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FACULDADE DE ARTES, LETRAS E COMUNICAÇÃO

LICENCIATURA EM MÚSICA

Bruno Nascimento

RESENHAS DO LIVRO DAS SONORIDADES

2022.1
Resenha apresentada à disciplina Introdução à Filosofia
da Música, do curso de Licenciatura em Música, da
Faculdade de Artes, Letras e Comunicação (FAALC),
da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
(UFMS) - Prof. Dr. William Teixeira da Silva

Campo Grande/MS
FERRAZ, S. Livro das sonoridades: notas dispersas sobre composição. Rio de Janeiro: 7
Letras, 2005.

Capítulo 1

A obra literária, intitulada: “Livro das Sonoridades: notas dispersas sobre


composição”, de autoria de Ferraz (2005), traz à baila questões imprescindíveis concernente à
reflexão sobre a música e o tempo. O autor elucida que “compor é como fazer uma casa. É
desenhar um lugar” (FERRAZ, 2005, p. 35). Na esteira desse pensamento, o pesquisador
segue argumentando que o canto é parte constituinte das atividades que reforçam a
compreensão para o que ele classifica como o canto. Nesse contexto, nas palavras de Ferraz
(2005), essas ações terminam desembocando, logo mais, em elementos cunhados de
“harmonias, as séries, as pequenas reiterações, as sonoridades reverberantes, os pequenos
jogos de ressonância são aquele material que utilizamos para desenhar este lugar” (FERRAZ,
2005, p. 35).
Se formos mais fundo na questão, veremos, mais adiante que Ferraz (2005) cunhado
nas ideias de Deleuze, apresenta o conceito de ritornelo, um símbolo com dois pontos no final
de uma partitura com a finalidade de delimitar um trecho musical, fazendo com que essa
determinada extensão seja repetida. O autor trata essa especificidade como uma metáfora pois
segundo ele, é por meio dessa especificidade que “opera o compositor quando torna sonoras
certas forças que não nos são sensíveis, não são sonoras – nem presente, nem passado. Esta é
a ligação da música com o som, não organizar sons, mas, se o tópico é organizar, tornar a
organização sonora (FERRAZ, 2005, p. 36).
A partir de conceitos como esses, que naturalmente revelam que a música passa a ser
pensada não somente apenas por evidências catalogáveis (os temas recursivos, as sequências
harmônicas e seriais), como salienta o autor, mas também por pequenos pontos circulantes
que registram um conjunto de informações sobre um determinado documento ou conjunto de
documentos.
É nessa linha de raciocínio, então, que Ferraz (2005) elucida uma de suas estratégias
que tem o objetivo de envolver o indivíduo nas atividades concernente à música, o que ele vai
chamar de jogo de modulação do classicismo, fazendo com que o ouvinte sinta-se conduzido
para fora de um determinado ambiente (FERRAZ, 2005). E é nessa aventura de fazer com que
o sujeito se sinta envolvido nesse tipo de atividade que “uma nota trai a harmonia, desfaz o
perfil principal da frase musical, uma sonoridade leva para um outro espaço de ressonâncias”
(FERRAZ, 2005, p. 37).
Ferraz (2005) retoma a teoria de “Deleuze na aula sobre o galope, acerca dos saltos de
um ponto a outro, sem preparação de linhas de fuga traçada às pressas, vincos forçados, tem-
se que nem sempre a música é feita de momentos tranquilos” (FERRAZ, 2005, p.40). O autor
segue argumentando que tal comportamento influencia o aprendiz a lidar com diversas
situações, quer sejam elas envolta a locais de instabilidade, criando zonas de turbulências,
terrenos que muitas vezes podem causar convergência entre dois ou mais terrenos, momentos
em que os sujeitos: ouvinte, compositor e o intérprete são atraídos por mais de uma força, por
mais de um eixo: harmonia vagante (FERRAZ, 2005). Felizmente, e como se pode constatar,
“esses terrenos instáveis podem surgir de tais mixagens, ou ainda da alternância rápida de
lugares, como nas bricolagens, como no Sacre de Stravinsky” (FERRAZ, 2005, p. 40).
O teórico procura desmistificar conceitos firmados no paradigma de que qualquer som
é música, e isso, na concepção do autor é tido como algo trivial, de caráter unilateral, e isso
tende a estreitar a natureza intrínseca da música, suas especificidades. Como assinala Ferraz
(2005, p. 42), ela “independe do som que é produzido para que seja caracterizada como
música [...] Seria o mesmo que aceitar que é preciso sempre alguém que diga “música” para
que haja música, ou então acreditar que qualquer coisa pode ser “música”.
Ferraz (2005) por sua vez, postula que o acorde se despontou da união das notas
musicais, e que por meio delas seria possível escutar cada nota em um acorde separadamente.
Nessa linha de pensamento, com base na ideia do autor, que arrolamos visões sobre a “ideia
de música”, já no próximo capítulo.
Sendo assim, complementa, então, que num contexto sobre os fenômenos que
procuram descrever, interpretar e compreender à percepção humana, é que Ferraz (2005), à
luz da “fenomenologia Schaeffereana”, “distingue dois planos determinantes para a escuta
musical do século XX, aquela que foi arrancada das salas de concerto para dentro dos rádios e
“gramofones”: o plano da sonoridade e o da musicalidade” (FERRAZ, 2005, p. 53).
Aprender a música exige uma nova percepção sobre fatores que a compõem, perpassa
a mera prática instrumental em si. Ferraz (2005) já argumentava que de maneira oposta refrear
“a música à percepção auditiva, a proposição de Schaeffer foi a de identificar um espaço que
lhe permitisse pensar a composição musical a partir do som, e não mais a partir de uma escuta
de atribuições ou abstrações ou de uma redução à audição (FERRAZ, 2005, p. 53).
Corroborando essa premissa, o autor testifica que a musicalidade, processo de
construção do conhecimento musical está associada à dinâmica de correlacionar os sons
atribuindo valores intrínsecos como “sons musicais, sons não musicais, instrumentos musicais
e ruídos não musicais. Com a cadeia do solfejo desmontada, muito do que se tem por música
pouco tem a ver com som” (FERRAZ, 2005, p. 58). Todavia, no tocante ao solfejo
tradicional, o pesquisador salienta que essa leitura métrica de caráter tradicional não se
respalda nos sons. Nessa lógica, ele chama a atenção para os quatro parâmetros dos sons, não
menos importante, mas sim de notas musicais: a altura, a intensidade, o timbre e a duração
(FERRAZ, 2005).
Levando em consideração tal contexto, Ferraz (2005) problematiza o conceito de “o
que é musicalidade, o que é música, o que torna algo em música. Assim, ele argumenta que as
respostas para seus questionamentos se configuram no “resultado da ação de uma operação
diferencial sobre aquilo que chamamos de história, de culturas, vidas etc” (FERRAZ, 2005, p.
63).
Ferraz (2005) complementa então, que num contexto característico daquilo que produz
som, ele se firma novamente nas ideias de Pierre Schaeffer, argumentando que nem tudo o
que é sonoro é entendido como música, mas produzir música é, na verdade, “tornar sonoro
forças não sonoras: forças de crescimento, forças de conexão humana, forças de guerra, forças
táteis, forças visuais etc (FERRAZ, 2005, p. 69).
Ferraz (2005) teoriza ainda que “criar uma sequência de sons, colocar uma frase
sonora depois, ou sobre a outra, não traz em si nenhuma garantia de que o que se fez foi
música, nem de que se fez a repetição do diferente” (FERRAZ, 2005, p. 74). Seguindo essa
trilha didático-pedagógica, é certo que no plano da música (FERRAZ, 2005), desmistificar as
nuanças de um sistema concernente à escuta, toma-se a consciência de que essa especificidade
rompe com paradigmas de que a simples escuta é algo profícuo em detrimento dos processos
criativos voltados para esse gênero composicional. “Mas, no plano da música, aquilo a que
chamamos de escuta é mais do que sonoro'' (FERRAZ, 2005, p. 76).
Diante desses dados tão expressivos e impressionantes, Ferraz (2005) postula que não
podemos passar despercebidos, ou ser surdos, como ele mesmo elucida, diante das relações
que os sons articulam com as nossas vidas, pois “um grito, um chamado, um choro, um
pedido, a voz humana, uma lembrança qualquer, uma paisagem sonora” (FERRAZ, 2005, p.
76-77), estão imbricados com o conceito de musicalidade na sua essência. E assim tem sido.
Diante dessa peculiaridade, essas questões envolvem um rol de sonoridades que
transitam umas às outras (FERRAZ, 2005). É nessa lógica que “Caminantes no hay camino…
el camino se hace al caminar”, título do próximo capítulo que se pretende dissertar de forma
sucinta. É nessa seara, portanto, que as metáforas sobre “às da natureza, forças como a
centrípeta, a centrífuga, a força da gravidade, força de crescer, força do vento e outros vetores,
forças que conectam coisas” (FERRAZ, 2005, p. 89), forças que não podemos ver, nem ouvir,
mas simplesmente sentir, merecem ser desatados.
Como bem lembra o autor, retomando o conceito de ritornelos, citado no início do
texto, o plano de composição recai sobre a responsabilidade do compositor que cria a
melodia. Nesse contexto, Ferraz (2005) atribui nome a essa atividade o que ele chama “de
material (Deleuze substitui o par matéria-forma do fenômeno pelo material-força da
sensação), a matéria investida de relações humanas” (FERRAZ, 2005, p. 96).
Nesses cenários e momentos peculiares, é que no último capítulo resenhado, nas
entrelinhas, o autor elucida sobre o tema “Em um Livro das Sonoridades, por que não
descrever?”. Nesse sentido, ao estabelecer-se o diálogo entre a música e o compositor, o autor
espera que essa faceta possa angariar resultados satisfatórios. Ao deixar claro que seria
prazeroso se “apenas com a resposta simples de alguém que, lendo algumas linhas, tenha se
instigado a ler alguns dos textos citados, a ouvir alguns dos compositores comentados, ou a
ver alguns dos pintores que nortearam esta escritura (FERRAZ, 2005, p. 125).
Ao longo do texto, vimos que as leituras em cada capítulo possuem a função de
instigar o leitor a refletir de maneira intensa sobre a música e porque não, sobre o tempo.
Vimos também que mesmo não sendo algo conclusivo, o autor foi otimista, embora tenha
deixado nas entrelinhas alguns descontentamentos sobre a questão de que o futuro é tido
como uma potência que intercepta ou mesmo influencia o presente. Em suma, embora tenha
tido um pouco de dificuldades para entender alguns conceitos existentes na obra de Ferraz,
quando fazia a leitura, ela mesma me instigou a pesquisar sobre essas ideias que outrora eu
não tinha conhecimento. Isso enriqueceu meu vocabulário, induzindo ainda mais meu instinto
pesquisador como futuro professor de música e outros.

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