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RESUMO
ABSTRACT
This work has as problematic the study of the growth of the neopentecostal movement in the
perspective of the social fields of Pierre Bourdieu. According to data (IBGE,) the exponential
growth of Protestantism with an emphasis on neopentecostalism in Brazil is evident, and this
changes a whole web of factors in our society. The objective of this work is to study this growth
and uses the methodology of Pierre Bourdieu, on the social fields to reach a greater clarification
on the problematic. The work concludes that the mechanisms of symbolic value in the Brazilian
religious field have changed and therefore, this religious group emerges as a more efficient
strategy regarding its numerical growth. The theory of social fields reveals the dynamics of the
field and the evident exchange of the Brazilian religious field.
1
Graduando em História pelo Centro Universitário Toledo
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Professor Doutor, em História Social pela UNESP/Assis-SP, graduado em Ciências econômicas, professor do
Centro Universitário Toledo de Araçatuba.
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INTRODUÇÃO
É de notório saber que os aspectos religiosos inspiram comportamentos, políticas,
expressões culturais, morais e alteram até mesmo as características de um povo (CHAVES, et
al. 2011). Poderíamos pensar em diversos exemplos na história em que a realidade de um povo
ou nação foi alterada por uma influência religiosa. No Brasil, desde meados do século XX, um
fenômeno religioso alterou a realidade da nação; o exponencial crescimento do protestantismo
- pentecostal e neopentecostal (MARIANO, 2013).
Se no final do século XX já se antevia uma maioria evangélica no país, hoje esses dados
flertam com a materialização do previsto há décadas, alcançando o número de 29% da
população brasileira. Isso significa sete pontos percentuais a mais do que o Censo 2010 do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística registrou (PIERUCCI, 2004). Segundo a mesma
instituição de pesquisa, havia 3,9 milhões de pentecostais no Brasil em 1980, 8,8 milhões em
1991 e 17,7 milhões em 2000, ou seja, um crescimento de mais de 400% em 20 anos. Entretanto,
quais são os fundamentos deste crescimento? Como se desenvolve, no campo religioso
institucional, essa expansão numérica? Quais são os discursos que fazem com que a igreja
evangélica brasileira se torne este fenômeno histórico de crescimento?
Em um primeiro momento vamos estudar a história do protestantismo/pentecostalismo
no Brasil através de uma abordagem histórica e sociológica por meio da teoria dos campos
sociais de Bourdieu para chegarmos a uma maior compreensão deste fenômeno de crescimento.
Além de Bourdieu, usaremos alguns outros autores como Proença, Mariano, Fonseca, Campos
e Preston, que escreveram elucidativas obras sobre os caminhos que o “evangelicalismo”
protestante percorreu até nossos dias. Sendo assim, com este embasamento histórico,
prosseguiremos em direção ao recorte principal de análise, que são as relações religiosas
internas nas comunidades cristãs.
É relevante que entendamos de maneira preliminar o que é campo social para Bourdieu.
O campo social é um espaço estruturado em função das distâncias sociais que separam
os agentes. Os indivíduos são posicionados neste espaço segundo sua maior ou menor
dotação em capital. A medida que todos cobiçam as posições dominantes, o espaço
social se apresenta como um espaço de lutas de todos. As lutas se centram em questões
específicas no quadro daquilo que Pierre Bourdieu denomina “campos” (Jourdain,
2017. p. 125).
Bourdieu empresta a expressão “capital” de Marx, embora não concorde com ele quanto
a única fonte real de distinção seja econômica (JOURDAIN, 2017), para estabelecer o que ele
chama de “capitais de distinção” (BOURDIEU, 2007). Se todos os agentes dos grupos buscam
ascender no campo, segundo o autor, sempre existirão capitais que serão expressões desta
diferenciação nos agentes que as possui, e de exclusão, ou inferiorização, para quem não as
possui.
Desde Adam Smith considera-se que os homens são motivados pelo interesse próprio
e que agem de acordo com ele pelo ganho financeiro [...] Enquanto Becker enxerga
os indivíduos agindo de acordo com “normas” de custo e lucros calculados, Bourdieu
compreende as ações em termos de interesses, benefícios e perdas culturais e sociais,
além de econômicos (GRENFELL, 2012).
Foi importante também para a pesquisa conseguirmos analisar a relação do ideal pós-
moderno de sucesso, através do conceito de produção (industrial) e do capital, descortinando-
os como agentes fundamentais para geração de uma nova significação metafísica dos valores
religiosos de endomarketing e da lógica de sucesso do campo social religioso (PROENÇA,
2003).
Foi em 7 de março de 1808 que algo realmente significativo aconteceu para a abertura
brasileira à pluralidade religiosa, pois, sob a alegação de refúgio ante a ameaça de invasão
napoleônica, a família real chega ao Brasil, transformando o status de colônia para império e
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Foi em 1889 que as inúmeras denominações cristãs obtiveram sua liberdade legal, por
meio da nova constituição. Ficou estabelecida definitivamente a separação da Igreja com o
Estado, garantindo assim, de maneira legal, a liberdade religiosa e a pluralidade de culto.
Todavia, aquilo que será usado no século XX e XXI como ferramenta de crescimento numérico,
ou seja, a fragmentação como ferramenta de multiplicação de fiéis, no século XIX e início do
século XX, transmitia um tipo de fragilidade e de auto-digladiação das denominações com
disputas teológicas infindáveis e autodestrutivas para o movimento.
O PENTECOSTALISMO
No início do século XX, temos um advento histórico que mudará a realidade religiosa
no Brasil e inaugurará um brutal declínio da hegemonia católica, assim como um novo modelo
de protestantismo capaz de dialogar com seu tempo e ser resposta para as necessidades e valores
da nova e líquida sociedade como diz Simas (2015).
Nesta época, o adestramento de populações nas grandes cidades ocorreu sem que
houvesse uma correspondência na expansão da infraestrutura citadina e na oferta de
emprego e moradias, transformando esse avolumar menos num desenvolvimento e
mais num inchaço, o que acentuou o contraste entre as desigualdades sociais que aí se
fizeram presentes (WISSENBACH, 1998, p.91).
Esse episódio é lembrado como pentecostes, por ter ocorrido no dia em que se
celebrava uma festa judaica que trazia esse nome em alusão aos cinquenta dias que a
separavam da páscoa. Daí a atribuição do nome “pentecostalismo”. A manifestação
de um fenômeno de êxtase, atribuído ao Espírito Santo, semelhantemente àquele
descrito pelo texto bíblico, teria se dado incialmente com a jovem Agnes Ozman,
aluna dirigida por Parhan. (PROENÇA, 2007)
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No ano de 1906, em Los Angeles, EUA, o pregador negro William J. Seymour, membro
da igreja Holiness e inspirado pela experiência de Topeka, começou a realizar cultos
evangelísticos carismáticos em um salão alugado na rua Azuza, 312, onde oficialmente se
fundou a primeira denominação cristã pentecostal chamada de Missão Evangélica da Fé
Apostólica (DE MATOS, 2006).
Para pensarmos em Pentecostalismo no Brasil, é pertinente e apropriada a utilização do
pragmatismo de Paul Preston (1994) como referencial da construção do mesmo. Preston divide
o movimento em 4 partes: 1910 - surgimento do pentecostalismo com Assembleia de Deus e
Congregação Cristã; em meados de 1950 uma segunda etapa em repaginamento deste
pentecostalismo histórico vem através de igrejas como a Deus é Amor e Igreja do Evangelho
Quadrangular; a terceira etapa é de 1980, mais conhecida como neopentecostalismo3,
representada principalmente por um cristianismo midiático e com uma abordagem mais
massiva da teologia da prosperidade; por último, o quarto estágio do pentecostalismo nacional,
de 1990, em uma nova reestruturação com advento do surgimento de uma igreja com pequenos
grupos, com uma mecânica de crescimento mais ligada a uma ideia de progressão geométrica,
um modelo de marketing multi-nível cristão, representado por igrejas como Sara Nossa Terra,
MIR, Igreja da Paz.
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Termo não utilizado pelo autor aqui referenciado
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Segundo Mello (2009), a miséria rural é, por assim dizer, exportada para a cidade, e, na
cidade, a chegada de verdadeiras massas de imigrantes pressionou constantemente a base do
mercado de trabalho urbano. A plutocracia urbana utiliza-se deste excedente de mão de obra
para se autobeneficiar com a diminuição dos salários, objetivando maiores percentuais de lucro.
As possibilidades de ascensão social são muito restritas e a sociedade brasileira
fragilizada ouve a mensagem da prosperidade pelas rádios e posteriormente por meio da TV,
encantando-se com as propostas que absorve. A somatória destes fatores deságua em uma
explosão de crescimento numérico, o discurso maniqueísta traz coesão para a igreja e legitima
um valor de exclusivismo para o movimento, lançando todas as culpas pelo fracasso da nação
na idolatria católica e nas “heresias” e cultos das religiões afro-brasileiras como diz Silva
(2007).
Apesar do crescimento vertiginoso, basicamente cinco igrejas capitalizaram quase todo
este crescimento, então, se o protestantismo se caracteriza (inclusive com as igrejas históricas),
como uma religião que se fragmenta muito, como pode a mesma construir um crescimento tão
impressionante e duradouro?
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Líder e fundador da Igreja Universal do Reino de Deus
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Há um rompimento com os ritos de santificação oriundos dos anos 40-50 do século XX.
Todavia, talvez o mais significativo valor da gestão destas comunidades é o caráter empresarial.
Pastores tornaram-se “coachs”, as atividades são meticulosamente estrategiadas, eventos com
avaliação prévia e posterior. Pastores auxiliares prestam relatórios detalhados das suas
atividades e precisam bater metas de novos membros. As mensagens não podem mais ser
moralistas, nem muito agressivas, pois a maneira como essas comunidades são construídas é
com o ideal de propiciar um espetáculo religioso digno de ser fidelizado a seus “clientes”, ou,
na perspectiva dos campos sociais; seus pretendentes.
Neste quarto grupo de igrejas, uma grande parte das mesmas são novas comunidades e
independentes. Lembremos que no final do século XX, a igreja protestante volta a se
fragmentar, dá crédito ao sacerdócio sem formação acadêmica e estabelece a ética da ruptura.
Como o intermediador da espiritualidade protestante não é o sacerdote e não há uma única
igreja, os vínculos religiosos e até afetivos não se preservam, gerando muitas rupturas, mesmo
nas denominações mais poderosas. A Igreja Mundial do poder de Deus, por exemplo, é fruto
de um cisma da IURD.
A força geradora da pulsão das novas comunidades está arraigada na ideia coletiva de
que a benção de Deus sobre uma igreja significa a multiplicação de seus membros. Se
estendermos como campo religioso da igreja local é influenciado pelo campo pastoral, ficará
ainda mais claro para compreender como os capitais de diferenciação entre os agentes, no caso,
os pastores, estão atreladas as características desta em dois grandes eixos: capital econômico de
distinção e capital simbólico de distinção.
O capital simbólico aqui é o valor de que pastor com maior “rebanho” é o mais
importante ou o mais reverenciado dentro do campo social pastoral. Automaticamente, isso se
capilarizará na igreja local, pois existem cursos, congressos, muito material escrito sobre
crescimento de igreja. Esses pastores tentam ascender, no campo social pastoral, com capitais
de diferenciação dentro do seu grupo, mesmo que seja inconscientemente, e por isso levam suas
comunidades a interiorizarem os valores de ascensão por meio de quem “ganha mais almas”,
gerando assim mais prestígio simbólico social no grupo.
Se antes do pentecostalismo os valores de distinção das igrejas históricas estavam
conectados à piedade, ao batismo, aos cargos e ofícios da comunidade, depois de um século
isso se alterou completamente. Porém, em um tempo tão volátil e mutativo, a igreja protestante
brasileira se resignifica em todos os cenários e se adapta constantemente, quase sempre com
êxito quando o assunto é arrebanhar pessoas.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O movimento protestante no decorrer de século XX demonstrou ter a competência de
se resignificar e colher os louros de suas práxis. Analisando o pentecostalismo em todos os seus
pragmáticos desdobramentos, evidencia-se a capacidade polifônica do movimento em se fazer
ouvido e como o mesmo possui habilidades estratégicas para se ressignificar diante de um
mundo em mutação.
A projeção do IBGE é que, em 2040, o Brasil seja um país de maioria evangélica se os
valores de crescimento estatísticos permanecerem como estão (CARDOSO, 2016) e isso
significa um indicador muito importante para as ciências sociais, pois nos remete à reflexão de
todas as possíveis consequências de uma predominância pentecostal no Brasil. As eleições de
2018 para presidente e para o legislativo, claramente já se manifestou em favor de uma gestão
pública mais rigorosa na perspectiva moral, conservadora e liberal quando o assunto é
economia, pautas presentes no discurso da conhecida bancada da bala.
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Termo contestado por muitos autores, mas aceito por grandes estudiosos sobre o tema como DE MATOS,
2006.
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REFERÊNCIAS
ALVES, R. A volta do sagrado: os caminhos da sociologia da religião no Brasil. Religião
e Sociedade, v. 3, p. 109 – 141, 1978.
BOURDIEU, Pierre. Economia das trocas simbólicas. Rio de Janeiro: Perspectiva, 1996.
FREIRE, Gilberto. Casa grande e senzala: formação da família brasileira sob o regime de
economia patriarcal. 1981.
JOURDAIN, Anne. A teoria de Pierre Bourdieu e seus usos sociológicos. 2017. ed.
Petrópolis: vozes, 2011. v. 1.
PIERUCCI, A. “Bye bye, Brasil”: o declínio das religiões tradicionais no Censo 2000. v.
18, n. 52, p. 17 – 28, 2004.
PRÁTICAS religiosas, errância e vida cotidiana no Brasil (finais do século XIX e inícios
do XX). [S.l.]: Companhia das Letras, 1998.
SANCHI, Paulo. O campo religioso será ainda hoje o campo das religiões? vozes,
petrópolis, p. 81– 131, 1995.
SOUZA, B. M. de. A experiência da salvação: pentecostais em São Paulo. São Paulo: Duas
cidades, 1964.