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Evaldo Becker 1
Resumo: Este artigo serve como apresentação à nossa tradução de dois textos de Rousseau. Os textos
possuem tamanhos e importância díspares, mas ambos podem nos auxiliar na compreensão da temática
que liga a questão da linguagem e das línguas à questão da moral e da política na obra do ‘cidadão de
Genebra’. O primeiro escrito a ser apresentado é: A origem da melodia. Trata-se de um primeiro esboço
daquele que virá a ser intitulado Ensaio sobre a origem das línguas. Já o segundo texto, intitula-se: Sobre a
eloquência, e faz parte do conjunto de escritos agrupados sob o título Mélanges de Littérature et de Morale, no
Tomo II das obras completas de Rousseau, edição da Pléiade.
Palavras-chave: Rousseau – linguagem – eloquência – política.
Nossa intenção ao traduzir os dois textos que ora apresentamos, foi de disponibilizar
ao leitor brasileiro, escritos de Rousseau que tratam da questão da linguagem e da música em
uma estreita vinculação com a questão dos costumes e da moral. Os textos possuem
tamanhos e importância díspares, mas ambos podem nos auxiliar na compreensão da
temática que liga a questão da linguagem e das línguas à questão da moral e da política na
obra do ‘cidadão de Genebra’.
O primeiro escrito a ser apresentado é: A origem da melodia. Trata-se de um primeiro
esboço daquele que virá a ser intitulado Ensaio sobre a origem das línguas. Bem antes de ter
acabado de escrever o Ensaio sobre a origem das línguas, Rousseau havia desenvolvido em
‘L’Origine de la mélodie, e também no chamado Principe de la mélodie ou réponse aux erreurs de M.
Rameau sur la Musique, escritos provavelmente no ano de 1755 2, sua defesa da melodia em
contraposição aos escritos de Rameau que argumentavam em favor da harmonia. Conforme
* Aproveito a oportunidade para agradecer ao Osmar de Souza Medeiros, colega do Grupo Rousseau
da USP, pela leitura e pelas dicas de tradução de passagens complicadas dos textos ora traduzidos.
1 Pós-Doutor em Filosofia – USP. Professor da UFS – Universidade Federal de Sergipe. A presente
tradução foi realizada como parte das pesquisas de pós-doutorado realizadas entre 2008 e 2009, sob
a supervisão da Profa. Dra. Maria das Graças de Souza, e foi financiada pela FAPESP – Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
2 Cf. TROUSSON & HEIGELDINGER, Dictionnaire de Jean-Jacques Rousseau, p. 673.
Para Rousseau, ‘o natural’ está sempre ligado à simplicidade, aos sons inarticulados,
imitativos da fauna de cada região, por isso, ‘figurado’, impreciso e acentuado. Enquanto que
3 Cf. GAGNEBIN, Introduction aux Ecrits sur la musique, la langue et le théâtre, p. XIX.
4 ROUSSEAU, L’origine de la mélodie. OC, V, p. 333.
5 ROUSSEAU, L’origine de la mélodie. OC, V, p. 334.
6 ROUSSEAU, Essai sur l’origine des langues. OC, V, p. 383.
a princípio não houve outra música além da melodia, nem outra melodia que
não o som variado da palavra; os acentos formavam o canto, e as quantidades,
a medida; falava-se tanto pelos sons e pelo ritmo quanto pelas articulações e
pelas vozes.9
Defender esta diversidade originária das línguas, equivale a afirmar, contra Diderot
por exemplo, que inexiste uma língua original articulada. Equivale a negar a existência de
uma ‘sociedade geral do gênero humano’. Rousseau afirmará que é justamente a ausência de
uma língua universal que evidencia o caráter puramente abstrato da noção de “gênero
humano”. Ele defenderá a ideia segundo a qual as línguas exprimem as peculiaridades
distintivas dos povos e de suas maneiras de conduzir sua vida em comum, e desde o princípio
evidenciam a pluralidade das formações sociais e de seus modos de vida. Na concepção de
Rousseau as línguas são produtos peculiares das diversas formas de sociabilidade humana.
Esta linguagem original que era pura transparência e que indicava no seu acento e
inflexão o próprio sentimento ao qual dava vazão; essa língua que em seu princípio não se
distinguia do canto e da poesia era utilizada com o intuito de transmitir os sentimentos e
posteriormente ideias e intenções. Tal linguagem, entretanto, acaba por se modificar no
momento em que as sociedades particulares são estabelecidas, isso porque as línguas
particulares, que são “seres morais”, refletem – como verificamos acima – as características
do clima, do local e do modo de vida das pessoas que as instituíram.
Com o passar do tempo, o homem se afasta de suas origens ampliando suas ‘luzes’,
mas corrompendo-se concomitantemente. Rousseau escreve no Capítulo V do Ensaio, que:
Tais ideias já se encontravam no esboço inicial do Ensaio sobre a origem das línguas que
ora apresentamos, onde Rousseau afirma que:
É por percebermos esta estreita vinculação estabelecida por Rousseau, entre a origem
da linguagem, da música e da vida social, que nos dispomos a traduzir e apresentar este que
Impossível não ver nessa frase inicial da carta de Sêneca uma correspondência com
o início do fragmento do autor genebrino. E ao final do primeiro parágrafo, Sêneca cita a
Abstract: This paper is an introduction to our translation of two texts by Rousseau. These texts are
different in size and importance, but both can help us understand the link between the questions
concerning language (and languages) and the question of morals and politics in the works of the ‘citizen
of Geneva’. The first text to be presented is The origin of melody. It is a first draft of what would become
the Essay concerning the origin of languages. The second is titled On eloquence, and is part of the ensemble
grouped under the title Mélanges de Littérature et de Morale, which is in the Tome II of Pléiade’s complete
works by Rousseau.
Keywords: Rousseau – language – eloquence – politics.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GAGNEBIN, Bernard. Introduction aux Ecrits sur la musique, la langue et le théâtre. In:
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Œuvres complètes. Volume V. Paris: Éditions Gallimard, 1995, p.
XIII-XXIX.