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GRANDE LOJA MAÇÔNICA DE PERNAMBUCO

A∴R∴L∴S∴ União e Justiça nº 52

Todo homem e toda mulher é uma estrela.


Todo número é infinito, não há diferença.

Liber Al vel Legis I

A CABALÁ: SÍNTESE DA ORIGEM E FUNDAMENTOS DO ESOTERISMO JUDAICO

JOÃO VICTOR DE ALMEIDA GODOY

Or∴ de Caruaru/PE

2023
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À G.’. S.’. A.’. D.’. U.’.
Acácia Respeitável Loja Simbólica União e Justiça n° 52

I – INTRODUÇÃO

A Cabalá é o estudo do sentido aprofundado e esotérico das escrituras veterotestamentárias


(Tanakh – a bíblia hebraica). Em que pese ser um estudo de natureza judaica, o simbolismo
cabalístico já foi assimilado por diversos grupos e correntes de Magick, dando origem a variantes,
tais como as denominadas “Cabalá Hermética” e a “Cabalá Cristã”, além de outras interpretações
que inserem a simbologia cabalística em sistemas mágicos diferentes, a exemplo do uso pelos
thelemitas. Até mesmo a “Cabalá Grega” já foi citada pela ilustre ocultista Madame Helena Petrovna
Blavastky.

Ora, pouco importa a terminologia dada ou a assimilação que fora feita, posto que todas
desembocam numa verdade extrafísica que permite interpretar e vivenciar a realidade de forma
autoconsciente e em sintonia com o Criador. Determinados conceitos são intercambiáveis entre
sistemas de crenças e ajudam na expansão de consciência do neófito.

Fato é que os estudos cabalísticos compõem uma parcela importante da tradição esotérica
oriental. Sem eles, não seria possível alcançar o sentido profundo contido nas entrelinhas das
escrituras judaicas. A Arte Real, sem dúvidas, bebe da fonte cabalística. A importância dada aos
números e os seus simbolismos. A arquitetura, que remonta sempre a narrativas contidas no universo
da Torá (tais como o Templo de Salomão,

II – A ORIGEM DA CABALÁ

É difícil datar a origem da tradição cabalística, em virtude de ser um conhecimento disperso


em várias obras rabínicas e de diferentes datações, a exemplo do Sêfer Yetzirah (Livro da
Formação), de autoria atribuída ao patriarca Abraão, e o Zôhar (Livro do Esplendor), de autoria
atribuída a Shimon Bar Yochi. São dois livros que, se realmente escritos por quem se atribui, são
separados por mais de 30 séculos. De acordo com o Sêfer Yetzirah, a primeira emanação do espírito
de Deus foi o (‫ =רוח‬espírito, ar, sopro) que produziu o fogo, que, por sua vez, formou a gênese da
água (WIKIPÉDIA, 2022).

É evidente que a autoria do primeiro provavelmente não é de Abraão. Estes dois livros são
duas importantíssimas obras dentro da temática ora tratada. Assim, não se sabe ao certo quando teria
surgido a tradição cabalística. Contudo, parte dos judeus cabalistas tendem a aceitar a origem da
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Cabalá como antes mesmo de Moisés receber a Torá no Monte Sinai, em 2448 (1313 AEC).

Em verdade, alguns estudiosos contestam até mesmo a origem judaica da Cabalá, afirmando
que esta foi trasmitada através dos egípcios. Segundo o Instituto Helion:

Durante a dinastia XVIII, em torno de 1350 a.C, um faraó, que se fez chamar de
Akhenaton, instaurou oficialmente o primeiro monoteísmo da história, adorando a
um único deus - Aton - e iniciando uma série de reformas políticas e religiosas.
Pouco depois de sua morte, suas reformas foram abolidas e o culto de Aton,
proibido para o povo, teve continuidade apenas no interior dos templos a ele
dedicados, cuja sobrevivência foi permitida pelos vencedores. Teria sido
precisamente nestes templos onde o jovem Moisés, educado como um príncipe do
Egito, teria recebido sua formação e, justamente esses conhecimentos dariam
origem à futura Kabbalah.

O termo designa, em hebraico, o verbo “receber”, dando-se a concepção de que a Cabalá foi
entregue por Deus aos judeus. Este conhecimento teria sido repassado geração a geração através da
oralidade. Conforme Moshe Idel (2012):

Em suas formas bíblicas e rabínicas, o judaísmo é uma religião democrática e


exotérica. Entretanto, como muitas outras religiões, possui também em suas
dimensões místicas e significativas tendências esotéricas, que são mais elitistas,
especialmente desde a Idade Média. A mais renomada dessas literaturas
místicoesotérica é conhecida sob o nome de Cabala. Este é um termo hebreu, quem
tem vários significados. Dentre eles, o básico deriva da raiz QBL do verbo receber,
e assim a palavra quer dizer recepção, enquanto em hebraico moderno designa um
recibo (IDEL, 2012, p.17).

Fato curioso acerca da Cabalá é que, ab initio, somente poderia ser estudada por homens,
maiores de 40 anos e com ao menos 3 filhos.

O Hassidismo foi um dos movimentos que impulsionou o estudo da Cabalá na Europa.


Surgido por meio do Rabino Baal Shem Tov, que enredou um movimento pregando um judaísmo
mais intelectual, filosófico, alegre e que buscava o “êxtase divino”. Posteriormente, outro hassídico,
chamado de Baal HaShulam, fez importantíssimas obras literárias comentando o Zôhar.

III – O SIMBOLISMO CABALÍSTICO

A Árvore da Vida compõe a base do sistema cabalístico, estabelecido por 10 sephirot, que
são esferas que tratam de algum aspecto da vida humana e do universo. As sephirot são unidas pelos
caminhos, que são retratados nas 22 letras do alfabeto hebraico. Existe ainda a sephirah invisível de
da’at.

Segundo a tradição thelêmica, ao chegar à sephirah de da’at, deve-se fazer a chamada


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Travessia do Abismo. Esta sephirah separa o macro do microcosmo e, ao chegar neste nível de
elevação, o iniciado sofrerá a perseguição do que Crowley e John Dee chamaram de Choronzon.
Este seria o demônio do abismo e sua função é destruir o Ego, que permite que o adepto ultrapasse
o abismo da cosmologia ocultista.

Na cabala judaica, o bem e o mal estão unidos entre si e dão equilíbrio para o cosmo. Sem a
existência do mal, é desnecessário tornar possível que a criatura exista. Entende-se que ambos
existem para elevar a um grau espiritual superior que se conecta com o Criador. Segue nesse mesmo
raciocínio a concepção de pecado, que é chamado o pecado de Adão, não pelo fato que pecou, mas
pela desobediência, descobriu o pecado. O pecado no judaísmo é entendido como traços da natureza
humana (FRANKIEL, 2009, p. 26).

Abaixo, demonstra-se ilustração da árvore da vida, fazendo-se paralelo com elementos


maçônicos. Vê-se, por exemplo, a equivalência entre o olho-que-tudo-vê e a sephirah de Kether,
que simboliza o Ein Sof, o Criador Não-Manifestado (ilustração 1).

Interessante notar ainda que os dois pilares, Jaquim e Boaz, representam os lados opostos da
Árvore da Vida. Jaquim, masculino. Boaz, feminino. Representam também os princípios herméticos
do gênero, dualidade e polaridade. O significado desses pilares, para além do sentido maçônico, é
trazido também no Ritual do Pilar do Meio, utilizado nas ordens de dissindentes da Golden Dawn,
tal como as thelêmicas (ilustração 2).

ILUSTRAÇÃO 1

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ILUSTRAÇÃO 2

Acerca dos caminhos, estes podem ser divididos de acordo com os mistérios sobre os quais
tratam:

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As sephirot representam (parte retirada do site Morashá com pequenas alterações e adição
de citação de Blavatsky) :

Kether: transcende as leis que governam o universo, pois estas só passam a existir após a
emanação das sefirot de Chokhmá e Binah. A Cabalá refere-se a esta sefirah como o "mundo da
Misericórdia". Sobre Kether, é interessante trazer consideração de Blavatsky, que afirma no livro a
Doutrina Secreta Vol. I – A Cosmogênese:

A Doutrina Esotérica ensina, tal como o budismo e o bramanismo, e também a


Cabala, que a Essência una, infinita e desconhecida existe em toda a eternidade, e
que é ora ativa, ora passiva, em sucessões alternadas, regulares e harmônicas. Na
linguagem poética de Manu, chamam-se esses estados Dias e Noites de Brahmâ.
Este último se encontra 'desperto' ou 'adormecido'.

A sephirah de Kether é, conforme falado anteriormente, o Ein Sof, isto é, a parte não

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manifesta de Deus, tal como os budistas, segundo Blavatsky, concebem a Essência Una, alternada,
regular, harmônica, hora ativa, hora passiva.

Chokhmá: sabedoria - é o pensamento puro que Deus utiliza para o funcionamento do


universo. É o poder da Luz Original, a força primordial usada para criar os céus e a terra. Chokhmá
é a inspiração inicial da qual o Cosmo evoluiu. É vista como "a planta" usada para a criação do
universo físico e espiritual, pois contém - potencialmente - todas as leis que vão reger a Criação e
os axiomas que determinam como estas leis funcionam. É a raiz dos elementos espirituais: fogo,
água, terra e ar. Sua essência é também incompreensível para nós.

Binah: entendimento, a compreensão, a lógica. Com sua emanação, é criado o sistema


lógico pelo qual os axiomas de Chokhmá são delineados e definidos. É através da Binah que
podemos começar a entender os axiomas tanto da Criação quanto do nosso próprio ser.
Da'at, conhecimento; a "lógica aplicada" de modo diferente das duas anteriores. Não é apenas o
acúmulo, mas também a soma de tudo o que é conhecido. É a capacidade de juntar as informações
básicas e fazê-las funcionar logicamente.

Quando Kether se manifesta, D'aat se oculta, já que são manifestações interna e externa,
respectivamente, da mesma força.

Chessed: graça, amor e bondade que nos beneficiam; a grandeza (Guedulá) do amor. Esta
sephirah representa o dar incondicional, o altruísmo, o impulso incontrolável de expansão. É Deus
dando-se às Suas criaturas de forma irrestrita, abrindo todas as portas da Sua Abundância. Deus
usou este atributo como o instrumento supremo no processo da Criação.

Guevurah: poder, justiça, o julgamento severo (Din); as forças para disciplinar a criação.
Guevurá representa a contração, a restrição, a criação de barreiras. A "auto-limitação" Divina foi
indispensável para a criação do Cosmo. A Cabalá se refere a esta como midat hadin, a medida ou
atributo do julgamento, do rigor. Esta sephirah direciona a energia espiritual para atingir uma meta
específica. É a força que permite o controle para podermos vencer tanto nossos inimigos internos
quanto os externos.

Tiferet: beleza, no sentido da harmonia. É a combinação da harmonia e da verdade, dando


espaço para a compaixão. Esta sephirah está associada com o poder de conciliar as inclinações
conflitantes de Chessed e Guevurá, para que haja compaixão. Na Cabalá é designada como midat
harachamim, "o atributo da misericórdia". A alma do homem emana desta sephirah pela união desta
qualidade com Malkhut, o corpo.

Netzach: vitória, eternidade, resistência. Esta sephirah representa a imposição Divina. É o


domínio, a conquista ou a capacidade de vencer. Representa o motivo primeiro da Criação: a
capacidade de vencer o mal.
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Hod: esplendor, empatia. Esta sephirah permite que o poder e energia repassados sejam
apropriados e aceitáveis a quem os recebe. É responsável pela criação dentro de uma relação do
espaço deixado para o outro. A qualidade espiritual de Hod salienta o atributo da humildade e
reconhecimento. Hod representa também a submissão que permite a existência do mal.
Yesod: fundação; alicerce representa a reciprocidade ideal numa relação. É o meio de
comunicação, o veículo de transporte de uma condição para outra. Representa o lugar do prazer
espiritual e físico; o vínculo mais poderoso que pode existir entre dois indivíduos, assim como entre
o homem e Deus: a aliança entre Deus e Israel: o Brit Milá.

Malkhut: reinado. É a Schechiná, o aspecto imanente de Deus neste mundo. É o mundo


revelado onde o potencial latente é concretizado. É o poder que Deus nos deu de receber Dele. Como
símbolo do receber, esta sephirah é caracterizada como aquela que não tem nada próprio. É um keli,
um mero recipiente. Malkhut é o último elemento de uma corrente que se inicia na Vontade Divina
e encontra sua realização neste mundo. Aquele que recebe pode dar de volta, tornando-se além de
receptor, um doador.

IV - CONSIDERAÇÕES FINAIS

O simbolismo cabalístico é presente em várias tradições, podendo haver, ainda, influência


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e semelhança em outros sistemas esotéricos. O conhecimento acerca deste simbolismo é passível
de incrementar a experiência maçônica, através da complementação ao significado das alegorias.

Sabe-se, ainda, que há correntes de estudos maçônicos que atribuem aos pedreiros do templo
de Salomão o início dos mistérios da geometria sagrada da maçonaria primitiva, que seriam levados
posteriormente ao Ocidente, por meio de Roma e, assim, a Maçonaria Moderna herdara esta tradição
através das Corporações de Ofício.

Alguns adornos da ordem, como o uso do Delta Luminoso, as alusões a passagens do Velho
Testamento, o revestimento do templo maçônico com os pilares Jaquim e Boaz, oriundos do Templo
de Salomão e o estudo do simbolismo dos números são evidências da Cabalá no meio maçônico.
Inclusive, as 3 sephirot superiores são mencionadas em instrução de Aprendiz, como exemplo do
ternário sagrado.

Portanto, é patente que a Cabalá influenciou no simbolismo da Ordem Maçônica e o seu


estudo mais aprofundado será proveitoso ao maçom.

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Que o G ∴ A ∴ D ∴ U∴ a todos Ilumine e Guarde
Or∴ de Recife-PE 03.02.2022

APROVO
EM ...../...../.....

Ir∴ 1º Vig ∴

REFERÊNCIAS
BLAVASTKY, Helena Petrovna. A Doutrina Secreta. Vol. I – A Cosmogênese;
LIMA, Cassia Maranhão. Cabala judaica e cristã: um breve estudo comparado.
IDEL, Moshe et. al. Cabala, cabalismo e cabalistas. São Paulo: Perspectiva, 2012.

SITES CONSULTADOS:
http://www.morasha.com.br/misticismo/sefirot-as-dez-emanacoes-divinas.html
https://www.matematicaparafilosofos.pt/helena-blavatsky-e-a-redescoberta-da-cabala-
grega/#:~:text=46%3A%20%C2%ABLidos%20com%20a%20ajuda,idades%20(e%20compreen
de%20todas%20as
http://www.institutohelion.org.br/origem

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