Você está na página 1de 3

São Luís, 10 de Dezembro de 2021.

Universidade Estadual do Maranhão – UEMA.


Centro de Ciências Tecnológicas – CCT.
Curso: Engenharia da Computação.
Disciplina: Leitura e Produção Textual. Semestre: 2021.2.
Professora: Mayalu Felix.
Aluno: Marcius Sidney França Filho. Matrícula: 20210002955.

Desdobramentos críticos: “1984” e o mundo contemporâneo

A obra “1984”, do escritor inglês George Orwell, narra acontecimentos em uma


sociedade fictícia localizada na Oceania, onde o totalitarismo – estrutura de governo
extremamente opressora – controla as práticas dos indivíduos em todos os níveis, utilizando-se
de estratégias como a vigilância, mediante teletelas que funcionam vinte e quatro horas; normas
extremamente rigorosas, principalmente no contexto de engajamento de um partido político;
uso do discurso, ou seja, do poder da palavra; propagandas para estabelecimento de uma espécie
de “ditadura do pensamento”, etc. Dentre outros aspectos, as estruturas opressoras encontradas
em tal sociedade funcionam como limitadoras da liberdade de expressão e de escolha – direitos
comuns em espaços democráticos, mas desconhecidos pelos personagens da obra -
impulsionadoras da alienação e da organização do poder em moldes ditatoriais.

“1984” pode ser recortada em vários aspectos de análise, já que, por mais que expresse
condições sociais aparentemente distantes da realidade, existem implicações pertinentes a
serem discutidas. Uma das estratégias bem elaboradas da narrativa é que a figura de poder
chamada de “O Grande Irmão”, que não é visto – em sentido material – pelos indivíduos, exerce
opressão sobre toda a sociedade, sendo temido e, ao mesmo tempo, idolatrado. Essa
característica da obra traz à tona a realidade de poderes totalitários, por serem carregados de
simbologias e ilusões e, por isso mesmo, conseguirem o máximo de alienação dos seus
subordinados. Inclusive, sob os conceitos da teoria sociológica, a forte representação do
“Grande Irmão” aliada ao heroísmo e a um grande carisma, assemelha-se ao tipo ideal de
dominação carismática, pontuado pelo pensador alemão Max Weber, no qual as habilidades
pessoais e extraordinárias, ou até mesmo “dons” de uma figura política – um governante, por
exemplo – são capazes de inflamar sentimentos de lealdade e confiança por parte de discípulos
e seguidores, afetividades que podem ser perigosas, já que anulam parte da capacidade de
raciocínio e senso crítico.
Outro aspecto muito forte da obra, que possui pontos em comum com a realidade social,
é o fato dos discursos e propagandas possuírem poder de manipulação das ações dos indivíduos.
As teletelas, ferramentas de vigilância e informatividade, controlam o comportamento de
pessoas engajadas em um partido político, que inclusive é o único dessa sociedade, e impõem
modelos de conduta extremamente ditatoriais. Em uma das cenas de “1984” é possível detectar
tamanha opressão: o personagem O’Brien, extremamente fiel aos princípios do partido – já que
é alvo constante das teletelas – tenta influenciar Winston Smith a desacreditar que o resultado
do somatório matemático “2 + 2” poderia ser diferente de “4” à medida que o partido pudesse
decretar que é “5”. O personagem principal recusa-se a admitir que uma instituição política
pudesse ter capacidade de tomar até mesmo o lugar da lógica. No entanto, O’Brien é um
exemplo de pessoa que decide viver sob os ditames da organização partidária e que acredita
que outros indivíduos devem igualmente se submeter. Duas situações reais podem ser extraídas
de tal cena; primeiramente, o fato de que o dogmatismo é sempre perigoso quando não levado
aos exames da razão, o que acontece em muitas religiões que impõem guerras “Santas”, nas
quais o não fiel é levado a se submeter a uma fé, e, quando não o faz, pode ser alvo de morte
ou tortura. Outra situação é o fato de que pessoas são induzidas, constantemente, por apelos
comerciais e políticos, em espaços como internet e televisão, a tomarem atitudes de comprar ou
consumir conteúdos que trazem malefícios, mas perduram em tais práticas por desejarem
aceitação ou sentimento de pertencimento social.

Inspiração para muitas reflexões, como analogias aos governos totalitários que ficaram
marcados na história - nazismo, comunismo e fascismo - além do papel de câmeras de vigilância
nas sociedades modernas, “1984” é uma obra grandiosa e intrigante, podendo ser dissecada em
vários prismas de análise. As suas nuances se relacionam com várias teorias das ciências
humanas, inclusive com as do filósofo inglês Jeremy Bentham, sobre o sistema panóptico,
muito comum em estruturas penitenciárias circulares, nas quais um observador central é capaz
de vigiar todos os presos. Michel Foucault se apropriou de tal teoria e, em seu livro “Vigiar e
punir”, discute como as sociedades atuais possuem instituições opressoras que tornam as
pessoas em “corpos dóceis”, por meio da disciplina e do uso do poder do discurso especializado.
Muitas outras perspectivas podem ser tomadas como exemplos atuais relacionados à obra de
George Orwell, até mesmo programas televisivos populares como “Big Brother”. Portanto, é
imprescindível que novos desdobramentos surjam, ainda mais críticos, a partir deste clássico
livro do século XX.
REFERÊNCIAS

BENTHAM, Jeremy. O Panóptico. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 1987. Petrópolis, Vozes.

ORWELL, George. 1984. 6. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1972. 277p.

WEBER, Max. Conceitos Sociológicos Fundamentais. Tradução Artur Mourão. Covilhã:


Lusofia: Press, 2010. p. 36.

Você também pode gostar