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Nome: Bianca Lopes Frechiani

Resenha

Glória Maria Ferreira Ribeiro em seu artigo “A experiência da solidão e os


limites da linguagem no livro VII da República de Platão” pretende compreender a
relação entre o exterior e o interior da alegoria da caverna escrita por Platão. Para isso a
autora divide o texto em quatro estágios, conforme a separação feita por Heidegger em
1933/34, chamados de “os quatro estágios do acontecimento da verdade”.
O artigo, inicialmente, define que sua intenção geral é entender a vivência da
filosofia como prática interpretativa e linguística. Na sequência estrutural do texto o
primeiro estágio dessa divisão traz consigo a análise da primeira parte da alegoria ,
observando as características dos principais personagens da trama. Os prisioneiros são
apenas espectadores de um teatro de sombras, totalmente passivos aceitam as imagens
projetadas sem o mínimo questionamento. Nesse universo subterrâneo descrito por Platão
através de Sócrates os homens vivem no âmbito do aparente, servindo como espectadores
das sombras, considerando verdade o que é apenas simulacro do real. Nesse sentido, a
autora descreve uma pequena lenda oriental chinesa que retrata a origem do teatro das
sombras, narrativa que o próprio Platão se inspira para criar sua alegoria. Na lenda um
imperador chinês vê-se desesperado com a morte de sua bailarina preferida e ordena ao
mago da corte que a traga de volta do reino das sombras. O mago desesperado tem a
sagaz ideia de fabricar a silhueta da bailarina usando pele de peixe macia e transparente e
projetá-la contra a luz do sol por meio de uma cortina que transparecia a luminosidade.
Assim fez surgir a sombra da bailarina e todos ficaram felizes. Percebe-se por meio da
lenda que as sombras têm o grande poder de iludir, justamente por refletirem de forma
muito próxima aquilo que é a causa do reflexo.
Ainda na primeira parte da alegoria a autora considera que a condição do
imperador e da sua corte e dos prisioneiros da caverna assemelham-se a condição do
homem cotidiano que encontra-se totalmente acomodado e familiarizado com o mundo, o
que é visto como sua prisão, onde a humanidade está voltada para o externo, onde tudo é
público e de todos e de ninguém, como explicitado por Heidegger “no cotidiano, o
homem esquecido de si mesmo se perde no atropelo das coisas”.
O segundo estágio compreende a libertação inesperada do prisioneiro, e traz luz
ao cenário e consequentemente dor e incredulidade pela descoberta do novo. Essa
libertação é de qual natureza? O que faz um liberto querer retornar para sua prisão? Como
entender essa liberdade que nos aprisiona? Esses são alguns questionamentos feitos pela
autora nesse momento. Para Heidegger a libertação do segundo estágio nada mais é do
que a retirada do objeto opressor, da soltura de algo. O liberto aqui ainda está confuso e
desnorteado e sente falta da estabilidade das amarras. Nesse momento o prisioneiro não
mais vê as sombras, apenas a luz e os objetos e sofre devido a perda da sua verdade, da
“não-verdade” que possuía e sofre pela ausência das suas convicções, perdendo a si
mesmo. Dessa forma, a liberdade alcançada nesse nível é apenas um “ser livre de”, e não
uma liberdade propriamente dita, a solução para esse conflito segundo Rilke, é ter
coragem diante do estranho que surge pra suportar a dor da perda, o incômodo da
desconstrução da rotina. Essa saída radical é o assunto do terceiro estágio.
O terceiro ponto abordado pela autora afirma que o responsável pela simetria
entre o exterior e o interior da caverna é a mediação. Somente depois de um tempo de
adaptação do antigo prisioneiro ao novo ambiente é que ele poderá olhar ao seu redor e
para a própria luz do sol, no entanto a sua visão não conseguirá jamais adentrar a
epiderme completa das coisas. Para o Sócrates de Platão, estamos sempre em débito com
a ideia do Bem supremo, que seria a origem das ideias, das coisas, e é somente na queda
do homem do princípio, que esse Bem é aprendido pelo homem cotidiano. O fim desse
trajeto é representado pelo retorno do homem liberto à caverna, esse seria o momento
emane o filósofo assume a radicalidade dessa liberdade por ele adquiria e assume também
a própria morre como condição da sua existência.
O quarto e último estágio, marca a relação entre o retorno do prisioneiro liberto
para o interior da caverna e a relação entre morte e liberdade. Na área externa da caverna
o homem enxerga nitidamente a verdade, porém ele não pode permanecer ali, é
necessário retornar para contar aos outros a ilusão na qual eles se encontram submersos,
mas acostumados com a familiaridade da caverna os prisioneiros não lhe darão ouvidos,
mas esse retorno inaugura um encontro consigo mesmo, da alma tornar-se plena em si
mesma, como fala Platão.
Nota-se pelas conclusões do artigo que ao filósofo após a conquista da verdade e
liberdade só é dado viver na iminência da morte, e que faz-se necessário despertar nos
outros homens o sentido dessa libertação, ainda que seja uma tarefa solitária.

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