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Ato 3 cena V

Romeiro – Basta: vai dizer-lhes que o peregrino era um impostor, que desapareceu,
que ninguém mais houve novas dele, que tudo isto foi um vil e grosseiro embuste de
inimigos de... dos inimigos desse homem que ela ama. E que sossegue, que seja feliz.
Telmo, adeus! 

Telmo– E eu hei de mentir, senhor, eu hei de renegar de vós, como um vilão que não
sou? 

Romeiro – Hás, porque eu te mando. 

Telmo – Senhor, eu... 

Romeiro – Tu farás o que eu te digo. O homem que aqui viveu morreu há vinte anos.
Não há nada mais meu neste lugar, então partirei. E se amas a Madalena... e o seu
marido como me amas a mim, vais dizer-lhes que o peregrino partiu, para que eles que
amas possam continuar a viver e para que eu, que morri, possa dormir descansado. 

Telmo – Senhor... assim farei. 

Cena VI

Telmo – Senhor Manuel, preciso de falar convosco. Tenho que ser rápido que preciso de falar
com Maria.

Manuel – Diz, meu caro.

Telmo – É sobre o homem (pausa) o Romeiro. Falei com ele faz meia hora.

Manuel – Ai, diz-me, Telmo. O que saiu da boca dele?

Telmo – Algo que me muito desagrada mas que talvez salve a sua família.

Manuel – O que disse ele (mais rápido)


Telmo – Disse que D. João de Portugal morreu há 20 anos e que não pretende voltar a viver.
Deseja sair, fugir, e poupar Madalena e depois morrer. Quer que finjamos que é um impostor.

Manuel – E tu, Telmo, o que respondeste?

Telmo – Eu disse-lhe que assim faria porque é o que tem de ser feito. Eu estive a pensar: o
homem foi interrogado e revelou ser um enviado para destruir esta família. Dizíamos que os
medos de Madalena, por mais que os tentasse esconder, não eram um segredo bem guardado
e que alguém o enviou como retributo pelo incêndio do seu castelo.

Manuel – E achas que isso vai funcionar?

Telmo – Vai porque tem de funcionar!

Madalena está a recuperar lentamente mas é certo que se não a conseguirmos ela perderá a
cabeça. Maria, aquele anjo, também tem de ser salva. Ela não merece viver assim, sem nome e
sem pais, tem de ser estimada e cuidada ou ainda morre de vergonha.

Manuel – E como achas que isto vai cair aos olhos de Deus?

Telmo – Não muito bem, receio. Mas há uma coisa que tenho a certeza: o amor e a
misericórdia de Deus são infinitos. Ele saberá perdoar. Creio que Deus nos esteja a testar. A ti,
a mim, a D. João, a todos nós. O que quer que façamos somos pecadores, considero que valha
pecar para alcançar um bem maior, como poupar Maria de um que não cometeu.

Manuel – Mas tu achas mesmo que vai funcionar?

Telmo – Sim!

(silêncio)

Telmo – Bem, está na hora de eu ir. Por favor pense nisso Senhor.
Cena VII

Manuel – Ai, a minha vida. Que me pedem para mentir á minha mulher sobre a família que é
dela. Credo…

Apesar de tudo acho que tenho de agradecer pela decisão tomada por D. João, assim apesar
do peso na consciência ainda iremos continuar a viver como uma família.

Cena VIII

Manuel - Madalena, minha querida madalena, já ouviste as novas?

Madalena – Ai, Manuel, não ouvi não. Mas sinto que não seja boa coisa: desde que aqui
chegamos nada de bom acontece. Só de pensar que Dom João está vivo…

Manuel – Não minha querida, nada disso: pelo contrário- interrogamos esse “Romeiro” que
chegou e ao que parece ele era um impostor enviado como vingança pelo incendio da nossa
antiga casa em Almada. Descansa, que ele não há de voltar.

Madalena – ( Desconfiada ) Manuel, que alivio que essas noticias seriam se eu ao menos as
pudesse confiar. Tomei uma decisão, preciso de vê-lo, preciso de falar com ele, credo… (baixo)
está vivo ou não se lhe puder perguntar que mais ele sabe, porque se ele é quem diz ser
decerto saberá coisas que só eu sei.

Manuel – ( improvisando ) Não, Madalena, não creio que isso seja a decisão acertada. Da
ultima vez que lhe falaste viste como ficaste. Aliás nós já lhe perguntamos tudo o que tinha de
ser perguntado e ele revelou tudo o que tinha escondido, não há nada mais que ele possa
dizer que nos seja útil. Devíamos só deixa-lo ficar.

Madalena – ( notando o seu nervosismo ) Tu mentes, Manuel, eu sinto-o. Vê-se na tua cara e
na maneira que falas. Porque não me dizes a verdade? Manuel , o que é que ele te disse para
me mentires.

Manuel – (aparte) Meu Deus, agora é que me fui ( não aparte) Nada, Madalena, eu disse
apenas o que sei…

Madalena – Não, não disseste. ( quase a chorar). Ai, Manuel, porque me escondes a verdade ?
Deixas-me a pensar. Ele está vivo… antes duvidava mas agora não é que já não chegou , ele
pode até… ( pausa). Ele já cá está.
Cena IX

Telmo – Maria, minha querida Maria, como estás ?

Maria – Estou bem, Telmo. E sinto que a minha mãe vai melhorar.

Telmo – Achas? Ela já não anda bem á muito tempo.

Maria – Mas decerto que vai ficar bem.

Telmo – Já não sei. Ele tem andado muito mal, desde que o homem chegou, e agora que ele
se foi embora ela não acredita que ele se foi.

Maria – Então e se nos juntássemos para jantar e falamos sobre isso á noite.

Telmo – Parece-me uma boa ideia.

Ato IV
Cena I

(De noite, no salão, a família toda senta-se para jantar. Jorge não está presente)

Telmo – Que bom que é finalmente estarmos aqui reunidos, todos juntos descansados.

Maria – Pois é que bom! Já não comíamos todos juntos há tanto tempo. As saudades que eu
tinha de momentos como este.

Manuel – Exato! E agora que a poeira assentou podemos finalmente descansar.

Madalena – (chorando) Não aguento mais. Não consigo continuar a mentir. Maria minha filha,
peço-te mil e uma desculpas mas não consigo suportar mais este fardo. Há vinte e anos atrás o
meu marido morreu numa guerra que nada tinha que ver com ele. Passei sete anos à sua
procura e nada encontrei. Desisti, e agora passados catorze anos casei-me contigo,Manuel, o
amor da minha vida, e tive uma filha, o meu anjo chamado Maria. E estava tudo bem, mas
agora um fantasma do meu passado voltou para me assombrar, para me tirar tudo o que
tenho. Dom João de Portugal está vivo e ele esteve aqui. Eu sei que ele vos pediu para
desaparecer, para o deixarem morrer de novo, mas eu não consigo viver sabendo que ele vive.

Manuel – Madalena, por favor para! Não vês o que estás a dizer?

Madalena – Não, Manuel, não paro. Não posso parar.

Manuel – Maria, por favor, sai desta sala. Que não quero que oiças isto.

Maria – Sim, pai.

Telmo – Eu vou com Maria, para a ajudar.

Cena II

Manuel – Madalena, ouve-me, isto não pode continuar. Pensa nas consequencias, pensa na
tua vida, pensa na tua filha, por amor de Deus!

Madalena – Deus! E ainda invocas o seu nome! Sebes bem que Deus é quem mais odeia esta
tua mentira e que quem mais a adora é o Diabo. Sabes bem que agarrá-la é a maneira mais
certa de ir parar ao inferno, onde seremos torturados por toda a eternidade.

Manuel – Madalena, já chega, vê o que fazes à Maria, a tua filha do teu coração. Se nós
continuamos com esta história ela, que já está tão doente, morre-nos mais cedo, que morre de
vergonha.

Madalena – (Apercebendo-se) Oh, não! O que é que eu fiz? Estou a matar a minha filha, a
minha filha! Manuel, lembra-te de mim e diz à Maria que eu peço desculpa e que eu não a
quero magoar mais. Manuel, adeus!

(Maria salta da janela)


Ato V (rés do chão, onde Madalena caiu)
(Manuel vê Madalena morta no chão e agarra-lhe pelos ombros chorando)

Manuel- Telmo, Telmo, vem cá, vem aqui agora, preciso da tua ajuda que a minha mulher se
tentou matar. Pode ser que ainda conseguimos salvar.

(Nada acontece por alguns segundos. Manuel chora em silêncio)

(Telmo chega depois)

 Cena II

Telmo- Jesus, que aconteceu?

Manuel- Ela saltou da janela pois não queria magoar mais Maria.

Telmo- Peço desculpa senhor, por ter pensado nesta mentira que a fez querer matar-se. Mas
olhe, ela não respira, não há nada que se possa fazer. Temos só que avançar, cuidar de Maria,
e rezar para que Deus entenda o motivo da morte dela. Não podemos é desistir de Maria e
deixar que o mesmo lhe aconteça. Madalena morreu para a salvar, não vamos deixar que
tenha sido em vão.

Manuel- Sim Telmo, (ainda a soluçar)  acho que é o melhor a se fazer.

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