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01 OS HOMENS, A ARTE LITERATURA

E A LITERATURA

A ARTE E A LITERATURA ARTE E SOCIEDADE


São inúmeras as maneiras de o homem expressar-se; no O poeta e crítico literário estadunidense Ezra Pound afirmava
entanto, é através da arte que consegue fazê-lo da maneira mais que “a literatura não existe no vácuo. Os escritores, como tais,
sublime. A própria arte pode definir-se de várias maneiras, como a têm uma função social definida, exatamente proporcional à sua
pintura, a escultura, a música, o teatro, a arquitetura ou a literatura; competência como escritores. Essa é sua principal utilidade”. Isso
cada uma delas com objeto próprio: as texturas, cores e traços dão significa que a literatura é diretamente relacionada à sociedade que
forma à pintura; as formas e suas variações, à escultura. Cabe à a produz, ligada a seus conceitos, suas opiniões; retratando suas
literatura ser a arte da palavra. vaidades, preconceitos, avanços ou comportamentos peculiares.
O artista é aquele que se preocupa com o objeto de sua arte, que A literatura é, em certa medida, o próprio retrato daquela
produz emoção, que faz do comum algo diferente; mas também sociedade, um apanhado da cultura que a sustenta, uma
é aquele que transforma a realidade, lança um olhar diferente representação de sua ideologia.
sobre sua época, realiza a releitura do já feito e a faz a invenção Ainda segundo Pound, “a linguagem é o principal meio de
do porvir. Esse é o poder da arte, moldar a realidade de diferentes comunicação humana. Se o sistema nervoso de um animal não
maneiras, sob diversos pontos de vista, independente de realidades transmite sensações e estímulos, o animal se atrofia. Se a literatura
ou fantasias, mentiras ou verdades. Segundo Pablo Picasso, pintor de uma nação entra em declínio, a nação se atrofia e cai”. A literatura,
espanhol do século XX, “a arte é uma mentira que revela a verdade”. então, não só é tomada como uma representação da cultura de um
Ora, mas nem toda produção humana pode ser considerada povo, mas como construção da identidade social desta mesma
artística. Assim, o conceito de estética ganha importância. cultura que por ela se expressa e se redefine a cada momento.
Segundo a definição mais comum, estética é um ramo da filosofia Contudo, as condições históricas e culturais de uma sociedade
voltado à reflexão a respeito da beleza sensível. Assim, os sentidos; não são fixas, transformam-se ao longo do tempo e apresentam,
as formas; a harmonia entre as partes, cores, palavras, versos, em cada época, um conjunto de características que serão refletidas
melodias e ritmos; e as representações são objetos da estética. na arte, inclusive na literatura. A essas características damos o
A literatura, por assim dizer, é a arte da palavra, não de qualquer nome de estilo de época. Essas características vão das vestimentas
coisa escrita, mas aquela intencional, carregada de significado, à linguagem, da ideologia ao comportamento, refletindo-se nas
harmônica, expressiva e que é capaz de recriar a realidade. obras literárias de maneira que se pode fazer um retrato social de
A intenção do escrito literário é voltada à própria linguagem, uma determinada época.
não se preocupando unicamente com sentidos objetivos, mas É claro que nem todas as pessoas guardavam todas as
carregando-os de subjetividade, de possibilidades de significação, características de uma época, apesar de viver nela. Não é
de inovações estruturais e vocabulares, enfim, rompendo as porque todos os homens usavam bengalas no século XIX que
barreiras da linguagem e expressão comuns, alcançando elevados um determinado autor também o faria. A esse comportamento
níveis de expressividade. individual, a essa compreensão pessoal de sua época, de seu
papel social e da própria realidade que o cercava chamamos estilo
A LINGUAGEM LITERÁRIA individual. Portanto, toda análise literária passará obrigatoriamente
por três elementos:
Normalmente, pretende-se que um texto possua qualidades
como clareza, precisão, objetividade entre outras para que possa Momento histórico
ser plenamente compreendido em sua função natural: informar.
Entretanto, nem todos os textos possuem a mesma função e, Representa a conjuntura política, social e econômica de
assim sendo, vão dispensar algumas dessas “qualidades” em prol uma determinada sociedade. As guerras, as crises, os avanços
de seus interesses distintos. tecnológicos, as tensões internas, enfim, tudo o que pode modificar
a estrutura social ou sua ideologia deve ser levado em consideração
Há ocasiões em que o texto apresenta-se distante dos para o entendimento de uma obra literária.
sentidos imediatos da palavra. Sua principal funcionalidade não é
a informativa, nem se pretende ser objetivo ou até mesmo claro.
A intenção revela-se no próprio uso da linguagem, na construção Padrão estético
múltipla de sentidos, na criação de realidades e no estranhamento Cada época revela um conjunto ideológico próprio que é
das estruturas. Essa linguagem, carregada de significação, representado pela estética. O resultado das inovações e as novas
correspondente aos desejos e anseios do artista é que será perspectivas criam, isto é, modelos, padrões que “devem” ser
classificada como arte literária. seguidos, pois representam a ideologia dominante da classe de
O texto literário diferencia-se, portanto, de outro não-literário, maior prestígio na sociedade.
pelo valor de sua linguagem simbólica, pela intencionalidade
de suas palavras, pela harmonia entre suas estruturas. Por tudo Estilo individual
isso é que chamamos de arte este tipo de produção escrita, em Como todos esses fatores influenciam a vida de um indivíduo?
contraposição a textos cotidianos como as notícias, os manuais, as Como esse indivíduo enxerga o mundo em que vive? Como
atas de reunião, as bulas de medicamentos, os livros didáticos etc. ele pretende mudá-lo? Essas perguntas formam um painel
comportamental do artista frente à sua época. Além disso, sua
história pessoal, suas preferências estéticas imediatas, sua
capacidade técnica e criativa serão decisivas para definir um perfil
que pode ser percebido em suas obras.

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LITERATURA 01 OS HOMENS, A ARTE E A LITERATURA

A ARTE, A LITERATURA Verossímil. 1. Semelhante à verdade; que parece verdadeiro.


2. Que não repugna à verdade, provável.
E SEUS CONCEITOS (FERREIRA, A. B. de Holanda. Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1986.)
Literatura é arte. É arte polissêmica e polifônica. Como tal,
A literatura, como toda obra de arte apresenta uma equivalência
dialoga constantemente com outras formas de arte, em especial
de realidade, de verdade, de lógica interna ao texto e de um conjunto
com as artes plásticas. Disse um dia Murilo Rubião que o escritor
de semelhanças que permitem ao leitor validar os acontecimentos
mantém o “olho armado” e, tal como o escultor ou o pintor, fixa o
como possíveis: a verossimilhança. É possível distinguir dois tipos
eterno em sua obra.
de verossimilhança:
Muito se tem discutido sobre a função e a estrutura do texto
• INTERNA: percebida pela própria estrutura da obra, pela
literário, ou ainda sobre a dificuldade de se entenderem os enigmas,
coerência dos elementos que a estruturam.
as ambiguidades, as metáforas da literatura. Mas é exatamente
aí que reside o seu encanto: no trabalho com a palavra, com seu • EXTERNA: percebida no mundo real, confere ao mundo
aspecto conotativo, com seus enigmas. imaginário a percepção de realidade.
Sem dúvida, a literatura apresenta-se como o instrumento
artístico de análise de mundo e de compreensão do homem.
Sófocles, Camões, Shakespeare, Rousseau, Dostoievski, Machado
MÍMESE, CATARSE E EPIFANIA
de Assis, Eça de Queiroz, Kafka, Clarice Lispector... todos Para os gregos, a arte possuía as funções hedonística e
preocupados com o grande mistério: entender a alma humana. catártica. A primeira preconizava a necessidade de a obra artística
proporcionar prazer, ser um retrato do belo. Essa beleza consistia
na relação direta e na semelhança entre a arte e a natureza. Na
CARACTERÍSTICAS segunda visão, a catarse era o um conjunto de sensações e
contrassensações, um efeito “moral” que buscava aliviar os
DO TEXTO LITERÁRIO sentimentos produzidos pela própria obra de arte: o terror, a
• Plurissignificação: as palavras, no texto literário, assumem piedade, as tensões etc.
vários significados. Valoriza-se a linguagem conotativa. A catarse pode ser compreendida tanto de forma externa
• Ficcionalidade: os textos criam um universo próprio, ainda à obra de arte, quando ligada às sensações e identificações que
que baseados no real, mas transfigurando-o, recriando-o. provoca no leitor ou expectador diante dos acontecimentos;
quanto de forma interna, como um processo de superação que os
• Aspecto subjetivo: o texto apresenta, normalmente, o olhar
próprios personagens devem enfrentar em suas jornadas. Assim, a
pessoal do artista, suas experiências e emoções.
passagem do estado agonia de um personagem para sua redenção
• Ênfase na função poética da linguagem: o texto literário já evidencia uma catarse.
manipula a palavra, revestindo-a de caráter artístico.
O filósofo grego Aristóteles debruçou-se sobre a literatura
O artista apresenta na obra literária uma postura diante do e ligava-a ao conceito de imitação, segundo ele, mímese. A
mundo e das aspirações do homem. arte mimética buscava imitar a vida e nessa relação buscava a
fidelidade absoluta. Era isso que levava o texto ao encontro com
a Verdade. Com o passar do tempo, essa ideia de arte imitativa foi
VEROSSIMILHANÇA INTERNA E perdendo força, apesar de ainda manter relação com as emoções
EXTERNA que provoca e a própria recriação da realidade que caracterizam os
conceitos de arte mais atuais.
Em muitas histórias, há “manifestações” de forças divinas ou
ocultas que levam um personagem à uma revelação, entendimento
súbito de sua condição ou compreensão da essência de algo ligado
à problemática da história. Essa intervenção “mágica”, que altera os
rumos dos acontecimentos e opera uma mudança na vida de um
personagem é chamada epifania. Modernamente, autores utilizam-
se de situações cotidianas como mote para a introspecção das
personagens, refundando o conceito grego em bases modernas.
(Ilustrações e texto de Will Eisner para o livro Narrativas gráficas)

Tanto na representação dos caracteres como no entrecho


das ações, importa procurar sempre a verossimilhança
e a necessidade; por isso, as palavras e os atos de uma EXERCÍCIOS
personagem de certo caráter devem justificar-se por sua
verossimilhança e necessidade. PROPOSTOS
(ARISTÓTELES; Arte Poética)

A importância da verossimilhança nas narrativas surgiu como 01. (UNB) A arte indígena no Brasil é mais representativa
preocupação e objeto de estudo desde Aristóteles. De forma geral, das tradições da comunidade em que está inserida que da
o conceito de verossimilhança está relacionado à verdade, ao que personalidade do indivíduo que a faz. É por isso que os estilos de
se apresenta – ou tem aparência − de verdadeiro. seus trabalhos artísticos variam significativamente de uma tribo
para outra. A tendência indígena de fazer objetos bonitos para usar
Esse estudo é fundamental para a literatura. Veja os conceitos na vida tribal pode ser apreciada principalmente
e definições abaixo:
a) na cerâmica, no trançado e na tecelagem.
(...) o objetivo da poesia (e da arte literária em geral) não é
o real concreto, o verdadeiro, aquilo que de fato aconteceu, b) na cerâmica, na tecelagem e na ourivesaria.
mas sim, o verossímil, o que pode acontecer, considerado c) no trançado, na ourivesaria e na cutelaria.
na sua universalidade. d) na cutelaria, na arte corporal e na ourivesaria.
(SILVA, Vítor M. de A. Teoria da literatura. Coimbra: Almedina, 1982.)
e) na arte corporal, na tecelagem e na colagem.

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02. (ENEM) sinais que não atendem apenas às necessidades básicas, como
os animais. O homem inventa sinais, sons e gestos de um valor
simbólico porque remetem a algum significado. Esses sinais
podem ir além das necessidades de sobrevivência (arte, religião).
O elevado nível cultural desse homem já moderno explica seu
sucesso e sua difusão por todo o planeta, com uma ampla
variedade de expressões, mas sempre um único ímpeto criativo.
(Facchini, Fiorenzo. O Homem. São Paulo. Moderna 1997 p.36)

Com base no texto, analise.


I. A arte foi sem sombra de dúvida a primeira forma de expressão
do homem primitivo.
II. Os grupos humanos criaram símbolos para representar o
mundo em que viviam e seu cotidiano.
III. A ausência de documentos escritos deixados pelos seres
humanos da Pré-História nos impede de levantar hipóteses
sobre a forma como viveram.
IV. Embora muitas questões fiquem sem respostas, os vestígios
A pintura rupestre mostrada na figura anterior, que é um patrimônio arqueológicos encontrados têm-nos permitido conhecer parte
cultural brasileiro, expressa do cotidiano Pré-Histórico.
a) o conflito entre os povos indígenas e os europeus durante o Estão corretas apenas as afirmativas
processo de colonização do Brasil. a) I, II, IV b) I, II, III c) II, IV d) III, IV
b) a organização social e política de um povo indígena e a
hierarquia entre seus membros. 06. (ENEM)
c) aspectos da vida cotidiana de grupos que viveram durante a
chamada pré-história do Brasil.
d) os rituais que envolvem sacrifícios de grandes dinossauros
atualmente extintos.
e) a constante guerra entre diferentes grupos paleoíndios da
América durante o período colonial.

03. (ENEM) Folclore designa o conjunto de costumes, lendas,


provérbios, festas tradicionais/populares, manifestações artísticas
em geral, preservado, por meio da tradição oral, por um povo ou
grupo populacional. Para exemplificar, cita-se o frevo, um ritmo
de origem pernambucana surgido no início do século) (Ele a
caracterizado pelo andamento acelerado e pela dança peculiar,
feita de malabarismos, rodopios e passos curtos, além do uso,
como parte da indumentária, de uma sombrinha colorida, que
permanece aberta durante a coreografia.
As manifestações culturais citadas a seguir que integram a mesma
categoria folclórica descrita no texto são
a) bumba-meu-boi e festa junina. d) maracatu e cordel.
b) cantiga de roda e parlenda. e) catira e samba.
c) saci-pererê e boitatá.

04. (ENEM) As pinturas rupestres no paleolítico, tinham um


significado mágico porque
a) expressavam o culto aos deuses.
b) expressavam os valores religiosos.
c) expressavam deuses antropozoomórficos.
d) possuíam um caráter expressionista.
e) ao representar cenas de caça e animais, os homens primitivos
desejavam sucesso na caça.

05. (UERN) Leia o texto que ressalta o caráter simbólico da arte


rupestre.

A arte rupestre
O homem Paleolítico deixou-nos belíssimas representações
nas paredes das cavernas e objetos decorativos com fino senso
artístico. O cuidado com os mortos, já comum entre os homens
de Neanderthal, é enriquecido com símbolos, isto é, sinais com
significados, que remetem a uma vida futura. [...] Ele recorre a

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LITERATURA 01 OS HOMENS, A ARTE E A LITERATURA

A imagem integra uma adaptação em quadrinhos da obra Grande 08. (UERJ) Escrever pode ser, ou é, a necessidade de tocar a
sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Na representação gráfica, a realidade que é a única segurança de nosso estar no mundo
inter-relação de diferentes linguagens caracteriza-se por – o existir. É difícil, se não impossível, precisar quando as coisas
a) romper com a linearidade das ações da narrativa literária. começam dentro de nós.
b) ilustrar de modo fidedigno passagens representativas da história. Esse parágrafo relaciona-se com o parágrafo anterior pela
associação de:
c) articular a tensão do romance à desproporcionalidade das
formas. a) registro e dor.
d) potencializar a dramaticidade do episódio com recursos das b) texto e verdade.
artes visuais. c) escrita e passado.
e) desconstruir a diagramação do texto literário pelo desequilíbrio d) literatura e solidão.
da composição.
09. (UERJ)
TEXTO PARA AS QUESTÕES 7 E 8
Porque a realidade é inverossímil
GAVETA DOS GUARDADOS Escusando-me1 por repetir truísmo2 tão martelado, mas movido
1
A memória é a gaveta dos guardados. Nós somos o que pelo conhecimento de que os truísmos são parte inseparável da boa
somos, não o que virtualmente seríamos capazes de ser. retórica narrativa, até porque a maior parte das pessoas não sabe
2
Minha bagagem são os meus sonhos. Fui o poeta das ruas, ler e é no fundo muito ignorante, rol no qual incluo arbitrariamente
das vielas silenciosas do Rio, antes que se tornasse uma cidade você, repito o que tantos já dizem e vivem repetindo, como quem
assolada pela violência. Sempre fui ligado à terra, ao meu pátio. usa chupetas: a realidade é, sim, muitíssimo mais inacreditável
do que qualquer ficção, pois esta requer uma certa arrumação
3
No Rio Grande do Sul estou no colo da mãe. Creio que minha fase falaciosa3, a que a maioria dá o nome de verossimilhança. Mas ocorre
atual, neste momento, em 1993, reflete a eterna solidão do homem. precisamente o oposto. Lê-se ficção para fortalecer a noção estúpida
4
A obra só se completa e vive quando expressa. Nos meus de que há sentido, lógica, causa e efeito lineares e outros adereços que
quadros, o ontem se faz presente no agora. Lanço-me na pintura e integrariam a vida. Lê-se ficção, ou mesmo livros de historiadores ou
na vida por inteiro, como um mergulhador na água. A arte é também jornalistas, por insegurança, porque o absurdo da vida é insuportável
história. E expressa a nossa humanidade. A arte é intemporal, embora para a vastidão dos desvalidos que povoa a Terra.
guarde a fisionomia de cada época. Conheci em Paris um escultor (João Ubaldo Ribeiro. Diário do Farol. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002.)
brasileiro, bolsista, que não frequentava museus para não perder a
Glossário:
personalidade, esquecendo que só se perde o que se tem.(...)
1
escusando-me: desculpando-me
A memória é a gaveta dos guardados, repito para sublinhar. O
5

clima dos meus quadros vem da solidão da campanha, do campo,


2
truísmo: verdade trivial, lugar comum
onde fui guri e adolescente. Na velhice perde-se a nitidez da visão 3
falaciosa: enganosa, ilusória
e se aguça a do espírito.
"os truísmos são parte inseparável da boa retórica narrativa, até
6
A memória pertence ao passado. É um registro. Sempre que
a evocamos, se faz presente, mas permanece intocável, como um porque a maior parte das pessoas não sabe ler" (l. 1-3)
sonho. A percepção do real tem a concreteza, a realidade física, O narrador justifica a necessidade de truísmos pela dificuldade de
tangível. Mas como os instantes se sucedem feito os tique-taques
leitura da maior parte das pessoas.
do relógio, eles vão se transformando em passado, em memória,
e isso é tão inaferrável* como um instante nos confins do tempo. Encontra-se implícita no argumento a noção de que o leitor
iniciante lê melhor se:
Escrever pode ser, ou é, a necessidade de tocar a realidade que
7

é a única segurança de nosso estar no mundo - o existir. É difícil, a) estuda autores clássicos;
se não impossível, precisar quando as coisas começam dentro de b) conhece técnicas literárias;
nós. (...) c) identifica ideias conhecidas;
8
A vida dói... Para mim o tempo de fazer perguntas passou. d) procura textos recomendados.
Penso numa grande tela que se abre, que se me oferece intocada,
virgem. A matéria também sonha. Procuro a alma das coisas. Nos
meus quadros o ontem se faz presente no agora. A criação é um 10. (UERJ)
desdobramento contínuo, em uníssono com a vida. O auto-retrato (…) Não resguardei os apontamentos obtidos em largos dias
do pintor é pergunta que ele faz a si mesmo, e a resposta também e meses de observação: num momento de aperto fui obrigado a
é interrogação. A verdade da obra de arte é a expressão que ela nos atirá-los na água. Certamente me irão fazer falta, mas terá sido
transmite. Nada mais do que isso! uma perda irreparável?
FOLHA DE SÃO PAULO, 09/05/1998 Quase me inclino a supor que foi bom privar-me desse material.
(CAMARGO, Iberê. In: NESTROVSKI, Arthur (Org.). "Figuras do Brasil: 80 autores em 80
anos de Folha". São Paulo: Publifolha, 2001.)
Se ele existisse, ver-me-ia propenso a consultá-lo a cada instante,
mortificar-me-ia por dizer com rigor a hora exata de uma partida,
A memória é a gaveta dos guardados. quantas demoradas tristezas se aqueciam ao sol pálido, em manhã
de bruma, a cor das folhas que tombavam das árvores, num pátio
07. (UERJ) branco, a forma dos montes verdes, tintos de luz, frases autênticas,
A frase acima expressa a importância das experiências gestos, gritos, gemidos. Mas que significa isso?
individuais na criação artística. A passagem do texto em que mais Essas coisas verdadeiras não ser verossímeis. E se
facilmente se percebe o vínculo entre memória e obra de arte é: esmoreceram, deixá-las no esquecimento: valiam pouco, pelo
a) “A obra só se completa e vive quando expressa.” menos imagino que valiam pouco. Outras, porém, conservaram-se,
cresceram, associaram-se, e é inevitável mencioná-las. Afirmarei
b) “Nos meus quadros, o ontem se faz presente no agora.”
que sejam absolutamente exatas? Leviandade.
c) “Lanço-me na pintura e na vida por inteiro.”
(…) Nesta reconstituição de fatos velhos, neste esmiuçamento,
d) “A percepção do real tem a concreteza, a realidade física.” exponho o que notei, o que julgo ter notado. Outros devem possuir

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lembranças diversas. Não as contesto, mas espero que não


recusem as minhas: conjugam-se, completam-se e me dão hoje
impressão de realidade (…)
(RAMOS, Graciliano. Memórias do cárcere. Rio, São Paulo: Record, 1984.)

O fragmento transcrito expressa uma reflexão do autor-narrador


quanto à escrita de seu livro contando a experiência que viveu
como preso político, durante o Estado Novo.
No que diz respeito às relações entre escrita literária e realidade, é
possível depreender, da leitura do texto, a seguinte característica
da literatura:
a) revela ao leitor vivências humanas concretas e reais.
b) representa uma conscientização do artista sobre a realidade.
c) dispensa elementos da realidade social exterior à arte literária.
d) constitui uma interpretação de dados da realidade conhecida.

GABARITO
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
01. A 03. E 05. A 07. B 09. C
02. C 04. E 06. D 08. C 10. D

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