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RESUMO
1 INTRODUÇÃO
Aluno concludente do curso de Bacharelado em História pela Universidade Estácio de Sá. E-mail:
marceloh2601@gmail.com
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redes sociais como plataformas de interação politica (HE, Y., 2019; HE, B., 2019; WU,
HUANG, 2019)
Desse modo, diante do acirramento das tensões entre o dito ocidente e a China
(GALLAS, 2020), e à fim de gerar melhor entendimento sobre o maior parceiro
comercial do Brasil e de mais de 140 países, percebe-se a necessidade de investigar
os meios de participação política do povo chinês após a reforma e abertura em 1978,
que culminaram na denominação de Democracia Popular de Processo Integral
(BRASIL, 2023; CHINA, 2021).
Assim, cabe indagar: há efetiva participação popular na política chinesa?
Portanto, o objetivo geral do presente trabalho é investigar o processo histórico
de participação popular desde a reforma e abertura em 1978 que resultou na
Democracia Popular de Processo Integral.
Os objetivos específicos serão: descrever o conceito de democracia para o
Partido Comunista Chinês (PCCh); explorar as formas de participação do povo na
política; e avaliar os impactos reais dessa participação popular.
Para tanto, o método utilizado foi o hipotético-dedutivo, sendo a pesquisa de
natureza básica estratégica e de objetivo exploratório. Através de revisão bibliográfica,
com abordagem qualitativa, foi apreendido o período da China pós 1978 e as formas
de participação política popular que se sucederam.
O artigo é dividido da seguinte forma: primeiro são confrontados os modelos
democráticos ocidentais com entendimento chinês de democracia. Após isso, é
introduzido o conceito do “Pensamento” no contexto político da China e sua
associação com o marxismo-leninismo. Mais adiante, é feita a diferenciação entre
Estado e Partido, com a explanação dos mecanismos institucionais que cada um
dispõe. Após isso, são apresentados casos de participação popular e suas
consequências. Por fim, verifica-se a convergência entre a literatura apresentada e os
objetivos propostos pelo trabalho.
O atual debate sobre democracia tem sido pautado pelos países ocidentais.
Bell (2015) nos alerta sobre como as recentes crises institucionais e representativas
em diversos países abriram espaço para o debate sobre modelos democráticos e
como nem entre eles há um modelo único e exportável a ser adotado. “The United
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States promotes electoral democracy as the ‘only game in town’, and the rest of the
world sits up and listens. To paraphrase Karl Marx, the ideas of the ruling country are
the ruling ideas” (BELL, 2015, p. 17).
O pensamento teleológico de que o desenvolvimento de um país só é possível
sob um modelo democrático nos moldes ocidentais, surge durante a guerra fria e é
embasado em uma literatura americanófila, aponta Ahmad (2019).
Buscando respostas para as críticas disparadas contra a China, Reigadas
(2022) rastreia suas origens no orientalismo e ainda acrescenta que a democracia não
é a única coisa questionada sobre China, já que a revolução científica e o sistema
legal chinês, por exemplo, também são alvos constantes de criticismo.
Após a reforma política e abertura econômica em 1978, os acadêmicos
chineses começaram os estudos sobre os modelos de governança a serem adotados.
Partindo de material produzido no ocidente, logo perceberam que não seriam
suficientes para abarcar a realidade chinesa e que seria necessário algo próprio e
híbrido (YU, WANG, 2019; REIGADAS, 2022). Se aproveitando do melhor que as
teorias de governança correntes tinham a oferecer, o Partido Comunista Chinês
(PCCh) começou a desenvolver algumas de suas principais características, sua
capacidade de experimentação e adaptabilidade (BELL, 2015; CUNHA, 2022;
REIGADAS, 2022).
Ahmad (2019) define o modelo de governança chinês como “progressão
administrativa”. Essa progressão pode ser vista, por exemplo, na proposta de Bell
(2015), onde quão mais baixo é o nível do governo, mais democrático, no meio, mais
experimental e no topo, mais meritocrático. Essas acepções buscam ressaltar o
caráter híbrido e complexo de todo o sistema de governança, afastando as
simplificações grosseiras (BELL, 2015).
(LÊNIN, 2020, p. 143). Sobre a participação não competitiva das linhas de massa, o
autor atenta sobre os perigos da chamada “liberdade de crítica” ao partido e as
medidas tomadas por este, pois isto pode levar à “liberdade de introduzir no socialismo
ideias burguesas e elementos burgueses” (LÊNIN, 2020, p. 28).
como objetivo principal do desenvolvimento, contra 17.8 que disseram ser democracia
e liberdade (BELL, 2015).
O PCCh assume o princípio de governar “do povo e para o povo”. Nesse
sentido, “do povo” se apresenta na forma das eleições diretas e a escolha dos
representantes, “para o povo” na legitimidade e confiança atribuída aos eleitos
(CHINA, 2021; BACKER, 2022).
deputados através das Assembleias Populares. Nas duas formas existe algum tipo de
representação e participação (BACKER, 2022; HE, Y., 2019).
Através dos conceitos apresentados anteriormente, observa-se a integração de
diversos setores sociais dentro do CCPPC e das Assembleias Populares como sendo
a linha de massas do PCCh, enquanto ele próprio é o partido de vanguarda. A
participação se dá por meio do centralismo democrático, onde há o debate e consulta
de ideias que não se configuram como oposição, e sim união de forças numa mesma
direção. Ao fim do processo temos a Democracia Popular de Processo Integral
(BACKER, 2022; CHINA, 2021).
que um dos principais desafios dos governantes é lidar com as crescentes demandas
da população. Desde os anos 1990, os membros do governo, sendo do PCCh ou não,
operam sob os chamados “Contratos de Responsabilidade”, que consistem em várias
metas a serem alcançadas dentro do prazo do contrato, que normalmente é de um
ano. Os contratos estipulam diferentes níveis de importância às metas a serem
atingidas, estando a estabilidade social entre as principais. Por estabilidade social
entende-se a não ocorrência de protestos ou petições em massa para os escalões
superiores, por exemplo. Para conferir se as metas foram cumpridas, times de
inspeção são formados por autoridades de níveis superiores e resultados negativos
podem implicar em redução salarial, retirada de bônus e a não promoção (HEBERER,
2019).
Ahlers, Heberer e Schubert (2019) nos indicam como o peso da estabilidade
social enquanto indicador de avaliação dos governantes molda suas ações com o
público. Protestos que eram controlados através da repressão, agora tendem a ser
antecipados e os conflitos evitados, através de políticas deliberativas e de respostas
às demandas populares. Ainda nesta direção, Bell (2015) nos aponta para uma
mudança de prioridades vindo do governo, de um olhar majoritariamente econômico
para um mais social, levando em conta o meio ambiente e a redução da pobreza. Cita
ainda a cidade de Foshan como exemplo de experimento com a participação popular
na avaliação dos membros do governo, onde parte do sistema de pontos levados em
conta nas avaliações é feito através de um questionário on-line preenchido pelo
público. Resultados positivos resultam em bônus, negativos em redução de
pagamento.
He (2015) analisa o crescimento e institucionalização dos recursos
consultivos/deliberativos. Em 2004, por exemplo, ele estima que o número de reuniões
com elementos deliberativos foi de 453,000 por todo o país. Partindo para as Cidades,
Wenling promoveu mais de 1190 reuniões com as mesmas características entre 1996
e 2000. Entre 2009 e 2012, na cidade de Chendu mais de 2300 vilas participaram de
debates sobre o uso de fundos públicos, gerando aproximadamente 40,000 projetos .
Ainda no nível das Cidades, entre 1998 e 2001 foram promovidas 1000 audiências
públicas para tratar dos preços. Entre 2009 e 2014, cerca de 4000 cidadãos foram
convidados a participar de programas de TV promovidos pela cidade de Hangzhou
para tratar de assuntos socioeconômicos.
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The 2012 Lien Survey, covering 34 cities in China with the sample size of
23,923, finds that the mean of the question of whether governments seek your
opinions and suggestions for policy decision-making is 6.13 (the scale from 0
to 10, where 0 is strongly disagree; 5 is in the middle; and 10 is strongly
agree). The mean of the question of whether governments adopt residents’
opinions and suggestions is 6.04. There is also the robust positive relationship
between “governments solicit opinions from citizens” and “citizen’s
satisfaction with the information released by official media”. (HE, 2015, p. 38).
área tentaram reparar a falta de participação pública dos estágios iniciais do projeto,
estabelecendo conversas com os moradores. Dois meses depois o projeto foi adiado.
Entre Dezembro de 2007 e Janeiro de 2008, o governo local disponibilizou uma
versão atualizada do projeto para receber comentários do público. Novamente não
houve entendimento, com a alegação dos moradores de que as mudanças não
atendiam os padrões usados normalmente do país. Uma avaliação ambiental também
foi disponibilizada para receber comentários do público e nela era alegado que o
projeto estava de acordo as normas e era seguro. Os moradores, mais uma vez,
questionaram o método usado para se chegar a tal conclusão e reagiram
negativamente.
Similar ao que foi feito no caso da indústria química, os moradores de Shanghai
se reuniram em um shopping local sob o pretexto de “fazer compras juntos” e
protestaram dessa forma. Seis dias após, organizam uma “caminhada” coletiva e
nesse mesmo dia, receberam como resposta o convite para que alguns
representantes dos moradores fossem junto de um ente governamental, participar de
uma medição da radiação emitida pelos trilhos. O resultado foi utilizado por eles para
confrontar os dados do projeto original.
Após tudo isso, várias reuniões foram organizadas entre governo, especialistas
e moradores, também foram estabelecidos quatro centros de consulta pública na
região, indicando a mudança de postura das autoridades locais. Após mais dois anos
de controvérsia, o projeto nunca foi materializado da forma como foi proposto no início,
mostrando assim, segundo Xixin e Yongle (2018), o importante papel dos moradores
nas negociações.
No terceiro caso analisado por Xixin e Yongle (2018) há uma diferença
fundamental em relação aos demais, pois trata-se de uma greve de fato. No dia 3 de
Novembro de 2008, na cidade Chongqing, 8000 taxistas paralisaram suas atividades
reivindicando a exploração que estavam sofrendo pelas companhias de táxi através
da cobrança de altas taxas.
No segundo dia de greve, o governo local se pronunciou pedindo desculpas
pelo inconveniente, prometeu reduzir as taxas cobradas pelas companhias, aumentar
o número de postos de combustível e retirar os táxis ilegais de circulação. No mesmo
dia, alguns grevistas retornaram a trabalhar. No dia 5 de Novembro, a taxa foi reduzida
e a greve se encerrou. No dia 6, uma reunião consultiva foi organizada com 40
representantes dos taxistas, 20 representantes dos moradores da cidade, 5
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com as instituições que nos são familiares no ocidente. Assim, indo ao encontro da
definição oficialmente adotada pela China.
Quanto à utilidade dos meios oficiais para a participação popular, os resultados
encontrados pelo presente estudo estão alinhados aos encontrados por He (2015),
visto que o desenvolvimento conjunto das políticas se estabeleceu em uma relação
de influência mútua entre as eleições diretas, os métodos consultivos/deliberativos, as
pressões dos diversos grupos sociais e protestos. Somando-se isso à necessidade de
avaliação positiva pelos membros do governo e do partido para acessarem
promoções, demonstra-se a necessidade de haver cooperação nessas relações.
Assim como nos é mostrado por Xixin e Yongle (2018) e Gao e Teets (2021), a
participação popular se faz de fato e, por vezes, é necessária para corrigir os rumos
de governança. O poder descentralizado através das Assembleias Populares e a
liberdade de moldar as políticas, distribuem a autoridade para vários níveis além do
central (BELL, 2015; ZHANG e LIAO, 2020).
Neste sentido, os resultados aqui engendrados encontram subsídios nas
literaturas visitadas, indicando a efetiva participação popular na política chinesa e seus
impactos reais à esta, descrevendo ainda os conceitos utilizados pelo PCCh em sua
formulação de democracia e o entendimento do mesmo sobre a inclusão do povo
(BELL, 2015; BACKER 2022; LÊNIN, 2020).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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