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As omissões
Um dos maiores nomes do
mercado digital brasileiro
CAMINHOS DO SUCESSO
Jairo Menezes
BRUNO PEREIRA
As omissões
Um dos maiores nomes do
mercado digital brasileiro
CAMINHOS DO SUCESSO
Jairo Menezes
Goiânia, 2021
Copyright © 2021 by: Jairo Menezes
Ficha Técnica:
Coordenação editorial: Jairo Menezes
Capa: Foto
Fotografias: Acervo familiar de Bruno Pereira
Revisão: Fátima Toledo
Projeto e produção gráfica: Carlos Sena
CDD-658.84
Boa leitura,
O autor.
Morando sozinho, no Setor Santa Genoveva,
casa dos pais, em 2006
1 – O baque
O
suor que começa a surgir das mãos vem acompanhado
de um leve tremor nas extremidades. A respiração curta
e ofegante nem é percebida por quem passa pela crise.
Cada batida do coração é como um empurrão. Numa fração de
segundos, surgem outros sintomas. O aperto no peito, a falta de
ar e a certeza de que esses são os últimos momentos de vida. A
inquietude é tomada por uma vontade enorme de sair dali. Ele
está em casa, acompanhado da noiva. Ela começa a se impres-
sionar com a tensão que se instaura no momento.
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Ela não sabe mais por onde andar, mas percebe que o som da
música, o vento no rosto e o barulho do motor do carro o fazem
ficar bem. Ela para o carro, enquanto ele não se cansa de repetir
frases como “eu vou morrer, me socorre; me salva”.
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do seu controle lhe tirava da zona de conforto. A exposição de
fragilidades não lhe trazia bem-estar, assim como acontece
com a maior parte das pessoas. Assim, ele chegou ao con-
sultório do psiquiatra, que, pelas descrições do paciente na
primeira conversa – o que na área de saúde se conhece por
anamnese –, pela indicação feita pelo profissional anterior e
pela apresentação do quadro, já havia percebido do que se
tratava. Bruno saiu do consultório com uma receita de cor
amarela. O homem, que era forte, de pensamentos rápidos e
desenvoltura irretocável durante as aulas virtuais, que já for-
mara até 2020 mais de 30 mil estudantes de todos os cantos
do Brasil e do mundo pelos meios digitais, estava doente.
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Primeira viagem aos EUA, com Matheus Peixoto, em 2014
2 – A agonia
H
avia alguns dias que a relação entre Bruno e a mãe
dos dois herdeiros – o mais velho tinha 15 anos – es-
tava ainda mais desconfortável, se é que isso fosse
possível, já que desde o início nada tinha sido fácil entre os
dois. Na adolescência, eram colegas de sala em uma escola
adventista de Goiânia e tinham famílias e criações regidas
pelos mais rígidos padrões possíveis. O namoro aconteceu de
forma arrebatadora, era novidade para ambos, e aquela re-
lação infantil iria ganhar um tom muito além de um simples
namorico infantil e inocente. Em pouco tempo, a notícia da
gravidez pegou a todos de surpresa. A menina de 15 anos seria
mãe de um filho advindo de um relacionamento com um
rapaz da mesma idade. Algo inconcebível para qualquer cri-
ação à luz da doutrina religiosa.
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e a conversar sobre o assunto – hoje motivo de arrependi-
mento por parte de Luís Celso, pai de Bruno, que chega a
chorar com facilidade quando questionado sobre algo que
tenha feito de errado na criação do filho: “Eu podia ter con-
versado, entendido ele, e ensinado, mas, ao invés disso,
brigava, e batia muito”, lamenta.
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ex-sogro a convencesse sobre a possibilidade de um acordo,
sem intervenção da Justiça, de guarda compartilhada, ou
que as crianças tivessem liberdade de trânsito entre os dois
lares. Quando percebeu essa movimentação e articulação, a
mulher tomou medidas ainda mais drásticas e, do dia para
a noite, sumiu. Nem ao próprio pai ela contou o que havia
planejado: uma viagem para um lugar bem distante, onde
Bruno não pudesse ‘roubar-lhe’ os filhos. Ela se sentia
ameaçada e tinha medo de ficar sem os dois meninos. O que
Bruno garante é que jamais impediria o convívio das cri-
anças com a mãe, que, segundo ele, deve receber todos os
méritos pela excepcional criação que deu aos dois, com base
em respeito ao próximo.
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Família completa. Da esquerda para direita, o primogênito
Nicholas, a irmã, Lorrany Pereira, a mãe, Mara Celma, o
sobrinho Daniel Pereira, o caçula Guilherme, o pai, Luis Celso
e Bruno Pereira: Natal de 2020
3 – Os cortes
Q
uando é possível ver Bruno Pereira – até mesmo porque
ele quase nunca vai a lugares públicos e não se dispõe a
estar em locais com muita concentração de pessoas –,
pode estar certo de que ele não estará acompanhado de multi-
dões. Bruno não teve muitos amigos, e muito disso aconteceu
por conta da criação rígida que recebera, com base em doutrinas
e ensinamentos da religião. Mara Celma, a mãe, e Luís Celso, o
pai, são adventistas, e, depois de quatro anos de tentativas para
engravidar, se transformaram em pais muito zelosos. Ela tinha
útero retrovertido – deformidade desde o nascimento, presente
em cerca de 15% a 25% das mulheres, segundo a literatura cien-
tífica –, e isso, conforme o que relata, fez com que a chegada do
primogênito fosse mais demorada. Aliás, quem conhece Bruno
sabe bem que, até para nascer, ele veio ao mundo quando quis,
na hora e do jeito que bem entendeu.
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complexidade foi definida pelo casal como o destino de urgên-
cia. Só que a dilatação não acontecia, apesar de as contrações
terem um padrão definido e aumentarem a cada sequência de
minutos. Mais de 20 horas depois, e já com medicação na
veia, para estimular a aceleração do nascimento natural, Mara
estava em uma sala de parto.
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mitia que ele fosse à casa dos outros meninos do bairro,
exceto na de Luzia, que havia criado o filho no mesmo
molde da família Pereira, sob rígidos padrões sociais, éti-
cos e morais. Foi assim, com essa aproximação dos dois,
que a amizade se fortaleceu. Mas a mudança de casa da
família Pereira iria causar um distanciamento entre os
dois, e essa amizade só retornaria com frequência, apesar
de se verem algumas vezes na infância, mesmo morando
em pontos diferentes da capital de Goiás, na segunda parte
da adolescência. O reencontro prestes à fase adulta reavi-
vou o que os dois sentiam antes, que era uma amizade de
compartilhar experiências, vivências, e dividir um com o
outro os detalhes da vida. Com os outros amigos não seria
do mesmo jeito, já que Bruno conseguia, com grande fa-
cilidade, superar os cortes que, por motivos distintos, a
vida lhe proporcionava.
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boa parte da infância, adolescência e fase adulta. Até que, por
motivos que ele se nega a mencionar, tomaram rumos difer-
entes. As pessoas que conviveram com Jonnas não nos reve-
laram os reais motivos para que o contato dos dois tivesse
sido interrompido. Bruno menciona pouco as causas que
levaram ao fim do convívio com o amigo. Uma ou duas pes-
soas ouviram falar que existiu inveja em um dos dois lados, e
que isso poderia ter sido a causa do rompimento. Mas a in-
formação não foi confirmada por Bruno, que simplesmente
não quis prolongar o tema.
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Em Lisboa, Portugal, na mesma cerâmica onde trabalhou na
adolescência e retornou em 2021, para gravações
4 – Humilhação
A
lém dos impedimentos dentro do próprio vínculo fa-
miliar, Bruno passou a sofrer preconceito, piadas e até
coações na sala de aula e na própria igreja que frequen-
tava. Tudo isso por ser um adolescente pobre, sem pele
branca, e por ter namorado sem seguir os formatos e moldes
estabelecidos à época.
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que permitissem a permanência de todos ali. As condições
eram precárias, porque a moradia era em uma estrebaria de
cavalos, ou estábulo, com outros brasileiros que, da mesma
forma, não tinham autorização para trabalhar e morar na
capital portuguesa. Para o sustento, todos tinham subtra-
balhos. O que os portugueses se negavam a fazer, lá estava
a mão de obra de brasileiros. Luís Celso conseguiu uma
oportunidade para Bruno ser inserido em uma olaria, que
fabricava, entre cerâmicas e outras coisas, tijolos. Mas o tra-
balho braçal não era a praia dele, ainda mais para receber
600 euros por mês, que não davam para nada. Volta e meia
o rapaz era encontrado atrás de pilhas de tijolos, e fazia jeito
de o tempo passar mais rápido, ou seja, em muitos momen-
tos, quando o trabalho braçal cansava, recebia, mesmo que
pouco, pelo tempo trabalhado sem render quanto se espera-
va – ele nega, e diz ter “ralado” muito. Do primeiro salário
que recebeu, comprou um notebook Acer e um tênis. Bruno
foi demitido em um dia de fúria do dono da cerâmica.
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Era quase certeza de o dia amanhecer em Lisboa
e, antes de anoitecer, o rapaz desse um jeito de re-
tornar ao Brasil. Mas os argumentos de Bruno não
eram aceitos pelos pais. Ele quase não dependia do
dinheiro do pai e queria de alguma forma deixar
claro que estava inconformado com a situação de
viver fora do País. Cabeça-dura que era, quando
colocava uma coisa na ideia, para retirar era difícil,
então partiu para a pressão. Ameaçou entregar
todos os imigrantes ilegais se não conseguisse que
o pai aceitasse seu retorno ao Brasil. De imediato,
recebeu outra ameaça: ele seria amarrado caso con-
tinuasse com aquela ideia. Os outros moradores do
apartamento confessaram a Luís Celso a incon-
veniência e a possível ameaça, o que lhe causou
mal-estar, e ele não viu alternativa senão ceder,
comprar uma passagem aérea e encaminhar o filho
para o Brasil. Mas Luís era turrão, e mesmo tendo
aceitado fazer o que o filho queria, viu o ato de
Bruno como uma infantilidade e um desrespeito às
decisões que havia tomado para o bem dos seus.
Não foi ao aeroporto se despedir. Eles passaram
seis meses sem se falar.
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Em Nova York, em 2016
5 – Os poucos
Q
ue Bruno não é rodeado de amigos, isso já é claro. Mas
até os amigos verdadeiros e mais próximos dele
sabem que ainda há a possibilidade de que sejam re-
duzidos e enxugados. Bruno tem uma imensa gratidão por
quem acreditou, confiou e o apoiou, e isso faz com que man-
tenha os seus sempre por perto. A pergunta: “pessoas são
descartáveis?” foi feita a muitos entrevistados, e todos re-
sponderam, de forma unânime, negativamente. O question-
amento surge pela grande facilidade e, ao mesmo tempo,
dificuldade que Bruno tem em abrir mão das amizades. En-
tende que os ciclos são mutáveis, e lida muito bem com isso.
Mas nem sempre consegue entender quando algum ciclo deve
ser encerrado por completo. Ele se dedica às pessoas benquis-
tas, e espera o mesmo de volta, porque cobra de forma ex-
agerada de quem ele se agrada.
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“Você não é homem para honrar as calças que veste!”, ou-
viram. O nível do que se discutia era muito tenso e parte das
fontes entrevistadas revelou muita vergonha de descrever o
que fora dito ali. Em pouco tempo, o ambiente saudável e de
cumplicidade se transformou em um palco de terror. Os gritos
e dedos na cara ficaram ainda mais densos, e quanto mais
tempo passava, maior era a hostilidade. A outra parte desta
cena, descrita por muitos como deplorável ou assustadora,
era Matheus Peixoto, sócio das empresas e negócios. O título
de ‘braço direito’ nem cabia a Matheus, porque ele era muito
mais que isso, pois, quando Bruno não estava, tinha a missão
de decidir sobre tudo na empresa.
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Aliás, para Bruno, o antigo adágio popular ‘dinheiro atrai
dinheiro’ é aplicável e lhe cabe como uma luva. É pelas
demonstrações de quanto tem em patrimônio, veículos e tudo
o que o dinheiro constrói que cada vez mais obtém admiração
dos seguidores e alunos dos cursos que ministra. O primeiro
investimento em Bruno foi feito por Matheus, que atuava
como piloto e tinha um Camaro, da Chevrolet: foram 70% do
veículo. O carro pomposo e da moda, no entanto, não seria
vendido inicialmente. Servia para passear nas ruas e fazer
postagens nas redes sociais. Era uma vitrine de poder, uma
meta de sucesso para quem queria se transformar em um im-
portador bem-sucedido, assim como Bruno mostrava ser nas
redes sociais. O percentual adquirido por Matheus, da Aca-
demia de Importação, foi de 20%. O primeiro curso teve o in-
vestimento total, direto, em dinheiro, menor que R$ 10 mil.
A surpresa foi geral quando o lucro esperado em R$ 20 mil
chegou aos incríveis R$ 130 mil.
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provocada pelo coronavírus, e auxiliava no que Bruno pre-
cisasse para a criação de conteúdos. O apartamento, além de
moradia, havia se transformado em depósito para abrigar as
mercadorias da antiga loja que havia começado no Setor
Santa Genoveva. Agora, o estúdio e Quartel General (QG) da
Academia de Importação e todas as marcas com selo Mr. Ins
estão no maior prédio comercial do Parque Lozandes, a região
de Goiânia que mais cresce e valoriza.
S
e alguém quiser vê-lo fora de si, a receita é muito sim-
ples: faça com que descumpra um compromisso, ou
tenha de entregar algo atrasado para algum dos seus
clientes, ou alunos, como prefere chamar. Para Bruno, com-
promisso é algo que determina a credibilidade, e ele leva isso
muito a sério. Quando acontecem problemas técnicos e ele
precisa entrar com atraso em uma live que já estava agen-
dada, ou se alguma coisa dá errada na hora da entrega de
algum produto que está prestes a ser lançado, é nítida a ira
que toma conta do homem. Um segredo? Não adianta tentar
justificar ou mostrar motivos que não compactuam com
planejamento, testes e checagem de equipamentos à exaus-
tão, ações necessárias para entregar o melhor a quem investiu
em algo da Mr. Ins. Bruno, que tem estopim curto com tudo,
só vai ficar ainda mais nervoso. Isso, porque sabe os detalhes
e como proceder em cada um dos processos. Os funcionários
não entendem que ele sabe desde o enquadramento e ilumi-
nação necessário para a câmera, à linguagem em sistemas do
arquivo, ou à redação do texto que vai ser enviado para a
venda: aprende tudo para exigir de quem é pago para fazer.
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Depois da reforma da casa dos pais, a pavimentação
da rua, em 2021
forma de aprender detalhes de criação. Design gráfico, dig-
ital, linguagens web, produção de conteúdo, vendas, comer-
cialização, enfim, uma infinidade de coisas que hoje são
aplicadas no dia a dia da Mr. Ins. Ele sabe de tudo, com
riqueza de detalhes, porque se aprofunda nos temas com
dedicação. Aquilo que não sabe e se interessa, pode ter a
plena certeza de que vai se esforçar para aprender. Desde
uma linguagem nova de programação a uma linhagem nova
de marketing, e até pilotar uma aeronave.
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dem a levar o relacionamento adiante. Nada lhe escapa aos
olhos. Mas o que ele cobra é trabalho. O resto é detalhe de
convivência.
Pois foi isso que ele fez: devolveu aos pais um sobrado su-
perconfortável, com detalhes de luxo. Mas antes que a casa
que foi derrubada para a construção de outra – num dos
lotes que Luís Celso e Mara haviam comprado em sociedade
com outros três vizinhos, que o dividiram para fazer as
próprias construções – entrasse na fase de acabamento, fal-
tava algo. O empresário havia solicitado a pelo menos três
políticos o intermédio com o poder público para a pavimen-
tação da rua. Esse era um sonho não só dos pais dele, mas
de todos os vizinhos que moravam ali há anos. O que ouviu
foram só promessas. Então decidiu, por conta própria, fazer
isso. Contratou a melhor empresa de pavimentação disponí-
vel no mercado, que entregava o que havia de excelência,
com engenharia de tráfego, criação de redes pluvial e fluvial,
além de quebra-molas, sinalização e tudo o mais. Pagou, co-
brou entrega no prazo e, quando a casa foi devolvida aos
pais, havia asfalto, sinalização, rede de esgoto e de chuva,
além de meios-fios instalados na rua. Não só para os pais,
mas para todos os que moravam e moram ali e transitam
naquela região do Setor Santa Genoveva. Palavra cumprida.
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Concentração antes de gravar, no estúdio do
escritório, em 2021
7 – Os erros
A
dor no estômago toma conta de repente. A noite, que
era para ser de descanso, se transformara em um mo-
mento de introspecção, com o silêncio sendo quebrado
somente pelo cantar dos grilos que estão no gramado do
jardim, do lado de fora da casa. Ele está sentado numa
poltrona, no canto da sala de estar da casa em que morava no
início de 2021, em um dos condomínios de luxo de Goiânia. Já
deu dois tragos de uísque para tentar fazer o corpo relaxar, mas
o único efeito que teve foi fazer com que o cansaço e a dor
provocada pela gastrite nervosa aumentassem ainda mais. O
homem, que está prestes a ver pela janela da sala da casa o sol
nascer, sabe o motivo pelo qual está assim. Em poucas horas
vai estar diante de uma câmera e vai falar para mais de 25 mil
pessoas num evento para toda a América Latina. O nervosismo
não tem nada a ver com o que ele vai falar, ou como vai se por-
tar frente a esse tanto de gente numa aula ao vivo. Isso ele dom-
ina muito bem, diga-se de passagem. Ele teme problemas com
a transmissão, o áudio, a projeção, a inserção das imagens na
hora certa, enfim, qualquer tipo de situação que fuja do pro-
gramado é um erro. E ele abomina erros.
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eterno problema: qualquer erro é responsabilidade direta de
quem é visto pelos clientes e, por consequência, o erro não dá
para ser terceirizado. Agir de forma diferente seria o oposto
ao que Bruno faz, e isso acarretaria em mudanças drásticas
de como se comporta e de como age no dia a dia com os seus
colaboradores. Além de se cobrar em demasia, o empresário
hora alguma deixa de cobrar de quem está próximo, para que
tudo saia com perfeição.
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Primeiro escritório da Mister Ins Cursos, em 2017,
onde tudo começou
8 – A reconstrução
M
adrugada de domingo. Dois rapazes de 18 anos, em
um carro de passeio em plena rodovia federal,
ouvem uma música no som digital do veículo. Era
verão de 2008. Apesar da estação do ano, a região onde eles
transitam é mais fria que o restante do País, embora um mor-
maço úmido faça parte das características do local. Em algum
lugar entre Foz do Iguaçu e Medianeira, pela BR-277, um
posto da Polícia Rodoviária Federal (PRF) com um único
agente da força de segurança, que faz a parada da dupla que
ocupa o veículo.
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compra, principalmente porque a dupla que burlava as leis
fiscais não tinha mais dinheiro para investir na empreitada.
E para ter essa quantia, um dos rapazes havia deixado o
próprio celular penhorado num empréstimo. O policial fica
calado alguns minutos, por certo no aguardo de alguma pro-
posta indecente. Mas, da mesma forma, os dois também se
silenciam. Sentem medo de falar qualquer coisa e se com-
plicar ainda mais. Temem ser presos por qualquer que seja o
detalhe. Bruno, ainda mais. De repente, o silêncio, que só era
quebrado pelos carros que passavam pela rodovia metros à
frente, é rompido entre a autoridade e os suspeitos. “Quer
saber? Vamos dar um jeito nisso. Eu dou uma ajuda a vocês,
e vocês me ajudam. Está na cara que vocês são trabalhadores,
e lutam para sobreviver e comercializar. Não tenho o mínimo
interesse em ferrar com vocês. Eu ajudo, libero vocês, e deixo
que vão embora”, disse o policial.
Essa não foi a única vez que Bruno viajou ao Paraguai para
comprar mercadorias para revender no Brasil. Claro que nem
todas as vezes os produtos eram taxados corretamente, como
manda o protocolo, e, como muitos brasileiros, ele se ar-
riscava e tinha perdas. Desde valores menos expressivos a
situações em que a mercadoria toda ficava apreendida, ou se-
quer era alvo de fiscalização. Certa vez, rodeado de fiscais e
agentes de polícia em uma delegacia, ele, de cabeça baixa,
toma um susto imenso ao perceber que está acompanhado
por um bode. Sabe-se lá o que o bicho fazia dentro de uma
delegacia! Mas o fato é que os policiais haviam apreendido a
mercadoria que Bruno e o amigo traziam, e eles sabiam que,
se os agentes dessem sequência ao protocolo, teriam até de
pagar multa posteriormente.
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juízos, observadas as proporções do que Bruno tinha à
época. Em um carro sem documentação em dia, com o din-
heiro contado para se alimentar na estrada, comprar as
mercadorias e retornar a Goiânia, correndo o risco de
perder os produtos para a fiscalização aduaneira, Bruno, ao
lado de um amigo, seguiu até a Ciudad del Este, onde faria
um dos maiores investimentos da vida: iria adquirir, de
uma só vez, 200 pen drives. Os produtos, comprados a
preço de banana no país vizinho, entrariam sem pagamento
de taxas para tal, e, na capital goiana, seriam revendidos
por valores muito superiores aos que haviam sido adquiri-
dos, o que daria para pagar os custos da viagem, e o valor
do investimento teria um retorno líquido que superaria os
150%. Apesar de todos os riscos envolvidos, como ser en-
quadrado em um crime fiscal e quanto às irregularidades
do veículo, além do perigo nas estradas federais e estaduais
no percurso do Paraguai até a chegada à capital do Estado
de Goiás, ele não esperava que fosse ter uma das maiores
decepções com a compra efetuada.
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Ao montar a escola de aviação em Goiânia, logo depois
de perceber que o curso para aviador era bom, ele
aproveitou a oportunidade para fazer melhor do que era
feito por quem fornecia os ensinamentos a quem queria
obter o brevet. Convocou os melhores professores e instru-
tores disponíveis no mercado e garantiu-lhes uma boa re-
muneração para ministrarem as aulas. Além de pagar as
aulas práticas para fornecer aos alunos, ainda disponibi-
lizava simuladores com a mais alta tecnologia disponível
no mercado. Mas, aos poucos, esse mercado não abria mais
possibilidade de crescimento. Ele desistiu.
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Uma das garagens, em 2021
9 - Solteirão
(até quando?!)
S
e questionado sobre sua vida amorosa, a resposta será
sempre a mesma: “Muito boa, obrigado!” Mas todos que
convivem com Bruno sabem que ele vive um grande
dilema. Está em dívida com a noiva, que espera o dia do casa-
mento. Os dois se conheceram por meio de um amigo em
comum, que os convidou para um evento simples na própria
casa. E foi nesta pequena reunião que surgiu algo entre eles.
O homem magro, de estatura mediana, bem apresentável, não
parava de olhar a menina bonita e de conversa inteligente. E
foi então que o galanteador partiu para cima. No evento, foi
gentil, se mostrou presente, disponível, mas não se furtou a
pedir-lhe o telefone. E não esperou passar mais de um dia
para fazer o primeiro contato. Revelou a ela o seu interesse e
a jovem deu-lhe abertura, o que abriu a oportunidade para
que se conhecessem melhor.
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soas com costumes tão diferentes aos que ele era acostumado.
Se a família Pereira educava os filhos com regras tão certas,
para que se tornassem independentes e individualistas, a
família de Júlia Gregório não tinha esse tipo de criação. Ali,
todos sabiam de tudo o que se passava com cada um dos in-
tegrantes. Quando havia atritos, existentes em todo círculo
familiar, a família de Bruno ficava magoada a ponto de se dis-
tanciar entre si; já do lado de lá, parecia que eles simples-
mente esqueciam as divergências, e no final de semana já
estavam todos juntos novamente.
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Assinatura de mais um contrato, em 2021
10 – (quase)
Nada é emoção
A
tarde era de domingo, e ele não parava de imaginar a
reunião que teria no dia seguinte. Estava agendada
para as 15 horas, mas a ansiedade tomava conta de
Bruno. Em questão de horas estaria diante do segundo cantor
mais ouvido do Brasil em 2020 e mais reproduzido na
América Latina, e fecharia um contrato em negociação há al-
guns dias. O que estava prestes a ser selado, um acordo com-
ercial de quase R$ 2 milhões, se tratava do maior contrato já
firmado pela Mr. Ins. Foi nesse momento que percebeu o
quanto a capacidade de negociação da empresa, e até dele
mesmo, estava em um patamar elevado. Fechar o contrato
com esse artista parecia uma missão quase impossível, já que
a possibilidade de dar certo se mostrava bem reduzida. O em-
presário dele já havia deixado clara a probabilidade de o negó-
cio não evoluir. E foi pela conversa de Matheus, aliada à
estratégia de Bruno, que tudo fluiu. Aquele seria o garoto-pro-
paganda escolhido pela Mr. Ins.
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o do cantor que estava em ascensão, e tinha, naquele ano, o
álbum mais tocado do País, segundo informava a plataforma
Spotify. No entanto, ele era quase que inacessível, e a con-
versação se iniciou com empresários. Para convencê-los de
que a empresa era realmente capaz de cumprir com o con-
trato, os valores de lucros apresentados anteriormente se-
riam sensivelmente adequados para uma realidade que só
aconteceria no futuro, quando o negócio já estivesse fechado
e em rendimento. Deu certo, tanto que o contrato perdurou,
e a campanha foi colocada no ar. Mas o contrato foi encer-
rado de forma amigável, pois o artista, que passava por
problemas pessoais, não conseguiu entregar o conteúdo.
Esse foi o principal motivo para a rescisão contratual, que
foi parar na esfera judicial.
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Enquanto ministra aula, na Mr. Ins, em março de 2021
11 - Silêncio
A
cara fechada do homem deixa clara pouca vontade em
trocar qualquer tipo de diálogo com quem quer se seja.
Isso não é empatia, pelo contrário, ele sente e percebe
todos os lados do assunto, mas se reserva ao silêncio da maio-
ria das vezes. Ao invés de, muitas vezes expressar tudo o que
se espera que seja dito, um feedback, ou simplesmente uma
opinião, ele cala. Não diz nada. Omite o que pensa. Porquê?
Essa não é uma dúvida de uma, ou uma dezena de pessoas:
na verdade, quase ninguém consegue explicar o que se passa
na cabeça desse homem, quando ele se cala diante de alguma
situação que lhe é imposta.
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como sendo guiadas pela emoção, têm, no entanto, outro
tipo de percepção. Quem passa a conhecer Bruno sabe que
há uma vasta possibilidade de ele tomar alguma medida por
impulso, durante o trabalho, ao tratar de algum assunto com
alguma pessoa. As percepções de falhas, no entanto, são o
que mais movem o emocional do homem, que muda com-
pletamente a feição e fica ainda mais sério, irritadiço, e
chega a dizer coisas sem pensar – o que pode gerar, em
muitas oportunidades, resultados catastróficos, como o pe-
dido de demissão de pessoas que irão fazer falta até certo
ponto para o andamento de alguns projetos, ou atritos inde-
sejados que poderiam ter sido evitados.
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No Paraguai, buscando pen drives: golpe que levou dos
hermanos, durante uma das tentativas
12 – Mentira
“categórica”
A
ponta da caneta tinteiro Montblanc de quase R$
10.000,00 passa com leveza e precisão sobre a linha
fina que está em cima do nome completo de Bruno
Henrique Rodrigues Pereira, impresso no final da página de
papel A4. A firmeza da mão que carrega no pulso um Rolex
analógico, de ponteiros em ouro branco, base em cor azul-
marinho e horas marcadas em algarismos romanos, deixa
clara a certeza de que ele não tem o mínimo de dúvidas sobre
o que faz. Quem assina o contrato fala algo com as pessoas
que estão em volta da mesa. O assunto não tem nada a ver
com o que está escrito nas páginas do acordo profissional. A
tranquilidade que o homem sugere nada tem a ver com o que
se passa na cabeça dele, que é um turbilhão de ideias, possi-
bilidades e alternativas do que aquela situação presente
poderá se transformar no futuro.
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peça com os dados de lucros anuais da empresa teve de ser al-
terada de forma categórica. Ao invés dos números reais, 50%
dos valores apresentados haviam sido inflacionados. Era para
mostrar o poder de negociação. Mas um detalhe precisa ser
revelado: nem quem fez parte dos processos antes da assi-
natura desse contrato sabia. Esta era a estimativa por baixo do
que o negócio renderia de lucro só para o contratante. Então,
feito o negócio, em menos de um mês a Mr. Ins teve um au-
mento quantitativo do capital, que superou – e muito – aquilo
que foi ‘inventado’ para a assinatura do contrato.
Se for comprar algo, pode ter a certeza de que ele vai fazer a
negociação de forma que leve vantagem. A base da conversa
pode ser toda verídica, mas, através de artimanhas, ele vai fazer
com que o valor do bem fique muito mais baixo que o pedido
inicialmente. Isso aconteceu em junho de 2021, quando re-
solveu comprar um carro por R$ 2,3 milhões. O valor inicial
era R$ 2,7 milhões, e ele deu um jeito de fazer com que uma
loja concorrente da concessionária em que sempre adquire os
veículos fosse instrumento para que o preço fosse reduzido. Ao
visitar a outra concessionária, gravou um vídeo, que nem
chegou a ser postado nas próprias redes, e o encaminhou ao
gerente de onde a negociação havia sido iniciada. Disse que
tinha encontrado um preço muito inferior ao que ele pedia,
mas que só compraria em outro local se ele não se disponibi-
lizasse a fazer o carro por menos. Resultado: negócio fechado.
Ele havia dito que faria uma viagem a São Paulo, porque
teria encaminhado currículos para a seletiva de uma empresa,
que teria se interessado por ele e que queria entrevistá-lo.
Sem dizer como faria para pagar a passagem, a mãe dá por
falta, de repente, do aparelho eletrônico. Bruno havia ven-
dido. Mara Celma entrou em desespero com o sumiço do
computador. Antes mesmo que Bruno retornasse da rua, en-
quanto fazia a negociação, ela ligou para a delegacia do bairro
e chamou os policiais, que foram até a casa para ouvir o que
a mulher tinha a dizer. Entenderam que não se tratava de um
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crime, já que ele havia vendido algo que também era dele, mas
fizeram o seguinte: deixaram para Bruno uma convocação
para que fosse até o Distrito Policial.
B
runo Pereira ostenta um alto padrão de vida. O homem
que vive do que vende por meio da Internet, dos negó-
cios imobiliários, investimento em artistas e produtos
físicos da própria marca mora em um condomínio de luxo
lotado de vizinhos famosos e é dono de uma Ferrari que su-
pera os R$ 2 milhões, além de outros tantos carros na
garagem, que, somados, dão muito mais que o dobro desse
valor. Isso tudo causa estranheza em quem não leva o mesmo
padrão de vida. Entrar na sala da casa dele e ver um piano
preto, de cauda, e observar que todos os detalhes de onde ele
reside são automatizados é um choque de vivência. Abrir as
portas dos armários de roupa e notar as marcas diversas e de
alto valor, fora as que ainda nem tiveram a etiqueta removida,
os tênis que custam salários inteiros de pais de família, causa
ainda mais o sentimento de também querer prosperar na
vida.
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que os seguidores possam alcançar objetivos palpáveis em
termos de patrimônio e dinheiro. E, claro, todos os que o
seguem querem prosperar na vida, e observam nele um
padrão a ser seguido, já que lutou e conseguiu conquistar tudo
o que queria e tudo o que o dinheiro pode comprar.
Assim ele faz com tudo o que tem. As coisas se pagam nat-
uralmente: o dinheiro vai chegar, e nem sempre ele precisa
fazer retiradas do patrimônio que já construiu, já que os ob-
jetos adquiridos irão proporcionar grandes outros negócios.
Ter dinheiro, ostentar, comprovar que as pessoas podem
crescer – se não na mesma proporção, mas podem ter inde-
pendência financeira com os investimentos nos próprios
negócios – são a forma mais clara que o perfilado tem de
atrair novos negócios, novos alunos, de vender o que sabe, e
de estar próximo ao que prega.
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Junho, 2021, viagem de classe executiva, a trabalho
14 – O personagem
O
homem contido, com palavras pausadas, frases cur-
tas, de dicção irretocável, gestuais curtos e planejados,
nada tem a ver com o mesmo que se apresenta atual-
mente. Isso porque quem acompanha a trajetória dele sabe
que hoje não é mais uma personagem que está ali, diante da
câmera, para uma turma de alunos individuais, ou grupos de
dezenas e centenas, ao vivo. Se hoje os palavrões, quando
necessário, saltam durante a transmissão e os desaforos em
comentários de pessoas que falam o que querem na Internet
são respondidos de forma igual, no início, em 2018, quando
apareceu em frente a uma câmera pela primeira vez, para
gravar na sala do apartamento com o celular, as aulas do
primeiro curso, que ensinava formas de importação, e como
fazer para a chegada dos produtos com mais agilidade, e
maneiras de lucrar com aquilo tudo, Bruno sequer respondia.
Agora, volta e meia ele manda alguém para a ‘puta que lhe
pariu’, ou manda ‘se fuder’ quem enche ‘o saco’ e perturba, ou
seja, ele mudou o perfil contido nas redes sociais para o mix
de perfil fora da lei e ostentador.
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as críticas é quase inexistente – o que não acontece na forma
presencial, quando as pessoas são mais retraídas, menos áci-
das e praticam mais a empatia.
N
ão tem como dizer com total e absoluta certeza que
Bruno Pereira e a Mr. Ins, em 2021, serão perecíveis.
Há muitas incertezas sobre o futuro, já que não tem
como prever o que será do mercado digital brasileiro. Mas a
renda dele não sai só do digital. Então, o que Bruno pode deixar
como ensinamento é: quando a galinha dos ovos de ouro bota
uma grande fortuna no seu colo, saiba distribuir em cestas
diferentes e lucrativas. Há a certeza de que a imagem dele de-
verá ser desvinculada, aos poucos, da empresa e dos produtos
e serviços que tem. A intenção é que em algum futuro médio
ou longo aconteça com ele o que já aconteceu com outros em-
presários. Ou seja, por uma questão profilática e por questões
comerciais, as duas coisas possam trabalhar separadamente –
o que pode gerar uma evolução ainda maior.
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