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GRUPO DE TRABALHO "TRAUMA E MEMÓRIA: INTERLOCUÇÕES"

Informações Gerais:

O Grupo de Trabalho “Trauma e Memória: interlocuções” é organizado pelo Museu das Memórias (In)Possíveis e se propõe a estudar os temas relativos à
memória, à memória social, às memórias subterrâneas, ao trauma. É um espaço interdisciplinar, gratuito e aberto a todos interessados.

Ele ocorre toda primeira segunda-feira do mês, das 21hs às 22h30.

Para fazer parte do “Trauma e Memória: interlocuções”, basta entrar em contato através do nosso e-mail: cartelmemoria@museu.appoa.org.br e pedir
sua inscrição.

As informações sobre links dos encontro, temas, conceitos e textos constam no Calendário de Eventos acima. Basta clicar em “Grupo de Trabalho
Trauma e Memória: interlocuções” ao lado da data do referido encontro.

Obs: O Cartel Memória, que iniciou em dezembro de 2019, mudou de formato. Agora é Grupo de Trabalho “Trauma e Memória: interlocuções”.

POR QUE UM CARTEL MEMÓRIA?

Maíra Brum Rieck

Jaime Alberto Betts

Priscila Chagas Oliveira

Otávio Augusto Winck Nunes

“É como se minha avó estivesse falando agora. (…) A gente conversa com várias pessoas. Pensamento vem tipo relâmpago que tem que falar naquela
hora. Tudo vem do pessoal que já se foram e estão junto da gente espiritualmente (…) é como se ela estivesse falando agora” (CAMPOS, 2016, p.61, IN:
CURY, 2017).

É assim, de forma simples, que um indígena conta para uma museóloga como se opera a transmissão entre as gerações, forma de preservar a memória.
Passado, presente e futuro se amarram de forma não linear, os corpos são misturados uns nos outros, os mortos estão incorporados nos vivos. O
individual e o coletivo estão imbricados, sem ilusões de que somos indivíduos separados do coletivo, apartados da cultura.

A psicanálise se ocupa das memórias. Memórias lembradas, memórias recalcadas, memórias apagadas, memórias esquecidas, memórias forcluídas,
memórias desmentidas…. Memórias que são contadas, memórias que são vividas em ato na transferência da cena analítica. Como Freud nos ensina, o
paciente não chega na sessão, necessariamente, dizendo que desafiava o pai, mas chega desafiando, em ato, o analista (FREUD, 1914/1996). Dessa
forma, coloca o conceito de transferência casado com o de memória: o sujeito ativa uma memória que não tem lembrança através de uma “encenação”
com o analista.

Mas como conceitualizar memória? Não o fazemos propriamente. São muitas as definições de memória e, como nos diz Jô Gondar (2016), é um conceito
impossível de precisar sob a ótica de uma única disciplina: o conceito de memória sempre escapa para outros cantos, por isso a necessidade de estudá-
lo sob a ótica de inúmeras disciplinas. A esse campo, transdisciplinar, chamamos de campo de estudo em memória social.

A autora diz:

A memória, contudo, nunca é: na variedade de seus processos de conservação e transformação, ela não deixa se aprisionar numa forma fixa ou estável.
A memória é, simultaneamente, acúmulo e perda, arquivo e restos, lembrança e esquecimento. Sua fixidez é a reconstrução permanente, o que faz com
que noções capazes de fornecer inteligibilidade a esse campo devam ser plásticas e móveis (GONDAR, 2016, p.19).

Mas a autora vai além e diz:

A memória concebida enquanto produção de poder, destinada à manutenção dos valores de um grupo, não é equivalente à memória pensada
enquanto componente ativo dos processos de transformação social e de produção de um futuro (GONDAR, 2016, p.19).

Memória é poder: “Onde há poder, há resistência, há memória e há esquecimento” (CHAGAS, 2009, p. 136). Quem escolhe o que fica registrado na
história oficial, o que fica salvaguardado em um museu ocupa uma posição de poder, escolhe o que fica dentro e o que fica fora, o que tornar-se-á
patrimônio, e o que será relegado ao esquecimento. Assim operavam os magistrados que guardavam em seus próprios domicílios os documentos que
consideravam importantes de serem preservados, escolhiam o que ia para o lixo e o que ia ser salvo para a história futura. Poucos indivíduos tinham o
poder de decisão e suas casas foram os primeiros museus da história (DERRIDA, 2001). Assim se constroem, até hoje, as memórias oficiais de um país. É
assim que se dão as disputas pelas memórias oficiais.

Nada mais psicanalítico, eticamente, do que esburacar essas memórias oficiais com os testemunhos dos vencidos, dos que ocupam as margens, dos
que não contam nem são contados.

O testemunho articula as memórias possíveis de serem contadas, recuperadas e aquelas mensagens fraturadas, fragmentadas, não traduzidas, da
ordem do excesso traumático. Nesse sentido, o testemunho se apresenta numa dupla face entre o dito e o não dito (CONTE, 2014). Não dito, falhado,
esquecido, formas que são da ordem do inconsciente. Mas há o não dito que fica como pedaços, fragmentos enigmáticos, restos traumáticos que
precisam ser escutados para, quem sabe, serem decifrados, articulados, ganhando significação reparadora na vida de quem testemunha, bem como na
de quem testemunha o testemunho. Trata-se de um processo em que a escuta do outro é fundamental, pois devolve à palavra sua extensão simbólica,
respeitando o tempo do que não pode até então ser revelado e articulado a uma rede significante compartilhada, possibilitando sua transmissão como
memória.

No Museu das Memórias (In)Possíveis contamos cada sujeito-narrativa um a um, não para fazer um conjunto, ou fazer uma nova história oficial, mas, ao
contrário, para não fazer conjunto, para contar os que não são contados a partir deles próprios. Fazer valer a palavra dos que “não contam” justamente
para criar um futuro para além do que está dado. Fazer memória do futuro. O Museu se torna ato de memória, vontade de memória. O Museu se torna
ação e intervenção no discurso social.

O cartel sobre memória que surge em dezembro de 2019 vem da necessidade da Comissão do Museu das Memórias (In)Possíveis de pensar e elaborar os
conceitos de memória nas mais diversas disciplinas e, também, da aproximação entre os campos da museologia e da psicanálise, de maneira a
potencializá-los. Desde 2014, o Instituto APPOA apostou na ideia de criar um Museu regido sob a ética da psicanálise. Não se tratava de um museu da
psicanálise, ou um museu sobre a história da psicanálise, mas um museu-intervenção, que atua no espaço público.

Referências bibliográficas:

CHAGAS, Mário. Memória Política e Política da memória. In: ABREU, Regina; CHAGAS, Mário. Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos. Rio de
Janeiro: Lamparina, 2009. p. 136-167.

CONTE, Bárbara. Testemunho: reparação do trauma é possível? In: Clínicas do Testemunho – reparação psíquica e construção de memórias. Porto Alegre:
Criação Humana, 2014.

CURY, Marilia Xavier. “Lições indígenas para a descolonização dos museus: processos comunicacionais em discussão”. In: Cadernos CINEMAC, v. 7, n.1,
Uberaba – MG, Brasil, 2017.

DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo. Uma impressão freudiana. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001.

FREUD, Sigmund. Recordar, repetir e elaborar (1914). O.C. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

GONDAR, Jô. “Cinco proposições sobre memória social” In: Por que memória social?. DOBEDEI, Vera & FARIAS, Francisco R. & GONDAR, Jô (Org.). Revista
Morpheus: estudos interdisciplinares em memória social. Rio de Janeiro: Híbrida. V.9, n. 15, 2016.

Texto originalmente publicado em: https://www.appoa.org.br/correio/edicao/305/8203museu_das_memorias_inpossiveis_cartel_sobre_memoria/910

ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE


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