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4° SEMINÁRIO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

27 e 28 de setembro de 2018, UNILA-FOZ DO IGUAÇU

03. História das Relações Internacionais e da Política Externa

HEGEMONIA MILITAR NÃO TRADICIONAL: O CASO DO REINO UNIDO (1816-1830)

José Renato Ferraz da Silveira – Universidade Federal de Santa Maria

FOZ DO IGUAÇU

2018
O presente estudo tentará apresentar uma abordagem quali-quantitativa sob a perspectiva
da teoria da estabilidade hegemônica, identificando o exercício de hegemonia militar não
tradicional pelo Reino Unido durante o período de 1816-1830. No período escolhido
notamos a ausência de guerras centrais e localizadas, a redução dos efetivos militares do
Reino Unido, o entusiasmo decrescente pelas intervenções militares na Europa e no mundo
extra europeu e um notável grau de predomínio global em 1815, graças à sua combinação
de domínio naval, crédito financeiro, habilidade comercial e diplomacia de alianças.
Utilizaremos do método de abordagem hipotético dedutivo e empregando quadros e revisão
bibliográfica (artigos internacionais, nacionais, livros, teses e dissertações). O estudo apoia-
se numa pesquisa descritiva, da interação entre os recursos econômicos e militares e
buscaremos demonstrar que o Reino Unido exerceu uma forma não tradicional de
hegemonia militar, principalmente, a partir de critérios não tradicionais: exército permanente
de pequenas proporções, força naval robusta, império colonial em expansão e sem rival,
controle e domínio das finanças.

Palavras-chave: Hegemonia Militar; Reino Unido; Potências.


1 Introdução

A história das Relações Internacionais é marcadamente caracterizada como uma luta


pelo poder e pela ordem. Potências ascendem e declinam. Potências fazem alianças ou
entram em conflito. Vale ressaltar que o poder de uma potência pode ser medido de maneira
relativa a outros atores do sistema em três esferas – cultural, econômica e militar.
Quando o país goza de amplos recursos em todas as esferas acima citadas e é
superior – conjuntamente - aos demais países, ele poderá exercer a hegemonia1. Para
Keohane (APUD Jackson e Sorensen, 2007, p. 269), um país que busca ser dominante
“além do poder militar, é necessário ter controle sobre quatro conjuntos de recursos
econômicos: matérias-primas, capital, mercados e a vantagem competitiva do hegemon na
produção de bens de alto valor”.
O presente estudo tentará apresentar uma abordagem quali-quantitativa sob a
perspectiva da teoria da estabilidade hegemônica2, identificando o exercício de hegemonia
militar não tradicional pelo Reino Unido3 durante o período de 1816-1830. No período
escolhido notamos a ausência de guerras centrais e localizadas, a redução dos efetivos
militares do Reino Unido, o entusiasmo decrescente pelas intervenções militares na Europa
e no mundo extra europeu e um notável grau de predomínio global em 1815, graças à sua
combinação de domínio naval, crédito financeiro, habilidade comercial e diplomacia de
alianças. Utilizaremos do método de abordagem hipotético dedutivo e empregando quadros
e revisão bibliográfica (artigos internacionais, nacionais, livros, teses e dissertações). O
estudo apoia-se numa pesquisa descritiva, da interação entre os recursos econômicos e
militares e buscaremos demonstrar que o Reino Unido exerceu uma forma não tradicional
de hegemonia militar, principalmente, a partir de critérios não tradicionais: exército
permanente de pequenas proporções, força naval robusta, império colonial em expansão e
sem rival, controle e domínio das finanças.
Com o objetivo de demonstrar a forma não tradicional de hegemonia militar exercida
pelo Reino Unido, dividiremos em duas partes o paper: a) contexto histórico – o século XIX
(considerado como “o século da paz”); b) apresentar a forma não tradicional de hegemonia
1
A origem primeira do conceito de hegemonia repousa na ideia de imposição da vontade por
intermédio da força armada. Nas relações internacionais contemporâneas, o termo está relacionado à
imposição de poder preponderante de um Estado e seus interesses sobre sistemas internacionais
regionais ou globais.
2
A teoria da estabilidade hegemônica está relacionada ao conceito de hegemonia. Essa teoria
ganhou corpo no campo da economia da economia da politica internacional por autores como
Stephen Krasner, Robert Keohane, Robert Gilpin e Charles Kindleberger, entre outros. A teoria parte
do pressuposto que o poder hegemônico, ou a concentração de poder, está ligado ao funcionamento
eficaz do regime internacional.
3
Por razões práticas, utilizaremos as denominações Inglaterra, Reino Unido e Grã Bretanha. A razão
por essa opção se deve ao fato das fontes consultadas utilizarem como termos sinônimos.
militar exercido pelo Reino Unido no período de 1816-1830 através dos traços
característicos, quadros comparativos e outros elementos pertinentes para evidenciar a
hipótese do presente paper.

2) O século XIX: o século da paz

De acordo com Cervo, 1815 é um marco histórico para as relações internacionais


contemporâneas. Em virtude de três aspectos: a) as decisões do Congresso de Viena que
configuram uma nova ordem internacional; b) impulso econômico e político dos europeus, o
sistema internacional ampliou-se da Europa para o mundo inteiro. c) na década de 1860-
1870, o surgimento do Império Alemão.
Para Dall’ Agnol (2016, p. 10):

Ainda que tenham ocorrido guerras locais e limitadas na Europa no “século


da paz”, autores como Kennedy (1997), Kissinger (1999) e Hobsbawm
(2009) costumam as reduzindo a questões de nacionalismos e ajuste de
fronteiras. Entende-se, aqui, por guerras locais e limitadas no sistema
regional europeu do século XIX, as seguintes guerras: i) Guerra da Crimeia
(1853-1856); ii) Guerra Sardo-Austríaca (1859); iii) Guerra Austro-Prussiana
(1866) e; iv) Guerra Franco-Prussiana (1870-1871). Karl Polanyi (2000)
afirma que o século XIX produziu um fenômeno sem precedentes nos anais
da civilização ocidental: uma paz que durou cem anos.

Podemos, então, afirmar que o fim das guerras napoleônicas marcou o início de um
sistema internacional baseado numa multipolaridade e no equilíbrio de poder entre as
Potências europeias que durou cem anos até a Primeira Guerra Mundial. Sem dúvida, foi o
mais longo período de paz da história da Europa.
Para Kissinger (1999, p. 81):

Após o Congresso de Viena, a Europa gozou do mais longo período de paz


que jamais teve. Durante 40 anos, não houve uma guerra sequer entre as
Grandes Potências, e após a Guerra da Crimeia, em 1854, nenhuma grande
guerra aconteceu durante os 60 anos seguintes. O acordo de Viena seguiu
o Plano Pitt tão literalmente que, quando Catlereagh o submeteu ao
parlamento, anexou um esboço do projeto inglês original para mostrar como
fora cumprido quase na íntegra.

O Congresso de Viena que reconstruiu o mapa da Europa em 1815 o fizeram


receosos em evitar que a “(velha) nova ordem” sofresse novos abalos. De modo paradoxal,
esta ordem internacional, criada em nome do equilíbrio de poder – mais que qualquer outra
em período anterior – apoiava-se no mínimo de poder. Todos os negociadores – príncipe
von Metternich (Áustria), príncipe von Hardenberg (Prússia), Talleyrand (França), czar
Alexandre I (Rússia), Lord Castlereagh (Inglaterra) – eram adversários da Revolução e
estavam conscientes de que a Europa de 1815 não poderia voltar a ser aquela de 1792.
Eles estavam determinados e inclinados a evitar novas crises. Dessa forma, utilizaram dois
princípios: o da legitimidade e do equilíbrio europeu. Com o resultado dos debates e
discussões de Viena, o mapa da Europa sofreu alterações importantes:
a) A região que corresponde a atual Alemanha, por exemplo, passou de 300 Estados
para 38, unidos estes numa nova entidade chamada Confederação Germânica;
b) A França foi privada das suas conquistas, mas recebeu de volta suas fronteiras
“antigas” – isto é pré-revolucionárias;
c) A Áustria cresceu na Itália;
d) A Prússia cresceu na região da Alemanha e rivalizou com a Áustria na liderança da
Confederação Germânica;
e) A Inglaterra limitou seus ganhos territoriais ao Cabo da Boa Esperança, na ponta sul
da África.

Fonte: Wikimedia Commons (https://commons.wikimedia.org/wiki/ File:Europe_1815_map_de.png)

Dois tratados pós-Congresso de Viena requerem atenção. O primeiro é o Tratado da


Santa Aliança, firmado entre o Czar da Rússia, o Imperador da Áustria e o Rei da Prússia,
em 26 de setembro de 18154.

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O mentor da Santa Aliança foi o Czar Alexandre. Imbuído de certezas conservadoras e “iluminado”
pelo misticismo, o czar russo articulou a Santa Aliança em contraposição a Quádrupla Aliança.
O segundo é o tratado conhecido como o da Quádrupla Aliança, entre os 4 Grandes
(Inglaterra, Rússia, Áustria e Prússia) em 20 de novembro de 18155.
Na visão de Kissinger (1999, p. 86-87):

No início do século XIX, a França era olhada com a mesma apreensão que
viu a Alemanha do século XX – como potência cronicamente agressiva e
inerentemente desestabilizadora. Devido a isso, os estadistas em Viena
forjaram a Quádrupla Aliança, com o objetivo de cortar no nascedouro, pela
força incontrastável, quaisquer tendências francesas ainda em brotação. Se
os vencedores reunidos em Versalhes, em 1918, criassem uma aliança
igual talvez o mundo não tivesse uma Segunda Guerra Mundial.
A Santa Aliança era totalmente diferente; a Europa não assistira coisa igual
desde que Ferdinando II deixara o trono do Sacro Império Romano, quase
dois séculos antes. Foi proposta do czar russo, que não conseguiu
esquecer a missão auto imposta de revisão do sistema internacional e a
reforma de seus participantes (...) A Santa Aliança foi o aspecto mais
original do acordo de Viena.

A partir de 1815, a ação dos países europeus intensificou-se em escala mundial. Por
exemplo, os objetivos da política externa britânica eram pela ampliação do liberalismo
político-econômico, comércio e constitucionalismo. Os britânicos atuaram – direta e
indiretamente – na independência das colônias espanholas e portuguesas na América e na
organização dessas novas nações americanas. De forma estratégica, anexou territórios
ultramarinos que lhe garantiam uma maior integração entre os centros de seu crescente
império global (Colônia do Cabo e Ceilão, e vantagens geoestratégicas no controle do
Mediterrâneo, como Gibraltar e as Ilhas Iônicas).
Os russos estavam atentos e interessados na decadência e da fragmentação
territorial do Império Otomano. A saída para as águas quentes era uma obsessão russa de
expansão e desenvolvimento da força naval. Isso explica a rivalidade entre a Inglaterra e
Rússia no século XIX.
Na concepção de Fernandes (2011, p. 81): “A tradição inglesa na política externa,
marcada pela cautela e o pragmatismo, não poderia ser conciliada ao milenarismo russo,
que viria a se manifestar de forma secular no século seguinte na forma do comunismo
soviético”. A Guerra da Crimeia seria um reflexo desse choque de interesses.
Por fim, a Europa que emergiu do Congresso de Viena era legitimista, clerical,
desigual, aristocrática e, principalmente, reacionária. Vale frisar que os movimentos ligados
ao “fantasma da revolução de 1789” não desapareceram.

Baseada em princípios cristãos e objetivava a reação a movimentos revolucionários e liberais. Isso


levaria ao afastamento da Inglaterra de seus aliados continentais.
5
Obra de Castlereagh, consistia em uma aliança defensiva e que deteria a repetição de uma tentativa
de hegemonia francesa no continente. O objetivo era isolar a França e não permitir um
recrudescimento da agressividade francesa.
O século XIX testemunhou um longo desenrolar de revoluções 6 e contrarrevoluções.
Destaca Cervo (2008, p. 46-47):

A luta entre hegemonia e anti-hegemonia (coalizões, guerra, balança,


acordos, regras de controle) movimentou o pêndulo das relações
internacionais, permitindo visualizar teoricamente um espectro entre o
triunfo absoluto da independência e o triunfo da hegemonia absoluta. Na
verdade, a Europa evoluiria, no início do século XIX, de uma sociedade
internacional de múltiplas independências com um hegemonia, o Império
Napoleônico, para uma sociedade internacional de múltiplas
independências moderadas e administradas por um pool hegemônico de
controle político, o Concerto europeu. Segundo as palavras de Watson,
esse concerto seria “uma hegemonia temperada pela balança do poder,
portanto uma síntese das duas tradições opostas da procura europeia pela
ordem.

Numa época de “paz conciliada”, Santa Aliança, Quádrupla Aliança, isolamento


político francês, de revoluções e contrarrevoluções, o Reino Unido exerceria uma forma não
tradicional de hegemonia militar. E o pilar de sustentação da política externa do Reino Unido
foi a projeção do poder naval. Detinham o expertise superior dos britânicos, a excelência
dos oficiais, a genialidade dos almirantes, a mais avançada tecnologia naval e a maior
marinha da época. Na visão de Fernandes (2011, p. 85-86):

Desenvolveu-se uma frota numerosa e homogênea, com uma extensa rede


de apoio logístico que contava com uma estrutura de dockyards,
recrutamento, treinamento e abastecimento. A Royal Navy progrediu da
liderança exercida de maneira amadora, se por vezes heroica e ate eficaz,
ao liderazgo de seamen profissionais. Deixou de ser uma frota heterodoxa e
amorfa para tornar-se uma força nacional sustentada e votada pelo
parlamento. Enfim, a Royal Navy havia se tornado indispensável para
atuação internacional da Inglaterra, revelando-se um instrumento eficaz de
política nacional. Estas características a distinguiam das outras potências
do cerne do sistema internacional no cenário europeu.

3) Forma não tradicional de hegemonia militar (1816-1830)

Desde a ascensão do primeiro ministro britânico Pitt (1784), a Inglaterra já havia


estabelecido as bases de seu poder: economia forte, comércio global, estabilidade e
sofisticação política, liderança em nível tecnológico, setor financeiro e marinha poderosa.
Com esses domínios e a sustentação da supremacia naval, e dada a sua deficiência em
forças terrestres, não é surpresa que o poder naval inglês tenha sido um dos vetores da
política externa desse período. Como bem observado pelo Duque de Wellington: “Uma frota
de navios de guerra britânicos são os melhores negociadores da Europa”.
Vale destacar que a Segunda Revolução Industrial só melhorou a posição inglesa.

6
Houve três ondas revolucionárias: 1820, 1830 e 1848.
Entre 1760 e 1830, o Reino Unido foi responsável por cerca de “dois terços
do crescimento da produção industrial da Europa”, e sua parcela da
produção mundial de manufatura pulou de 1,9% a 9,5%, nos 30 anos que
se seguiram, a expansão industrial britânica elevou esse número para
19,9%, apesar da difusão da nova tecnologia a outros países do Ocidente.
Mais ou menos em 1860, provavelmente a época que o país alcançou seu
zênite em termos relativos, o Reino Unido produziu 53% do ferro do mundo,
e 50% do carvão e lignita, tendo consumido pouco menos da metade do
algodão bruto produzido pelo mundo. “Com 2% da população mundial e
10% da população da Europa, o Reino Unido parece ter evidenciado uma
capacidade, nas indústrias modernas, igual a 40-45% do potencial do
mundo, e 55-60% do potencial da Europa. Seu consumo de energia de
fontes modernas (carvão, lignita, petróleo) em 1860 era cinco vezes o dos
Estados Unidos ou Prússia/Alemanha, seis vezes o da França e 155 vezes
o consumo da Rússia! A Grã-Bretanha, sozinha, era responsável por um
quinto do comércio mundial, mais de dois quintos do comércio e bens
manufaturados. Mais de um terço da marinha mercante do mundo usava a
bandeira britânica, e essa parcela aumentava constantemente (KENNEDY,
1989, p. 151).

Esses dados, essas estatísticas evidenciam uma posição de domínio sem igual pela
Grã-Bretanha, mas vale ressaltar uma observação que se apoia na análise de Kennedy
(1989, 151-152):

A crescente força industrial não se organizou, nas décadas posteriores a


1815, de modo a dar estado um acesso rápido ao equipamento militar e aos
contingentes humanos como, digamos, ocorria nos domínios de Wallenstein
na década de 1630, ou como a economia nazista faria. Pelo contrário, a
ideologia da economia política do laissez-faire, que floresceu juntamente
com esse começo da industrialização, pregava as causas da paz eterna,
dos reduzidos gastos governamentais (especialmente com a defesa) e da
redução dos controles estatais sobre a economia e o indivíduo. Talvez fosse
necessário, como Adam Smith havia admitido em A Riqueza das Nações
(1776), tolerar a manutenção de um exército e de uma marinha, a fim de
proteger a sociedade britânica “da violência e invasão de outras sociedades
independentes”; mas como as forças armadas per se eram “improdutivas” e
não contribuíam para a riqueza nacional da mesma maneira que uma
fábrica ou uma fazenda, deveriam ser reduzidos ao menor nível possível,
adequado a segurança nacional. Supondo (ou pelo menos, esperando) que
a guerra fosse um último recurso, e cada vez menos provável no futuro, os
discípulos de Smith, e ainda mais de Richard Cobden, se teriam horrorizado
à ideia de organizar o estado para a guerra. Em consequência, a
“modernização” que ocorreu na indústriaa e nas comunicações britânicas
não teve pararelo em melhoramentos para o exército que (com algumas
exceções) estagnou nas décadas posteriores a 1815.

Ou seja, os gastos com a defesa foram mantidos no nível mínimo. Durante os 50


posteriores a 1815, as forças armadas consumiram apenas 2-3% do PNB. Esses números
seriam baixos para um país de ambições e meios modestos. Como pondera Kennedy (1989,
p. 152): “para um estado que podia “governar as ondas”, que dispunha de um império
enorme, espalhado, e que ainda mantinha um grande interesse na preservação do equilíbrio
europeu de forças, eram realmente notáveis”.

Quadro 1. Efetivos militares das potências 1816-1830

1816 1830

Reino Unido 255.000 140.000

França 132.000 259.000

Rússia 800.000 826.000

Prússia/Alemanha 130.000 130.000

Império Habsburgo 220.000 273.000

Estados Unidos 16.000 11.000

Figura 1 - Efetivos Militares (Sistema Regional Europeu: 1816-1872)

Fonte: Elaboração do autor (Augusto César Dall’Agnol) a partir de dados de CORRELATES OF WAR-
COW (2016a).

Figura 2 - Gastos Militares das Potências Europeias (UK£ 1000.00) (1816-1872)

Fonte: Elaboração do autor (Augusto César Dall’Agnol) a partir de dados de CORRELATES OF WAR-
COW (2016a).

Figura 3 - Capacidades dos Estados do Sistema Regional Europeu (1816-1872)


1816
1872 1818
1870 1820
1868 1822
1866 1824

1864 1826
Grã-Bretanha
1862 1828
Rússia
1860 1830 França
Áustria/Áustria-Hungria
1858 1832 Prússia/Alemanha
Piemonte/Itália
1856 1834

1854 1836

1852 1838
1850 1840
1848 1842
1846 1844

Fonte: Elaboração do autor (Augusto César Dall’Agnol) a partir de dados de CORRELATES OF WAR-
COW (2016a).

Houve um entusiasmo decrescente pelas intervenções militares na Europa e no


mundo extra europeu. Era desejo dos britânicos ao manter uma ordem mundial econômica
liberal, não empregar seu poder militar e manter uma política de laissez-faire. Como afirma
Krasner, na teoria da estabilidade hegemônica, o país hegemônico provê uma estrutura
aberta de relações de tal forma que assegure aos demais países acesso a mercados, sem
com eles competir por mercados terceiros. Os resultados são os elementos básicos da
governança internacional: repressão à agressão, implementação de comércio livre de
barreiras e impedimentos de toda sorte e até mesmo a garantia de uma moeda de troca
internacional.
Um aspecto notável sobre essa forma incomum de exercício hegemônico são os
relatos de militares e funcionários políticos – em lugares como a Índia – que reclamavam da
inadequação das forças que comandavam, dada a extensão dos territórios que controlavam.
Portanto, a Grã- Bretanha era uma grande potência de um tipo diferente, “e que sua
influência não se podia medir pelos critérios tradicionais da hegemonia militar” (KENNEDY,
1989, p. 153). Os britânicos eram fortes em outras áreas, vistas como muito mais valiosas
do que um exército permanente, de grandes proporções, e oneroso:
a) Naval: A marinha britânica ocupou após 1815 – por um século – o primeiro lugar no
mundo. Não houve rival a altura.
b) Império colonial em expansão: Não havia rivais sérios. Houve conquistas
estratégicas/comerciais e o império continuou a crescer. O modo de dominação
indireta ajudou nas iminentes resistências nativas.
c) Finanças: os britânicos souberam explorar seu crédito nos centros bancários e nos
mercados de títulos. As melhorias nas instituições financeiras do país estimularam os
ingleses a investir no exterior. Esse montante investido além-mar não só tornava a
Grã-Bretanha ainda mais rica, como dava estímulo constante ao comércio e às
comunicações globais.

4) Considerações finais

Consideramos que o Reino Unido exerceu uma forma especial de hegemonia não
tradicional. Com poucos recursos utilizados para as forças militares e pouca população em
comparação com as demais potências, os britânicos optaram por manter uma força naval
irresistível, um império colonial em expansão, e tendo o domínio das finanças. Notamos que
a teoria da estabilidade hegemônica se aplica em virtude dos britânicos buscarem assegurar
uma ordem liberal, implementação de comércio livre de barreiras e impedimentos de toda
sorte e até mesmo a garantia de uma moeda de troca internacional (ouro).
5) Referências

DALL’AGNOL, Augusto C. Guerras locais e limitadas: mudanças no sistema regional


europeu no ''século da paz'' (1853-1871). Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em
Relações Internacionais) – Centro de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Federal de
Santa Maria, Santa Maria, 2016. Disponível em:
<http://coral.ufsm.br/gecap/images/tccs/DALLAGNOL-2016.pdf>.

FERNANDES, Daniel Costa. A política externa da Inglaterra: análise histórica e orientações


perenes. Brasília, Fundação Alexandre Gusmão, 2011.

GONÇALVES, Joanisval Brito; ODON, Tiago Ivo; FILHO, Dario Alberto de Andrade.
Introdução às Relações Internacionais: teoria e história. Brasília, Senado Federal, Instituto
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HOBSBAWM, Eric. A era dos impérios. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988.

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rev. e ampl. Barueri, Manole, 2010.

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