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Título: Influência de configurações operacionais de reatores em batelada sequencial na

estabilidade de longo prazo do lodo granular aeróbio

Tema: Efluentes Sanitários e Industriais: Caracterização, Coleta, Tratamento, Disposição,


Reuso, Lodo e Biossólidos.

Sub-tema: 16 - Lodo de Esgoto

Forma apresentação: Apresentação Oral

Palavras-chave: Lodo granular aeróbio, estabilidade, longo prazo, desintegração,


fragmentação

Introdução (máx. 2500 caracteres)

O lodo granular aeróbio (LGA) é uma tecnologia emergente em sistemas de


tratamento de esgoto e representa uma alternativa viável aos sistemas tradicionais de
biomassa dispersa. Quando comparada aos lodos ativados, a tecnologia de LGA possui
maior capacidade de reter biomassa, apresenta eficiências superiores de remoção de
nitrogênio e fósforo, maior estabilidade quanto às variações de composição do esgoto
bruto, de temperatura e toxicidade e suportam maiores cargas orgânicas. Além do mais,
atende as principais preocupações relacionadas ao tratamento de esgoto: a minimização
de custos, atingir melhores padrões de lançamento de efluentes, atender futuras
condições de tratamento e reduzir problemas ambientais (DE KREUK; KISHIDA; VAN
LOOSDRECHT, 2007; BASSIN, 2012).

Apesar dos avanços relevantes relacionados à formação do LGA, a instabilidade do


lodo durante uma operação de longa duração ainda é vista como uma grande barreira
para uma ampla aplicação prática dessa tecnologia. De forma semelhante, ainda não há
uma elucidação sobre o mecanismo molecular exato por trás da desintegração de
grânulos aeróbios. Por isso, é imprevisível por quanto tempo o LGA pode permanecer
ativo em sistemas de tratamento de esgoto. A desintegração de grânulos pode ser
resultado de diferentes tipos de fatores, variando de parâmetros de projeto, ao
crescimento de microrganismos, à disponibilidade de íons livres ou à competição entre as
comunidades microbianas (SARMA; TAY; CHU, 2017; FRANCA et al., 2018).

A desintegração e lavagem de LGA em operações de longo prazo foi relatada em


uma quantidade significante de estudos apresentados em uma revisão realizada por
Franca et al. (2018), que resultaram no aumento da concentração de sólidos suspensos
no esgoto tratado, na deterioração do desempenho do tratamento e falhas gerais
eventuais de biorreatores. Similarmente às condições de formação dos grânulos, a
estabilidade do LGA está relacionada às condições de operação dos biorreatores, todavia
nem todas as condições de operação dos biorreatores que levam a formação do lodo
granular são adequadas para a estabilidade granular. Por exemplo, Liu e Tay (2008)
mostraram que um regime de feast-famine com período de famine mais curto acelerou a
formação do LGA, todavia os grânulos formados eram instáveis. Além do mais, Liu e Tay
(2015) confirmaram que as condições cruciais de formação granular e manutenção da
estabilidade podem ser diferentes e devem ser moduladas para satisfazer ambas.

Objetivo do Trabalho (máx. 2500 caracteres)

Neste estudo, um experimento foi conduzido por mais de 500 dias para verificar a
estabilidade operacional de longo prazo do lodo granular aeróbio com o objetivo de
investigar como as condições operacionais dos reatores influenciam nas características
físicas e na morfologia do grânulo. De forma mais específica, o trabalho visa identificar
como as condições de formação do lodo granular, a mudança da configuração das fases
de operação e a taxa de aeração influenciam na estabilidade de longo prazo e na forma
do LGA.

Além disso, levou-se em consideração para discussão dos resultados de


granulometria a hipótese do tamanho crítico proposta por Verawaty et al. (2013). A
hipótese sugere que as condições de operação relevantes como características do esgoto
bruto, velocidade de sedimentação, forças de cisalhamento, forma de alimentação do
reator e ciclo de aeração determinam um certo tamanho crítico de grânulo para uma
situação particular da operação. Dessa forma, grânulos maiores que o tamanho crítico
seriam mais propensos a quebrarem por atrito, de modo que a redução do tamanho
supere seu crescimento. Portanto, outro objetivo específico deste estudo é testar a teoria
do tamanho crítico.

Deve-se notar que a maioria dos relatos e estudos relacionados a estabilidade


granular a longo prazo foram conduzidos em laboratório, com condições operacionais
precisamente controladas. Operações mais longas que um ano completo são raras na
literatura, e mais atípicas quando tratam esgoto sanitário real em escala piloto. Dessa
forma, informações acerca da estabilidade de longo prazo do LGA são valiosas para
identificar seus fatores cruciais e mecanismos subjacentes.
Metodologia Utilizada (máx. 2500 caracteres)

O experimento é composto por três reatores em batelada sequencial em escala


piloto do tipo coluna de bolhas alimentados com esgoto sanitário proveniente da rede
coletora da Universidade Estadual de Campinas, como mostrado na figura 1. Cada reator
possui volume de 200 litros, com altura útil de 160 cm, diâmetro interno de 40 cm e
relação de troca volumétrica entre 25% e 45%. O esgoto é constituído principalmente de
efluentes hospitalares, domésticos, de restaurantes, escolares, de agências bancárias e
prédios administrativos.

Figura 1 – Unidade experimental em escala piloto

Fonte: Autores

O ciclo de operação dos reatores consiste em um período de enchimento e


esvaziamento simultâneos de 60 minutos (0,4<v asc<0,7 m/h), no qual o esgoto bruto
afluente é introduzido pela base e o esgoto tratado é coletado no topo; seguido de um
período de aeração total de 175 minutos, dos quais os primeiros 60 minutos são definidos
por uma taxa de aeração de 0,30 cm/s nos reatores 1 e 2, e 0,60 cm/s no reator 3,
enquanto os outros 115 minutos da aeração são definidos por uma taxa de aeração
mínima (< 0,10 cm/s); por último, o ciclo é finalizado com um período de decantação de 5
minutos, como apresentado na Figura 2.

Figura 2 – Fases dos reatores durante a operação

Fonte: Autores
A formação dos grânulos ocorreu com taxas de aeração constantes ao longo de
todos os 175 minutos da aeração definidas em 0,30 cm/s para os reatores 1 e 2 e 0,60
cm/s para o reator 3, de acordo com o esquema ilustrado na figura 3. A etapa de
granulação ocorreu durante 81 dias para o reator 1 e 465 dias para os reatores 2 e 3,
enquanto a etapa de operação durou 133 dias para os três reatores. Além disso, a
operação e a granulação diferem quanto à configuração das fases de operação: na etapa
de granulação, o enchimento e esvaziamento dos reatores ocorriam de formas
independentes.

Figura 3 – Fases dos reatores durante a etapa de granulação


Fonte: Autores
As características físicas do lodo granular são monitoradas e analisadas buscando-
se comparar variações na sua estabilidade física e estrutural. Benatti (2019) descreve o
ensaio empregado neste estudo em que são usadas nove peneiras de aço para
peneiramento e classificação numa frequência semanal. O acompanhamento das
características da morfologia do lodo granular também foi realizado mensalmente por
meio de capturas de imagens fotográficas.

Resultados Obtidos ou Esperados (máx. 2500 caracteres)

As mudanças das características físicas do lodo granular puderam ser identificadas


ao longo do experimento pelas fotografias registradas e apresentadas na Figura 4.

Figura 4 – Capturas fotográficas digitais do LGA durante a fase operacional


Fonte: Autores
As imagens apresentam as modificações observadas ao longo do tempo do LGA
em cada um dos reatores. Os índices numéricos 1, 2 e 3 identificam as fotografias dos
reatores 1, 2 e 3, respectivamente, enquanto os índices alfabéticos a, b, c, d, e, f e g
mostram respectivamente as fotos capturadas nos dias 448, 475, 491, 525, 554, 584 e
598 do experimento. Dessa forma, a primeira fotografia apresenta o lodo 17 dias antes do
final da fase de granulação e início da fase de operação, que ocorreu no dia 465. As
fotografias seguintes apresentam o lodo ao longo da fase de operação até o último
registro no dia 598.

É possível observar que apesar dos reatores 1 e 2 possuírem condições de


formação granular semelhantes, o LGA observado nas fotografias destoam em forma e
tamanho devido a diferença na quantidade de dias durante a granulação, sendo 385 dias
mais curta para o R1. Nota-se, também, claramente pelas fotografias que o reator 3
passou pelo processo de desintegração granular. A partir da figura 3b até a 3g, a
presença cada vez maior de grânulos fissurados e, de acordo com De Kreuk, Heijnen e
Van Loosdrecht (2005), achatados ou com estrutura em forma de rim caracterizam sua
quebra e fragmentação.

Além do mais, as mudanças da distribuição do tamanho das partículas puderam


ser acompanhadas durante toda a fase de operação dos reatores. A primeira medição foi
realizada 7 dias após o início da operação e seguiu até o dia 593 do experimento. As
figuras 5, 6 e 7 apresentam os ensaios granulométricos do lodo dos reatores 1, 2 e 3,
respectivamente. A figura 8 apresenta as mudanças observadas no tamanho médio das
partículas de lodo e na fração de LGA ao longo do tempo.

Figura 5 – Curva granulométrica do lodo do reator 1


Fonte: Autores
Figura 6 – Curva granulométrica do lodo do reator 2

Fonte: Autores

Figura 7 – Curva granulométrica do lodo do reator 3

Fonte: Autores

Figura 8 – Evolução do percentual de lodo granular e tamanho médio do lodo


Diâmetro médio das partículas (mm) 2.4 100

2
80

% partículas > 0.2mm


1.6
60

1.2

40
0.8

20
0.4

0 0
472 492 512 532 552 572 592
Tempo de operação (dias)
R1 R2 R3 % R1 % R2 % R3

Fonte: Autores
Nos três reatores, as curvas mostram claramente que houve um aumento na
quantidade de lodo flocular, identificado pelo diâmetro inferior a 0,2 mm. Em cada reator a
quantidade percentual de lodo flocular era inferior a 10% no dia 472, todavia esse valor
cresceu até o dia 593.

Análise dos resultados (máx. 2500 caracteres)

A desintegração granular pode ser identificada com maior precisão nas análises
granulométricas. A fragmentação é responsável por causar o desaparecimento de
partículas grandes e, consequentemente, o surgimento de muitos grânulos menores de
maneira gradual, representado por um espalhamento na curva granulométrica. Por
exemplo, no reator 3 no dia 472, o lodo é composto de aproximadamente 70% em massa
de partículas maiores que 2 mm, mas na análise do dia 538 esse valor gira em torno de
45%, indicando que as partículas grandes têm se tornado em partículas de menor
diâmetro, mesmo com o aumento do percentual em massa de lodo flocular (+10%) no
período.

Além do mais, os dados experimentais suportam a hipótese do tamanho crítico. No


reator 3, é possível observar claramente o espalhamento da curva granulométrica, mais
especificamente nos maiores diâmetros (1-3mm) resultado das complicações da
biomassa devido as limitações de transferência de massa para o interior do grânulo. A
morte celular e o consumo de EPS no centro do grânulo produziu uma estrutura nuclear
mais fraca resultando na fragmentação do lodo como sugerido por Verawaty et al. (2013).
Deve-se considerar que o reator 3 possuía lodo com distribuição granulométrica estável,
porque estava há mais de um ano em condição operacional de granulação. Todavia, as
modificações das condições operacionais no dia 465 resultaram num menor fornecimento
de oxigênio na etapa de aeração e em condições hidrodinâmicas diferentes na etapa de
enchimento e esvaziamento simultâneo. Como a velocidade de sedimentação, as forças
de cisalhamento, a forma de alimentação do reator e o ciclo de aeração foram alterados, o
reator definiu um novo tamanho crítico ao lodo. Portanto, as partículas maiores que o
tamanho crítico se fragmentaram a fim de atingir uma operação com grânulos menores e
próxima desse limite.

É importante destacar que o espalhamento da distribuição granulométrica também


é acompanhado por um aumento da fração flocular do lodo. Esse efeito foi resultado da
etapa de enchimento e esvaziamento simultâneo que preserva essas partículas nos
reatores através do efeito do fluxo de pistão, em que a baixa velocidade (0,5<v asc<3,5 m/h)
do esgoto bruto “empurram” o esgoto tratado sobrenadante pelo topo sem que haja
lavagem do lodo. No reator 2, nota-se que esse efeito pode ter amenizado o
espalhamento da granulometria, uma vez que a fração de lodo flocular foi até duas vezes
maior que o observado no reator 3 no dia 598.

Conclusões/Recomendações (0/2500)

As diferenças apresentadas entre o lodo dos reatores 1 e 2 mostram que mesmo


em condições semelhantes o estágio de maturação dos grânulos não foi alcançado com
88 dias de granulação no R1. Ademais, a hipótese do tamanho crítico é sustentada ao
analisar os dados coletados em todos os três reatores. Adicionalmente, toda modificação
operacional súbita resultará em um desequilíbrio operacional do lodo, o qual buscará
atingir novo equilíbrio dadas as condições operacionais vigentes do reator. Conclui-se,
portanto, que a estabilidade física granular de longo prazo é fundamental para uma
operação estável. Além disso, a fragmentação e quebra do lodo granular constitui um
processo contínuo e natural do LGA. Dessa forma, a instabilidade do lodo granular é
esperada e deve ser temporária, quando há variações das condições operacionais de
reatores com LGA estável.

Por fim, o aumento, em massa, da presença do lodo flocular pode ter


desempenhado um importante papel na saúde dos grânulos. A atenuação do
espalhamento da distribuição das dimensões do lodo, observado no reator 2, pode ter
relação de causa-efeito com o aumento da fração flocular: o efeito de diminuição da
dimensão média das partículas de lodo acompanhou a diminuição do tamanho crítico e
amenizou os efeitos da fragmentação. Todavia, ainda não há na literatura uma
compreensão completa dos mecanismos moleculares por trás da fragmentação por atrito
que elucide essa hipótese. Um estudo realizado por Rollemberg et al. (2019) identificou
diferenças significativas entre as comunidades microbianas entre dois reatores de
diferentes configurações: um condições operacionais convencionais de volume variável
(enchimento, reação anaeróbia, aeração sedimentação e esvaziamento) e outro de
volume constante (enchimento e esvaziamento simultâneo, reação anaeróbia, aeração,
sedimentação). Portanto, mesmo que os reatores possuam as fases de reação idênticas,
a alteração das condições de enchimento e esvaziamento, como observado neste estudo,
modificou completamente a distribuição funcional da afiliação taxonômica dos
microrganismos nos grânulos aeróbios.

Referências bibliográficas (0/2500)

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