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JORGE RIBAS DA CRUZ NETO

UTILIZAÇÃO DE TESTES ALÉRGICOS COMO AUXÍLIO DIAGNÓSTICO EM


DERMATITE ATÓPICA CANINA

Curitiba/PR
2021
JORGE RIBAS DA CRUZ NETO

UTILIZAÇÃO DE TESTES ALÉRGICOS COMO AUXÍLIO DIAGNÓSTICO EM


DERMATITE ATÓPICA CANINA

Monografia apresentada como requisito para


Conclusão do Curso de Pós-graduação em Clínica
Médica e Cirúrgica de Pequenos Animais da
Faculdade Qualittas.
Orientador: Prof. Dr. Welington Hartmann

Curitiba/PR
2021
Autorizo a reprodução parcial ou total desta obra, para fins acadêmicos, desde que citada a fonte.
“Fazer todo o bem que possa, amar sobretudo a liberdade, e jamais renegar a verdade”
Ludwig van Beethoven
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................... 5
2 REVISÃO DE LITERATURA ............................................................... 7
2.1 ETIOPATOGENIA ................................................................................ 8
2.2 SINAIS CLÍNICOS ................................................................................ 10
2.3 FISIOPATOLOGIA ............................................................................... 11
2.3.1 Imunoglobulinas ................................................................................... 12
2.4 ATUAÇÃO DOS LINFÓCITOS NO PROCESSO DO PRURIDO ......... 13
2.5 ALÉRGENOS NO CONTEXTO DA MEDICINA VETERINÁRIA .......... 14
2.6 DIAGNÓSTICO .................................................................................... 14
2.7 TESTES CUTÂNEOS ........................................................................... 15
2.8 TESTES UTILIZADOS NA CLÍNICA MÉDICA ..................................... 17
2.8.1 Teste de escarificação ......................................................................... 17
2.8.2 Teste de puntura ou skin track test ...................................................... 17
2.8.3 Teste de autossoro (TAS) .................................................................... 18
2.8.4 Teste de contato (TC) ........................................................................... 18
2.9 TERAPÊUTICA .................................................................................... 19
3 RELATO DE CASO ............................................................................. 28
4 RESULTADOS ..................................................................................... 32
5 DISCUSSÃO ........................................................................................ 33
6 CONCLUSÃO ...................................................................................... 34
REFERÊNCIAS ................................................................................................. 35

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LISTA DE ABREVIATURAS

AA Ácido araquidônico
DAC Dermatite atópica canina
DAPP Dermatite alérgica a picada de pulgas
ELISA Teste de imunoabsorção ligado a enzimas
EPA Ácido eicosapentanóico
GLA Ácido gamalinolênico
IL Interleucina
LA Ácido linoleico
TAS Teste com autossoro
TC Teste cutâneo

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1. INTRODUÇÃO

Dermatite Atópica Canina (DAC) é uma doença comum na clínica de pequenos


animais e afeta negativamente os indivíduos em função do seu caráter crônico, da
qualidade de vida dos cães afetados e da preocupação de seus tutores. É uma
dermatopatia prurítica, inflamatória e crônica, com uma predisposição genética, afetando
entre 10 e 30% da população canina (CARLOTTI, 2012). É uma doença geneticamente
programada em cães, que se tornam sensíveis a antígenos ambientais, sendo esses:
ácaros de poeira doméstica, esporos de fungos, pólen de vegetais, escamas de outros
animais e partes de insetos. Resulta na perda da função de barreira física tegumentária
e no aumento da imunorreatividade. Estima-se que aproximadamente 80% dos cães com
DAC têm aumento dos níveis de imunoglobulina específica de anticorpos E (IgE),
principalmente como resposta aos alérgenos ambientais, microbianos e alimentares
(PUCHEU-HASTON et al., 2015). É considerada de caráter multifatorial, pois implica uma
reação de hipersensibilidade do tipo I a alérgenos ambientais, uma barreira cutânea
débil, maior propensão para infecções secundárias bacterianas e, ou, fúngicas, entre
outros fatores (PRÉLAUD, 2014).
Ácaros domiciliares são considerados as principais fontes de alérgenos e a
comprovação dessa associação se faz necessária para que medidas preventivas e
terapêuticas possam ser indicadas. O presente trabalho contém uma revisão de literatura
sobre dermatite atópica canina e um relato de caso ocorrido em uma fêmea da raça
Schitzu não castrada com 9 anos de idade que apresentava atopia.
É uma doença de pele de caráter genético e inflamatório, e o paciente se torna
sensibilizado a antígenos ambientais mediante a formação de anticorpos IgE, que
causam afecção alérgica pruriginosa. A atopia canina é o segundo distúrbio cutâneo
alérgico mais comum, sendo menos freqüente apenas que a dermatite alérgica à picada
de pulgas.
Algumas raças são mais predispostas, como Shar Pei, West Highland White
Terrier, Scoth Terrier, Lhasa Apso, Shih Tzu, Fox Terrier de Pêlo de Arame, Dálmata,
Pug, Setter Irlandês, Boston Terrier, Golden Retriever, Boxer, Setter Inglês, Labrador,
Schnauzer Miniatura, Pastor Belga e Buldog Inglês. Outras raças são citadas com menor

5
freqüência: Pastor Alemão, Cocker Spaniel, Dachshund, Doberman e Poodle Gigante
(GRIFFIN e DEBOER, 2001). A DAC também pode acometer cães mestiços (WHITE,
1998).
A deposição da lâmina lipídica do estrato córneo na pele de cães atópicos
mostrou-se marcadamente heterogênea comparada com a pele de cães normais. Olivry
et al. (2001) realizaram um trabalho por meio do qual compararam a pele de cães
atópicos com a de cães normais, utilizando microscopia eletrônica, e demonstraram as
diferenças estruturais dos lipídeos presentes no estrato córneo nestes dois grupos.
Os testes alérgicos são úteis para identificar a hipersensibilidade mediada por IgE
e para selecionar alérgenos para imunoterapia específica alergênica em cães com DAC.
É extremamente importante estabelecer o perfil de sensibilidade do paciente antes de
iniciar o tratamento (OLIVRY et al., 2005). Cunha et al. (2012) descreveram a presença
de anticorpos contra ácaros domésticos, como Dermatophagoides farinae e Blomia
tropicalis em amostras de soro de cães portadores de DAC no Rio de Janeiro.

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2. REVISÃO DA LITERATURA

Segundo Soldera (2015), Dermatite Atópica Canina (DAC) é uma doença alérgica
caracterizada clinicamente por eritema e prurido cutâneo e que, normalmente, predispõe
animais afetados a infecções cutâneas secundárias causadas por bactérias e leveduras.
Na maioria das vezes, quantidades elevadas de anticorpos da classe das IgE alérgeno-
específicas podem ser demonstradas através de sorologia. É considerada de caráter
multifatorial, pois implica uma reação de hipersensibilidade do tipo I a alérgenos
ambientais, uma barreira cutânea débil, maior propensão para infecções secundárias
bacterianas e ou fúngicas, entre outros fatores (NUTTALL, 2008).
A dermatite atópica canina é uma dermatite pruriginosa inflamatória comum, que
se caracteriza pela produção excessiva de imunoglobulinas IgE específicas contra
alérgenos ambientais (HALLIWELL, 2006). Os principais alérgenos ambientais
envolvidos na patogênese da DAC são o pó doméstico e os antígenos de ácaros; pólens
de gramas, árvores e ervas; esporos; antígenos epidérmicos e antígenos dos insetos.
Ácaros de poeira presentes nos domicílios, particularmente Dermatophagoides farinae e
D. pteronyssinus (da família Pyrogliphidae), são os principais alérgenos responsáveis
pela hipersensibilidade imediata em cães, afetando 30 a 100% dos cães com DAC
(RANDALL et al., 2003). Os ácaros da família Glycyphagidae, particularmente Blomia
tropicalis, são frequentemente encontrados em casas de áreas tropicais e subtropicais e
são frequentemente espécies de ácaro encontradas em poeira domiciliar (BINOTTI et
al., 2001).
A idade em que os sinais clínicos se iniciam varia de seis meses a sete anos
(OLIVRY et al., 2010). Cerca de 70% dos cães desenvolvem a doença entre um e três
anos de idade (SCOTT, MILLER e GRIFFIN, 2001).
De acordo com Dethioux (2006) essa doença é considerada uma síndrome
complexa e sua etiopatogênese ainda é mal compreendida. Diversas células
inflamatórias participam da resposta imune, sendo consideradas mais importantes: (1)
as células de Langherhans e células dendríticas dermais, ambas responsáveis pela
apresentação e processamento de antígenos; (2) linfócitos-B, responsáveis pela
produção de citocinas levando a ativação de células-B e outras células inflamatórias; (3)

7
mastócitos, responsáveis pela produção e liberação de mediadores inflamatórios
(SOLDERA, 2015).
Segundo Zanon et al. (2008), o diagnóstico da DAC poderá ser firmado com base
na história, em sinais clínicos e na eliminação laboratorial de alguns diferenciais.
Entretanto, o diagnóstico e a revelação dos alérgenos envolvidos só poderão ser
conseguidos mediante o teste cutâneo intradérmico.
As principais fontes de alérgenos envolvidas na DAC são: ácaros da poeira
domiciliar, ácaros de produtos armazenados, pólens de gramíneas, árvores e arbustos;
esporos de fungos; bolores, debris da epiderme humana, sementes de gramíneas, penas
e outros antígenos epidermais e de insetos (WILLEMSE, 2002).
O diagnóstico é baseado no histórico e na apresentação clínica e posteriormente
por testes intradérmicos ou testes sorológicos, tais como testes de imunoabsorção ligado
a enzimas (ELISA) e o teste de radioalergoabsorção, os quais demonstram níveis
aumentados de IgE alérgeno-específico. A identificação dos alérgenos responsáveis
pela doença é extremamente importante, pois permite que medidas terapêuticas e
preventivas possam ser introduzidas (SOLDERA, 2015).

2.1 - ETIOPATOGENIA

Quando em fase aguda da doença, a falha da barreira cutânea facilita a entrada


de alérgenos ambientais e microbianos. Ao adentrarem a barreira cutânea estes
alérgenos serão fagocitados pelas células de Langherans que irão transportá-los até o
linfonodo regional. A partir daí serão apresentadas aos linfócitos T que irão apresentá-
las aos linfócitos B que por sua vez, irão produzir imunoglobulinas do tipo E (IgE)
alérgenos-específicas que irão se ligar aos mastócitos e basófilos teciduais resultando
na degranulação destes mastócitos e consequente liberação de mediadores
inflamatórios como histamina, proteases, quimiocinas e citocinas, essa reação é
chamada imediata e classificada como uma hipersensibilidade do tipo I (OLIVRY et al.,
2010).
A hipersensibilidade é caracterizada por reações provenientes de resposta imune
protetora, porém exagerada e deletéria, contra determinado antígeno (OLIVRY et al.,
2001). Os distúrbios da hipersensibilidade clínica são divididos em quatro tipos (I, II, III e

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IV), de acordo com a base imunológica. As reações do tipo I são aquelas que envolvem
predisposição genética, produção de anticorpos reagentes, além da degranulação de
mastócitos. São reações que geralmente se iniciam após o segundo contato com o
antígeno, sendo também chamadas de reações imediatas, e são mediadas
principalmente pela IgE. Uma vez feito o contato com o alérgeno, as células de
Langerhans entram em contato com este e os linfócitos T auxiliares são requisitados
para fazerem a apresentação do antígeno aos linfócitos B. Estes produzem anticorpos
IgE alérgenoespecíficos e células de memória. Os anticorpos IgE se ligam aos
mastócitos e basófilos teciduais, o que resulta em degranulação dos mastócitos e
liberação de mediadores inflamatórios pré-formados, além da estimulação da cascata do
ácido araquidônico. Esses mediadores pré-formados são: histamina, heparina,
serotonina, cininogenase, proteases neutras, fator quimiotático eosinofílico da anafilaxia,
fator quimiotático do neutrófilo, fator ativador das plaquetas (DEBOER, 2004) e todos os
derivados do ácido araquidônico.
Este último é ativado por uma entre duas vias, a lipoxigenase, que leva à formação
de leucotrienos, ou a cicloxigenase, que leva à formação de prostaglandinas. Os
leucotrienos e a histamina aumentam a permeabilidade vascular e induzem a contração
da musculatura lisa. Assim, ocorre resposta bifásica iniciada tanto por mediadores
solúveis quanto por células inflamatórias. A combinação dos mediadores inflamatórios
pré-formados e derivados do ácido araquidônico resulta no desenvolvimento dos sinais
de inflamação, como eritema, edema e prurido. Contudo, clinicamente não está bem
estabelecido qual é o mediador mais relevante em relação à manifestação dos sinais da
DAC em cães (MARSELLA e OLIVRY, 2001).
Quando se compara cães atópicos a cães normais, verifica-se que há uma
“superexpressão” da interleucina (IL) – 4 nos primeiros (MARSELLA, 2006). Algumas
áreas da pele apresentam maior predileção para manifestação dos sinais de atopia, são
elas: pavilhões auriculares e membros. Nelas, a concentração de mastócitos é maior
(AUXILIA e HILL, 2000).
A DAC pode ser classificada como uma doença que se inicia através da reação
do sistema imunológico do paciente e segue com influências externas pela atuação de
alérgenos irritantes, bactérias e fungos que levam à piora dos sintomas (HNILICA, 2012).
As influências intrínsecas estão associadas a alterações genéticas destes animais e de

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seu sistema imunológico, visto a reação exacerbada deste frente a estes alérgenos
inalados, ingeridos ou penetrados via transepidérmica. Os fatores externos aparecem
como oportunistas, aproveitando-se da falha da barreira lipídica cutânea e
estabelecendo infecções secundárias (DEBOER, 2017).
Esta teoria do envolvimento “interno-externo” levou o conhecimento da dermatite
atópica a um novo patamar, desta forma foi possível perceber novidades em sua
fisiopatogenia que permitiu reconhecer, por exemplo, que a DAC nem sempre é mediada
com IgE e que outros mecanismos podem estar envolvidos pelo menos em alguns
pacientes isolados (OLIVRY et al., 2010).
Alguns mecanismos envolvidos na patogenia da doença são: a diminuição da
função da barreira epidérmica, que resulta em aumento da permeabilidade da pele
facilitando a entrada de alérgenos e outros irritantes; a baixa produção de peptídeos
antimicrobianos pelas células epidérmicas com aumento da propensão desses animais
a infecções cutâneas e o aumento da resposta inflamatória frente a substâncias
secretadas por microrganismos, como as exotoxinas estafilocócicas. Além disso, a
importância da atenção às condições ambientais, visto que estas podem afetar e
modificar o desenvolvimento da alergia e a resposta de um indivíduo geneticamente
predisposto (OLIVRY et al., 2010).

2.2 – SINAIS CLÍNICOS

O principal sinal demonstrado pelos cães com a dermatite atópica é o prurido em


áreas sem lesão visível, este leva a lesões cutâneas causadas pelo traumatismo
autoinduzido e também ao espessamento da camada córnea (hiperqueratose) por conta
da fricção infecção e processo inflamatório crônico. As áreas mais comumente
acometidas são os espaços interdigitais, face, região periocular, região inguinal, axilas,
virilhas e os pavilhões auriculares (CERDEIRO et al., 2021).
Nos animais acometidos os sinais podem variar de nenhum sinal aparente a
hipotricose, descoloração salivar, eritema, hiperpigmentação, liquenificação, presença
de colaretes epidérmicos, pápulas, crostas e alopecia. Em muitos casos há o
aparecimento de otite externa, sendo esta recorrente e muitas vezes crônica. Existem
sinais incomuns, porém, observados em alguns casos de dermatite atópica canina,

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sendo estes a conjuntivite com blefarite secundária e em cadelas pode haver
apresentação de estro irregular (CERDEIRO et al., 2021).
As manifestações iniciais contribuem para o desenvolvimento de infecções e
podem originar lesões secundárias como alopecia focal ou difusa, pústulas, máculas,
edema, liquenificação, hiperpigmentação e em animais de pelame claro pode ocorrer
discromia ferruginosa devido à lambedura excessiva. As lesões crônicas são observadas
principalmente nos locais onde há prurido intenso e repetido (SCOTT; MILLER;
GRIFFIN, 2001).
Diferente dos outros cães, o Buldog Inglês atópico quase sempre apresenta
eritema, edema e lesões cutâneas secundárias, mas pouco ou nenhum prurido. A otite
externa e o prurido do pavilhão auricular ocorrem em aproximadamente 86% dos
pacientes (GRIFFIN e DEBOER, 2001). Conjuntivite, epífora e blefaroespasmo podem
estar presentes em 50% dos casos (OLIVRY e HILL, 2001a). Seborréia acentuada é
observada em 12 a 23% dos cães atópicos (GRIFFIN e DEBOER, 2001).
A piodermite estafilocócica acomete em torno de 68% dos cães atópicos.
Geralmente é superficial, mas pode ser profundo em alguns casos (HILLIER, 2002).
Alguns cães atópicos desenvolvem sinais não cutâneos, como rinite, catarata, asma
(OLIVRY e HILL, 2001b), ceratoconjuntivite seca, distúrbios urinários, gastrointestinais e
hipersensibilidade hormonal. Cadelas podem apresentar ciclos estrais irregulares, taxa
de concepção diminuída e incidência elevada de pseudociese (DEBOER, 2004).

2.3 - FISIOPATOLOGIA

A patogênese da Dermatite Atópica Canina é extremamente complicada, uma vez


que envolve fatores genéticos, diversas células inflamatórias, inúmeros mediadores
inflamatórios, uma barreira cutânea deficiente, e provavelmente uma ação bacteriana
(DETHIOUX, 2006). A atopia é uma reação de hipersensibilidade do tipo I, que é mediada
principalmente pela IgE. As reações do tipo I são aquelas que envolvem predisposição
genética, produção de anticorpos reagentes, além da degranulação de mastócito. São
reações que geralmente se iniciam após o segundo contato com o antígeno, sendo
também chamadas de reações imediatas (SCOTT, MILLER e GRIFFIN, 2001).

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Os antígenos absorvidos por via percutânea encontram-se com IgE nas células
de Langerhans, os quais são capturados, processados e apresentados aos linfócitos T
alérgeno específicos. Há uma consequente expansão preferencial de células T helper2
culminando em produção aumentada de IgE pelos linfócitos B. A IgE interage com
mastócitos e basófilos através dos receptores específicos. A expansão subsequente ao
alérgeno forma ligações cruzadas com duas moléculas de IgE induzindo degranulação
e liberação ou produção de mediadores que produzem reações alérgicas, histamina,
leucotrienos e citosinas (WILLENSE, 2002).
Há evidências de que defeitos genéticos primários na barreira epidérmica podem
ser determinantes no desenvolvimento da dermatite atópica. A IgE se distribui pela
superfície das células dendríticas e de mastócitos, originando a formação do complexo
antígeno-anticorpo, o realce da capacitação e da apresentação antigênica e a
degranulação mastocitária, o que conduz à amplificação da resposta imune, da
inflamação e do prurido associado a dermatite atópica (SCOTT et al., 2001).
A via epicutânea é a principal via de penetração dos alérgenos na pele, além de
ser a principal responsável pelos escores clínicos e pela persistência do prurido e dos
sintomas lesionais em cães com DAC (DETHIOUX, 2006).

2.3.1 – Imunoglobulinas

São proteínas produzidas por linfócitos B com várias subunidades que atuam na
imunidade, compostas de duas cadeias pesadas e duas cadeias leves, incluindo formas
monoméricas ou poliméricas, e formas transmembranosas (receptores de antígenos de
células B) ou secretadas (anticorpos). São classificadas de acordo com a seqüência de
aminoácidos de suas cadeias pesadas em cinco classes: IgA, IgD, IgE, IgG e IgM, e
subclasses. IgG e IgM são normalmente encontradas no soro em maiores
concentrações, IgA é a mais encontrada em secreções, como saliva, leite e fluido
intestinal. A IgD é um receptor de antígeno dos linfócitos B, portanto raramente
encontrada em fluidos corpóreos; e a IgE é encontrada em baixíssimas concentrações
no soro, e está presente nas reações alérgicas (HARTMANN, 2021).
IgE também é produzida por plasmócitos localizados abaixo da superfície
corporal, como a IgA. Quando o antígeno se liga à IgE, uma rápida liberação de

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moléculas inflamatórias pelos mastócitos é desencadeada. A inflamação aguda
resultante aumenta as defesas locais e ajuda a eliminar o invasor. Apresenta meia-vida
curta, de 2 a 3 dias (HARTMANN, 2021).

2.4 – ATUAÇÃO DOS LINFÓCITOS NO PROCESSO DE PRURIDO

Os linfócitos T CD4+, também chamados de auxiliares (Helper), quando ativados


secretam citocinas que promovem o crescimento, diferenciação e funções de linfócitos
B, macrófagos e outras células. Dois subgrupos desses linfócitos podem ser definidos
pelo tipo de citocinas que secretam: Th1 (T helper 1) e Th2 (T helper 2). No entanto,
antes de se tornarem Th1 ou Th2, esses linfócitos T estão em estado de quiescência, ou
seja, em repouso, sendo denominados Th naive ou virgens (VAZ et al., 2007).
Até esse momento o único papel deles é produzir interleucina 2 (IL-2) e expressar
receptores para a mesma. O principal efeito da IL-2 é autócrino, ou seja, age na própria
célula que a está secretando. Depois de um estímulo mínimo as Th naive passam para
a circulação, passando a designar-se Th0 (zero).
Quando ocorre um estímulo mais acentuado acontece a diferenciação do Th0 em
Th1 ou Th2. Quando o agente indutor de Th0 é a IL-12, dá origem a Th1. E quando o
agente é a IL-4, forma-se Th2.
A diferenciação entre Th1 e Th2 é:
- As Th1 produzem citocinas relacionadas principalmente com a defesa mediada por
fagocitose contra agentes infecciosos intracelulares, como Interferon-gama (INF-γ), IL-
2 e Fator de Necrose Tumoral alfa (TNF-α).
- As Th2 secretam IL-4, IL-5, IL-10 e IL-13, relacionadas com a produção de anticorpos
IgE e reações imunes mediadas por eosinófilos e mastócitos contra alérgenos e
helmintos.
Após a ativação destas duas subpopulações, Th1 e Th2 influenciam-se mutuamente
e de forma antagônica: Th1 produz INF-γ que inibe as células Th2; Th2 produz IL-10 que
inibe as células Th1. E assim, a atividade dessas células fica controlada e o sistema
imune em equilíbrio (ABBAS, 2015).

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2.5 – ALÉRGENOS PRESENTES NA MEDICINA VETERINÁRIA

- Ácaros: os ácaros são insetos pertencentes à subclasse dos Aracnídeos, ordem


acarina, sendo a família Piroglifidea a mais importante da poeira domiciliar. Na família
Tyroglifidea são encontrados os ácaros de estocagem que contaminam os grãos nos
silos.
- Fungos: os fungos alergênicos mais importantes pertencem à classe dos
Deuteromicetos ou fungos imperfeitos, com duas espécies importantes: Ascomicetos e
Basomicetos. Essa classificação é baseada em aspectos macro e microscópicos dos
esporos, hifas e micélios, podendo não refletir as propriedades bioquímicas e
imunoquímicas dos fungos que são importantes nos eventos da clínica de alergia.

2.6 - DIAGNÓSTICO

O diagnóstico da DAC baseia-se no histórico do paciente, exame físico e o


descarte de demais dermatopatias pruriginosas e alérgicas. Testes intradérmicos podem
ser utilizados para a identificação do agente etiológico que desencadeia a reação de
hipersensibilidade, porém, este teste pode ser altamente variável dependendo do
método utilizado, ocorrendo várias reações falso-negativas e falso positivas. As
dermatopatias que devem ser eliminadas para diagnosticar a DAC são hipersensibilidade
à picada de pulgas (DAPP), hipersensibilidade alimentar e outras dermatites como a de
contato. Deve-se eliminar também as infecções oportunistas como as causadas por
bactérias e fungos que podem confundir o diagnóstico definitivo (HNILICA, 2012).
O diagnóstico definitivo da dermatite atópica geralmente não é dado na primeira
consulta. Realizar raspado cutâneo (deve ser feito de vários lugares para as espécies do
gênero Demodex) e exame micológico (direto e cultura) são imperativos para qualquer
paciente portador de dermatopatia, salvo exceções, como nos casos de neoplasia
cutânea. Em uma etapa posterior, realizar triagem terapêutica com uso, por exemplo, de
anti-histamínicos ou corticóides, torna-se um dos pontos principais para se confirmar ou
excluir alguns dos diagnósticos diferenciais (HILLIER, 2002). Devem-se obter amostras

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da superfície da pele em mais de um local acometido, por meio de “imprint”, para
realização de exame citológico (HILLIER, 2002). Fazer swab de pústulas para a cultura
bacteriana se houver uma resposta inapropriada a antibioticoterapia. O exame citológico,
bem como a cultura bacteriana das orelhas acometidas também é indicado (HILLIER,
2002).

2.7 - TESTES CUTÂNEOS

A prevalência de doenças respiratórias alérgicas, como é o caso da asma e da


rinite, tem aumentado significativamente nas últimas décadas, tornando-se uma grande
preocupação médica. As principais causas no aumento dessas doenças derivam-se de
fatores ambientais, como poluição do ar e diminuição da exposição a estímulos
microbiológicos, além de mudanças nos hábitos alimentares (DETHIOUX, 2006).
A alergia, por sua vez, é uma reação imunológica exagerada a proteínas, que
constituem alérgenos, em especial aos aeroalérgenos (ácaros, plantas, fungos, pelos de
animais). Além desses, outros fatores podem ser responsáveis pelo desenvolvimento de
alergia (fatores genéticos e idade média de exposição a alérgenos) (SOLDERA, 2015).
Para confirmação da presença de alergia, os procedimentos diagnósticos mais
comuns são o teste da imunoglobulina E (IgE) específica e o teste cutâneo (TC). O TC é
o método mais utilizado na área clínica para investigação de sintomas alérgicos, sendo
considerado o teste padrão na avaliação de sensibilização a alérgenos, por ser rápido,
simples e bastante acessível. Sua principal desvantagem é a falta de padronização, pois
o resultado depende dos tipos de extratos utilizados e da experiência do profissional
responsável pela análise. Além disso, sua especificidade varia de acordo com a condição
alérgica do paciente (CERDEIRO et al., 2021).
A relação entre os resultados do TC e da doença alérgica é interpretado pela
história clínica do paciente. A seleção dos alérgenos deve ser feita com base em
sintomas do paciente, exposições ambientais, situação ocupacional e idade. Além disso,
a história clínica do paciente deve ser considerada na interpretação do teste de alergia.
A determinação dos alérgenos mais comuns e a relação entre os resultados do
TC com as doenças alérgicas em cada área desempenha um papel importante no

15
diagnóstico e tratamento de doenças alérgicas, como no caso da imunoterapia
(DETHIOUX, 2006).
O teste cutâneo é um método amplamente utilizado na área clínica para análise
da sensibilização a determinados antígenos, auxiliando no diagnóstico de asma ou rinite
alérgica. O surgimento de pápula representa uma reação em que há presença do
anticorpo IgE específico em relação ao alérgeno testado. No entanto, para ser
considerado positivo, deve-se aplicar em conjunto o controle negativo (solução salina) e
o controle positivo (histamina), considerando positivo o resultado cujo diâmetro da pápula
for igual ou maior a três milímetros em relação ao controle positivo. O significado do teste
positivo relaciona-se a uma sensibilização e não necessariamente à alergia, sendo
necessária uma correlação clínica para comprovação da doença alérgica.
O teste cutâneo apresenta valores positivos entre 10 e 15% de pacientes
assintomáticos, que porventura podem vir a apresentar sintomas da doença alérgica com
o passar dos anos. A principal vantagem do teste cutâneo é a praticidade e rapidez do
resultado, que é dado entre 30 e 40 minutos, além de possuir baixa incidência de efeitos
adversos e baixo custo (ZANON et al, 2008).
Em estudos clínicos, além de servir como fator de identificação a sensibilizações,
serve como avaliação da resposta a tratamentos para atopia, como a imunoterapia, e em
programas de educação em doenças alérgicas, fazendo com que o paciente visualize a
resposta alérgica, reforçando a informação verbal e ajudando na avaliação da causa-
efeito da alergia (SOLDERA et al., 2015).
Contudo, no que se refere ao teste cutâneo, o principal desafio para o diagnóstico
preciso vai além da aplicação, em virtude de a sensibilização variar de indivíduo para
indivíduo.
Inúmeros são os reagentes específicos testados mundialmente, não havendo um
consenso sobre quais são os principais alérgenos que devam ser aplicados nos
diagnósticos de asma e rinite alérgica, dificultando a escolha dos reagentes mais
adequados para a aplicação
Desde o reconhecimento de várias comorbidades, como por exemplo a dermatite
de contato, a urticária de contato, a rinite, a asma, a anafilaxia e outras que podem ser
causadas por exposição a certas substâncias orgânicas de origem proteica ou
inorgânica, passou-se a estabelecer práticas de reexposição às citadas substâncias

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como meio auxiliar no diagnóstico dessas doenças. Os testes cutâneos usados na
alergia clínica constituem uma ferramenta auxiliar importante no diagnóstico das
doenças alérgicas (DETHIOUX, 2006).
Os testes cutâneos podem ser úteis como meio de confirmação diagnóstica nos
vários tipos de alergias, os testes ideais devem ser rápidos de fácil execução de baixo
custo e boa sensibilidade e especificidade. No entanto, podem produzir resultados falso
positivos ou falso negativos. Um teste alérgico positivo não significa, necessariamente,
a presença de doença alérgica, visto que pacientes não alérgicos podem ter testes
positivos, do mesmo modo que um teste negativo não exclui uma etiologia alérgica, deste
modo os testes cutâneos devem sempre estar relacionados com a história clínica, o
exame físico e se a exposição a determinados agentes suspeitos podem ser fatores
desencadeantes de doenças alérgicas (SOLDERA, 2015).

2.8 – TESTES UTILIZADOS NA CLÍNICA MÉDICA


A título de esclarecimento citamos o teste de escarificação, porém não é mais
utilizado. Os testes recomendados são: teste de puntura, teste com autossoro e teste de
contato.

2.8.1 – Teste de escarificação

Este tipo de teste não é mais usado na clínica atual, pois tem uma especificidade
muito baixa além de causar sangramentos locais frequentes. É 500 vezes menos
sensível do que os testes intradérmicos e 50 a 60 vezes menos sensível que os testes
de puntura (prick-test). Está mais frequentemente associado a reações falso-positivas do
que os teste de puntura e intradérmico, uma vez que causa maior trauma cutâneo local,
não estando recomendado na rotina diagnóstica ou em trabalhos científicos.

2.8.2 – Teste de puntura (ou prick test ou skin prick test)

O teste de puntura é o mais utilizado na prática clínica diária dos especialistas e


sofreu algumas modificações desde a sua introdução em 1924.

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Na realidade o que ocorreu nos últimos 60 anos foi a melhoria de qualidade dos
extratos alergênicos. Entre 1970 e 1980 passou-se a utilizar e aperfeiçoar métodos in
vitro para a determinação de IgE específica e nesta década foram publicados trabalhos
enfocando principalmente análises comparativas entre estes métodos novos (in vitro) e
os testes cutâneos (in vivo) e a partir daí os testes cutâneos começaram a ser
reabilitados.
O prick- test é o mais seguro e de fácil execução, tem boa reprodutibilidade e é
considerado o melhor para uso na prática clínica da alergia. Na rotina é aconselhável
que seja realizado em duplicata a fim de diminuir os resultados falso-negativos. Durante
a realização de protocolos científicos, recomenda-se seu uso em quadruplicata.
Em estudos conduzidos por Cerdeiro et al. (2021) o teste de puntura foi mais
eficaz na identificação da sensibilização do pólen de gramíneas em cães com dermatite
atópica do que no teste intradérmico da pele. A sensibilização para o pólen de gramíneas
ocorreu em cerca de um quarto dos indivíduos e foi mais comum a Cynodon dactylon e
Lolium multiflorum através do teste de puntura.

2.8.3 – Teste com autossoro (TAS)

É usado na prática de investigação de urticárias crônicas ou doenças autoimunes,


e pode ser usado com um razoável valor preditivo, quando positivo indica a presença de
autoanticorpos funcionais circulantes contra o receptor de IgE.

2.8.4 – Teste de contato (TC)

Esse teste é usado para detectar e definir possíveis agentes químicos exógenos
que podem ser a causa da dermatite alérgica de contato. Tais agentes químicos podem
causar dermatite por mecanismos imunológicos. O TC é uma exposição experimental
feita em condições especiais, limitada local e temporalmente. Mediante este teste há
possibilidade de comprovar a sensibilização da pele de um paciente a determinada
substância. Recomenda-se sua utilização quando há suspeita de dermatite de contato,
nos eczemas crônicos recorrentes ou nas dermatites com liquenificação.

18
2.9 - TERAPÊUTICA

A terapia indicada baseia-se no tratamento das sintomatologias, controle


sistêmico do prurido e eliminação das infecções secundárias. Outro fator importante é a
realização de um controle de ectoparasitos, visto que, em parte dos animais acometidos
pode haver dermatite alérgica a picada de pulgas (DAPP) concomitante a Dermatite
Atópica (HNILICA, 2012).
O tratamento dos cães afetados por DAC baseia-se em tentativas de restabelecer
a barreira cutânea através da reidratação e, além disso, reduzir a inflamação e o prurido.
Neste sentido, são atualmente utilizados corticosteróides e outras drogas anti-
inflamatórias, imunomoduladoras e imunossupressoras. Para reduzir o uso de todos
esses fármacos, a imunoterapia específica alergênica pode ser adicionada à
programação terapêutica. O clínico deve esclarecer ao tutor que o tratamento é vitalício
e que as modificações terapêuticas são esperadas ao longo da vida do paciente (SCOTT;
MILLER; GRIFFIN, 2001).
A opção em relação à terapia irá variar de acordo com o resultado e tipo de testes
realizados. Quando há sinais de puliciose, trata-se contra pulgas adultas e em estágios
imaturos, presentes no meio ambiente. Todos os animais da casa devem ser tratados.
Na presença de piodermite, administrar antibióticos via oral e tópicos (se necessários),
xampus antibacterianos ou sprays. Na presença de fungos, a exemplo da malassezíase,
a terapia é constituída por antimicóticos tópicos e/ou via oral. A tentativa de se eliminar
o prurido na fase inicial de tratamento mediante o uso de anti-inflamatórios, não é
recomendada nas situações em que os fatores perpetuantes não tenham sido
identificados e eliminado (HILLIER, 2002). A eliminação dos efeitos somatórios e a
diminuição do limiar pruriginoso são pontos importantes a serem considerados no início
do tratamento. Terapias tópicas, dessensibilização, drogas antipruriginosas sistêmicas,
ácidos graxos, anti-histamínicos e ocasionalmente drogas imunossupressoras
constituem o arsenal terapêutico para o tratamento da DAC (SCOTT; MILLER; GRIFFIN,
2001). O uso de antibióticos na maioria das vezes constitui a primeira medida no
tratamento da DAC. A droga de escolha é a cefalexina, administrada por via oral na
dosagem de 22 mg/kg a cada oito horas ou 33 mg/kg a cada 12 horas (WHITE, 1998).

19
Quando se confirma a presença de malassezíase, antifúngicos (como o
cetoconazol, na dosagem de 10 mg/kg, via oral, a cada oito horas) são necessários como
parte coadjuvante do tratamento. Uma opção alternativa para o tratamento, porém, de
difícil execução é através do impedimento do animal à exposição ao alérgeno, sendo
possível em raros casos, isso porque a maioria dos pacientes reagem a vários tipos de
antígenos (HNILICA, 2012).
Não existe um protocolo de tratamento universal e o gerenciamento da DAC deve
ser adaptado ao caso individual com base na resposta à terapia, potencial de efeitos
adversos, conformidade do proprietário e custos de medicações (WERFELL et al., 2016).

- Retirada do alérgeno

Evitar o contato do paciente com os alérgenos é o ponto chave do tratamento


(MARSELLA, 2006). Esta etapa do tratamento depende da cooperação e compreensão
dos tutores, pois leva tempo e é trabalhosa. As medidas a serem adotadas são: cobrir
colchões, travesseiros, cama dos cães, cadeiras e sofás com tecidos impermeáveis
(como o vinil); manter o canil seco e limpo; assim como a cama do animal; manter o
estoque de comida do animal em ambiente seco; manter o animal longe de grama recém
cortada, folhas caídas, feno e celeiros; remover colchões das áreas em que o cão dorme
para prevenir o acúmulo de poeira e facilitar a limpeza; não permitir ao cão que entre em
áreas que tipicamente acumulam poeira, como armários, lavanderia e embaixo das
camas e lavar roupa de cama e cobertores toda semana com água quente (HILLIER,
2002).

- Terapia tópica

O tratamento tópico tem como objetivo a remoção dos alérgenos da pele. O uso
de agentes tópicos antipruriginosos é geralmente mais eficiente no tratamento de áreas
localizadas de prurido. Em geral, a maioria dos cães atópicos deve ser banhada a cada
uma ou duas semanas com xampus hipoalergênicos contendo aveia (SCOTT; MILLER;
GRIFFIN, 2001). Xampus antibacterianos e antisseborréicos também auxiliam no
tratamento de infecções e dermatite seborréica secundárias, respectivamente (WHITE,
1998).

20
- Anti-histamínicos

Os anti-histamínicos são freqüentemente recomendados para o tratamento


sintomático do prurido na dermatite atópica canina. Sua ação é a de inibir os efeitos
fisiológicos da histamina, bloqueando seus receptores. Desta forma, interferem na
liberação de mediadores inflamatórios, recrutamento de células inflamatórias,
permeabilidade vascular e conseqüentemente no prurido (DEBOER e GRIFFIN, 2001).
O efeito adverso mais comum está relacionado ao sistema nervoso central, como
letargia, depressão, sedação e sonolência. Efeitos gastrointestinais também podem
ocorrer como vômito, diarreia, anorexia e constipação. Entretanto, são incomuns e
podem ser amenizados com a administração do medicamento junto com a refeição
(SCOTT, MILLER e GRIFFIN, 2001).
Os anti-histamínicos mais utilizados na DAC são o maleato de clorfeniramina (0,2-
0,5 mg/kg), difenidramina (2,2 mg/kg), hidroxizine (2,2 mg/kg) e fumarato de clemastina
(0,05 - 0,1 mg/kg) (HILLIER, 2002). O efeito benéfico dessas drogas, quando usadas
isoladamente, ocorre entre 7 e 14 dias. Além disso, a resposta aos anti-histamínicos é
muito individualizada e pode ser ineficiente em pacientes com prurido intenso (GRIFFIN
e DEBOER, 2001).

- Ácidos graxos

O uso de ácidos graxos essenciais no tratamento do prurido crônico foi


amplamente estudado e seu efeito benéfico foi comprovado por vários autores. Os ácidos
graxos essenciais linolênico, alfa-linolênico, araquidônico e poliinsaturados ômega 3 e
ômega 6 são incorporados no interior de todas as membranas celulares (DEBOER,
2004). Eles são exigidos para todas as estruturas e funções da membrana celular, não
são sintetizados e, portanto, devem ser fornecidos na dieta (WHITE, 1998).
Teoricamente, cães com dermatite atópica canina são mais responsivos a
suplementos com ácidos graxos que contêm baixas doses de ácido linoléico (LA) e altas
doses de ácido γ-linolênico (GLA) e/ou ácido eicosapentaenóico (EPA). Estes,
incorporados à membrana celular competem com o ácido araquidônico (AA) pelas

21
enzimas cicloxigenase e lipoxigenase diminuindo, portanto, a produção de leucotrienos
e prostaglandinas, apresentando, portanto, ação antiinflamatória (DEBOER, 2004). Cães
com atopia exibem anormalidades nos lipídios que formam a proteção da epiderme,
levando à perda de água e hiperidrose (OLIVRY e HILL, 2001b). Desta forma, há
evidências de que a administração oral de altas doses de ômega 6 poderia melhorar os
sinais clínicos provocados por tal alteração. A suplementação de ácidos graxos na dieta
poderia, portanto, diminuir a perda de água pela pele, pois essas substâncias se
incorporam aos lipídeos intracelulares da epiderme (DEBOER, 2004). Assim, como a
perda de água está aumentada em cães atópicos, a suplementação oral com ácidos
graxos essenciais e a aplicação tópica de óleos podem levar à normalização da barreira
epidérmica (MARSELLA, 2006).
As dosagens indicadas são 40 mg/kg de ácido graxo ômega 3 e 60 a 138 mg/kg
de ácido graxo ômega 6, administrados por via oral uma vez ao dia (HILLIER, 2002).
Obtêm-se efeitos sinérgicos quando se utiliza ácidos graxos associados à anti-
histamínicos ou a glicocorticóides. O uso adequado dos agentes não esteróides pode
permitir que até 60% dos casos de DAC sejam satisfatoriamente tratados sem
glicocorticóides. Além disso, a associação de ácidos graxos permite freqüentemente
redução nas doses requeridas de glicocorticóides (WERFELL et al., 2016).
Alguns efeitos adversos após o uso prolongado de ácidos graxos ômega 3 podem
ocorrer, como um aumento no risco de sangramentos associado à disfunção plaquetária
e fibrinólise. A função plaquetária pode ser alterada pelos ácidos graxos ômega 3, pois
esses são incorporados à membrana das plaquetas. Além disso, o uso prolongado de
ômega 3 tem o potencial de induzir à peroxidação e à formação de lipofuscina no tecido.
O acúmulo de lipofuscina pode afetar a viabilidade e a função celular e o acúmulo de
ácidos graxos no tecido os deixa mais pré-disposto à peroxidação lipídica (SCOTT;
MILLER; GRIFFIN, 2001).

- Glicocorticóides

Os glicocorticóides sistêmicos são geralmente muito eficazes no tratamento da


DAC, entretanto, são consideradas as drogas potencialmente mais danosas dentre as
utilizadas, devido aos possíveis efeitos colaterais. Por essa razão, seu uso deve ser

22
limitado aos períodos ativos da doença com duração menor que 4 meses ou naqueles
em que os anti-histamínicos e a imunoterapia não foram eficazes (SCOTT; MILLER;
GRIFFIN, 2001).
Os glicocorticóides previnem a ativação de muitas células do sistema imune, como
linfócitos T, eosinófilos, células dendríticas e macrófagos, que estão envolvidas na
inflamação e na alergia. Também agem suprimindo produção de citocinas, como
interferon gama e interleucinas. A produção de anticorpos não é suspensa, apenas
diminuída. Em níveis farmacológicos, os glicocorticóides bloqueiam a ação da fosfolipase
A2 nas membranas celulares, o que resulta na inibição da cascata do ácido araquidônico,
produtor de potentes mediadores inflamatórios (SCOTT; MILLER; GRIFFIN, 2001).
A prednisona via oral é o glicocorticóide de escolha para o tratamento de DAC
(ALVES et al., 2018). O esquema terapêutico mais utilizado consiste em indução e
manutenção (SCOTT; MILLER; GRIFFIN, 2001). A dosagem de indução comumente
usada é de 1,1 mg/kg a cada 24 horas. Entretanto, nos quadros graves, usa-se a
dosagem de 1,75 a 2,0 mg/kg/dia. Geralmente essas dosagens são administradas
durante 3 a 10 dias, a cada 24 horas ou divididas a cada 12 horas durante 2 a 4 dias,
seguidas da dosagem total a cada 24 horas até o 10º dia. Mantém-se este esquema até
que os sinais da doença estejam controlados. Após, inicia-se o protocolo da terapia de
manutenção (SCOTT; MILLER; GRIFFIN, 2001), com o objetivo de se atingir valores
entre 0,25 e 0,5 mg/kg a cada 48 horas. Na terapia de manutenção a dosagem em dias
alternados sofre redução pela metade a cada 1 ou 2 semanas. Este esquema não diminui
alguns efeitos colaterais, como a hipotrofia adrenal, mas os torna menos graves e de
início tardio (SCOTT; MILLER; GRIFFIN, 2001).
Nos cães, os efeitos colaterais associados ao uso crônico de glicocorticóides
sistêmicos são muitos. Entre eles está a poliúria, polidipsia, alopecia, polifagia,
obesidade, infecções urinárias do trato inferior até efeitos mais graves como pancreatite,
ulceração e perfuração gastrintestinal e miopatias (SCOTT; MILLER; GRIFFIN, 2001).

23
– Ciclosporina

A ciclosporina é um metabólito polipeptídico cíclico lipossolúvel derivado do fungo


Tolypocladium inflantum (MARSELLA e OLIVRY, 2001). Na dermatologia canina, tem
sido objeto de crescente interesse para o tratamento da fístula perianal e dermatite
atópica. Em cães a ciclosporina é metabolizada pelo fígado e intestino. A ciclosporina
possui propriedades anti-inflamatórias inibindo a ativação de vários tipos celulares
envolvidos na inflamação da alergia cutânea (DEBOER, 2004). Também atua contra a
degranulação dos mastócitos, age diretamente na inibição da histamina (SCOTT;
MILLER; GRIFFIN, 2001), e bloqueia a proliferação de linfócitos T ativados pela inibição
da interleucina 2, ativação genética e transcrição do RNA mensageiro. Além disso,
bloqueia receptores de superfície de células T (SCOTT; MILLER; GRIFFIN, 2001).
É necessário tratamento por no mínimo 30 dias até se observar resposta clínica
(HILLIER, 2002). Um recente estudo foi desenvolvido sobre o uso da ciclosporina no
controle e tratamento da dermatite atópica canina, com 71% a 75% de taxa de satisfação
dos clientes. A administração oral de ciclosporina na dosagem de 5 mg/kg apresentou
eficácia similar à da predinisolona na dosagem de 0,5 mg/kg em um estudo de 6
semanas (MARSELLA, 2006).
Recomenda-se a administração da ciclosporina 2 horas antes ou após a
alimentação. Quando aplicada via percutânea, tem pobre penetração devido à presença
de muitos lipídeos solúveis. Em cães, os efeitos colaterais são incomuns e surgem
quando se usa a ciclosporina na dosagem de 5 a 10 mg/kg. Esses efeitos são:
nefrotoxicidade, hipertensão, hepatotoxicidade, hiperplasia gengival, periodontite,
papilomatose cutânea, vômito, diarréia, bacteriúria, infecção cutânea bacteriana,
anorexia, supressão da medula óssea e dermatose linfoplasmocitóide (SCOTT; MILLER;
GRIFFIN, 2001). Além disso, ela pode predispor ao desenvolvimento do linfoma
(MARSELLA, 2006).
O tratamento prolongado está associado a lesões irreversíveis do parênquima
renal quando se utiliza altas doses (30 mg/kg) de ciclosporina. Nesses casos verificou-
se redução do fluxo urinário e da excreção de sódio. Entretanto, em estudos toxicológicos
conduzidos em cães utilizando a ciclosoporina na dosagem de 45 mg/kg durante 52
semanas, não foram observados sinais de nefrotoxicidade em relação ao aspecto clínico

24
e histológico. Uma das vantagens dessa droga é que seu uso pode ser tópico, limitando
os riscos de efeitos colaterais sistêmicos. Em cães atópicos seu principal efeito é a
diminuição do eritema, contudo a diminuição do prurido não é significativa (MARSELLA
e OLIVRY, 2001).
O ungüento de tracolimus tem se demonstrado seguro e eficaz para o tratamento
da atopia em humanos (MARSELLA, 2006). Quando utilizado a 0,1% durante 4 semanas,
reduziu satisfatoriamente os sinais clínicos da atopia. Poucos estudos têm avaliado a
eficácia do tracolimus no tratamento da dermatite atópica canina (MARSELLA, 2006).
É uma droga com baixo peso molecular, que penetra prontamente na pele
inflamada, mas pobremente na epiderme normal, levando à hipótese de que quanto
menor a inflação da cútis, menor será a sua capacidade de penetração. A aplicação
tópica é bem tolerada em cães, podendo ocorrer discreta irritação no local. Toxicidade e
efeitos adversos não foram reportados, além de nenhuma mudança na contagem total
de células sanguíneas e parâmetros bioquímicos (MARSELLA, 2006).

– Pentoxifilina

Há relatos do uso de inibidores da fosfodiesterase, como a pentoxifilina 10 mg/kg


via oral, duas vezes ao dia (HILLIER, 2002), para o tratamento da DAC. Esta droga
possui propriedades imunomoduladoras e em cães é relatada a supressão da produção
de interferons (inibe as propriedades pró-inflamatórias das citocinas). O uso desta droga
o prurido e o eritema.
A pentoxifilina é bem tolerada e considerada segura para uso em animais. Efeitos
colaterais graves não foram relatados (MARSELLA e OLIVRY, 2001), sendo que os mais
comuns foram vômito e diarréia. Recomenda-se que ela não seja administrada junto com
alimentos.

- Maleato de oclacitinib

O maleato de oclacitinib é uma molécula lançada recentemente e foi aprovada em


vários países para tratamento e controle do prurido em pacientes com Dermatite Atópica
Canina, devendo ser utilizada em animais com idade acima de doze meses. Esta

25
molécula não possui classificação de corticosteróide e nem de anti-histamínico, por ser
uma molécula recém-descoberta, ainda não possui nenhum tipo de classificação. O
protocolo indicado para o tratamento da dermatite atópica com utilização do oclacitinib é
através de dois ciclos, sendo o primeiro com duas administrações diárias com intervalo
de 12 horas durante 14 dias e o segundo, diminuindo para uma aplicação diária, com
intervalo de 24 horas, durante 14 dias (MARTINS, 2018).

- Lokivetmab

Lokivetmab é um anticorpo monoclonal caninizado, ou seja, é desenvolvido em


por sequencias de IgG de cães. É comercializado sob a denominação de Cytopoint®.
Este anticorpo se liga a IL-31 do cão antes que essa se ligue ao seu receptor, evitando
assim os efeitos pruriginogênicos destas citocinas. É uma molécula muito segura, com
especificidade única, porém, não possui amplo efeito anti-alérgico. IL-31 constitui um
conjunto de isoleucinas secretadas pelos linfócitos Th2 após um desafio alergênico e
que induzem o prurido nas espécies mamíferas (SOUZA et al., 2018).

– Outras possibilidades terapêuticas

O misoprostol é uma prostaglandina análoga com potentes efeitos antialérgicos.


Essa droga, entre outras ações, inibe a proliferação dos linfócitos, a ativação
granulocítica e a síntese de citocinas próinflamatórias que participam do processo das
reações alérgicas. Efeitos adversos podem ocorrer em alguns pacientes, como por
exemplo, vômito e diarréia. Não se comprovou totalmente a eficácia deste medicamento
(MARSELLA e OLIVRY, 2001).
A fluoxetina é um inibidor da captação da serotonina (MARSELLA e OLIVRY,
2001) e é eficiente em cerca de 30% dos cães com prurido alérgico. As desvantagens
são os efeitos adversos como excitação, poliúria, polidipsia e letargia (HILLIER, 2002).
Ainda não há evidências conclusivas para o uso dessa droga no tratamento da DAC
(MARSELLA e OLIVRY, 2001).

26
3 - RELATO DE CASO

O presente trabalho se refere a uma fëmea canina de 9 anos,


ovariohisterectomizada, da raça Schitzu, que compareceu à clínica veterinária localizada
em Curitiba – PR com histórico de prurido intenso e intermitente, acompanhada por seus
tutores.

- Anamnese

Durante sua fase de filhote foi criada em domicílio, sem área externa. Os banhos
eram esporádicos e não havia controle de ectoparasitas. A alimentação consistia em
ração comercial. A partir dos 3 anos de idade houve troca de tutores e passou a conviver
com outros cães e receber alimentos cozidos, derivados da alimentação dos tutores.
Passou a ter controle mensal antipulgas (lufenuron), banhos quinzenais, vacinações e
vermífugos regularmente de acordo com as prescrições. Passaram a utilizar xampu
contendo fitoesfingosina para os banhos, devido à sua ação antipruriginosa.
Na continuidade, adotaram os seguintes procedimentos: controle de
ectoparasitas, banhos quinzenais e ração com hipoalergênicos composta por: carne de
cordeiro, fécula de mandioca, levedura de cerveja, óleo de vísceras de aves, óleo de
salmão, batata doce, frutas desidratadas, polpa de beterraba, semente de linhaça,
cloreto de sódio, algas Schizochytrium sp., zeolita, prebióticos, vitaminas (A, D3, E, K3,
C, B1, B2, B6, B12) minerais (sulfato de ferro, sulfato de cobre, iodato de cálcio, cloreto
de potássio, proteinato de zinco, óxido de zinco, óxido de manganês, proteinato de
selênio, selenito de sódio), lisina, metionina, taurina, ácido propiônico, aloe vera (0,01%),
extratos de chá verde e alecrim, cúrcuma e extrato de tocoferol.
Observando que o prurido era contínuo, os tutores procuraram assistência
veterinária.

27
Exame clínico

Comparecendo à clínica para a consulta, a paciente da raça Shi Tzu apresentava


as seguintes características:
- Idade: 9 anos
- Raça: Shitzu
- Sexo: fêmea ovariohisterectomizada
- Coloração da pelagem: predominantemente, com pelagem preta ao redor das orelhas,
dos olhos e da face
- Peso: 8,7 kg
Ao ser realizado o exame clínico, apresentava os seguintes parâmetros:
- Mucosas oculares e vulvares: normocoradas
- Tempo de preenchimento capilar: 2 segundos
- Dentição: arrasamento dos incisivos e pré-molares, com dentes fraturados e presença
de cálculos dentários
- Frequência respiratória: 25 mpm
- Frequência cardíaca: 80 bpm
- Temperatura retal: 38,7º C
- Lesões encontradas: lesões epidérmicas resultantes de prurido nas áreas ventrais e
em axilas e extremidades dos membros toráxicos.
Observando que os parâmetros clínicos estavam normais e tendo as informações
referentes à anamnese, o médico veterinário esclareceu aos tutores os procedimentos
referentes ao skin prick test como tentativa de obter esclarecimentos sobre a origem do
prurido. Perguntou se haviam administrado anti-histamínicos nos últimos 7 sete, e/ou
cortisona nos últimos 14 dias, por via oral, ocular ou tópica. Mediante as respostas
negativas, passou a observar se a paciente se enquadrava nos critérios de Favrot
(RIBEIRO et al., 2020):
1- Aparecimento dos sinais antes dos 3 anos de idade
2- Cão que vive maior parte do tempo dentro de casa
3- Prurido responsivo a corticoterapia

28
4- Prurido como primeiro sinal, e só depois lesões associadas
5- Extremidades dos membros torácicos afetadas
6- Pavilhões auriculares afetados
7- Margens auriculares não afetadas
8- Área dorso-lombar não afetada

Concluindo que a paciente atendia a 7 dos 8 critérios de Favrot, optou-se por


executar o skin prick test.

Avaliação do prurido

Durante a consulta o clínico avaliou a intensidade do prurido seguindo a Escala


Qualitativa de Prurido Corpóreo, segundo Rybnicek et al. (2009), sendo:
- A: prurido ausente ou normal, equivalente a escala de 0 a 2 = coceira ocasional.
- B: prurido discreto, equivalente a 3 a 4 = coceira episódica e mais frequente. O animal
não se coça enquanto dorme, come, brinca, passeia ou quando está distraído por
qualquer atividade.
- C: prurido leve, equivalente a 5 a 6 na escala = coceira em vários momentos do dia
quando o animal está acordado. O cão acorda para se coçar.
- D: prurido moderado, equivalente a nota 7 a 8 na escala = coceira bastante intensa
em vários momentos do dia. O cão para de comer e brincar e acorda para se coçar, ou
se coça enquanto dorme.
- E: prurido grave, com nota entre 9 e 10 = coceira constante. O animal se coça mesmo
quando está distraído e durante a consulta. Só para de se coçar quando se chama a
sua atenção.
Observando o comportamento da paciente durante a consulta, foi lhe atribuída a
nota 9.

Procedimento: skin prick test

Em atendimento ambulatorial, inicialmente houve a contenção adequada da


paciente em decúbito Fowler, com tricotomia nas áreas abdominais e assepsia na região

29
de aplicações com álcool a 70%. Em sequência, realizou-se a delimitação das áreas
onde o alérgeno seria aplicado, com caneta dermográfica de ponta fina, em
distanciamentos de 3 cm, totalizando 21 pontos. Para a aplicação dos alérgenos usou-
se lancetas descartáveis, embebidas previamente em extratos alergênicos
individualizados. Foram utilizados 19 extratos de alérgenos, sendo: arroz, frango, milho,
ovo, trigo, carne suína, carne bovina, caseína, ácaros (Dermatophagoides pteronyssinus,
Dermatophagoides farinae e Blomia tropicalis), fungos (Aspergillus fumigatus, Penicillium
notatum, Alternaria alternata e Candida albicans) e insetos (Blatella germanica (barata),
Periplaneta americana (barata), Barata mix (Blatella+Periplaneta) e Culex pipiens
(mosquito). Em seguida foram aplicados os controles, sendo: histamina para o positivo
e solução salina para o negativo.

30
4- RESULTADOS

Após as aplicações, houve a espera de 20 minutos e procedeu-se a leitura, como


demonstrado na Figura 1. As pápulas obtidas foram delimitadas com caneta. Foram
considerados positivos os testes cujas pápulas apresentaram diâmetro igual ou superior
a 3 mm.

FIGURA 1: leitura dos resultados

Houve 2 resultados negativos: um corresponde a solução salina e o outro a carne


suína. Quatorze resultados foram positivos: histamina, arroz, frango, milho, ovo, trigo,
carne bovina, caseína, Dermatophagoides pteronyssinus, Dermatophagoides farinae,
baratas e mosquito. Os outros 5 se demonstraram reagentes, porém com pápulas de
diâmetros inferiores 2,5 mm: Blomia tropicalis e os fungos.

31
5 - DISCUSSÃO

Aos tutores foi orientada a troca de alimentação da paciente pois apresentou


reações alérgicas à maioria dos alimentos menos carne suína. Com isso foi estabelecida
uma dieta a base de carboidratos e carne suína, banhos medicamentosos semanais,
antibióticoterapia por 15 dias para diminuir a infecção secundária causada pelo prurido,
e foi recomendado o uso do oclacitinib duas vezes por dia quando estiver em crise.
Após 6 meses a paciente retornou à consulta apresentando resultados
promissores, com significativa melhoria na qualidade da pele e ausência de prurido.
O prick test (teste cutâneo de puntura) demonstrou ser uma prova confiável,
segura, rápida e exequível para pacientes caninos.
A condução da marcha diagnóstica foi adequada e conferiu confiabilidade aos
resultados, permitindo excluir a carne suína do conjunto de alimentos desencadeadores
de prurido, e assim passou a constituir um alimento seguro para a paciente do caso
relatado.

32
6 – CONCLUSÃO

O clínico veterinário é desafiado diariamente com referência à interpretação dos


sinais exteriorizados ou não pelos pacientes, para que obtenha êxito no estabelecimento
do diagnóstico e tratamento.
Para tanto não se deve ter prevenções nem precipitações.
Portanto é aconselhável que se utilize meios de diagnóstico eficazes, não
dispendiosos quando possível, e com resultado rápido.
O teste de puntura demonstrou essas características e colaborou decisivamente
para o estabelecimento do diagnóstico causal, resultando na eficiência da conduta
clínica.

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REFERÊNCIAS

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