mω $ ! mω 2 $
ψ 0 (x) = # & exp # − x &! (I18.14)!
" π! % " 2! %
!
0.8
0.7
0.6
0.5
ψ0(x)

0.4
0.3
0.2
0.1
0
-5 -3 -1 1 3 5
x !
Figura!I18.1!–!No!estado!fundamental!do!oscilador!harmônico,!a!maior!probabilidade!de!a!massa!ser!
encontrada!ocorre!em!x!=!0,!onde!a!energia!cinética!é!máxima.!Isto!contraria!a!intuição!clássica,!pois,!
nessa!posição,!a!velocidade!é!mais!alta!e!o!tempo!de!permanência!é!mínimo!
!
!
!
Essa!função!é!mostrada!na!Figura!I18.1.!Vamos!agora!fazer!um!procedimento!análogo,!mas,!
dessa!vez,!aplicando!o!operador!a+!à!direita!da!equação!de!Schroedinger:!
!

!ω (a + a)a +ψ = E 'a +ψ
!ω (aa + −1)a +ψ = E 'a +ψ (I18.15)!
!ω aa + ( a +ψ ) = (E '+ !ω ) ( a +ψ )
!
!
Ou!seja,!vemos!que!!! !!é!autofunção!do!mesmo!hamiltoniano,!com!energia!!′ + !ℏ!.!Se!o!
procedimento! for! repetido! n! vezes,! obteremos! autofunções! !! ! !!com! autoenergias!
correspondentes!!′ + !!ℏ!.!Ao!contrário!do!que!acontece!com!a!aplicação!de!a,!o!espectro!
de! energia! do! oscilador! harmônico! não! tem! um! valor! superior! máximo! e! pode! aumentar!
indefinidamente.!Ou!seja,!! = 0, 1, 2, 3, ⋯.!!
!
É!nesse!ponto!que!surge!uma!interpretação!realmente!poderosa!do!formalismo!de!segunda!
quantização.! A! cada! vez! que!!! !é! aplicado,! um! quantum! de! energia,!ℏ!,! é! criado! no!

! 82!
sistema.! Por! um! lado,! podemos! pensar! nisso! apenas! como! uma! mudança! no! nível! de!
energia! do! oscilador.! Mas,! na! linguagem! de! segunda! quantização,! alternativamente,!
podemos! abandonar! a! ideia! de! um! objeto! oscilando! preso! a! uma! mola! e! pensarmos! no!
sistema! como! se! fossem!!!partículas,! todas! com! a! mesma! energia! !ℏ!,! sobre! o! qual! a!
atuação!do!operador!!! !cria!um!quantum!de!energia,!e!a!do!operador!a!destrói!ou!aniquila,!
um! quantum! de! energia.! Por! essa! razão,! os! operadores! a+! e! a! são! chamados,!
respectivamente,! operadores! de! criação! e! aniquilação.! Usando! a! forma! diferencial! do!
operador!de!criação,!podemos!obter!qualquer!autoestado!a!partir!da!aplicação!sucessiva!de!
a+!ao!estado!fundamental:!
!
n
+ n 1 " d %
(I18.16)!
ψn = ( a ) ψ 0 = n/2 $ − + ξ ' ψ 0 !
2 # dξ &
!
A!Figura!I18.2!mostra!algumas!das!autofunções!do!oscilador!harmônico.!!

Figura!I18.2!–!Autofunções!correspondentes!aos!quatro!primeiros!estados!excitados!do!oscilador!
harmônico.!Note!como!os!valores!máximos!de!probabilidade!(módulo!quadrado!das!autofunções)!se!
deslocam!ao!longo!do!eixo!x!!
!
!
!

! 83!
É! interessante! notarmos! ! aspectos! não! intuitivos! revelados! nessas! figuras.! Primeiro,!
notamos! que! o! estado! fundamental! (Figura! I18.1)! tem! o! máximo! de! probabilidade! de!
encontrar! o! oscilador! em! x! =! 0.! Porém,! essa! é! a! posição! na! qual! a! energia! cinética! do!
oscilador!é!máxima,!e!a!sua!energia!potencial!é!zero.!Portanto,!a!intuição!clássica!nos!diz!
que!essa!deveria!ser!a!posição!de!menor!probabilidade!para!se!encontrar!o!oscilador,!já!que!
ele! passa! por! esse! ponto! com! velocidade! máxima.! A! partir! daí,! na! medida! em! que! n!
aumenta,! as! distribuições! de! probabilidade! começam! a! oscilar! e! preencher! o! eixo! x! com!
vários! máximos.! Para! n% muito! grande,! ocorre! o! que! se! espera! no! limite! clássico,! como!
mostrado! na! Figura! I18.3.! Para! fins! de! comparação,! vamos! calcular! a! distribuição! de!
probabilidades! do! oscilador! clássico.! Se!!(!)!é! a! velocidade! do! oscilador! em! uma! posição!
qualquer!do!eixo!x,!o!tempo!gasto!para!atravessar!a!distância!!"!será!!" = !"/!(!).!Logo,!
se! o! período! do! movimento! é!!,! a! probabilidade! de! o! oscilador! ser! encontrado! entre!
!!e!! + !"!é:!
!
!" 2!"
! ! !" = = !
!/2 !"(!)
!
Usando!a!expressão!para!a!energia!total!do!oscilador:!
!
!!(!)! !! !
!= + !
2 2
!
obtemos:!
2 ! 1
! ! = !
! 2! − !! !
!
Note!que,!quando!a!energia!potencial!se!aproxima!da!energia!total,!essa!expressão!diverge.!
Esses! limites! são! mostrados! como! as! duas! linhas! verticais! na! Figura! I18.3.! Repare! que! a!
função!de!onda!se!prolonga!para!além!desses!limites!clássicos,!fenômeno!conhecido!como!
tunelamento.!!
!
!

! 84!
0.3
0.25

0.2

ψ102(x)
0.15

0.1

0.05

-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8
x !
Figura!I18.3!–!Na!medida!em!que!o!número!quântico!n!aumenta,!!a!distribuição!de!probabilidades!do!
oscilador!harmônico!quântico!se!aproxima!daquela!do!oscilador!clássico.!A!a!amplitude!máxima!de!
oscilação!do!clássico!é!mostrada!nas!duas!linhas!verticais.!Repare!que!a!função!de!onda!quântica!
ultrapassa!esses!limites;!esse!é!o!fenômeno!de!tunelamento.!
!
! !
Finalmente,!notamos!que!as!autoenergias!serão!dadas!por:!
!
En' = n!ω
!ω (I18.17)!
En − = n!ω !
2
" 1%
En = $ n + ' !ω
# 2&
!
A! energia! do! estado! fundamental! corresponde! a! n! =! 0:!!! = ℏ!/2.! Portanto,! o! oscilador!
quântico,! ao! contrário! do! clássico,! nunca! está! parado.! Como! um! exemplo! de! aplicação,!
vamos! calcular! a! probabilidade! de! o! oscilador,! estando! no! estado! fundamental,! ser!
encontrado!com!energia!total!menor!do!que!a!energia!potencial,!fenômeno!classicamente!
impossível.!!Considerando!a!função!de!onda!do!estado!fundamental:!
1/4
! mω $ ! mω 2 $
ψ 0 (x) = # & exp # − x &! (I18.18)!
" π! % " 2! %
!
queremos!calcular!a!probabilidade!de:!

! 85!
mω 2 2 !ω
x >
2 2
!
⇒ x2 >

!
⇒ x>+ !

ou
!
x<−

Logo:!
− !/mω 2 +∞ 2
p= ∫ −∞
ψ 0 (x) dx + ∫ + !/mω
ψ 0 (x) dx
!
p ~ 16%
!
!

I19.!O!efeito!AharonovdBohm!
Fenômenos! quânticos! interessantes! também! aparecem! quando! consideramos! o!
movimento! de! partículas! carregadas! se! movendo! em! campos! elétricos! e! magnéticos.!
Classicamente,! uma! partícula! com! carga! q! e! massa! m,! sujeita! a! campos! elétrico! E! e!
magnético!B,!fica!sujeita!à!força!de!Lorentz:!
!
d 2r
F=m = qE + qv × B
dt 2 ! (I19.1)!

!
Os!campos!E!e!B!são!determinados!por!quantidades!auxiliares!chamadas!potencial!escalar,!
V,!e!potencial!vetor,!A:!
!
1 ∂A
E=− − ∇V
c ∂t
(I19.2)!
B = ∇×A !
!
No!entanto,!existem!infinitas!formas!de!V!e!A!que!definem!os!mesmos!campos!E!e!B.!De!
fato,!para!qualquer!função!escalar!Λ,!as!transformações!abaixo:!
!

! 86!
1 ∂Λ
V →V −
c ∂t (I19.3)!
A → A + ∇Λ !
!
levam! aos! mesmos! campos! E! e! B.! Tais! transformações! são! chamadas! transformações! de!
calibre!e,!como!a!dinâmica!clássica!é!governada!pelos!campos!E!e!B,!os!potenciais!V!e!A!são!
considerados!apenas!quantidades!matemáticas!auxiliares.!!
!
No!entanto,!a!dinâmica!quântica!de!uma!partícula!sujeita!a!campos!elétrico!e!magnético!é!
governada!pelo!hamiltoniano38:!
!
2
1 " q %
H= $ p − A ' + qV
2m # c & (I19.4)!
!
!
Ou! seja,! os! potenciais! A! e! V! aparecem! explicitamente! no! hamiltoniano! e,! obviamente,!
definirão!o!comportamento!da!função!de!onda:!
!

∂ * 1 $ q '
2 -
i! Ψ(r, t) = , & p − A ) + qV / Ψ(r, t) (I19.5)!
∂t ,+ 2m % c ( /.
!
!
Cabe!agora!perguntarmos!o!que!ocorre!com!a!função!de!onda!sob!uma!transformação!de!
calibre,!ou!seja:!

∂ , 1 & q q )
2
1 ∂Λ /
i! Ψ '(r, t) = . ( p − A − ∇Λ + + qV − 1 Ψ '(r, t)
∂t .- 2m ' c c * c ∂t 10 (I19.6)!
!
!
A! função! Ψ’,! necessariamente,! deve! descrever! exatamente! a! mesma! distribuição! de!
probabilidades!que!a!função!Ψ.!Portanto,!elas!só!podem!diferir!uma!da!outra!por!um!fator!
de!fase!global.!Por!substituição!direta,!podeose!ver!que!a!relação!entre!as!duas!funções!é:!
!
!"!
Ψ′ !, ! = ! ℏ! Ψ(!, !)! (I19.7)!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
38!De!fato,!na!formulação!hamiltoniana!clássica,!as!equações!de!movimento!são!obtidas!desse!mesmo!
hamiltoniano.!!

! 87!
!
Ou!seja,!o!efeito!de!uma!mudança!de!calibre!nos!potenciais!V!e!A!resulta!em!uma!mudança!
de! fase! na! função! de! onda.! Baseado! nessa! observação,! em! 1959,! Yakir! Aharonov! e! David!
Bohm! perceberam! que! o! comportamento! de! partículas! carregadas! poderia! ser! alterado,!
mesmo!em!regiões!onde!os!campos!E!e!B!são!nulos!!Esse!fenômeno!ficou!conhecido!como!
efeito%Aharonov^Bohm.!
!

!
Figura!I19.1!–!Primeira!página!do!artigo!de!Aharonov!e!Bohm!em!um!Physical!Review!de!1959,!sobre!
o!efeito!que!leva!o!nome!dos!dois!autores.!
!
! !

O!efeito!AharonovoBohm!pode!ser!visto!por!meio!do!seguinte!experimento:!um!capacitor!
de! placas! paralelas! é! posicionado! entre! as! fendas! de! um! anteparo! com! fenda! dupla.! Um!
elétron! que! incide! sobre! as! fendas! terá! a! sua! função! de! onda! desdobrada! entre! as! duas!
entradas.!Suponha!que!a!placa!da!esquerda!seja!mantida!em!um!potencial!nulo,!enquanto!a!
da!direita!em!um!potencial!dependente!do!tempo,!V(t).!O!campo!elétrico!está!confinado!na!
região!entre!as!placas!(Figura!I19.2).!!
!

! 88!
fendas
elétron incidente

capacitores
!

Figura!I19.2!–!Esquema!experimental!para!a!observação!do!efeito!AharonovcBohm.!Elétrons!incidem!
sobre!um!anteparo!contendo!uma!dupla!fenda.!Na!parte!de!trás,!existem!placas!de!capacitores!entre!
as!duas!fendas!que!implementam!uma!fase!relativa!nas!funções!de!onda!que!emergem!de!cada!lado.!!
Essa!fase!depende!do!calibre!escolhido!para!o!potencial!elétrico!!
!
! !
A! liberdade! de! escolha! do! calibre! permite! que! o! potencial! seja! zero! no! lado! esquerdo! e!
diferente! de! zero! do! lado! direito.! Consequentemente,! a! função! de! onda! da! esquerda!
satisfaz!à!equação!de!uma!partícula!livre:!
!
∂ !2 2
i! ΨE = − ∇ ΨE
∂t 2m ! (I19.8)!
!
mas!a!da!direita!satisfaz!a!de!uma!partícula!sujeita!a!um!potencial!elétrico:!
!
∂ !2 2
i! ΨD = − ∇ Ψ D + eV (t)Ψ D (I19.9)!
∂t 2m !
!
Chamemos!de!Ψ!! !a!função!de!onda!da!fenda!da!direita!na!ausência!do!capacitor.!A!relação!
entre!essa!função!e!ΨD!solução!da!equação!acima,!segundo!(I19.7)!é:!
!
Ψ D = eieΛ/!c Ψ 0D ! (I19.10)!
!
Portanto,!após!passar!pelas!duas!fendas,!a!função!de!onda!total!será!uma!superposição!das!
duas!funções!de!onda:!
!
Ψ E + eieΛ/!c Ψ 0D (I19.11)!
Ψ total =
2 !

! 89!
!
Essa! fase! relativa! entre! as! duas! funções! induz! um! padrão! de! interferência! entre! as! duas!
ondas.!Portanto,!a!distribuição!de!probabilidades!depende!da!escolha!do!calibre!!Esse!é!o!
efeito! AharonovoBohm.! Um! argumento! semelhante! pode! ser! construído! para! o! potencial!
vetor!A!e!partículas!em!campos!magnéticos.!!
!
Apesar! da! simplicidade! da! descrição! teórica! do! efeito! AharonovoBohm,! a! sua! existência! é!
ainda! controversa! e! não! demonstrada,! devido! às! dificuldades! de! se! fazer! uma! verificação!
experimental!rigorosa.!A!maior!dificuldade!consiste!exatamente!em!garantir!que!o!elétron!
estará!sujeito!ao!potencial!V!ou!A;!porém,!completamente!isolado!dos!campos!E!ou!B.!Em!
todas!as!tentativas!até!o!momento,!os!resultados!foram!inconclusivos.!!
!

I20.!Métodos!perturbativos!
Em!várias!situações,!mesmo!que!o!hamiltoniano!do!sistema!seja!conhecido,!não!é!possível!
resolver! a! equação! de! Schroedinger! para! determinar! exatamente! os! autovalores! e!
autoenergias.! Dependendo! da! situação,! é! possível,! ainda! assim,! obter! informações!
importantes! sobre! o! sistema,! aplicandoose! métodos! aproximativos.! Os! mais! importantes!
são!as!teorias!de!perturbações!estacionárias!e!dependentes!do!tempo39.!!
!
Suponha! que! os! autoestados! de! um! hamiltoniano! não! perturbado!!! ,! {!!! , !!! },! sejam!
soluções!conhecidas!da!equação!de!Schroedinger,!como!os!autoestados!de!um!elétron!em!
um!átomo!de!hidrogênio!ou!um!oscilador!harmônico:!
!
!! !!! = !!! !!! ! (I20.1)!
!
A! esse! hamiltoniano,! acrescentaose! uma! perturbação! V,! tal! que! os! autoestados! sejam!
modificados!para! !! , !! ,!resultando!em!uma!nova!equação!de!Schroedinger:!
!
!! + ! !! = !! !! ! (I20.2)!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
39!Existem!ainda!os!chamados!métodos!semiclássicos!de!aproximação,!mas!não!vamos!tratar!deles!neste!

texto.!!

! 90!
!
A!condição!para!que!V!seja!considerada!uma!perturbação!é!! ! ! ≪ ! !! .!Se!essa!condição!
for!satisfeita,!as!novas!funções!de!onda!podem!ser!corrigidas!a!partir!do!conhecimento!das!
autofunções!e!autoenergias!não!perturbadas,!segundo!(ver!Referências!bibliografias):!
!
Vnk
ψ n = ψ n0 + ∑ 00
ψ k0 ! (I20.3)!
k≠n E − Ekn

onde:!

!!" = !!!∗ !!!! ! ! !!

!
são!os!elementos!de!matriz!da!perturbação!calculados!com!os!estados!não!perturbados.!As!
autoenergias!corrigidas!até!segunda!ordem!são!dadas!por:!
!
2
V
En = E + ∫ ψ V ψ d r + ∑ 0 nk 0
0
n
0*
n
0
n
3
(I20.4)!
k≠n En − Ek !

!
Repare!que!a!correção!de!primeira!ordem!(segundo!termo!do!lado!direito)!é!simplesmente!
o!valor!esperado!da!perturbação!calculado!com!a!autofunção!não!perturbada.!Repare!ainda!
que!cada!estado!deve!ser!corrigido!individualmente.!Vamos!ver!um!exemplo!de!aplicação!
dessas!fórmulas.!!
!
Considere! um! oscilador! harmônico! cuja! energia! cinética! não! relativística! é!! = ! !! /2!.!
Porém,!se!a!velocidade!aumentar!o!suficiente,!essa!expressão!deve!ser!substituída!pela!sua!
contrapartida!relativística:!
!

T = p 2 c 2 + m 2 c 4 − mc 2 (I20.5)!
!
!
O!termo!sob!a!raiz!é!a!energia!total!relativística,!e!o!último!termo!do!lado!direito!a!chamada!
energia! de! repouso.! A! diferença! entre! as! duas! é! a! energia! cinética.! Considerando! que!
!! ! ! ≫ !!!! ,!podemos!escrever:!!
!

! 91!
" p2 %
T = c p 2 + m 2 c 2 − mc 2 = c $ 2 2 +1' m 2 c 2 − mc 2
#m c &
(I20.6)!
" p2
2 p4 %
T = mc $1+ 2 2
− 4 4'
− mc 2
# 2m c 8m c & !
!
onde!a!expansão!foi!feita!até!segunda!ordem40.!Portanto,!ficamos!com!a!energia!cinética:!
p2 p4
T≈ − 3 2 (I20.9)!
2m 8m c !
!
O! segundo! termo! é! a! perturbação! sobre! a! energia!!! /2!,! não! relativística41.! Com! esse!
termo,! podemos! calcular! a! correção! de! primeira! ordem! sobre! a! energia! do! estado!
fundamental!do!oscilador!harmônico:!
!

p4 +∞
*
% p4 (
ΔE = −
8m 3c 2
= ∫ 0 '& 8m3c 2 *)ψ0 dx
ψ −
−∞
1/2
% mω ( −mω x 2 /2! %
+∞
1 ∂4 ( −mω x 2 /2! (I20.8)!
ΔE = ∫ ' * e ' − 4*
e dx
−∞ π !
3 2
& ) & 8m c ∂x )
15 ! 2ω 2
ΔE = −
32 mc 2 !
!
Portanto,! a! energia! do! estado! fundamental! do! oscilador! harmônico,! com! correção!
relativística!de!primeira!ordem,!é:!
!
2
!ω 15 ( !ω )
E0 = − (I20.9)!
2 32 mc 2 !
!
A! correção! na! função! de! onda! e,! consequentemente,! na! distribuição! de! probabilidades!
pode!ser!facilmente!calculada!seguindo!os!mesmos!passos.!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
40! 1 + ! ! ≈ 1 + !" + ! ! − 1 ! ! /2!!
41!Note!que!essa!correção!é!genérica!e!serve!para!qualquer!sistema!–!!e!não!apenas!para!o!oscilador!

harmônico.!

! 92!
No!caso!de!perturbações!dependentes!do!tempo,!a!abordagem!é!diferente,!pois!esse!tipo!
de! perturbação! induz! transições! entre! os! níveis! de! energia.! Segundo! a! teoria! de!
perturbações!dependentes!do!tempo,!se,!em!t%=!0,!o!sistema!se!encontra!em!um!estado!ψn!
e! sobre! ele! é! aplicada! uma! perturbação! V(t),! a! probabilidade! de! ele! ser! encontrado!
posteriormente!em!um!estado!ψm!é!dada!por:!
!
4π 2 2
Pmn = Vmn (ω mn ) !
! 2 (I20.10)!

onde:!
1 +∞
Vmn (ω mn ) = ∫ Vmn (t)eiωmnt dt
2π −∞
!
!
Ou!seja,!a!probabilidade!de!transição!é!dada!pela!transformada!de!Fourier!do!elemento!de!
matriz!da!perturbação!entre!os!autoestados!em!questão.!Nessa!expressão:!
Em − En
ω mn = ! (I20.11)!
!
No! caso! de! uma! perturbação! monocromática,! ou! seja,! com! um! único!
componente!de!frequência:!
!
! ! = ! !! ! !"# ! (I20.12)!
!
obtémose!uma!expressão!analítica:!
!
2π 2
Pmn = V0 δ ( Em − En − !ω )
! ! (I20.13)!
!
A!função!delta!aparece!para!garantir!que!a!energia!total!deva!ser!conservada!no!processo.!!
!
Como! exemplo! de! aplicação! desse! formalismo,! considere! um! oscilador! harmônico!
unidimensional!com!carga!– !!que,!incialmente!no!estado!fundamental,!sofra!a!ação!de!um!
potencial!elétrico!dependente!do!tempo,!resultando!em!uma!interação!dada!por42:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
42!Repare!que!o!campo!elétrico!é!homogêneo;!porém,!dependente!do!tempo.!

! 93!
!
(I20.14)!
2
/τ 2
V (x, t) = −eExe−t !
!
Vamos!calcular!a!probabilidade!de!o!oscilador!ser!encontrado!no!primeiro!estado!excitado!
após!certo!intervalo!de!tempo.!Primeiro,!precisamos!calcular!o!elemento!de!matriz!!!" :!
+∞
−t 2 /τ 2
V01 (t) = −eEe ∫ ψ xψ*
1 0 dx ! (I20.15)!
−∞

Substituindo!as!funções:!
1/4
! mω $ −mω x 2 /2!
ψ 0 (x) = # & e
" π! %
!
! mω $
1/4
2mω −mω x 2
/2!
(I20.16)!
ψ1 (x) = # & xe
" π! % !
Encontraose:!
2
/τ 2 ! (I20.17)!
V01 (t) = −eEe−t !
2mω
Com!isso!podemos!calcular!a!transformada!de!Fourier43:!
!

1 +∞
iω t eE ! +∞ −t 2 /τ 2 iωt eE π ! −ω 2τ 2 /4
V01 (ω ) =

∫V 01 (t)e dt = −


2mω −∞
e × e dt = −
2π 2mω
τe
−∞ !
(I20.18)!
!
!
Finalmente!podemos!calcular!a!probabilidade!de!transição:!
!
4π 2 e 2 E 2 ! 2 2 2 π 2 2
P0→1 = πτ 2 e−ω τ /2 = ( eEτ ) e−ω τ /2 (I20.19)!
! 4π 2mω
2 2
2m!ω !
!
Note!que!a!probabilidade!de!transição!máxima!ocorre!em!!~1/!.!
!
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
43!Notar!que!o!oscilador!simples!só!tem!uma!única!frequência,!! = ! !/!.!

! 94!
I21.! As! conferências! de! Solvay,! o! paradoxo! EPR,! localidade,!
realismo!e!o!teorema!de!Bell!
!
A!efervescência!que!ocorreu!no!ambiente!científico!europeu!em!torno!da!então!nascente!
mecânica!quântica!impressionou!o!empresário!e!químico!belga!Ernest!Solvay!(1838!–!1922).!
Milionário,!ele!decidiu!patrocinar!uma!série!de!conferências!que!entraram!para!a!história!
como!as!Conferências!de!Solvay.!A!primeira!conferência!foi!a!de!1911,!mas!a!mais!famosa!
foi!a!de!1927.!!
!
Ninguém!menos!que!Heisenberg!descreve!o!clima!da!Conferência!de!Solvay!de!192744:!!
!
A%Conferência%de%Solvay,%em%Bruxelas,%no%outono%de%1927,%fechou%um%período%maravilhoso%
na% história% da% teoria% atômica.% Planck,% Einstein,% Lorentz,% Bohr,% de% Broglie,% Born% e%
Schroedinger% e,% da% nova% geração,% Kramers,% Pauli% e% Dirac% reuniam^se% aqui% e% logo%
centralizavam%as%discussões%nos%duelos%entre%Einstein%e%Bohr.%Nós%nos%reuníamos%no%hotel%à%
mesa% do% café% da% manhã,% e% Einstein% começava% a% descrever% um% experimento% imaginado% no%
qual%as%contradições%da%teoria%seriam%expostas.%Seguíamos%juntos%do%hotel%para%o%prédio%da%
conferência,% e% eu% ouvia% a% entusiasmada% discussão% entre% esses% dois% homens% com% atitudes%
filosóficas%tão%distintas.%Em%geral,%Bohr%analisava%o%experimento%de%Einstein%durante%o%dia,%e%
a% discussão% recomeçava% na% mesa% de% jantar.% Ehrenfest,% amigo% de% Bohr% e% Einstein,% dizia:%
``estou%envergonhado%de%você,%Einstein.%Você%está%se%colocando%na%mesma%posição%dos%seus%
oponentes,%quando%tentaram%refutar%a%teoria%da%relatividade''.%As%discussões%se%estendiam%
de%uma%conferência%para%a%outra.%Na%conferência%de%1930,%na%mesa%do%café,%Einstein%propôs%
o% famoso% experimento% em% que% a% cor% de% um% quantum% de% luz% deveria% ser% determinada%
pesando^se% a% fonte% antes% e% depois% da% emissão.% Como% o% problema% envolvia% gravidade,% nós%
tivemos%que%usar%a%teoria%da%relatividade%geral%para%analisá^lo.%Foi%um%triunfo%para%Bohr%ao%
final% do% dia% mostrar% para% Einstein,% usando% sua% própria% teoria,% que% a% interpretação% de%
Copenhague%estava%correta.%
%
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
44!Ref.!Quantum(Theory(and(Measurement,!J.!A.!Wheeler!e!W.!H.!Zurek,!Ed.!Princeton!(1983).!

! 95!
!
!
É! interessante! notar! como! Einstein,! que! deu! contribuição! fundamental! para! a! mecânica!
quântica,! em! 1905,! com! a! explicação! para! o! efeito! fotoelétrico! e,! no! ano! seguinte! com! o!
modelo! quântico! para! o! calor! específico! dos! sólidos,! se! tornou! mais! tarde! o! seu! principal!
opositor.!Seu!principal!oponente!era!um!entusiasmado!Bohr!e!um!grupo!de!jovens,!como!
Pauli!e!Heisenberg,!ao!seu!lado,!o!defendendo!da!artilharia!pesada!disparada!por!Einstein!
contra!a!mecânica!quântica.!!!
!
O!famoso!experimento!para!medir!o!peso!do!fóton!proposto!por!Einstein!em!1927!pode!ser!
descrito!da!seguinte!forma:!imagine!uma!caixa!fechada,!contendo!um!relógio!com!precisão!
arbitrária! e! um! dispositivo! que! pode! emitir! um! fóton! –! por! exemplo,! um! átomo! em! um!
estado!excitado.!Todo!o!sistema!está!pendurado!em!uma!balança!usada!para!medir!o!peso!
do! aparato! completo,! por! hipótese! também! com! precisão! arbitrária.! Antes! da! emissão!
ocorrer,!o!peso!da!caixa!é!medido!com!tudo!dentro!e,!no!momento!da!emissão,!marcaose!
exatamente! o! instante! em! que! o! decaimento! ocorreu.! Finalmente,! medeose! o! peso! do!
aparato!todo!após!a!emissão.!Comparandoose!as!duas!medidas!do!peso,!determinaose!com!
precisão! arbitrária! a! energia! do! fóton! emitido.! Como! o! instante! da! emissão! também! foi!
medido!com!precisão!arbitrária,!as!duas!medidas!juntas!violariam!o!princípio!de!incerteza,!
contrariando! a! mecânica! quântica.! Um! desenho! do! esquema! experimental! feito! pelo!
próprio!Bohr!é!mostrado!na!Figura!I21.1.!
!

! 96!
!

Figura!I21.1!–!Desenho!feito!por!Bohr!de!um!esquema!experimental!(imaginário)!para!se!medir!o!
“peso”!de!um!fóton.!O!esquema!foi!concebido!por!ele,!após!um!debate!com!Einstein!em!uma!das!
Conferências!de!Solvay.!!!
!
!
!
É!claro!que!um!experimento! desses!não!é!realizável!na!prática,!mas!o!ponto!que!Einstein!
defendia! não! estava! ligado! à! praticidade! do! experimento,! mas! aos! pilares! da! mecânica!
quântica.! Segundo! Léon! Rosenfeld,! assessor! de! Bohr,! o! experimento! mental! de! Einstein!
causou!grande!impacto!sobre!ele:!
!
Foi%um%grande%choque%para%Bohr%ser%confrontado%com%esse!problema;%ele%não%conseguiu%ver%
a% solução% imediatamente.% ! Durante% todo% o% tempo,% ele% parecia% muito% contrariado,% indo% de!
um%lado%para%o%outro,%tentando%convencer%as%pessoas%de%que!aquilo%não%podia%ser%verdade%e%
que%seria%o%fim%da%física%se!Einstein%estivesse%certo.%No%entanto,%ele%não%conseguia%refutar!o%
argumento...%.%Na%manhã%seguinte,%veio%o%triunfo%de%Bohr!e%a%salvação%da%física.%
%
Bohr!contraoargumentou!da!seguinte!maneira:!mesmo!com!precisão!arbitrária,!as!medidas!
necessariamente!terão!incertezas!associadas,!pois!a!precisão!de!um!experimento!não!pode!
ser!infinita.!Portanto,!a!medida!da!posição!do!ponteiro!da!balança!terá!uma!incerteza!Δ!,!e!
a!medida!do!momento,!ao!ocorrer!a!emissão!do!fóton!e!a!balança!se!mover,!terá!incerteza!
Δ!.!O!princípio!de!incerteza!estabelece!o!limite!inferior!para!o!produto!dessas!incertezas:!
Δ!Δ! ≥ ℎ.!!

! 97!
!
No! entanto,! após! a! emissão! do! fóton,! o! ponteiro! da! balança! se! move! para! cima.!
Pendurandoose! nele! uma! pequena! massa!∆!,! podeose! fazer! o! ponteiro! voltar! à! posição!
inicial! e,! com! isso,! determinar! a! variação! do! peso! causada! pela! emissão! do! fóton:!!∆!.!
Esta!variação!de!peso!causa!um!impulso!na!caixa!que,!para!que!seja!perceptível,!deve!ser!
maior!do!que!a!variação!do!momento:!!∆!"#! ≥ ! ∆!,!onde!!"!é!o!tempo!necessário!para!a!
caixa! chegar! ao! repouso! após! a! massa!∆!!ser! pendurada! nela.! Usando!∆! = ! ∆!! ! !da!
relatividade!restrita,!podeose!escrever!as!seguintes!desigualdades:!
!
∆! ℎ (I21.1)!
! !!! ≥ ! ∆!! ≥ ! !
!! ∆!
Que!implicam:!
!
(I21.2)!
!"#∆!∆!
≥ ℎ!
!!
!
Bohr,!então,!usou!o!argumento!da!teoria!da!relatividade!geral!de!Einstein,!a!qual!estabelece!
que! o! campo! gravitacional! afetará! a! medida! de! tempo! pelo! relógio,! de! tal! forma! que,! na!
posição!mais!alta!da!caixa!(depois!da!emissão),!o!relógio!se!atrasará!em!relação!à!posição!
mais!baixa!(antes!da!emissão),!sendo!a!mudança!fracional!de!tempo!dada!por:!
!
∆! !∆! (I21.3)!
= ! !
!" !
!
Nesta! expressão!Δ! !é! a! variação! da! medida! do! intervalo! de! tempo!!"!causada! ! pela!
diferença!no!campo!gravitacional.!Ou!seja,!Δ!!é!a!incerteza!sobre!!".!Portanto,!
!
gΔxδ t (I21.4)!
Δt = !
c2
De!onde!se!deduz:!!Δ!Δ! ≥ ℎ!
!
Ou!seja,!Bohr!provou!que!o!princípio!de!incerteza!se!aplica!ao!experimento!proposto!por!
Einstein,!usando!a!relatividade!geral.!!

! 98!
O!Paradoxo!de!!EPR!
Em! sua! cruzada! para! expor! as! dificuldades! da! mecânica! quântica,! Einstein,! com! dois!
colaboradores,!Boris!Podolsky!e!Nathan!Rosen,!publicou!em!1935,!o!artigo!que!entrou!para!
a!história!da!física!como!o!Paradoxo!EPR,!assim!nomeado!em!homenagem!aos!seus!autores.!
Novamente,!o!artigo!segue!a!estratégia!de!Einstein!de!imaginar!experimentos!que!levem!a!
contradições!na!mecânica!quântica.!Nesse!artigo,!os!autores!imaginam!duas!partículas!que!
não! interagem! entre! si! e! que! têm! posições! e! momentos! satisfazendo! as! seguintes!
condições:!
!
!! − ! !! = !!!!!!e!!!!!!! + ! !! = 0!!
!
A! primeira! condição! estabelece! que! a! distância! entre! as! partículas! é! fixa,! e! a! segunda! é!
meramente!a!condição!de!conservação!do!momento.!!
!

Figura!I21.2!–!Einstein,!Podolsky!e!Rosen!e!a!primeira!página!do!famoso!artigo!sobre!o!paradoxo!EPR!
publicado!em!!março!1935.!Meses!depois!apareceria!a!resposta!de!Bohr!refutando!os!argumentos!EPR!
!
!

! 99!
!
Suponha! que! se! faça! uma! medida! de!!! !na! partícula! 2,! e!!! !ou!!! !na! partícula! 1.! Como!
!! , !! = ! !! , !! = 0,! o! resultado! da! medida! na! partícula! 2! não! depende! do! observável!
que! escolhemos! medir! na! 1.! Imagine! que! o! resultado! da! medida! sobre! o! momento! da!
partícula!2!seja!!.!Logo,!pela!conservação!do!momento,!se!a!mesma!quantidade!for!medida!
na!partícula!1,!o!resultado!tem!que!ser!– !.!No!entanto,!se!escolhermos!medir!a!posição!da!
partícula!1,!em!vez!do!seu!momento,!pelo!fato!de!que! !! , !! = !ℏ,!ao!medir!a!posição,!o!
seu! momento! fica! indeterminado,! levando! consequentemente! a! uma! indeterminação! do!
momento! da! partícula! 2!! Ou! seja,! o! resultado! da! medida! sobre! a! partícula! 2! depende! da!
escolha! que! se! faz! sobre! a! medida! na! partícula! 1.! Segundo! os! autores! do! artigo,! a!
impossibilidade! de! a! mecânica! quântica! prever! o! resultado! de! uma! medida! sobre! a!
partícula!2!a!tornaria!uma!teoria!incompleta.!!!
!
Imagine!agora!que!dois!observadores,!A!e!B,!estejam!cada!um!com!uma!partícula!do!par,!
separados!por!uma!grande!distância!L.!Eles!escolhem!independentemente!o!que!medir!nas!
respectivas!partículas,!se!posição!ou!momento.!Suponha!que!A!!escolha!medir!o!momento!
e!faça!a!sua!medida!antes!de!B.!Ao!fazer!a!medida,!o!momento!da!partícula!de!B!tornaose!
conhecido! para! A,! por! conta! da! conservação! do! momento.! Mas,! se! A! escolher! medir! a!
posição! da! sua! partícula,! por! causa! da! não! comutatividade,! o! seu! momento! se! torna!
indeterminado! e,! consequentemente,! o! momento! da! partícula! com! B! também! fica!
indeterminado,! novamente! por! causa! da! conservação.! Assim,! o! valor! do! momento! da!
partícula!que!está!com!B!depende!da!escolha!da!medida!que!A!faz!!!
!
Um! paradoxo! aparece! quando! levamos! em! conta! que,! segundo! a! relatividade! restrita,! a!
sequência!das!medidas!depende!do!referencial.!Em!um!referencial!A!faz!a!medida!antes!de!
B,!mas!em!outro!é!B!quem!faz!a!medida!antes!de!A.!Assim,!se!B!medir!o!momento!de!sua!
partícula!antes!de!A!medir!a!posição!da!sua,!em!um!referencial,!o!momento!da!partícula!de!
B!será!bem!definido,!mas!em!outro!não,!e!isto!viola!a!ideia!de!que!as!leis!da!física!são!as!
mesmas!em!todos!os!referenciais!inerciais.!!
!
Ainda! em! 1935,! e! no! mesmo! periódico,! Bohr! respondeu! ao! artigo! EPR,! publicando! um!
artigo! com! o! mesmo! título,! no! qual! questionou! a! definição! de! “elemento! de! realidade”!

! 100!
dada!por!EPR!e!utilizou!o!conceito!de!complementaridade!para!rebater!todos!os!pontos!do!
argumento!daqueles!autores.!!
!

Figura!I21.3!–!A!resposta!de!Bohr!aos!argumentos!EPR.!Após!a!publicação!desse!trabalho,!ele!teria!
comentado!com!Rosenfeld:!“Eles(foram(espertos,(mas(é(mais(importante(estar(certo(do(que(ser(esperto.”!
!
!
Após! a! resposta! de! Bohr,! Einstein! decidiu! não! prosseguir! com! o! debate.! Curiosamente,! o!
artigo! EPR! é! muito! mais! lembrado! (e! citado)! do! que! o! artigo! de! Bohr,! o! qual! o! tempo!
provou! estar! certo.! Na! época,! após! publicar! a! sua! resposta,! Borh! teria! feito! o! seguinte!
comentário!para!Rosenfeld:!!
!
“...eles%(EPR)%foram%espertos.%Porém,%é%mais%importante%estar%certo%do%que%ser%esperto.”.!
!
Duas! ideias! importantes! emergem! do! debate! entre! Einstein! e! Bohr! sobre! a! mecânica!
quântica:!localidade!e!realismo.!Dizose!que!duas!medidas!feitas!em!sequência!sobre!objetos!
separados!são!locais!se!elas!ocorrerem!em!um!intervalo!de!tempo!maior!do!que!aquele!em!
que!a!luz!levaria!para!atravessar!a!distância!que!separa!os!dois!objetos.!Se!tal!critério!não!
for!satisfeito,!dizose!que!a!medida!é!nãoolocal.!Por!exemplo,!se!medirmos!as!frequências!de!
oscilação!de!dois!pêndulos!separados!por!1!km!de!distância!um!do!outro,!em!um!intervalo!
de!tempo!menor!do!que!1/300.000!segundos!(~!3,3!!"),!a!medida!será!nãoolocal.!Segundo!
a!teoria!da!relatividade,!o!resultado!de!uma!medida!feita!em!um!dos!pêndulos! não!pode!
influenciar!o!resultado!da!outra!se!a!separação!entre!eles!for!nãoolocal,!pois!durante!esse!
intervalo!de!tempo!não!é!possível!haver!qualquer!tipo!de!comunicação!entre!os!dois.!!
%
Realismo!é!a!hipótese!de!que!as!variáveis!físicas!de!um!sistema!(observáveis)!têm!valores!
bem!definidos!antes!que!medidas!sejam!feitas.!A!este!respeito!é!interessante!notar!que!a!
mecânica! quântica! não! faz! qualquer! menção! sobre! a! existência! de! valores! préodefinidos!

! 101!
para!observáveis!antes!das!medidas.!Sob!esse!aspecto,!a!existência!de!tais!valores!é!apenas!
uma! crença!! O! nãoorealismo,! portanto,! é! a! ideia! de! que! as! grandezas! físicas! só! adquirem!
um!valor!bem!definido!(um!dos!autovalores!do!observável!que!se!mede)!no!ato!da!medida.!!
!
Por! mais! estranhas! que! essas! questões! possam! parecer! para! uma! ciência! exata! como! a!
física,! ao! longo! dos! anos,! critérios! foram! sendo! estabelecidos! para! a! realização! de! testes!
experimentais! capazes! de! decidir! sobre! esses! aspectos! da! mecânica! quântica.! O! mais!
importante!foi!o!resultado!encontrado!por!John!Bell,!publicado!em!1964.!

! !
Figura!I21.4!–!O!irlandês!John!Bell!e!seu!trabalho!sobre!a!famosa!desigualdade!que!leva!o!seu!nome.!!
Bell!acreditava!que,!no!debate!entre!Einstein!e!Bohr,!o!primeiro!era!quem!estava!certo!sobre!a!
mecânica!quântica.!
!
!
!
O! chamado! teorema! de! Bell! nada! mais! é! do! que! um! limite! imposto! para! as! correlações!
estatísticas! que! podem! existir! entre! variáveis! aleatórias! de! um! sistema! clássico.! Vamos!
supor!que!dois!experimentadores!–!que!vamos!chamar!!Alice!e!Bob!–!!!joguem,!cada!um,!
uma!moeda!para!o!alto!e!anotem!o!resultado!da!seguinte!forma:!se!for!“cara”,!atribuiose!o!
resultado! numérico!+!1!à! jogada,! e! se! for! coroa! atribuiose!– !1.! Ao! final! de,! digamos,! 20!
jogadas,! eles! produzem! uma! lista! como! a! mostrada! na! Tabela! 2.! Note! que! as! médias!
tomadas!nas!duas!colunas!são!iguais!a!zero45.!Perguntaose:!existe!alguma!correlação!entre!
os!resultados!de!Alice!e!Bob?!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
45!A!media!só!será!próxima!de!zero!após!um!número!de!jogadas!muito!maior!do!que!o!do!exemplo.!

Estritamente,!apenas!com!um!número!infinito!de!jogadas,!o!resultado!será!zero.!!!

! 102!
!
A!estatística!tem!muitas!ferramentas!para!medir!correlação!entre!variáveis!aleatórias.!Uma!
delas!consiste!em!multiplicarmos!os!resultados!das!duas!colunas!e!somarmos!tudo:!
!

1 20 8 × (+1) +12 × (−1) 1



20 i=1
x(i)alice × y(i)bob =
20
=
5!
(I21.5)!

!
Ou!seja,!segundo!esse!resultado,!os!dados!estão!correlacionados,!embora!as!médias!sejam!
zero.! Por! outro! lado,! o! bom! senso! nos! diz! que! o! resultado! da! jogada! de! uma! moeda! não!
pode! influenciar! ou! depender! do! resultado! da! jogada! de! outra.! O! problema! aqui! é! que! o!
número! de! jogadas! é! muito! pequeno.! Apenas! com! um! número! muito! grande! de! jogadas,!
não! só! as! médias! serão! zero,! mas! também! as! correlações.! Esse! exemplo! revela! um!
problema!importante!em!estatística:!o!chamado!problema!da!amostragem.!Se!não!tivermos!
uma!amostragem!de!dados!grande!o!suficiente,!a!análise!estatística!pode!levar!a!conclusões!
equivocadas.!!
!
Bell! estabeleceu! um! limite! superior! para! correlações! clássicas! entre! variáveis! aleatórias.!
Sejam!X,!Y,!Z!e!W!variáveis!aleatórias!clássicas,!cada!uma!podendo!!adquirir!valores!+!1!ou!
– !1.!Suponha!que!Alice!faça!uma!série!de!medidas!sobre!X!e!Y,!e!Bob!faça!o!mesmo!número!

! 103!
de!medidas!sobre!Z!e!W.!Ao!final,!os!dois!constroem!uma!tabela!e!comparam!os!resultados!
para!ver!se!existe!algum!tipo!de!correlação.!Uma!forma!de!medir!a!correlação!é!definindo!a!
seguinte!quantidade:!
!
! = ! + ! ! + (! − !)!! (I21.6)!
!
É!fácil!ver!que,!para!cada!conjunto!de!resultados!(! = ! ±1, ! = ! ±1, ! = ! ±1, ! = ! ±1),!
a!quantidade!C!só!poderá!ser!+!2!ou!– !2.!Logo,!o!seu!valor!médio!necessariamente!estará!
entre!estes!dois!limites:!
!

−2 ≤ (X +Y )Z + (X −Y )W ≤ +2 !
(I21.7)!
!
Este!resultado!de!aparência!simples!é!conhecido!como!desigualdade!de!Bell,!ou!teorema!de!
Bell.!É!um!resultado!puramente!estatístico!–!e,!portanto,!independente!de!modelos!físicos!–!
e! se! aplica! a! qualquer! sistema! com! variáveis! aleatórias! dicotômicas.! No! segundo! bloco!
deste! texto,! vamos! mostrar! que,! em! se! tratando! de! variáveis! aleatórias! dicotômicas!
quânticas!(como!spins!1/2),!essa!desigualdade!pode!ser!violada,!e!isto!revela!que!sistemas!
quânticos! têm! determinados! tipos! de! correlação! que! não! existem! classicamente.! Trataose!
de!um!dos!resultados!mais!importantes!da!física.!
!

I22.!Interpretações!da!dualidade!partículadonda!
Com! o! passar! dos! anos,! a! mecânica! quântica! tornouose! inquestionável! em! seu! poder! de!
previsão!sobre!o!comportamento!dos!sistemas!físicos,!com!um!alcance!que!nenhuma!outra!
teoria! desfruta! na! física.! De! fato,! a! descrição! de! partículas! subatômicas,! a! estrutura! de!
átomos! e! moléculas,! os! fenômenos! de! matéria! condensada! (materiais! condutores,!
isolantes,! semicondutores,! supercondutores,! magnéticos! etc.),! fenômenos! estelares,!
nanociências!etc.,!a!mecânica!quântica!é!a!base!para!a!construção!das!mais!diversas!teorias!
da!física.!Mas,!se!por!um!lado,!ninguém!questiona!esse!aspecto!“quantitativo”!da!mecânica!
quântica,! por! outro,! no! que! diz! respeito! às! suas! interpretações,! não! existe! consenso,! e! a!
controvérsia!parece!estar!muito!longe!de!terminar.!!!
!

! 104!
A!matéria!é!feita!de!onda!ou!partícula?!Os!observáveis!têm!ou!não!valores!definidos!antes!
que! medidas! sejam! feitas?! Como! se! dá! a! comunicação! quântica! por! meio! do!
emaranhamento,!e!afinal!o!que!é!isso?!Por!que!o!mundo!macroscópico!se!torna!clássico,!e!
a!natureza!quântica!da!matéria!não!se!manifesta!no!dia!a!dia?!!
!
A!origem!de!todas!essas!questões!está!na!dualidade!partícula/onda.!Diferentes!tentativas!
de! interpretação! dessa! dualidade! foram! sendo! construídas! ao! longo! dos! anos,! as! mais!
importantes!sendo!as!quatro!descritas!a!seguir46.!
1. Interpretação%ondulatória!–!Defendida!por!Schroedinger!e!von!Neumann.!Antes!da!
detecção!o!objeto!físico!se!propaga!como!uma!onda,!tornandoose!localizado!apenas!
no!momento!da!detecção.!Este!é!o!colapso!da!função!de!onda.!
2. Interpretação%corpuscular%–!Defendida!por!Landé.!O!fóton!e!o!elétron!(assim!como!
outros! objetos)! são! corpúsculos.! O! padrão! de! interferência! que! se! observa! em!
determinados! experimentos! deve! ser! explicado! a! partir! das! interações! entre! os!
objetos!e!os!aparelhos!de!medida.!!
3. Interpretação%dualista%realista%–!Defendida!por!de!Broglie!e!David!Bohm.!O!objeto!
físico! é! composto! por! uma! ondaopiloto! e! uma! partícula,! cuja! trajetória! é! bem!
definida,!mas!desconhecida.!O!padrão!de!interferência!é!causado!pela!onda.!
4. Interpretação% da% complementaridade% –! Defendida! por! Bohr.! Os! objetos! quânticos!
são! ondas.! O! aspecto! corpuscular! aparece! por! causa! da! forma! intrinsecamente!
descontínua!do!ato!de!detecção,!como!a!ionização!de!um!átomo.!!
!
Vamos!concluir!a!primeira!parte!deste!curso!com!a!descrição!de!um!experimento!de!óptica!
quântica! em! um! aparato! chamado! interferômetro! de! MachoZehnder,! e! as! estranhas!
conclusões!a!que!se!podem!chegar!quando!olhamos!para!o!regime!quântico!da!luz.!
!
A!Figura!I22.1!mostra!um!experimento!muito!simples!em!que!uma!fonte!de!laser!emite!um!
feixe! com! intensidade! I0.! O! feixe! incide! sobre! um! espelho! semitransparente! inclinado! 45o!
em!relação!à!direção!de!incidência!e!se!divide!em!duas!partes,!cada!uma!com!metade!da!
intensidade!do!feixe!original.!Suponha!que!a!intensidade!do!feixe!seja!reduzida!até!o!ponto!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
46!Ver!Conceitos(de(física(quântica,!Osvaldo!Pessoa!Jr.,!Ed.!Livraria!da!Física!(São!Paulo,!2003),!e!Teorias(e(
Interpretações(da(mecânica(quântica,!Nelson!Pinto!Neto,!Livraria!da!Física!(São!Paulo!2010).!

! 105!
em! que! um! único! fóton! seja! emitido.! Perguntaose:! ao! atingir! o! espelho,! qual! caminho! o!
fóton!vai!seguir?!Qual!dos!dois!detectores!acusará!a!presença!do!fóton?!
!

Detector 1

I0 /2 Detector 2
I0

I0 /2
Fonte de laser Espelho
semi-transparente
!

Figura!I22.1!–!Em!um!experimento!simples!de!óptica!clássica,!uma!fonte!de!laser!emite!um!feixe!
intenso!que!é!dividido!exatamente!na!metade!por!um!espelho!semictransparente!inclinado!45o!em!
relação!à!direção!de!incidência.!Se!apenas!um!fóton!for!enviado!pela!fonte,!ao!chegar!no!espelho,!é!
impossível!calcular!a!direção!que!ele!irá!“escolher”!!
!
! !
A! mecânica! quântica! nos! diz! que! é! impossível! respondermos! a! esta! pergunta,! ainda! que!
soubéssemos! todos! os! detalhes! das! interações! do! fóton! com! o! espelho.! Ao! chegar! no!
espelho,! a! função! de! onda! do! fóton! se! divide,! e! a! chance! de! ele! seguir! a! trajetória!
horizontal! é! a! mesma! de! seguir! a! vertical.! Se! um! número! muito! grande! de! fótons! for!
emitido!individualmente,!ao!final,!aproximadamente!metade!será!registrado!no!detector!1!
e!metade!no!detector!2.!Isso!é!tudo!o!que!pode!ser!dito!!!
!
Vamos!agora!voltar!ao!interferômetro!de!MachoZehnder,!como!mostrado!na!Figura!I22.2.!!
Se!um!feixe!com!intensidade!inicial!I0!for!emitido!na!fonte,!ajustandoose!a!fase! φ,!podeose!
controlar!a!interferência!e!fazer!com!que!todo!o!feixe!siga!para!o!detector!2.!Suponha!que,!
como!anteriormente,!!a!intensidade!do!feixe!seja!reduzida!até!que!seja!emitido!um!único!
fóton.!Qual!dos!dois!detectores!vai!acusar!o!fóton?!O!experimento!mostra!que!novamente!
será!o!detector!2.!Mas,!agora,!como!não!temos!um!feixe,!mas!apenas!um!fóton,!como!pode!
haver!interferência!no!espelho!próximo!aos!detectores?!Vamos!fazer!a!hipótese!de!que!o!
fóton,!ao!atingir!o!primeiro!espelho!semitransparente,!siga!o!caminho!vertical.!Ele!é,!então,!

! 106!
refletido!pelo!espelho!totalmente!refletor!e!alcança!o!segundo!espelho!semitransparente.!
Ora,!essa!situação!deveria!ser!idêntica!à!anterior!(descrita!na!Figura!I22.1),!e!metade!dos!
fótons! deveria! seguir! o! caminho! para! D2! e! metade! para! D1! (se! muitos! fótons! forem!
enviados).!No!entanto,!apenas!D2!registrará!os!fótons.!!
!
O! experimento! mostra! que! não! se! pode! atribuir! uma! trajetória! ao! fóton;! ao! atingir! o!
primeiro! espelho! semitransparente,! a! função! de! onda! necessariamente! se! desdobra! nos!
dois! caminhos,! e! a! interferência! que! ocorre! no! segundo! espelho! semitransparente! é!
causada! pela! superposição! dessas! duas! funções! de! onda,! tal! como! acontece! no!
experimento! da! dupla! fenda.! Se! uma! das! trajetórias! for! interrompida! –! por! exemplo,!
bloqueandoose! o! caminho! horizontal! após! o! primeiro! espelho! semitransparente! –,!
interrompeose!a!interferência,!e!os!dois!detectores!passam!a!registrar!o!mesmo!número!de!
fótons,!em!média,!reproduzindo!o!que!foi!descrito!na!Figura!I22.1.!
!

50% 100%

Fonte

50%

100%
D2

D1 !

Figura!I22.2!–!Esquema!de!um!interferômetro!de!MachcZehnder!(veja!também!Figura!I13.3).!!
Funcionando!no!regime!quântico,!essa!montagem!experimental!revela!que!não!se!pode!atribuir!uma!
trajetória!ao!fóton!após!a!incidência!sobre!o!primeiro!espelho!semitransparente!!
!
!
!
!

! 107!
No! segundo! bloco! retornaremos! a! essas! e! outras! questões,! fazendo! uso! do! aparato!
matemático!formal!da!mecânica!quântica.!!
!
!
! !

! 108!
!
Problemas!
1. Qual! o! comprimento! de! onda! correspondente! à! radiação! máxima! de! um! corpo!
negro!a!uma!temperatura!de!6000!K?!
2. Considerando!a!Terra!como!um!corpo!negro!irradiando!energia!para!o!espaço!a!uma!
taxa!de!1340!W/m2,!calcule!a!temperatura!na!superfície!do!planeta.!!
3. Calcule!a!frequência,!comprimento!de!onda!e!momento!de!um!fóton!cuja!energia!é!
igual!à!energia!da!massa!de!repouso!do!elétron.!!
4. A!energia!necessária!para!remover!um!elétron!do!sódio!é!de!2,3!eV.!Iluminando!o!
sódio! com! luz! amarela,! ! = 5890!Å ,! haverá! corrente! fotoelétrica?! Calcule! o!
comprimento!de!onda!de!corte!para!o!efeito!fotoelétrico!do!sódio.!!
5. Deduza!a!expressão!da!Eq.(I6.2)!para!o!efeito!Compton.!!
6. Use!o!princípio!de!incerteza!para!mostrar!que!uma!partícula!(fóton,!nêutron,!elétron!
etc.)!com!comprimento!de!onda!igual!a!!!que!atravessa!um!anteparo!através!de!!um!
pequeno!orifício!com!diâmetro!!!é!difratada!com!uma!dispersão!angular!da!ordem!
de!!/!.!Se!em!vez!de!um!orifício,!existirem!dois!com!o!mesmo!diâmetro,!separados!
por!uma!distância!! ≫ !,!a!dispersão!no!momento!será!ℎ/!!!ou!ℎ/!?!
7. O!positrônio!é!um!sistema!formado!por!um!elétron!e!um!pósitron!ligados!entre!si!
pela!interação!coulombiana,!que!pode!decair!em!dois!fótons!após!uma!vida!média!
de!1,25×10!!" !.!Com! base! nessas! informações:! a)! Calcule! a! energia! de! ligação! do!
sistema.! b)! Calcule! a! energia! e! o! comprimento! de! onda! de! cada! fóton,! medidos! a!
partir! do! centro! de! massa! do! positrônio;! c)! Se! um! dos! fótons! é! espalhado! por! um!
elétron! no! efeito! Compton,! calcule! a! energia! máxima! que! o! fóton! pode! transferir!
para!o!elétron.!!
8. Mostre!que,!se!a!energia!potencial!de!um!sistema!de!N!partículas!puder!ser!escrita!
como! uma! soma! de! potenciais! que! são! funções! das! coordenadas! individuais,!
! !! , !! , ⋯ , !! = ! !! (!! ),!a!equação!de!Schroedinger!pode!ser!decomposta!em!

N!equações!de!partículas!individuais.!
9. Mostre! que! a! derivada! primeira! da! função! de! onda! independente! do! tempo! é!
contínua,!mesmo!em!pontos!onde!o!potencial!apresenta!uma!descontinuidade.!!
10. Calcule! a! distribuição! de! probabilidades! de! momento! para! uma! partícula! em! um!
poço!de!potencial!unidimensional!em!um!autoestado!n!qualquer.!!

! 109!
11. Calcule!o!potencial!para!o!qual!a!função:!
!
! !
! ! =! ! !!/!! !
!!
!
onde! !!e!!! !são! constantes,! seja! uma! autofunção! da! equação! de! Schroedinger.!
Suponha!que!quando!! → ∞, !(!) → 0.!
12. Mostre!que,!para!qualquer!autoestado!do!átomo!de!hidrogênio,!o!valor!esperado!da!
energia!cinética!é!igual!a!menos!a!energia!do!estado.!
13. Encontre! a! equação! de! Schroedinger! na! representação! de! momento! para! uma!
partícula!em!um!potencial!periódico!dado!por:!! ! = !! cos!(!!).!
14. Mostre!que!a!expressão!do!princípio!de!incerteza!para!qualquer!estado!do!oscilador!
harmônico!é!igual!a:!
!
!! 1
Δ!Δ! = = ! + ℏ!
! 2
!!
15. Considere!o!hamiltoniano!!
!
! = !! + !! !!onde!!!! = !!! !!!e!!!! = !"(!! + !)!
!
onde!!!!e!!!! !são!operadores!de!aniquilação!e!criação!de!bósons,!respectivamente.!
Encontre!os!autoestados!de!energia!de!H.!
16. Um! poço! de! potencial! com! paredes! infinitas! e! largura! ! !tem! dois! potenciais!
perturbativos! com! a! mesma! largura! ! !e! altura! ! ,! posicionados! em! ! = !/4 !e!
! = 3!/4.! Considere!! ≪ !.! Usando! teoria! de! perturbação,! calcule! a! correção! em!
primeira!ordem!da!diferença!!! − !! !entre!o!segundo!e!quarto!autoestados.!!
17. Um!oscilador!harmônico!unidimensional!é!sujeito!a!uma!perturbação!dada!por:!
!
! ! = !
! ! + !!
!
Calcule! a! correção! em! primeira! ordem! da! energia! do! estado! fundamental! do!

oscilador!nos!limites!a)!! ≪ (ℏ/!")!!!e!b)!!! ≫ (ℏ/!")!.!

! 110!
18. A!chamada!equação!de!Heisenberg!para!um!operador!A(t)!é!dada!por:!
!
! !
!ℏ ! ! = !, ! + !(!)!
!" !"
!
Aplique! a! equação! de! Heisenberg! para! os! operadores! de! posição! e! momento! de!
uma! partícula! de! carga! q! e! massa! m! em! um! campo! eletrostático! uniforme! E,! e!
deduza!a!segunda!lei!de!Newton!das!equações.!
!
19. Uma! partícula! em! um! potencial! central! tem! momento! angular! orbital!! = 2!e! spin!
! = 1.!Encontre!os!níveis!de!energia!da!interação!spinoórbita:!!!!!!!!!!!!!!! = !! ∙ !.!!
20. Um!elétron!está!em!um!estado!descrito!pela!função!de!onda!abaixo:!
!
!
1 !"
!= ! !"#$ + !"#$ ! ! , tal!que!! !(!) ! ! ! !" = 1!
4! !

!
a) Quais!são!os!possíveis!resultados!de!uma!medida!de!!! !para!esse!estado?!
b) Quais!são!as!respectivas!probabilidades!para!os!resultados!calculados!em!(a)?!
c) Calcule!o!valor!esperado! !! .!
!

! 111!
!
!
!
BLOCO%II%%
Formalismo!
!
! !

! 112!
A%REALIDADE%DO%FÓTON%
Um!estudo!minucioso!das!boas!biografias!do!físico!de!origem!alemã!Albert!Einstein!
(1879=1955)! nos! permite! fazer! uma! afirmação! incisiva:! é! muito! provável! que! ele!
tenha!sido!o!único!cientista!de!sua!época!a!crer,!de!1905!a!1925,!na!realidade!física!
do! fóton.! Foi! neste! último! ano! que! experimentos! feitos! tanto! nos! EUA! quanto! na!
Alemanha!apresentaram!os!dados!que!acabaram!com!uma!polêmica!que!se!arrastou!
por!praticamente!duas!décadas.!
!
A!ideia!de!fóton!foi!apresentada!no!primeiro!dos!seis!trabalhos!produzidos!–!cinco!
publicados! –! por! Einstein! em! 1905.! O! artigo! mereceu! a! adjetivação! de! “ideia! mais!
revolucionária!da!minha!vida”.!Por!sinal,!“a!ideia!mais!feliz”!foi!quando!ele,!em!1907,!
em! artigo! de! revisão! sobre! a! relatividade! restrita,! chegou! à! conclusão! sobre! a!
equivalência!entre!a!massa!inercial!e!a!gravitacional,!o!que,!de!certo!modo,!iniciou!
sua!jornada!rumo!a!uma!nova!teoria!da!gravitação:!sua!relatividade!geral,!publicada!
em!1915.!
!
A! ideia! de! fóton! parece! realmente! ter! algo! de! revolucionária! –! no! sentido! de! que!
parecia!‘fora!de!seu!tempo’.!O!físico!alemão!Max!Planck!(1858=1947)!–!tido!como!o!
grande! incentivador! da! carreira! de! Einstein! –! chegou,! em! meados! da! década! de!
1910,!a!se!desculpar!pela!ideia!do!fóton!em!carta!na!qual!apresentava!Einstein!como!
candidato!à!Academia!Prussiana!de!Ciências.!Sua!alegação!era!mais!ou!menos!assim:!
a!ideia!de!um!quantum!de!luz!está!equivocada,!mas!não!é!possível!fazer!boa!física!
teórica!sem!certa!dose!de!ousadia.!
!
Em! 1916,! o! físico! norte=americano! Robert! Millikan! (1868=1953)! apresentou! os!
resultados! de! um! experimento! planejado! inicialmente! para! estudar! a! equação! do!
efeito! fotoelétrico,! proposta! por! Einstein,! e,! principalmente,! para! demonstrar! o!
equívoco!da!ideia!do!fóton.!No!entanto,!mais!tarde,!se!viu!obrigado!a!concluir!pela!
existência!desse!corpúsculo!–!isso!parece!ter!se!dado!apenas!em!1950,!quando!ele!
publicou! sua! autobiografia.! Esse! resultado,! porém,! por! conta! da! descrença! de!
Millikan!e!tantos!outros,!não!teve!a!força!e!repercussão!necessárias!para!mostrar!a!
realidade!do!fóton.!

! 113!
Muitos!físicos!–!e!até!mesmo!historiadores!da!ciência!–!apontam!o!experimento!de!
outro!físico!norte=americano,!Arthur!Compton!(1892=1962),!como!aquele!em!que!as!
dúvidas!sobre!a!existência!dos!fótons!foram!solucionadas.!No!entanto,!logo!após!a!
publicação! dos! resultados! de! Compton,! em! 1923,! veio! a! público! uma! teoria!
elaborada! pelo! dinamarquês! Niels! Bohr! (1885=1962),! o! holandês! Hendrik! Kramers!
(1894=1952)! e! o! norte=americano! John! Slater! (1900=1976).! Conhecida! como! teoria!
BKS! –! sobrenome! dos! autores! –,! esse! modelo! alegava! poder! explicar! os! resultados!
de! Compton! sem! a! necessidade! do! fóton.! No! entanto,! isso! implicava! –! e! a! ideia!
parece!ter!vindo!de!Bohr!–!a!violação!de!um!‘santo!graal’!da!física:!a!conservação!de!
energia.!
!
Bohr! –! um! dos! maiores! físicos! do! século! passado! –! foi! além! de! desconfiar! da!
realidade!dos!fótons!e!propor!a!violação!da!conservação!de!energia.!Ele!se!opôs!ao!
princípio! da! incerteza! de! Heisenberg,! ao! neutrino! e! ao! méson! pi.! Isso,! em! parte,!
parece! mostrar! a! não! linearidade! do! pensamento! científico! e,! de! certa! forma,! põe!
em! dúvida! a! robustez! e! o! alcance! do! chamado! ‘método! científico’! –! para! filósofos!
como! o! austríaco! Paul! Feyerabend! (1924=1994),! a! ciência! nem! mesmo! tem! um!
método;!nesse!aspecto,!resumiu!ele,!“Vale!tudo”.!
!
Nas!palavras!do!físico!teórico!e!historiador!da!ciência!holandês!Abraham!Pais!(1918=
2000),!Bohr!–!herói!em!seu!país!–!foi!o!maior!filósofo!do!século!20.!Segundo!Pais,!as!
discussões!entre!Bohr!e!Einstein!foram!o!debate!filosófico!mais!profundo!do!século!
passado,! pois! não! era! uma! discussão! sobre! aspectos! particulares! da! física,! esta! ou!
aquela!lei,!mas,!sim,!sobre!o!que!ele!denominou!“a!alma!da!natureza”.!Esse!debate!
ecoa!até!hoje!entre!os!que!se!interessam!pelos!fundamentos!da!mecânica!quântica!–!
e!pode!ser!encontrado!em!boa!parte!deste!livro.!
!
Dois!anos!depois,!Compton!fez!um!novo!experimento,!e,!quase!concomitantemente,!
os! alemães! Hans! Geiger! (1882=1945)! e! Walther! Bothe! (1891=1957)! também!
realizaram! um,! para! testar! a! realidade! dos! fótons.! Os! resultados! desses! dois!
experimentos,! ambos! publicados! em! 1925,! dizimaram,! de! uma! vez! por! todas,! o!
ceticismo! sobre! a! existência! dos! fótons.! Mais! ou! menos! nessa! época,! com! o! então!

! 114!
recém=desenvolvimento! da! mecânica! quântica,! começaram! a! surgir! as! primeiras!
ideias!sobre!o!fóton!ser!o!carregador!da!força!eletromagnética.!!
!
Geralmente,! atribui=se! o! termo! fóton! ao! físico=químico! norte=americano! Gilbert!
Lewis!(1875=1946)!em!1926.!No!entanto,!o!historiador!da!física!dinamarquês!Helge!
Kragh!mostra!que!o!termo!começou!a!ser!usado!logo!após!o!fim!da!Primeira!Guerra!
Mundial,! em! áreas! como! óptica! e! medicina.! O! próprio! Lewis! aplicou=o! a! uma!
partícula!que!era!bem!diferente!do!fóton!proposto!por!Einstein!em!1905.!
!
Prioridades! são! sempre! questões! complexas! em! história! da! ciência! –! quando! não!
sem! sentido.! Exemplo! nessa! linha! é! o! início! da! própria! teoria! quântica.! Há! autores!
que! o! atribuem! não! à! proposição! do! quantum! de! energia! por! Planck,! mas,! sim,! ao!
artigo!de!Einstein!de!1905.!Outros!defendem!que!o!início!da!física!quântica!deva!ser!
a! Conferência! de! Solvay! em! 1911,! quando! o! físico! alemão! Walther! Nernst! (1864=
1941)! apresentou! seu! dados! experimentais! comprovando! as! ideias! de! Einstein! de!
1906! sobre! o! calor! específico,! artigo! que,! para! muitos,! inaugurou! a! chamada! física!
quântica! do! estado! sólido! (hoje,! matéria! condensada).! A! descoberta! do! múon,! por!
exemplo,! dependendo! da! fonte! histórica! que! se! queira! escolher,! espalha=se!
temporalmente!do!final!da!década!de!1920!ao!fim!da!seguinte.!
!
Por! sinal,! um! dos! equívocos! históricos! mais! repetidos! –! até! mesmo! em! textos!
consagrados! –! é! o! de! que! a! física! quântica! nasceu! como! desdobramento! de! uma!
suposta!crise!sofrida!por!essa!disciplina!no!século!19,!marcada!principalmente!pela!
chamada! ‘catástrofe! ultravioleta’,! segundo! a! qual! a! física! clássica! previa! que! uma!
fonte! de! calor! tão! inofensiva! quanto! uma! xícara! de! chá! quente! poderia! emitir!
radiação!danosa!para!um!ser!vivo.!
!
Helge! Kragh! desfaz! esse! mito! em! texto! sólido! e! esclarecedor.! Esse! historiador!
dinamarquês!renomado!é!incisivo!ao!afirmar!o!que,!para!ele,!é!o!principal!motivo!do!
nascimento! da! física! quântica:! o! profundo! conhecimento! de! Planck! sobre!
termodinâmica.!Mas,!para!chegar!ao!quantum,!esse!teórico!alemão!teve!que!aceitar!
‒! e! passar! a! usar! ‒! a! termodinâmica! estatística,! criada,! naquele! século! 19,!

! 115!
principalmente!pelo!físico!austríaco!Ludwig!Boltzmann!(1844=1906).!Mais:!deixar!de!
lado! idiossincrasias,! como! não! acreditar! na! realidade! nem! dos! elétrons,! nem! dos!
átomos.!
!
Kragh! é! também! autor! de! outra! observação! perspicaz! sobre! a! década! de! 1920,!
quando! se! deu! o! amplo! desenvolvimento! da! mecânica! quântica.! Essa! teoria! foi!
abraçada! com! fervor! pelas! novas! gerações! de! físicos! à! época,! pois! esse! jovens!
pesquisadores!perceberam!que!dali!é!que!haveria!de!sair!os!próximos!prêmios!Nobel!
–!e!a!história!comprovou!essa!previsão.!
!
A! relatividade! geral,! por! sua! vez,! era! uma! teoria! feita! por! Einstein! –! à! época,! o!
cientista!mais!famoso!do!mundo!–,!tinha!uma!matemática!extremamente!complexa!
e!ininteligível!para!muitos!físicos,!bem!como!lidava!com!temas!(cosmologia)!que!não!
tinham! praticamente! suporte! experimental.! Mais:! tinha! fama! de! pertencer! muito!
mais! ao! mundo! da! filosofia! do! que! às! coisas! terrestres,! como! apontou! relatório!
encomendado!pelo!Comitê!Nobel!por!volta!de!1920.!!
!
De!certo!modo,!isso!fez!com!que!essa!teoria!da!gravitação!fosse!arrastada!para!um!
tipo! de! ostracismo! até! meados! da! década! de! 1960,! quando! foi! arrancada! dessa!
penumbra!por!trabalhos!teóricos!de!matemáticos!como!o!britânico!Roger!Penrose!e!
passou!a!ganhar!dados!observacionais!confiáveis.!Marco!nesse!sentido!foi!a!primeira!
comprovação!(precisa!)!do!desvio!da!luz!por!uma!campo!gravitacional;!a!detecção!da!
chamada! radiação! cósmica! de! fundo;! e! a! descoberta! de! novos! corpos! cósmicos,!
como!quasares,!pulsares!etc.!
!
O! Brasil! tem! papel! indireto,! mas! interessante! do! ponto! histórico,! na! evolução! dos!
acontecimentos! que! levaram! à! aceitação! do! fóton.! Na! primeira! metade! de! 1925,!
Einstein! estava! no! Brasil.! Deveria,! a! princípio,! falar! apenas! sobre! suas! teorias! da!
relatividade.!Porém,!em!uma!mudança!de!última!hora,!decidiu!fazer!sua!palestra!na!
Academia! Brasileira! de! Ciências! sobre! a! questão! do! fóton! –! “quantum! de! luz”,! nas!
palavras!dele!–!isso!é!um!indicativo!de!que!ele!estava!preocupado!com!o!tema.!!

! 116!
Pouco!antes!de!sair!da!Alemanha!para!suas!viagens!à!América!do!Sul,!Einstein!havia!
provavelmente! tido! contato! com! resultados! parciais! do! experimento! de! Geiger! e!
Bothe.! Documentos! históricos! do! período! indicam! que! Einstein,! à! época! de! sua!
palestra!na!ABC,!não!sabia!que!os!resultados!de!seus!dois!colegas!alemães!haviam!
sido!publicados!–!resumo!dessa!história!pode!ser!vista!em!exposição!permanente!no!
CBPF,!‘Einstein!no!Brasil’.!
!
Em! meados! da! década! de! 1920,! a! física! no! Brasil! vivia! um! momento! de! inflexão.!
Havia! duas! obras! publicadas! sobre! a! relatividade! e,! como! vimos,! um! artigo!
relacionando! esta! teoria! com! as! raias! espectrais! do! hidrogênio.! Em! relação! à!
relatividade,! o! livro! mais! conhecido! é! o! de! Amoroso! Costa,! Introdução* à* teoria* da*
relatividade.*Menos!conhecido!é!aquele!de!um!então!jovem!tenente!da!Marinha!do!
Brasil,! Carlos! Pena! Boto! (1892=1973),! cujo! título! é! O* neo3relativismo* einsteiniano,!
lançado!poucos!meses!depois!da!obra!de!Amoroso!Costa.!Cerca!de!quatro!décadas!
depois,! esse! militar! –! anticomunista! extremado! –! se! destacaria! por! suas! posições!
conservadoras! no! regime! militar! no! Brasil.! Fica! tentador! arriscar! dizer! que! Pena!
Boto,! que! serviu! no! encouraçado! ‘Delaware’,! nos! EUA,! de! 1914! a! 1916,! tenha!
tomado! contato! com! a! teoria! da! relatividade! em! passagem! pelo! Laboratório! Naval!
dos!EUA.!
!
Ainda! não! há! um! estudo! mais! detalhado! sobre! o! porquê! de! um! jovem! oficial! de!
nossa!Marinha!ter!lançado!um!livro!sobre!um!tema!muito!em!voga!à!época.!Talvez,!
contribua! para! a! resposta! lembrar! que! aquele! início! de! década! foi! marcado! pelas!
primeiras!grandes!obras!sobre!a!relatividade,!coincidindo!com!um!momento!em!que!
aquela! teoria! havia! ganhado! sua! comprovação! histórica! –! o! adjetivo! ‘histórico’,! no!
caso,! é! aconselhável,! pois! os! erros! nas! chapas! fotografia! usadas! para! detectar! o!
desvio! da! luz! pelo! campo! gravitacional! solar! durante! um! eclipse! eram! muito! altos,!
alguns!na!casa!dos!30%.!
!
m!1925,!quando!da!passagem!de!Einstein!pela!América!do!Sul,!o!Brasil!já!tinha!sua!
academia!de!ciências,!como!resultado!de!um!movimento!que!havia!se!iniciado,!como!
vimos,! ainda! no! fim! do! século! anterior,! pleiteando! a! introdução! nas! (poucas)!!

! 117!
universidades! do! país! da! chamada! ‘ciência! pura’.! Vale! lembrar! que,! na! Europa,! a!
Alemanha,! por! exemplo,! havia! se! tornado! um! tipo! de! referência! mundial! para! a!
ciência! e! engenharia! em! parte! por! conta! de! uma! reforma! universitária! que! havia!
iniciado,!ainda!no!século!19,!a!profissionalização!do!pesquisador.!!
!
Essa!reforma!é,!de!certa!maneira,!resposta!à!entrada!–!algo!atrasada!–!da!Alemanha!
na!Revolução!Industrial.!Esse!país!escolheu!como!nicho!–!não!ocupado!amplamente!
por!Reino!Unido!e!França!–!a!área!de!química.!Houve,!nesse!período,!naquele!país,!
ampla!formação!de!engenheiros,!por!exemplo.!E!o!pano!de!fundo!para!essa!disputa!
foi!também!a!dificuldade!da!Alemanha!na!obtenção!de!colônias!na!África,!de!onde!se!
extraíam!matérias=primas!para!a!produção!de!bens.!Em!resumo,!na!Europa,!apoio!à!
ciência,! reforma! universitária,! Revolução! Industrial! e! colonialismo! estavam,! a! seu!
modo,!entrelaçados.!
!
Também!na!década!de!1920,!houve,!no!Brasil,!a!fundação!da!Associação!Brasileira!de!
Educação! (ABE),! da! qual! vários! cientistas! (agora,! na! ABC)! faziam! parte.! Com! a!
implementação!(ainda!que!inicial)!da!ideia!de!que!era!importante!fazer!‘ciência!pura’!
no!Brasil!e!de!que!a!área!de!educação!igualmente!merecia!atenção!e!planejamento!
(um!dos!papéis!da!ABE),!parecia!fazer!parte!de!uma!visão!de!que!o!Brasil!apontava!
sua!proa!na!direção!do!rumo!tomado!ainda!no!século!19!pelas!nações!civilizadas!–!o!
farol! naquele! momento! era! a! Europa,! pois! a! ciência! nos! EUA,! em! muitos! campos!
(inclusive,!a!física),!era!ainda!ganhava!momento.!!
!
A!evolução!dos!eventos!históricos!sobre!a!realidade!dos!fótons!nos!mostra!um!fato!
que! poucos! historiadores! da! física! parecem! ter! percebido:! Einstein! foi! o! que!
poderíamos! chamar! maior! especialista! em! mecânica! estatística! do! primeiro! quatro!
do!século!passado.!Esse!programa!tem!seu!ápice!com!a!proposição!do!fóton!(1905),!
passando! vários! artigos! importantes! por! volta! de! 1910! e! 1915! (por! exemplo,!
opalescência! crítica! e,! em! parte,! a! emissão! estimulada),! e! tendo! seu! ocaso! com! o!
condensado!de!Bose=Einstein!(1925).!
%
%

! 118!
II1.%Os%postulados%da%mecânica%quântica%
Os! fundamentos! da! mecânica! quântica! foram! introduzidos! na! Parte! I! deste! texto,!
incluindo! aspectos! históricos.! Nesta! segunda! parte! veremos! o! seu! formalismo!
matemático!e!diversas!aplicações.!Destacam=se!as!técnicas!de!segunda!quantização,!
e! o! conceito! de! matriz! densidade,! além! da! própria! estrutura! formal! da! teoria.! A!
primeira!permite!não!apenas!a!diagonalização!de!hamiltonianos!de!!problemas!com!
muitos! componentes,! mas! também! uma! descrição! unificada! baseada! na! natureza!
quântica!das!partículas!(bósons!ou!férmions).!A!segunda!é!uma!ferramenta!poderosa!
para! o! cálculo! de! observáveis! termodinâmicos! a! partir! do! conhecimento! do!
hamiltoniano! do! sistema,! o! que! permite! uma! comparação! direta! com! dados!
experimentais.!!
!
O!formalismo!da!mecânica!quântica!é!construído!sobre!quatro!postulados:!
Postulado% 1:! Espaço* de* estados! –! Para! todo! sistema! físico! isolado! existe!
associado! um! espaço! vetorial! complexo,! chamado! de! espaço! de! estados,! também!
conhecido!como!espaço!de!Hilbert.!A!cada!estado!físico!do!sistema!corresponde!um!
vetor!no!espaço!de!Hilbert,!chamado!ket!ou!vetor!de!estado,!representado!por1:!
!
Ψ ! (II1.1)!

O!vetor!conjugado!transposto!de!um!ket!é!chamado!de!bra!e!representado!por2:!
!
(II1.2)!
Ψ !

O! produto! escalar! entre! dois! vetores! de! estado! quaisquer! é! chamado! braket! e!
representado!por:!
!
ΨΦ ! (II1.3)!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
1!Esta!notação!foi!introduzida!por!Paul!A.!M.!Dirac!em!1939!no!artigo:!A"new"notation"for"

quantum"mechanics,!Math.&Proc.&Cambridge&Philos.&Soc.,!35!(1939)!416.!!
2!Em!matemática,!todo!espaço!vetorial!tem!um!espaço!dual!correspondente.!Os!elementos!do!

espaço!dual!dos!kets!são!os!bras.!O!produto!escalar,!!resultado!da!ação!de!um!bra!sobre!um!ket,!é!
uma!operação!linear!que!associa!um!número!complexo!a!cada!vetor!de!estado.!!

! 119!
Os!vetores!de!estado!no!espaço!de!Hilbert!são!normalizados,!condição!representada!
pelo!produto!escalar:!
Ψ Ψ =1! (II1.4)!
!
!

!
!
Como!ocorre!em!qualquer!espaço!vetorial,!os!vetores!de!estado!no!espaço!de!Hilbert!
podem!ser!expandidos!em!diferentes!bases.!A!título!de!comparação,!no!ℜ! !um!vetor!
A!qualquer!pode!ser!expandido!na!base!de!coordenadas!retangulares:!
!
! = !! ! + ! !! ! + ! !! !,%
!
ou!na!base!de!coordenadas!esféricas:!
!
! = ! !! ! + ! !! ! + ! !! !,!
!

! 120!
ou!em!qualquer!outra!base.!O!vetor!A!permanece!o!mesmo,!tendo!mudado!apenas!a!
sua!representação.!Os!elementos!da!base!são!em!geral!ortonormais!entre!si,!embora!
isso!não!seja!estritamente!necessário.!
!

!
! Figura!II1.1!–!No!espaço!R3,!um!vetor!qualquer!é!escrito!como!uma!
combinação!linear!de!três!componentes!mutuamente!ortogonais.!No!espaço!
! de!Hilbert,!um!vetor!de!estado!(ket)!é!escrito!como!uma!combinação!linear!de!
vetores!mutuamente!ortogonais!e!pode!ter!dimensão!infinita!!
!
!
No!espaço!de!Hilbert,!as!bases!vetoriais!podem!ser!discretas!ou!contínuas,!finitas!ou!

infinitas.! As! bases! contínuas! são! sempre! infinitas.! Representamos! por! { n } !uma!
base!no!espaço!de!Hilbert.!A!condição!de!ortonormalidade!da!base!é!dada!por:!
!
n m = δn,m ! (II1.5)!
!
Em!um!espaço!discreto,!um!vetor!de!estado!escrito!nessa!base!é!representado!por:!
!

Ψ = ∑ cn n ! (II1.6)!
n

! 121!
onde! os! coeficientes! da! expansão,! cn,! são! números! complexos! que,! como! veremos!
adiante,! são! amplitudes! de! probabilidade.! A! normalização! do! vetor! de! estado!
implica:!
!
2
Ψ Ψ = ∑ cm* cn m n = ∑ cn = 1 (II1.7)!
n,m n !
!
Repare! que! a! igualdade! mais! à! direita! é! a! propriedade! de! uma! soma! de!
probabilidades.!Voltaremos!a!isso!mais!adiante.!!
!
Usando!a!propriedade!do!produto!escalar,!o!vetor!de!estado!pode!ser!projetado!em!
qualquer!“direção”!no!espaço!de!Hilbert:!
!

m Ψ = ∑ cn m n = cm (II1.8)!
n !!!!!
!
Tomando!o!conjugado!transposto!de!(II1.6),!deduz=se!que:! cm* = Ψ m .!

!
Outro!tipo!de!produto!que!pode!ser!construído!com!vetores!de!estado!é!o!análogo!
ao!produto!tensorial!de!vetores3!no!ℜ! ,!representado!por:!
!
Ψ Φ (II1.9)!
!
!
Mais!adiante,!veremos!que!o!resultado!desse!produto!não!é!outro!vetor,!mas!uma!
matriz.!!
!
Usando!os!resultados!acima,!podemos!deduzir!uma!importante!propriedade!da!base.!
Primeiro,!vamos!construir!o!operador! m m !e!aplicá=lo!a!um!estado:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
3!O!produto!tensorial!entre!dois!vetores,!também!chamado!de!produto!diádico,!! = ! , ! , ! !e!
! ! !
!! !! !! !! !! !!
! = !! , !! , !! ,!é!denotado!por!!⨂!,!e!dado!por:! !! !! !! !! !! !! .!
!! !! !! !! !! !!
!

! 122!
!

m m Ψ = ∑ cn m m n = cm m (II1.10)!
n !
!
Ou! seja,! o! operador!|! !|!projeta! o! vetor! de! estado!|Ψ !sobre! uma! “direção”!
particular! no! espaço! de! Hilbert.! Por! essa! razão,! operadores! com! essa! propriedade!
são! chamados! projetores.! Note! que! o! produto! escalar! desse! operador! por! ele!
mesmo! resulta! invariante.! De! fato,! qualquer! operador!!!que! tenha! a! propriedade!
!! = !!é!um!projetor.!!
!
Projetores! têm! uma! importante! propriedade! que! pode! ser! deduzida! da! forma! a!
seguir.!Seja!a!expansão!de!um!vetor!de!estado!em!uma!base!{|! }:!!
!

! Ψ = ∑ cn n = ∑ n Ψ n (II1.11)!
n n !
! !
A!quantidade! n Ψ !é!um!número!puro!e,!portanto,!podemos!escrever:!

!
# &
Ψ = ∑ n n Ψ = $∑ n n ' Ψ ⇒ ∑ n n = I ! (II1.12)!
n %n ( n

!
onde! I! é! a! matriz! identidade.! Essa! propriedade! deve! ser! satisfeita! para! qualquer!
base,!e!é!conhecida!como!completeza4.!!
!
Assim! como! os! vetores! no!ℜ! !podem! ser! escritos! como! matrizes! linha! ou! coluna,!
vetores! de! estado! são! representados! da! mesma! forma.! Um! estado! como! o! da! Eq.!
(II1.11)!pode!ser!escrito!como:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
4!Em!inglês,!o!termo!usado!é!completeness,!que!também!siginifica!plenitude.!!

! 123!
!!
!!
|Ψ = !! !!e!! Ψ| = (!!∗ !!∗ !!∗ … !!∗ )!!!!!! (II1.13)!

!!
!
Vejamos!o!caso!específico!de!um!spin!½!.!Uma!base!possível!para!tal!sistema!é!o!par!
de!autoestados:!!
!
1 0 (II1.14)!
|↑ = !!e!!|↓ = !!!!!!!!!!!!!!!!!!!
0 1
!
Qualquer!estado!de!um!spin!pode!ser!escrito!nessa!base!como:!
!
!
Ψ = ! ↑ + !|↓ = ! (II1.15)!
!
!
!
A!normalização!do!estado!requer!que:!
!

(II1.16)!
2 2
Ψ Ψ =1⇒ a + b =1
!
!
Essa! propriedade! é! a! mesma! que! a! das! funções! seno! e! cosseno,! o! que! permite!
parametrizar!o!estado!de!um!spin!½!utilizando!ângulos!esféricos!! θ!e! φ,!da!seguinte!
forma:!
!
"θ % "θ %
Ψ = cos $ ' ↑ + eiφ sin $ ' ↓ (II1.17)!
#2& #2& !
!
A!vantagem!dessa!representação!é!que!ela!oferece!um!quadro!geométrico!simples!
do!espaço!de!Hilbert!de!um!spin!como!sendo!uma!esfera,!a!qual!é!conhecida!como!
esfera! de! Bloch.! Qualquer! estado! pode! ser! mapeado! em! um! par! de! ângulos! θ! e! φ!
sobre! essa! esfera.! Em! particular,! os! autoestados! da! base! são! os! polos! opostos! da!
esfera,!como!mostra!a!Figura!II1.2.!!

! 124!
!
!

Ψ
θ

!
Figura!II1.2!–!A!esfera!de!Bloch!representa!o!espaço!de!Hilbert!de!um!spin!1/2!
Outra! base! interessante! para! representar! os! estados! de! um! spin! ½! é! a! seguinte,!
.!Qualquer!estado!pode!ser!mapeado!em!apenas!dois!ângulos;!os!estados!que!
formada!pelos!vetores! + !e! − definidos!por:!!
formam!a!base!ficam!nos!polos!da!esfera!!!

!
↑ +↓
+ =
2 (II1.18)!
↑ −↓
− =
2 !
!
Repare! que! esses! vetores! satisfazem! os! requisitos! para! compor! uma! base:! são!
ortonormais! e! atendem! à! condição! de! completividade.! Na! esfera! de! Bloch,! eles! se!
encontram!em!pontos!opostos!sobre!o!eixo!X.!!
!
Postulado%2:!Evolução*de*estados!–!A!evolução!de!um!sistema!físico!isolado!é!
representada!por!uma!transformação!unitária,!U,!atuando!sobre!o!estado!no!espaço!
de!Hilbert,!representada!por:!
!
|Φ = !|Ψ → Φ| = Ψ|! ! → !! ! = !!
(II1.19)!
!
A!propriedade!de!unitariedade!implica!a!conservação!da!norma!do!estado,!!
!
Φ Φ = Ψ U +U Ψ = Ψ Ψ = 1 ,! (II1.20)!
!
e!também!na!reversibilidade!da!transformação:!

! 125!
!
Ψ = U −1 Φ (II1.21)!
!
!
Evolução* temporal* de* estados! –! Um! tipo! particularmente! importante! de!
transformação!é!a!evolução!temporal!de!vetores!de!estado!de!um!sistema!isolado.!
Tal!evolução!é!descrita!pela!equação!de!Schroedinger:!
!

i! Ψ = H Ψ ,! (II1.22)!
∂t
!
onde!H!é!o!hamiltoniano!do!sistema.!Se!H!não!depender!do!tempo,!a!solução!dessa!
equação!é!dada!por:!
!
# Ht &
Ψ(t) = exp % −i ( Ψ(0) (II1.23)!
$ ! ' !
!
Vemos,!portanto,!que!para!evoluções!temporais!o!operador!unitário!U!é!dado!por:!
!
" Ht %
U(t) = exp $ −i ' ,! (II1.24)!
# ! &
!
o! que! garante! a! conservação! da! norma! e! reversibilidade! temporal.! Se! durante! um!
intervalo!de!tempo!t1!o!sistema!é!atuado!por!um!hamiltoniano!H1;!durante!t2!por!H2;!
etc.,!tn!por!Hn,!a!evolução!temporal!total!do!estado,!de!t1!até!tn,!é:!
!
!
# Ht & # H t & # Ht & # Ht &
Ψ(tn ) = exp % −i n n ( exp % −i n−1 n−1 ("exp % −i 2 2 ( exp % −i 1 1 ( Ψ(0) (II1.25)!
$ ! ' $ ! ' $ ! ' $ ! ' !
!
!
Note! que,! em! uma! sequência! como! essa,! os! hamiltonianos! podem! conter!
operadores! que! não! comutam! entre! si! e,! portanto,! o! produto! dos! operadores! de!

! 126!
evolução! não! pode! ser! substituído! por! um! único! operador! com! uma! soma! de!
hamiltonianos.!!!
!
Como!exemplo!de!evolução!temporal!de!estado!em!um!espaço!discreto,!considere!
um! spin! ½! em! um! campo! magnético! uniforme! na! direção! Z.! O! hamiltoniano! para!
esse!sistema!é:!
!
! = ! −!! ∙ ! = ! −2!! !! !! = ! −!!! !! !! ! (II1.26)!
!
onde!!! = 2!! .!Como!esse!hamiltoniano!independe!de!t,!o!vetor!de!estado!em!um!
instante!qualquer!será:!
!
) #µ B & # µ B &,
Ψ(t) = e−iHt/! Ψ(0) = e+i( µB B0t/!)σ z Ψ(0) = * I cos % B 0 t ( + iσ z sin % B 0 t (- Ψ(0) !
+ $ ! ' $ ! '.

! (II1.27)!
Supondo! que,! em! t* =* 0,! o! estado! fosse! Ψ(0) = + !e! tendo! em! conta!

que:!!!!
!
↑ +↓ ↑ −↓
!! σ z + = σ z = = − ,!
2 2
ficamos!com:!
!
"µ B % "µ B %
Ψ(t) = cos $ B 0 t ' + + isin $ B 0 t ' − ! (II1.28)!
# ! & # ! &
!
Esse!resultado!representa!um!vetor!que!gira!no!plano!X=Y!da!esfera!de!Bloch,!com!
frequência!angular!!! = !!! !! /ℏ.!Note!que,!para!!! ! = !",!com!n!inteiro,!o!estado!
Ψ(t) será!autoestado!de!!! !e!para!!! ! = !"/2!será!autoestado!de!!! .!

! 127!
Postulado%3:!Composição*de*estados!–!Os!elementos!do!espaço!de!Hilbert!de!
sistemas! físicos! compostos! é! formado! pelo! produto! tensorial! dos! elementos! dos!
espaços!individuais.!!
!
Por!exemplo,!os!elementos!de!um!sistema!de!dois!spins!½!são!dados!por:!
!

{ ↑ , ↓ } ⊗ { ↑ , ↓ } = { ↑↑ , ↑↓ , ↓↑ , ↓↓ } ! (II1.29)!
!
De!um!modo!geral,!para!N!spins!½,!o!número!de!elementos!do!sistema!composto!é!
2! ,!igual!à!dimensão!do!espaço!de!Hilbert.!Note!que,!para!cada!spin!adicionado,!o!
espaço!dobra!de!tamanho:!2!!! = 2×2! .!O!crescimento!exponencial!da!dimensão!
com!o!número!de!componentes!do!sistema!é!a!principal!dificuldade!para!a!realização!
de!cálculos!numéricos!em!sistemas!!com!um!grande!número!de!componentes.!Por!
exemplo,! um! sistema! com! apenas! 100! spins! tem! um! espaço! de! Hilbert! com!
dimensão!2!"" !~!10!" .!
!
Nesse! ponto! é! importante! introduzir! a! convenção! para! representar! estados! de!
sistemas!compostos.!No!exemplo!dado!em!(II1.27),!se!os!elementos!à!esquerda!do!
produto!tensorial!pertencem!ao!sistema!“A”!e!os!da!direita!ao!sistema!“B”,!a!mesma!
ordem! deve! ser! seguida! nos! elementos! do! sistema! composto.! Por! exemplo,! o!
primeiro!dos!quatro!elementos!à!direita!representa!o!estado!em!que!os!spins!“A”!e!
“B”! estão!up.! No! segundo! elemento,! “A”! está!up! e! “B”!down.! No! terceiro! “A”! está!
down!e!“B”!up.!E!no!último!ambos!estão!down.!Sem!essa!convenção,!uma!operação!
como!!!! |↓↑ !fica!indefinida.!
!
Postulado% 4:! Medidas! –! Os! possíveis! resultados! de! uma! medida! de! um!
observável! feita! sobre! um! sistema! em! um! estado! quântico! são! descritos! por! um!
conjunto!de!operadores!projetores!que!atuam!sobre!o!estado.!Usando!novamente!o!
exemplo! de! um! spin! ½,! os! dois! operadores! M↑ = ↑ ↑ !e! M↓ = ↓ ↓ !são! projetores!

de!medidas.!De!fato,!considere!um!estado!genérico:!!
!

! 128!
Ψ = a ↑ +b ↓
!
!
Atuando!com! M↑ !sobre!esse!estado,!resulta:!

!
↑ ↑Ψ =a↑ (II1.30)!
!
!
2
Ou!seja,!o!estado! Ψ foi!projetado!sobre!a!“direção”! ↑ .!Porém,!sabemos!que! a !é!
2
a!probabilidade!de!o!estado!“spin!up”!ser!encontrado!na!medida!–!assim!como! b é!

a! probabilidade! de! encontrar! “spin=down”! –.! Portanto,! podemos! escrever! o!


seguinte:!
!
2
a = ↑ Ψ ⇒ aa* = a = Ψ ↑ ↑ Ψ = Ψ M↑ Ψ ! (II1.31)!

!
Podemos! generalizar! dizendo! o! seguinte:! se! !! !representa! um! conjunto! de!
projetores! de! medidas! sobre! o! estado! Ψ ,! a! probabilidade,! !(!) ,! de! que! o!

resultado!“k”!seja!encontrado!é5:!
!
p(k) = Ψ M k Ψ (II1.32)!
!
!
O!estado!projetado!logo!após!a!medida!é!dado!por:!
!
Mk Ψ Mk Ψ (II1.33)!
Φk = =
p(k) Ψ Mk Ψ
!
!
Em! mecânica! quântica,! a! medida! de! um! estado! é! um! dos! problemas! mais!
controversos,! não! por! conta! do! formalismo! matemático,! o! qual! reproduz!
perfeitamente! os! resultados! experimentais.! O! problema! é! o! quadro! físico! que!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
5!É!possível!ir!mais!adiante!nessa!definição!e!incluir!operadores!de!medidas!que!não!são!

projetores.!Nesse!caso,! p(k) = Ψ M k+ M k Ψ .&Ver!M.!Nielsen!e!I.!Chuang,!Computação"


Quântica"e"Informação"Quântica,!Bookman!(São!Paulo,!2003).!

! 129!
emerge!do!ato!da!medida.!Considere!um!estado!genérico,!expandido!em!uma!base!
|! :!
!

Ψ = ∑ ck k
k !
!
Uma! medida! feita! sobre! esse! estado! projeta! o! vetor,! instantaneamente,! sobre! um!
dos! autoestados! da! base.! Embora! não! seja! definido! (e! longe! de! ser! claro),! tal!
processo! envolve! algum! tipo! de! evolução! temporal! que! não! está! contemplada! no!
Postulado!2.!Este!é!o!chamado!problema!do!colapso!da!função!de!onda.!O!problema!
fica!ainda!mais!complicado!quando!se!consideram!medidas!sobre!estados!de!mais!de!
um!componente,!como!estados!emaranhados,!como!se!verá!adiante.!!
!
II2.%Representação%matricial%de%operadores%
As! transformações! de! vetores! no! !ℜ! !(por! exemplo,! rotações)! podem! ser! descritas!
pela!atuação!de!matrizes!3×3.!O!similar!ocorre!com!transformações!de!estados!no!
espaço! de! Hilbert.! Dado! um! operador! O! e! uma! base! { n } qualquer,! chamamos!
elementos!de!matriz!do!operador!os!objetos:!
!
Om,n = m O n (II2.1)!
!
!
Os!objetos!assim!construídos!permitem!que!o!operador!O!seja!representado!como!
uma! matriz,! cujas! linhas! são! indexadas! pelos! bras! e! as! colunas! pelos! kets.! Por!
exemplo,! considere! o! operador! de! spin! do! elétron,!!! ,! atuando! nos! elementos! da!
base! { ↑ , ↓ } :!


!! |↑ = + |↑ !!
2
(II2.2)!

!! |↓ = − |↓ !
2
!
Os!elementos!de!matriz!desse!operador!nessa!base!são:!!
!

! 130!

!!!! = ↑ !! ↑ = + ,
2

!!!" = ↑ !! ↓ = 0, !!!!" = ↓ !! ↑ = 0, !!!!! = ↓ !! ↓ = − !!!
2
! (II2.3)!
Logo,!a!matriz!de!!! !nessa!base!é:!
!
ℏ 1 0
!! = + ! (II2.4)!
2 0 −1
!!
Repare! que,! se! a! base! for! outra,! a! representação! matricial! do! operador! muda.! Por!
exemplo,! considere! a! base! descrita! pela! Eq.! (II1.18).! A! atuação! de!!! !naquela! base!
resulta!em:!

!! |+ = + |− !!
2 (II2.5)!

!! |− = + |+ !
2
!
Portanto,!nesta!base,!a!representação!matricial!de!!! !é:!!
!
ℏ 0 1 (II2.6)!
!! = + !
2 1 0
!
Nesse!ponto,!é!interessante!introduzir!as!matrizes!de!Pauli,!definidas!por:!!
!
ℏ ℏ ℏ (II2.6)!
!! = !! , !! = !! , !! = !! !!
2 2 2
!
Na!base! { ↑ , ↓ } ,!são!representadas!por:!

! 131!
$ 0 1 '
↑ σ x ↑ = 0; ↑ σ x ↓ = 1; ↓ σ x ↑ = 1; ↓ σ x ↓ = 0 ⇒ σ x = & )
% 1 0 (
$ 0 −i ' !
↑ σ y ↑ = 0; ↑ σ y ↓ = −i; ↓ σ y ↑ = i; ↓ σ y ↓ = 0 ⇒ σ x = & )
% i 0 (
$ 1 0 '
↑ σ z ↑ = 1; ↑ σ z ↓ = 0; ↓ σ z ↑ = o; ↓ σ z ↓ = −1 ⇒ σ x = & ) (II2.7)!
% 0 −1 (

!
!
Tomemos!agora!novamente!o!estado!genérico:!
!
Ψ = ∑ cn n !
n

!
Vamos!construir!a!seguinte!operação,!semelhante!ao!elemento!de!matriz!de!um!
observável!O:!
!
Ψ O Ψ = ∑ cm* cn m O n = ∑ cm* cnOm,n !
m,n m,n (II2.8)!

!
Agora,!se!os!elementos!da!base! { n } !forem!autoestados!de!O,!ou!seja,!se

O n = λn n ,!obtemos:!

!
2
Ψ O Ψ = ∑ cn λn ! (II2.9)!
n

!
Porém,! do! Postulado! 4,! sabemos! que! !! ! !é! a! probabilidade! de! se! encontrar! o!
autovalor!!! !em! uma! medida! de! O.! Portanto,! a! expressão! acima! representa! o!
valor!médio!dos!autovalores!do!operador!O.!Essa!quantidade!é!chamada!de!valor!
esperado&de&O!no!estado!|Ψ ,!e!usafse!o!símbolo! ! !para!representáfla.!!
!
As!propriedades!físicas!de!um!sistema!(como!posição,!momento,!energia!etc.)!são!
representadas! por! operadores! quânticos! que! são! chamados! observáveis.! A!
matriz!de!um!observável!necessariamente!deve!ter!autovalores!reais,!bem!como!

! 132!
o! seu! valor! esperado,! pois! são! esses! os! valores! que! se! obtêm! de! medidas! em!
experimentos.!Matematicamente!isto!é!garantido!impondofse!que!os!observáveis!
sejam!operadores!hermitianos6.!
!
Como!exemplo!de!aplicação!desses!conceitos,!vamos!estudar!o!problema!de!dois!
spins!½!acoplados,!segundo!o!hamiltoniano!abaixo:!
!
(II2.10)!
H = E1σ 1z + E2σ 2 z − E12σ 1xσ 2 x !

!
A!representação!matricial!desse!hamiltoniano!na!base! { ↑↑ , ↑↓ , ↓↑ , ↓↓ } é:!

!
" E +E 0 0 −E12 %
$ 1 2
'
$ 0 E1 − E2 −E12 0 ' (II2.11)!
H =$ '!
$ 0 −E12 −E1 + E2 0 '
$ −E12 0 0 −E1 − E2 '&
#

As!autoenergias!deste!sistema!devem!ser!obtidas!diagonalizandofse!H.!São!elas7:!
!
2
ε1 = − E122 + E22 − 2E1E2 + E12 = − E122 + ( E1 − E2 )
2
ε 2 = + E122 + E22 − 2E1E2 + E12 = + E122 + ( E1 − E2 )
!
2 2 2 2 2 (II2.12)!
ε3 = − E + E + 2E1E2 + E = − E + ( E1 + E2 )
12 2 1 12

2
ε 4 = + E122 + E22 + 2E1E2 + E12 = + E122 + ( E1 + E2 )

!
Vemos,! portanto,! que,! se! todas! as! energias! forem! positivas,! teremos!
ε3 < ε1 < ε 2 < ε 4 .!Ou!seja,!nesse!caso,!o!estado!fundamental!será!!! .!
!
II3."Emaranhamento"de"spins"
Considere!os!seguintes!estados!de!dois!spins:!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
6!Uma!matriz!A!é!hermitiana!se!ela!é!igual!à!sua!transposta!conjugada,!A+!,!obtida!trocandofse!

linhas!por!colunas,!ao!mesmo!tempo!em!que!se!toma!o!complexo!conjugado!dos!seus!elementos.!
7!Não!é!tarefa!simples!diagonalizar!uma!matriz!como!essa.!Felizmente,!existem!programas!

gratuitos!na!internet!que!fazem!isso.!Veja,!por!exemplo,!o!site:!
http://wims.unice.fr/~wims/wims.cgi!.!

! 133!
!
↑↑ + ↑↓
Ψ1 =
2 (II3.1)!
!
↑↑ + ↓↓
Ψ2 =
2
!
Seja! agora! o! operador! de! medida! do! spin! 1! (primeiro! símbolo! do! par):!
M1↑ = ↑ ↑ .!Aplicando!este!operador!sobre!! Ψ1 !!resulta:!

!
↑ ↑↑↑ + ↑ ↑↑↓
↑ ↑ Ψ1 = = Ψ1 (II3.2)!
2 !
!
Ou! seja,! após! a! medida,! o! spin! 1! permanece! no! autoestado! “up”,! e! o! spin! 2,! na!
superposição!original.!Agora,!repita!o!procedimento!para!o!segundo!estado:!
!
↑ ↑↑↑ + ↑ ↑↓↓ 1 (II3.3)!
↑ ↑ Ψ2 = = ↑↑ !
2 2
!
Segundo!o!Postulado!4,!a!probabilidade!de!encontrarmos!o!spin!1!em!“up”!após!a!
medida!é:!
p(↑) = Ψ 2 ↑ ↑ Ψ 2 = 50% ! (II3.4)!
!
Porém,!uma!vez!feita!a!medida!e!encontrado!“up”,!o!estado!posterior!será!(ainda!
segundo!o!Postulado!4):!
1 ↑↑
Φ = 2 = ↑↑ !
1 (II3.5)!
2
!
Ou! seja,! após! a! medida,! não! só! o! spin! 1! estará! em! “up”,! mas! também! o! spin! 2,!
ainda! que! nenhuma! medida! tenha! sido! feita! sobre! ele!! E,! mais! estranho! ainda,!
esse!resultado!independe!da!distância!entre!os!dois!spins:!na!medida!em!que!o!
estado!for!mantido,!o!resultado!será!sempre!o!mesmo:!todas!as!vezes!que!uma!
medida!sobre!o!spin!1!resultar!em!up,!o!spin!2!também!irá!para!up.!E,!todas!as!

! 134!
vezes! que! o! resultado! da! medida! sobre! 1! for! down,! o! segundo! também! será!
encontrado! em! down.! Ou! seja,! nesse! estado! emaranhado,! os! dois! spins! estão!
perfeitamente!correlacionados.!!!
!
Como! foi! mencionado! no! Bloco! I,! essa! correlação! já! foi! testada!
experimentalmente!inúmeras!vezes,!com!as!partículas!a!dezenas!de!quilômetros!
de!separação.!Estados!emaranhados!são!um!ingrediente!essencial!em!aplicações!
em!computação!e!comunicação!quânticas,!como!se!verá!no!Bloco!III.!Lá,!também!
veremos! como! esses! estados! podem! ser! produzidos! de! forma! controlada! em!
laboratório.!!
!
No! entanto,! para! que! as! correlações! quânticas! de! estados! emaranhados! sejam!
observadas,!é!preciso!que!as!medidas!nos!dois!spins!sejam!feitas!na!mesma!base.!
Se!um!observador!fizer!a!sua!medida!na!base! { ↑ , ↓ } !e!o!outro!na!base! { + , − } ,!

a!correlação!não!será!observada8.!No!entanto,!qualquer!que!seja!a!base!comum!
escolhida! pelos! dois! observadores,! a! correlação! será! a! mesma.! Para! ver! isso,!
suponha!que!se!faça!uma!mudança!de!base,!de! { ↑ , ↓ } !para! { + , − } :!

!
↑↑ + ↓↓ 1 $+ +− + +− + − − + − − ' ++ + −− (II3.6)!
= % • + • (=
2 2& 2 2 2 2 ) 2 !
!
!
! !
Ou!seja,!na!nova!base,!todas!as!vezes!em!que!o!resultado!“+”!for!encontrado!em!
um! dos! spins,! o! outro! também! será.! O! mesmo! ocorre! para! o! resultado! “−”.!
Fisicamente,! estados! de! spins! são! medidos! aplicandofse! campos! magnéticos! na!
direção! da! componente! que! se! deseja! medir,! como! em! um! aparelho! de! Sternf
Gerlach.!Por!construção,!os!estados!“up”!e!“down”!devem!ser!medidos!ao!longo!
de!Z,!enquanto!os!estados!“+”!e!“−“!ao!longo!de!X.!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
8!No!exemplo!anterior,!suponha!que!o!primeiro!observador!obtenha!o!estado!“up”!medindo!na!

base!de!Z.!Se!o!segundo!observador!também!medir!em!Z,!encontrará!“up”!com!100%!de!chance.!
Mas,!se!medir!na!base!de!X,!encontrará!“up”!com!apenas!50%!de!chance!e!“down”!também!com!
50%.!

! 135!
!
Finalmente,!vale!mencionar!que!estados!emaranhados,!como!o!estado!acima,!não!
podem!ser!fatorados!em!nenhum!produto!de!estados!individuais!de!spin.!Ou!seja,!
um! estado! emaranhado! não! é! um! estado! composto,! no! sentido! do! Postulado! 3;!
dizfse!que!o!estado!é!não>separável.!!Para!ver!isso,!tome!dois!estados!de!um!spin!
e!faça!o!produto!tensorial!entre!eles:!
!
Ψ = a ↑ +b ↓
Φ =c↑ +d ↓ ! (II3.7)!
Ψ ⊗ Φ = ac ↑↑ + ad ↑↓ + bc ↓↑ + bd ↓↓

!
As! condições! para! que! esse! estado! seja! emaranhado,! como! o! estado!|Ψ! !em!
(II3.1),!exigem!que:!!
1
ac = bd = ;ad = bc = 0 ,!
2
que! são! obviamente! incompatíveis! entre! si.! Portanto,! não! existem! estados! de! 1!
spin!cujo!produto!resulte!em!um!estado!emaranhado.!!
!
O!estado!|Ψ! !é!um!exemplo!de!estado!que!tem!grau!máximo!de!emaranhamento!
entre!dois!spins.!Ele!é!conhecido!como!o!estado!do!gato!–!referência!ao!famoso!
problema! do! gato! de! Schroedinger! –! e! representado9!por! Ψ + !.! Existem! outros!

três!estados!de!dois!spins!com!emaranhamento!máximo:!
!
↑↑ − ↓↓
Ψ− =
2
↑↓ + ↓↑ (II3.8)!
Φ+ = !
2
↑↓ − ↓↑
Φ− =
2
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
↑↑ + ↓↓
9!Daqui!para!frente,!usaremos!a!notação! Ψ+ = !para!o!estado!do!gato.!!
2
!

! 136!
Juntos,! esses! quatro! estados! formam! uma! base! de! estados! de! dois! spins,!
chamada!!Base!de!Bell.!
!
II4."Violação"da"desigualdade"de"Bell"
Vimos,!no!Bloco!I,!que,!dadas!quatro!variáveis!aleatórias!dicotômicas!clássicas,!Q,!
R,! S! e! T,! o! teorema! de! Bell! afirma! que! existe! um! limite! máximo! para! as!
correlações! estatísticas! que! podem! existir! entre! elas.! O! teorema! é! expresso! na!
desigualdade:!
!
−2 ≤ (Q + R)S + (R − Q)T ≤ +2 ! (II4.1)!
!
Vamos! agora! considerar! variáveis! aleatórias! dicotômicas! quânticas:! spins.!
Imagine! que! dois! observadores! estejam,! cada! um,! com! um! spin! de! um! par!
emaranhado.! O! observador! 1! faz! uma! medida! do! seu! spin! ao! longo! de! X! ou! Z,!
após! escolhida! aleatoriamente! uma! dessas! duas! direções.! Da! mesma! forma,! o!
observador!2!escolhe!aleatoriamente!medir!ao!longo!de!outras!duas!direções,!u!
ou!v,!dadas!por:!
−i − k −i + k
u= ;v = !
2 2
A!Figura!II4.1!mostra!essas!direções.!!
!

! 137!
Figura!II4.1!–!Em!um!teste!de!violação!da!desigualdade!de!Bell,!cada!
observador!recebe!um!spin!de!um!par!emaranhado!e!escolhe!aleatoriamente!
uma!entre!duas!direções!dadas!para!fazer!a!sua!medida!
!
!
Note! que! as! componentes! do! spin! ao! longo! de! u! e! v! podem! ser! escritas! como!
combinações!das!matrizes!de!Pauli:!
!
!" −σ − σ z
σu = σ •u = x
2
!" !
−σ x + σ z (II4.2)!
σv =σ •v =
2
!
A!medida!de!qualquer!componente!do!spin!ao!longo!de!qualquer!direção!sempre!
retornará!+1!ou!−1.! Portanto,! podemos! fazer! a! seguinte! identificação! entre! as!
componentes!de!spin!e!as!variáveis!aleatórias!do!teorema!de!Bell:!
!
Q ↔σ z
R ↔σ x (II4.3)!
!
S ↔σu
T ↔σv
!
Substituindo!na!desigualdade,!obtemos:!
!
(II4.4)!

! 138!
{
−2 ≤ − 2 σ x(1)σ x(2) + σ z(1)σ z(2) } ≤ +2 ,!
!
O! termo! entre! chaves! pode! ser! facilmente! calculado! para! qualquer! estado.! Por!
exemplo,!para!o!estado!separável:!
!
↑↑ + ↑↓ (II4.5)!
Ψ = !
2
!
o! resultado! é! zero! e,! portanto,! satisfaz! à! desigualdade! de! Bell.! Porém,! para! o!
estado! Φ− da!base!de!Bell,!o!resultado!é:!

!
↑↓ − ↓↑ − ↑↓ + ↓↑
Φ− σ z(1)σ z(2) Φ− = σ z(1)σ z(2) = • = −1
2 2
↑↓ − ↓↑ − ↑↓ + ↓↑
Φ− σ x(1)σ x(2) Φ− = σ x(1)σ x(2) = • = −1
2 2
{
⇒ − 2 σ x(1)σ x(2) + σ z(1)σ z(2) } = +2 2 (II4.6)!
!
!
Ou! seja,! viola! o! limite! superior! imposto! pelo! teorema.! Isso! significa! que! as!
correlações! existentes! nesse! (e! nos! outros)! estados! da! Base! de! Bell! não!podem!
ser!explicadas!pelas!premissas!clássicas!assumidas!no!teorema!de!Bell.!!
!
Finalmente,! cabe! enfatizar! que! nem! todo! estado! emaranhado! viola! a! mesma!
desigualdade! de! Bell.! De! fato,! dado! um! estado! emaranhado,! é! preciso! construir!
uma!desigualdade!específica!para!ele.!Por!isso,!existem!muitas!desigualdades!do!
tipo! Bell,! com! nomes! diversos.! É! sempre! importante! lembrar! que! essas!
correlações! quânticas! já! foram! testadas! diversas! vezes! por! diferentes! grupos!
experimentais!ao!redor!do!mundo.!No!entanto,!por!muitos!anos,!os!experimentos!
apresentaram! “brechas”,! que! ficaram! conhecidas! na! literatura! científica! como!
loopholes.!Um!exemplo!de!brecha!experimental!é!a!eficiência!de!um!contador!de!
fótons.! Se! a! eficiência! for! baixa,! nada! garante! que! a! estatística! da! medida! é!
representativa! da! totalidade! de! pares! (problema! da! amostragem,! discutido! na!
Sec.!I21).!Outro!exemplo!é!a!proximidade!entre!a!fonte!dos!pares!emaranhados!e!

! 139!
os! locais! de! detecção! das! partículas.! Se! houver! proximidade,! o! critério! de! nãof
localidade!fica!comprometido.!E!assim!por!diante.!!!
!
Apenas! em! outubro! de! 2015! foi! publicado! na! revista! Nature! resultados!
experimentais!que,!pela!primeira!vez,!testaram!as!“ações!fantasmas”!de!estados!
emaranhados!livres!de!brechas.!!
!
!

!
!
II5"Espaços"contínuos"
Naturalmente,! espaços! de! Hilbert! não! são! apenas! discretos,! mas! também!
contínuos.! As! bases! contínuas! são! representadas! de! forma! semelhante! às!
discretas:!
!
Base!de!posição:!

{ r }! (II5.1)!

Base!de!momento:!

{ p }! (II5.2)!
Ortonormalidade:!
r r' = δ (r − r')
! (II5.3)!
p p' = δ (p − p')

! 140!
Completividade:!
|! !|! ! ! = !
! (II5.4)!
|! !|! ! ! = !!

!
A!função!de!onda!de!um!sistema!de!variáveis!contínuas!é!a!representação!obtida!
pela!projeção!do!vetor!de!estado!sobre!uma!base!contínua:!
!
ψ (r) = r Ψ
ψ (p) = p Ψ (II5.5)!
!
!
A!primeira!é!a!representação!de!posição;!e!a!segunda,!de!momento.!Um!resultado!
particularmente! interessante! é! obtido! da! projeção! de! um! autoestado! de!
momento!sobre!a!base!de!posições:!
!
1 !i $
rp = 3/2
exp # p • r & !
( 2π !) "! % (II5.6)!

!
Esse! resultado! pode! ser! obtido! da! seguinte! forma:! tome! o! elemento! de! matriz!
entre! r !e! r' !da!relação!de!competividade!para!o!momento:!

∫ r p p r' d 3 p = r r' = δ (r − r') (II5.7)!


!
!
Mas,!por!outro!lado,!sabemos!que!a!função!delta!pode!ser!representada!por:!
!
+∞
1
3/2 ∫
e−ip⋅(r−r')/! d 3 p = δ (r − r') (II5.8)!
(2π !) −∞
!
!
De!onde!se!segue!a!relação!desejada.!A!partir!desse!resultado,!podefse!obter!uma!
relação!entre!as!representações!de!posição!e!momento!da!função!de!onda:!
!

! 141!
p Ψ = ψ (p) = p ∫ r r d 3r Ψ = ∫ p r r Ψ d 3r
1 ip•r/!
ψ (p) = ∫ ψ (r)e d 3r
( 2π !)
3/2
(II5.9)!
!
!
Ou!seja,!uma!representação!é!a!transformada!de!Fourier!da!outra.!!
!
Como!exemplo!de!aplicação!de!um!problema!de!espaço!contínuo,!considere!uma!
partícula! sujeita! a! uma! força! ! F(r) = −∇V (r) !,! tal! que! a! sua! função! de! onda!
satisfaça!à!equação!de!Schroedinger!na!representação!de!momento:!
!
# p2 & ∂
% − a∇ 2p (ψ (p, t) = i! ψ (p, t)
$ 2m ' ∂t
∂2 ∂2 ∂2 (II5.10)!
∇ 2p = + +
∂px2 ∂py2 ∂pz2
!
!
onde!!!é!uma!constante.!Perguntafse:!qual!é!a!expressão!da!força!atuando!sobre!
o!sistema?!Aplicando!o!laplaciano!na!expressão!da!representação!de!momento!da!
função!de!onda,!obtemos:!
!

2 1 r2
∇ ψ (p) = − ∫ ψ (r)eip•r/! d 3r
p
( 2π !)
3/2
! 2 (II5.11)!
!
!
Substituindo!na!equação!de!Schroedinger!acima,!vemos!que!o!hamiltoniano!é:!
!
p2 a 2
H= + r
2m ! 2 !
!
Ou!seja,!! ! = !!! ! /ℏ! .!Consequentemente:!! ! = ! − 2!/ℏ! !."
"
Como! outro! exemplo,! vamos! considerar! uma! versão! simplificada! do! famoso!
problema! da! fenda! dupla,! introduzido! na! Sec.! I13.! O! esquema! é! mostrado! na!
Figura!II5.1.!!
!

! 142!
!

x
!
! Figura!II5.1!–!Em!um!experimento!quântico!de!dupla!fenda,!partículas!incidem!
individualmente!sobre!o!anteparo,!e!a!interferência!das!funções!de!onda!que!
! se!originam!de!cada!fenda!produz!o!padrão!observado!no!anteparo.!Cada!
! fenda!define!um!autoestado!de!posição!!
!
A! onda! do! lado! esquerdo! representa! partículas! quânticas! que! incidem! no!
aparato,!o!qual!contém!duas!fendas!nas!posições!y1!e!y2,!separadas!de!y1&–&y2&=&d.!
Se!uma!partícula!emerge!na!fenda!1,!por!exemplo,!significa!que!o!seu!autoestado!
de!posição!será! y1 .!O!análogo!vale!para!a!fenda!2.!!

!
Com! as! duas! fendas! abertas,! as! partículas! sairão! em! uma! superposição! de!
autoestados!de!posição,!com!50%!de!chance!para!cada!fenda:!
!
y1 + y2
Ψ =
2 ! (II5.12)!
!
A! probabilidade! de! uma! partícula! ser! encontrada! com! momento! py,! após!
atravessar!o!aparato,!é:!
py y1 + py y2
py Ψ = ! (II5.13)!
2

! 143!
Mas!sabemos!que:!
i( py /!) y
e
y py = !

(II5.14)!
Logo:!
21 iky y1 iky y2 −iky y1 −iky y2
py Ψ

e +e
= ( e +e )( )
1+ cos#$k y (y1 − y2 )%& 1+ cos ( k y d )
2
py Ψ = = (II5.15)!
2π 2π !
!
Podemos,!portanto,!ver!a!dupla!fenda!como!um!aparato!que!cria!superposições!
de! autoestados! de! posição.! O! padrão! de! interferência! observado! decorre! da!
distribuição! de! probabilidades! dos! autoestados! de! momento.! O! resultado! para!
uma! única! fenda! é! obtido! fazendofse! d& =& 0.! Neste! caso,! a! distribuição! fica!
uniforme!e!igual!a!1/2π.!
!
II.6"Momento"angular"
Os!operadores!de!momento!angular!foram!introduzidos!na!Sec.!I14.!Seguindo!a!!
notação! de! bra>kets,! os! autoestados! de! momento! angular! (Eq.! (I14.6))! são!
escritos!como:!
!
L2 Ψ l,m = l(l +1)! 2 Ψ l,m
Lz Ψ l,m = m! Ψ l,m ,! (II6.1)!
m = −l, −l +1,"+ l −1, +l
!
e,!naturalmente,!obedecem!às!mesmas!regras!de!comutação!que!as!componentes!
de!spin:!
!" Lx , Ly #$ = i!Lz
!" Ly , Lz #$ = i!Lx
! (II6.2)!
[ Lz , Lx ] = i!Ly
!" L2 , Lk #$ = 0;k = x, y, z

!
Note!que!para!qualquer!autoestado!de!Lz!teremos:!
!

! 144!
1" 1 m
Lx = Ψ l.m # Ly , Lz $% Ψ l,m = Ψ l.m Ly Lz − Lz Ly Ψ l,m = Ψ l.m Ly − Ly Ψ l,m = 0
i! i! i !
!
Ou! seja,! para! qualquer! autoestado! de! momento! angular! da! base! { Ψ l,m } !se!
medirmos! um! número! grande! de! vezes! a! componente! X! (ou! Y)! do! momento,! a!
média!será!zero.!!Por!outro!lado:!
!
L2x = L2 − L2y − L2z = L2 − L2y − L2z
!
!
Porém,! tendofse! em! vista! que! as! direções! X! e! Y! são! equivalentes,! temos! que!
L2x = L2y .!Com!isso!obtemos:!

!
L2 − L2z l(l +1) − m 2 2 (II6.3)!
L2x = = !
2 2 !
!
Repare!que!o!estado!com!a!menor!dispersão!ocorre!para!! = !:!
!
1
L2x = l! 2
2 !
!
A!Figura!II6.1!mostra!esquematicamente!o!significado!dessas!quantidades!no!que!
seria! uma! distribuição! de! probabilidades,! após! um! número! grande! de! medidas!
do!momento!angular.!!
!
!

! 145!
L2x

0
Lx
!
Figura!II6.1!–!Significado!da!média!(valor!esperado)!e!desvio!padrão!(largura)!
!
de!uma!distribuição!esquemática,!resultado!de!um!número!muito!grande!de!
! medidas!da!componente!X!do!momento!angular!de!uma!partícula!em!um!
! autoestado!arbitrário!de!LZ.!Embora!o!valor!médio!de!Lx!seja!igual!a!zero,!
resultados!individuais!de!medidas!podem!ser!diferentes!de!zero!
!
!
Considere! agora! um! sistema! composto! por! duas! partículas! com! momentos!
angulares! !! = 1!!!!!!! = 2 .! Se! representarmos! por! { m1, m2 } !a! base! de!

autoestados!do!sistema!composto,!teremos!15!autovetores10:!
!

{ m1, m2 } = −1, −2 , −1, −1 , −1, 0 , −1, +1 , −1, +2 ,


0, −2 , 0, −1 , 0, 0 , 0, +1 , 0, +2 ,
+1, −2 , +1, −1 , +1, 0 , +1, +1 , +1, +2 (II6.4)!
!
!
Vamos!agora!calcular!o!momento!angular!total!do!sistema!nessa!representação:!
!
L2 = (L1 + L 2 )2 = L12 + L22 + 2L1 • L 2 ! (II6.5)!
!
O!último!termo!tem!componentes!que!não!comutam!entre!si.!Podemos!escrever!
este! termo! em! função! dos! operadores! de! levantamento! e! abaixamento! de!
momento!angular,!definidos!por:!
L+ ≡ Lx + iLy
! (II6.6)!
L− ≡ Lx − iLy

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
10!O!número!de!elementos!da!base!de!um!sistema!composto!por!!!partículas!com!momentos!

!! , !! , ⋯ !! !é!dado!por:!(2!! + 1)×(2!! + 1) ⋯ (2!! + 1).!

! 146!
Para! deduzirmos! as! propriedades! desses! operadores,! considere! o! seguinte!
comutador:!
(II6.7)!
!! , !! = !! , !! + !!! = ℏ!! !
!
Agora! –! para! simplificar,! omitindo! o!ℏ!f,! vamos! aplicar! o! comutador! a! um!
autoestado!da!base!de!Lz:
!
!

( L L − L L ) l, m
z
+ +
z = L+ l.m
Lz L+ l, m − mL+ l, m = L+ l, m (II6.8)!
Lz {L l, m } = (m +1){L l, m
+ +
}!
!
Ou!seja,!o!estado! L+ l, m !é!autoestado!de!Lz,!com!autovalor!correspondente!igual!

a!!! + 1.!Portanto,!podemos!escrever:!
!
L+ l, m = γ l, m +1
! (II6.9)!
!
Agora!vamos!determinar!o!valor!de!gama.!Tomando!o!complexo!conjugado:!
!
l, m L− = γ * l, m +1 !
(II6.10)!
!
E!fazendo!o!produto!escalar!entre!os!dois!estados:!
!
2
l, m L− L+ l, m = γ (II6.11)!
!
!
No!entanto,!sabemos!que:!
!
L− L+ = (Lx + iLy )(Lx − iLy ) = L2 − L2z − Lz (II6.12)!
!
!
A!partir!daí,!se!obtém:!
!
!

! 147!
!
! = ! ! + 1 − ! ! + 1 ! → !! !! |!, ! = ! ! + 1 − ! ! + 1 |!, ! + 1 !

! (II6.13)!

onde!uma!fase!foi!tomada!igual!a!1.!De!forma!análoga,!teremos:!
!
L− l, m = l(l +1) − m(m −1) l, m −1 (II6.14)!
!
!
Podemos! agora! retornar! ao! problema! do! cálculo! de! L2! do! sistema! composto! e!
escrever:!
L2 = L12 + L22 + L+1 L−2 + L−1 L+2 + 2L1z L2 z
! (II6.15)!
!
O!elemento!de!matriz!desse!operador!na!base! { l1, l2 , m1, m2 } !é:!
!
l1, l2 , m1, m2 L2 l1, l2 , m1' , m '2 = l1 (l1 +1) + l2 (l2 +1) + 2m1m2 +

+ l1 (l1 +1) − m1' (m1' +1) × l2 (l2 +1) − m '2 (m '2 −1)δm1+1,m1δm2 −1,m2 + ! (II6.16)!
+ l1 (l1 +1) − m1' (m1' −1) × l2 (l2 +1) − m '2 (m '2 +1)δm1−1,m1δm2 +1,m2

!
Um! sistema! composto! por! duas! partículas,! uma! com!!! = 1!e! outra! com!!! = 2,!
tem! 15!×!15 = 225 !elementos! de! matriz,! que! podem! ser! calculados! com! a!
fórmula! acima!! Obviamente! não! é! prático! fazer! contas! analíticas! com! matrizes!
desse! tamanho.! O! menor! sistema! que! podemos! lidar! analiticamente! –! mas! que!
serve!para!o!nosso!propósito!nessa!seção!–!!é!um!sistema!com!!! = !! = 1/2,!cuja!
base!é:!
!
−1 / 2, −1 / 2 , −1 / 2, +1 / 2 , +1 / 2, −1 / 2 , +1 / 2, +1 / 2 !

!
!!Aplicando!a!fórmula!acima,!obtemos!para!tal!caso:!
!

! 148!
! 2 0 0 0 $
# &
0 1 1 0
L =#
2 & (II6.17)!
# 0 1 1 0 &
# 0 0 0 2 &
" %!
!
cujos! autovalores! são! 0! e! 2! (três! vezes! degenerado).! Tendo! em! conta! que! os!
autovalores! de! L2! são! da! forma!!(! + 1),! obtemos!! = 0!!e!!! = 1.! Os! autovetores,!
no!entanto,!são:!
!
" 0 %
$ '
1 $ −1 ' − +1 / 2, −1 / 2 + −1 / 2, +1 / 2
ψ1 = =
2$ 1 ' 2
$ 0 '
# &
" 0 %
$ ' (II6.18)!
1 $ 1 ' +1 / 2, −1 / 2 + +1 / 2, −1 / 2
ψ2 = = !
2$ 1 ' 2
$ 0 '
# &
" 1 % " 0 %
$ ' $ '
$ 0 ' $ 0 '
ψ3 = = +1 / 2, +1 / 2 ; ψ 4 = = −1 / 2, −1 / 2
$ 0 ' $ 0 '
$ 0 ' $ 1 '
# & # &
!
Vemos!que! ψ1 !e! ψ 2 !são!estados!emaranhados!de!momento!angular!orbital.!Os!

estados! ψ 2 , ψ3 !e! ψ 4 !correspondem! ao! autovalor! ! = 1, com!! = 0, 1, −1 ,!

respectivamente.! Esses! estados! são! chamados! tripleto.! O! estado! ψ1 !

corresponde!a!! = 0!e!é!chamado!singleto.!
!
O! uso! da! base! { l1, l2 , m1, m2 } !não! é,! contudo,! a! melhor! escolha! para! representar!
os! estados! de! momentos! angulares! acoplados.! A! melhor! representação! é! a! do!
momento!total.!Por!exemplo,!se!duas!partículas!têm!momentos!angulares!!! !e!!! ,!
os!valores!possíveis!para!o!momento!total!serão:!
!
! = !! + !! , !! + !! − 1, ⋯ , !! − !! !! (II6.19)!
!

! 149!
Dado! um! valor! de!! ,! os! autovalores! da! componente! Z! do! momento! serão:!
!! = −!, −! + 1, ⋯ , +!.!Nessa!representação:!
!
L2 l, ml = l(l +1)! 2 l, ml
Lz l, ml = m! l, ml (II6.20)!
!
!
No!exemplo!analisado!anteriormente,!teremos:!
!
l1 = l2 = 1 / 2
l = l1 − l2 , l1 + l2 = 0,1
l = 0 ⇒ ml = 0
l = 1 ⇒ ml = −1, 0,1 !
!
As! regras! acima! nos! dizem! como! os! momentos! angulares! se! acoplam,! mas! elas!
não!estabelecem!critério!algum!que!determine!qual!será!o!momento!angular!de!
certo! sistema! composto.! Para! isso,! é! preciso! utilizar! outro! conjunto! de! regras,!
conhecidas!como!regras!de!Hund,!que!se!aplicam!ao!cálculo!do!momento!angular!
total!(orbital!e!spin)!de!átomos!isolados.!São!elas:!
!
1. Para! uma! dada! configuração! eletrônica,! maximize! o! valor! do! spin!
obedecendo! ao! princípio! de! exclusão! de! Pauli.! Isso! resultará! na! menor!
energia!possível!do!sistema;!
2. Observada!a!regra!número!(1),!distribua!os!elétrons!de!modo!a!maximizar!
o!momento!angular!orbital;!
3. Se!a!camada!estiver!menos!que!a!metade!cheia,!o!momento!angular!total!
será!! = ! ! − ! ;!!se!estiver!mais!que!a!metade!cheia,!! = !! + !.!
!
Considere,!por!exemplo,!o!átomo!neutro!de!cobalto,!cuja!distribuição!eletrônica!
para!o!estado!fundamental!é:!
!
!" 3! ! 4! ! !
!

! 150!
Ou!seja,!o!átomo!é!formado!por!um!“caroço!completo”!com!a!mesma!distribuição!
do! átomo! de! argônio,! uma! camada! s! externa! completa! e! uma! camada! d! interna!
incompleta.! Camadas! atômicas! totalmente! cheias! ou! vazias! não! têm! momento!
angular,! nem! orbital,! nem! de! spin.! Camadas! semicheias! possuem! momento!
angular!total!igual!a!zero!e!spin!máximo.!!
!
As!duas!primeiras!regras!nos!dizem!que!devemos!distribuir!os!elétrons!entre!os!
estados!de!momento!angular!de!forma!a!maximizar!s!e!l.!!No!orbital!d,!cabem!10!
elétrons! em! cinco! estados! de! momento! angular:!! = −2, −1, 0, +1, +2!,! cada! um!
desses! podendo! comportar! dois! elétrons.! Delas,! obtemos!! = 3!e!! = 3/2!para!
esse! caso.! Isso! significa! que! os! valores! possíveis! de! momento! angular! são:!
! ! ! !
! = ! , ! , ! , !.!Mas,!como!o!orbital!está!mais!que!a!metade!cheio,!a!terceira!regra!de!

Hund!diz!que!o!momento!total!é!! = 9/2.!!!
!
II7"Momento"magnético,"interação"spinIórbita"e"interação"de"Heisenberg"
Uma! das! propriedades! físicas! mais! importantes! para! o! estudo! da! matéria,! seja!
microscópica! ou! macroscópica,! é! o! momento! magnético! das! partículas.! O!
momento! magnético! está! associado! ao! momento! angular,! seja! ele! orbital! ou! de!
spin.!Como!vimos!no!Bloco!I,!a!descoberta!do!spin!por!Stern!e!Gerlach!foi!feita!em!
um!estudo!experimental!do!momento!magnético!de!átomos!neutros,!em!estados!
de!momento!angular!igual!a!zero.!O!momento!magnético!total!de!um!átomo!pode!
ser!escrito!como11:!
!
!! = ! !! + ! !! ,!
(II7.1)!
!
onde!!! = !! !!!e!!! = −2!! !,! onde!!! !é! o! magneton! de! Bohr.! O! fator! “2”! que!
aparece! na! expressão! do! momento! magnético! de! spin! é! uma! aproximação! do!
chamado! fatorfg! de! spin! do! elétron,! que! vale! exatamente 12!

2,002!319!304!361!82! ± 0,000!000!000!000!52 .! O! sinal! negativo! no! fator! de!


proporcionalidade!significa!que!o!momento!magnético!de!spin!é!antiparalelo!ao!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
11!Aqui!nos!referimos!apenas!aos!elétrons!do!átomo.!Em!muitas!situações!é!necessário!considerer!

também!o!momento!magnético!dos!núcleos,!mas!isso!não!sera!tratado!aqui.!
12!De!fato,!o!sinal!negativo!é!parte!do!fatorfg!de!spin.!Ver!o!site!do!NIST:!

http://physics.nist.gov/cgifbin/cuu/Category?view=html&All+values.x=80&All+values.y=11!

! 151!
momento!angular!de!spin,!ao!contrário!do!momento!magnético!orbital,!o!qual!é!
paralelo!a!L.!!
!
Por! outro! lado,! dados! os! momentos! orbital,! L,! e! de! spin,! S,! podemos! definir! o!
momento!angular!total,!!J:!
J!=!L!+!S! (II7.2)!
!
O!momento!angular!total!obedece!às!mesmas!regras!de!comutação!de!L!e!S,!bem!
como!atua!de!forma!semelhante!nos!seus!autoestados:!
!
J 2 J, M = j( j +1)! 2 J, M
J Z J, M = M ! J, M (II7.3)!
M = −J,", +J !
!
Em! algumas! situações,! como! na! presença! de! um! forte! acoplamento! spinfórbita,!
tornafse! mais! adequado! utilizamos! a! representação! de! momento! angular! total,!
em!vez!das!componentes!orbital!e!de!spin.!Uma!vez!definido!o!valor!do!momento,!
podemos! calcular,! entre! outras! quantidades,! o! momento! magnético! total,!
!! = !! !! !.!O!fator!gJ!é!chamado!fator&de&Landé,!dado!por13:"
"

gJ ≅
3 s(s +1) − l(l +1)
+ (II7.4)!
2 2 j( j +1) "
"
Essas! relações! fornecem! uma! forma! adequada! de! representarmos! a! interação!
spinfórbita!em!termos!dos!valores!de!momento!angular!do!átomo:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
13!O!sinal!de!aproximado!vem!do!fato!de!que!se!tomou!igual!a!2!o!fatorfg!de!spin.!

! 152!
J 2 = L2 + S 2 + 2L ⋅ S
J 2 − L2 − S 2
L⋅S =
2 (II7.5)!
J 2 − L2 − S 2 !
H SO = λ L ⋅ S = λ
2
λ
ESO ( j, l, s) = { j( j +1) − l(l +1) − s(s +1)}
2
!
Um! dos! aspectos! mais! interessantes! (e! surpreendentes)! envolvendo!
hamiltonianos! de! spin! é! a! chamada! interação! de! Heisenberg,! base! dos! modelos!
de!ordem!magnética!em!materiais.!A!natureza!da!interação,!de!fato,!nada!tem!a!
ver!com!spins,!mas!com!interação!coulombiana!e!com!o!princípio!de!exclusão!de!
Pauli.!!
!
Considere!o!hamiltoniano!da!interação!entre!dois!elétrons:!
!
e2 1
H= (II7.6)!
4πε 0 r1 − r2
!
!
Vamos!calcular!o!valor!esperado!desse!hamiltoniano.!Como!ele!não!depende!do!
spin! dos! elétrons,! temos! que! usar! funções! espaciais! devidamente! simetrizadas.!
Tomemos!as!funções!simétrica!(sinal!positivo)!e!antissimétrica!(sinal!negativo):!
!
1
ψ± (r1, r2 ) = {φα (r1 )φβ (r2 ) ± φα (r2 )φβ (r1 )} (II7.7)!
2 !
!
Nessa! expressão,!∅! !e!∅! !são! dois! autoestados! normalizados! –! por! exemplo,!
duas!funções!atômicas.!Vamos!supor!que!a!função!seja!simétrica,!tomando!o!sinal!
positivo!da!soma.!Daí,!obtemos!para!o!valor!esperado!do!hamiltoniano:!
!

! 153!
*
∫ ψ (r , r )Hψ (r , r )dr dr
± 1 2 ± 1 2 1 2 = H =
e2 * 1
8πε 0
∫ {φ α (r1 )φ β (r2 ) + φα (r2 )φ β (r1 )}
r1 − r2
{φα (r1 )φβ (r2 ) + φα (r2 )φβ (r1 )} dr1dr2
e2 * 1
H =
8πε 0
∫ {φ α (r1 )φ β (r2 )}
r1 − r2
{φα (r1 )φβ (r2 )} dr1dr2 +
e2 * 1
8πε 0
∫ {φ α (r2 )φ β (r1 )}
r1 − r2
{φα (r2 )φβ (r1 )} dr1dr2 +
e2 * 1
8πε 0
∫ {φ α (r1 )φ β (r2 )}
r1 − r2
{φα (r2 )φβ (r1 )} dr1dr2 +
e2 * 1
8πε 0
∫ {φ α (r2 )φ β (r1 )}
r1 − r2
{φα (r1 )φβ (r2 )} dr1dr2
!
! (II7.8)!
!
Vemos! que! os! dois! primeiros! termos! representam! os! valores! esperados! da!
interação! coulombiana! com! o! elétron! de! coordenada! r1! (r2)! no! estado! α! (β).!
Estes! termos! reproduzem! o! valor! clássico! da! interação! coulombiana.! Ao!
contrário,!nos!dois!últimos!termos,!há!troca!entre!estados!e!coordenadas.!Estes!
termos!podem!ser!vistos!como!medidas!da!região!em!que!as!funções!de!onda!se!
superpõem! no! espaço;! não! existe! análogo! clássico! para! esta! forma! de! energia,!
chamada! energia! de! troca.! Sem! perda! de! generalidade,! podemos! supor! que! os!
dois! primeiros! termos! são! iguais,! assim! como! os! dois! últimos.! Com! isso,!
chegamos!a:!
!
H = 2EC + 2J
e2 * 1
EC =
8πε 0
∫ {φ α (r1 )φ β (r2 )}
r1 − r2
{φα (r1 )φβ (r2 )} dr1dr2
! (II7.9)!
e2 * 1
J=
8πε 0
∫ {φα (r1 )φβ (r2 )} r1 − r2
{φα (r2 )φ β (r1 )} dr1dr2

onde!!! !é!a!energia!coulombiana!clássica,!e!J!é!a!energia!de!troca.!É!fácil!ver!que,!
se! tivéssemos! tomado! o! sinal! negativo! na! função! de! onda,! ou! seja,! o! estado!
antissimétrico,!teríamos!chegado!a:!
!

! 154!
H = 2EC − 2J (II7.10)!
!
!
Com!isso,!juntando!os!dois!resultados,!teremos:!
!
H = 2EC ± 2J ,! (II7.11)!
!
onde!o!sinal!positivo!deve!ser!tomado,!se!o!estado!for!simétrico;!e!o!negativo,!se!
for!antissimétrico.!!
!
Aqui,!emerge!um!fato!interessante.!Repare!que,!embora!a!interação!original!não!
contenha! operadores! de! spins! dos! elétrons,! o! resultado! final! depende! do! spin,!
por!conta!do!princípio!de!exclusão.!Se!a!função!for!simétrica,!os!spins!estarão!no!
estado!singleto,!que!é!antissimétrico.!Mas,!se!a!parte!espacial!for!antissimétrica,!a!
parte!de!spin!será!o!tripleto!de!spins,!que!é!simétrico.!!
!
Esse!é!um!exemplo!de!como!as!correlações!quânticas!afetam!o!estado!final!de!um!
sistema.! No! caso! acima,! vemos! que! a! energia! coulombiana! pode! aumentar! ou!
diminuir,!dependendo!do!estado!de!spin.!!
!
No!final!da!década!de!1920,!Heisenberg!notou!que!o!termo!!da!energia!de!troca!
poderia! ser! escrita! como! um! hamiltoniano! de! spins,! o! qual! se! convencionou! a!
escrever!como:!!
!
H = −2JS1 ⋅ S2 !
(II7.12)!
!
Se!em!vez!de!apenas!dois,!tivermos!uma!cadeia!com!N!spins,!esse!hamiltoniano!
se!generaliza!para:!
!
N
H TROCA = −2J ∑ Si ⋅ Si+1 ! (II7.13)!
i=1

! 155!
Esse! hamiltoniano,! chamado! hamiltoniano! de! troca& ou& hamiltoniano! de!
Heisenberg,!!é!a!base!para!os!modelos!de!acoplamento!entre!spins!para!explicar!a!
ordem! magnética! na! matéria.! Por! exemplo,! note! que,! se!!! > 0,! a! configuração!
que!minimiza!a!energia!é!a!dos!spins!se!alinhando!paralelamente!uns!aos!outros.!
Dizemos! que! o! acoplamento! é! ferromagnético.! Ao! contrário,! se!! < 0,! os! spins!
devem!se!ordenar!de!forma!antiparalela,!e!a!isto!se!dá!o!nome!de!acoplamento!
antiferromagnético.!
!

!
! Figura!II7.1!–!Spins!de!átomos!vizinhos!em!uma!cadeia!podem!se!acoplar!
ferromagneticamente,!J&>!0!(esquerda),!ou!antiferromagneticamente,!J!<!0!
" (direita).!Outras!formas!de!acoplamento!são!possíveis,!dependendo!da!
" distância!entre!os!átomos!e!das!funções!de!onda!envolvidas.!Embora!o!
acoplamento!defina!as!propriedades!magnéticas!do!material,!a!interação!de!
" troca!tem!origem!no!princípio!de!exclusão!e!na!interação!eletrostática!entre!
" átomos.!É!um!dos!melhores!exemplos!de!correlação!quântica!entre!variáveis!
espaciais!e!de!spin!
"
"
II8"Segunda"quantização:"fótons"
Vimos,! no! Bloco! I,! que! a! quantização! do! campo! eletromagnético! em! uma!
cavidade! foi! postulada! por! Planck! no! seu! trabalho! de! 1900.! Vamos! agora!
detalhar!o!procedimento!formal!de!como!isso!é!feito.!!
!
O! ponto! de! partida! são! as! equações! de! Maxwell! no! vácuo,! que! no! sistema!
gaussiano!são14:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
14!No!sistema!gaussiano,!as!duas!constants!! !e!! ,!respectivamente,!a!permeabilidade!magnética!
! !
e!permissividade!elétrica!do!vácuo,!ficam!incorporadas!emu!ma!única,!a!velocidade!da!luz,!c.!

! 156!
∇⋅E = 0
∇⋅B = 0
(II8.1)!
1 ∂B
∇×E+ =0
c ∂t !
1 ∂E
∇×B− =0
c ∂t

onde! c! é! a! velocidade! da! luz! no! vácuo.! Os! campos! elétrico! e! magnético! podem!
ambos! ser! derivados! do! mesmo! potencial! vetor,! considerandofse! o! chamado!
calibre!de!Coulomb,!!∇ ∙ ! = 0:!!
!
B = ∇×A
1 ∂A (II8.2)!
E=−
c ∂t !
!
Como!se!verá!adiante,!a!escolha!desse!calibre!impõe!que!a!direção!de!propagação!
da!onda!seja!perpendicular!à!direção!dos!campos.!!
!
Calculando!o!rotacional!da!primeira!expressão!de!(II8.2),!e!usando!a!condição!de!
calibre,!obtemos:!
!
∇×! = ∇× ∇×! = ∇ ∇ ∙ ! − ∇! ! = −∇! !!
!
Por!outro!lado,!substituindo!a!segunda!equação!de!(II8.2)!na!quarta!equação!de!
Maxwell,!teremos:!
!
1 !!!
∇×! = − !
! ! !! !
!
Essas!relações!levam!à!seguinte!equação!de!onda!para!o!potencial!vetor:!!
!
1 ∂2
∇ 2 A(r, t) = A(r, t) ! (II8.3)!
c 2 ∂t 2
!

! 157!
A! solução! desta! equação! pode! ser! escrita! como! uma! superposição! de! ondas!
planas:!
!
! !, ! = ! !! !! ! ! !!!! ! + !!∗ !∗! (!)! !!!! ! ! (II8.4)!
!
onde!uk!é!a!amplitude!da!componente,!ou!modo,!k!e!! = ! !! = !"!é!a!relação!de!
dispersão!para!fótons15.!!!
!
Substituindo!(II8.4)!na!equação!de!onda,!chegafse!a:!
!

!
!!!
∇ !! ! + ! !! ! !! ! !!!! ! + complexo!conjugado = 0!
!
!

! (II8.5)!
Como! os! coeficientes!!! !são! necessariamente! diferentes! de! zero,! os!
termos!entre!parêntesis!devem!se!anular!individualmente:!
!
!
!!
∇! !! ! + !!
!! ! = 0! (II8.6)!

!
com! expressão! similar! para! o! complexo! conjugado.! Esta! é! a! equação! tem! a!
mesma! estrutura! daquela! do! oscilador! harmônico,! cujas! soluções! normalizadas!
para!um!volume!finito!V!são:!
!
1 (II8.7)!
!! ! = !! !!!∙! "
!
!
onde!n!é!a!direção!de!polarização!da!onda.!Aplicando!o!calibre!de!Coulomb!nesta!
solução,!obtémfse:!
∇ ∙ !! ! = 0 → ! ∙ ! = 0! (II8.8)!
!
ou!seja,!k-e!n!são!perpendiculares!entre!si.!!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
15!A!soma!pode!conter!um!índice!representando!as!direções!de!polarização,!mas!isso!não!será!

importante!para!essa!seção.!!!

! 158!
Queremos! calcular! a! energia! do! campo! eletromagnético,! que! no! sistema!
gaussiano!é!dada!por:!
!
1 (II8.9)!
!= !!+ ! !
! ! !!
8!
!
Comecemos! pelo! cálculo! do! módulo! do! campo! eletromagnético.! De! (II8.2)! e!
(II8.4)!obtémfse:!
!
! (II8.10)!
!(!) = !! !! !! ! ! !!!! ! − !!∗ !∗! (!)! !!!! ! !
!
!

Consequentemente16:!
!
!
! = ! ∙ !∗ =
!! !!! ∗
!,!! !!
[!! !!! !! ∙ !∗!! ! !! !! !!!! !
+ !!! !!∗ !!! ∙ !∗! ! !! !! !!!! !
−"

−!! !!! !! ∙ !!! ! !! !! !!!! !


− !!∗ !!!
∗ ∗ ∗ !!
!! !!! ! !! !!!! !
]! (II8.11)!

!
O! próximo! passo! é! substituir! essa! expressão! no! primeiro! termo! de! (II8.9)! e!
realizar!a!integração!sobre!o!volume!V.!Usando!(II8.7)!em!(II8.11)!e!observando!
que!
!

! ±!(!±!!)∙! ! ! ! = !!!±!! !

!
chegafse!ao!resultado:!
!
!
!!
! ! !! ! = (II8.12)!
! ! ∗
!!! ! ! !! [!! !! + !!∗ !! − !! !!! ! !!!!! ! − !!∗ !!!

! !!!!! ! ]!

!
Até! este! ponto,! os! coeficientes!!! !são! números! complexos! e,! naturalmente! a!
soma! dos! dois! primeiros! termos! de! (II8.12)! é! igual! a!2 !! ! .! ! No! entanto,! como!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
16!Como!vimos!no!Bloco!I,!o!confinamento!do!campo!em!um!volume!finite!faz!com!que!as!suas!

componentes!de!momento!sejam!discretizadas.!Isso!justifica!a!soma!discreta!em!(II8.10).!

! 159!
esses! coeficientes! serão! associados! aos! operadores! de! criação! e! aniquilação!
quando!o!campo!for!quantizado,!a!sua!soma!permanecerá!explícita.!!
!
Passemos!ao!cálculo!da!contribuição!do!campo!magnético!para!a!energia.!Usando!
(II8.2)!e!(II8.4)!chegafse!a:!
!

! = −! !! !×!! ! ! !!!! ! − !!∗ !×!∗! (!)! !!!! ! ! (II8.13)!


!

Consequentemente:!
!
! =

=− [!! !!! (!×!! ) ∙ !′×!∗!! ! !! !! !!!! !
+ !!! !!∗ !×!∗!
!,!!

∙ !′×!∗!! ! !! !! !!!! !
!
−!! !!! !×!! ∙ !′×!!! ! !! !! !!!! !
− !!∗ !!!

!×!∗! ∙ !′×
!∗!! ! !! !! !!!! !
]! (II8.14)!
!
Utilizando!a!identidade!vetorial!!
!
!×! ∙ !×! = ! ∙ ! ! ∙ ! − (! ∙ !)(! ∙ !)!
!
e!tendo!em!conta!a!perpendicularidade!entre!k!e!u!chegafse!a:!
!
1 (II8.15)!
! ! !! !
8!
1
= ! ! !! !!∗ + !!∗ !! + !! !!! ! !!!!! ! + !!∗ !!!

! !!!!! ! !
8!
!

!
Note!que!esse!resultado!é!idêntico!ao!do!campo!elétrico,!Eq.!(II8.12),!mas!com!os!
dois!últimos!termos!tendo!o!sinal!oposto.!A!energia!total!do!campo!é,!portanto:!
!
1 1 !!! (II8.16)!
!
! + ! ! !
! != ! !∗ + !!∗ !! !
8! 4! !! ! !
!

onde!se!usou!! = !
!!! /! ! .!

! 160!
!
Finalmente,! podemos! fazer! a! quantização! do! campo.! Para! isso! associamos! os!
coeficientes!!! !com!os!operadores!de!criaçãofaniquilação:!
!
(!") !(!")
!! → !! !! !!e!!!!∗ → !!∗ !! ! (II8.17)!
!
onde!!! !é!um!parâmetro!multiplicativo!que!será!determinado!adiante.!Com!isso,!
usando! !! , !!! = 1,!o!hamiltoniano!quantizado!é!obtido:!
!
(II8.18)!
1 !!! 1
!= ! !
!!! !! + !
2! !! ! 2
!

!
Para! que! o! este! hamiltoniano! seja! escrito! como! uma! soma! de! energias! do! tipo!
ℏ!! ,!devemos!fazer:!

2!! ! ℏ
!! = !
!!

O!que!finalmente!resulta!em:!
!
1 (II8.19)!
!= ℏ!! !!! !! + !
2
!

!
O! operador!!!! !cria! um! fóton! com! momento! k! e! energia!ℏ!! !e! o! operador!!! !
destrói.!O!operador!!!!! !! !é!chamado!operador!de!número,!pois!seu!autovalor!é!o!
número!de!fótons!com!momento!k!e!energia!ℏ!! .!Os!autoestados!deste!operador!
são!chamados!estados!de!Fock!e!representados!por!|!! ,!ou!seja:!
!
!!! !! |!! = !! |!! ! (II8.20)!

!
O! estado! de! vácuo! é! aquele! que! tem!!! = 0!para! todo! k.! Tal! estado! tem! a!
propriedade!
!! |0 = 0!
!

! 161!
e!tem!energia,!chamada!energia!do!vácuo,!igual!a:!!
!
1 (II8.21)!
!!á!"# = ℏ!! !
2
!

!
Podemos! agora! explorar! esse! resultado! para! calcularmos! um! observável!
termodinâmico!do!sistema.!A!contribuição!por!modo!para!a!densidade!de!energia!
interna! desse! “gás! de! fótons”! foi! calculada! no! Bloco! I! e! é! dada! pela! equação!!
(I2.5):!
!
!ω 3 1
u(ω,T ) = 2 3 ! (II8.22)!
π c exp(!ω / kBT ) −1
!
A! densidade! de! energia! interna! total! em! uma! dada! temperatura! é! obtida!
integrandofse!(II8.22)!para!todas!as!frequências!e!resulta!na!Lei!de!Stefan:!
!
! !, ! !"! → !(!) = !!! ! ,! (II8.23)!
!
!o! que! significa! que! o! calor! específico! é! proporcional! à! terceira! potência! da!
temperatura:! !!! !~!! ! .! ! Ao! interpretar! esse! resultado,! devemos! lembrar! que! o!
cálculo! é! feito! para! ondas! eletromagnéticas! aprisionadas! em! uma! cavidade.! A!
mudança!na!temperatura!do!gás!de!fótons!se!dá!por!meio!das!interações!entre!os!
modos!de!vibração!e!as!paredes!da!cavidade:!essa!última!recebe!calor!externo!e!
“repassa”! ao! campo! eletromagnético,! cuja! frequência! é! aumentada,! como! pode!
ser!visto!na!Figura!II8.1!(reprodução!da!Figura!I1.3).!
!

! 162!
!

Figura!II8.1!–!Distribuições!de!energia!radiante!do!chamado!corpo!negro!para!diversas!
temperaturas.!Na!medida!em!que!a!temperatura!diminui!o!máximo!da!distribuição!também!
diminui!e!se!afasta!da!faixa!do!visível!–!daí!a!denominação!corpo&negro.!A!figura!mostra!a!
previsão!do!!eletromagnetismo!clássico!em!franco!desacordo!com!a!previsão!quântica,!
obtida!por!Planck!para!pequenos!comprimentos!de!onda.!Para!grandes!comprimentos!de!
onda,!as!previsões!quântica!e!a!clássica!coincidem.!
!
!
!
Como! veremos! a! seguir,! essa! mesma! dependência! com! a! temperatura! ocorre!
para!fônons!acústicos!em!uma!cadeia!atômica.!A!razão!fundamental!para!isso!são!
as!relações!de!dispersão,!!! = !"!para!fótons,!e!!! = !! !,!onde!!! !é!a!velocidade!
de!grupo,!para!fônons!acústicos.!
!
Interação"entre"luz"e"matéria:"modelo"de"JaynesICummings!!
Um! aspecto! interessante! a! respeito! da! quantização! do! campo! eletromagnético!
diz! respeito! à! descrição! da! interação! entre! a! luz! e! a! matéria.! Em! diversas!
aplicações! de! interesse,! enquanto! o! aspecto! quântico! da! matéria! é! levado! em!
conta,!a!radiação!é!considerada!um!campo!clássico.!Tal!é!o!caso,!por!exemplo,!do!
modelo! quântico! para! a! susceptibilidade! elétrica! nos! sólidos17,! ou! o! modelo! de!
interações!entre!spins!e!um!campo!magnético!oscilante!utilizado,!em!ressonância!
magnética!nuclear!(Sec.!III8).!!!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
17!Veja:-Introdução-à-Física-do-Estado-Sólido,!3a.!Ed.,!Ivan!S.!Oliveira!e!Vitor!L.!B.!de!Jesus,!
Livraria!da!Física!(São!Paulo,!2017).!
!

! 163!
No! entanto,! em! algumas! aplicações! importantes,! como! é! o! caso! da! computação!
quântica! com! circuitos! supercondutores! (Sec.! III9),! a! natureza! quântica! da!
radiação! precisa! ser! levada! em! conta.! Este! é! o! caso! também! das! chamadas!
cavidades! eletrodinâmicas,! nas! quais! átomos! individuais! interagem! com! fótons!
aprisionados!em!uma!cavidade.!!
!
O! modelo! mais! simples! de! interação! entre! matéria! e! luz! é! constituído! por! um!
átomo! de! dois! níveis! interagindo! com! um! fóton.! O! hamiltoniano! de! partida!
descreve! a! interação! entre! o! dipolo! elétrico! do! átomo! e! o! campo! elétrico! da!
radiação:!!
!
! = ! ∙ !" (II8.24)!
!
onde!! = −!!"é! o! dipolo! elétrico.! Para! um! campo! elétrico! (clássico)! que! se!
propaga! ao! longo! da! direção!!!com! polarização!!,! Eq.(II8.10),! ! considerando!
apenas!um!único!modo!(único!valor!de!!)!chegafse!à:!
!
!!
!=! !
!! ! !"#(!")!! (II8.25)!

!
onde!! ! = !! !!"# ,! com!!!real! é! a! amplitude! do! campo.! Das! transformações!
(I18.7)!deduzfse!a!relação!entre!!!e!os!operadores!de!criação!e!aniquilação18:!
!
(II8.26)!

!= (! + !! )!
2!

!
Por! causa! da! polarização! do! campo! elétrico,! a! componente! do! dipolo! que!
aparecerá! no! hamiltoniano! (II8.24)! será! a! componente! X,! que! pode! ser! escrita!
como:!
0 1 (II8.27)!
!! = !!! = ! !
1 0

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
18!Para!
uma! discussão! detalhada,! veja:! Elements- of- Quantum- Optics,- Pierre! Meystre! e!
Murray!Sargent!III,!3a.!Ed.,!Springer!(New!York,!1999).!
!

! 164!
!
Porém,!tendo!em!vista!que!!! = ! ! + ! ! /2,!o!hamiltoniano!final!se!torna:!
!

ℏ! !! + !! (II8.28)!
!=! !"#(!") (! + !! )!
!!! 2

! ℏ!
Chamando!! = ! ! !!
!"#(!"),!obtemos:!

!
! = !(! ! ! + ! ! !! + ! ! ! + ! ! !! )! (II8.29)!

!
A! descrição! dos! processos! físicos! por! esse! hamiltoniano! é! muito! simples:! o!
primeiro! termo! representa! a! aniquilação! do! fóton! que! é! absorvido! pelo! átomo,!
que!passa!do!estado!fundamental!para!o!estado!excitado!(lembrar!que!no!modelo!
o! átomo! só! tem! dois! níveis).! O! último! termo! representa! o! processo! inverso:! o!
átomo! passa! do! estado! excitado! para! o! fundamental,! emitindo! o! fóton.! Os! dois!
termos! do! meio! representam! processos! que! não! podem! ocorrer:! no! segundo!
termo! um! fóton! é! criado! ao! mesmo! tempo! em! que! o! átomo! é! excitado,! e! no!
terceiro! um! fóton! é! destruído! junto! com! a! defexcitação! do! átomo.! Esses! dois!
termos! devem,! portanto,! ser! descartados.! Adicionando! os! termos! de! átomo! e!
campo!livres,!chegamos!ao!conhecido!hamiltoniano!de!JaynesfCummings:!
!
ℏ!á!"!" (II8.30)!
!= !! + ℏ!!ó!"# !! ! + !(! ! ! + ! ! !! )!
2
!
Voltaremos!ao!modelo!de!JaynesfCummings!no!próximo!bloco.!
"
II9"Segunda"quantização:"fônons-
Vimos,! na! Seção! I18,! que! o! hamiltoniano! do! oscilador! harmônico! simples! pode!
ser!escrito!em!termos!dos!operadores!de!criação!e!aniquilação:!
!
! 2 d 2 mω 2 2 # 1& (II9.1)!
H =− 2
+ x ⇒ !ω % a + a + (
2m dx 2 $ 2 '!
!

! 165!
Essa! forma! do! hamiltoniano! permite! reinterpretarmos! os! estados! excitados! do!
oscilador! simples! como! a! criação! de! partículas:! os! autovalores! de!!! ! !são!
números! inteiros! que! representam! o! número! de! partículas! com! energia!ℏ!.! A!
aplicação!de!!! !cria!uma!partícula!com!essa!energia,!e!de!!!destrói!uma.!!
!
A!verdadeira!utilidade!dessa!linguagem!de!segunda!quantização!aparece!quando!
tratamos! sistemas! contendo! um! número! muito! grande! de! partículas.! Dois!
exemplos! de! sistemas! são! particularmente! paradigmáticos! na! física:! a! cadeia!
monoatômica!linear!e!a!cadeia!de!spins!acoplados.!Nessa!seção!vamos!estudar!a!
cadeia!monoatômica!linear!e!os!fônons!acústicos.!!!
!
Considere! uma! cadeia! atômica! linear! muito! grande,! com! N! átomos,! acoplados!
entre! si! por! meio! de! forças! restauradoras.! O! hamiltoniano! da! cadeia! pode! ser!
escrito!como:!

(II9.2)!
!
!
no!qual!!! !é!a!posição!do!n>ésimo!átomo!e!!!!! !a!de!seu!vizinho19!e:!!
!

!
!
Vamos! definir! novos! operadores,! !! !e! !! !por! meio! das! séries! de! Fourier!
discretas:!
!

(II9.3)!

!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
19!Note!que!!
! !é!uma!função!discreta!da!posição!n!do!átomo;!especificamente,!seu!deslocamento.!
Se!a!cadeia!de!átomos!fosse!estática,!a!posição!de!qualquer!átomo!seria!dada!por!um!número!
inteiro!da!distância!entre!vizinhos,!a.!!

! 166!
Dessas! definições,! dado! que! o! deslocamento! é! necessariamente! um! operador!
hermitiano,!notamos!que:!

!
(II9.4)!
Da!mesma!forma:!

!
! (II9.5)!
A!relação!de!comutação,! !! , !! = !ℏ,!implica!a! !! , !! = !ℏ.!!!
!
Vamos! agora! calcular! o! hamiltoniano! em! termos! dos! novos! operadores.!
Primeiro,!o!termo!de!energia!cinética:!!
!
1 (II9.6)!
!!! = !! !!! ! !!"#$ ! !!"!!" !
!
!,!!

Somando!em!n:!!
1 (II9.7)!
!!! = !! !!! ! !! !!!! !"
!
!
! !,!! !

!
A! soma! mais! à! direita,! destacada! entre! chaves,! se! assemelha! à! representação!
integral!da!função!delta:!
!
+∞
−i(k+k ')q
∫e dq = δ (k + k ') (II9.8)!
−∞ !
!
Para! o! caso! de! uma! cadeia! discreta! com! N! átomos,! sendo! N! muito! grande,! esta!
relação!se!torna20:!
!

(II9.9)!
!
Portanto,!se!obtém:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
20!Veja,!por!exemplo,!Apêndice!F!de!N.!W.!Ashcroft!e!N.!D.!Mermin,!Solid&State&Physics,!CBS!

Publishing!(Filadelfia!1976).!!

! 167!
(II9.10)!

! !
Agora,!vamos!calcular!o!termo!de!energia!potencial:!
!

(II9.11)!
!
!
Definindo:!
!"
!!! = 4!! sin! !
! (II9.12)!
Chegamos!a:!
"P P mω k %
H = ∑ # k −k + X k X−k & (II9.13)!
k
$ 2m 2 '!

!
Esse! hamiltoniano! nada! mais! é! do! que! aquele! original! escrito! em! termos! das!
amplitudes! de! Fourier! das! expansões! dos! operadores! de! momento! e! posição.!
Para!passarmos!para!a!representação!de!modo!coletivo,!precisamos!introduzir!as!
seguintes!transformações21:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
21!Essas!transformações!são!generalizações!daquelas!utilizadas!na!segunda!quantização!do!

oscilador!harmônico!simples,!como!abordado!no!Bloco!I.!!

! 168!
m 1
!ω k ak = ω k Xk + i P−k
2 2m
m 1
!ω k ak+ = ω k X−k − i Pk
2 2m
mω k X P PX 1
⇒ !ω k ak+ ak = X−k X k + iω k −k −k − iω k k k + Pk P−k
2 2 2 2m
mω k XP P X 1
⇒ !ω k ak ak+ = X k X−k − iω k k k + iω k −k −k + P−k Pk
2 2 2 2m
i i
⇒ !ω k #$ak , ak+ %& = −ω k [ X−k , P−k ] − ω k [ X k , Pk ]
2 2
⇒ #$ak , ak %& = 1
+ (II9.14)!
!
!
Os! operadores! assim! definidos! são! chamados! operadores& de& bósons.! Fazendo! a!
soma!em!k!da!terceira!expressão!em!(II9.14),!obtemos:!
!
" mω k 1 % " ω %
∑ !ω a a = ∑#$ +
k k k
2
X−k X k +
2m
Pk P−k & + ∑ #i k ( X−k P−k − Pk X k )&
' k $ 2 '!
(II9.15)!
k k

!
Agora,!tendo!em!vista!que!a!soma!sobre!k!corre!sobre!todos!os!valores!possíveis,!
positivos!e!negativos,!podemos!escrever!a!última!parcela!à!direita!como:!
!
ω " % 1 " ω %
∑#$i 2 ( X k
P − Pk X k )& = ∑ #i k ( X−k P−k + X k Pk − Pk X k − P−k X−k )&
−k −k
' 2 k $ 2 '
k
!
" ω % 1 ω !ω
∑#$i 2k ( X−k P−k − Pk Xk )&' = 2 ∑i 2k {[ X−k , P−k ] + [ Xk Pk ]} = −∑ 2 k (II9.16)!
k k k

!
Com!isso,!obtemos!finalmente:!
!
! 1$
H = ∑ !ω k # ak+ ak + & (II9.17)!
k
" 2%!
!
Esse! hamiltoniano! tem! obviamente! o! formato! daquele! de! um! oscilador!
harmônico! simples.! Ou! seja,! o! procedimento! matemático! utilizado! permitiu!
transformarmos! um! problema! de! N! osciladores! acoplados! em! uma! soma! de!
osciladores! simples,! desacoplados.! Esses! “novos! osciladores”! são! os! modos!

! 169!
normais! de! vibração! da! cadeia,! e! o! hamiltoniano! acima! representa! a! sua!
quantização.!!
!
É! comum! escrever! a! definição! dos! operadores! coletivos! de! uma! forma! mais!
simétrica,!separando!os!termos!positivos!e!negativos!de!k:!
!

(II9.18)!
!
!
Definidos!assim,!é!fácil!obter!uma!relação!entre!as!coordenadas!de!partículas!e!as!
coordenadas!de!modos!coletivos:!
!

(II9.19)!

!
!
Da! mesma! forma! que! a! quantização! dos! modos! normais! do! campo!
eletromagnético! são! as! partículas! que! chamamos! fótons,! a! quantização! dos!
modos! normais! dos! osciladores! mecânicos! são! chamados! fônons.! No!
hamiltoniano! acima,! o! operador!!!! !! !tem! autovalores! inteiros,!!! = 0, 1, 2, 3, ⋯!
e! representa! o! número! de! fônons! com! energia!ℏ!! .! Note! que,! para! k! pequeno,!
!!!
!! ! ∝ ! ! ! → !"
= !! !~!! ,! o! que! é! característico! de! ondas! sonoras! (longos!

comprimentos! de! onda).! Por! essa! razão,! fônons,! nesses! modos! são! chamados!!
acústicos.!!
!
De! posse! desse! hamiltoniano,! podemos! agora! calcular! o! calor! específico! de!
fônons! de! um! sólido,! como! obtido! por! Debye22!em! 1912.! Para! isso! precisamos!
primeiro!calcular!a!energia!interna!do!sistema!de!fônons!dada!por:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
22!Debye,!P.&(1912).&"Zur&Theorie&der&spezifischen&Waerme".&Annalen&der&Physik&&39&(4):&789–839.!

! 170!

U =∑ !ω k /kBT
k
,! (II9.20)!
k e −1
!
com!!! !dado! pela! Eq.! (II9.12).! Debye! assumiu! fônons! acústicos! escrevendo!
!! = !",! que! é! característico! de! propagação! de! ondas! sonoras.! Além! disso,!!
postulou!que!existe!uma!frequência!máxima!de!oscilação!para!os!modos!normais,!
a! qual! se! passou! a! chamar! frequência! de! Debye,! !! .! A! existência! de! tal!
frequência! decorre! do! fato! de! que! os! átomos! de! uma! cadeia! cristalina! se!
encontram!separados!por!uma!distância!mínima,!o!que!define!um!comprimento!
de! onda! mínimo! para! os! fônons.! ! A! energia! de! um! fônon! com! a! frequência! de!
Debye! é! chamada! energia! de! Debye:!!! = ℏ!! .! Finalmente,! a! partir! da! energia!
de! Debye,! podemos! definir! a! temperatura! de! Debye,! importante! parâmetro!
experimental:!!! = !! /!! .!Fazendo!a!transformação!de!soma!para!integral:!
!
V
∑→ 8π ∫ d k ,! 3
3

!
obtemos!para!a!energia!interna!dos!fônons:!
!
kD
U 1 !vk
=u= 3 ∫e !vk/kBT
d 3k !
V 8π 0 −1
!
Fazendo!a!substituição!de!variáveis:!!
!vk
x= ,!
k BT

obtemos:!
4 θ D /T
3!v ! kBT $ x3
u= # & ∫ dx ! (II9.21)!
2π 2 " !v % 0 e x −1

!
O! fato! “3”! que! aparece! do! lado! direito! é! introduzido! para! representar! as! três!
direções! de! polarização.! Dessa! expressão,! vemos! que! a! dependência! do! calor!
específico! com! a! temperatura,!!! = !"/!" ,! é! bem! complexa! e! depende! da!
temperatura! de! Debye,! no! caso! geral.! No! entanto,! para! baixas! temperaturas,!

! 171!
! → 0,! o! limite! superior! da! integral! se! torna!!! /!! ! → ∞,! e! a! integral! fica!
independente! da! temperatura.! Nesse! limite,!!!~!! ! !e!!! !~!! ! ,! como! observado!
experimentalmente.! Para! temperaturas! intermediárias,! o! calor! específico! é!
ajustado! usando! (II9.21),! tendofse! como! único! parâmetro! de! ajuste! a!
temperatura!de!Debye.!!
!
II10"Segunda"quantização:"mágnons!
Outro! sistema! no! qual! a! aplicação! do! formalismo! de! segunda! quantização! é!
importante! é! aquele! de! uma! cadeia! de! spins! acoplados.! Esse! sistema! tem!
semelhanças! com! o! tratado! na! sessão! anterior;! porém,! com! uma! relação! de!
dispersão!diferente!daquela!para!fônons.!!
!
Considere! uma! cadeia! de! N! spins! separados! entre! si! por! uma! distância! ! ,!
acoplados! entre! si! por! meio! da! interação! de! Heisenberg! e! submetidos! a! um!
campo!magnético!estático!!! ,!aplicado!ao!longo!da!direção!Z:!
!
H = −J 0 ∑ SR •SR+d − gµ B B0 ∑ SRZ (II10.1)!
R,d R !
!
O!símbolo!!! "representa!o!spin!na!posição!R!da!cadeia,!e!!!!! ,"o!seu!vizinho.!Em!
termos!dos!operadores!de!“levantamento”!e!“abaixamento”!de!spins,!temos:!
!
1 + −
SR • SR+d =
2
(SR SR+d + SR− SR+d
+
) + SRZ SR+dZ ! (II10.2)!

E!também:!
1 + −
SRZ =
2
( SR SR − SR+ SR− ) (II10.3)!
!
!
Agora,! de! forma! semelhante! ao! que! foi! feito! na! seção! anterior,! realizamos! uma!
transformação! para! a! representação! de! movimento! coletivo,! por! meio! da!
expansão!de!Fourier!dos!operadores!de!spin:!
!

! 172!
2S
SR− =
N k
∑ eik•Rbk
(II10.4)!
2S
SR+ =
N k
∑ e−ik•R bk+
!
!
É! fácil! ver! que! !"bk , bk+ #$ = 1 .! Substituindo! esses! operadores! no! hamiltoniano! e!

utilizando! as! propriedades! da! função! delta,! como! anteriormente,! após! algumas!
manipulações,!chegafse!ao!resultado!final:!!
!
!
H = − ( J 0 NzS 2 + gµ B B0 NS ) + ∑ !ω k bk+ bk
k

# 1 & (II10.5)!
!ω k = 2J 0 zS %1− ∑ cos(k • d)( + gµ B B0 !
$ z d '

onde!z!é!o!número!de!spins!vizinhos!da!posição23!R.!!
!
O! primeiro! termo! dentro! dos! parênteses! do! lado! direito! do! hamiltoniano,!
representa!a!interação!de!troca!total,!máxima,!de!uma!cadeia!com!N!spins,!cada!
um!deles!acoplado!aos!seus!z!vizinhos.!Esta!seria!a!energia!total!na!ausência!de!
excitações!e!sem!campo!magnético!aplicado.!!!
!
O! segundo! termo,! dentro! dos! mesmos! parênteses! representa! a! energia! total! de!
um! sistema! de! N! spins! em! um! campo! magnético! e! que! não! interagem! entre! si.!!
Finalmente,! o! último! termo! representa! as! excitações! elementares! do! sistema,!
chamadas!mágnons.!!Estes!são!quantizações!dos!modos!normais!de!oscilação!do!
sistema! magnético.! Uma! representação! esquemática! de! um! modo! de! ondas! de!
spin!é!mostrada!na!Figura!II10.1.!As!excitações!elementares!aumentam!a!energia!
magnética!do!sistema.!
!
Repare! na! relação! de! dispersão,! que,! para! grandes! comprimentos! de! onda,!
podemos!expandir!o!cosseno!e!obter!!! ! ∝ ! ! ! .!Nesse!limite,!considerado!válido!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
23!Supõefse!que!cada!spin!na!posição!R!é!cercado!por!z!outros!spins,!distantes!!d!de!R.!

! 173!
para! baixas! temperaturas,! podemos! calcular! a! energia! interna! e! o! calor!
específico! de! mágnons! e! os! compararmos! com! os! casos! anteriores.! Escrevendo!
!! = !! ! !teremos:!
!
1 ∞
A!k 2
u= 3 ∫e A!k 2 /kBT
4 π k 2 dk
8π −1
0
(II10.6)!
A! ∞
k 4 dk
u= ∫e A!k 2 /kBT
!
2π 2 0 −1
5/2
A! 2 1& k ) ∞
x 3/2 dx
x≡ k ⇒ k 4 dk = ( B + T 5/2 ∫ x
k BT 2 ' A! * 0 e −1

!
No! limite! de! baixas! temperaturas! a! integral! independe! de! T! e! vale!
!
aproximadamente!1,78.!Vemos,!portanto,!que!!! ∝ ! ! ! ! → ! !! ! ∝ ! ! !/! .!Portanto,!a!
observação! dessa! dependência! com! a! temperatura! no! calor! específico! de! um!
material!magnético!é!uma!assinatura!da!presença!de!mágnons!no!sistema.!!
!
!

!
!
Figura!II10.1!–!Uma!onda!de!spins!é!um!movimento!coerente!dos!spins!de!
!
átomos!vizinhos!que!se!acoplam!via!interação!de!Heisenberg.!A!quantização!
!
dessas!ondas!são!os!mágnons.!Essas!partículas!(ou!excitações!elementares)!
! estão!para!o!movimento!de!spins!assim!como!os!fônons!estão!para!as!ondas!
sonoras!ou!os!fótons!para!o!movimento!do!campo!eletromagnético!
"
"
II11."Matriz"densidade"
Em! geral,! os! textos! clássicos! de! mecânica! quântica! não! enfatizam! o! caráter!
intrinsecamente! probabilístico! dos! experimentos! feitos! em! sistemas! com!
propriedades! quânticas.! Ao! lidarmos! com! sistemas! quânticos,! nos! deparamos!

! 174!
com! dois! tipos! de! indeterminismo.! Um! deles! é! intrínseco! à! natureza,! e,! para!
exemplificáflo,!vamos!considerar!os!dois!estados!de!spin!abaixo:!
!
ψ1 = ↑
↑ +↓
ψ2 =
2 !
!
Suponha! que! uma! partícula! seja! preparada! aleatoriamente! em! um! desses!
estados! e! que! um! observador! que! não! tenha! conhecimento! sobre! os! estados!
queira! determinar! em! qual! deles! ela! está! fazendo! apenas! 1! medida.! É,!
obviamente,! impossível! com! apenas! uma! medida,! pois! o! autoestado! up! ocorre!
nos!dois!casos.!Ainda!que!ele!encontre!o!estado!down,!não!conseguirá!determinar!
em!qual!dos!dois!a!partícula!foi!preparada.!A!única!forma!é!realizar!um!grande!
número! de! medidas! e! fazer! a! média! ao! final:! se! aproximadamente! metade! das!
vezes! for! encontrado! o! estado! down,! significa! que! o! estado! preparado! é! ψ 2 ;!

caso! contrário,! a! resposta! será! ψ1 .! Este! caráter! estatístico! é! intrínseco! à!

mecânica!quântica!e!não!pode!ser!eliminado,!ainda!que!tenhamos!certeza!sobre!
os!estados.!!
!
A!outra!indeterminação!ocorre!porque,!em!geral,!não!se!pode!ter!certeza!sobre!o!
estado! quântico! em! si,! mas! apenas! sobre! a! probabilidade! com! que! ele! é!
produzido.!No!exemplo!acima,!seria!como!se!o!estado! ψ1 !fosse!produzido!com!

probabilidade! !! !e! o! estado! ψ 2 !com! probabilidade! !! .! Nesse! caso,! para!

distinguirmos! os! dois! estados,! temos! que! levar! em! conta! esse! segundo! tipo! de!
indeterminação,!de!natureza!clássica,!e!que!não!tem!nada!a!ver!com!a!natureza!
quântica!do!problema.!!
!
Suponha,!por!exemplo,!que!se!queira!obter!o!valor!esperado!da!energia.!Após!um!
número! muito! grande! de! medidas,! se! tivéssemos! certeza! de! que! o! estado!
preparado! foi! ψ1 ,! o! valor! médio! será! E1 = ψ1 H ψ1 .! Mas,! se! soubéssemos!

que! foi! ψ 2 ,! teríamos! E2 = ψ 2 H ψ 2 .! Mas! como! não! temos! certeza! da!

preparação,!o!valor!médio!final!obtido!no!experimento!será:!

! 175!
!

E = E1 p1 + E2 p2
! (II11.1)!
!
Essa! expressão! final,! claramente,! inclui! os! dois! tipos! de! indeterminação,! a!
quântica! (por! meio! dos! valores! esperados)! e! a! clássica! (por! meio! das!
probabilidades! clássicas).! A! formalização! deste! procedimento! para! qualquer!
estado!é!feita!por!meio!de!uma!ferramenta!da!física!estatística!chamada!matriz!
densidade.!
!
Denominafse! mistura! estatística! um! sistema! quântico! sobre! o! qual! não! se!
conhece! o! estado! quântico,! mas! apenas! um! conjunto! de! estados! ψ k !que!

ocorrem!com!probabilidades!!! :!
!

{ ψk , pk , k = 1, 2, 3,!}
! (II11.2)!
!
Para!cada!estado!k,!definefse!o!seu!projetor:!
!
Pk = ψ k ψ k ,! (II11.3)!
e!o!operador!“médio”!a!seguir:!
!
Pk ≡ ρ = ∑ pk ψ k ψ k (II11.4)!
k !
!
Este!operador!médio!é!chamado!operador!densidade,!ou!matriz!densidade.!!
Para!entendermos!o!significado!da!matriz!densidade,!considere!o!produto!de!um!
observável!qualquer!Ô!pelo!operador!densidade:!
!
Ôρ = ∑ pkÔ ψ k ψ k ! (II11.5)!
k

!
Expanda!os!estados! ψ k !na!base!de!autovetores!de!Ô:!

! 176!
ψ k = ∑ cnk n
n

Ô n = λn n
(II11.6)!
⇒ Ôρ = ∑∑∑ pk λn cnk ckm
*
n m
k n m !
!
Finalmente,!tomemos!o!traço!para!obter:!
!

{ }
Tr Ôρ = ∑∑∑∑ pk λn cnk ckm
*
jn m j
k n m j

{ }
Tr Ôρ = ∑∑∑∑ pk λn cnk ckm
*
δ j,nδm, j
k n m j
! (II11.7)!
2
{ }
Tr Ôρ = ∑∑ pk λn cnk
k n
2
{ }
Tr Ôρ = ∑ pk ∑ λn cnk = ∑ pk ψ k Ô ψ k =∑ pk Ô
k
k n k k

!
Ou!seja,!a!operação!de!traço!do!produto!do!observável!pelo!operador!densidade!
fornece! o! valor! médio! do! observável,! o! qual! inclui! ambas! as! estatísticas,! a!
quântica! e! a! clássica.! Portanto,! a! determinação! do! operador! densidade! de! uma!
mistura! estatística! é! tão! importante! quanto! a! determinação! do! vetor! de! estado!
de!uma!sistema!puro.!!
!
Vamos! agora! derivar! uma! equação! diferencial! para! a! evolução! do! operador!
densidade!em!relação!ao!tempo,!a!partir!da!sua!definição:!
!

∂ρ " ∂ ψk ∂ ψk %
= ∑ pk # ψk + ψk &
∂t k $ ∂t ∂t '
∂ρ 1
= ∑ pk {i!H ψ k ψ k − i! ψ k ψ k H }
∂t i! k
!
∂ρ 1* -
= , H, ∑ pk ψ k ψ k /
∂t i! + .
k
(II11.8)!
∂ρ i
= [ ρ, H ]
∂t !
!

! 177!
Ou! seja,! conhecendofse! o! hamiltoniano! do! sistema,! temfse! uma! equação!
diferencial! cuja! solução! é! o! operador! densidade24.! Conhecendofse! o! operador!!
densidade,! podemfse! calcular! os! observáveis! termodinâmicos! do! sistema.! Essa!
equação!está!para!misturas!estatísticas,!assim!como!a!equação!de!Schroedinger!
está!para!sistemas!puros!isolados.!!
!
Um! caso! particularmente! importante! de! evolução! temporal! é! aquele! em! que! o!
hamiltoniano! não! depende! do! tempo.! Neste! caso! a! evolução! temporal! do!
operador!densidade!é:!
!
ρ (t) = e−(i/!)Ht ρ (0)e+(i/!)Ht !
(II11.9)!
!
Com! esta! expressão! podemos! calcular! o! valor! médio! de! um! observável! em!
qualquer!instante!de!tempo:!
!

O (t) = Tr {Oρ (t)}


! (II11.10)!
!
Uma!propriedade!importante!da!matriz!densidade!é!a!do!traço:!
!
Tr {ρ } = ∑ pk ∑ n ψ k ψ k n
k n
2
! (II11.11)!
Tr {ρ } = ∑ pk ∑ ank = ∑ pk = 1
k n k

!
onde! usoufse! a! expansão! ψ k = ∑ ank n .! Essa! propriedade! de! conservação! do!
n

traço! da! matriz! densidade! representa,! obviamente,! a! conservação! da!


probabilidade.!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
24!Repare!que!essa!equação!é!semelhante!na!forma,!mas!não!igual,!à!equação!de!Heisenberg!para!

um!operador!dependente!do!tempo!(veja!Problema!6!desse!bloco):!
dÔ(t) i ! ∂Ô(t)
= " H,Ô(t)#$ + !
dt ! ∂t
!

! 178!
Uma!segunda!propriedade!se!obtém!do!traço!do!quadrado!de!ρ:!
!

ρ 2 = ∑∑ pk pn ψ k ψ k ψ n ψ n
k n

ρ = ∑∑ pk pn ck,n ψ k ψ n
2

k n

Tr {ρ 2
} = ∑∑ p p c k n k,n m ψk ψn m
k,n m
!
Tr {ρ 2 } = ∑∑ pk pn ck,n ψ n m m ψ k
k,n m

Tr {ρ 2
}=∑p p c k n k,n ψ n ψ k = ∑ pk pn ck,n ck,n
*

k,n k,n
2
Tr {ρ 2
}=∑p p k n ck,n
k,n (II11.12)!
!
Vemos,!portanto,!que!o!traço!do!quadrado!de! ρ!será!necessariamente!menor!ou!
igual!a!1,!já!que!é!formado!pelo!produto!de!três!probabilidades.!Essa!quantidade!
será! igual! a! 1! apenas! para! um! estado! puro,! ou! seja,! um! estado! para! o! qual!
!! = !! = 1!e!todos!as!outras!probabilidades!iguais!a!zero.!Assim,!essa!operação!
pode! ser! utilizada! como! critério! para! se! avaliar! se! uma! dada! matriz! densidade!
representa!um!estado!puro!ou!uma!mistura!estatística.!Vale!a!pena!enfatizar!que!
essas! propriedades! devem! ser! observadas! em! qualquer! instante,! tanto! para!
matrizes!estáticas!quanto!as!que!evoluam!no!tempo:!
!
Tr {ρ } = 1
!
Tr {ρ 2 } ≤ 1 (II11.13)!

!
Os! elementos! da! diagonal! principal! de! uma! matriz! densidade! são! chamados!
populações,!e!são!dados!por:!
!
2
pn = n ρ n = ∑ pk n ψ k ψ k n = ∑ pk cnk
(II11.14)!
k k !
!

! 179!
Esse! número! representa! a! probabilidade! do! autoestado! n !ser! obtido! em! uma!

medida!sobre!um!sistema,!para!qualquer!estado! ψ k da!mistura25.!!

!
Os!elementos!!fora!da!diagonal!principal!de!uma!matriz!densidade!são!chamados!!
coerências:!!!
!

!!" = ! ! ! = !! !|!! !! |! ! (II11.15)!


!

!
As! coerências! são! de! primeira! ordem,! segunda! ordem! etc.,! dependendo! da!
posição!da!linha!em!que!se!encontram!em!relação!à!diagonal!principal!da!matriz.!
Coerências!estão!ligadas!a!observáveis!importantes!e!também!às!correlações!do!
sistema.! Como! exemplo! de! aplicação! do! formalismo,! vamos! calcular! as!
componentes! da! magnetização! de! um! sistema! de! N! spins! ½! em! equilíbrio.! A!
matriz!densidade!expandida!na!base!de!autoestados!de!um!spin!pode!ser!escrita!
como:!
!
ρ = p↑ ↑ ↑ + p↓ ↓ ↓
! (II11.16)!
!
E!as!médias!das!componentes!da!magnetização:!
!

2µ B Sz = M z = 2µ BTr {Sz ρ } = 2µ B { ↑ Sz ρ ↑ + ↓ Sz ρ ↓ }
M z = µ B ( p↑ − p↓ )
Mx = My = 0 (II11.16)!
!
!
As! componentes! X! e! Y! são! zero,! pois! a! matriz! densidade! é! diagonal! na! base! da!
componente!Z!do!spin.!Considere,!no!entanto,!o!caso!geral!para!um!spin:!
!
# p c1 &
ρ = p1 ↑ ↑ + p2 ↓ ↓ + c1 ↑ ↓ + c2 ↓ ↑ = % 1 (
% c2 p2 ('
$ ! (II11.17)!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
25!Podemos!pensar!nos!elementos!da!diagonal!de!!!como!as!médias!estatísticas!das!

probabilidades!quânticas,! !! ! ,!para!cada!autoestado.!

! 180!
!
Nesse!caso,!a!componente!Z!será!dada!como!anteriormente,!mas:!
!
1 1
Sx = ↑ ↓+ ↓ ↑
2 2
c +c (II11.18)!
⇒ Tr {Sx ρ } = 1 2
2 !
!
Com! expressão! semelhante! para! a! componente! Y.! No! Bloco! III,! voltaremos! a!
abordar! o! papel! das! coerências! da! matriz! densidade! para! as! aplicações! no!
processamento!da!informação!quântica!(Seção!III8).!!
!
Outro! aspecto! importante! diz! respeito! às! matrizes! densidade! de! sistemas!
compostos.!Se!dois!sistemas!A!e!B!têm!matrizes!densidade!!!! e!!! ,!uma!matriz!do!
sistema!composto!pode!ser!formada!pelo!produto!tensorial26:!
!
ρ A+B = ρ A ⊗ ρ B ! (II11.19)!
!
Por!exemplo:!
!
! $ 1 2
ρA = # 1 / 3 0 &= ↑ ↑ + ↓ ↓
" 0 2/3 % 3 3
! $ 3 5
ρB = # 3 / 8 0 &= ↑ ↑ + ↓ ↓
" 0 5/8 % 8 8
! 1/8 0 0 0 $
! $ ! $ # &
ρ A ⊗ ρB = # 1 / 3 0 & ⊗ # 3/8 0
&=#
0 5 / 24 0 0 &
" 0 2/3 % " 0 5/8 % # 0 0 1/ 4 0 &
# 0 0 0 5 /12 &
" %
1 5 1 5
ρ A ⊗ ρ B = ↑↑ ↑↑ + ↑↓ ↑↓ + ↓↑ ↓↑ + ↓↓ ↓↓ (II11.20)!
8 24 4 12 !
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
26!A!forma!mais!geral!da!matriz!do!sistema!composto!seria!uma!combinação!linear!de!tais!
produtos.!

! 181!
Nesse! exemplo,! utilizamos! matrizes! diagonais,! mas,! naturalmente,! o!
procedimento! é! válido! para! quaisquer! matrizes.! Para! adicionar! mais!
subcomponentes!ao!sistema,!basta!proceder!com!o!produto!tensorial.!Note!que,!
no!caso!de!spins!1/2,!!o!tamanho!do!espaço!de!Hilbert!(número!de!elementos!da!
matriz!densidade)!dobra!para!cada!spin!adicionado!ao!sistema!!
!
Vamos!agora!olhar!um!exemplo!de!evolução!temporal.!Suponha!que,!em!! = 0,!a!
matriz!densidade!de!um!sistema!de!um!spin!½!seja,!na!base!de!Z27:!
!
3/4 0 (II11.21)!
! 0 = !
0 1/4
!
Um!campo!magnético!é!!aplicado!ao!longo!de!+X.!Vamos!calcular!as!componentes!
da!magnetização!em!um!tempo!t&posterior.!
!
Primeiro,!notemos!que!o!hamiltoniano!é:!
!
H = −2µ B BSx = −µ B Bσ x ! (II11.22)!
!
Como!esse!hamiltoniano!não!depende!de!t,!a!matriz!densidade!será:!
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
27!Esta!matriz!densidade!representa!um!sistema!cuja!probabilidade!de!ocupação!do!estado!de!

spin!up!é,!em!media,!2/3,!e!a!de!ocupação!do!estado!down!é,!em!media,!1/3.!!

! 182!
ρ (t) = e ( B ) x ρ (0)e ( B ) x
i µ Bt/! σ −i µ Bt/! σ

( " µ Bt % " µ Bt % + ( " µ Bt % " µ Bt % +


ρ (t) = ) I cos $ B ' + isin $ B 'σ x , ρ (0) ) I cos $ B ' − isin $ B 'σ x ,
* # ! & # ! & - * # ! & # ! & -
" cos µ Bt / ! isin µ Bt / ! %"
$ ( B ) ( B ) ' 3 / 2 0 %"$ cos (µ B Bt / !) −isin (µ B Bt / !) %
'
ρ (t) = $ '
$ isin (µ Bt / !) cos (µ Bt / !) '# 0 1 / 2 &$ −isin (µ Bt / !) cos (µ Bt / !) '
# B B & # B B &
" cos µ Bt / ! isin µ Bt / ! %" 3cos µ Bt / ! / 2 −3isin µ Bt / ! / 2 %
( B ) ( B ) '$ ( B ) ( B ) '
ρ (t) = $
$ isin (µ Bt / !) cos (µ Bt / !) '$ −isin (µ Bt / !) / 2 cos (µ B Bt / !) / 2 '
# B B &# B &
" %
1 $ 3cos (µ B Bt / !) + sin (µ B Bt / !) −isin ( 2µ B Bt / !)
2 2

ρ (t) = $ '
2 isin ( 2µ B Bt / !) cos (µ B Bt / !) + 3sin (µ B Bt / !) '
2 2
# & !
! (II11.23)!
!
Podemos!agora!calcular!as!componentes!da!magnetização:!
!
µ B " 2µ B Bt % µ B " 2µ B Bt %
M x (t) = µ BTr {ρ (t)σ x } = −i sin $ ' + i sin $ '=0
2 # ! & 2 # ! &
µ " 2µ Bt % µ " 2µ Bt % " 2µ Bt %
M y (t) = µ BTr {ρ (t)σ y } = − B sin $ B ' − B sin $ B ' = −µ B sin $ B '
2 # ! & 2 # ! & # ! &
" 2µ Bt %
M z (t) = µ BTr {ρ (t)σ z } = +µ B cos $ B '
# ! & !
! (II11.24)!
!
Vemos,!portanto,!que!as!componentes!Y!e!Z!oscilam!com!frequência!! = 2!! !/
ℏ.!Essas!soluções!reproduzem!corretamente!o!que!é!previsto!classicamente!pela!
segunda!lei!de!Newton!para!torques!externos:!
!
dM (II11.25)!
= M × γ B ,!
dt
!
onde! γ! é! o! fator! de! proporcionalidade! entre! o! momento! angular! e! a!
magnetização28.!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
28!A! segunda! lei! de! Newton! diz! que! a! taxa! de! variação! do! momento! angular! é! proporcional! ao!

torque! exercido! por! forças! externas.! Além! disso,! sabemos! que! a! magnetização! e! o! momento!
angular!se!relacionam!por!! = !!!.!

! 183!
!
A! operação! inversa! ao! produto! tensorial! entre! matrizes! densidade! é! a! de! traço!
parcial.! Essa! operação! permite! que,! dada! uma! matriz! de! um! sistema! composto,!
se!obtenham!as!matrizes!marginais!dos!subsistemas!individuais.!O!traço!parcial,!
como! sugere! o! nome,! é! uma! operação! de! traço! sobre! os! estados! de! um! dos!
subsistemas! que! compõem! o! sistema! total.! Por! exemplo,! considere! a! matriz!
densidade!de!dois!spins29:!
!
ρ = α ↑↑ ↑↑ + β ↑↓ ↑↓ + γ ↓↑ ↓↑ + δ ↓↓ ↓↓
! (II11.26)!
!
O!estado!do!primeiro!spin!é!obtido!fazendo!o!traço!parcial!sobre!os!estados!do!
segundo! spin;! e! o! estado! do! segundo! é! obtido! somandofse! sobre! os! estados! do!
primeiro:!
!
ρ A = TrB {ρ } = ↑ ρ ↑ + ↓ ρ ↓ = (α + β ) ↑ ↑ + (γ + δ ) ↓ ↓
ρ B = TrA {ρ } = ↑ ρ ↑ + ↓ ρ ↓ = (α + γ ) ↑ ↑ + ( β + δ ) ↓ ↓ (II11.27)!
!
!
Em!notação!matricial,!essas!matrizes!são:!
!
!+! 0 !+! 0
!! = !!e!!!! = !
0 !+! 0 !+!
!
Como!veremos!no!Bloco!III!deste!texto,!o!conhecimento!das!matrizes!parciais!por!
meio!da!operação!de!traço!parcial!é!essencial!para!os!protocolos!de!transmissão!
de!informação!quântica.!
!
Finalmente,! vale! observar! que! os! postulados! da! mecânica! quântica,! enunciados!
inicialmente! em! termos! de! vetores! de! estado,! podem! ser! reformulados! em!
termos!de!operadores!densidade:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
29!Novamente,!para! facilitar! o! cálculo,! usamos! como! exemplo! uma! matriz! diagonal.! Porém,! a!
operação!é!geral!e!pode!ser!aplicada!a!qualquer!matriz!composta.!

! 184!
Postulado" 1:! A! todo! sistema! físico,! corresponde! um! espaço! vetorial! complexo!
chamado! espaço! de! Hilbert.! O! sistema! é! completamente! caracterizado! por! um!
operador! densidade,! hermitiano,! positivo! e! com! traço! igual! a! 1,! que! atua! nos!
elementos!desse!espaço.!
!
Postulado"2:!Transformações!de!um!sistema!quântico!fechado!são!descritas!por!
operações!unitárias!que!atuam!sobre!o!operador!densidade:!
!
ρ ' = U ρU + ! (II11.28)!
!
A!evolução!temporal!é!dada!por:!
!
∂ρ i (II11.29)!
= [ ρ, H ] ,!
∂t !
!
onde!H!é!o!hamiltoniano!do!sistema.!
!
Postulado"3:!Operadores!densidade!de!sistemas!compostos!atuam!no!espaço!de!
estados! daqueles! sistemas! (veja! Eq.! (II1.27))! e! são! construídos! pelo! produto!
tensorial!dos!operadores!densidade!dos!sistemas!individuais30:!
!
ρ = ρ1 ⊗ ρ2 ⊗!⊗ ρ N ! (II11.30)!
!
Postulado"4:!Medidas!são!descritas!por!um!conjunto!de!operadores!de!medidas,!
Mm.! A! probabilidade! de! um! resultado! m! ser! obtido! após! uma! medida! sobre! um!
sistema!com!operador!densidade!ρ é:!
!
p(m) = Tr {M m ρ } ! (II11.31)!
!
O!estado!do!sistema!após!a!medida!é:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
30!Novamente,!aqui,!a!forma!mais!geral!do!estado!é!uma!combinação!linear!de!tais!produtos.!

! 185!
M m ρ M m+
ρ final = !
Tr {M m ρ } (II11.32)!

!
E,!em!qualquer!instante!de!tempo,!o!valor!médio!de!um!observável!O!é:!
!

O = Tr {Oρ } ! (II11.33)!
!
Para! concluirmos! essa! Seção! sobre! matriz! densidade,! precisamos! especificar!
como!obter! ρ(0)!para!um!dado!sistema!físico.!Vimos!que,!se!o!hamiltoniano!não!
depende! do! tempo,! podemos! determinar! a! matriz! densidade! em! qualquer!
instante!de!tempo,!usando!o!resultado!(II11.9).!No!entanto,!para!isso,!precisamos!
conhecer! ρ(0).! Em! geral,! ρ(0)! representa! um! sistema! em! equilíbrio!
termodinâmico.! Para! sistemas! compostos! por! um! número! muito! grande! de!
partículas,! a! uma! temperatura! fixa,! ρ(0)! é! obtida! a! partir! do! princípio! de!
maximização!da!entropia31,!e!o!resultado!é:!
!
e−H /kBT e−H /kBT
ρ (0) = ρeq = = ,!
Tr {e−H /kBT } Z (II11.34)!

!
onde! H! é! o! hamiltoniano;! e! Z,! a! função! de! partição.! Vemos,! portanto,! que,!
conhecendofse!o!hamiltoniano,!temos!um!procedimento!bastante!genérico!para!
calcularmos! a! matriz! densidade! do! sistema! e! qualquer! observável!
termodinâmico!em!qualquer!instante!de!tempo.!!
!
Como!exemplo,!considere!o!hamiltoniano!de!um!sistema!com!energia!ℏ!:!
!
H = !ω a + a ! (II11.35)!
!

Vamos!calcular!o!número!médio!de!partículas,! n = a + a ,!a!uma!temperatura!de!

equilíbrio!T.!Segundo!(II11.33)!e!(II11.34),!esse!número!é!dado!por:!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
31!Ver,!por!exemplo,!Ivan!S.!Oliveira!e!Vitor!L.!B.!de!Jesus,&Introdução&à&Física&do&Estado&Sólido,!3a.!

Edição,!Complemento!C1,!Livraria!da!Física!(São!Paulo,!2017).!!

! 186!
!
−( !ω /kBT )a+a

n = Tr {ρ a + a} =
{
Tr a + ae }
+ (II11.36)!
Tr e { −( !ω /kBT )a a
} !
!
Agora,!para!calcularmos!os!traços,!precisamos!conhecer!a!natureza!quântica!das!
partículas! do! sistema:! se! forem! bósons,! a! soma! vai! de! zero! até! infinito,! e! o!
resultado!é:!
!

−!ω /kBT n
∑ n (e )
n = n=0
=
1 (II11.37)!
∞ +!ω /kBT
−!ω /kBT n e −1
∑(e )
n=0 !
!
que! é! a! própria! distribuição! de! Planck! para! a! radiação! de! corpo! negro.! No!
entanto,! se! os! operadores! forem! de! férmions,! o! princípio! de! Pauli! deve! ser!
observado,!e!as!somas!só!têm!dois!termos,!para!n&=&0!e!para!n!=!1:!
!
1
−!ω /kBT n
∑ n (e ) 1
n=0
n = =
(II11.38)!
1 +!ω /kBT
−!ω /kBT n e +1
∑(e )
n=0 !
!
que!é!a!distribuição!de!FermifDirac.!!
!
Para!apreciarmos!como!a!natureza!quântica!das!partículas!afeta!as!propriedades!
físicas!dos!objetos!macroscópicos,!vamos!calcular!o!calor!específico!de!um!gás!de!
férmions,!usando!(II11.32).!O!primeiro!passo!é!calcular!a!energia!interna!do!gás!
para! uma! temperatura! de! equilíbrio.! Lembremos! que,! na! Seção! I17,! a! energia!
total! do! gás! (no! caso,! elétrons)! foi! calculada! para! T! =! 0! (Eq.! I17.9).! De! forma!
semelhante! ao! que! foi! feito! para! o! caso! dos! fótons,! é! conveniente! fazermos! o!
cálculo!usando!a!densidade!de!estados!para!um!gás!de!elétrons!livres.!A!integral!
que!temos!de!calcular!é:!
!

! 187!
!

!2k 2 (II11.39)!
u= ∫ n[E(k)] d 3k !
0 2m
!
onde!o!número!médio!é!dado!por!(II11.38).!É!mais!conveniente!expressarmos!a!
integral!em!termos!da!energia!do!elétron:!
!

!2k 2
u= ∫ n d 3k
0 2m

!2k 2 (II11.40)!
u= ∫ n 4π k 2 dk
2m
!
0
−1/2
m # 2mE &
dk = 2 % 2 ( dE
! $ ! '

Eg(E)
u= ∫e E/kBT
+1
dE
0

!
onde!!(!)!é!a!densidade!de!estados.!Nessa!expressão,!! ! !"!é!igual!ao!número!
de! estados! eletrônicos! entre!!!e!! + !".! Multiplicado! por! E,! resulta! na! energia!
total!no!intervalo.!O!fator!estatístico!representa!a!probabilidade!de!o!estado!com!
energia!E!estar!ocupado.!Fazendo!a!transformação:!
!
E
x= !
k BT
!
vemos!que!!!~!! ! ,!e,!portanto32,!!!~!!.!Esse!resultado!difere!dramaticamente!do!
resultado! clássico,! para! o! qual! o! calor! específico! independe! da! temperatura.!
Juntando!tudo!o!que!foi!dito!aqui!sobre!calor!específico,!ao!analisarmos!medidas!
dessa! grandeza! em! um! metal! magnético! a! baixas! temperaturas,! temos! que!
considerar! três! tipos! de! contribuição:! a! dos! fônons,! inerente! à! vibração! dos!
átomos!que!formam!o!sólido;!a!dos!mágnons!referente!às!oscilações!magnéticas;!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
32!Um!tratamento!completo!desse!problema!deve!considerar!o!chamado!potencial!químico,!que!

também!é!função!da!temperatura,!necessariamente!diferente!de!zero!para!um!gás!de!férmions.!
No!entanto,!a!aproximação!feita!aqui!não!altera!as!conclusões!finais.!Veja,!por!exemplo,!Ivan!S.!
Oliveira!e!Vitor!L.!B.!de!Jesus,!Introdução&à&Física&do&Estado&Sólido,!3a!Edição,!Livraria!da!Física!
(São!Paulo,!2017).!
!

! 188!
e!a!dos!elétrons,!responsáveis!pela!condução!de!corrente.!Portanto,!medidas!de!
calor! específico! nesses! materiais! são! ajustadas! com! curvas! contendo! essas! três!
contribuições:!
!
c = γ T + αT 3 + β T 3/2 ! (II11.41)!
!
!
onde! α,! β! e! γ! são! parâmetros! de! ajustes.! Fazendofse! um! gráfico! de!!! vs. ! ! ,! é!

possível!detectar!a!contribuição!individual!desses!graus!de!liberdade!para!o!calor!
específico,! cada! qual! com! a! sua! própria! assinatura! quântica,! registrada! na!
dependência!com!a!temperatura.!
!
!
II12." Operadores" de" criação" e" aniquilação" para" férmions;! interação" entre"
elétrons"via"fótons."
"
O! formalismo! de! operadores! de! criação! e! aniquilação! se! aplica! também! para!
férmions.!Como!sabemos,!a!diferença!essencial!entre!férmions!e!bósons!é!que!os!
primeiros! devem! satisfazer! o! princípio! de! exclusão,! mas! os! segundos! não.! Na!
linguagem!de!segunda!quantização,!representamos!estados!de!N!férmions!como:!
!
Ψ = n1n2 !nk !nN ! (II12.1)!

!
onde!!! = 0!ou!1.! Representamos! o! operador! que! cria! um! férmion! no! estado! k!
por!!!! ;! e! o! que! destrói,! por!!! .! Esses! operadores! satisfazem! a! uma! regra! de!
anticomutação:!

{c , c } ≡ c c
k
+
n
+
k n + cn+ck = δk,n ! (II12.2)!
!
O! operador!!!! !! !tem! autovalores! 0! ou! 1,! o! número! de! férmions! no! estado! k.!
Nessa!linguagem,!o!princípio!de!exclusão!é!expresso!como:!
!
+ 2
(c )
k nk = 0 ! (II12.3)!
!

! 189!
que!meramente!expressa!o!fato!de!que!dois!elétrons!não!podem!estar!no!mesmo!
estado!k33.!
!
As! representações! matriciais! desses! operadores! podem! ser! obtidas! facilmente!
das!suas!definições!para!um!férmion:!
!
0 1
! 0 = 0; !!! 1 = |0 ! → ! = !!!!
0 0
0 0
! ! 0 = |1 ;!!! ! 1 = 0!! → ! ! = ! !
1 0
onde!os!autovetores!são:! (II12.4)!
!
! 1 $
0 =# &
" 0 % (II12.5)!
!
! 0 $
1 =# &
" 1 %

!
É! interessante! notar! que! esses! operadores! podem! ser! representados! como!
combinações!das!matrizes!de!Pauli:!
!
1 1 (II12.6)!
!= !! + !!! !!e!!! ! = !! − !!! !!!
2 2
!
Nessa! representação,! o! hamiltoniano! representando! a! energia! cinética! de! um!
conjunto!de!férmions!sem!interação!é!escrito!como:!
!
!2k 2 +
H =∑ ck ck ! (II12.7)!
k 2m
!
Existe! um! procedimento! simples! –! porém! genérico! –! para! representarmos!
qualquer!hamiltoniano!de!uma!partícula!em!linguagem!de!segunda!quantização.!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
33!Em!problemas!em!que!o!spin!deve!ser!explicitamente!levado!em!conta,!os!operadores!são!
!
escritos!como!!!"! !e!!!!" ,!significando!a!destruição!(criação)!de!uma!particula!no!estado!k,!com!
spin!σ.!

! 190!
Dado! um! hamiltoniano! escrito! em! primeira! quantização,! ! !, ! , !para!
transformáflo!na!segunda!quantização,!calculamos!a!expressão:!
!
H= ∫Ψ +
(r)H Ψ(r)d 3r !
(II12.8)!
onde:!
Ψ(r) = ∑ϕ k (r)ck
k

Ψ (r) = ∑ϕ k* (r)ck+
+
! (II12.9)!
k

⇒ H = ∑{ ∫ ϕ k* (r)H (r, p)ϕ k ' (r)d 3r}ck+ck '


k,k '

Vemos!que,!se! ϕ k forem!autofunções!de!H,!essa!expressão!se!reduz!a!(II12.7).!Se!

houver! interação! entre! férmions,! o! procedimento! pode! ser! generalizado.!


Considere!como!exemplo!a!interação!coulombiana!entre!dois!elétrons:!
!
1 !! (II12.10)!
!= !
4!!! !! − !!
!
Seguindo!o!procedimento!descrito!para!segunda!quantização,!obtemos:!
!
!! 1
!= Ψ ! !! Ψ ! !! Ψ !! Ψ !! ! ! !! ! ! !! !
4!!! !! − !!
!! 1
!= !!!! !!!! !!! !!! !!∗ ! !! !!∗ ! !! ! ! ! ! ! ! !! ! ! !! !
4!!! !! − !! !! ! !! !
!! !! !! !!

! (II12.11)!
!
Escrevendo! ϕ k (r) = eik⋅r !e!tendo!em!conta!a!expressão:!

!
1 4π
= ∑ 2 eiq⋅(r1−r2 ) ! (II12.12)!
r1 − r2 q q

!
e!a!representação!integral!da!função!delta,!obtémfse:!
!

! 191!
e2
H=∑ c+ c+ c c !
2 ∑ k1+q k2 −q k1 k2
2ε 0 q k1,k2 (II12.13)!
q

!
Esse! é! o! hamiltoniano! da! interação! coulombiana! entre! dois! elétrons,! escrito! na!
linguagem! de! segunda! quantização.! Repare! que! ele! representa! um! processo! no!
qual! dois! elétrons,! inicialmente! nos! estados! k1! e! k2,! são! aniquilados,! para!
ressurgirem! nos! estados! k1! +! q! e! k2! –! q.! O! vetor! q! representa! o! momento! do!
fóton!(quantum!da!interação!eletromagnética)!trocado!entre!os!elétrons!durante!
o! processo! de! interação.! O! processo! pode! ser! representado! graficamente! por!
meio!dos!chamados!diagramas!de!Feynman,!como!mostrado!na!Figura!!II12.1.!
!
!
!

k1 + q

q
k1 k2 - q

1 k2
2 !
!
!
Figura!II12.1!–!Representação!da!interação!entre!dois!elétrons!por!meio!da!
" troca!de!um!fóton,!usando!um!diagrama!de!Feynman.!Dois!elétrons!são!
aniquilados!nos!estados!iniciais!|k1>!e!|k2>!e!recriados!nos!estados!|k1+q>!e!
"
|k2fq>!!
"
"
II13."Interação"elétronIfônon:"pares-de-Cooper-
Nas! seções! anteriores,! vimos! como! os! diversos! tipos! de! “ondas”! podem! ser!
quantizadas! e! descritas! em! termos! das! chamadas! excitações! elementares:! um!
fóton!é!uma!excitação!elementar!de!uma!onda!eletromagnética;!um!fônon!é!uma!
excitação! elementar! de! uma! onda! elástica;! e! um! mágnon! é! uma! excitação!
elementar!de!uma!onda!de!spins.!!!

! 192!
!
As! excitações! elementares! têm! propriedades! corpusculares! –! são! bósons! –! e!
podem!interagir!com!férmions.!De!fato,!essas!partículas!de!campo!operam!como!
os!mediadores!das!interações!entre!férmions.!Por!exemplo,!duas!cargas!elétricas!
interagem!entre!si!por!meio!da!intermediação!de!fótons.!!
!
Um!dos!casos!mais!importantes!de!interação!entre!dois!férmions!por!meio!de!um!
bóson!é!o!de!dois!elétrons! dentro!da!matéria!interagindo!através!de!um!fônon.!
Essa!interação!dá!origem!a!uma!nova!partícula!composta!(2!elétrons!+!1!fônon)!
chamada!par!de!Cooper34.!!A!descoberta!dos!pares!de!Cooper!levou!à!formulação,!
por! John! Bardeen! e! John! Schrieffer,! além! do! próprio! Cooper,! da! famosa! Teoria!
BCS! da! supercondutividade,! um! dos! grandes! triunfos! da! Mecânica! quântica35.!
Uma! peculiaridade! dos! pares! de! Cooper! é! o! fato! de! que! a! interação! elétronf
elétron! via! fônon! se! dá! entre! elétrons! separados! por! grandes! distâncias!
interatômicas!(~10! !Å).!!
!
Vamos! fazer! uma! descrição! desta! interação! no! caso! simples! de! uma! cadeia!
atômica!unidimensional,!semelhante!ao!que!foi!tratado!na!Seção!II9.!!Considere!
uma!cadeia!atômica!linear,!com!os!íons!localizados!pela!coordenada!!,!com!um!
elétron! localizado! pela! coordenada! ! .! A! interação! entre! o! elétron! e! um!
determinado!íon!só!depende!da!distância!entre!eles!e!é!genericamente!descrita!
pelo!potencial:!
!
(II13.1)!
!!!! = !(! − !)!!
!
A! coordenada!!!pode! ser! decomposta! como! uma! soma! entre! a! posição! de!
equilíbrio!!! !e!o!deslocamento!causado!pela!vibração!da!cadeia,!!:!
!
(II13.2)!
! = !! + !!!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
34!Em!homenagem!a!Leon!Cooper,!o!descobridor!do!fenômeno.!Veja:!Cooper,&Leon&N.,!Bound"

electron"pairs"in"degenerate"Fermi"gas,!Phys.&Rev.,!104!(1956)!1189.!
35!Bardeen,&J.&Cooper,&L.&N.&e&Schrieffer,&J.&R.,!Microscopic"theory"of"superconductivity,!Phys.&Rev.!

106!(1957)!1175.!

! 193!
Substituindo!na!expressão!do!potencial,!para!deslocamentos!pequenos,!obtemos!
a!expansão:!
!
!" (II13.3)!
!!!! ≈ ! ! − !! − ! !
!"
!
Nesta! expressão! o! primeiro! termo! representa! a! interação! do! elétron! com! a!
cadeia! estática.! É! essa! interação! que! dá! origem! à! estrutura! de! energias!
eletrônicas! sob! a! forma! de! bandas! de! energia! nos! metais,! por! exemplo36.! O!
segundo!termo!representa!as!interações!do!elétron!com!as!vibrações!da!rede,!ou!
seja,!os!fônons.!É!nele!que!estamos!interessados.!Vamos!escrever!essa!interação!
como:!
!
ℋ!!! = −!"(x)! (II13.4)!

!
onde!deixamos!explícito!o!fato!de!que!a!proximidade!do!elétron!de!um!íon!afeta!o!
seu!deslocamento.!!
!
Como! na! Seção! anterior,! para! transformar! esse! hamiltoniano! para! a! linguagem!
de!segunda!quantização,!devemos!usar!a!fórmula:!
!

!!!! = Ψ ! ! ℋ!!! Ψ ! !" , com!!Ψ ! = ! !"# !!! !e!!Ψ ! ! = ! !!"# !!! !


! !

! (II13.5)!
!
Agora,!o!deslocamento!!(!)!deve!também!ser!escrito!em!termos!dos!operadores!
de! criação! e! aniquilação! para! fônons.! No! limite! do! contínuo,! a! expressão! se!
torna37:!!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
36!Veja,!por!exemplo,!Ivan!S.!Oliveira!e!Vitor!L.!B.!de!Jesus,!Introdução&à&Física&do&Estado&Sólido,!3a!

Ed.,!Livraria!da!Física!(São!Paulo,!2017).!
37!Veja,!por!exemplo,!C.&Kittel,!Quantum"Theory"of"Solids,!2a.!Ed.,!John!Wiley!&!Sons!(New!York!

1987).!Também!no!Apêndice!A9!de!Ivan!S.!Oliveira!e!Vitor!L.!B.!de!Jesus,!Introdução&à&Física&do&
Estado&Sólido,!3a!Ed.,!Livraria!da!Física!(São!Paulo,!2017).!

! 194!

ℋ!!! = !" ! !! ! !"# − !!! ! !!"# !
2!!!
!
(II13.6)!
!
onde!!!é!a!densidade!linear.!Inserindo!esse!hamiltoniano!na!expressão!
(II13.5),!obtemos:!
!

!

!!!! = !" !!! !! ! !! ! !(!!!!!!)! !" − !!! ! !(!!!!!!)! !" !
2!!!
!,!! !

! (II13.7)!
!
Finalmente,!usando!a!representação!integral!da!função!delta!de!Dirac,!chegamos!
ao!resultado:!
!

! !

!!!! = ! !(!) !!!! !! !! − !!!! !! !!! , com!! ! = ! !!
2!!!
!,!

! (II13.8)!
!!
Esse! hamiltoniano! se! assemelha! àquele! de! (II12.13),! e! a! sua! interpretação! é!
quase!idêntica:!o!primeiro!termo!dentro!do!parênteses!representa!um!processo!
em! que! um! elétron! inicialmente! com! momento!!!interage! com! um! fônon! com!
momento!!;! o! fônon! é! aniquilado,! e! o! elétron! passa! do! estado!!!para! o! estado!
! + !.! O! segundo! termo! é! a! situação! em! que! o! fônon! é! criado! na! interação.!
Quando!um!segundo!elétron!é!considerado,!este!tipo!de!processo!resulta!em!uma!
ligação!efetiva!entre!os!dois!elétrons,!intermediada!por!um!fônon:!são!os!pares!
de!Cooper38.!O!hamiltoniano!final!é:!
!
ℏ!! ! !
! = !! ! !!!!! !!! !!!!! !!! !
! !! !! !!! − !!!!! − ℏ! !!!
!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
38!Veja,!por!exemplo,!Complemento!A9,!de!Ivan&S.&Oliveira&e&Vitor&L.&B.&de&Jesus,!Introdução"à"
Física"do"Estado"Sólido,!3a!Ed.,!Livraria!da!Física!(São!Paulo!2017).!

! 195!
!
!
!
!
!
!
!

!
"
Figura!II13.1!–!Dois!elétrons!se!correlacionam!em!uma!rede!atômica!!a!
"
deformando!localmente!e!produzindo!um!fônon.!A!partícula!composta!pelos!
" dois!elétrons!e!o!fônon!é!um!par!de!Cooper.!Este!é!o!mecanismo!da!
supercondutividade!nos!materiais,!e!a!teoria!microscópica!que!a!formaliza!é!
" chamada!de!teoria!BCS!!
"
"
II14."Entropia,"informação"e"emaranhamento"
!Entropia! é! um! conceito! que! aparece! em! diferentes! áreas! da! física.!
Historicamente,!foi!Rudolf!Clausius!(1882f1888)!quem!propôs!a!nova!grandeza,!
inicialmente!como!uma!tentativa!de!quantificar!a!parcela!da!“energia!perdida”!de!
um!sistema,!ou!seja,!não!disponível!para!a!realização!de!trabalho.!!
!
Em! termodinâmica,! o! conceito! de! entropia! está! ligado! aos! chamados! processos!
não! adiabáticos.! Isso! pode! ser! discutido! a! partir! da! primeira! lei! da!
Termodinâmica,!uma!lei!de!conservação!de!energia!que!relaciona!a!variação!da!
energia!interna!de!um!sistema,!∆!,!o!fluxo!calor,!∆!,!!e!o!trabalho!realizado,!∆!:!

! 196!
!
∆! = ! ∆! + ! ∆!! (II14.1)!
!
Essas!três!quantidades!podem!variar!positiva!ou!negativamente.!Fluxo!de!calor!
ocorre!para!dentro!ou!fora!do!sistema!quando,!por!exemplo,!este!é!colocado!em!
contato! com! um! reservatório! térmico! a! uma! temperatura! fixa.! Por! outro! lado,!
trabalho!pode!ser!realizado!sobre!ou!pelo!sistema.!A!experiência!mostra!que!se!o!
trabalho!for!realizado!muito!vagarosamente!e!com!temperatura!fixa,!no!chamado!
regime! quase! estático,! o! sistema! estará! sempre! próximo! ao! equilíbrio.! No!
entanto,!se!o!trabalho!for!realizado!abruptamente,!uma!parte!dele!“se!perde”!sob!
a! forma! de! calor.! ! Esta! variação! de! calor,! dividida! pela! temperatura! do!
reservatório39!é!o!que!se!chama!entropia!termodinâmica:!
!
ΔQ (II14.2)!
ΔS ~
T !
!
Note! que! a! entropia! assim! definida! tem! a! mesma! unidade! que! a! constante! de!
Boltzmann:!cal/K,&J/K!etc.!!Apesar!de!depender!da!forma!como!a!transformação!é!
realizada,! a! entropia! termodinâmica! é! um! exemplo! do! que! se! chama! função! de!
estado,!cuja!variação!só!depende!dos!seus!valores!nos!estados!inicial!e!final40.!!
!
Na! sua! tentativa! de! dar! uma! fundamentação! microscópica! para! a!
Termodinâmica,! ao! lado! de! ! Ludwig! Boltzmann! (1844f1906)! e! James! Clerk!
Maxwell!(1831f1879),!Josiah!Willard!Gibbs!(1839f1903)!chegou!ao!conceito!de!
entropia!estatística,!definida!como:!!
!
S = −kB ∑ pn ln pn (II14.3)!
n !
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
39!É!importante!fazer!essa!distinção,!pois,!durante!uma!transformação!termodinâmica!sobre!um!
sistema,!este!pode!não!ter!uma!temperatura!definida.!!
40!Para!uma!interessante!discussão!sobre!Termodinâmica!em!Ressonância!Magnética!Nuclear,!
veja!Quantum"thermodynamics"and"work"fluctuation"with"applications"to"magnetic"
resonance,!W.!L.!Ribeiro,!G.!T.!Landi!e!F.!L.!Semião,!Am.&J.&Phys.,!84!(2016)!948.!

! 197!
Nesta! expressão,! !! !são! as! probabilidades! de! ocorrência! dos! chamados!
microestados!de!um!sistema.!Repare!que!a!única!conexão!com!a!termodinâmica!
que! aparece! nessa! expressão! é! a! constante! de! Boltzmann.! A! entropia! de!
Boltzmann,! assim! definida,! permite,! com! hipóteses! adicionais,! o! cálculo! das!
funções! termodinâmicas! clássicas.! No! entanto,! não! existe! até! o! momento! uma!
teoria! baseada! em! primeiros! princípios! da! qual! a! termodinâmica! seja! obtida!
como!caso!limite.!!
!
Um! microestado! é! uma! configuração! microscópica! que! resulta! em! um! estado!
macroscópico.!Para!exemplificar!a!ideia!de!microestado!e!a!aplicação!da!entropia!
estatística,!suponha!que!se!joguem!para!o!alto!quatro!moedas.!Vamos!chamar!!CA!
o!resultado!“cara”!e!CO!o!resultado!“coroa”.!Existem!16!configurações!possíveis!
de!um!resultado!qualquer:!
!
CA!CA!CA!CA!
!
CA!CA!CA!CO!
CA!CA!CO!CA!
CA!CO!CA!CA!
CO!CA!CA!CA!
!
CA!CA!CO!CO!
CA!CO!CA!CO!
CO!CA!CA!CO!
CO!CA!CO!CA!
CA!CO!CO!CA!
CO!CO!CA!CA!
!
CO!CO!CO!CA!
CO!CO!CA!CO!
CO!CA!CO!CO!
CA!CO!CO!CO!
!

! 198!
CO!CO!CO!CO!
!
Cada! uma! dessas! configurações! é! o! que! se! chama! microestado41.! ! Vemos! que!
existem! quatro! configurações! em! que! ocorre! apenas! uma! CO! e! três! CA.! Logo,! a!
!
probabilidade! dessa! configuração! ocorrer! em! uma! jogada! é!!! = !" = 1/4.! O!

mesmo!vale!para!uma!CA!e!três!CO.!!A!configuração!mais!provável!é!aquela!em!
!
que!ocorrem!duas!CA!e!duas!CO:!!! = !" = 3/8.!Finalmente,!a!probabilidade!de!

se!obter!apenas!CA!ou!apenas!CO!é!!! = 1/16.!Assim,!a!entropia!estatística!desse!
sistema!é:!
!
) 1 # 1 & 3 # 3& 1 # 1 &,
S = −kB *2 × ln % ( + ln % ( + 2 × ln % (- = 0, 97kB
+ 4 $ 4' 8 $8' 16 $ 16 '. !
!
Qual!o!significado!desse!número?!Ele!quantifica!o!grau!de!conhecimento!(ou!de!
desconhecimento)! que! temos! sobre! o! sistema.! Quanto! mais! próximo! de! 1! for! a!
entropia,! menor! é! o! conhecimento! que! temos! sobre! o! sistema.! Naturalmente!!
nesse! exemplo! com! apenas! quatro! moedas,! a! constante! de! Boltzmann! não! tem!
muito!sentido!no!resultado!final,!já!que!tal!número!de!moedas!está!longe!de!ser!
um!sistema!termodinâmico.!!!
!
Mas! a! entropia! calculada! dessa! forma! para,! por! exemplo,! um! conjunto! muito!
grande! de! spins42!! permite! obter! todas! as! funções! termodinâmicas! do! sistema,!
meramente! a! partir! de! um! cálculo! de! probabilidades!! Vêfse! que! a! entropia!
estatística!também!tem!a!mesma!unidade!que!kB.!
!
Uma! terceira! definição! de! entropia! apareceu! em! 1948,! quando! o! jovem!
engenheiro!Claude!E.!Shannon!(1916f2001),!trabalhando!no!MIT,!formulou!a!sua!
revolucionária! Teoria! Matemática! da! Comunicação 43 .! ! Shannon! estava!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
41!Em!um!sistema!físico!contendo!um!número!muito!grande!de!componentes,!como!por!exemplo!

10!" !spins!nucleares!do!hidrogênio!em!um!copo!com!água,!o!número!de!microestados!é!
infinitamente!maior.!
42!Por!exemplo,!para!100!spins!existem!1030!microestados!!
43!A&Mathematical&Theory&of&Communication,!C.!E.!Shannon,!The!Bell!System!Technical!Journal,!27!

(1948)!379.!

! 199!
interessado!em!uma!quantidade!que!pudesse!medir!o!grau!de!confiança!com!que!
se! pode! recuperar! uma! mensagem! enviada! por! meio! de! um! cabo! elétrico! (na!
época,! o! telégrafo;! atualmente! a! Internet)! sob! a! forma! de! pulsos! elétricos.! A!
entropia! de! Shannon! é! semelhante! à! entropia! estatística,! mas! não! contém! a!
constante! de! Boltzmann,! e! o! logaritmo! é! tomado! na! base! dois! e! não! na! base!
natural:!
!
S = −∑ pn log 2 pn ! (II14.4)!
n

!!
A!razão!para!isso!está!na!definição!da!unidade!de!informação,!o!dígito!binário,!ou!
bit44.!!Um!sistema!que!tem!uma!única!unidade!informação,!com!probabilidade!½!!
de!ser!0!e!½!de!ser!1,!tem!entropia!de!Shannon!igual!a!1:!
!
1 #1&
S = −2 × log 2 % ( = 1
2 $2' !
!
A!unidade!dessa!entropia!é!justamente!o!que!chamamos!atualmente!de!bit.!!
!
A! entropia! de! Shannon! representa! o! número! mínimo! de! bits! necessários! para!
que!uma!mensagem!seja!enviada!por!meio!de!um!canal!de!comunicação!sem!que!
haja!perda!essencial!de!conteúdo.!É!interessante!notar!que!a!teoria!de!Shannon!
quantifica! as! condições! para! transmissão! segura! de! informação! através! de! um!
canal!de!comunicação,!mesmo!na!presença!de!ruído,!sem!a!necessidade!de!uma!!
modelagem!sobre!as!causas!físicas!do!ruído.!
!
A! teoria! de! Shannon! forma! a! base! matemática! de! toda! a! tecnologia! de!
comunicação! da! atualidade,! baseada! em! processos! físicos! clássicos,! envolvendo!
processamento! de! sinais! na! presença! de! ruído.! No! entanto,! a! compreensão! de!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
44 !A!
noção! matemática! do! bit! não! é! devida! a! Shannon;! ela! apareceu! em! outro! artigo!
revolucionário,!publicado!em!1936,!por!Alan!Turing,!no!qual!ele!propõe!a!ideia!de!uma!máquina!
operando!apenas!com!zeros!e!uns.!Porém,!o!termo!“bit”!aparece!pela!primeira!vez!no!artigo!de!
Shannon!de!1948.!!
!

! 200!
que!sistemas!quânticos!têm!correlações!que!não!existem!classicamente,!levou!à!
definição!de!uma!quarta!forma!de!entropia!por!John!von!Neumann!no!início!da!
década!de!1930:!
! = −Tr !ln! ! (II14.5)!

!
onde!!!é!a!matriz!densidade!do!sistema.!Repare!que,!apesar!da!definição!utilizar!
logaritmo!natural,!!se!o!traço!for!tomado!na!base!de!autovetores!de! ρ,!a!entropia!
de! von! Neumann! fica! com! a! mesma! forma! que! a! de! Shannon.! Porém,! isto! não!
significa! que! a! entropia! de! Shannon! tenha! a! mesma! abrangência! que! a! de! von!
Neumann.! Para! termos! uma! noção! disso,! vamos! escrever! a! entropia! de! von!
Neumann!como!a!de!Shannon:!
!

!=− !! ln!! !
!

!
Suponha!que!tenhamos!um!único!estado!quântico,!ou!seja,!um!estado!puro:!
!
↑ +↓
ψ =
2
↑ ↑+↑ ↓+↓ ↑+↓ ↓
⇒ρ= ψ ψ =
2
⇒ p =1 !
!
Portanto,! essa! distribuição! com! apenas! um! estado! tem! !! = 1,! e! a! entropia! do!
sistema!é!zero.!Entropia!zero!significa!que!temos!certeza!do!estado.!O!fato!de!ser!
uma!superposição!de!autestados!implica!!uma!indeterminação!quântica!que!nada!
tem! a! ver! com! a! entropia,! mas! com! o! fato! de! que! a! base! que! expande! o! estado!
não! ser! aquela! que! diagonaliza! ρ.! De! fato,! se! notarmos! que! ψ = + ,! a! matriz!

densidade!!poderia!ser!escrita! ρ = + + !,!e!a!entropia!seria!zero.!
!
!
Essa!propriedade!é!verificada!para!qualquer!estado!puro.!!
!

! 201!
Existe! um! caso! que! torna! evidente! a! diferença! entre! estados! quânticos! e!
clássicos,! que! é! o! da! matriz! densidade! que! representa! um! estado! emaranhado!
puro.!Tomemos!o!estado!do!gato:!
!
↑↑ + ↓↓ ↑↑ + ↓↓ ↑↑ ↑↑ + ↑↑ ↓↓ + ↓↓ ↑↑ + ↓↓ ↓↓
ρ= • =
2 2 2
# 1 0 0 1 &
% ( !
1% 0 0 0 0 (
ρ=
2% 0 0 0 0 (
% 1 0 0 1 ('
$
(II14.6)!
!
Por! ser! um! estado! puro,! a! entropia! é! zero,! como! no! exemplo! anterior.! No!
entanto,!como!temos!dois!spins,!podemos!usar!o!conceito!de!traço!parcial!para!
obtermos!as!matrizes!individuais:!
!

1! $
ρ A = ρB = # 1 0 & (II14.7)!
2" 0 1 %!

Que! implica!!! = ! !! = 1.! Ou! seja,! as! entropias! individuais! são! máximas.! O!
estado! emaranhado! é! tal! que! a! entropia! do! conjunto! é! zero,! enquanto! a! das!
partes!é!máxima!!Não!existe!análogo!clássico!para!essa!situação.!!
!
A!noção!de!informação!associada!à!entropia!e!à!matriz!densidade!de!um!sistema!
nos!permite!introduzir!a!noção!de!ambiente!e!de!sistemas!quânticos!abertos.!O!
que! chamamos! “ambiente”! representa! uma! parte! do! sistema! sobre! a! qual! não!
temos! informação,! mas! que! pode! ser! introduzida! no! formalismo! por! meio! da!
operação!de!traço!parcial.!!
!
No! próximo! Bloco,! veremos! aplicações! da! mecânica! quântica! nas! chamadas!
nanociências,! nanotecnologia! e! também! no! processamento! da! informação!
quântica,!área!que!inclui!o!uso!de!recursos!quânticos!para!tarefas!de!computação!
ou!comunicação.!!
!
!

! 202!
!
!
!
!
!
Problemas"
1. Encontre! as! condições! para! que! a! equação! de! Schroedinger! seja!
invariante! sob! transformações! galileanas! do! sistema! de! coordenadas,!
supondo!que!o!potencial!seja!invariante!sob!tal!transformação.!
2. Seja!o!hamiltoniano!abaixo:!
!
! !

!= !! ! ! + ! {|! ! + 1| + |! + 1 !|},!
!!! !!!

!
onde! {|! } !forma! uma! base! ortonormal.! Considerando! condições! de!
contorno! periódicas,! |! + ! = |! ,! calcule! as! autoenergias! e! os!
autoestados!deste!hamiltoniano.!!
3. Seja!a!definição!do!operador!de!translação,!Γ(!):!
!
Γ ! ! ! = !(! + !)!
!
Mostre!que!Γ!é!unitário!e!que!pode!ser!expresso!em!termos!do!operador!
! = −!ℏ!/!".!
4. Sejam! os! operadores! !, !!e!!, tal!que! !, ! = !, e! !, ! = !, ! = 0 .!
Mostre!que!!
!
! !!! = ! ! ! ! ! !!/! !
!
5. Mostre!que,!para!quaisquer!dois!operadores!A!e!B,!!
!
1 1
! ! !! !! = ! + !, ! + !, !, ! + !, !, !, ! + ⋯!
2! 3!
!
!

! 203!
6. Seja!!(!)!um! operador! que! depende! explicitamente! do! tempo,! em! um!
sistema!com!hamiltoniano!!.!!Mostre!que:!
!
!" ! !"
= !, ! + !
!" ℏ !"
!
Essa!é!a!chamada!equação!de!Heisenberg.!
7. Uma!partícula!com!spin!S!e!momento!magnético!! = !!! !"é!submetida!a!
um!campo!magnético!com!a!seguinte!forma:!
!
! ! = !! ! + ! !! [!!"# !" + !!"# !" ]!
!
a)! Faça! uma! mudança! para! um! sistema! de! coordenadas! no! qual! esse!
campo!não!depende!mais!do!tempo;!b)!usando!a!equação!de!Heisenberg!
do! problema! anterior,! deduza! as! equações! de! movimento! para! as!
componentes!do!momento!magnético.!Interprete!o!resultado.!!
8. Resolva! o! problema! do! oscilador! harmônico! na! representação! de!
momento.!
9. Seja! o! hamiltoniano! de! uma! partícula! com! massa!!!em! um! potencial!
! ! :!!
!
!!
!= + !(!)!
2!
!
!
Mostre!que:!! ! !! − !! !!" = ℏ! /2!,!onde!!! !são!os!autoestados!de!
energia,!e!!!" !é!o!elemento!de!matriz!da!componente!X!de!r.!!
10. Encontre! as! regras! de! comutação! para! as! componentes! do! operador!
velocidade!de!uma!partícula!carregada!sem!spin!em!um!campo!magnético!
estático!e!homogêneo!aplicado!ao!longo!da!direção!Z.!
11. Seja!o!hamiltoniano!representando!a!interação!entre!dois!spins:!
!
! = !! + !!! ∙ !! "
!

! 204!

com!spin!total!! = !! + !! = ! (!! + !! )." a)!Mostre!que!!, !! !e!!! !podem!

ser!medidos!simultaneamente.!!
12. Duas! partículas! de! spin! ½,! A! e! B,! estão! nos! seguintes! autoestados:!
|↑ ! !e!|+ ! .!Calcule!a!probabilidade!de!uma!medida!do!spin!total!resultar!
no!valor!zero.!!
13. O! spin! de! um! elétron! é! medido! e! encontrado! no! autoestado! +1/2! da!
direção! Z.! Qual! a! probabilidade! de,! em! uma! segunda! medida,! o! spin! ser!
encontrado! em! uma! direção! no! plano! X>Z,! formando! um! ângulo!!!com! o!
eixo!Z?!
14. Mostre! que! a! medida! de! qualquer! componente! de! um! spin! ½! sempre!
retornará!±ℏ/2!como!resultado,!qualquer!que!seja!a!direção.!
15. Um!átomo!de!hidrogênio!no!estado!com!número!quântico!principal!! = 2,!
está! sob! a! ação! de! um! campo! elétrico!ℰ !na! direção! Z! e! um! campo!
magnético!ℬ!na!direção!X,!de!magnitudes!comparáveis.!!Desconsiderando!
o!spin!e!os!efeitos!diamagnéticos,!calcule!a!correção!em!primeira!ordem!
na!energia!do!estado.!!
16. Sejam!os!operadores!de!campo:!
!
1 1
Ψ ! = !! ! !!!∙! !!e!!Ψ ! ! = !!! ! !!!∙! !!
! !
! !

!
onde! V! é! o! volume! do! sistema,! e!!!! !!!!! ,! operadores! de! criação! e!
aniquilação! de! bósons.! Mostre! que:! a)! Ψ ! , Ψ ! !′ = !(! − !′) ;! b)!
Ψ ! , Ψ !′ = Ψ ! ! , Ψ ! !′ = 0.!
17. Seja! o! hamiltoniano! de! interação! de! spins! entre! um! elétron! com!
coordenada!!!e!um!íon!em!repouso:!
!
! = −2! ! ! ∙ !"
!
onde!S-é!o!spin!do!íon!e!s!o!spin!do!elétron.!a)!Escreva!este!hamiltoniano!
em!termos!dos!operadores!de!levantamento!e!abaixamento!de!spins;!b)!a!
partir!dos!operadores!de!campo!para!os!estados!eletrônicos:!
!

! 205!
!
Ψ ! = ! !"# |! !!" !!e!! ! !!"# !|!!" !!!!!
!,! !,!

escreva! o! hamiltoniano! na! linguagem! de! segunda! quantização! para! os!


estados! eletrônicos;! c)! realize! explicitamente! as! somas! sobre!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
os!estados!de!spin!eletrônicos!e!mostre!que:!
!
! ! ! !
ℋ=− ! !, !′ [! ! !!!↓ !!↑ + ! ! !!!↑ !!↓ + !! !!!↑ !!↑ − !!!↓ !!↓ ]!
!,!

!
onde!!(!, !)!é! a! transformada! de! Fourier! de!!(!).! Interprete! os! termos!
desse!hamiltoniano.!!
18. !Mostre!que!se!o!hamiltoniano,!H,!de!um!sistema!não!depende!do!tempo,!a!
solução!da!Eq.(II11.29)!é:!
!
!" !"
! ! = ! ! !! ℏ !(0)! !! ℏ !
!
19. !Considere! a! matriz! densidade! de! um! sistema! de! spins! ½! em! equilíbrio!
térmico!com!um!campo!magnético!estático!na!direção!Z:!
!
! !!/!! !
!! = ! , onde!! = −!! !! !
!
!"{! !! ! }

!
Suponha! que,! em!! = 0,! outro! campo! magnético! é! aplicado! na! direção! X!
(hamiltoniano! !! = !! !! ).! Usando! o! resultado! do! problema! anterior,!
calcule:! a)!!(!),! a! matriz! densidade! em! um! instante! posterior;! ! b)! as!
componentes! da! magnetização! em! função! de! t,! !!! ! , !! ! !e!!! (!)!no!
limite!de!altas!temperaturas.!
20. Considere!uma!matriz!densidade!com!a!seguinte!forma:!
!
1−!
!= ! + !|! !|!
4
onde!|! !é!o!estado!emaranhado:!

! 206!
|↑↑ + |↓↓
|! = !
2
!
O! chamado! critério! de! Peres! afirma! que!!!será! emaranhada! se! a! sua!
chamada! matriz! transposta! parcial 45 !tiver! algum! autovalor! negativo.!
Mostre! que! a! condição! sobre!!,! para! que! a! matriz! densidade! acima! seja!
emaranhada,!é!! > 1/3.!!
!
!
!
!
!
!
!
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
45!A!matriz!transposta!parcial!é!obtida!trocandofse!os!rótulos!das!linhas!pelos!de!colunas,!de!

apenas!um!dos!spins.!!

! 207!
!
!
!
!
BLOCO%III%%
Aplicações!!
!
! !

! 208!
ENSAIO:%A%FÍSICA%DEPOIS%DA%SEGUNDA%GUERRA%
Em!vários!sentidos,!a!Segunda!Guerra!foi!um!divisor!de!águas!para!o!modo!de!se!fazer!física!
‒!disciplina,!então,!alçada,!por!conta!da!bomba!atômica!e!do!radar,!principalmente,!a!uma!
posição!de!‘rainha’!entre!as!ciências.!O!modo!como!ela!passou!a!ser!feita,!administrada!e!
financiada!ganhou!contornos!que!contrastam!muito!como!aquela!em!que!a!pesquisa!nessa!
área!era!feita!antes!do!conflito.!
!
Com! o! fim! da! guerra,! surge! um! novo! cenário! geopolítico! mundial! incensado! pelo! que!
Kojevnikov! denomina! ‘Metafísica! da! Guerra! Fria’.! Nele,! várias! nações! perceberam! que!
conhecimento! era! sinônimo! de! poder,! tanto! político! quanto! econômico.! Os! EUA! foram! o!
exemplo!emblemático!dessa!mudança.!Participante!de!uma!guerra!que!havia!ocorrido!em!
outro! continente! –! ou! seja,! seu! território! não! havia! sido! devastado,! exceção! para! Pearl!
Harbor!–,!o!país!começou!a!investir!pesadamente!em!pesquisa!básica!e!aplicada!–!inclusive,!
naquela!com!teor!fortemente!militar.!!
!
As!linhas!gerais!da!importância!da!ciência!e!tecnologia!estão!no!relatório!de!um!dos!grandes!
administradores! de! C&T! nos! EUA,! o! engenheiro! Vannevar! Bush! (1890`1974).! O! texto! tem!
como!título!‘Science:!Endless!Frontier’![Ciência:!Fronteira!Sem!Fim],!o!que!diz!muito!sobre!
como!essa!cultura!ganhou!valor!–!por!sinal,!ciência,!nas!palavras!do!historiador!marxista!Eric!
Hobsbawm! (1917`2012),! foi! a! cultura! mais! importante! do! século! passado.! O! conteúdo!
daquele!relatório!–!posto!em!prática!nas!décadas!seguintes!–!tem!muito!a!ver!com!a!posição!
atual! de! liderança! dos! EUA! no! cenário! científico`tecnológico! –! bem! como! político! e!
econômico.!
!
O! novo! modo! de! produção! da! ciência! nos! EUA,! por! seus! contornos! algo! grandes! quando!
comparados! à! maneira! de! fazer! pesquisa! antes! da! guerra,! foi! denominado! Big$ Science,!
nome!bem!apropriado!para!as!características!que!se!implantaram!nessa!cultura:!!
i)! a! física! feita! por! pequenas! equipes! (às! vezes,! por! um! só!
pesquisador)! em! bancadas! passa! a! ser! realizada! em! grandes!
laboratórios! nacionais,! para! onde! se! dirigiam! físicos! das!
universidades! de! vários! estados! (no! caso! do! EUA),! sendo! que! a!
origem!de!muitos!desses!laboratórios!está!nas!instalações!montadas!

! 209!
para!o!desenvolvimento!do!projeto!Manhattan,!que!se!incumbiu!da!
produção!das!bombas!atômicas;!
ii)! a! Big$ Science! cobrava! agora! dos! físicos! um! talento! extra:! a!
administração! de! equipes! (por! vezes,! com! milhares! de! cientistas! e!
técnicos),! bem! como! de! verbas! vultuosas! se! comparadas! àquelas!
destinadas!à!pesquisa!antes!do!conflito;!
iii)!o!governo,!com!verbas!destinadas!à!pesquisa!militar,!passou!a!ser!
o!grande!financiador!da!pesquisa!básica!‒!principalmente,!a!partir!da!
década!de!1950;!!
iv)! os! aceleradores! de! partículas! tornaram`se! equipamentos!
indispensáveis! para! a! nova! forma! de! fazer! física,! e! os! EUA! deram!
início! à! chamada! ‘Era! dos! Aceleradores’,! com! dezenas! dessas!
máquinas!funcionando!em!seu!território!já!na!década!de!1950.!
!
Esse! novo! modo! de! fazer! física! demandava! muito! dinheiro.! A! Europa,! devastada! pelo!
conflito,! não! dispunha! de! verbas! para! isso,! o! que! levou! várias! nações! a! se! juntarem! para!
planejar! e! construir! o! chamado! Centro! Europeu! de! Pesquisas! Nucleares! (CERN),! cujas!
atividades!começaram!por!volta!de!meados!da!década!de!1950.!!
!
A!física!–!até!aquele!momento,!‘filha’!do!continente!europeu!–!havia!transferido!sua!morada!
para!os!EUA.!Na!área!de!partículas!elementares!(hoje,!altas!energias),!os!norte`americanos!
dominariam! o! cenário! até! recentemente,! quando,! por! um! erro! estratégico! lastimável,!
abriram! mão! da! construção! de! um! imenso! acelerador,! o! SSC! (sigla,! em! inglês,! para!
Supercolisor!Supercondutor),!equívoco!tático!que!ecoa!até!hoje!naquele!país.!Atualmente,!
nas!últimas!duas!décadas,!fazer!física!de!partículas!de!ponta!é!sinônimo!de!CERN.!
!
O!uso!de!aceleradores!trouxe,!para!física,!certo!‘controle’!sobre!a!natureza,!programa!que!
os! físicos! começaram! a! implementar! já! no! fim! do! século! 19,! ao! tentar! reproduzir! em!
laboratório!os!fenômenos!naturais.!A!invenção!de!um!dos!detectores!mais!importantes!da!
história! da! física,! a! câmara! de! nuvens,! é! desdobramento! direto! desse! projeto.! Com! o!
controle,! veio! também! a! possibilidade! da! estatística! (entenda`se,! obtenção! de! grande!
quantidade!de!eventos).!Até!o!final!da!década!de!1940,!uma!nova!partícula!era!aceita!com!

! 210!
base!em!poucos!eventos!–!às!vezes,!um!ou!dois,!como!foi!o!caso!do!mésotron!ou!do!próprio!
méson! pi.! Depois! do! conflito,! os! eventos! passaram! a! ser! apresentados! aos! milhares! nas!
conferências.!!
!
O!historiador!da!física!norte`americano!Peter!Galison,!em!sua!obra`prima!Image$&$Logic!–!
quase! leitura! obrigatória! para! físicos! que! lidam! com! altas! energias! –,! divide! essas! duas!
tradições! em! ‘estatística’! versus$ ‘eventos! de! ouro’.! Encontro! ocorrido! em! Pisa! (Itália)! em!
1954!é!considerado!um!‘ponto!de!virada’!nesse!sentido:!enquanto!físicos!de!raios!cósmicos!
apresentavam!poucos!eventos,!os!norte`americanos!chegavam!à!reunião!com!centenas!de!
milhares! deles.! Talvez,! o! antipróton,! detectado! em! 1955! –! no! então! mais! potente!
acelerador!do!mundo,!o!Bévatron,!de!6!BeV!(bilhões!de!elétrons`volt)!–!tenha!sido!uma!das!
últimas!partículas!cuja!aceitação!se!deu!por!meio!de!pouquíssimos!eventos.!!
!
Por!sinal,!quando!se!pergunta!aos!físicos!sobre!o!porquê!de!o!Bévatron!ter!sido!construído,!
a! resposta`padrão! é:! para! detectar! o! antipróton.! No! entanto,! exame! mais! detalhado! da!
documentação!da!época!mostra!que!os!financiadores!do!projeto!‒!a!poderosa!Comissão!de!
Energia! Atômica! (CEA)! dos! EUA! ‒! pouco! se! importavam! com! a! descoberta! dessa! ou! de!
qualquer!outra!nova!partícula!–!e!nem!mesmo!com!um!possível!desdobramento!bélico!do!
projeto.! O! plano! da! CEA! era! construir! uma! máquina! daquelas! proporções! para! manter! os!
físicos! mobilizados! logo! após! o! fim! do! conflito,! quando! muitos! desses! profissionais!
abandonaram! os! grandes! laboratórios! –! e! a! pesquisa! militar! que! nele! se! fazia! de! forma!
intensa!–!para!voltarem!às!suas!universidades.!!
!
Daí,! o! financiamento! para! a! pesquisa! básica! (em! todas! as! áreas! da! ciência!)! naquele!
momento! ter! tido! origem! esmagadoramente! militar.! Era! uma! questão! de! segurança!
nacional,! em! uma! época! em! que! a! Guerra! Fria! ganhava! contornos! inquietantes! para! o!
governo!dos!EUA.!
!
Até! meados! da! década! de! 1960,! em! geral,! os! experimentos! direcionavam! a! física!
experimental! na! área! de! partículas! elementares.! Com! o! modelo! dos! quarks,! idealizado!
naquele! período,! houve! uma! inversão:! a! teoria! passou! a! indicar! o! que! os! experimentos!
deveriam!buscar.!Caso!recente!–!mesmo!que!a!proposta!seja!ainda!da!década!de!1960!–!foi!

! 211!
a!descoberta!do!bóson!de!Higgs.!Algo!semelhante!se!passa!hoje!com!uma!das!teorias!que!
são! candidatas! à! unificação! das! quatro! interações! (forças)! da! natureza:! supercordas,! que!
indica! a! existência! de! um! novo! e! extenso! cardápio! de! partículas! subatômicas! –! até! agora,!
não!detectadas.!
!
O!Brasil!do!pós`guerra!foi!uma!dos!poucos!países!fora!do!eixo!histórico!da!ciência!(Europa`
EUA)!a!perceber!a!importância!da!nova!geopolítica!que!se!desenhava!com!base!na!máxima!
‘conhecimento!é!poder’.!Aqui,!uma!aliança!(com!interesses!distintos)!entre!civis!e!militares!
levou! à! fundação! de! um! centro! nacional! de! física:! o! Centro! Brasileiro! de! Pesquisas! Físicas!
(CBPF),! no! Rio! de! Janeiro! (RJ).! O! CBPF! era,! de! certa! forma,! a! concretização! da! luta! pelo!
chamado!regime!de!dedicação!integral!ao!ensino!e!à!pesquisa,!de!ecoava!desde!o!início!da!
década!de!1940!na!Universidade!do!Brasil,!por!exemplo.!
!
O! CBPF,! no! entanto,! sofreu! grande! baque! quando,! entre! 1954,! as! verbas! de! seu! projeto!
mais!importante!–!a!construção!de!um!acelerador!de!grande!porte!–!foram!gastas!por!um!
dos!administradores!da!instituição,!Álvaro!Difini,!professor!da!Universidade!do!Rio!Grande!
do! Sul,! em! corridas! de! cavalo! (voltaremos! ao! tema).! Lattes! –! contrariando! conselhos! de!
colegas!e!fundadores!do!CBPF,!como!Leite!Lopes!–!levou!o!caso!ao!jornalista!Carlos!Lacerda!
(1914`1977),! que! fez! uso! político! do! fato! para! atacar! o! governo! de! Getúlio! Vargas! (1882`
1954).!
!
Pelas! duas! décadas! seguintes! ao! ‘caso! Difini’,! o! projeto! mais! importante! do! CBPF! talvez!
tenha!sido!o!de!sobreviver.!Em!1976,!novamente,!um!acordo!entre!militares!–!do!lado!do!
CBPF,!o!general!Edmundo!de!Macedo!Soares!(1901`1989),!e!do!governo,!o!então!presidente!
Ernesto!Geisel!(1907`1996)!–!permitiu,!em!uma!reunião!que,!segundo!testemunhas,!durou!
cerca!de!meia`hora,!em!Brasília,!que!o!CBPF!passasse!a!fazer!parte!do!CNPq.!
!
Terminava!(ou!recomeçava),!assim,!depois!de!quase!30!anos,!aquele!projeto!de!um!instituto!
que,!para!fazer!ciência!em!regime!integral,!deveria!estar!desacoplado!da!universidade!(no!
caso,! a! do! Brasil),! pois! esta! sofria! dos! males! inerentes! a! uma! estrutura! departamental! e!
catedráticos!poucos!afeitos!à!pesquisa!científica.!

! 212!
No! momento! da! transferência,! o! CBPF! vivia! uma! profunda! crise! financeira.! Salários! não!
eram!pagos!por!quase!um!ano,!e!muitos!pesquisadores!trocaram!a!instituição!por!cargos!em!
outros!centros!de!ensino!e!pesquisa!–!ou!mesmo!outros!afazeres!na!iniciativa!privada.!Do!
ponto! de! vista! científico,! foram! poucos! os! resultados! que! se! destacaram! de! meados! da!
década! de! 1950! até! a! anexação! pelo! governo! federal.! E! estes! foram! de! pouca! relevância!
científica,!se!comparados!às!duas!detecções!do!méson!pi,!que!haviam!alicerçado!a!fundação!
do!centro,!e!mesmo!aos!resultados!do!início!da!década!de!1940!(Wataghin!e!equipe)!que!
inseriram!o!Brasil,!pela!primeira!vez,!no!cenário!internacional!da!física.!
!
Agora,! a! garantia! de! orçamento! fixo! e! salários! em! dia! alteraram! os! rumos! do! CBPF.! Mas!
essas! mudanças! ainda! levariam! cerca! de! 10! anos! para! se! concretizarem! e! para! que! fosse!
cumprida! uma! das! missões! estabelecidas! pela! instituição! ainda! em! sua! fundação:! as!
colaborações! internacionais.! Um! pequeno! grupo! de! físico! de! partículas! do! CBPF! foi!
trabalhar!no!Fermilab!(EUA)!na!primeira!metade!da!década!seguinte.!!
!
Ainda!em!sua!fundação,!um!dos!departamentos!do!CBPF!era!um!laboratório!a!5!mil!metros!
de! altitude,! no! monte! Chacaltaya! (Bolívia),! onde! Lattes! havia! exposto! emulsões! nucleares!
(chapas! fotográficas! especiais)! em! meados! ainda! de! 1947,! capturando,! com! esse! tipo! de!
detector! simples! e! barato,! mais! cerca! de! 30! decaimentos! do! méson! pi! em! méson! mi! (ou!
seja,!de!píons!em!múons).!Esses!novos!dados!serviram!para!calcular,!por!exemplo,!a!razão!
entre! as! massas! dessas! partículas! e! foram! publicados! em! outubro! daquele! ano! na! revisa!
Nature.$!!
!
O! Laboratório! de! Chacaltaya! pode! ser! visto! como! o! início! de! nossa! ‘Big$ Science’.$ Razão:!
representava!um!salto!significativo!na!física!experimental!brasileira,!quando!comparada!ao!
que!havia!no!país!até!a!década!de!1920!–!um!laboratório!didático!da!Escola!Politécnica!do!
Rio!de!Janeiro,!montado!por!Henrique!Morize!–!e!aos!experimentos!de!pequena!escala!(e!de!
baixo!custo)!feitos!pela!equipe!de!Wataghin!na!USP!a!partir!da!segunda!metade!da!década!
seguinte.!
!
Esse!departamento!do!CBPF!se!estabeleceu!com!mais!força!a!partir!do!início!da!década!de!
1950,! quando! Lattes! se! apressou! para! firmar! um! convênio! com! a! Universidade! de! San!

! 213!
Andrés! por! conta! da! concorrência! dos! norte`americanos,! que! já! haviam! montado! ali! um!
contêiner! para! medições! de! radiação! cósmica! com! finalidades! para! aplicações! médicas.!
Naquele! momento,! Chacaltaya! era! do! interesse! de! várias! nações,! por! sua! altitude! e! pela!
logística!‒!fato!de!estar!muito!perto!de!La!Paz,!capital!boliviana.!
!
Capitaneado! pelo! CBPF,! o! primeiro! grande! projeto! brasileiro! em! Chacaltaya! foi! levar! para!
aquele! monte! uma! câmara! de! nuvens! cedida! a! Lattes! por! um! colega! da! Universidade! de!
Chicago.! Essa! iniciativa! demandou! a! vinda! de! pesquisadores! e! engenheiros! estrangeiros!
para! o! Brasil! –! inclusive! Occhialini! e! Ugo! Camerini,! colega! de! Lattes! em! Bristol! –! e! uma!
logística!complexa,!envolvendo!transporte!aéreo,!fluvial,!terrestre!(inclusive,!carros!de!boi).!!
!
Chacaltaya!representava!a!possibilidade!de!detectar!partículas!com!energia!várias!ordens!de!
grandeza!superiores!àquelas!obtidas!em!aceleradores!tanto!nos!EUA!quanto!no!CERN.!
Esse!momento!de!otimismo!da!física!brasileira!–!fundação!do!CBPF,!do!CNPq,!da!Capes!etc.,!
e!o!desejo!dos!militares!de!obter!o!ciclo!completo!da!energia!nuclear!–!talvez!tenha!sido!o!
motivo!de!o!país!ter!se!engajado!em!um!projeto!que!se!mostrou,!desde!o!início,!inviável:!a!
construção! de! um! acelerador! de! 400! MeV! –! basta! lembrar! que! a! máquina! de! Berkeley,!
então!a!mais!potente!do!mundo,!chegava!a!380!MeV.!!
!
O!projeto!naufragou!não!só!pelo!‘caso!Difini’,!mas!também!pela!falta!de!recursos!humanos!
(cientistas! e! engenheiros)! especializados! e! de! infraestrutura! (por! exemplo,! usinagem! de!
ímãs!gigantescos).!“Não!sabíamos!nem!mesmo!fabricar!lâmpadas!elétricas”,!resumiu!Lattes,!
que! se! opôs! ao! projeto! ‒! para! ele,! o! Brasil! deveria! construir! uma! máquina! de! pequenas!
proporções,!voltada!para!o!treinamento!de!alunos.!
!
Em!1954,!por!conta!da!repercussão!do!caso!Difini,!Lattes!teve!!um!surto!psicótico!sério!–!ele!
era!bipolar,!alternando!euforia!e!depressão.!Seguiu!para!os!EUA,!para!se!tratar!e!trabalhar.!
Foi!um!período!difícil!para!ele!e!de!pouca!produção.!Voltou!ao!Brasil!três!anos!depois,!na!
tentativa!de!prosseguir!com!seus!projetos!no!CBPF.!No!entanto,!a!situação!financeira!crítica!
do!centro,!os!baixos!salários!e!a!inflação!o!obrigaram!a!voltar!para!a!USP,!onde!havia!sido!o!
único! aluno! a! se! formar! em! física! em! 1943.! Ironicamente,! Lattes! –! cujos! resultados!

! 214!
impulsionaram!a!fundação!do!CBPF!–!não!tem!um!só!artigo!em!seu!currículo!no!qual!haja!
‘CBPF’!como!instituição!de!origem.!!
!
A!partir!também!da!década!de!1950,!a!física!no!Brasil!–!que,!por!razões!históricas,!havia!se!
desenvolvido! no! eixo! Rio`São! Paulo! –! passa! a! se! expandir! para! o! interior! (no! caso,! São!
Paulo)!e!outras!capitais!–!por!exemplo,!Porto!Alegre,!com!seu!Centro!de!Pesquisas!Físicas,!
que!emulava!a!estrutura!de!seu!congênere!carioca.!!
!
O!golpe!militar!de!1964!teve!impacto!significativo!nas!universidades,!mas!não!com!a!mesma!
intensidade!no!CBPF.!No!entanto,!em!1968,!com!o!Ato!Institucional!número!5!(AI`5),!vários!
pesquisadores! renomados! da! física! no! Brasil! –! alguns! que! nem! mesmo! eram! militantes!
políticos,!como!Jayme!Tiomno!e!Elisa!Frota`Pessôa!–!foram!cassados!ou!obrigados!a!se!exilar!
no!exterior.!
!
No! mesmo! ano,! o! governo! militar! havia! imposto! –! e! este! é! o! termo! correto! –! a! chamada!
‘Reforma!Sucupira’!(referência!a!Newton!Sucupira,!1920`2007),!estabelecendo!a!pesquisa!e!
pós`graduação!nas!universidades.!Muitos!professores!–!alguns!meramente!‘lentes’,!ao!estilo!
do!século!19,!que!iam!às!universidades!apenas!para!dar!aulas!–!nem!mesmo!tinham!ideia!do!
que!era!fazer!pesquisa!científica.!!
!
Diferentemente! do! que! ocorreu! na! Argentina! e! no! Uruguai,! nas! respectivas! ditaduras,! o!
governo!militar!do!Brasil!tinha!um!projeto!para!os!físicos,!como!notou!de!forma!perspicaz!
um! físico! uruguaio! em! um! texto! sobre! as! relações! científicas! entre! países! do! Mercosul.! E!
parte!da!comunidade!de!físicos!no!Brasil!aceitou!um!papel!–!até!mesmo!certo!protagonismo!
–!nesses!projetos.!Para!ficar!em!poucos!casos,!vale!citar!as!telecomunicações!(Telebrás),!a!
energia! nuclear! (Usinas! de! Angra),! a! indústria! aeronáutica! (Embraer)! e! armamentista!
(Engesa),!todas!ligadas!a!questões!de!segurança!nacional.!Essa,!talvez,!tenha!sido!a!3ª!das!
alianças!entre!físicos!e!militares,!sendo!as!outras!duas:!i)!no!desenvolvimento!do!sonar!na!
USP;!ii)!na!fundação!do!CBPF!–!esta!duas!em!momentos!de!democracia!no!país.!Mais!tarde,!
haveria!outra:!a!da!reserva!de!mercado!para!a!informática.!
!

! 215!
Na! década! de! 1970,! houve! um! crescimento! substancial! das! universidades! federais,! o! que!
aumentou! significativamente! a! demanda! por! pós`graduandos! de! todas! as! áreas.! A! volta! à!
democracia!no!Brasil!ocorreu!há!mais!de!30!anos.!No!entanto,!a!relação!de!cientistas!com!o!
governo!militar!ainda!é!tabu!como!tema!de!pesquisa!‒!assunto!a!se!encarado!de!modo!mais!
incisivo!pela!historiografia!da!ciência!local.!
!
Para!os!historiadores!da!ciência!argentinos!Diego!Hurtado!de!Mendonza!e!Ana!María!Vara,!a!
Big$ Science$ instalou`se! no! Brasil! com! a! construção! do! Laboratório! Nacional! de! Luz!
Síncrotron!(LNLS)!e!na!Argentina!com!o!Tandar,!acelerador!de!íons!pesados.!Segundo!esses!
autores,! “uma! extrema! simplificação! dos! processos! de! tomada! de! decisão! ligados! a! um!
contexto!de!autoritarismo!político!‒!os!quais!permitiram!superar!a!falta!de!consenso!dentro!
da! comunidade! de! físicos,! bem! como! as! incertezas! financeiras! ‒! parece! ter! sido! uma!
condição!necessária!tanto!para!o!Tandar!quanto!o!LNLS”.!!
!
Um! diferencial! do! LNLS! em! relação! a! outros! equipamentos! similares! no! mundo! é! que! os!
pesquisadores! e! técnicos! brasileiros! decidiram! aprender! a! construir! esse! tipo! de!
equipamento!a!partir!de!seus!constituintes!básicos.!Isso!parece!ter!sido!fator!preponderante!
para!que!o!país!desenvolvesse!expertise!nesse!campo!e!está!na!origem!da!construção!atual!
do! Sírius! (com! alto! grau! de! nacionalização),! que! promete! ser! um! dos! aceleradores!
síncrotron!mais!modernos!(dito!de!4ª!geração)!do!mundo!quando!iniciar!suas!atividades!nos!
próximos!anos.!!
!
Outro!grande!projeto!que!poderia!ser!classificado!como!Big$Science!no!Brasil!parece!não!ter!
tido! a! mesma! prioridade! que! o! Sírius:! o! Reator! Multipropósito! Brasileiro,! que! daria!
autossuficiência!ao!país!na!área!de!radiofármacos.!Até!o!momento,!essa!iniciativa!está!com!
o!cronograma!bem!atrasado.!

%
%
%
%
%
%

! 216!
III1.%“Engenharia”%de%hamiltonianos:%tecnologia%quântica%
!
Nos! últimos! 30! anos,! houve! um! avanço! extraordinário! nas! técnicas! para! a! fabricação! de!
estruturas!artificiais!por!meio!da!manipulação!cada!vez!mais!precisa!da!matéria!em!escalas!
moleculares!e!atômicas.!Nos!capítulos!anteriores!deste!texto!vimos!como!o!formalismo!da!
mecânica!quântica!permite!fazer!previsões!sobre!o!comportamento!dos!sistemas!físicos!em!
qualquer! escala! da! matéria,! seja! usando! vetores! de! estado,! funções! de! onda! ou! matrizes!
densidade.!!
!
Neste! último! Bloco,! vamos! estudar! como! o! desenvolvimento! das! técnicas! experimentais,!
não!apenas!para!a!fabricação!daquelas!estruturas,!mas!também!para!a!sua!caracterização,!
levaram! a! um! novo! campo! de! pesquisa! interdisciplinar! que! se! passou! a! chamar!
nanotecnologia! ou! tecnologia! quântica.! Estão! incluídas! aqui! técnicas! de! nanofabricação,!
como!a!litografia!de!feixe!de!elétrons!e!a!microscopia!de!tunelamento!e!varredura!(STM)1,!
bem!como!técnicas!de!caracterização,!como!o!microscópio!eletrônico!!ou!próprio!STM,!além!
de! técnicas! de! medidas! ultras! sensíveis,! como! os! estados! comprimidos! e! centros! de!
vacância!em!diamantes,!utilizados!na!chamada!metrologia!quântica.!!
!
Vamos! estudar! ainda! como! os! fenômenos! quânticos! podem! ser! explorados! para! fins! de!
computação! e! comunicação2.! Já! existem! dispositivos! comerciais! oferecidos! por! empresas!
que!exploram!fenômenos!quânticos!para!fins!de!comunicação!segura!e!de!computação.!Em!
particular,! na! última! seção! vamos! estudar! em! detalhe! as! aplicações! dos! dispositivos!
supercondutores!chamados!junções!Josephson!na!computação!quântica.!!
!
No!final!do!ano!de!2017!foi!anunciado!pela!IBM!a!construção!do!primeiro!chip!quântico!com!
50! q`bits! baseado! em! junções! Josephson.! Tal! chip! tem! o! potencial! de! representar!
simultaneamente!2!" = 10!" !números,!o!que!está!muito!além!do!que!pode!fazer!qualquer!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
1
!Do!inglês!Scanning$Tunneling$Microscopy.!
2
!Uma!referência!na!area!de!nanociência,!veja!Nanostructures%and%Nanotechnology,!Douglas!Natelson,!
Cambridge$Press!(Cambridge,!2015)!e!para!a!area!de!processamento!da!informação!quântica,!veja!
Computação%Quântica%e%Informação%Quântica,!Michael!A.!Nielsen!e!Isaac!L.!Chuang,!Editora!Bookman!(São!
Paulo,!2003).!

! 217!
chip!clássico3.!E!no!início!de!2018!a!empresa!Google!também!anunciou!a!construção!de!um!
chip!quântico!contendo!72!q`bits.!Além!disso,!a!empresa!canadense!D`Wave!anunciou!que!
até! meados! de! 2018! irá! disponibilizar! na! “nuvem”! um! computador! quântico,! também!
baseado! em! supercondutores,! que! utiliza! 2000! q`bits! para! realizar! tarefas! computacionais!
usando! o! modelo! conhecido! como! computação! quântica! adiabática.! Considerados! no! seu!
conjunto,! todos! esses! avanços! indicam! que! brevemente! a! computação! quântica! estará!
sendo! utilizada! em! larga! escala! para! resolver! problemas! que! estão! além! das! capacidades!
dos! computadores! clássicos! atuais.! Devemos! lembrar! que,! em! última! análise,! toda! essa!
tecnologia!só!está!se!tornando!possível!graças!à!capacidade!de!manipulação!da!matéria!nas!
escalas!micro!e!nanométricas.!!
!
Basicamente,!o!controle!das!propriedades!da!matéria!em!escala!nanoscópica!ou!atômica!é!
possível! por! meio! do! controle! do! hamiltoniano.! Isso! pode! ser! visualizado! por! meio! do!
seguinte!“roteiro”!para!o!cálculo!das!propriedades!físicas!de!um!sistema:!
!
1. Defina!um!hamiltoniano!H!para!o!sistema;!
2. Encontre!os!seus!autovalores!!! ;!
3. Escreva!a!matriz!densidade!do!sistema,!!;!
4. Calcule!os!observáveis,! ! = !"{!"};!
5. Compare!com!resultados!experimentais.!!
!
A!etapa!(4)!conecta!o!observável!macroscópico,! ! ,!com!os!autovalores!do!hamiltoniano,!
através!de!!.!Portanto,!se!pudermos!controlar!H,!teremos!controle!sobre!as!propriedades!
físicas!do!sistema,!como!magnetização,!corrente!elétrica,!calor!específico,!susceptibilidade!
magnética!etc.!É!essa!“engenharia!de!hamiltonianos”!o!objetivo!das!técnicas!experimentais!
de!nanofabricação!para!a!produção!de!dispositivos!quânticos.!!
!
A!etapa!(5)!é!fundamental:!se!as!propriedades!previstas!não!forem!aquelas!observadas!no!
laboratório,! supondo`se! que! as! etapas! (2)! e! (3)! foram! corretamente! implementadas,! o!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
3
!Para!fins!de!comparação,!em!julho!de!2017!a!Intel!anunciou!o!seu!novo!chip!contendo!3×10!" !transistores!
medindo!apenas!5!nm!cada!um.!Mesmo!que!cada!transistor!pudesse!representar!individualmente!um!número,!
ainda!assim!estaria!muito!aquém!daquilo!que!pode!fazer!um!chip!quântico!com!apenas!50!q`bits.!!!!

! 218!
problema! está! no! modelo,! e! é! necessário! redefinir! o! hamiltoniano,! ou! seja,! o! modelo!
adotado.!!
!
Cabe! enfatizar! que! as! propriedades! físicas! estão! contidas! na! definição! de! H,! apenas.! As!
etapas! (2),! (3)! e! (4)! são! meramente! aplicações! de! técnicas! matemáticas! e/ou!
computacionais!na!cadeia!de!solução!do!problema.!
!

III2.%A%visão%de%Dick%Feynman;%nasce%a%nanociência%
Diversos! autores! identificam! as! origens! da! nanociência! e! nanotecnologia! com! o! famoso!
colóquio!do!físico!norte`americano!Richard!Feynman!na!reunião!anual!da!Sociedade!Norte`
americana!de!Física!(APS)!em!1959.!Naquela!ocasião!disse!ele:!
!
Eu$gostaria$de$descrever$uma$área$de$pesquisa$onde$muito$pouco$tem$sido$feito,$mas$
onde$há$muito$o$que$fazer.$Tal$área$não$se$assemelha$a$outras$da$física$fundamental$
(no$sentido$de$que$a$pergunta$que$fazemos$é$“que$estranhas$partículas$são$estas?),$
sendo$ela$mais$próxima$da$física$do$estado$sólido,$onde$o$maior$interesse$está$nos$
estranhos$fenômenos$que$ocorrem$em$situações$complexas.$Além$disso,$um$ponto$de$
maior$importância$é$que$haveria$ali$um$número$enorme$de$aplicações$tecnológicas.$$
O$que$eu$gostaria$de$falar$é$sobre$o$problema$de$manipularmos$e$controlarmos$as$
coisas$em$pequenas$escalas.$
Por$que$não$podemos$escrever$os$24$volumes$da$Enciclopédia$Britânica$na$cabeça$de$
um$alfinete?$
!
Ao!final!da!conferência,!Feynman!lançou!dois!desafios,!oferecendo!um!prêmio!de!U$!1!mil!
(cerca!de!U$!8!mil!em!2016)!para!quem!resolvesse!cada!um!deles:!!
1. Construir! um! motor! elétrico! em! um! cubo! de! aresta! de! 1/64! de! polegada!
(aproximadamente!!0,4!mm);!!
2. Escrever!a!página!de!um!livro!em!um!espaço!25!mil!vezes!menor!do!que!o!de!uma!
página!usual.!!
O!primeiro!desafio!foi!vencido!já!no!ano!seguinte,!em!1960,!pelo!engenheiro!elétrico!norte!
americano!William!Howard!McLellan.!A!Figura!III2.1!mostra!uma!fotografia!de!MacLellan!e!

! 219!
Feynman,!este!olhando!o!minúsculo!motor!em!um!microscópio.!Ao!lado!uma!fotografia!do!
próprio! motor,! comparado! a! uma! asa! de! inseto.! O! motor! era! composto! por! 13! partes!
separadas,!pesava!250!µg!e!funcionava!a!2!mil!rotações!por!minuto!!!
!
O! segundo! desafio! só! foi! vencido! 26! anos! depois,! em! 1985,! pelo! então! estudante! da!
Universidade! Stanford,! Tom! Newman.! Ele! escreveu! uma! página! de! um! conto! de! Charles!
Dickens,!A$Tale$of$Two$Cities,!na!cabeça!de!um!alfinete!utilizando!um!feixe!de!elétrons.!!
!

!
Dick!Feynman!conferindo!no!microscópio!(esquerda)!o!motor!construído!por!William!McLellan!em!1960!
(direita)!!
!
!
Aquele! foi! um! grande! feito!! Uma! página! de! papel! A4! tem! dimensões! 210! x! 297! mm2.! Se!
aplicarmos!o!fator!25!mil!em!cada!lado,!ficamos!com!uma!área!de!0,0001mm2.!Já!a!cabeça!
de! um! alfinete! tem! área! aproximada! de! 0,5! mm2,! ou! seja,! mil! vezes! maior.! A! maior!
dificuldade! de! Tom! Newman! foi! encontrar! o! texto! na! cabeça! do! alfinete!! A! Figura! III2.2!
mostra!o!texto!escrito!ao!lado!de!uma!foto!de!Newman.!!
!

! 220!
!
Página!de!um!conto!de!Charles!Dickens!escrita!em!1985!com!um!feixe!de!elétrons!!na!cabeça!de!um!
alfinete!(esquerda)!e!Tom!Newman,!o!autor!do!feito!(direita)!!!
!
!

III3.% Estados% eletrônicos% em% baixas% dimensões:% pontos,% fios,% poços%


quânticos%e%dispositivos%
!
Grande! parte! das! propriedades! exploradas! em! aplicações! da! nanotecnologia! se! baseia! no!
comportamento!quântico!de!estruturas!que!limitam!o!movimento!espacial!dos!elétrons.!Em!
termos!gerais!podemos!dizer!que!o!comportamento!quântico!dos!elétrons!surge!quando!os!
comprimentos! característicos! do! problema! se! aproximam! do! comprimento! de! onda! de! de!
Broglie:!
ℎ 2!ℏ (III3.1)!
! =! =! !
! !"
!
A!inclusão!dos!detalhes!das!interações!entre!um!elétron!com!os!átomos,!outros!elétrons!e!
excitações! elementares! de! um! meio! material! é! um! problema! muito! complicado.! No!
entanto,! existe! uma! forma! simplificada! de! se! fazer! isso,! considerando`se! a! temperatura!
como! uma! espécie! de! parâmetro! para! aquelas! interações.! A! ideia! é! que,! ao! se! mover! no!
meio,! as! interações! do! elétron! se! refletem! na! sua! energia! cinética.! ! Em! uma! abordagem!
“semiclássica”,!utiliza`se!o!princípio!de!equipartição!da!energia!para!se!obter!a!velocidade!
do!elétron:!
!

!! ! 3 3!! ! (III3.2)!
= ! !! !! ⇒ ! = ! !
2 2 !

! 221!
!
que!pode!ser!substituída!na!Eq.!(III3.1):!
2!ℏ (III3.3)!
! =! !
3!!! !
!
Com! essa! fórmula,! podemos! avaliar! o! comprimento! característico! para! a! manifestação! de!
propriedades!quânticas!de!um!elétron,!fazendo!!!~!!:!
! (III3.4)!
2!ℏ 0,1
!!~! !! !!/! ~! !nm,!
3!!! !
!
onde!os!valores!das!constantes!fundamentais!foram!substituídos,!e!a!unidade!foi!convertida!
para! nanômetros,! por! conveniência.! Devemos! lembrar! que,! em! um! sólido! típico,! as!
distâncias!interatômicas!são!da!ordem!de!1!–!10!nm.!Ou!seja,!se!quisermos!observar!efeitos!
quânticos! em! uma! estrutura! com,! digamos,! 1! nm,! devemos! baixar! a! temperatura! da!
amostra!até!10!mK,!o!que!é!facilmente!alcançável,!utilizando!os!chamados!refrigeradores!de!
diluição!de!3He`4He.!!
!
É!importante!enfatizar!que!essa!estimativa!foi!feita!empregando`se!a!massa!do!elétron!livre,!
o! que! nunca! ocorre! em! uma! estrutura! sólida! real.! O! uso! da! chamada! massa! efetiva! do!
elétron!pode!modificar!a!escala!para!que!efeitos!quânticos!sejam!observados.!!
!
A!restrição!no!movimento!de!elétrons!em!nanoestruturas!pode!ser!feita!em!uma,!duas!ou!
três! dimensões! espaciais.! Quando! as! três! dimensões! são! restritas,! temos! uma! estrutura!
conhecida! como! ponto! quântico.! Quando! restringimos! duas! dimensões! temos! um! poço!
quântico! e,! finalmente,! quando! a! restrição! se! dá! em! apenas! 1! dimensão! temos! um! fio!
quântico.!!
!
A! fabricação! dessas! estruturas! se! tornou! possível! ao! longo! da! década! de! 1980! com! a!
invenção,! entre! outras,! da! técnica! conhecida! como! MBE4,! que! será! tratada! adiante.! Em!
geral,!as!estruturas!são!obtidas!por!meio!do!“empilhamento”!controlado!de!várias!camadas!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
4
!Molecular$Beam$Epitaxy!ou!Epitaxia!de!Feixe!Molecular.!

! 222!
atômicas! que! restringem! o! movimento! eletrônico! de! forma! controlada! ao! longo! de!
determinadas!orientações.!
!
Um!ponto!quântico!é!por!vezes!comparado!a!um!“átomo!artificial”.!Se!houver!apenas!um!
elétron!em!um!ponto!quântico,!o!sistema!será!equivalente!a!um!átomo!de!hidrogênio,!mas!
com!autoestados!de!energia!dados!por5:!
!
! ! ℏ! ! (III3.5)!
!! = ! ! + !!! + !!! !
2!!! !
!
A! energia! do! estado! fundamental! corresponde! a! !! = !! = !! = 1.! Para! um! ponto!
quântico!com!! = 5!nm,!teremos!!! ~!0,04!eV,!e!!! ~!0,08!eV.!Para!fins!de!comparação,!a!
energia! térmica! ambiente! é! !! !!~!0,03! eV.! As! autofunções! de! um! elétron! em! um! ponto!
quântico!retangular!são!dadas!por:!
!
(III3.6)!
8 !!! ! !!! ! !!! !
!! !, !, ! = ! ! sen sen sen !
! ! ! !

!
Note!que!a!função!de!onda!se!anula!nas!paredes!do!ponto,!o!que!pressupõe!uma!barreira!
de!potencial!infinita.!
!
Um!exemplo!interessante!de!modelo!de!ponto!quântico!é!o!de!um!elétron!em!um!potencial!
esférico!atrativo:!!
!
! ! = !! ! !!" !onde!!! < 0! (III3.7)!

!
Vamos!calcular!a!energia!média!do!elétron!neste!potencial.!Como!se!trata!de!um!potencial!
atrativo,! de! forma! similar! ao! que! ocorre! com! o! átomo! de! hidrogênio,! a! parte! radial! da!
função!de!onda!será!uma!exponencial!decrescente:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
5
!Lembrar!que!no!átomo!de!hidrogênio,!!! ~1/!! .!

! 223!
! ! = !! !!" ! (III3.8)!
!
A!constante!de!normalização!é!dada!por:!!
!
! (III3.9)!
! ! ! !
1
4! ! ! ! !" = 1 = !! ! → ! = !
! !! !

!
Usando! esta! função! normalizada,! podemos! calcular! diferentes! quantidades! de! interesse,!
como!o!valor!esperado!da!energia!cinética!do!elétron:!
!
ℏ! !" ! ! ℏ! ! ! (III3.10)!
! = 4! ! !" = !
2! !" 2!
!
E!da!sua!energia!potencial:!
!
(III3.11)!
∗ !!" !
8!!!
! = 4!"! ! ! !! !" = !
!! ! (2! + !)
!
!
Dois! pontos! quânticos! juntos,! separados! por! uma! barreira! de! potencial,! formam! uma!
espécie!de!molécula!artificial.!Para!dois!pontos!de!dimensão!L,!separados!por!uma!barreira!
de! largura! d,! pequena! em! relação! ao! comprimento! de! onda! de! de! Broglie,! a! energia! do!
estado!fundamental!do!elétron!torna`se:!
!
! ! ℏ! 1 (III3.12)!
!!! ~! ! !
2!!! 1 + !/! !
!
Um! modelo! interessante! de! ponto! quântico! duplo! considera! um! potencial! ! !, !, ! =
! ! ! ! !(!),! infinito! nas! “paredes! externas”! e! uma! barreira! finita! ao! longo! de! !!
separando!os!dois!poços:!
!

! 224!
∞, para!! < 0!!!! > !!
! ! = 0, para!0 < ! < !, !! − ! < ! < !! !
!! , para!! ≤ ! ≤ !! − !!
!
∞, para!! > !! !e!! < 0
! ! = 0, para!0 ≤ ! < !! !
!
(III3.13)!
!
∞, para!! > !! !e!! < 0
! ! = 0, para!0 ≤ ! < !! !
!
!
A! parte! central! do! ponto,! de! altura! !! ,! pode! ser! considerada! uma! perturbação! sobre! os!
autoestados!do!poço!infinito:!
!
! !!! !
!!!! ! = !!
!"# !!
, ! = !, !, !!

(!) ! ! ℏ! !!! !!! !!!


!!! ,!! ,!! = + + ! (III3.14)!
2! !!! !!! !!!
!
Como! a! barreira! de! potencial! é! apenas! ao! longo! de! !,! somente! as! autoenergias!
correspondentes!precisam!ser!corrigidas.!Em!primeira!ordem:!
!
!! !!
(!) (!) 2!! !!! ! !! !! 2!!! !
!!! = !!!! ∗ !! !!! !" = !"#! !" = !! − 2! + !"# !
!! ! !! !! !!! !!
!
(III3.15)!
!
A!expressão!final!para!as!autoenergias!do!elétron!nesse!ponto!quântico!duplo!é!dada!pela!
(!) (!)
soma!!!! ,!! ,!! +!!!! .!

!
Estruturas!que!restringem!duas!dimensões!do!espaço,!mas!permitem!o!livre!movimento!do!
elétron! em! uma! dimensão,! digamos! Z,! são! chamadas! de! fios! quânticos.! Ao! longo! da!
dimensão!em!que!o!elétron!se!move,!a!sua!energia!no!fio!quântico!será!a!de!uma!partícula!
livre:!

! 225!
!
(III3.16)!
ℏ! !!!
! !! =! ,!
2!
!
e!nas!outras!duas!dimensões,!onde!há!restrição!de!movimento,!ela!será!quantizada:!
!
! ! ℏ! ! (III3.17)!
!! = ! !
!! + !!! !
2!!
!
A! energia! total! será! a! soma! dessas! duas! energias.! A! Figura! III3.1! mostra! a! estrutura! de!
energias!de!um!elétron!em!um!fio!quântico.!Os!autoestados!se!organizam!em!“bandas!de!
energia”.! Cada! banda! é! rotulada! por! um! par! !! , !! ! e,! dentro! da! banda,! o! elétron! se!
comporta!como!uma!partícula!livre.!!
!

E(kZ ) = ħ2kZ2 / 2m

ε(n1 = 1,n2 = 2) = n2 = 5π2ħ2 / 2mL2


E(kZ ) = ħ2kZ2 / 2m

ε(n1 = n2 = 1) = n1 = π2ħ2 / mL2

kZ
0 !

Figura! III3.1! –! Níveis! de! energia! de! um! elétron! em! um! fio! quântico.! A! restrição! do! movimento! em! duas!
dimensões! dá! origem! a! uma! estrutura! de! “bandas! de! energia”,! mantendo! a! relação! de! dispersão! do!
elétron!livre!dentro!de!cada!banda!!!
!
!
As!autofunções!do!elétron!no!fio!quântico!são:!

! 226!
!
2 !!! ! !!! ! !! ! (III3.18)!
!! !, !, ! = ! sen sen ! ! !
! ! !
!
Novamente,!essa!solução!prevê!barreiras!impenetráveis!nas!paredes!do!fio.!
!
Um!modelo!alternativo!ao!de!barreira!infinita!em!um!fio!quântico!considera!o!elétron!livre!
ao!longo!da!direção!!!e!restringido!em!!!e!!!por!um!potencial!do!tipo!oscilador!harmônico:!
!
!! + !! (III3.19)!
! !, ! = ! !
2
!
Nesse!caso,!os!autoestados!são:!
!
!!! ,!! !, !, ! = !!!"#
!
(!)!!!"#
!
(!)! !!! ! !

ℏ! !!!
!!! ,!! !! = ℏ! !! + !! + 1 + !onde!!! + !! = 0,1,2, ⋯ e!! = !/!!!
2!
!
(III3.20)!
!
Finalmente,!um!poço!quântico!é!uma!estrutura!na!qual!a!restrição!do!movimento!do!elétron!
é! em! apenas! uma! dimensão,! sendo! que,! nas! outras! duas,! o! movimento! é! livre.! As!
autoenergias! e! autofunções! de! um! elétron! em! um! poço! quântico! com! restrição! de!
movimento!ao!longo!de!Z,!são:!
!
! ! ℏ! ! ℏ! ! (III3.21)!
!!! !! , !! =! ! + ! + !!! !
2!!! ! 2! !
!
(III3.22)!
2 !!! ! ! !! !!!! !
!! !, !, ! = ! sen ! !
! !

!
A!Figura!III3.2!mostra!a!estrutura!das!energias!do!elétron!no!poço.!!
!
!

! 227!
!
!

Enx(kII)
kII

E2 ky

E1
0 kz
!

Figura!III3.2!–!Níveis!de!energia!de!um!elétron!em!um!poço!quântico.!Nessa!estrutura,!o!elétron!se!move!
livremente!em!duas!dimensões.!A!restrição!do!movimento!em!uma!dimensão!dá!origem!a!uma!estrutura!
de!“bandas!de!energia”!!!
!
!
Como! aplicação! dessa! solução,! vamos! calcular! a! probabilidade! de! um! elétron! no! estado!
fundamental!de!um!poço!quântico!de!largura!L!!ser!encontrado!entre!L/4!e!3L/4.!Usando!a!
função!de!onda!(III3.22)!para!nz!=!1,!vem:!
!
!!/!
2 !" ! 1 2
! =! ! sen !" = ! 1 + ~!82%!
! !/! ! 2 !
!
Essas! estruturas! que! restringem! o! movimento! dos! elétrons! são! construídas! em!
equipamentos!que!realizam!a!superposição!controlada!de!várias!camadas!de!filmes!finos!de!
materiais;! em! geral,! feitos! de! elementos! semicondutores! dopados! com! elementos!
metálicos.!!Por!exemplo,!duas!camadas!de!GaAs!de!6nm!de!espessura,!intercaladas!por!uma!
camada! de! Al0,2Ga0,8As! ! com! 4! nm! de! espessura,! formam! um! poço! quântico! duplo.! As!
soluções! de! problemas! quânticos! dentro! dessas! estruturas,! levando`se! em! conta! as!
condições!de!contorno,!podem!ser!obtidas!numericamente,!por!exemplo,!a!partir!da!técnica!
de!elementos!finitos.!!

! 228!
Um!exemplo!de!aplicação!para!um!poço!quântico,!utilizando`se!um!programa!desse!tipo,!é!
mostrado!na!Figura!III3.3.!Um!cilindro!semicondutor!de!12,5!nm!de!raio!e!100!nm!de!altura!
é! formado! por! duas! regiões! de! GaAs,! separadas! por! um! poço! de! 2! nm! de! altura,! feito! de!
InAs! (a).! Nesse! exemplo,! a! única! informação! sobre! os! diferentes! materiais! está! na! massa!
efetiva!do!elétron,!igual!a!0,067!vez!a!massa!do!elétron!livre!no!GaAs,!e!0,023!no!InAs.!!
!
A! figura! (b)! mostra! a! estrutura! de! células! (malha! ou! elementos! finitos)! para! a! solução!
numérica!–!a!equação!de!Schroedinger!é!resolvida!dentro!de!cada!uma!delas!–!;!e!a!figura!
(c),!as!funções!de!onda!do!estado!fundamental!e!o!primeiro!estado!excitado.!Finalmente,!a!
figura!(d)!mostra!uma!seção!do!cilindro!com!a!função!de!onda!de!um!dos!estados!dentro!do!
poço!de!InAs.!!!!
!

Figura!III3.3!–!Exemplo!de!aplicação!de!cálculo!numérico!utilizando`se!elementos!finitos!para!a!solução!da!
equação! de! Schroedinger! em! um! poço! quântico.! Em! (a),! a! definição! da! geometria! e! dos! materiais!
envolvidos,!bem!como!os!valores!da!massa!efetiva!do!elétron!em!cada!porção.!O!poço!é!formado,!na!parte!
do! meio,! de! InAs.! Em! (b)! malha! (elementos! finitos)! formando! as! células! dentro! das! quais! a! equação! de!
Schroedinger!será!resolvida.!Em!(c),!duas!soluções!mostrando!o!estado!fundamental!e!o!primeiro!estado!
excitado! do! elétron! no! poço.! Em! (d),! representação! da! geometria! do! sistema! com! as! funções! de! onda!
dentro!do!poço!!
!
!
%
%

! 229!
As!autoenergias!eletrônicas!em!pontos,!fios!e!poços!quânticos!podem!ser!manipuladas!por!
meio! do! controle! das! dimensões! dos! nano`objetos.! A! possibilidade! de! controle! do!
hamiltoniano! por! meio! da! construção! de! materiais! nanoestruturados! tem! levado! a! uma!
série! de! inovações! tecnológicas! com! aplicações! quase! ilimitadas,! que! geram! produtos! de!
grande!valor!agregado.!Nos!Estados!Unidos,!por!exemplo,!estima`se!que!30%!do!PIB!(algo!
em!torno!de!U$!4,5!trilhões!em!2016)!decorra!de!aplicações!diretas!da!mecânica!quântica.!
Algumas!dessas!aplicações!são:!
• Diodos% de% efeito% túnel! –! Formados! por! duas! barreiras! de! potencial! com! um! poço!
quântico!entre!elas.!Uma!corrente!de!tunelamento!através!da!estrutura!oscila!com!a!
voltagem!aplicada.!Tem!várias!aplicações;!sobretudo,!na!indústria!de!informática.!!
• Transistores%de%um%elétron%–!Formado!por!pontos!quânticos.!Funciona!pela!corrente!
de!tunelamento!de!um!único!elétron!de!dentro!para!fora!do!ponto6.!!
• Diodos% Emissores% de% Luz% (LEDs)% –! Os! primeiros! LEDs! só! emitiam! no! vermelho! e!
infravermelho,!como!os!que!são!utilizados!nos!controles!remoto;!LEDs!verdes!eram!
de! baixa! eficiência.! Somente! após! o! surgimento! das! técnicas! de! nanofabricação,!
tornou`se!possível!a!construção!de!LEDs!de!várias!cores,!de!alta!eficiência,!inclusive!
de!luz!branca.!Devido!ao!seu!baixíssimo!consumo!e!grande!eficiência!na!conversão!
de!luz,!esses!dispositivos!prometem!revolucionar!o!consumo!de!energia!para!fins!de!
iluminação.!Essa!inovação!deu!a!Isamu!Akasaki,!Hiroshi!Amano!e!Shuji!Nakamura!o!
prêmio!Nobel!de!Física!de!2014.!
• LASERs% –! Lasers! de! semicondutores! são! baseados! em! poços! quânticos,! mas! já!
existem!tentativas!de!se!utilizarem!pontos!quânticos!para!fabricação!desses!objetos.!
O! primeiro! laser! desse! tipo! foi! demonstrado! por! um! grupo! da! Universidade! de!
Tokyo,!em!20047.!
• Fotodetectores%–!Funcionam!com!base!no!efeito!fotoelétrico,!ou!seja,!convertem!luz!
em! corrente! elétrica.! Uma! das! aplicações! mais! interessantes! é! o! seu! uso! em!
máquinas! fotográficas! digitais,! nas! quais! os! fotossensores! são! construídos! como!
arrays!de!poços!quânticos.!!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
6
!Veja,!por!exemplo,!Sketched%oxide%single_electron%transistor,!Guanglei!Cheng!e!co`autores,!Nature$
Nanotechnology$Letters,!6!(2011)!343.!
7
!Veja!o!press$release!da!época!no!site:!http://www.fujitsu.com/global/about/resources/news/press`
releases/2004/0910`01.html!

! 230!
• Junções%Josephson%–!São!dispositivos!supercondutores!capazes!de!medir,!por!meio!
de! um! processo! de! interferometria! quântica,! variações! de! fluxo! magnético!
extremamente!pequenas.!Têm!aplicações!em!equipamentos!de!medidas!magnéticas.!
Em! 2016,! a! IBM! disponibilizou! o! primeiro! protótipo! de! computador! quântico! (veja!
adiante)!para!testes!por!especialistas!de!qualquer!parte!do!mundo,!feito!com!base!
nas!junções!Josephson.!!
• Dispositivos%baseados%em%spintrônica% –!O!termo!“spintrônica”!significa!“eletrônica!
de! spins”! e! inclui! dispositivos! de! memória,! sensores! magnéticos! de! alta!
sensibilidade,!dispositivos!lógicos!etc.!Uma!corrente!de!spin!não!transporta!carga!e,!
portanto,! o! custo! energético! para! a! realização! de! operações! de! inversão! de! spin! é!
muito!menor!do!que!aquele!da!eletrônica!convencional.!!
• Uso%de%formas%alotrópicas%do%carbono%–!Incluem`se!aqui!o!fulereno,!ou!buckyballs!
(60C),! os! nanotubos! de! carbono! e! o! grafeno.! Todas! essas! estruturas! são!
mecanicamente! muito! resistentes8,! com! potencial! para! diversas! aplicações.! Os!
fulerenos,! por! exemplo,! podem! ser! usados! em! células! solares,! no! armazenamento!
de!hidrogênio,!sensores,!transportadores!de!fármacos!etc.!Os!nanotubos!de!carbono!
possuem! a! resistência! mecânica! dos! fulerenos,! ! são! flexíveis,! e! apresentam! altas!
condutividades! elétrica! e! térmica.! Têm! várias! aplicações! em! microeletrônica,!
biotecnologia,!armazenamento!de!energia,!etc.!Os!grafenos!seguem!na!mesma!linha:!
possuem! propriedades! mecânicas,! eletroeletrônicas,! ópticas,! etc.,! que! os! colocam!
como! uma! das! grandes! promessas! de! aplicações! em! medicina! (engenharia! de!
tecidos,! contrastes,! dispositivos! etc.),! eletrônica! (transistores,! sensores! Hall,!
dispositivos!de!pontos!quânticos,!etc.),!geração!e!armazenamento!de!energia!etc.!!
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
!Estima`se!que!a!molécula!do!fulereno!possa!suportar!uma!pressão!de!até!3!mil!atm.!!!
8

! 231!
!
Figura! III4.1! –! Formas! alotrópicas! do! carbono.! O! fulereno,! ou! buckyball,! é! uma! estrutura! contendo! 60!
átomos!de!carbono.!Os!grafenos!são!redes!bidimensionais!de!carbono.!A!relação!de!dispersão!dos!elétrons!
nessas! redes! tem! a! mesma! estrutura! que! a! de! uma! partícula! sem! massa.! Os! nanotubos! de! carbono! são!
redes!de!grafeno!“enroladas”.!Suas!propriedades!de!transporte!dependem!da!quiralidade!(veja!texto).!As!
propriedades!elétricas!e!mecânicas!desses!materiais!têm!muitas!aplicações!de!inovações!tecnológicas!
!
%
%
III4.% Fabricação% e% caracterização% de% nano_objetos% % de% regime%
quântico%
!
As! técnicas! de! fabricação! de! nanoestruturas! são! classificadas,! basicamente,! em! duas!
categorias:!(i)!as!do!tipo!“de!cima!para!baixo”!(top]down,!no!jargão!da!área);!!(ii)!as!do!tipo!
“de! baixo! para! cima”! (bottom]up).! No! primeiro! caso,! parte`se! de! uma! estrutura!
macroscópica! e,! por! meio! de! vários! processos! físicos! e! eletroquímicos,! a! nanoestrutura! é!
obtida.! No! segundo! caso,! parte`se! da! manipulação! da! matéria! em! escala! nanoscópica! ou!
atômica!e!contrói`se!a!estrutura!desejada!–!!às!vezes,!átomo!a!átomo.!As!principais!técnicas!
são!descritas!brevemente!a!seguir:!!
!
a. Fotolitografia!–!A!fotolitografia!é!um!exemplo!de!técnica!top]down.!Ela!não!produz!
nano`objetos,! por! razões! que! ficarão! claras! a! seguir,! mas! é! excelente! para! a!
fabricação! de! objetos! de! escala! micro! até! dezenas! de! nanômetros.! Primeiro,! um!
substrato! é! cuidadosamente! limpo! e,! sobre! ele,! é! depositada! uma! camada! de! um!
óxido! que! vai,! ao! final! do! processo,! delinear! a! microestrutura! que! se! deseja!
construir.! Sobre! esse! óxido! é! depositada! outra! camada,! tipicamente! de! 2! µm,! de!
uma!substância!sensível!à!ação!da!luz.!Esse!é!o!chamado!photoresist,!que!vai!dar!a!
forma!final!da!microestrutura.!Sobre!o!photoresist,!é!colocada!a!máscara,!contendo!
o! desenho! da! estrutura! que! se! quer! construir,! e! todo! o! conjunto! é! exposto! à! luz!

! 232!
ultravioleta.! O! papel! da! luz! é! sensibilizar! o! photoresist! nas! regiões! que! não! foram!
cobertas! pela! máscara.! Depois! disso,! utilizando`se! meios! químicos,! o! photoresist!
sensibilizado!é!removido,!ficando!apenas!o!desenho!da!máscara.!Então,!um!processo!
de! corrosão! remove! as! partes! expostas! do! óxido,! e,! finalmente,! o! que! restou! do!
photoresist!é!removido,!restando!sobre!o!substrato!a!forma!!impressa!no!óxido!da!
estrutura!desenhada!na!máscara.!As!etapas!da!fotolitografia!são!mostradas!na!Figura!
III4.1.!Na!parte!mais!à!direita!da!figura,!são!exibidas!algumas!estruturas!construídas!
com!essa!técnica.!!
!
a. Preparo da pastilha d. Exposição à luz UV f. Dissolver o óxido exposto
óxido
PR
substrato vidro
Cr
óxido
b. Aplicação do fotorresiste
PR substrato
PR
óxido óxido

substrato substrato

c. Alinhamento da máscara g. Remover o fotorresiste


vidro
d. Revelar e remover restante
Cr
o fotorresiste
PR óxido
PR óxido
óxido substrato
substrato
substrato
!
!
Figura!III4.1!–!Etapas!para!a!fabricação!de!uma!micro/nano!estrutura!por!fotolitografia.!Sobre!um!
! óxido! em! um! substrato! é! aplicada! uma! camada! de! um! material! sensível! à! luz! ultravioleta!
(photoresist).! Uma! máscara! contendo! o! desenho! do! objeto! que! se! deseja! imprimir! no! óxido! é!
! alinhada! ao! conjunto.! Luz! ultravioleta! sensibiliza! as! partes! expostas! do! photoresist! que! é! então!
removido!imprimindo!a!forma!desejada!no!óxido!!
! !
!
O!limite!de!resolução!da!fotolitografia!–!e,!portanto,!o!limite!inferior!para!o!tamanho!
dos! objetos! que! podem! ser! construídos! com! essa! técnica! –! é! estabelecido! pelo!
comprimento!de!onda!da!luz!utilizada!e!pela!capacidade!de!a!luz!ser!transmitida!para!
a!estrutura!que!a!absorve.!Comprimentos!de!onda!na!casa!dos!200!nm!são!usados!
para!produzir!estruturas!com!resolução!de!até!50!nm.!Para!melhorar!a!resolução,!é!
preciso!diminuir!o!comprimento!de!onda.!Isso!pode!ser!feito!utilizando`se!feixes!de!
elétrons,!em!vez!dos!de!fótons.!!
!
b. Litografia%por%feixe%de%elétrons!–!Os!princípios!da!litografia!por!feixe!de!elétrons!são!
os!mesmos!da!fotolitografia,!sendo!a!principal!diferença!o!comprimento!de!onda!dos!
elétrons,! que! pode! chegar! à! ordem! de! 20! nm,! e,! consequentemente,! aumentar! a!

! 233!
resolução!do!que!pode!ser!fabricado.!A!técnica!permite!a!fabricação!de!objetos!com!
dimensões! abaixo! de! 10! nm.! Outra! diferença! importante! é! que! o! tempo! de!
fabricação! de! uma! estrutura! é! consideravelmente! maior! com! técnica! de! elétrons.!
Isto!significa!que!esta!última!não!é!adequada!para!fabricar!estruturas!muito!grandes,!
da! ordem! de! centenas! de! cm2.! A! Figura! III4.2! mostra! exemplos! de! estruturas! na!
escala!micro!e!nano!de!objetos!construídos!com!litografia!de!feixe!de!elétrons.!!
!

!
! Figura!III4.2! –!Exemplos!de!estruturas!com!dimensão!nanométrica!construídas!com!litografia!de!
feixes!de!elétrons.!O!controle!da!energia!do!elétron,!e,!consequentemente,!do!seu!comprimento!
! de!onda!de!de!Broglie!permite!alcançar!resoluções!que!não!são!possíveis!para!feixes!de!luz!!!
! !

c. Epitaxia% por% feixe% molecular% (MBE)! –! O! termo! epitaxia! refere`se! à! técnica! de!
crescimento! de! um! monocristal! –! ou! seja,! um! cristal! sólido! com! todas! as! ligações!
químicas!entre!os!átomos!orientadas!na!mesma!direção!para!formar!a!rede!–!a!partir!
de! um! substrato! sobre! o! qual! se! depositam! átomos.! A! técnica! da! MBE! surgiu! nos!
laboratórios! Bell! no! final! da! década! de! 1960.! Ela! é! utilizada! para! o! crescimento! de!
camadas! muito! finas! de! monocristais! sobre! um! substrato.! Em! particular,! tem! sido!
amplamente! aplicada! para! a! manufatura! de! transistores! semicondutores!
empregados!em!telefones!celulares,!entre!outros!aparelhos.!!
!
O!método!se!baseia!no!fato!de!que!átomos!e!moléculas!termicamente!ejetados!–!ou!
ejetados! por! meio! da! ação! de! um! laser)! de! diferentes! substâncias! podem! ser!
condensados!sobre!um!substrato!mantido!a!baixas!temperaturas9.!A!quantidade!de!
material! depositado! é! controlada! através! de! shutters! ! posicionados! na! saída! dos!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
9
!Semelhantemente!ao!que!acontece!com!a!umidade!do!ar!que!se!condensa!no!vidro!de!uma!janela!gelada.!

! 234!
recipientes!que!contêm!as!substâncias!a!serem!ejetadas.!Tudo!isso!deve!ocorrer!em!
um! ambiente! de! ultra`alto! vácuo,! da! ordem! de! 10`15! atm.! A! Figura! III4.3! mostra!
esquematicamente!os!elementos!de!um!MBE!para!o!crescimento!de!poços!quânticos!
em!redes!semicondutoras,!ao!lado!do!que!seria!uma!estrutura!formando!um!duplo!
poço!quântico,!com!a!função!de!onda!do!estado!fundamental!(par)!e!a!do!primeiro!
estado!excitado!(ímpar)!e!uma!fotografia!de!um!equipamento!de!MBE.!!
!

!
!
Figura!III4.3!–!A!técnica!chamada!Epitaxia!de!Feixe!Molecular,!conhecida!pela!sua!sigla!em!inglês!
! MBE,!permite!a!construção!de!estruturas!físicas!cristalinas!de!altíssima!pureza!e!precisão!por!meio!
do!controle!na!deposição!de!átomos!sobre!um!substrato.!Acima,!!esquema!de!um!MBE!e,!abaixo,!
! imagem! de! um! equipamento.! Acima,! à! direita,! exemplo! de! estrutura! nanométrica,! um! poço!
quântico!duplo!construído!por!MBE!pela!deposição!de!camadas!sucessivas!de!GaAs!dopado!com!
! Al.!Essa!estrutura!é!a!base!para!inúmeras!aplicações!em!nanotecnologia.!!!
! !

! 235!
d. Fulerenos,% nanotubos% de% carbono% e% grafenos! –! Estas! formas! do! carbono! são!
produzidas! por! métodos! físico`químicos! complicados.! Os! fulerenos! podem! ser!
extraídos! de! fuligem! e,! depois,! purificados.! Nanotubos! de! carbono! podem! ser!
produzidos!em!quantidade!utilizando`se!ablação!a!laser,!deposição!de!vapor!químico!
(CVD)! etc.! Grafenos! são! produzidos! por! esfoliação! que! pode! ser! controlada! por!
métodos! eletroquímicos! para! produção! em! quantidade.! Devido! à! sua! importância!
tecnológica!uma!gama!enorme!de!técnicas!para!a!produção!do!fulerenos,!nanotubos!
de!carbono!e!grafenos!têm!sido!desenvolvidas10.!!
!
e. Microscopia%de%Tunelamento%e%Varredura%(STM);!modelo%1D%de%tunelamento%entre%
ponta%e%substrato.%
!
O!STM!funciona!com!base!em!um!efeito!quântico!que!se!aprende!nos!textos!básicos!
universitários! de! física! moderna:! o! efeito! túnel.! Nesse! tipo! de! microscópio,! uma!
ponta! metálica! extremamente! fina,! de! dimensões! atômicas,! é! aproximada! da!
superfície!de!um!material.!O!material!da!ponta!é!normalmente!tungstênio!ou!algum!
tipo! de! liga! metálica.! A! uma! distância! de! poucos! angstroms! da! superfície,! uma!
pequena!tensão!elétrica!é!aplicada!entre!essa!última!e!a!ponta.!Dessa!forma,!cria`se!
uma! barreira! de! potencial! através! da! qual! elétrons! da! superfície! podem! tunelar! e!
chegar! até! a! ponta.! O! fato! importante! é! o! aspecto! quântico! dessa! corrente! de!
tunelamento,! que! varia! exponencialmente! com! a! distância! entre! a! ponta! e! a!
superfície:!
!
(III4.1)!
!~! !!! !!!! /ℏ
!
!
onde! !! é! a! distância! entre! a! ponta! e! a! superfície,! e! !! ,! a! diferença! de! potencial!
aplicada.!Ao!percorrer!a!superfície!do!material,!infinitésimas!variações!na!distância!
causam! uma! mudança! perceptível! na! corrente! de! tunelamento.! Para! se! ter! uma!
ideia!da!sensibilidade,!considere!a!variação!da!corrente!com!relação!à!distância:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
10
!Existem!muitas!publicações!especializadas!a!respeito!desses!materiais.!Veja,!por!exemplo,!Graphene:%
fundamentals,%device%and%applications,!Ed.!Serhii!Shafraniuk,!Pan!Stanford!(2015);!Carbon%Nanotube%Science.%
nd
Synthesis,%properties%and%applications,!Peter!J.!F.!Harris,!Cambridge!University!Press,!2 !Ed.!(2011);!
Fullerenes:%nanochemistry,%nanomagnetism,%nanomedicine,%nanophotonics,!Elena!Sheka,!CRC!Press!(2011).!!

! 236!
!
!" 2! 2 2
~!!"# − 2!!! × − 2!!! = ! − 2!!! !
!" ℏ ℏ ℏ
!
!Portanto,!a!variação!fracional!da!corrente!de!tunelamento!será:!
!
!" 2 (III4.2)!
~ − 2!!! !"!
! ℏ
!
Substituindo!os!valores!típicos!!! = 5!eV!e!!" = 1!Å,!obtemos!uma!variação!relativa!
!"
de!corrente!de! ! !~!0,5.!Com!uma!corrente!da!ordem!de!alguns!nano!amperes,!tal!

variação! é! facilmente! detectável.! Fazendo! a! ponta! do! microscópio! percorrer! a!


superfície! de! uma! amostra,! a! corrente! de! tunelamento! medida! é! convertida! em!
coordenadas! espaciais,! e! a! imagem! da! superfície! é! reconstruída.! A! figura! III4.4!
mostra!uma!fotografia!de!STM!!da!superfície!do!grafite,!ao!lado!de!um!equipamento!
comercial.!
!

!
!
Figura!III4.4!–!Fotografia!de!uma!montagem!experimental!com!um!microscópio!de!tunelamento!e!
! varredura! (STM).! Este! equipamento! permite! a! manipulação! de! átomos! individuais! para! a!
construção!de!estruturas!nanométricas.!À!direita,!uma!imagem!de!um!conjunto!de!átomos!feita!
! com!STM.!!!
! !

! 237!
É! possível! fazermos! uma! descrição! bastante! completa! do! tunelamento! de! elétrons!
entre!a!ponta!e!a!superfície,!mesmo!em!uma!abordagem!unidimensional.!Considere!
uma! barreira! de! potencial! ! ! = !! !para − ! < ! < !! e! zero! em! todas! as! outras!
regiões!do!espaço.!Para!analisar!o!tunelamento,!vamos!considerar!um!elétron!com!
energia!positiva,!!,!tal!que!! < !! .!Em!ambos!os!lados!da!barreira,!a!função!de!onda!
será! composta! por! uma! onda! incidente! sobre! a! barreira! e! uma! onda! refletida.!
Dentro!da!região!da!barreira,!a!função!de!onda!decairá!exponencialmente:!!
!
!! !"# + !! !!"# , para!! < −!
(III4.3)!
! ! = !! !" + !! !!" , para − ! < ! < !!
!! !"# + !! !!"# , para!! > !
!
Nessas! expressões,! ! = 2!"/ℏ! e! ! = 2!(!! − !)/ℏ.! Impondo`se! a!
continuidade! da! função! de! onda! e! de! sua! derivada! primeira! nos! dois! lados! da!
barreira!obtemos!um!conjunto!de!quatro!equações!para!os!coeficientes!que!podem!
ser!organizados!em!uma!forma!matricial:!!
!
!"!! !"!! ! !"!! !"!! !
! ! ! !
= !!" !!"
! (III4.4)!
! !"!!
! ! !"!! ! !"!!
! ! !"!! ! !
!!" !!"

!
para!a!fronteira!do!lado!esquerdo!da!barreira,!e:!!
!
!"!! !"!!
! !!
! !"!! ! − !!
! !"!! ! ! (III4.5)!
= !
! −
!"!! ! !"!!
! ! !"!! ! !"!! !
! !
!! !!

!
para!a!fronteira!do!lado!direito.!!
!
A!segunda!equação!pode!ser!substituída!no!lado!direito!da!primeira,!resultando!em!
uma! relação! direta! entre! os! coeficientes! das! funções! de! onda! dos! dois! lados! da!
barreira.!A!matriz!resultante!do!produto!é!chamada!!matriz!de!transmissão:!!
!

! 238!
! !!! !!" ! (III4.6)!
= !
! !!" !!! !
!
Dessa! expressão,! podemos! calcular! quantidades! importantes.! Por! exemplo,! o!
coeficiente!de!transmissão!é!dado!por:!
!
!! ! !
!= = = !! !!!
senh! (2!")!! (III4.7)!
!! !!! ! !!
!!"

!
No! limite! ! ≫ ! !! ! (barreira! muito! maior! do! que! comprimento! de! atenuação),! se!
obtém:!
!
(III4.8)!
!~! !!! !! !! !! /ℏ
!
!
que!é!a!Eq.!(III4.1).!!
!
Além! de! “fotografar”! átomos,! o! STM! pode! ser! utilizado! também! para! construir!
nanoestruturas,!e!é,!de!fato,!um!exemplo!de!técnica!bottom]up!de!nanofabricação.!
Aplicando`se!a!tensão!correta!entre!a!ponta!do!microscópio!e!a!superfície,!é!possível!
mover!um!único!átomo!de!uma!posição!para!outra!e!construir!verdadeiros!desenhos!
atômicos,! como! mostra! a! Figura! III4.5.! O! logo! da! IBM! foi! o! primeiro! objeto!
construído!(1989)!com!essa!técnica:!são!átomos!de!xenônio!sobre!uma!superfície!de!
níquel.! A! invenção! do! STM! rendeu! o! prêmio! Nobel! de! Física! de! 1986! aos! seus!
criadores,!Gerd!Binnig!e!Heinrich!Rohrer.!!!!
!
!

! 239!
!
! Figura! III4.5! –! Desenhando! com! átomos.! Exemplos! famosos! de! estruturas! atômicas! construídas!
com!a!técnica!de!STM.!O!logo!da!IBM!feito!em!1989!foi!o!primeiro!exemplo!dessa!capacidade!
!
!
!
!
f. Microscopia% de% Força% Atômica% (AFM)! –! O! Microscópio! de! Força! Atômica! foi!
inventado!em!1992,!anos!depois!da!invenção!do!STM.!Ele!se!baseia!no!fato!de!que,!
quando! dois! objetos! estão! suficientemente! próximos! um! do! outro,! eles! se! atraem!
pela! ação! de! forças,! como! a! de! van! der! Waals,! de! capilaridade,! devidas! a! ligações!
químicas,! eletrostáticas,! de! Casimir,! etc.! Esses! efeitos! são! explorados! entre! uma!
ponta!muito!fina!e!a!superfície!que!se!quer!estudar.!Uma!vantagem!do!AFM!sobre!
outras! formas! de! microscopia! é! que! ele! permite! que! superfícies! sejam! estudadas!
independentemente!de!suas!propriedades!condutoras,!o!que!não!é!o!caso!do!STM.!
Uma!ponta!muito!fina!na!extremidade!de!uma!haste!flexível!é!aproximada!de!uma!
superfície.! Ao! ser! atraída,! a! deflexão! da! haste! é! medida! por! meio! de! um! laser.! A!
amplitude!da!deflexão!é!convertida!em!um!sinal!elétrico,!e!a!imagem!da!superfície,!
reconstruída.!A!Figura!III4.6!mostra!o!esquema!de!um!AFM,!ao!lado!de!imagens!de!
pontas! das! hastes! e! de! superfícies! obtidas! com! o! AFM! (grafeno,! acima;! nanofios!
construídos!por!litografia!de!feixe!de!elétrons,!abaixo).!
%

! 240!
Detector e
eletrônica de
controle

Fotodiodo
Laser

Haste e
Superfície da ponta
amostra
PZT

!
! Figura! III4.6! –! Em! um! AFM,! uma! ponta! muito! fina! na! extremidade! de! uma! haste! flexível! é!
aproximada! da! superfície! de! um! material.! O! deslocamento! da! haste! devido! às! interações! que!
! ocorrem! com! a! superfície! é! detectado! por! meio! de! um! feixe! de! laser.! Ao! deslocar! a! haste! pela!
superfície,!as!deflexões!da!haste!registradas!pelo!laser!são!convertidas!em!imagens!!!!
!
!
!
g. Microscopia% Eletrônica% de% Transmissão% (TEM)% –! O! microscópio! eletrônico! de!
transmissão!funciona!com!o!mesmo!princípio!que!o!microscópio!óptico.!A!diferença!
é!que,!em!vez!de!fótons,!um!feixe!de!elétrons!atravessa!uma!amostra!muito!fina,!e!
produz!uma!imagem.!A!principal!vantagem!do!microscópio!eletrônico!sobre!o!óptico!
está! no! fato! de! que! o! comprimento! de! onda! de! de! Broglie! dos! elétrons! pode! ser!!
muito! menor! do! que! o! comprimento! de! onda! da! luz,! o! que! aumenta! muito! a!
resolução! do! microscópio! eletrônico.! Um! elétron! em! um! TEM! pode! atingir!
velocidades!relativísticas,!e!seu!comprimento!de!onda!é!dado!por:!
%
ℎ (III4.9)!
! =! !
2!! ! 1 + !/2!! ! !
!
Nessa!expressão,!!! !é!a!massa!de!repouso!do!elétron!e!E!a!sua!energia,!esta!última!
tipicamente! na! faixa! de! centenas! de! keV.! A! 100! keV,! por! exemplo,! a! resolução! do!
TEM! chega! a! 10`3! nm.! A! Figura! III4.7! mostra! um! esquema! de! um! TEM,! ao! lado! de!

! 241!
imagens!do!vírus!Ebola!(acima)!e!de!uma!bactéria!circundada!por!vírus,!obtidas!com!
essa!técnica.!!

Filamento

Fonte de
elétrons
Lentes
magnéticas
Feixe de
elétrons
sistema de lentes
eletromagnéticas

porta amostras

Amostra
Lentes de
projeção
Imagem sistema de
imagens

!
!
Figura!III4.7!–!O!funcionamento!de!um!microscópio!eletrônico!de!transmissão!é!semelhante!ao!de!
um!microscópio!óptico.!A!principal!diferença!é!o!uso!de!um!feixe!de!elétrons!em!vez!de!um!feixe!
!
de! luz.! O! controle! sobre! a! energia! dos! elétrons! e,! consequentemente,! sobre! o! comprimento! de!
onda!de!de!Broglie!permite!a!obtenção!de!imagens!na!escala!subnanométrica.!À!direita!da!figura,!
1. !
imagens!do!vírus!do!Ebola!(acima)!e!de!uma!bactéria!infectada!por!vírus!(abaixo)!
! !
!
h. Microscopia%de%Força%Magnética%e%Força%Magnética%Ressonante%(MFM,%MRFM)!–!O!
microscópio!de!força!magnética!é!semelhante!ao!AFM.!A!principal!diferença!é!que,!
enquanto!o!AFM!é!utilizado!para!fazer!imagens!estruturais!de!superfícies,!o!MFM!faz!
imagens! de! estruturas! magnéticas.! Um! pequeno! magneto! permanente! é!
posicionado! na! extremidade! de! uma! haste.! Esse! magneto! produz! um! campo!
magnético! estático! inomogêneo! espacialmente.! A! ponta,! então,! é! aproximada! de!
uma!superfície!contendo!algum!tipo!de!material!magnético.!Suponha!que!seja,!por!
exemplo,! uma! partícula! com! momento! magnético! !,! e! que! o! magneto! da! ponta!
produza!um!gradiente!de!campo!na!direção!Z:!!"/!".!A!força!do!momento!sobre!a!
haste!será:!
!

! 242!
!
!" (III4.10)!
! = ! ±!! !
!"
!
Ou! seja,! se! o! momento! estiver! alinhado! paralelamente! ao! gradiente,! a! haste! é!
repelida;! se! estiver! antiparalelo,! será! atraída.! A! deflexão! da! haste! é! mínima,! mas!
pode! ser! detectada! usando`se! interferometria! óptica.! Podemos! estimar! a!
intensidade! da! força! sobre! um! único! momento! atômico! de! 1! magneton! de! Bohr.!
Suponha!que!a!partícula!na!ponta!da!haste!seja!uma!esfera!de!raio!R!e!magnetização!
M,!apontando!na!direção!Z.!O!seu!momento!magnético!será:!
!
4 (III4.11)!
! = ! !!! !!%
3
%
O!campo!magnético!produzido!por!esse!momento!é!dado!por:!
!
!! 3 ! ∙ ! ! − ! (III4.12)!
! =! !
4! !!
!
onde!u!é!o!unitário!na!direção!de!r.!Tomando!a!componente!Z!do!campo,!podemos!
calcular!o!gradiente:!
!!! !! 2! (III4.13)!
= −3 !
!" 4! ! !
!
Supondo!que!a!força!é!atrativa,!encontra`se:!
!
!! 2 ! (III4.14)!
! = 2!!! ! !!
4! ! !
Substituindo!!
!
!! = 9,27!×!10!!" , ! = 50!Å, !!! ! = 2,2!!! valor!relativo!ao!Fe !e!! = 10!Å!
!
obtém`se! !!~!5,0!×!10!!" !!.! Essa! força! parece! pequena,! mas,! de! fato,! a!
sensibilidade!dos!MFMs!pode!chegar!a!10!!" !.!A!Figura!III4.8!mostra!duas!imagens!

! 243!
de!discos!de!memória!magnética,!um!de!3,2!Gb!e!o!outro!de!30!Gb,!obtidos!com!um!
MFM.!!
!

Disco rígido magnético com 3,2 Gb Disco rígido magnético com 30,0 Gb

5.0 º
20.0 º
0.0 º
0.0 º
10 µm 10 µm
10 µm 10 µm
8 8
8 8
6 6
6 6
4 4
4 4

2 2 2 2

!
! Figura! III4.8! –! ! Exemplos! de! imagens! de! discos! rígidos! de! gravação! magnética! com! duas!
densidades!diferentes,!obtidas!com!MFM!
!
!
!
Uma! variação! importante! da! técnica! de! MFM! é! a! MRFM,! a! Microscopia! de! Força!
Magnética! Ressonante.! Nessa! versão,! um! pequeno! campo! magnético! estático! é!
aplicado!ao!material!com!impurezas!magnéticas.!O!papel!desse!campo!é!estabelecer!
uma! frequência! de! ressonância! que,! no! caso! de! um! spin! ½! eletrônico,! será! !! =
2!! !! /ℏ.!O!valor!do!campo!magnético!é!escolhido!de!forma!que!a!ressonância!do!
spin!seja!igual!à!do!sistema!mecânico!haste!+!ponta!magnética.!!
!
O!passo!seguinte!é!excitar!as!oscilações!do!spin!com!um!campo!oscilante,!por!meio!
de!um!solenoide.!Ao!entrar!em!ressonância!com!o!campo,!o!movimento!do!spin!fará!
com! que! a! haste! oscile! também! em! ressonância,! aumentando! a! amplitude! do! seu!
movimento! e! tornando! o! sistema! mais! sensível.! A! detecção! é! feita! por!
interferometria! óptica.! A! Figura! III4.9! mostra! um! esquema! do! MRFM! e! um! gráfico!
com!a!detecção!de!um!único!momento!magnético!eletrônico11.!!
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
11
!D.!Rugar,!R.!Budaklan,!H.!J.!Manin!e!B.!W.!Chul,!Single%spin%detection%by%magnetic%resonance%force%
microscopy,!Nature,!430!(2004)!329.!

! 244!
!
!

Figura! III4.9! –! Na! variação! ressonante! do! MFM,! o! conjunto! haste! +! ponta! magnética! entra! em!
ressonância! com! o! movimento! de! momentos! magnéticos! que! oscilam! abaixo! da! superfície! do!
material! por! ação! de! um! campo! de! radiofreqüência.! Esse! sistema! aumenta! a! sensibilidade! dos!
espectrômetros!de!ressonância!eletrônica!convencionais!em!mais!de!10!ordens!de!magnitude.!À!
direita,!o!sinal!detectado!de!um!único!spin!eletrônico!
!
!
%
III5.%Metrologia%quântica:%estados%comprimidos%e%estados%NOON%%
Em! física! experimental,! a! avaliação! precisa! dos! erros! de! medidas! é! essencial! para! a!
credibilidade!de!um!novo!resultado!e!o!estabelecimento!de!novos!padrões.!Por!exemplo,!o!
valor! atual! da! constante! de! Planck,! segundo! o! site! do! NIST12! é! ℎ = (6,626!070!040! ±
0, 000!000!081)×10!!" ! Js.! O! erro! associado! ao! valor! de! h! impacta! todas! as! medidas! em!
que! a! constante! de! Planck! aparece! e! pode! ser! decisivo! para! uma! nova! descoberta!
experimental!ou!a!comprovação!de!uma!previsão!teórica!em!laboratório.!!
!
Sabe`se,!!com!base!na!teoria!dos!erros,!que!a!média!das!medidas!de!um!observável!feitas!N!
vezes! de! forma! independente! resulta! em! um! erro! igual! a! 1/ !,! como! o! observado! em!
detectores! de! fótons! que! fazem! contagem! de! partículas! ou! em! outros! equipamentos!
eletrônicos! de! medida.! Esse! tipo! de! “erro! eletrônico”! é! chamado! shot$ noise,! ou! limite!
padrão!e!é!uma!consequência!da!distribuição!gaussiana!de!resultados!de!medidas13.!!Além!
disso,! descobriu`se! que! o! erro! na! medida! de! observáveis! feita! por! meio! de! estados!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
12
!National$Institute$of$Standards$and$Technology:!http://physics.nist.gov/cgi`
bin/cuu/Value?h|search_for=planck!
13
!Esse!resultado!é!válido!para!erros!descorrelacionados.!

! 245!
quânticos! correlacionados! resulta! em! 1/!,! ou! seja,! um! ganho! por! um! fator! 1/ !! em!
relação!ao!erro!obtido!com!estados!independentes.!Por!exemplo,!a!contagem!do!número!de!
fótons! em! um! feixe! de! laser! descorrelacionado! será! ! 1/ !,! mas! se! os! fótons! estiverem!
emaranhados,!o!erro!será!1/!.!Essa!incerteza!na!medida!é!chamada!limite!de!Heisenberg.!
!
O! desenvolvimento! de! técnicas! experimentais! com! controle! quântico! empurrou! os! limites!
da! precisão! de! medidas! para! muitas! casas! decimais! “depois! da! vírgula”.! Essa! busca! pela!
precisão!tem!sido!muito!motivada!pelo!desenvolvimento!das!técnicas!de!nanotecnologia!e!
nanofabricação.! O! conjunto! dos!métodos!que!explora!propriedades!quânticas!de! sistemas!
para!fins!de!medidas!de!alta!precisão!é!conhecido!como!metrologia!quântica.!!
!
A!metrologia!quântica!se!incorpora!naturalmente!à!área!da!tecnologia!quântica!e!já!existem!
iniciativas! em! vários! países! que! visam! ao! estabelecimento! de! padrões! de! medidas!
quânticas,! como! é! o! caso! do! Quantum$ Metrology$ Institute,! no! Reino! Unido,! parte! do!
National$Physical$Laboraty!(NPL),!com!investimentos,!em!2013,!de!£!270!milhões!(cerca!de!
R$!1,37!bilhão!atuais),!só!nesta!área.!!
!
Sabemos! que! o! limite! máximo! para! a! informação! que! pode! ser! obtida! sobre! um! sistema!
quântico!é!dado!pelo!princípio!de!incerteza,!que,!nas!variáveis!de!posição!e!momento,!toma!
a!conhecida!forma:!
ℏ (III5.1)!
∆!∆! ≥ !
2
!
Nessa!expressão,!Δ!!e!Δ!!dependem!da!escolha!do!estado!quântico:!
!
(III5.2)!
Δ! = ! !! − ! ! ; !Δ! = ! ! ! − ! ! !!
!
onde! ! ! = !|! ! |! !etc.!Um!estado!para!o!qual!a!relação!de!incerteza!tem!o!seu!menor!

valor! possível,! ou! seja,! ∆!∆! = !,! é! chamado! estado! comprimido.! Esse! é! o! caso,! por!

! 246!
exemplo,! do! estado! fundamental! do! oscilador! harmônico,! também! chamado! estado! de!
vácuo14:!
!
!" !/!
! /!ℏ
(III5.3)!
!! = ! !!!" !
!ℏ
!
Como!esse!estado!é!simétrico!em!relação!a!! = 0,!teremos! ! = ! ! = 0.!No!entanto:!
!
!!
!" !/!
! /!ℏ ! /!ℏ ℏ (III5.4)!
!! = ! ! !!!" ! ! ! !!!" !" = ! !
!ℏ !! 2!"
!
!" !/! !!
!! !"ℏ (III5.5)!
! !!!" ! /!ℏ ! !!!" ! /!ℏ
! =! ! −ℏ ! !" = ! !
!ℏ !! !" ! 2
Portanto:!
(III5.6)!
!"ℏ ℏ
Δ! = ! !e!Δ! = ! !
2 2!"

Consequentemente:!
ℏ (III5.7)!
Δ!Δ! = !
2
!
O!fato!de!que!esse!limite!de!precisão!vem!sob!a!forma!de!um!produto!é!interessante!para!
metrologia!quântica,!pois!podemos!diminuir!a!incerteza!de!uma!das!variáveis!e!aumentar!a!
da!outra!correspondentemente,!de!modo!que!o!princípio!de!incerteza!não!seja!violado:!
!
!
(III5.8)!
∆!
∆!! → !!∆!!!e!!∆!! → ! !
!
!
Se,! por! exemplo,! ! > 1,! a! incerteza! em! x! é! reduzida,! e! a! incerteza! em! p! aumentada.! Isso!
pode!ser!muito!vantajoso!se!o!objetivo!de!um!experimento!for!medir!variações!de!posição!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
14
!Esse!nome!vem!do!fato!de!que!esse!estado!corresponde!a!n!=!0!na!expressão!das!autoenergias!do!oscilador!
harmônico.!

! 247!
com!precisão!melhor!do!que!o!limite!natural!do!princípio!de!incerteza.!Essa!“compressão”!
na!variável!x!é!obtida!de!um!estado!do!tipo:!
!
!" !/! (III5.9)!
!" ! /!ℏ
!! = ! ! !!! !
!ℏ
o!qual!fornece:!

!"ℏ 1 ℏ (III5.10)!
Δ! = !! !e!Δ! = ! !
2 ! 2!"

!
Em!2013,!a!equipe!do!experimento!LIGO15!para!detecção!de!ondas!gravitacionais!anunciou!
o!uso!de!estados!comprimidos!de!fótons!para!aumentar!a!sensibilidade!dos!detectores16.!A!
detecção! das! ondas! foi! anunciada! em! 201617.! Estados! comprimidos! de! fótons! são!
produzidos!utilizando`se!cristais!com!propriedades!não!lineares.!!
!
Outra! estratégia! de! medida! quântica! faz! uso! de! correlações! de! estados! quânticos.!
Considere,!por!exemplo,!que!um!spin!seja!preparado!no!seguinte!estado:!
!
|↑ + |↓ (III5.11)!
|! = !
2
!
e,!depois,!evolua!livremente!sob!a!ação!de!um!campo!magnético!!! ,!aplicado!ao!longo!da!
direção!Z.!!Após!certo!tempo,!o!estado!será:!
!
!
!

!!"#/ℏ
! !"#/! |↑ + ! !!"#/! |↓ (III5.12)!
! |! = |!(!) = !!!
2

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
15
!Laser%Interferometer%Gravitational_Wave%Observatory;!ver!site!https://www.ligo.caltech.edu/!e!também!J.!
Aasi!et!al.,!Enhanced%sensitivity%of%the%LIGO%gravitational%wave%detector%by%using%squeezed%states%of%light,!
Nature$Photonics|Letter,!7!(2013)!613.!
16
!http://www.nature.com/nphoton/journal/v7/n8/abs/nphoton.2013.177.html!
17
!http://journals.aps.org/prl/abstract/10.1103/PhysRevLett.116.061102!
!

! 248!
!"#/!
|↑ + ! !!"# |↓
|!(!) = ! !
2
!
Como!o!fator!de!fase!global!não!é!observável,!ele!pode!ser!descartado.!!A!probabilidade!de!
que!o!estado!no!instante!t!seja!igual!ao!estado!inicial!é:!!
!
! !
!! !(!) ≡ !(!) = !"# ! !
! (III5.13)!
!
onde! ! = !".! Segundo! a! teoria! dos! erros,! o! erro! na! quantidade! !! avaliada! a! partir! de!
(III5.13)!é:!
∆!(!) (III5.14)!
∆! = !
!"(!)/!"
!
!
onde! ∆! = ! − !! .! Usando! a! expressão! (III5.13),! substituindo! em! (III5.14),! obtemos!
∆! = 1.! Essa! é! a! dispersão! que! se! obtém! em! uma! única! medida! de! !.! Em! N! medidas!
independentes,!a!dispersão!será:!∆! = 1/ !.!
!
Suponha!agora!que!se!queira!fazer!a!mesma!medida,!mas!em!um!estado!inicial!emaranhado!
de!N!spins:!
|↑↑↑ ⋯ ↑ + |↓↓↓ ⋯ ↓ (III5.15)!
|! = !
2
!
Suponha! ainda! que! todos! os! spins! tenham! a! mesma! frequência! no! campo! magnético.! O!
hamiltoniano!será:!
!
(III5.16)!
!= ℏ!!!! !
!!!

!
Após!um!tempo!t,!o!estado!se!torna:!
!
!
!
!

! 249!
!
|↑↑↑ ⋯ ↑ + ! !!"#$ |↓↓↓ ⋯ ↓ (III5.17)!
|! = !
2
!
!" !"# !" !"# !"
Para! esse! estado,! ! ! = !"! ! !
, Δ! = !
, !"/!" = ! !
,! o! que! resulta!

em!Δ! = 1/!.!Ou!seja,!o!uso!de!um!estado!emaranhado!resulta!em!um!ganho!de!um!fator!
extra!de!1/ !!sobre!o!estado!não!emaranhado.!!!
!
No! entanto,! a! criação! e! manutenção! de! estados! emaranhados! de! N! spins! –! ou,! mais!
genericamente,! N! q`bits,! como! se! verá! adiante! –! não! é! tarefa! fácil.! Alternativamente!
descobriu`se!que!se!utilizarmos!N!spins!em!um!estado!degenerado!(ou!seja,!com!a!mesma!
frequência)! emaranhados! com! um! outro! spin! único,! obtém`se! o! mesmo! resultado.! Tal!
sistema!ocorre,!por!exemplo,!na!molécula!Si(CH3)4,!esquematicamente!mostrada!na!Figura!
III5.1.!

H
H H

Si

Figura! III5.1! –! A! molécula! do! Tetrametilsilano,! Si(CH3)4,! é! utilizada! em! experimentos! de!
ressonância! magnética! nuclear! (discutido! adiante)! para! a! preparação! dos! chamados! estados!
NOON!aplicados!em!metrologia!quântica.!Os!spins!empregados!nesse!tipo!de!experimento!são!o!
29 1
do!núcleo!de! Si,!que!fica!no!centro!da!molécula,!e!os!dos!doze! H,!que!o!circundam,!ambos!igual!
a!1/2!!!
!
!
A!molécula!é!composta!por!um!átomo!de!silício,!no!centro,!ligado!a!quatro!grupos!químicos!
idênticos,!cada!um!desses!com!três!átomos!de!hidrogênio,!totalizando,!portanto,!12!átomos!
de! hidrogênio.! Tanto! o! núcleo! do! 29Si! (abundância! isotópica! de! aproximadamente! 4,7%)!

! 250!
quanto! o! núcleo! do! 1H! têm! spin! 1/2.! ! Quando! essa! molécula! é! submetida! a! um! campo!
magnético!estático,!a!energia!de!interação!entre!o!momento!magnético!do! 29Si!e!o!campo!
será! diferente! daquela! dos! spins! do! 1H! e,! consequentemente,! as! suas! frequências!
características! também! serão! diferentes.! Nesse! sistema,! é! possível! criar! um! estado!
emaranhado!entre!os!13!spins!dos!hidrogênios!e!o!spin!do!silício:!
!
|↓ 13↑ + ! !!!"!" |↑ 13↓ (III5.18)!
|! = !
2
!
Se! uma! medida! do! campo! magnético,! feita! a! partir! da! medida! da! fase! desse! estado! for!
realizada,!o!erro!na!medida!será!1/13!daquele!que!seria!em!uma!medida!sem!correlação18.!!
O!estado!acima!é!um!exemplo!do!que!se!chama!NOON$state,!representados!genericamente!
por:!
|!0 + ! !!"# |0! (III5.19)!
|! = !
2
!
Neste! estado,! N$ +! 1! objetos! quânticos! de! dois! níveis! (spins,! fótons,! átomos! etc.),!
genericamente! chamados! q`bits,! estão! em! um! estado! emaranhado.! Uma! medida! da! fase!
desse!estado!resulta!em!uma!dispersão!igual!a!1/N,!ou!seja,!alcança!o!limite!de!Heisenberg.!!!!
!
!

III6.% Sensores% quânticos:% centros% de% vacâncias% e% nitrogênio% em%


cristais%de%diamante%e%sensores%atômicos%%
Uma!das!tecnologias!mais!promissoras!que!surgiram!nos!últimos!anos!na!área!de!metrologia!
quântica! são! os! chamados! centros! de! vacância! e! nitrogênio! em! cristais! de! diamante19,! ou!
simplesmente! centros! NV.! Essas! estruturas! são! sensores! naturais! de! altíssima! precisão,!
capazes!de!realizar!medidas!de!variações!ínfimas!de!campo!magnético!e!temperatura.!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
18
!Esse!experimento!foi!de!fato!realizado!por!Simmons!e!colaboradores:!Magnetic%field%sensors%using%13_spin%
cat%states,!Phys.$Rev.$A!82,!022330!(2010).!
19
!Em!inglês,!NV]Centers.!!

! 251!
Cristais! de! diamantes! são! formados! por! átomos! de! carbono,! como! mostrado! na! Figura!
III6.1(a).!Sob!determinadas!condições,!um!átomo!de!nitrogênio!substitui!um!dos!átomos!de!
carbono! da! estrutura! e,! para! que! o! novo! arranjo! seja! energeticamente! estável,! um! outro!
átomo!de!carbono!é!expelido!de!sua!posição,!deixando!uma!vacância,!como!mostra!a!Figura!
III6.1(b).!!
!
Esta!estrutura,!formada!entre!o!nitrogênio!(N)!e!a!vacância!(V),!é!o!que!se!chama,!em!inglês,!
NV]Center.!Quanto!à!carga!elétrica,!o!complexo!NV!pode!ser!neutro,!representado!por!NV0;!
ou! negativo,! representado! por! NV`.! ! A! estrutura! neutra! tem! um! único! elétron!
desemparelhado!e!possui!spin!! = 1/2.!!
!
Para! fins! de! aplicações! como! sensores! ou! processadores! quânticos,! a! estrutura! negativa,!
com! dois! elétrons! e! spin! total! ! = 1,! é! a! melhor.! Sob! a! ação! de! um! campo! magnético!
somada! à! interação! entre! os! spins! dos! elétrons! e! o! spin! do! núcleo! do! nitrogênio! (14N),! os!
estados! eletrônicos! se! desdobram! em! várias! transições! possíveis,! como! mostra! a! Figura!
III6.2(c).! O! hamiltoniano! completo! é! dado! por! três! termos! de! interação:! um! puramente!
eletrônico,!um!puramente!nuclear!e!um!termo!de!interação!elétron`núcleo:!
!
ℋ = ℋ! + ℋ! + ℋ!" , onde!
ℋ! = !!!! + ! !!! − !!! + !! !! ! ∙ !%
ℋ! = !!!! − !! !! ! ∙ !!
(III6.1)!
ℋ!" = !∥ !! !! + !! !! !! + !! !! !
!
Os! dois! primeiros! termos! de! ℋ! ! descrevem! as! interações! entre! os! spins! eletrônicos! e! as!
cargas!do!cristal20;!!o!segundo,!a!interação!com!o!campo!magnético.!O!primeiro!termo!de!
ℋ! !é!a!interação!entre!as!cargas!do!núcleo!de!14N!e!o!cristal;!o!segundo,!a!interação!entre!o!
momento! magnético! e! o! campo! magnético.! O! terceiro! hamiltoniano! pressupõe! uma!
interação!anisotrópica!entre!os!spins!eletrônico!e!o!nuclear.!Os!parâmetros!multiplicativos!
são!obtidos!experimentalmente,!como!mostrado!na!tabela!a!seguir:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
20
!Conhecido!como!interação!com!o!campo!cristalino.!

! 252!
!
Parâmetro! Nome! Valor!
D$ Interação!axial!de!campo!cristalino! 2,87!GHz!
E$ Interação!transversal!de!campo!cristalino! kHz`MHz!!
P$ Interação!quadrupolar!elétrica!nuclear! `4,95!MHz!
!! ! Fator`g!eletrônico!de!spin! 2,003!
!! ! Fator`g!nuclear!de!spin! 0,403!
!∥ ! Interação!axial!hiperfina! `2,16!MHz!
!! ! Interação!transversal!hiperfina! `2,7!MHz!

!
A! propriedade! física! importante! dos! centros! de! vacância! NV! para! fins! de! informação!
quântica! é! a! fluorescência.! Essa! é! a! propriedade! do! cristal! de! emitir! luz! visível! após! o!
sistema!ser!excitado!por!um!laser!de!luz!visível!–!em!geral,!verde.!A!Figura!III6.1(c)!mostra!as!
transições!possíveis!estre!os!estados!|!! = ±1 !e!|!! = 0 !dos!spins!eletrônicos,!que,!por!
sua! vez,! podem! ocorrer! para! os! estados! nucleares! ! |!! = ±1 ! e! |!! = 0 ,! com! ligeiro!
deslocamento!em!frequência,!como!se!vê!na!figura.!!
!
A! fluorescência! depende! do! estado! de! spin! e,! utilizando`se! a! técnica! de! ressonância!
magnética!(ver!Seção!III8!adiante),!as!populações!dos!níveis!com!diferentes!valores!de!spin!
podem! ser! manipuladas,! mudando! a! fluorescência! do! cristal21.! Portanto,! as! interações!
magnéticas! dos! spins! eletrônicos! e! nucleares! com! campos! externos! ou! locais! podem! ser!
detectadas!como!variações!na!fluorescência,!como!é!mostrado!na!Figura!III6.1(d).!!
!
O!que!torna!a!técnica!sensível!é!o!fato!de!que!a!fluorescência!pode!ser!detectada!no!regime!
quântico! de! fóton! a! fóton,! utilizando`se! microscopia! confocal22.! Com! isso,! o! sinal! de! um!
único!spin,!eletrônico!ou!nuclear,!pode!ser!detectado23.!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
21
!S.!J.!DeVience!e!coautores,!Nanoscale%NMR%spectroscopy%and%imaging%of%multiple%nuclear%species,!Nature$
Nanotechnology!10!(2015)!129.!Ver!também:!M.!V.!Gurudev!Dutt,!L.!Childress,!L.!Jiang,!E.!Togan,!J.!Maze,!F.!
Jelekzo,!A.!S.!Zibrov,!P.!R.!Hemmer!e!M.!D.!Lukin,!Quantum%register%based%on%individual%electronic%and%
nuclear%spin%qubits%in%diamond,!Science!316!(2007)!1312;!e!L.!Childress,!M.!V.!Gurudev!Dutt,!J.!M.!Taylor,!A.!S.!
Zibrov,!F.!Jelezko,!J.!Wrachtrup,!P.!R.!Hemmer!e!M.!D.!Lukin,!Coherent%dynamics%of%coupled%electron%and%
nuclear%spin%qubits%in%diamond,!Science!314!(2006)!281.!
22
!O!microscópio!confocal!utiliza!lasers!para!fazer!a!iluminação!pontual!de!objetos!e!produzir!imagens!de!
partes!de!uma!amostra.!
23
!Veja,!por!exemplo,!A.!O.!Sushkov!e!co`autores,!em!Magnetic%resonance%detection%of%individual%próton%
spins%using%quantum%reporters,!Phys.$Rev.$Lett.!113!(2014)!197601.!

! 253!
(a) (b)

Variação percentual da fluorescência


ms=+1 P-AB m1=0
0
m1=-1
2AB
ms=±1 -0.1
2gs μB Bz m1=+1

P-AB
m1=0 -0.2
ms=-1 m1=+1
2AB -0.3
D m1=-1
-0.4

ms=0 m1=0 -0.5


P
Zeeman m1=±1 2.80 2.85 2.90 2.95
hiperfina 14N Frequência (GHz)

(c) (d)
!
Figura! III6.1! –! Em! (a)! e! (b),! centros! NV! são! estruturas! que! se! formam! em! cristais! de! diamante! pela!
substituição!de!um!átomo!de!carbono!por!um!de!nitrogênio.!Um!par!de!elétrons!aprisionados!no!centro!VN!
confere!ao!sistema!propriedades!óticas!únicas!para!o!seu!uso!como!nanosensores!de!campo!magnético!ou!
temperatura! (ver! texto).! Em! (c)! as! transições! possíveis! entre! os! estados! eletrônicos.! Em! (d),! as! diversas!
transições!mostrando!a!variação!da!fluorescência!em!função!da!frequência!de!micro`ondas!de!um!campo!
oscilante!aplicado!

!
Em! 2010,! foi! descoberto! por! V.! M.! Acosta! e! colaboradores24! que! o! parâmetro! D! no!
hamiltoniano! ℋ! ! de! (III6.1)! de! um! centro! de! vacância! depende! significativamente! da!
temperatura,! o! que,! imediatamente,! transforma! esses! sistemas! em! nanotermômetros.!
Inúmeras! aplicações! têm! aparecido! desde! então! nessa! área25.! Além! das! aplicações! em!
metrologia!quântica,!os!centros!de!vacância!em!diamante!são!candidatos!promissores!para!
processadores!quânticos!que!podem!funcionar!à!temperatura!ambiente.!!
!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
24
!V.!M.!Acosta,!E.!Bauch,!M.!P.!Ledbetter,!A.!Waxman,!L.`S.!Buchard!e!D.!Budker,!Temperature%Dependence%of%
the%Nitrogen_Vacancy%Magnetic%Resonance%in%Diamond,!Phys.$Rev.$Lett.,!104!(2010)!070801.!
25
!Veja!por!exemplo,!P.!Neumann!e!co`autores,!High_Precision%Nanoscale%Temperature%Sensing%Using%Single%
Defects%in%Diamond,!Nano$Letters,!13!(2013)!2738,!e!G.!Kucsko!e!co`autores,!Nanometer_scale%thermometry%
in%a%living%cell,!Nature|Letter!500!(2013)!54.!Para!uma!excelente!revisão!sobre!centros!NV!veja!D.!Suter!e!F.!
Jelezko,!Single_spin%magnetic%resonance%in%nitrogen_vacancy%center%of%diamond,!Prog.$Nuc.$Mag.$Res.$Spectr.!
98`99!(2017)!50.!

! 254!
Sensores%atômicos%
%
Ondas!de!matéria,!da!mesma!forma!que!ondas!eletromagnéticas,!podem!ser!utilizadas!em!
experimentos! de! interferometria.! Por! terem! massa,! as! partículas! em! tais! interferômetros!
interagem! com! o! campo! gravitacional! e,! naturalmente,! se! tornam! gravímetros! de! alta!
precisão.!!
!
Para! serem! utilizados! em! um! interferômetro,! átomos! neutros! devem! ser! resfriados! a!
temperaturas!da!ordem!de!nanokelvin.!Um!átomo!em!um!gás!a!temperatura!ambiente!tem!
velocidade! da! ordem! de! 1000! m/s! e! comprimento! de! onda! de! de! Broglie! da! ordem! do!
nanômetro.! A! 1! µK! o! comprimento! de! onda! já! é! da! ordem! de! 1! µm.! As! técnicas! de!
resfriamento! atômico! começaram! na! década! de! 1990! e! já! em! 1991! o! primeiro!
interferômetro!atômico!foi!demonstrado26.!!
%
A! Figura! I22.2! (Bloco! I)! mostra! o! esquema! de! um! interferômetro! de! Mach`Zehnder! para!
fótons.! As! únicas! operações! ! realizadas! são! as! divisões! do! feixe! por! espelhos! semi`
transparentes,! mudanças! na! sua! direção! por! espelhos! totalmente! refletores,! e! o!
deslocamento!de!fase!antes!da!recombinação!dos!caminhos.!No!caso!de!um!interferômetro!
atômico,!os!espelhos!são!substituídos!por!pulsos!de!laser!que!mudam!o!estado!quântico!dos!
átomos.!O!fato!importante!é!que,!com!a!sintonia!adequada,!o!laser!modifica!tanto!o!estado!
interno! do! átomo! –! produzindo! transições! entre! seus! níveis! de! energia! –,! quanto! seu!
momento!linear.!!!Se!um!átomo!de!dois!níveis!se!encontra!no!estado!inicial!|1, ! ,!onde!“1”!
se! refere! ao! estado! fundamental! e! “2”! ao! estado! excitado,! após! um! pulso! de! laser! de!
duração!τ o!estado!final!será27:!!
!
Ω! Ω!
|! ! = !"# |1, ! + ! !!"/! ! !!! !"# |2, ! + ℏ! !" !
2 2
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
26
!Veja:!W.D.!Phillips!and!H.J.!Metcalf,!Cooling%and%Trapping%Atoms,!Sci.$Am.!(1987)!50.!
27
!Veja!M.!de!Angelis!et!al.,!Precision%gravimetry%with%atomic%sensors,!Meas.$Sci.$Technol.!20!(2009)!022001.!

! 255!
onde! Ω! é! a! frequência! de! rotação! do! estado! quântico! associada! à! amplitude! do! laser,! !! !
uma! fase! produzida! pela! interação! com! o! laser! e! ℏ! !" ! o! momento! transferido! para! o!
átomo.!!
!
Da!expressão!acima!nota`se!que!se!Ω!/2!for!igual!a!!/2,!o!estado!inicial!é!desdobrado!em!!
uma! superposição! de! dois! estados,! ou! trajetórias,! tal! como! ocorre! com! um! fóton! em! um!
interferômetro! de! Mach`Zehnder.! Dessa! forma,! com! sequências! de! pulsos! de! laser! com!
rotações!de!!/2!e!!!as!operações!realizadas!em!um!interferômetro!são!implementadas.!Na!
presença!de!um!campo!gravitacional!haverá!um!deslocamento!de!fase!para!cada!uma!das!
componentes,! que! pode! ser! medido! ao! se! recombinar! os! dois! caminhos.! Essa! diferença! é!
dada!por!(ver!Ref.!No!pé!de!página!27):!
!
Δ!! = −!!" !! ! !
!
onde!!!é!a!aceleração!da!gravidade!e!T!é!o!período!de!aplicação!dos!pulsos!de!laser.!Com!
esta! técnica,! medidas! do! campo! gravitacional! com! precisão! Δ!/!!da! ordem! de! 10!! −
10!!" ! têm! sido! obtidas.! Uma! das! aplicações! mais! interessantes! desse! tipo! de! sensor! é! a!
detecção!de!jazidas!de!óleo!e!minério!no!subsolo,!a!partir!de!medidas!de!variação!do!campo!
gravitacional!produzido!pela!massa!do!reservatório.!!

%
%
III7.% Processamento% da% Informação% Quântica.% Chaves% lógicas,%
circuitos%e%teleporte%quântico%
!
O! processamento! da! informação! quântica! consiste! na! utilização! de! fenômenos! quânticos!
para!fins!de!realização!tanto!de!tarefas!de!computação!(execução!de!algoritmos!quânticos)!
quanto!de!comunicação,!como!a!distribuição!de!chaves!criptográficas!de!forma!segura.!!
!
Na! seção! anterior,! vimos! como! fenômenos! quânticos! podem! ser! utilizados! para! fins! de!
medição!com!a!mínima!dispersão!possível.!O!interesse!pela!descoberta!e!implementação!de!
algoritmos!quânticos!foi!impulsionado!a!partir!de!1997,!após!a!publicação!do!agora!famoso!

! 256!
algoritmo! de! fatoração! de! Shor28,! que! teve! impacto! significativo! na! questão! da! segurança!
em!redes!de!comunicação.!!
!
Em!termos!genéricos,!as!condições!para!a!implementação!do!processamento!da!informação!
quântica!são:!
1. Uma!representação!adequada!para!a!unidade!de!informação!quântica,!o!q`bit;!
2. Os!meios!experimentais!para!a!preparação!de!um!estado!inicial!reprodutível;!
3. Os! meios! experimentais! para! a! implementação! de! transformações! unitárias!
necessárias!em!protocolos!quânticos!de!computação!e!comunicação;!
4. Capacidade!para!a!caracterização!completa!do!estado!final.!
!
Exemplos! de! objetos! físicos! que! representam! q`bits:! ! fótons,! átomos! aprisionados,!
dispositivos! supercondutores,! elétrons! em! pontos! quânticos,! spin! eletrônico! e! nuclear,!
dentre! outros.! Esses! são! os! q`bits! naturais! mais! importantes.! Ao! final! deste! capítulo!
estudaremos!um!q`bit!“artificial”!construído!por!meio!de!circuitos!eletrônicos!com!junções!
Josephson.!!
!
Poderíamos!adicionar!como!demanda!na!lista!acima,!por!exemplo,!o!item!escalonamento.!
Esse! termo! se! refere! à! capacidade! de! aumento! do! número! de! q`bits! no! sistema.! Essa!
questão! está! longe! de! ser! trivial! e,! até! agora,! nenhuma! técnica! experimental! foi! capaz! de!
chegar! sequer! perto! do! desejado! para! a! solução! real! de! problemas! importantes:! algumas!
centenas!de!q`bits.!!
!
Até! o! momento,! as! pesquisas! experimentais! nessa! área! têm! se! concentrado! em!
demonstrações! de! execução! de! protocolos! quânticos! em! sistemas! com! um! número!
reduzido! de! q`bits,! bem! como! na! criação! de! novas! áreas! de! investigação,! a! chamada!
termodinâmica!quântica.!!No!entanto,!cabe!enfatizar!que!já!existem!no!mercado!produtos!
decorrentes! da! pesquisa! em! processamento! da! informação! quântica29.! No! entanto,! um!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
28
!P.!Shor,!Polynomial_time%algorithms%for%prime%factorization%and%discrete%logarithms%on%a%quantum%
computer,!SIAM$J.$Sci.$Statist.$Comput.!26!(1997)!1484.!
29
!Em!2016,!pelo!menos!duas!empresas!já!comercializavam!sistemas!de!distribuição!de!chaves!criptográficas!
utilizando!dispositivos!que!criam!estados!quânticos!coerentes!de!fótons:!a!Americana!Magic$Q$Technologies$
(http://www.magiqtech.com/Home.html)!e!a!suiça!ID$Quantique!(http://www.idquantique.com/).!Há!ainda!a!

! 257!
computador! quântico! contendo! centenas! de! q`bits! cujos! estados! quânticos! possam! ser!
plenamente!controlados!para!a!execução!de!algoritmos!quânticos,!ainda!não!existe,!apesar!
dos!promissores!resultados!alcançados!com!os!circuitos!supercondutores.!!
!
Historicamente,! os! autores! identificam! as! primeiras! ideias! que! levaram! ao! surgimento! da!
área!em!meados!da!década!de!1980!com!o!trabalho!de!Rolf!Landauer,!que,!cerca!de!20!anos!
antes,! era! funcionário! da! IBM! e! estudava! termodinâmica! de! processos! computacionais.!
Landauer! mostrou! que! processos! computacionais! irreversíveis! –! ou! seja,! aqueles! que!
apagam!informação!–!!gastam!energia!e!aumentam!a!entropia30.!Em!particular,!ele!calculou!
que!a!energia!gasta!para!apagar!um!bit!de!informação!é!igual!a!!! !log2!e!que!ese!processo!
resulta!em!um!aumento!de!entropia!igual!a!!!! log2.!
!
Treze! anos! depois! do! trabalho! de! Landauer,! outro! cientista! da! IBM,! Charles! Bennett,!
concluiu! que,! ao! menos! em! teoria,! é! possível! construir! um! modelo! de! computação!
inteiramente! reversível,! ou! seja,! sem! operações! que! apaguem! a! informação31.! Nessas!
condições,!o!processo!computacional!não!aumenta!a!entropia!e!é!realizado!a!custo!zero!de!
energia!!!
!
Foi!Paul!Benioff!quem,!em!1982,!identificou!as!operações!lógicas!reversíveis!do!trabalho!de!
Bennett! com! as! transformações! unitárias! da! mecânica! quântica32.! Nesse! trabalho,! Benioff!
demonstra! o! equivalente! quântico! de! uma! máquina! de! Turing! universal33.! Estava!
fundamentada!uma!nova!área!de!pesquisa!em!Física:!a!Computação!Quântica.!!
!
O! conceito! mais! básico! em! informação! quântica! e! computação! quântica! é! o! da! própria!
unidade! de! informação! quântica,! o! q`bit:! trata`se! de! qualquer! sistema! quântico! de! dois!
níveis:! um! spin! ½! em! um! campo! magnético;! o! estado! fundamental! e! o! primeiro! estado!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
canadense!D]Wave,!que!comercializa!um!tipo!especial!de!computador!quântico,!baseado!na!chamada!
computação!quântica!adiabática!(http://www.dwavesys.com/).!
30
!R.!Landauer,!Irreversibility%and%Heat%Generation%in%the%Computing%Process,!IBM$Journal!(July,!1961)!183.!
31
!C.!H.!Bennett,!Logical%Reversibility%of%Computation,!IBM$Journal$of$Research$and$Development!17!(1973)!
525.!
32
!P.!Benioff,!Quantum%Mechanical%Models%of%Turing%Machines%that%Dissipate%no%Energy,!Phys.$Rev.$Lett.,!48!
(1982)!1581.!
33
!Uma!máquina!de!Turing!universal!é!um!modelo!teórico!de!computação!que!pode!resolver!problemas!
matemáticos!realizando!operações!simples!sobre!bits!clássicos.!!

! 258!
excitado!de!um!átomo;!as!duas!direções!de!polarização!do!fóton!(vertical!e!horizontal),!etc.!
O!autoestado!de!energia!mais!baixa!é!rotulado!como!|0 !e!o!de!energia!mais!alta!como!|1 ,!
como!mostrado!na!Figura!III7.1!para!o!caso!de!um!spin!½!em!um!campo!magnético!B0.!
!

!
Figura!III7.1!–!Os!dois!estados!de!um!spin!½!em!um!campo!magnético!estático!representam!um!
bit!de!informação!quântica!(q]bit).!!Na!linguagem!computacional!os!autoestados!de!spin!|↑ !e!|↓ !
são!substituídos!pelos!“autoestados!lógicos”,!|0 !e!|1 ,!respectivamente!
!
!
A! vantagem! dessa! notação! é! que! não! precisamos! fazer! menção! a! nenhum! sistema! físico!
específico,!pois!o!que!vale!para!um!q`bit!vale!para!todos.!De!fato,!muito!mais!do!que!uma!
conveniência! de! notação,! isso! cria! uma! linguagem! comum! que! permite! aos! físicos,!
engenheiros,! matemáticos! e! químicos,! trabalhando! em! informação! quântica! –! porém! em!
áreas!diferentes,!como!ótica!quântica,!armadilhas!atômicas,!ressonância!magnética!nuclear,!
etc.!–!interagir!entre!si.!!
!
Vamos!reproduzir!aqui,!por!comodidade,!uma!parte!da!seção!II1,!mas,!agora,!com!a!notação!
de!q`bits.!O!estado!quântico!mais!geral!de!um!q`bit!é!a!superposição:!
!
! = !! 0 + !|1 ! (III7.1)!

!
! !
onde! ! + ! = 1.! Essa! relação! é! a! mesma! que! é! satisfeita! pelas! funções!
trigonométricas! seno! e! cosseno,! bem! como! por! exponenciais! complexas.! Por! essa! razão,!
podemos! re`escrever! o! estado! (III7.1)! mapeando! as! amplitudes! de! probabilidades! em!
ângulos!!!e!!:!
!
(III7.2)!

! 259!
! !
|! = cos |0 + ! !" sen |1 !
2 2
!
Essa! notação! tem! a! vantagem! de! fornecer! um! quadro! geométrico! para! todos! os! estados!
quânticos!de!um!q`bit:!a!esfera!de!Bloch.!Trata`se!de!uma!esfera!de!raio!unitário!na!qual!o!
polo! norte,! ! = 0,! representa! o! autoestado! |0 ,! e! o! polo! sul,! ! = !,! o! autoestado! |1 .! O!
ponto!no!equador!da!esfera,!sobre!o!eixo!X,!é!a!superposição!
!
|0 + |1 (III7.3)!
|! = ,!
2
e!sobre!o!eixo!Y!é!o!estado:!
|0 + !|1 (III7.4)!
|! = !
2
!
E!assim!por!diante.!A!Figura!III7.2!mostra!a!esfera!de!Bloch!com!pontos!especiais.!!
!

!
! Figura! III7.2! –! A! esfera! de! Bloch! representa! o! espaço! de! Hilbert! de! um! spin! 1/2.! Nessa!
representação! geométrica,! qualquer! estado! pode! ser! mapeado! em! apenas! dois! ângulos.! Os!
!
autoestados!da!base!são!representados!nos!dois!polos!da!esfera!
! !
!
Definida! a! unidade! de! informação! quântica,! precisamos! definir! as! operações! lógicas! que!
irão! atuar! sobre! ela.! Em! computação! clássica,! as! operações! lógicas! são! representadas! por!
símbolos!chamados!de!chaves!lógicas.!Um!conjunto!de!chaves!lógicas!(clássicas)!a!partir!das!
quais! qualquer! outra! operação! lógica! pode! ser! construída! é! o! conjunto! E,! OU! e! NÃO,!
representados!na!Figura!III7.3.!!

! 260!
!

E OU NÃO
!

Figura! III7.3! –! Exemplo! de! um! conjunto! de! chaves! lógicas! universais! da! álgebra! booleana.!
Qualquer! operação! computacional! pode! ser! realizada! por! meio! de! combinações! adequadas!
dessas! três! chaves,! em! circuitos! lógicos! complexos.! As! chaves! E! e! OU! recebem! dois! bits! na!
entrada,! mas! retornam! apenas! um! na! saída.! Elas! apagam! informação,! o! que,! do! ponto! de! vista!
termodinâmico,!significa!irreversibilidade.!
!
!
!
!
!
Note!que!a!chave!NÃO!tem!apenas!uma!entrada!(linha!do!lado!esquerdo)!e!uma!saída!(linha!
do!lado!direito).!Diferentemente!desta,!as!chaves!E!e!OU!possuem!duas!entradas!e!apenas!
uma! saída.! Isso! significa! que! as! operações! de! E! e! OU! apagam! informação! (dois! bits! na!
entrada,!e!apenas!um!na!saída),!o!que!tornam!as!suas!ações!irreversíveis.!A!chave!NÃO,!por!
sua!vez,!é!reversível.!!
!
Essas! chaves! são! símbolos! da! chamada! lógica! booleana34.! Elas! são! utilizadas! para! a!
construção!de!circuitos!lógicos!para!implementar!algoritmos!computacionais.!Para!que!isso!
seja! feito! na! prática,! é! preciso! que! estas! chaves! sejam! representadas! por! objetos! físicos!
reais.!Nos!computadores,!são!os!circuitos!eletrônicos!que!representam!essas!chaves,!como!
mostrado!no!exemplo!da!Figura!III7.4!para!a!porta!chamada!NÃO`E!(NAND,!em!inglês).!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
34
!Devida!a!George!Boole!(1815`1864),!educador,!matemático!e!filósofo!inglês.!!

! 261!
+5V

R1 R2

X
Z
X Z
Y

Q1

Figura! III7.4! –! ! Nos! computadores,! as! chaves! lógicas! booleanas! são! representadas! por! circuitos!
eletrônicos.!Esquema!que!realiza!eletronicamente!as!operações!lógicas!da!chave!NÃO`E!(NAND),!
cujo! símbolo! é! mostrado! do! lado! direito.! Essa! chave,! sozinha,! forma! um! conjunto! universal,! no!
sentido!de!que!qualquer!operação!lógica!pode!ser!realizada!por!meio!de!combinações!dela!!
!
!
Em! resumo,! com! elementos! de! circuitos! eletrônicos,! podem`se! construir! dispositivos!
lógicos,! que,! por! sua! vez,! podem! ser! combinados! para! se! construirem! circuitos! lógicos!
complexos!voltados!à!solução!de!problemas.!!
!
No! caso! quântico,! a! situação! é! análoga.! Por! meio! de! transformações! unitárias,! pode`se!
construir!um!conjunto!de!portas!lógicas!quânticas!elementares.!São!elas:!as!portas!X,!Y!e!Z,!
que!nada!mais!são!do!que!as!matrizes!de!Pauli:!
!
0 1 0 −! 1 0 (III7.5)!
!= ; !! = ; !!! = !!
1 0 ! 0 0 −1
!
!A!atuação!de!cada!uma!dessas!portas!em!um!estado!genérico!de!um!q`bit,!Eq.!(III7.1)!!é:!
!
! ! = ! 1 + ! 0 ; !!! ! = !" 1 − !" 0 ; !! ! = ! 0 − !|1 !!! (III7.6)!
!
Outras! duas! chaves! importantes! que! atuam! sobre! o! estado! de! um! q`bit! são! a! porta! de!
Hadamard,!H,!e!a!porta!de!fase,!S:!
!
1 1 1 1 0 (III7.7)!
!= ; !! = !
2 1 −1 0 !
!

! 262!
A!atuação!dessas!duas!portas!sobre!estados!de!um!q`bit!resulta!em:!
!
|0 + |1 |0 − |1
!|0 = , !|1 = !
2 2
!|0 = |0 , !|1 = !|1 !
!
Essas!portas!são!as!únicas!necessárias!para!se!implementar!qualquer!transformação!unitária!
do!estado!de!um!q`bit.!No!entanto,!para!se!realizar!computação!quântica!sobre!um!sistema!
com!muitos!q`bits,!é!preciso!introduzir!uma!porta!que!atue!sobre!estados!de!dois!q`bits.!Tal!
porta!é!chamada!NÃO`CONTROLADO!(CNOT).!!
!
A!porta!CNOT!inverte!o!estado!de!um!dos!q`bits!–!ou!seja,!atua!como!um!NOT!–,!chamado!
de!q]bit$alvo,!se!o!estado!do!outro!q`bit!for!igual!a!1.!Este!segundo!é!chamado!de!q`bit!de!
controle.!!
!
A!matriz!que!representa!a!porta!CNOT!com!controle!no!primeiro!q`bit!pode!ser!facilmente!
deduzida!a!partir!da!sua!ação!nos!estados!da!base!computacional!de!dois!q`bits:!
!
!"#!! |00 = |00 !
!"#!! |01 = |01 !
!"#!! |10 = |11 !
!"#!! |11 = |10 !
!
(III7.8)!
1 0 0 0
!!!!
!"#!! = 0 1 0 0 !
0 0 0 1
!!!!
0 0 1 0
!
Ou!com!controle!no!segundo!q`bit:!
!
!"#!! |00 = |00 !
!"#!! |01 = |11 !
!"#!! |10 = |10 !
!"#!! |11 = |01 !

! 263!
! (III7.9)!
1 0 0 0
!!!!
!"#!! = 0 0 0 1 !
0 0 1 0
!!!!
0 1 0 0
!
Assim! como! circuitos! lógicos! clássicos,! as! chaves! lógicas! quânticas! podem! ser! combinadas!
para!a!construção!de!circuitos!lógicos!quânticos.!Para!isso,!utiliza`se!a!simbologia!mostrada!
na!Figura!III7.5!para!as!chaves!lógicas!quânticas!elementares.!!
!

Hadamard H
CNOT
Pauli-X X

Pauli-Y Y

Pauli-Z Z

Fase S
!

Figura! III7.5! –! Conjunto! universal! de! chaves! lógicas! quânticas.! Qualquer! transformação! unitária!
sobre!um!estado!quântico!genérico!pode!ser!implementada!por!meio!da! combinação!adequada!
destas! chaves! lógicas.! A! única! operação! que! atua! sobre! o! estado! de! dois! q`bits! é! o! NÃO`
CONTROLADO!(CNOT);!todas!as!outras!são!operações!sobre!estados!de!apenas!um!q`bit!
!
!
Dois!exemplos!de!combinações!de!chaves!lógicas!quânticas!são!mostrados!na!Figura!III7.6.!
O! circuito! da! esquerda! emaranha! dois! q`bits! inicializados! em! um! dos! estados! da! base!
computacional,! enquanto! o! circuito! da! direita! faz! exatamente! o! oposto:! dois! q`bits!
emaranhados!que!entrem!nesse!circuito!são!univocamente!convertidos!em!um!dos!estados!
da!base!computacional.!Esse!segundo!circuito!pode!ser!considerado!um!leitor!de!estados!da!
base!de!Bell!(ver!Sec.!II3).!!
!
!

! 264!
0 H H 0
00 + 11 00 + 11
0 2 2 0
!

Figura!III7.6!–!Exemplos!de!circuitos!quânticos.!O!da!esquerda!cria!estados!emaranhados!da!base!
de!Bell!a!partir!de!estados!da!base!computacional.!O!da!direita!faz!a!operação!inversa!e!pode!ser!
visto!como!um!leitor!de!estados!emaranhados!

!
Outro!exemplo!interessante!de!circuito!quântico!envolvendo!apenas!chaves!de!Hadamard!e!
CNOT!e!contendo!três!q`bits!é!o!mostrado!na!Figura!III7.7.!!!
!

ψ a 0 +b 1 H φ

0 H φ

0 H H ψ
!

Figura! III7.7! –! Circuito! quântico! para! a! realização! do! teleporte.! Ao! final! do! circuito,! o! estado!
genérico! (desconhecido)! do! q`bit! de! cima! é! teleportado! para! o! q`bit! debaixo,! ficando! os! outros!
dois!em!um!mesmo!estado!genérico!!|! !
!
!
Por! enquanto,! desconsidere! a! linha! tracejada! do! circuito.! Vamos! calcular! a! evolução! do!
estado!dos!três!q`bits!ao!longo!do!lado!esquerdo!da!linha.!Primeiro,!notamos!que!o!estado!
inicial!é!(ordenado!de!cima!para!baixo/da!esquerda!para!a!direita):!
!
|!! = !00 = ! 000 + !|100 ! (III7.10)!
!
Ou!seja,!o!primeiro!q`bit!é!iniciado!em!um!estado!genérico!desconhecido,!e!os!outros!dois,!
em!|0 .!A!primeira!operação!é!um!Hadamard!no!segundo!q`bit,!o!que!leva!o!estado!para35:!
!
!! !! = ! 000 + !|010 + !|100 + !|110 ! (III7.11)!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
35
!Por!simplicidade,!os!fatores!1/ 2!!introduzidos!pelos!operadores!H!foram!absorvidos!nos!coeficientes.!

! 265!
!
Depois,!vem!o!CNOT!entre!o!segundo!e!terceiro!q`bits,!com!controle!no!segundo.!O!estado!
se!torna:!
!
!"#!!" ∙ !! !! = ! 000 + !|011 + !|100 + !|111 ! (III7.12)!
!
Então,!vem!outro!CNOT!entre!o!primeiro!e!segundo!q`bits,!com!controle!no!primeiro:!
!
!"#!!" ∙ !!"#!!" ∙ !! !! = ! 000 + !|011 + !|110 + !|101 ! (III7.13)!

!
Segue,!então,!a!última!operação!antes!da!linha!tracejada,!um!Hadamard!no!primeiro!q`bit:!
!
!! ∙ !"#!!" ∙ !!"#!!" ∙ !! !! = ! 000 + ! 100 + ! 011 + !|111 +
!|010 − !|110 + !|001 − !|101 ! (III7.14)!
!
Vamos!chamar!esse!estado!|!′ !e!rearranjar!os!termos!como!mostrado!abaixo:!
!
|!′ = |00 ! 0 + ! 1 + |01 ! 1 + ! 0 + |10 ! 0 − ! 1 + |11 !|1 − !|0 !
! (III7.15)!
!
Suponha!que,!no!instante!marcado!pela!linha!tracejada,!seja!feita!uma!medida!sobre!os!dois!
primeiros! q`bits,! mas! não! sobre! o! terceiro.! Se! o! estado! encontrado! for! |00 ,! o! que! pode!
ocorrer! com! 25%! de! chance,! segundo! a! expressão! acima,! o! estado! do! terceiro! q`bit! será!
!|0 + !|1 .!Mas,!este!era!o!estado!de!entrada!do!primeiro!q`bit!!Ou!seja,!o!circuito,!até!a!
linha!tracejada!transfere!o!estado!do!primeiro!q`bit!para!o!terceiro!com!probabilidade!igual!
a! ¼.! Mas! se! o! resultado! da! medida! for! |01 ,! o! que! também! pode! ocorrer! com! 25%! de!
chance,! então,! o! terceiro! q`bit! estará! em! !|1 + !|0 .! Para! recuperar! o! estado! original,! é!
necessário!aplicar!uma!porta!X!a!esse!estado.!!
!
Continuando:! se! a! medida! na! linha! tracejada! resultar! em! |10 ! para! o! estado! dos! dois!
primeiros!q`bits,!o!terceiro!q`bit!estará!em!!|0 − !|1 ,!e,!para!recuperar!o!estado!inicial!do!
primeiro!q`bit,!é!necessário!aplicar!uma!porta!Z.!!

! 266!
!
Finalmente,!se!o!resultado!da!medida!sobre!os!dois!primeiros!q`bits!for!|11 ,!o!terceiro!q`bit!
estará!em!!|1 − !|0 ,!e!o!estado!original!pode!ser!recuperado!por!uma!porta!X!e,!depois,!
uma!porta!Z.!
!
O! que! acabamos! de! descrever! é! o! protocolo! quântico! de! teleporte.! Para! funcionar,! o!
ingrediente! fundamental! necessário! é! o! emaranhamento! realizado! entre! o! segundo! e!
terceiro!q`bits,!como!mostrado!pelas!duas!primeiras!operações!feitas!no!circuito.!!
!
Suponha! que,! após! o! emaranhamento,! os! dois! primeiros! q`bits! sejam! enviados! a! um!
observador! A,! e! o! terceiro! q`bit,! a! um! observador! B.! Os! dois! observadores! podem! estar!
separados!por!uma!distância!arbitrária.!!
!
Após! essa! distribuição! dos! q`bits,! o! operador! A! realiza! as! duas! outras! operações! antes! da!
linha!tracejada!e,!depois,!faz!a!medida!sobre!os!dois!q`bits!que!estão!com!ele.!Ao!fazer!!isso,!
A!saberá!em!que!estado!o!q`bit!de!B!colapsou.!Tudo!que!ele!tem,!então,!a!fazer!é!entrar!em!
contato!com!B!por!um!meio!clássico!qualquer!(telefone,!fax,!e`mail,!etc.)!e!informar!qual!foi!
o!resultado!da!sua!medida.!Com!isso,!B!saberá!que!operação,!ou!operações,!ele!deve!aplicar!
ao!seu!q`bit!para!recuperar!o!estado!original!do!primeiro!q`bit.!!
!
Repare!que!os!coeficientes!a!e!b!permanecem!desconhecidos!por!todo!o!tempo.!Ou!seja,!o!
estado! que! é! teleportado! do! primeiro! para! o! terceiro! q`bit! é! desconhecido! por! ambos! os!
observadores.!!
!
As!operações!do!lado!direito!da!linha!tracejada!garantem!que!qualquer!que!seja!o!resultado!
da! medida! feita! por! A,! o! q`bit! de! B! irá! para! o! estado! correto.! ! Note! que,! após! a! linha!
tracejada,! nenhuma! operação! adicional! é! feita! sobre! os! dois! q`bits! de! A,! servindo! eles!
apenas!de!controle!para!as!operações!que!devem!ser!realizadas!por!B.!!
!

! 267!
O! fenômeno! do! teleporte! já! foi! verificado! em! vários! experimentos! diferentes,! usando`se!
como! q`bits,! fótons,! spins! nucleares! e! átomos! aprisionados! em! armadilhas36.! A! seguir,!
vamos! estudar! uma! das! mais! bem`sucedidas! técnicas! de! processamento! da! informação!
quântica,!a!ressonância!magnética!nuclear!(RMN).!!
!

III8.% Spins% nucleares% como% bits% quânticos;% construindo% chaves%


lógicas%e%algoritmos%quânticos%com%pulsos%de%radiofrequência%%
!
Spins! nucleares! são! q`bits! quase! perfeitos! para! o! processamento! da! informação! quântica!
em! sistemas! pequenos.! Eles! são! bem! isolados! do! meio! ambiente,! o! que! significa! longos!
tempos! de! coerência! dos! estados! quânticos! e! podem! ser! manipulados! quase!
arbitrariamente,! usando`se! a! técnica! experimental! da! RMN.! Vamos! primeiramente! fazer!
uma!descrição!da!dinâmica!de!um!spin!isolado!sob!a!ação!de!campos!magnéticos,!estático!e!
oscilante,! e,! então,! discutiremos! o! mesmo! problema! em! uma! amostra! macroscópica,!
contendo!um!número!muito!grande!de!spins.!!
!
Um!spin!½!em!um!campo!magnético!estático!e!homogêneo!na!direção!Z!tem!hamiltoniano!
(veja!Figura!III7.1):!
!
ℏ!! (III8.1)!
!=− !!
2 !
!
onde! !! = !! !! ! é! a! frequência! de! Larmor! do! núcleo,! o! qual! tem! fator! giromagnético! !! .!
Esse!hamiltoniano!define!dois!níveis!de!energia,!e,!portanto,!um!q`bit!de!informação:!
!
ℏ!! ℏ!! (III8.2)!
!! = − !!e!!!! = + !
2 2

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
36
!Até!agora,!os!experimentos!mais!interessantes!foram!aqueles!que!teleportaram!estados!atômicos.!Foram!
feitos!em!2004!por!dois!grupos!diferentes,!que!publicaram!seus!artigos!no!mesmo!volume!da!revista!Nature:!
M.!Riebe,!H.!Häffner,!C.!F.!Roos,!W.!Hänsel,!J.!Benhelm,!G.!P.!T.!Lancaster,!T.!W.!Körber,!C.!Becher,!F.!Schmidt`
!
Kaler,!D.!F.!V.!James!and!R.!Blatt,!Deterministic%Quantum%Teleportation%with%Atoms,!Nature!429!(2004)!734,!e!
M.!D.!Barrett,!J.!Chiaverini,!T.!Schaetz,!J.!Britton,!W.!M.!Itano,!J.!D.!Jost,!E.!Knill,!C.!Langer,!D.!Leibfried,!R.!Ozeri!
and!!D.!J.!Wineland,!Deterministic%Quantum%Teleportation%of%Atomic%qubits,!Nature!429!(2004)!737.!
!
!

! 268!
!
A!diferença!de!energia!entre!os!dois!níveis!define!a!frequência!de!ressonância!do!sistema:!
!
!! − !! (III8.3)!
= !! = 2!!! !

!
Para!excitar!o!sistema,!ou!seja,!fazer!o!spin!mudar!de!nível,!é!preciso!aplicar!ao!sistema!um!
campo! magnético! dependente! do! tempo! na! frequência! de! ressonância.! Esse! campo! é!
chamado!de!campo!de!radiofrequência!(RF),!porque!a!sua!faixa!de!frequências!é!de!MHz.!
Ele!é!aplicado!na!direção!perpendicular!a!!! .!O!campo!total!é!escrito!como:!!
!
! = !! ! + !! {!!"# !" − !!"# !" }! (III8.4)!
!
Com!esse!campo,!o!hamiltoniano!se!torna:!
!
ℏ!! ℏ!! (III8.5)!
!=− !! − !! !"# !" − !! !"# !" !
2 2
!
onde!!! = !! !! .!O!significado!físico!desta!frequência!ficará!claro!adiante.!Repare!agora!que!
temos!três!parâmetros!de!frequência:!!, !! !e!!! .!!
!
Com!esse!hamiltoniano,!temos!agora!que!resolver!a!equação!de!Schroedinger!dependente!
do! tempo,! para! determinarmos! a! evolução! temporal! do! spin.! Mas,! como! o! hamiltoniano!
depende!do!tempo,!não!podemos!simplesmente!escrever!a!solução!como:!
!
|! ! = ! !!"#/ℏ |! 0 ! (III8.6)!
!
Repare,!no!entanto,!que37:!
!
!
!" !"
!! !"# !
− !! !"# !
= ! !! !"/! !!
!! ! !! !"/! !!
! (III8.7)!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
37
!Veja!o!Problema!9.!

! 269!
!
A!razão!para!o!fator!“1/2”!no!argumento!das!funções!acima!está!no!fato!de!que!o!objeto!
físico! proporcional! ao! momento! magnético! –! ou! seja,! o! qual! interage! com! o! campo!
magnético! –! é! o! spin! nuclear! I! e! não! os! operadores! de! Pauli,! que! são! apenas! objetos!
!
matemáticos!auxiliares.!Como!! = !,!a!frequência!de!precessão!de!I$será!metade!daquela!

de!σ .!Com!isso,!a!equação!de!Schroedinger!se!torna:!
!
!
!|! ℏ!! ℏ!! !! (III8.8)!
!"/! !!
!ℏ =− !! |! − ! !! ! !! !"/! !!
|! !
!" 2 2
!
Olhando!para!o!último!termo!do!lado!direito,!vamos!definir!um!novo!vetor!de!estado:!
!
!′ = ! !! !"/! !!
! !!ou!! ! = ! !! !"/! !!
!′ ! (III8.9)!
!
Derivando!essa!expressão!em!relação!ao!tempo,!obtemos:!
!|! ℏ! !|!′ (III8.10)!
!ℏ =− ! ! !! !"/! !!
|!′ + !ℏ! !! !"/! !!
!
!" 2 ! !"
!
Substituindo!na!equação!de!Schroedinger,!ficamos!com:!
!
ℏ! !|!′ ℏ!! ℏ!! !!"#!
− !! ! !!"#!! |!′ + !ℏ! !!"#!! =− !! ! !!"#!! |!′ − ! ! ! |!′ !
!
2 !" 2 2
!
(III8.11)!
De!onde!resulta!a!equação:!
!
!|!′ ℏ (III8.12)!
!ℏ =− !! − ! !! + !! !! |!′ !
!" 2
!
Vemos! agora! que! o! hamiltoniano! independe! de! t.! Este! hamiltoniano! pode! ser! escrito! na!
forma:!
!
(III8.13)!

! 270!
ℏΩ
!!" = − ! !
2 !
!
onde!!! !é!a!componente!do!spin!ao!longo!da!direção!u:!
!
!! ! + !! − ! ! !! ! + !! − ! ! (III8.14)!
!! = !! ∙ ! = ! ∙ =!∙ !
!!! + !! − ! ! Ω

!
Com! o! hamiltoniano! independente! do! tempo,! podemos! calcular! a! evolução! temporal! do!
estado:!
!
! ! = ! !!!!" ! ! 0 = !! !/! !!!
|! 0 (III8.15)!
Ω! Ω!
= !"#$ + !!! !"# |! 0 !
2 2
!
!
A!condição!de!ressonância!se!dá!quando!a!frequência!do!campo!de!RF!se!iguala!à!frequência!
natural!do!sistema:!! = !! ! → Ω = !! !e!!! = !! .!Com!isso,!a!expressão!acima!se!torna:!
!
!! ! !! ! (III8.16)!
|! ! = !"#$ + !!! !"# |! 0 !
2 2
!
Nessa!expressão,!tanto!!! !(a!amplitude!do!campo!de!RF)!quanto!t!(o!tempo!durante!o!qual!
o! campo! de! RF! permanece! ligado38)! são! parâmetros! que! podem! ser! controlados!
externamente.!Portanto,!o!ângulo!de!rotação!! = !! !!também!pode!ser!controlado.!Se,!por!
exemplo,!escolhermos!! = !/2,!supondo!que!o!estado!inicial!é!|↑ ,!obtemos:!
!
|↑ + !|↓ (III8.17)!
|! !/2 = !
2
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
38
!Essa!forma!de!aplicação!da!RF!com!duração!controlada!é!chamada!de!RMN!pulsada.!Diz`se!que!um!pulso!de!
π/2!ou!π!foi!aplicado.!

! 271!
Ou! seja,! controlando! a! amplitude! e! duração! da! RF! podemos! criar! uma! superposição! de!
estados!a!partir!de!um!estado!inicial!bem!definido.!Controlando!sua!fase!(direção!ao!longo!
da!qual!a!RF!é!aplicada)!e!duração!dos!pulsos!de!RF,!é!possível!gerar!todas!as!chaves!lógicas!
de! um! q`bit! discutidas! na! Seção! anterior.! Por! exemplo,! para! a! chave! X,! basta! fazermos!
!! ! = !.!A!chave!de!Hadamard!é!obtida!com!uma!sequência!de!dois!pulsos!de!RF!com!fases!
diferentes:!primeiro!um!pulso!de!π/2!na!direção!Y,!seguido!de!um!pulso!de!π!na!direção!X.!
Essa!sequência!resulta!em:!
!
1 1 1 (III8.18)!
! !!"!! ! !! !/! !!
= ! !!"/! × !
2 1 −1
!
Ou! seja,! o! resultado! é! um! operador! de! Hadamard,! com! um! fator! de! fase! global! que! não!
afeta!o!resultado!da!operação!da!chave.!!
!
No! entanto,! como! vimos! anteriormente,! para! a! realização! de! todas! as! chaves! lógicas!
quânticas,! precisamos! do! CNOT,! uma! chave! de! dois! q`bits.! Em! RMN,! o! CNOT! pode! ser!
implementado!em!sistemas!com!spins!acoplados.!Exemplo!de!tal!sistema!é!a!molécula!do!
clorofórmio,!mostrada!na!Figura!III8.1.!!
!

Cl
!

Figura!III8.1!–!A!molécula!do!clorofórmio!(ClCH3)! é!o!protótipo!do!processador!quântico!de!RMN!
de!dois!q`bits.!Um!átomo!de!carbono`13!se!liga!quimicamente!a!um!de!hidrogênio!e!três!de!cloro.!
13
Os! q`bits! são! representados! pelos! isótopos! C,! com! abundância! isotópica! de! aproximadamente!
1
1,1%!e!do! H,!99,985%!abundante!
!
! 272!
!
O!átomo!central!dessa!molécula!é!o!carbono,!o!qual!se!liga!a!três!átomos!de!cloro!e!a!um!de!
hidrogênio.! Portanto,! a! fórmula! química! dessa! molécula! é! CHCl3.! Os! dois! spins! que!
funcionam!como!um!processador!quântico!nessa!molécula!são!os!spins!dos!núcleos!13C!e!1H,!
ambos!com!I!=!½.!O!fato!essencial!dessa!molécula,!como!um!processador!quântico!de!dois!
q`bits,!é!o!chamado!acoplamento!J!entre!os!dois!spins,!que!tem!a!forma:!!
!
!
!! = ℎ!!!" !!" = ! ℎ!!!" !!" ! (III8.19)!
!
A! intensidade! do! acoplamento! é! dada! por! J,! que,! no! clorofórmio,! é! da! ordem! de! 250! Hz.!
Fisicamente,!esse!acoplamento!surge!da!interação!dos!spins!nucleares!com!os!elétrons!que!
formam! a! ligação! química! da! molécula;! portanto,! trata`se! de! uma! interação! indireta,!
reportada!pela!primeira!vez!em!195239.!No!sistema!girante,!na!presença!do!campo!efetivo!e!
do!acoplamento!J,!o!hamiltoniano!se!torna:!
!

!= ! − !!! !!" + ! − !!! !!" − !!! !!" − !!! !!" + !!"!!" !!" !
2
!
(III8.20)!
!
O!último!termo!desse!hamiltoniano!é!essencial!para!a!criação!da!chave!lógica!CNOT.!Para!
ver!isso,!considere!a!evolução!livre!do!sistema,!ou!seja,!a!evolução!sem!a!aplicação!da!RF,!
apenas!sob!a!ação!do!acoplamento!J:!!
! (III8.21)!
!(!) = ! !!"#!"!" !!" /! !
!
Suponha! que! os! dois! spins! evoluam! livremente! até! o! instante! ! = 2/!.! No! caso! do!
!
clorofórmio,!esse!tempo!será!da!ordem!de!!"# !" !! ~!8!!".!Nesse!instante,!teremos:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
39
!E.!L.!Hahn!e!D.!E.!Maxwell,!Spin%Echo%Measurements%of%Nuclear%Spin%Coupling%in%Molecules,!Phys.$Rev.!88!
(1952)!1070.!

! 273!
1−! 0 0 0
! 0 1+! 0 0 (III8.22)!
!! = !
! 0 0 1+! 0
0 0 0 1−!
!
Para!gerar!uma!chave!CNOT!com!controle!no!q`bit!representado!pelo!13C,!procede`se!com!a!
seguinte!sequência:!um!pulso!de!π/2!no!1H!ao!longo!de!x,!um!período!de!evolução!livre!UJ!e!
outro!pulso!de!π/2!ao!longo!de!y.!Isso!produz!a!chave!CNOT!com!uma!fase!que!não!altera!o!
resultado!de!sua!aplicação!sobre!os!autoestados:!
!
1−! 0 0 0
! ! ! ! ! 0 1+! 0 0 (III8.23)!
!"#!! = !! = !
! ! ! ! ! 0 0 0 −1 + !
0 0 1+! 0
!
Em!resumo,!utilizando!pulsos!de!RF!com!duração!controlável!e!explorando!o!acoplamento!
natural! entre! os! spins! nucleares! de! uma! molécula,! é! possível! construir! com! a! RMN! o!
conjunto! de! chaves! lógicas! quânticas! necessárias! para! a! implementação! da! computação!
quântica.!!
!
Porém,!isso!não!resolve!totalmente!o!problema.!A!razão!é!que,!em!experimentos!de!RMN,!
as! amostras! são! objetos! macroscópicos,! contendo! um! número! imenso,! da! ordem! de! 1023!
moléculas!por!cm3!e!não!uma!única!molécula,!como!descrito!acima.!!!
!
Como! vimos! no! Bloco! II! deste! texto,! em! um! sistema! contendo! muitas! partículas,! teremos!
necessariamente! um! indeterminismo! estatístico.! Ou! seja,! ao! aplicarmos! pulsos! de! RF! no!
sistema,!não!temos!como!saber!o!comportamento!individual!dos!spins!em!cada!molécula.!E!
existe!outro!problema,!que!diz!respeito!ao!uso!do!núcleo!de!carbono!como!q`bit.!O!isótopo!
do! carbono! mais! abundante! é! o! 12C,! sendo! 99%! no! carbono! natural;! o! 13C! é! apenas! 1%!
abundante.!!
!
O! primeiro! tem! spin! nuclear! igual! a! zero! e,! portanto,! não! pode! representar! um! q`bit! de!
RMN.!O!segundo!tem!spin!½.!Ao!prepararmos!uma!amostra!de!clorofórmio!líquido!para!um!

! 274!
experimento! de! computação! quântica! por! RMN,! 99%! de! todas! as! moléculas! serão! inúteis!
para!o!experimento.!!!
!
Felizmente,! existe! um! procedimento! comercialmente! disponível! chamado! enriquecimento!
isotópico,!o!qual!permite!que!mais!de!99%!de!todos!os!isótopos! 12C!sejam!substituídos!por!
13
C,! tornando! virtualmente! todas! as! moléculas! de! clorofórmio! do! líquido! úteis! para! o!
processamento!da!informação!quântica.!
!
Voltemos! ao! problema! estatístico.! Ao! colocarmos! um! líquido! de! clorofórmio! enriquecido!
em! um! campo! magnético,! após! atingir! o! equilíbrio! térmico,! o! sistema! será! descrito! pela!
matriz!densidade!(veja!Seção!II1.1):!
! !!/!! ! (III8.24)!
!= !
!
!
onde!o!hamiltoniano!(na!ausência!de!RF)!é!dado!por:!
!

! = ! −!!! !!" − !!! !!" + !!"!!" !!" ! (III8.25)!
!
Em! um! campo! magnético! de! 12! tesla,! por! exemplo,! a! energia! do! hidrogênio! (a! maior! do!
hamiltoniano! acima)! será! da! ordem! de! ℏ!!! !~!10!! eV,! ao! passo! que! a! energia! térmica!
correspondente! à! temperatura! ambiente! é! !! !!~!0,02!eV,! ou! seja,! quatro! ordens! de!
magnitude! maior! do! que! a! energia! magnética.! Por! isso,! podemos! expandir! a! matriz!
densidade!até!primeira!ordem.!Tendo!em!vista!que,!no!mesmo!limite,!teremos!Z!=!4:!
!
! ! (III8.26)!
!= − !
4 4!! !
!
Se!pulsos!de!RF!representando!rotações!dos!spins!forem!aplicados!ao!sistema,!essa!matriz!
se!transformará!como:!
!
!

! 275!
! 1
!′ = !! !! ⋯ !! !! !!!! !! ⋯ !!! !! = − ! ! ⋯ !! !! !!!! !! ⋯ !!! !! !
4 4!! ! ! !
!
(III8.27)!
!
Ou! seja,! apenas! o! hamiltoniano! se! transforma,! com! a! parte! da! identidade! permanecendo!
inalterada.! Além! disso,! se! uma! medida! da! magnetização! for! realizada! sobre! esse! estado,!
digamos!ao!longo!do!eixo!Y,!se!obtém:!
!
!!" + !!" = 2!! !" !!" + !!" !′
2!!
=− !" !!" + !!" !! !! ⋯ !! !! !!!! !! ⋯ !!! !! !
4!! !
! (III8.28)!
!
Isto!é,!o!termo!proporcional!à!identidade!não!contribui!para!a!medida!da!magnetização.!!
!
A!aproximação!de!altas!temperaturas!da!matriz!densidade!e!a!possibilidade!de!transformar!
o! hamiltoniano! utilizando! pulsos! de! RF! levaram! à! descoberta,! em! 1997! –!!
independentemente! por! Gershenfeld! e! Chuang,! bem! como! Cory,! Fahmy! e! Havel40! `,! dos!
chamados! estados! pseudopuros.! Utilizando`se! pulsos! de! RF! e! médias,! a! matriz! densidade!
(III8.26)!pode!ser!transformada!em41:!
!
1−! (III8.29)!
!!! = ! + !|! !|,!
4
!
!! !!
onde! ! = !! !
!~!10!! !e!|! ! um! estado! quântico! puro.! Sob! transformações! unitárias,! esse!

estado!evolui!como!um!estado!efetivamente!puro:!
!
1−! (III8.30)!
!"!! ! ! = ! + !"|! !|! ! ,!
4
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
40
!Bulk%Spin_Resonance%Quantum%Computation.!N.!A.!Gershenfeld!and!I.!L.!Chuang,!Science!275%(1997)!350,!e!
Ensemble%quantum%computing%by%NMR%spectroscopy,!D.!G.!Cory,!A.!F.!Fahmy!e!T.!F.!Havel,!Proc.$Nat.$Acad.$
Sci.!94!(1997)!1634.!!
!Veja:! NMR$Quantum$Information$Processing,!Ivan!S.!Oliveira,!Tito!J.!Bonagamba,!Roberto!S.!Sarthour,!Jair!
41

C.C.!de!Freitas!e!Eduardo!R.!deAzevedo,!Elsevier!(Amsterdam,!2007).!
!

! 276!
!
E,!sob!uma!medida!da!componente!qualquer!da!magnetização,!se!obtém:!
!
!!!!,!,! = 2!! !"{!! !"!! ! ! } = !2!! !"{!! !|! !|! ! }! (III8.31)!

!
Ou! seja,! o! sinal! detectado! da! magnetização! será! proveniente! de! spins! que! estão! em! um!
único!estado!puro!!Vale!a!pena!enfatizar!que!como!!!é!muito!pequeno,!para!cada!spin!no!
estado!|! ,!outros!1!milhão!estarão!no!estado!de!mistura!estatística!máxima.!Mas!estes!não!
são! detectáveis! por! RMN.! Por! essas! propriedades,! o! estado! (III8.29)! é! chamado! estado!
pseudo`puro.!!
!
Em!resumo,!a!RMN!é!uma!técnica!capaz!de!implementar!todas!as!etapas!necessárias!para!o!
processamento! da! informação! quântica.! A! principal! desvantagem! da! técnica,! quando!
aplicada!em!amostras!líquidas,!é!a!sua!não`escalabilidade.!Ou!seja,!na!prática,!não!é!possível!
utilizar!sistemas!com!mais!do!que!uma!dezena!de!spins.!No!entanto,!para!fins!de!verificação!
de!algoritmos!e!protocolos!quânticos!em!sistemas!pequenos,!como!o!clorofórmio!e!outras!
moléculas!com!poucos!spins!acoplados,!a!RMN,!talvez,!seja!a!melhor!técnica!disponível!para!
tal.!!
!
Com!ela,!inúmeros!estudos!de!simulação!de!sistemas!quânticos!e!verificações!fundamentais!
da! termodinâmica! podem! ser! feitos,! além! de! testes! de! computação! quântica,! teleporte!
etc42.!Esses!e!outros!estudos!nos!ajudam!a!compreender!fenômenos!da!natureza!em!suas!
manifestações!mais!fundamentais.!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! ! !
42
!Veja:!Enviroment_induced%sudden%transition%in%quantum%discord%dynamics,!R.!Auccaise, L.!C.!Céleri, D.!O.!
! ! ! ! ! !
Soares`Pinto, E.!R.!deAzevedo, J.!Maziero, A.!M.!Souza,!T.!J.!Bonagamba, R.!S.!Sarthour, I.!S.!Oliveira, and!R.!M.!
Serra,! Phys.$ Rev.$ Lett.,! 107! (2011)! 140403;! Experimentally% Witnessing% the% Quantumness% of% Correlations,! R.!
! ! ! ! ! ! !
Auccaise, J.! Maziero, L.! C.! Céleri, D.! O.! Soares`Pinto, E.! R.! deAzevedo, T.! J.! Bonagamba, R.! S.! Sarthour, I.! S.!
!
Oliveira, and! R.! M.! Serra,! Phys.$ Rev.$ Lett.,! 107! (2011)! 070501;! Observation% of% Environment_Induced% Double%
! ! !
Sudden% Transitions% in% Geometric% Quantum% Correlations,! F.! M.! Paula, I.! A.! Silva, J.! D.! Montealegre, A.! M.!
! ! ! ! ! ! !
Souza, E.! R.! deAzevedo, R.! S.! Sarthour, A.! Saguia, I.! S.! Oliveira, D.! O.! Soares`Pinto, G.! Adesso, and! M.! S.!
Sarandy,! Phys.$ Rev.$ Lett.,! 111! (2013)! 250401; Measuring% Bipartite% Quantum% Correlations% of% an% Unknown%
! ! ! ! ! ! !
State,!I.!A.!Silva, D.!Girolami, R.!Auccaise, R.!S.!Sarthour, I.!S.!Oliveira, T.!J.!Bonagamba, E.!R.!deAzevedo, D.!O.!
!
Soares`Pinto, and! G.! Adesso,! Phys.$ Rev.$ Lett.,! 110! (2013)! 140501; Experimental% Reconstruction% of% Work%
!
Distribution%and%Study%of%Fluctuation%Relations%in%a%Closed%Quantum%System,!Tiago!B.!Batalhão, Alexandre!M.!
! ! ! ! ! ! !
Souza, Laura!Mazzola, Ruben!Auccaise, Roberto!S.!Sarthour, Ivan!S.!Oliveira, John!Goold, Gabriele!De!Chiara,
!
Mauro! Paternostro, and! Roberto! M.! Serra,! Phys.$ Rev.$ Lett.,! 113! (2014)! 140601; Spin% Squeezing% in% a%
! ! ! !
Quadrupolar% Nuclei% NMR% System,! R.! Auccaise, A.! G.! Araujo`Ferreira, R.! S.! Sarthour, I.! S.! Oliveira, T.! J.!

! 277!
!
!

III9.% Computação% quântica% utilizando% circuitos% supercondutores.%


Computação%quântica%adiabática%%
!
Nessa!última!seção,!vamos!discutir!uma!representação!interessante!de!q`bits,!não!por!meio!
de! propriedades! de! partículas,! como! spin! ou! polarização! de! fótons,! mas,! sim,! um! tipo!
especial! de! circuito! eletrônico! chamado! junção! Josephson.! É! o! próprio! circuito! que! tem!
propriedades!quânticas!que!o!habilitam!a!operar!como!um!q`bit43.!!
!
Os!elementos!básicos!para!a!construção!de!circuitos!eletrônicos!são!o!capacitor,!o!indutor!e!
o! resistor.! Com! esses! elementos,! pode`se! construir,! por! exemplo,! circuitos! ressonantes!
equivalentes! a! sistemas! mecânicos,! como! o! sistema! massa`mola.! Circuitos! elétricos! com!
capacitores! e! indutores! armazenam! energia! eletromagnética,! enquanto! sistemas!
mecânicos,!energia!potencial.!!
!
Sabemos!do!eletromagnetismo!clássico!que!a!energia!armazenada!em!um!circuito!LC!é!dada!
por:!!
!
1 1 (III9.1)!
! = !! ! + !! ! !
2 2
!
Usando! as! relações! ! = !"! e! Φ = !",! onde! !! é! a! carga! armazenada! no! capacitor! e! Φ! o!
fluxo!magnético!armazenado!no!indutor,!obtém`se:!
!
! ! Φ! (III9.2)!
!= + !
2! 2!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Bonagamba, and! I.! Roditi,! Phys.$ Rev.$ Lett.,! 114! (2015)! 043604;! Irreversibility% and% the% Arrow% of% Time% in% a%
! ! ! ! ! !
Quenched%Quantum%System,!T.!B.!Batalhão, A.!M.!Souza, R.!S.!Sarthour, I.!S.!Oliveira, M.!Paternostro, E.!Lutz,
!
and!R.!M.!Serra,!Phys.$Rev.$Lett.,!115!(2015)!190601. !

43
!Para!uma!excelente!revisão,!veja!G.!Wendin!e!V.!S.!Shumeiko,!Superconducting%Quantum%Circuits,%Qubits%
and%Computing,!arXiv:cond`mat/0508729.!

! 278!
O! que! temos! aqui! é,! formalmente,! o! hamiltoniano! do! oscilador! harmônico! (OH),! com! a!
carga! e! o! fluxo! sendo! as! variáveis! canonicamente! conjugadas.! Quando! quantizado,! no!
entanto,! sabemos! que! o! OH! gera! um! espectro! de! níveis! de! energia! com! espaçamento!
uniforme!e,!por!essa!razão,!não!é!uma!boa!representação!de!q`bit.!A!principal!propriedade!
de! uma! junção! Josephson! é! que! ela! gera! um! espectro! semelhante! ao! do! OH,! mas! com!
espaçamento!desigual,!graças!às!suas!propriedades!de!não`linearidade.!

Existem!três!arquiteturas!possíveis!para!q`bits!em!circuitos!contendo!junções!Josephson:!a!
do!q`bit!de!fase,!a!do!q`bit!de!fluxo!e!a!do!q`bit!de!carga.!A!seguir,!vamos!estudar!cada!uma!
delas!em!detalhe.!!

III9.a% q_bit% de% fase! –! Dois! supercondutores! unidos! por! uma! fina! camada! isolante! formam!
uma! junção! Josephson.! A! corrente! supercondutora! tem! uma! fase,! !,! a! qual! se! relaciona!
tanto! com! a! diferença! de! potencial! elétrico! na! junção,! !(!),! quanto! a! corrente! que!
atravessa!a!barreira,!!(!),!pelas!seguintes!equações!fundamentais:!
(III9.3)!
ℏ !"
! ! = !!e!!!! ! = !!" !"#$(!)!
2! !"

onde! !!" ! é! a! corrente! supercondutora! máxima! que! pode! percorrer! a! junção,! chamada!!!
corrente!Josephson!crítica44.!

A!configuração!mais!simples!de!um!circuito!supercondutor!que!opera!como!um!q`bit!é!a!que!
tem! apenas! uma! junção! Josephson! alimentada! por! uma! fonte! de! corrente! externa.! Esse!
circuito!é!equivalente!a!um!circuito!com!elementos!em!paralelo,!como!mostra!a!figura!III9.1.!!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
44
!A!teoria!quântica!da!supercondutividade,!chamada!teoria!BCS,!fornece!o!valor!da!corrente!Josephson!crítica!
em!função!do!gap$supercondutor!e!da!temperatura.!!

! 279!
Junção Josephson
com fonte de corrente Circuito equivalente

IJ IC IR
supercondutor

óxido isolante
(barreira) Ie J C R Ie

Ie = I J + I C + I R
!

! Figura! III9.1! –! Uma! junção! Josephson! (esquerda)! é! um! circuito! formado! pela! união! de! dois!
supercondutores!por!meio!de!um!óxido!isolante!que!forma!uma!barreira!à!passagem!da!corrente.!
Tal!dispositivo!pode!ser!representado!pelo!circuito!equivalente!da!direita!
! !

O!“elemento!Josephson”!é!representado!por!um!“X”!no!circuito!da!direita,!e!a!corrente!que!
o!atravessa!é!aquela!dada!por!(III9.3).!A!corrente!que!atravessa!o!capacitor!é!dada!por:!

!" !" ℏ! ! ! !
! = !"! → = !! = ! = !
!" !" 2! !" !
(III9.4)!
E!a!que!atravessa!o!resistor:!
(III9.5)!
! ℏ !"
!! = = !
! 2!" !"

Quando!conectado!a!uma!fonte!externa,!!! ,!a!lei!de!Kirchhoff!estabelece!que:!

!! + !! + !! = !! ! (III9.6)!

de!onde!se!obtém!uma!equação!diferencial!para!a!fase:!
(III9.7)!
ℏ! ! ! ! ℏ !"
!
+ + !!" !"#$ ! = !! !
2! !" 2!" !"

Para!darmos!uma!formulação!hamiltoniana!a!esse!problema,!o!termo!resistivo!(equivalente!
à! interação! com! o! ambiente)! deve! ser! descartado.! Fazendo! isso,! ficamos! com! a! seguinte!
equação:!
(III9.8)!

! 280!
ℏ! ! ! !
+ !!" !"#$ ! = !! !
2! !" !

Essa!equação!pode!ser!deduzida!de!uma!lagrangeana,!mas,!para!isso,!precisamos!identificar!
os! termos! de! energia! cinética! e! potencial.! Note! que,! como! ! ∝ !,! podemos! associar! a!
energia!do!capacitor!à!energia!cinética:!
(III9.9)!
!
!! !! ! ℏ !! !
!= = = !
2! 2 2! 2

Por! sua! vez,! a! energia! potencial! pode! ser! calculada! a! partir! da! expressão! do! trabalho!
realizado!pela!corrente!que!atravessa!a!junção:!

! !
ℏ !"
! ! = ! ! ! ! !" = !!" !"#$ ! − !! !"!
2! !"
! !
(III9.10)!
a!qual!também!pode!ser!escrita!como:!

!
ℏ ℏ!!" ℏ!!
! ! = !!" !"#$ − !! !" = 1 − !"#$ − !!
2! 2! 2!
!
(III9.11)!

Podemos,!agora,!escrever!a!lagrangeana!do!circuito:!

!
ℏ !! ! ℏ!!" ℏ!!
ℒ =!−! = − 1 − !"#$ + !!
2! 2 2! 2!
(III9.12)!
!

É!fácil!ver!que,!aplicando`se!as!equações!de!Lagrange:!
(III9.13)!
! !ℒ !ℒ
− = 0!
!" !! !"
!
a!equação!de!movimento,!(III9.8),!é!corretamente!recuperada.!!
!
Antes!de!prosseguirmos!para!a!quantização,!vamos!definir!as!seguintes!quantidades:!

! 281!
a. Energia!do!capacitor!por!par!de!Cooper:!
2! ! (III9.14)!
!! = !
2!
b. Energia!do!elemento!Josephson:!
ℏ!!" (III9.15)!
!! = !
2!
c. Quantum!de!fluxo!magnético:!
ℎ (III9.16)!
Φ! = !
2!
Em!termos!dessas!quantidades,!!(III9.11)!se!torna:!!
!
!
ℏ! ! ! ℏ!! (III9.17)!
ℒ= − !! 1 − !"#$ + !!
4!! 2!
!
Podemos,!agora,!calcular!o!momento!canonicamente!conjugado!à!fase:!
!
! (III9.18)!
ℏ! !
!ℒ ℏ
!! = = = !!!
!! 2!! 2!
!
Porém,!usando!(III9.3)!obtemos:!!
!
(III9.19)!
ℏ !
!! = !" = ℏ !
2! 2!
!
!No!entanto,!a!razão!entre!a!carga!total!no!capacitor!e!a!carga!de!um!par!de!Cooper!é!igual!
ao!número!total!de!pares!de!Cooper.!Consequentemente:!
!
!! = ℏ!! (III9.20)!
!
é! o! momento! canonicamente! conjugado! à! fase.! O! processo! de! quantização! consiste! em!
transformarmos! essas! grandezas! em! operadores,! considerando! a! regra! de! comutação!
equivalente:!
(III9.21)!

! 282!
!
!, !! = !ℏ,!!!onde!!!!! = −!ℏ !
!"
!
A! última! expressão! à! direita! refere`se,! naturalmente,! ao! momento! na! representação! de!
fase.!!
!
Dessa!regra!de!comutação,!seguem`se!outras!duas:!entre!fase!e!número:!
!
(III9.22)!
!, ! = !!
!
E!entre!fase!e!carga:!
(III9.23)!
!, ! = 2!"!
!
!O!hamiltoniano!pode!ser!obtido!a!partir!da!lagrangeana!por!meio!de:!
!
ℏ! ! ! ℏ!! ℏ!!
ℋ = !! ! − ℒ = + !! 1 − !"#$ − ! = !! !! + !! 1 − !"#$ − !!
4!! 2! 2!
! (III9.24)!
!
O!termo!de!energia!potencial!é!dado!pelos!dois!últimos!termos!do!lado!direito.!Um!gráfico!
representativo!dessa!energia!é!mostrado!na!figura!III9.2.!!
!
!

! 283!
V(δ)

-8 -6 -4 -2
0
2 4 6
δ
-2

-4

Figura! III9.2! –! ! Representação! do! potencial! em! um! q`bit! de! fase! (dois! últimos! termos! da! Eq.!
III9.24).!No!regime!quântico,!próximo!ao!fundo!do!potencial,!dois!autoestados!definem!o!q`bit.!!
!
!
Usando!a!expansão!cosseno,!próximo!ao!mínimo,!o!potencial!se!torna:!
!
!! ! ℏ!! (III9.25)!
! ! ≈ ! − !!
2 2!
!
Usando!(III9.15),!!somando!e!subtraindo!o!termo!!!! /2!!! ,!chega`se!a:!
!
!
!! !! !!! (III9.26)!
! ! ≈ !− + !!
2 !! 2!!
!
Esse!é!o!potencial!do!oscilador!harmônico!deslocado:!o!seu!mínimo!ocorre!nas!coordenadas!
!! /!! , !!! /2!!! !e!tem!frequência!de!ressonância!igual!a:!
!
(III9.27)!
2!! !! 2!!!
!! = = !
ℏ! ℏ!

Nesse! regime,! os! autoestados! de! fase! são! aqueles! do! oscilador! harmônico,! com!
autoenergias!dadas!por:!
1 (III9.28)!
!! = ℏ!! ! + !
2

! 284!
!
É! importante! enfatizar! que! esses! autoestados! só! valem! na! aproximação! (III9.25),! o! que!
significa! que! apenas! os! dois! primeiros! estados! devem! ser! considerados.! Dentro! dessa!
aproximação! de! dois! níveis,! o! sistema! pode! ser! utilizado! como! q`bit! e! a! arquitetura! é!
conhecida!como!q`bit!de!fase.!!
!

III9.b%q_bit%de%fluxo!– Uma!variação!do!circuito!descrito!acima!consiste!em,!em!vez!de!uma!
fonte! externa! de! corrente,! se! inserir! um! loop! supercondutor,! e! portanto! uma! indutância,!
que!gera!uma!variação!de!fluxo.!O!loop!supercondutor!introduz!uma!indutância!no!circuito!a!
qual!se!relaciona!com!a!tensão!e!corrente!por!meio!de:!

(III9.29)!
!"
! ! =! !
!"

Da!relação!entre!voltagem!e!fase,!Eq.!(III9.3),!obtemos!uma!relação!entre!a!fase!e!o!fluxo:!

(III9.30)!
2! 2! Φ
! ! = ! ! !" = !" ! = 2! !
Φ! Φ! Φ!

No!entanto,!podemos!também!escrever:!

(III9.31)!
!" ℏ !"
! = !
!" 2! !"

que!resulta!em:!

!
(III9.32)!

!= ! − !! !
2!"

onde!!! !é!a!variação!da!fase!em!razão!da!variação!de!fluxo!causada!pelo!loop!adicional.!A!
figura!III9.3!mostra!o!esquema!do!circuito!supercondutor!e!seu!equivalente!elétrico.!

! 285!
L
Φ
C
J
óxido isolante
supercondutor
!

Figura! III9.3! –! Esquema! de! um! q`bit! de! fluxo! (esquerda)! e! seu! equivalente! elétrico.! O! loop!
supercondutor!permite!o!controle!dos!estados!quânticos!do!q`bit!por!meio!do!controle!do!fluxo.!!
!
A! equação! de! movimento! para! esse! circuito! é! similar! à! (III9.8),! com! um! termo! adicional!
substituindo!o!termo!de!corrente!externa:!!!
!
ℏ! ! ! ! ℏ (III9.33)!
!
+ !!" !"#$ + ! − !! = 0!
2! !" 2!"
!
Essa! equação! pode! ser! obtida! da! lagrangeana! (III9.17),! substituindo! o! último! termo! (o! da!
corrente!externa)!por:!
−ℏ (III9.34)!
! − !! ! !
4!"
Seguindo! o! procedimento! anterior,! vemos! que! essa! arquitetura! resulta! em! um! potencial!
dado!por:!
ℏ (III9.35)!
! = !! 1 − !"#$ + ! − !! ! !
4!"
!

Esse!potencial!pode!gerar!um!ou!dois!mínimos,!dependendo!da!relação!entre!os!termos!da!
soma,!como!mostrado!na!figura!III9.4.!Nela!são!representados!os!casos!!! = 0,!isto!é,!sem!
fluxo!induzido!pelo!loop!(Eq.!(III9.30)!)!e!!! = !,!o!que!gera!dois!mínimos.!!
!

! 286!
!

Figura!III9.4!–!Potencial!para!um!q`bit!supercondutor!do!tipo!fluxo,!para!dois!valores!de!fase!!! !!
!
!

Fisicamente,! cada! lado! do! potencial! representa! um! sentido! de! circulação! da! corrente!
supercondutora;!estes!são!os!autoestados!do!q`bit!de!fluxo.!!

No!caso!em!que!temos!o!duplo!poço,!o!estado!fundamental!é!duplamente!degenerado,!e!o!
primeiro! estado! excitado! está! muito! acima! em! energia.! No! entanto,! o! tunelamento!
macroscópico!da!corrente!supercondutora!através!da!barreira!levanta!a!degenerescência!do!
estado!fundamental,!dando!origem!a!um!sistema!efetivo!de!dois!níveis,!o!qual!pode,!então,!
ser!associado!a!um!q`bit!de!informação!–!nesse!caso,!chamado!q`bit!de!fluxo.!O!problema!
pode! ser! formalmente! mapeado! em! um! problema! de! um! spin! ½! ,! como! mostra! a! figura!
III9.5.!!

! 287!
V(δ)

ΔV

δ
!

Figura! III9.5! –! O! duplo! poço! de! um! q`bit! de! fluxo! representa! os! dois! sentidos! de! circulação! da!
corrente! supercondutora! no! loop.! O! tunelamento! da! corrente! através! da! barreira! levanta! a!
degenerescência! do! estado! fundamental.! Os! dois! estados! resultantes! são! associados! aos!
autoestados!do!q`bit!
!
!

III9.c% q_bit% de% carga – Uma! terceira! realização! possível! de! q`bits! com! supercondutores! é!
utilizar! o! número! de! carga! como! variável! quântica.! O! seu! esquema! é! mostrado! na! figura!
III9.6.!

Cg Cg n

Vg
Vg

! Figura! III9.6! –! Arquitetura! de! um! q`bit! de! carga! (esquerda)! e! sua! representação! no! circuito!
equivalente.!Uma!pequena!ilha!supercondutora!se!acopla!a!um!“reservatório!de!pares!de!Cooper”!
por!meio!de!uma!junção!Josephson.!Um!capacitor!e!uma!fonte!de!tensão!controlam!o!excesso!de!
! pares!na!ilha!
!
Um! q`bit! de! carga! é! construído! acoplando`se! uma! pequena! “ilha! supercondutora”! a! um!
supercondutor! massivo! por! meio! de! uma! junção! Josephson! e! um! capacitor! de! controle,!

! 288!
como!mostrado!na!figura!a!seguir.!A!voltagem!!! !e!a!capacitância!!! !controlam!o!número!
de! pares! de! Cooper! que! tunelam! através! da! junção! para! a! ilha.! O! número! de! pares! de!
Cooper!no!capacitor!de!controle!é!dado!por:!

!! !!
!! = − !
2!

O!hamiltoniano!do!circuito!é!dado!por:!

! (III9.37)!
ℋ = 2!! ! − !! − !! !"#$!

Repare! a! semelhança! entre! esse! hamiltoniano! e! aquele! dado! em! (III9.24).! Vale! ressaltar!
que,!nessa!expressão,!!! !é!um!número,!enquanto!!!é!um!operador.!!

A! condição! !! ≫ !! ! é! chamada! “regime! de! carga”! e! significa! que! a! ilha! supercondutora!


(caixa)!torna`se!isolada,!com!um!número!específico!de!pares!de!Cooper!aprisionados.!!

Podemos!escrever!explicitamente!a!matriz!hamiltoniana!e!calcular!seus!autovalores.!Usando!
a!propriedade!entre!operadores!conjugados!!!e!!! = ℏ!:!

(III9.38)!
!"
!! , !(!) = −!ℏ !
!"
é!fácil!deduzir:!
! !" , ! = −! !" !
Dessa!relação,!chega`se!a:!
! !" |! = |! + 1 ! (III9.39)!
E!de!forma!semelhante:!
! !!" |! = |! − 1 ! (III9.40)!
!
Escrevendo!o!hamiltoniano!(III9.37)!na!forma:!
!
! !! !" (III9.41)!
ℋ = 2!! ! − !! − ! + ! !!" !
2
!
que,!na!base! |0 , |1 !de!um!q`bit,!se!obtém:!

! 289!
!
2!! !!! −!! /2 (III9.42)!
ℋ= !
−!! /2 2!! (1 − !!! )
!
No!limite!!!! ≫ 1,!podemos!escrever:!
!
!! (III9.43)!
ℋ = 2!! !!! !! − ! !
2 !
!
Esse! hamiltoniano! pode! ser! facilmente! diagonalizado,! e! suas! autoenergias! fornecem! a!
frequência!de!ressonância!para!controle!dos!estados!do!q`bit.!!
!
III9.d%Acoplamento%local%entre%q_bits%supercondutores!–!Como!já!vimos,!a!implementação!
de!um!conjunto!de!chaves!lógicas!quânticas!requer!uma!operação!de!dois!q`bits,!os!quais,!
para! isso,! precisam! ser! acoplados! entre! si.! O! acoplamento! local! entre! dois! q`bits!
supercondutores!em!qualquer!uma!das!arquiteturas!vistas!acima!pode!ser!feito!utilizando`
se! os! mesmos! elementos! de! circuito,! como! mostra! a! figura! III9.7:! dois! q`bits! de! fluxo! são!
naturalmente!acoplados!pela!indutância!mútua,!!!" ,!entre!os!dois!indutores;!dois!q`bits!de!
carga!se!acoplam!por!meio!de!um!capacitor!comum,!!!" ;!e!dois!q`bits!de!fase!se!acoplam!
por! meio! de! uma! junção! Josephson! comum,! !!" .! Em! q`bits! de! carga! e! de! fluxo,! o!
acoplamento!resulta!em!um!termo!no!hamiltoniano!com!a!forma:!
!
(III9.44)!
ℋ!" = !!!! !!! !
!
!
onde!! = ! ! /(2!!" )!e!! = ℏ/2! !!" ,!para!carga!e!fluxo,!respectivamente.!!!
!
O!acoplamento!local!entre!dois!q`bits!de!fase!resulta!em!um!hamiltoniano!não`diagonal45:!
!
ℋ!" = ! !!! !!! + !!! !!! ! (III9.45)!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
45
!Ver!G.!Wendin!e!V.!S.!Shumeiko,!Superconducting%Quantum%Circuits,%Qubits%and%Computing,!arXiv:cond`
mat/0508729!e!referências.!

! 290!
onde!! = !!!" /4.!
!
!

L12
Φ1 Φ2 Acoplamento
indutivo entre
L1 L2 q-bits de fluxo.

Acoplamento
capacitivo entre
q-bits de carga.
C1 C2
C12
Vg Vg

Acoplamento
Josephson entre
q-bits de fase.
C1 C2
J12
Vg Vg

Figura!III9.7!–!Esquemas!de!acoplamentos!entre!dois!q`bits!supercondutores!próximos,!por!meio!
de!elementos!de!circuito.!O!acoplamento!é!necessário!para!a!realização!de!operações!de!dois!q`
bits!permitindo,!por!exemplo,!a!criação!de!estados!emaranhados!(ver!referências)!
!
!
Por!meio!desses!acoplamentos!e! de! outros!elementos!de!circuito,!é!possível!implementar!
operações! de! computação! quântica! em! sistemas! supercondutores! contendo! poucos! q`
bits46.!Vale!mencionar!que!esses!circuitos!são!fabricados!por!meio!das!técnicas!de!litografia!
discutidas!no!início!deste!capítulo.!!
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
46
!Veja,!por!exemplo,!L.!DiCarlo!e!colaboradores!em,!Demonstration%of%two_qubit%algorithms%with%a%
superconducting%quantum%processor,!Nature!460,!(2009)!240!e!também!M.!Steffen!e!colaboradores!em!
Measurement%of%entanglement%of%two%superconducting%qubits%via%state%tomography,!Science!313!(2006)!
1423.!

! 291!
III9.e% Acoplamento% entre% q_bits% supercondutores% distantes% por% meio% de% guias% de% onda.%
Escalonamento% da% computação% quântica! –! Desde! que! os! primeiros! experimentos!
demonstrando! a! implementação! de! operações! lógicas! quânticas! em! diferentes! sistemas!
físicos!surgiram!na!literatura,!o!chamado!“problema!do!escalonamento”!se!tornou!evidente.!
Esse! termo! se! refere! à! necessidade! do! aumento! no! número! de! q`bits! de! um! sistema,!
mantendo`se! a! capacidade! de! realização! de! operações! lógicas! quânticas! e! o! controle! do!
estado! sobre! todos! eles.! Essa! é! uma! necessidade! óbvia,! visto! que,! para! transformar! a!
computação!quântica!em!uma!tecnologia,!de!fato,!útil,!o!problema!do!escalonamento!tem!
que!ser!superado.!No!entanto,!trata`se!de!um!problema!muito!difícil,!sob!vários!aspectos:!
primeiro,! porque! sistemas! naturais,! como! as! moléculas! utilizadas! como! processadores!
quânticos! na! RMN! (seção! III8)! ou! fótons! interagindo! com! átomos,! não! existem! com! um!
grande! número! de! q`bits.! Segundo,! porque! ainda! que! fosse! possível! a! construção! de!
sistemas!artificiais!contendo!muitos!desses!q`bits,!o!controle!dos!estados!quânticos!–!cujo!
número!cresce!exponencialmente!com!a!quantidade!de!q`bits!–!se!torna!muito!complicado!
e!suscetível!à!descoerência,!bem!como!a!preparação!do!estado!inicial!e!a!leitura!do!estado!
final.!Finalmente,!porque!apenas!aumentar!o!número!de!q`bits!não!resolve!o!problema!do!
escalonamento,!pois!é!necessário!que!se!tenha!o!controle!completo!sobre!o!acoplamento!
de!qualquer!par!de!q`bits!no!sistema.!
!
Portanto,! superar! o! problema! do! escalonamento! se! tornou! um! dos! temas! de! maior!
interesse! em! computação! quântica! nas! últimas! décadas.! No! que! diz! respeito! ao!
acoplamento!entre!q`bits!supercondutores!distantes,!um!resultado!teórico!fundamental!foi!
obtido! em! 2004! por! Blais! e! coautores47.! Nesse! trabalho,! os! autores! demonstram! que! o!
dipolo! elétrico! intrínseco! a! um! q`bit! de! carga! pode! se! acoplar! fortemente! a! um! modo! do!
campo!eletromagnético!dentro!de!uma!cavidade!eletrodinâmica.!O!problema!é!semelhante!
ao!de!um!átomo!acoplado!ao!campo!em!uma!cavidade,!sendo!que!o!acoplamento!é!mais!
intenso! devido! ao! grande! momento! de! dipolo! associado! ao! q`bit.! A! figura! III9.8! mostra! a!
arquitetura! do! esquema! proposto! e! seu! equivalente! elétrico:! a! cavidade! é! obtida! sob! a!
forma!de!uma!guia!de!onda!supercondutora,!que!pode!ser!construída!por!litografia!óptica.!
Um!q`bit!de!carga!é!posicionado!na!região!onde!uma!onda!estacionária!é!máxima.!!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
47
!Cavity%quantum%elctrodynamics%for%superconducting%electrical%circuits:%an%architecture%for%quantum%
computation,!A.!Blais,!R.!Huang,!A.!Wallraff,!S.M.!Girvin!e!J.!Schoelkopf,!Phys.$Rev.$A!69!(2004)!06320.!

! 292!
!

Figura! III9.8! –! Esquema! para! o! acoplamento! entre! um! q`bit! de! carga! e! um! modo! do! campo!
elétrico!dentro!de!uma!guia!de!onda.!!Essa!arquitetura!permitiu!a!solução!de!um!dos!problemas!
relacionados!ao!escalonamento!da!computação!quântica!(ver!referências)!
!
!
O! resultado! essencial! desse! trabalho! é! o! mapeamento! do! problema! do! q`bit! dentro! da!
cavidade,!no!hamiltoniano!de!Jaynes`Cummings!(ver!Sec.!II8!e!problema!19).!O!acoplamento!
se!dá!por!meio!do!dipolo!elétrico!que!se!forma!nesse!tipo!de!q`bit!por!conta!da!diferença!de!
carga! entre! a! caixa! supercondutora! e! o! reservatório! de! pares! de! Cooper.! ! No! trabalho! é!
demonstrado!que!o!hamiltoniano!é!–!na!notação!do!original!–!dado!por:!
!
1 ℏΩ
! = ℏ!! !! ! + + !
2 2 !

!! ℏ!! !
−! ! + ! 1 − 2!! − !"#$!! + !"#$!! ! (III9.46)!
!! !"

!
onde!ℏ!! !é!a!energia!do!fóton!na!cavidade,!!ℏΩ!é!o!splitting!de!energia!do!q`bit,!!! !e!!! !
são,!respectivamente,!a!capacitância!do!capacitor!de!controle!da!caixa!supercondutora!e!a!
capacitância! total! do! circuito! do! q`bit.! A! cavidade! tem! indutância! !!! e! capacitância! C.!!
Finalmente:!!
!
!! (III9.47)!
! = !"!! !
4!! 1 − 2!!
!

! 293!
Para! !! = 1/2,! ! = !/2! e! esse! hamiltoniano! se! reduz! exatamente! ao! modelo! de! Jaynes`
Cummings!(Eq.!II8.30),!com!acoplamento!dado!por48:!!
!
!

!! ℏ!!
!=! !
!! !"

! (III9.48)!
!
Nessa!situação!o!acoplamento!entre!o!q`bit!e!a!cavidade!será!máximo,!o!que!faz!com!que!o!
espectro!de!transmissão!da!cavidade!dependa!do!estado!do!q`bit,!o!que!é!essencial!para!a!
manipulação!e!caracterização!dos!estado!quânticos.!!
!
Ainda! em! 2004,! Wallraff49! e! colaboradores! demonstraram! experimentalmente! essa!
proposta,! construindo,! por! litografia! óptica,! uma! guia! de! onda! supercondutora,! utilizando!
nióbio! sobre! um! substrato! de! silício! e! contendo! um! q`bit! de! carga! dentro! da! guia! (figura!
III9.9).! As! características! do! circuito! foram! testadas! observando`se! o! espectro! da! potência!
transmitida! através! da! guia,! as! quais! dependem! do! estado! do! q`bit! de! carga.! A! baixas!
temperaturas! (menores! que! 100! mK),! o! número! de! ocupação! de! fótons! na! cavidade! é! da!
ordem!de!0,06,!ou!seja,!o!acoplamento!entre!o!q`bit!e!o!campo!se!dá!no!regime!de!fótons!
individuais.!!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
48
!Como!o!hamiltoniano!de!Jaynes`Cummings!é!a!base!para!a!descrição!da!chamada!eletrodiâmica!quântica!de!
cavidade,!o!hamiltoniano!(III9.46)!motivou!o!termo!eletrodinâmica$quântica$de$circuitos.!
49
!Strong%coupling%of%a%single%photon%to%a%superconducting%qubit%using%quantum%electrodynamics,!A.!
Wallraff,!D.!I.!Schuster,!A.!Blais,!L.!Frunzio,!R.`S.!Huang,!J.!Majer,!S.!Kumar,!S.M.!Girvln!e!R.!J.!Schoelkopf,!
Nature,!431!(2004)!162.!!!

! 294!
!

Figura!III9.9!–!Imagem!de!uma!guia!de!onda!construída!por!litografia!óptica!contendo!um!q`bit!de!
carga.!O!q`bit!se!encontra!no!centro!da!guia!e!seu!acoplamento!com!o!campo!elétrico!é!testado!
observando`se!o!padrão!de!transmissão!da!potência!do!campo!em!função!do!estado!do!q`bit!(ver!
referências)!
! !

O! experimento! de! Wallraff! e! colaboradores! abriu! caminho! para! a! solução! de! um! dos!
problemas!mais!importantes!do!escalonamento!dos!chips!quânticos:!o!acoplamento!entre!
q`bits!distantes.!Como!foi!visto!na!seção!III9.d,!o!acoplamento!local!–!ou!seja,!entre!q`bits!
vizinhos!–!pode!ser!feito!utilizando`se!os!mesmos!elementos!de!circuito:!junções!Josephson,!
indutores!e!capacitores.!Mas!essa!solução!não!funciona!para!q`bits!distantes.!Aproveitando!
o! experimento! de! Wallraff,! Majer! e! colaboradores50! demonstraram! o! acoplamento! entre!
dois!q`bits!separados!por!incríveis!5!mm!!O!esquema!é!mostrado!na!figura!III9.10.!O!sucesso!
desse! experimento! abriu! caminho! para! a! fabricação! de! chips! quânticos! contendo! dezenas!
de!q`bits.!!
!
!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
50
!Coupling%superconducting%qubits%via%cavity%bus,!J.!Majer,!J.!M.!Chow,!J.!M.!Gambetta,!Jens!Koch,!B.!R.!
Johnson,!J.!A.!Schreier,!L.!Frunzio,!D.!I.!Schuster,!A.!A.!Houck,!A.!Wallraff,!A.!Blais,!M.!H.!Devoret,!S.!M.!Girvin!e!
R.!J.!Schoelkof,!Nature$Letters!449!(2007)!443.!Veja!também:!Building%logical%qubits%in%a%superconducting%
quantum%system,!J.!M.!Gambetta,!J.!M.!Chow!e!M.!Steffen,!NPJ$Quantum$Information!(2017)!2.!

! 295!
!
!
Figura! III9.10! –! Esquema! para! o! acoplamento! entre! dois! q`bits! de! carga! separados! por! uma!
distância!de!5mm,!por!meio!de!uma!guia!de!onda.!Acima,!as!posições!dos!dois!q`bits!e!o!perfil!do!
campo! elétrico! dentro! da! guia.! Abaixo,! imagem! da! montagem! experimental! construída! por!
litografia!óptica!(ver!referências)!
! !

A!figura!III9.11!mostra!quatro!desses!chips!construídos!pela!IBM,!utilizando!essa!tecnologia!
e!contendo!dois,!três,!quatro!e!oito!q`bits.!A!foto!do!canto!direito!embaixo!(com!oito!q`bits)!
mostra!o!detalhe!de!uma!imagem!micrográfica!de!um!q`bit!acoplado!à!guia!de!onda.!!
!
Usando!essa!tecnologia,!em!novembro!de!2017!a!IBM!anunciou!um!chip!quântico!de!50!q`
bits,! e,! em! março! do! ano! seguinte! (data! em! que! essa! seção! é! escrita),! a! Google! anunciou!
uma! arquitetura! contendo! 72! q`bits.! O! grande! desafio,! agora,! é! aumentar! os! tempos! de!
descoerência!(da!ordem!de!dezenas!de!microssegundos)!e!operar!plenamente!esses!chips!
para!resolver!problemas!reais.!

! 296!
!

Figura! III9.11! –! Imagens! de! chips! quânticos! construídos! pela! IBM,! contendo! dois! (acima,!
esquerda),!três!(acima,!direita),!quatro!(abaixo,!esquerda)!e!oito!q`bits.!Em!novembro!de!2017!a!
empresa! anunciou! a! construção! de! um! chip! contendo! 50! q`bits! e! em! março! de! 2018,! a! Google!
anunciou!o!seu!próprio!chip!quântico,!contendo!72!q`bits!
! !
Superadas! as! dificuldades! técnicas! para! o! controle! da! descoerência! nesses! sistemas,! é!
possível!que!a!ciência!da!computação!sofra!uma!profunda!mudança!em!direção!a!um!novo!
paradigma!de!computadores,!com!reflexos!imediatos!para!toda!a!ciência!e!tecnologia,!o!que!
deve!acontecer!nos!próximos!anos.!Tudo!isso!é!consequência!de!duas!áreas!da!física!que!se!
desenvolveram! em! paralelo,! partindo! mais! ou! menos! na! mesma! época:! a! computação!
quântica!e!a!nanotecnologia.!!
!

Computação% quântica% adiabática% –% Para! encerrar! esse! curso,! vamos! agora!


discutir! brevemente! o! importante! tópico! da! computação! quântica! adiabática.! Trata`se! de!
um!modelo!de!computação!quântica!alternativo!ao!de!circuitos!(veja!Seção!III7),!mas!com!a!

! 297!
propriedade!de!que!ambos!podem!ser!formalmente!mapeados!um!no!outro,!o!que!garante!
a!universalidade!da!computação!quântica!adiabática51.!!
!
Grosso$ modo,! a! computação! quântica! adiabática! consiste! em! se! encontrar! o! estado!
fundamental!de!um!hamiltoniano!cujos!parâmetros!são!desconhecidos,!a!partir!da!evolução!
de!um!outro!mais!simples,!com!parâmetros!conhecidos.!
!
Formalmente,!a!computação!quântica!adiabática!é!um!tipo!do!que!se!chama!em!informação!
quântica! “recozimento! quântico”! (quantum$ annealing,! em! inglês).! Esse! nome! se! deve! ao!
fato!de!que!o!processo!de!busca!pelo!valor!mínimo!de!um!hamiltoniano!é!feito!por!meio!da!
flutuação!da!energia!do!sistema,!como!se!ele!“esquentasse”!e!“resfriasse”,!tal!como!ocorre!
em!um!processo!de!tratamento!térmico!de!um!material!qualquer.!
!
Um!algoritmo!de!computação!quântica!adiabática!consiste!essencialmente!na!execução!de!
dois! passos:! primeiro,! encontra`se! um! hamiltoniano! cujo! estado! fundamental! codifique! a!
solução! do! problema! numérico! que! se! quer! resolver.! Depois,! parte`se! do! estado!
fundamental!de!um!hamiltoniano!conhecido!e!implementa`se!uma!transformação!unitária!
adiabática! até! o! hamiltoniano! alcançar! aquele! do! passo! anterior.! O! teorema! da!
adiabaticidade51! garante! que! ao! longo! de! todo! o! processo! o! sistema! permanecerá! no! seu!
estado! fundamental! instantâneo.! O! processo! tem! o! atrativo! de! ser! robusto! à! ação! do!
ambiente,!o!que!permite!o!aumento!do!número!de!q`bits!do!sistema.!
!
O! requisito! da! unitariedade! da! transformação! significa! que! o! hamiltoniano! no! instante! !,!
!(!),!obedece!à!equação!de!Schroedinger:!
!
!|!(!) (III9.49)!
!ℏ = !(!)|!(!) %
!"
!
Se! o! hamiltoniano! inicial! é! !(0)! e! o! final! ! ! ,! onde! !! é! o! tempo! para! realizar! a!
transformação! ! 0 → ! ! ,! e! se! Δ!!"# ! é! o! menor! gap! de! energia! entre! o! estado!
fundamental! e! o! primeiro! estado! excitado! de! !(!),! o! teorema! da! adiabaticidade! garante!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
51
!Adiabatic%quantum%computation,!T.!Albash!e!D.A.!Lidar,!Rev.$Mod.$Phys.!90!(2018)!015002`1.!

! 298!
que! o! sistema! permanecerá! no! estado! fundamental,! na! medida! em! que! a! transformação!
ocorra!em!um!tempo!não!menor!que:!
!
1 (III9.50)!
!~ ! !
ΔE!"#
!
A!transformação!é,!explicitamente,!escrita!como:!
!
!
! ! (III9.51)!
! ! = 1 − ! 0 + !(!)!
! !
!
com!!!variando!de!0!a!!,!observada!a!condição!(III9.50).!Uma!aplicação!desses!conceitos!em!
um!experimento!de!ressonância!magnética!nuclear!pode!ser!visto!no!artigo!de!Peterson!e!
colaboradores52.!
!
A!computação!quântica!adiabática!é!o!modelo!de!computação!utilizado!nos!chips!quânticos!
da! empresa! canadense! D]Wave53,! a! primeira! empresa! de! computação! quântica! fundada.!
Com! relação! à! arquitetura! do! chip,! a! D]Wave! também! usa! redes! de! junções! Josephson!
formando!q`bits!do!tipo!fluxo.!Contudo,!não!há!acoplamento!entre!q`bits!distantes!via!guias!
de! onda,! como! no! caso! do! chip! da! IBM;! cada! q`bit! se! acopla! apenas! com! seus! primeiros!
vizinhos,! o! que! permite! mapear! a! rede! em! um! modelo! de! cadeia! de! spins! acoplados,!
conhecido! como! modelo! de! Ising51,54.! Com! essa! arquitetura,! a! D]Wave! anunciou,! em!
setembro!de!2016,!um!processador!contendo!2000!q`bits.!!
!
Apesar! de,! formalmente,! a! computação! quântica! adiabática! ser! mapeável! em! um! modelo!
universal! de! circuitos,! os! problemas! que! a! D]Wave! promete! resolver! com! seus!
computadores! quânticos! são! restritos! a! problemas! de! otimização,! reconhecimento! de!
padrões!(machine$learning),!análise!de!mercado!financeiro,!dentre!outros!da!mesma!classe.!
Porém,! até! o! momento! em! que! este! texto! é! concluído! (agosto! de! 2018),! falta! ainda! na!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
52
!Reliability%of%digitized%quantum%annealing%and%decay%of%entanglement,!J.P.S.!Peterson!et!al.,!Annelen$der$
Physik,!530!!(2018)!1800007.!
53
!https://www.dwavesys.com/quantum`computing!!
54
!O!modelo%de!Ising!é!um!caso!particular!do!hamiltoniano!(II10.1)!no!qual!só!aparecem!as!componentes!Z!dos!
spins.!Veja!também:!D_Wave%quantum%computing%Ising%model:%a%case%study%for%the%forecasting%of%heat%
waves,!D.!Zubov!e!F.V.M.!Khosravy,!Proc.$Int.Conf.$Contr.$Aut.$Inf.$Sci.!(ICCAIS)!2015.!

! 299!
literatura!um!relato!de!solução!de!algum!problema!importante!por!um!chip!quântico!que,!
provadamente,!não!possa!ser!resolvido!por!computadores!clássicos.!O!cenário,!contudo,!é!
otimista!e!espera`se!que!brevemente!tal!fato!possa!ocorrer.!
!
ENSAIO:%A%CIÊNCIA%NESTE%SÉCULO%
Do! fim! da! Segunda! Guerra! para! cá,! houve! uma! mudança! radical! na! percepção! pública! da!
ciência.! Essa! cultura! passou! de! uma! situação! de! ‘aceitação! inquestionável’,! logo! após! o!
conflito,! para! um! ‘interesse! crítico! em! suas! aplicações’! nas! últimas! décadas.! Parte! dessa!
crítica! foi! impulsionada! pelo! chamado! movimento! ecológico! (ou! verde),! que! passou! a!
chamar! a! atenção! para! o! fato! de! que! o! cartesianismo! –! a! natureza! (entenda`se,! fauna! e!
flora)!estaria!aí!para!ser!explorada!a!qualquer!custo!e!servir!à!humanidade!–!deveria!deixar!
de!ser!um!fio!condutor!para!a!atividade!científica.!!!
!
Hoje,! ciência! é! um! termo! simples! para! explicar! uma! multitude! de! áreas! e! atividades! cujo!
espectro!é!quase!impossível!relatar.!A!humanidade!produziu!mais!conhecimento!do!fim!da!
Segunda! Guerra! até! hoje! do! que! durante! toda! a! história! da! humanidade.! Áreas! surgem! e!
áreas! esmaecem.! Por! exemplo,! há! cerca! de! três! décadas,! ninguém! imaginaria! que! seria!
possível! isolar! uma! entidade! quântica! (fóton,! elétron,! átomo! etc.)! em! uma! ‘armadilha’.! É!
nesse! feito! que! estão! as! origens! da! área! de! informação! quântica,! que! busca! desenvolver,!
por!exemplo,!computadores!extremamente!velozes!e!códigos!invioláveis!–!e!um!dos!temas!
deste!livro.!!
!
Com! o! apoio! de! estudos! em! história! da! ciência,! podemos! dizer! que! o! século! 17! trouxe!
atenção! para! um! novo! tipo! de! cultura! que! hoje! denominamos! ciência.! Esse! acúmulo!
sistemático! de! conhecimento! foi! impulsionado! pela! valorização! da! matemática! como!
linguagem! da! natureza! e! teve! apoio! das! recém`fundadas! academias! científicas,! que!
formalizaram! como! essa! cultura! deveria! ser! estudada.! Ainda! é! motivo! de! discussão! entre!
historiadores!da!ciência!se!houve!uma!mudança!abrupta!chamada!‘Revolução!Científica’!ou!
um!processo!lento!que!se!iniciou!nas!práticas!manuais!da!Idade!Média.!!
!
Nesse! ponto,! vale! citar! uma! síntese! soberba! apresentada! por! Sue! Mansfield! sobre! a!
‘Revolução! Científica’! Segundo! essa! pesquisadora,! esse! período! de! transformação! levou! a!

! 300!
uma!clara!cizânia!em!nossa!visão!(ainda!que!subliminarmente)!de!mundo,!a!saber:!de!um!
lado,!ficaram!os!homens,!o!cérebro!e!a!ciência;!de!outro,!as!mulheres,!o!corpo!e!a!natureza.!
Essa!divisão!parece!permanecer!até!hoje,!mesmo!na!academia.!
Hoje,! a! cultura! científica,! depois! de! séculos! de! reducionismo,! parece! dar! mais! atenção! à!
multidisciplinaridade.!Na!física,!a!área!de!sistemas!complexos!é!um!exemplo!nesse!sentido,!
já!que!o!fenômeno!da!complexidade!surge!em!várias!áreas!da!natureza!–!inclusive!nas!ditas!
ciências!sociais!(comportamento!de!multidões,!por!exemplo).!
!
Para! pensadores! influentes,! como! o! filósofo! britânico! John! Gray,! a! ciência! é! a! ‘grande!
utopia’! deste! século.! O! papel! desempenhado! pela! física! –! principalmente,! a! nuclear! –! no!
pós`guerra!é!hoje!exercido!pelas!chamadas!tecnologias!do!genoma.!O!Projeto!Genoma,!por!
exemplo,!emula,!nas!ciências!biológicas,!a!organização!de!grandes!colaborações!científicas,!
como!foi!o!Projeto!Manhattan,!com!milhares!de!participantes!de!vários!centros!de!pesquisa!
e! universidades,! bem! como! verbas! milionárias.! Como! toda! nova! área! da! ciência,! seus!
especialistas!–!fazendo!bom!uso!do!interesse!da!mídia!nas!‘futurologias’!–!vêm!prometendo!
avanços!–!a!maioria!deles!ainda!não!cumpridos.!!
!
Fala`se,!por!exemplo,!em!cura!das!maiorias!das!doenças,!manipulação!genética!de!embriões!
–!e,!portanto,!o!fim!de!males!de!fundo!congênito!–!e!mesmo!sobre!a!clonagem!de!humanos!
–! esta! última,! tabu,! por! questões! éticas! e! religiosas.! Fala`se! mais! recentemente! em!
transumanismo,!como!um!modo!de!o!ser!humano!poder!transcender!seu!corpo!físico!e!ter!
sua!mente!armazenada!em!algo!comparável!a!um!‘nuvem’!de!dados,!um!ciberespaço.!Com!
isso,! o! H.$ sapiens! completaria! um! tipo! de! ‘sonho! final’,! iniciado,! segudo! Harari,! ainda! na!
‘Revolução! Científica’:! vencer! a! morte.! Essa! é! a! grande! promessa! da! ciência! deste! século,!
que,!para!dar!conta!desse!programa,!cerra!trincheiras!com!áreas!como!inteligência!artificial!
e!tecnologias!correlatas!–!o!que!não!exclui!a!própria!informação!quântica,!por!exemplo.!!
!
Ainda! que! ideia! no! campo! da! ficção! científica,! os! críticos! desse! programa! lançam! uma!
pergunta! simples:! quem! irá! administrar! o! provedor! onde! todas! as! consciências! estariam!
‘imortalmente’!armazenadas?!Uma!potência!confiará!à!outra!tarefa!tão!delicada!e!que,!sem!
dúvida,!envolverá!questões!de!segurança!nacional?!O!mais!provável,!como!aponta!Gray,!é!

! 301!
que!o!transumanismo!e!o!ciberespaço!irão!refletir!as!configurações!geopolíticas!do!mundo!
material,!com!seus!interesses!políticos!e!econômicos.!
!
Em!geral,!a!história!da!ciência!ensina!que!a!própria!sociedade!trata!de!elaborar!normas!para!
questões! científicas! de! ponta! que! tenham! implicações! éticas! importantes.! Foi! o! caso! dos!
alimentos! geneticamente! modificados.! Em! um! primeiro! momento,! foram! tratados! como!
potencialmente! perigosos! e,! hoje,! são! abundantes! em! produtos! alimentícios! e! nas!
prateleiras!dos!supermercados.!!
!
Nesta! década! de! 2010,! dois! outros! temas! levantam! questões! tidas! como! igualmente!
preocupantes:!i)!a!produção!de!clones!humanos;!ii)!a!fabricação!de!máquinas!que!se!tornam!
autônomas! e,! portanto,! fora! do! controle! dos! humanos.! O! setor! militar! das! grandes!
potências!já!está!atento!aos!desdobramentos!dessas!tecnologias!para!fins!armamentistas!e!
segurança!nacional.!
!
Em! relação! à! matéria! e! radiação! ‒! o! que,! indiretamente,! tem! a! ver! com! a! estrutura! e!
evolução!do!universo!‒,!fala`se!em!uma!teoria!final,!que,!ao!juntar!a!mecânica!quântica!com!
a!gravitação!(ou!seja,!o!mundo!do!extremamente!pequeno!com!o!do!amplamente!grande)!
explicaria!todos!os!fenômenos!da!natureza.!No!entanto,!sabe`se!que!estão!fora!do!escopo!
dessa! teoria! ‒! caso! ela! venha! a! ser! concretizada! ‒! fenômenos! corriqueiros,! como! a!
turbulência.! Além! disso,! questões! de! suma! importância! relativas! à! consciência! e! à! vida!
também!não!estariam!contempladas!nesse!programa.!Afinal,!i)!como!a!matéria!não!viva!se!
torna!viva?;!ii)!como!a!matéria!não!consciente!se!torna!consciente?!Nem!mesmo!se!sabe!se!
a!ciência!terá!respostas!paras!essas!questões.!!
!
Críticos!e!filósofos!apontam!ainda!hoje!a!presença!de!elementos!metafísicos!na!física.!Não!
há!consenso!entre!especialistas!se!(ou!não)!a!ciência!um!dia!poderá!dar!uma!explicação!para!
questões!como!consciência!e!livre!arbítrio.!
!
De!certo!modo,!as!origens!de!programas!científicos!que!tentam!unir!o!macro!com!o!micro!
estão!em!naturalistas!–!o!termo!cientista!só!foi!usado!por!volta!de!1830!pela!primeira!vez!–!
ainda!do!século!17!que!aprenderam!a!ver!o!‘grande’!com!as!lunetas’!e!o!‘pequeno’!com!os!

! 302!
microscópios.!Como!vimos,!dois!séculos!depois,!essa!união!era!uma!característica!da!física,!
como!aponta!Hiebert.!
!
A! ideia! da! ciência! como! uma! cultura! imparcial,! objetiva,! isenta,! apolítica! e! refratária! a!
ideologias!e!às!mazelas!humanas!há!muito!deixou!de!ser!propagada!e!aceita,!por!não!resistir!
a!uma!análise!mais!profunda!de!sua!essência.!A!história!da!ciência!nos!ensina,!por!exemplo,!
que!a!cosmologia,!na!década!de!1930,!voltou!a!ser!envolvida!por!um!conteúdo!significativo!
de!metafísica.!Algo!semelhante!se!passou!com!a!mecânica!quântica,!quando!questões!tidas!
como! metafísicas! (intromissão! da! mente! do! observador! nos! resultados! dos! experimentos;!
colapso! da! função! de! onda;! não! localidade! etc.)! fizeram! (ou! fazem)! parte! do!
desenvolvimento!dessa!teoria,!considerada!a!mais!precisa!da!ciência.!!
!
Até!hoje!a!interpretação!da!mecânica!quântica!é!motivo!de!debate!entre!várias!correntes.!
Mais! recentemente,! pesquisadores! têm! tentado! reconstruí`la! a! partir! de! princípios! físicos!
simples!(axiomas)!–!por!exemplo,!informação!localizada!no!tempo!e!espaço;!conservação!de!
informação;! teorema! da! não! clonagem;! constância! da! velocidade! da! luz! etc.! –! dos! quais!
seria! possível! resgatar! fenômenos! como! superposição,! emaranhamento,! incerteza,! não!
localidade.! Se! esses! esforços! vão! conseguir! levar! a! um! consenso! sobre! as! várias!
interpretações,!é!ainda!dúvida!entre!especialistas.!!
!
É!pouco!conhecido!–!como!apontam!estudos!históricos!–!que!o!espiritismo!era!um!ramo!da!
física!levado!a!sério!no!final!do!século!19!–!principalmente,!no!Reino!Unido,!onde!esse!tipo!
de!estudo!foi!conduzido!por!cientistas!da!estatura!de!William!Crookes!(1832`1919),!que!os!
publicava! inicialmente! com! a! anuência! da! Royal! Society.! Até! hoje,! parte! substancial! dos!
pesquisadores! no! mundo! acredita! na! eficácia! da! homeopatia,! mesmo! que! periódicos!
médicos! de! prestígio! (The$ Lancet,! por! exemplo)! já! tenham! mostrado! um! sem`número! de!
vezes! que! não! há! evidências! experimentais! que! sustentem! essa! crença.! No! entanto,! no!
Brasil!–!e,!certamente,!em!outros!países!–,!é!possível!fazer!pós`graduação!nesse!tema.!
!
Voltando! à! chamada! gravidade! quântica.! Dois! modelos! têm! a! liderança! nessa! busca:! i)!
supercordas,!que!preveem!a!existência!de!um!sem`número!de!novas!partículas!elementares!
(ditas! supersimétricas)! e! de! dimensões! extras,! para! além! das! quatro! do! espaço`tempo;! ii)!

! 303!
gravidade! quântica! em! laço! (loop),! que! dispensa! esses! dois! elementos! propostos! pelas!
supercordas,!mas!defende!a!não!existência!do!espaço!e!tempo!nas!dimensões!quânticas.!!
Filósofos! –! e! descrentes! nos! programas! de! gravidade! quântica! –! ou! veem! aspectos!
metafísicos! nessas! tentativas,! ou! mesmo! descartam! esses! programas! como!
‘pseudocientíficos’,!pela!impossibilidade!de!comprovar!experimentalmente!previsões!desses!
modelos.! Críticas! semelhantes! recaem,! por! exemplo,! sobre! modelos! de! multiversos,! que!
preveem!um!sem`número!de!universos!‘paralelos’,!sem!comunicação!entre!si.!
!
Quanto!às!relações!entre!ciência!e!política,!o!caso!emblemático!é!o!apoio!do!ditador!Josef!
Stalin!(1878`1953)!às!ideias!–!hoje,!sabidamente!equivocadas!e!retrógradas!–!do!biólogo!e!
agrônomo!soviético!Trofim!Lysenko!(1898`1976)!sobre!genética,!o!que!custou!a!morte!por!
fome!de!provavelmente!dezenas!de!milhões!de!pessoas!na!União!Soviética.!Um!caso!atual!é!
o!do!governo!norte`americano!em!relação!às!questões!climáticas!e!ao!bem`estar!de!animais!
para!pesquisa.!!
!
Como!atividade!humana!que!é,!a!ciência!esteve,!está!‒!e!sempre!estará,!provavelmente!‒!
navegando! sob! a! ação! dos! ventos! das! ideologias! e! do! poder! político! e! econômico! das!
nações.! Nos! EUA! de! hoje,! parte! substancial! da! pesquisa! em! física! é! subsidiada! por! verbas!
ligadas!a!questões!de!defesa!ou!segurança!nacional.!Basta!ver!o!alcance!–!para!ficar!em!um!
só! exemplo! –! do! financiamento! da! Darpa! (sigla,! em! inglês,! para! Agência! de! Projetos! de!
Pesquisa!Avançada!em!Defesa)!no!campo!da!pesquisa!científica!e!tecnológica!naquele!país!–!
lembrando! que! essa! agência! é! um! aparato! diminuto! do! chamado! Complexo! Militar`
Científico`Industrial!dos!EUA,!que!tem!ciência!e!tecnologia!como!‘cerne’!de!sua!atuação.!
!
Vale!lembrar!que!os!conflitos!geram!tecnologias!que!trazem!bem`estar!para!as!populações!
em! nível! planetário.! Por! exemplo,! a! Primeira! Guerra! gerou! os! fertilizantes! industriais,! as!
lâmpadas! de! ultravioleta,! os! absorventes! femininos,! os! raios! X! portáteis,! o! controle! de!
tráfego! aéreo! e! drones.! Da! Segunda! Guerra,! herdaram`se! a! cabine! pressurizada! e! as!
turbinas!dos!aviões,!a!penicilina!médica,!o!café!solúvel,!os!computadores!de!grande!porte,!o!
radar,!a!energia!nuclear,!os!foguetes!de!lançamento!de!satélites!etc.!
!

! 304!
A! relação! íntima! –! e,! principalmente,! longeva! –! entre! ciência! e! militarismo! se! deu,! como!
vimos,!ainda!na!Primeira!Guerra!Mundial!e!se!acentuou!depois!do!fim!do!segundo!conflito!
de!proporções!quase!planetárias.!Para!se!ter!uma!ideia,!os!percentuais!do!financiamento!de!
origem!militar!impressionavam!já!no!final!da!década!de!1940:!96%!de!todas!as!verbas!para!a!
pesquisa!básica!em!física!nos!EUA!vinham!de!agências!federais!ligadas!à!defesa.!Em!meados!
da! década! seguintes,! essa! cifra! cresceria! para! 98%.! Essas! fontes! fizeram! o! financiamento!
para! a! pesquisa! básica! –! em! todas! as! áreas! da! ciência!! –! aumentar! cerca! de! 25! vezes! se!
comparados!aos!números!anteriores!à!guerra.!
!
No!Brasil,!o!Departamento!de!Física!da!Universidade!de!São!Paulo!fez!pesquisa!militar,!ao!
desenvolver!um!sonar!para!a!Marinha!do!Brasil,!ocasião!em!que!Wataghin!foi!proibido!de!
frequentar! –! sob! protestos! do! jovem! César! Lattes,! então! seu! assistente! –! as! áreas! do!
departamento!em!que!eram!feitos!esses!estudos,!pelo!fato!de!ele!ter!origem!italiana.!
!
Essa!relação!mais!estreita!ente!política!e!ciência!data!ainda!do!século!18,!quando!–!talvez,!
pela! primeira! vez,! como! mostram! estudos! de! história! da! ciência! –! cientistas! renomados!
foram! convidados! a! participar! de! decisões! governamentais! –! mais! especificamente,! como!
parte! de! um! comitê! que! daria! um! prêmio,! no! Reino! Unido,! para! quem! resolvesse! o!
chamado!problema!da!longitude,!que!tinha!implicações!políticas!e!econômicas!importantes!
à!época.!!
!
A! ciência! saiu! com! uma! imagem! arranhada! da! Primeira! Guerra,! por! conta! de! sua!
participação!no!desenvolvimento!de!gases!usados!nos!campos!de!batalha,!da!metralhadora,!
da!aviação!militar,!dos!tanques!etc.!Com!a!Segunda!Guerra,!ganhou!o!estatuto,!como!vimos,!
de! cultura! que! levou! à! vitória! e! à! paz! no! mundo,! por! conta! do! radar,! a! quebra! do! código!
secreto!dos!nazistas!e!dos!artefatos!nucleares.!!
!
A! mídia! e,! principalmente,! os! divulgadores! da! ciência! –! que,! em! geral,! parecem! ser!
militantes! treinados! para! agir! como! seguidores! ‘cegos’! dessa! cultura! –! têm! parcela!
significativa! de! culpa! na! disseminação! acrítica! da! ciência! –! o! que! é! ruim,! por! ir! contra! a!
própria!essência!dessa!cultura.!A!divulgação!científica!serviu!–!com!mais!intensidade!a!partir!
da!Segunda!Guerra!–!para!disseminar!conceitos!equivocados,!em!cenários!de!controvérsia!e!

! 305!
luta! pelo! poder! de! comunidades! de! especialistas! e! interesses! políticos! governamentais.!
Hoje,! fala`se! muito! em! ‘alfabetização! científica’,! mas! pouco! em! ‘artística’,! ‘literária’,!
‘poética’!ou!mesmo!‘política’!etc.!Ecos!de!uma!cultura!vencedora.!
Do! ponto! da! vista! da! mídia,! uma! possível! solução! é! ter! em! mente! o! que! defende,! por!
exemplo,! o! experiente! jornalista! científico! norte`americano! John! Horgan:! não! pregar! para!
convertidos,!ou!seja,!a!ciência!é!uma!cultura!que!precisa!ser!criticada.!Mas!isso,!na!prática,!
parece! valer! pouco:! em! jornais! e! revistas,! há! crítica! de! cinema,! literatura,! artes,! esportes!
etc.!Mas!a!ciência!parece!imune!a!essa!atitude.!
!
Há! um! relevante! e! notável! aspecto! paradoxal! na! cultura! que! tem! gerado! riqueza! para! as!
nações! e! bem`estar! para! as! populações:! ela! está! intimamente! envolvida! nas! guerras! e! na!
destruição! planetária,! da! atmosfera,! da! fauna! e! da! flora! –! destas! duas! últimas,! em! escala!
industrial,!apoiada!em!métodos!científicos.!E!isso!parece!ser!inerente!à!própria!contradição!
presente!na!natureza!humana!–!e!que!só!cabe!a!nós!resolver.!!
!
Para!Gray,!a!grande!utopia!de!nossos!dias!é!a!crença!de!que!o!acúmulo!de!conhecimento!irá!
mudar!(para!melhor)!a!natureza!humana.!Tudo!indica!que!isso!se!mostrará!como!mais!uma!
das!grandes!utopias.!Isso!deriva!do!fato!de!acreditarmos!na!noção!de!progresso,!que!só!faz!
sentido!só!em!ciência!e!culturas!derivadas,!mas!não!em!artes!e!literatura,!ética!e!política,!
por! exemplo.! Como! enfatiza! Gray,! ética! e! política! são! expedientes! temporários.! E! mesmo!
avanços! materiais! gerados! pelo! conhecimento! científico! acabam! destruídos! quando! há!
guerras.!
!
Resumidamente:!tudo!indica!que!a!ciência!será!a!utopia!deste!século,!assim!como!!foram,!
nos! últimos! 100! anos,! o! nazismo,! o! comunismo! e! –! para! muitos! especialistas! –! a! atual!
globalização.! Se! suas! promessas! irão! vingar,! é! assunto! para! o! futuro.! Segundo! o! filósofo!
britânico,!assim!como!essas!utopias,!a!ciência!tem!características!de!uma!religião!ateia.!Ela!
oferece,! neste! século,! um! ‘paraíso’! sem! morte,! enquanto! o! cristianismo! promete! um!
paraíso!‘nos!céu’,!e!o!comunismo!ofertava!algo!semelhante!na!Terra.!
!
Como!disse!Einstein:!“Uma!coisa!eu!aprendi!ao!longo!da!vida.!A!ciência,!quando!comparada!
à! realidade,! é! primitiva! e! infantil! –! e,! no! entanto,! é! a! coisa! mais! preciosa! que! temos”.!

! 306!
Sabiamente,!um!dos!maiores!físicos!de!todos!os!tempos!parece!ter!percebido,!a!seu!modo,!
algo!da!contradição!inerente!a!essa!cultura.!!
%
%
Problemas%%
1. A!sensibilidade!de!um!material!fotossensível!é!definida!como:!
!! !
!= !
!! ℏ!
onde!!! !é!o!número!de!fótons!que!incide!na!superfície,!e!!! ,!o!número!de!elétrons!
ejetados.!Calcule!!! !para!um!material!com!! = 10!"/!,!sabendo!que!!! = 10! !e!
o!comprimento!de!onda!da!radiação!incidente!é!de!! = 0,55!!".!!
2. Um! elétron! se! encontra! em! um! poço! de! potencial! unidimensional! com! paredes!
infinitas!e!largura!! = 5!".!Encontre!os!comprimentos!de!onda!dos!fótons!emitidos!
dos!estados!excitados!! = 2!e!! = 3!para!o!estado!fundamental.!!Compare!com!os!
comprimentos!de!onda!do!espectro!visível!e!também!com!aqueles!correspondentes!
às!mesmas!transições!no!átomo!de!hidrogênio.!!
3. Um! elétron! é! acelerado! em! um! TEM! por! eletrodos! com! diferença! de! potencial! de!
250!kV.!Use!a!Eq.(III4.9)!para!avaliar!o!comprimento!de!de!Broglie!do!elétron.!
4. Discuta!que!tipo!de!microscopia!seria!mais!adequada!para!produzir!imagens!de:!a)!
um! fio! de! cabelo! humano,! b)! uma! célula! sanguínea,! c)! um! transistor! de! última!
geração!da!Intel,!d)!uma!molécula!de!DNA,!e)!um!átomo.!!
5. Para!um!elétron!confinado!em!um!poço!quântico,!calcule!as!dimensões!do!poço!para!
que!o!primeiro!estado!excitado!esteja!a!30!MeV!do!estado!fundamental.!!
6. Em! litografia! óptica,! um! dos! limitadores! da! resolução! máxima! alcançada! por! um!
equipamento!é!a!superposição!de!feixes!de!luz!difratados!por!diferentes!aberturas.!
O! chamado! critério! de! Rayleigh! estabelece! a! distância! mínima! para! a! resolução! de!
dois!objetos55,!!!"# :!
!
!
!!"# = ! !
!"
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
55
!Em!ingles,!denominado$Minimum$Feature$Size,!MFS.!

! 307!
Nessa!expressão,!NA!é!a!abertura!do!sistema!óptico,!e!k!uma!constante!que!depende!
apenas! das! características! do! equipamento,! conhecida! como! fator! de! resolução.!
Calcule! !!"# ! para! a! luz! visível,! ! = 436! nm,! radiação! ultravioleta,! ! = 200! nm,! e!
raio`X,!! = 10!nm.!Considere!! = 0,25!e!!" = 0,93.!
7. Objetos!na!escala!nano!precisam!ter!caracterizados!a!sua!estrutura!e/ou!composição!
química.! Uma! das! técnicas! mais! poderosas! na! análise! da! composição! química! de!
objetos! em! nível! atômico! é! a! RBS,! sigla,! em! inglês,! para! Rutherford$ Backscattering$
Spectroscopy! (espectroscopia! de! retroespalhamento! de! Rutherford,! em! uma!
tradução!livre).!Um!íon!com!energia!cinética!inicial!!! !e!massa!!! !incide!sobre!um!
alvo!e,!após!interagir!com!um!íon!com!massa!!! !do!alvo,!é!espalhado!de!um!ângulo!
!.!!A!energia!do!íon!espalhado!é!dada!por:!
!
!
! !
1 − (!! )! !"!! ! + !! !"#$
! !
!!"# = !! !! !
1+!
!

!
O!espalhamento!máximo!ocorre!para!! = 180! !e,!como!essa!expressão!depende!da!
massa! do! íon! do! alvo,! medir! a! energia! dos! íons! retro`espalhados! permite! obter! a!
massa! do! íon! do! alvo.! Calcule! !!"# ! para! íons! de! !" ! com! !! = 1!MeV! retro`
espalhados!sobre!alvos!de!C,!N!e!O.!!
8. Em!um!AFM!operado!no!chamado!“modo!de!não`contato56”!entre!a!ponta!da!haste!
do!microscópio!e!a!superfície!da!amostra,!a!principal!força!envolvida!na!operação!é!a!
interação! de! van! der! Waals,! que! surge! a! partir! das! flutuações! de! dipolos! elétricos!
entre!átomos!próximos.!a)!Mostre!que!para!o!estado`s:!
!
! !!/!!
!!! = !
4!!!!
!
onde! !! ! é! o! raio! de! Bohr,! o! valor! esperado! do! momento! de! dipolo! elétrico,! ! =
−!!,!é!zero,!mas!do!seu!quadrado,!!! = ! ! ! ! ,!é!diferente!de!zero;!b)!Baseado!no!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
56
!Nesse!modo,!a!ponta!da!haste!não!entra!em!contato!com!a!superfície!da!amostra.!Existe!o!“modo!de!
contato”,!em!que!a!ponta!da!haste!tem!contato!direto!com!a!superfície!a!ser!estudada.!

! 308!
resultado!do!item!(a),!argumente!como!átomos!neutros!com!distribuições!esféricas!
de!carga!(por!exemplo,!os!gases!nobres)!podem!interagir!via!força!de!van!der!Waals!
e! faça! uma! estimativa! da! intensidade! da! interação! para! dois! átomos! neutros!
separados!por!1!nm.!!!!
9. Um! MFM! opera! com! uma! partícula! magnética! esférica! de! raio! !! e! magnetização!
! = !!! na! ponta! de! uma! haste.! Calcule! a! força! magnética! exercida! sobre! um!
momento!magnético!de!1!!! !em!uma!posição!!!abaixo!da!esfera!magnética,!e!faça!
uma!estimativa!numérica!usando!os!seguintes!valores:!!
! = 50!Å, !! ! = 2,2!tesla, ! = 10!Å.!
10. Considerando!o!problema!anterior!de!um!MFM,!calcule!a!componente!!!do!campo!
magnético! sobre! um! segundo! momento! magnético! de! mesmo! valor,! localizado! na!
mesma! altura,! mas! a! uma! distância! ! = 50!Å! da! partícula! magnética! da! haste.!
Obtenha!também!a!componente!z!da!força.!
11. A!força!mínima!detectável!em!um!MRFM!é!dada!por:!
!

4!!! !"
!!"# = !
!! !

!
onde!!!é!a!constante!elástica!da!haste;!!! = !! /2!,!a!frequência!de!ressonância;!!,!
o!fator!de!qualidade!do!sistema;!e!!,!a!sua!“largura!de!banda”;!e!!,!a!temperatura.!
Faça!uma!estimativa!dessa!força!para!! = 100!mK!e!400!K,!utilizando!os!seguintes!
valores:!! = 0,0042!N/m,!!! = 2!×23!rd/s,!! = ! 10! !e!! = 0,6!kHz.!
12. !Junções! Josephson! são! dispositivos! supercondutores! com! grande! potencial! de!
aplicação!em!eletrônica!digital!e!computação!quântica,!devido!às!propriedades!não`
lineares!que!surgem!da!natureza!quântica!macroscópica!dos!pares!de!Cooper.!Uma!
junção!Josephson!é!formada!por!dois!eletrodos!supercondutores!separados!por!uma!
camada!muito!fina,!da!ordem!de!1!nm,!de!um!óxido.!A!função!de!onda!de!um!par!de!
Cooper!em!um!dos!eletrodos!é!dada!por:!
!
! !, ! = ! ! !"(!,!) !
!!!!!!!!!!!!!!!

! 309!
Para! uma! diferença! de! potencial! !! entre! os! eletrodos,! a! energia! de! um! par! de!
Cooper! será! igual! a! ! = −2!".! a)! Use! essa! energia! e! a! equação! de! Schroedinger!
dependente! do! tempo! para! deduzir! a! seguinte! equação! diferencial! para! a! fase! da!
função!de!onda:!
!" 2!"
= !
!" Φ!
!
onde!Φ! = ℎ/2!!é!o!quantum!de!fluxo!magnético.!Calcule!o!valor!de!Φ! !e!faça!uma!
análise! dimensional! para! demonstrar! que! sua! unidade! é! de! fato! a! de! fluxo!
magnético;!b)!pares!de!Cooper!dos!dois!eletrodos!supercondutores!podem!tunelar!
através! da! junção! dando! origem! a! uma! corrente! elétrica.! Josephson! mostrou! que!
esta!corrente!de!tunelamento!é!dada!por:!
!
! = !!" !"# ∆! !
!
onde! !!" ! é! a! corrente! máxima! (ou! crítica)! que! pode! atravessar! a! junção;! e! ∆!,! a!
diferença! de! fase! das! funções! de! onda! dos! pares! nos! dois! eletrodos.! Integre! a!
equação!para!a!fase!com!uma!diferença!de!potencial!DC!e!mostre!que!uma!corrente!
AC!aparece!através!da!junção.!Faça!uma!estimativa!da!frequência!dessa!corrente!AC!
para!uma!diferença!de!potencial!de!10!!V.!
!
13. Um!modelo!simples!para!o!efeito!Josephson!pode!ser!derivado!da!seguinte!forma:!
considere! dois! eletrodos! supercondutores! separados! por! uma! camada! fina! de! um!
óxido.!Sejam!as!funções!de!onda!em!cada!eletrodo!dadas!por:!
!
!! = ! exp !!! !e!!!! = ! exp !!! !!
!
!!!!!!!!!!!!!!onde!!! = ! ∙ !! !e!!!! = ! ∙ !! .!!Considerando!a!superposição!abaixo:!
!
!! + !"!
!= !
2
!

! 310!
use! a! definição! quântica! de! corrente! para! calcular! a! corrente! de! tunelamento!
através!da!junção.!
14. Dispositivos! eletrônicos! que! operam! com! um! único! elétron! se! baseiam! em! pontos!
quânticos.! Um! ponto! quântico! pode! ser! visto! como! um! capacitor! na! escala!
nanométrica:!se!o!ponto!contém!um!elétron,!a!energia!necessária!para!colocar!um!
segundo!elétron!aumenta!rapidamente,!segundo!as!dimensões!do!ponto!diminuem.!
A! energia! para! transferir! um! elétron! por! tunelamento! para! um! ponto! quântico! é!
dada!por:!
!!
!= !
2!
!
onde! !! é! a! capacitância! do! ponto! quântico.! Um! outro! parâmetro! importante! é! a!
chamada! resistência! de! tunelamento,! !! ,! associada! ao! tempo! necessário! para!
carregar!o!capacitor:!Δ! = !! !.!Use!o!princípio!de!incerteza!entre!!!e!Δ!!e!encontre!
uma! relação! entre! !! ! e! o! quantum! de! resistência,! ℎ/! ! .! Calcule! o! valor! dessa!
quantidade.!
15. Um! dos! problemas! importantes! no! processamento! da! informação! quântica! é! o! da!
distinguibilidade!de!estados.!Para!serem!distinguíveis,!estados!devem!ser!ortogonais!
entre!si.!Considere!um!spin!½!inicialmente!no!estado!!
!
|↑ + |↓
|! = !
2
Mostre! que,! sob! a! aplicação! de! um! campo! magnético! estático! na! direção! Y,! esse!
estado! evoluirá! para! outro! distinguível,! em! um! tempo! mínimo! compatível! com! o!
princípio!de!incerteza.!!
16. A!velocidade!de!processamento!de!um!computador!está!em!última!análise!associada!
à!quantidade!de!energia!disponível!para!as!operações!lógicas.!Para!dada!massa!!,!a!
teoria! da! relatividade! estabelece! que! o! máximo! de! energia! disponível! é! ! = !! ! .!
Usando! esse! fato! e! o! resultado! do! problema! anterior,! faça! uma! estimativa! da!
velocidade!máxima!de!um!processador!com!uma!massa!de!1!kg.!!
17. Considere! o! estado! do! gato! formado! por! dois! spins! nucleares.! Um! pulso! de!
radiofrequência!é!aplicado!ao!longo!da!direção!X!sobre!o!primeiro!q`bit,!produzindo!

! 311!
uma!rotação!igual!a!!.!Imediatamente!após!isso,!um!segundo!pulso!é!aplicado!sobre!
o!segundo!q`bit!produzindo!uma!rotação!de!!.!Calcule!a!matriz!densidade!resultante!
e! encontre! as! condições! sobre! ! + !! para! que! o! emaranhamento! permaneça!
máximo.!!
18. Uma!das!propostas!teóricas!mais!originais!de!um!processador!quântico!foi!feita!no!
ano! de! 2000! por! G.P.! Berman! e! coautores57,! utilizando! MRFM! em! um! sistema! de!
estado!sólido!com!spins!nucleares!e!eletrônicos!acoplados.!Considere!uma!“linha!de!
átomos”! em! uma! matriz! não! magnética,! cada! átomo! tendo! um! único! elétron!
acoplado!a!um!núcleo!de!spin!1/2.!!Os!átomos!se!encontram!a!100!Å!da!superfície!
do! material! (matriz),! e! a! separação! entre! eles! é! de! 50!Å.! A! ponta! da! haste! do!
microscópio! tem! uma! partícula! magnética! esférica! com! raio! também! de! 50!Å.! Um!
campo! estático! e! homogêneo! de! 10! T! é! aplicado! ao! sistema.! a)! Calcule! as!
polarizações! eletrônica! e! nuclear! nesse! campo,! para! uma! temperatura! de! 1! K.! b)!
calcule! o! deslocamento! em! frequência! da! ressonância! eletrônica! causado! pelo!
campo! provocado! pela! haste;! c)! leia! o! artigo! de! Bergman! e! coautores! e! descreva!
como!uma!operação!CNOT!pode!ser!implementada!com!essa!proposta.!!!
19. Uma! das! realizações! experimentais! mais! importantes! na! área! da! informação!
quântica! é! o! controle! dos! estados! de! fótons! e! átomos! que! interagem! entre! si! nas!
chamadas! cavidades! eletrodinâmicas.! O! hamiltoniano! modelo! de! tal! sistema! é!
chamado! de! hamiltoniano! de! Jaynes`Cummings,! que! considera! fótons! interagindo!
com!um!único!átomo!de!dois!níveis:!
!
ℏ!!
!= ! + ℏ!!! ! + ℏ! !! !! + !!! !
2 !
!
Nesse!hamiltoniano,!o!primeiro!termo!representa!o!átomo!livre;!o!segundo,!fótons!
livres;!e!o!terceiro,!a!interação!entre!eles.!Dentro!do!parênteses,!o!primeiro!termo!
representa!a!emissão!de!um!fóton,!seguida!do!abaixamento!do!spin,!e!o!segundo!
termo,!o!processo!contrário:!a!absorção!de!um!fóton,!seguida!do!levantamento!do!
spin.!a)!Considerando!um!estado!genérico!de!!!fótons:!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
57
!G.!P.!Berman,!G.!D.!Doolen,!P.!C.!Hammel!e!V.!Y.!Tsifrinovich,!Solid_state%nuclear%spin%quantum%computer%
based%on%magnetic%resonance%force%microscopy,!Phys.$Rev.$B!61!(2000)!14694.!

! 312!
!
! = ! !, 1 + !|! + 1,0 !
!
encontre! !!e!!! para! que! esse! seja! um! autoestado! do! termo! de! interação;! b)!
reescreva!o!hamiltoniano!na!forma:!
!
! = ℏ!" + ℏ!!! + ℏ! !! !! + !!! !
!
onde!! = !! ! + !! /2,!e!! = !! − ! /2,!!a!diferença!entre!as!energias!do!átomo!
e! do! fóton58;! c)! mostre! que! o! estado! encontrado! no! item! (a)! é! autoestado! desse!
hamiltoniano! para! ! = 0;! d)! Desprezando! o! termo! em! !! e! considerando! os!
autoestados!de!apenas!uma!excitação!simples!do!campo,!|00 , |01 , |10 ,!calcule!a!
matriz!do!hamiltoniano!e!o!operador!de!evolução:!
!
!"
! = exp −! !

! !
e)!calcule!a!probabilidade!de!uma!emissão!espontânea!do!átomo,!dada!por:!
!
!
10|!|01 !
!
20. Calcule! a! entropia! de! Shannon! associada! à! jogada! de! uma! moeda! ligeiramente!
viciada,!para!favorecer!uma!das!faces!com!excesso!de!probabilidade!! = 0,05.!!
!
! !

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
58
!Na!literatura,!esse!parâmetro!é!conhecido!como!detuning!(dessintonia,!em!português).!

! 313!
%
%
%
%
%
%
%
%
%

APÊNDICE%A%
Soluções%dos%Problemas%
%
%
%
%
%
%
%
%
%
%
%
%

! 314!
Bloco%I%
1. Da!expressão!(I2.9),!para!o!comprimento!de!onda!relativo!ao!máximo!da!distribuição!
de!Planck:!

!!
5,097×10!!
!!"# ! = 5,097×10 !! ∙ ! → !!"# = = 0,85×10!! !!!
6000
Este!comprimento!de!onda!está!na!borda!do!infravermelho.!
2. Devemos!usar!aqui!a!Lei!de!Stefan,!! = !! ! :!
! !
1340 !
= 5,67×10!! ! ! ! ! → ! = (236,33×10! )!/! = 390!!!
! ! !
ou!seja,!temperatura!ambiente.!
3. A! energia! relativa! à! massa! de! repouso! do! elétron! é! dada! por! ! = !! ! = 9,11×
10!!" ×(3×10! )! = 8,2×10!!" !!.! Para! calcularmos! a! frequência! do! fóton,!
!"!!!
igualamos! essa! energia! a! hf:! ! = 8,2× !,!
×10!" = 1,24×10!" !!".! Essa!
!
frequência!está!na!faixa!dos!raios!gama.!O!momento!do!fóton!é!dado!por:!! = ! =
! !"!"
ℎ ! = 6,6×10!!" ×1,2× !
×10!! = 2,6×10!!! !!" ∙ !/!.! Finalmente,! o!

comprimento!de!onda:!! = ℎ ! = 2,5×10!!" !!.!!

4. A!partir!da!expressão!para!o!efeito!fotoelétrico:!
!
!! !
ℏ! = ! + = ! + !!
2
!
Substituindo!! = 2,3!!"!!!! = 2!"/! = 2!×3×10! /5,89×10!! = 1,01×10!" !" ∙
! !! ! encontramos:! ℏ! = 0,6582×10!!" !!" ∙ !×1,01×10!" !! = 0,665!!".! Como!
este!número!é!menor!do!que!W,!não!haverá!fotocorrente.!O!comprimento!de!onda!
! !
de!corte!será:!ℏ! = ! = ℎ ! → !! = ℎ ! = 1797!Å.!
!

5. Suponha! que! um! elétron! esteja! inicialmente! em! repouso! sobre! a! origem! de! um!
sistema! de! coordenadas,! e! um! fóton! com! momento! !! ! incida! sobre! ele,! vindo! da!
direção!– !.!Após!o!espalhamento,!o!momento!do!fóton!faz!um!ângulo!!!com!o!eixo!
X,! e! o! do! elétron,! um! ângulo! !.! O! processo! se! passa! no! plano! X]Y.! Se! !! !e!!! ! são,!

! 315!
respectivamente,!os!momentos!do!elétron!e!do!fóton!após!a!colisão,!a!conservação!
do!momento!requer!que:!
!
!! = !! !"#$ + !! !"#$!!(para!a!direção!!), e!!! !"#$ = !! !"#$!(para!!)!
!
Elevando!ao!quadrado!e!somando!as!duas!expressões,!obtemos:!
!
!!! + !!! − 2!! !! !"#$ = !!! !
!
Por!sua!vez,!a!conservação!da!energia!requer!que!a!!energia!cinética!adquirida!pelo!
elétron!!seja!igual!à!diferença!de!energia!do!fóton:!
!
!! − !! = ! !! − !! = !!
!
onde! usamos! a! relação! de! dispersão! para! o! fóton,! ! = !".! Porém,! a! energia!
relativística! total! do! elétron! após! a! colisão! é! ! + !! ! ! ,! a! qual,! segundo! a!
relatividade!restrita,!deve!satisfazer!à!relação:!
!
! + !! ! ! !
= ! ! !!! + !!! ! ! !!ou!
!
! ! + 2!! ! ! ! = ! ! !!! !
!
Substituindo!as!expressões!para!conservação!do!momento!e!energia!nessa!relação,!
obtemos!uma!expressão!envolvendo!apenas!o!momento!do!fóton,!antes!e!depois!da!
colisão:!
!
(!! − !! )! + 2!! ! !! − !! = (!!! + !!! − 2!! !! !"#$)!
!
a!qual!pode!ser!simplificada!para:!
!
1 1 1 ℎ ℎ ℎ
− = 1 − !"#$ = − = 1 − !"#$ = !! − !! = Λ 1 − !"#$ !
!! !! !! ! !! !! !! !

! 316!
!
6. Seja!!!a!coordenada!da!partícula!na!direção!do!anteparo.!Ao!passar!pelo!orifício,!a!
incerteza! na! coordenada! será! ∆!~!,! e! a! incerteza! no! momento,! ∆!~ℎ/!.! Por! sua!
vez,!do!postulado!de!de!Broglie,!! = ℎ/!,!e!a!dispersão!angular!será:!!
!
∆! ℎ ! !
~ × = !
! ! ℎ !
!
Se! existirem! dois! orifícios! em! vez! de! um,! a! incerteza! na! posição! passa! a! ser! a!
distância!entre!eles,!ou!seja,!!.!Porém,!a!incerteza!no!momento!continua!sendo!igual!
a!ℎ/!.!Assim,!para!dois!orifícios,!Δ!Δ!~ℎ!/!.!!
!
7. a)! A! equação! de! Schroedinger! para! o! átomo! de! hidrogênio! é! dada! por! (I14.1).! No!
caso! do! positrônio,! a! única! diferença! é! a! massa! do! pósitron,! igual! à! massa! do!
elétron,! esta,! por! sua! vez,! cerca! de! 2! mil! vezes! menor! do! que! a! do! próton.! As!
autoenergias! são! dadas! por! (I14.2).! Se! o! pósitron! estivesse! parado,! bastaria! dividir!
aquela!expressão!por!2!mil!para!obtermos!as!autoenergias.!No!entanto,!o!que!temos!
que! fazer! é! substituir! !! pela! massa! reduzida! do! sistema:! !! !!"# /(!! + !!"# ) =
!",!
!! /2.!Com!isso,!a!energia!de!ligação!do!positrônio!será!!! = − !
= −6,8!!";!b)!a!

energia! de! cada! fóton! emitido! na! aniquilação! será! igual! à! energia! de! repouso! do!
elétron:! !! = !! ! ! = 0,51!!"#.! Note! que! essa! energia! é! muito! maior! do! que! a!
!
energia! de! ionização.! O! comprimento! de! onda! pode! ser! calculado! de:! ! = ℎ ! =
!

0,024!Å.!Esse!comprimento!de!onda!é!igual!ao!comprimento!de!onda!de!Compton,!
Λ;!c)!a!maior!transferência!de!energia!de!um!fóton!para!um!elétron!ocorre!quando!
há! retroespalhamento,! ou! seja,! quando! ! = !.! Segundo! a! Eq.(I6.2),! isso! significa!
!
!′ = ! + 2Λ = 3Λ,!onde!se!usou!o!resultado!do!item!anterior.!Usando`se!! = ℎ !! =
! !,!"
ℎ !! = !
= 0,17!!"#.!!

8. A!equação!de!Schroedinger!para!o!potencial!dado!é:!
!
ℏ! ! !
− + !! !! ! !! , ⋯ , !! = !" !! , ⋯ , !! !
2! !!!!
!

! 317!
Escrevendo! a! função! de! onda! como! um! produto! de! funções! das! coordenadas!
individuais:!
!

! !! , ⋯ , !! = !! (!! )!
!!!

!
Substituindo!na!equação!acima,!obtemos:!
!
!!!
ℏ! ! !
!! (!! ) × − + !! !! − ! !! !! = 0!
2! !!!!
(!!!)!! !

!
Para! que! a! igualdade! seja! zero,! os! termos! do! somatório! devem! se! anular!
individualmente,!o!que!resulta!nas!equações!de!Schroedinger!individuais.!!!
9. Seja!a!equação!de!Schroedinger:!
!
! ! ! 2!
= ! ! ! − ! !(!)!
!! ! ℏ
!
Suponha! que! o! potencial! tenha! uma! descontinuidade! em! ! = !.! Integrando! em! um!
intervalo!±!!em!torno!de!!,!obtemos:!
!
!!!
!" !" 2!
− = ! ! − ! !(!)!" !
!" !!! !" !!! ℏ! !!!

!
Repare!que,!no!caso!da!função!delta!tratada!no!texto,!a!derivada!primeira!da!função!de!
onda! é! descontínua,! Eq.(I10.5).! A! razão! é! que,! naquele! caso,! o! potencial! delta! é!
descontínuo!e!infinito.!Neste!problema,!devemos!tratar!V!como!descontínuo,!mas!finito,!
como!seria!o!caso!de!uma!barreira!de!potencial.!Como!!(!)!também!é!finita,!pois!seu!
módulo!quadrado!representa!uma!densidade!de!probabilidades,!podemos!escrever:!!
!
!!! !!!
!" !" 2!
− = ! !(!) ! ! !" − ! !" !
!" !!! !" !!! ℏ !!! !!!

! 318!
A!segunda!integral!do!lado!direito!é!obviamente!zero.!Se!!(!)!fosse!uma!função!delta,!a!
primeira!integral!seria!finita.!Porém,!a!hipótese!de!que!essa!função!é!finita,!a!despeito!
de! apresentar! descontinuidades,! permite! concluir! que! a! primeira! integral! também! vai!
necessariamente!a!zero!quando!! → 059.!
10. A!função!de!onda!de!um!estado!n!de!um!poço!infinito!com!largura!a!é:!
!

2 !
!! ! = !"# !" !
! !

!
A!representação!de!momento!é!obtida!pela!transformada!de!Fourier!da!função!(ver!Eq.!
(II5.9)):!!
!
1 1 ! 1
!! ! = !! (!)! !"#/ℏ !" = !"# (!" + !") !
2!ℏ ! !"ℏ !" + !" 2
!
onde!se!levou!em!conta!que,!como!fora!do!poço!a!amplitude!de!probabilidade!é!nula,!a!
integração! só! será! diferente! de! zero! dentro! do! poço.! Se! fosse! no! espaço! livre,! o!
resultado! seria! uma! delta! de! Dirac.! Note! que! o! resultado! é! uma! função! !"#$(!).! A!
distribuição!de!momento!é!o!módulo!quadrado! !! (!) ! .!!
11. Diferenciando!a!função!duas!vezes,!obtemos:!
!
!! ! ! !−1 ! 1
!
= !
−2 + ! !(!)!
!" ! !! ! !!
Substituindo!na!equação!de!Schroedinger,!temos!a!equação:!
!
ℏ! ! ! − 1 ! 1
!−! ! =− !
−2 + ! !
2! ! !! ! !!
!
Utilizando!os!limites!dados!no!problema,!chegamos!a:!
!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
59
!Esse!problema!está!longe!de!ser!trivial.!Veja!por!exemplo,!D.!Branson,!Continuity%
conditions%on%Schroedinger%wavefunctions%at%discontinuities%of%the%potential,!Am.$J.$Phys.,!
47!(1979)!1000.!

! 319!
ℏ!
!=− !
2!!!!
!
Consequentemente:!
!
ℏ! ! ! − 1 !
! ! = !
−2 !
2! ! !! !
!
12. O!hamiltoniano!do!átomo!de!hidrogênio!é:!
!
!! !!
!= − !
2! 4!!! !
Logo:!
!! !!
!!∗ !"! ! ! ! = !! = ! − ! !! !
2! 4!!!
!
Usando!o!fato!de!que! ! !! = 1/ !! !! ,!onde!!! !é!o!raio!de!Bohr,!vem:!
!
!! !!
!! = ! − =! ! ! + 2!!! → !! = − ! ! !
2! 4!!! !! !!
!
13. A!equação!de!Schroedinger!na!representação!p!é!dada!por60:!
!
!!
! !! 1
!ℏ ! !, ! = ! !, ! + !"′!(! − !′)! !, ! !
!" 2! 2!ℏ !!

!
onde!!(!, !)!é!a!transformada!de!Fourier!de!!(!, !),!e!!(!),!a!transformada!de!Fourier!
de!!(!).!Notando!que:!
!
!!
!!
! ! = !! cos !" ! !!"# !" = !(! − !)!
!! 2

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
60
!Esse!assunto!foi!tratado!no!Bloco!II.!Veja!por!exemplo,!Cohen`Tannoudji,!Diu!e!Laloe,!
Quantum%Mechanics,!Volume!1,!Complemento!DII.!

! 320!
!
a!integral!do!segundo!termo!da!equação!de!Schroedinger!resulta!em:!
!
!!
1 !! /2
!"′!(! − !′)! !, ! = ! ! − !, ! !
2!ℏ !! 2!ℏ
!
14. Para!qualquer!sistema!quântico,!podemos!escrever:!
!

Δ! = ! ! − ! ! !!!!e!!Δ! = !! − ! ! !
!
No!caso!do!oscilador,!os!valores!esperados!da!posição!e!do!momento!são!zero!para!
qualquer!estado,!por!causa!da!simetria!bem!definida!das!autofunções.!Ou!seja,!para!
qualquer!autoestado!n:!
!

Δ! = ! ! ! !!!!e!!Δ! = !! ! !
!
Por!sua!vez,!para!o!oscilador!harmônico!(ver!Problema!12,!análogo!para!o!átomo!de!
hidrogênio):!
!
!!
!! ! = !
!!e!! !! ! = !!! !
!!
!
Logo:!
!! 1
Δ!Δ! = = ! + ℏ!
! 2
!
Para!o!estado!fundamental:!!! = ℏ!/2.!
!
!
15. Fazendo! a! transformação! para! novos! operadores! de! bósons:! ! → ! − !!!e!!!! →
! ! − !,! obtém`se! o! novo! hamiltoniano:! ℋ = !! ! ! − !!! ,! cujos! autovalores! são:!
!! = !" − !!! .!

! 321!
16. Os!autoestados!para!um!poço!infinito!unidimensional!são:!
!

(!) ! ! ℏ! ! (!) 2 !"


!! = ! !!!e!!!!! = !"# ! !
2!!! ! !

!
!!!!!!!!!!!!!A!correção!primeira!ordem!de!perturbação!é!dada!por:!
!
! !!
!!/! !!/!
(!) ! 2! !" ! 2! !"
!! = !"!! ! !" + !"!! ! !"
!
!!/! ! ! !!
!!/! ! !
! !
2!" !" 3!"
= !"!! + !"!! !
! 4 4
!
!!!!!!!!!!!!!!Consequentemente:!
!
(!) 4!"
!! − !!! = !
!
!
17. A!correção!em!primeira!ordem!para!a!energia!do!estado!fundamental!é!dada!por:!
!
!! ! !! ! !
(!) !" !/! ! !!"! /ℏ ! !" !/! ! !!"! ! /ℏ
!! =! ! !
!" = !"!
!ℏ !! ! +! ! !ℏ !! !! + 1
!
!!!!!!!!!!!!!onde!se!fez!a!substituição!de!variáveis!! = !".!Tendo!em!conta!que:!
!
!!
!"
= !!
!! !!+1
!

!!!!!!!!!!!!!no!limite!! ≪ ℏ/!",!obtemos!!

(!) ! !"# !/!


!! = !
! ℏ
!
Além! disso,! no! limite! ! ≫ ℏ/!",! o! denominador! pode! ser! desprezado! e! se!!!!
obtém:!

! 322!
(!) !
!! = !
!!
!
18. O!hamiltoniano!da!partícula!é:!
!
!!
!= − !! ∙ !%
2!
!
Vamos!calcular!as!equações!de!Heisenberg!para!!!e!!! .!Como!esses!operadores!não!
dependem!explicitamente!do!tempo,!teremos:!
!
!" 1 1 !!! !! 1 !!
= !, ! = !, = !, !! = !
!" !ℏ !ℏ 2! ! !ℏ !
!!! 1 1
= !! , ! = ! , −!"! ! = !!! !
!" !ℏ !ℏ !
!
com! equações! semelhantes! para! as! outras! componentes! de! r! e! p.! Tomando! os!
valores!esperados!de!cada!equação!e!juntando!as!componentes,!obtemos:!
!
!! ! !!
= !!e!! = !!%
!" ! !"
%
Derivando! a! primeira! em! relação! ao! tempo! e! substituindo! a! segunda,! chegamos! à!
segunda!lei!de!Newton!para!o!movimento!da!partícula:!
!
!! !
! = !!%
!! !
!
!
19. Escrevendo!o!momento!angular!total:!
!
! = ! + !! → ! !! = (! + !)! = !! + ! ! + 2! ∙ !%
%

! 323!
!! − !! − ! ! !! − !! − ! !
!∙!= →!=! %
2 2
%
!
!!,!,! = [! ! + 1 − ! ! + 1 − ! ! + 1 ]!
2
!
Segundo! as! regras! de! composição! do! momento! angular:! ! = ! − ! , ⋯ , ! + !.!
Portanto,!para!!! = 2!e!! = 1,!!!! = 1, 2, 3.!As!energias!são:!
!
!!,!,! = ! −3!, !!,!,! = ! −!, !!,!,! = ! +2!!
!
!
20. (a)!Tendo!em!vista!que:!
!

3 3
!!" = !"#$!!e!!!!±! = ∓ !"#$!! ±!" !
4! 8!

!
Podemos!escrever:!

1
! =! − 2!!! + !!" !(!)!
3

Portanto,! os! valores! possíveis! para! uma! medida! da! componente! Z! do! momento!
angular!são!0!e + ℏ.!
(b)!Como!a!integral!do!quadrado!de!!(!)!é!igual!a!1,!as!probabilidades!pedidas!são!
dadas! diretamente! pelo! quadrado! dos! coeficientes! dos! harmônicos! esféricos,! ou!
seja:!! ! = 1 = 2/3!e!! ! = 0 = !1/3.!
! !
(c)!!! ! = ! !
− 2!! !!! + !! !!" ! ! = − !
ℏ!!! ! → !! = 2ℏ/3.!

!
!
!
!
!
!
!

! 324!
Bloco%II%
1. Sejam!dois!sistemas!de!coordenadas!que!se!movem!relativamente!um!ao!outro!com!
velocidade! !.! A! relação! entre! as! coordenadas! nos! dois! sistemas! é! dada! pela!
transformação!galileana:!
!
! = !′ + !!!
!
Chamemos! as! respectivas! funções! de! onda! ! !, ! !!e!!!(!′, !).! Queremos! obter! as!
condições! para! que! as! equações! de! Schroedinger! sejam! iguais! nos! dois! sistemas.!
Começamos!notando!as!relações!entre!operadores!nos!dois!sistemas:!
!
! !
∇! ′ = ∇! !!e!! =!∙∇+ !
!"′ !"
!
Como,!por!hipótese,!o!potencial!é!invariante!sob!a!transformação,!teremos:!
!
ℏ! ! !"
− ∇ ! + !" = !ℏ! ∙ ∇φ + !ℏ !
2! !"
!
Além! disso,! ! !, ! !!e!!!(!′, !)! devem! resultar! nas! mesmas! distribuições! de!
probabilidades! e,! portanto,! diferir! apenas! por! um! fator! de! fase! global,! que! vamos!
representar!por!! = ! ∙ ! − !":!
!
! = !! !!(!∙!!!") !
!
Substituindo!na!equação!de!Schroedinger,!após!rearrumações:!
!
ℏ! ! !" ℏ ℏ! !
− ∇ ! + !! − !ℏ = !ℏ − ! + ! ∙ ∇! + − ! + ℏ! ∙ ! − ℏ! !!
2! !" ! 2!
!

! 325!
Agora,!para!que!a!equação!de!Schroedinger!seja!válida,!os!termos!entre!parêntesis!
do!lado!direito!devem!se!anular!independentemente!um!do!outro,!já!que!a!função!
de!onda!e!o!seu!gradiente!são!independentes:!
!
ℏ ℏ! !
− ! + ! = 0!!e! − ! + ℏ! ∙ ! − ℏ! = 0!
! 2!
!
Da! primeira,! se! obtém! a! conhecida! relação:! ℏ! = !! = !;! da! segunda:! ℏ! =
!! ! /2.!
2. Como!o!primeiro!termo!do!hamiltoniano!já!é!diagonal,!é!preciso!apenas!diagonalizar!
o! segundo! termo.! Estes,! por! sua! vez,! é! uma! soma! de! operadores! de! criação! e!
aniquilação:!
!
!! = |! + 1 !|!e!! = |! + 1 !|!!
!
Estes!dois!operadores!têm!os!mesmos!autovalores,!e,!portanto,!precisamos!calcular!
aqueles!!de!apenas!um!deles.!Usando!o!fato!de!que:!
!
!!" = !|!|! !
!
teremos:!
0 1 ⋯ 0 0
0 0 1 ⋯ 0
!= 0 0 0 1 ⋯ !
⋮ ⋮ ⋮ ⋮ ⋮
1 0 0 ⋯ 0 !×!

!
O!dígito!“1”!que!aparece!na!última!linha,!primeira!coluna,!deve`se!!às!condições!de!
contorno!periódicas.!A!equação!de!autovalores!para!essa!matriz!é:!
!
−! 1 ⋯ 0 0
0 −! 1 ⋯ 0
! − !" = 0 0 −! 1 ⋯ !
⋮ ⋮ ⋮ ⋮ ⋮
1 0 0 ⋯ −! !×!

! 326!
!
cujo!determinante!resulta!em:!
!
2!
!! − 1 = 0! → ! !! = ! !!! !com!!! = !!!e!!! = 0, 1, 2, ⋯ , ! − 1!
!
!
Os!autovalores!de!!! !serão!1/!! = ! !!!! !,!pois!o!produto!!! !!aplicado!a!um!estado!
|! !deve!retornar!o!número!de!ocupação.!Portanto,!os!autovalores!de!H$são:!
!
!! = !! + 2!"#$(!! )!
!
3. Expandindo!!(! + !)!em!série!de!Taylor!em!torno!do!ponto!!:!
!
!
!! ! ! !(!)
! !+! = !
!! !! !
!!!

! Substituindo!−!ℎ!/!" = !!!teremos:!
!
! !
1 !"# !"#
! !+! = ! ! =! ! ! ! = Γ(!)!(!)!
!! ℎ
!!!

!
! Consequentemente:!
!"#
Γ ! =! ! !

! Ou!seja,!é!um!operador!unitário,!escrito!em!função!do!momento.!
4. Considere!a!função!dos!operadores!A!e!B:!
!
! !(!!!) = ! !" ! !" !(!)!
! !
Derivando!em!relação!a!!,!obtém`se:!
!
!"
! + ! !! !!!
= ! !" ! + ! ! !" ! ! + ! !" ! !" !
!"
! !

! 327!
! Que!pode!ser!simplificada!para:!
!"
! !!" ! !!" !! !" ! !" ! − !" = !
!"
Vamos! agora! examinar! a! função! destacada! entre! parênteses,! que! vamos! chamar!!
!(!):!
!"
! ! = ! !!" !! !" ! → ! = ! !!" !" − !" ! !" = −!!
!"
!
Portanto,! ! ! = −!" + constante.! Fazendo! ! = 0!vemos!que!′constante′ = !.!
Consequentemente:!
!
!" !! !
= −!" + ! ! − !" = −!"! → ! ! = ! ! ! !!"#$%&#%' !
!"
!
Novamente,!fazendo!! = 0,!vemos!da!definição!de!f!que!a!constante!é!igual!a!zero.!
Finalmente,!tomando!! = 1,!chegamos!a:!
!
! (!!!) = ! ! ! ! ! !!/! !
!
5. Seja!o!operador:!
! ! = ! !" !! !!" !
! !
Derivando!em!relação!a!lambda:!
!
!"
= !" !" !! !!" − ! !" !! !!" ! = [!, !]!
!"
!
Derivando!mais!uma!vez:!
!
!! ! !"
!
= !, = !, !, ! !
!! !"
!
Pela!terceira!vez:!

! 328!
!
!! !
= !, !, !, ! !
!!!
!
E! assim! por! diante.! Por! sua! vez,! a! expansão! de! !(! = 1)! em! série! de! Taylor! em!
torno!da!origem!é61:!
!
!"(0) ! ! !(0) ! ! !(0)
! 1 =! 0 + + + + ⋯!
!" !!! !!!
!
Tendo!em!vista!que!! 0 = !!e!substituindo!os!termos!da!série!pelos!comutadores,!
obtém`se!o!resultado!desejado.!
6. Considere!o!valor!esperado!de!um!observável!A!no!instante!de!tempo!t:!
!
! ! = ! ! |!|!(!) !
! !
! Tendo!em!vista!que:!!
|! ! = ! !!"#/ℏ |!(0) !
!!!!!!!!!!!!!!Obtemos:!
! ! = ! 0 |! !!"#/ℏ !! !!"#/ℏ |!(0) !
!!!!!!!!
!!!!!!!Podemos! interpretar! esse! resultado! como! a! evolução! temporal! do! operador! A,!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
segundo:!
! ! = ! !!"#/ℏ !! !!"#/ℏ !
! Derivando!em!relação!ao!tempo:!
!
!"(!) ! !"(!) ! !"(!)
= !"(!) − !(!)! + = !, !(!) + !
!" ℏ !" ℏ !"
!
! que!é!a!equação!de!Heisenberg.!

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
61
!Note!que!a!expansão!de!uma!função!!(!)!em!série!de!Taylor!em!torno!de!um!ponto!!! !
pode!ser!feita!para!qualquer!valor!de!!.!
!

! 329!
7. Começamos!por!definir!um!novo!sistema!de!coordenadas!pelas!transformações:!
!
!′ ! = !!"# !" + !!"# !" !
!′ ! = −!!"# !" + !!"# !" !
!′(!) = !!
!
As!componentes!do!spin!nesse!novo!sistema!são:!
!
!!! (!) = ! ∙ !′ = ! !! !"# !" + !! !"# !" !
!!! (!) = ! ∙ !′ = ! −!! !"# !" + !! !"# !" !
!!! = !! !
!
Precisamos! calcular! as! equações! de! movimento! do! momento! magnético! (ou,!
equivalentemente,!do!spin)!no!novo!sistema!de!coordenadas.!A!equação!básica!para!
o!movimento!do!operador!de!spin!é!a!equação!de!Heisenberg:!
!
!! ! !!
= !, ! + !
!" ℏ !"
!
onde! ! = −!!! !! !! − !!! !! !! cos !" + !! sen!(!") .! Em! termos! das!
componentes!no!sistema!transformado:!!
!
! = !!! ! !′ ! + !!! ! !′ ! + !!! (!)!′(!)!
!
Portanto:!!
!
!! !!!! !!′ !!!! !!′ !!!! !!′
= !′ + !!! + !′ + !!! + !′ + !!!
!" !" !" !" !" !" !"
!!!! !!!! !!!!
= !′ + !′ + !′ + !!′×!!! !′ + !!′×!!! !′!
!" !" !"
!

! 330!
O!termo!entre!parênteses!é!a!derivada!temporal!tomada!no!sistema!transformado,!
que!representaremos!por!!′!/!".!Note!que!o!segundo!termo!pode!ser!escrito!como!
um!produto!vetorial:!
!
!!×!!! !′ + !!×!!! !′ = !×!%
! !
Vamos!agora!calcular!os!comutadores.!Usando!s!relações!anteriores,!é!fácil!ver!que:!
(VERIFICAR!AS!UNIDADES!E!CONSTANTES):!
!
!, !!! = −!!! !! !!! !

!
!, !!! = !!! !! !!! − !!! !! !!! !

!
!, !!! = −!!! !! !!! !

!
Portanto,!as!equações!de!movimento!no!novo!sistema!de!coordenadas!se!tornam:!
!
!′!!!
= −(!!! !! + !)!!! !
!"
!′!!!
= + !!! !! + ! !!! − !!! !! !!! !
!"
!′!!!
= −!!! !! !!! !
!"
!
Ou!seja,!no!novo!sistema!de!coordenadas!a!dependência!temporal!do!hamiltoniano!
desaparece.!!
!
8. O!hamiltoniano!do!oscilador!harmônico!na!representação!de!momento!é:!
!
!! !!! ! ! !
!= − ℏ !
2! 2 !!!
!
!!!!!!!!!!!!!E!a!equação!de!Schroedinger!na!mesma!representação!será:!
!

! 331!
! !! !!! ! ! !
!ℏ Φ(!, !) = − ℏ Φ(!, !)!
!" 2! 2 !!!
!
!!!!!!!!!!!!!Buscando!soluções!do!tipo:!!
Φ !, ! = !(!)! !!"#/ℏ !
!
!!!!!!!!!!!!Chega`se!à!seguinte!equação!para!a!parte!espacial:!
!
!! !
+ ! − ! ! ! = 0!
!! !
!!!!!!!!!!!!!Onde:!
! 2!
!= !!e!!! = !
!"ℏ ℏ!
!
Essa! equação! é! idêntica! à! do! oscilador! harmônico! no! espaço! das! configurações! ! e,!
portanto,!tem!soluções:!!
!
1 !!
! ! ! !! 1
!! ! = (−1)! ! !!!e!!!!! = ℏ! ! + !
2! !! !"ℏ !! ! 2
!
9. Primeiramente,!notemos!que!para!um!estado!|!(!) !qualquer:!
!
! ! = ! ! !! ! = ! 0 ! !!"#/ℏ !! !!"#/ℏ ! 0 !
!
Expandindo!|!(0) !na!base!de!autoestados!do!hamiltoniano:!
!

|! 0 = !! |! !
!

!
obtemos!

! ! = !! !! !|!|! ! ! !! !!! !/ℏ
!
!.!

Vamos!definir!o!seguinte!elemento!de!matriz:!
!

! 332!
! !! !!! ! ! !! !!! !
!!" ! = ! ! ! ! ℏ = !!" ! ℏ !
!
e!derivá`lo!em!relação!ao!tempo:!
!
!!!" !
= !! − !! !!" !
!" ℏ
!
Com!estas!relações,!vamos!calcular!o!que!pede!o!problema:!
!
! ! ∗
!! − !! !!" = !! − !! !!" = !! − !! !!" !!" !
! ! !

!
1 ∗
1 ∗
!! − !! !!" = !! − !! !!" !!" + !! − !! !!" !!" !
2 2
! ! !

!
1 ℏ !!!" ∗
!! − !! !!" = !
2 ! !" !"
! !
∗ ∗
1 ℏ !!!" ℏ !!!" ∗ !!!"
− !!" = ! − ! !
2 ! !" 2! !" !" !" !"
! !

Explicitando! os! elementos! de! matriz! e! usando! a! relação! de! completividade,!


obtemos:!
!

!
ℏ ℏ ℏ!
!! − !! !!" = !|!! − !!|! = !|!" − !"|! = !
2! 2!" 2!
!

!
10. O! operador! velocidade! de! uma! partícula! carregada! sem! spin! em! um! campo!
magnético!é!dado!por:!
1
!= ! − !! %
!
%
onde!!%é!o!momento!mecânico!da!partícula,!!%o!potencial!vetor!e!!!a!sua!carga.!Para!
um!campo!estático!na!direção!Z,!o!potencial!vetor!é!dado!por:!
!
1 !!
! = − !×! = (−!! + !!)!
2 2

! 333!
%
Substituindo!na!expressão!da!velocidade,!obtemos:!
!
!! + !!! !/2
!! = !
!
!! − !!! !/2
!! = !
!
!!
!! = !
!
O!único!comutador!que!não!é!nulo!é!aquele!das!componentes!X!e!Y:!
!
!!! !!! !!!
!! , !! = − !
!! , ! + !
!, !! = ! ℏ!
2! 2! !!
!
11. Para!que!possam!ser!medidos!simultaneamente,!!, !! !e!!! !precisam!comutar!entre!
si.!Sabemos!que! !! , !! = 0!e!também!que:!
!
ℏ! !
!! = ! + !!! + 2!! ∙ !! !
4 !
!
!!!!!!!!!!!!!Tendo!em!conta!que!!!! = 3!,!obtemos:!
!
2!!
!! ∙ !! = − 3!
ℏ!
!!!!!!!!!!!!!Segue!daí!que! !, !! = !, !! = 0.!
!
12. O!estado!do!sistema!antes!da!medida!é:!
!
|↑↑ + |↑↓
|! = |↑ ! !⨂!|+ ! =! !
2
!
!!!!!!!!!!!!!Por!sua!vez,!os!dois!estados!de!dois!spins!com!spin!total!igual!a!zero!são:!
!
|↑↓ ± |↓↑
|! ± = !
2

! 334!
!!!!!!!!!!!!!A!probabilidade!pedida!é!dada!por:!
!
| ! ± |! |! = 25%!
!
13. O!estado!genérico!de!um!spin!é:!
!
! !
|! = !"# !!|↑ ! + !! ! !" !!"# !|↓ !
2 2
!
Os! estados! sobre! o! plano! X`Z! são! aqueles! para! os! quais! ! = 0.! Portanto,! a!
probabilidade!pedida!é!dada!por:!
!
!
| ! ! = 0 |↑ |! = !"! ! !
2
!
14. A!componente!de!um!spin!em!uma!direção!genérica!
! = !"#$!!"#$!! + !"#$!!"#$!! + cos !!!!é:!
!
!! = ! ∙ ! = !!"#$!!"#$!!! + !!"#$!!"#$!!! + !"#$!!! !
ℏ !"#$ ! !!" !"#$ !
!! = ! !!"
2 ! !"#$ −!"#$
!!!!!!!!!!!!!!!
Os!autovalores!dessa!matriz!fornecem!os!resultados!possíveis!de!serem!obtidos!em!
uma!medida!de!!! .!A!diagonalização!da!matriz!é!trivial,!e!os!autovalores!são!±ℏ/2.!
15. O!hamiltoniano!da!perturbação!é:!
!
!ℬ
!= ! + !ℰ!!
! !
!
Na! ausência! de! perturbação,! os! autoestados! do! átomo! de! hidrogênio! dependem!
apenas! do! número! quântico! principal.! Portanto,! temos! que! analisar! o! efeito! da!
perturbação!levando!em!conta!todos!os!estados!degenerados.!Para!! = 2,!teremos!
! = 0, 1!e!! = 0, −1, 0, 1.!Assim,!os!estados!que!formam!o!subespaço!que!devemos!

! 335!
olhar! são:! |!"# = |200 , |210 , |211 , |21 − 1 .! Usando! as! propriedades! dos!
operadores!!! !e!!! :!
!

!± |!"# = ! (! ∓ !)(! ± ! + 1)|!"# ± 1 !


!! + !!
!! = !
2
! Aplicando!aos!autoestados:!
!
2
!! |200 = 0, !! |211 = !! |21 − 1 = ℏ|210 !
2
2
!! |210 = ℏ |211 + |21 − 1 !
2
!
Por!sua!vez,!usando!a!representação!de!harmônicos!esféricos!para!os!autoestados!e!
tendo!em!vista!que!! = !"#$%,!os!únicos!elementos!de!matriz!não`nulos!do!termo!
de!campo!elétrico!são:!
!
!
210|!"#$%|200 = 200 !"#$% 210 = !
3
!
Com!isso,!a!matriz!hamiltoniana!da!perturbação!pode!ser!escrita:!
!
0 !ℰ ! / 3 0 0
!ℰ ! / 3 0 2!ℬℏ/2! 2!ℬℏ/2!
!= !
0 2!ℬℏ/2! 0 0
0 2!ℬℏ/2! 0 0
!
Os! autovalores! dessa! matriz! fornecem! o! deslocamento! nos! níveis! de! energia.! São!
eles:!
2!ℬℏ !ℰ !
!! = 0,0, ± 2!! + ! ! !!!!!onde!!! = !!e!!! = ! !
2! 3
16. Fazendo!o!comutador!dos!operadores!de!campo:!
!

! 336!
1 !
Ψ ! , Ψ ! !′ = !! , !!! ! !!!∙! ! !!!!∙! !
!
! !!

!
!
Como!o!sistema!é!bosônico,! !! , !!! = ! !!,!! !e!uma!das!somas!pode!ser!eliminada:!
!
1
Ψ ! , Ψ ! !′ = ! !!!∙(!!!!) !
!
!

!
Usando!a!expressão!(I17.6),!obtemos!(VERIFICAR!PI!AO!CUBO):!
!

!
1 ! !!!∙(!!!!) ! ! !
Ψ ! ,Ψ !′ = = !(! − !′)!
! ! ! /!
!
As! outras! identidades! seguem! trivialmente! das! relações! de! comutação! entre! os!
operadores!de!criação!e!aniquilação.!!
!
17. Usando!! ± = !! ± !!! ,!o!hamiltoniano!pode!ser!escrito!como:!
!!!! + !!!!
! = −2! ! !! !! + !! !! + !! !! = −2! ! + !! !! !
2
!
Usando!a!regra!para!a!segunda!quantização:!
!

ℋ= Ψ ! ! !Ψ ! !"!

Obtemos:!
!

!
!!!! + !!!!
ℋ = −2 !!!!! !!,! !′| + !! !! |! × !(!)! ! !!!! !
!"!
2
!,! !!!!

!
onde!o!último!termo!é!a!transformada!de!Fourier!da!interação!de!troca.!Chamando!
esse! termo! !(!, !′)! e! expandindo! a! soma! sobre! os! estados! de! spin! do! elétron,!
obtemos:!
!

! 337!
! !!!! + !!!!
ℋ = −2 !(!, !′) !!!↑ !!↑ ↑|
2
!,!!

! !!!! + !!!!
+ !! !! ↑ + !!!↑ !!↓ ↑| + !! !! ↓
2

! !!!! + !!!! ! !!!! + !!!!


+ !!!↓ !!↑ ↓ | + !! !! |↑ + !!!↓ !!↓ ↓ |
2 2

+ !! !! |↓ !

!
Tendo!em!vista!que!! ! ↑ = ! ! ↓ = 0, ! ! |↓ = |↑ , ! ! |↑ = |↓ !e!a!ortonormalidade!
entre!os!estados,!chega`se!a:!
!
! ! ! !
ℋ=− ! !, !′ [! ! !!!↓ !!↑ + ! ! !!!↑ !!↓ + !! !!!↑ !!↑ − !!!↓ !!↓ ]!
!,!

!
18. Derivando!!(!)!em!relação!ao!tempo:!
!
!" ! !"# !"# !"# ! !"# ! ! !
= −! ! ! ℏ ! 0 ! ! ℏ + ! ! ℏ ! 0 ! ! ! ℏ = !" − ! ! = [!, !]!
!" ℏ ℏ ℏ ℏ ℏ
!
19. Em!! = 0,!a!matriz!densidade!é:!
!
! !! !! /!! !
! 0 = !
!
!
! !
onde! ! = !" exp!( !! !! ) .! Ao! se! aplicar! um! campo! na! direção! !,! a! matriz! se!
!

transforma!segundo:!
!
1 !! !! ! !! !! !! !! !
! ! = ! ! !! ℏ ! !! ! ! !! ℏ !
!
!
No!limite!de!altas!temperaturas,!podemos!escrever:!
!

! 338!
!! !! !! !!
! !! ! ≈ ! + !!e!!! ≈ 2!
!! !
onde!!!é!a!matriz!identidade!2×2.!Com!isso:!
!
! !! !!!! !! ! ! ! !
!! ! !
! ! =! + ! ℏ !! ! ℏ !
2 !! !
!
Usando!a!relação:!!
!! !! ! ! ! !
!! ! ! !! ! !! !
! !! ℏ !! ! ℏ = !! !"# − !! !"# !
ℏ ℏ
!
Obtemos!finalmente:!
! !! !! ! !! !
! ! =! + !! !"# − !! !"# !
2 !! ! ℏ ℏ
!
Vamos!calcular!a!componente!Z!da!magnetização:!
!
!! !! ! !! !
!! ! = !" !(!)!! = !" !!! !"# − !" !! !! !"# !
!! ! ℏ ℏ
!! !! !
!! ! = !" !(!)!! = !"# !
!! ! ℏ
!
Vê`se,!portanto,!que!a!componente!Z!oscila!com!frequência!proporcional!ao!campo!
em!X!e!com!amplitude!proporcional!ao!campo!em!Z.!As!outras!componentes!podem!
ser!calculadas!da!mesma!forma.!!
20. A!matriz!original!é:!
!
(1 + !)/4 0 0 !/2
0 (1 − !)/4 0 0
!= !
0 0 (1 − !)/4 0
!/2 0 0 (1 + !)/4
!
A! matriz! transposta! parcial! é! obtida! invertendo`se! os! índices! de! apenas! um! dos!
spins.!Por!exemplo,!o!elemento!da!quarta!linha,!primeira!coluna:!
!

! 339!
!
↓↓ ! ↑↑ = !
2
!
torna`se!o!elemento!da!terceira!linha,!segunda!coluna:!
!
!
↓↑ ! ↑↓ = !
2
!
E,!assim,!sucessivamente.!A!nova!matriz!parcialmente!transposta!se!torna:!
!
(1 + !)/4 0 0 0
0 (1 − !)/4 !/2 0
!!" = !
0 !/2 (1 − !)/4 0
0 0 0 (1 + !)/4
!
cujos! autovalores! são:! (1 + !)/4!triplamente! degenerado! e! (1 − 3!)/4.! O! critério!
de! Perez! afirma! que,! se! algum! destes! autovalores! for! negativo,! o! estado! será!
emaranhado.! Como! ! > 0,! a! condição! será,! portanto,! dada! pelo! último! autovalor:!
1 − 3! < 0! → !! > 1/3.!
! !

! 340!
Bloco%III%
1. Da!expressão!da!sensibilidade,!obtemos:!
!
!! !" 10! ×1,6×10!!" ×0,55×10!!
!! = = = 0,044×10!" ≈ 10! !fótons!
!ℎ! 10!! ×6,63×10!!" ×3×10!
!
2. As!autoenergias!de!um!elétron!em!um!poço!infinito!1D!com!comprimento!!!são:!
ℎ! !! 6,63×10!!" !
!! = = !! = 9,7×10!!" !! !joule!
2!!! 2×9,11×10!!" × 5×10!! !

!
O! estado! fundamental! é! aquele! com! ! = 1.! Portanto,! !! = 9,7×10!!" ! Joule.!
Por!sua!vez:!
!! − !! 4!! − !! 3!! 3!!
=!= = →!= !!
ℏ ℏ ℏ ℎ
Tendo!em!vista!que!! = !/!,!obtemos:!
!
ℎ! 6,63×10!!" ×3×10!
!!→! = = = 0,68×10!! !m = 0,68!nm!
3!! 3×9,7×10!!"
!
Esse!comprimento!de!onda!é!muito!menor!do!que!o!da!luz!visível,!que!vai!de!390!
nm! (violeta)! até! 780! nm! (vermelho).! A! transição! equivalente! no! átomo! de!
hidrogênio!corresponde!à!série!de!Lyman!e!tem!91!nm,!também!muito!superior.!
O!comprimento!de!onda!da!transição!3 → 1!!é!igual!a!0,26!nm.!!
!
3. A!equação!(III5.3)!é:!

! =! !
2!! ! 1 + !/2!! ! !
!
Ao!atravessar!a!diferença!de!potencial!de!250!kV,!o!elétron!adquire!uma!energia!
de!250!keV,!ou!seja,!4×10!!" !joule.!Portanto:!
!

! 341!
6,63×10!!"
!= !
4×10!!"
2×9,11×10!!" ×4×10!!" × 1+
2×9,11×10!!" ×9×10!"
! = 2,45×10!!" m = 2,45!pm!
!
4. O! limite! de! resolução! de! qualquer! microscópio! é! dado! pelo! comprimento! de!
onda!da!radiação!que!ele!utiliza,!em!comparação!às!dimensões!do!objeto!físico!a!
ser! estudado.! As! dimensões! típicas! dos! objetos! listados! são:! a)! fio! de! cabelo:!
100!!m;!b)!célula!sanguínea:!10!!m;!c)!transistor!da!Intel!14!nm;!d)!diâmetro!de!
uma!molécula!de!DNA:!!20!Å;!e)!átomo:!1`10!Å.!
!
Já! os! limites! de! resolução! dos! diversos! microscópios! (valores! representativos)!
são:! a)! óptico:! 0,2! !m;! b)! AFM:! 10! nm! c)! microscópios! eletrônicos! 1`10! Å.!
Portanto,!fios!de!cabelo!e!células!sanguíneas!podem!ser!vistos!com!microscópios!
ópticos.!Um!transistor!de!um!chip!de!última!geração!da!Intel!pode!ser!visto!em!
um!AFM.!Moléculas!e!átomos!precisam!de!microscopia!eletrônica.!!
5. As! autoenergias! do! poço! quântico! são! dadas! por! (III3.11).! Mas,! precisamos!
considerar,!nesse!problema,!apenas!a!parte!da!quantização!dos!estados:!
!
ℎ! !!
!! = !
2!!!
!!!!!!!!
!!!!!!!O!estado!fundamental!corresponde!a!! = 1,!e!o!primeiro!estado!excitado,!a!!!!!!
!!!!!!!! = 2.! Portanto,! queremos! calcular! !! para! o! qual! !! − !! = 30!MeV =
!4,81×10!!" !joule:!
!

3ℎ! 3
!! − !! = ! !
→!=ℎ
2!! 2! !! − !!

3
= 6,63×10!!" !
2×9,11×10!!" ×4,81×10!!"

! = 3,9×10!!" m!(VERIFICAR!)!

! 342!
!
6. Dos!dados!fornecidos,!obtemos!!" = 0,27.!Portanto,!!!"# = 118!nm,!para!a!luz!

visível;!!!!"# = 54!nm,!para!o!ultravioleta;!e!!!"# = 2,7!nm!para!Raios!X.!!


7. Para!! = !,!a!energia!de!um!íon!retroespalhado!se!torna:!
!
!! − !! !
!!"# = !! !
!! + !!
!
! !!!!!!!!Em!unidades!de!massa!atômica,!temos:!!
!
!! = ! !" = 4, !!! = 12! ! , 14! ! , 16(!)!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Obtemos:!!!"# (!) = 0,25!MeV,!!!"# (!) = 0,31!MeV!e!!!"# (!) = 0,36!MeV.!
8. Os!valores!esperados!pedidos!podem!ser!calculados!trivialmente:!
!
!
! !
!!
! = −! ! = − ×4! !!! !! !" = 0!
!!!! !
!
!! !
!!
! ! !
=! ! !
= ! ×4! !!! !! !" = 3! ! !!! ≠ 0!
!!! !

!
O! fato! de! o! valor! esperado! do! dipolo! ser! zero! não! significa! que,! em! um! dado!!!!!
instante! !,! o! átomo! não! possa! apresentar! um! momento! !(!).! Isso! ocorre! por!
conta!das!flutuações!temporais!na!distribuição!de!cargas!do!átomo,!fazendo!com!
que!o!centro!das!cargas!positivas!(núcleo)!instantaneamente!não!coincida!com!o!
das! cargas! negativas! (elétrons).! Com! isso,! um! campo! elétrico! instantâneo! na!
posição!!,!!(!, !)!é!criado:!
!
!(!)
!(!, !) ≈ !
4!!! ! !
!
Esse!campo!interage!com!um!segundo!dipolo!em!!,!segundo:!!
!
!! ! !! ! 3! ! !!!
! ≈ −! ! ! !, ! = − → ! = − = − !
4!!! ! ! 4!!! ! ! 4!!! ! !

! 343!
!
onde,!no!último!termo!do!lado!direito,!foi!utilizado!o!resultado!do!item!anterior!
para! um! estado! s.! A! energia! é! obviamente! diferente! de! zero! e! pode! ser!
facilmente!estimada!para!! = 1!nm:!
!
3× 1,60×10!!" ×5,29×10!!! !
! =− = 1,93×10!!" joule! ≈ 0,012!eV!
4!×8,85×10!!" ×10!!"
!
Para! fins! de! comparação,! a! energia! térmica! ambiente! a! 400! K! é! da! ordem! de!
0,034!eV.!
9. O!momento!magnético!da!partícula!será:!
!
4
! = !!! !!%
3
%
%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%%E!o!campo!magnético!gerado!por!ele!em!uma!posição!! = !!! :!
!
!! 3 ! ∙ !! !! − !
!= !
4! !!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!O!campo!magnético!produzido!a!uma!distância!z!abaixo!será:!
!
!! 2! !" !! 2!
!! = !
→ = −3 !
4! ! !" 4! ! !
!
A!força!exercida!sobre!uma!partícula!de!1!!! !pelo!gradiente!de!campo!será:!
!
!" !! !"! 4 !
! = −!! =3 2 !! !
!" 4!! ! 3
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Substituindo!os!valores!numéricos!fornecidos,!encontra`se:!
!
! ≈ 5×10!!" !N!
!

! 344!
Para!fins!de!comparação,!o!limite!de!sensibilidade!de!um!MFM!comercial!é!da!
ordem!de!10!!" !N.!
10. Considerando!que!o!momento!magnético!aponta!na!direção!z,!a!componente!z!
do!campo!dipolar!calculado!no!problema!anterior!é!dada!por:!
!
!
!! ! ! ! !
!! = −1 !
3 ! !
!
! !!!!!!!!Considerando!os!dados!do!problema!anterior,!com!! = 50!Å,!obtemos:!
!
!
2,2 1
!! = − 1 = −0,7!T!
3 5
!
A! componente! z! da! força! magnética! sobre! esse! segundo! momento! pode! ser!
também! obtida! facilmente! derivando`se! a! expressão! do! campo! magnético!
acima.!!É!ela:!
!
!
! 3! 5! !
!! = ±!! !"! − ! !
! !! !
!
onde!o!sinal!positivo!deve!ser!usado,!se!o!momento!tiver!a!direção!contrária!à!
do!gradiente.!!
11. Substituindo!os!valores!fornecidos,!encontra`se:!
!
!!"# = 9,8×10!!" !!N!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Portanto,!!!"# 400!K ≈ 2×10!! !N!!e!!!!"# 0,1!K ≈ 3×10!!! !N.!!
!
12. A!equação!de!Schroedinger!para!o!par!de!Cooper!é:!
!
!"
!ℏ = −2!"#!
!"
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Derivando!a!função!fornecida!no!problema,!obtemos:!

! 345!
!
!" !" 2! 2!" 2!"
!ℏ!×!!" = −2!"# → = != = !
!" !" ℏ ℎ/2! Φ!
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!A!unidade!do!quantum!de!fluxo!é:!
!
Joule!×!s kg×m×s !! ×m×s kg×m!
Φ! = = = !
Coulomb C C×s
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Além!disso,!da!expressão!da!força!de!Lorentz,!! = !"#,!vemos!que:!!
!
!"
! = = !"#$%!
!×!
!
Portanto,! Φ! = !"#$%!×!!! ,!que!é!a!unidade!de!fluxo!magnético,!denominada!
Weber! e! representada! por! Wb.! Vamos! calcular! agora! o! valor! do! quantum! de!
fluxo:!
!
6,63×10!!"
Φ! = ≈ 2,1×10!!" !Wb!
2×1,60×10!!"
!
A! integração! da! equação! para! a! fase! da! função! de! onda! de! um! par! de! Cooper!
resulta!em:!
2!"
! ! =! 0 + !!
Φ!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Com!isso,!a!corrente!de!tunelamento!se!torna:!
!
2!"
! ! = !! !"#! ! 0 + ! !
Φ!
!
ou! seja,! a! aplicação! de! uma! tensão! DC! resulta! em! uma! corrente! AC,! com!!
frequência!igual!a:!
2!"
!! = = 2!!! !
Φ!

! 346!
!
Substituindo!os!valores!numéricos:!
!
10×10!!
!! = !Hz ≈ 0,476×10! !Hz!!ou!!476!MHz!
2,1×10!!"
!
!
13. A!definição!quântica!de!densidade!de!corrente!é:!
!

! = ! −2! ! ∗ ∇! − !∇! ∗ !
2!"
!
Ao! substituirmos! a! função! dada! nessa! expressão,! devemos! manter! apenas! os!
termos! cruzados,! pois! são! eles! que! representam! a! corrente! de! tunelamento!
através!da!junção,!ou!seja:!
!

! ! = −! ×! !!∗ ∇!! + !! ∇!!∗ − !!∗ ∇!! + !! ∇!!∗ !
!"
!
O!primeiro!termo!dentro!das!chaves!representa!a!corrente!de!tunelamento!do!
eletrodo! 1! para! o! 2;! e! o! segundo! termo,! a! corrente! oposta.! A! diferença! entre!
elas!dará!a!corrente!de!tunelamento!líquida.!Usando!o!fato!de!que:!
!
∗ ∗
∇!!!!,! = !!!!!!,! !!!!!∇!!!!,! = −!!!!!!,! !
!
chega`se!a:!

! ! = −! 2! !! !!∗ − !!∗ !! !
!
!
Substituindo!as!funções!fornecidas,!encontra`se:!
!
ℏ!
! ! = 2!" !"# !! − !! = ! 2! !!!"# ! = !! !"# ! !
!
!

! 347!
que!é!a!expressão!do!efeito!Josephson.!
14. O!princípio!de!incerteza!de!energia!e!tempo!em!um!sistema!quântico!é:!
!
Δ!Δ! ≳ ℎ!
!
! !!!!!!!!Substituindo!as!quantidades!fornecidas,!obtemos:!
!
!! ℎ
×!! ! ≳ ℎ! → ! !! ≳ ! !
2! 2!
!
Essa! é! a! condição! para! que! se! observe! a! transferência! de! um! elétron! para! o!
ponto!quântico,!por!tunelamento.!Numericamente,!o!quantum!de!resistência!é:!
ℎ 6,63×10!!"
= = 2,59×10! !Ω = 25,9!!Ω!
!! 1,60×10!!" !
! !!!!!!!!!
O! controle! da! corrente! de! tunelamento! em! pontos! quânticos! permite! a!
construção! de! transistores! de! um! único! elétron.! Nesses! dispositivos,! elétrons!
fluem,! um! a! um,! de! um! eletrodo! (fonte)! para! outro! (dreno),! dependendo! do!
controle! exercido! por! um! terceiro! eletrodo! sobre! a! barreira! de! potencial! que!
deve!ser!tunelada.!
15. O!hamiltoniano!de!evolução!do!spin!no!campo!é:!
!
1
! = − ℏ!!! !
2
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Sob!esse!hamiltoniano,!a!evolução!será:!
!
! |↑ + |↓
|! ! = !"# !"!! !
4 2
!" !" |↑ + |↓
|! ! = !"#$ +!"#$ ! !
4 4 ! 2
1 !" 1 !"
|! ! = !"# |↑ + |↓ + !"# |↑ − |↓ !
2 4 2 4

! 348!
1 !" 1 !"
|! ! = !"# |↑ + |↓ + !"# |↑ − |↓ !
2 4 2 4
1 !" 1 !"
|! ! = !"# |↑ + |↓ + !"# |↑ − |↓ !
2 4 2 4
!
Note! que! o! estado! |↑ − |↓ / 2! é! ortogonal! ao! estado! inicial! e! portanto!
distinguível.!Logo,!se!tomarmos!um!tempo!!,!tal!que:!
!
!" ! 2!
= →!= !
4 2 !
!
o! estado! será! distinguível.! Além! disso,! ℏ!! é! a! energia! do! sistema.! Fazendo! o!
produto!de!incerteza!entre!o!tempo!e!a!energia,!se!encontra:!
!
2!
∆!∆! = ℏ!× = ℎ!
!
!
Ou! seja,! o! tempo! mínimo! necessário! para! o! sistema! evoluir! do! estado! inicial!
para!um!estado!distinguível!é!aquele!dado!pelo!princípio!de!incerteza.!!
16. Uma!massa!de!1!kg!fornece!uma!energia!máxima!igual!a:!!
!
! = 1× 3×10! !
= 9×10!" !J!
!
A!velocidade!de!processamento!pode!ser!estimada!utilizando`se!o!princípio!de!
incerteza! e! o! tempo! mínimo! para! distinguibilidade! de! estados! calculada! no!
problema!anterior:!
!
1 !
= ≈ 10!" !Hz = 1!GHz!×!10!" !
! ℎ
!
Para!fins!de!comparação,!o!processador!Intel!Core!i7!tem!uma!velocidade!de!4,2!
GHz.!
17. Calculando!a!primeira!rotação:!
!

! 349!
! |00 + |11 ! |10 + |01
! !!"!!! |! ! = !"# − !"#$ !
2 2 2 2
!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Agora,!sobre!este!estado!aplica`se!a!segunda!rotação!para!obter:!
!
! + ! |00 + |11 ! + ! |10 + |01
! !!"!!! ! !!"!!! |! ! = |! ! = !"# − !"#$ !
2 2 2 2
!
Portanto,! para! ! + ! = 2!"!!ou!!(2! + 1)!! o! estado! será! maximamente!
emaranhado.!A!matriz!densidade!correspondente!a!este!estado!é:!
!
|! ! ! ! | =
!+! !+!
!"! ! +!/2!"# ! + ! +!/2!!" ! + ! !"! !
2 2
!+! !+!
1 −!/2!"# ! + ! !"!! !"!! −!/2!"# ! + !
= 2 2 !
2 !
!+! !
!+!
−!/2!"# ! + ! !"! !"! −!/2!"# ! + !
2 2
!+! !+!
!"! ! +!/2!"# ! + ! +!/2!"# ! + ! !"! !
2 2
!
Os!espectros!de!RMN!são!formados!pelos!elementos!(1,2)!e!(3,4)!para!um!dos!q`
bits,!e!(1,3)!e!(2,4)!para!o!outro.!
!
18. Usando!os!resultados!dos!problemas!9,!10!e!11,!encontra`se!que!a!componente!
Z!do!campo!magnético!na!posição!do!momento!é!de!5,4×10!! !T.!Multiplicando!
esse!valor!pela!razão!carga/massa!do!elétron,!!/! ≈ 1,76×10!! !C/kg,!se!obtém!
a! frequência! de! cíclotron:! !! ≈ 9,5×10! ! rd/s,! o! que! corresponde! a! uma!
!
frequência!de! !!! ≈ 1,5×10! !Hz!ou!1,5!GHz.!Esse!é!o!valor!do!deslocamento!em!

frequência!causado!pelo!campo!produzido!pela!haste.!Na!ressonância,!em!1!K,!a!
amplitude! de! oscilação! da! haste! será! de! 1,2!Å,! o! que! é! bem! acima! do! ruído!
térmico,! da! ordem! de! 0,3!Å.! Em! um! campo! de! 10! T,! a! polarização! eletrônica!
será:!
!

! 350!
! !! !/!! ! !!
! ↑ = ≈ = 99,75%!
! 20,15
!
Portanto,! ! ↓ ≈ 0,25%.! Assim,! nesse! campo,! praticamente! todos! os! elétrons!
estão! alinhados.! Já! os! spins! nucleares! terão! ! ↑ ≈ 50,25%! e! ! ↓ ≈ 49,75%.!
Ou!seja,!a!polarização!nuclear!é!muito!menor!do!que!a!eletrônica.!!
!
Para! explicar! a! operação! do! CNOT,! vamos! usar! a! seguinte! notação! para! os!
estados!da!base!computacional,!com!a!convenção!|elétron, núcleo :!
!
|↑ ,0 , |↑ ,1 , |↓ ,0 , |↓ ,1 !
!
As!transições!eletrônicas!dependem!do!estado!do!spin!nuclear.!São!elas:!
!
|↑ ,0 → |↓ ,0 !com!frequência!!!! !
|↑ ,1 → |↓ ,1 !com!frequência!!!! !
!
Os! estados! eletrônicos! são! usados! como! “sensores”! para! se! implementarem!
operações! lógicas! sobre! os! estados! nucleares.! Considere! um! núcleo! em! uma!
posição!!! !da!cadeia!e!outro!em!!! + !.!O!primeiro!será!o!q`bit!de!controle,!e!o!
segundo,!o!alvo.!Primeiro,!a!ponta!é!posicionada!sobre!o!q`bit!de!controle!e!um!
pulso!!!com!frequência!!!! !é!aplicado.!Esse!pulso!vai!girar!o!spin!do!elétron!se!e!
apenas!se!o!q`bit!de!controle!estiver!em!“0”.!Caso!contrário!nada!acontece.!!
!
Em! seguida! a! ponta! do! MRFM! se! move! para! o! q`bit`alvo.! A! frequência! de!
ressonância!do!alvo!depende!do!estado!do!spin!eletrônico!vizinho:!se!o!estado!
eletrônico! for! “up”,! ela! terá! um! valor;! e! se! for! “down”,! terá! outro.! Irradia`se,!
então,! o! núcleo! com! a! frequência! correspondente! ao! estado! “down”! do! spin!
eletrônico!vizinho.!Se!o!spin!nuclear!inverter,!isso!significa!que!o!spin!eletrônico!
de!fato!está!em!“down”,!o!que,!por!sua!vez,!significa!que!o!estado!do!q`bit!de!
controle!está!em!“0”.!Se!não!inverter,!significa!que!o!q`bit!de!controle!está!em!
“1”.!Isto!completa!o!CNOT!no!esquema!de!Berman!e!coautores.!!

! 351!
19. Aplicando!o!termo!de!interação!ao!estado!dado:!
!
! !! !! + !!! ! = !{!!! !! !, 1 + !!! !! |! + 1,0 +!
+!!!!! !, 1 + !"!! ! + 1,0 }!
!
Usando!o!fato!de!que:!
!
!! 1 = 0 ;!!!! 0 = 0;!!! 1 = 0;!!! |0 = |1 !
! ! = ! ! − 1 ;!!! |! = ! + 1|! + 1 !!
!
Obtemos:!

! !! !! + !!! ! = !" ! + 1 ! + 1,0 + !" ! + 1|!, 1 !

= ! ! + 1 !|!, 1 + !|! + 1,0 !


!
Portanto,! para! que! o! estado! resultante! seja! autoestado! do! operador! de!
interação,!devemos!ter!! = ! = 1/ 2.!Já!que!o!autovalor!é!! ! + 1.!!
!
Para! reescrever! o! hamiltoniano! na! forma! pedida,! basta! adicionar! e! subtrair! o!
termo!ℏ!!! /2.!A!vantagem!desta!forma!é!que!a!diferença!entre!a!frequência!do!
campo! e! a! frequência! natural! do! átomo! fica! explícita.! Como! a! frequência! do!
campo!é,!em!princípio,!sintonizável,!o!termo!de!dissintonia!pode!ser!feito!igual!a!
zero,!e!os!autoestados!do!hamiltoniano!resultante!são!como!os!do!item!anterior.!!
!
Chamando!!! !o!hamiltoniano!sem!o!primeiro!termo!e!aplicando!os!outros!dois!
aos!estados!da!base!fornecidos,!obtemos:!
!
!! |00 = ℏ!|00 !
!! 01 = −ℏ! 01 + ℏ!|10 !
!! 10 = +ℏ! 10 + ℏ!|01 !
!

! 352!
Lembrando!que!os!kets!indexam!as!colunas!e!os!bras!as!linhas,!obtemos!a!matriz!
hamiltoniana:!
! 0 0
! =ℏ 0
! −! ! !
0 ! !
!
Os!autovalores!dessa!matriz!são:!
!

!! = ℏ!, !! = −ℏΩ, !! = +ℏΩ, onde!!Ω = ! ! + !! !


!
E!os!autovetores:!
!
0 0
1 !+Ω !−Ω
|!! = 0 ;!|!! = − ;!|!! = − !
! !
0
1 1
!
Na!sua!base!de!autovetores,!a!matriz!de!evolução!é!diagonal:!
!
! = ! !!!! !/ℏ !! !! | + ! !!!! !/ℏ !! !! | + ! !!!! !/ℏ |!! !! |!
!
Expandindo!os!autovetores!na!base!original!e,!após!uma!série!de!manipulações!
algébricas,!encontramos:!
!
!+Ω !+Ω
! = ! !!"# 00 00 + ! !!! − |01 + |10 − 01| + 10| +!
! !
!−Ω !−Ω
+! !!!! − |01 + |10 − 01| + 10| !
! !
!
De!onde!chega`se!a:!
!
2
! = ! !!"# 00 00 + ! ! + Ω! cos Ω! + Ω!"#$ Ω! 01 01 −!
!!
2
− !"#$ Ω! + !Ω!"# Ω! 01 10 + 10 01 + 2!"# Ω! 10 10 !
!

! 353!
!
A!probabilidade!de!emissão!é!dada!pelo!termo!multiplicado!por!!−2/!!(todos!os!
outros!se!anulam):!
!

!
4 !
10|!|01 =! ! = ! !"! ! Ω! + Ω! !"!! Ω! !
!!
!
Vemos! que,! se! ! = 0, Ω = !,! e! a! probabilidade! de! emissão! espontânea! se!
torna:!
!
4!"!! g!
!(!) = !
!
!
20. Em!uma!moeda!sem!vício,!cada!lado!tem!probabilidade!½!de!ser!sorteado.!Nesse!
caso,!a!entropia!de!Shannon!é:!
!
1 1 1 1
! = − log ! − log ! = 1!bit!
2 2 2 2
!
Se! uma! das! faces! for! ligeiramente! favorecida! por! um! excesso! igual! a! !,! as!
probabilidades!serão:!!
!
1 1
!! = + !!!!e!!!! = − !!!!!
2 2
!
Nesse!caso:!
1 1 1 1 2! !
!=− + δ log ! + ! − − δ log ! − ! ≈ 1 − bit!
2 2 2 2 ln!2
!
onde! a! expressão! mais! à! direita! é! obtida! para! ! ≪ 1.! Vemos,! portanto,! que! a!
entropia!diminui,!o!que!significa!que!a!informação!sobre!o!sistema!aumenta.!Para!
! = 0,05,!obtemos!! = 0,993.!
!

! 354!
!
! !

! 355!
Referências%Bibliográficas%
!
Neste! texto! as! referências! de! artigos! são! dadas! em! notas! de! rodapé! e,! por! vezes,! alguns!
livros!aparecem!também!ao!longo!do!texto.!Os!livros!a!seguir!de!forma!alguma!esgotam!a!
vastíssima!literatura!que!existe!sobre!mecânica!quântica!e!suas!aplicações.!Eles!refletem!as!
preferencias!e!a!trajetória!profissional!desse!autor.!!
%
Textos%Clássicos!–!Existem!vários!livros!excelentes,!introdutórios!ou!avançados,!com!
os!rótulos!“Física!Moderna”,!!“Física!Quântica”,!“Teoria!Quântica”,!“Mecânica!Quântica”,!
etc.!Dois!dos!mais!tradicionais!adotados!nos!cursos!brasileiros!são:!
1. Quantum$Mechanics,!Volumes!1!e!2,!Claude!Cohen`Tannoudji,!Bernard!Diu!e!Frank!Lalöe,!John!Wiley!
&!Sons!(New!York!1977).!
2. Modern$ Quantum$ Mechanics,! J.! J.! Sakurai! e! Jim! J.! Napolitano,! Pearson! Educational! Limited! (Essex!
2014).!
!
Textos% Auxiliares% e% Complementares! –! A! mecânica! quântica! permeia!
praticamente! toda! a! física.! Estudando! livros! de! outras! áreas,! muitas! vezes! é! possível!
aprendermos! novos! problemas,! aplicações! e! técnicas! que! não! são! encontrados! nos!
livros!de!Mecânica!Quântica.!Alguns!livros!desta!categoria!que!foram!consultados!para!a!
elaboração!deste!texto!são:!
3. Conceitos$de$Física$Quântica,!volumes!1!e!2,!Oswaldo!Pessoa!Jr.,!Livraria!da!Física!(São!Paulo!2003).!
4. Teorias$ e$ Interpretações$ da$ Mecânica$ Quântica,! Nelson! Pinto! Neto,! Livraria! da! Física! (São! Paulo!
2010)!
5. Quantum$Paradoxes,!Yakir!Aharonov!e!Daniel!Rohrlich,!Wiley`VCH!(Weinheim,!2005).!
6. Quantum$Computation$and$Quantum$Information,!Michael!A.!Nielsen!e!Isaac!L.!Chuang,!Cambridge!
Press!(Cambridge,!2010).!
a
7. Introdução$à$Física$do$Estado$Sólido,!3 .!Ed.,!Ivan!S.!Oliveira!e!Vitor!L.!B.!de!Jesus,!Livraria!da!Física!
(São!Paulo,!2017).!
8. Quantum$Information$Theory,!Mark!M.!Wild,!Cambridge!Press!(Cambridge,!2013).!
9. NMR$Quantum$Information$Processing,!Ivan!S.!Oliveira,!Tito!J.!Bonagamba,!Roberto!S.!Sarthour,!Jair!
C.C.!de!Freitas!e!Eduardo!R.!deAzevedo,!Elsevier!(Amsterdam,!2007).!
a
10. Elements$of$Quantum$Optics,$Pierre!Meystre!e!Murray!Sargent!III,!3 .!Ed.,!Springer!(New!York,!1999).!
!
Aplicações%em%Nanociências%e%Nanotecnologia!–!Com!o!rápido!desenvolvimento!
dessas! áreas! de! aplicação! da! Mecânica! Quântica,! surgiram! excelentes! livros! sobre! o!
assunto.!Neste!texto!foram!utilizados!os!seguintes:!
11. Quantum$Mechanics$for$Nanostructures,!Vladimir!V.!Mitin,!Dmitry!I.!Sementsov!e!Nizami!Z.!Vagidov,!
Cambridge!Press!(Cambridge,!2010).!
12. Nanoelectronics$and$Information$Technology,!Rainer!Waser!(Ed.),!Wiley`VCH!(Weinheim,!2012).!
13. Nanostructures$and$Nanotechnology,!Douglas!Natelson,!Cambridge!Press!(Cambridge,!2015).!
!
Problemas% Resolvidos! de% Mecânica% Quântica! –! A! variedade! de! aplicações! de!
problemas! nos! diversos! tópicos! de! mecânica! quântica! é! quase! infinita.! Existem! muitos!
livros!de!problemas!resolvidos,!entre!os!quais!os!seguintes!foram!utilizados!neste!texto:!
14. Problems$in$Quantum$Mechanics,!F.!Constantinescu!e!E.!Magyari,!Pergamon!Press!(Oxford,!1971).!
15. Exploring$ Quantum$ Mechanics,! Victor! Galitski,! Boris! Karnakov,! Vladimir! Kogan! e! Victor! Galitski! Jr.!
Oxford!Press!(Oxford,!2013).!
16. Problems$in$Quantum$Mechanics,$Emilio!d’Emilio!e!Luigi!E.!Picasso,!Springer!(Milan,!2011).!
a
17. Problems$in$Quantum$Mechanics,%3 .!Ed.$D.!Ter!Haar,!Dover!(Mineola,!1975).!

! 356!
18. Problems$ and$ Solutions$ on$ Quantum$ Mechanics,! Yung`Kuo! Lim! (Ed.),! World! Scientific! (New! Jersey,!
1998).!
!
!
Algumas%das%obras%consultadas%nos%ensaios:%
19. BALL,!Philip.!‘The!crucible!of!change’.!In:!Nature$v.!324,!p.!412!(27!August!2015).!
20. GALISON,! Peter.! Image$ &$ logic$ ‒$ a$ material$ culture$ of$ microphysics.$ Chicago:! The! University! of!
Chicago!Press,!1997.!
21. HIEBERT,! Erwin! (1979).! ‘The! state! of! physics! at! the! turn! of! the! century’,! p.! 3`22.! In:! BUNGE,! Mario;!
SHEA,!William!L.!(eds.)!Rutherford$and$the$physics$at$the$turn$of$the$century.!New!York:!Dawson!and!
Science!History!Publications,!1979.!
22. HIGGITT,! Rebekah.! ‘The! Longitude! Prize! Committee:! a! new! board! of! longitude?’! H`word! (The!
Guardian!blog),!19!May!2014.!
23. HURTADO! DE! MENDONZA,! Diego;! VARA,! Ana! María.! ‘Winding! roads! to! Big! Science:! experimental!
physics!in!Argentina!and!Brazil’.!In:!Science,!Technology$&$Society!v.!12,!n.!1,!p.!27`48,!March!2007.!
24. KAISER,!David.!‘History:!Shut!up!and!calculate!’.!In:!Nature$v.!505,!p.!153`155!(08!January!2014).!
25. KRAGH,!Helge.!‘Max!Planck:!the!reluctant!revolucionary’.!In:!Physics$World,!December!2000.!!
26. MANSFIELD,!Sue.!Gestalts$of$war:$an$inquiry$into$its$origins$and$meanings$as$a$social$institution.$New!
York:!Dial!Press,!1982.!
27. MARBURGER,! John! H.! (edited! by! Robert! Crease).! Science$ Policy$ Up$ Close.$ Cambridge:! Harvard!
University!Press,!2015.!
28. VIDEIRA,!Antonio!Augusto!Passos.!Henrique$Morize$e$o$ideal$de$ciência$pura$na$República$Velha.$Rio!
de!Janeiro:!FGV!Editora,!2003.!
29. VIDEIRA,! Antonio! Augusto! Passos;! BIBILONI,! Aníbal! G.! Encontro$ de$ História$ da$ Ciência$ –$ Análises$
comparativas$das$relações$científicas$no$século$XX$entre$os$países$de$Mercosul$no$campo$da$física.$Rio!
de!Janeiro,!2001.!
30. VIDEIRA,!Antonio!Augusto!Passos;!VIEIRA,!Cássio!Leite.!Cosmologia:$uma$introdução$histórica.![título!
provisório].!Rio!de!Janeiro:!Objetiva![no!prelo]!
31. VIDEIRA,! Antonio! Augusto! Passos;! VIEIRA,! Cássio! Leite.! Reflexões$ sobre$ historiografia$ e$ história$ da$
física$no$Brasil.!São!Paulo:!Editora!Livraria!da!Física,!2010.!
32. VIEIRA,! Cássio! Leite;! VIDEIRA,! Antonio! Augusto! Passos.! ‘Carried! by! history:! Cesar! Lattes,! nuclear!
emulsions,!and!the!discovery!of!the!pi`meson’.!In:!Physics$in$Perspective!v.!16,!n.!1,!pp.3`36.!2014.!
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!
!

! 357!

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