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Universidade Estadual de Campinas

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas


Programa de Pós-Graduação em Sociologia

Subjetivação de pastores da periferia: onde a margem e o centro


neopentecostal se encontram.

Projeto de Mestrado em Sociologia

Jefferson Arantes de Souza

Campinas - SP
2021
2

Resumo

A proposta desta pesquisa de mestrado é investigar, por meio do método


etnográfico, relações entre neoliberalismo e neopentecostalismo a partir da atividade
pastoral em pequenas igrejas neopentecostais independentes localizadas no Parque Oziel
e Jardim Monte Cristo - Campinas/SP. O neopentecostalismo é uma religião aderente
aos pobres periféricos, composta por uma impressionante variabilidade de igrejas
articuladas por uma teologia da prosperidade; que, por sua vez, tem afinidades com o
ethos neoliberal. Além do levantamento bibliográfico, a pesquisa se amparará no
trabalho de campo, em depoimentos e em entrevistas com pastores evangélicos
independentes, moradores e atuantes nas regiões já mencionadas. A pesquisa tem duplo
enfoque: Por um lado, analisar a relação entre pastores independentes da periferia e o
centro do neopentecostalismo e, por outro, investigar se a atuação desses pastores
marginais contribue para processos de subjetivação neoliberal entre os pobres.

1 Introdução

Compreenderemos, neste projeto, o fenômeno do neoliberalismo não unicamente


como política econômica, mas como maneira de existência que implica formas
específicas de comportamento social na contemporaneidade. Trata-se de um tipo de
racionalidade, incorporada – inclusive - por indivíduos pertencentes a recortes sociais
marginais ao capitalismo, que tem por finalidade garantir estabilidade social por meio da
gestão de tensões locais. (FOUCAULT, 2008; DARDOT e LAVAL, 2016; CÔRTES,
2018).
A racionalidade em questão conduz os indivíduos a se perceberem e agirem no
mundo a partir da lógica da autogestão empresarial, da radical autorresponsabilização de
suas condições de vida e da busca por um aproveitamento produtivo em todas as esferas
da vida. O neoliberalismo é, ao mesmo tempo, uma política que destrói direitos e uma
governança criativa que atravessa esfera pública e privada. Neste projeto, tentaremos
empregá-lo como criador de uma governabilidade organizadora de esferas da sociedade,
inclusive a religião. Nessa governança, criação e destruição operam articuladas,
conectando a plena instrumentalização da vida individual na maximização de ganhos e o
esvaziamento da vida cidadã, fazendo questões estruturais, como desigualdade social e
3

mobilidade social, serem compreendidas unicamente na chave da responsabilização


individual.
Após resultados catastróficos provocados pelo laissez-faire do século XIX,
Estados nação de capitalismo avançado passaram a desempenhar um papel mais
intervencionista1 visando favorecer um ambiente economicamente seguro para as
atividades de mercado. Através de políticas públicas, o público passa a ser bastante
delineado por regras econômicas liberais. Após a Segunda Guerra, visando à diminuição
das tensões sociais geradas pelo agravamento das desigualdades sociais que favoreciam
o florescimento de diversos movimentos populares reivindicatórios, surgiram as
políticas sociais de Estado2 que, paralelamente às políticas intervencionistas de cunho
liberal, tinham como objetivo gerir demandas sociais advindas dos segmentos marginais
à riqueza produzida socialmente. Michel Foucault chamou este fenômeno de
ordoliberalismo alemão, caracterizado pela ação Estatal pautada no incentivo à liberdade
econômica, favorecendo a construção de um ambiente social de concorrência entre
empresas. O intervencionismo da governança do Estado, defendido pelos contratualista
liberais John Locke3 (1689) e Thomas Hobbes4 (1651), permanece razoavelmente
existente até a década de 1970, em que foi se conformando a outro tipo de poder
sobreposto a ele.
Segundo Dardot e Laval, “um Estado não deve mais ser julgado por sua
capacidade de assegurar sua soberania sobre um território (...), mas pelo respeito que
demonstra às normas jurídicas e “boas práticas” econômicas da governança” (DARDOT
e LAVAL, 2016, p. 276).
Em meados dos anos de 1970, com o desequilíbrio da balança geopolítica,
resultado do enfraquecimento econômico das potências socialistas que propositavam
uma ordem social mais distributiva, a economia capitalista, de caráter concentracionista,
foi se tornando hegemônica e globalista5 (1999). Esse novo estado de coisas, gestado
nos governos Thatcher em 1979 e Reagan em 1981, desembocou poucos anos depois na
ascensão política da ideologia neoliberal pelo mundo ocidental.

1
Keynesiano, desenvolvimentista.
2
Estado social.
3
LOCKE, J. Segundo tratado sobre o governo civil. Tradução: Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2006.
4
HOBBES, T. Leviatã: ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. Tradução: Alex Marins. São
Paulo: Martin Claret, 2006.
5
BECK, Ulrich. O que é a globalização? Equívocos do globalismo respostas à globalização. São Paulo: Paz e
terra, 1999.
4

Para além da adequação das políticas públicas ao princípio basilar da livre


concorrência, o aprofundamento do capitalismo na contemporaneidade foi denominado
por Foucault como neoliberalismo americano. Nele, a lógica econômica é estendida a
todas as esferas sociais, tornando os indivíduos "sujeitos neoliberais". Agora, esse
sujeito passa a se autogovernar a partir das regras econômicas dissipadas pela sociedade
(FOUCAULT, 2008). Em suma, trata-se de um processo de incorporação, pelo
indivíduo, do espírito da empresa em que concorrência, gestão produtiva do tempo,
capital humano e lucratividade são princípios orientadores da vida. Nesse contexto, o
Estado, que foi gradativamente sendo cooptado aos interesses privados do capital,
segundo a digressão histórica aqui apresentada, abandona qualquer pretensão
universalizante, passando a administrar a população por suas demandas setorizadas
(FOUCAULT, 2008). O que se constata sobre essa nova governança é que ela
ultrapassou os limites do Estado deixando de ser cidadã e universal, passando a uma
gestão localizada, direcionada por cisuras biopolíticas diferenciais (CÔRTES, 2018).
A generalização dessa nova racionalidade na produção de um novo sujeito moral
traz a importante reflexão sobre os diferentes meios por onde essa subjetivação se
realiza, tornando de extrema relevância pensar o papel de certas práticas e instituições de
formação cultural dentro do cenário de reprodução e disseminação da ideologia
neoliberal. Fazeres como programação neurolinguística, psicologia comportamental,
livros de autoajuda tem se tornado bastante populares ao prometeram otimizar a
produtividade e a competitividade dos indivíduos (DARDOT e LAVAL, 2016). Escolas
e igrejas têm papel central nessa conquista de mentes e corações, fazendo dos
indivíduos, a partir de suas realidades e demandas sociais específicas, incorporações do
espírito da empresa.

Dessa maneira, este trabalho vai na esteira de estudos que visam compreender as
igrejas neopentecostais como um meio de subjetivação do constructo moral neoliberal,
sobretudo em camadas de maior vulnerabilidade social. (ORO, 1996; MARIANO, 2011;
WREGE, 2011; BURNATELLI e LAHUERTA, 2014; CÔRTES, 2018). Ademais, no
cenário político brasileiro, há ressonâncias recentes que relacionam neopentecostalismo
e neoliberalismo, inclusive no expressivo apoio dos pentecostais e neopentecostais a Jair
Bolsonaro nas eleições de 2018 - candidatura de viés conservador e neoliberal.
5

A religião tem papel fundamental na incorporação de ideologias pelas classes


subalternas (BURNATELLI e LAHUERTA, 2014); expressando, muitas vezes, o
protesto da dor real nas representações de um tipo de consciência (LOWY, 2007). As
igrejas neopentecostais, mediante sua teologia da prosperidade, caracterizam-se como
uma religião que coaduna elementos principiológicos do neoliberalismo, entre esses o
individualismo self made man e a concorrência.

Nas igrejas neopentecostais, geralmente é transmitido um ideário religioso que


concebe o homem como único responsável pelo seu próprio destino, assim o sujeito é
levado a crer que nenhuma condição "mundana", a priori, poderia obstruir sua felicidade
de vida se Deus estiver ao seu lado. Para a melhor compreensão do neopentecostalismo,
é necessário analisar o crescimento vertiginoso do segmento evangélico brasileiro,
sobretudo a partir dos anos de 1980, crescimento concomitante à expansão mundial do
neoliberalismo. Trata-se de uma efervescência no campo religioso brasileiro que, no
transcorrer das décadas, aderiu fortemente à vida social, cultural e política (PIERUCCI,
2004). Dentre os diversos grupos religiosos que compõem o multifacetado campo
evangélico, que - entre os anos de 1980 e 2010 - cresceu6 61,3% (cinco vezes o
crescimento médio da população em geral), destacam-se os de vertente pentecostal e
neopentecostal, que representam mais da metade dos evangélicos brasileiros ou 13,3%
da população brasileira7. Segundo pesquisa Censo, foram definidos como evangélicos
não determinados8 21% da população evangélica total9, fenômeno que vem crescendo e
pode representar uma expansão ainda maior dos pentecostais e neopentecostais
brasileiros, considerando que a pesquisa Censo não pergunta ao entrevistado (a) o nome
da instituição religiosa frequentada, definindo como "não determinado" aquela (e) que
somente diz ser evangélica (o).

Do ponto de vista histórico, o pentecostalismo é um dos maiores movimentos


religiosos do Ocidente, sendo uma vertente do movimento protestante estadunidense que
surgiu no início do século XX como expressão religiosa de camadas pobres,
predominantemente negras e periféricas (CAMPOS, 2005). Poucos anos após seu
surgimento, o movimento chegou ao Brasil, através de igrejas como "Assembleia de
Deus" e "Evangelho Quadrangular", reproduzindo o padrão de forte aderência nas

6
IBGE, censo demográfico, 2010.
7
Id., 2010.
8
Evangélicos não filiados a uma instituição.
9
IBGE, censo demográfico, 2010.
6

populações pobres. Em meados dos anos de 1950, uma segunda onda pentecostal se
desdobrou com o surgimento de igrejas como "O Brasil para Cristo" e "Deus é amor",
todas dissidentes do movimento anterior.

O neopentecostalismo surgiu na metade dos anos de 1970 e ganhou força no Brasil


na última década do século XX. Ele identifica um subcampo do pentecostalismo
brasileiro. O neopentecostalismo é composto por igrejas fundadas no território nacional
e não dissidentes das igrejas originárias do pentecostalismo, sendo assim ele traz
algumas mudanças institucionais, comportamentais e teológicas importantes. São
exemplos dessas instituições “Igreja Universal do Reino de Deus”, “Igreja da Graça”,
“Renascer em Cristo”, “Igreja Mundial”, entre outras que compõem uma ampla rede que
vai de grandes grupos denominacionais até pequenos salões domiciliares independentes.
Além da maior centralização do poder eclesiástico na figura do líder religioso, as igrejas
neopentecostais mostram-se mais avessas à tolerância e ao pluralismo religioso, sendo
mais adeptas que os pentecostais à comercialização de bens simbólicos e bens materiais
e à utilização de técnicas de marketing para o convencimento de seus fiéis (ORO, 1992;
MARIANO, 2004).

Segundo Durkheim, "[...] é o traço distintivo do pensamento religioso, a divisão do


mundo em dois domínios, um que compreende tudo o que é sagrado, e outro que
compreende tudo o que é profano" (DURKHEIM, 1968 p. 68).

Da perspectiva das características teológicas do neopentecostalismo Ricardo


Mariano discorre:

No plano teológico, caracterizam-se por enfatizar a guerra espiritual contra o Diabo e


seus representantes na terra, por pregar a Teologia da Prosperidade, difusora da crença
de que o cristão deve ser próspero, saudável, feliz e vitorioso em seus empreendimentos
terrenos, e por rejeitar usos e costumes de santidade pentecostais, tradicionais símbolos
de conversão e pertencimento ao pentecostalismo." (MARIANO, 2004, p.124).

A igreja “Universal do Reino de Deus” é a maior igreja neopentecostal do Brasil,


sendo a principal difusora da chamada teologia da prosperidade. Teologia originada nos
Estados Unidos, entre os anos 50 e 60 do século vinte, em que o tradicional ascetismo
pentecostal deixa de ser parte da identidade religiosa, sendo substituído por uma
religiosidade vinculada ao desejo pelo enriquecimento e pela aquisição de bens materiais
para o desfrute da vida terrena (WREGE, 2011). Segundo essa teologia, todo e qualquer
sofrimento, inclusive a pobreza, é automaticamente atribuído a forças malignas. Raquel
7

Silveira Wrege (2011) faz referência à teologia da prosperidade como sendo o grande
divisor de águas entre o pentecostalismo e o neopentecostalismo; já que, no primeiro, a
riqueza seria uma dádiva divina àqueles aos quais o dinheiro não poderia corromper.
Diferente dos neopentecostais, que atribuem a privação financeira aos poderes do mal,
os pentecostais concebem a possibilidade desta privação ser a expressão da vontade
divina.
Portanto, para os neopentecostais, ser pobre significa – necessariamente - ser
atingido por males espirituais (ORO, 1996). Em "As formas elementares da vida
religiosa", Émile Durkheim discorre sobre as crenças e os ritos definindo que "os
primeiros são estados de opinião, consistem em representações; os segundos são modos
de ação determinados" (DURKHEIM 1989, p. 68). Na dimensão da crença, expressa-se
o poder do sagrado em contraponto ao do profano. Dessa maneira, o neopentecostalismo
é uma religião de dualismo radical que consagrou a riqueza terrena e material - processo
germinado com a reforma protestante - e profanou a condição de pobreza na qual o
pobre é considerado um amaldiçoado. Há fortes indicativos que a teologia da
prosperidade dos neopentecostais retroalimenta o exacerbamento do espírito capitalista
na contemporaneidade ao: (i) inaugurar uma prática religiosa não solidária, calcada em
uma espécie de self-made man que visa à superação do mal mediante o sacrifício; (ii)
despolitizar por meio de um sistema de causalidades sobrenaturais que explica as
condições sociais; (iii) contribuir com a lógica do triunfalismo via consumo, dificultando
a consciência de classe e as reflexões sobre condições reais de ascensão social.

Os primeiros10 estudos sociológicos que analisaram o movimento evangélico no


Brasil buscaram relacionar processos migratórios do rural ao urbano e,
consecutivamente, o desenvolvimento de um tecido social por parte das comunidades
pentecostais nas periferias pobres das grandes cidades. Essa perspectiva, funcionalista
durkheimiana, concebeu tal fenômeno como resposta à anomia social, pois promovia a
integração de populações desarraigadas (MARIANO, 2011). Os conceitos sociológicos
weberianos11 da secularização e da modernização também foram bastante mobilizados
na segunda metade do século XX. Mediante a primeira, buscou-se compreender o
crescimento dos pentecostalismos na perspectiva de um atraso brasileiro frente ao
desencantamento moderno. Já, a partir da ideia de modernização, compreendeu-se a

10
D'EPINAY, O. refúgio das Massas, 1970. E. WILLENS, Followers of the New Faith: Culture Change and the
Rise of Protestantism in Brazil and Chile, 1967
11
MARTIN, D. Tongues of fire 1990. D. STOLL, Is Latin American turning protestant?, 1990.
8

expansão do pentecostalismo como parte de um gradual processo civilizatório que


levaria o país a superar seus traços culturais ligados ao arcaico - patrimonialismo ibérico
-, incorporando a matriz religiosa cristã, anglo-americana e moderna (MARIANO,
2011).

Chamaremos de "neopentecostalismo das margens" a malha de igrejas


neopentecostais brasileiras composta por uma infinidade de pequenos espaços
independentes, localizados em comunidades periféricas muito pobres12 e que são
lideradas, geralmente, por um pastor que reside na comunidade. Por outro lado,
denominaremos "centro do neopentecostalismo" as grandes igrejas, localizadas em
regiões urbanizadas, detentoras de meios de comunicação em massa e com diversas
filiais.

As igrejas do centro do neopentecostalismos geralmente não estão presentes nas


localidades marginais de muita pobreza, onde predomina pequenas igrejas
independentes, todavia essas denominações se utilizam de um grande potencial de
difusão religiosa pelos meios de comunicação de massa. Essa tecnologia provavelmente
contribui para a formação dos pastores independentes em locais de pobreza, orientando
suas estratégias de oferta e discursos religiosos. Suspeitamos que esses pastores locais,
ao serem subjetivados pelo centro neopentecostal e vivenciarem o cotidiano dos
moradores da sua região, constroem uma religiosidade centralizada na teoria da
prosperidade, que gere as demandas específicas do seu contexto social. Por outro lado, o
tecido social neopentecostal, que torna esse fenômeno nacional, se sustentaria na
constituição de uma espécie de comunidade imaginada (ANDERSON, 2008) em que o
pastor pobre da periferia tem papel central, conectando margens e centro.

Portanto, investigar esse duplo movimento a partir da atuação dos pastores


neopentecostais da periferia pobre parece importante para a compreensão da
conformação contraditória do indivíduo pobre religioso que, vitimado pelas
desigualdades sociais brasileiras, torna-se sujeito reprodutor justamente de valores e
princípios que reforçam sua condição social.

12
Neste caso, ocupações não regulamentadas, carentes de serviços públicos como segurança, educação,
transporte e saneamento básico.
9

2 Justificativa

Diante da discussão histórica desenvolvida na introdução, com o apontamento da


bibliografia que aborda o neopentecostalismo e sua relação com a racionalidade
neoliberal, o presente projeto de pesquisa justifica-se: a) por investigar, a partir da
atividade pastoral independente na periferia pobre, a conformação entre o neoliberalismo
e a neopentecostal; b) por contribuir para o entendimento, a partir do campo religioso, de
formas contemporâneas de reprodução da desigualdade; c) por aprofundar a
compreensão organizacional do neopentecostalismo, na articulação entre margem e
centro; d) por ser pouco convencional estudar o neopentecostalismo a partir de suas
margens.
Nas eleições presidenciais de 2018, o então candidato Jair Bolsonaro teve ampla
vantagem no que tange o voto evangélico13. Ao mesmo tempo que isso indica a cisão no
campo religioso cristão brasileiro, já que no mesmo pleito o voto católico se distribuiu
quase que igualmente entre os candidatos do segundo turno14, também ficou explícito o
apoio das maiores lideranças neopentecostais ao candidato vencedor. O papel do aparato
de comunicação do centro neopentecostal, composto por redes de rádio15 e por um dos
maiores canais de televisão do Brasil16, sem dúvida contribui para a articulação desse
fragmentado segmento religioso no território nacional em prol de um projeto político
conservador e neoliberal. Segundo Oualalou (2019), foram nos estados brasileiros com
maior proporção de evangélicos que Bolsonaro obteve vitória mais acachapante17; do
contrário, Haddad venceu nos estados com menos evangélicos18. Portanto, a vitória de
Bolsonaro pode ser entendida como resultado de um longo processo de transformações
culturais em que agentes religiosos cristãos conservadores têm papel central, sobretudo
por suas atuações em periferias brasileiras, oferecendo ao povo desprovido uma visão
religiosa do mundo, alinhada às necessidades mais concretas.

13
11 milhões de votos a mais, entre evangélicos, que Fernando Haddad, do PT. Disponível em:
<http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/584304-o-voto-evangelico-garantiu-a-eleicao-de-jair-bolsonaro/>.
Acesso em: 06 de Set. de 2021.
14
Bolsonaro (29,8 milhões) e Haddad (29,6 Milhões) Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/78-
noticias/584304-o-voto-evangelico-garantiu-a-eleicao-de-jair-bolsonaro/>. Acesso em: 06 de Set. de 2021.
15
Rede Gospel FM (Renascer em Cristo), Rede Aleluia (IURD), Nossa Rádio (Internacional da graça), Rádio
Nova Mundial (Mundial do poder de Deus).
16
Rede Record - IURD
17
Jair Bolsonaro venceu com larga vantagem em estados como Acre, Rio de Janeiro, Rondônia e Roraima.
Disponível em: <http://divulga.tse.jus.br/oficial/index.html />. Acesso em: 10 de Set. de 2021.
18
Fernando Haddad venceu em estados como Piauí, Maranhão e Ceará. Disponível em:
<http://divulga.tse.jus.br/oficial/index.html />. Acesso em: 10 de Set. de 2021.
10

O agravamento da condição paupérrima nas periferias brasileiras e a expansão de


uma religiosidade self made man entre os pobres revelaria a dupla face de desmonte e
criação operada pelo neoliberalismo (CORTES, 2018). Desmonte do aparato de proteção
social do Estado e criação de uma governança social própria e seletiva operada pelos
diversos meios de subjetivação, inclusive a religião.
Segundo PIERUCCI (1998), os agentes religiosos19 e o aspecto organizacional das
igrejas devem ser objetos de estudo do cientista social que pretende compreender as
lógicas que organizam a oferta religiosa (PIERUCCI, 2004). É bem provável que a ação
local, dinâmica e eficiente, das igrejas neopentecostais tornam-nas mais pragmáticas e
preparadas para o mercado de serviços religiosos; já que, diante da perda de força dos
instrumentos estatais de provisão e de organização social, a adesão a religiões que
prometem alívio das aflições imediatas parece ser maior (OLIVEIRA LIMA, 2007).
No processo de modernização brasileira, o papel da ideologia20 obscureceu de
maneira extraordinária as causas reais da desigualdade, seja para os privilegiados, seja
para as vítimas desse processo, naturalizando a abissal desigualdade no país (SOUZA
2004; 2013). Para Geertz (1989), o pensamento ideológico fornece uma "saída
simbólica'' para as perturbações emocionais geradas pelo desequilíbrio social. Bourdieu
(1991) diz que a governança filantropa, quando ganha as dimensões estatais, acaba por
ser um tipo de gestão seletiva que gere os dominados, diminuindo a periculosidade das
classes marginais. Dardot e Laval (2016) chamam a atenção para como a racionalidade
neoliberal presente no Brasil, por meio da "cumplicidade estrutural"21 dos agentes
sociais que, de forma contraditória, além de sua vontade e consciência, contribuem para
a subversão da tradição democrática e republicana à lógica da concorrência.
O processo de subjetivação neoliberal, via neopentecostalismo, do qual estamos
tratando neste projeto, que visa dar estabilidade a um tipo de sociedade fundada em
relações de produção específicas e na concentração de riqueza, acaba por ser um
caminho que conduz à reflexão de formas contemporâneas de reprodução da
desigualdade social brasileira. Velhas narrativas religiosas não respondem a novos
anseios sociais ideológicos; visto que esses, quase sempre, demandam novos sistemas de
sentido (ARENARI, 2017). Dentro desse processo, parece-nos importante pensar a

19
Profissionais que sobrevivem da religião.
20
No referido artigo, Jessé de Souza faz uma crítica aos clássicos da teoria social brasileira.
21
Conceito cunhado pelo filósofo André Gorz.
11

atividade do pastor pobre e independente na reprodução social em questão, e pensar no


neopentecostalismo a partir de suas margens e não a partir de grandes instituições.

3 Objetivo

O objetivo principal é pesquisar a atividade de pastores neopentecostais


independentes em regiões de grande pobreza, buscando compreender a articulação entre
o centro e a margem do neopentecostalismo e processos de subjetivação neoliberal
operado por esses pastores. Como objetivos específicos, tem-se: (i) contribuir para os
estudos do avanço do capitalismo nas periferias; (ii) verificar novas estratégias de oferta
religiosa e tendências do mundo profissional religioso; (iii) contribuir para o
entendimento da chamada "onda conservadora" no Brasil.

4 Materiais e Métodos

Esta pesquisa situa-se dentro do campo religioso e articula trabalho pastoral,


teologia da prosperidade e neoliberalismo em contexto de pobreza. Levando em conta os
objetivos propostos, nosso estudo se baseará em uma análise etnográfica de pastores, na
periferia de Campinas, mais especificamente no Parque Oziel e Jardim Monte Cristo,
Campinas-SP. Faremos uma observação participante, o que supõe a interação entre
pesquisador e pesquisado. Para isso, buscaremos registrar rotinas, histórias, trajetórias de
vida e fazer relações que articulem os dados coletados com eixos da pesquisa. Foi
estabelecido contato com uma organização de voluntários que realiza trabalho social na
região22 para que, no primeiro momento, a inserção na localidade estudada seja
facilitada. O líder dessa organização propôs-se a nos apresentar alguns pastores e líderes
comunitários locais. Na entrada em campo, será feito um levantamento de igrejas
neopentecostais23. O perfil socioeconômico dessa região corresponde aos estratos mais
baixos da população brasileira com baixa empregabilidade, baixa escolaridade,
analfabetismo e baixa renda. Uma população constituída por maioria de pardos e
negros, ou seja, justamente os recortes sociais nos quais o neopentecostalismo mais
avança (MARIANO, 2011). Hoje, uma caminhada curta pelas ruas do Parque Oziel e

22
Site oficial da organização; Disponível em: < www.artistasemacao.com.br >. Acesso em: 10 de Set. de 2021.
23
Compreenderemos como igreja neopentecostal pequenas igrejas evangélicas, independentes, desvinculadas de
grandes denominações neopentecostais, pentecostais ou tradicionais. Portanto, que se enquadrem nas
características anteriormente citadas neste projeto.
12

Jardim Monte Cristo é suficiente para se constatar a presença de dezenas de pequenas


igrejas, localizadas em casas, garagens residenciais e pequenos prédios.
Levando em consideração o perfil socioeconômico da região e as facilidades de se
abrir uma igreja neopentecostal independente, acreditamos que se trata, em sua maioria,
de igrejas neopentecostais, o que faz dessa região um campo de estudo adequado aos
objetivos de pesquisa. Obviamente, para o rigor científico, será necessário um trabalho
de campo mais rigoroso de identificação e seleção das igrejas/pastores que servirão de
ponto de partida para a pesquisa. Atualmente a população dessa área24 soma
aproximadamente 30 mil pessoas (Prefeitura Municipal de Campinas25).
Realizaremos o acompanhamento da rotina de cerca de dez pastores26 de igrejas
neopentecostais independentes, focando em suas atividades religiosas e reservando
períodos específicos para entrevista, de modo a entender: a) como se deu o processo de
conversão e as mudanças nas práticas hábitos; b) como e por quais meios se deu o
aprendizado pastoral; c) como essa religião pode ajudar a melhorar a vida de pessoas
daquele lugar; d) suas próprias trajetórias e objetivos de vida. Segundo Bourdieu (2004),
a biografia particular de um indivíduo pode revelar que esse já se encontra predisposto a
sentir e a exprimir, de modo particular, disposições éticas ou políticas já presentes nos
membros da classe ou do grupo de seus destinatários.
Visando estabelecer um processo dialógico entre pesquisador e entrevistado
(MICHELAT, 1982), decidimos utilizar uma estrutura de entrevista não-diretiva; pois,
nesse caso, a nosso entender, esse modelo aumentaria as possibilidades de reflexão por
parte do entrevistado a respeito dos questionamentos, contemplando não somente os fins
pré-definidos desta pesquisa, mas também novas e surpreendentes narrativas por parte
dos pastores. Levaremos para a entrevista um gravador e um caderno de campo, nos
quais serão anotados detalhes a respeito das entrevistas e qualquer situação que escape à
gravação de áudio. Consideramos que os primeiros contatos com os pastores podem se
desdobrar em novas descobertas e na reorganização das estratégias de registro e coleta
de dados. Buscaremos realizar a descrição de experiências e observações no campo que,
segundo Geertz (2008), deve vir também acompanhada por um “esforço intelectual [...]
um risco elaborado para uma descrição densa.” (GEERTZ, 2008, p.15)

24
Parque Oziel e o Jardim Monte Cristo, incluindo também o Gleba B.
25
Disponível em: < https://novo.campinas.sp.gov.br/noticia/1462 >. Acesso em: 10 de Set. de 2021.
26
A variabilidade de títulos nesse campo religioso é extensa: Pastor, Bispo, Apóstolo, Missionário, entre outros.
13

Feltran (2016) salienta que a permanência duradoura no campo e elaboração de


técnicas de registro são fundamentais para uma descrição densa de fatos, pessoas e
eventos. O autor também chama atenção para a necessidade de manter-se atento às
conexões entre os acontecimentos registrados e o tema geral de pesquisa. Na resenha
“Dez mandamentos da observação participante”, da obra “Sociedade de esquina: a
estrutura social de uma área urbana pobre e degradada” de William Foote Whyte,
Valladares (2007) lembra a importância que Foote Whyte dá para permanência longa do
pesquisador em campo que, além de contribuir para gerar confiança na população
estudada, é pré-requisito para que sua observação participante possa captar a evolução
do comportamento das pessoas.
Nesta pesquisa, o espaço será entendido como lugar de produção de saberes
próprios, nunca inferiores a qualquer outro saber, por considerarmos, como sugere
Feltran (2016), a experiência como fundante do conhecimento. O indivíduo produz
saberes a partir de suas experiências no espaço, portanto consideramos fortemente
espaço e relato dos pastores indissociáveis e fundamentais para a pesquisa. A etnografia
nos é cara pelas possibilidades de compreensão de outras percepções do mundo sendo
ela uma via de procura por alteridades. Segundo Fonseca (2000), a palavra “alteridade”
sintetiza o envolvimento entre o pesquisador e o outro envolvendo simultaneamente
ambos, sendo necessário olhar de forma realista para as diferenças, questionando os
próprios valores.
Os deslocamentos dos parâmetros tradicionais do fazer etnográfico, que tem na
obra de Malinowski suas origens clássicas, trouxeram novas potencialidades para a
etnografia, porém não se pode desconsiderar as experiências que estão inscritas na
história da etnografia, como a submissão dos valores de grupos estudados aos valores do
pesquisador.
Segundo Feltran (2016) pela etnografia, a partir da imersão no campo, nas diversas
nuances da localidade, vai se coletando e construindo um conjunto de referências que,
comparados com outros dados disponíveis, fornece-nos leituras mais amplas que podem
referenciar novas compreensões na pesquisa.
Espera-se que o material levantado possa nos auxiliar na interpretação mais crítica
dos modos e meios de subjetivação neoliberal aos quais esses pastores se submetem e
operam simultaneamente. A dissertação será fundamentada na relação entre o material
coletado, bibliografia e análises sociológicas.
14

Durante o período de investigação, buscaremos debater o desenvolvimento da


pesquisa em várias instâncias como: a) nas disciplinas de mestrado a serem realizadas no
primeiro ano de pesquisa; b) nas reuniões de orientação; c) em congressos e seminários
que tematizem tanto o fenômeno do neoliberalismo entre os pobres como neopentecostal
no Brasil.
15

5 Cronograma de execução

Período
Atividades
2022 2023

Realização das X X
disciplinas

Levantamento X X
bibliográfico

Análise do material X X X X
bibliográfico levantado

Preparação das X X
entrevistas

Realização das X X
entrevistas

Transcrição e análise X X
das entrevistas e outros
materiais coletados

Redação X
preliminar

Exame de X
qualificação

Redação final X

Defesa de tese X

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16

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