1
Vale observar que para Sartori, o multipartidarismo e a representação proporcional não são um
problema em si mesmos. Afinal, em sua tipologia, como se sabe, há dois tipos de pluralismos, o
moderado e o polarizado. A condenação a representação proporcional é condicional, isto é, decorre do
momento de sua adoção, se anterior ou posterior à entrada das massas no sistema político e a
consolidação do quadro partidário. O pluralismo moderado, segundo o autor, teria emergido onde a
adoção da representação proporcional tria sido posterior a incorporação das massas ao sistema político.
Alguns desses autores, que iniciam a ruptura com os modelos de análise
predominantes na ciência política até o final dos anos 70s, foram centrais
nas origens do institucionalismo no Brasil2. Mas, mesmo que assim tenha
sido, o fato é que determinantes gestados na experiência política da
oposição ao autoritarismo foram decisivos para o progressivo abandono
da sociologia política.
2
North & Thomas (1973), Williamson (1973), Katzenstein (1977), Skocpol (1979), Shepsle (1979), Riker
(1980), Hardin (1982), Lijphart (1984) e Evans et al. (1985) são, geralmente, consideradas as obras
seminais da abordagem racionalista e/ou neoinstitucionalista, em suas diferentes vertentes. Para uma
visão de conjunto do neo-institucionalismo ver Hall & Taylor(1996).
Com efeito, as explicações dominantes sobre o regime autoritário,
entendido como forma política assumida pelo capitalismo dependente,
não abriam espaço à política como escolha livre, dentro de certos limites,
nem eram úteis para entender a transição do regime autoritário que, em
1982, entrava em outro patamar, com a eleição de governadores do
PMDB, nos principais colégios eleitorais do país 3. Elas batiam de frente,
também, com a experiência concreta de acadêmicos de projeção, muitos
dos quais banidos das universidades e que se haviam transformado em
figuras públicas da oposição democrática ao regime autoritário.
3
Além de André Franco Montoro, em São Paulo, o PMDB elegeu Tancredo Neves, em Minas Gerais; José
Richa, no Paraná; Iris Rezende, em Goiás; Jader Barbalho, no Pará, Gerson Camata, no Espírito Santo.
Leonel Brizola, no Rio de Janeiro, foi o único governador eleito pelo PDT.
Estados Unidos foi fortemente influenciada pelo estrutural-fucionalismo e
sua ênfase nas atitudes políticas. O ponto a ressaltar é que, no interior
deste paradigma, a redemocratização do país também se configurava
como uma impossibilidade. A cultura política dominante conspiraria
contra uma ordem democrática estável.
4
“the Brazilian case represents an authoritarian situation rather than an authoritarian regime (Linz,
1973:235, itálicos no original).
5
Na primeira metade dos ano 70, o tema da institucionalização do regime ganhou certa relevância
entre os setores mais brandos do regime. Em 1975, em viagem ao Brasil para seminário organizado, no
Rio de Janeiro, por Candido Mendes, Samuel Huntington, em entrevista de grande repercussão,
aconselhou o governo Geisel a aproveitar a conjuntura econômica favorável para institucionalizar o
regime. Propostas de “mexicanização”, ou seja, de apoiar o regime em um partido dominante e eleições
controladas tiveram certa circulação à época.
6
Em “O Discurso e o Processo”, texto discutido em seminários internos do CEBRAP antes de ser
publicado em 1979, Lamounier mobiliza explicitamente o trabalho de Linz, aprofundando a discussão da
relação entre legitimidade e as dificuldades do regime em se institucionalizar.
democracia em países periféricos, seja a periferia definida em termos
econômicos, seja em termos culturais7. Nos dois casos, o caminho para a
democracia estaria vedado, senão completamente, pelo menos enquanto
não se dessem transformações profundas na estrutura social do país e/ou
nas crenças e atitudes dominantes, transformações estas que, para dizer o
mínimo, não estariam no horizonte.
“The process of political opening at present under way in Brazil flatly contradicts some
widespread notions of the late 1960 and early 1970s. The so called ‘dependency theorists’ often
suggested that consistent; heavily bureaucratic-corporatist structures had come to stay and
allowed no room for ‘conventional democracy’ in countries undergoing ‘dependent
development’. Less radical, but with the some thrust, was the picture sketched by several
studies which stressed continuity with the colonial past: the bureaucratic-mercantile formation
of the Brazilian state, the fundamentally authoritarian character of the Iberian (and, by
extension, Brazilian (…) political culture, and so on”. (Lamounier, 1984, p. 168)
liderado por Guillermo O´Donnell e Philippe Schmitter (O’Donnell,
Schmitter, & Whitehead, 1986).
Um presidencialismo diferente
12
“O determinante básico dessa inclinação ao fracionamento partidário é a própria pluralidade social,
regional e cultural. O sistema de representação, para obter legitimidade, deve ajustar-se aos graus
irredutíveis de heterogeneidade, para não incorrer em riscos elevados de deslegitimação, ao deixar
segmentos sociais significativos sem representação adequada.” (Abranches, 1988:12)
majoritário. Para ele, o presidencialismo de coalizão termina sendo uma
forma de organização política equivalente às outras na sua capacidade de
resistir aos desafios de uma sociedade desigual e conflitiva13.
Gráfico 1
Número de artigos publicados por ano (1988-2014)
30
25
20
15
10
0
88 90 92 94 96 98 00 02 04 06 08 10 12 14
19 19 19 19 19 19 20 20 20 20 20 20 20 20
Tabela 1
Número de artigos por subárea
(1988-20140
Subárea Nº de artigos
Relação entre poderes e os Poderes individualmente 149
Federalismo, relações intergovernamentais e políticas públicas 59
Eleições e sistemas partidários 47
Regimes políticos e transição 17
Neo-institucionalismo 7
Total 279
Fonte: Compilação própria
De fato, 1995 marca essa reorientação de foco das análises. Em duas áreas
chaves do debate em curso -- descentralização (que englobando estudos
sobre relações intergovernamentais, políticas públicas e federalismo) e
relações Executivo-Legislativo-- são publicados, neste ano, artigos que
vieram a se tornar os eixos sobre o qual estes dois campos de pesquisa
vieram a se movimentar nos anos seguintes. No primeiro caso, o artigo é
"Federalismo e políticas sociais" de Maria Hermínia Tavares de Almeida.
No segundo caso, em realidade, são dois os artigos publicados por
Argelina Figueiredo e Fernando Limongi.
16
No apêndice A a lista completa. Os dados de citação foram retirados do Google acadêmico.
Fonte: Google Acadêmico, elaboração própria
Gráfico 217
17
As citações contabilizadas no gráfico foram retiradas dos artigos selecionados. Olhamos uma a uma as
referências bibliográficas de cada um dos 279 artigos. E coletamos todas as referências feitas a Sérgio
Abranches, Bolivar Lamounier, Wanderley Guilherme dos Santos, Fernando Limongi e Argelina
Figueiredo. No último caso, foram coletadas apenas as referências dos artigos escritos em coautoria.
Não foram contabilizados papers apresentados em Congressos. Apenas livros, capítulos de livros e
artigos em periódicos nacionais e internacionais.
tomado como um marco da reorientação geral da agenda de pesquisa em
direção ao estudo do funcionamento da democracia brasileira.
Conclusões
Abrucio, F. L. (1994). Os barões da federação. Lua Nova: Revista de Cultura E Política, (33),
165–183.
Editora Hucitec.
Abrucio, F. L., & Costa, V. M. F. (1998). Reforma do Estado e o contexto federativo brasileiro
Berger, S. (1983). Organizing interests in Western Europe: Pluralism, corporatism, and the
Stepan (Ed.), Democratizando o Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra (pp. 443–482).
Evans, P. B., Rueschemeyer, D., & Skocpol, T. (1985). Bringing the state back in. Cambridge
University Press.
Figueiredo, A., & Limongi, F. (1995a). Mudança constitucional, desempenho do Legislativo e
Figueiredo, A., & Limongi, F. (1995b). Partidos políticos na Câmara dos Deputados: 1989-1994.
Haas, E. B. (1958). The Uniting of Europe: Political, Economic and Social Forces, 1950-1957.
Hall, P. A., & Taylor, R. C. (1996). Political science and the three new institutionalisms*.
Huntington, S. P. (1968). Political order in changing societies. New Haven: Yale University Press.
Katzenstein, P. J. (1977). Between power and plenty: Foreign economic policies of advanced
Lamounier, B. (1984). Opening through Elections: Will the Brazilian Case Become a Paradigm?
Lamounier, B., & Cardoso, F. H. (1975). Os Partidos e as Eleições no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e
Terra.
Lima Jr, O. B. (1993). Democracia e Instituições Políticas no Brasil dos anos 80. São Paulo,:
Loyola.
authoritarian regime: the case of Brazil. In Authoritarian Brazil: origins, policies, and
North, D., & Thomas, R. P. (1973). The rise of the western world: A new economic history.
O’Donnell, G., Schmitter, P. C., & Whitehead, L. (1986). Transitions from authoritarian rule:
Rae, D. W. (1967). The political consequences of electoral laws. New Haven: Yale University
Press.
Riker, W. H. (1980). Implications from the Disequilibrium of Majority Rule for the Study of
Santos, W. G. dos. (1987). Crise e castigo: partidos e generais na política brasileira. São Paulo:
Vértice, 134.
Schmitter, P. C. (1974). Still the century of corporatism? The Review of Politics, 36(01), 85–131.
Skocpol, T. (1979). States and social revolutions: A comparative analysis of France, Russia and
decentralization. Macmillan.