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Patané, Rosana & Martins, António (2011).

“Objecto de estudo e seu percurso metodológico: do processo


de definição do objeto ao tratamento de dados sobre representações sociais” in Pinto, Ivany (org.)
Escrituras imagens e sentidos. Saberes sobre o objeto de pesquisa na educação. Belém - Pará:
Editora Cromos, pp. 137-161

OBJECTO DE ESTUDO E SEU PERCURSO METODOLÓGICO: DO


PROCESSO DE DEFINIÇÃO DO OBJETO AO TRATAMENTO DE DADOS
SOBRE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Patané, Rosana1 & Martins, António2


Introdução

O texto3 que propomos incide sobre a descrição de um percurso metodológico de


uma investigação de doutoramento sobre as representações sociais construídas por
professores4 portugueses e brasileiros em relação às políticas educativas em sexualidade
e gênero. Diferente do que é tradicionalmente executado como opção metodológica da
Teoria das Representações Sociais (TRS) nas vertentes mais etnográficas como nos
refere Denise Jodelet ao dizer que o objectivo de contextualizar as representações num
conjunto social específico implica uma abordagem etnográfica, envolvendo vários
níveis de observação e de análise (1986:176), ou através do método experimental (Sá,
1998:81) esta investigação pretende realizar um caminho mais eclético, no que se refere
à escolha do método bem assim como à seleção das técnicas de recolha e de análise de
dados.

1
Aluna de Doutoramento do Departamento de Educação da Universidade Aveiro e Bolseira de
Investigação da Fundação para a Ciência e a Tecnologia – FCT e do Centro de Investigação em Didáctica
e Tecnologia da Formação de Formadores – CIDTFF. Mail: rosanapatane@ua.pt
2
Docente na Universidade de Aveiro no Departamento de Educação da Universidade de Aveiro e
investigador do Centro de Investigação em Didáctica e Tecnologia da Formação de Formadores -
CIDTFF– Portugal. Mail: amartins@ua.pt
3
O texto proposto regula-se pelas normas do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (AO) assinado
em 1990 por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe
(tendo Timor- Leste aderido em 2004). O AO entrou em vigor no início de 2009 no Brasil e em 13 de
maio em Portugal. Por essa razão, alguns termos e expressões próprias da utilização corrente do idioma
em Portugal e no Brasil poderão estar em evidência conforme o previsto no referido instrumento. (Porto
Editora, 2011).
4
Os professores selecionados para participar da investigação em relação ao Brasil leccionam no Ensino
Fundamental (5º ao 9º) e no Ensino Médio e suas escolas pertencem às Metropolitanas Regionais III, IV e
X, localizadas na Cidade do Rio de Janeiro e coordenadas pela Secretaria Estadual de Educação. Em se
tratando de Portugal, os professores selecionados são do Ensino Básico (2º e 3º ciclos) e do Ensino
Secundário. As escolas pertencem aos Agrupamentos de Escolas de: Aveiro, São Bernardo, Esgueira e
Aradas, localizadas no Concelho de Aveiro.
2

O objeto de pesquisa da investigação que apresentamos acima possui um


enfoque essencialmente qualitativo, por refletir opiniões, valores, asserções e crenças,
que levam à adoção de comportamentos e à reprodução de ideias e de conceitos como
algo concreto.
Por tal razão, a definição do objeto de pesquisa para além de ser o ponto de
partida para a realização de uma investigação no campo das representações sociais, é o
objeto de conhecimento, de onde evocamos a pergunta de partida, na qual o fenómeno
social é a própria produção de conhecimento prático orientado para a compreensão do
mundo e para a comunicação (Spink, 2008:12).
Destacamos que na definição do objeto de pesquisa não se trata apenas da
escolha de um fenómeno para ser estudado como representação social, deve ser
constituído de características das quais se possam extrair propriedades como: a
dispersão da informação, a focalização e a pressão à inferência (Sá, 1998:26). A
primeira consiste na busca de fenómenos que articulam o pensamento social a uma
prática social. A segunda, a “focalização”consiste no levantamento de informações, seja
por meio da literatura ou mesmo de entrevistas de carácter diagnóstico junto a
informadores privilegiados, que ampliam o grau de conhecimento sobre o objeto de
pesquisa. E a terceira, “a pressão à inferência”, concentra-se sobre a elaboração dos
objetivos claros e exequíveis que irão sustentar as fases de operação do desenho de
investigação.
Em função do objeto de pesquisa e problema de investigação que definimos,
optamos pela utilização da metodologia “mista” ou “quali-quanti”5, abordagem multi-
metodológica, da triangulação ou da combinação entre técnicas quantitativas
(construção e aplicação de questionários) e qualitativas (realização de entrevistas) para
obter o máximo de informação sobre os grupos sociais estudados (os professores
brasileiros e portugueses) por se tratar de uma investigação que desenvolve-se em dois
países (Brasil e Portugal) com realidades sociais, políticas, económicas, culturais e
educacionais distintas. Por outro lado e de acordo com Flick (2005) é importante que
uma dada investigação não se focalize essencialmente numa única corrente de
pensamento para produção de conhecimento científico.

5
Segundo Freitas & Moscarola (2008), Sampieri, Collado & Lucio (2003), Dezin & Lincoln (2006) a
metodologia “quali-quanti”é um recurso que permite não só a combinação de mais do que um método,
como também, das técnicas de recolha e de tratamento de dados próprios dos estudos de abordagem
quantitativa e qualitativa para obtenção de resultados precisos sobre o objeto de estudo.
3

Importa realçar que o estudo compreende também uma vertente comparativa ao


abordar duas realidades educativas distintas: os professores do 5º ao 12º ano que
lecionam nas escolas de Ensino Fundamental e Médio da Cidade do Rio de Janeiro e os
professores que lecionam nas escolas de Ensino Básico e Ensino Secundário dos
mesmos anos escolares no concelho de Aveiro. Trata-se de realidades não apenas
distintas do ponto de vista cultural, mas, também, das políticas educativas neste
domínio. Sem se utilizar o método comparativo, por trabalharmos com dados
predominantemente subjectivos, estabelecer-se-ão às comparações possíveis e
especialmente com base nos dados de natureza mais quantitativa.
A ideia central deste texto é promover a reflexão em torno da realização de um
percurso metodológico, e, ao mesmo tempo, dialogar com os pesquisadores do campo
da educação, e sobretudo, com os pesquisadores iniciantes que estão à procura de bases
de fundamentação teórica e de “modos de como fazer bem uma investigação” com base
na Teoria das Representações Sociais.
O trabalho que aqui damos conta será equacionado em redor de quatro temáticas
centrais. A primeira refere-se à uma breve contextualização sobre a problemática e o
objeto de estudo, considerando as características dos mesmos e as influências que as
questões da sexualidade, do gênero e da educação sexual sofreram em função das
transformações sociais ocorridas nas últimas quatro décadas, assim como, as
representações sociais a elas associadas. A segunda temática aborda a escolha do
método e a razão pela qual optamos por um caminho metodológico que mescla métodos
e técnicas de recolha e de tratamento de dados de tradição qualitativa e quantitativa. Na
terceira temática descreve-se o tipo de instrumentos construídos para a recolha de dados
com base em cada um dos cinco objetivos de investigação. Caracterizamos a amostra
selecionada para responder ao inquérito e o grupo de informadores escolhidos para
responder ao guião de entrevista semiestruturada. E, por último, apresentam-se as
técnicas e o processo de tratamento da informação recolhida consoante a técnica de
recolha de dados utilizada. Realçamos a importância da utilização de programas
informáticos específicos que dão suporte no processo de organização, descodificação,
esquematização e análise da informação levantada.

1. A definição do objeto de pesquisa e o problema de investigação

1.1. Problematização do objeto de estudo


4

Os temas da sexualidade, bem assim como o de gênero, considerados em todas


as suas dimensões, são temas de relevância social, tanto pela repercussão que exercem
na dinâmica social como pelo impacte causado por seus problemas nas decisões do
poder público. Ocasionaram e, ainda hoje, ocasionam mudanças nos costumes, nos
diversos modos de socialização que envolvem os indivíduos, seja em seus contextos de
socialização de origem, na escola, no ambiente académico, no ambiente de socialização
profissional, ou ainda, entre os novos grupos de partilha que marcam a mobilidade
social.
Constatamos tal facto, se observarmos as mudanças que foram desencadeadas
com as grandes transformações que ocorreram no campo social, da tecnologia e da
economia a partir dos anos 60. As transformações foram muitas e repercutiram sobre as
formas de comunicação, de convívio e de compreensão e aceitação da própria
sexualidade, dos valores da família, e, sobretudo, do exercício da sexualidade com
liberdade pela mulher.
No entanto, vale destacar que mesmo com o grande impacte dos valores da
contracultura (a revolução dos costumes e sexual) dos anos 60 e 70 sobre as sociedades
ocidentais, os valores tradicionais não se reduziram ao ponto de não serem valores em
concorrência com os que emergiram com o Novo Estatuto da Sexualidade.
Estes foram sendo contestados de forma progressiva pelos diferentes grupos
mais conservadores e pelas diferentes igrejas, especialmente, pela Católica através de
instâncias e das instituições reprodutoras de suas formas de socialização, como a escola
e a família. Foi através do poder simbólico que a Igreja Católica não só reforçou os
valores tradicionais, como incidiu sobre os sistemas educativos durante os regimes
ditatoriais instaurados tanto no Brasil como em Portugal até ao último quartel de século
XX.
A Igreja Católica associou-se de forma activa aos sistemas políticos para
defender abordagens disciplinares sobre a religião centradas nos dogmas por si
defendidos para a formação cívica, para a moral sexual, sobretudo, após a deflagração
da SIDA (AIDS) enquanto pandemia, como destaca Alferes (1996, 2002).
As campanhas voltadas para a promoção do sexo seguro reforçavam estereótipos
relativos à orientação sexual e ao papel social de gênero. A força da Igreja Católica
como instituição opositora dos novos valores sexuais que foram introduzidos a partir
dos anos 60 do último século foi intensificada e, com isso, as representações sobre a
5

sexualidade e o gênero assumira uma outra complexidade: a associação de que a SIDA


estaria vinculada ao comportamento sexual das pessoas na sociedade. O risco de
exposição à doença seria propiciado em função de três grandes categoriais: papel social
(caso dos e das profissionais do sexo); orientação sexual assumida publicamente (caso
dos homossexuais masculinos, das lésbicas e das pessoas com orientação bissexual) e
valores (Loyola, 1992).
Tal associação constitui-se num fenómeno social que revelou não só a força que
a herança dos valores judaico-cristãos imprimiram junto à formação do sujeito sexual
nas sociedades ocidentais, como revelou que as sociedades contemporâneas ainda não
estão preparadas para viver um outro projecto de modus operandi em relação às
questões da sexualidade e do gênero em interface com o exercício da cidadania e com
os direitos humanos.
Realçamos, assim, que os valores da revolução dos costumes e sexual
promoveram um abalo considerável nos valores sexistas e no reforço à discriminação
em função do gênero, do sexo e da orientação sexual. No entanto, não conseguiram
romper por completo com o que era considerado “certo” ou “errado”, conforme a
referida herança tradicional e judaico-cristã sempre defendeu e que continua a ser
apanágio do seu sistema de ideias neste domínio.
Os obstáculos de ordem social e cultural que se fundamentam na herança dos
valores morais judaico-cristãos e nos conhecimentos científicos produzidos pela ciência
do sexo que nasceu na segunda metade do século XIX com os discursos médico-
assistenciais baseados nos discursos médico-políticos do século XVIII, que
consideravam as manifestações sexuais em dois grandes campos complementares: o da
biologia da reprodução e o da medicina do sexo (Foucault, 2003), continuam a
influenciar a forma como estas realidades são entendidas e como influenciam as práticas
sociais, isto é, as representações sociais.
Após a Primeira Guerra Mundial inaugura-se uma segunda fase, da ciência do
sexo, que se intensifica com a deflagração da revolução sexual e da SIDA,
posteriormente. Trata-se da sexologia contemporânea onde tende a predominar uma
certa naturalização e em que se elegeu o orgasmo e o conceito de descarga sexual como
seus objetos centrais (Alferes, 2002).
A nova perspectiva, antes referida, reflete a forma progressiva como as
transformações sociais vieram acontecendo no campo da sexualidade e das relações de
gênero nas últimas quatro décadas.
6

Com base nas abordagens de Guiddens (1995) sobre as influências das lógicas
do mercado capitalista nas dinâmicas sociais relativas à sexualidade nos meios de
comunicação social de massa, inauguraram o que consideramos como uma “aceitação
por indução”, por considerarmos que os indivíduos fizeram diversas adesões relativas à
liberdade e ao comportamento sexual de forma não reflexionada. Simplesmente os
reproduziram por influência dos meios de comunicação e pela pressão exercida de
sujeito para sujeito (parceiros, cônjuges ou pares). O que revela a existência de uma
espécie de “adesão e de assimilação”, que se incorpora na vida cotidiana, ao ponto de
conquistar o estatuto de legítimo e de “normal” pelo senso comum e desta forma dar
suporte à criação de tipologias de representações sociais específicas e que importa
discutir.

1.2. O Problema de investigação e sua delimitação teórica

Trabalhar com o tema da sexualidade e do gênero, no contexto das políticas


educativas, significa, observar de forma crítica, o que mudou no comportamento dos
indivíduos e na sociedade em relação ao perfil do sujeito sexual contemporâneo.
A questão da educação sexual trata-se, assim, de um tema que está diretamente
implicado à relação indivíduo-sociedade, não só em relação às questões sociais
relativas, mas, de modo universal em função das dinâmicas, trocas e relações presentes
no atual mundo globalizado em que as relações (aos diferentes níveis) tendem a ser não
apenas globais como mais intensas e a circulação de pessoas, bens materiais
(especialmente financeiros) e culturais tende a intensificar-se com reflexos na criação de
novos modos de vida e de novos valores (Martins, 1999). Pois, qualquer que seja a
sociedade e a cultura, a questão sexual e, mais precisamente, a gestão da prática sexual
dos indivíduos se coloca como um construto de vida e uma meta dos governos.
Neste sentido, a educação sexual veiculada pelas instâncias mais progressistas
ou pelas mais tradicionais, expressam um conjunto de regras que interferem diretamente
na organização do espaço social, na configuração do status quo e na consolidação de
estatutos e de relações de poder. Seja no campo das macro relações (do Estado para a
sociedade) como no campo das micro relações sociais (relações intergrupais ou de
indivíduo para indivíduo).
Por essa razão, o problema de investigação centra-se na formação das
representações sociais que foram construídas pelos professores brasileiros e portugueses
7

sobre as políticas educativas em sexualidade e gênero, elaboradas pelos governos para


organização funcional do trabalho de educação sexual nas escolas.
Nos interessa saber como se expressam e se constroem as representações sociais
dos professores sobre as políticas educativas que regulamentam o trabalho pedagógico
com as temáticas da sexualidade e do gênero em meio escolar, em termos de regime de
aplicação (conteúdos abordados e organização funcional e curricular).
Para tanto, buscamos nas perspectivas teórico-metodológicas da grande teoria
das representações sociais (paradigma moscoviciano) as orientações e contribuições que
nos auxiliassem a fazer a identificação dos elementos estruturantes que compõem as
representações sociais aqui estudadas, não só quando desvelam o significado das
mesmas, como o processo figurativo e social, que sustenta um determinado conceito ou
opinião.
Caracterizar a estrutura das representações sociais e os processos que marcam a
sua construção, nos permite compreender, não só, como as representações sociais dos
professores sobre a sexualidade e o gênero se formaram no seio dos processos de
socialização estabelecidas no grupo social de origem e na trama das relações ocorridas
nos processos de ensino-aprendizagem no contexto da educação formal (Martins; Pardal
e Dias, 2008). Por isso, a identificação dos elementos do núcleo central são “uma
consequência metodológica essencial (…). Estudar uma representação social é de início,
e antes de qualquer coisa, buscar os constituintes de seu núcleo central”, conforme
destaca Franco (2004:174).
Por essa razão, trabalhamos com os conceitos de ancoragem e objectivação. O
propósito é buscar o “não familiar” que após a análise dos dados se torna “familiar” na
medida em que justifica uma série de significados a respeito das referidas
representações sociais, por serem conceitos que nos permite:

(…) extrair uma primeira caracterização de seus processos formadores (…) na


integração cognitiva do objeto representado a um sistema de pensamento social
pré-existente (…) ancorar é classificar e denominar coisas que não são
classificadas nem denominadas (…) representar o não usual em nosso mundo
usual, reproduzi-lo como a réplica de um modelo familiar(…). Já no que respeita à
“(…) objetivação (…) trata-se de uma operação imaginante e estruturante, pela
qual se dá uma forma – ou figura – específica ao conhecimento acerca do objeto,
8

tornando concreto, quase tangível, o conceito abstrato, como que materializando a


palavra (Moscovici, 1976, referido por Sá, 1996: 46-47).

Em síntese, nos detemos na busca dos elementos que justificam a formação de


uma representação social em suas componentes simbólica e figurativa que segundo Sá
(1996: 48) se organiza:

(…) num esquema explicativo básico que “não é difícil conceber que desse
esquema parcimonioso se possa extrair a explicação para a produção de efeitos
funcionais de compreensão e explicação da realidade, de definição da identidade
grupal, de orientação dos comportamentos e das práticas e de justificação das
tomadas de posição. Eles pousam (…) sobre a dinâmica da familiarização que rege
os processos formadores das representações.

Da teoria do núcleo central faz parte também o sistema periférico onde, de certa
forma, se matrializam as representações sociais e onde o “eu”, o “nós” e os “objectos”
se encontram. O sistema periférico é complementar do sistema central, com o qual se
encontra em dialéctica permanente (Abric, 2001; Flament, 1994: 86) e apresenta duas
importantes funções: protecção do núcleo duro das representações sociais e adaptação à
realidade.
De acordo com Flament (1989: 218), o facto de se verificar algum tipo de
desfasamento entre a realidade e a sua representação, faz com que os sistemas
periféricos funcionem por uma lado como um filtro que protege e estabiliza o núcleo
duro da representação comparativamente à realidade exterior e por outro ao serem mais
flexíveis e estarem mais atreitos à influência do contexto tendem a ser mais permeáveis
à mudança e por conseguinte à alteração das representações sociais.
Mesmo que a representação social seja determinada pelo sistema central ela
acaba por ter expressão ao nível do sistema periférico, como diz Flament (1994) “(…) é
na periferia que se vive uma representação social no quotidiano (…)” (p. 85). Este facto
coloca ou pode colocar algumas dificuldades nos estudos empíricos, particularmente
quando se segue o método indutivo e não são respeitadas orientações metodológicas
rigorosas.
Este estudo por tomar como referência, a teoria das representações sociais, já se
constitui num estudo de natureza complexa, dado que e de acordo com Moliner (1996)
trata-se de: “un corpus de conaissances fondé sur dês traditions partagées et enrichi par
9

de milles d`observations, d`experience, sanctionées par la pratiques” (p.13). As


representações sociais dos professores sobre as políticas educativas em sexualidade e
gênero, sendo o produto de um pensamento e de uma prática social, comportam
representações e tensões relativas ao desenvolvimento obrigatório da educação sexual
intencional em todas as escolas, e, por conseguinte, em todas as áreas disciplinares.
A partir do problema e da sua discussão e enquadramento teórico e como forma
de tornar mais precisas as nossas questões e construir os instrumentos de observação da
realidade e de recolha da informação necessária foram equacionados cinco objetivos:

1) Identificar e comparar que representações sociais os professores construíram


sobre a sexualidade e o gênero e seus estereótipos, a partir dos processos de
socialização primária e como tais representações foram sendo alteradas, ao
longo dos vários anos de educação formação (processo de socialização
académica, profissional e de mobilidade social e geográfica);

2) Identificar quais são os elementos centrais que compõem a organização


interna das representações sociais (o sistema central e o sistema periférico)
sobre a sexualidade e o gênero formuladas pelos professores tanto nos
processos de educação informal como de educação formal;

3) Que representações sociais e que concordâncias os professores evidenciam


em relação às políticas educativas em sexualidade e gênero;

4) Identificar quais são as tensões existentes entre as práticas dos docentes e as


práticas recomendadas pelas políticas educativas em sexualidade e gênero;

5) Analisar a partir das representações sociais dos professores sobre as políticas


educativas relativas às temáticas da sexualidade e do gênero, as tensões
existentes e, como essas podem estar a contribuir ou não, para impedir o
desenvolvimento dos projectos de educação sexual nas escolas.

2. O método: justificação da escolha e sua definição

2.1. A complexidade do problema e a escolha do método


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O método escolhido em qualquer investigação está estreitamente ligado ao problema e


aos objetivos e, por conseguinte, a natureza e complexidades destes determinam a
influência e a escolha daquele. Neste sentido se pronuncia Denise Jodelet, ao referir
que:

a ideia de que as escolhas metodológicas devam estar identificadas com as


condições sob as quais as representações sociais emergem e funcionam. A escolha
de uma metodologia diversificada pode contribuir para cercar a complexidade do
fenómeno estudado (Jodelet referida por Nascimento & Camargo, 2000:288).

Como já referido, o problema desta investigação envolve alguma complexidade


e variabilidade o que nos “obrigou/condicionou” a escolher métodos e técnicas diversos.
A complexidade advém: de a sexualidade e do gênero serem assuntos ainda “tabu” nas
sociedades atuais; de parte da abordagem se fazer com base em dados subjetivos
constituintes do senso comum, isto é, das representações sociais detidas por um
determinado grupo; de o grupo estudado “os professores” ser bastante heterogéneo, quer
por lecionarem em anos diferentes, quer e sobretudo, pela natureza dos elementos que
os definem enquanto grupo. E ainda, por se tratarem de dados recolhidos em realidades
socioculturais e políticas distintas – Portugal e Brasil.
Ao elegermos as políticas educativas em sexualidade e gênero, como nosso
objeto de pesquisa, colocamos em discussão temas que possuem ainda grande dinâmica
social, e de modo simultâneo, compreendem modos de saber variados enquanto ideias,
valores, crenças, atitudes e comportamentos.
Importa destacar o facto já referido de a investigação se desenvolver em dois
países (Brasil e Portugal) com realidades sociais, políticas, económicas, culturais e
educacionais distintas, onde a componente comparativa não pôde ser ignorada. No
entanto, decidimos não realizar um aprofundamento rigoroso nos critérios que
caracterizam os estudos do método comparativo pelos limites “impostos”, tanto pelo
método qualitativo, quanto pelos dados de natureza mais subjectiva que informam as
representações sociais. Neste sentido não estamos centrados na realização de um
trabalho de confrontação entre os sistemas educativos brasileiro e português sobre o
desenvolvimento das políticas educativas em sexualidade e gênero; mas, no modo como
os professores, enquanto grupo social, tanto na realidade social brasileira como
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portuguesa, percepcionam as referidas políticas e transferem essas percepções para os


seus discursos e práticas sociais.
Sendo assim, assumimos, que o desenho de investigação foi construído para
comportar a conjugação entre técnicas quantitativas e qualitativas, no sentido de
“responder” aos cinco objetivos traçados para compreensão do problema, caracterizado
como bastante complexo por analisar tanto os sistema de valores e os processos de
socialização permeados pelas relações sociais do senso comum, como, por se deter a
compreender de que modo tais sistemas de valores se articulam com o conhecimento
científico relativo aos temas da sexualidade e do gênero e, quais são as repercussões
desta articulação na realidade profissional vivenciada pelos professores brasileiros e
portugueses.

2.2. O método misto ou “Quali-quanti”

Como nos referimos anteriormente, a definição e natureza do objeto de pesquisa


é determinante para a escolha do método, pois determina ou indica qual é a lógica que
está presente na situação-problema que se pretende investigar.
O método é o modelo lógico tomado como referência para orientar a
investigação e determinar que tipo de informação nos interessa mobilizar para produzir
conhecimento científico. Ou seja, o método nada mais é que o conjunto de operações
mentais para que possa chegar a um conhecimento organizado, claro e relevante
(Vilelas, 2009; Pardal & Correia, 1995). Para Denzin & Lincoln (2006: 27) o método ou
os métodos não são estratégias passiva, refletem um posicionamento e uma intenção
clara de realizar a descodificação ou análise das informações e das ideias que compõem
o problema.
Neste trabalho condicionados pela natureza do objeto de pesquisa e pelos
objetivos de investigação definidos, optamos pela utilização da metodologia “mista” ou
“quali-quanti”6, isto é, uma abordagem em que se procura conjugar tanto os métodos e
as técnicas de natureza qualitativa como os de natureza quantitativa. Segundo Flick
(2005) os métodos quantitativos e qualitativos não são opostos inconciliáveis. No

6
Segundo Freitas & Moscarola (2008), Sampieri, Collado & Lucio (2003), Dezin & Lincoln (2006) a
metodologia “quali-quanti”é um recurso que permite a combinação não apenas de mais do que um
método como também das técnicas de recolha e de tratamento de dados próprios dos estudos de
abordagem quantitativa e qualitativa para obtenção de dados mais precisos sobre o objeto de estudo.
12

entanto a investigação qualitativa exige do pesquisador uma definição do objeto de


pesquisa mais cuidadosa, pois, sendo o objeto de estudo composto por uma grande
carga de subjetividade, o processo de desdobramento do mesmo, requer, o
aperfeiçoamento gradativo do processo indutivo, que por sua vez, torna
interdependentes, as várias partes do processo de investigação.
A conjugação dos vários elementos nos processos de investigação, também
designados por “triangulação, fusão ou o casamento quali-quanti”, consiste na estratégia
de investigação que ao combinar o uso dos métodos e das técnicas quantitativas e
qualitativas, nos permite não só realizar a complementação da informação, como a
verificação das variáveis presentes no mesmo constructo (Sampieri, Collado & Lucio,
2003).
Dentre os quatro tipos de triangulação7 que existem, referimo-nos aqui à
triangulação metodológica8, centrada na utilização de métodos e de técnicas de recolha
e de tratamento de dados diferentes para explicar a mesma classe de fenómenos. Ou
seja, procedemos de acordo com Vilelas à triangulação metodológica entre métodos
(2009:347).
A triangulação atua no sentido de sobrepor enfoques em uma mesma pesquisa e
poder mesclar diferentes facetas do fenómeno de estudo. Um estudo pode ser
configurado como um estudo de natureza quantitativa, e servir-se de técnicas de recolha
de dados qualitativas, como as entrevistas abertas e a análise de evocações livres,
conforme Sampieri, Collado & Lucio (2003) e Denzin & Lincoln (2006).
Por tais características julgamos a triangulação ou fusão quali-quanti, um recurso
importante para o trabalho de investigação com problemas semelhantes ao que
trabalhamos neste texto, pois permite mobilizar mais informação e fortalecer o
pesquisador dado tratar-se de um caminho que se afasta de posturas assumidas pelos
mais “puristas” que exigem a separação entre os enfoques quantitativo e qualitativo,
como se um fosse inimigo do outro e, só possuem valor absoluto quando mantidos em

7
O método de triangulação permite a verificação de dados e serve-se das várias fontes de informação dos
vários métodos de recolha de dados ou, pode permitir a mobilização de vários investigadores com
procedimentos científicos distintos no mesmo estudo. Os tipos de triangulação são basicamente quatro: a
triangulação de dados, a triangulação do investigador, a triangulação teórica e a triangulação
metodológica (Vilelas, 2009:345).
8
Pode ocorrer de dois modos: a) dentro dos métodos; b) entre os métodos. Quando ocorre dentro dos
métodos pode incidir sobre o desenho do estudo ou na recolha de dados. Este modo consiste na
combinação de dois ou mais instrumentos de recolha de dados, com idênticas aproximações do objecto
em estudo para medir a mesma variável (Vilelas, 2009:347).
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diferentes lados da trincheira. Consideramos que o uso do método nisto e da


triangulação constitui uma estratégia por um lado eficiente e pragmática e por outro
capaz de recolher e tratar informação sobre realidades socioculturais complexas
(Sampieri, Collado & Lucio, 2003:13).
Ao assumirmos este posicionamento metodológico não deixamos de ter em
mente que deveríamos fazer uma escolha mais adequada das técnicas e formas de
tratamento dos dados que pudessem valorizar a análise objetiva da expressão verbal e
textual e, ao mesmo tempo, pudesse permitir a identificação dos laços que ligam os
elementos centrais aos elementos periféricos de uma representação social. Ou seja,
métodos de recolha e de tratamento que possibilitem tanto a captação dos nós existentes
nas teias que influenciam diretamente na manifestação, na evolução e na transformação,
como destaca Sá (1996).

3. As técnicas de recolha da informação

Da multiplicidade de técnicas de recolha de dados possíveis e como resultado da


nossa orientação metodológica global foram selecionadas: O inquérito por questionário
e a entrevista semiestruturada. Claro que outra informação será recolhida através de
outros meios como análise documental ou a observação informal no contacto com os
sujeitos e os contextos. Importa conhecer as potencialidades e os limites de cada uma
das duas técnicas utilizadas a fim de o seu uso permitir os resultados que é legitimo
esperar (Quivy & Campenhoudt 2008; Pardal & Correia, 1995).
O inquérito por questionário apresenta um conjunto de vantagens que importa
desde já referir: natureza impessoal e padronizada das perguntas; garantia de anonimato,
permitindo aos inquiridos exprimirem-se sem constrangimentos; uniformização das
respostas, o que permite a sua comparação; ser mais rápido e permitir um melhor
controlo das variáveis; utilização extensiva e estandardizada a universos mais ou menos
extensos; permitir uma maior liberdade de tempo no seu preenchimento. Apresenta,
contudo, também um conjunto de desvantagens que é necessário conhecer para se
evitarem erros com o seu uso: pouca profundidade; susceptível de interpretações
erróneas, levando a que se tenham de anular respostas quando detectados erros; não
pode ser aplicado a indivíduos iletrados ou com dificuldades de interpretação; deixar de
ter significado estatístico em universos reduzidos. Em síntese, o inquérito por
14

questionário é caracterizado pela extensividade, o que permite generalizações, e pela


superficialidade, o que limita a profundidade da análise.
O recurso às entrevistas justifica-se por apresentarem um conjunto de vantagens
que são complementares ao inquérito por questionário: permitem obter uma informação
mais rica sobre os sujeitos, não apenas objectiva mas também subjectiva; podem ser
aplicadas a indivíduos iletrados; possibilidade de obter as respostas necessárias pela
reformulação das perguntas. Apresentam, contudo, um conjunto de desvantagens: a sua
aplicação é bastante limitada e as perguntas e respostas ao serem pouco estandardizadas
limitam o estabelecimento de comparações e generalizações; dificuldade de obter
respostas objectivas sobre assuntos delicados; a sua aplicação envolve maiores
dispêndios financeiros e de tempo, neste caso sujeita ainda à conjugação dos tempos do
entrevistado e do entrevistador. Ao contrário do inquérito por questionário, a entrevista
permite recolher dados em profundidade e mais intensivos, possibilitando análises mais
qualitativas mas não generalizáveis. Apresentam-se, assim, como duas técnicas de
recolha de dados com elevadas potencialidades quando articuladas na obtenção de
informação sobre um mesmo objecto de estudo.
A construção das técnicas teve por base um conjunto de dimensões de análise
emanadas do problema e dos objectivos e que passamos a descrever: caracterização
sócio-demgráfica e profissional do grupo social estudado; difusão do saber prático na
sociedade e a reprodução de papéis sexuais e dos estereótipos; acessibilidade e formas
de transmissão do saber formal (escolar e acadêmico); percepções dos professores
portugueses e brasileiros sobre as políticas educativas em sexualidade e gênero;
existência de tensões relativas à formação e ao desempenho do trabalho docente face às
referidas políticas educativas.
O questionário foi estruturado em cinco partes (A; B;C; D; E) e distribuído em
25 questões. Cada parte está relacionada com uma das cinco dimensões da investigação
antes referidas. Na primeira parte (A), construímos questões relacionadas com os
aspectos sócio demográficos e profissionais em relação à educação sexual em contexto
escolar. Na segunda, terceira e quarta parte, ou seja, (B;C;D) construíram-se escalas de
respostas nominais com enfoques diferentes. Na parte B recolheu-se informação relativa
à formação de saberes sociais formulados pelo senso comum sobre a sexualidade e o
gênero com base em estereótipos. Na terceira parte C, nossa intenção foi apreender de
que modo os assuntos relativos à sexualidade e ao gênero foram abordados pela escola,
pela formação acadêmica e pela formação profissional contínua. Na quarta parte (D) o
15

propósito foi apreender como os professores apreciam as políticas educativas em


sexualidade e gênero, com base em ideias que circulam no ambiente docente que são
oriundas do senso comum e do conhecimento científico. E por último, na parte (E)
elaboraram-se dois tipos de questões: uma escala nominal para avaliar em que medida
os professores percepcionam, e concordam ou discordam das políticas educativas em
questão e três pergunta abertas com a intenção de fazer os inquiridos responder sobre
qual o seu próprio posicionamento e sobre o que pensam das políticas que estão a ser
executadas nas escolas pelos professores. O questionário foi construído em duas
versões: uma brasileira e outra portuguesa, para facilitar a compreensão do mesmo em
cada população alvo nos dois países.
O questionário será aplicado (no Brasil e em Portugal) a cerca de 500
professores, com uma distribuição mais concentrada no grupo de professores do 7º ao 9º
ano, em ambos os países. A investigação realizou-se em 3 escolas de Ensino
Fundamental do1º ao 9º ano e em 1 escola de Ensino Médio, localizadas na Cidade do
Rio de Janeiro. Em relação ao concelho de Aveiro foram selecionadas 4 escolas do
Ensino Básico de 2º e 3º Ciclos e 1 escola do Ensino Secundário.
No que se reporta às entrevistas, optou-se por um guião semiestruturado. O
grupo selecionado ou informadores privilegiados foi constituído por professores
coordenadores de educação para a saúde e de educação sexual e por diretores de escola
perfazendo um total de 18 entrevistados nos dois países.

4. O tratamento dos dados

Em conformidade com o atrás referido, os dados foram recolhidos de forma


dominante, através do inquérito por questionário e de entrevistas semiestruturadas não
obstante terem sido recolhidas outras informações de forma não estruturada recorrendo-
se à análise documental e à observação dos sujeitos e dos contextos suporte da
investigação. Os dados serão tratados de forma dominante através de programas
informáticos específicos em conformidade com a natureza daqueles e com as exigências
colocadas pelos objectivos da investigação.
Os dados serão introduzidos nas respectivas bases de dados no respeito pelas
cinco dimensões de análise acima referidas e mediante um conjunto de procedimentos
técnicos como a categorização em unidades de análise (no caso dos dados de natureza
16

qualitativa) e serão tratados através de programas informáticos como o Statistical


Package for the Social Sciences (SPSS) e o programa NVivo8.
No tratamento dos dados serão utilizadas tanto a estatística descritiva e
inferencial com a análise de conteúdo e em unidades de análise, mais localizadas e
específicas. Utilizaremos a análise de homogeneidade dos dados, por meio do
procedimento Homals, centrado na Análise de Correspondência Múltipla (ACM)
(Pereira, 1997).

Considerações finais

O trabalho que se apresentou pretendeu traçar uma metodologia geral de um


percurso de investigação conducente à realização de uma tese de doutoramento e que
deverá ser entendido como um trabalho em construção e como base para o intercâmbio
e discussão de ideias neste domínio. É claro que existem muitos caminhos
(metodologias) para se chegar a um determinado lugar e até há quem diga que o
“caminho se faz andando”. O que pretendemos propor neste percurso metodológico foi
a delimitação de um percurso resultante de vários encontros mas também desencontros
em que se procedeu à definição do objecto/problema de investigação, dos objectivos
gerais e específicos, do método e técnicas de recolha e de tratamento da informação
bem assim como à fundamentação teórica dos diferentes processos equacionados.
As dúvidas que acompanharam o pesquisador no percurso e na construção do
caminho, são dúvidas que demonstram como o “caminhar metodológico”, exige mais
que a aquisição de conhecimentos por meio de literatura específica. Exige um processo
de amadurecimento gradativo e constante por parte do pesquisador para torná-lo cada
vez mais competente para compreender o conjunto de informações levantadas a respeito
do problema de investigação que ele formulou, com base no objecto de pesquisa com
efeitos relevantes sobre as dinâmicas sociais de um determinado grupo social.
A apresentação dialógica e descritiva da realização do percurso metodológico
que referimos neste texto, foi uma opção e com ela decidimos discorrer sobre as
características do estudo que executamos, enquanto fenómeno social e objeto de estudo.
Com esta orientação, decidimos discorrer sobre as características do estudo tendo em
conta o problema de investigação e suas singularidades enquanto fenómeno social que
desencadeia problemas a serem estudados pela teoria das representações sociais.
17

O problema equacionado consiste no estudo das representações sociais


construídas por professores portugueses e brasileiros em relação às políticas educativas
em sexualidade e gênero, sendo a discussão teórica centrada mas problemáticas da
sexualidade e do gênero, das políticas educativas, em ambos os países, e
fundamentalmente na teoria das representações sociais.
Em função do problema de investigação e da sua complexidade optou-se pela utilização
da metodologia “mista” ou “quali-quanti”, que permite a combinação não apenas de
mais do que um método como também das técnicas de recolha e de tratamento de dados,
bem assim como se fará uso da triangulação metodológica. Esta amplitude da
metodologia ao fornecer-nos um conjunto de lentes de observação permitirá a resolução
de um problema bastante heterogéneo e complexo de forma pragmática, embora
reconheçamos poder colidir com posicionamentos mais conservadores e ortodoxos.
Esta construção do caminho metodológico fez-se pela conjugação dos caminhos
já conhecidos (métodos) mas também pelo “caminhar” do investigador entre as teorias e
o campo onde o estudo empírico se materializa. A capacidade de discernimento e de
decisão do investigador se ampliam, à medida que o estudo avança. Esse adquire cada
vez mais compreensões a respeito do seu objeto de conhecimento e passa a colocar-se
também como crítico do seu próprio estudo. Não mais se coloca numa postura de
submissão absoluta aos cânones que balizam o método e passa a perceber os limites do
seu próprio estudo em relação ao método e técnicas de recolha de dados utilizados,
mesmo que esse seja o “casamento quali-quanti” como destaca Sampieri, Collado &
Lucio (2003, p.12).
Neste sentido o percurso metodológico, constrói-se não só através dos estudos
realizados para definir qual o melhor caminho a seguir e como efetuar um processo de
recolha e de tratamento dos dados coerente com as características do objeto de pesquisa
e do problema de investigação, como também, representa todas as dúvidas, dilemas e
inseguranças que acompanham o pesquisador ao longo de uma investigação. Ao
contrário do que seria desejável as dúvidas e as inseguranças tendem a estar sempre
presentes justamente porque existem muitas opções e recursos, por vezes contraditórios,
para serem mobilizados. O ponto central é saber o que utilizar e como utilizar para se
construir um desenho de investigação singular e próprio de um certo percurso
metodológico.
Sendo assim, os dilemas, as dúvidas, inseguranças e inquietações são
componentes tão legítimas do percurso metodológico, como o grande esquema
18

funcional construído para desdobrar o problema de investigação e os possíveis fatores


da causa-problema estudados.
A cada fase do percurso metodológico, não só podemos melhor nos apropriar do
que cada método (quantitativo ou qualitativo) poderá nos fornecer em termos de suporte
científico, como torna possível ampliar a capacidade de “ver” com lentes mais refinadas
as reais características da realidade social estudada.

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