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CENTRO PRESBITERIANO DE PÓS-GRADUAÇÃO

ANDREW JUMPER

Warton André Nunes Viana

PROFETA, SACERDOTE E REI, IMPLICAÇÕES DA CRISTOLOGIA NOS


FUNDAMENTOS PRÁTICOS DA PLANTAÇÃO DE IGREJAS

São Paulo
2022
CENTRO PRESBITERIANO DE PÓS-GRADUAÇÃO
ANDREW JUMPER

Warton André Nunes Viana

PROFETA, SACERDOTE E REI, IMPLICAÇÕES DA CRISTOLOGIA NOS


FUNDAMENTOS PRÁTICOS DA PLANTAÇÃO DE IGREJAS

Monografia apresentada ao Centro Presbiteriano


de Pós-graduação Andrew Jumper – CPAJ, como
requisito parcial para obtenção do título de
Magister Divinitatis, MDiv, na área de Estudos
Pastorais. Orientador Professor Chun Kwang
Chung.

São Paulo
2022
Elaborado pelo Sistema de Geração Automática de Ficha Catalográfica da
Mackenzie com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
V614p Viana, Warton Andre Nunes.
Profeta, Sacerdote e Rei, implicações da Cristologia nos
fundamentos práticos da plantação de igrejas : [recurso eletrônico]
/ Warton Andre Nunes Viana.
430 KB ; il.

Monografia (Magister Divinitatis) - Universidade Presbiteriana


Mackenzie, São Paulo, 2023.
Orientador(a): Prof(a). Dr(a). Chun Kwang
Chung. Referências Bibliográficas: f. 62-66.

1. Ofícios De Cristo. 2. Missiologia. 3. Plantação De Igreja.


I. Chung, Chun Kwang, orientador(a). II. Título.

Bibliotecário(a) Responsável: Eliezer Lírio Dos Santos - CRB 8/6779


Warton André Nunes Viana

PROFETA, SACERDOTE E REI, IMPLICAÇÕES DA CRISTOLOGIA NOS


FUNDAMENTOS PRÁTICOS DA PLANTAÇÃO DE IGREJAS

Monografia apresentada ao Centro Presbiteriano


de Pós-graduação Andrew Jumper – CPAJ, como
requisito parcial para obtenção do título de
Magister Divinitatis, (MDiv) na área de Estudos
Pastorais. Orientador Professor Chun Kwang
Chung.

Aprovação 23 /11 / 2022


Orientador: Professor: Chun Kwang Chung
Folha de Identificação da Agência de Financiamento
Dedicatória

Dedico este trabalho aos plantadores de igrejas, homens e mulheres apaixonados por
Cristo Jesus, que não poupam esforços, recursos, nem a própria vida a fim de que a missão
seja cumprida.
Agradecimentos

Agradeço a Deus por me encantar com a beleza de sua Missão. À minha amada
esposa, Dayane, por acreditar em mim mais do que eu mesmo e pela paciência em me deixar
debruçado nos estudos e na pesquisa. Aos líderes da Igreja Presbiteriana do Bairro Alto, pelo
apoio nesta maratona acadêmica. Ao meu irmão, Rodrigo, pela leitura atenta e correções
sugeridas. À minha querida mãe que custeou com orações e sacrifícios o início da minha
jornada de estudos. Ao Dr Chun, pela profundidade teológica e pela paixão missionária.
Resumo

Uma boa e adequada eclesiologia deve estar ancorada na Cristologia, uma teologia
ortodoxa considera isso salutar. Considerando que a Cristologia é tão fundamental para a
Missiologia, o presente projeto pretende indagar qual o papel dos ofícios de Cristo para a
plantação de novas igrejas? As práticas e os fundamentos bíblicos - teológicos de um projeto
de plantação podem e devem estar ancorados nos ofícios de Cristo?

Objetiva-se fazer um exame dos ofícios de Cristo delineados na tradição Reformada.


A partir dessa análise, intenciona-se perceber as implicações dos ofícios de Cristo para prática
eclesiológica e consequentemente para o Plantio de Igrejas.

Palavras-chave: Ofícios de Cristo; Missiologia; Plantação de Igrejas.


Abstract

A good and adequate ecclesiology must be anchored in Christology, an orthodox theology


considers this healthy. Considering that Christology is so fundamental to Missiology, the
present project intends to ask what is the role of the offices of Christ for the planting of new
churches? Can and should the biblical-theological practices and foundations of a plantation
project be anchored in the offices of Christ?

The aim is to examine the offices of Christ outlined in the Reformed tradition. From this
analysis, it is intended to understand the implications of the offices of Christ for
ecclesiological practice and consequently for Church Planting.

Keywords: Offices of Christ; Missiology; Church Planting.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 11
1. A PERSPECTIVA TRÍPLICE 15
1.1. A PERSPECTIVA TRÍPLICE COMO REFERENCIAL TEÓRICO 15
1.2. ACOLHER MÚLTIPLAS PERSPECTIVAS É SINAL DE SABEDORIA 16
1.3. A TRÍPLICE PERSPECTIVA CONSIDERA A ECLESIOLOGÍA A PARTIR DO
UNGIDO 17
1.4. O SENHORIO DIVINO ESTABELECE UM PADRÃO TRÍPLICE PARA O
CONHECIMENTO DA REALIDADE 18
2. A ECLESIOLOGIA E O TRÍPLICE OFÍCIO 22
2.1. A IMPORTÂNCIA DE DEFINIR O QUE É IGREJA 22
2.2. DEFINIÇÃO DE IGREJA E SUA RELAÇÃO COM O MÚNUS TRIPLEX 24
2.3. AS MARCAS DA VERDADEIRA IGREJA E O MUNUS TRIPLEX 25
2.4 A IGREJA É PROFETA, SACERDOTE E REI 27
2.5 IMPLICAÇÕES PRÁTICAS DO TRÍPLICE OFÍCIO 30
3. A MISSÃO ASSOCIADA À PERCEPÇÃO TRÍPLICE 34
3.1 UMA DISTINÇÃO DO SIGNIFICADO DA MISSÃO 34
3.2. O CARÁTER TRIPLO DAS FONTES DA MISSIOLOGIA 39
3.3. A LIDERANÇA NA PLANTAÇÃO DE IGREJAS CONSIDERADA SOB A
PERSPECTIVA TRÍPLICE 41
3.3.1. Objeções na Categorização Tríplice para Tipologias de Liderança 44
3.4. OS PARADIGMAS MISSIOLÓGICOS E O EQUILÍBRIO OFERECIDO PELA
PERSPECTIVA TRÍPLICE 49
3.5. A IGREJA CENTRADA E A PERSPECTIVA TRÍPLICE 53
CONCLUSÃO 60
REFERÊNCIAS 62
11

INTRODUÇÃO

Neste projeto considera-se os ofícios de Cristo e suas implicações para os


fundamentos práticos no plantio de igrejas. O século vinte está sendo palco da manifestação
de Movimentos de Plantação de Igrejas. A Cristologia é fundamento crucial para o
desenvolvimento de uma adequada eclesiologia e consequentemente de uma correta
missiologia. Assim sendo, os Ofícios de Cristo podem e devem oferecer parâmetros e
diretrizes sobre a prática missiológica.
Diante de tal consideração é necessário fazer a seguinte pergunta: se a Cristologia é
tão fundamental para a eclesiologia e para o plantio de igrejas, qual o papel dos ofícios de
Cristo para a plantação de novas igrejas? As práticas e os fundamentos bíblicos - teológicos
de um projeto de plantação podem e devem estar ancorados nos ofícios de Cristo?
O movimento de plantação de igrejas é, eventualmente, criticado por excessos, sendo
um desses equívocos, de acordo com os críticos, o pragmatismo. Para tais analistas,
plantadores de Igrejas são tentados a buscar fazer não o que é certo mas o que dá certo. No
intuito de promover o estabelecimento de novas igrejas, muitos se valem de metodologias que
contrariam princípios importantes das Escrituras.
Sendo assim, para uma perspectiva missiológica que seja fiel aos valores das
Escrituras, ancorada na tradição reformada, afirma-se que todas as metodologias devem
passar pelo crivo cristológico. O Senhor Jesus Cristo, sendo o fundador e líder da Igreja,
salvador dos homens, é o maior interessado em estabelecê-la. Cristo continua sendo profeta,
sacerdote e rei em seu estado de exaltação. Ele continua sendo o dono da Igreja, e ela,
extensão de sua vida e obra.
É oportuno indagar se os ofícios de Cristo e suas devidas implicações práticas para a
vida da igreja seriam a diretriz adequada para o que se deve fazer no início de um trabalho de
plantação e sua consequente consolidação? Uma estratégia comprovadamente eficaz, em
alguma medida, está conectada às implicações práticas dos ofícios de profeta, sacerdote e rei?
Em que medida os projetos de plantação em sua eclesiologia encontram nos ofícios de Cristo
respaldo para suas ações?
Diversas áreas práticas da igreja podem ser devidamente associadas à tríplice distinção
oferecida pelo conceito de munus triplex. Em algum sentido, tudo que esteja necessariamente
e biblicamente relacionado à Igreja deve estar vinculado com Cristo, visto ser ele seu
fundador, redentor e sustentador. Pela ótica da teologia bíblica, Cristo é o cabeça da Igreja.
12

Sendo assim, todas as áreas da vida da igreja estão, por implicação lógica, necessariamente
associadas à identidade de rei, profeta e sacerdote.
O objetivo geral desta pesquisa é apontar quais as implicações e convergências da
Cristologia na Missiologia com ênfase em Plantação de Igrejas: pretende-se encontrar
conexões entre conceitos eclesiológicos e missiológicos e a Cristologia. Objetiva-se
estabelecer os fundamentos de tais proposições na Cristologia conforme delineada pelos
Ofícios de Cristo. Para tanto, estabeleceu-se esses objetivos específicos: avaliar à perspectiva
tríplice, verificando sua ocorrência para justificar sua utilização como referencial teórico ao
analisar o plantio de igrejas; analisar a definição de Igreja segundo à tradição reformada e sua
correspondência com o múnus triplex; apresentar a plausível associação do entendimento de
missão vinculado ao tríplice ofício considerando o equilíbrio que essa tríade oferece para os
paradigmas missionários. A discussão sobre as tipologias de lideranças estabelecidas a partir
do tríplice ofício receberá atenção considerando a implicação da temática para a plantação de
igrejas. Por fim, a pesquisa irá apreciar uma perspectiva tríplice na eclesiologia missional para
contexto urbano.
Algumas igrejas de tradição protestante recorrem aos manuais de plantio de igrejas
para sua prática missionária, utilizando a pesquisa e a missiologia como referencial teórico
para sua empreitada. Todavia, a missiologia com ênfase em plantio de igrejas é acusada de
nem sempre ter um diálogo efetivo com a teologia. Lidório afirma que “o divórcio entre
teologia e missiologia é uma das mais graves barreiras na formação de pastores e
missionários”1. Essa crítica costuma ser justificada por, pelo menos, duas práticas
missionárias identificadas entre igrejas reformadas: 1) uma prática missionária e de plantação
de igrejas que se apoia apenas na tradição e nos modelos do passado para sua ação
missionária. Essa postura torna-se absoluto estratégico e referencial eclesiológico definitivo
para iniciar novos projetos de plantação. Consequentemente, desconsidera-se novos tempos e
exigências de contextualização, além de nem sempre os projetos serem marcados por frutos
esperados. É fato conhecido e registrado em livros de atas2 que, no Brasil, muitas igrejas
reformadas não nasceram com motivações missionais, mas com ênfase em manutenção e
cuidado de membros que moravam em regiões distantes. Essas igrejas eram plantadas para
viabilizar o congregar e encurtar distâncias. O anseio de alcançar os perdidos não foi nutrido e

1
LIDÓRIO, Ronaldo. Plantando igrejas. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2018. P. 24.
2
AGRESTE, Ricardo. Aula de pós-graduação. Fatev. Curitiba. 2017. Material não publicado.
13

despertado nesses projetos como característica fundamental. O que por si só é um problema


sério ao se considerar a Cristologia, visto ter Cristo vindo para salvar os perdidos.
A segunda prática identificada pode ser percebida em igrejas que, no extremo oposto,
seguem as novas tendências buscando descobrir as ações que funcionam e que oferecem o
crescimento desejado. Por vezes, esse segundo grupo é acusado de subverter as prioridades e
princípios das Escrituras a fim de alcançar o objetivo de crescer e estabelecer a igreja. Essa
postura, inevitavelmente os coloca como reféns do pragmatismo.
É salutar considerar que práticas do passado, bem como métodos eficazes devem e
podem ser considerados na escolha de metodologias para implementação de uma nova igreja.
Todavia, um caminho mais substancial deve ser trilhado; perceber que qualquer estratégia
missionária deve ser guiada por uma eclesiologia moldada pela Cristologia. Sendo assim, os
ofícios de Cristo e suas implicações para a prática missionária fornecem as propostas e
diretrizes em dizer “como” essa obra deve ser estruturada.
A hipótese desta pesquisa é que uma igreja só é plantada por Cristo. Ele, enquanto rei,
profeta e sacerdote, está presente atuando em várias frentes através de práticas específicas, as
quais destacamos: em primeiro lugar essa pesquisa presume que as obras de intercessão,
oração, adoração, comunhão, ações de misericórdia são essenciais na prática eclesiológica e
estão diretamente relacionadas ao ofício sacerdotal de Cristo. Em segundo lugar, supõe-se que
a prática do ensino bíblico, o ministério da pregação das Escrituras, a evangelização, a
tradução do texto sagrado, o discipulado bíblico e o estudo doutrinário são consequências do
ofício profético de Cristo em andamento. Por último, afirma-se que a organização e
supervisão de uma igreja, a visão de avanço missionário, o comissionamento de
vocacionados, a identificação de dons, o treinamento e estabelecimento de liderança, a
autoridade dada para enfrentar o poder de Satanás, o chamado dos eleitos, bem como a
entrega de leis para que obedeçam ao Rei, são aspectos decorrentes do ofício da realeza
aplicados no exercício prático da vivência da igreja. Sendo assim, o tríplice ofício, oferece o
equilíbrio adequado para a prática eclesiológica. Qualquer manual de plantação de igreja que
considere essas práticas provará fidelidade e conexão com a Cristologia.
Esta pesquisa tomou o tri-perspectivismo como referencial teórico. Considerando a
distinção tríplice verificada no múnus triplex, o trabalho seguiu o trilho da verificação da
consistência da categorização em tríades na realidade teológica, no universo eclesiológico e
consequentemente no ambiente missiológico.
14

A metodologia de pesquisa utilizada foi a bibliográfica. A pesquisa valeu-se, para


balizar o próprio conceito do múnus triplex e da identidade da Igreja, de documentos
confessionais, como credos e catecismos. A robusta contribuição teológica sistemática de
Bavinck, Horton e Berkhof foi empregada para guiar o conceito do múnus triplex e da
identidade da Igreja. A contribuição missiológica na pesquisa utilizou-se, principalmente, das
proposições de Lidório, Hesselgrave, Fernando e Keller. A conceituação do tri-perspectivismo
seguiu os parâmetros de seus autores, Frame e Poythress.
15

1. PERSPECTIVA TRÍPLICE
1.1 A PERSPECTIVA TRÍPLICE COMO REFERENCIAL TEÓRICO

A tríplice perspectiva é um excelente caminho para considerar a missiologia aplicada


ao plantio de Igrejas. O tri-perspectivismo é tomado nesta pesquisa como referencial teórico3.
Ele pode ser considerado uma espécie de dispositivo pedagógico4. Pensando em sua
abordagem geral, ele seria uma postura epistemológica, quanto a abordagem específica, ele
pode ser considerado uma estratégia metodológica5.
O conhecimento bíblico contém inúmeras tríades6, sendo a mais preponderante para
esta pesquisa os ofícios de Cristo. A relação dependente e orgânica entre Cristo e sua igreja
implica que o múnus triplex seja tomado como referencial eclesiológico. O reconhecimento
da relevância da perspectiva tríplice é alcançado ao perceber suas ocorrências e real sentido.
O uso do termo “perspectiva” nessa pesquisa é bem específico em seu significado.
Trata-se do modo como se analisa determinada situação, objeto ou realidade, relaciona-se a
percepção de quem analisa aliado ao lugar de onde se vê. Não toma-se a palavra perspectiva
nesta pesquisa como sinônimo de “visão de mundo”, pois, se assim o fosse, não poderíamos
equivaler a visão de mundo cristã7 com as demais: secular, budista, hindu e outras. A noção
de perspectiva nesta pesquisa, aplicada ao estudo da plantação de igreja segue a linha da
conceituação de Poythress ao considerar a perspectiva na vida comum e relacioná-la à
teologia: “as pessoas não são todas iguais. Elas nem sempre percebem a mesma coisa, mesmo
quando estão olhando para o mesmo objeto. Essa observação comum tem algumas
implicações profundas para a maneira como fazemos teologia8.

3
FRAME, John M. O que é tri - perspectivismo. Disponível em:
frame--poythress-org.translate.goog/what-is-triperspectivalism/?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt-BR&_x_
tr_pto=sc. Acesso em: 20 mar. 2022.
4
Ibid.
5
FONTES, Felipe. Resenha de A doutrina do conhecimento de Deus de John Frame.. São Paulo: Cultura Cristã,
2010. p. 448. Fides Reformata. Nº 2 (2015): 145-151.
6
FRAME, John M. A doutrina de Deus. São Paulo: Cultura Cristã, 2013.
7
POYTHRESS, Vern Sheridan. Teologia sinfônica: a validade de múltiplas perspectivas em teologia.
Originalmente publicado: Grand Rapids, MI: Zondervan, 1987. Disponível em:
https://frame--poythress-org.translate.goog/ebooks/symphonic-theology-by-vern-poythress/?_x_tr_sl=en&_x_tr_
tl=pt&_x_tr_hl=pt-BR&_x_tr_pto=sc. Acesso em 30 abr. 2022.
8
Ibid.
16

Acolher a tríplice perspectiva para analisar a plantação de igrejas e a própria


eclesiologia é um tipo de defesa contra uma tendência de dar exclusividade apenas a um foco
de atenção na pesquisa, na leitura bíblica9 e na ênfase ministerial. Em termos empíricos é
possível afirmar que missiólogos são mais inclinados a ler a Bíblia em busca de ênfases
missionárias, pregadores tendem a ler as Escrituras e visualizar com frequência um sermão,
conselheiros sofrem a tendência de buscar nas Escrituras apenas princípios éticos e lições de
sabedoria.
Da mesma maneira, plantadores de igrejas e missionários são tentados a cobrir áreas e
atividades afins no campo de trabalho não orientados pelo equilíbrio exigido em todas as
demandas necessárias. Antes, enfatizam algo legitimado pela sua tradição ou experiência, ou
até concentram-se excessivamente em atividades relacionadas aos seus dons e capacidades, o
que, por sua vez, gera negligência em áreas essenciais e isso não é bom. A tríplice perspectiva
é um recurso para obter equilíbrio na atuação ministerial.
Portanto, é uma indagação oportuna descobrir se há sabedoria em considerar a noção
tríplice e como essa proposta metodológica pode auxiliar pregadores, conselheiros,
supervisores e plantadores a evitar equívocos comuns em sua tendência de acolher apenas
uma perspectiva em seu labor ministerial.

1.2 ACOLHER MÚLTIPLAS PERSPECTIVAS É SINAL DE SABEDORIA

Considerar múltiplas perspectivas não é estranho à missiologia na área metodológica


da plantação de igrejas. A prática de plantação de igrejas é uma área da teologia prática que
não tem consenso entre os especialistas sobre as melhores práticas e metodologias para
implementação de um projeto. Como afirma Stetzer: “há muitos métodos bíblicos eficazes
para a plantação de igrejas, e Deus não abençoa um modelo mais que o outro”10. Em outras
palavras, existem perspectivas diferentes sobre como plantar igrejas.
Não há um método único de plantar igrejas. Há igrejas que nascem de um pequeno
grupo de cristãos que almejam alcançar determinado grupo de não cristãos, há igrejas que são
iniciadas por plantador / missionário treinado, há outras que são formadas por gente simples
com zelo de Deus e sem preparo formal11.
9
Ibid.
10
STETZER, Ed. Plantando Igrejas Missionais: como plantar igrejas bíblicas, saudáveis e relevantes à cultura.
São Paulo: Vida Nova, 2015. P. 77.

11
LIDÓRIO, Ronaldo. Biografias, Sr. João. 09 de setembro de 2019. Disponível em:
https://youtu.be/VzuH-iBulzI. Acesso em 14 out 2021.
17

Essas diferentes maneiras de perceber a efetivação do início de novas comunidades de


fé não devem servir como argumento a favor do “qualquer coisa serve”, ao contrário, devem
ensinar que a amplitude e complexidade do trabalho oferece inúmeras perspectivas que,
quando consideradas, podem favorecer um conhecimento mais aprofundado daquilo que
realmente é essencial neste tipo de atividade.
Acolher a múltiplas perspectivas é um ato de sabedoria. Somos limitados, múltiplas
perspectivas são necessárias para prover nosso entendimento e torná-lo um pouco mais
completo. A realidade é complexa e desafia o conhecimento de quem a observa.
Diferentemente do conhecimento que Deus possui, o conhecimento humano é limitado e
prejudicado pelo pecado. Todavia, o conhecimento humano, ainda que dificultado, é possível.
Cada observador não pode ter a palavra final e absoluta sobre o conhecimento que se propõe a
formular e conceber. Somente Deus possui esse tipo de saber. Sendo assim, acolher partes das
áreas conhecidas como uma perspectiva que pode e deve ser ampliada por outra, é certamente
um passo de sabedoria.
Esta pesquisa restringiu as múltiplas perspectivas a apenas três. Isso se deriva do fato
proeminente das perspectivas com as quais as escrituras sinalizam o oficialato do Messias, o
qual precisa ser apreciado.

1.3 A TRÍPLICE PERSPECTIVA CONSIDERA A ECLESIOLOGÍA A PARTIR DO


UNGIDO

A eclesiologia deve ser orientada pela categoria tríplice por ser ela da natureza do
Ungido. Cada cristão em todas as eras e locais confessa e experimenta “logo, já não sou eu
quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gl 2.20). Aquele que é profeta, sacerdote e rei vive em
cada cristão. Logo, todos assumem, ainda que de maneira subordinada, o ofício real, profético
e sacerdotal.
Em termos teológicos é explícito que a eclesiologia está ancorada na cristologia. Uma
das principais confissões de fé da história da igreja confirma essa íntima relação entre Cristo e
sua igreja.
Creio em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, o qual foi concebido
por obra do Espírito Santo; nasceu da virgem Maria; padeceu sob o poder de Pôncio
Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado; ressurgiu dos mortos ao terceiro dia; subiu
18

ao Céu; está sentado à direita de Deus Pai Todo-poderoso, donde há de vir para julgar
os vivos e os mortos.12

Isso implica no fato de que uma igreja sem Cristo não pode ser considerada igreja. O
caráter íntimo de Cristo e sua igreja, na mesma linha confessional, é corroborado por outra
parte de seu texto. Depois de considerar a doutrina de Deus, do Filho e do Espírito Santo,
afirma o Credo: “Creio”… “na Santa Igreja Universal; na comunhão dos santos; na remissão
dos pecados; na ressurreição do corpo; na vida eterna. Amém13. Esta afirmação do primeiro
documento de fé vincula a Igreja, povo de Deus, à Trindade, e necessariamente, com Cristo e
sua obra14.
A conexão entre o Messias e sua Igreja precisa ser reforçada pois a sua
desconsideração tira o devido entendimento sobre a natureza da Igreja. A Igreja é de Cristo e
de mais ninguém. Ele a fundou e lidera, a sustenta e a ensina. O caráter orgânico e vital dessa
relação é muito bem destacado pela metáfora bíblica do corpo. “A Igreja não é uma
organização; é um organismo. É formada de partes vivas”15. Essa relação íntima e
indissociável com Cristo orienta uma eclesiologia que considere as implicações da natureza
tríplice dos ofícios do Ungido e sua consequente aplicação para a eclesiologia.
As confissões de fé insistem que o ofício tríplice de Cristo foi manifestado no estado
de humilhação de Cristo, mas também permanecem atuantes em seu estado de exaltação. O
fato de Cristo continuar atuando numa perspectiva tríplice é mais um ensejo para considerar
com ênfase essa manifestação tríplice na realidade do mundo e da igreja. Os ofícios de Cristo
e sua íntima relação com a sua Igreja ratificam a perspectiva tríplice como componente da
identidade do povo de Deus. Essa constatação deve guiar o plantio de novas igrejas, a
formulação de um projeto para plantio de igrejas deve ser guiada por esse pressuposto.

1.4 O SENHORIO DIVINO ESTABELECE UM PADRÃO TRÍPLICE PARA O


CONHECIMENTO DA REALIDADE

O senhorio divino, como delineado por Frame, aparece em categoria tríplice: o Senhor
é: (a) aquele que controla todas as coisas por seu grande poder; (b) aquele que fala com
12
Credo Apostólico. Bíblia de Estudo da Fé Reformada. A Igreja. Editor chefe. Sproul, A.R. São José dos
Campos: Editora Fiel, 2021. P. 2388.
13
Ibid. loc. cit.
14
Op. cit.
15
A Igreja. Bíblia de Estudo da Fé Reformada. 2021. P. 2094.
19

autoridade absoluta, exigindo corretamente que todos obedeçam; (c) aquele que se entrega ao
seu povo na intimidade da aliança: “Eu serei o seu Deus, e você será o meu povo”. Frame
nomeia esse último conceito de presença.16
Na visão de Frame, o conhecimento possui uma categoria tríplice. A partir de um
paradigma reformado entende-se que todo conhecimento é viabilizado por Deus. Ao tomar os
atributos do senhorio divino para sobrepor realidades é possível ampliar um conhecimento
sobre determinado objeto de estudo.
As devidas perspectivas consideradas a partir dos atributos divinos serão: a normativa,
a situacional e a existencial. Os atributos divinos a que elas correspondem são a autoridade, o
controle e a presença17. Assim, um conhecimento é mais amplamente percebido quando se
considera esse olhar tríplice para a “norma” que rege o objeto ou realidade a ser conhecida,
para a “situação” em que o objeto ou realidade em análise está participando, e para a
“existência”, que vem a ser o aspecto íntimo ou intrínseco do que se conhece18.
Aproximando os termos do tríplice ofício estabelece-se que a perspectiva normativa
está para o ofício profético, assim como a perspectiva situacional está para o ofício real e a
perspectiva existencial está para o ofício sacerdotal.
É importante lembrar que esse método teológico ou teoria do conhecimento não foi
dado como normativo para os assuntos teológicos até o momento. Seria inapropriado
desconsiderar que há opositores dessa proposta tríplice no mundo teológico, receosos de
algumas de suas implicações e aplicações.
O que parte de seus críticos deve lembrar, bem como seus ávidos defensores, é que a
perspectiva tríplice é, antes de mais nada, uma postura epistemológica19. Isso significa, entre
outras coisas, que o tri-perspectivismo não deve ter caráter de doutrina, o que daria a ele um
aspecto normativo. Essa proposta pouco rígida do método é verificada na conclusão de um
dos seus principais propositores sobre qual seria a utilidade do perspectivismo, Frame afirma:
“Há alguns momentos em que acho que é uma espécie de estrutura profunda do universo e da
verdade bíblica. Outras vezes (na maioria das vezes) penso nisso de forma mais modesta,
como um dispositivo pedagógico20.
16
FRAME, J. O que é Tri-perspectivismo. op. cit.
17
FONTES, F. op. cit.
18
FRAME, John M. A doutrina do conhecimento de Deus. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2010. P. 105.
19
FONTES, F. Op. cit.
20
FRAME, J. O que é tri- perspectivismo. Op. cit.
20

Se por um lado ele não é normativo, por outro, deve-se argumentar que ele não é
relativista. Na postura perspectivista o conhecimento é possível. Sendo o tri-perspectivismo
fundamentado na epistemologia reformada21, ele reconhece a limitação do conhecimento
humano, mas isso não é a mesma coisa que afirmar não haver conhecimento. Outrossim, a
soma das perspectivas não presume esgotar o conhecimento, pois o conhecimento absoluto
somente a Deus pertence.
Faz necessário reforçar que esse método perspectivista implica em tratar a maneira
como o conhecimento humano é possibilitado. O conhecimento humano, mesmo acessando
revelação especial não se iguala ao jeito que Deus vê22. O que pode ser captado pelo homem é
um modo de perceber o que foi dado a conhecer por Deus, é uma perspectiva.
Sendo assim, a missiologia aplicada à plantação de igrejas se apoia em três
perspectivas para ampliar sua compreensão sobre o que vem a ser necessário na plantação de
igrejas. Outrossim, ao considerar a perspectiva profética, real e sacerdotal, evita-se o enfoque
hiper dimensionado em uma única vertente do trabalho missionário. Na soma dessas
perspectivas há que se encontrar o equilíbrio desejado para a efetivação do trabalho.
O perspectivismo não endossa todas as opiniões de outras visões do mundo, todavia,
ele considera que áreas do conhecimento humano, científico, psicológico, podem conter
elementos de verdade e por isso colaborar com uma melhor visão do todo.
O método tríplice pode auxiliar a amenizar o fundamentalismo e as leituras e análises
unilaterais ou fundamentalistas no meio cristão que acirram e munem a oposição da sociedade
relativista contra o cristianismo. Interpretações simplistas e superficiais de teólogos e pastores
favorecem a antipatia já costumeira da sociedade contra os cristãos e isso deve ser evitado por
todo aquele que está engajado em projetos missionários de plantação de igrejas.
O tri-perspectivismo considera múltiplas perspectivas para o conhecimento sem negar
a existência de um conhecimento possível e real sobre a realidade. É ao mesmo tempo
humilde e corajoso. “Nossa finitude não implica que todo o nosso conhecimento seja errôneo
ou que a certeza seja impossível”23.
O que esta pesquisa propõe é aplicar esse referencial teórico na plantação de igrejas.
Pode-se afirmar que isso seria levar a discussão para um passo adiante. O tri-perspectivismo

21
FONTES, F. Op. cit.
22
Ibid.
23
FRAME, J. O que é Tri-perspectivismo. Op.cit.
21

pode instruir e fundamentar a visão eclesiológica para o plantio de novas igrejas. Ele fornece
“lentes” metodológicas para compreender e considerar os fundamentos práticos da plantação
de igrejas. Ele possibilitará ênfases ministeriais distintas, equilíbrio na utilização de fontes
para o pensar missiológico, e direção para o serviço missionário em harmonia com o que
estabelece a Cristologia. Não se trata de inovação, mas um desdobramento possível e útil a
discussão missiológica.

Como seria tratar a plantação de novas igrejas sob a tríplice perspectiva? Quanto a
categorização tríplice define a identidade da Igreja? Enquanto reis, sacerdotes e profetas
subordinados, quais práticas devem guiar o povo de Deus no estabelecimento de comunidades
locais que se reúnem em nome de Jesus Cristo? Quais fontes a categorização tríplice oferecerá
para a missiologia?
22

2. A ECLESIOLOGIA E O TRÍPLICE OFÍCIO

2.1 A IMPORTÂNCIA DE DEFINIR O QUE É IGREJA


O que é a Igreja? O que faz uma igreja ser reconhecida como verdadeiramente Igreja?
Uma clara definição da identidade e missão da Igreja é essencial para a atividade missionária
relacionada ao plantio de novas igrejas. Todos os envolvidos neste trabalho de plantio de
novas igrejas devem saber exatamente o que se relaciona ao seu trabalho. A definição do que
vem a ser igreja tem por finalidade demonstrar natureza, identidade e missão. Na presença de
uma distorção ou equívoco, os desdobramentos práticos da razão de ser, essência e foco do
projeto missionário ou trabalho estabelecido podem ser equivocados, infrutíferos, e pior,
infiéis.
Este questionamento sobre a identidade da Igreja esteve no centro de profundas
discussões no cenário protestante americano e brasileiro nas últimas décadas. Títulos
emergiram no cenário protestante evocando a necessidade de resgatar o valor e a essência do
que vem a ser a Igreja: “Porque amamos a Igreja”, “Igreja por que me importar”, “As nove
marcas de uma igreja saudável”, “Igreja simples”, “Igreja essencial”, “Igreja centrada”, Igreja
intencional”, “Deliberadamente igreja” somam-se a outras obras que visam resgatar o
conceito e a importância do que vem a ser a Igreja, bem como resgatar sua identidade e
missão.
O surgimento das Igrejas emergentes, o fenômeno dos desigrejados, somados ao
crescente número de seitas e heresias, trazem à tona muitos desafios, entre eles, a necessidade
de se insistir em um conceito confessional do que vem a ser a Igreja. Campos oferece uma
excelente contribuição ao defender a necessidade das Igrejas Reformadas valorizar a
confessionalidade com forma de contrapor a enxurrada de cosmovisões que desafiam a fé
cristã:
A Escritura tem sido abordada por óticas diferentes, que geralmente são chamadas de
cosmovisões. Ela tem sido interpretada por pessoas que possuem cosmovisões muito
diversas, que ocasionam entendimentos bastante diferentes dos mesmos textos. A fé
reformada é uma tentativa justa e consistente de interpretar a Escritura de acordo com a
própria Escritura. Portanto, ao encerrar-se o século XX, as Igrejas Reformadas têm que
fazer jus à sua história e reafirmar veementemente a fé que uma vez por todas nos foi
entregue, da forma em que está interpretada pelos símbolos reformados de fé.24

24
CAMPOS, Heber Carlos. A relevância dos credos e confissões. Fides Reformata. 2/2 1997. Disponível em:
https://cpaj.mackenzie.br/wp-content/uploads/2019/02/7_A-Relevancia_dos_Credos_e_Confissoes_Heber_Cam
pos.pdf. Acesso em: 05 set 2022.
23

Além de uma definição amparada na boa tradição, insistir nas marcas da igreja
verdadeira, de acordo com o paradigma eclesiológico confessional, é mais um componente de
defesa para combater os ventos de desconstrução advindos do contexto atual.
A luta por uma definição eclesiológica está longe de dar sinais de arrefecimento na
teologia contemporânea25. Chung considera que “a eclesiologia é o grande debate da teologia
atual”26 . O erro na definição e conceituação do que vem a ser a igreja está no bojo deste
processo de desconstrução de identidade eclesiológica, e adverte-se que seu resultado
desastroso explica parte do trágico fenômeno dos desigrejados.
Horton, acertadamente percebe que o erro dos emergentes e das igrejas livres está em
seu deslocamento da referência dos meios de graça, isso é fortalecido pela desconexão
histórica dos referidos movimentos e o seu consequente desprezo pela tradição. Horton
enuncia como eles pensam a igreja: “ uma realidade puramente espiritual trazida à existência
pela vontade e esforço de muitas pessoas, sem um relacionamento definido entre o sinal e a
realidade significada”.27 Como sinal dessa presente desconstrução, nesse movimento citado, a
pregação e os sacramentos são vistos meramente como testemunhos da graça de Deus, e não
como meios pelos quais de fato Deus comunica sua graça28. Isso tudo traz implicações sobre o
que eles entendem e ensinam sobre o que é a Igreja.
Insistir nas marcas da verdadeira Igreja a partir da boa tradição, assim como definir o
que é e o que não é “Igreja” torna-se elementar para caracterizar o que vem a ser essencial em
termos práticos para a eclesiologia. E mais ainda, uma definição que expresse a noção bíblica
de eclesiologia e que tenha o bom testemunho da história dá a chance de equiparar os
conceitos que emergem do munus triplex.
Ir ao âmago da definição do que vem a ser a igreja, bem como se valer dos distintivos
que orientam quais são as marcas de uma igreja verdadeira, conecta a sua natureza ao munus
triplex, necessariamente. A união da definição teológica do que vem a ser a Igreja de Cristo
somada aos apontamentos históricos da tradição reformada sobre as marcas da verdadeira
igreja oferecem um conjunto de elementos que tornam possíveis a identificação de correlação
entre os ofícios de Cristo e a dinâmica da igreja na sua realidade prática e histórica.

25
CHUNG, Chun. Aula: Fundamentos Bíblicos da Missão. Centro de Pós-graduação Andrew Jumper. São
Paulo: Ano 2021. Material não publicado.
26
Ibid.
27
HORTON, Michael. Teologia Sistemática. São Paulo: Cultura Cristã, 2016. P. 876.
28
Ibid.
24

2.2. DEFINIÇÃO DE IGREJA E SUA RELAÇÃO COM O MÚNUS TRIPLEX

Bavinck ecoa muito bem a tradição reformada em sua conceituação e define a Igreja
como “a reunião dos crentes que confessam Jesus como seu Senhor”.29 Tomando essa
definição como referência é possível distinguir uma tríade e associá-la ao munus triplex, “a
reunião dos crentes” está para o ofício sacerdotal, assim como a “confessar Jesus” está para o
ofício profético, e considerar que Jesus é o Senhor é análogo ao ofício real.
Os pontos destacados podem ser elencados da seguinte maneira: a reunião dos crentes
para comunhão, o ajuntamento, o cuidado mútuo, e a caminhada fraterna entre os fiéis fazem
parte do conjunto de realidades subentendidas na definição de Bavinck, apoiados no conceito
expresso: “reunião dos crentes”. Todos esse quadro conceitual revela o papel do ofício
sacerdotal. Em outras palavras, é sabido que a reconciliação de Deus com seu povo, e a união
desse povo como família de muitos irmãos é viabilizada pela obra salvífica e expiatória de
Cristo, expediente vinculado ao ofício sacerdotal do Ungido.
A compreensão do senhorio de Cristo, o entendimento de sua obra e o acesso aos seus
ensinos que, por sinal, levam esse povo a confessar Jesus, são dinâmicas com conexão ao
ofício profético. Por sua vez, a obediência do povo ao governo soberano de Deus e a rendição
irrestrita ao domínio de Cristo está amparada no ofício real.
Na tradição reformada não há variações que distanciam dessa definição de Bavinck,
no entanto há ocorrências de desdobramentos e apontamentos de áreas e atividades essenciais
que compõem esse ajuntamento dos santos. Vale a verificação para perceber alguns
componentes de permanência e até desdobramentos válidos do mesmo conceito. Torna-se
oportuno, inclusive, a identificação de algumas tríades na definição de Lidório, o qual define a
igreja incluindo seu aspecto missiológico e trinitário. Ele vincula natureza e propósito em sua
definição:
O plantio de igrejas é o resultado da soberania de Deus que decidiu chamar para si
pessoas de todos os povos, línguas, tribos e nações por meio de sua graça expressa no
sacrifício do Cordeiro Jesus, juntando-as em igrejas locais centradas na Palavra,
comunhão, adoração, oração e missão, encorajadas pelo Espírito Santo, debaixo do seu
poder e para sua própria glória.30

Uma sequência tríplice de tríades podem ser verificadas nesta definição de Lidório.
Essas constatações orientam a noção de que a realidade tríplice permeia toda a realidade

29
BAVINCK, Herman. Teologia Sistemática.Santa Barbara d’Oeste: SOCEP, 2001. p. 566.
30
LIDÓRIO, Ronaldo. Plantando igrejas. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2018. p. 15.
25

eclesiológica. Primeiramente, destaca-se a tríade da ação divina, caracterizada pela: soberania,


redenção e santificação; em segundo lugar, nota-se a tríade dos agentes da plantação de
igrejas: Pai, Filho e Espírito Santo; por último segue a tríade dos propósitos de Deus na
plantação de igrejas: chamar pessoas, juntá-las em igrejas locais, promover a Glória de Deus.
A aproximação de definições do que vem a ser igreja para verificação da ocorrência de
padrões tríplices se torna um passo importante para identificação da permeabilidade do munus
triplex na eclesiologia. O próximo passo é considerar as marcas da verdadeira igreja e
verificar se a mesma ocorrência se repete.

2.3. AS MARCAS DA VERDADEIRA IGREJA E O MUNUS TRIPLEX

Vale lembrar que as marcas da verdadeira Igreja vieram a ser consideradas para fazer
frente às ameaças de deturpações. A partir do momento em que seitas e heresias começaram a
dar sinais de forte influência no seio da cristandade, foi necessário apontar o que realmente
distingue uma Igreja verdadeira, isso se repetiu com maior ou menor intensidade ao longo da
história do cristianismo31.
Esse delineamento sobre o que distingue uma igreja verdadeira de uma igreja falsa foi
sim um tipo de problema suscitado já na Igreja Primitiva32. Outros problemas teológicos que
afetariam diretamente a vida da Igreja suscitaram concílios que firmaram suas convicções e
defenderam a sã doutrina contra o erro.
Um sucinto relato histórico contribui para perceber a necessidade dos Credos e
Confissões para a saúde da Igreja. O primeiro Credo, o apostólico é datado do segundo
século. Em 325 foi formulado o Credo de Nicéia, marcado pelo combate às heresias de Ário,
depois houve o Credo de Constantinopla (381), que afirmou a plena divindade do Espírito
Santo. O Credo de Calcedônia (451) tratou especificamente das duas naturezas de Jesus
Cristo, sobre as quais a igreja pouco acrescentou posteriormente, em virtude da precisão das
suas idéias. Esses foram os principais33.

31
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. São Paulo, Cultura Cristã: 2009 P. 528.
32
OLSON, Roger E. História da teologia cristã: 2000 anos de tradição e reforma. São Paulo: Editora Vida,
2000. P. 27.
33
CHAMPLIN, Russel Norman. Enciclopédia de Bíblia, teologia e filosofia. Volume 01. São Paulo: Editora
Hagnos, 2001.
26

Ainda que a formulação de credos tenham arrefecido na Idade Média, a necessidade


de distinguir a crença ortodoxa retorna com veemência no período da Reforma Protestante34.
A efusão de tal comportamento nesse último contexto pode ser confirmada pela quantidade de
confissões que emergiram na ocasião.
Para considerar os atributos da Igreja, as qualidades inerentes e indissolúveis do corpo
de Cristo, pode-se tomar como paradigma um desses primeiros Credos erigidos na história, o
Credo Niceno35. A partir dele lista-se as características essenciais da Igreja, que elencadas são:
unidade, santidade, catolicidade e apostolicidade.
Enquanto o documento erigido em Nicéia concentra-se nos atributos da Igreja, ao
longo das eras verificou-se a necessidade de perceber e listar quais características são
indispensáveis para que uma comunidade de fé local possa ser legitimamente identificada
como santa, una, católica e apostólica.
Não há unanimidade em torno da determinação de quais são as marcas distintivas da
igreja. Mas isso não impede a análise de apontamentos legítimos na história. Calvino destaca
apenas a Palavra e os Sacramentos como marca da verdadeira Igreja, conclusão esta seguida
por Abraham Kuyper36. Houve quem ampliasse as referidas marcas para além das três
apoiadas por Berkhof, a saber, a fiel pregação da palavra, a correta administração dos
sacramentos e o fiel exercício da disciplina37. Nesta pesquisa, optou-se pela definição de
verdadeira igreja o que adota Bavinck, o qual delineia muito bem sua noção do conjunto
sacramental: “essa ministração da Palavra e o dos sacramentos devem ser acrescentados o
exercício da disciplina e o serviço de misericórdia”38
Pode ser indagada a razão da escolha por Bavinck. A sua adição faz jus à tradição
reformada. Ela é a que melhor respalda a distinção de ofícios na liderança das igrejas da
mesma tradição. É mister lembrar que na consideração dessa tradição, ao indicar a
responsabilidade do presbítero docente como responsável pela fiel pregação e administração
dos sacramentos, ao presbítero regente atribui-se à responsabilidade da disciplina e por sua
vez, os diáconos concentram-se nos serviços relacionados ao ministério da misericórdia. Tal
consideração sobre as lideranças constituídas é endossada pelo eminente teólogo Beeke. Ele
34
Ibid.
35
Credo Niceno-Constantinopolitano. Bíblia de Estudo da Fé Reformada. 2021. P. 2389.
36
BERKHOF, Louis. 2009. P. 529.
37
Ibid. P. 528.
38
BAVINCK, Herman. 2001. P. 594.
27

afirma que “na igreja da nova aliança agora existem três ofícios permanentes: ministros da
palavra (pastores e mestres), presbíteros e diáconos”.39
Os ofícios de Cristo podem ser facilmente associados ao que a boa tradição definiu
como marca distintiva da igreja. A pregação fiel e a correta administração dos sacramentos
têm uma correlação direta com o ofício profético. Na vida prática da igreja local, quando essa
área está cuidada a contento, pode-se afirmar que o ofício profético de Cristo, manifestado de
forma subordinada pelos dons específicos na igreja local está recebendo a devida atenção.
A disciplina do Rei dos reis é possibilitada na atuação subordinada do ofício real na
responsabilidade dos presbíteros regentes. Assim, com a obra de serviço e misericórdia do
Supremo Sacerdote se manifesta de forma subordinada na ação da diaconia da igreja local.
As marcas da Igreja verdadeira apontam para o fundamento em que ela está fundada, a
pessoa e obra do ungido, razão pela qual a autenticidade da igreja passa pela consideração do
munus triplex. O próximo passo é analisar como as áreas práticas da vida de uma igreja local
são tocadas por essa realidade tríplice.

2.4 A IGREJA É PROFETA, SACERDOTE E REI

A dinâmica de uma igreja local oferece atividades e encaminhamentos que


oportunizam uma diversidade de áreas afins que merecem atenção e zelo. Na prática do dia a
dia emergem mais setores e demandas na igreja do que verificado do que pode ser
depreendido de imediato ao categorizar “as marcas da verdadeira Igreja”. Na experiência
prática, é constatado que áreas afins, departamentos, dons e necessidades surgem. A questão
que pode ser levantada é como o munus triplex acomoda tal pluralidade de atividade e
serviços que são bem mais que três?
O tríplice ofício trata daquilo que é vital e necessário para a vida da Igreja em todos os
tempos e épocas, pois ele se relaciona com a obra de Cristo para o seu povo e propósito.
Cristo é suficiente para sua Igreja sempre. Sendo assim, todas as áreas e atividades realmente
essenciais ao corpo de Cristo se enquadram na atribuição de um dos ofícios de Cristo.
Tudo que esteja necessariamente e biblicamente relacionado à Igreja deve estar
vinculado com Cristo, visto ser ele seu fundador, redentor e sustentador, e por consequência, a
medida que servos e servas se empenham no labor da obra de Cristo, na Igreja e no mundo,
eles dão continuidade aos ofícios de Cristo de maneira subordinada. "O cumprimento de Jesus

39
BEEKE, Joel; JONES, Mark. Teologia Puritana: doutrina para a vida. São Paulo: Vida Nova, 2016.
28

​dos papéis de profeta, sacerdote e rei tem implicações para a missão da igreja e para o papel
de cada crente40.
Pela ótica da teologia bíblica, Cristo é o cabeça da Igreja. Essa noção de “cabeça” é
uma metáfora para revelar o papel central de Cristo. Há ainda outra figura de linguagem que
corrobora esse conceito está na noção de “pedra principal” sobre a qual a Igreja está firmada.
Outra figura com viés orgânico que ilustra de forma intensa a percepção de como Cristo é a
fonte da vida da igreja é considerada no Evangelho de João41. Nesse contexto, Cristo é posto
como o organismo do qual os discípulos derivam como ramos. A vitalidade desses ramos e
sua frutificação está intimamente relacionada à permanência nesse tronco central.
Considerando ser Cristo tão fundamental para igreja, isso seria dizer em outras
palavras, tudo que permeia a igreja enquanto organismo que desfruta de vitalidade tem sua
origem em Cristo Jesus. A palavra Cristo é o título para o Messias. Essa nomenclatura tem
total relação com o fato do Senhor Jesus ser o mediador do pacto da graça. O catecismo maior
de Westminster ensina que:
“o nosso mediador recebeu o nome de Cristo porque foi ungido sobre medida pelo
Espírito Santo, e assim separado e plenamente investido de total autoridade e
capacidade para exercer os ofícios de profeta, sacerdote e rei da sua igreja, tanto no
estado da sua humilhação quanto no da sua exaltação42.
O catecismo insiste que o tríplice ofício é mantido por Cristo em seu estado de
exaltação. Portanto, ao considerar que a identidade de Cristo passa pela realidade do munus
triplex, é salutar afirmar que todas as áreas da vida da igreja estão, por implicação lógica,
necessariamente associadas à identidade de rei, profeta e sacerdote.
A divisão feita e a aplicabilidade dos ofícios para identificar dons e áreas não excluem
a noção de que cada ofício de Cristo manifestado na igreja ocorre de forma múltipla e
simultânea. A distinção serve para estudo e análise. Ofícios jamais são vivenciados de forma
exclusiva e independente. Em outras palavras, Jesus Cristo nunca é rei sem ser ao mesmo
tempo profeta e sacerdote43.

40
BELCHER, Richard P. Jr.. Profeta, sacerdote e rei: os papéis de Cristo na bíblia e nossos papéis hoje.
Publicação P & R. Edição do Kindle. 2016. P. 159.
41
Evangelho de João, capítulo 15. Bíblia Sagrada. Sociedade Bíblica do Brasil.
42
VOS, Johannes Geerhardus. Catecismo de Westminster comentado. Recife: Os puritanos, 2015. P. 136.
43
HORTON, M.2016. P. 553.
29

Bavinck falando dos ofícios de Cristo em seu estado de humilhação menciona que
“Jesus em todos os lugares ocupou-se simultaneamente do exercício desses três ofícios''. Ele
proclama a palavra de Deus como um profeta, mas ao falar ele exercia a sua misericórdia
sacerdotal e seu poder real, pois através da sua palavra ele curava os enfermos, perdoava
pecados e acalmava a tempestade”44.
Teólogos são categóricos ao afirmar que o propósito inicial do homem na criação tinha
estreita relação com os ofícios de rei, profeta e sacerdote. “O propósito e o destino do homem
estão no desdobramento da imagem de Deus, no desenvolvimento harmonioso de todos os
seus dons e poderes, no exercício dos ofícios de profeta, sacerdote e rei”45. Bavinck, ao
salientar a oposição que João Calvino fez à hierarquia sacerdotal romana, afirma que no
conceituação do reformador, ao restabelecer os ofícios da liderança (presbíteros e diáconos),
“ele pensava na Igreja, acima de tudo, como uma reunião ou comunhão de crentes, que, por
sua confissão e por sua vida, provavam ser o povo de Deus e na qual todos foram
pessoalmente ungidos por Cristo para ser profetas, sacerdotes e reis”46.
Beeke conclui que a vida da igreja, a partir da declaração do Reformador João
Calvino, tem conexão direta com os ofícios de Cristo ao mesmo tempo que os vincula
diretamente à obra missionária.
“A afirmação de Calvino do sacerdócio universal de todos os crentes envolve a
participação da igreja no mistério profético, sacerdotal e real. Ele comissiona os crentes a
confessarem o nome de Cristo a outros (tarefa profética), para orar pela salvação deles
(tarefa sacerdotal), e para discipliná-los (tarefa real). Isto é a base para a poderosa
atividade evangelística por parte da igreja viva “até os confins da terra”47.
A aplicação dos ofícios de Cristo por Beeke elenca as atividades evangelísticas,
intercessórias e exortativas dos cristãos aos respectivos ofícios. Ele vai mais longe em sua
aplicação do que muitos outros estudiosos. Um cristão enquanto rei exorta e disciplina,
enquanto profeta confessa e testemunha de Cristo, enquanto sacerdote, ora. A aplicabilidade
de Beeke sobre os ofícios ainda é bem restrita e pode ser somada a outras percepções.

44
BAVINCK, Herman. 2001.P. 366.
45
Ibid. p. 367.
46
Ibid. p. 591.
47
BEEKE, Joel. João Calvino como professor de evangelismo. E-book. Editora Os puritanos. Disponível em:
https://livros.gospelmais.com.br/files/livro-ebook-joao-calvino-como-professor-de-evangelismo.pdf. Acesso em:
10 fev 2022.
30

A conexão que Horton faz dos desdobramentos dos ofícios liga-os diretamente aos
dons de liderança. Ele associa a presença do múnus triplex e sua mediação muito mais aos
oficiais da igreja do que aos cristãos. Por exemplo, ao abordar as obras de serviço efetuadas
pelos diáconos, pontua o autor que elas são feitas oficialmente em nome de toda igreja.
Não dá para dizer que Horton cala-se de todo quanto a aplicabilidade e ocorrência dos
ofícios na vida da igreja. Ainda que ele afirme a responsabilidade dos ministros e presbíteros
que preparam os santos como testemunhas no ofício geral como profetas, sacerdotes e reis,
assim, o autor oferece uma pista da associação de dons específicos com determinado ofício:
“as obras de serviço, são feitas oficialmente em nome de toda a igreja pelos diáconos,
conquanto todos os cristãos sejam dotados com dons de hospitalidade, generosidade e serviço
mútuo no corpo.”48.
É perceptível neste caso que os dons de hospitalidade, generosidade e serviço mútuo
estão para Horton inseridos dentro do corpo de ação do ofício sacerdotal, o que por sua vez é,
na compreensão do autor, mediado pelo Espírito na ação do diaconato.

2.5 IMPLICAÇÕES PRÁTICAS DO TRÍPLICE OFÍCIO

Propõe-se que três áreas específicas que estão presentes na vida das igrejas locais,
sejam categorizadas com binômio específico. Essa nomeação visa dar clareza ao leque de
abrangência de atividades e áreas afins que podem compor os ministérios de uma comunidade
local.
A primeira grande área sugerida é atribuída ao escopo de ação do ofício‘profético”,
nomeia-se a mesma, para fins didáticos, com o binômio “palavra e missão”. Pode-se incluir
todos serviços que vinculam-se com evangelização, discipulado, ensino bíblico, ensino
teológico, tradução e pregação.
As escrituras ensinam que todas as coisas foram criadas pelo poder da Palavra. O
gesto discursivo de Deus na obra da criação sinaliza o valor das Palavras de Deus. O profeta
bíblico é o emissário autorizado por Deus para enviar a mensagem de Deus, esse mensageiro
anuncia as Palavras do próprio Deus. Esse destaque para o emissário das palavras divinas é
validado por toda a narrativa bíblica, o que evidencia seu valor essencial.
O ofício profético é determinante na revelação do conhecimento de Deus, esse é o
testemunho de toda a teologia bíblica. Cristo Jesus é o verdadeiro profeta, que não apenas

48
HORTON, M. 2016. P. 901.
31

anuncia e ensina a Palavra de Deus, mas que é a própria Palavra encarnada. A sua Igreja
recebe dele a profecia e é alçada a testemunha fiel para proclamar suas verdades a todos os
povos. Diante disso, cabe considerar que Cristo permanece em seu estado de exaltação como
o verdadeiro profeta, todos os seus discípulos dão continuidade ao ofício profético de maneira
subordinada à medida que se relacionam com a proclamação da verdade bíblica. Sendo assim,
‘palavra-missão’ está conectada ao grande eixo do ofício profético de Cristo, que aparece na
igreja através de dons e práticas específicas. Todos esses serviços proféticos são
extremamente relevantes à eclesiologia, portanto, indispensáveis na prática da plantação de
novas igrejas.
A segunda grande área a ser considerada tem relação com o ofício real. Nomeado com
o binômio “liderança e disciplina”. Em sua abrangência pode ser incluído práticas tais como:
correção, exortação, excomunhão, organização, administração, a autoridade dada para
enfrentar o poder de Satanás, bem como o chamado dos eleitos e a entrega de leis para que
obedeçam ao Rei, comissionamento de vocações e delegação de responsabilidade, bem como
estabelecimento de visão, criação de planejamento e utilização de estratégia para o trabalho
ministerial.
É vital reconhecer que todos os serviços e realidades acima citados são
desempenhados pelo ofício real de Cristo manifestado em sua Igreja. Em outras palavras, são
aspectos decorrentes do ofício de Rei aplicados no exercício prático da vivência da igreja.
Belcher assevera que o ofício real no AT já era desempenhado muito antes da monarquia, a
história de Abraão evidencia isso. Sua postura diante dos desafios impostos em seu contexto
exigiu dele liderança, estratégia e coragem. “Derrotar a coalizão de reis envolve estratégia
militar, e Abraão negocia com o rei de Sodoma quando ele retorna com os despojos. Abraão
age como um rei defendendo a terra derrotando um poderoso grupo de reis e resgatando um
membro de sua casa49.
O Rei, Jesus Cristo, que um dia chamou para si súditos, libertou seus filhos da
escravidão, deu-lhes o reino, mantém sua operação de realeza de maneira subordinada através
da igreja. A liderança da igreja, de forma geral, ao conduzir o povo de Deus, integra o eixo do
ofício real. Nessa categoria de ação da realeza, pode ser acrescentado o mandato cultural,
onde cada discípulo de Jesus vive subordinado às leis do Rei para promover o reino em todas
as áreas da vida.

49
BELCHER, R. 2016. P.5.
32

Por último, a grande área que envolve o ministério sacerdotal, nomeada nesta
pesquisa com o binômio: “comunhão e serviço de misericórdia”. Nela estão contidas todas as
ações, serviços e ministérios que envolvem: oração, culto, adoração, cuidado dos pobres e
necessitados, conexão e cuidado mútuo entre membros da comunidade, etc.
Julga-se a obra sacerdotal do Messias um dos pontos mais essenciais da redenção: a
saber, a expiação e morte substitutiva e vicária de Cristo na cruz do Calvário50. Com seu
sangue derramado, o Filho de Deus recebe a justa ira divina que recairia sobre todos aqueles
que hão de receber a salvação. De acordo com o Evangelho de João, Cristo é o Cordeiro de
Deus que tira o pecado do mundo. Na perspectiva do escritor de Hebreus, ele é o Sumo
Sacerdote que se compadece das fraquezas dos filhos de Deus, e que propicia a aproximação
de todos os que creem ao trono da graça de Deus.
A obra sacerdotal de Cristo tem total relação ao sacrifício no calvário pelo qual fez a
expiação dos pecados de todos os filhos de Deus, mas, soma-se a essa obra sacerdotal uma
vida de retidão em gratidão e glória ao Pai. O viver santo do Filho de Deus tem conexão direta
com seu papel sacerdotal.
“Deus preparou um corpo para o Filho eterno para ser dado não apenas para expiação,
mas para aquela obediência viva para a qual a humanidade foi criada… Em resumo,
Cristo é o nosso salvador sacerdotal tanto ao oferecer seu sacrifício vivo de uma vida
inteira de louvor e gratidão como por oferecer a si mesmo como o sacrifício pela culpa
pelos nossos pecados”51.

A compaixão de Cristo também tem conexão com seu papel sacerdotal. O escritor de
Hebreus conceitua a compaixão de Cristo pelos pecadores como algo associado ao seu ofício
sacerdotal. Bavinck ecoa esse entendimento ao afirmar que “as obras realizadas por Jesus
pertenciam ao seu ofício sacerdotal, e por isso elas eram manifestações da sua compaixão,
todos os milagres de Jesus são milagres de redenção e cura, e como tais eles pertencem ao seu
ofício sacerdotal”52.
Sendo Cristo sacerdote eterno, seu povo é subordinadamente alçado à condição de
sacerdotes53. Levando em consideração a obra de expiação e intercessão de Cristo, esta
pesquisa reconhece que a obra de intercessão, oração, adoração, e os sacrifícios verificados na
boas obras por parte de todo cristão, ou seja, ações de misericórdia e compaixão, devem ser
50
VOSS, G. J.. 2015. P. 141.
51
HORTON, M.. 2016. P. 519.
52
BAVINCK, 2015. P. 377, 378.
53
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Editora Vida Nova. 2007. P. 528
33

adequadamente relacionadas ao ofício sacerdotal. Todas essas ações podem ser relacionadas
aos sacrifícios apontados no NT, e como afirma Belcher, “parte do papel dos sacerdotes será
oferecer sacrifícios em nome dos israelitas para levá-los a um estado de santidade, garantindo
que a presença de Deus permaneça no meio deles”54.
Sendo assim, todos os discípulos envolvidos em tais serviços estão exercitando o
ofício sacerdotal. ‘Comunhão e serviço misericórdia’ são essenciais à conjuntura da vivência
prática eclesiológica, portanto, área salutar a ser considerada na plantação de novas igrejas.
A subdivisão de áreas pode ser ampliada. As que foram mencionadas servem apenas
de ilustração para apontar a presença de uma categorização dos serviços que podem ser
associados a responsabilidade específica de cada ofício.
A classificação proposta deu-se mais por dedução do que por conexão com textos
provas. Sua proposta é tanto mais apontamento de um caminho possível para compreensão e
percepção da presença do tríplice ofício em áreas práticas da vida da igreja. A proposta tem
pretensão didática e não normativa.
Ao considerar essas áreas, não deve-se pensar em estrutura linear, como se ocorresse
uma após a outra separadamente, Trata-se de ocorrências simultâneas, separadas na
explicação apenas para fins didáticos. O plantio de igrejas, assim como a própria vivência da
igreja se dá em processos que se perpassam. O próprio plantio de igrejas acontece de forma
processual. Lidório, ao considerar estratégias essenciais para o plantio de igrejas, lembra que
o plantio de igrejas é um processo55.
É salutar destacar que manifestação do tríplice ofício no contexto da igreja local não é
privilégio apenas do pastor ou missionário. Ela é estendida a todos os convertidos. Pelo poder
e aplicação da obra de Cristo pelo Espírito Santo, os discípulos de Jesus manifestam os ofícios
de Cristo. Como afirma Grudem: “por toda a eternidade, agiremos para sempre como
profetas, sacerdote e reis subordinados, sempre sujeitos ao Senhor Jesus, o supremo profeta,
sacerdote e rei56. Seguindo o princípio do sacerdócio universal, todos os cristãos são além de
sacerdotes, em determinada medida, reis e profetas também. Eis um excelente princípio de
prática eclesiológica a ser considerado no plantio de igrejas.
O equilíbrio nas frentes ministeriais não ocorre de acordo com as necessidades, eles
são diretamente derivados dos ofícios. Sendo assim, a consideração dos ofícios é que deve

54
BELCHER, R. 2016. P. 4.
55
LIDÓRIO, R. 2018. P. 126.
56
GRUDEM, W. 2007. P. 529.
34

orientar uma igreja na sua dinâmica e cuidado. Por conta de ser a igreja: profeta, sacerdote e
rei, áreas e ministérios que derivam diretamente desse tríplice ofício devem permear o dia a
dia e a vida da igreja. Pois, como diz Belcher, falando da continuidade e permanência do
ofícios de Cristo na vida do seu povo depois de ter ido aos Céus, “ele os cumpre em sua obra
de salvação e continua nestes papéis em nome de seu povo em sua ascensão”57.
Até aqui considerou-se a presença de categorias tríplices na definição do que é igreja,
bem como as implicações dessa categorização para o ministério da igreja. Tais implicações
devem ser conduzidas em algo tão necessário para a igreja e para a plantação de novas igrejas.
Em outras palavras, é necessário indagar sobre como a missão é tocada e influenciada pelo
tríplice ofício.

3. A MISSÃO ASSOCIADA À PERCEPÇÃO TRÍPLICE

3.1 UMA DISTINÇÃO DO SIGNIFICADO DA MISSÃO

Seria a estrutura profunda do universo marcada por uma realidade tríplice? Uma das
impressões dadas por Frame pensando em seu próprio método teológico orienta esse capítulo.
Ao considerar a utilidade do tri-perspectivismo, o referido autor afirma: “há alguns momentos
em que acho que é uma espécie de estrutura profunda do universo e da verdade bíblica”58. A
presente pesquisa apontou a ocorrência de padrões tríplices. A aproximação dessas tríades
com o tríplice ofício confirmou sua correlação. O que por sinal, mantém a questão acima
como digna de profunda e contínua verificação. É necessário maior aprofundamento
teológico, filosófico e científico para confirmar se há uma “tríplice estrutura profunda da
realidade”. O que esta pesquisa destaca é: uma estrutura tríplice perpassa a conceituação
missiológica e isso tem implicações para o plantio de igrejas.
É possível descrever a “missão” em uma perspectiva tríplice. Ela está pautada no
envio de discípulos, para proclamar o evangelho e fazer novos discípulos de Cristo, que
passam a desfrutar da vida de Deus em adoração e amor a Ele. De maneira resumida, ela pode
ser explicada assim: Cristo envia enquanto Rei, isso resulta no chamado de todos os eleitos
para salvação e no envio de toda a igreja para missão59. Disso implica que todas as atividades
e ações relacionadas ao chamado e envio pela igreja são manifestações subordinadas do ofício

57
BELCHER. R. 2016. P. 15.
58
FRAME, John. O que é tri-perspectivismo. Op. Cit.
59
LIDÓRIO, Ronaldo. Teologia, Piedade e Missão. Editora Hebrom. Edição do Kindle. 2021.
35

da realeza. E, de forma subordinada também, seus servos exercem o ofício profético,


pregando e discipulando as nações. Por fim, o ofício sacerdotal aparece na nova relação de
cada novo discípulo que recebe a mensagem e pode se relacionar com o Deus trino por meio
da fé e obra vicária de Cristo, que transforma rebeldes enganados em súditos, aprendizes e
adoradores, que o louvam e oferecem sacrifícios de boas obras para dar glórias ao Deus
eterno.

Nas discussões missiológicas contemporâneas é unanimidade o fato de que existe uma


“missão” que envolve Deus e seus planos para seu povo e a humanidade. No entanto, quando
se pretende determinar para quais fins Deus envia sua Igreja e, se realmente a envia, vem à
tona as distinções e confusões sobre o significado do que vem a ser a missão. Dessa
indefinição emerge a necessidade de clareza sobre seu real significado.

Acolher uma definição ou outra determinará agenda, prioridades e decisões sobre os


rumos da vida eclesiástica e teológica. Não dá para dizer que tudo é missão. É crucial, para
fins de guardar o que é essencial e evitar que o significado desse conceito se perca no cenário
de desconstrução pós - moderna, “manter distinções por motivos de clareza e de reservar a
palavra missão para o discipulado dos povos”60.

Pode-se considerar ao menos quatro distinções do conceito de missão no contexto das


discussões missiológicas atuais. Em certo sentido, os três primeiros que serão discutidos a
seguir sinalizam a presença de ênfase que pode ser correlacionada com um ou dois ofícios de
Cristo. No entanto, a própria conceituação revela uma trágica lacuna que evidencia o papel de
pelo menos um dos ofícios de Cristo sendo ignorado nestas três conceituações analisadas
inicialmente.

A primeira noção de missão, contemplada no cenário internacional, é denominada


"Missio Dei”. Em termos práticos, ela propõe que “tudo o que Deus está fazendo no mundo”
faz parte de sua missão. Nessa concepção, a missão é a obra de Deus a ser realizada no mundo
inteiro, respondendo a todas as demandas desse mundo. Sua abrangência é tão extensa que até
o não cristão pode estar participando da missão, mesmo sem saber. Ela significa na prática:
“a busca da justiça, a promoção da dignidade humana, a reconciliação de grupos hostis, o

60
FERDINANDO, Keith. Missão: um problema de definição. Themelios, Volume. 33, Ed. 01. Em:
https://www.thegospelcoalition.org/themelios/article/mission-a-problem-of-definition/. Acesso em: 21 jul. 2022.
36

cuidado com o meio ambiente, todos refletem a vontade de Deus para sua criação e, portanto,
todos fazem parte de sua missão sejam quais forem os agentes”61.

Em objeção a essa definição, pode-se dizer que o soberano cuidado de Deus


manifestado em sua criação, o mandato cultural de cada cristão, e a própria bondade de Deus
revelada na graça comum, dão conta de todas essas pautas levantadas pela Missio Dei. O
grande problema dessa conceituação de missão é confundir os resultados da manifestação do
Reino de Deus com a missão do próprio povo de Deus. Os súditos do Reino, pelo poder
santificador do Espírito, vivenciam uma busca, em alguma medida, por um mundo melhor, no
entanto, isso não implica dizer que a missão do povo de Deus é trabalhar pela melhora deste
mundo.

Nessa concepção de missão classificada como Missio Dei, pode -se concluir uma
ênfase demasiada no ofício da realeza em detrimento dos papéis do ofício profético e do
ofício sacerdotal. É visível na conceituação que tanto a importância da mensagem de
salvação, bem como a necessária e urgente transformação do idólatra em adorador do
verdadeiro Deus são realidades negligenciadas e esquecidas. Esse desequilíbrio tira o foco da
missão de acordo com o que as Escrituras ensinam. O ofício profético e sacerdotal são
imprescindíveis na orientação do que vem a ser missão. A definição denominada de Missio
Dei não emerge de profundidade exegética em textos relacionados a grande comissão para
então ser aplicada à realidade histórica. Desconsidera-se inclusive toda teologia bíblica
centrada na obra expiatória e redentora de Cristo, a qual deve ser anunciada pela mensagem
do Evangelho como fundamento para a salvação da humanidade. O que essas ausências
sinalizam é a fonte principal da missiologia dessa conceituação de Missio Dei é
fundamentalmente construída sobre uma perspectiva histórica e existencial.

A segunda concepção de missão é denominada “mandato cultural”. A missão, nesse


caso, é vista como responsabilidade do povo de Deus, o qual deve viver em todas as áreas da
vida para a glória de Deus, isso “incluindo comércio e governo, indústria e agricultura,
serviço e educação, e, de fato, sem nenhuma esfera legítima excluída”62. Essa conceituação
pretende frear um erro dualista entre sagrado e secular que já fora enfrentado no passado, mas,

61
Ibid.
62
Ibid.
37

diferentemente do que propõe a definição, como critica Fernando, essa é uma inflação do
conceito de missão que representa perda de foco do que realmente é prioritário63.

Nesse conceito de missão acima citado, pode-se constatar o papel de dois ofícios
presentes em sua ênfase. Em algum aspecto há associação com o ofício real, pelo
estabelecimento das leis do reino para o viver diário, e em outro aspecto, é possível destacar o
papel sacerdotal, que orienta a necessária adoração em todas áreas da vida. A validade dessa
proposta seria irretocável se não fosse por uma razão, ela ser nomeada de missão da igreja. O
correto seria defini-la como “resultado do evangelho”.

Nessa noção de mandato cultural emerge a invalidação: do discipulado das nações; da


evangelização que ressuscita mortos; da mudança do status de rebeldes para filhos amados
promovida pela contundente pregação da mensagem de salvação. Todas essas realidades caras
ao evangelho e à igreja são negligenciadas por esta noção de missão como mandato cultural.
Nota-se que as devidas implicações e relevância do ofício profético para o conceito de missão
é a grande lacuna a ser preenchida nesse conceito.

“Ação Social” é uma outra definição de missão, “ela se refere ao alívio do sofrimento
humano e à eliminação da injustiça, exploração e privação”64. Nesse caso a diferenciação
quanto a definição é que ela não se direciona a tudo o que os cristãos devem fazer. Nesse
caso, a missão se concentra no labor e atenção da igreja com a miséria e o sofrimento
humanos. O papel da ação sacerdotal, marcada por misericórdia e compaixão, é hiper
potencializado nesse conceito. Permanecem desconsiderados nessa definição, o papel da
realeza, e, principalmente, o papel do ofício profético na missão.

Em todas as definições consideradas até aqui, ficam evidentes problemas de ordem


maligna com implicações culturais: a perniciosidade de engano, descrédito e desvalorização
da Palavra do Eterno se fazem presentes. A face cultural desse antagonismo caracteriza-se
pelo problema da hermenêutica relativista e pela poderosa influência do pluralismo65. Tais
elementos corrosivos pretendem inibir a ousada proclamação do senhorio e a suficiente morte
e ressurreição de Cristo para transformar o mais essencial da realidade humana: seu coração
pecador.

63
Ibid.
64
Ibid.
65
NEWBIGIN, Lesslie. O Evangelho em uma sociedade pluralista. Viçosa, MG: Ultimato, 2016. P. 13.
38

A mais restrita de todas as abordagens é a quarta, nomeada no artigo de Ferdinando,


como “fazendo discípulos de todas as nações”66. Nessa conceituação o evangelismo tem
importante papel, mas é mais do que isso. Na definição em pauta, o alvo não são apenas
decisões, antes, “significa o processo não apenas de levar as pessoas à fé, mas de promover
seu crescimento espiritual em termos de relacionamento com Deus e seu povo, e de
obediência em todas as áreas da vida”67.

Essa última definição se apresenta como a que mais encontra eco nas Escrituras e na
tradição protestante quanto ao que é prioritário para a missão da igreja. Sobre o referencial
bíblico desta última definição, o próprio autor referido apresenta uma percepção bíblica sobre
como a igreja no Novo Testamento entendeu sua prioridade missionária: Há uma missão
apostólica distinta ocorrendo em Atos, que é uma expressão de obediência explícita à grande
comissão. Seu foco é ganhar pessoas para a fé e para o modo de vida que essa fé produz, e seu
método é a proclamação da palavra de Cristo.68

Na conceituação oferecida por Fernando sobre missão como “discipulado das nações”,
definição que faz juz à tradição reformada, estão presentes os papéis correspondentes a cada
ofício de Cristo. A aproximação da definição com a perspectiva tríplice resultam em
correlações que atestam o equilíbrio determinante dos ofícios de Cristo para a missiologia.

A missão apresenta um cenário de guerra, o processo de discipulado possui


apontamentos expressos contundência de uma conquista A escolha semântica expressa o tom
do que significa o discipulado das nações, marcado por um vocabulário de conflito e disputa:
“ganhar pessoas para a fé”, e consequentemente para um “modo de vida “. Essa linguagem
belicosa não é estranha às Escrituras, ela compõe a realidade de batalha espiritual travada
entre reinos opostos. Portanto, o ofício da realeza tem um papel crucial no discipulado das
nações e consequentemente é um eixo fundamental para a missão.

Quando se considera o que as Escrituras ensinam sobre o que gera fé, fica mais do que
evidente o papel do ofício profético no fazer missionário, pois “a fé vem pelo ouvir da palavra
de Cristo”69. A pregação da mensagem salvífica deve estar na lista de prioridades essenciais
da ação missionária no contexto do plantio de igrejas. Na definição em análise, importa

66
FERDINANDO, Keith. Missão: um problema de definição. Op. cit.
67
Ibid.
68
Ibid.
69
Bíblia Sagrada. Romanos capítulo 10, versículo 17. NAA. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil. 2020.
39

destacar o método enfatizado “proclamação da palavra de Cristo”. Isso não é negociável,


tampouco periférico no entendimento da missão.

No entanto, o ofício profético traz à tona o que há de mais significativo quanto ao


ofício sacerdotal de Cristo, a expiação. A mensagem profética aponta para a ação sacerdotal
de Cristo. A mensagem do evangelho anuncia sim as palavras, a vida e a história de Cristo, no
entanto, seu ápice está na verdade de que Cristo foi entregue para substituir todos os
condenados que nele creem. Tal mensagem não aceita apenas atenção, ela é um
pronunciamento do Rei, portanto, é exigido rendição e fé. Aos que se dobram, fica
consignado viver uma vida de súdito fiel que dá continuidade aos propósitos do rei para todas
as áreas da vida, com destaque para a missão: “fazer discípulos em todas as nações”.

O que todas as definições que divergem dessa última proposta evidenciam é a


incapacidade de distinguir o evangelho dos resultados do evangelho. DeYoung, ao oferecer
resposta sobre o que vem a ser a missão da igreja, faz distinções importantes sobre os
resultados do evangelho e o evangelho em si. Ele evidencia uma conexão intrínseca da missão
da Igreja com o evangelho. Para deixar claro que ações de misericórdia não devem ser
confundidas com a missão da Igreja, ele insiste que atividades importantes na vida do
discípulo não podem ser confundidas com a missão primordial da igreja. “Cremos que a
igreja é enviada ao mundo para testemunhar de Jesus, por proclamar o evangelho e fazer
discípulos de todas as nações. Esta é a nossa tarefa. Esta é a nossa chamada, única e central”70.
O autor, em sua distinção, consegue também equilibrar a dinâmica dos ofícios, deixando
evidente o local de destaque da proclamação, mostrando o lugar preponderante do ofício
profético.

O significado de missão traz à tona a conceituação subjacente e implícita do tríplice


ofício de Cristo em seu bojo. O estudo da missiologia pode ser percebido de maneira tríplice,
essa opção metodológica se mostra útil e adequada frente aos desafios da missão.

3.2. O CARÁTER TRIPLO DAS FONTES NA MISSIOLOGIA

Hesselgrave, ao apontar três fontes para a missiologia destaca a revelação, as ciências


sociais e o bem pensar associado ao senso espiritual. Essa tríade é um bom ponto de partida

70
DEYOUNG, Kevin; GILBERT, Greg. Qual a Missão da Igreja?: Entendendo a Justiça Social e a Grande
Comissão. São José dos Campos - SP: Editora Fiel, edição do Kindle. 2010.
40

para se considerar as implicações do munus triplex à prática do plantio de igrejas. Pode-se


afirmar que isso é exatamente o que ensina o tri-perspectivismo, ele afirma ser possível obter
o conhecimento verdadeiro através das perspectivas: normativa (referente à lei de Deus),
situacional (referente ao mundo) e existencial (referente a si mesmo)71. Sendo assim, a
revelação está para a perspectiva normativa, a ciências sociais está para perspectiva
situacional assim como o bem pensar associado ao senso espiritual está para a perspectiva
existencial.

Esta aplicação do tri-perspectivismo na missiologia implica afirmar que, mesmo sendo


a “revelação" prioritária nessas considerações, outros campos de atuação mostram-se valiosos
para o pensar e o fazer missionário no plantio de igrejas. Em outras palavras, contribuições
importantes para a área missiológica no plantio de igrejas advém de outras fontes que não a
Escritura, elas não devem ser desconsideradas por não ser possível encontrar textos chaves
para exemplificar ou validar a verdade do argumento ou do ponto em estudo. Muitas verdades
de diversas áreas validadas como verdadeiras não encontram respaldo direto de suas
descobertas em textos bíblicos, nem por isso deixam de ser afirmadas e consideradas como
reais e necessárias.

Tome-se três conceitos que não são necessariamente temas de doutrina bíblica:
“contextualização da mensagem, estratégias de trabalho missionário e perfil de obreiro”. O
tema da “contextualização” não é bíblico, mas derivado dele e incontestável no que diz
respeito a sua importância. Hesselgrave aponta que “contextualizar é tentar comunicar a
mensagem, trabalho, Palavra e desejo de Deus de forma fiel à sua revelação e de maneira
significante e aplicável nos distintos contextos, sejam culturais ou existenciais”72.

A necessidade de conscientizar - se da importância da contextualização é verificada


como essencial ao perceber que ignorá-la torna-se uma barreira na comunicação do
Evangelho como afirma Nicholls, “a segunda barreira à comunicação do Evangelho é que ele
frequentemente apresentado às pessoas pessoas por meio de formas culturais estrangeiras”73.

71
MACLENDON, Justin. Cristo, o mediador: o diálogo atual para teologia e ministério: uma aplicação prática
do capítulo 8 da cfb1689. The founders Journal. nº 108.
72
HESSELGRAVE, David J. Plantar igrejas: um guia para missões nacionais e transculturais. São Paulo: Vida
Nova, 1995.
73
NICHOLSS, Bruce J. Contextualização: uma teologia do Evangelho e cultura. Vida Nova. 2013. Edição
Kindle.
41

Assim, mesmo entendendo que contextualização não seja diretamente uma temática das
Escrituras, o é indiretamente.

A analogia se aplica também ao tema da “estratégia”. É básico ao considerar um plano


missionário de evangelização e plantio de igrejas, a utilização de “estratégias”. As estratégias
podem se valer de inúmeras áreas do conhecimento para ser construídas. Evidente que em
toda essa base de apoio, nenhuma delas deve suprimir ou superar as Escrituras, tampouco
afrontá-las. Hesselgrave, reflete o caos que prevalece quando as “estratégias” não estão sendo
consideradas no campo missionário.

Com demasiada frequência, as unidades do exército cristão estão fora de contato umas
com as outras. Há generais, mas não poucos deles dão a impressão de terem sido auto -
nomeados. Aqueles que não são, frequentemente parecem tão preocupados com a
logística que têm pouquíssimo tempo ou inclinação para mapear uma estratégia global ou
para dirigir uma investida contra o inimigo. Finalmente, há o fato desconcertante de que
muitos membros do exército alegam que estão recebendo diretrizes contraditórias e que
se cancelam mutuamente. Ficamos em dúvida. Estão se submetendo à obediência, ou
fazem o que bem entendem com a esperança de que, de alguma maneira, a causa global
será ajudada74.
Por último, a análise do perfil do missionário ou plantador é parte do estudo que se
pretende emitir um diagnóstico das potencialidades e fraquezas do obreiro para o campo.

O sucesso do início de uma nova igreja é amplamente determinado pela decisão de quem
será o plantador da igreja. Estabelecer uma nova igreja exige do plantador de igrejas dons
distintos, habilidades e experiências no ministério, que frequentemente não são
encontrados em um pastor normal75.
Diante desse quadro, é possível afirmar que ainda que, “contextualização, estratégia e
perfil” não se relacionem diretamente com matérias de assunto teológico ou de doutrinas que
emergem das Escrituras, são, no entanto, bem vindas e essenciais para o trabalho missionário.
Constatação que valida e demonstra a importância da tríade normativa, situacional e
existencial para consideração dos conceitos válidos quanto ao plantio de igrejas.

3.3. A LIDERANÇA NA PLANTAÇÃO DE IGREJAS CONSIDERADA SOB A


PERSPECTIVA TRÍPLICE

74
Ibid.
75
KELLER, Timothy; THOMPSON, J. Allen. Manual para Plantação de Igrejas. Centro de Plantação de
Igrejas do Redentor, 2002. Em:
https://www.faberj.edu.br/cfb-2015/downloads/biblioteca/plantacao_de_igrejas/MANUAL%20DO%20IMPLAN
TADOR%20DE%20IGREJAS.pdf. Acesso: set. 2021.
42

Ao considerar as estratégias para plantação de novas igrejas, especialistas experientes


provam que o obreiro é elemento fundamental nesse trabalho. A escolha e a manutenção do
pastor certo é o aspecto chave na fundação de uma nova missão, de acordo com Schaller76. Os
elementos básicos que precisam aparecer no perfil de alguém chamado para essa obra podem
ser conectados diretamente aos ofícios de Cristo. Ao traçar o perfil do plantador, Lidório
afirma que “um plantador de igrejas não deve ser identificado simplesmente por
características externas”77. Os estereótipos tendem a formar uma cultura geral em torno do
que seria um candidato ideal. Consideram-se negativas as seguintes características:
“acentuada introversão, falta de carisma pessoal, dificuldade de se comunicar em público e
pouco dinamismo”78. Para tanto, o missiólogo destaca ser mais importante e decisivo a
“postura de coração”79.
É aqui o ponto chave da tríade que emerge da definição do missiólogo. “Postura de
coração” não deve ser confundida com “boas intenções”. Sobre o que isto vem a significar,
segue-se uma definição tríplice oferecida pelo referido autor que complementa seu raciocínio,
delineando que postura de coração significa: “convicção, compromisso e santidade”80.
A partir da definição acima, considerando-se o referencial tríplice, é razoável
considerar que o plantador precisa da “convicção” de um rei, que é destemido, que enfrenta a
oposição e que ao olhar para o Rei por excelência, sabe quem é o vencedor. Em segundo
momento pode-se afirmar que o plantador precisa do “compromisso” de um profeta,
evidenciado pelo seu zelo e apego às verdades de Deus, um firme propósito em não
corromper a mensagem do Senhor. Por último, o plantador precisa da “santidade” de um
sacerdote, que foi purificado e está na presença do Altíssimo, que vive uma vida para glória
de Deus, evidenciado no seu amor pelo Criador e na sua compaixão e cuidado com suas
relações horizontais.
Nesta mesma linha de análise de perfil de liderança, Hesselgrave, ao tratar do perfil do
plantador, destaca três características: “integridade com Deus, com a missão e com o povo”.
Novamente emergem elementos propícios à categorização tríplice. A integridade para com

76
SCHALLER, Lyle citado por KELLER, Timothy. 2012. P. 84.
77
LIDÓRIO, R. 2018. P. 133.
78
LIDÓRIO, R. 2018. P 134.
79
Ibid. P. 134.
80
Ibid. P. 134
43

Deus está para o ofício profético, a integridade para com a missão vincula-se ao ofício real e
integridade com o povo está para o ofício sacerdotal.
Tomando os paradigmas de estudo que vinculam a obra tríplice de Cristo
indistintamente a todos os cristãos, há autores que estão distinguindo a proeminência da
presença de determinados ofícios nas lideranças. Ou seja, para alguns autores, nem todos os
ofícios estão presentes em todas as pessoas. Nesse caso os ofícios estão associados
diretamente a dons.
Patrick, adepto dessa visão, aponta que habilidades necessárias são imprescindíveis
para plantar uma igreja, as quais destaca: liderar, ensinar e pastorear. Para liderar, ele diz ser
necessário o dom da realeza, para o ensinar, o dom profético e para o pastoreio, o dom
sacerdotal81. O autor insiste que um plantador deve ter no mínimo dois desses dons.
A equiparação dos dons de um plantador aos ofícios de Cristo não é unanimidade. No
entanto, pesa a favor de tal abordagem a consideração das tendências de personalidade. Ao
avaliar perfis e dons, percebe-se em determinadas pessoas, habilidades e capacidades que
favorecem uma equiparação a um determinado ofício em detrimento de outro. Talvez o
caminho mais equilibrado seja apontar que todos os ofícios estão presentes, com destaque
para um ou outro de acordo com dons e habilidades individuais.
Gomes aponta na direção de que todos os homens e mulheres foram feitos para serem
profetas, sacerdotes e reis, mas a queda comprometeu essa estrutura. O resultado é que até nas
falhas e rupturas verificadas nas fraquezas humanas o perfil tríplice se manifesta.
“Observe que ninguém foi criado por Deus para ser uma coisa ou outra, mas
para espelhar a sua glória em verdade, amor e frutos , nas funções de profeta,
sacerdote e rei. O pecado é que, além de iludir-nos com o avesso do brilho, tornando
-nos controladores, agradadores e dominadores, ainda nos faz exagerar a importância
de uma ou outra função como se fosse ídolo”82.

Empiricamente é possível identificar perfis de pessoas que se mostram hábeis em


propagar visão, criar energia, motivar, inspirar e desenvolver sistemas. Para Goodmanson,
tais características são evidências de que o dom de destaque nesse seja o dom de rei83.
Igualmente plausível é a caracterização que é feita de quem possui dons sacerdotais como
destacáveis, “se o seu dom é sacerdote, você tenderá a buscar contexto de ministério nos quais

81
PATRICK, Darrin. O Plantador da Igreja. São Paulo, Vida Nova: 2013. P. 87.
82
GOMES, Wadislau Martins. Coração e Sexualidade: Entendendo a Deus, a si mesmo e ao outro. Brasília:
Editora Monergismo. 2019. P. 112
83
GOODMANSON, Drew. Aprofundando a conversa sobre tri-perspectivismo. Disponível em:
https://www.goodmanson.com/church/furthering-the-triperspectivalism-conversation/. Acesso em: jan 2022.
44

você possa interagir de maneira relacional com as pessoas à sua volta, o que frequentemente
funciona em igrejas menores”84.
A mesma correlação é feita com o ofício profético, nesta categorização confere-se ao
pastor ou líder que dedica-se ao ensino e a pregação o dom de profeta. Patrick afirma que:
“Os profetas muitas vezes são encarregados do ministério do ensino da igreja, protegendo
o púlpito das doutrinas errôneas. Eles podem se sair excelentes mestres porque têm uma
grande estima pelas Escrituras, gostam de estudar a palavra de Deus e compartilhar as
percepções que encontram nela, ajudando a esclarecer questões teológicas difíceis"85.

Essa categorização do tríplice ofício como referencial para apontar tipos de liderança é
um estudo ainda em andamento, que possui lacunas a serem preenchidas e faz-se necessário
ouvir as objeções a tal tendência para que a hipótese ganhe robustez em termos acadêmicos e
teológicos dando conta das críticas e aperfeiçoando seus fundamentos e implicações.

3..3.1. Considerando objeções na categorização tríplice para tipologias de liderança

Há quem possua severas reservas quanto a essa tipologia tríplice para a liderança.
Miller crítica a análise de que o chamado de profeta, sacerdote e rei é apenas para os líderes,
esse chamado é para todo cristão segundo a autora86. Wilson, mesmo confessando que pode
estar sendo excessivamente “rabugento”87, faz uma ácida crítica às ponderações de quem
legitima a tipologia de liderança baseado no múnus triplex.
a palavra “profeta” é usada em um sentido não carismático, o que cria confusão na igreja
local sobre o que exatamente significa; a palavra “sacerdote” causa mais confusão, dada a
forma como a palavra tem sido usada na história da igreja; a palavra “rei ” corre o risco
de confundir o governo de Cristo com estratégia, administração e sistemas88.

Jones, em artigo baseado no seu livro sobre o assunto, considera que a tipologia de
liderança apoiada no tríplice ofício é completamente falha em seu fundamento. Analisa-se sua
primeira crítica e considera-se algumas limitações de sua argumentação.
84
PATRICK. D. 2013. P. 87.
85
PATRICK, D. 2013. P. 89.
86
MILLER, Rachel Green. Profeta, sacerdote e rei: nossa identidade em Cristo. Modern Reformation. 14 jul.
2021. Disponível em:
https://modernreformation.org/resource-library/web-exclusive-articles/prophet-priest-and-king-our-identity-in-ch
rist/. Acesso em: 12 mar 2022.
87
WILSON, André. Profetas, sacerdotes e reis, Frame, Keller e Driscoll. 11 jul. 2012. Disponível em:
https://thinktheology.co.uk/blog/article/prophets-priests-kings-frame-keller-and-driscoll. Acesso em: 10 mar
2022.
88
Ibid.
45

O referido autor afirma em primeiro lugar que, “a realeza no Antigo Testamento tinha
a ver com fidelidade à aliança, não liderança organizacional”. Certamente tudo que diz
respeito à aliança no AT, o papel do rei é preponderante .E de fato, é indefensável presumir
diretamente liderança organizacional nos moldes do mundo empresarial do contexto
contemporâneo no exercício da realeza no mundo antigo. Contudo, esperar algum tipo de
nomenclatura como “liderança organizacional” no texto bíblico para validar a concepção de
liderança e visão associada às atribuições da realeza seria anacronismo.
O autor pede por uma evidência impossível. Repare a redação de seu argumento “não
há indícios de que estratégias organizacionais visionárias fizessem parte da descrição do
trabalho dos reis de Israel”. Na construção do seu próprio argumento o autor oferece os
princípios que guiam a noção da tipologia para liderança associada ao munus triplex. É
evidente que ele valoriza com zelo acentuado a norma bíblica, ao não encontrar “termos e
nomes” utilizados pelos defensores da tipologia tríplice na linguagem veterotestamentária, ele
encontra razão para o princípio que presume-se por implicação. Pode-se afirmar que o autor
seria mais equilibrado se considerasse a perspectiva tríplice para admissão do conhecimento.
Se, além de olhar para a perspectiva normativa, ele verificasse as perspectivas situacionais e
existenciais, ou na linguagem de Hesselgrave, as ciências sociais e o bom senso unido ao bem
pensar89, evidentemente, ele poderia encontrar paralelos e princípios orientadores para
verificar que em algum aspecto há analogia da prática e demanda de um rei no mundo antigo
com as demandas organizacionais do mundo moderno.
Jones, ao construir seu argumento afirma não haver “indícios de estratégias
organizacionais”90, entretanto, é evidente que no corpo de inúmeras batalhas e estruturação da
monarquia em Israel, defesa e avanço contra as tropas inimigas e promoção da guerra santa,
organização dos soldados, dos recursos, das finanças, das tropas, em todas essas frentes, os
reis de Israel se valeram de estratégias. Aliás, o próprio conceito de estratégia não está
subscrito à categoria dos reis enquanto estabelecida a monarquia em Israel. No período
patriarcal, inúmeras estratégias foram utilizadas. Extrair esse princípio e relacioná-lo ao ofício
real de Cristo, afirmando ser Jesus Cristo o promotor mor de boas estratégias ao longo das
histórias bíblicas é o passo a mais dado por quem defende a noção de tipologia tríplice para
liderança.

89
HESSELGRAVE. 1995. P. 33.
90
JONES. 2018. Op. cit.
46

Um segundo termo que pode ser analisado a partir da redação de Jones é o emprego da
palavra “visionária”, vinculado a “estratégias organizacionais”. Ele afirma que isto não está
conectado ao trabalho dos reis de Israel, ou seja, nenhum rei em Israel foi descrito como
possuindo “estratégias organizacionais visionárias”. É necessário concordar com o autor
nesses termos. Todavia, os defensores da tipologia tríplice para liderança aplicam o princípio
de que “um rei tem visão”. Novamente, para se considerar a questão na perspectiva adequada,
não deve-se questionar se um rei tem visão organizacional, mas se os reis em Israel tiveram
visão.
Inicialmente vale questionar o que significa a palavra “visão”? Para Paes, visão é o
que Deus dá e põe em nossa mente e em nosso coração. É uma expectativa apaixonante do
futuro pela qual estaremos até disposto a morrer”91. George Barna afirma que visão é o
vislumbre do tipo de mundo que Deus deseja que vivamos, um mundo que ele pode criar por
meio de nós, se todos aqueles a quem ele chama como líderes cumprirem o seu chamado de
acordo com a direção dada por seu Espírito92” Patrick, citando Wagner, deixa explícito o que
significa visão ao explicar o dom de liderança.
“o dom da liderança é a habilidade especial que Deus dá a certas pessoas do corpo de
Cristo de estabelecer objetivos de acordo com os propósitos divinos para o futuro e de
transmitir esses objetivos aos outros de tal modo que eles trabalhem juntos, de maneira
voluntária e harmoniosa, na realização deles para a glória de Deus”93

Lidório declara que “é necessário ter uma visão definida [...], ela está diretamente
ligada ao chamado e direção de Deus”94. Ela é tão prática e vital que o referido autor afirma,
“iniciar um projeto ministerial sem uma visão definida é ser irresponsável com seu tempo,
energia e equipe”95.
Pode-se afirmar, a partir das definições acima, que visão trata-se de tomar consciência
de um objetivo de Deus para o futuro, culminando no envolvimento de um líder e de seus
liderados para promover através de meios, recursos e pessoas o propósito estabelecido. Esse
detalhamento é esclarecedor. Os reis de Israel, em momento de fidelidade e respeito à Aliança
de Deus mantiveram-se firmes em propósitos estabelecidos por Deus, os quais evidenciaram a
presença de “visão” nos termos apontados. A construção do Templo e a expansão do domínio
91
PAES, Carlito. Igrejas que prevalecem. São Paulo: Editora Vida, 2009. P. 53.
92
PATRICK, Darrin. 2013. P. 96.
93
Ibid.
94
LIDÓRIO, R. 2013. P. 101.
95
Ibid.
47

através das guerras contra os vizinhos pagãos estão situados dentro desse exato contexto de
promover os objetivos de Deus para o futuro, ou seja, reis e líderes possuem visão.
A consideração dos ofícios de Cristo não estão fundadas apenas na noção dos reis do
AT. O tríplice ofício está presente desde os primeiros capítulos de Gênesis96. Reis, sacerdotes
e profetas estão presentes em toda a Escritura para além dos tempos da monarquia. A postura
visionária real de José, Josué e Neemias é notável, mesmo que as personagens citadas não
tenham recebido a nomenclatura correspondente.
Deve-se, ainda, responder a indagação se uma liderança visionária deve ser
correlacionada ao ofício real de Cristo. O pressuposto básico da teologia bíblica é que os
líderes do A.T. podem ser considerados como tipos de Cristo.97 Sendo assim, o que há de
melhor em Abraão, José, Josué e Davi apontam para a pessoa e obra do redentor, se esses
servos, em suas qualidades e virtudes possuíam dons e habilidades concernentes ao serviço e
chamado designado, essas virtudes devem ser associadas a Cristo Jesus. Portanto, uma
liderança visionária está estreitamente relacionada à Cristo e consequentemente, ao ofício da
realeza.
Na argumentação de Jones, há que se dar atenção a uma importante objeção feita à
tipologia tríplice para a liderança. Um tipo de problema aparentemente suscitado pela ênfase
da tipologia tríplice. Segue o trecho capaz de gerar a inquietação:
O líder profético é “um visionário que tem um desejo ardente de pregar a Palavra de
Deus”, enquanto os líderes reais “sabem como ter uma visão, organizá-la e
implementá-la”, e o líder sacerdotal cuida das “necessidades das pessoas” e resolve
“problemas interpessoais”[...] Em particular, preocupava-me o fato de cuidar – o suposto
“papel sacerdotal” – quase sempre ser delegado a outra pessoa. Em alguns casos, os
pastores em treinamento deixaram claro que aconselhar e cuidar das almas das pessoas
não eram papéis que eles planejavam exercer98.

O ponto alto da crítica de Jones se relaciona com o perigo da exclusividade dada por
líderes em suas práticas após a identificação de qual seria seu dom de destaque. Sendo assim,
o foco ministerial passaria a ser dado pelo dom reconhecido.
Acentuar as tipologias como caracterização do que um líder deve considerar em
exclusividade para sua atuação e negar outras tantas particularidades vinculadas ao ministério
é um tipo de problema que deve ser evitado.

96
GRUDEM, Wayne. Ano 2007. Op. cit. P. 529.
97
MUSSELMAN, Vinicius. Pregando Cristo no Antigo Testamento. 28 jun 2012. Disponível em:
https://voltemosaoevangelho.com/blog/2012/06/pregando-cristo-no-antigo-testamento-9/. Acesso em: jan 2022.
98
JONES, Timothy Paul. Prophet, priest and king. Leadership for church today. Acesso em 25 de agosto de
2022. Disponível em:
https://www.timothypauljones.com/leadership-the-kingship-of-christ-and-church-leadership-today/
48

A questão em cheque é se esse problema de evitar atividades específicas é um


problema gerado pela conceituação da tipologia tríplice ou por outros motivos. A vida
pastoral é de uma dinâmica tal que, se considerar dons e perfis, algumas atividades são mais
fáceis para uns e mais difíceis para outros.
A evangelização é uma atividade de todo cristão, há pastores com um vasta dedicação
na área evangelística, enquanto outros se omitem de tal tarefa alegando que não possuem tal
dom. O mesmo é verdadeiro para visitação e aconselhamento, há líderes extremamente
habilidosos nestas áreas, enquanto outros o fazem com pouca destreza. Realidade reconhecida
até mesmo pela comunidade local. Isso não exime nenhum pastor de considerar que deve estar
aberto às demandas e necessidades de sua comunidade, dedicando-se com afinco às realidades
nas quais seus dons mostram-se mais efetivos.
A ênfase excessiva na demarcação e categorização de que um líder é exclusivamente
profeta, ou sacerdote ou rei pode ser corrigida a partir da própria consideração de como a
natureza dos ofícios se manifesta em Cristo Jesus, o Senhor e líder supremo da Igreja.
Grudem expressa que o homem foi feito originalmente para evidenciar o tríplice ofício99. A
mesma direção é seguida por Berkhof ao explicar “que o fato de Cristo ter sido ungido para
um tríplice ofício confirma o fato de que o homem foi originalmente destinado ao exercício
desse tríplice ofício e respectiva obra”100.
Sendo a reconciliação e a nova vida implantada por Cristo uma manifestação da
restauração promovida por Deus, seria desacertado afirmar a exclusividade de manifestação
de um ou outro ofício na liderança. Bavinck, ao falar sobre o ministério de Cristo, oferece
adequada consideração sobre como o mesmo é marcado pelo tríplice ofício, o que deve
inspirar e orientar a liderança cristã na sua atuação, ainda que considerando as devidas
limitações de que os cristãos exercem os ofícios de forma subordinada.
Jesus em todos os momentos e em todos os lugares ocupou-se simultaneamente do
exercício desses três ofícios. Quando falava Ele proclamava a Palavra de Deus como
um profeta, mas ao falar Ele exercia também sua misericórdia sacerdotal e Seu poder
real, pois através de Sua palavra Ele curava os enfermos, perdoava pecados e
acalmava a tempestade. Ele era o Rei da verdade. Seus milagres eram sinais de Sua
missão divina e da verdade de Sua palavra, mas eram ao memo tempo uma revelação
de Sua compaixão sobre todos os aflitos, de seu domínio sobre a doença e a morte e
sobre o poder de Satanás. Em resumo, toda a Sua manifestação , palavra e obra têm
um caráter profético, sacerdotal e real101.

99
GRUDEM, Wayne. 2007.
100
BERKHOF, L. 2009. P.328.
101
BAVINCK, H. 2001 P. 366.
49

Se for acolhido a premissa de que há líderes com dons que manifestam, por exemplo,
com proeminência o ofício profético, faz se necessário expressar que a atuação desse líder,
bem como seus ensinos e palavras, devem ser moldadas pela misericórdia e compaixão de
um sacerdote e também devem estar relacionadas a missão e poder de um rei. Portanto, assim
como em Cristo o tríplice ofício sempre está conjugado e atuando de forma conjunta, ainda
que um ou outro possa estar em maior evidência em razão da natureza da ocasião e
necessidade, igualmente para os líderes cristãos a manifestação ocorre na simultaneidade. “A
semelhança de Cristo, um pastor precisa demonstrar compaixão e amor pelo rebanho, manter
constante vigilância sobre todo rebanho, ser zeloso para a glória de Deus e ter uma vida santa
e inculpável"102.
Assim, a tipologia para liderança ainda que válida deve ser cautelosa nessa
demarcação restrita sobre competência e responsabilidades. Outrossim, os desvios não devem
minar importantes contribuições desse campo de estudo. A noção tríplice deve servir
sobretudo para equilibrar as ênfases e não supervalorizar uma em detrimento da outra.

3.4 OS PARADIGMAS MISSIOLÓGICOS E O EQUILÍBRIO OFERECIDO PELA


PERSPECTIVA TRÍPLICE

Os paradigmas missiológicos e suas consequentes ênfases podem ser explicados pela


ausência de equilíbrio entre os ofícios de Cristo. Os referenciais do que vem a ser essencial
na obra missionária tendem a refletir super atenção em um ofício específico.
Paul Bendor Samuel expõe que dois paradigmas dominantes têm marcado a discussão
e a prática missionária103. O primeiro paradigma segundo o autor é o evangelismo e o
estabelecimento de igrejas. O autor demonstra que o foco desse paradigma é o anúncio do
rompimento entre a humanidade e Deus por conta do pecado, apontando para a obra de Cristo
visando a salvação pessoal. Pessoas salvas são agrupadas em igrejas para se protegerem
espiritualmente e ganharem outros para Cristo. O segundo paradigma, de acordo com o autor,
vê o seu papel na Missio Dei como participação na transformação. Os que se envolvem nessa
transformação demonstram a bondade do Reino - ressaltando como é o governo de Deus, em
todo seu amor, compaixão e graça - mas se esforçam pouco para levar aqueles ao nosso redor

102
BEEKE, J. 2016. P.912.
103
SAMUEL, Paul Bendor. A missão invertida. Viçosa: editora Ultimato. 2018.
50

ao Reino. É possível perceber que as ênfases dos paradigmas missiológicos acima tem
correspondência com o desequilíbrio entre ênfases do tríplice ofício.
Samuel, ao considerar o paradigma do evangelismo e estabelecimento de igrejas,
informa que esse paradigma conta preponderantemente como planos estratégicos, estatísticas
e tabelas, a ponto de ser chamado de “missão por gerenciamento”104. A marca intensa do
resultado como um valor é evidenciada na fala de seus defensores, “em sua defesa, os
proponentes apontam para o grande número de convertidos e de igrejas e partes da África, da
América Latina e da Ásia”105.
No primeiro paradigma, o ofício profético e o ofício real ganham profunda atenção,
visto que a preocupação maior desse primeiro paradigma se dá no anúncio do Evangelho
(ação profética) e na consequente estruturação e organização de igrejas locais (ação real).
Segundo a crítica de Samuel, , nessa ênfase há um claro descuido para com a situação
existencial e com o sofrimento dos alcançados106. O que pode ser explicado pela ausência do
ofício sacerdotal.
O segundo paradigma destacado pelo autor é predominante marcado por compaixão e
ações de misericórdia, a conhecida diaconia. Esse paradigma pode ser vinculado ao ofício
sacerdotal, marcado por dons de misericórdia, generosidade e serviço. Mas a ausência, nesse
paradigma, dos ofícios real e profético, faz com que esse segundo paradigma incorrer no
equívoco de não se preocupar com a conversão, como diz o autor “se esforçam pouco para
levar aqueles para o Reino”107. Nesse paradigma não está presente o interesse em plantio de
igrejas e evangelização, tampouco a ênfase em discipulado, ainda que demonstre o amor pelas
boas obras.
Os desequilíbrios em paradigmas de missão podem ser explicados pela distorção de
ênfases no papel de alguns ofícios em detrimento de outros. Esse desequilíbrio também
desencadeia equívocos e descompassos nas lideranças das comunidades locais. A falta de
percepção de que é necessário equilíbrio na atuação dos ofícios cria problemas na igreja local
e na liderança. Isso é abordado por Frame da seguinte maneira:
Por sua vez, esses ofícios têm sido vistos como modelos para os oficiais da igreja: o
presbítero ensinante representa especialmente a autoridade de Deus; o presbítero
governante o controle de Deus, e o diácono o ministério sacerdotal de misericórdia. Como
104
Ibid.
105
Ibid.
106
Ibid.
107
SAMUEL, P. B. 2018.
51

perspectivas, nenhum desses dons pode funcionar adequadamente sem os outros. Mas às
vezes um ou outro é mais proeminente. De fato, às vezes há desequilíbrios em igrejas que
enfatizam demais o ensino, a disciplina ou a misericórdia em detrimento dos outros108.

O equilíbrio oferecido pelo tríplice ofício ao abordar a missão pode ser observado nas
considerações de Chung109. Em seu livro “Missão Priomordial”, trabalho exegético que trata
da missão a partir dos primeiros onze capítulos de Gênesis, é possível encontrar a
categorização tríplice a partir das proposições que emergem do conceito de missão de sua
análise.
Destaque-se o aspecto kerigmático como base primordial da missão. A narrativa
bíblica exibe um mundo criado pela Palavra de Deus que fez tudo vir à existência ex nihilo.
Posto esse fundamento, o autor destaca que a pregação é fundamento importante da missão, o
que dá ensejo a conexão dessa realidade da missão ao ofício profético de Cristo, já verificado
em Gênesis e aplicado ao homem.
Quanto à presença do conceito do ofício real nos escritos do autor, é possível fazer a
aproximação das considerações em que ele trata do mandato cultural. Consciente dos
descaminhos em ênfases teológicas que distorcem o que vem a ser missão, as definições do
autor evidenciam sua preocupação quanto aos descaminhos da missiologia, bem como
corroboram a ênfase do pensamento do autor quanto ao aspecto da adoração. Mesmo
mantendo essas diretrizes é evidente a correlação com o ofício real já verificado na criação.
Sede fecundos, multiplicai, enchei a terra, sujeitai a dominai (Gn 1.28). Esse texto é
comumente conhecido como o mandato cultural. Alguns relegam essa ordem apenas ao
cuidado com a criação e outros ao nosso chamado na família e no trabalho. Não devemos
confundir o cuidado com a criação com a missão110.

Para o referido autor, o ofício sacerdotal perpassa e orienta o ofício real e o ofício
profético. Há um nítido eco à tradição reformada, fundada na primeira pergunta do Breve
Catecismo de Westminster. O autor salienta que “o mandato cultural não deveria ser isolado
de seu contexto cúltico”111. A proeminência do aspecto sacerdotal é visível quando Chun
lembra que a missão é doxológica. Ele descreve que a essência da missão é levar a adoração a
todo planeta: “Através da mediação e autoridade do homem criado à imagem de Deus a

108
FRAME, J. O que é tri-perspectivismo. Op, cit.
109
CHUNG, K. C. 2019.
110
Ibid. p. 36.
111
Ibid. p. 37.
52

missão consiste em levar a glória de Deus a todos os cantos da criação fazendo com que todo
o ser que respire louve ao Senhor”112.
Pode-se então, reconhecer que Chung conecta a natureza dos três ofícios
subentendidos em sua abordagem, o mandato cultural (real), a importância da Palavra
(profético) e o destaque ao componente doxológico da missão (sacerdotal). A abordagem de
Chun denota um equilíbrio garantido pela teologia bíblica, e que necessariamente ecoa o
munus triplex.
Goheen, ao trabalhar a identidade missional do povo de Deus, propõe que a
eclesiologia deve ser elaborada a partir da construção do povo de Israel. A missão do povo de
Deus, verificada no AT, não estava marcada prioritariamente pelo ir e nem pelo fazer, mas sim
pelo ser. Sendo assim, fazendo eco a noção doxológica de Chun sobre a essência da missão,
Goheen insiste que a maneira de tornar Israel uma nação atraente aos povos para promover a
glória de Deus exigiu um movimento em três direções:
Olhar para trás, para a criação, encarnando o plano e intenção originais de Deus para a
vida humana; olhar para a frente, para a consumação, carregando em sua vida a promessa
divina do propósito da história universal, uma humanidade restaurada em uma nova terra;
e olhar para fora, para as nações, confrontando a idolatria das nações em favor das quais
havia sido escolhido113.

A tríade de direções apontadas por Goheen pode ser associada ao tríplice ofício da
seguinte forma: olhar para a criação, o que Deus sempre quis de seu povo foi a adoração, a
forma original é marcada pela centralidade do sacerdócio. Olhar para frente, prestando
atenção na restauração implementada pelo Reino de Deus pode ser associada ao ofício real.
Por fim, o confronto a idolatria das nações, algo que deveria fazer parte da vida de Israel,
conecta a missão de Israel ao ofício profético. Portanto, a missão do povo de Deus passa pelo
ofício real, sacerdotal e profético.
Assim como o equilíbrio eclesiológico e missiológico a partir da atenção devida ao
munus triplex pode ser alcançado, o contrário também é real. Uma tríade de desequilíbrio
pode ser encontrada nos perigos no plantio de igrejas: o erro pode ter característica
pragmática, sociológica e eclesiológica. Quando há descompasso entre a devida aplicação dos
ofícios de Cristo, um desequilíbrio aparece.

Lidório utiliza a seguinte tríade para descrever esse descompasso: perigo pragmático,
perigo sociológico e perigo eclesiológico. Por perigo pragmático ele destaca a tentação de se

112
CHUNG, K. C. 2019. P. 36.
113
GOHEEN. M. 2014. P. 44.
53

focalizar demasiadamente nos resultados do trabalho em detrimento dos fundamentos


teológicos114. Esse seria um típico erro de quem acentuou dons e ações vinculadas ao ofício da
realeza. O segundo perigo destacado é o sociológico, que significa “aceitar o plantio de
igrejas como nada mais do que uma cadeia de soluções para as necessidades humanas”115.
Considerando que as ações subordinadas do ofício sacerdotal de Cristo levam os discípulos às
obras de compaixão, nesse caso, esse erro concentra seu foco nos dons relacionados ao ofício
sacerdotal. Por último, o autor menciona o erro eclesiológico, as práticas da adoração e estudo
da palavra estão presentes, mas completamente desalinhadas com o ímpeto missionário que
deve marcar a igreja. Conclui-se aqui que esse erro é caracterizado pela ênfase intensa no
ofício profético e desconsideração pelo ofício real. Como afirma Lidório, “há adoração e
cuidadoso estudo da Palavra, mas completa ausência de missão”116.

3.5 A IGREJA CENTRADA E A PERSPECTIVA TRÍPLICE

Uma igreja equilibrada demonstrará o tríplice ofício em sua conjuntura e áreas. O


trabalho de Keller em Igreja Centrada, como testemunho do que procurou estabelecer no
contexto de Manhattan, pode ser um excelente estudo de caso do equilíbrio oferecido por uma
concepção tríplice.
A missão, com destaque prioritário para o discipulado dos povos, tem como
referencial a ênfase na proclamação das boas novas, conversão e ensino formativo para fazer
novos discípulos que adoram o Deus trino e participam de sua missão. Pode-se definir o
trabalho de Keller como um referencial eclesiológico urbano que, ao considerar fundamentos
para o trabalho de uma igreja, estabeleceu três eixos principais: evangelho, cidade e
movimento, os quais convergem para a noção do discipulado das nações.

O trabalho eclesiológico e missiológico que emerge das considerações de Keller são


dignos de nota por inúmeros predicados que tornam suas proposições relevantes para essa
pesquisa. Pode-se listar: a experiência missionária e eclesiástica vivida no contexto de Nova

114
LIDÓRIO, R. 2018. P. 10.
115
Ibid.
116
Ibid.
54

York no plantio da Redeemer Presbyterian Church117; ele fundou e preside a “City to City”118,
que tem como objetivo promover um movimento evangélico em cidades do mundo a partir da
plantação de igrejas; sua notável habilidade de escrita e sua profícua produção teológica; e por
fim, destaque para o reconhecimento da comunidade acadêmica e teológica sobre a relevância
e pertinência de suas obras e ministério.
Para Keller, a igreja centrada deve assumir três eixos119 ou compromissos básicos: com
evangelho, com a cidade e com o movimento. Quanto ao evangelho, se trata das boas novas a
serem proclamadas; quanto a cidade, reconhece o ambiente de desenvolvimento do ministério
e um olhar para as pessoas e cultura; quanto ao movimento, o autor atenta-se para a promoção
e desenvolvimento da missão para além da igreja local, abarcando toda a cidade. Essa
distinção tríplice, quando aproximada do significado e implicações do munus triplex, oferece
inúmeros paralelos. Assim como no decorrer da pesquisa, a aproximação de conceitos seguirá
o padrão de verificação de correspondências entre os apontamentos oferecidos pelo autor e o
tríplice ofício. A análise a seguir proporcionará a aproximação devida para validar o tópico.
Considerar a natureza da mensagem que deve ser proclamada, a essencialidade do ato
de proclamar, bem como o conteúdo dessa proclamação, são temáticas análogas a atenção
profética e são exatamente esses tópicos que o autor elenca como pertinentes ao primeiro eixo
que fundamenta uma igreja centrada, ele denomina o eixo de evangelho.120 Esse lugar de
destaque ao evangelho oferece correlação direta com o ofício profético por conta de três
elementos. Primeiro, o evangelho é uma mensagem acerca do que Deus realizou, realiza e
realizará. É falar da parte de Deus, o conteúdo de Deus. Isso está diretamente conectado ao
trabalho profético. O segundo elemento é sobre o ato de anunciar. Destaque não apenas para o
conteúdo mas para o ato de anúncio propriamente dito. O significado do ato discursivo
proclamador ao apontar que a mensagem não é um “bom conselho, nem um conjunto de ética,
mas uma boa notícia”121. Por último, essa mensagem, o evangelho, é tão importante e vital
que ela não apenas informa, mas assim como a mensagem profética, ela transforma. O autor
usa o seguinte termo, "o evangelho molda toda a vida e ministério de uma igreja"122.
117
https://www.redeemer.com/. Acesso em: ago 2014.
118
https://redeemercitytocity.com/. Acesso em: ago 2014.
119
KELLER, Timothy. Igreja Centrada. São Paulo: Editora Vida Nova, 2014. P. 27.
120
Ibid. P. 34.
121
Ibid. P. 35.
122
Ibid. P. 35.
55

De outro modo, pode-se dizer que esse eixo do evangelho abarca outra tríade que
explica sua implicação: em primeiro lugar, um entendimento adequado do que vem a ser o
evangelho, em segundo lugar, a pregação fiel das boas notícias de salvação, e por fim, e muito
menos óbvio, um todo ministerial moldado pelo evangelho. Essa terceira parte revela o ponto
cego em muitas percepções eclesiológicas, pois como afirma Keller, “é muito fácil pressupor
que, se entendermos o evangelho corretamente e se o pregarmos de modo fiel, nosso
ministério será necessariamente moldado por ele - mas isso não é verdade”123.

Distanciando - se de uma proposta de missão que divide ou confunde a prioridade da


proclamação das boas novas repartindo seu lugar de destaque com algum tipo de boas obras
ou ação social, Keller aponta os limites da sua noção de missão ao lembrar que evangelho não
se trata de bons conselhos, nem de estilo de vida, mas essencialmente de um anúncio. Citando
Carson ele pontua que, embora o evangelho seja o ponto de partida correto para a ética, para
os aforismos e para a sistemática, ele não é nenhuma dessas três coisas: ele é uma notícia, boa
notícia, e, portanto, deve ser publicamente anunciado”124.

O ofício profético é visivelmente representado pelo que é substancial na manifestação


desse ofício: a natureza da mensagem a ser proclamada. O autor lembra que o evangelho é a
notícia de redenção125. Ela dá conta do que Deus fez na história provendo salvação. Ele trata
de explicar como a encarnação do verbo eterno e sua consequente obra na cruz viabiliza
salvação ao povo escolhido de Deus. Essa obra de redenção revela a gloriosa riqueza de graça
do Deus trino, seu amor incondicional e sua soberana condução da história. A mensagem de
Jesus aponta para a sua presença pela obra do Espírito. O Evangelho é uma pessoa. A
salvação diz respeito a um relacionamento ofertado. A presença do Deus trino126. Sobre a
necessidade do ministério estar fundado em um bom labor teológico, portanto, um adequado
trabalho profético, Keller afirma: “O ministério centrado no evangelho é mais pautado pela
teologia do que por programas. Para buscá-lo temos de passar tempo refletindo sobre a
essência, sobre as verdades e sobre os próprios padrões do evangelho”127.

123
Ibid. P. 34.
124
Ibid. P. 35.
125
Ibid. P. 34.
126
Ibid. P. 35.
127
Ibid. P. 34.
56

O segundo eixo tem correspondência com o ofício sacerdotal. Se por um lado o


ministério da igreja centrada dá profunda atenção ao ato de anúncio e a própria mensagem a
ser anunciada com todas as implicações que disso possa emanar, um ministério centrado, na
opinião de Keller, não desconsidera o contexto imediato onde ele se insere128. A proclamação
da mensagem não ignora os ouvintes da mensagem, o ambiente e o contexto onde estão
inseridos. Há uma presença do evangelho, e essa presença é endereçada para um contexto e
local específico. Portanto, o ofício sacerdotal, marcado por compaixão, revela-se na
apreciação e consideração do contexto. Em Igreja Centrada, isto está situado em sua
consideração pela Cidade. Nesse quesito, a obra aborda a importância da contextualização do
Evangelho, denotando a compaixão e conhecimento da realidade onde a Igreja Centrada vai
atuar129.
Keller aponta que um ministério da igreja centrada precisa acolher o fato inevitável da
cidade. Propondo um olhar que não seja condescendente demais e tampouco demasiadamente
hostil, ele destaca que “a visão teológica da igreja centrada sustenta que os centros urbanos
são lugares maravilhosos, estratégicos e pouco servidos pelo ministério do evangelho”130.
Percebe-se nessa posição um olhar afável e simpático para com a cidade, um olhar de
compaixão, uma percepção de que há realidades marcadas por beleza, conhecimento, avanço
tecnológico, possibilidades e criatividade. Essa inclinação solidária para o contexto ecoa o
ofício sacerdotal, revelado obviamente no ato de compaixão de se condoer do outro e
promover sua cura. Sobre essa visão, o autor afirma: “a visão da cidade nos dará amor
genuíno pelo lugar que fomos chamados a alcançar com o evangelho, e não hostilidade ou
indiferença para com ele”131.
Enquanto o primeiro eixo do evangelho pode ser equiparado a ação proeminente do
ofício profético, a consideração existencial e histórica do contexto e pessoas alvo desse
evangelho é denominado de eixo da cidade. A percepção de que esse olhar para a cidade é
marcado essencialmente por compaixão, sensibilidade e consciência dos desafios impostos
pela cidade dão ensejo a categorizar essa linha de ação e análise no ofício sacerdotal.
Portanto, nesse segundo eixo pode-se afirmar que ele é sobretudo marcado pela ação
proeminente do ofício sacerdotal, manifestado de forma subordinada na Igreja:
128
Ibid. P. 108.
129
Ibid. P. 108.
130
Ibid. P. 108.
131
Ibid. P. 109.
57

Se os cristãos querem alcançar os não alcançados, tem de ir para as cidades. Para alcançar
as gerações seguintes, temos de ir para as cidades. Para causar algum impacto para Cristo
no desenvolvimento da cultura, temos de ir para as cidades. Para servir aos pobres, temos
de ir para as cidades132.
Enquanto o ofício profético tem correspondência com o eixo do evangelho, e o ofício
sacerdotal pode ser identificado no eixo cidade, o terceiro eixo tem correspondência com o
ofício da realeza. O terceiro eixo elencado por Keller é denominado de Movimento. É
possível associá-la diretamente ao ofício real por vários motivos: nele se encontra a maneira
de promover a vida missional; a integração de ministérios que permitem conexão das pessoas
com Deus, com as próprias pessoas e com as necessidades das pessoas; e a convergência do
trabalho de inúmeras igrejas para o alcance da cidade. É nessa última parte que se estabelece
o "como" da implementação dos princípios ensinados pelo autor para uma visão de igreja para
a cidade. Essa habilidade de distinguir, definir e implementar a visão e os princípios do
evangelho para o contexto gerando movimento pode ser relacionada diretamente à ação do
real.
Uma boa liderança conjuga avanço com equilíbrio. O autor trata da dinâmica
imprescindível de conjugar no ministério o lugar do organismo e o lugar da instituição. Ele
enfatiza o devido respeito com as tradições herdadas sem desconsiderar a essencial ajuda
entre o corpo de Cristo para alcançar a cidade pelo evangelho para Cristo133. Nesse ponto da
obra de Keller, o olhar é caracterizado pela estratégia necessária para o avanço e a promoção
do evangelho na cidade, o que é viabilizado pela Comunidade Missional, pelo Ministério
Integrativo e pela Dinâmica do Movimento.
O conceito de igreja missional definido por Keller é mais do que “ser uma igreja
evangelística”, ou seja, que anuncia a salvação de Cristo. Mas não é menos que isso também.
Essa igreja missional que vive para que o evangelho seja conhecido e anunciado possui
particularidades importantes. A estratégia dessa igreja fica evidente na sua maneira de
considerar áreas importantes:
É necessário ir além daquilo que normalmente chamamos de igreja evangelística;
precisamos de uma igreja missional. O culto numa igreja é assim porque faz sentido aos
não crentes daquela cultura, ao mesmo tempo que desafia e molda os cristãos com o
evangelho. Os membros da igreja são missionais porque vivem tão concentrados no que
está do lado de fora, tão envolvidos em suprir necessidades da comunidade local, que a
igreja é famosa por sua compaixão. Os membros da igreja missional também sabem

132
Ibid. P. 194.
133
Ibid.
58

contextualizar o evangelho, desafiando as pessoas com todo o cuidado, mas também


dialogando com a as narrativas culturais básicas da sociedade ao redor134.
A ação estratégica ainda aparece no plano integrativo proposto pelo autor. Ele entende
que na aplicação prática do ministério integrativo emergem quatro frentes ministeriais para
aplicação dos conceitos.

“Evangelismo e adoração são parte do ministério visam colocar as pessoas em contato


com Deus. Através da comunidade e do discipulado as pessoas serão colocadas uma em
contato com a outra. A igreja colocará seus membros em contato com as necessidades das
pessoas através de ministérios de misericórdia e justiça. Por último, a conexão com a
cultura se dará por meio da integração da fé e trabalho”.135
De acordo com o autor, a visão de uma igreja que é centrada no evangelho, deve ser
marcada pela dinâmica de que a obra do evangelho é muito mais ampla e abrangente do que a
capacidade de uma igreja local e até mesmo de uma única instituição promover136. Certo
disso, diante dos grandes desafios da cidade, essa visão implica em um movimento que
envolvam inúmeras igrejas no engajamento do propósito do evangelho. Sem nenhuma
pretensão de desprezar o valor da instituição: “as instituições representam heranças de
propósitos valiosos acompanhadas por regras e obrigações morais”.137 O autor mostra que as
características do movimento são: uma visão cativante, que leva seus participantes à uma
cultura de compromisso sacrificial, caracterizados por uma postura flexível e generosa para
com instituições e pessoas e, por fim, possui espontaneidade para novas ideias e liderança que
emerge no seu meio138.
Considerar uma visão é obra e marca do ofício da realeza, segundo o que já foi
possível elencar nesta pesquisa. Evidentemente que pode-se questionar se a visão para a
cidade proposta nesta obra é fundamentalmente bíblica. Se essa avaliação for feita, o que
estará sob escrutínio é a exegese e hermenêutica de Keller aplicada à eclesiologia. Pode ser
dito que qualquer discrepância, se considerada, não anula a necessidade de se estabelecer uma
grande visão para o mundo a ser alcançado, como afirma Keller:

Um movimento que se recuse a adotar algumas características organizacionais -


autoridade, tradição, unidade de crença e controle de qualidade - se fragmentará e se

134
Ibid. P. 313.
135
KELLER, T. 2014.
136
Ibid. P 400.
137
Ibid. P. 400.
138
Ibid. P. 402.
59

dissipará. Movimentos que não resistem à inevitável tendência rumo à institucionalização


total perderão sua vitalidade e eficiência139.
A presença do munus triplex é o que oferecerá equilíbrio para uma eclesiologia e uma
missiologia aplicada ao plantio de igrejas. Profeta, sacerdote e rei são perspectivas da obra do
Ungido, que caracterizam sua identidade e missão. A igreja deve ser moldada pelas
implicações dessa tríade para promover um ministério que dê a devida atenção à mensagem,
aos ouvintes, e a missão. Isso é, respectivamente, correlacionando a obra profética, sacerdotal
e real. Portanto, não é estranho identificar que a obra “Igreja Centrada” seja caracterizada
pelos eixos: evangelho, cidade e movimento.

139
Ibid. P. 404.
60

CONCLUSÃO

A plantação de novas igrejas é o melhor jeito de cumprir a grande comissão. Dois


equívocos devem ser evitados. De um lado deve-se atentar que os fundamentos práticos desse
importante trabalho não sejam determinados por métodos que prometam eficácia e que não
consideram a fidelidade bíblica. De outro lado, contraria a sabedoria bíblica a mera repetição
de modelos justificados por exclusiva fidelidade à tradição. Tal método pode ter compromisso
com fidelidade institucional mas pode negar a sua responsabilidade quanto a frutificação.
Elemento de extremo interesse quando o assunto é missão e plantação de igrejas.
A Cristologia e o munus triplex possuem implicações práticas para a vida de cada
cristão. O evangelho é a boa notícia sobre o que Deus proveu em Cristo para o seu povo. A
pessoa e obra de Jesus de Nazaré dão a cada seguidor nova natureza, identidade e propósito.
Por ser o mestre profeta, sacerdote e rei, o povo de Deus é alçado à condição de profetas,
sacerdotes e reis. Essa caracterização não é simplesmente nomenclatura para definir status
alterado. O tríplice ofício de Cristo deve ser norteador da vida e identidade do povo de Deus.
Há quem diga que o sacerdócio universal foi uma doutrina altamente defendida na
Reforma, mas que suas implicações práticas para o povo de Deus ainda carecem de maior
ensino e efetivação140. Tal crítica é feita ao perceber-se a clericalização de ramos importantes
do protestantismo. É possível afirmar que ainda é necessário insistir no profetismo universal e
na realeza universal. Essa importante doutrina, derivada do Supremo Oficial, Jesus Cristo,
ainda há que ser muito mais ensinada e pesquisada, para que possa ser também praticada.
Quando o assunto é plantação de novas igrejas, os ofícios de Cristo devem ser
tomados como paradigma para a identidade da nova igreja que está sendo plantada. Ensino
bíblico, sacramentos, evangelização e pregação são aspectos imprescindíveis de um projeto
missionário. Uma plantação que considera esses elementos está cumprindo o papel profético
que lhe é atribuído pelos ofícios de Cristo. Oração, culto, comunhão e ação de misericórdia
são áreas vitais na plantação de uma igreja e na sua consolidação, elementos inegociáveis no
estabelecimento de um trabalho cristão e missionário, tais áreas fazem parte do papel
sacerdotal que toda igreja deve cumprir. Comissionamento, despertamento de vocações,
libertação de cativos, triunfo sobre o maligno, rendição ao Senhorio de Cristo, supervisão,
organização, visão de crescimento, disciplina, treinamento de líderes e envio para o ministério
são atribuições vinculadas ao papel da realeza. Para um efetivo trabalho de plantação de igreja

QUEIROZ, Sérgio. Palestra centro de treinamento e plantação de igrejas. Campinas. 2018. Material não
140

publicado.
61

e para uma necessária consolidação e multiplicação, exige-se que essas realidades estejam
presentes.
A eclesiologia sadia fora defendida ao longo dos séculos através daquilo que se
classificou como as marcas da verdadeira igreja. Essas marcas são distintivos de saúde do que
vem a ser uma igreja. A ausência dessas marcas evidenciam problemas dignos de correção,
sendo que sua permanência implica em desconfigurar a natureza desse ajuntamento de
pessoas. A correlação de termos e realidades tríplices entre as marcas da igreja e o munus
triplex, somam a mais uma razão para considerar os ofícios de Cristo ao buscar nutrir e formar
uma igreja verdadeira.
As tipologias de liderança oferecem excelentes insights para a consideração dos perfis
de líderes, no entanto, mostra-se frágil o desdobramento de suas implicações quando
associa-se a um líder específico a correspondência exclusiva de um dos ofícios. Na ótica
bíblica e teológica todos os cristãos são profetas, sacerdotes e reis. Isso é válido para a
liderança também.
Os desvios na conceituação da missão estão diretamente relacionados ao desequilíbrio
na consideração do que vem a ser a obra de Cristo. Uma atenta consideração sobre sua pessoa,
obra e ofícios é suficiente e necessária para a construção de uma missiologia que faça juz ao
que ensina as Escrituras.
Os ofícios de Cristo e as implicações podem ser subentendidos e verificados nos
textos sobre missiologia e plantação de igreja. Essa pesquisa oferece um passo na direção de
validar o munus triplex como referencial metodológico para o plantio de igrejas. É necessário
que muito mais pesquisas considerem o assunto no ambiente acadêmico e os plantadores
atestem e confirmem tal paradigma na prática.
62

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