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Doutorando do Programa de Pós Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade
Presbiteriana Mackenzie – Bolsista CAPES.
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Professor Doutor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
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Doutorando do Programa de Pós Graduação em Psicologia Educacional no Centro Universitário FIEO .
negros do sexo masculino, moradores das periferias e áreas metropolitanas
dos centros urbanos. Dados do SIM/DATASUS do Ministério da Saúde
mostram que mais da metade dos 52.198 mortos por homicídios em 2011 no
Brasil eram jovens (27.471, equivalente a 52,63%), dos quais 71,44% negros
(pretos e pardos) e 93,03% do sexo masculino (WAISELFISZ, 2013).
Problematizando Juventude,
Criminalização e Políticas Públicas
A partir do final dos anos 1980, os grupos em defesa dos direitos e adolescentes
desenvolveram uma série de discussões e mobilizações que culminaram com a
aprovação do Estatuto da Criança e do adolescente (ECA), que instituía a proteção
integral, já indicado no art. 227 da Constituição Federal de 1988, modificando o status
desses jovens de “menor” para sujeito de direitos.
Nem por isso a juventude pobre e negra deixou de ser alvo das demandas do
medo das classes medianas e altas que, com base em seus sensos comuns, exigiam a
repressão e punição, mesmo que isso incorresse em perdas de garantias de direitos e o
exercício de ações arbitrárias.
Para Tereza Caldeira:
Esta é uma das questões que vieram a tona na pesquisa piloto empreendida nesta
investigação. Ali, os jovens apontaram - como uma questão de fundo para a
compreensão do que é ser jovem em uma periferia urbana – a discriminação da qual são
vítimas, inclusive a policial. Assim, a partir dos
A PESQUISA PILOTO
Esta etapa da pesquisa inicia uma investigação mais ampla sobre a apropriação e
o impacto das politicas públicas e sociais junto a juventude. Os resultados referem-se a
avaliação realizada junto aos grupos de jovens participantes de uma Comissão de
Festividade do local pesquisado, em meados do mês de Junho/2018, no Conjunto
Residencial Jardim Gaivotas – Grajaú.
Foram feitos dos dois encontros com grupos de jovens moradores do extremo sul
da região metropolitana de São Paulo, caracterizado por algumas carências e
vulnerabilidades sociais, particularmente em termos de acesso a bens e serviços
públicos e sociais, moradias precarizadas, baixa renda familiar/ per capta e um forte
processo de estigmatização territorial e social.
O estudo, que se pretende ser mais amplo e englobar outras regiões da metrópole
paulistana, dadas as condições objetivas do momento, desenvolveu-se na região do
Grajaú, distrito de Capela do Socorro, Zona Sul da cidade de São Paulo.
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LEFÉVRE, F. e LEFÉVRE, A. M. C. O Discurso do Sujeito Coletivo: Um novo enfoque à pesquisa
qualitativa (desdobramentos). Caxias do Sul: UDUCS – Coleção Diálogos, 2005.
processo de discussão coletiva do tema em questão. A técnica de pesquisa é uma forma
de entrevista grupal, baseada na comunicação e na interação entre os participantes.
Assim, procurou-se identificar tendências e padrões de respostas associadas com o tema
de estudo, no caso a Juventude e as Políticas Públicas. O aspecto da criminalização e a
percepção que os jovens têm dela e como se percebem enquadrados ou inseridos nela
também foi assunto da discussão.
Assim a partir de categoria social juventude tais sujeitos foram sub classificados
em diferentes subgrupos: faixas etárias, gênero, escolaridades. Estas características
acrescentam variáveis que podem influenciar de modo não controlado os resultados do
estudo.
Esta etapa preliminar foi desenvolvida com dois grupos (um com 17
participantes e outro com 15), ambos realizados no mesmo dia, sendo um pela manhã e
outro a tarde. O critério para tanto foi a disponibilidade dos participantes.
Tabela 1
Idade e Gênero
% Gênero
Idade (anos) Total em relação ao Feminino Masculino
total
N. abs. % N. abs. %
De 15 até 18 8 3 33,33 5 21,74
De 18 até 21 18 4 44,45 14
De 21 até 25 4 1 11,11 1
De 25 até 29 2 1 11,11 1
Total 32 100,00 9 100,00 23
Tabela 2
Escolaridade, segundo gênero
% Gênero
Escolaridade Total em relação Feminino Masculino
ao total N. abs. % N. abs. %
Fundamental incompleto 1 3,12 1 4,35
Fundamental completo 7 21,88 1 11,11 6 26,10
Ensino médio incompleto 10 31,25 5 55,56 5 21,74
Ensino médio completo 12 37,50 2 22,22 10 43,56
Superior incompleto 2 6,25 1 11,11 1 4,35
Superior completo - - -
Total 32 100,00 9 100,00 23 100,00
Faremos aqui uma avaliação geral dos dois grupos trabalhados, indo direto para a
análise dos dados obtidos. Assim, a pesquisa destaca que os jovens de uma forma geral
conhecem as políticas públicas, muito embora, por vezes alguns as confundam com a
política partidária. Destacaram algumas como a escola, os postos de saúde, hospitais, o
policiamento, bem como programas como o Leve-Leite e cessão de cestas básicas, por
parte de algumas entidades.
Questionam algumas das iniciativas locais, como os CEUs, muito embora também
reconheçam sua importância na região. Da mesma forma, valorizam a educação, apesar
de não acreditar totalmente na possibilidade da transformação social apenas pela
questão da escolarização.
Tendo em vista sua origem socioeconômica, o fato de serem migrantes, ou filhos
de migrantes, negros e mestiços também têm uma noção do preconceito e da
discriminação que vivenciam – particularmente os rapazes – constantemente
“escolhidos” para serem revistados pela polícia. Por tudo isso, destacaram a importância
de “ralar” em dobro para alcançar “algo de bom na vida” uma vez que se sabem
“pobres, pretos e pardos, sem acesso e morando longe” como citado por eles.
Com tudo isso, no entanto, apesar do aspecto ruim dessa situação, da defasagem
em relação aos grupos privilegiados da sociedade - os “Burguesinhos/ Mauricinhos”-,
também se veem como mais amadurecidos e capazes de assumir a responsabilidade pela
própria vida. A permanência nas casas paternas, no mais das vezes, se dá por uma
questão de composição de renda ou, como relatado: “uns [os burgueses] não saem [da
casa dos pais] porque não querem largar o osso; outros [os jovens pobres] não saem
porque é a carne dele que ajuda a manter a casa em pé”.
Apesar disso, têm percepção de que, enquanto comunidade e população periférica
lhes falta muito do mínimo necessário para uma vida digna. Também destacam a
ausência do poder público e a presença do poder local ligado ao tráfico de drogas e
outras contravenções.
Sabem que são associados à criminalidade, só por morarem onde moram. Alguns
relataram que eles mesmos e/ ou membros de suas famílias por vezes mentem sobre o
local de moradia para conseguirem emprego. Assim, veem e convivem com a
criminalização em seu cotidiano – seja nas “Gerais” da polícia, seja no comportamento
da chamada burguesia ante a sua presença na rua, num estabelecimento comercial, nos
recintos de culto ao consumo. A esse respeito, lembraram dos “rolezinhos” dos quais
alguns participaram, bem como do “churrasco dos diferenciados” na praça Buenos Aires
em Higienópolis.
Um dos aspectos interessantes que nos remonta a avaliação de Magnani sobre o
pedaço é justamente a visão positiva que têm de sua comunidade e a relação que se
estabelecem entre muitos de seus membros. Apesar de reconhecerem as mazelas que
embasam a existência/ sobrevivência nas suas localidades, também reconhecem a
movimentação proposta pela própria comunidade.
Destacamos aqui o histórico de lutas reivindicatórias, movimentos culturais e
combatividade da região (Grajaú – movimento de moradia, Casa da Mulher do Grajaú,
Mães Crecheiras, Balaio Cultural, Pagode da 23 etc.). Assim, seja pelo engajamento
político – dos quais muitos pais e parentes participaram – seja pela vivência artística e
cultural ou ainda pelas associações religiosas, festividades e mobilizações de caráter
reivindicatório e participativo alguns dos jovens se reconhecem e reconhecem a história
de sua família nesses processos.
Tais aspectos referem-se diretamente aos vínculos de pertencimento, aos elos de
identidade e de solidariedade que unem os grupos quase que em comunidades, no
sentido mais sociológico do termo, ao invés do eufemismo geralmente usado para
descrever as favelas, cortiços, ocupações e outras formas precarizadas de habitação.
Assim, apesar do Estado não se fazer presente na medida minimamente necessária,
CONCLUSÃO
E há, também, o aspecto das construções e das relações sociais, dos movimentos
ligados à cultura local e suas práticas (esportivas, de festividades, de mutirões, das
mobilizações reivindicatórias) que desencadeiam nos jovens a busca por agremiações,
por pertencimento, por formas de organização – ainda que não amadurecidas – mas que
lhes permitam espaços de discussão, de percepção e de tomada de decisões.
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