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Objetivos
Esperamos que, ao final desta aula, você seja ser capaz de:
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Literatura Brasileira V
Introdução
Nesta aula, você vai ver que Murilo Mendes foi um poeta de muitas
fases, apesar de podermos observar, em sua obra, características típicas
do momento modernista, em que a ruptura e a inovação serviam bem à
multiplicidade de valores da linguagem. Sua obra não foi publicada em
ordem cronológica, o que dificulta ainda mais a noção usual de crítica
literária, em que se procura estabelecer um crescimento linear da poéti-
ca produzida por um autor. De toda forma, podemos dizer que sua obra
data da segunda fase modernista, tendo seu primeiro livro, Poemas, sido
publicado em 1930.
Dizemos que o poeta faz parte do Modernismo pelo viés temático
de sua obra. Em seu livro História do Brasil, por exemplo, é possível
perceber o tratamento humorístico e irônico dado à nossa história,
uma clara inspiração em Oswald de Andrade. Como Murilo Mendes
lança-se numa fase já mais amadurecida do movimento, faz parte de Antítese
uma linhagem que, diante de tantas proposições, começa a questio- Figura de linguagem
nar o estatuto de artista e a maneira de se relacionar com o mundo. na qual o sentido é
construído através de
Nesse momento, é evidente, em sua obra, um claro retorno aos ideais ideias opostas. Exemplo:
“Tristeza não tem fim/
simbolistas, que visam ao intimismo espiritualizado, prenhe de antí- Felicidade, sim” (“A
teses e dicotomias. felicidade”, Vinícius de
Moraes).
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Aula 5 • Murilo Mendes e o Surrealismo: “múltiplo, desarticulado, longe como o diabo”
Aula 5 •
Aula 5 •
A pluralidade da ruptura
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Literatura Brasileira V
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Aula 5 • Murilo Mendes e o Surrealismo: “múltiplo, desarticulado, longe como o diabo”
Aula 5 •
Aula 5 •
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Literatura Brasileira V
1500
A imaginação do Senhor
Flutua sobre a baía.
As pitangas e os cajus
Descansam o dia inteiro.
O céu, de manhã à tarde,
Faz pinturas de baú.
O Pão de Açúcar sonhou
Que um carro saiu da Urca
Transportando com amor
Meninas muito dengosas,
Umas, nuinhas da silva,
Outras, vestidas de tanga,
E mais outras, de maillot.
Chega um índio na piroga,
Tira uma gaita do cinto,
Desfia um lundu tão bom
Que uma índia sai da onda,
Suspende o corpo no mar.
Nasce ali mesmo um garoto
Do corpo moreno dela,
No dia seguinte mesmo
O indiozinho já está
De arco e flecha na mão,
Olhando pro fim do mar.
De repente uma fragata
Brotou do chão da baía,
Sai um velho de tamancos,
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Aula 5 • Murilo Mendes e o Surrealismo: “múltiplo, desarticulado, longe como o diabo”
Aula 5 •
Aula 5 •
Fica em pé no portaló,
Dá um grito: “Bofé, vilões!
Descobrimos um riacho
E a fruta aqui é bem boa.”
No mesmo instante o garoto
Lhe respondeu: “Sai, azar!”
Despede uma flecha no velho
Que olha pro índio mais velho
Cheinho de barbas brancas,
Pensa que é Dão Sebastião,
Dá um tremor no seu corpo
E zarpou para Lisboa
(Mendes, 2014, p. 34-35).
Exergo
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Literatura Brasileira V
2. Cristianismo
O texto de Murilo Mendes é, muitas vezes, dissolvido num profun-
do espírito barroco, no qual podemos observar um misticismo, sempre
marcado pelo tom dualista. Leia atentamente o poema a seguir, dedica-
do a Cecília Meireles:
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Aula 5 • Murilo Mendes e o Surrealismo: “múltiplo, desarticulado, longe como o diabo”
Aula 5 •
Aula 5 •
Vi a cidade barroca
Sem enfeites se levantar.
Nem flores eu pude ver,
Flores da vida fecunda,
Nesta áspera Ouro Preto,
Nesta ária Ouro Preto:
Nem veras flores eu vi
Nascidas da natureza,
Da natureza lavada
Pelo frio e o céu azul
Tristes flores de Ouro Preto!
Só vi cravos-de-defunto,
Apagadas escabiosas,
Murchas perpétuas sem cheiro,
Só vi flores desbotadas
Nascidas de sete meses,
Só vi cravos-de-defunto
Que se atam ao crucifixo,
Que se levam ao Senhor Morto.
Vi flores de pedra azul...
Eu vi nos muros de canga
A simples folhagem rasa,
A avenca úmida e humilde,
Brancos botões pequeninos
A custo se entreabrindo,
Mas não vi flores fecundas,
Não vi as flores da vida
Nascidas à luz do sol.
Eu vi a cidade árida,
Estéril, sem ouro, esquálida;
Eu vi a cidade nobre
Na sua pátina fosca,
Desfolhando lá das grimpas
No seu regaço de pedra
Buquês de flores extintas.
Eu vi a cidade sóbria
Medida na eternidade,
Severa se confrontando
À cinza das ampulhetas,
Sem outro ornato apurado
Além da pedra do chão
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Literatura Brasileira V
Eu vi a cidade barroca
Vivendo da luz do céu
(MENDES, 2014, p. 144-145).
Veja que, muito além de narrar uma cidade ainda colonial – em que a
arquitetura e a escultura barrocas estão muito presentes, principalmen-
te nas edificações religiosas –, verificamos uma profusão de referências
que circulam entre a terra e o céu, o finito e o eterno. Temos, ainda, por
exemplo, a simbologia de cravos-de-defunto, que circula em oposição
à vida. Há também, no cristianismo de Murilo Mendes, algo de social
que, diferente do esmiuçamento do eu no Simbolismo (no qual se bus-
cava a transcendência), procura testemunhar o sofrimento não só do eu,
mas também do coletivo.
3. Surrealismo
Este aspecto revela que o texto de Murilo Mendes está pautado pelas
características estéticas, mas também pelo delírio e pelo sonho, em que
a lógica convencional desaparece e há uma negação da realidade. Já que
este aspecto é central na produção de sua obra, sendo destaque desta
aula, vejamos, no próximo capítulo, as diferentes facetas dessa marca
autoral. Mas, antes, vamos checar se você entendeu as questões traba-
lhadas até este momento.
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Aula 5 • Murilo Mendes e o Surrealismo: “múltiplo, desarticulado, longe como o diabo”
Aula 5 •
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Atividade 1
Atende ao objetivo 1
A sesta
TEXTO II
Hípica
Saltos records
Cavalos da Penha
Correm jóqueis de Higienópolis
Os magnatas
As meninas
E a orquestra toca
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Literatura Brasileira V
Chá
Na sala de cocktails
(ANDRADE apud BASTOS, 2004, p. 113).
Resposta comentada
Os dois poemas são escritos em versos livres. Ambos relatam cenas co-
tidianas, caracterizadas por diferentes camadas sociais. Há uma sequên-
cia de elementos que denotam o ambiente em que os personagens estão
inseridos. O espaço curto de tempo – no caso de Oswald de Andrade,
mais ainda – descreve e monta uma cena com elementos essenciais para
que o leitor visualize a imagem.
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Aula 5 •
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Pré-história
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Literatura Brasileira V
Cantiga de Malazarte
Malazarte
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Conclusão
Atividade Final
Atende ao objetivo 2
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O visionário
Resposta comentada
Neste poema, podemos observar um clima insólito, em que as noções de
realidade são perdidas e cedem lugar ao ambiente onírico – onde tudo pode
acontecer. No âmbito da livre associação de ideias, verificamos vocábulos
que se identificam pela religiosidade e pela antítese bem versus mal. Vemos
ainda uma marca de claridade, típica do barroco. A ideia de visionário se
entrelaça ao sobrenatural, na medida em que tenta antecipar o futuro, pre-
vendo tendências e mudanças. O eu poético parece transcender o tempo
com o intuito de apaziguamento e consolo daquilo que o aflige.
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Aula 5 •
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Resumo
Leitura recomendada
Referências
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