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DESENVOLVENDO A INTELIGÊNCIA VISO-ESPACIAL

NOS ALUNOS DE ENGENHARIA DA UFPE

Danilo Candido Pereira


UFPE – CAC, Departamento de Expressão Gráfica
danilo.candidop@ufpe.br

Maria Eduarda Rabelo Duarte


UFPE – CAC, Departamento de Expressão Gráfica
eduardarabelo@hotmail.com

Andiara Valentina de Freitas e Lopes


UFPE – CAC, Departamento de Expressão Gráfica
andiaralopes@yahoo.com

Resumo
Este artigo objetiva uma análise na estrutura didático-metodológica da
disciplina Introdução ao Desenho dos cursos de Engenharia da UFPE
focando no desenvolvimento da inteligência viso-espacial dos alunos
através da habilidade de comunicação e expressão gráfica. Nessa
disciplina os conteúdos ministrados são a perspectiva cavaleira, o desenho
isométrico e o sistema mongeano. Estudando a problemática pela
psicologia cognitiva, principalmente nas teorias de Jean Piaget e Howard
Gardner, observa-se que as dificuldades surgem desde a ausência da
disciplina na educação básica e o não desenvolvimento da habilidade na
infância. Para assim, sugerir exercícios de habilidades espaciais e uma
revisão dos conceitos geométricos básicos.

Palavras-chave: inteligência visual e espacial, psicologia cognitiva,


expressão gráfica.

Abstract
This paper aims an analysis in the methodological and educational
structure of the discipline “Introduction to Drawing of the Engineering
graduation” from the Course Expressão Gráfica of the Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE). It is focused on the development of the
visual and spatial intelligence through the abilities of graphic expression
and communication. In this discipline, the content includes the oblique
perspective, the isometric drawing and orthogonal views. Studying the
issue by the cognitive psychology, mainly in Jean Piaget and Howard
Gardner theories, it was observed that the difficulties rises because of the
absence of the discipline in basics education and the non-development of
the skill in the childhood. Therefore, it suggests spatial abilities exercises
and a review of the basics geometrics concepts.

Keywords: visual and spatial intelligence, cognitive psychology, graphic


expression.

1 Introdução
Este trabalho enfoca uma análise da estrutura didático-metodológica da disciplina
“Introdução ao Desenho” do ciclo básico dos cursos de Engenharia da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE), visando o desenvolvimento da percepção viso-
espacial dos alunos através da habilidade de interpretação e expressão gráfica. Os
conteúdos dessa disciplina compreendem o estudo da perspectiva cavaleira, o
desenho isométrico e o sistema mongeano. Procedendo metodologicamente nessa
sequência, observa-se que há barreiras na aprendizagem desses conteúdos, de
ordem psico-cognitiva e epistemológica.
Segundo o Art. 4º e 6º da resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE,
2002), a formação do bacharel em engenharia, independente de sua modalidade, deve
versar sobre algumas competências e conteúdos básicos. Um dos tópicos foca a
competência na comunicação e expressão gráfica como parte da formação básica do
engenheiro para, só então, desenvolver uma das habilidades fundamentais para a
formação do bacharel em Engenharia: a inteligência espacial.
A teoria piagetiana descreve o desenvolvimento cognitivo como uma
transformação que acontece do interior para o exterior pela interação entre o indivíduo
e o meio. Para Piaget, o desenvolvimento da inteligência espacial – e qualquer outro
tipo de inteligência – acontece através do processo de maturação, experiência e
transformação social. Conforme essa teoria (BISHOP, 1978 apud SORBY, 1999), esse
desenvolvimento acontece em três estágios. Em primeiro lugar, desenvolvem-se as
habilidades topológicas, ou seja, a capacidade de distinguir e relacionar objetos
bidimensionais; em segundo, desenvolvem-se habilidades espaciais projetivas, ou
seja, a capacidade de visualizar objetos tridimensionais de diferentes pontos de vista;
por fim, em terceiro lugar, desenvolvem-se relações entre habilidades projetivas com
conceitos de medidas, ou seja, a capacidade de visualizar volume, área, distância,
rotação, translação e reflexão.
Conforme Sorby (1999), alguns estudos acerca do desenvolvimento da percepção
visual concluem que em diversas carreiras a inteligência espacial interpreta um papel
de grande importância. Profissões da área tecnológica e das ciências, como
engenharia, necessitam tanto dessa habilidade quanto as profissões ligadas às artes.
O programa curricular da disciplina “Introdução ao Desenho” da UFPE aplica um
procedimento didático adequado para o desenvolvimento da inteligência espacial, isto
é, parte de uma representação de fácil intelecção espacial, como a perspectiva
cavaleira e o desenho isométrico, para uma representação de interpretação mais
complexa como o sistema mongeano, contrariando o cânone literário da área cujo
tópico inicial é o sistema mongeano para depois estudar as perspectivas. Entretanto,
observa-se que ainda há dificuldades enfrentadas por parte de alguns discentes em
relação à percepção espacial que persistem devido a diversos fatores. Contudo,
apenas dois são adequados ao nosso estudo. O primeiro refere-se ao não
desenvolvimento da inteligência espacial durante a infância. Dessa forma, grande
parte dos alunos encontra-se estacionada no primeiro estágio do desenvolvimento
cognitivo, quando deveria estar no terceiro estágio. O segundo é a não familiaridade
com os conteúdos estudados – que muitas vezes são vistos pela primeira vez nessa
disciplina – os quais deveriam ser estudados pelos alunos antes do ingresso à
universidade, como os bacharelados em Arquitetura e Urbanismo e Design e os
alunos de Licenciatura em Expressão Gráfica, que realizam uma prova específica de
Geometria Gráfica que envolve esses conteúdos.
Como uma forma de suprir essa necessidade, este estudo analisará a origem
dessas dificuldades para sugerir estratégias metodológicas e didáticas que ajudarão
no desenvolvimento da habilidade viso-espacial desses alunos.

2 Desenho na educação básica e superior


O perfil do aluno de engenharia antes do ingresso à universidade é de um estudante
com habilidade lógico-matemática bem desenvolvida e com boa compreensão das
ciências da natureza, pois a prova de seleção para esse curso (o vestibular) exige
conhecimentos de matemática, química e física. Entretanto, é negligenciado a esse
estudante o oferecimento de disciplinas na educação básica que desenvolvam
competências relacionadas à percepção visual, como é o caso de Artes e Desenho
Geométrico (ou até mesmo Matemática).
A estrutura curricular da educação básica sofreu modificação em 1971 com a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de número 5692, a qual definia quais
seriam os grupos de disciplinas obrigatórias e optativas da educação básica. Nessa
modificação, a disciplina de Desenho Geométrico tornou-se parte do grupo de
optativas e, como consequência, a matéria começou a desaparecer dos currículos
escolares brasileiros. Outro fator que também contribuiu para a desvalorização da
disciplina de Desenho nessa mesma década foi a abolição da prova de Desenho
Geométrico com régua e compasso dos vestibulares para os cursos de Arquitetura e
Engenharias. Apenas em 1998, nos Parâmetros Curriculares Nacionais, é que alguns
conteúdos de Desenho Geométrico foram integrados ao currículo de Matemática, mas
sem qualquer expressividade ou aprofundamento. Aos poucos, também, a prova de
habilidade em Desenho retorna aos vestibulares para os cursos de Arquitetura e
Urbanismo e novos cursos ligados às áreas do design e das artes, mas não aos
cursos de Engenharias. Essa prova que possui diferentes denominações, tais como
“Prova de Aptidão” ou “Prova de Geometria Gráfica” (como é o caso da UFPE), possui
conteúdos que variam da Geometria Euclidiana à Geometria Descritiva.
A ausência da disciplina na educação básica e dessa obrigatoriedade para os
vestibulares de Engenharias deixam falho, tanto por parte do aluno como do professor,
o desenvolvimento de habilidades que, a priori, são indispensáveis para um estudante
que prestará exame para Engenharia. Esquece-se que a habilidade viso-espacial é
importante tanto para a vida acadêmica como para a vida profissional do bacharel em
Engenharia.
Nos cursos de Engenharia da UFPE, independente da modalidade (Civil,
Mecânica, Cartográfica, de Produção, etc.), as disciplinas estudadas no ciclo geral (ou
básico) distribuem-se em áreas das ciências exatas (como Cálculo Diferencial e
Integral, Geometria Analítica e Álgebra Linear), ciências da natureza (como Física
Geral, Física Experimental e Química Geral), informática (como Computação
Eletrônica) e expressão gráfica (como Introdução ao Desenho). Como as habilidades
lógico-matemáticas já foram trabalhadas durante a educação básica, as disciplinas
ligadas às ciências exatas, da natureza e da informática podem ser desenvolvidas sem
que se precise recorrer a conceitos e definições elementares (como conhecimentos de
aritmética, por exemplo). No entanto, nas disciplinas que envolvem a expressão
gráfica, que trabalham com propriedades geométricas (apenas trabalhadas de
execução algébrica e analítica no ensino básico) e normas do desenho técnico, os
alunos carecem de familiaridade com os elementos que as circundam, como acontece
com o manejo de materiais para traçado (compasso, par de esquadros, escala, etc.) e
os conceitos geométricos básicos, satisfazendo assim, numa disciplina de 60
(sessenta) horas, os objetivos necessários para preencher as lacunas deixadas pela
educação básica.
A disciplina “Introdução ao Desenho”, como dito anteriormente, tem como objetivo
desenvolver a capacidade de percepção viso-espacial através da comunicação e
interpretação gráfica. O conteúdo dessa disciplina versa sobre três tópicos principais:
a perspectiva cavaleira, o desenho isométrico ou isometria simplificada e o sistema
mongeano. Os dois primeiros não são estudados como sistemas de representação,
pois para a perspectiva cavaleira ser um sistema de representação, a projeção oblíqua
deve ser acompanhada de uma vista ortogonal (COSTA, 1994); e para isometria
simplificada ser um sistema de representação, suas arestas devem ser multiplicadas
pela razão de 0,816 característica da isometria axonométrica. Apenas o sistema
mongeano é visto como um sistema de representação. Todavia, o foco dessa
disciplina não é o ensino dos sistemas de representação, e sim o desenvolvimento de
habilidades espaciais através de representações gráficas, já que dependendo da
modalidade de engenharia escolhida pelo graduando, haverá disciplinas específicas
para o estudo dos sistemas de representação como disciplinas de Geometria
Descritiva e Desenho Técnico.

3 Desenvolvimento da inteligência viso-espacial


De acordo com a teoria do desenvolvimento cognitivo do epistemólogo suíço Jean
Piaget, o desenvolvimento humano acontece em quatro estágios. Diferentes entre si,
esse estágios mostram como o ser humano interage e reage ao ambiente. No primeiro
estágio, sensório-motor, a criança (0-2 anos) responde através de reflexos e é capaz
de realizar tarefas motoras como resposta ao ambiente. No segundo estágio, pré-
operacional, a criança (2-7 anos) começa a se utilizar de símbolos para representar
sensações visuais, sonoras e táteis; nessa fase a criança percebe o ambiente apenas
por seu ponto de vista, ou seja, é a fase em que a criança está muito voltada para si.
No terceiro estágio, operacional concreto, a criança (7-11 anos) deixa o egocentrismo
para iniciar um pensamento de forma lógica e entender o ambiente, interagindo com
ele. Finalmente, no quarto estágio, chamado de operacional formal, a criança (acima
dos 12 anos) consegue realizar ideias abstratas a partir da formulação de conceitos
lógicos (TERRA, 2011).
Em cada estágio, a criança passa por processos cognitivos que a ajudam a
adaptar-se ao ambiente. Piaget chama esses processos de assimilação e
acomodação. O primeiro é quando a pessoa integra um novo dado às suas estruturas
cognitivas, ou seja, uma nova experiência, adaptando esse novo conhecimento aos
que já possui. O segundo é definido quando a pessoa modifica os dados (adquiridos
no processo de assimilação) através de uma situação externa, como por exemplo,
quando uma criança observa um gato e um cão e por relação aponta para o gato e
chama-o de cão, ação que é corrigida por um adulto (elemento externo) que explica
que aquilo é um gato e não um cão. A partir daí a criança "acomoda" uma nova ideia,
que no caso é o “gato” (TAFNER, 2001). Portanto, o desenvolvimento das inteligências
(linguística, viso-espacial, lógico-matemático, etc.) acontece a partir de uma mesma
função semiótica, isto é, todos os aspectos simbólicos (língua, números, imagem,
movimento, etc.) desenvolvem-se conforme a mesma função.
Influenciado pelas teorias de Jean Piaget, o também teórico da psicologia
cognitiva Howard Gardner acredita que o desenvolvimento das inteligências ocorre de
forma independente de seus códigos simbólicos. Contudo, Gardner (1994) acredita
que uma criança pode desenvolver uma habilidade precocemente (o que para Piaget
seria o estágio operacional formal) e possuir outra um pouco abaixo da média
(sensório-motor). Para Gardner, o desenvolvimento cognitivo é a capacidade que o
individuo tem para comunicar e interpretar ideias em diversos sistemas simbólicos,
sem que necessariamente haja ligações entre uma inteligência e outra. Ele acredita
que cada área do conhecimento desenvolve habilidades especificas e que o
desenvolvimento de determinadas inteligências tem ligação com a valorização de
culturas particulares. Gardner identificou, assim, sete inteligências: linguística, musical,
lógico-matemático, viso-espacial, corporal-sinestésica, interpessoal e intrapessoal.
Porém, nosso estudo focaliza particularmente a inteligência viso-espacial, mais
especificamente a origem da dificuldade de seu desenvolvimento em alunos de
Engenharia, cuja convenção cultural valoriza apenas o desenvolvimento da habilidade
lógico-matemática dessa profissão.
Segundo Gardner (1994), a inteligência viso-espacial é a capacidade de perceber
o universo visual e espacial de maneira precisa,

[...] reconhecer exemplos do mesmo elemento; a capacidade de


transformar ou reconhecer uma transformação de um elemento em
outro; a capacidade de evocar formar mentais e então transformar
estas formas; a capacidade de produzir uma representação gráfica de
informações espaciais [...] (GARDNER, 1994, p.136-137).

Essa habilidade é desenvolvida por arquitetos, artistas plásticos, engenheiros,


decoradores, etc. e envolve uso da cor, linha, traço, forma e configuração do espaço.
As pessoas com essa habilidade bem desenvolvida têm uma percepção do mundo
multidimensional, facilidade para distinguir objetos no espaço, boa orientação espacial
(uso de mapas e percurso) e se expressa com mais frequência visualmente (desenho,
pintura) do que verbalmente (escrita, fala).
Segundo Sorby (1999), o desenvolvimento de habilidades espaciais acompanha
os mesmos estágios da teoria piagetiana, com exceção do estágio sensório-motor,
pois a criança é incapaz de relacionar elementos de forma lógica. No primeiro estágio
do desenvolvimento da habilidade espacial (referente ao pré-operacional da teoria
piagetana), as crianças desenvolvem habilidades topológicas (bidimensionais). Nesse
estágio é possível perceber relações entre objetos planos (normalmente, em crianças
que montam quebra-cabeças, esse está bem desenvolvido). No segundo estágio
(operacional concreto), crianças são capazes de perceber e distinguir objetos
tridimensionais, mesmo de diferentes pontos de vista, rotacionados ou transformados.
Muitas crianças que alcançam esse estágio têm facilidades com objetos conhecidos,
mas se outros fatores (como movimento, por exemplo) forem adicionados haverá
dificuldade de percepção. No terceiro estágio (operacional formal), o adolescente
consegue perceber conceitos sobre área, volume, distância combinados com
habilidades projetivas como translação, rotação e reflexões. Nesse estágio, os
adolescentes são capazes de executar jogos de comutadores tridimensionais com
facilidade. Sheryl Sorby (1999) afirma que algumas atividades, tais como brincar com
jogos de construção, ajudam o desenvolvimento da visualização espacial. Da mesma
forma, participar em atividades manuais que envolvem a construção de objetos
(mecânico, artesanal) na escola, participar de algumas atividades esportivas e
habilidades matemáticas bem desenvolvidas ajudam na visualização espacial.
Em resumo, Piaget acredita que todo desenvolvimento acontece de uma mesma
função semiótica. Já Gardner aponta que o desenvolvimento independe do código
simbólico. Mas, tanto Piaget quanto Gardner encaram o desenvolvimento cognitivo
como um processo contínuo de transformações das estruturas cognitivas, resultando
cada estrutura na mudança de uma estrutura anterior, ou seja, o ser humano constrói
o conhecimento continuamente através de uma reconstrução desse conhecimento
fazendo-o cada vez mais hábil à inteligência em questão. Ambos viam nos seres uma
necessidade de moldar-se ao ambiente e, a partir daí, construir o conhecimento que
permita realizar uma significação para impor uma intervenção ao ambiente por meios
de adaptação.
Visando essas teorias, foi observado que os estudos de Gildo Montenegro, sobre
a inteligência visual e espacial, estabelecem uma relação com elas. Os exercícios de
orientação do espaço, reconhecimentos e relacionamento de formas, rotações de
imagens, mudanças de pontos de vista, leituras de mapas e outras atividades ajudam
ao estímulo da capacidade da habilidade viso-espacial (MONTENEGRO, 2005).
Através dessas atividades, é aplicada uma relação de transformação do estágio
cognitivo no qual o aluno se encontra para a resolução do problema espacial. A cada
problema, o aluno sedimenta o raciocínio usado e aplica-o no problema seguinte.
Realizando, dessa forma, os processos de assimilação e acomodação estudados por
Piaget; o as transformações do desenvolvimento cognitivo visto por ambos os teóricos.
Fazendo os estudos de Gildo Montenegro ideal para a aplicação.
4 O ensino de desenho
Como mencionado antes, a disciplina “Introdução ao Desenho” tem como objetivo
desenvolver a capacidade de percepção visual dos alunos e a partir de
representações gráficas (duas perspectivas e um sistema de representação) construir
essa habilidade. A disciplina tem como conteúdo inicial a perspectiva cavaleira e todos
os elementos que a circundam (fator de conversão, eixos, posição do ortoedro de
referência, etc.) e em seguida o desenho isométrico (ou isometria simplificada). Como
se trata de perspectiva – representação de um objeto tridimensional no plano
bidimensional – é possível ver três faces da figura de forma integrada, ou seja, uma
representação mais semelhante à forma tridimensional. Dessa maneira, o aluno tem
como se relacionar de mais diretamente com o objeto tridimensional. Porém, mesmo
com essa "facilidade" de relacionar a imagem com o objeto, os alunos têm dificuldade
de manipular essa imagem mentalmente, como rotacioná-la ou ainda transformá-la,
dificuldade essa, oriunda do não desenvolvimento da habilidade espacial durante a
infância. Visando uma melhoria nessa habilidade, são sugeridos alguns exercícios de
habilidades espaciais para despertar a inteligência, criados por Gildo Montenegro.
Num dos problemas dados por Montenegro (2004), seis peças são apresentadas
de forma que apenas uma delas complete a figura, que é colocada no centro do
exemplo. O objetivo é formar, através da união das duas peças um cubo achatado.

Figura 1: Montenegro (2004, p. 28) - Juntando cacos

Esse problema é um exemplo claro de transformação de objetos e pode ser


trabalhado antes do estudo das perspectivas como uma forma de treinar a inteligência
visual em 3D.
Outro exemplo de problema que desperta habilidades tridimensionais são
exercícios que envolvem rotações mentais. Uma das grandes dificuldades dos alunos
de Engenharia em relação à representação do desenho de perspectiva é a rotação. O
uso de modelos plástico-didáticos auxilia bastante a resolver os exercícios de rotação,
pois com o objeto em mão, o movimento e as faces a serem mostradas são mais
facilmente perceptíveis. Mentalmente, esse tipo de habilidade categoriza-se no último
estágio do desenvolvimento cognitivo de Piaget (estágio operacional formal), devido
ao fato de a rotação mental ser uma ideia abstrata.
O problema abaixo ilustrado por Montenegro (2004) exemplifica esse tipo de teste.
É dada a perspectiva de um objeto e logo abaixo há três opções. Uma dessas opções
é a mesma perspectiva dada depois uma rotação.

Figura 2: Montenegro (2004, p. 32) - Qual a peça que está errada?

Logo após, os alunos passam a estudar o sistema mongeano. A grande questão


para a compreensão desse sistema de representação – composto por, no mínimo, três
vistas ortogonais – é entender que essas três vistas são apenas uma representação.
Diferente da sequência encontrada na literatura da área de expressão gráfica, no qual
o sistema mongeano é estudado antes das perspectivas, a sequência didática da
disciplina em questão atende à sua proposta, ou seja, privilegiar o desenvolvimento da
habilidade espacial ao invés do estudo dos sistemas de representação. Isto ocorre
porque o sistema mongeano é de interpretação mais complexa e exige do aluno um
nível de habilidade visual alta (estágio operacional formal), pois visualizar mentalmente
um objeto a partir de três vistas, que aparentemente não se integram, requer um alto
grau de abstração.
Alguns testes de habilidade visual criados por Montenegro (2004) ajudam a treinar
essa relação entre as vistas ortogonais e uma perspectiva. O exemplo abaixo mostra
três vista ortogonais e quatro opções de perspectiva. O objetivo é escolher a
perspectiva que se relaciona com o sistema mongeano. O problema ainda pede que
se explique por que as outras perspectivas não representam as vistas ortográficas.

Figura 3: Montenegro (2004, p. 24) - Belas vistas

Como as dificuldades não residem apenas no falho desenvolvimento da


habilidade visual, outros dois fatores colaboram para agravar o quadro: a pouca
familiaridade com os conteúdos geométricos básicos e o uso dos materiais de
desenho como, por exemplo, traçar retas perpendiculares ou paralelas em relação à
outra reta. Para realizar essa atividade o aluno deverá conhecer os conceitos de
perpendicularidade e paralelismo e saber como realizá-los com o par de esquadros ou
com o compasso. O exemplo abaixo ilustra bem essa questão. Eis o problema: em
relação ao segmento de reta AB, passe uma reta perpendicular passando em C e uma
reta paralela passando em D e E. O objetivo desse exercício é trabalhar com os
conceitos de perpendicularidade e paralelismo e, ao mesmo tempo, trata-se de um
exercício de como usar o par de esquadros.

Figura 4: Atividade para uso dos esquadros.

Esse tipo de atividade pode ser ministrada como uma introdução da disciplina
para familiarização dos instrumentos (que serão utilizados até o fim da disciplina) e
dos conceitos básicos geométricos (figuras planas, sólidos, curvas cônicas, etc.).
A visualização espacial tem um papel fundamental em diversas carreiras
profissionais de diferentes áreas do conhecimento, não apenas para as áreas de
Arquitetura e Artes, mas também para a Engenharia. De acordo com Ferguson (1992
apud Sorby, 1999), os primeiros engenheiros começaram como artistas no
Renascimento (como Leonardo da Vinci, Francesco di Giorgio e Georg Agricola).
Ferguson afirma ainda que os currículos atuais dos cursos de engenharias se apoiam
muito nos métodos analíticos, distanciando-se do uso da percepção visual e que as
falhas mais recentes da engenharia (a explosão do ônibus espacial Challenger, a
queda da ponte Tacoma Narrows e a falha do cruzador USS Vincennes) são
decorrentes da ausência de percepção visual, tátil e sensorial do currículo de
bacharelado em Engenharia.

5 Conclusão
Com o não desenvolvimento da percepção espacial devido a falhas na educação
básica, os alunos ingressam na universidade sem um conhecimento prévio. Portanto,
seria interessante a aplicação de uma prova de habilidade específica ou a prova de
geometria gráfica, como ocorre na seleção para os cursos de Arquitetura, Design e
Expressão Gráfica, para que exista uma preparação antes do ingresso à universidade
e para que as dificuldades enfrentadas pelos discentes na disciplina “Introdução ao
Desenho” sejam minimizadas.
Na busca por melhores resultados para os alunos, exercícios de visualização
espacial e desenho geométrico nas primeiras aulas da disciplina seriam uma maneira
de ajudá-los na percepção visual. Deste modo, o rendimento ao longo do período seria
melhor e mais satisfatório. Além disso, prepararia o aluno, que não teve suas
habilidades exploradas previamente, para qualquer desafio visual ao longo de sua vida
acadêmica, pessoal e profissional, bem como melhoraria sua aprendizagem em outras
áreas do conhecimento.

Referências

COSTA, Mario Duarte; COSTA, Alcy P. de A. Vieira. Geometria Gráfica


Tridimensional, v. 1. Recife: Editora Universitária - UFPE, 1994.

CNE. Resolução CNE/CES 11, de 11 de março de 2002. Diário Oficial da União,


Brasília, 9 de abril de 2002. Seção 1, p. 3. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES112002.pdf. Acessado em: 09/04/2011.

GARDENER, Howard. Estruturas da mente: a teoria das inteligências múltiplas. Trad.


Sandra Costa. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994.
MONTENEGRO, Gildo A. Habilidades espaciais: exercícios para o despertar de
idéias.Santa Maria: sCHDs, 2003.

MONTENEGRO, Gildo A. Inteligência Visual e 3-D: compreendendo conceitos


cásicos da geometria espacial. São Paulo: Edgar Blücher, 2005.

SORBY, Sheryl A. Developing 3-D spacial visualization skills. Engineering Design


Graphics Journal. v. 63, n. 2, p. 21-32, Spring, 1999.

TAFNER, Malcon. A construção do conhecimento segundo Piaget. Disponível em:


http://www.cerebromente.org.br/n08/mente/construtivismo/construtivismo.htm.
Acessado em: 20 abr. 2011.

TERRA, Márcia Regina. O desenvolvimento humano na teoria de Piaget.


Disponível em: http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/d00005.htm.
Acessado em: 20 abr. 2011.

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