Você está na página 1de 3

voltar para referências

TEXTOS SOBRE A ILUSTRAÇÃO BOTÂNICA PARA DIVULGAçÃO EM GERAL

1. Ilustração Botânica - Uma arte milenar


2. O trabalho do ilustrador botânico
3. Breve relato histórico sobre a Ilustração Botânica no Brasil

Ilustração Botânica uma Arte Milenar

Diana Carneiro

A arte de ilustrar plantas é muito antiga e apreciada por povos do mundo inteiro. Desde o
tempo dos faraós no Antigo Egito os homens costumavam usar motivos vegetais para decorar
paredes, vasilhas e vestimentas.
Com o desenvolvimento das civilizações a arte botânica evoluiu, passando por etapas
diferentes até chegar à forma como é conhecida hoje em dia, caracterizada pela extrema
precisão morfológica e riqueza de detalhes. No entanto somente no século XVI, com o
surgimento dos primeiros herbários, surge a figura do ilustrador botânico, pessoa que se
especializa em ilustrar para a Ciência, contribuindo para a divulgação dos conhecimentos
científicos relacionados com a flora em geral.
Até pouco tempo atrás (fins do séc. IXX e começo do séc. XX), os naturalistas, cientistas
viajantes que percorriam os continentes conhecendo e registrando os ambientes, animais e
plantas, não possuíam outro recurso além dos próprios olhos, mãos e lápis para registrar o que
viam. Faziam seus primeiros esboços no próprio ambiente onde estavam e depois de
retornarem da viagem, em seus estúdios e laboratórios, elaboravam belíssimas pranchas
detalhadas que são consideradas, hoje, verdadeiras obras de arte.
A Ilustração Botânica é, em síntese, a arte de representar uma planta com a maior
fidelidade possível, garantindo perfeito reconhecimento do vegetal. Através de aprimoramento
técnico e artístico, o ilustrador capta todas as características formais da planta, traduzindo-as
num trabalho expressivo, capaz de sensibilizar o observador.
Na atualidade, mesmo possuindo equipamentos fotográficos de alta resolução, pantógrafos,
computadores gráficos de adiantada tecnologia, a arte botânica sobrevive pelos seguintes
motivos:
1. nem a fotografia é capaz de registrar uma imagem focalizando-a totalmente, isto é,
deixando a imagem nítida em todos os pontos, independentemente da posição e do tamanho do
vegetal. Essa é uma característica do desenho e de técnicas próprias desenvolvidas pelos
ilustradores;
2. desenhar e pintar são atividades especificamente humanas e como tais carregadas de
emoção e sensibilidade que permeiam toda atividade artística, trazendo uma satisfação enorme
para quem a pratica e também para quem observa os resultados. O uso de máquinas, de certa
forma bloqueia parte das sensações que o artista pode vivenciar no processo de produção
artística. Mesmo considerando os ensaios fotográficos como forma de arte, esta não se aplica no
caso de um registro botânico.
A computação gráfica, hoje em dia tão difundida, se presta a inúmeras tarefas que
facilitam o trabalho do desenhista em geral (quadrinistas, projetistas, designers, etc.), e também
ao científico mas ele somente logrará êxito em suas tarefas, se dominar perfeitamente a
linguagem do desenho, a noção de composição do trabalho gráfico, da finalização e resolução
de sua pintura. Em outras palavras, mesmo nos dias de hoje nada substitui a velha arte de
observar, desenhar e pintar da forma mais tradicional possível, como faziam os homens das
cavernas.

O Trabalho do Ilustrador Botânico

Diana Carneiro

Como todo processo de profissionalização, o desenvolvimento deste ofício é de natureza


lenta e progressiva e, como qualquer ofício, vai se fundamentando com a prática, quase diária,
da atividade. Não se deve considerar que, em princípio, apenas pessoas que possuam os
considerados talentos ‘ inatos’ tem condições de se tornar um artista botânico. Parte-se do
pressuposto que uma pessoa goste de desenhar e que, ao longo de sua vida, tenha aproveitado
momentos oportunos para praticar o desenho. Esse é o pré requisito mais importante, ao lado da
identificação da pessoa -e certo grau de sensibilidade- às causas ambientalistas, fator importante
e motivador para a prática da arte botânica. Ambos os quesitos, são os ingredientes necessários
para a formação do artista botânico.
Os passos do trabalho do trabalho do ilustrador botânico, em linhas gerais, são
1. Observação e análise do material a ser registrado;
2. Elaboração de esquemas gráficos rápidos (esboços) para a escolha do melhor ângulo de
visão, ou seja, a posição ideal em que todas as características marcantes do material sejam
evidenciadas;
3. Registro gráfico preciso, bem proporcionado, com marcação de volumes e texturas de
superfície. Quando necessário, detalhamentos e cortes do material em estudo também fazem
parte dessa etapa;
4. Transporte do desenho para o papel definitivo;
5. Acabamento do trabalho (ou arte-finalização) que pode ser em branco e preto utilizando-
se o grafite, o nanquim e aguada monocromática ou em cores, empregando-se geralmente a
aquarela. Tinta acrílica, têmpera a guache e, mais raramente, a tinta a óleo podem ser
empregadas.
A vida do ilustrador botânico é cheia de surpresas e desafios. Muitas vezes ele tem que ir a
campo acompanhando um pesquisador durante uma expedição científica ou uma simples coleta
de material biológico. Nestas ocasiões ele faz anotações sobre o tamanho e porte do vegetal,
onde ele de desenvolve, como seus ramos se distribuem naturalmente no ambiente. Os
primeiros esboços gráficos são ali mesmo elaborados porque, na maioria das vezes, logo após a
coleta de um ramo da planta, antes mesmo que chegue em casa ou ateliê, o material terá se
modificado, perdendo o brilho natural de suas folhas e as peças florais fatalmente se
desprenderão de seus cálices, pelo efeito da desidratação. Quando a planta se encontra em vaso,
tudo fica mais fácil para transportar e acomodar o material no estúdio. Outra dificuldade do
ilustrador é adaptar-se ao ritmo biológico da planta. Para descrevê-la completamente tem-se que
fazer vários registros, de acordo com a ocorrência das fases que compõem a vida do vegetal
focalizado. Assim, muitas vezes, pinta-se flores e folhagem numa estação climática e aguarda-se
o período de ocorrência dos frutos e sementes nas estações seguintes, geralmente de quatro a
seis meses após o primeiro registro. Com a prática o ilustrador encontra meios de contornar e
resolver esses problemas.
Como exposto, não se trata de um trabalho rápido. Desde a primeira etapa usa-se muita
atenção e concentração na observação de todas as características do vegetal como forma,
tamanho, tonalidades, textura da superfície das folhas, tipo de nervuras, disposição das folhas,
ramos ao longo do caule, peças que compõe as flores, enfim, todas as características que, em
conjunto, auxiliem a descrever graficamente o vegetal.
Qualquer pessoa que tenha interesse em desenvolver a Ilustração Botânica, sugere-se que
inicie com modelos que apresentem relativa facilidade de representação, isto é, que possua
formas simplificadas, número pequeno de folhas e flores singelas (não dobradas), para
gradativamente escolher modelos mais complexos. A finalização do trabalho em aquarela exige
certamente o desenvolvimento de técnica própria, como a aplicação de camadas transparentes
de tinta até se obter a tonalidade e intensidade de cores desejadas. Por isso propõe-se ao
iniciante, a princípio, a finalização dos trabalhos em lápis de cor, dada a facilidade técnica e
resultados rápidos e, se possível, buscar orientações sobre a técnica de aquarela com um
ilustrador experiente ou em fontes bibliográficas de referência.
Embora seja uma prática milenar, aos olhos das teorias modernas, os fundamentos
estéticos que norteiam a arte botânica estão embasados nos princípios do Naturalismo Científico,
corrente artística surgida no Renascimento com os trabalhos de Albretht Dürer, Leonardo da
Vince e André Vesálio, mas que sofreram influências dos movimentos artísticos que se
sucederam, do Barroco do século XVI ao Romantismo e Realismo do XVIII-XIX, adquirindo assim
nuances de naturalismo/romântico ao naturalismo/realístico, chegando à forma como é praticada
na atualidade. Ao lado dos aspectos puramente descritivos da ilustração, há também os de
caráter expressivo, isto é, os que dizem respeito mais diretamente à arte gráfica ou pictórica
associadas às características peculiares de cada artista, a personificação de sua obra, sua forma
de expressão, sem os quais não poderia ser considerada 'artística' esse tipo de atividade. Por
essa razão foi criada a expressão "Arte Botânica", pois o ilustrador para produzir uma obra
realmente bela e que impressione o observador, ao lado dos aspectos científicos de seu trabalho
terá que usar os recursos das artes plásticas como movimento, ritmo e equilíbrio, buscando a
harmonização de sua composição artística.

Breve Relato Histórico Sobre a Ilustração Botância no Brasil

Diana Carneiro

Na atualidade artistas brasileiros já produzem ilustrações botânicas com alto grau de


apuramento técnico e relativo virtuosismo, como as famosas ilustrações inglesas dos séculos
XVIII e XIX, época em que essa arte se firmou na Europa. Mas nossa história registra o
desenvolvimento dessa arte, a partir da criação de nossas instituições de pesquisa no sec. XIX e,
mais intensamente, no século passado.
Os primeiros registros gráficos da flora brasileira perdem-se no tempo do Brasil colonial
quando os primeiros viajantes percorreram as matas do país com os mais diferentes objetivos.
Desta época tem-se os relatos minuciosos e cenas descritas como as feitas por Hans Stäeden,
Jean de Lery e pelos padres jesuítas portugueses , seguida por Frei Cristóvão de Lisboa na
Amazônia, no início do séc. XVII. Porém, foi com a vinda dos holandeses para a Capitania de
Pernambuco em 1637, chefiados por Maurício de Nassau, que a história da Ilustração Botânica
no Brasil realmente tomou corpo. Faziam parte da comitiva de Nassau pintores como C. Peters,
Frans Post e Albert Eckhout que registraram principalmente a exuberância de nossas paisagens
tropicais costeiras.
Nos séculos seguintes o país recebeu diversas expedições de cientistas naturalistas que
vieram com a incumbência de retratar, descrever e coletar espécies vegetais, a maioria delas
desconhecidas para a Ciência. Nomes como Humboldt, Martius, Spix, Langsdorf, Rugendas,
Debret, Taunay e Hercules Florence merecem destaque neste panorama de artistas e cientistas
que deixaram um legado gráfico e pictórico de grande importância para o conhecimento da
biodiversidade e paisagem brasileiras do passado.
No século XX já temos a contribuição de artistas importantes como Maria Wernek de
Castro, Barbosa Rodrigues, Etienne Demonte, a equipe de Frederico Hoehne do Instituto
Botânico de São Paulo, dentre outros. Foi, contudo, uma inglesa - Margaret Mee, que colocou a
Arte Botânica novamente em destaque entre nós, documentando centenas de espécies das
florestas amazônica e atlântica em lindíssimas pranchas aquareladas. Nos seus quarenta anos de
trabalho no Brasil, realizou quinze expedições a Amazônia, documentando a flora nativa sendo
que algumas espécies, desconhecidas para a Ciência, levaram o seu nome de registro. Após sua
morte, em 1988, foi criada na Inglaterra a fundação Margaret Mee Amazon Trust e no ano
seguinte, no Brasil, a Fundação Botânica Margaret Mee. Ambas instituições compartilham
objetivos, dentre eles o de administrar bolsas de estudo para botânicos, biólogos e artistas
aquarelistas para aperfeiçoamento nesta arte. Fruto desses 20 anos de existência a FBMM enviou
a Londres quase duas dezenas de artistas que, através dos inúmeros cursos e oficinas
ministrados em nosso país, contribuíram decisivamente para a difusão dos conhecimentos
técnicos adquiridos.
Como resultado do impulso e desenvolvimento da arte botânica brasileira, a partir do ano
2000 vários núcleos de prática da atividade e centros de estudo foram criados no país como o
Centro de Ilustração Botânica do Paraná, Botânica Arte e Companhia em São Paulo e o Núcleo de
Ilustração Científica da UNB, em Brasília. Mais recentemente novos centros e associações
surgiram como o NIB da UFMG e a Associação de Ilustradores Botânicos do CentroOeste
Brasileiro, atendendo a formação de novos artistas e demanda da produção de uma nova
iconografia naturalista nacional com o registro de um número cada vez maior de espécies nativas
brasileiras.

©Supernova Comunicação_2002. Todos os direitos reservados.

Você também pode gostar