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e das aprendizagens por parte dos alunos. As escolas fizeram-se para os lização da Rede e dos Cursos ministrados pelas diversas instituições de
alunos e para defender os seus interesses e não para satisfazer quaisquer Ensino Superior. O número de instituições existentes em Portugal está
modelos por mais eficazes que eles pareçam ser noutras sociedades e dentro dos padrões internacionais, o que não significa que não tenha que
noutros contextos sócio-culturais. ser continuado de forma persistente um trabalho de integração e de arti
O modo como se processa o financiamento da educação assenta hoje culação entre instituições, designadamente entre as Universidades e os
em Portugal num modelo multifacetado. Do pré-escolar ao ensino supe Institutos Politécnicos que integram a Rede Pública. O caso recente de
rior existem formas muito diversas de as escolas, públicas ou privadas,
obterem os recursos financeiros com que constroem os seus orçamentos
1 fusão entre a Universidade de Lisboa e a Universidade Técnica é um bom
exemplo de uma medida no sentido correto, desde que a tal fusão se si
de funcionamento. O Estado continua a ser o grande financiador, mas a gam as indispensáveis medidas de articulação e integração entre departa
questão requer uma reflexão que permita otimizar os recursos disponí mentos existentes cujos objetivos se sobrepõem entre si. Também no que
veis tendo em conta, por um lado as exigências crescentes em relação à diz respeito à racionalização da oferta de cursos há que continuar o traba
qualidade do ensino e, por outro, a necessidade de escolarizar a totalidade lho que vem sendo realizado pela Agência A3Es sendo que os resultados
das nossas crianças e adolescentes. já alcançados são de tal modo satisfatórios que o que importa é prosse
Os termos de referência para qualquer negociação passa portanto, em guir o que tem sido feito de forma tão discreta e serena. A Agência, dado
nossa opinião, pela importância que deve ser atribuída à escolarização o estatuto de independência que possui, constitui aliás um bom exemplo
de todos os que têm idades até aos 18 anos e pela defesa de uma con em Portugal do que pode e deve ser feito por uma entidade de regulaçáo.
quista civilizacional como é a da gratuitidade da escolaridade obrigatória. Acresce que em relação aos estabelecimentos de Ensino Superior não
No que se refere à norma constitucional que aponta para uma educação podemos manter um conjunto de procedimentos em que o poder cen
“tendencialmente gratuita” entendo que há muito ela deixou de ser cum tral tudo controla e tudo quer controlar, mesmo quando aquilo que as
prida particularmente quando para o Ensino Superior o Tribunal Consti instituições fazem resulta da obtenção de financiamentos que não têm
tucional deliberou que o pagamento de propinas com algum significado origem no orçamento do Estado ou seja foram obtidos através de “fund
não transgride a Lei Fundamental. -raising” ou de contratos em que o Estado não foi parceiro nem ativo nem
Gostava, no entanto, de reforçar a ideia de que é no conceito e na defi passivo.
nição dos estatutos de autonomia a conceder às escolas, às universidades E, aliás, nestas matérias que mais se faz sentir a falta de um verdadeiro
e aos institutos politécnicos que reside a questão essencial de todo este estatuto de autonomia para as instituições de ensino e investigação.
processo de negociação que venho preconizando. Finalmente haverá três temas que me parecem da maior importância
A avaliação das escolas do Ensino não Superior bem como a avalia e a que o país tem que dar um impulso dada a sua relevância estratégica
ção das Universidades e Institutos Politécnicos são áreas em que importa para o nosso desenvolvimento.
igualmente estabelecer regras que permitam tomar claros os indicado Trata-se do Financiamento da Investigação Científica, da Translação
res de avaliação e sobretudo definir os critérios a aplicar relativamente às do Conhecimento entre as Universidades e o tecido económico e da Inter
conclusões e recomendações apresentadas pelos avaliadores e pelas ins nacionalização do Ensino Superior.
timições de avaliação. E isto tendo presente que a avaliação é um instru São questões que se encontram intimamente ligadas e que exigem
mento cujos objetivos são a melhoria da qualidade do ensino e da apren 8 uma atuação e um acompanhamento especiais ao nível das prioridades
dizagem a par de uma melhoria global do funcionamento das instituições políticas que importa assumir sem tergiversações ou descontinuidades.
em termos da gestão dos recursos humanos e financeiros e do aumento O Ensino Superior português dispõe no momento atual de capacidades
da relevância do ensino ministrado. pouco conhecidas no país e quase desconhecidas em muitos países nossos
Uma outra área em que se tem que encetar um grande esforço para parceiros com quem mantemos uma cooperação intensa em setores diver
otimizar os recursos existentes relaciona-se com os critérios de raciona- sos, designadamente nas áreas do turismo ou das trocas comerciais.
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1.
40 ANOS DE POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO EM PORTUGAL COMPROMISSO NA EDUCAÇÃO
É importante que, politicamente e ao mais alto nível, as instituições de de redefinir as funções e o papel do Estado, mas tem que o fazer assente
Ensino Superior que dispõem de recursos humanos altamente qualifica na realidade concreta e tendo em vista um país que possa progredir sem
dos e que desenvolvem e criam conhecimento ao nível internacional em voltar a pôr em causa a estabilidade financeira que já lhe faltou por três
tantos setores da ciência e da técnica, sejam devidamente incentivado5 e vezes nos últimos quarenta anos.
motivados para ganharem peso como um importante produto de expor Quero ainda sublinhar a muito especial importância que em qualquer
tação. compromisso para o futuro deve ser atribuida à educação pré-escolar e
Não se trata de transformar as Universidades em empresas exportado mesmo ao acompanhamento das crianças que frequentam as creches en
ras, mas sim em entidades reconhecidas internacionalmente com poten tre os poucos meses de idade e os três anos. Trata-se de um setor a que
cialidades e capacidades para atrair para Portugal investimento estran me sinto particularmente ligado. É nestes primeiros anos de sociabiliza
geiro em áreas das tecnologias avançadas e do conhecimento científico çáo da criança que se constroem as bases que vão ter uma importância
mais sofisticado. Temos já no pais alguns departamentos universitários decisiva no futuro comportamento da criança quando se toma adoles
cujo trabalho de interação com as empresas tem contribuído decisiva cente e mais tarde adulto.
mente para a afirmação externa dos bens e serviços que Portugal exporta Como escrevia um autor americano há muitos anos: “Alil need to know
hoje em ritmo crescente. 1 kamed iii the Kindergarden”
O trabalho que vem sendo realizado tem no entanto que ser conso
lidado tanto através da estabilização dos critérios de financiamento da Nota final
Investigação Científica como no campo do apoio e do incentivo à transla A Reforma do Estado é uma matéria que tem merecido os mais diversos
ção do conhecimento entre as Universidades e as Empresas. comentários e para a qual o próprio Governo elaborou um documento
Em conclusão:
A Reforma do Estado nestes diversos setores relacionados com a Educa
ção designadamente a gestão das Escolas, das Universidades e dos Ins
titutos Politécnicos, é uma matéria sensível sobre a qual devem meditar
1: ficações dos ativos; outra rompe com esse consenso e traz para a frente
de cena o que poderia ser designado, nos seus termos, como as questões-
-chave da qualidade, da exigência e da competitividade. Mas as coisas
nunca são assim tão simples. Como vimos, a primeira agenda foi objeto
de críticas, adaptações e desenvolvfrnentos em sentidos contrários, con
soante os interesses e os poderes das forças sociais que a foram (re)pro
O terceiro ponto, consonante com o anterior, é a radical reforn-iulação
da conceção do serviço público de educação e do modelo de financia duzindo. Pode, por outro lado, acontecer, como já sucedeu no passado,
mento público do acesso aos bens educativos, no contexto da defesa do que o antagonismo ente agendas venha a desembocar, não num jogo
que comummente se designa por “cheque-ensino”. De facto, se se pensa de tudo ou nada, mas sim em processos complexos de ajustamento recí
as desigualdades escolares como desigualdades de mérito e esforço pes proco. Ou talvez a lógica de cristalização e entrincheiramento, numa
delas, tenha como efeito fortalecer e legitimar a posição contrária.
soal e se entende que elas são visíveis, e legítimas, desde a infância, não
Em qualquer caso última nota que pode ser deixada no plano ana
se vê porque não se há de deixar jogar, em todo o sistema, o jogo da com
—
lítico deste ensaio nenhuma agenda política existe sem condições de
petição entre alunos, entre famílias e entre escolas, garantindo a todos,
—
discurso: ela é o que ela diz; sem condições de mobilização: agenda im
independentemente de origem e condição, o mesmo volume de recursos
plica ação e ação requer atores; e sem condições de remuneração: algum
públicos. Assim, o Estado cumpriria o seu único papel imprescindível
i
objetivo há de ser colhido e algum beneficio correlativamente alcançado.
que era garantir a existência de uma oferta acessível em todo o território,
Ora, para haver condições de remuneração (no sentido mais amplo,
regulando depois minimamente o sistema, a montante através do curti gratificação que motive extrínseca e intrinsecamente), é preciso que a
culo nacional e a jusante através das consequências dos resultados dos agenda política da política educativa regresse ao centro da agenda política
exames para efeitos de seriações, prémios, castigos e reparações. O mer toutcourt. A crise que nos aflige desde 2008 fé-la desaparecer como pon
cado encarregar-se-ia “naturalmente” da regulação principal. to crítico desta agenda global, tornando-a, como a saúde, numa espécie
de consequência, no caso das restrições orçamentais. Desta perspetiva,
Uma agenda para o próximo futuro: condições de mobilização o crescendo da agenda alternativa ao consenso democrático, a agenda do
Quero, aqui, situar uma agenda política para a política educativa dos pró ensino, dos exames, dos cursos vocacionais, do cheque-ensino, tem o mé
ximos anos, e não embrenhar-me direta e aprofundadamente no seu de rito de ir para além das restrições orçamentais, porque o seu programa é,
bate. Embora seja nítido, pela própria perspetiva de análise que escolhi de cabo a raso e sem nenhuma intenção pejorativa, ideológico: é mesmo
—a partir do consenso que se foi formando na democracia portuguesa e outra visão do mundo e outra ambição para a política. Neste tópico espe
foi enfaticamente expresso e expandido pela Lei de Bases de 1986— qual cífico, parece que a bola está mais do lado dos seus antagonistas, que têm
é o ponto de vista normativo a que me vinculo (é a componente do “dever de trazer a agenda educativa mais para o centro da sua reflexão e ação
ser’ das formações e opções doutrinárias inescapáveis, felizmente, em política.
todos os estudos prospetivos de políticas públicas que se levem a sério), As condições de mobilização são hoje bem mais fracas do que em con
posso parar neste limiar em que se toma totalmente claro quão determi junturas anteriores. Sem curar de escrutinar as causas, assentemos ape
nante é a ideologia (palavra positiva) na definição das agendas políticas. nas na constatação. A desclassificação social dos professores, de um lado,
É precisa prudência na antecipação de desenvolvimentos futuros e os efeitos da retração do mercado de trabalho e de outros canais de
À primeira vista, sobressai a existência de mais do que uma agenda e o mobilidade sobre as procuras de educação, são talvez os dois aspetos mais
antagonismo estrutural entre agendas. Simplificando, uma vem da Lci graves desta desmobilização. A remobilização social em torno da educa
de Bases de 1986, e define como questões principais o cumprimento e a ção, no que resta desta década, não é tarefa fácil, dadas as condições obje
extensão da escolaridade obrigatória e a recuperação do défice de quali tivas que vivemos e viveremos. Mas a agenda depende crucialmente dela.
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40 ANOS DE POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO EM PORTUGAL
Finalmente, a agenda é também da ordem do discurso. O quadro que
ela desenha não é diretamente o que nós pensamos e dizemos, mas é o
conjunto das categorias e das relações entre categorias em que nós pen
samos e dizemos. Aí, não é difícil identificar os travões ftmdamentais à
centralidade da agenda educativa como capacidade e horizonte de ação:
é o discurso do excesso de qualificações (quer absoluto, “temos doutores
a mais”, quer relativo, “não há saídas profissionais para tão grande nú
mero de formados”), da desvalorização do atraso de qualificações (cor
relativo da mais geral ideologia que despreza as necessidades próprias
dos mais velhos) e, sobretudo, o discurso da impotência da política pú REFERÊNCIAS
blica (ao fim e ao cabo, a educação seria uma opção ou destino pessoal).
Não direi nenhuma novidade se escrever que a consciência coletiva, cí Políticas Públicas e Saberes Científicos um diálogo imprescindível
—
vica, cultural e económica, da qualificação como recurso-chave de uma AZEvEDO, José Maria (1995), Os nós da rede. Contributo para a enunciação dopro
sociedade e uma economia do conhecimento é a trave-mestra de uma blema das escolas primárias em meio rural, Dissertação para a obtenção do grau
agenda política positiva para a educação, qualquer que seja a forma con de mestre em Ciências da Educação, Porto, FPCE-UPP, mimeo.
creta, em termos de políticas, que ela assuma. Mas, muitas vezes, o que BENAvENTE, Ana (1990), “Insucesso escolar no contexto português — aborda
necessitamos de fazer é repetir o que sabemos, ou deveríamos saber, ou, gens, concepções e políticas”, Análise Social, Vol. 2OCV (108-109), 1990 (4Y e
5.2), 715-733.
sabendo, não deveríamos calar.
CAPUCHA, Luís (2013), “Em defesa da Iniciativa Novas Oportunidades: a quali
ficação de adultos é uma prioridade”, Aprender, Portalegre, Escola Superior
de Educação.
CARNEIRO, Roberto (1999), ‘A Changing Canon of Govemment: From Custody
to Service”, Governments of theFuhsre. Paris, OECD/PUMA.
CARNEIRO, Roberto (coord.) (2009), Iniciativa Novas Oportunidades. Primeiros
Estudos da Avaliação Externa, Lisboa, Agência Nacional para a Qualificação,
I.P.
MENDONÇA, Maria Amélia e Maria Ana Carneiro — Caderno Temático N°1 Polí
—
ticas Públicas
Liz, Carlos, Mariana Ribeiro Machado e Ercília Burnay —Caderno Temático
N°2—Percepções.
VALENTE, Ana Cláudia e Lourenço Xavier Carvalho, —Caderno Temático N°3 —
Estudos de Caso.
LopEs, Henrique, Jorge Cerol e Pedro Magalhães (CESOP) —Caderno Temático
N°4— Painéis.
LopEs, Henrique, Jorge Cerol e Pedro Magalhães (CESOP) Caderno Temático
—
N°5— Qualidade e Satisfação.
MELO, Rodrigo Queiroz e, Francisco Jacinto, Hugo Caldeira, Isabel Salvado,
Melissa Marmelo, Sofia Reis, Jorge Cerol e Carlos Rondão Caderno Tem ático
—
N°6— Auto-Avaliação.
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