Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
Resumo
Este trabalho é referente ao Eixo temático Expressão Corporal e relaciona-se com o desenvolvimento das competências instrumental, social e comunicativa por meio de uma
Estratégia de Ensino que toma como ponto de partida e de chegada o mundo cotidiano e o contexto cultural, no qual professores e alunos constroem sentidos e significados
para as diferentes manifestações corporais, dentre elas a Dança. Esta Estratégia foi implementada na E.E. Cel. José Teófilo Carneiro, com alunos da Fase IV do Ciclo
Complementar de Alfabetização. Seu objetivo é a reprodução, modificação e criação coletiva de seqüências coreográficas, associadas à uma reflexão acerca do sentido e
significado encontrado nas músicas selecionadas pelos alunos para esta produção. Propõe-se, com este tipo de estratégia, tornar a aula de Educação Física o espaço
privilegiado da reflexão sobre elementos que estão presentes na vida das crianças, os quais tornam-se parte dos conteúdos de ensino, com a finalidade de ampliar sua
compreensão crítica à medida que o fazer torna-se objeto do compreender.
Introdução
Este trabalho tem como objetivo apresentar uma Estratégia de Ensino relacionada ao Eixo Temático Expressão Corporal, contido nas
Diretrizes Básicas de Ensino da Educação Física da Rede Municipal de Ensino de Uberlândia/MG (DBE/EF/RME). Elaborada coletivamente no
contexto do Planejamento Coletivo do Trabalho Pedagógico (PCTP), sua implementação se deu em uma escola da Rede Estadual de Ensino.
Participo das reuniões do PCTP, que é uma estratégia de intervenção que faz parte de um processo de formação continuada do qual
participam os professores da RME/UDI e da Escola de Ensino Básico–ESEBA/UFU. Neste contexto, trabalhamos com a construção coletiva e
implementação de Estratégias de Ensino, pautadas em bases teóricas ancoradas em concepções críticas de Educação e na teoria crítica de
Currículo. Apesar de não contar com um espaço para o desenvolvimento do trabalho coletivo e da formação continuada na Rede Estadual, meu
trabalho nesta Rede, bem como na Rede Municipal, segue as mesmas diretrizes político-pedagógicas, o que significa dizer que utilizo as mesmas
Estratégias de Ensino nas duas escolas em que trabalho..
1
Professora especialista - Rede Municipal de Ensino de Uberlândia e Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais.
202
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
A Escola Estadual Cel. José Teófilo Carneiro atende a 20 turmas de alunos do ensino fundamental e está situada à Av. Floriano Peixoto,
1352, centro da cidade de Uberlândia. O espaço físico destinado às aulas de Educação Física consta de um pátio cimentado e sem cobertura. Os
materiais são escassos para atender a todas as turmas e a equipe de professores de Educação Física (dois ao todo).
A referida Estratégia foi implementada com alunos da Fase IV do Ciclo de Complementar de Alfabetização 2 , porém, a orientação
metodológica segue o esboço da microcurricularidade 3 da Educação Física em construção no PCTP. Neste caso, estes alunos estão inseridos em
uma Zona de Desenvolvimento identificada como sendo um “período em que o/a aluno/a passa a utilizar o raciocínio sincrético como parte dos
processos de análise e compreensão da realidade, revelando-se capaz de analisar criticamente e descrever os elementos constitutivos dos objetos,
dos conceitos, dos costumes e dos sentimentos, demonstrando-se assim a elevação de seu raciocínio crítico por indagação teórica sobre as causas
e efeitos, por resistência as opiniões dos adultos e por identificação emocional com os pares do mesmo sexo” (DBE/EF/RME).
Pretende-se, por meio desta Estratégia de Ensino permitir ao aluno a aquisição e utilização de Competências Educacionais e prática social
relacionadas às dimensões instrumental, social e comunicativa desenvolvidas em três momentos interligados: da reprodução de determinadas
práticas sociais, de sua modificação, à partir da análise e reformulação de suas regras constitutivas e/ou regulativas, e finalmente de sua
recriação-criação na forma de novas práticas sociais que atendam os interesses consensualmente construído pela coletividade (DBE/EF/RME).
2
A Rede Estadual de Ensino de Minas Gerais, a partir de 2004 implantou o Ensino Fundamental de nove anos. Os cinco primeiros anos estão divididos em dois grandes ciclos
de aprendizagem: o Ciclo Inicial de Alfabetização, com duração de três anos, voltado para o atendimento das crianças de 6, 7 e 8 anos, e o Ciclo Complementar de
Alfabetização, que atende as crianças de 9 e 10 anos, com duração de dois anos. A IV Fase do Ciclo Complementar de Alfabetização corresponde à 4ª série do Ensino
Fundamental seriado.
3
De acordo com a Teoria Crítica do Currículo, seu processo de produção apresenta níveis Macro e Microcurriculares. A Microcurricularidade representa a organização dos
conteúdos de ensino de um determinado componente curricular. Foram definidos nas Diretrizes Básicas de Ensino de Educação Física da RME/UDI cinco Eixos Temáticos
para o ensino da Educação Física nos níveis infantil e fundamental: 1) Escola e Educação Física; 2) Jogo; 3) Esporte, Indivíduo e Sociedade; 4) Expressão Corporal e, 5)
Exercício, Lazer e Qualidade de Vida.
203
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
Segundo Fensterseifer (2001), a reflexão sobre as expressões corporais que se conformaram, na modernidade, à uma concepção
dicotômica que vê apenas um corpo destituído de historicidade, reduzido à sua dimensão anátomo-fisiológica, vêm sendo arduamente
questionadas, especialmente, pela vertente fenomenológica da produção de conhecimento na área de Educação Física. Por outro lado, estudos
atuais vêm alertando para o fato de que as repercussões desta crítica à uma racionalidade técnico-instrumental, que converte as intenções motoras
do homem “natural e biológico” em movimentos objetivos, cientificamente estudados, redundou numa ênfase exagerada à “redescoberta do
corpo”, às práticas corporais alternativas, às emoções, dentre outras, que abrem espaço para um discurso compensatório, o qual tenta jogar o
corpo para a pura subjetividade.
Tais perspectivas, no entanto, terminam ignorando que a sensibilidade humana é também mediada pela cultura e enquanto tal é histórica,
não podendo ser compreendida nem apenas por meio do estudo dos aspectos anatômicos dos movimentos, numa proposição racionalista, nem
superdimensionando o pólo oposto, numa visão espontaneísta. (FENSTERSEIFER, 2001).
Neste sentido, tomando como referência os pressupostos de ensino da Educação Física Escolar apontados nas Diretrizes da Rede
Municipal, o trabalho com o Eixo Temático Expressão Corporal relaciona-se ao desenvolvimento das competências instrumental, social e
comunicativa, por meio de Estratégias de Ensino que tomem como ponto de partida e de chegada o mundo cotidiano e o contexto cultural, no
qual professores e alunos constroem sentidos e significados para as diferentes manifestações corporais, dentre elas a dança.
Esta prática humana “é uma das mais antigas manifestações culturais humanas, e de acordo com o nível de conhecimento da realidade
adquirido pelo homem, esta prática social foi historicamente utilizada como importante meio de expressão” (DBE/RME/PMU).
Como parte do conteúdo da Educação Física, este saber na escola tem ficado basicamente restrito aos professores desta área, os quais
admitem a dificuldade que têm ao trabalhar com a dança, numa perspectiva crítica de educação que seja capaz de:
Neste sentido, não se trata de negar a presença, no cotidiano, de expressões da dança associadas ao consumo, ao corpo-mercadoria,
permeadas por uma sensualidade reproduzida, em larga escala, pelas crianças nas diferentes faixas etárias. Nem tão pouco, tomar para o
professor a função de “purificar” o ambiente escolar, por meio da seleção daquilo que deve ou não deve ser estudado, valendo-se de critérios de
cunho ético-moral adotados de forma arbitrária.
204
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
Ao contrário, propõe-se tornar a aula de Educação Física o espaço privilegiado da reflexão sobre elementos que estão presentes na vida
das crianças, os quais tornam-se parte dos conteúdos de ensino, com a finalidade de ampliar sua compreensão crítica à medida que o fazer torna-
se objeto do compreender. No desenvolvimento de Estratégias de Ensino relacionadas com o Eixo Expressão Corporal que, no caso da dança,
requer atividades que não são facilmente aceitas por todos, em função de aspectos como timidez, níveis de habilidade, relações de gênero,
questões religiosas, dentre outros, torna-se necessário ao professor estar atento para não ignorar tais elementos, uma vez que são eles que poderão
motivar, tanto a modificação da própria Estratégia, quanto à criação de novas alternativas para a problematização dos mesmos, como parte do
processo de formação ampliada dos alunos.
205
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
206
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
5- A partir do texto produzido 10ª Aula : • Pode ocorrer que, após esta reflexão
anteriormente, refletir 9 O/a professor/a copia a letra da música no quadro sobre a música, a turma queira refazer o
coletivamente sobre a letra da negro e faz a leitura em voz alta com os/as processo de escolha da coreografia, por
música escolhida e produzir um alunos/as. identificar na letra conteúdos que não
novo texto com modificações 9 Em seguida, solicita que um dos alunos do grupo sejam aceitos pela maioria, ou que sejam
207
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
sugeridas pela turma. da coreografia escolhida leia o texto que eles contrários aos valores que acreditam.
elaboraram. Neste caso, a turma deverá repetir o
9 Após a leitura, o/a professor/a solicita aos demais processo das 8ª e 9ª aulas.
alunos que dêem sugestões para melhorar o texto,
registrando-as no quadro.
9 A partir das sugestões apresentadas, professor/a e
alunos/as constróem um texto coletivo sobre a
mensagem da música.
Terceira Fase: modificação da
coreografia escolhida. 11ª à 13ª Aulas: • O/a professor/a e os/as alunos/as definem
6- O/s alunos/as proporão 9 Em grupos, os/as alunos/as deverão rever a anteriormente os critérios para a escolha
modificações serem incorporadas coreografia e propor modificações ou a inclusão de das modificações propostas, procurando
na coreografia escolhida. novas seqüências ou movimentos. valorizar o trabalho já feito, bem como
9 Cada grupo apresenta sua sugestão à turma. superar os conflitos, caso não haja
9 As sugestões serão testadas pelos/as demais consenso na aprovação das sugestões
alunos/as e incorporadas ou não na coreografia, de apresentadas pelos grupos.
acordo com a avaliação da turma.
7- Ensaiar a coreografia modificada 14ª à 17ª Aulas: • Durante todo o processo de construção
e definir o figurino para 9 Definir com a turma quais alunos/as irão participar da coreografia, o/a professor/a orientou
apresentação na Mostra de Dança da Mostra de Dança na escola. que todos/as os/as alunos/as
à ser realizada na escola. 9 Discutir e definir o figurino a ser utilizado por eles participassem, porém, para a
na Mostra de Dança. apresentação na Mostra de Dança a
9 Discutir a distribuição espacial dos/as alunos/as participação foi optativa.
que participarão da apresentação. • Na discussão sobre a importância do
9 Ensaiar a coreografia. figurino, enquanto elemento constitutivo
da dança, é importante respeitar as
possibilidades da turma para a aquisição
do mesmo. Este fator não deve, de
nenhuma maneira, limitar a participação.
208
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
8- Organizar e apresentar as 9 Apresentar a coreografia na Mostra de Dança • Relatei aqui a Estratégia de Ensino de
coreografias de todas as turmas da escola. Dança aplicada com as turmas da IV Fase
em uma Mostra de Dança, que se do Ciclo de Escolarização (4ª séries),
realizará como parte das porém apliquei Estratégias semelhantes a
festividades da escola, na esta com todas as turmas do turno da
“Semana da criança”. manhã, e cada uma construiu e
apresentou sua coreografia na Mostra de
Dança da escola.
209
Revista Especial de Educação Física – Edição Digital nº. 2 – 2005
Anais do IV Simpósio de Estratégias de Ensino em Educação/Educação Física Escolar – 7 a 9 de dezembro – 2004
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho com Dança na escola, geralmente tem ficado restrito ao ensaio de coreografias para atender as datas comemorativas pré-
determinadas no calendário escolar, e é realizado quase sempre por professores que tiveram algum tipo de formação específica na área. Neste
tipo de trabalho, tem prevalecido a reprodução da dança – mercadoria, que objetiva estimular o consumo de produções advindas da indústria
musical, sem reflexão, tanto por parte dos alunos quanto dos professores. Nesse sentido, perde-se a oportunidade de transformar a aula de
Educação Física em um importante espaço de reflexão e discussão sobre as práticas sociais que permeiam o cotidiano dos alunos.
Na Estratégia de Ensino aqui apresentada, a proposta de deixar por conta dos alunos a escolha das músicas para elaborar a coreografia,
trouxe também o risco, para o professor de ver-se “autorizando” a presença de determinados tipos de manifestações da dança que poderiam ser
consideradas impróprias para o contexto escolar, principalmente por parte de pais ou de outros professores da escola. Por outro lado, percebeu-se
que a explicação de toda a estratégia previamente forçou a turma a construir seus próprios critérios de escolha, levando em conta a atividade
proposta, qual seja, elaborar uma reflexão sobre a letra da música escolhida. Isto sem que houvesse necessidade de interferência, por parte do
professor, quanto ao estabelecimento de regras de valores éticos-morais, de forma arbitrária, com intenção de controle do processo.
Referências Bibliográficas
FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo. 2001. A educação física na crise da modernidade. Ijuí: Ed. Unijui.
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO – PREFEITURA MUNICIPAL DE UBERLÂNDIA. Diretrizes Básicas de Ensino da Educação
Física (Mimeo), Uberlândia: 2003.
210