Você está na página 1de 17

São Paulo, 02 de Janeiro de 2021

Ao Rev.mo Pe. Carlos Herrera, FSSPX – São Paulo, Brasil.

Cordiais cumprimentos em Cristo Jesus Nosso Senhor,

Seguem-se as teses/objeções as quais considero não satisfatoriamente


respondidas em minha consciência, e que por amor sincero a Jesus Cristo, creio serem
as resoluções, de sumo valor e importância para que eu possa aderir sem receio àquilo
que se proclama como Verdadeira Fé, ou seja, a Fé Católica da Igreja Romana.
Gostaria de manifestar a compreensão de que nem toda resposta está ao
alcance da limitada inteligência humana, e como bem afirma Santo Tomás de Aquino:

Nada impede que um conhecimento mais certo segundo a sua natureza seja
ao mesmo tempo menos certo para nós; isso se deve à fraqueza do nosso
espírito, que se encontra, diz Aristóteles, ‘diante das mais altas evidências das
coisas, como olho da coruja diante da luz do sol’. A dúvida que pode surgir
com relação aos artigos de fé não deve, portanto, ser atribuída a uma
incerteza das coisas mesmas, mas à fraqueza da inteligência humana. [...]
(AQUINO, Tomás de. Summa Theologiæ. [S. l.] ~ 1265-1273). Disponível
em: https://www.facebook.com/iAquinasPT/photos/a.675778622856347/103
0343930733146/. Acesso em: 09 dez. 2020.

Em sentido contrário, deposito firmemente a minha Fé nas Palavras de


Nosso Senhor, por meio da autoridade do Bem-Aventurado Apóstolo Pedro: “Estejam
sempre preparados para responder a qualquer que lhes pedir a razão da esperança que
há em vocês” (1 Pedro 3:15, grifo nosso). – Em tal caso apenas anseio por uma
explicação às graves objeções em contrapartida da esperança que devo depositar na Fé
da Igreja Romana.

Desde já, gostaria de antecipar o desejo e a expectativa de que todas estas


objeções não passem de equívocos pessoais de minha parte, tendo em vista o profundo
amor que nutri pela mesma Igreja ao longo de tão curto período de conversão (há aprox.
2 anos). Sem mais, descrevo-as abaixo:
1-) Acerca do Primado Petrino:

• Resumo Histórico:

1) 588 d.C. – Sínodo de Constantinopla: João IV, “o Jejuador”, patriarca de


Constantinopla, recebe o título de “ecumênico” ou “Bispo Universal”, mas não começa
a usá-lo até 595 d.C. Ref.: https://www.newadvent.org/cathen/08493a.htm.

2) 590 d.C. – Gregório I, o Grande, torna-se Patriarca de Roma, 590-604 d.C.

3) 595 d.C. – João IV, começa a usar o título de “Bispo Universal” e Gregório I, nega o
título até para si mesmo. Como Bispo de Roma, Gregório I protesta o uso do título de
“Bispo Universal” por João IV, dizendo que tal afirmação é um sinal de que “o
Anticristo está perto” o que chama também de “título orgulhoso e profano” e equipara
João IV ao próprio diabo:

Livro V, Carta 18 a João IV, Bispo de Constantinopla:

[...] Certamente o apóstolo Paulo, quando ouviu alguns dizerem: Eu sou de


Paulo, eu de Apolo, mas eu de Cristo – 1 Coríntios 1:13, considerou com o
maior horror tal dilaceração do Corpo do Senhor, pela qual eles se juntaram,
pois foram, a outras cabeças, e exclamou, dizendo: Foi Paulo crucificado por
vós? Ou você foi batizado em nome de Paulo (ib.)? Se então ele evitou
sujeitar os membros de Cristo parcialmente a certas cabeças, como se ao
lado de Cristo, embora isto fosse aos próprios apóstolos, o que você dirá
a Cristo, quem é o Cabeça da Igreja universal, no escrutínio do juízo
final, tendo tentado colocar todos os seus membros sob o seu nome pelo
nome de Universal? Quem, eu pergunto, é proposto para imitação neste
título injusto, mas aquele que, desprezando as legiões de anjos
constituídas socialmente consigo mesmo, tentou subir a uma eminência
de singularidade, para que pudesse parecer não estar sob nenhuma e
estar sozinho acima todos? Quem mesmo disse: ‘Subirei ao céu, exaltarei o
meu trono acima das estrelas do céu: sentarei no monte do testamento, nas
laterais do Norte: subirei acima das alturas das nuvens; Serei como o
Altíssimo’ – Isaías 14:13. [...]

[...] Não foi o caso, como sabe a Vossa Fraternidade, que os prelados desta
Sé Apostólica, que pela providência de Deus eu sirvo, tiveram a honra de
serem chamados universais pelo venerável Concílio de Calcedônia? Porém,

2
nenhum deles jamais desejou ser chamado por tal título, ou apoderar-se
deste nome imprudente, para que se, em virtude da posição do pontificado,
tomasse para si a glória da singularidade, poderia parecer ter negado isso a
todos os seus irmãos. [...]

(Gregório I: Livro V, Carta 18, tradução nossa, grifo nosso). Disponível em:

https://www.newadvent.org/fathers/360205018.htm. Acesso em 09 dez 2020.

Em outras cartas afirma:


(Livro VIII, Carta 30 a Eulogius, Bispo de Alexandria)

[...] Vossa bem-aventurança também teve o cuidado de declarar que agora


não fazeis uso de títulos orgulhosos, que surgiram de uma raiz de vaidade,
por escrito a certas pessoas, e você [no entanto] se dirige a mim dizendo:
‘Como você ordenou’. Esta palavra, ‘ordenar’, eu imploro que você retire
da minha audiência, pois eu sei quem eu sou e quem você é. Pois em
posição vocês são meus irmãos, em caráter meus pais. Eu não ordenei,
então, mas estava desejoso de indicar o que parecia ser lucrativo. No entanto,
não acho que sua bem-aventurança esteja disposta a se lembrar perfeitamente
disso mesmo que trouxe à sua memória. Pois eu disse que nem a mim nem a
qualquer outra pessoa deves escrever algo dessa espécie; e eis que, no
prefácio da epístola que você dirigiu a mim mesmo, que a proibiu, você
julgou conveniente fazer uso de uma denominação orgulhosa, chamando-
me Papa Universal. Mas imploro a Vossa Santidade mais doce que não
faça mais isso, pois o que é dado a outro além do que a razão exige é
subtraído de você. Pois quanto a mim, não procuro prosperar por palavras,
mas por minha conduta. Nem considero isso como uma honra pela qual sei
que meus irmãos perdem sua honra. Pois minha honra é a honra da Igreja
universal: minha honra é o vigor sólido de meus irmãos. Então, fico
verdadeiramente honrado quando a honra devida a todos e a cada um deles
não é negada. Pois, se Vossa Santidade me chama de Papa Universal,
você nega ser você mesmo o que me chama universalmente. [O mesmo
poderia ser observado com relação à denominação da Igreja, que é “Católica”
porém não “Romana”, do contrário deixa de ser “Católica”, mas a Igreja
Romana seria parte da Igreja Católica] Mas longe de nós. Fora com palavras
que aumentam a vaidade e ferem a caridade. [...]

(Gregório I: Livro VIII, Carta 30, tradução nossa, grifo nosso). Disponível
em: https://www.newadvent.org/fathers/360208030.htm. Acesso em: 09 dez.
2020.

3
Carta a Maurício Tibério Augusto, imperador:

[...] Agora, eu digo com confiança que todo aquele que se chama, ou deseja
ser chamado, Sacerdote Universal, está em sua exaltação o precursor do
Anticristo, porque ele orgulhosamente se coloca acima de todos os outros.
[...]

(Gregório I: Livro VII, Carta 33, tradução nossa, grifo nosso). Disponí-vel
em: https://www.newadvent.org/fathers/360207033.htm.
Acesso em: 09 dez. 2020.

Em outros trechos, retomando a carta 18 do Livro V:

O rei do orgulho está perto e (terrível para ser dito!) Há um


exército de sacerdotes em preparação para ele, visto que aqueles que
foram nomeados para serem líderes em humildade se alistam sob o
pescoço do orgulho. Mas neste assunto, embora nossa língua não tenha
protestado de forma alguma, o poder d’Aquele que em Sua própria pessoa se
opõe peculiarmente ao vício do orgulho é exaltado para vingança contra a
exaltação. Pois, portanto, está escrito: ‘Deus resiste ao orgulhoso, mas dá
graça ao humilde’ – Tiago 4:6. Por isso, novamente, é dito: ‘Todo aquele que
exalta seu coração é impuro diante de Deus’ – Provérbios 16:5. [...]

[...] Ele [Jesus] disse: ‘Quem quiser ser o principal entre vocês será o menos
de todos’ – Mateus 20:27. Pelo que se vê claramente como é verdadeiramente
exaltado nas alturas aquele que em seus pensamentos se humilha. Tenhamos,
portanto, medo de ser contados entre aqueles que buscam os primeiros
assentos nas sinagogas, e saudações no mercado, e ser chamado de rabino de
homens. Pois, ao contrário, o Senhor diz aos seus discípulos: ‘Mas não sejais
chamados Rabi; porque um é o vosso mestre; e todos vocês são irmãos. E a
nenhum homem chame seu Pai sobre a terra, pois um é o seu Pai’ –
Mateus 23:7-8.

O que então, querido irmão, você dirá naquele terrível escrutínio


do julgamento vindouro, se você ambiciona ser chamado no mundo não
apenas de pai, mas também de pai geral? Que, então, se evite a má
sugestão de homens maus; que toda instigação à ofensa seja fugida. Deve ser
(de fato) que as ofensas vêm; no entanto, ai daquele homem por quem a
ofensa vem (Mateus 18:7). Eis que por causa deste título execrável de
orgulho a Igreja está dividida, os corações de todos os irmãos são levados à
ofensa. O quê! Já te escapou a memória como a Verdade diz: ‘Quem ofender

4
um destes pequeninos que crêem em mim, seria melhor para ele que uma
pedra de moinho fosse pendurada em seu pescoço, e que ele se afogasse nas
profundezas do mar.’ (Ib. 5:6) Mas está escrito, ‘a caridade não busca o seu
próprio’ – 1 Coríntios 13:4. [...] (Id., ibid.).
Disponível em: https://www.newadvent.org/fathers/360208030.htm.
Acesso em: 09 dez. 2020.

4) 595 d.C. – João IV, o Jejuador, morre em 2 de Setembro, pouco depois de afirmar ser
o Papa Universal.

5) 602 d.C. – O imperador romano Maurício é assassinado em um golpe por Focas, que
então se torna imperador. Ref.: https://en.wikipedia.org/wiki/Maurice_(emperor)

6) 604 d.C. – Gregório Magno, Bispo de Roma morre e é substituído por Sabiniano, que
reina por dois anos.

7) 606 d.C. Sabiniano, Bispo de Roma morre e é substituído por Bonifácio III. Focas
escreve ao novo bispo de Roma, Bonifácio III e, por decreto imperial do governo
romano, proclama Bonifácio III, como o “Chefe de todas as Igrejas” e “Bispo
Universal”. Focas transfere o título de Constantinopla para Roma. Bonifácio III,
Bispo de Roma assume o título: “Bispo universal”: o Catolicismo Romano nasce
formalmente em sua forma evoluída final, mas o leste nunca aceita as reivindicações de
Roma e, finalmente, divide a comunhão com Roma em 1054 d.C.

Referências:

• https://pt.wikipedia.org/wiki/Papa_Bonifácio_III
• https://pt.wikipedia.org/wiki/Grande_Cisma

8) 607 d.C. – Bonifácio III morre em 19 de Fevereiro, pouco depois de afirmar ser o
Papa do Universal. É interessante que o primeiro líder oriental (João IV, o Jejuador) ao
se proclamar “Bispo Universal” e o primeiro líder ocidental (Bonifácio III) ao fazer o
mesmo, tenham morrido em 12 meses afirmando ser o “Bispo Universal”.

9) Em resumo, quando João IV, Patriarca de Constantinopla, começou a se chamar


“Bispo Universal”, Gregório I, Patriarca de Roma, não disse: “Ei, esse é o meu título,

5
você não tem o direito de usá-lo.” Em vez disso, Gregório disse que nenhum homem
deveria se considerar o “Bispo Universal” (mesmo quando tal título fosse oferecido em
relação ao Bispo de Roma, o que pode ser evidenciado abaixo), chamando-o de sinal de
que o “anticristo” estava próximo. (Ver II Tes. 2:3-4) O bispo de Constantinopla, João
IV estava dizendo, “Eu superei você”, Gregório estava dizendo, “nós somos iguais”,
embora Gregório prontamente fizesse a alegação de que ele, não João, foi um sucessor
do Apóstolo Pedro. (Primado de Honra, o que, entretanto não prova o Primado
Jurídico).

Carta a Eulogius; Bispo de Alexandria e Anastácio; Bispo de Antioquia:

[...] Pois, como sabe Venerável Santidade, este nome de Universalidade foi
oferecido pelo santo Sínodo de Calcedônia ao pontífice da Sé Apostólica,
que pela providência de Deus eu sirvo. Mas nenhum dos meus
predecessores jamais consentiu em usar este título tão profano; visto
que, em verdade, se um Patriarca é chamado Universal, o nome do
Patriarca no caso dos demais é derrogado. Mas longe está isso, longe está
da mente de um cristão, que qualquer um deseje tomar para si aquilo pelo
qual ele possa parecer diminuir a honra de seus irmãos no mínimo grau.
Embora, então, não estejamos dispostos a receber esta honra quando nos é
oferecido, pense como é vergonhoso para qualquer um ter desejado usurpar
para si mesmo à força. [...]

(Gregório I: Livro V, Carta 43, tradução nossa, grifo nosso). Disponível em:
https://www.newadvent.org/fathers/360205043.htm.
Acesso em 09 dez 2020.

• Resumo das objeções:

1) João estava usando o título para excluir todos os outros bispos.


Gregório se opôs porque o título se aplicava apenas a ele, como o Papa, significando
que João roubou o título de Gregório.
2) Gregório objetou porque João estava definindo erroneamente o título para significar
algo diferente de como Gregório usaria o título, ou João estava definindo corretamente o
título, mas não tinha o direito de usá-lo porque pertencia exclusivamente a Gregório?

6
• Resposta:

Primeiro, João IV nunca afirmou excluir todos os outros bispos com o título
mais do que Bonifácio III fez alguns anos depois, quando assumiu o título.
Em segundo lugar, Gregório nunca disse que o título estava errado porque
era apenas para ele usar, mas que nenhum homem deveria usá-lo. – Cf.: “[...] Pois eu
disse que nem a mim nem a qualquer outra pessoa deves escrever algo dessa
espécie; [...]” (Gregório I: Livro VIII, Carta 30, tradução nossa, grifo nosso).
Disponível em: https://www.newadvent.org/fathers/360208030.htm. Acesso em: 09 dez.
2020.

Finalmente, o Papado Romano é onde o Papa tem controle universal total de


toda a Igreja em todo o mundo. Suas declarações ditas “dogmáticas” e entre outras não
podem ser derrubadas por ninguém.
Não é exatamente esta a definição que dizem que João estava aplicando ao
Papa Universal? Na verdade, o Papa hoje, realmente está em uma classe sozinho, sem
outros.

Resposta a algumas contra-argumentações das disposições anteriores:

I) “… A sé apostólica, está, por ordem de Deus, estabelecida sobre todas as Igrejas…”


[etc., bem como expressões relacionadas tais como: “pela autoridade do Apóstolo
Pedro” (Gregório I, Livro V, Carta 43) – demonstrando acordo e conformidade com a
ortodoxia do mesmo citado Apóstolo – “Primado de Honra”].

- Gregório Magno Livro III, Carta XXX ao Subdiácono João. – grifo nosso.

I) Resposta:

É verdade que o Bispo de Roma tinha o hábito de fazer esse tipo de


afirmação. Entretanto, é fato também, que todos os concílios e cânones anteriores a isso
evidenciaram que Roma não tinha o controle total e absoluto da Igreja Universal. Em
325, três igrejas patriarcais governavam igualmente o mundo. Em 381 d.C., o Segundo
Concílio Ecumênico (I Concílio de Constantinopla) tentou mudar o número de igrejas
governantes de 3 para 2 poderes iguais e 3 poderes secundários. Em 451 d.C., o quarto

7
concílio ecumênico, 5 igrejas patriarcais iguais. Embora Roma sempre tenha tido o
maior prestígio (de honra), sempre foi entendido que Roma não tinha controle
(jurídico) total, mas compartilhava o poder com as outras igrejas patriarcais.

Sobre a Sé Apostólica:

[...] sobre a qual, por autoridade divina, três bispos agora presidem. [...]

- Gregório, Livro VII, carta 40.

Disponível em: https://www.newadvent.org/fathers/360207040.htm

1) Referências:

• Cânon No. 6 do I Concílio de Nicéia:

6. Confirmação de antigos costumes, dando jurisdição sobre grandes regiões


aos bispos de Alexandria, Roma e Antioquia:

“Que o antigo costume no Egito, Líbia e Pentapolis prevaleça, que o


Bispo de Alexandria tenha jurisdição em todos estes, uma vez que o
mesmo é habitual para o Bispo de Roma também. Da mesma forma em
Antioquia e as outras províncias, deixe as Igrejas mantêm seus privilégios. E
isso é seja universalmente entendido, que se alguém for feito bispo sem o
consentimento do Metropolita, o grande Sínodo declara que tal homem não
deve ser um bispo. Se, no entanto, dois ou três bispos pelo amor natural de
contradição, oporem-se ao sufrágio comum do resto, sendo razoável e de
acordo com a lei eclesiástica, em seguida, deixai a escolha da maioria prevale
-cer.” (Cânones do Concílio de Nicéia. 325 d.C., grifo nosso).

Disponível em:
http://www.apologistascatolicos.com.br/obraspatristicas/Obras/ConciliosEcu
menicos/ConcilioDeNiceiaI.html. Acesso em: 11 dez 2020. Hora: 15 h 00
min.

8
Segundo o site “Apologistas Católicos” o texto católico (referente à parte
grifada) possui as seguintes interpretações possíveis do referido Cânon acima. Segue-se
abaixo:

“uma vez que o mesmo [ou este, τοῦτο] é de costume para o bispo de Roma
também.”

O texto vem com “O MESMO” τοῦτο, Se refere ao que? Ora se o


texto diz “o Bispo de Alexandria tenha jurisdição em todos estes”, então em
seguida diz “O MESMO” logo isso quer dizer que o mesmo território que
Alexandria tinha poder é de costume Roma também ter.

O pronome τοῦτο está diretamente ligado a palavra anteriormente


mencionada “jurisdição” que no texto grego vem como ἐξουσίαν, então o
costume era a “jurisdição” sobre “Egito, Líbia e Pentapolis”. Quando passa o
discurso para Roma τοῦτο entra para dizer que “este” ou “o mesmo” costume
era também para bispo romano também. Fica de se entender que aquilo
mesmo que se referia a Alexandria, ou seja a “Jurisdição” dos territórios, era
para Roma também.

Eu não entendo como “uma vez que o mesmo é de costume para o


bispo de Roma também”, pode significar “o bispo de Roma tem autoridade
sobre o seu próprio território também.”.

https://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/controversias/5
82-o-concilio-de-niceia-e-a-supremacia-de-roma-no-canon-vi.
Acesso em: 11 dez 2020. Hora: 15 h 00 min.

E assim, o autor passa a citar o texto original em grego, depois a tradução


para o latim, ao seu favor. O texto grego nos diz:

ς′. Τὰ ἀρχαῖα ἔθη κρατείτω τὰ ἐν Αἰγύπτῳ, καὶ Λιβύῃͅ καὶ Πενταπόλει, ὥστε
τὸν ἐν Ἀλεξανδρείᾳ ἐπίσκοπον πάντων τούτων ἔχειν τὴν ἐξουσίαν, ἐπειδὴ
καὶ τῷ ἐν τῇ Ῥώμῃ ἐπισκόπῳ τοῦτο σύνηθές ἐστιν· ὁμοίως δὲ καὶ κατὰ τὴν
Ἀντιόχειαν καὶ ἐν ταῖς ἄλλαις ἐπαρχίαις, τὰ πρεσβεῖα σώζεσθαι ταῖς
ἐκκλησίαις. Καθόλου δὲ πρόδηλον ἐκεῖνο, ὅτι εἴ τις χωρὶς γνώμης τοῦ
μητροπολίτου γένοιτο ἐπίσκοπος, τὸν τοιοῦτον ἡ μεγάλη σύνοδος ὥρισε μὴ
δεῖν εἶναι ἐπίσκοπον. Ἐὰν μέν τοι τῇ κοινῇ πάντων ψήφῳ εὐλόγῳ οὔσῃ, καὶ
κατὰ κανόνα ἐκκλησιαστικὸν, δύο ἢ τρεῖς δι᾽ οἰκείαν φιλονεικίαν
ἀντιλέγωσι, κρατείτω ἡ τῶν πλειόνων ψῆφος5.

Extraído de:
https://earlychurchtexts.com/main/nicaea/canons_of_nicaea_01.shtml.
Acesso em: 11 dez 2020. Hora: 15 h 13 min.

9
Este texto poderia ser interpretado como foi feito pelo autor Católico
Romano? Uma análise do texto nos mostra que isto é altamente improvável:

O cânon nos fala de vários costumes ἔθος (éthos), já que a palavra está no
plural ἔθη (éthi). Por que são vários costumes? Provavelmente por que se refere ao
costume no Egito, na Líbia e em Pentápolis. Quais são estes costumes? A palavra grega
ὥστε, seguida de acusativo mais infinitivo, nos dá uma consequência: a oficialização
destes costumes antigos portanto dará o poder a Alexandria sobre estes territórios. O
texto portanto está oficializando uma situação já existente em Alexandria.

Aqui entra a menção a Roma, que é introduzida pela conjunção ἐπειδὴ


(epeidí), que é o marcador de causa ou razão. Ou seja, o poder sobre aquelas igrejas será
dado a Alexandria por que para Roma isto também é costumeiro τοῦτο σύνηθές ἐστιν
(toúto sýnithés estin). Aqui nos deparamos com a grande pergunta: a que se refere τοῦτο
nesta frase? Como o pronome demonstrativo é neutro singular, provavelmente se refere
a uma cláusula anterior. E assim, poderia apontar, como sugere o texto católico, a “ter o
poder sobre todos estes” πάντων τούτων ἔχειν τὴν ἐξουσίαν (pánton toúton échein tín
exousían). Mas poderia também simplesmente se referir a “ter o poder” ἔχειν τὴν
ἐξουσίαν (échein tín exousían), sem entrar nos méritos de especificar sobre quais
territórios Roma teria este poder. Há vários motivos para pensar que a última explicação
é a que melhor se encaixa ao contexto do cânon. Em primeiro lugar, como já vimos, a
cláusula sobre Roma é uma cláusula causal: ela está dando o motivo para se dar
autoridade a Alexandria. Sendo assim, qual a interpretação que explica melhor o cânon
6? Aquela que se dá autoridade a Alexandria sobre aquelas regiões por que o bispo
de Roma tem autoridade sobre elas, ou aquela que dá autoridade a Alexandria
sobre suas regiões por que Roma tem autoridade sobre as suas regiões também? A
última interpretação mostra uma vontade de equilibrar o poder das Metrópoles, mas
qual seria a explicação da primeira interpretação?

O texto fica mais claro à medida que continuamos sua leitura. O cânon
começa a falar sobre Antioquia, e neste ponto emprega o advérbio ὁμοίως (omoíos), que
significa “da mesma forma”. Se τοῦτο (toúto) na cláusula anterior se refere a “ter o
poder sobre todos estes”, a consequência será que Antioquia também deveria da mesma
forma “ter o poder sobre todos estes”, e o mesmo para “as outras províncias”: todos
deveriam ter poder sobre o Egito, Líbia e Pentápolis. Mas obviamente não é esta a

10
intenção do concílio, e isto fica claro quando ele especifica exatamente aquilo que está
se estabelecendo para Antioquia: “deixe as igrejas reterem seus privilégios”. Este é o
resumo da primeira parte deste cânon. Assim, quando se diz que Alexandria deve ter o
poder sobre suas regiões, que Roma também tem este poder, que Antioquia tem o
mesmo, assim como outras regiões, está se declarando apenas isto: que as igrejas
retenham seus privilégios igualmente.

Para confirmar esta interpretação, cita-se o Antigo Epítome: “uma vez que o
mesmo é de costume para o bispo de Roma também” (NFPF e History of the Christian
Church, vol. II., p.275, grifo nosso), para deixar claro que este era o entendimento
antigo sobre este texto. Logo, a interpretação dada pelo site Católico-Romano é
altamente improvável.
Ref.: http://www.e-cristianismo.com.br/historia-do-cristianismo/pais-nicenos-e-pos-
nicenos/a-jurisdicao-de-roma-no-concilio-de-niceia.html#sdendnote5sym.

• O Cânon No. 28 de Calcedónia:

No IV° Concílio Ecumênico reunido em Calcedónia em 451, aprovou-se


entre outros o seguinte cânon vigésimo oitavo:

28. O bispo de Nova Roma (Constantinopla) gozará dos mesmos privilégios


que o bispo da Roma Antiga, por causa da remoção do Império. Por essa
razão, os [metropolitas] do Ponto, da Ásia e da Trácia, bem como os bispos
bárbaros, serão ordenados pelo bispo de Constantinopla;

«NPNF2-14. The Seven Ecumenical Councils». Christian Classics Ethereal


Library. Consultado em 24 de junho de 2019. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Concílio_de_Calcedónia#Cânones /
https://www.ccel.org/ccel/schaff/npnf214.toc.html#P3825_663549. Acesso
em: 09 dez. 2020.

O cânon 28 concede privilégios iguais (isa presbeia) a Constantinopla


como de Roma, porque Constantinopla seria a Nova Roma, algo renovado pelo cânon
36 do Concílio Quinissexto de 697. O Papa Leão I declarou o cânon 28 nulo e sem
efeito, aprovando apenas os cânones do concílio que eram pertinentes à fé. [1] [2]

1
CATHOLIC ENCYCLOPEDIA: Council of Chalcedon. www.newadvent.org. Retrieved 2018-12-07.
2
MIGNE, Jacquies Paul, Patrologia Latina, 54, 1038 & 1143

11
O “Santo, Grande e Universal Concílio” simplesmente se dirigiu ao
bispo de Roma como “Arcebispo Leão”. [1] [2] [3]

Conclusões:

1) Leão não pôde impor a sua vontade aos orientais,


2) O cânon 28 permaneceu,
3) Não há por parte dos membros do concílio nenhum reconhecimento ou
consciência de que o bispo de Roma fosse dotado de algum poder de
jurisdição universal por direito divino e sucessão apostólica.

Algumas considerações em menção à Carta 43, de Gregório Magno:

[...] Pois, como sabe Venerável Santidade, este nome de Universalidade foi
oferecido pelo santo Sínodo de Calcedônia ao pontífice da Sé Apostólica,
que pela providência de Deus eu sirvo. Mas nenhum dos meus
predecessores jamais consentiu em usar este título tão profano; visto
que, em verdade, se um Patriarca é chamado Universal, o nome do
Patriarca no caso dos demais é derrogado. (Id., ibid.).
Disponível em: https://www.newadvent.org/fathers/360205043.htm.
Acesso em 09 dez 2020.

Entretanto, nas atas do Concílio de Calcedónia, local algum consta que tal
concílio ofereceu o título de bispo universal aos bispos de Roma. Cf.:
https://www.newadvent.org/fathers/3811.htm.

1
MIGNE, Jacquies Paul, Patrologia Latina, 54, 951
2
SCHWERIN, Pastor Philip (April 20–21, 1998). How the Bishop of Rome Assumed the Title of
“Vicar of Christ” (PDF). essays.wls.wels.net. South Central District Pastoral Conference. p. 5. Retrieved
2018-12-07.
3
DOESWYCK, Peter J. (2012). Ecumenicalism and Romanism: Their Origin and Development.
Literary Licensing. p. 93, grifo nosso. ISBN 9781258514310.

12
Um detalhe a observar:

Comenta Dr. Tommaso Mari, especialista em linguística pela Otto-Friedrich,


Universidade de Bamberg 1:

In the text transmitted in his own letter, Pope Leo is identified as “the
head of the universal church” (caput universalis ecclesiae, 5–7), but in the
Greek translation he is down-graded to “archbishop of great and senior
Rome.” Who exactly is innovating here? Is Leo magnifying his titles in his
letter to the Gallic bishops? Or is it rather the Greek translators who
downplay the role of the Roman see within the universal church? One has to
take into account that the stretch of time following the Council of Chalcedon
was a period of friction between Rome and Constantinople over the idea of
the Roman primacy within the church.36 I have mentioned above that the
official edition of the Acts promoted under the Emperor Marcian aimed to
undercut the role of the Roman see at the Council. The downgrading of Pope
Leo’s standing in this passage fits in well with that tendency. What is ironic
here is that the sixth-century Latin translators, who were actively pro-Roman,
were tricked by the Greek translations into downgrading the Pope, while they
probably would have been very happy to call him “the head of the universal

1
Perfil acadêmico: https://www.uni-bamberg.de/en/erc-stg-aco/correspondingfellows/dr-tommaso-mari/
https://www.researchgate.net/profile/Tommaso_Mari2

13
church. (MARI, Tommaso. The Latin Translations of the Acts of the
Council of Chalcedon: Greek, Roman and Byzantine Studies. 58, 2018,
p. 144) Disponível em:

https://www.researchgate.net/publication/324644252_The_latin_translations_
of_the_acts_of_the_council_of_chalcedon. Acesso em 10 dez. 2020.

Tradução (Google Tradutor):

No texto transmitido em sua própria carta, o Papa Leão é


identificado como “o cabeça da igreja universal” (caput universalis
ecclesiae, 5-7), mas na tradução grega ele é rebaixado a “arcebispo da grande
e velha Roma.” Quem exatamente está inovando aqui? Leão está
ampliando seus títulos em sua carta aos bispos gauleses? Ou são os tradutores
gregos que minimizam o papel da visão romana dentro da igreja universal?
Deve-se levar em consideração que o período de tempo após o Concílio de
Calcedônia foi um período de atrito entre Roma e Constantinopla sobre a
ideia do primado romano dentro da igreja. 36 Mencionei acima que a edição
oficial dos Atos promovida sob o imperador Marciano pretendia minar o
papel da sé romana no Conselho. O rebaixamento da posição do Papa Leão
nesta passagem se encaixa bem com essa tendência. O que é irônico aqui é
que os tradutores latinos do século VI, que eram ativamente pró-romanos,
foram enganados pelas traduções gregas para rebaixar o papa, embora
provavelmente ficassem muito felizes em chamá-lo de “o chefe da Igreja
Universal.” (MARI, Tommaso. The Latin Translations of the Acts of the
Council of Chalcedon: Greek, Romanand Byzantine Studies.58, 2018, p. 14
4, grifo nosso, tradução nossa).

Disponível em:
https://www.researchgate.net/publication/324644252_The_latin_translations_
of_the_acts_of_the_council_of_chalcedon. Acesso em 10 dez. 2020.

14
Segundo Giovanni Domenico Mansi, padre e teólogo italiano:

“O santíssimo, beatíssimo arcebispo da grande e antiga Roma, Leão, por


nosso intermédio e do presente santo sínodo, juntamente com o beatíssimo e digno de
todo louvor bem-aventurado Pedro apóstolo, que é pedra e base da santa Igreja católica
e o fundamento da verdadeira fé, espoliou-o (Dióscoro) da dignidade episcopal e
afastou-o de todo ministério sacerdotal”. [1]

II) Carta a Maurício Tibério Augusto, imperador:

[...] Para todos os que conhecem o Evangelho, é evidente que, pela voz do
Senhor, o cuidado de toda a Igreja foi confiado ao santo Apóstolo e Príncipe
de todos os Apóstolos, Pedro. Pois a ele se diz: ‘Pedro, tu me amas?
Apascenta as minhas ovelhas’ – João 21:17. A ele se diz: ‘Eis que Satanás
deseja peneirar você como trigo; mas eu orei por ti, Pedro, para que sua fé
não desfaleça. E tu, quando te converteres, confirma os teus irmãos.’ – Lucas
22:31. A ele se diz: ‘Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja
e as portas do Inferno não prevalecerão contra ela. E dar-vos-ei as chaves do
reino dos céus e tudo o que ligardes a uma Terra também será ligado no céu;
e tudo o que desligardes na terra será desligado também no céu.’ – Mateus
16:18.

Eis que ele recebeu as chaves do reino celestial, e foi dado a ele poder
para ligar e desligar, o cuidado e o principado de toda a Igreja foram
confiados a ele, mas mesmo assim ele não foi chamado de apóstolo
universal; enquanto o homem santíssimo, meu companheiro padre João,
tenta ser chamado de bispo universal. Sou compelido a gritar e dizer: Ó
tempora, ó mores! [...]

(Gregório I: Livro V, Carta 20, tradução nossa, grifo nosso). Disponível em:
https://www.newadvent.org/fathers/360205020.htm.
Acesso em 11 dez 2020.

1
MANSI, Conciliorum amplissima collectio, VI, 1047 (Act. III); Schwartz, II, vol. I, pars. altera, p. 29
(225] (Act. II), grifo nosso.

15
II) Resposta:

São Gregório, nesta passagem está a falar exclusivamente do Apóstolo


Pedro. Tudo isso é atribuído somente a Pedro pessoalmente.
São Gregório não diz que “[...] o cuidado de toda a Igreja foi confiado ao
santo Apóstolo e Príncipe de todos os Apóstolos, Pedro,... e aos seus sucessores na
figura dos Bispos de Roma.” Neste trecho, vale observar a parte grifada. – “[...] mas
mesmo assim ele não foi chamado de apóstolo universal; [...]

Averigua-se também um equívoco muito comum, por parte dos membros da


Igreja Católica Romana acerca dos títulos honoríficos atribuídos com relação à Sé da
Igreja de Roma. Semelhantemente, acerca da citação: “Roma preside a Igreja na
caridade.” (Inácio de Antioquia, Carta aos Romanos – Prólogo)., ou seja, que de tal
afirmação poderia se concluir superioridade jurisdicional, mutatis mutandis sobre toda a
Igreja Universal.
Os elogios e os títulos honoríficos, o seu papel de liderança corroboraria e
definiria a estrutura básica do papado consecutiva e ininterrupta. Deve se dizer que, não
basta demonstrar apenas que o Apóstolo Pedro tinha uma primazia de honra e um papel
de proeminência (mesmo jurisdicional sobre a Igreja de seu tempo), pois nenhum
teólogo protestante (sério) nega isto, mas deve se demonstrar a primazia jurisdicional
consequentemente com a comprovação de sucessão interrupta até que se desbanque na
pessoa do atual Papa; Franciscus, S.J. – Card. Jorge Mario Bergóglio, e deve-se
demonstrar que tal existia na Igreja primitiva dos primeiros séculos à luz da literatura
patrística ou qualquer outra fonte de época, que seja unanemente aceita e comprovada
pela História.

16
CONCLUSÃO

A elaboração deste relatório, com as objeções anteriormente referidas e


comprovadas, pretende evidenciar tal qual era a forma de governo jurídico da Igreja
Cristã Primitiva em seus primeiros IV/V séculos de História.
Em suma, é possível concluir a inexistência de um poder jurídico Universal,
isto é, que exercia o seu poder quanto às definições de fé e moral sobre toda a Igreja
Católica, sem exceção.

Por virtude do Papado, produziram-se os dois maiores cismas da história do


cristianismo:

1. O Grande Cisma entre as Igrejas do Oriente e a do Ocidente, quando o


Papa quis impor aos orientais a doutrina do Primado Romano, e como os orientais a
desconheceram, os quis excomungar.

2. O Grande Cisma do Ocidente, quando outro Papa, subestimou o clamor


da Reforma e deixou que a Igreja se dividisse.

Como curiosidade, ambos tinham tomado para si o mesmo nome:

Leão IX – Papa 1049-1054

Leão X – Papa 1513-1521

Durante séculos a Igreja manteve a sua unidade sem primado de jurisdição nem de
magistério do bispo de Roma. Quando quis impô-los, precipitou o cisma.

Você também pode gostar